Design "Casa da Acolhida" - Grupo Curare de Permacultura

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DESIGN PERMACULTURAL

CASA DE ACOLHIDA AMBIENTAL DE BOTUCATU


SUMÁRIO INTRODUÇÃO

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Apresentação

4

A Permacultura

7

Cozinha

77

Dormitórios

81

Forno Solar

83

Aquecedor Solar

85

Desidratador

87

Placas Fotovoltaicas

90

LEITURA DA PAISAGEM

11

Localização

13

Clima

15

Relevo

17

Círculo-de-bananeiras

95

Vegetação

18

Filtro Biológico

98

SETORIZAÇÃO

33

Tanque de Evapotranspiração

102

ANÁLISE DE ELEMENTOS

39

Banheiro-seco

107

Espiral-de-ervas

112

Meliponário

115

Canais de Infiltração

41

Poço

44

Cisternas

45

Pomar

118

Trilha Ecológica

48

Cerca-viva

120

Núcleos de Restauração

55

Composteiras

123

Viveiro

69

Estacionamento

74

Sede e Alojamento

75

TABELA DE ELEMENTOS

127

RELAÇÕES INVISÍVEIS

1 2


INTRODUÇÃO

3


APRESENTAÇÃO DO PROJETO

Este projeto foi realizado pelo Grupo Curare, tendo a Permacultura como fundamento e atendendo ao convite de Maria de Lourdes Spazziani e Paulo Sérgio Sardinha, para na criação de um espaço no qual:

» A vegetação nativa seja recomposta para reestabelecer processos ecológicos; » Pessoas sejam acolhidas e reaproximadas da natureza de forma integrada, respeitando-a; » O desenvolvimento de atividades de educação ambiental seja possibilitado e auxiliado por meio de trilhas didáticas e espaços comunitários.

O grupo recebeu com alegria e entusiasmo o convite e realizou o projeto, uma vez que está em sintonia com princípios que cultiva. Assim, nasceu o design permacultural da CASA DE ACOLHIDA AMBIENTAL.

< Sumário

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O GRUPO

O Grupo Curare de Permacultura é um coletivo formado em Botucatu por amigos e amigas que estudaram juntos na UNESP, provenientes dos cursos de Biologia, Nutrição e Agronomia. Depois de um período de atuação na universidade, o grupo criou suas próprias asas e vem atuando de forma independente.

Nosso maior objetivo é trabalhar a favor da popularização e difusão da Permacultura. Neste sentido, desenvolvemos diversas atividades: Cursos de Design em Permacultura (PDC) a valores mais acessíveis, visitas guiadas no Sítio Beira Serra (Botucatu), organização de cursos e oficinas práticas, elaboração de projetos de design, exposição de tecnologias sustentáveis em eventos e atividades em educação ambiental.

< Sumário

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EQUIPE CÉSAR CLARO TREVELIN Licenciado e bacharel em Ciências Biológicas pela UNESP, campus de Botucatu, possui curso de aperfeiçoamento em ilustração científica pelo UFTM e curso de jardinagem pelo SENAC. Trabalha com fotografia, ilustração científica e Permacultura. cesartrevelin@yahoo.com.br - 11 98192-1318

PAULO ROBERTO AMARAL LENCIONI Licenciado e bacharel em Ciências Biológicas pela UNESP, campus de Botucatu, está se aprofundando nos processos de aprendizagens sociais com base na visão fenomenológica de Goethe, Antroposofia, Dragon Dreaming, Comunicação NãoViolenta e Art of Hosting. Vem buscando compreender e vivenciar a Permacultura como uma das bases para sua vida. paulorobertolencioni@hotmail.com - 14 98813-0994 RAFAEL GUERREIRO SERAPHIM Licenciado e bacharel em Ciências Biológicas pela UNESP, campus de Botucatu, tem como áreas de estudo a Ecologia de Agroecossistemas e Ecologia da Restauração. Atua com levantamento florístico, projetos de restauração e produção de alimentos com base ecológica. Atua também como educador nos Cursos de Design em Permacultura. rafaelgs2@gmail.com - 14 98808-9894 < Sumário

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A PERMACULTURA

Oriunda da conjugação das palavras permanent e culture, a Permacultura visa uma “cultura da permanência” do ser humano em harmonia com a natureza. Como conceituada por Bill Mollison, um dos australianos idealizadores da Permacultura, ela: “… é o planejamento e a manutenção conscientes de ecossistemas agriculturalmente produtivos, que tenham a diversidade, estabilidade e resistência dos ecossistemas naturais. É a integração harmoniosa das pessoas e a paisagem, provendo alimento, energia, abrigo e outras necessidades, materiais ou não, de forma sustentável. A filosofia por trás da Permacultura visa trabalhar com a Natureza, e não contra ela. É um trabalho de observação do mundo natural, com conclusões transferidas para o ambiente planejado.”

Assim, além de uma filosofia que objetiva a criação de assentamentos humanos sustentáveis, a Permacultura consiste em um método de design fundamentado em princípios éticos de cuidado com a terra, cuidado com as pessoas e partilha justa. < Sumário

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CUIDAR DA TERRA

PARTILHA JUSTA

CUIDAR DAS PESSOAS

Figura 1.1. Princípios éticos da Permacultura. < Sumário

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ÁGUA

MEIO AMBIENTE

BEM-ESTAR

HABITAÇÃO A Permacultura, no processo de design, busca a integração e sustentabilidade de um sistema pensando e sistematizando estratégias para os diferentes aspectos da vivência humana.

PRODUÇÃO DE ALIMENTOS

< Sumário

ENERGIA

RELAÇÕES SOCIAIS


Um dos pilares da Permacultura, ao lado da ecologia e de princípios éticos, é seu método de design, o qual consiste nas seguintes etapas:

-LEITURA DA PAISAGEM -ANÁLISE DE ELEMENTOS -SETORIZAÇÃO -ZONEAMENTO

< Sumário

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LEITURA DA PAISAGEM

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A primeira etapa do método permacultural consiste na LEITURA DA PAISAGEM. Trata-se da análise do contexto natural (clima, relevo, solo, paisagem, biota, hidrografia) e social (história, economia, estruturas antrópicas, pessoas) no qual está ou será inserido o assentamento humano. Tal procedimento é imprescindível para que possamos planejar para a sustentabilidade. A abordagem da Permacultura parte desse contexto para, então, buscar os conhecimentos e conceitos científicos e das culturas tradicionais que permitam a interferência e interação no meio ambiente em consonância com os PRINCÍPIOS ÉTICOS. Somente então, as técnicas (ou conteúdos) são escolhidas para cada aspecto e necessidade do projeto. Esta linha de pensamento mostra que uma técnica por si só não será “permacultural” caso não considere a ética da Permacultura, o contexto do local e os conceitos que a justifiquem. A Permacultura é, portanto, mais do que um conjunto de técnicas (figura 2.1.).

< Sumário

Figura 2.1. Diagrama ilustrativo da abordagem permacultural. O sentido do design é de fora para dentro.

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LOCALIZAÇÃO A Cidade Botucatu é uma cidade com aproximadamente 130.000 habitantes, localizada no centro-oeste paulista (22°53'09" de latitude sul, 48°26'42" de longitude oeste). Possui um território de 1.482,642km² numa região de transição entre os biomas Cerrado e Mata Atlântica. O nome da cidade tem origem tupi Ibytu-katu e significa “bons ares” ou “bons ventos”. Outra origem possível faz referência à junção dos termos tupis ybytyra e katu, que significam “serra boa”. A cidade está localizada, a uma altitude média de 840m, na chamada Cuesta Basáltica, formação que marca a transição entre a depressão periférica e o planalto paulista. Além disso, é importante zona de recarga do Aquífero Guarani, com afloramentos do arenito que compõe a estrutura desse importante sistema natural de armazenamento de água doce. Apesar de pequena, a cidade vem expandindo uma vida cultural rica e diversa, além de possuir um forte histórico de agriculturas alternativas como a orgânica, agroecológica e a biodinâmica, que foi iniciada há 42 anos na primeira fazenda biodinâmica do Brasil, a Estância Demétria. Também há o Sítio Beira Serra, que busca desenvolver um trabalho com a Permacultura. < Sumário

Figura 2.2. Localização de Botucatu no estado de São Paulo.

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O Bairro O Bairro Vista Alegre situa-se há 2,5km da entrada da cidade e conta com aproximadamente 70 famílias. Atualmente, grande parte dos proprietários residem no bairro, diferente do passado, quando a maior parte das chácaras eram de veraneio e alugadas para eventos. Realizamos entrevistas semiestruturadas para conhecer e compreender seu contexto social. Essa metodologia foi utilizada para melhor naturalidade no diálogo e, consequentemente, maior aproximação e fluidez, revelando dados e questões não previamente planejadas. Apesar de haver uma comunidade que vive no bairro constantemente, foi levantado que não há espaços de confraternização entre os moradores, havendo assim pouca interação. Os locais onde há essa possibilidade são na Igreja de São Francisco e na SACREVA, que é a associação de moradores do bairro. Um dos entrevistados participa dessa associação e descreve que não são muitos os que se interessam e participam das reuniões para juntos decidir sobre as questões do bairro. Todas as questões e demandas que surgem dos moradores é discutida nesse espaço, que diz ter uma atuação prática. Outra questão tratada diz respeito à segurança. Como relatado, há cerca de 15 anos atrás, assaltos eram frequentes no bairro, porém, hoje em dia, a segurança tem sido uma questão menos preocupante. As queimadas foram levantadas como uma forma comum de destinação dos resíduos sólidos. Esse breve relato nos mostra questões que emergem e são consideradas no design. A partir desse olhar, conseguimos pensar como o projeto pode contribuir para o desenvolvimento também do seu entorno social. < Sumário

Figura 2.3. Localização do bairro Vista Alegre na cidade de Botucatu. 14


CLIMA

O clima é considerado subtropical úmido (do tipo Cfa, de acordo com a classificação Köppen e Geiger: clima temperado quente – mesotérmico – úmido, com temperatura média do mês mais quente superior a 22°C), com presença de ventos constantes. A pluviosidade média anual é de 1.501,4mm, bem distribuídos ao

longo do ano, com período de estiagem durante o inverno. Botucatu tem uma temperatura média de 20,3 °C. Figura 2.4. Gráficos de temperatura média e precipitação na cidade de Botucatu no período de 1971 a 2008. Eixo vertical: meses do ano; eixo horizontal: dias do mês. Fonte: Faculdade de Ciências Agronômicas – UNESP. < Sumário

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Botucatu tem uma média pluviométrica anual de aproximadamente 1.501,4mm. Essas chuvas, porém, não se distribuem uniformemente ao longo do ano. O maior volume chuvas se concentra entre os meses de dezembro e março (150-230mm/mês), com momentos de baixa precipitação entre abril e setembro (35-60mm/mês).

Meses

Figura 2.5. Climograma típico da cidade de Botucatu evidenciando um período quente e úmido e um período frio e seco. Linha vermelha: temperatura; barras azuis: precipitação. < Sumário

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RELEVO O terreno possui uma declividade predominante de nordeste para sudoeste, com variação média de 8 metros (26,7%). No fundo do terreno (região mais afastada da rua), a declive passa a ser no sentido de noroeste para sudeste com declividade média de 10 metros (33,4%) e um paredão rochoso com cerca de 7 metros de altura. Por possuir essas características topográficas, precisamos ter cuidado com o processo erosivo decorrente da ação da água, que em áreas com declividade acentuada ganha velocidade e carrega o solo. Tendo isso em vista, são três os pontos que devemos ter maior atenção: a porção central do terreno e os dois cursos de água intermitentes.

Figura 2.6. Mapa topográfico do terreno. < Sumário

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VEGETAÇÃO

Objetivo e Metodologia Realizamos um levantamento florístico qualitativo, com o objetivo de obter informações importantes para o planejamento da restauração ecológica. A identificação das espécies presentes no terreno também é importante para a caracterização da vegetação e do seu estágio sucessional. Para isto, percorremos aleatoriamente toda a área, identificando todas as espécies arbustivas e arbóreas avistadas. Usamos como critérios de amostragem: a circunferência à altura do peito (CAP) maior que 15 centímetros e a altura acima de 50 centímetros (quando a CAP estava abaixo de 15 centímetros). O primeiro critério representa as árvores adultas que são responsáveis pela estrutura da vegetação, enquanto que o segundo representa a regeneração natural, ou seja, as plântulas que encontraram condições adequadas para germinar e se desenvolver no local, possuindo grande probabilidade de compor o estrato adulto em longo prazo. Os indivíduos

regenerantes fornecem a ideia acerca da evolução do sistema e da qualidade das fontes de propágulos – frutos e sementes – na paisagem (remanescentes de mata nas proximidades).

< Sumário

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Área Degradada O terreno apresenta duas fisionomias distintas. A primeira, que ocupa, aproximadamente, três quartos, constitui-se de área

degradada ocupada por gramíneas invasoras, tais como a braquiária

(Urochloa decumbens) e o capim-colonião (Panicum maximum), além de outras herbáceas espontâneas como cambará-de-cheiro

(Lantana camara), asteráceas (Baccharis dracunculifolia, Eupatorium sp.) e samambaias (Pteridium sp., Thelypteris dentata). Estão presentes árvores e arbustos isolados ou em pequenos agrupamentos, sendo as espécies de maior abundância: sapuva

(Machaerium stipitatum), candeia (Moquiniastrum polymorphum), tucaneiro (Vochysia tucanorum) e quaresmeira (Tibouchina

granulosa). Além das espécies nativas, encontram-se frutíferas exóticas como abacate (Persea americana), goiaba (Psidium

guajava), limão-rosa (Citrus x limonia) e manga (Mangifera indica). No total, foram encontradas 35 espécies nessa área (tabela 1.1). < Sumário

Observa-se um processo inicial de invasão biológica caracterizada pelo estabelecimento de indivíduos de ipezinho-de-

jardim (Tecoma stans; figura 2.1), espécie ornamental dispersa pelo vento e que possui alta taxa de germinação, formando pequenos agrupamentos, e de pinheiro (Pinus elliottii). A presença da braquiária é conhecidamente um fator que prejudica ou até mesmo impede o estabelecimento das espécies nativas, o que resulta na baixa densidade de regenerantes no local. Porém, nos agrupamentos onde existem espécies arbóreas de recobrimento, havendo maior sombreamento do solo, a braquiária é menos abundante e foi possível observar o estabelecimento de indivíduos regenerantes das espécies nativas. Realizamos também o mapeamento das árvores maiores (CAP>40cm) encontradas nesta área (figura 2.2).

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ESPÉCIES INVASORAS O processo de invasão biológica – ou contaminação biológica - ocorre quando uma espécie exótica, ou seja, não natural daquele ecossistema, é nele introduzida e se naturaliza, passando a se dispersar e colonizá-lo com grande eficiência. A invasão por espécies vegetais prejudica o funcionamento ecossistêmico principalmente por: 1) impedir ou reduzir a regeneração (estabelecimento e desenvolvimento) das espécies nativas em decorrência da competição; 2) exclusão da fauna dispersora pela redução na oferta de frutos e sementes; 3) alteração nas interações ecológicas das espécies nativas à medida que as espécies invasoras tornam-se preferencialmente polinizadas e dispersadas pela fauna e aumentam sua abundância; 4) como consequência, a diminuição nas populações ou extinção local de organismos associados às espécies nativas.

As invasões biológicas são, atualmente, consideradas a segunda maior causa da perda de biodiversidade no mundo, ficando atrás somente da destruição direta dos ecossistemas. >>

Figura 2.7. Exemplo de espécie invasora: ipezinho-de-jardim

(Tecoma stans).

< Sumário

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Tabela 1.1. Espécies encontradas na área degradada. EXO: exótica; P: pioneira; S: secundária; D: diversidade; I: invasora; R: recobrimento; ANE: anemocoria (vento); AUT: autocoria; ZOO: zoocoria (animais). NOME CIENTÍFICO

Acrocomia aculeata Aegiphila integrifolia [=Aegiphila sellowiana] Casearia sylvestris Cecropia pachystachya Cedrela fissilis Citrus x limonia Croton floribundus Eucalyptus sp. Luehea divaricata Inga vera subsp. affinis [=Inga uruguensis] Machaerium stipitatum Mangifera indica Melia azedarach Moquiniastrum polymorphum [=Gochnatia polymorpha] Morus nigra Myrcia spectabilis Myrsine coriacea [=Rapanea ferruginea] Myrsine umbellata [=Rapanea umbellata] < Sumário

NOMES POPULARES

FAMÍLIA BOTÂNICA

macaúba, palmeira-macaúba tamanqueiro, caiuia guaçatonga, lagarteira embaúba cedro limoeiro-rosa capixingui eucalipto açoita-cavalo, açoita-cavalo-miúdo ingá-do-brejo, ingá-comum sapuva, sapuvinha mangueira santa-bárbara, amargoseira candeia, cambará-branco

ARECACEAE LAMIACEAE SALICACEAE URTICACEAE MELIACEAE RUTACEAE EUPHORBIACEAE MYRTACEAE MALVACEAE FABACEAE FABACEAE ANACARDIACEAE MELIACEAE ASTERACEAE

amoreira perta-guela, ameixa-do-mato capororoca, capororoca-ferrugem capororoca-branca,

MORACEAE MYRTACEAE PRIMULACEAE PRIMULACEAE

GRUPO SUCESSIONAL S P P P S EXO P EXO P P S EXO EXO P

GRUPO FUNCIONAL D D D D D I R D R R D D I R

EXO S P S

I D D D

DISPERSÃO ZOO ZOO ZOO ZOO ANE ZOO AUT AUT ZOO ZOO ANE ZOO ZOO ANE

ZOO ZOO ZOO ZOO 21


Nectandra megapotamica Pera glabrata [=Pera obovata] Persea americana Pinus elliottii Piper aduncum Psidium guajava Schinus terebinthifolius Schizolobium parahyba Solanum mauritianum Tabernaemontana hystrix [=Peschiera fuchsiifolia] Tapirira guianensis Tecoma stans Tibouchina granulosa Trema micrantha Vernonanthura phosphorica [=Vernonia polyanthes] Vochysia tucanorum Zanthoxylum rhoifolium

< Sumário

canela-louro, canelinha

LAURACEAE

S

D

ZOO

pombeiro, tabocuva

PERACEAE

P

D

ZOO

abacateiro

LAURACEAE

EXO

D

AUT

pinheiro, pinus

PINACEAE

EXO

I

ANE

falso-jaborandi

PIPERACEAE

S

D

ZOO

goiabeira

MYRTACEAE

EXO

I

ZOO

aroeira-pimenteira, aroeirinha

ANACARDIACEAE

P

R

ZOO

guapuruvu

FABACEAE

P

D

AUT

folha-de-porco, fumo-bravo

SOLANACEAE

S

D

ZOO

leiteiro, jasmim-do-campo

APOCYNACEAE

P

D

ZOO

peito-de-pombo, copiúva

ANACARDIACEAE

S

D

ZOO

ipezinho-de-jardim

BIGNONIACEAE

EXO

I

ANE

quaresmeira-roxa

MELASTOMATACEAE

P

R

ANE

crindiúva, pau-pólvora

CANNABACEAE

P

R

ZOO

cambará-guaçu, assa-peixe

ASTERACEAE

P

R

ANE

pau-de-tucano, cinzeiro, tucaneiro

VOCHYSIACEAE

S

D

ANE

S

D

ZOO

mamica-de-porca, laranjeira-brava RUTACEAE

22


Figura 2.8. Mapa do terreno com a localização das principais árvores (CAP>40cm). Legenda de siglas e cores: Ab: abacateiro; Ac: açoita-cavalo; Ap: aroeira-pimenteira; Ca (alaranjado): candeia; Can: canela-amarela; Cap: capixingui; Capo: capororoca; Ce: cedro; Co: copaíba; Em: embaúba; Eu: eucalipto; Ip (verde): ipezinho-de-jardim; Ja: jequitibá; La: lagarteira; Li: limão; Ma: mangueira; Mac: palmeira-macaúba; Mp: mamica-de-porca; Paup: pau-pólvora; Pi (preto): pinheiro; Pj: pau-jacaré; Pom: pombeiro; Pp: peito-de-pombo; Qua (rosa): quaresmeira; Sa (amarelo): sapuva; Tam tamanqueiro; Tu (roxo-claro): tucaneiro. < Sumário

23


Figura 2.9. Fotografia da vista frontal do terreno. Nota-se a presença de árvores isoladas ou em pequenos agrupamentos e a alta incidência de braquiária. < Sumário

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As características observadas nesta área levam à conclusão de que a vegetação encontra-se em um processo intermediário de sucessão ecológica: Fragmento Florestal O restante do terreno, equivalente a

1708m2,

apresenta uma

mata secundária, ou seja, um remanescente de vegetação nativa

que sofreu impactos de atividades humanas. Essa vegetação pôde ser classificada como Floresta Estacional Semidecídua devido à ocorrência de espécies exclusivas de mata (necessitam de ambiente sombreado em

algum estágio do seu desenvolvimento, sendo mais sensíveis aos fatores de temperatura e umidade) ou generalistas (que possuem ampla ocorrência nos diferentes tipos de vegetação) e ausência de espécies exclusivas de Cerrado (não toleram sombreamento).

Foram identificadas, ao todo, 45 espécies no fragmento (tabela 1.2.).

< Sumário

1. Presença de clareiras (aberturas no dossel com alta incidência de radiação solar no solo); 2. Distribuição diamétrica das árvores com amplitude moderada, com predomínio de pequenos diâmetros e algumas árvores de grande diâmetro (acima de 40 cm); 3. Camada de serrapilheira fina e descontínua sobre o solo (provavelmente devido à erosão); 4. Indivíduos de espécies secundárias regenerando no banco de plântulas; 5. Presença de trepadeiras lenhosas em baixa densidade e epífitas (musgos, liquens e bromélias do gênero Tillandsia) na quase totalidade de árvores adultas; 6. Sub-bosque de áreas mais sombreadas com arbustos umbrófilos (piperáceas, rubiáceas e mirtáceas); 7. Árvores adultas características de estágio avançado com CAP maior que 40 cm: canelas (Ocotea velutina, Nectandra lanceolata), jequitibá (Cariniana estrellensis) e cedro-rosa (Cedrela fissilis). 25


Tabela 1.2. Espécies encontradas no fragmento florestal. EXO: exótica; P: pioneira; S: secundária; D: diversidade; I: invasora; R: recobrimento; ANE: anemocoria (vento); AUT: autocoria; ZOO: zoocoria (animais). NOME CIENTÍFICO

Alchornea triplinervia Allophylus edulis Astronium graveolens Calophyllum brasiliense Calyptranthes concinna Campomanesia guazumifolia Cariniana estrellensis Casearia decandra Cecropia pachystachya Cedrela fissilis Centrolobium tomentosum Chrysophyllum gonocarpum Copaifera langsdorffii Croton floribundus Cupania vernalis Dasyphyllum brasiliense Dendropanax cuneatus Eriobotrya japonica Eugenia florida Euterpe edulis < Sumário

NOMES POPULARES pau-jangada, tapiá, tapieira chal-chal, fruta-de-jacu guaritá guanandi guamirim-facho sete-capotes, araçá-do-mato jequitibá-branco cafezeiro-do-mato embaúba, embaúba-branca cedro araribá, araribá-rosa, araribá-vermelho guatambu-branco, aguaí copaíba capixingui arco-de-peneira, camboatã-vermelho espinho-de-agulha maria-mole nêspera, ameixa-amarela guamirim palmito-juçara, palmiteiro

FAMÍLIA BOTÂNICA EUPHORBIACEAE SAPINDACEAE ANACARDIACEAE CALOPHYLLACEAE MYRTACEAE MYRTACEAE LECYTHIDACEAE SALICACEAE URTICACEAE MELIACEAE FABACEAE SAPOTACEAE FABACEAE EUPHORBIACEAE SAPINDACEAE ASTERACEAE ARALIACEAE ROSACEAE MYRTACEAE ARECACEAE

GRUPO SUCESSIONAL P P S S S S S S P S S S S P S P P EXO S S

GRUPO FUNCIONAL R D D D D D D D D D D D D R D R D I D D

DISPERSÃO ZOO ZOO ANE ZOO ZOO ZOO ANE ZOO ZOO ANE ANE ZOO ZOO AUT ZOO ANE ZOO ZOO ZOO ZOO 26


Guarea kunthiana Inga marginata Luehea divaricata Matayba elaeagnoides Mollinedia schottiana Mollinedia widgrenii Myrcia guianensis [=Myrcia lingua] Myrcia spectabilis Myrciaria floribunda Nectandra lanceolata Nectandra megapotamica Neomitranthes glomerata Ocotea velutina Piper aduncum Piper amalago Piper arboreum Piper regnellii Piptadenia gonoacantha Plinia cauliflora Syagrus romanzoffiana Syzygium jambos Tapirira guianensis Trichilia casaretti Trichilia elegans Trichilia pallida

canjambo, marinheiro ingá-feijão açoita-cavalo, açoita-cavalo-miúdo camboatã-branco guatambú-langanha corticeira, erva-santa guamirim perta-guela, ameixa-do-mato murtinha-do-campo canela-amarela canela-louro, canelinha canelão-amarelo, canelão falso-jaborandi falso-jaborandi falso-jaborandi nhandiba, caapeba, pariparoba pau-jacaré jaboticabeira jerivá, coco-gerivá, baba-de-boi jambeiro peito-de-pombo, copiúva catiguá cariguazinho, pau-de-ervilha baga-de-morcego

MELIACEAE FABACEAE MALVACEAE SAPINDACEAE MONIMIACEAE MONIMIACEAE MYRTACEAE MYRTACEAE MYRTACEAE LAURACEAE LAURACEAE MYRTACEAE LAURACEAE PIPERACEAE PIPERACEAE PIPERACEAE PIPERACEAE FABACEAE MYRTACEAE ARECACEAE MYRTACEAE ANACARDIACEAE MELIACEAE MELIACEAE MELIACEAE

S S P/S S S S S S S S S S S S S S S P S S EXO S S S S

D R R D D D D D D D D D D D D D D D D D I D D D D

ZOO ZOO ANE ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO AUT ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO 27 ZOO


A

B

Figura 2.10. Fotografias da borda (A) e dossel (B) do fragmento de vegetação.

< Sumário

28


FLORESTA ESTACIONAL SEMIDECÍDUA Uma das diferentes fitofisionomias compreendidas dentro do domínio (ou bioma) da Mata Atlântica. Sua ocorrência se dá em função do clima marcado por seca hibernal e intensas chuvas

de

verão.

Tal

sazonalidade

determina

a

semideciduidade da vegetação, ou seja, entre 20 a 50% dos indivíduos arbóreos perdem as folhas no período seco como uma resposta fisiológica que reduz a transpiração. >>

A região de Botucatu apresenta grande diversidade

de fitofisionomias: desde as formações savânicas do Cerrado, até formações florestais como a própria Floresta Estacional Semidecídua e o Cerradão. Entre estas formações, encontramse os Ecótonos, isto é, áreas de transição que apresentam alta diversidade biológica. A determinação do tipo de vegetação,

principalmente as florestais, só é possível através da sua

Figura 2.11. Fotografia no interior do fragmento de vegetação do terreno, a qual pôde ser classificada como Floresta Estacional Semidecídua. < Sumário

composição florística (espécies de plantas que ocorrem no local). 29


Área de Preservação Comunitária Na direção oposta ao terreno, existe uma área de preservação comunitária do bairro Vista Alegre. Esta área foi reflorestada após desmatamento e encontra-se, atualmente, em estágio inicial de sucessão ecológica. As observações que permitiram essa classificação foram: 1. Serrapilheira bastante descontínua ou ausente; 2. Alta incidência solar no solo permitindo a presença de braquiária no interior da área; 3. Dominância de espécies pioneiras, principalmente ingás (Inga vera e Inga marginata); 4. Poucos indivíduos de espécies secundárias, o que compromete a sustentabilidade da área em longo prazo. Assim como no terreno, ocorre invasão do ipezinho-de-jardim (Tecoma stans) em processo avançado e presença de outra espécie invasora, o jambolão (Syzygium

cumini).

Na região próxima ao terreno, foram identificadas 27 espécies e um corpo d’água de pequenas dimensões com brejo associado a ele. < Sumário

Figura 2.12. Imagem aérea da área de preservação comunitária do bairro Vista Alegre (destaque em verde) e localização do terreno (destaque em amarelo). 30


Tabela 1.3. Espécies encontradas na área de preservação comunitária. EXO: exótica; P: pioneira; S: secundária; D: diversidade; I: invasora; R: recobrimento; ANE: anemocoria (vento); AUT: autocoria; ZOO: zoocoria (animais). NOME CIENTÍFICO

Aegiphila integrifolia [=Aegiphila sellowiana] Alchornea triplinervia Cedrela fissilis Citharexylum myrianthum Eriobotrya japonica Eugenia uniflora Handroanthus heptaphyllus [=Tabebuia heptaphylla] Hedyosmum brasiliense Inga marginata Inga vera subsp. affinis [=Inga uruguensis] Miconia sp. Moquiniastrum polymorphum [=Gochnatia polymorpha] Morus nigra Myrsine coriacea [=Rapanea ferruginea] Pera glabrata [=Pera obovata] Piper amalago Piper regnellii Rhamnidium elaeocarpum < Sumário

tamanqueiro, caiuia pau-jangada, tapiá, tapieira cedro pau-viola, pombeiro nêspera, ameixa-amarela pitangueira ipê-roxo chá-de-soldado, hortelã-do-brejo ingá-feijão ingá-do-brejo, ingá-comum micônia candeia, cambará-branco

GRUPO GRUPO DISPERSÃO SUCESSIONAL FUNCIONAL LAMIACEAE P D ZOO EUPHORBIACEAE P R ZOO MELIACEAE S D ANE VERBENACEAE P D ZOO ROSACEAE EXO I ZOO MYRTACEAE S D ZOO BIGNONIACEAE S D ANE CHLORANTHACEAE S D ZOO FABACEAE S R ZOO FABACEAE P R ZOO MELASTOMATACEAE ZOO ASTERACEAE P R ANE

amoreira capororoca, capororoca-ferrugem tamanqueira, tabocuva falso-jaborandi nhandiba, caapeba, pariparoba saguaraji-amarelo, cafezinho

MORACEAE PRIMULACEAE PERACEAE PIPERACEAE PIPERACEAE RHAMNACEAE

NOMES POPULARES

FAMÍLIA BOTÂNICA

EXO P P S S S

I D D D D D

ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO ZOO 31


Schinus terebinthifolius Senna pendula var. glabrata Syzygium cumini Tapirira guianensis Tecoma stans Tibouchina granulosa Trichilia pallida Triplaris americana Vochysia tucanorum

< Sumário

aroeira-pimenteira, aroeirinha canudo-de-pito, aleluia jambolão peito-de-pombo, copiúva ipezinho-de-jardim quaresmeira-roxa baga-de-morcego pau-formiga, pau-de-novato, novateiro pau-de-tucano, cinzeiro, tucaneiro

ANACARDIACEAE FABACEAE MYRTACEAE ANACARDIACEAE BIGNONIACEAE MELASTOMATACEAE MELIACEAE POLYGONACEAE VOCHYSIACEAE

P P EXO S EXO P S P S

R D I D I R D D D

ZOO AUT ZOO ZOO ANE ANE ZOO ANE ANE

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SETORIZAÇÃO

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Na Permacultura, chamamos de setorização a identificação e representação gráfica das energias externas e não controláveis que fluem através do sistema planejado. Tais energias são o sol, ventos, presença de fogo, fontes de poluição, entre outras. A setorização é um importante momento na elaboração do design permacultural. A compreensão do contexto em que estamos intervindo traz maior consciência e clareza para a proposição dos elementos que irão interagir com essas energias, seja para captá-las, armazená-las e utilizá-las ou impedir sua entrada no sistema. Este processo permite um design com maior sabedoria e assertividade. As conclusões da setorização interferem diretamente no localização relativa da casa, das placas solares, viveiro, plantios, enfim, de todos os elementos do sistema. Os setores principais foram observados nessa primeira etapa de design, porém, a observação constante realizada pelos envolvidos com o terreno é bastante aconselhada. Assim, propiciamos uma vivacidade que traz orientação e aprimoramento ao design.

< Sumário

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Sol

A atenção dada ao percurso do Sol no terreno é essencial à alocação dos elementos dentro do design permacultural, No hemisfério sul, o momento no qual há maior incidência de luz é no solstício de verão (21 de dezembro). Nesse período, o Sol nasce a sudeste e se põe a sudoeste A partir dessa data, o percurso do Sol no céu se desloca a norte, atingindo o ponto de menor insolação no solstício de inverno (21 de junho), em que o Sol nasce a nordeste e se põe a noroeste. Então, seu percurso volta a se deslocar para o sul e assim sucessivamente. Por isso, a face norte é mais valorizada em todo o hemisfério sul, pois ela é a que recebe a incidência de luz solar ao longo de todo o ano.

Figura .. Esquema ilustrando a mudança da incidência solar nas estações e a criação de microclimas no relevo. < Sumário

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Água

A água, seguindo a declividade bastante íngreme, escorre da lateral superior para a lateral inferior na maior parte do terreno, sendo barrada no muro de arrimo do vizinho. Adjacente ao muro, há um caminho por onde a água escorre até os fundos do terreno. No fragmento de mata, a conformação do terreno se altera um pouco, conduzindo toda a água para um pequeno curso d’água intermitente de poucos centímetros de largura. Existe também um paredão no qual ocorre afloramento da água proveniente da infiltração nos terrenos localizados acima. O constante gotejamento, nos períodos chuvosos, é intensificado, aumentando o fluxo d’água e originando um afluente. A erosão laminar é um problema que pode ser observado em determinados locais do terreno.

Figura .. Mapa do terreno com a representação dos fluxos da água. < Sumário

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Poluição Sonora

Ventos

O vento sudeste em Botucatu predomina durante a maior parte do ano, mas seu sentido se inverte em momentos de chuva (noroeste). No terreno, esses ventos tem uma performance própria, pois o vento sudeste é protegido pelos grandes bambuzais e pela floresta do fundo, diminuindo significativamente sua influência. Já os advindos do noroeste, quando se aproximam, segundo observação dos moradores, fazem uma pequena curva subindo os terrenos mais pelo oeste. Este inclusive já causou destelhamento em casas do bairro. Ressaltadas pelos entrevistados, as massas de ar vindas de noroeste continuam a aparecer durante o inverno, porém com poucas chuvas, devido a seca da época.

< Sumário

Outro setor é representado pelos sons que prevalecem com frequência. Um deles é derivado das motorroçadeiras da vizinhança. Comuns em bairros rurais, seu uso é quase diário em épocas de chuva, devido ao maior crescimento das gramíneas. Outro som é causado pelos cachorros domésticos. Ambos são provenientes das mais variadas direções, pois eles provêm de diversas chácaras. Por fim, também percebemos o barulho dos veículos da estrada, conduzido através dos ventos vindo do noroeste. Esse setor, particularmente, apesar de parecer menos impactante num primeiro olhar, pode influenciar tanto quanto qualquer outro. Tendo em vista que um dos objetivos do projeto é o de anfitriar um espaço de descanso, estudo e de atividades educativas, sons como esses podem ser muito perturbadores, trazendo a importância de criar estratégias para atenuá-los nesses locais e construções onde essas atividades acontecerão.

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Figura .. Mapa do terreno com a representação dos diferentes setores. < Sumårio

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ANÁLISE DE ELEMENTOS

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No design permacultural, chamamos de “elementos” as estruturas construídas, plantas e animais que compõem ou que poderão compor o sistema. A etapa de analisar esses elementos é fundamental para que possamos planejar

considerando suas características, produtos e necessidades. A autossustentabilidade do sistema, objetivo do design, será atingida quando as necessidades de cada elemento forem supridas pelos produtos de outro dentro do mesmo sistema. Da mesma forma, os produtos de um elemento forem destinados também no próprio sistema. Além disso, buscamos elementos que exerçam mais de uma função e que funções importantes sejam cumpridas por mais de um elemento. Tais premissas visam garantir a resistência e resiliência do sistema, ou seja, sua capacidade de pouco se afetar e se recuperar após possíveis adversidades. Nesta seção, descreveremos os elementos pensados para o projeto de acordo com os objetivos e contexto do espaço, assim como traremos informações técnicas sobre eles. Ao final, uma tabela sistematizando as características intrínsecas, necessidades, produtos e funções desses elementos e um diagrama ilustrando as conexões entre eles.

< Sumário

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CANAIS DE INFILTRAÇÃO

O trabalho de sistematização de água é essencial no desenvolvimento de um design de qualidade. Quando não bem manejada, a água pode ser um grande problema para uma propriedade – seu excesso ou falta trazem grandes dificuldades para nossa vida. Quando bem manejada, porém, ela se torna uma grande solução, trazendo vida ao sistema. O processo de sistematização da água visou analisar o caminho que ela percorre na área e trabalhar para deixar o sistema cada vez mais complexo, diminuindo sua velocidade de saída do terreno através da conexão com o maior número possível de elementos. Nesse sentido, propomos a restauração da mata, utilização de cisternas para captação de água da chuva, canais de infiltração (swales) e sistemas de tratamento de águas servidas. É importante ressaltar que o bairro não está conectado à rede de esgoto municipal e que a água pluvial das chácaras acima não está sistematizada, o que provocou a queda de parte da mureta lateral da chácara vizinha e representa um grande fator de erosão no terreno. O manejo e restauração da mata são medidas valiosas que podem prover margens de cursos d´água estáveis e aumentam muito a infiltração da água no solo, evitando que ela escoe superficialmente. Além disso, as árvores são enormes superfícies de condensação de vapor d’água., regulando o microclima nos meses mais secos. No design, devemos observar os caminhos que a água faz e planejar formas para que sua velocidade seja reduzida, ela seja espalhada por todo o terreno e para que infiltre no solo. Os canais de infiltração (swales) cumprem esse papel.

< Sumário

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Um canal de infiltração (swale) nada mais é do que uma linha de nível escavada. A terra retirada é amontoada na margem inferior do canal. Após o monte, árvores são plantadas para estabilizar a terra, sombrear e proteger o canal. Sem a vegetação, ocorre o acúmulo de sais no solo. Espécies rasteiras que cobrem bem o solo plantadas na margem superior do canal são indicadas pra reter sedimentos que podem cobrir o swale. A água que entra no canal (proveniente do escoamento superficial da área acima) é distribuída uniformemente ao longo de sua extensão, por estar em nível, e aos poucos infiltra no solo, beneficiando as planta abaixo e elevando o nível do lençol freático, favorecendo os corpos d’água próximos. Esse processo permite a criação de um microclima de umidade, intensa atividade de decomposição de matéria orgânica e produção de solo. < Sumário

Figura .. Desenho esquemático em corte lateral de um canal de infiltração ainda cheio após uma chuva. As setas indicam a infiltração da água.

A indicação é de que os swales tenham 0,60m (largura) x 0,60m (profundidade) e estejam situados no terço superior e inferior do terreno (Figura ..). A implantação deve ocorrer na fase inicial da restauração, pois o solo se encontra com pouca cobertura vegetal, o que indica uma alta taxa de escoamento superficial que pode prejudicar as plantas jovens e erodir o solo. 42


Figura .. Mapa do terreno com a localização sugerida para os canais de infiltração. < Sumário

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POÇO Para fins de consumo, além do abastecimento de água proveniente do município (Sabesp), sugerimos a abertura de um poço. Segundo informações da vizinhança, os poços existentes no bairro tem profundidades que variam de X a Y metros. Para a água ser coletada nesse poço, seria utilizada uma bomba Shurflo (descrita mais à frente). O armazenamento seria em caixa d’água de 5000 litros sobre o prédio-sede, planejada para guardar um volume de água potável necessário para a estadia das pessoas por cerca de uma semana com lotação máxima. Para utilização da água de poço para fins potáveis, devem ser feitos testes prévios para aferir a qualidade da água, tais testes são: análise física da água (departamento de química e bioquímica da Unesp – Botucatu) e análise biológica (departamento de microbiologia da Unesp - Botucatu). Tal medida é importante, pois como o bairro não possui rede de esgoto, existe a possibilidade das chácaras vizinhas contaminarem águas subterrâneas por armazenamento impróprio de dejetos. < Sumário

Tabela 1. Consumo de água potável: referência (acima) e projeção para a casa de acolhida (abaixo).

USO

QUANTIDADE (litros/dia/pessoa)

Ingestão

2

Lavagem e preparação de alimentos

2

Lavagem de utensílios de cozinha

6

Lavagem de mão e face TOTAL

10 20

Consumo na casa de acolhida Fase 1 - 20 pessoas Fase 2 – 40 pessoas

Diário Semanal 400 l 2,8 m³ 800 l 5,6 m³

Mensal 12 m³ 24 m³

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CISTERNAS Cento e dez litros de água por pessoa por dia é o consumo recomendado pela ONU (Organização das Nações Unidas) para que as necessidades básicas das pessoas sejam sanadas. A água coletada da chuva pode suprir as necessidades para fins não potáveis (tabela 2). A captação e armazenamento de água da chuva é umas das formas mais simples e inteligentes para aproveitar esse recurso com qualidade, já que a água pluvial chega livre de impurezas ao sistema. Construções de maneira geral tem grandes superfícies impermeáveis, telhados por exemplo, que são uma oportunidade para servir como ponto de coleta de água. O que deve se analisar com cuidado é a capacidade de captação da superfície e o volume de armazenamento do reservatório, que tende a ser menor que o volume captado. Isso pode se tornar um problema se o destino desse excedente não for bem planejado, já que, quando o reservatório estiver cheio, todo excedente gerado terá um destino. O design prevê que, com a lotação da casa de acolhida < Sumário

de 35 pessoas, a demanda hídrica por pessoa para fins não potáveis (banho, descarga, lavagem de roupa, limpeza dos espaços) é de 90 litros por dia, mais 100 litros por dia destinados ao viveiro e plantios. Logo, necessitamos de 3250 litros de água/dia. A variação mensal na precipitação tem grande influência no planejamento de uma cisterna, pois exige que manejemos corretamente nos momentos de abundância para que tenhamos nos momentos de escassez. Para se ter uma ideia, enquanto em janeiro podemos coletar 230 litros numa superfície de 1m², em julho coletaríamos 35 litros na mesma área. Além dos valores médios, deve-se levar em conta valores críticos máximos já registrados de pluviosidade para que o sistema consiga suportar uma carga extra de água. Em Botucatu, o mês com maior registro pluviométrico atingiu 496mm de chuva, e o dia com menor índice atingiu 30mm. No período analisado, o ano mais chuvoso foi 1983, com 2.247mm, e o ano menos chuvoso foi 1984, com 939mm. 45


Tabela 2. Consumo de água não potável. USO Ducha Descarga vaso sanitário Lavagem de roupa Limpeza da habitação TOTAL

QUANTIDADE (litros/dia/pessoa) 50 25 10 5 90

Figura ..Modelo de cisterna de ferrocimento. < Sumário

Como sugestões para os modelos de cisternas, temos as subterrâneas, cujo formato permitiria o acúmulo máximo de água. Há modelos comerciais feitas de polietileno. Outra opção bastante interessante e de baixo custo, mas que ocupa uma área externa à da construção, são as cisternas de ferrocimento. Esse tipo de cisterna utiliza pequena quantidade de cimento e possui altíssima resistência, além de fácil manutenção. Por fim, existem diversos modelos de cisternas pré-fabricadas de plástico, as quais são mais caras, mas mais práticas. Atualmente, são encontrados modelos verticais que podem ser alocados nas paredes, ocupando uma superfície horizontal pequena. Outra opção, bastante comum, é a utilização de caixas d’água com esse propósito. A água dos primeiros 10 minutos de chuva é descartada, pois ela carrega a sujeira que foi acumulada no telhado. orgânica lavada do telhado. Esse descarte pode facilmente ser feito utilizando-se um cano de PVC com uma boia antes da entrada da cisterna. O excedente de água captado sairá pelo ladrão das cisternas para o sistema de canais de infiltração. 46


Dimensionamento Escolhemos os telhados da maioria das edificações como superfícies de captação de água, estimamos suas áreas e dividimos o armazenamento em duas cisternas conforme a tabela abaixo: Armazenamento Cisterna 1 (C1) (39.250 litros) Cisterna 2 (C2) (16.000 litros)

Altura: 2 m Raio: 2,5 m Altura: 2 m Raio: 1,6 m

Área estimada para o telhado (m²) Sede 170 Casa para 8 pessoas 45 Casa para 4 pessoas 35 Casa para 4 pessoas 35 Total 285

Edificações captadoras

Considerando uma perda de 33% da água precipitada (água de descarte, suja, garoa e outras perdas eventuais), 1000mm dos 1500mm de chuvas anuais pode ser captado, o que corresponde a 285.000 litros (285 m³) em 285 m² de telhado. As cisternas foram dimensionadas para suprir a demanda hídrica de 10 pessoas (C1 para 7 pessoas e C2 para 3 pessoas) vivendo integralmente no local. Tal dimensionamento é baseado na demanda hídrica não potável diária multiplicada pela tempo médio de estiagem na região, que em Botucatu é em média de 2 meses (julho e agosto). 90litros/pessoa./dia x 10 pessoas x 60 dias = 54.000 litros < Sumário

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TRILHA ECOLÓGICA

As trilhas ecológicas possibilitam às pessoas extrair outros sentidos para um mundo cada vez mais dominado por automóveis, calçadas e concreto e marcado pelo distanciamento da natureza. Ao invés de ameaçar a integridade dos ambientes naturais, trilhas são paradoxal instrumento de preservação, de apreciação e de educação ambiental. No entanto, para que esta afirmação seja verdadeira, as trilhas devem ser planejadas, não um “caminho que acontece” e cujo objetivo é somente levar de um ponto a outro. Trilhas que não sejam erodidas pela água e pelo uso, não afetem a qualidade da água ou do ecossistema natural e que satisfaçam as necessidades de seus usuários, oferecendo uma vivência construtiva.

< Sumário

A trilha interpretativa é aquela cujos elementos naturais são traduzidos didaticamente e questões são problematizadas para os visitantes por meio de monitores, guias, folhetos, painéis, mapas, placas entre outros recursos. Em outras palavras, as trilhas interpretativas tem o propósito de estimular e sensibilizar as pessoas. Neste sentido, elas representam um instrumento pedagógico interessante para o conhecimento da flora, fauna, geografia, dos fenômenos biológicos e interações ecológicas, bem como para o desenvolvimento de atitudes e valores nos indivíduos. A interpretação deve buscar no público o sentimento de pertencimento à natureza e, consequentemente, seu respeito e consideração. 48


Existem dois tipos básicos de trilhas interpretativas: as guiadas e as autoguiadas. As trilhas guiadas são aquelas planejadas para serem percorridas com o auxílio de um educador ou monitor capacitado para a atividade. Enquanto que as autoguiadas podem ser visitadas autonomamente pelo público, o qual é despertado para os atrativos do local e conscientizado para questões ecológicas por meio de materiais gráficos. Ambos os tipos possuem vantagens e desvantagens quanto ao objetivo educativo, logo, o contexto pode ser o critério para a escolha do tipo mais adequado. No caso, as trilhas interpretativas autoguiadas seriam mais apropriadas, pois os visitantes, a qualquer momento, poderiam percorrer a trilha e serem levados para questões relevantes da relação do ser humano com a natureza. Lembrando que uma trilha planejada para ser autoguiada não exclui a possibilidade de que atividades guiadas sejam nela realizadas.

< Sumário

A trilha interpretativa pensada para o projeto representa um elemento integrador, ou seja, ela possui a função de conectar os elementos entre si e na paisagem. Além disso, ao conduzir as pessoas por áreas que foram degradas e perderam suas funções ecológicas (necessitando serem restauradas), de mata consolidada e com estruturas humanas sustentáveis, buscamos a reflexão de como o ser humano pode se integrar ao meio ambiente de forma sinérgica e benéfica a ambos. Assim, temos como horizonte um dos princípios da Permacultura: integrar ao invés de segregar. Integrar o ser humano ao meio no qual vive e não segregar-se dele. 49


Especificações Técnicas

A trilha ideal evita ser uma reta, mas serpenteia para um lado e para o outro (em curva de nível, nas encostas) ou ondula para cima e para baixo. Isto se deve, pois a água superficial precisa ser desviada da trilha, para que ela não seja erodida ou encharcada. O objetivo é “quebrar” a continuidade de uma declividade (ou seja, incluir curtas rampas subindo, numa trilha que está descendo e vice-versa), direcionando a água para fora da trilha e impedindo que siga escorrendo pelo piso. A declividade de uma trilha é invertida por 3 a 5 metros, e então volta à inclinação anterior, para continuar. Inversões de declividade devem ser colocadas frequentemente, a cada 10 ou 20 metros. Figuras .. Exemplos de trilhas não retilíneas e com inversão de declividade. < Sumário

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A declividade de cada trecho subindo ou descendo uma encosta deve ser menos do que 10%. Para se atingir isto, a trilha deverá ser em “zigue-zague” ou diagonal. Construir trilhas encaixadas numa encosta, em nível ou na diagonal, exige escavar a encosta da montanha para providenciar um piso estável e sólido. Em áreas planas, a água não tem para onde escoar, assim, o piso deve possuir um leve caimento para fora (cerca de 5%), para ajudar a água a escoar através da trilha. Na construção com corte parcial do talude, o piso da trilha fica meio para dentro da encosta, meio sobre o material de aterro.

A maioria dos solos é estável com um talude de 1:1, o que significa um metro de elevação para um metro de deslocamento (ou projeção) horizontal. Rochas sólidas podem ter um talude mais íngreme de 2:1, enquanto solos menos coesos podem precisar de um talude 1:2. < Sumário

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Recursos Educativos

Os textos e mapas deste relatório podem ser utilizados para a confecção dos materiais educativos da trilha, como guias impressos e placas de madeira instaladas ao longo da trilha. Assente o poste das placas no buraco e mantenha-o em posição vertical, enquanto despeja rochas dentro, para firmá-lo. Então martele estas pedras com o cabo de uma ferramenta, encaixando-as em posição. Continue jogando rochas e terra dentro do buraco, compactando enquanto despeja. Por fim, termine juntando um montinho ao pé do poste, para acomodar o material já despejado e impedir que a água forme uma poça ao redor. As placas não podem ocupar o espaço de caminhada da trilha mais do que 1m, sendo que o suporte delas é colocado fora deste espaço. A altura das placas deve estar entre 0,6 e 2m.

< Sumário

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Especificações para Acessibilidade

Para que a trilha seja acessível, algumas especificações precisam ser atendidas: >Largura: 1m no mínimo, podendo, em condições excepcionais, ser reduzida para 0,8m. >Superfície: estável e o mais regular possível (terra compactada, por exemplo). >Áreas de descanso: espaços na trilha com, no mínimo, 15m de largura em intervalos a depender da declividade do trecho. A declividade dessas áreas não deve exceder 5% em nenhuma direção. >Declividade: ideal até 5%, podendo, no máximo, chegar a 12%, neste caso, o trecho com tal declividade não pode exceder 3m de distância. Trechos com declividades entre 5 e 8% devem possuir no máximo 61m, enquanto os trechos com declividades entre 8 e 10%, somente 9m. Essas distâncias máximas referem-se aos intervalos entre as áreas de descanso.

Figura .. Pessoas percorrendo uma trilha acessível.

>Obstáculos: não podem exceder 5cm de altura. < Sumário

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Pontos Interpretativos Sugestões dos pontos.

Figura .. Mapa do terreno com os pontos interpretativos: 1) Sede; 2); Área degradada e núcleos de restauração ecológica; 3) Caminho sensorial com árvores de diferentes odores e texturas de tronco; 4) Área de descanso; 5) Mata (diferentes subtemas: ciclagem de nutrientes, interações ecológicas, diversidade, dinâmica florestal); 6) Deque de contemplação e meditação; 7) Meliponário; 8) Casas e alojamento; 9) Refeitório e cozinha; 10) Composteira; 11) Sistemas de tratamento de água; 12) Banheiroseco; 13) Cisterna; 14) Espiral de ervas; 15) Pomar de nativas; 16) Viveiro de mudas

< Sumário

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NÚCLEOS DE RESTAURAÇÃO ECOLÓGICA E FRAGMENTO FLORESTAL O que significa Restauração Ecológica? E por que restaurar? Tais conceito e questionamento foram se modificando ao longo da recente história da Ecologia da Restauração, ciência encarregada das bases teóricas sobre o processo de planejar, assistir e manejar a recuperação da integridade ecológica dos ecossistemas. Na perspectiva mais atual, a restauração ecológica objetiva o reestabelecimento das interações e processos ecológicos nos ambientes que foram degradados. No contexto de intensa degradação ambiental que vivemos, ações nesse sentido são de extrema importância para que voltem a ser exercidos as chamadas funções ecossistêmicas: > Interações ecológicas de polinização e controle biológico > Sequestro de carbono > Regulação do clima e do ciclo hidrológico > Conservação do solo > Manutenção da biodiversidade > Cultivo de valores culturais, estéticos e relacionados ao bem-estar humano < Sumário

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ÁREA DEGRADADA

NÚCLEOS DE VEGETAÇÃO

VEGETAÇÃO NATIVA ESTABELECIDA A PARTIR DOS NÚCLEOS

Figura .. Esquema ilustrativo da expansão dos núcleos de vegetação.

A partir do contexto encontrado, uma estratégia apropriada seria a da nucleação. Ela consiste na criação de núcleos de vegetação a partir dos quais a restauração irá progredir, ao invés do plantio em área total. Esta forma de restauração apresenta-se viável quando o local possui potencial próprio para se autorregenerar, o que pode ser concluído pela presença de fragmentos de mata nativa nas proximidades. As intervenções irão apenas facilitar ou possibilitar o início da sucessão ecológica. A vantagem da nucleação é a diminuição dos custos da restauração e da mão-de-obra, que também será mais focada. Um estudo recente demonstrou que um tamanho mínimo de 100m² para as chamadas “ilhas de árvores” já é o suficiente para que elas sejam similares ao plantio total no que se refere à chuva de sementes para o local e ao estabelecimento de novas plântulas.* Neste projeto, utilizamos princípios e valores da Agroecologia aplicados na restauração ecológica.

* ZAHAWI; HOLL; COLE; REID. Testing applied nucleation as a strategy to facilitate tropical forest recovery. J. Appl. Ecol., 2013. < Sumário

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SUCESSÃO ECOLÓGICA Chama-se sucessão ecológica a substituição de espécies que se estabelecem em determinado ambiente ao longo do tempo. Esta sucessão ocorre à medida que este ambiente passa por uma série de transformações físicas, químicas e biológicas causadas pelos próprios seres vivos. Em um ecossistema florestal, são chamadas de pioneiras aquelas espécies com alta tolerância à luminosidade, escassez de água, baixa fertilidade do solo, entre outros fatores. Logo, elas são as primeiras a conseguirem se estabelecer em um ambiente degradado. Assim que as condições do ambiente são alteradas pelas pioneiras, outras espécies encontram condições para se estabelecer naquele ambiente. Estas são chamadas de secundárias, não-pioneiras ou climáxicas a depender do referencial teórico, já que não existe um consenso cientifico quanto a essas classificações, pois elas tentam reduzir a complexidade do processo de sucessão. Compreender o processo de sucessão e o grupo ao qual pertence cada espécie é fundamental para a restauração ecológica. Por exemplo, se uma espécie secundária for plantada num ambiente degradado, para o qual ela não possui as adaptações necessárias para ali sobrevier, certamente haverá uma altíssima mortalidade de mudas e gasto econômico e energético. >>

< Sumário

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GRUPOS SUCESSIONAIS X GRUPOS FUNCIONAIS Durante bastante tempo, a classificação das espécies quanto a sua ocorrência na sucessão (pioneira, secundária, climáxica etc.) bastava para os projetos de restauração. No entanto, a experiência mostrou o contrário, levando a uma mudança de paradigma na Ecologia da Restauração. É necessário, também, considerar o grupo funcional:

O plantio de somente um dos grupos pode significar o fracasso da restauração: seja por não impedir a competição com as gramíneas ou por não promover a autossustentabilidade do plantio. >>

Espécies de recobrimento: são aquelas pioneiras, ou seja, que conseguem se estabelecer em ambientes degradados e possuem crescimento rápido, mas que, devido ao formato de copa e tipo de suas folhas, proporcionam um alto sombreamento do solo. Este grupo é importante no controle de gramíneas, as quais não toleram sombreamento, dando oportunidade para as espécies nativas ali se estabelecerem. -

Espécies de diversidade: são pioneiras ou secundárias que não sombreiam o solo, mas exercem outras funções altamente importantes como o fornecimento de recursos (frutos, néctar, sementes, insetos...), que atraem a fauna e dão continuidade ao processo de sucessão. -

< Sumário

Figura .. Embaúba (Cecropia pachystachya.), típica espécie pioneira bastante utilizada em restauração, mas que não sombreia o solo. 58


Estrutura dos Núcleos

O núcleo será um círculo de 12m de diâmetro (aproximadamente 100m²). As mudas das árvores são plantadas com espaçamento 3x2m. Entre as colunas centrais de mudas, linhas de adubação-verde. Todas a mudas das bordas devem ser de pioneiras de recobrimento e as internas, intercaladas com as pioneiras de diversidade. Não há necessidade de que haja muitas espécies utilizadas para recobrimento.

2m 1,5m

3m

1,5m

1,5m

1,5m

3m

Adubo-verde 16 =

Pioneiras de Recobrimento (P/R)

7=

Pioneiras de Diversidade (P/D) Figura .. Esquema ilustrativo da composição dos núcleos de vegetação de alta densidade no primeiro ano de plantio.

< Sumário

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14 = Secundárias (S/D)

O plantio do tipo escalonado visa aumentar as chances de estabelecimento das secundárias. Após um ano, a adubação-verde poderá ser podada totalmente e usada para cobrir o solo onde serão plantadas as mudas das espécies secundárias. O espaçamento entre as mudas é de 2m. Duas mudas adicionais podem ser colocadas nas bordas, a 1,5m das espécies de recobrimento. Quanto maior for a diversidade de espécies, melhor será a qualidade da restauração. No entanto, um mínimo de 2 indivíduos por espécie é o indicado. As espécies a serem plantadas deverão ser as que estão na tabela anexa a este relatório. Lá, constam aquelas de ocorrência regional, ou seja, nativas da Floresta Estacional Semidecídua do interior paulista, assim como os grupos funcionais a que pertencem. A escolha de quais dentre elas e a quantidade de cada uma dependerá da disponibilidade nos viveiros

< Sumário

2m

1,5m

1,5m

1,5m

2m

1,5m

Figura .. Esquema ilustrativo da composição dos núcleos de vegetação de alta densidade no segundo ano de plantio. 60


O plantio em linhas é utilizado para facilitar o manejo, o acesso de maquinário e quando se busca uma eficiência precisa. Essa forma de plantio advém das técnicas convencionais de silvicultura, na qual os cálculos são otimizados para rendimento econômico. No entanto, o plantio em linhas pode não agradar esteticamente, trazendo um visual artificial. Caso desejado, o plantio poderá, então, se parecer com a figura ao lado, em que as distâncias foram aproximadamente respeitadas, mas não medidas em linha. Na segunda etapa do plantio, o das secundárias, podese buscar uma distribuição mais natural plantando essas espécies sob a sombra daquelas que já se desenvolveram.

Figura .. Esquema ilustrativo da composição final dos núcleos de vegetação de alta densidade seguindo uma disposição não linear das mudas. < Sumário

É interessante que a composição de espécies de cada núcleo seja diferente e que sejam implantados um ou dois em cada ano. Dessa forma, cria-se um mosaico heterogêneo na paisagem com finalidade também didática e experimental.

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Procedimentos Técnicos I. Adubação-verde

A utilização dos fertilizantes sintéticos (chamados comercialmente de NPK) tornou-se um procedimento padrão na agricultura e, consequentemente, nos plantios de restauração. No entanto, seu uso é controverso. Este tipo de fertilizante é citado como uma das causas das superpopulações de insetos herbívoros e doenças nas plantas devido ao excesso de aminoácidos na seiva que ele ocasiona (teoria da trofobiose). Uma das alternativas à utilização dos fertilizantes sintéticos é a adubação-verde. Trata-se do plantio de espécies cujas características melhoram a qualidade do solo. Neste grupo de plantas, estão as leguminosas fixadoras de nitrogênio

(simbiose com bactérias nas raízes) ou que concentram determinados nutrientes em suas folhas como fósforo e potássio.

A adubação-verde é semeada diretamente na área que será restaurada. Após um período, que pode variar de quatro meses a um ano dependendo dos objetivos, realiza-se a poda parcial ou total das plantas e a matéria orgânica é incorporada ao solo, onde irá se decompor (assim como as raízes), alimentando toda a fauna do solo e liberando os nutrientes para as mudas das árvores. Recomenda-se que esse corte seja realizado no início do florescimento, para que os nutrientes das raízes não sejam deslocados para as sementes. No caso do corte parcial, a planta poderá rebrotar, fornecendo continuamente matéria orgânica.

BENEFÍCIOS DA ADUBAÇÃO VERDE

MELHORIA DA ESTRUTURA FÍSICA E QUÍMICA DO SOLO

AUMENTO DA FERTILIDADE

DIVERSIFICAÇÃO DA BIOTA DO SOLO

CONTROLE DAS POPULAÇÕES DE INSETOS HERBÍVOROS E ERVAS ESPONTÂNEAS 62


Dentro das muitas opções de espécies de adubo-verde, as mais indicadas para um projeto de restauração são as que: 1. Possuem uma folhagem mais densa e sombreiam o solo, diminuindo o estabelecimento da braquiária; 2. Não apresentam potencial invasor e não se estabelecem no sistema após o crescimento das espécies nativas; 3. Possuem raízes profundas que absorvem os nutrientes que foram carregados para baixo, evitando a competição com as mudas das árvores. A

B

Figura .. Espécies de adubo-verde indicadas para auxílio na restauração ecológica. A) feijão-guandu (Cajanus cajan): planta com flores e frutos (acima) e sementes (embaixo); B) crotalária (Crotalaria juncea): planta com flores (acima) e sementes (embaixo).

< Sumário

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II. Adubação

Outra alternativa é o adubo orgânico, o qual pode ter diferentes fontes, como esterco animal ou resíduos domésticos já compostados. É importante o adubo estar compostado para que ele não fermente no solo e prejudique as plantas. A aplicação deste tipo de adubo é feita no momento do plantio, em uma quantidade de 10 litros (ou mais) por muda e, caso necessário, também posteriormente sobre o solo a uma distância do caule que corresponda ao limite da copa. Recomenda-se também a utilização de: a) 2 copos de pó-derocha, preferencialmente de basalto; b) 3 copos de calcário calcítico; c) 2 copos de cinzas. III. Controle de Formigas

No caso da presença de formigas cortadeiras, cortar as extremidades de uma garrafa PET de 2 litros e colocar em volta da muda, ou seja, fixar no solo deixando a muda no centro. As formigas tem dificuldade em subir e descer para coletar as folhas. < Sumário

Lembrando que as formigas sinalizam a degradação do solo, o qual, quando rico em vida e micronutrientes, favorece a resistência da planta. A deficiência em molibdênio tem sido citada como uma causa do aumento das formigas. Matéria orgânica, pós-de-rocha e cinza,são adubos que proporcionam a saúde do solo. IV. Berços de Plantio

Em dias nublados (preferencialmente) e em período de chuvas, após a roçagem da área, os berços das mudas são cavados possuindo as dimensões mínimas de 50cm de diâmetro e 50cm de profundidade. À esta terra removida, são misturados os adubos para então ser retornada ao berço. Dentro do berço, abre-se uma nova cavidade nas dimensões necessárias ao recebimento da raiz da muda. Atenção deve ser tomada para que a parte subterrânea da muda não fique acima do nível do solo e o caule não seja enterrado Sempre que necessário, as mudas devem ser amarradas (em forma de oito com barbante ou sisal) a uma estaca. As mudas devem ter uma altura mínima de 30cm e apresentarem bom estado nutricional para serem plantadas. 64


V. Coroamento

Após o plantio, a área ao redor da muda num raio de 50cm é chamada de “coroa”. Esta região deve formar uma bacia de contenção de água, ou seja, as bordas de toda a coroa ou de um dos seus lados (a depender do declive do terreno) devem estar levemente acima do nível do centro para que a água infiltre no local e seja melhor aproveitada. Além disso, a braquiária deve ser removida dessa área com enxada e o solo deve permanecer coberto por uma camada de matéria vegetal de 10 a 15cm. Para isto, podem ser utilizadas as podas do adubo-verde, folhas secas ou, inclusive, a própria braquiária proveniente da roçagem. A função do coroamento é manter a umidade, criar um ambiente propício para a vida do solo, fornecer nutrientes lentamente para a planta e, principalmente, impedir o avanço da braquiária, que não consegue se estabelecer no solo coberto.

< Sumário

Figura .. Muda de cereja-do-mato (Eugenia involucrata) com coroamento realizado há 6 meses. Nota-se que a braquiária não avançou para a área coberta. 65


Procedimento Operacional

ROÇADA DA ÁREA

>

>

ABERTURA DAS LINHAS DE PLANTIO

ROÇADA DA ÁREA

PLANTIO DAS ÉSPECIES PIONEIRAS

Dezembro

>

>

+

>

COROAMENTO DAS MUDAS

+

4 meses

COROAMENTO DAS MUDAS

SEMEADURA DA ADUBAÇÃOVERDE

>

4 meses

ROÇADA DA ÁREA

ROÇADA DA ÁREA

>

COROAMENTO DAS MUDAS

4 meses

>

>

ADUBAÇÃO ORGÂNICA DAS MUDAS

>

Início de outro(s) núcleo(s)

+ DAS PLANTIO ÉSPECIES SECUNDÁRIAS

+

PODA E INCORPORAÇÃO DA ADUBAÇÃOVERDE

*A roçada pode ser realizada em intervalos menores a depender do crescimento da braquiária < Sumário

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Restauração do Fragmento Florestal e Agrupamentos de Árvores

Como constatado no levantamento florístico, o fragmento florestal encontra-se em estágio intermediário de sucessão ecológica em decorrência da existência de regiões com clareiras ocupadas por braquiária no interior da mata. No entanto, árvores adultas com idade e porte elevados também estão presentes, assim como muitos indivíduos regenerantes. Já na área degradada, encontramos agrupamentos de árvores com diversos tamanhos, composições e graus de ocupação por gramíneas sob as copas. Em ambos os casos, a restauração será bastante facilitada, sendo necessário somente o plantio de adensamento e enriquecimento (figura ..). A transposição de solo é outra técnica acessória e opcional para acelerar a restauração dessas áreas. Consiste em coletar a camada superficial de solo (~7cm) de uma área de mata nativa consolidada (podendo ser a do próprio terreno) e colocá-la na área que se deseja restaurar. Esta < Sumário

área que receberá o solo deve estar parcialmente sombreada e não possuir gramíneas. O objetivo desta técnica é inserir no local micro-organismos que irão melhorar a qualidade do solo e sementes de espécies nativas (não só de árvores) que irão germinar. Outra medida bastante importante é o controle das espécies invasoras arbóreas, como o ipezinho-de-jardim e o pinheiro, pois estas espécies podem comprometer a restauração no futuro. Para isso, sugerimos o método de controle por anelamento das árvores maiores. Trata-se da remoção da casca em toda a circunferência. A espessura desse “anel” formado deve ser de 30cm no mínimo. Cabe ressaltar que pode haver rebrota, sendo necessário um acompanhamento constante para o efetivo controle. O anelamento possui a vantagem de manter a árvore em pé, servido de poleiro para aves que trazem sementes. Os eucaliptos, apesar de não serem invasores, podem atrapalhar o desenvolvimento de nativas, portanto, é opcional sua remoção para a utilização da madeira nas construções ou para confecção das placas da trilha. 67


1

Gramíneas Pioneiras 2

Pioneiras de Recobrimento Plantadas Regenerantes

3

Secundárias Plantadas

Figura .. Esquema exemplificativo de plantios de adensamento e enriquecimento. 1) situação inicial da área degradada com alta cobertura de gramíneas, algumas espécies pioneiras e poucos indivíduos regenerantes de espécies não pioneiras. 2) plantio de pioneiras de recobrimento em alta densidade (espaçamento 2x2m) para sombreamento do solo e exclusão das gramíneas; 3) plantio de secundárias ou espécies já existentes (mas de procedências diferentes) para enriquecimento florístico e genético (espaçamento 6x6m). < Sumário

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VIVEIRO DE MUDAS

O viveiro é a estrutura adaptada para a germinação e desenvolvimento das plantas. É nele que as mudas serão cuidadas até adquirirem idade e tamanho suficientes para serem plantadas no local definitivo.

Figura .. Estrutura geodésica feita com madeira e conexões metálicas. < Sumário

Local e Estrutura

O local deve ser levemente inclinado (1% a 3%) a fim de evitar acúmulo de água das chuvas ou mesmo do excesso de irrigação. Recomenda-se cobrir todo o piso com uma camada de brita ou areia grossa para absorção da água e evitar um ambiente muito úmido favorável para o desenvolvimento de doenças. No caso de um viveiro retangular, o maior comprimento fica no sentido lesteoeste, o que garante ambientes totalmente ensolarados na maior parte do tempo. Porém, uma ideia interessante é construir o viveiro na forma geodésica (figura ..). Esse tipo de estrutura é bastante didático por apresentar extraordinária resistência e leveza, podendo ser móvel. Ela consiste em barras de qualquer material, como bambu ou PVC, e pode possuir qualquer dimensão, desde que o tamanho das suas barras seja calculado corretamente. O revestimento do viveiro deve ser com sombrite de 50% de sombreamento. 69


Figura .. Outro exemplo de geodĂŠsica, feita de bambu, cobrindo uma horta.

< SumĂĄrio

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Recipientes e Substrato das Mudas

Existem muitas opções de recipientes no mercado que variam em tamanho e custo. Os mais utilizados são os sacos plásticos de polietileno, tubetes plásticos e vasos de polipropileno. Além destes, também se encontram tubetes biodegradáveis e vasos confeccionados com fibras recicladas de embalagens. No entanto, essas opções possuem maior custo e podem não ser reutilizáveis. Outra alternativa são os chamados vasos freáticos (figura ..). Nada mais são do que garrafas PET reutilizadas. Para sua confecção, corta-se a garrafa um pouco abaixo do meio e encaixa-se a parte superior invertida na parte de baixo. A parte superior recebe o substrato com a muda e a parte inferior armazena água. No gargalo da garrafa, coloca-se um material que apresente alta capilaridade (como tecidos ou esponjas reutilizadas). A vantagem deste recipiente, além de um custo inexistente de aquisição, é que ele diminui a frequência de manutenção, já que a planta absorverá a água armazenada no fundo de acordo com as suas demandas. Uma desvantagem é que, por se tratar de uma técnica recente, ela nunca foi testada cientificamente, não apresentando dados da quantidade de água necessária. Importante ressaltar que não existe a proliferação de mosquitos na água, pois o compartimento inferior fica vedado.

Figura .. Muda de araçá (Psidium sp.) em vaso freático. < Sumário

Na formulação de substratos, geralmente se utiliza um componente mineral (terra de subsolo retirada a 30cm de profundidade) e um ou mais componentes orgânicos, que podem ser inertes (casca de arroz carbonizada e fibra de coco) ou biologicamente ativos (composto orgânico, esterco curtido de gado, húmus de minhoca e turfa). Sobre o substrato, matéria orgânica seca ajuda a diminuir a perda da água. 71


Irrigação

No caso dos recipientes escolhidos serem tubetes ou vasos convencionais, deve-se molhar o substrato das mudas pelo menos duas vezes ao dia, preferencialmente, no início da manhã e no final da tarde. A depender da disponibilidade de mão de obra, as regas poderão ser feitas manualmente ou com aspersores automáticos. Atenção deve haver com a quantidade de água adicionada a cada recipiente, pois seu excesso pode ser tão prejudicial quanto a falta dela. O encharcamento do recipiente pode erodir e compactar o substrato, dificultar a circulação do ar, impedir o crescimento, causar o apodrecimento das raízes ou lavar os nutrientes.

< Sumário

Canteiros

Espaço onde serão colocados os recipientes com as mudas em crescimento. Quando as mudas são feitas em recipientes maiores (>15cm diâmetro), os canteiros devem ter aproximadamente 1m de largura, sempre dispostos perpendicularmente à linha do declive. A distância entre os canteiros deve ser de 60cm, a fim de facilitar a manutenção do viveiro. Se os recipientes utilizados forem muito pequenos (< 7 cm de diâmetro), os canteiros devem ser protegidos lateralmente por ripa ou tarugo de madeira para evitar seu tombamento.

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Resgate de Plântulas

Procedimento utilizado par minimizar impactos ambientais e, ao mesmo tempo, fornecer mudas para a restauração. No estabelecimento da trilha pelo terreno, plântulas de espécies nativas estarão no caminho e precisarão ser removidas, plantadas em recipientes apropriados e cuidadas em viveiro até poderem ser replantadas em campo. Para a remoção dessas plântulas (indivíduos com até aproximadamente 60cm de altura e no mínimo 4 folhas), utiliza-se enxada, cortadeira (”vanga”) ou faca de jardinagem após vários dias chuvosos para que o solo esteja bastante úmido e haja menor dano na raiz pivotante (principal), a qual merece bastante atenção. Depois de removidas, realiza-se a poda de 50% das folhas e as plântulas são colocadas em saco plástico com umidade para que não desidratem até a chegada ao viveiro. O plantio no recipiente escolhido é realizado, em até 36h após a retirada, com terra e composto orgânico (2:1), atentando-se para que toda a raiz fique enterrada. Quando necessário, faz-se o corte da mesma para que não fique dobrada. Este procedimento deve ser realizado sob sombrite 40% e o substrato mantido úmido, condições nas quais as mudas permanecerão até se estabelecerem (desenvolvimento total de novas folhas). Antes de serem plantadas no local definitivo em campo, as mudas podem passar por um período de rustificação a pleno sol, de pelo menos 30 dias, para que aumentem as chances de sobrevivência. < Sumário

Figura .. Plântula de uvaia (Eugenia sp.) após estabelecimento em vaso freático.

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ESTACIONAMENTO O estacionamento deverá estar localizado próximo à entrada do terreno e próximo a recepção, permitindo acessibilidade para todos os frequentadores da área. Por ser o local do primeiro contato, pensamos em fazer alguns canteiros e pergolado com ervas, arbustos e trepadeiras da flora nativa do Brasil, como guaco, maracujá-silvestre, fisális, macela, carqueja-doce, entre outras, que teriam a função de fornecer para fins terapêuticos, além de funcionar como um jardim sensorial, a fim de reavivar a percepção de cores, toques, cheiros – por vezes adormecida pelo estresse do dia-a-dia. Espécies arbóreas caducifólias com flores vistosas também poderiam ser plantadas, atentando-se para não se localizarem a norte dos telhados das construções para evitar o sombreamento. Sugestões dessas espécies seriam os ipês (Handroanthus spp.), cássia (Cassia ferruginea), caroba (Jacaranda micrantha), corticeira (Erythrina falcata e E. verna). O estacionamento teria capacidade para 8 carros e 1 ônibus, cujas dimensões de vaga são respectivamente: 5x2,5m e 12x3,5m. < Sumário

Figura .. Árvores ornamentais nativas: ipê-rosa e corticeira.

Para a área do estacionamento, é importante que a pavimentação seja estável e permeável, suportando a carga aplicada pelos veículos e evitando que atolem e permitindo a infiltração da água. Para isso, poderemos sugerir o pavimento de pedra, pavimento de entulho limpo, pavimento intertravável de concreto e pavimento de concreto permeável. 74


SEDE E ALOJAMENTO A sede é a estrutura que cumpre o papel de anfitriar os visitantes. Aí, se dá a chegada, as boas vindas, a troca de olhares entre as pessoas que estiverem cuidando desse terreno, que estiverem servindo ao ideal desse projeto, e aqueles que estão chegando para poderem aprender e ensinar. Sendo essa a primeira estrutura de acolhida no terreno, pensamos em colocá-lo logo ao lado do estacionamento, no início do terreno, fazendo-a acessível. Tendo em vista que um dos objetivos desse projeto é o de receber cursos, oficinas, atividades com educação ambiental, entre outros., refletimos sobre como essa construção pode viabilizar um espaço que por si próprio seja educativo e propicie recursos para auxiliar no desenvolvimento dessas atividades com qualidade. Se prestarmos atenção na configuração das cadeiras numa sala de aula isso já nos diz muito sobre a ideologia que está sendo reproduzida ali. Se são enfileiradas, uma atrás da outra, há uma maior dificuldade de comunicação entre os < Sumário

participantes, um permanecendo de costas para o outro. Neste local, ao contrário, objetivamos processos educativos que construam o conhecimento conjuntamente e também a partir do educando. Essa cocriação do tema estudado necessita da participação e, desde as comunidades tradicionais, a forma mais utilizada para uma troca de saberes horizontal é o círculo. Dessa forma, sugerimos um salão circular, onde cada pessoa pode encontrar no olhar qualquer outra pessoa da roda, não havendo uma hierarquia em evidência, e sim uma liderança rotativa. Buscando contemplar cerca de 35 pessoas nesse espaço de recepção e visando maior conforto, sugerimos que o salão tenha dez metros de diâmetro. Com essa medida, a disposição das cadeiras tanto poderia ser uma roda contínua, quanto um semicírculo para fazer uma frente com lousa, projetor ou outros recursos pedagógicos.

O segundo andar dessa construção, poderá ser um alojamento com capacidade para 10 pessoas. 75


Figura .. Exemplo de bioconstrução: ecopousada “Sítio Pé no Chão”, localizada em Brasília. As paredes do andar térreo foram feitas com a técnica de superadobe. < Sumário

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COZINHA Este é um espaço que tem um grande poder de reunir amigos, familiares; entre boas conversas, é possível preparar um delicioso almoço ou jantar. A cozinha sempre foi um espaço fascinante de compartilhamento de saberes e sabores. Por isso, optamos por fazer uma cozinha maior, fora das casas, para que as pessoas pudessem conviver nesse ambiente agradável. Uma boa ventilação é importante no design da cozinha, por isso, sugerimos um pé direito de, no mínimo, três metros. As paredes e pisos devem ser laváveis. Nesse ambiente, o fogão a lenha é ótimo para cozinhar e aquecer o local. O modelo de fogão chamado rocket (foguete) utiliza princípios de alta eficiência. Nesse modelo, existe uma diferente relação entre a entrada de ar, a câmara de combustão e a altura onde se colocará a chapa para ser aquecida.. A entrada de ar fica abaixo da câmara de combustão, emitindo menos fumaça e a altura da chapa (onde se colocariam as panelas) é três vezes a altura do lugar onde se colocam as madeiras, ou seja, a câmara de < Sumário

combustão. Isto faz com que a queima seja bem mais eficiente. É possível utilizar o fogão-foguete para o aquecimento da água (assim como o fogão à lenha comum permite com uma serpentina metálica) ou de uma massa térmica de barro, como um sofá.

Figura .. Fogão do tipo foguete 77


Entrada de água fria

Válvula

Chaminé

Irradiação

Tijolos refratários Revestimento Isolamento

Condutor do ar quente Câmara de alimentação Massa térmica

Câmara de combustão

Poço de cinzas

Figura .. Esquema ilustrativo do fogão-foguete para aquecimento de massa térmica.

< Sumário

Aço

Saída de água quente

Figura .. Esquema ilustrativo do fogão-foguete para aquecimento de água.

Figura .. Sofá aquecido pelo fogãofoquete. 78


Figura .. Processo de construção de residência localizada em Belmiro Braga (MG). Observa-se o emprego de diferentes técnicas como os tijolos de solocimento e o “bambu-a-pique” (ainda sem acabamento). < Sumário

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Figura .. Residência bioconstruída localizada em Belmiro Braga (MG) em fase final de construção. < Sumário

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DORMITÓRIOS Os dormitórios devem ser harmoniosos com o meio ambiente, pois são o local onde o visitante passará boa parte de seu tempo. No local, sugerimos a construção de cinco casas; sendo duas casas menores, para no máximo duas pessoas; outras duas casas para quatro pessoas e uma casa maior para oito pessoas. A casa maior terá dois quartos , dois banheiros, uma sala e varanda. As casas menores contarão com um quarto, uma sala e um banheiro. A posição das casas foi definida de acordo com alguns fatores, tais como: topografia – escolhemos o local mais alto do terreno, com uma vista privilegiada, com menor declividade, poucas arvores presentes, menor ação das águas, que poderiam ocasionar danos estruturais; proximidade com a trilha. As casas serão posicionadas ao longo da trilha superior formando um núcleo de habitação, assim, será possível uma economia de material e de recurso financeiro, pois a quantia de tubulações de água e rede eletricidade será menor. Para a construção das casas, sugere-se algumas < Sumário

técnicas, como o superadobe, adobe, tijolo de solocimento, pau-a-pique e taipa-de-pilão. Essas técnicas são interessantes, pois utilizam como matéria-prima a terra, recurso que é abundante na área. A técnica de superadobe utiliza sacos preenchidos com solo, para formar as paredes da construção, as camadas são socadas, para ficarem firmes e estáveis. O adobe, uma antiga técnica de construção, é um tijolo grande feito com terra, palha e água, porém, não é necessário queimá-lo, como os tijolos convencionais. Para a confecção do tijolo de solocimento é necessário uma prensa manual ou pneumática e este processo poderá ser feito por apenas duas pessoas. O pau-a-pique é uma técnica construtiva que utiliza a terra crua, juntamente com madeira ou bambu para formar uma parede. A taipa-de-pilão é uma técnica com terra crua, em que a terra é pilada em camadas dentro de uma forma. Para dar acabamento a todas essas técnicas, pode-se usar o reboco natural (mistura feita de terra, areia, cal, fibra vegetal e pouco cimento) e a tinta natural, que utiliza cola branca, e barro ou pigmentos naturais para dar cor às paredes. 81


Do ponto de vista arquitetônico, trazemos as seguintes contribuições: projetar as casas com uma das águas do telhado voltada a norte para facilitar a instalação de aquecedor solar e placa fotovoltaica; proteger o telhado na face sudeste (relatos de casas de foram parcialmente destelhadas nessa face); ventilação natural ocorre na direção sudeste – noroeste; a chuva vem predominantemente do noroeste; banheiro na face norte viabiliza o modelo seco. Ao se construir com terra, são necessários alguns cuidados, o telhado deve ser largo para proteger as paredes da chuva, a fundação deve ser alta, para evitar a umidade vinda do solo. Além disso, para possibilitar o conforto térmico, algumas casas poderão ter telhado-verde. Uma opção viável em Botucatu, por conter uma pedreira, é construção da fundação com pedras; assim, há um menor gasto em relação ao transporte de materiais para a obra. Figura .. Dormitórios de pequenas dimensões construídos com madeira, que pode ser substituída pelas técnicas à base de terra. < Sumário

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FORNO SOLAR Como muitas das técnicas indicadas e utilizadas na permacultura, os fornos solares não são tecnologias novas, mas, sim, um resgate de conhecimentos tradicionais que perderam valor em nossa cultura atual. Na Permacultura, as energias passivas são priorizadas frente à energia elétrica ou dos combustíveis fósseis. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a utilização do fogão solar por 30% da população brasileira reduziria anualmente a extração de lenha para cozimento de alimentos em 5.370.000m³, uma quantidade significativa. Se pensamos na diminuição do uso do gás, que é um recurso não-renovável derivado do petróleo, podemos imaginar quão menor seria o impacto ambiental e quão mais autônomos seríamos com a adoção dos fornos solares. Existem muitos tipos de fornos solares. Há o modelo mais simples (figura ..), feito com uma caixa de papelão revestida internamente com papel alumínio e um vidro, reproduzido o efeito estufa. Já esse modelo consegue atingir até 300 graus dependendo da eficiência de vedação. Esses são bem fáceis de serem confeccionados e, inclusive, podem ser uma oficina ministrada para estudantes que forem conhecer o projeto, pois é acessível, fácil e traz considerável mudança nos gastos mensais da família. Uma curiosidade desse modelo é que ele é fechado e não há saída de umidade, portanto não corre-se risco de queimar o alimento, pois a água para o cozimento permanece no compartimento. < Sumário

Figura .. Modelo simples e didático de forno solar.

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Outros modelos mais complexos e desenvolvidos são os parabólicos, nos quais há uma grande parabólica espelhada que converge todos os raios solares para um mesmo ponto, atingindo altas temperaturas. Para além da economia, também há uma influência no sabor. Alguns cientistas já descrevem o quinto sabor do paladar que é comumente estimulado pela substância glutamato monossódico, que é um realçador de sabor, mas que é prejudicial a saúde e pesquisas revelam ser cancerígeno. A forma natural de estimular esse quinto sabor é através do lento cozimento dos alimentos, sendo esses fornos solares mais simples ideais para esse feito. Há muitas possibilidades, umas mais acessíveis e simples e outras mais complexas. Com o desenvolver do projeto, pode-se ir investindo em tecnologias maiores e mais complexas, mas desde já alguns fornos solares de papelão já podem suprir essa demanda inicial sem gerar gastos e durando bastante tempo. Figura .. Forno solar parabólico (acima) e modelo comercial (abaixo). < Sumário

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AQUECEDOR SOLAR DE ÁGUA Um dos maiores gastos de energia elétrica costuma ser causado pelos chuveiros elétricos. Dessa forma, alternativas para a redução no consumo elétrico são fundamentais nessa questão. Propomos nesse design aquecedores solares. Assim como nos fornos, aqui também é utilizado o princípio do efeito estufa, porém, ao invés de termos um recipiente com alimentos, temos serpentinas com água. A água é aquecida nas placas posicionadas nos telhados e devem ficar voltadas para o norte (maior incidência solar ao longo de todo o ano) e, em seguida, canalizada para um boiler (reservatório com isolamento térmico para armazenar a água quente) para, então, ser distribuída para toda a casa. Além dos aquecedores industriais, que são relativamente comuns, há também tecnologias caseiras que podem ser desenvolvidas (figura ..). Além de diminuir os custos, essa técnica também pode ter um valor didático nas visitas, mostrando como podemos conciliar a diminuição dos gastos com maior autonomia em relação às empresas de distribuição da energia elétrica. < Sumário

Figura .. Conjunto comercial de placa e reservatório para aquecimento e armazenamento de água.

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Dimensionamento Considerando a recomendação da ONU do consumo de água, temos: 50l por banho x 40 pessoas x 30 dias = 60000l de água por mês para o uso do banho com a capacidade máxima de pessoas no local. Segundo o site da Heliotek, empresa especializada no ramo de aquecedores solares, para dez pessoas consumindo água quente na pia dos banheiros e da cozinha e nos chuveiros, seriam necessárias um reservatório de 300 litros com ânodo e 3 coletores (placas). Isso representaria uma economia por volta de R$ 2093,184 por ano de energia elétrica e 273,024kg de CO² deixariam de ser emitidos por essa opção. Sendo uma alternativa que em pouco tempo você tem um retorno financeiro de seu investimento, sendo esse em menos de dois anos, e que tem um significativo impacto positivo em relação a questão ambiental.

< Sumário

Fazendo o mesmo dimensionamento no site da Soletrol, empresa indicada por especialista na área, mostra que o gasto de água quente de quarenta pessoas seria em torno de 2.348l por dia. Para isso, seria necessário um reservatório que tivesse capacidade de armazenar esse volume. Eles possuem reservatórios propícios para o armazenamento de água quente com 1500 litros, podendo essa ser uma alternativa para o começo do projeto e, caso haja a frequência de 40 pessoas, um menor poderia ser adicionado.

Seria necessário fazer um cálculo mais preciso e solicitar um orçamento de uma empresa capacitada, pois a tecnologia das placas solares também variam, variando, portanto, a eficiência energética das mesmas. Por isso, não indicamos exatamente o número de placas necessárias, porém trazemos aqui esses benefícios e a indicação de que essa é uma importante solução. 86


DESIDRATADOR SOLAR Indicamos essa técnica, pois, compreendendo que terão alimentos sendo produzidos na propriedade (como as bananeiras das bacias de evapotranspiração, por exemplo) e que poderá haver uma rotatividade de pessoas no projeto, esses alimentos, sendo desidratados, adquirem maior durabilidade. Além disso, ervas também podem ser desidratadas para serem utilizadas posteriormente na culinária ou para usos medicinais. O desidratador solar usa como princípio o efeito estufa, captando o calor do sol. A grande diferença entre essa técnica e o forno solar é que para criar o efeito de desidratação é preciso que a umidade saia do sistema, ou seja, ele não pode ser vedado. Ele possui uma área coletora dos raios solares, onde essa insolação irá provocar o aquecimento do ar. Como mencionado em outras técnicas que precisam coletar essa radiação solar, aqui também importante essa área estar posicionada para face norte, visando a maior captação possível ao longo do ano. Para que a umidade possa sair do sistema, tem uma entrada de ar na parte inferior do coletor e uma saída na parte superior do desidratador. Dessa forma, garantimos que o ar frio entre por baixo, seja esquentado e, quente, suba passando pelas bandejas com os alimentos, retirando a umidade e a conduzindo para fora do sistema. < Sumário

Figura .. Modelo simples de desidratador solar.

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Saída de ar

Porta de acesso às bandejas de desidratação

Superfície refletora Câmara de desidratação

Superfície coletora

Entrada de ar Câmara coletora

Traseira

Lateral

Frontal

Figura .. Esquema de um desidratador solar móvel.

< Sumário

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Há muitos modelos de desidratadores, sendo que uns são projetados de forma que a área coletora e as bandejas de alimento sejam o mesmo local e outros em que elas são separadas. Uma outra possibilidade ainda é a de fazer um desidratador embutido na cozinha, de forma que a área coletora fique do lado de fora da casa e as bandejas com os alimentos na parte interior. A figura x representa essa lógica, porém, nesse caso, o coletor era para aquecer a casa como um todo, porém o princípio é o mesmo. E essa, inclusive, pode ser uma segunda função do desidratador, pois ele pode ter a saída superior voltada para dentro da casa e a entrada para fora. Quando for uma época mais quente, fechase a saída que traz para o interior da casa e, quando for uma época mais fria, abre-se, conduzindo esse ar quente para aquecer o interior. < Sumário

Figura .. Diferentes modelos de desidratador.

Figura .. Coletor solar para aquecimento do interior da casa.

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PLACAS FOTOVOLTAICAS Painéis solares são um conjunto de células fotovoltaicas. Essas células, por sua vez, criam uma diferença de potencial elétrico por ação da luz. As células solares contam com o efeito fotovoltaico para absorver a energia do sol e fazem a corrente elétrica fluir entre duas camadas com cargas opostas. Ou seja, essas unidades construídas com silício cristalino ou arsenieto de gálio conseguem, quando expostos a luz, transformar essa energia luminosa em energia elétrica. Elas conseguem gerar em média 0,3 V por célula.

Figura .. Placas fotovoltaicas sobre telhado. < Sumário

Esses painéis tem um custo econômico relativamente alto, mas em questão de poucos anos ele trará o retorno do investimento, além de lhe propiciar uma grande autonomia. Há duas formas principais de você utilizar e “armazenar” essa energia produzida. Uma delas é criando um local onde você possa abrigar grandes baterias que a armazenem. Com essa estratégia, cria-se um sistema autônomo, pois ele fica inteiramente autossuficiente, só dependendo da compra dessas baterias. Para isso, você precisa de um controlador de carga, estrutura que funciona como uma válvula para evitar o sobrecarregamento de energia na bateria, cuidando para que sua vida útil seja preservada. Além disso é importante ter um inversor que transforma os 12 V de corrente contínua (CC) das baterias em 110 ou 220 V de corrente alternada (AC), ou outra tensão desejada. O inconveniente dessa opção é que as baterias possuem substâncias muito tóxicas na sua composição, sendo péssimo resíduo de difícil reciclagem e altamente contaminante., além de ter o custo de aquisição delas. 90


A outra estratégia é direcionar essa energia para a rede elétrica de abastecimento da cidade. Durante o dia, quando usamos menos energia elétrica, todo o excedente será direcionado para a rede. Com esse sistema, começa a “vender” energia para a concessionária e, à noite, quando não estiver mais produzindo energia, a energia da rede é usada, debitando o crédito criado durante o dia. No final do mês, se a produção foi menor do que o gasto, irá pagar a quantidade de watts que utilizou a mais, porém se você utilizar menos energia do que produziu, você ganha créditos da concessionária. Essa é uma situação ainda pouco conhecida no Brasil e tem cidades do interior que ainda desconhecem a legislação que legaliza essa situação. A Resolução Normativa 482/2012 da ANEEL (Agencia Nacional de Energia Elétrica), regulamenta a implantação de projetos deste tipo. Ao instalar esse sistema é importante entrar em contato com os órgãos

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responsáveis para que a lei entre em vigor, garantindo essa “venda” para a rede e o seu correspondente crédito a partir disso. Nesse caso, não há necessidade dos controladores nem da bateria, pois a energia não será armazenada. Por outro lado, são necessários inversores (Grid-tie), responsáveis pela sincronia com a rede elétrica. Pensando na proposta do projeto, entendemos que seria ideal que ele se aproxime quanto mais de uma autossustentabilidade e isso inclui no investimento de dinheiro. Como, após esse investimento inicial, os gastos mensais serão menores, sem contas de luz a pagar, isso colabora para que esse sistema possa ser autônomo em longo prazo. Como mencionado nas outras técnicas que envolvem a captação de radiação solar, aqui também é essencial que as placas sejam posicionadas no telhado tenham face norte.

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Além das placas solares para a geração da energia elétrica, também sugerimos um kit com uma placa que esteja unicamente ligada a uma bomba d'água Shurflo, que consegue bombear cerca de 5000l de água por dia levando-a até 13m de altura. Essa bomba poderá ser útil para a sistematização da água no terreno, como falado na parte sobre cisternas.

Figura .. Bomba solar hidráulica da marca Shurflo.

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Dimensionamento Cálculo dos possíveis gastos com energia elétrica considerando uma lotação máxima de 40 pessoas: > Casas: 1 luminária LED de 20w e um LED de 12w no banheiro ligadas 4 horas por dia = 640wh por dia > Cozinha: 8 painéis de LEDs de 60x60cm de 40w cada ligados 4 horas por dia = 1280wh por dia

> Sala de recepção: 8 painéis de LEDs 60x60cm de 40w cada ligados 2 horas por dia (considerando dias que podem não haver utilização da sala) = 640wh por dia > Refeitório: 5 painéis de LEDs de 60x60cm de 40w cada ligados 4 horas por dia = 800wh por dia > Banheiros (2) da recepção: um LED de 12w em cada ligados 1 hora por dia = 24wh por dia > 20 notebooks 80w ligados 4 horas por dia = 6400wh por dia > 20 carregadores de celular 70w ligados 1 hora por dia = 1400wh por dia > 1 aparelho de som 60w ligado 1 hora por dia = 60wh por dia > 1 projetor de slides 239w ligado 1 hora por dia (uma média pensando em todo o mês) = 239wh por dia > Máquina de lavar roupa 1000w ligada meia hora por dia = 500wh por dia Total por dia: 11983wh < Sumário

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A partir deste cálculo, temos cerca de 11 placas fotovoltaicas com 250w segundo dimensionamento realizado no site www.portalsolar.com.br/calculo-solar. Para compreender esses cálculos, temos que levar em consideração a radiância (quantidade de radiação) solar, que em Botucatu é considerado uma média de 1000w por m². Além disso, há diferença entre placas feitas com policristalino, que são menos potentes, e outras com monocristalino que conseguem captar maior radiância. Com essas suposições temos um total de 359,49 kwh por mês, sendo que para isso o gerador precisa ter cerca de 2,68Kwp (watt-pico). Dessa forma, seria necessário, como dito acima, cerca de 11 placas com 250w. Os cálculos relativos a quantas lâmpadas são necessárias

< Sumário

por ambiente foram realizados por uma empresa de Curitiba que trabalha somente com iluminação a LED. Totalizando cerca de R$6700,00 de investimento na iluminação. Lembrando que esse gasto é recuperado pela economia dessa tecnologia em comparação com as outras lâmpadas. Porém, esse cálculo pode ser impreciso, pois para um projeto adequado eles solicitam a planta e o projeto das construções, oferecendo uma iluminação adequada para cada arquitetura.

O investimento inicial para a compra dessas placas é relativamente grande. Para isso não ser um inviabilizador, sugerimos comprar uma quantidade menor de início, suprindo parte dessa simulação e conforme mais pessoas começarem a visitar o local outras placas irem sendo adicionadas, ampliando o sistema.

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CÍRCULO-DE-BANANEIRAS As águas que já foram utilizadas nas atividades humanas podem ser divididas em dois tipos: cinzas e escuras. As águas cinzas são aquelas provenientes de chuveiros, pias, máquinas de lavar, entre outras fontes que não possuem dejetos humanos (vaso sanitário), os quais, quando presentes, caracterizam as águas como escuras. Tal separação entre as águas é importante pois cada um dos tipos possui características distintas e merece tratamentos e destinações específicas. As águas escuras oferecem maior risco biológico devido à maior possibilidade de contaminação com patógenos. Já as águas cinzas tem menor risco, sendo mais “limpas”, e apresentam maior volume (correspondendo de 50 a 80% da água destinada ao esgoto). Como o tratamento das águas escuras (menor volume) exige maior cautela e segurança, não é inteligente misturá-las com as águas cinzas, pois contamina-se uma água de melhor qualidade e dificulta-se o tratamento. < Sumário

Além disso, outra diferença é que as águas cinzas possuem uma concentração de nitrogênio muito menor (apesar de ser bastante rica em fósforo): um décimo da proporção do esgoto combinado. Essa característica significa que as águas cinzas se decompõem e estabilizam muito mais rapidamente. Para este projeto, calculamos que, por dia, no cenário de lotação de 40 pessoas, serão gerados por volta de 3400l de água cinza. Para melhor tratar esse efluente, decidimos distribuir parte dela em círculos de bananeiras próximas às construções e a outra parte para o filtro biológico. Já para o tratamento das águas escuras, escolhemos tanque de evapotranspiração

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Orientações no reuso da água cinza Não armazene-a (por mais de 24h) sem tratamento em local aberto. Se isso é feito, ela entra em decomposição, liberando mau cheiro. > Minimize o contato com ela antes do tratamento, pois ainda existe prossibilidade de contaminação. Da mesma forma, isole-a do contato com animais domésticos. > No caso de uso direto (como no círculo-debananeiras), infiltre-a no solo, não deixe que escorra superficialmente. >

Figura .. Círculo-de-bananeiras próximo a um banheiro. < Sumário

Os círculos de bananeiras, como o nome já indica, são bananeiras plantadas em círculos com uma depressão de 1m no centro, na qual podem ser despejadas águas cinzas. Essas águas serão absorvidas pelas plantas e evapotranspiradas. Cada bananeira, absorve e devolve para a atmosfera de 9 a 28 litros de água por dia. Com isso, descentralizamos o tratamento. O cuidado que se precisa ter é com os componentes utilizados para higiene (seja no banho, na louça, etc). Se esse cuidado for tomado, o consumo das bananas é seguro. Outras plantas ornamentais também podem compor o círculo: helicônias (Heliconia spp.), bananeira-de-jardim (Musa velutina), bananeirinha (Canna spp.) e bastão-do-imperador (Etlingera elatior).

Figura .. Espécies ornamentais: Canna generalis e Musa velutina. 96


Respiradouro

Plantas Sifão Válvula de desvio Duto de limpeza

Saída para esgoto

Ecanamento para água cinza

Declive

Cascalho

Matéria orgânica

Depressão

Distância adequada da fundação

Figura .. Esquema ilustrativo do direcionamento da água da pia para um círculo-de-bananeiras. < Sumário

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FILTRO BIOLÓGICO Existem diferentes modelos de filtros biológicos, porém, o princípio básico desta forma de tratamento de águas cinzas é a utilização de microorganismos decompositores e plantas. Cascalho e areia constituem uma barreira para a matéria orgânica e uma superfície na qual os microorganismos e instalam e realizam a limpeza a água. Os nutrientes liberados são absorvidos pelas plantas, que produzem biomassa utilizável em compostagem ou na cobertura do solo. A água proveniente dos chuveiros, máquina de lavar roupas e pia da cozinha é canalizada para um tanque impermeável de sedimentação. Posteriormente, segue para canteiros com plantas (zona de raízes). Esses canteiros são revestidos por lona impermeável de PVC ou polietileno para que a água não infiltre no solo. O preenchimento deles é feito com cascalho, ao redor das entradas e saídas, e areia no centro (onde são colocadas as plantas – juncos, ciperáceas, Schoenoplectus, Triglochin). Após passar pelas zonas de raízes, a água pode ser armazenada em tanques subterrâneos ou direcionada para lagos. Neste caso, é necessária a presença de peixes que consomem larvas de mosquitos e plantas flutuantes que são periodicamente removidas quando em excesso para que não haja acúmulo de nutrientes e consequente eutrofização. O destino final da água tratada pode ser seu reuso em descargas e irrigação de árvores.

Areia e Plantas

Figura .. Esquema ilustrativo de um filtro biológico. Cascalho < Sumário

Lona

Árvores 98


Figura .. Sistemas biolรณgicos para tratamento de รกguas cinzas constituindo jardins internos.

< Sumรกrio

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Figura .. Plantas utilizadas em tanques de tratamento de água: sombrinha-chinesa (Cyperus alternifolius) e papiro-anão (Cyperus

papyrus).

Figura .. Lagos de água cinza após o tratamento. Plantas aquáticas flutuantes, como o aguapé (Eichhornia crassipes) e alface-d’água (Pistia stratiotes), são utilizadas para finalizar o tratamento e servir como fonte de biomassa. < Sumário

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Dimensionamento

Sugerimos que todo o conjunto de tanque de sedimentação e filtros tenha, no mínimo, 22m³ de capacidade. A altura dos filtros com plantas deve ficar em torno de 1m. Este valor considera seis dias como um bom período de descanso dessas águas para a decomposição de elementos mais impactantes, como o próprio sabão. Temos que esse filtro conseguirá comportar o volume antes de chegar no último estágio, que indicamos um lago de armazenamento. Em seis dias, o volume de água gerado é de 20400l e o sistema com tal capacidade comporta 22000l.

sistema e facilitar o manejo do viveiro, que necessita visitação diária. Quando uma boia colocada no lago atingisse determinado nível, um sinal seria enviado ao arduíno previamente programado que ligaria automaticamente a bomba de água para irrigação. O arduíno é uma ferramenta com muitas possibilidades. Outros sinais possíveis para o acionamento da bomba poderiam ser o horário do dia ou a umidade do solo detectada por um sensor. A bomba de água seria a da marca Shurflo conjuntamente com uma placa solar, como já citado no capítulo de painéis fotovoltaicos.

Dando mais uma função a esse elemento, o lago, que será constantemente enchido pelas águas da casa, pode fornecer água para irrigar o plantio das árvores ou viveiro. Assim, mantemos a água por mais tempo no sistema, criando ciclos. Arduíno O arduíno é uma plataforma de prototipagem eletrônica de hardware livre capaz de traduzir sinais físicos em dados. Ele pode ser utilizado para dar maior autonomia para o < Sumário

Figura .. Placa arduíno. 101


TANQUES DE EVAPOTRANSPIRAÇÃO O tanque (ou bacia) de evapotranspiração (TEvap) é um sistema de tratamento das águas escuras, ou seja, aquelas provenientes do vaso sanitário. Aqui, o princípio decomposição anaeróbia da matéria orgânica, mineralização e absorção dos nutrientes pelas raízes é a base para o saneamento. Sugerimos essa técnica para o saneamento dos resíduos das casas de acolhida, pois ela tem tanto um valor didático, quanto para fazer um tratamento adequado desses resíduos com autonomia e preservando o ambiente. Como o nome já sugere, essa técnica é composta por uma bacia impermeável (com a técnica de ferrocimento ou alvenaria). Internamente (figura ..), há um duto feito de pneus, pouco espaçados um do outro, centralizado no sentido do comprimento. Para dentro desse duto, é canalizada a água dos vasos sanitários, a qual irá se distribuir por todo o fundo do tanque. De baixo até a superfície, temos consecutivas camadas de detritos com diferentes granulometrias: começando com entulho ao redor dos pneus e diminuindo < Sumário

gradativamente, passando por cascalho grosso, brita, areia grossa, areia fina e, por fim, terra. Esses diferentes tamanhos de detritos proporcionam um efeito de filtro, fazendo com que essa matéria orgânica derivada dos dejetos humanos sejam retidas e decompostas por micro-organismos decompositores. A última camada, logo na superfície do tanque, é composta de terra, pois aí são colocadas plantas com alta capacidade de evapotranspiração, ou seja, plantas que conseguem consumir e transpirar grandes quantidades de água por dia, como a taioba e a bananeira, por exemplo. A título de curiosidade, uma bananeira, em condições de luminosidade adequada, pode evapotranspirar até 400l de água por dia. O TEvap é um sistema cíclico, pois os nutrientes deixam o sistema incorporando-se à biomassa das plantas e a água é eliminada por evapotranspiração..

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7 6

5

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1: Tanque impermeável de ferrocimento 2: Entrada da água 3: Câmara de fermentação 4: Camada de entulho 5: Filtro grosso de brita 6: Filtro fino de areia 7: Terra com plantas de elevada taxa transpiratória 8: Saída para excesso de água 9: Duto de inspeção 10: Vapor d’água

Figura .. Esquema ilustrativo de um tanque de evapotranspiração.

< Sumário

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Considerações Técnicas Buscando o bom desenvolvimento e evapotranspiração das plantas, é importante que ela receba insolação ao longo de todo o ano e que não haja barreiras para o vento, que é responsável pela retirada da camada limítrofe dos estômatos, colaborando para a evaporação. >

Ser completamente vedada e impermeabilizada para não haver vazamentos que são poluentes para as águas subterrâneas. >

Dutos de inspeção devem ser colocados ao longo do tanque. Com esses canos de inspeção, é possível verificar em que altura está a água e consequentemente avaliar se há o correto funcionamento. Se ela encher demais, o solo ficará saturado, as plantas podem morrer e o processo de decomposição pode ser afetado. Se tiver água de menos as plantas podem desidratar. >

< Sumário

Em caso de chuva excessiva, a água pode alagar o tanque, visto que ela é fechada. Portanto, colocam-se folhas das próprias bananeiras para fazer com que a água da chuva possa escoar para os lados e não infiltrar no sistema. Além disso, visando proteger das águas de escoamento superficial, coloca-se uma fiada de tijolos ao redor do tanque para que ela fique mais alta que o nível do terreno. >

As substâncias que podem entrar na planta e contaminá-la, inviabilizando o consumo da banana, por exemplo, são os metais pesados e produtos químicos de limpeza. Por isso, é importante termos consciência dos produtos que utilizamos para não haver sua entrada no sistema. Produtos antibacterianos devem ser evitados, pois matam as bactérias responsáveis pela decomposição da matéria orgânica. Recomenda-se o uso de sabão para a limpeza dos vasos. sanitários >

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Dimensionamento

O dimensionamento padrão do TEvap é de 2m³ de por pessoa. Mantendo-se a altura de 1,5m por 2m de largura, o comprimento, portanto, fica regulável de acordo com o número de pessoas que queremos atender no sistema. Pensando que teremos por volta de vinte pessoas visitando as casas e vinte pessoas que poderão se hospedar na sede, pensamos em construir diferentes tanques: 1) Tanque exclusivo para a casa de 8 hóspedes por ser a maior. Deverá medir 1,5 de altura por 2m de largura e 5,4m de comprimento, totalizando 16m³. 2) Tanque para uma das casas de 4 hóspedes e uma de 2 hóspedes. As medidas serão: 1,5 de altura por 2m de largura e 4m de comprimento, totalizando os necessários 12m³.

3) Tanque para as outras casas de 4 hóspedes e de 2 hóspedes. Dimensões iguais ao e cima..

< Sumário

Figura .. Tanque de evapotranspiração: visão do interior no início do preenchimento com pneus e entulho. 105


4) Tanque para a sede: teremos os banheiros secos, porém, algumas pessoas que nunca tiveram contato com a técnica podem não se sentirem confortáveis em usá-lo. Dessa forma, recomendamos fazer um banheiro no primeiro andar da sede (logo abaixo do banheiro seco) que terá ligação com um tanque de evapotranspiração. Além disso, como citaremos na seção referente ao banheiro seco, esse tanque também terá a função de tratar a urina coletada nos mictórios e nos assentos que contarão com coletores de urina. Pensando nisso, calculamos que seria ideal esse tanque ter uma capacidade de 24m³, portanto as medidas serão 1,5 de altura por 2m de largura e 8m de comprimento.

Figura .. Exemplos de tanques de evapotranspiração em funcionamento. < Sumário

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BANHEIRO-SECO

Tendo em vista que um dos maiores consumos residenciais de água é devido às descargas do vaso sanitário, são imprescindíveis formas de se economizar essa água. Uma alternativa que radicaliza essa questão é o banheiro-seco. Além do mais, ele evita a contaminação de rios e águas subterrâneas com os dejetos humanos e também oferece recursos para o sistema como um todo. O banheiro seco (figura x), como o próprio nome sugere, é desenvolvido de forma que não haja a utilização de água no seu funcionamento. O tratamento dos resíduos ocorre localmente através de processos de compostagem. Apesar de um possível estranhamento à primeira vista, este método já se comprovou seguro, eficiente e adequado quando executado corretamente. Figura .. Interior de um banheiro-seco. < Sumário

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Considerações Técnicas

Cada banheiro possui dois acentos que dão acesso a dois compartimentos onde as fezes serão armazenadas e decompostas conjuntamente com serragem. Existem esses dois acentos, pois quando um compartimento estiver cheio, o outro começará a ser utilizado. Quando esse segundo chegar na sua capacidade máxima, os resíduos do primeiro já deverão ter se tornado composto, podendo ser retirado e então utilizado. >

Os compartimentos possuem uma rampa com cerca de quarenta e cinco graus para que as fezes possam se depositar na parte inferior do compartimento, aproveitando todo o espaço. Para isso também é importante que a rampa seja lisa. >

O banheiro possui uma chaminé também pintada de preto para esquentar o ar em seu interior. Sua função é criar uma corrente de ar que entra pelo assento e sai pela chaminé, eliminando a possibilidade de mau cheiro e oxigenando o composto. >

< Sumário

Na parte inferior da rampa, há uma porta de acesso ao compartimento para a retirada do composto após o término do processo de compostagem. Esse material é um rico adubo! Porém, apesar da compostagem ideal eliminar possíveis patógenos, não há como ter essa certeza. Assim, não utilizar o composto em cultivos onde o alimento está em contato direto com o solo (alface, cenoura, etc) ou com possibilidade de contato de pessoas e animais domésticos, e sim em árvores, por exemplo. Caso desejado, para total segurança, armazena-se o composto em recipiente fechado (como tambores) pelo período de um ano antes de seu uso. >

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Chaminé (preta) Chapa de ferro (preta)

Piso do banheiro

2,50 m.

Rampa de concreto

Portas para Inspeção

Alvenaria 2,00 m. 2,50 m.

1,00 m.

Figura .. Esquema em perspectiva de um banheiro seco com dimensões padronizadas.

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O processo de decomposição acontece no equilíbrio de 1 parte de nitrogênio para 25 de carbono. Materiais ricos em carbono são serragem, palha, folhas secas e inclusive o papel higiênico que pode ser depositado no mesmo local. Como todos esses materiais também possuem nitrogênio em sua composição, na prática, utiliza-se a proporção de 1 parte de fezes (ricas em nitrogênio) por 3 de palha (ou outro material rico em carbono). >

Temperaturas elevadas dentro do compartimento de compostagem são necessárias. O processo de decomposição é acelerado e tem maior eficiência nesta situação. Para isso, é importante que a superfície superior do compartimento seja preta e de um material que propicie um rápido aumento de temperatura. Além disso, no hemisfério sul, buscando uma maior insolação ao longo de todo ano, é essencial essa placa ser direcionada ao norte. >

Necessário cartaz informativo dentro do banheiro com as instruções de uso do mesmo, tendo em vista que será um público diverso, rotativo e não familiarizado com a tecnologia que utilizará o banheiro. >

< Sumário

A matéria seca é também essencial para o controle da umidade, a qual em excesso, promove também a fermentação (ausência de oxigênio) e liberação de mau cheiro, comprometendo a funcionalidade do banheiro-seco. Considerando que muitas pessoas farão uso dele, propomos um coletor de urina no vaso (figura). No banheiro masculino, além dos coletores podem haver mictórios. Usualmente, costuma-se direcionar a urina para galões de armazenamento e, após sua diluição em água na proporção 1/10, utilizá-la como fertilizante. Porém, como estimam-se aproximadamente 1800l por mês de urina na lotação de 40 pessoas (1,5l/dia/pessoa), os coletores, tanto do banheiro masculino quanto do feminino, podem direcionar a urina diretamente para um tanque de evapotranspiração. No primeiro andar dessa construção, abaixo do piso do banheiro-seco, haverá um banheiro comum cujo tratamento da água será em tanque de evapotranspiração já dimensionado para receber esse volume de urina dos banheiros-secos. >

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Dimensionamento No design, sugerimos dois banheiros (um masculino e um feminino) integrados à estrutura da sede. Para criar um grande compartimento respeitando o ângulo necessário para a rampa, eles foram pensados com dois andares e dois acessos: pelo quarto do alojamento (em cima da cozinha) e por uma escada lateral externa Como ele estará integrado a essa construção, esteticamente ele ficará igual a um banheiro comum, com a única diferença de haver dois vasos um ao lado do outro e sem água dentro deles. Essa composição estética é importante para não gerar um impacto e a sua funcionalidade ser apreciada. >

< Sumário

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ESPIRAL-DE-ERVAS A espiral-de-ervas é uma técnica bastante associada à Permacultura, no entanto, como discutido anteriormente, uma técnica sem a consideração de seus conceitos e de um contexto, não será permacultural. Sendo assim, o que justifica seu emprego para além da estética? Primeiramente, a espiral nada mais é do que um canteiro que imita um padrão natural com a finalidade de melhor aproveitar o espaço, ou seja, numa mesma área, a espiral possibilita maior eficiência do que um círculo, por exemplo.

Figura .. Desenhos esquemáticos de uma espiral-de-ervas em visão geral (esquerda) e corte lateral (direita). < Sumário

Outra vantagem é a sua função de criar nichos microclimáticos, possibilitando uma maior riqueza de espécies no mesmo local. Isto significa que, na espiral, existirão diferentes condições para cada planta específica, já que este tipo de canteiro deve ser posicionado de acordo com os pontos cardeais e possuir um gradiente decrescente de altura do topo até a base. O resultado é que o topo (mais alto e com insolação o ano todo) será quente e seco, enquanto que a base (mais baixa e posicionada a sul) só receberá sol no verão, sendo, portanto, fria e úmida. O lado leste receberá o sol ameno da manhã e será sombreado a tarde, enquanto que o lado oeste receberá o sol mais intenso da tarde. Considerando estes microclimas básicos, as plantas são alocadas na espiral de acordo com suas adaptações. Consideramos a espiral ideal para o contexto do projeto devido à sua autossustentabilidade, ou seja, baixíssima necessidade de manejo e irrigação (com exceção no início do plantio). 112


Execução A espiral-de-ervas é construída com a justaposição de unidades que podem ser de diversos materiais como tijolos, placas de madeira, rochas, bambus ou materiais reutilizados. Para maior durabilidade, prefira materiais inertes. Atenção para que não haja vãos na espiral por onde a terra possa escorrer ou plante nesses vãos. O diâmetro da espiral não deve exceder os 2m, para que o topo seja acessível. Já a sua altura é entre 1,20 e 1,50m. Após a assentamento da estrutura, preencha a espiral com terra e matéria orgânica de lenta decomposição (galhos, madeira). Em seguida, realize o plantio respeitando as necessidades de cada espécie, cubra o solo com matéria vegetal seca (palha, folhas) e regue. Coloque plaquinhas de madeira com a identificação das espécies para que ela seja ainda mais didática.

Figura .. Etapas da execução de uma espiral-de-ervas. < Sumário

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Plantio O próprio cultivo das ervas medicinais e condimentares à porta de casa, por si só, já se configura como uma atividade terapêutica. A técnica simples da espiral-de-ervas ilustra o início de uma autonomia: nossos remédios e temperos acessíveis, frescos e livres de agrotóxicos. A figura abaixo traz exemplos do que podemos plantar na espiral de acordo com suas diferentes regiões.

N Topo Mediterrâneo Alecrim, Orégano, Tomilho, Arruda, Alho, Artemísia Leste Ameno Salsinha, Cebolinha, Poejo, Salsão, Arnica-de-jardim, Melissa, Manjerona Noroeste Ensolarado Manjericão, Lavanda, Sálvia, Endro, Pimenta Sul Úmido Coentro, Hortelã, Cavalinha, Funcho

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MELIPONÁRIO A meliponicultura é a criação de abelhas nativas sem ferrão (meliponídeos). Embora a produção de mel dessas espécies seja bem inferior à das abelhas comuns, sua criação apresenta vantagens interessantes na perspectiva do projeto., a começar pela questão ecológica, já que essas abelhas são mais adaptadas à polinização das árvores nativas e sua criação auxilia na preservação das espécies. Outras funções seriam a educativa e o fornecimento de própolis e mel (em pequena escala), o qual apresenta aroma e sabor únicos. Antes da chegada da abelha Apis mellifera no continente americano, ou da exploração da cana, o mel das abelhas nativas caracterizava-se como principal adoçante natural, fonte de energia indispensável para os povos indígenas. A herança indígena é evidenciada pelos nomes populares de muitas espécies, como Jataí, Uruçu, Mandaçaia e Guarupu, que são as principais espécies criadas na região Sudeste. O que é importante considerar da legislação brasileira é que não é permitida a remoção de ninhos do habitat natural. < Sumário

A pessoa que deseja iniciar a meliponicultura pode capturar um enxame com uma isca artificial de nidificação estrategicamente colocada no ambiente.

Figura ..Abelhas jataís (Tetragonisca angustula) na entrada do ninho. 115


Confecção das Iscas Os ninhos-isca são recipientes deixados na natureza com a finalidade de capturar uma colônia de abelhas. Esta é uma estratégia que se aproveita do processo natural de enxameagem das abelhas. Como os locais previamente ocupados por outras colônias têm a preferência das abelhas, o ninho-isca deve ser impregnando internamente com loção atrativa produzida com álcool de cereais e própolis proveniente da espécie que se tem interesse (na proporção de 3 para 1 respectivamente) . O tipo de isca mais utilizada é aquela confeccionada com garrafas tipo PET. Primeiramente, corta-se a garrafa transversalmente em três partes e, logo em seguida, une-se novamente as partes com fita adesiva. Este procedimento visa facilitar a posterior remoção da colmeia de dentro da garrafa. Ela, então, é envolta com jornal e saco plástico preto, imitando o interior oco de árvores. Um pequeno orifício é feito na tampa da garrafa (o suficiente para a entrada da abelha) e aplica-se a cera da espécie ao redor desse orifício, com a finalidade de fornecer material para o início da colmeia. O ninho-isca deve ser instalado em locais de ocorrência de abelhas e no período de maior enxameação, geralmente, durante a primavera e o verão. Cerca de 30 dias após a instalação do enxame na isca, deve-se proceder a transferência para caixa definitiva/meliponário, que deve estar a mais de 300 metros do local de captura. < Sumário

Figura ..Ninhos-isca confeccionados com garrafa PET. 116


Caixa Racional Estrutura facilmente manuseável construída para abrigar as colônias de abelhas nativas. Diversos modelos já foram desenvolvidos e encontram-se disponíveis no mercado, cada qual com uma finalidade em destaque e de acordo com as características do enxame. De modo geral, a caixa racional é segmentada em dois compartimentos: ninho e melgueira. O ninho pode, ainda, ser subdivido entre ninho e sobre-ninho em criações que visam a multiplicação não-natural dos enxames. Este é o local onde estarão os discos de favos de cria e a rainha. Já a melgueira é o compartimento onde serão estocados os potes de mel e/ou pólen (fig. ).

O material utilizado para a confecção da caixa racional é prioritariamente a madeira, tendo também experimentos em isopor e outros materiais que possuem características de isolamento térmico, acústico, de umidade e de luminosidade, buscando a semelhança com os locais de nidificação encontrados na natureza e a proteção contra predadores.

Figura ..Interior de uma melgueira.

Figura ..Meliponário de madeira.

< Sumário

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POMAR DE NATIVAS

Uma característica marcante do domínio da Mata Atlântica é sua megadiversidade biológica.. No entanto, pouquíssimas espécies usadas na nossa alimentação são nativas, o que representa um desperdício e desvalorização da nossa flora. Um dado curioso é o de que 90% da alimentação mundial provém de somente 20 espécies vegetais. Se considerarmos a estimativa de que, em média, 10% da diversidade de plantas em qualquer bioma do mundo é comestível, teríamos 3000 espécies nativas (entre árvores, arbustos e ervas) para nos alimentarmos. O cultivo de tais espécies pouco valorizadas e cosumidas, chamadas de plantas alimentícias não convencionais (PANC), é uma alternativa bastante educativa, levando a reflexões sobre nossa alimentação e a uniformização alimentar global formulada pela indústria.

< Sumário

Ao cultivarmos tais espécies, contribuímos para a manutenção de nossa biodiversidade. As árvores frutíferas nativas possuem enorme potencial alimentício para as pessoas, servindo de matéria-prima para a confecção de doces, geleias, sorvetes, e também para as aves, que serão atraídas para a área da casa de acolhida e poderão ser contempladas. A partir desse contexto, propomos um pomar ao longo do canal de infiltração mais próximo às construções utilizando espécies nativas.

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Espécies Frutíferas As seguintes espécies são indicadas para compor o pomar de frutíferas nativas: araticum-açú (Annona montana), bacuri (Attalea phalerata), baru (Dipteryx alata; 1), cabeludinha (Myrciaria glazioviana), cajá (Spondias mombin), cerejeira-do-mato (Eugenia involucrata; 2), gabiroba-árvore (Campomanesia xanthocarpa; 3), grumixama (Eugenia brasiliensis; 4), ingá-doce (Inga edulis), jatobá (Hymenaea courbaril), jenipapo (Genipa americana; 5), laranjinha-do-mato (Eugenia speciosa), mamãzinho (Jacaratia spinosa), marianeira (Acnistus arborescens), palmeira-jerivá (Syagrus romanzoffiana; 6), pitanga (Eugenia uniflora; 7), sete-capotes (Campomanesia guazumifolia), uvaia (Eugenia pyriformis; 8).

< Sumário

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CERCA-VIVA

Além de um refúgio para as pessoas, a casa de acolhida objetiva também ser um refúgio para a vida silvestre. Como identificado por observações e entrevistas com moradores, o bairro Vista Alegre conta com a presença de uma fauna silvestre bastante rica, sendo relatado, inclusive, o presença de uma jaguatirica, dentre outros mamíferos. No entanto, os cães domésticos podem ser prejudiciais na preservação dessa fauna silvestre.. Identificamos também, durante a leitura da paisagem, setores de ventos e poluição sonora e uma possível questão quanto à segurança.

< Sumário

Considerando tais premissas, a opção por uma cercaviva no limite lateral do terreno apresenta-se como uma solução de acordo com os objetivos do projeto e mais permacultural em detrimento a muros. Porém, a escolha da espécie para compor a cerca não é uma tarefa tão simples. Existem inúmeras possibilidades e cada uma apresenta suas vantagens e desvantagens. Um dos critérios principais foi quanto à origem das espécies, sendo o primeiro filtro a exclusão de espécies exóticas e invasoras. Outra característica buscada foi a de exercer um bom fechamento e quebra-vento. A seguir, pensando no objetivo de um elemento exercer múltiplas funções, chegamos a uma espécie que possui também funções alimentícias e ornamental.

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Descrição da Espécie Indicamos a ora-pro-nobis (Pereskia aculeata), também chamada de carne-vegetal. Ela é considerada uma PANC (planta alimentícia não convencional) de altíssimo valor nutritivo. Não possui nenhum princípio tóxico, é extremamente rica em proteínas de boa qualidade (possui 25% de proteínas de alta digestibilidade). Os frutos são ricos em carotenoides e podem ser utilizados em sucos, geleias, mousses e licores. As flores jovens podem ser usadas para saladas ou salteadas. Já as folhas tem uso culinário semelhante às hortaliças convencionais: cruas em saladas, refogadas e em outros pratos quentes. Do ponto de vista ornamental, apresenta uma florada generosa que ocorre entre os meses de janeiro a abril, produzindo um espetáculo surpreendente, suas flores são muito perfumadas e melíferas

< Sumário

Figura ..Ora-pro-nobis (Pereskia aculeata) em floração.

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A planta possui hábito bastante plástico, podendo ser uma trepadeira quando encontra suporte ou um arbusto bastante ramificado. É uma planta nativa, cactácea, rústica, resistente a seca, própria de clima tropical e subtropical. Desenvolve em diferentes tipos de solo e não é exigente em fertilidade, porém, adapta-se melhor onde haja luz plena. Pode ser propagada por sementes ou facilmente por estacas (ramos não muito jovens de outra planta, com 10 a 20 cm de comprimento), acomodadas em solo afofado, a três ou quatro cm de profundidade, mantendo-se a umidade do solo para facilitar seu desenvolvimento. A sua intransponibilidade, quando conduzida corretamente, apresenta a desvantagem de exigir um manejo intenso e cauteloso devido ao rápido crescimento e presença de muitos espinhos. Ela deve ser plantada a um espaçamento de aproximadamente 1,5m e mantida a uma altura entre 1,8 e 2m.

Figura .. Cerca-viva utilizando a ora-pro-nobis (Pereskia aculeata). Notar o crescimento bastante vigoroso. < Sumário

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COMPOSTEIRAS O Brasil produz 241.614 toneladas de lixo por dia, dos quais 76% são depositados a céu aberto, em lixões, e 13% são depositados em aterros controlados. Em média, uma pessoa gera 1,5kg de resíduos por dia, cerca de 60% é composto pelos resíduos orgânicos. Todo esse material, quando jogado nestes locais inapropriados, além de contaminar o lençol freático, produz metano durante sua fermentação, gás 23 vezes mais potente que o gás carbônico (CO2) para o efeito estufa. A cozinha é um dos locais onde produzimos a maior parte desses resíduos e isso se torna um grande problema, devido ao descarte inadequado. A compostagem doméstica é uma das soluções. Nada mais é do que a decomposição da matéria orgânica realizada por micro-organismos, como fungos e bactérias e outros organismos (minhocas, insetos,...). Esse processo é fundamental na reciclagem dos elementos que constituem a matéria orgânica, possibilitando que sejam novamente absorvidos pelas plantas na forma de nutrientes. < Sumário

Nas condições ideais e na presença de oxigênio, a compostagem não libera o gás metano. O resultado é um composto de alta qualidade, com odor de terra e que pode ser colocado em vasos, hortas, jardins, mudas de árvores... Nesse método, é necessário que haja um local adequado, próximo à cozinha, coberto, ao abrigo do sol e do vento, a fim de se alocar os resíduos orgânicos para que eles possam se decompor. O segredo é alternar camadas de matéria seca (rica em carbono - palha, serragem, folhas secas) e úmida (rica em nitrogênio - restos de alimentos) para que sua composteira não fique nem muito seca e nem muito úmida. No caso de ficar muito seca, o composto irá demorar muito para ficar pronto, já que os microorganismos necessitam de água. Se ficar muito úmida, não entrará oxigênio suficiente e outros microorganismos anaeróbios irão se desenvolver, resultando em mau cheiro.

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Há algumas formas para se fazer a compostagem doméstica. Uma delas é um minhocário que utiliza caixas de plástico empilháveis com furos no fundo (exceto a última) para facilitar o fluxo de minhocas e umidade, a qual é bastante concentrada em nutrientes e pode ser utilizada como biofertilizante. As minhocas são usadas na compostagem doméstica e aceleram o processo de decomposição. Se manejado corretamente, um minhocário com minhocas californianas pode digerir cerca de um quilo de alimento por dia. Após 60 dias, há formação de húmus de minhoca, que é muito mais rico em nutrientes que o composto normal. As minhocas controlam sua população de acordo com a comida e com o espaço disponível, sendo assim, se houver um período com poucos visitantes utilizando a cozinha e houver pouca geração de resíduo orgânico, as próprias minhocas regularão sua população. Os casulos ficam no ambiente por 21 dias, em média. Quando eclodem, geram de 8 a 12 minhocas. Nesse modelo de composteira doméstica, sugere-se o seguinte dimensionamento: 30 litros por pessoa. As caixas podem ser substituídas por recipientes cilíndricos de plástico reutilizados. < Sumário

Figura .. Modelo de minhocário reutilizando embalagens de alimento.

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Figura .. Minhocários de diferentes tamanhos.

A

B

C

D

E

Figura .. Esquema de um minhocário. Ele é composto por caixas de plástico empilháveis (A). A primeira recebe o os resíduos orgânicos (B). Na segunda, estão as minhocas realizando a compostagem (C). A última recebe todo o excesso de umidade (D). Quando o composto está pronto, as minhocas migram para a primeira caixa e a segunda pode ser esvaziada, colocada em primeiro e o processo se reinicia (E). < Sumário

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O minhocário é uma estratégia bastante prática e fácil, porém, nos momentos de maior número de pessoas, a composteira em leira pode ser usada. O material é empilhado sobre o próprio solo, intercalado com material orgânico seco (palha, folhas, serragem). Nesse processo, é essencial que haja aeração, para que o material não exale mau cheiro. Além disso, é preciso que haja o controle da umidade, por isso, a pilha deverá ser coberta. Qualquer que seja o modelo de composteira, os materiais que podem ser compostados são restos de legumes, verduras, frutas, filtros e borra de café, cascas de ovos, palha, folhas, galhos e cascas de árvores, esterco etc.

Figura .. Composteira de pilha. Os bambus facilitam na aeração.

Não devem ser colocados na composteira: madeiras tratadas com pesticidas ou envernizadas, vidro, metal, óleo, tinta, plásticos, fezes de animais de estimação. Deve-se evitar as gorduras animais, pois são de difícil decomposição, como também restos de carne, por atrair animais domésticos.

Figura .. Amostra do composto pronto. < Sumário

Para diminuirmos ainda mais o descarte de resíduos no aterro sanitário municipal, é essencial que haja a separação de material reciclável, que poderá ser levado para o ponto de entrega voluntária localizado na entrada do bairro. 126


RELAÇÕES INVISÍVEIS

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Até o momento, trouxemos sugestões nas áreas de energia, água, ecologia, arquitetura, gestão de resíduos, entre outros. Todas essas sugestões são físicas e visíveis no terreno., possuem uma localização e estão interligadas, através de suas funções e necessidades, como visto na tabela. Criamos um fluxo complexo que une toda o sistema num grande organismo. É justamente esse fluxo entre os elementos que faz eles terem vida e, por conseguinte, uma capacidade autorregulativa para alcançar um equilíbrio dinâmico harmônico e sustentável. Mas, algumas questões surgem: O que gera esse fluxo? De onde nasce? Esse fluxos são justamente criados pelos seres humanos envolvidas, com suas capacidades de realizar um design, concretizá-lo, trazê-lo à realidade com sua criatividade e energia. E esses fluxos, essas interações entre as pessoas presentes no sistema não são visíveis nem físicas, porém, invisíve is e assim perpassam por todas as estruturas. Na Permacultura, chamamos de Relações Invisíveis a área do design que se dedica a essa questão Aqui, portanto, traremos algumas considerações e possibilidades para melhor cuidar desse importante aspecto humano.

< Sumário

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Relações Internas Para o projeto crescer e amadurecer, um dos aspectos essenciais é na relação cotidiana dentro do espaço, no dia a dia do projeto. Não há muita funcionalidade ter uma harmonia nas árvores que crescem, porém uma guerra dentro das construções. Assim como estão sendo propostos caminhos para harmonizar os elementos do terreno, aqui também nos perguntamos como harmonizar e ajudar a compreender essas relações que acontecerem no projeto. Uma das formas, acreditamos que é através de acordos. Não regras prontas e estáticas, mas acordos e, como a própria etimologia sugere, um fazer de coração. Quais são os acordos necessários para as estruturas da casa funcionarem? Precisa regar algo, esvaziar o banheiro seco, levar resíduos para compostagem, limpar o local...? São algumas as tarefas necessárias para o bom andamento desse organismo. Para isso acontecer bem é importante que cada órgão cumpra sua função. Esses acordos podem ser criados, informados e aprimorados com cada novo acolhido, sendo importante essa < Sumário

conversa ser convidada e anfitriada por alguém que esteja ajudando a cuidar do projeto. Um espaço de acordos pode envolver ouvir as necessidades e capacidades de cada um e ver como juntos podemos nos cuidar e nos distribuir de forma que consigamos conviver bem. Além das conversas, pode haver um site para divulgação e prévia conscientização das particularidades do local, já preparando os próximos visitantes. Uma forma de informar sobre o funcionamento do projeto pode ser utilizando placas informativas nas diversas técnicas. Por exemplo, uma placa informando como utilizar o banheiro seco, quais produtos podem ser utilizados no tratamento das águas cinzas e que cuidados são necessários com o tanque de evapotranspiração, com qual frequência é importante irrigar o viveiro e os núcleos de regeneração da mata, como proceder em noites frias com geada para que as placas de aquecimento solar não estraguem, etc. Essas placas podem ser autoinstrutivas, trazendo uma inteligência rápida no sistema e nas relações para o bom andamento e preservação das estruturas. 129


Além desses cuidados, um importante momento de integração entre os “moradores” do projeto são aqueles onde mais recebemos energia: as celebrações. Momentos de encontro religiosos e/ou festivos, para podermos festejar e celebrar a vida. Sendo a celebração tanto num sentido de apreciação e comemoração quanto de luto e lamento, caso algo tenha acontecido que não tenha agradado parte do grupo, trazendo uma avaliação sobre isso e amadurecendo essas trocas. As celebrações são os momentos correspondentes a olhar o que vivemos e nos autorregularmos aprendendo e amadurecendo. Relações Externas As parcerias com outras iniciativas da cidade é com certeza uma estratégia que pode agregar muito e trazer atividades e repercussão para o projeto. Hoje, existem muitas iniciativas em Botucatu que apreciam temas correlatos aos tratados na Permacultura e com educação ambiental, sendo esses eixos principais do projeto. Algumas delas são: Sítio Beira Serra que trabalha com viagens didáticas com escolas, cursos e eventos artísticos culturais; Giramundo (ONG) que trabalha < Sumário

com agroecologia; Grupo Curare de Permacultura que trabalha com cursos, educação ambiental e consultorias; Mirante das Artes que tem shows e aulas de dança, música e outras atividades artísticas, entre outros. Todos esses grupos são potenciais aliados para criarem projetos juntos, divulgando essas alternativas formas de viver na sociedade em nossos dias em mais harmonia com a natureza. Outro princípio que a Permacultura traz nesse item está relacionado ao conceito de famílias estendidas, onde todos que compartilham de um ideal comum com esse projeto possam se unir e fortalecer essa rede. Isso está relacionado com o item anterior e também podemos pensar nisso em relação à vizinhança. Quanto mais divulgada e explicada a proposta do projeto para a vizinhança, maior crescimento isso pode trazer ao bairro, maior autonomia pela partilha de habilidades e serviços ali presentes e maior união e amizade entre esses novos vizinhos. Tal fortalecimento de relações também é uma porta de entrada para a ampliação da regeneração das matas do entorno e dos fundos dos terrenos.

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Questão Econômica A questão econômica é um ponto nevrálgico quando pensamos na sustentabilidade ao longo do tempo. Hoje, muitas são as possibilidades de viabilizar um projeto deste tipo. A mais óbvia é o próprio fundador do projeto bancá-lo. Já outras mais colaborativas e sistêmicas partem da visão da Permacultura, trazendo a criação de comunidades, cuidado com as pessoas e compartilhamento de responsabilidades e excedentes para cuidar da terra. Uma das possibilidades é a de fazer financiamentos coletivos anuais que garantam os recursos necessários para um ano (por exemplo). Anualmente, se faria campanha divulgando o projeto e acessando assim a rede de pessoas que queiram colaborar com a sua manutenção. Muitos projetos contam com essa estratégia e ela tem se mostrado frequentemente eficaz, porém, também precisamos levar em consideração que cada vez é maior o número de projetos acessando esse caminho. Por isso, é preciso uma intensa dedicação na divulgação dessas campanhas. Outro caminho é criando uma rede de pessoas que se associem a essa iniciativa porque realmente a consideram < Sumário

necessária para o mundo e gostariam de contribuir continuamente para seu crescimento. Dessa forma, poderia haver alguns valores sugeridos e essas pessoas poderiam colaborar mensalmente ou a cada 3, 6 ou 12 meses. Assim, há uma maior constância e previsão, visto que teriam acordos estabelecidos previamente, de qual será a entrada no próximo espaço de tempo, dando maior autonomia também para se fazer planejamentos e investimentos maiores a longo prazo. Ainda outra possibilidade seria por meio de parcerias com empresas e iniciativas que já tenham recursos direcionados para a área social e que também queiram contribuir com essa. Isso por vezes é mais dificultoso de encontrar num primeiro momento, mas os investimentos, quando feita uma sólida parceria, podem ser altos. Essas são algumas das muitas estratégias para entrada de dinheiro para o projeto se manter. Outras muitas, porém indiretas, já foram apresentadas ao longo desse projeto no sentido de fazer com que o próprio sistema, a partir do design, já consiga diminuir muitos custos e ter uma grande autonomia financeira após um investimento inicial. 131


Diminuímos a necessidade de dinheiro quando pensamos que parte ou toda a energia elétrica é gerada no próprio local, parte da água é captada ali mesmo, o esgoto é tratado ali mesmo, não precisando pagar para tratarem dele para nós, adubo e mudas produzidos no próprio terreno para que o reflorestamento no local e no entorno seja feito, etc. Ainda uma outra proposta interessante, que pode ser um subprojeto da casa de acolhida, é trabalhar com o LETS (local exchange trading system – sistema de trocas local). Essa metodologia visa criar uma economia não baseada em lucro, mais solidária e regional com a vizinhança. Resumidamente, ela já acontece em vários locais do mundo levantando capacidades e necessidades de todos os participantes dessa comunidade. Aqui, a comunidade pode ser tanto dentro do projeto, com os moradores temporários, quanto com a vizinhança. Com esse levantamento, que frequentemente surpreende, pois as pessoas muitas vezes vão percebendo talentos que não davam valor ou não lembravam ter ou nem exerciam, percebemos uma inteligência, resiliência e economia regionais. Assim sendo, muitos dos gastos existentes com participantes fora desse sistema podem ser < Sumário

trocados dentro do próprio sistema. Uma moeda pode ser criada para esse microssistema econômico, como, por exemplo, o tempo. Há muitas experiências de sucesso e tudo isso pode ser feito com uma simples tabela online regulando essas trocas entre os participantes, pensando no nível de bairro, e com uma lousa pensando entre os membros do projeto naquele instante. Quando um novo “morador” entra, ele coloca suas habilidades e necessidades e a troca começa. Por consequência, a riqueza local começa a ser criada. Interessante lembrar que as trocas não são entre indivíduos, mas entre indivíduo e comunidade. Ou seja, o débito e crédito gerados numa troca devem ser anulados, mas com outros membros da comunidade. Essas são algumas estratégias das muitas que podem ser utilizadas parar buscar garantir uma maior sustentabilidade econômica ao projeto. Tanto uma delas pode ser priorizada perante outra, quanto algumas delas podem ser utilizadas conjuntamente, trazendo assim algumas fontes diferentes de recursos e, portanto, tendo uma maior segurança e resiliência econômica por essa energia vir de fontes diversas. 132


Atividades Culturais e Educativas Como uma das principais atividades desse projeto, temos os cursos, atividades educativas e culturais que poderão acontecer. Tanto as parcerias quanto essa inteligência regional citadas anteriormente podem contribuir para trazer cursos interessantes que tragam profundas e necessários ensinamentos para a comunidade. Um fato para o desenvolvimento de cursos é que cada vez mais os educadores desses eventos têm dado atenção ao local de trabalho, pois o próprio local exerce função didática. Para se ensinar sobre qualquer tipo de sustentabilidade, economia participativa, vivência em comunidade, questões ambientais, vivências na natureza, relações humanas, mediação de conflitos, etc. Todos esses assuntos são de alguma forma vividos nesse próprio sistema, sendo ele mesmo educativo e instrutivo. Essa diferença pode fazer esse local ter grande potencial para esse tipo de atividades. Inclusive, receber grupos

< Sumário

que procurem um local para imersão educativa de um determinado assunto pode ser uma das fontes de renda que tragam sustentabilidade ao projeto. Se pensamos no princípio da fraternidade no meio econômico, como proposto por Rudolf Steiner, temos que grupos que possuem maior acesso a recursos econômicos podem contribuir mais para o espaço enquanto outros que possuem menos contribuem menos para a realização das atividades. Dessa forma, conseguimos propiciar mais oportunidade de crescimento para uma ampla diversidade e quantidade de pessoas. Outra forma de fazer essa relação é o próprio curso oferecendo benfeitorias para o local. Por exemplo, se for um curso de construção de bicimáquinas ou forno de barro, o resultado da prática pode ser deixado no espaço. Assim, conseguimos ir além de uma economia convencional, que não valoriza as diversas inteligências e recursos que temos na convivência humana.

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ÍNDICE DE FIGURAS

Swale: adaptação de ilustração encontrada em: MOLLISON, B. Introduction to Permaculture. Geodésica: http://www.armazemdoeucalipto.com.br/wpcontent/uploads/2015/08/geodesica.jpg Pousada: http://aneverde.blogspot.com.br/ Residencia: https://www.facebook.com/tababambu/ Tevap esquema: http://www.ecoeficientes.com.br/new/wpcontent/uploads/2013/04/TEVAP.jpg Tevap pronta: https://plus.google.com/+ArquiteturaEcol%C3%B3gicaPHILaur odeFreitas/posts/46esnERU2ms Bananeira agua cinza: http://www.yourhome.gov.au/water/wastewater-reuse Laguinhos: http://aguapeengenharia.com.br/ ; http://magiadequintal.blogspot.com.br/2014/07/larecologico-2-tratamento-de-aguas.html Caixa jataí: http://meliponariodaserra.blogspot.com.br/ < Sumário

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