JORNAL 1162

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JORNALDA

S.O.S. ENSINO REMOTO LINKS PARA OS VÍDEOS: PARTE 1: youtu.be/7ttsvI6jccA PARTE 2: youtu.be/ABmao8VXPLk

1162 . 14 de janeiro de 2021 . www.adufrj.org.br . TV ADUFRJ: youtube.com/adufrj

PARTE 3: youtu.be/qFFfmdgDU6Y

NO FIM DA FILA PELA VACINA, BRASIL ESPERA PLANO DE IMUNIZAÇÃO Página 3

NOVAS FORMAS DE

RESISTENCIA

O presidente Jair Bolsonaro já interferiu na escolha de reitores em 19 instituições federais de ensino superior, nomeando para o cargo os segundos ou terceiros colocados nas listas tríplices, ou até mesmo indicando dirigentes que sequer tiveram seus nomes submetidos aos colegiados. Só que as comunidades universitárias não estão passivas diante desses ataques. Contra a intervenção, novas frentes de mobilização vêm sendo construídas para garantir a autonomia das instituições, como mostra o Jornal da AdUFRJ em uma série de reportagens a partir desta edição. No primeiro capítulo, conheça a inovadora gestão compartilhada da Federal de Pelotas, e os enfrentamentos contra o arbítrio na UFPB e na UFRGS. Resistir é preciso. Páginas 4 e 5


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QUINTA-FEIRA, 14.1.2021

JORNALDAADUFRJ #OrgulhoDeSerUFRJ

EDITORIAL

VACINA JÁ, UNIVERSAL E GRATUITA! HIPPERTT

DIRETORIA

A

OFÍCIO DA PREFEITURA DE MACAÉ CAUSA POLÊMICA

grande palavra de ordem hoje é garantir e proteger a vida. Temos o SUS, com capilaridade nacional, temos instituições e história de grandes e eficientes campanhas de vacinação, temos profissionais qualificados. Estamos sucumbindo a uma pandemia, mas não porque não tenhamos condições de enfrentá-la, mas sim porque estamos submetidos a uma política de destruição nacional. Não é só a estupidez que habita o Palácio do Planalto. Parece que o horror que atravessamos tem método, tem propósito. A irresponsabilidade chega a proporções gigantescas, envolvendo os milhões de jovens que aguardam a realização do Enem e não têm até o momento nenhuma certeza de que as provas se realizarão com as condições mínimas de segurança sanitária. Começamos a esboçar um movimento nacional, que nos próximos dias deve se intensificar, para garantir a vacinação universal

n Um ofício da Secretaria

Esse é o convite para a ação nesses primeiros dias de janeiro: vamos construir as condições para que o SUS possa cumprir o seu papel, para que tenhamos uma grande campanha nacional de vacinação, como já fizemos tantas vezes antes. e gratuita a toda a população. Trata-se de enfrentar dois grandes desafios: vencer um governo que tem sido empurrado a tomar decisões que já demonstrou não acreditar e convencer uma parte da população, descrente ou desinformada, que também resiste à ideia da vacinação obrigatória. Esse é o convite para a ação nesses primeiros dias de janeiro: vamos construir as condições para que o SUS possa cumprir o seu papel, para que tenhamos uma grande campanha nacional de vacinação, como já fizemos tantas vezes antes. As entidades sindicais, as associações científicas, movimentos sociais, organizações e instituições de vários tipos, secretarias municipais e estaduais de Saúde, conselhos, estamos todos a exigir que o Estado cumpra com suas funções constitucionais. Até mesmo os órgãos da grande imprensa vêm se juntando nesse esforço. E que este seja apenas um ensaio do que está por vir: uma grande mobilização nacional capaz de dar forma e força à luta democrática pela transformação desse país. Mesmo que não tenhamos muitas razões para olhar com otimismo para o que temos pela frente, ainda mais se considerarmos o

fechamento de fábricas, demissões em massa no Banco do Brasil e tantas outras indicações que beiramos a uma verdadeira hecatombe econômica, ao menos distinguimos no horizonte novas possibilidades de enfrentamento. As universidades vão buscando formas de resistir às investidas autoritárias do governo, as frentes começam a se formar. Sem ilusões ou falsas esperanças, mas com a convicção de quem está enfrentando esse governo desde o seu início, o campo da Educação tem conseguido impor a ele algumas derrotas. E elas vieram sempre que marchamos juntos. Pois que seja essa a nossa lição para os dias de hoje: seja lá onde estivermos, estejamos juntos em defesa da vida.

Municipal de Educação de Macaé, no apagar das luzes de 2020, surpreendeu as direções da UFRJ e da UFF na cidade. O documento, datado do dia 30, solicitava a desocupação de salas utilizadas pelas duas universidades no prédio da antiga Fundação Educacional de Macaé (Funemac), na Cidade Universitária, até o dia 4. A UFRJ perderia salas dos professores dos cursos de Engenharia, Enfermagem, Farmácia, Medicina, Nutrição e Química, além de laboratórios de ensino e pesquisa, e locais de guarda de materiais administrativos e didáticos. A prefeitura alega não se tratar de um despejo, e sim uma realocação de espaços, para abrigar a sede da secretaria no local. Mas não foram apresentadas garantias dessa realocação. “O pleito da prefeitura de ocupar o prédio para ser a sede da sua Secretaria de Educação é justo. Mas a decisão foi tomada com pouca habilidade política, faltou diálogo”, comenta o professor Jackson Menezes, diretor da AdUFRJ. As reitorias da UFRJ e da UFF vão se reunir com a prefeitura de Macaé nesta sexta (15), às 10h, para discutir o problema.

VACINAÇÃO JÁ PARA TODOS

PROFESSORES PODEM SOLICITAR KITS DE MÁSCARAS DA AdUFRJ

O ano começa com a mobilização das centrais sindicais e entidades estudantis e de servidores em defesa da vida. Enquanto 51 países já vacinam contra a covid-19, o governo brasileiro ainda não definiu o calendário de imunização. “Nossa pauta é vacina para todos. No caso da Educação, não há condições de retorno presencial antes da vacina”, explica Duda Quiroga, diretora do Sepe-RJ e vice-presidente da CUT-RJ. Para chamar atenção para a reivindicação, atividades nacionais serão realizadas entre 25 de janeiro e 2 de fevereiro, quando deverá ocorrer a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado. “O Rio de Janeiro está abraçando esta campanha iniciada nacionalmente. A vacina é crucial”, afirma a presidente da AdUFRJ, professora Eleonora Ziller. Uma reunião virtual organiza os próximos passos da campanha no estado, dia 19.

A AdUFRJ distribuiu um kit de máscaras como brinde de fim de ano para os docentes. Receberam primeiro aqueles que estão com cadastro atualizado junto ao sindicato. Para quem ainda não ganhou, a solicitação dos kits pode ser feita por um formulário eletrônico disponível em https:// bit.ly/3mjPamI. No link, o docente deve informar o nome completo, números e e-mail de contato e o endereço. Cada kit tem três máscaras — nas cores amarela, verde e roxa —, feitas de tecido triplo com TNT, o que confere um alto grau de proteção contra o novo coronavírus. Além do logotipo do sindicato, as máscaras são estampadas com frases como: “Eu defendo a Educação”.


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À espera da vacina, país não tem plano de imunização > Especialistas analisam dados de eficácia da Coronavac, divulgados esta semana pelo Instituto Butantan, e alertam para a necessidade de uma estratégia nacional de vacinação contra a covid-19 SILVANA SÁ silvana@adufrj.org.br

A

notícia da semana foi o anúncio dos dados de eficácia da Coronavac, vacina desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo. O percentual de 50,38% de eficácia global quase bateu na trave do mínimo exigido pela Organização Mundial da Saúde, que é de 50%. No entanto, não é para ele que devemos olhar, na opinião do professor Paulo Nadanovsky, do Departamento de Epidemiologia do Instituto de Medicina Social da Uerj. “O que mais interessa são os 78% que fazem parte dos números anunciados”, afirma. O percentual indica que somente 22% dos vacinados que desenvolveram a doença precisaram de algum tipo de assistência médico-ambulatorial. “Neste momento de total descontrole da pandemia, isso é muito bom, porque reduz o estresse dos serviços de saúde”, avalia. Em relação ao anúncio de 100% de proteção contra internações para tratamento de casos moderados e graves, o epidemiologista, que também é pesquisador da Fiocruz, se mantém reticente. “Houve sete casos no grupo que tomou placebo, contra zero no grupo que tomou a vacina. Não há dados estatísticos suficientes”. O pesquisador compara o cenário com dois candidatos a eleições. Um deles tem 28% das intenções de voto e o outro, 26%. A margem de erro, ou intervalo de confiança, é de 4 pontos percentuais para mais ou para menos. “Neste exemplo, os candidatos estão empatados. Não há como afirmar quem ganha. É o mesmo no caso desses 7 a 0. Os intervalos de confiança estão totalmente sobrepostos”, afirma. O professor Herbert Guedes, do Instituto de Microbiologia Paulo de Goés, concorda. “O número de casos graves foi muito pequeno no estudo. Estatisticamente não há como ter certeza do dado. Quando passarmos à fase 4, que é a de vacinação para amplo número de pessoas, é que vamos poder comparar e ter clareza sobre isso”, diz ele, que é especialista em vacinas e imunização. Para Guedes, uma vacina com 50% de eficácia já é uma ferramenta muito importante. “Vai nos ajudar a sair deste momento de emergência.

STATUS DE DOCUMENTAÇÃO DAS VACINAS NA ANVISA A Anvisa liberou o acesso ao acompanhamento das análises de documentações referentes a quatro vacinas: Fiocruz/Astrazeneca, Butantan/Sinovac (Coronavac), Janssen e Pfizer. Os números se referem à última atualização publicada pela agência, no dia 14, data de fechamento desta edição.

%

40,92

%

32,6

%

21,67

33,26

49,02

Concluído

34,38

Em análise:

Os dados em relação aos casos graves podem indicar uma tendência que, se confirmada, será algo fantástico. O que queremos é salvar vidas”, afirma. Clarissa Damaso, professora do Laboratório de Virologia Molecular do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, reforça que o Brasil precisará de uma cobertura vacinal grande, bem acima dos 70%, para gerar a chamada ‘imunidade de rebanho’. “Precisamos de ampla cobertura para controlarmos a pandemia”, alerta. “O ideal seria começar a imunização para todos, mas infelizmente será preciso fazer escolhas porque não teremos vacinas suficientes”, completa a virologista. VACINA ESTERELIZANTE Uma estratégia de vacinação bem estabelecida precisa do maior número de dados possível e, até agora, nenhum dos estudos disponibilizou informações suficientes para se saber, por exemplo, se os imunizantes são ou não do tipo esterelizante. Ou seja, se garantem que o indivíduo vacinado não transmita mais o vírus ou se agem apenas contra o desenvolvimento da doença em pessoas infectadas. “Se tivermos respostas de que alguma vacina evita a transmissão do vírus, pode-se pensar

FIOCRUZ/ASTRAZENECA

18,38

JANSSEN

29,58

48,75

10,21

%

BUTANTAN/SINOVAC

25,82

5,2

PFIZER

50,21

Pendente de complementação

Não apresentado

em estratégias interessantes de imunização, combinando dois tipos. Por exemplo, destinar uma vacina para grupos que mais circulam na cidade e focar outra, que proteja mais contra casos graves, em idosos e pessoas com comorbidades”, sugere o epidemiologista Paulo Nadanovsky. “Isso pode reduzir bastante o tempo de saída da pandemia”, acredita o pesquisador. “Mas, para isso, precisamos de mais vacinas e de mais informação”. Para a professora Clarissa Damaso, a única forma de saber se uma vacina bloqueia a transmissão do vírus na fase dos testes clínicos seria fazendo o acompa-

Dados insuficientes

nhamento dos voluntários com swab recorrentemente, para ver se eles teriam o vírus nas vias aéreas. “Isso demandaria mais tempo. Sobretudo num país como o nosso, que já não está conseguindo testar sua população, atrasaria muito a vacina”, explica a professora. Mas, caso não haja o bloqueio do vírus, esta não será uma exclusividade das vacinas contra a covid-19. Há vacinas contra o sarampo e a poliomielite, por exemplo, que também não bloqueiam a transmissão dos vírus, apenas impedem o desenvolvimento das doenças. Exatamente por isso, quando a cobertura va-

FIOCRUZ QUER ENTREGAR 30 MILHÕES DE DOSES EM FEVEREIRO Apesar do erro que levou a AstraZeneca e seus parceiros a refazerem os testes da fase 3 – foram aplicadas duas doses inteiras em um grupo de voluntários e uma dose e meia em outro grupo –, a Fiocruz já começou a desenvolver o imunizante. A documentação está sendo analisada pela Anvisa. De acordo com a agência, nenhum dado deixou de ser enviado, mas cerca de 18% ainda

precisam de complementação. A expectativa é que a Anvisa finalize a análise dos documentos ainda esta semana e autorize o uso da vacina a partir do dia 18. E a Fiocruz estima que possa entregar 30 milhões de doses no mês que vem. Como o estoque inicial ainda será baixo, especialistas discutem o uso das vacinas que estiverem disponíveis em uma dose só ou em duas doses mais espaçadas, com intervalos de até três meses.

cinal cai, essas e outras enfermidades consideradas erradicadas voltam a surgir. Portanto, distanciamento social, uso de máscaras e higienização das mãos continuarão sendo necessários, mesmo após a vacinação. “Ainda precisaremos de estratégias para proteger os grupos que não estarão imunizados, como crianças, adolescentes e gestantes, já que os testes ainda não foram realizados nesses grupos”, afirma a docente. BRASIL NO FIM DA FILA Até o momento, 51 países já iniciaram a vacinação contra a covid-19. Mas o Brasil ainda não tem data nem plano para que isso ocorra. Na última segunda-feira (11), o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, afirmou que a imunização dos brasileiros acontecerá “no dia D, na hora H”. Dois dias depois, voltou atrás e afirmou que a vacina começará a ser distribuída ainda em janeiro. E em encontro com prefeitos, nesta quinta-feira (14), o general disse que a vacinação pode começar na quarta-feira que vem (20). Diante de tantas incertezas, dois milhões de doses da vacina da AstraZeneca deverão chegar nos próximos dias, vindas da Índia. Essas doses são capazes de imunizar menos de meio por cento da população. Além da AstraZeneca, que tem a Fiocruz como produtora do imunizante no Brasil, o governo federal firmou acordo com o Instituto Butantan. As duas instituições já solicitaram à Anvisa a autorização para uso emergencial das vacinas. Segundo a agência, cerca de 20% das informações encaminhadas ainda precisam de complemento. O andamento dos processos é atualizado diariamente. Já a Pfizer e a Janssen ainda não pediram o uso emergencial, mas as documentações vêm sendo analisadas em processo de submissão contínua. A estratégia ajudaria a ampliar o alcance da primeira dose a um grupo maior de pessoas. “Como vacinologista, sempre defendo duas doses, porque amplificam a resposta imunológica”, acredita o professor Herbert Guedes. “A estratégia pode funcionar e garantir algum grau de imunização a um número maior de indivíduos”, considera. “Mas é preciso que tenham sido feito estudos que respondam ao percentual de imunização da primeira dose. A decisão precisa se basear em dados”.


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CONTRAAINTERVENÇÃO

RESISTÊNCIA POR AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA TOMA O PAÍS LUCAS ABREU lucas@adufrj.org.br

Já são 19 universidades e institutos federais que sofreram intervenção no governo Bolsonaro. O modus operandi, em geral, é o mesmo: o presidente desrespeita a consulta pública e os votos dos colegiados universitários, e escolhe candidatos menos votados, normalmente figuras alinhadas à sua política de desmonte da educação pública, na lista tríplice enviada pelas instituições ao MEC. Isso quando não nomeia quem sequer participou do processo — caso da UFGD, por exemplo — ou designa um reitor

pro tempore, como fez na UFS. Mas a última intervenção, ocorrida semana passada na Universidade Federal de Pelotas, seguiu outro script. Bolsonaro nomeou como reitora a segunda colocada da lista tríplice, Isabela Fernandes Andrade. Ele fez parte da chapa eleita pela comunidade, e seria pró-reitora da nova gestão. A universidade decidiu então que Isabela e o professor Paulo Roberto Ferreira Júnior, o mais votado na lista tríplice, farão a gestão compartilhada da reitoria. A partir dessa inovadora forma de resistência, o Jornal da AdUFRJ começa nesta edição uma série de reportagens sobre o cenário em algumas dessas instituições sob intervenção, mostrando como a autonomia universitária está sob ataque.

PELOTAS INOVA COM DUPLA NA GESTÃO COMPARTILHADA

INTERVENTÔMETRO

A chapa UFPel Diversa, que tinha o professor Paulo Roberto Ferreira Júnior como candidato a reitor, teve 56% dos votos na consulta pública. Diante do risco de ter a universidade sob o controle do governo, o Conselho Universitário e os concorrentes no pleito concordaram que o colegiado votaria apenas em membros da chapa vencedora. Paulo teve 56 votos. A professora Isabela Fernandes de Andrade ficou em segundo lugar, com seis votos, e Eraldo Pinheiro, com dois. Isabela foi a escolhida pelo presidente Jair Bolsonaro. A comunidade acadêmica inovou na resposta a mais esse ataque à autonomia universitária e decidiu que a UFPel terá dois reitores: Isabela, a nomeada, e Paulo, o mais votado, vão compartilhar a gestão no período 2021-2025. Oficialmente, Paulo Roberto Ferreira Júnior vai assumir a pró-reitoria de Planejamento, cargo que seria de Isabela, mas a intenção é que os dois trabalhem em conjunto à frente da universidade. Isabela como gestora oficial e Paulo como

representante político da comunidade. “Não era a minha intenção assumir a reitoria da universidade”, explicou a professora em uma transmissão ao vivo realizada pela UFPel no último dia 7. “Lamento pela não nomeação do reitor eleito desta universidade. “A partir de amanhã, Paulo e eu estaremos juntos na reitoria da Universidade Federal de Pelotas em uma soma de reitora nomeada com reitor eleito, fazendo uma gestão a quatro mãos, colaborativa, compartilhada”, explicou. A transmissão foi conduzida pelo então reitor da UFPel, Pedro Hallal, no último dia do seu mandato. Paulo Roberto Ferreira Júnior também participou do evento e começou a sua fala dizendo que a universidade foi golpeada pelo governo federal, mas clamou pela união da comunidade universitária. “O governo e seus asseclas tentam, com essa nomeação, gerar conflito, dúvida e desunião na nossa comunidade, não podemos permitir que isso aconteça. Segundo o professor, é uma tradição da UFPel que a lista trí-

A comunidade da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) respirou aliviada esta semana. Após acompanhar intervenções do governo em instituições coirmãs da capital do estado (UFRGS) e na vizinha Pelotas (UFPel), um decreto publicado nesta quinta-feira (14) trouxe a nomeação do professor Danilo Giroldo para a reitoria. Giroldo foi o candidato a reitor mais votado no Colégio Eleitoral da FURG e integrou a chapa escolhida pela comunidade acadêmica, em consulta realizada no mês de outubro. O professor assume a gestão por quatro anos em solenidade que será marcada nos próximos dias. Também esta semana, foi oficialmente encerrada uma intervenção no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN). O professor José Arnóbio de Araújo Filho, escolhido pela comunidade acadêmica, assumiu a reitoria do IFRN no lugar de um pro tempore indicado pelo MEC. A nomeação atendeu a uma decisão da Justiça Federal. O MEC alegava que Arnóbio não poderia assumir o cargo por estar respondendo a um processo administrativo. O Ministério Público Federal discordou da pasta da Educação, mas o impasse durou oito meses até ser resolvido.

plice seja sempre composta por membros da chapa vencedora na consulta pública. “Sempre fomos precavidos quanto à nomeação de um reitor que fosse desalinhado com a proposta escolhida pela comunidade”, contou. Paulo ainda reforçou o seu compromisso com o programa eleito e com seu grupo. “Trabalhamos juntos e construímos esse projeto juntos. Somos um grupo que tem um reitor eleito e uma reitora nomeada, e temos um programa de gestão escolhido democraticamente pela comunidade”, afirmou Paulo, pedindo o apoio de toda a universidade. Alguns setores da UFPel se insurgiram contra a intervenção, e não receberam bem a forma de resistência com dois reitores compartilhando a gestão. “Nós estamos rompendo com o princípio da autonomia universitária, estamos aceitando um interventor”, disse a presidente da ADUFPel, Celeste Pereira. “A professora Isabela não concorreu no processo eleitoral. Em que pese que ela seja uma pessoa do mesmo campo

político do reitor eleito, ela está passando pelo mesmo processo, como interventora, que qualquer outro nome”, explicou a professora. Para o sindicato, a nomeação de alguém que não venceu a eleição é uma intervenção por princípio. Mas Celeste sabe que a oposição a ser feita deve ser contra a intervenção, e não contra a professora nomeada. “Para nós, o papel das entidades de classe é defender princípios. A escolha de uma gestão compartilhada é da gestão, e as entidades não foram consultadas a esse respeito”, disse a professora. “Estamos em assembleia permanente, e o nosso debate é exatamente esse: a nossa oposição não é a Isabela, mas ao processo. Não queremos um interventor na universidade”. De acordo com a professora Celeste, o DCE e o sindicato dos técnicos da UFPel (ASUFPel) compartilham da mesma posição, e as três entidades vão trabalhar em conjunto para enfrentar a intervenção. “Estamos organizando algumas manifestações contra

a intervenção, não contra a professora Isabela. É pela garantia do direito constitucional da autonomia da universidade pública e da democracia”, relatou. A decisão de ter dois reitores é inédita. Segundo o professor de Direito Constitucional da UFRJ, Luigi Bonizzato, as universidades têm em suas estruturas administrativas pró-reitores justamente para que o trabalho do reitor seja dividido, e Paulo Roberto Ferreira Júnior assumir uma pró-reitoria o coloca na estrutura administrativa da UFPel. “Dentro da universidade, do corpo social, não podemos impedir que o professor Paulo também seja considerado um reitor”, explicou o professor. Para ele, a princípio, a separação clara entre as responsabilidades legais e políticas dos dois reitores não deve criar problemas legais, mas o ineditismo da situação não permite uma resposta contundente sobre a segurança jurídica do arranjo. “Evidentemente existem questões políticas e de direito que ora se entrelaçam, e ora se unem. E esse é um exemplo claro disso”, disse.

(18) SOFRERAM INTERVENÇÃO: Nomeado o 2º colocado: UFES – UFTM – IFSC – UFPI – UFpel Nomeado o 3º colocado: Unifesspa – UNIFEI – UFRGS – UFFS – UFRB – UFC – UFERSA – UFVJM – UFPB Nomeado não participou do processo: UNIVASF – UFGD Nomeado de fora: CEFET-RJ

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(1) Designada reitora pro tempore: UFS (1) CASO SINGULAR: UNIRIO – nomeado não participou da consulta, mas venceu no Colégio Eleitoral

? (2) AGUARDAM DECISÃO DO PRESIDENTE: UFSCAR – IF FARROUPILHA

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CONTRAAINTERVENÇÃO NATHALIA WILLIANY

INTIMIDAÇÃO É ARMA DE INTERVENTOR DA UFPB O interventor da Universidade Federal da Paraíba não teve nenhum voto no colégio eleitoral, e mesmo assim foi nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro. Na consulta pública e no colegiado, a vencedora foi a professora Terezinha Martins, com 46% dos votos na consulta e 47 votos no colégio eleitoral. O interventor nomeado, Valdiney Veloso Gouveia, que passou em branco no colégio eleitoral, teve apenas 5% dos votos na consulta pública. Seu nome só constou na lista tríplice graças a uma decisão judicial, que está sendo contestada pela ADUFPB. Valdiney foi nomeado no começo de novembro passado e, desde então, vem tentando intimidar setores da universidade e atacar direitos de professores e servidores. “Há muita insatisfação e indignação da comunidade universi-

tária em todos os setores, de docentes, técnicos e estudantes”, contou o presidente da ADUFPB, Fernando Cunha. “Junto com sua equipe de assessores e o procurador da universidade, ele tentou intimidar o sindicato, para impedir uma atividade de paralisação”, lembrou Fernando. “O procurador disse que não recebeu a nossa notificação e disse que ia cortar nosso ponto. Mas era uma bravata”. O professor diz ainda que o procurador tentou intimidar um centro acadêmico e o movimento estudantil da universidade. A reitoria também tentou incriminar estudantes que ocuparam o acesso à reitoria em uma manifestação contra a intervenção. A truculência do interventor é uma tentativa de calar a ruidosa oposição contra ele na UFPB. “Nós fizemos três atos públicos, cada um com mais de duas mil

pessoas, fizemos uma vigília virtual contra a intervenção”, relatou Fernando Cunha. Mas o dirigente sindical reconhece que os atos aconteceram em outro momento da pandemia, quando o número de casos no estado era estável. “Esse é um enorme desafio. Estamos procurando outros caminhos de mobilização e organização”, disse o professor. “Nós vamos fazer uma assembleia no início de fevereiro e vamos nos reunir com outras lideranças da UFPB para pensar nessa estratégia”. Valdiney tem um perfil alinhado ao governo federal de desmonte das universidades e adesão ao programa Future-se — iniciativa proposta pelo MEC, na gestão do funesto ministro Abraham Weintraub, para que as instituições federais de ensino busquem recursos privados para se manter. Uma das deci-

NATHALIA WILLIANY

sões tomadas pelo interventor foi emitir um boletim que desfazia progressões funcionais, desde 2015, de mais de 300 professores, sob pena de devolução de recursos pelos docentes. “Acionamos nossa assessoria jurídica e vamos à Justiça para

brigar por esse direito”, contou Fernando Cunha. Para o dirigente sindical, a medida foi uma maneira de remanejar recursos com o corte de orçamento. “Assim, ele mantém a atividade e se sai bem com o governo federal”. O interventor tentou reiniciar as aulas presenciais, passando por cima dos conselhos superiores da universidade, mas voltou atrás ao perceber que não teria força contra os colegiados. A relação de Valdiney com o Conselho Universitário é turbulenta. “Nós temos conseguido conter as decisões arbitrárias dele”, contou Clodoaldo Gomes, representante do sindicato dos técnicos no conselho. “Ele tem adotado uma postura de desqualificar os conselheiros, alegando que suas posturas são ideológicas. Como se ele fosse ideologicamente neutro, mas ele não é”, disse Clodoaldo.

CONSELHO UNIVERSITÁRIO ENFRENTA ATAQUES NA UFRGS DIVULGAÇÃO

Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o reitor Rui Oppermann foi reeleito na consulta pública e no Conselho Universitário, onde recebeu 45 votos. Mesmo assim, o presidente Bolsonaro escolheu o professor Carlos Bulhões, o terceiro lugar da lista, que recebeu apenas três votos. Bulhões foi nomeado em setembro passado, e desde então vem tentando, de maneira arbitrária, implantar na universidade o projeto de destruição defendido pelo governo federal. “Estamos observando uma desconstrução da administração da universidade. O interventor está tomando atitudes que são contrárias ao estatuto e promovendo mudanças que resultam em uma fragilização da UFRGS como universidade

de ponta”, contou o reitor eleito Rui Oppermann. Uma das mudanças mais significativas que o interventor fez foi fundir as pró-reitorias de Graduação e Pós-Graduação. “A UFRGS tem uma pós-graduação muito forte, e que precisa da autonomia de uma pró-reitoria para a sua expansão. E agora a vemos transformada em um departamento sem nenhuma justificativa”, explicou o professor. De acordo com Rui Oppermann, as mudanças na estrutura da UFRGS são feitas com a justificativa de “dinamizar a gestão”. “Eles ainda estão fazendo uma gestão por inércia, com base no que deixamos pronto. Mas agora eles terão que colocar as suas posições mais claramente”, explicou Rui, que

defende que nesse momento o movimento de oposição à intervenção vai precisar agir. E a oposição ao interventor está atenta. “Cabe ao sindicato encaminhar as nossas lutas, mantendo a nossa postura contrária à forma como ele foi nomeado, e defender a autonomia da universidade”, explicou o professor Lúcio Vieira, presidente da ADUFRGS. A pandemia obriga a se pensar em novas maneiras de fazer atos políticos. “A pandemia é um grande dificultador das mobilizações”, explicou o professor. “O que temos feito é manifestado nosso descontentamento às mudanças que estão sendo colocadas pelo interventor”, relatou. Para Lúcio, o Conselho Universitário tem sido uma instância importante

de enfrentamento. “Nós temos um conselho muito identificado com a autonomia universitária”. A professora Márcia Barbosa compõe o Conselho Universitário (Consun) da UFRGS e contou que, além de fundir as pró-reitorias de Graduação e Pós-Graduação, o interventor criou uma pró-reitoria de Inovação, e só depois convocou uma reunião do colegiado. “Ele não pode mudar a estrutura da universidade, essa estruturação é

do Conselho Universitário”. Mas, de acordo com a conselheira, as reuniões virtuais do Consun não estão sendo um espaço para um debate amplo e democrático. “O interventor estabeleceu um limite de tempo para toda reunião. Como ele é presidente da mesa, começa com assuntos pouco importantes, uma enrolação”, relatou a professora. “Se fosse presencialmente, a pressão para não encerrar a reunião seria diferente, mas na reunião virtual ele simplesmente derruba a conexão quando dá a hora estipulada”. A estratégia do interventor impede que temas relevantes que o desagradem sejam votados. “Toda reunião é tensa e algumas discussões levam várias semanas”, desabafou.


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MEC ignora riscos do Enem e expõe milhões à covid-19 > Ministério decide manter datas de aplicação das provas em cenário de alta da pandemia. Para entidades científicas, insistência do governo poderá impulsionar ainda mais a incidência da doença FERNANDO FRAZÃO/AGÊNCIA BRASIL

ELISA MONTEIRO elisamonteiro@adufrj.org.br

E

m meio a uma nova onda de covid-19 e de saturação dos leitos hospitalares em todo o país, o Ministério da Educação decidiu manter o calendário para a realização das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), órgão que coordena o Enem, 6,1 milhões de candidatos serão mobilizados nos dias 17 e 24 de janeiro. “É óbvio que ninguém quer ficar adiando o Enem por tempo indeterminado, mas o MEC não se moveu como seria necessário para garantir segurança para a saúde da população e criou uma instabilidade entre os participantes, em um momento que cresce a contaminação”, afirmou o presidente da União Nacional dos Estudantes, Iago Montalvão, em seu perfil no Twitter. “Por isso, adia Enem 2020”, completou. O apelo dos estudantes não é à toa. Em maio de 2020, quando os reitores de institutos e universidades federais do Rio de Janeiro — incluindo a UFRJ — solicitaram o adiamento do Enem, pela primeira vez, o Brasil contabilizava 120 mil infecções e oito mil mortos por covid. Agora, são mais de 200 mil mortos e oito milhões de infectados. A pandemia vitimou o próprio diretor de Avaliação da Educação Básica do INEP, Carlos Roberto Pinto de Souza, na segunda-feira (11). Em alguns estados do Norte, a situação é dramática — a Justiça Federal do Amazonas decidiu suspender a aplicação do Enem naquele estado, mas o MEC avisou que vai recorrer. Em nota assinada ao lado da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e da Associação Nacional de Pós-Graduandos, a UNE deixa claro que o Enem e os demais programas de acesso à universidade “são importantes e não podem ser enfraquecidos”. “Acreditamos que a necessidade de adiamento do Enem é fruto da falta de organização e transparência do MEC, e serviria para a criação de uma estratégia efetiva de garantia da segurança sanitária para realização da prova, sem prejuízos para os instrumentos de seleção como o SISu, Prouni e Fies”, diz o trecho final do texto. A AdUFRJ participou da mo-

AGLOMERAÇÃO na Uerj, no Enem/2019. MEC diz que haverá medidas de biossegurança. Entidades científicas dizem que não serão suficientes

O MEC não se moveu como seria necessário para garantir segurança para a saúde da população e criou uma instabilidade entre os participantes” IAGO MONTALVÃO Presidente da UNE

Não faz sentido algum essa insistência com janeiro” EDUARDO MORTIMER Coordenador do GT de Educação Básica da SBPC

bilização contra a realização das provas, no ano passado. Uma das ações foi a projeção da hashtag #AdiaEnem em paredões da cidade. Pressionado pela opinião pública, o pior ministro da história, Abraham Weintraub, também teve de recuar da aplicação do Enem em novembro. O anúncio de retomada do

calendário das provas em janeiro mobilizou a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped) e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Com apoio de outras 45 entidades científicas e acadêmicas do país, elas enviaram uma carta ao ministro da Educação, Milton Ribeiro, solicitando a postergação das provas. Segundo um dos trechos, para um momento em que os “índices de transmissão e a capacidade de resposta dos serviços de saúde estejam dentro de níveis aceitáveis”. A carta ressalta “a crescente incidência da covid-19 no último mês” e a previsão de que haverá um salto dos números nas próximas semanas, devido às festas de fim de ano. Professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenador do Grupo de Trabalho de Educação Básica da SBPC, Eduardo Mortimer critica a exposição prolongada dos estudantes. “Estão falando em trinta pessoas por sala com uso de ventiladores. Quem conhece as escolas públicas sabe que as condições estão muito longe das ideais”. Para o docente, apesar de o ministro Milton Ribeiro garantir que todos os cuidados de biossegurança possíveis estão sendo tomados, “não há sinalizações de ações concretas nessa direção”. Mortimer frisa que a consulta online promovida pelo pró-

prio Ministério da Educação em 2020 apontou para o mês de maio de 2021 como nova data para a realização da prova. “Não faz sentido algum essa insistência com janeiro”, opina. CAp É FAVORÁVEL AO ADIAMENTO O Colégio de Aplicação da UFRJ tem 91 estudantes no terceiro ano do ensino médio. Os alunos farão a prova do INEP, mas a escola é favorável ao adiamento do exame. “Não é razoável aplicar uma prova de tantas horas, no calor do Rio de Janeiro, sem refrigeração. O Enem, em condições normais, já é um momento de muita tensão”, argumenta a vice-diretora da escola, professora Cristina Miranda. Em sua avaliação, o calendário do Enem atende à demanda da iniciativa privada para “garantir o fluxo de matrículas”. Cristina lembra a posição do Conselho Nacional de Secretá-

rios de Saúde (Conass) que solicitou ao ministro da Educação, Milton Ribeiro, na terça-feira (12), o adiamento do Enem. “Se eles, que estão com as planilhas de transmissão nas mãos, pedem que a prova seja adiada é porque a situação é muito grave”, diz. Além dos riscos de contaminação, há o risco de explosão da desigualdade educacional. Boa parte dos jovens brasileiros ficou sem aulas ao longo de 2020. “O CAp foi uma das poucas escolas públicas que conseguiu garantir as atividades de maneira remota”, acrescenta Cristina. A docente afirma que os dois editais de auxílio emergencial e para compra de equipamentos da reitoria foram importantes para garantir as atividades remotamente. Segundo o professor Ulisses Dias da Silva, da Direção Adjunta do CAp, oito alunos foram contemplados pelo benefício.

UFRJ NÃO VAI SEDIAR EXAME Caso sejam mantidas as datas do Enem, a UFRJ não estará entre os locais de aplicação das provas. De acordo com o prefeito universitário, Marcos Maldonado, a universidade chegou a ser sondada pela Fundação Cesgranrio para receber 2,5 mil estudantes em salas do Centro de Tecnologia, Centro de Ciências Matemáti-

cas e da Natureza e Faculdade de Letras, no campus do Fundão. O plano logístico da Prefeitura Universitária incluía a redução do intervalo de circulação dos ônibus internos de dez em dez para três em três minutos, reforço da vigilância, sinalização com placas e distanciamento nas salas. Mas a negociação não avançou.


QUINTA-FEIRA, 14.1.2021

JORNALDAADUFRJ

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#OrgulhoDeSerUFRJ FOTOS: DIVULGAÇÃO

PARA INTERPRETAR OS SINAIS DO MAR > Acordo técnico com a participação da UFRJ prevê melhorias no monitoramento da costa do Rio de Janeiro, o que beneficia a operação nos portos do estado e a prática de esportes náuticos KIM QUEIROZ comunica@adufrj.org.br

A

s condições meteorológicas e oceanográficas se tornarão mais acessíveis para os portos do estado do Rio de Janeiro em 2021. A Companhia Docas do Rio de Janeiro (CDRJ) firmou um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com o Sistema de Monitoramento da Costa Brasileira (SiMCosta), sob coordenação da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e com o suporte da UFRJ. A parceria nasce da necessidade de aprimorar o monitoramento marítimo e de fortalecer a rotina de manutenção das boias meteo-oceanográficas, que são utilizadas pelo SiMCosta. “Para atingir um outro padrão de certificação internacional dos portos do Rio de Janeiro, a CDRJ sugeriu fazer esse acordo técnico-científico. A FURG tem a propriedade física de todas as boias, coordena o SiMCosta a nível nacional, e dá todo o apoio logístico. A UFRJ faz a parte operacional de manutenção aqui no Rio. E Docas dará o apoio náutico”, explica o professor Mauro Cirano, do Departamento de Meteorologia da UFRJ. Os dados adquiridos pelos equipamentos são transmitidos via celular ou satélite para o servidor da FURG, e logo são disponibilizados gratuitamente e em tempo real no portal do SiMCosta (http://www.simcosta.furg.br/home). Coordenador do SiMCosta no Rio de Janeiro, Mauro destaca que a parceria traz ganhos para ambas as partes. “A CDRJ

vai prover as embarcações de apoio que a gente precisa para a manutenção estrutural dos fundeios. Em contrapartida, as universidades vão divulgar os dados”, conta. Os dados meteo-oceanográficos próximos da Baía de Guanabara serão importantes para a implementação do sistema de calado dinâmico no Porto do Rio de Janeiro. A nova parceria promete contribuir muito com o cotidiano operacional dos serviços portuários. “Antes de qualquer operação para embarcar em um navio, a praticagem utiliza esses dados para saber em tempo real quais as condições de onda, vento e corrente”, exemplifica Mauro. “A outra função é para melhorar o que chamamos de calado dinâmico. Com base nessas medições, conseguimos otimizar a máxima profundidade permitida para os canais de acesso, fazendo com que navios de maior calado possam entrar no porto”, completa. Fernando Barberini, doutorando do Programa de Engenharia Oceânica da Coppe-UFRJ, contribui com a operacionalização das boias no Rio. “Quando não há nenhuma emergência, a gente faz uma manutenção mensal. Mas dependemos sempre das condições do tempo e do mar”, aponta o pesquisador. A periodicidade mensal é adotada para que os sensores possam sempre realizar medições de qualidade. Além de consolidar essa revisão mensal dos equipamentos, o acordo com a CDRJ inclui a compra de mais uma boia, que fornecerá novos dados para o sistema. LEGADO OLÍMPICO O monitoramento na costa do Rio de Janeiro começou em 2015. “Essas boias são um lega-

Antes de qualquer operação para embarcar em um navio, a praticagem utiliza esses dados para saber em tempo real quais as condições de onda, vento e corrente (...) A outra função é para melhorar o que chamamos de calado dinâmico” MAURO CIRANO Professor de Meteorologia da UFRJ e coordenador do SiMCosta no Rio de Janeiro

do dos Jogos Olímpicos de 2016, adquiridas com recursos do Fundo Clima”, lembra Mauro. As manutenções, realizadas pela equipe técnica do SiMCosta-RJ desde o lançamento das boias, se caracterizam pelo desligamento e retirada dos sensores oceanográficos para a manutenção em terra. Já a inspeção é qualquer tipo de atividade realizada no local do fundeio, desde a limpeza dos sensores até o reparo de algum equipamento. Durante esse procedimento, todos os sensores permanecem ligados.

Inicialmente posicionadas na Baía de Guanabara, as duas boias do Rio de Janeiro foram então identificadas como RJ-1 e RJ-2. Com a transferência de uma para perto do Forte de Copacabana, e da outra para as cercanias da Ilha de Cotunduba, passaram a ser chamadas de RJ-3 e RJ-4, respectivamente. Além delas, o estado do Rio também conta com um marégrafo, equipamento que faz o monitoramento do nível do mar, instalado pelo SiMCosta na Diretoria de Hidrografia e Navegação da Marinha (DHN), em Niterói. Segundo Mauro, os dados fornecidos podem beneficiar a população em geral, com diferentes aplicações. “Depois que a ciclovia Tim Maia fechou, em razão do acidente, a prefeitura fez todo um estudo para utilizar as boias como um sistema de alerta para abertura e fechamento da ciclovia”, aponta. “Indiretamente, esses dados são utiliza-

dos por diversas pessoas. Isso inclui aquelas que os utilizam para a prática de esportes náuticos, como stand-up paddle, surf e iatismo”, comenta o professor. Além desta nova parceria, o SiMCosta-RJ já vem sendo apoiado por três importantes parceiros locais associados aos terminais portuários do Rio de Janeiro: Multi-Rio Operações Portuárias S/A; Libra Terminal Rio S/A; e Triunfo Logística Ltda, o que vem permitindo a manutenção destas boias desde 2017. O projeto está sendo implementado em fases no país, por meio de recursos que são oriundos do Fundo Clima/Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). Em sua primeira fase, a iniciativa buscou atender à região Sul-Sudeste (nos estados do RS, SC, PR, SP e RJ). Em sua segunda fase, o SiMCosta pretende expandir para os demais estados brasileiros, localizados na zona costeira. FERNANDO BARBERINI, doutorando da Coppe-UFRJ, participa da equipe de manutenção das boias no litoral do Rio de Janeiro


#OrgulhoDeSerUFRJ

Artigo JOSUÉ MEDEIROS Diretor da AdUFRJ, cientista político e coordenador do Núcleo de Estudos sobre a Democracia Brasileira

O GOVERNO TRUMP ACABOU. MAS O GOVERNO BOLSONARO CONTINUA

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m 20 de janeiro, o democrata Joe Biden toma posse como presidente dos Estados Unidos. A Era Trump chega formalmente ao fim. Mas os perigos fascistas e autoritários que ele representa e impulsiona terão cessado com essa saída do poder? Obviamente, a resposta é não. Trump teve 75 milhões de votos, dez milhões a mais do que em 2016. Algumas das vitórias democratas mais importantes para retirar Trump da presidência se deram por margem estreita de votos. Na Geórgia, por exemplo, foi por 11 mil votos. Os ataques que marcaram a invasão do Capitólio em 6 de janeiro são mais um sintoma da força do trumpismo nos EUA. No dia que deveria ser a consagração da sua derrota, Trump rouba a cena, desafia as instituições e mostra que seu ciclo político não acabou. Os apoios que recebeu no Partido Republicano são outra demonstração de força. Seu recuo posterior não muda isso, pois é o padrão típico das lideranças autoritárias. Recuam para disfarçar e, depois, voltam ao ataque. Por tudo isso, o desafio de Biden é gigante e complexo. Se ele repetir o padrão dos últimos governos democratas, jogará água no moinho da descrença na democracia e fortalecerá as energias do trumpismo. Se não cumprir suas promessas, Biden alimentará toda a narrativa de Trump e, ao mesmo tempo, desmobilizará a parcela mais ativa da sociedade civil dos EUA que se engajou por ele. Trump conta com isso e vai manter seu movimento vivo atacando cada erro ou inação do governo. Trump só foi derrotado porque, além de um processo de enfrentamento institucional organizado e coerente (impeachment tramitando no Congresso,

HIPPERTT

tro eleitoral de negros e migrantes, são a melhor expressão da força dessas lutas, cujas demandas deveriam ser prioritárias para o novo governo, se quiser, de fato, acabar com o trumpismo.

Justiça barrando ações radicais do presidente, empresas bloqueando a circulação de informações e recursos para as milícias digitais e de rua do trumpismo), ocorreu nos EUA um grande processo de mobilização social que não só sustentou os movimentos institucionais, mas avançou na cobrança por mais direitos e por uma democracia mais substantiva. Os movimentos antirracistas reunidos sob a insígnia “Black Lives Matter” e a ação da ativista Stacey Abrams na Geórgia, que coordenou um processo de regis-

E O BRASIL NISSO TUDO? Subestimar a força de Trump – ou de Bolsonaro – é um erro que não podemos mais cometer. No Brasil, também temos a energia cívica do movimento negro, como nos EUA, e ainda do feminismo, que na Argentina conquistou a legalização do aborto, mas ainda não conseguimos consolidar um amplo movimento de cidadania para enfrentar o avanço do projeto autoritário de Bolsonaro. Na Educação, depois da grande mobilização de 15 de Maio de 2019, que deu um freio no então ministro Weintraub, conquistamos recentemente a histórica vitória de renovação do Fundeb. Trata-se do primeiro direito que conquistamos desde 2015, quando os direitos trabalhistas para empregadas domésticas foram incluídos na Constituição. Todavia, seguimos na defensiva, sem entender a lógica de Bolsonaro e sem conseguir transformar nossa comoção com os mais de 200 mil mortos e com o fim do auxílio emergencial em resistência organizada. O perigo autoritário segue mais vivo do que nunca, embora ele agora não conte com o apoio do presidente dos EUA, o que é bastante importante. Os ataques contra a sociedade civil, a destruição da natureza, o processo de desmonte do Estado, a asfixia das universidades, tudo segue seu curso sem maiores obstáculos. O fato é que Bolsonaro mantém um nível de popularidade suficiente para garantir uma vaga no segundo turno; aumentou seu controle sobre instituições-chave tal qual a PF; indicou um ministro do STF,

indicará outro em 2021, além de estar bem colocado no STJ e em outras instâncias; tem procurado organizar uma rede de policiais, bombeiros e militares de baixa patente; tem ao seu lado grande parte do empresariado brasileiro; e, por fim, pode sacramentar sua força emplacando um aliado na presidência da Câmara. A vitória de Arthur Lira para o comando dos deputados terá duas consequências para a consolidação do projeto bolsonarista: primeiro, a hipótese do impeachment estará sepultada em definitivo. O afastamento de Bolsonaro é uma construção difícil para 2021, por conta de todos os elementos da conjuntura que já falamos. Mas com Lira na presidência da Câmara, mesmo que algumas daquelas condições mudem – por exemplo, mobilizações sociais contra o governo impulsionadas pela insatisfação popular diante da piora de vida – não terão como ser canalizadas no parlamento. A segunda consequência é a possibilidade que Bolsonaro terá para fazer avançar sua agenda autoritária em projetos de armamento da população, aumento do poder das forças repressoras (excludente de ilicitude) contra a população negra e contra os movimentos sociais e ataque aos direitos das mulheres e LGBTs. Bolsonaro sequer precisa ter maioria para aprovar essa agenda. Para ele, basta que ela tramite e vá para votação em plenário. Em caso de rejeição, o bolsonarismo usará o resultado negativo para insuflar suas milícias contra as instituições e reforçar o sentimento antissistema. Outro agenda que pode avançar é o questionamento à lisura do processo eleitoral brasileiro. Com isso, Bolsonaro vai preparando o terreno para consolidar uma institucionalidade autoritária em um futuro segundo mandato. Em resumo, os perigos para a democracia seguem vivos nos EUA e no Brasil. Aqui, o momento institucional chave para isso será a eleição da presidência da Câmara. É fundamental uma frente ampla que impeça Bolsonaro de controlar o Legislativo. Esse momento institucional precisa ser sustentado e impulsionado por mobilizações sociais de vulto que organizem as energias democráticas da sociedade brasileira. As instituições não conseguirão resistir por muito tempo sem que as ruas apareçam para (re)fazer a história da democracia brasileira.

JORNALDAAdUFRJ / REDAÇÃO - COORDENAÇÃO: ANA BEATRIZ MAGNO CHEFIA DE REPORTAGEM: KELVIN MELO EDIÇÃO: ALEXANDRE MEDEIROS, KELVIN MELO E SILVANA SÁ REPORTAGEM: ELISA MONTEIRO, KELVIN MELO, LUCAS ABREU E SILVANA SÁ ESTÁGIARIOS: KIM QUEIROZ E LIZ MOTA ALMEIDA DESIGN: ANDRÉ HIPPERTT TI: MARCELO BRASIL


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