Entre A Espada e a Parede - Sample

David Stevenson Entre a Espada e a Parede Vitória e derrota em 1918

Tradução António Sousa Ribeiro (Grande Prémio de Tradução Literária 2017)

Título Original: With Our Backs To The Wall Autor: David Stevenson Copyright © 2011, David Stevenson Todos os direitos reservados Impresso originalmente por Allen Lane, 2011 Allen Lane é uma chancela da Penguin Books Copyright da edição portuguesa © 2014 Publicações A Ferro e Aço Todos os direitos reservados para a língua portuguesa Adaptação da capa: Gabinete Editorial Publicações A Ferro e Aço Fotografia da capa: Infantaria francesa e britânica perto de Nesle, 25 de Março de 1918 ( © Imperial War Museum) Tradução: António Sousa Ribeiro Revisão: Gabinete Editorial Publicações A Ferro e Aço Paginação: Gabinete Editorial Publicações A Ferro e Aço Impressão e acabamentos: Cafilesa, Lda. 1.ª edição: Junho de 2018 Depósito legal: 441372/18 ISBN: 978-989-99149-5-7 Editor: André Andraus Publicações A Ferro e Aço é uma chancela do Grupo Narrativa IN Castro - Centro de Ideias e Negócios, Sala 14 e 17 Rua Manuel Assunção Mestre, 22 7780-199 Castro Verde Tel. 286249033 / Tlm. 965988157 editorial@gruponarrativa.pt facebook/aferroeacohistoria www.aferroeaco.pt www.gruponarrativa.pt

Índice ista de ilustrações L Lista de mapas Lista de tabelas Abreviaturas Nota sobre a terminologia militar e naval Prefácio Prólogo: Impasse, 1914-1917

vi viii ix x xv xvii 1

1. Na defensiva, Março-Julho de 1918

27

2. Ao ataque, Julho-Novembro de 1918

99

3. A nova guerra: informações, tecnologia e logística

151

4. O factor humano: recursos humanos e moral

217

5. O controlo dos mares: submarinos e transportes marítimos

277

6. As economias de guerra: dinheiro, canhões e manteiga

313

7. As frentes internas: diferença sexual, classe e nação

393

8. O armistício e depois

455

Notas Bibliografia Índice remissivo

489 561 589

Lista de ilustrações 1. O Kaiser Wilhelm II a passar em revista o corpo de exércitos Rupprecht, Junho de 1918 (Imperial War Museum) 2. Haig passando canadianos em revista (Imperial War Museum) 3. Comandantes superiores no quartel-general alemão, Spa (Bettmann/Corbis) 4. Foch e Pershing (Corbis) 5. Boroevic (Imperial War Museum) 6. Infantaria francesa e britânica perto de Nesle, 25 de Março de 1918 (Imperial War Museum) 7. Tropas britânicas junto do Canal de St. Quentin, 2 de Outubro de 1918 (Imperial War Museum) 8. Soldado de infantaria italiano, finais de 1917 (Imperial War Museum) 9. Cavalaria ligeira australiana perto de Jericó, 17 de Agosto de 1918 (Imperial War Museum) 10. Interrogatório francês de um prisioneiro alemão, por Edouard Vuillard (Musée d’histoire contemporaine – BDIC, Paris) 11. Esquadrilha de caças austríacos sobre o Brenta, 1917, por Max Edler von Poosch (Heeresgeschichtliches Museum, Viena) 12. Bombardeiro Gotha IV (Imperial War Museum) 13. A artilharia pesada americana bate a Meuse-Argonne (Bettmann/Corbis) 14. Artilharia de Campanha Real na Batalha do Canal du Nord, 27 de Setembro de 1918 (Imperial War Museum) 15. Guarnição de metralhadora (Imperial War Museum) 16. Tropas americanas com prisioneiros alemães na batalha do Canal de St. Quentin, 29 de Setembro de 1918 (Imperial War Museum) 17. Uma coluna de transporte alemã na estrada Albert-Bapaume durante a operação “Michael” (Imperial War Museum) 18. Comboios de abastecimento franceses (Susan Yates) vi

19. Locomotiva britânica virada na neve (Imperial War Museum) 20. Tropas americanas na Lorena (Susan Yates) 21. Senegaleses junto de uma cozinha de campanha junto ao Aisne (Susan Yates) 22. Feridos britânicos e alemães num posto de enfermagem avançado durante a batalha de Epéhy, 18 de Setembro de 1918 (Imperial War Museum) 23. Sargento de infantaria austro-húngaro capturado pelos Britânicos na Itália (Imperial War Museum) 24. Um comboio, Mar do Norte, 1918, por Sir John Lavery (Imperial War Museum) 25. Na fábrica de canhões do Arsenal de Woolwich, 1918, por Sir George Clausen (Imperial War Museum) 26. Oficina para o fabrico de obuses de 38 cm, por Anna Airy (Imperial War Museum) 27. Comboio transportando obuses de artilharia pesada para a frente perto de Bourg-et-Comin (Aisne) (Susan Yates) 28. Marroquinos a extraírem pedra sob supervisão (Susan Yates) 29. Mulheres apanhadoras de turfa na Alsácia (Susan Yates) 30. Duas WAACS depositam coroas no cemitério britânico, Abbeville, Fevereiro de 1918 (Susan Yates) 31. Tropas britânicas na estação de Valenciennes (Susan Yates) 32. Tropas francesas e civis na cidade têxtil de Fourmies (Nord), 9 de Novembro de 1918 (Susan Yates) As ilustrações 18, 20, 21 e 27-32 são reproduzidas, por cortesia de Susan Yates, de 1914-1918 Us and Them: A Pictorial History of the War on the Western Front (ISBN 978-0-956-01930-1), copyright © Susan Yates

Lista de ilustrações |

vii

Lista de Mapas 1. Europa, 1918

xxii–xxiii

2. A Frente Ocidental: ofensivas alemãs, Março–Julho de 1918

xxiv–xxv

a. “Michael” b. “Georgette” c. De “Blücher–Yorck” a “Marneschütz-Reims”

xxvi–xxvii xxviii–xxix xxx–xxxi

3. A Frente Ocidental: ofensivas aliadas, Julho–Novembro de 1918

xxxii–xxxiii

4. Rede ferroviária na Frente Ocidental, 1917–18

xxxiv–xxxv

5. A Frente italiana 6. Os Balcãs

xxxvi–xxxvii xxxviii

7. O Médio-Oriente

xxxix

8. Áustria-Hungria

xl–xli

9. A Guerra no Mar

xlii

viii

Lista de Tabelas 1.1. Baixas alemãs e britânicas, 21 de Março de 1918 3.1. Produção de gás, 1914–18

49 181

5.1. Tonelagem bruta de navios mercantes perdidos por acção inimiga, 1 de Julho de 1917–11 de Novembro de 1918

278

5.2. Submarinos alemães perdidos / entrados ao serviço, 1914–18

287

5.3. Submarinos alemães perdidos / entrados ao serviço, 1918

287

5.4. Tropas americanas embarcadas por mês, 1918

308

6.1. Despesas de guerra, 1914–18

314

6.2. Produto interno bruto americano, 1913–18

326

6.3. produto interno bruto do Reino Unido, 1913–18

331

6.4. Exportações de carvão britânicas para a França, 1913–18

351

6.5. Reservas de carvão das redes ferroviárias francesas, 1916–18

356

6.6. Produtos internos brutos, 1914

375

6.7. Produção de aço bruta da Alemanha, 1914–18

381

6.8. Produção de carvão e lignite alemã, 1913–18

383

6.9. Produção agrícola alemã, 1913–18

386

7.1. Operários em greve na Alemanha, 1916–18

422

ix

Abreviaturas AC

Austen Chamberlain papers (Arquivo de Austen Chamberlain, Biblioteca da Universidade de Birmingham)

ACS

Archivio centrale di stato (Arquivo Central do Estado, Roma)

ADM

Admiralty papers (Arquivo do Almirantado, Arquivo Nacional Britânico)

AEF

American Expeditionary Force (Força Expedicionária Americana)

AFGG

Les Armées françaises dans la Grande Guerre (Os exércitos franceses na Grande Guerra, história oficial francesa)

AFL

American Federation of Labor (Federação Americana do Trabalho)

AIF

Australian Imperial Force (Força Imperial Australiana)

AIR

Air Ministry papers (Arquivo do Ministério do Ar, Arquivo Nacional Britânico)

AMAE

Archives du Ministère des Affaires Étrangères (Arquivos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Paris)

AMTC

Allied Maritime Transport Council (Conselho Aliados dos Transportes Marítimos)

AMTE

Allied Maritime Transport Executive (Executivo dos Transportes Marítimos Aliados)

AN

Archives nationales (Arquivos Nacionais, Paris)

ANC

Allied Naval Council (Conselho Naval Aliado)

AOK

Armee Oberkommando (Alto-Comando Austro-Húngaro)

ASE

Amalgamated Society of Engineers (Associação Unida dos Trabalhadores da Indústria Mecânica)

ASL

Auxiliary Service Law (Lei do Serviço Auxiliar)

BA-MA

Bundesarchiv-Militärarchiv, (Arquivo Federal-Arquivo Militar, Freiburg im Breisgau)

BDF

Bund der Frauen (Liga das Mulheres)

BDFA

British Documents on Foreign Affairs (Documentação Britânica de Assuntos Externos)

BEF

British Expeditionary Force (Força Expedicionária Britânica)

BEV

Beveridge papers, (Arquivo de Beveridge, Biblioteca Britânica de Ciência Política e Económica)

x

BHStA

Bayerisches Hauptstaatsarchiv (Arquivo Central do Estado da Baviera, Munique)

BL

Manuscripts Department (Secção de Manuscritos, Biblioteca Britânica)

BTY

Beatty papers (Arquivo de Beatty, Museu Marítimo Nacional, Greenwich)

CAB

Cabinet papers (Arquivo do Governo, Arquivo Nacional Britânico)

CCAC

Churchill College Archive Centre (Centro Arquivístico do Churchill College, Cambridge)

CGS

Chief of the General Staff (Chefe do Estado-Maior)

CGT

Confédération Générale du Travail (Confederação Geral do Trabalho)

CID

Committee of Imperial Defence (Comité de Defesa Imperial)

CIGS

Chief of the Imperial General Staff (Chefe do Estado-Maior Imperial)

CND

Council of National Defense (US) - Conselho de Defesa Nacional

CNS

Chief of the Naval Staff (Chefe do Estado-Maior Naval)

CPI

Committee on Public Information (Comité da Informação Pública)

CRB

Commission for the Relief of Belgium (Comissão de Socorro à Bélgica)

CS

Comando Supremo (alto-comando italiano)

CUP

Committee of Union and Progress (Young Turk party) – Comité da União e do Progresso (Partido dos Jovens Turcos)

DDP

Deutsche Demokratische Partei (Partido Democrático Alemão)

DORA

Defence of the Realm Act (Lei de Defesa do Reino)

EEF

Egyptian Expeditionary Force (Força Expedicionária Egípcia)

EFC

Emergency Fleet Corporation (Sociedade da Marinha de Emergência)

EMA

Etat-major de l’armée (Estado-Maior francês)

FO

Foreign Office papers (Arquivo do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Arquivo Nacional Britânico)

FOCP

Foreign Office Confidential Print (Publicações Confidenciais do Ministério dos Negócios Estrangeiros)

GAR

Groupe d’Armées de Réserve (Grupo de Exércitos de Reserva)

GK

Generalkommission (centro sindical alemão)

GQG

Grand Quartier-général (alto-comando francês)

HHStA

Haus-, Hof-, und Staatsarchiv, (Arquivo da Casa Real, da Corte e do Estado, Viena)

HMM

History of the Ministry of Munitions (História do Ministério das Munições)

HO

Home Office papers (Arquivo do Ministério do Interior, Arquivo Nacional Britânico)

HNKY

Hankey papers (Arquivo de Hankey, Centro Arquivístico do Churchill College, Cambridge)

HSF

High Seas Fleet (Esquadra de Alto Mar)

IACWPF

Inter-Allied Council on War Purchases and Finance (Conselho Inter-Aliado de Compras e Finanças de Guerra)

IF

Independent Force (Força Independente)

ISB

International Socialist Bureau (Secretariado Socialista Independente)

Abreviaturas |

xi

IWC

Imperial War Cabinet (Gabinete de Guerra Imperial)

IWM

Imperial War Museum (Museu de Guerra Imperial)

IWW

Industrial Workers of the World (Trabalhadores Industriais do Mundo)

JO

Journal officiel de la République française. Débats parlementaires: Chambre des députés (Jornal oficial da República Francesa. Debates parlamentares: Câmara dos Deputados)

KAM

Bayerisches Hauptstaatsarchiv, Abteilung IV, Kriegsarchiv (Arquivo do Estado da Baviera, Munique, Secção IV, Arquivo de Guerra)

KAW

Kriegsarchiv (Arquivo de Guerra, Viena)

KRA

Kriegsrohstoffabteilung (Departamento de Matérias-Primas da Guerra)

K.A

Kriegsüberwachungsamt (Departamento de Vigilância de Guerra)

LAB

Ministry of Labour papers (Arquivo do Ministério do Trabalho, Arquivo Nacional Britânico)

LC

Liddle Collection (Fundo Liddle, Biblioteca da Universidade de Leeds)

LDB

“La Dame Blanche” papers (Arquivo “La Dame Blanche”, Museu de Guerra Imperial)

LG

Lloyd George papers (Arquivo de Lloyd George, Arquivos Parlamentares)

LHCMA

Liddell Hart Centre for Military Archives (Centro Liddell Hart para os Arquivos Militares, King’s College, Londres)

LOC

Manuscripts Division (Secção de Manuscritos, Biblioteca do Congresso)

MAF

Records of Agriculture, Fisheries, and Food Departments (Arquivos dos Departamentos de Agricultura, Pescas e Alimentação, Arquivo Nacional Britânico)

MFGB

Miners’ Federation of Great Britain (Federação dos Mineiros da GrãBretanha)

MLN

Milner papers (Arquivo de Milner, Biblioteca Bodleiana, Oxford)

MOFB

Military Operations: France and Belgium (Operações militares: França e Bélgica, história oficial britânica)

MT

Transport ministries papers (Arquivo do Ministério dos Transportes, Arquivo Nacional Britânico)

MUN

Ministry of Munitions papers (Arquivo do Ministério das Munições, Arquivo Nacional Britânico)

NAA

Northern Arab Army (Exército Árabe do Norte)

NAC

National Archives of Canada (Arquivos Nacionais do Canadá)

NARA

National Archives and Records Administration (Administração Nacional dos Arquivos e Registos, College Park, Maryland)

NLS

National Library of Scotland (Biblioteca Nacional da Escócia)

NOT

Netherlands Overseas Trust (Companhia Ultramarina Holandesa)

NWAC

National War Aims Committee (Comité Nacional de Objectivos de Guerra)

OHL

Oberste Heeresleitung (alto-comando alemão)

OPDA

Ottoman Public Debt Administration (Administração da Dívida Pública Otomana)

xii | ENTRE A ESPADA E A PAREDE

ÖULK

E. Glaise von Horstenau e R. Kiszling, orgs., Österreich-Ungarns letzter Krieg (A última guerra da Áustria-Hungria, história oficial austro-húngara)

PSI

Partito Socialista Italiano (Partido Socialista Italiano)

PMR

Permanent Military Representatives (Representantes Militares Permanentes do Conselho Supremo de Guerra)

PWW

A. S. Link et al., orgs., The Papers of Woodrow Wilson (Os documentos de Woodrow Wilson)

RFC

Royal Flying Corps (Corpo de Aviação Real)

RMA

Reichsmarineamt (Departamento da Marinha do Reich)

RNAS

Royal Naval Air Service (Serviço Aéreo Naval Real)

SBR

Small Box Respirator (máscara anti-gás)

SFIO

Section française de l’Internationale ouvrière (Partido Socialista Francês)

SHA

Service historique de l’armée de terre (Serviço histórico do exército de terra, Vincennes)

SKL

Seekriegsleitung (Comando da Guerra no Mar)

SPA

Socialist Party of America (Partido Socialista da América)

SPD

Sozialdemokratische Partei Deutschlands (Partido Social-Democrático Alemão)

SWC

Supreme War Council (Conselho Supremo de Guerra)

T

Treasury papers (Arquivo do Ministério das Finanças, Arquivo Nacional Britânico)

TF

Territorial Force (Força Territorial)

TNA

The National Archives (Arquivo Nacional Britânico, Kew)

TUC

Trades Union Congress (Congresso dos Sindicatos)

UDC

Union of Democratic Control (União de Controlo Democrático)

UDZ

W. Schücking et al., orgs., Die Ursachen des deutschen Zusammenbruchs im Jahre 1918 (As causas da derrocada alemã em 1918)

UGACPE

Union des grandes associations contre la propagande ennemie (União das Grandes Associações contra a Propaganda Inimiga)

USAWW

The United States Army in the World War (O exército dos Estados Unidos na Guerra Mundial, história oficial americana)

USFA

United States Food Administration (Administração Alimentar dos Estados Unidos)

USPD

Unabhängige Sozialdemokratische Partei Deutschlands (Partido SocialDemocrático Independente Alemão)

USRA

United States Railroad Administration (Administração dos Caminhos de Ferro dos Estados Unidos

USSB

United States Shipping Board (Direcção dos Transportes Marítimos dos Estados Unidos)

WAAC

Women’s Auxiliary Army Corps (Corpo Auxiliar do Exército Feminino)

WIB

War Industries Board (Direcção das Indústrias de Guerra)

WK

Reichsarchiv, Der Weltkrieg (A Guerra Mundial, história oficial alemã)

Abreviaturas |

xiii

WMYS

Wemyss Papers (Arquivo de Wemyss, Centro Arquivístico do Churchill College, Cambridge)

WO

War Office Papers (Arquivo do Ministério da Guerra, Arquivo Nacional Britânico)

WUMBA

Waffen und Munitions Beschaffungsamt (Departamento de Aquisição de Armas e Munições alemão)

WWS

“Women, War, and Society 1914–1918” (“Mulheres, Guerra e Sociedade, 1914-1918”, Museu de Guerra Imperial)

xiv | ENTRE A ESPADA E A PAREDE

Nota sobre a terminologia Militar e Naval Em 1914, uma divisão de infantaria na sua máxima força compreendia, no exército alemão, 17.500 oficiais e soldados, 72 peças de artilharia e 24 metralhadoras; no exército francês, 15.000 oficiais e soldados, 36 peças de artilharia e 24 metralhadoras; no exército britânico, 18.073 oficiais e soldados, 76 peças de artilharia e 24 metralhadoras. Estes números referem-se a efectivos regulamentares e a efectivos de combate depois do começo das hostilidades eram quase invariavelmente inferiores. Durante a guerra, a maioria dos exércitos reduziu os efectivos regulamentares e aumentou o poder de fogo. Contudo, as divisões americanas eram muito maiores do que a norma europeia: cerca de 28.000 oficiais e soldados cada.

Um corpo de exército compreendia normalmente duas divisões de infantaria e um exército, dois ou mais corpos. Um grupo de exércitos (tal como existia nos exércitos francês e alemão) compreendia vários exércitos, num total que ia de 500.000 a mais de um milhão de homens. No sentido inverso, os componentes normais das divisões de infantaria eram as brigadas (4.000-5.000 homens), os regimentos (2.000-3.000), os batalhões (600-1.000), as companhias (100-200), os pelotões (30-50) e os grupos de combate ou secções (8-11).

As peças de artilharia (usualmente referidas no texto como “canhões”) dividiam-se em canhões (munidos de um cano longo com uma trajectória rasa/horizontal do projéctil) e obuseiros ou morteiros (de cano curto e trajectória curva/mergulhante). Dividiam-se também de acordo com o calibre (o diâmetro do interior do cano), embora muitas peças britânicas recebessem um nome derivado do peso da sua munição. Assim, o canhão ligeiro normal (“canhão de campanha”) era o de 75 mm no exército francês, o de 77 mm no exército alemão e o de 18 libras*1no exército britânico. Os obuseiros de campanha médios incluíam o alemão de 120 mm e de 150 mm, o francês de 155 mm e o britânico de 6 polegadas. Os canhões de campanha mais pesados tinham geralmente um calibre superior a 170 mm; os obuseiros mais pesados iam de 200 a 400 mm. Os *

Ao longo do texto, as referências a pesos e medidas serão genericamente convertidas para o sistema

métrico decimal (NdT).

xv

Minenwerfer (lançadores de minas) alemães eram morteiros curtos, de carregar pela boca, em tamanhos ligeiro, médio e pesado.

As metralhadoras dividiam-se em modelos pesados e ligeiros. As metralhadoras pesadas tinham pelo menos 40-60 quilogramas e exigiam uma guarnição de três a seis homens. As metralhadoras ligeiras (9-14 quilogramas) foram desenvolvidas durante a guerra e podiam ser transportadas por um homem ou ser montadas num avião.

O Real Corpo de Aviação Britânico (fundido com a Real Força Aérea a partir de Abril de 1918) dividia-se em brigadas, regimentos, esquadrilhas e pelotões. Em 1914, uma esquadrilha do Real Corpo de Aviação compreendia doze aparelhos. A unidade básica da força aérea francesa era a escadrille. A aviação de combate alemã dividia-se em Jagdgruppen, Jagdgeschwader e Jagdstaffeln.

Os navios de guerra mais poderosamente armados do período são referidos colectivamente como “navios capitais”. Compreendiam couraçados e cruzadores. Os cruzadores dispunham de uma artilharia comparável à dos couraçados, mas eram mais rápidos porque o armamento era mais ligeiro. Os navios capitais mais modernos eram conhecidos como couraçados ou cruzadores “dreadnought” (deslocando cerca de 17.000 toneladas ou mais) se tivessem uma velocidade e poder de fogo comparáveis ou maiores do que o navio da marinha de guerra britânica Dreadnought (1906). Os cruzadores dividiam-se em cruzadores pesados (ou “blindados”) (acima das 10.000 toneladas), que se destinavam a combater como navios de patrulha em acções de esquadra ao lado de navios capitais, e cruzadores ligeiros (2.000-14.000 toneladas), que tinham uma blindagem menos forte e se destinavam a guardar rotas comerciais ou postos avançados coloniais. Os contratorpedeiros (500-800 toneladas em 1914) eram normalmente utilizados em flotilhas e estavam armados com torpedos e canhões ligeiros.

xvi | ENTRE A ESPADA E A PAREDE

Prólogo: Impasse, 1914-1917

Assim, às onze horas desta manhã chegou ao fim a guerra mais cruel e mais terrível que alguma vez flagelou a humanidade. Espero que possamos dizer que, deste modo, nesta manhã decisiva, chegaram ao fim todas as guerras.

David Lloyd George na Câmara dos Comuns, 11 de Novembro de 19181

Desde o dia em que estivera junto ao túmulo da minha mãe que não tinha voltado a chorar. […] Mas agora não conseguia evitá-lo. E assim tudo tinha sido em vão. […] Tudo isto aconteceu apenas para que um bando de criminosos amaldiçoados pudesse apoderar-se da pátria? Nessas noites, o ódio foi crescendo em mim, ódio pelos responsáveis por este acto. Nos dias que se seguiram, o meu próprio destino revelou-se-me. […] Eu, pela parte que me tocava, decidi enveredar pela política.

Adolf Hitler, Mein Kampf2

A décima-primeira hora do décimo-primeiro dia do décimo-primeiro mês de 1918 foi um momento excepcional. Essa hora permanece gravada no calendário ocidental. À medida que a nossa distância em relação a ela aumenta, ela tem-se tornado mais emblemática da guerra em geral, e tornou-se impossível ver o armistício sem ironia, como expressão desamparada da esperança de que uma tal catástrofe não pudesse voltar a acontecer. Naquele próprio dia, a filha de Clemenceau pediu-lhe: “Papá, diz-me que estás contente.” Ele respondeu que “Não posso dizer isso, porque não estou. Tudo será em vão.”3 O cessar-fogo suscitou uma gama de emoções, mas a reconciliação não fazia parte delas. O caminho que conduzira até aí fora demasiado doloroso e o antagonismo

1

entre os antigos beligerantes tornara-se demasiado profundo. Para compreender esse caminho e este antagonismo, temos de recuar décadas e escavar até às raízes do conflito. A catástrofe de 1914-18 nasceu de fissuras no coração da Europa do século dezanove que se transformaram em abismos depois da eclosão dos combates. Até estar decidido o desfecho nos campos de batalha, as tentativas de superar esses abismos através da diplomacia revelaram-se infrutíferas.

A Grande Guerra foi tão destruidora porque envolveu as potências mais fortes da época. Nas suas fases finais, a guerra arrastara todas elas. Em 1918, uma coligação (as Potências Centrais) baseada no interior da Europa Central e da Ásia Menor enfrentava uma outra (os Aliados e os Estados Unidos) que avançava para o interior, direita ao coração da massa continental eurasiática. Os Aliados e os Americanos podiam fazê-lo porque a revolução vitoriana das comunicações, condensada nos caminhos de ferro, no telégrafo e no barco a vapor, lhes dava domínio sobre os recursos mundiais e porque eles mobilizaram esses recursos de novas maneiras. Durante as décadas anteriores à guerra, o crescimento da agricultura e da indústria e a expansão transnacional do comércio, dos investimentos e das migrações tinham reforçado os laços entre o mundo atlântico.4 Tinham também propagado a democratização, à medida que os dirigentes tradicionais dos países europeus, por uma mistura de medo, idealismo e calculismo, haviam alargado o direito de voto e as liberdades civis às classes médias e às classes trabalhadoras, crescentemente urbanas e organizadas. Este processo tornava provável que qualquer nova grande guerra fosse travada de modo muito diferente do que acontecera no passado, mas - diferentemente das previsões de comentadores mais idealistas - não tornavam uma guerra como essa impensável.

Pelo contrário, a política europeia mantinha-se enraizada na soberania irrestrita das grandes potências, que estavam agora mais formidavelmente armadas do que nunca.

E o crescimento dos sindicatos e dos partidos socialistas também não consolidou a paz, porque o alastrar do patriotismo popular contrabalançava a influência deles e, em larga medida, era por eles partilhado.

Entre os antagonismos mais viscerais que conduziram à guerra, contava-se o antagonismo entre a Alemanha e a França. Segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, em 1917, um “oceano de ódio” separava os dois países.5 A unificação alemã sob Otto von Bismarck realinhara o equilíbrio de poderes europeu mesmo antes de a Guerra Franco-Prussiana de 1870-71 ter infligido aos Franceses tanto uma derrota humilhante como a perda das suas províncias da Alsácia e da Lorena do Norte.

Depois de 1871, os governos franceses reconheceram que uma guerra de vingança era impraticável, mas as détentes periódicas entre Paris e Berlim nunca se tornaram numa aliança e os exércitos de ambas as potências continuaram a estar ordenados um contra o outro. Ao lado desta primeira linha de tensão, uma segunda provinha da rivalidade nos Balcãs entre a Rússia czarista governada pela dinastia dos Romanov e a Monarquia Dual da Áustria-Hungria governada pelos Habsburgos. Durante os anos setenta e oitenta, Bismarck uniu a Rússia e a Áustria-Hungria com a Alemanha (governada pelos Hohenzollern) num alinhamento de monarquias conservadoras, 2 | ENTRE

A E S P A D A E A PA R EDE

mas, depois de o imperador Wilhelm II** ter subido ao trono alemão e Bismarck ter sido demitido, este equilíbrio rompeu-se. Em 1891-4, a Rússia concluiu uma aliança com a Terceira República Francesa. Mesmo se, do ponto de vista ideológico, Paris e São Petersburgo estavam nos antípodas, unia-os a suspeita relativamente aos Alemães, que, concomitantemente, se tornaram mais dependentes da sua aliança de 1879 com a Áustria-Hungria. A partir de agora, as potências europeias estavam divididas em blocos opostos, consolidados por alianças secretas e convenções militares, e esta divisão persistiria até 1918.

Durante algum tempo, foi possível gerir o confronto, nomeadamente porque, entre a década de 1880 e 1905, a diplomacia europeia se centrou em rivalidades imperialistas na África e na Ásia, onde a França, a Alemanha e a Rússia todas colidiam com a Grã-Bretanha. Só gradualmente é que uma nova linha de tensão foi emergindo no Mar do Norte na sequência da decisão alemã - enquanto política pessoal de Wilhelm, mas levada à prática pelo seu secretário da Marinha, Alfred von Tirpitz - de criar uma esquadra de alto mar com navios capitais modernos capaz de desafiar o predomínio da Marinha Real britânica. Os Britânicos responderam com novas construções, sobretudo quando, em 1906, encomendaram o navio Dreadnought, o que fez subir a parada da corrida naval engrenando-a numa fase de concorrência mais dispendiosa assente em embarcações mais poderosas. Mas também reagiram através da diplomacia e os anos de 1904-7 revelaram-se um momento de charneira. Por um lado, a Rússia foi derrotada na Guerra Russo-Japonesa e a agitação revolucionária ameaçou a autoridade do czar Nicolau II. Por outro lado, os Alemães exploraram a situação pondo em causa os esforços da França para controlar Marrocos e propondo-se realinhar a Europa através da criação de um bloco alemão-francês-russo. Mas a França e a Grã-Bretanha tinham resolvido os seus desentendimentos extra-europeus no acordo de 1904 conhecido como “Entente Cordiale” e, na crise de Marrocos de 1905-6, o novo governo liberal de Londres ofereceu encorajamento diplomático aos Franceses e iniciou conversações secretas sobre a cooperação militar e naval. Em 1907, um novo acordo demarcou as esferas de influência britânica e russa na Ásia Central e o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, Sir Edward Grey, visava explicitamente com este ajuste ajudar a conter a Alemanha na Europa.

A Alemanha estava agora alienada de três grandes potências. Além disso, a Itália, que formara a Tríplice Aliança com a Alemanha e a Áustria-Hungria em 1882, chegou a um entendimento secreto com os Franceses em 1902. Embora continuasse a fazer parte da Tríplice Aliança, depois de 1904 a Itália lançou uma corrida aos armamentos terrestres e navais contra a Áustria-Hungria. A hostilidade entre Roma e Viena tinha origem na oposição da Áustria, no século dezanove, à unificação italiana, mas centrava-se agora na questão dos falantes de italiano que viviam no Trentino e

Seguiu-se o critério de manter a forma original dos nomes referidos, dado ser também essa a opção seguida por sistema no original inglês. (NdT)

**

Prólogo : Impasse, 1914-1917 |

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na região de Trieste, que permaneciam sob domínio habsbúrgico. A Áustria-Hungria era a única grande potência aliada da Alemanha em que esta podia confiar, mas tinha inimigos não apenas na Rússia e na Itália, mas também nos Balcãs, onde a influência que exercia sobre a Sérvia se desmoronou depois de um golpe de Estado em 1903 que fez subir ao trono em Belgrado uma dinastia mais nacionalista. Ambas as “Potências Centrais” se defrontavam agora com o que o chanceler alemão caracterizou como “cerco”. Iriam reagir à dificuldade da situação lançando-se na guerra.

As estruturas internas da Alemanha e da Áustria-Hungria desempenharam um papel essencial nesta história. Ambos os estados eram híbridos entre a autocracia e o constitucionalismo. O Império Alemão era uma federação, embora dominada pela Prússia, cujo rei era também o imperador da Alemanha e cujo primeiro-ministro era o chanceler alemão. Embora a marinha fosse um serviço imperial, não havia um exército imperial. Os estados alemães maiores mantiveram as suas próprias forças terrestres, mas o Estado-Maior prussiano tornou-se a única instância de planeamento estratégico. O Chefe do Estado-Maior era responsável perante o imperador e não perante o governo civil chefiado pelo chanceler (entre 1909 e 1917, Theobald von Bethmann Hollweg), mas também o chanceler era nomeado e demitido por Wilhelm e não carecia de uma maioria na câmara baixa do parlamento imperial, o Reichstag. (A câmara alta, o Bundesrat, representava os governos estaduais). Por outro lado, era necessária uma maioria no Reichstag para aprovar as leis, incluindo as leis relativas a aumentos de impostos, recrutamento e armamentos, e a câmara baixa era escolhida com base num sufrágio reservado a homens adultos por um eleitorado que era livre de se organizar em partidos políticos e grupos de pressão. Em 1914, a maioria do terço de eleitores alemães que era católica estava a votar no Partido do Centro, cuja lealdade era considerada suspeita pelos interesses prussianos protestantes instalados. O Partido Social-Democrático (SPD), que queria mais democratização, havia-se tornado no maior do parlamento, ao passo que o apoio aos partidos conservadores, sustentáculo tradicional do regime, estava a diminuir. Conflitos de classe, confessionais e regionais dividiam o império, embora as suas minorias não-alemãs - polacos no Leste, dinamarqueses no Norte e alsacianos e lorenos no Ocidente - fossem pequenas.

Em contrapartida, a Áustria-Hungria continha doze grupos étnicos importantes e os dois mais influentes - os alemães e os magiares - somavam juntos menos de metade da população. Desde 1867, houvera a divisão entre os componentes austríaco e húngaro (também conhecidos como Cisletânea e Transletânea) e, de um ponto de vista técnico, Franz Joseph I era imperador austríaco, mas rei da Hungria. As duas metades tinham parlamentos, governos, orçamentos e mesmo exércitos separados, com estes últimos a prestar serviço paralelamente ao exército comum. Os ministros das Finanças tinham na mão os cordões da bolsa para o exército comum, a marinha, e os negócios estrangeiros. O governo húngaro tinha direito de veto relativamente às decisões de política externa mais importantes e apoiava-se num sufrágio severamente restrito, com os não-magiares a perfazerem 47 por cento da população da metade 4 | ENTRE

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húngara, mas a ocuparem apenas 14 por cento dos assentos parlamentares.6 Na metade austríaca, em contrapartida, a câmara baixa (Reichsrat) era eleita desde 1907 por sufrágio masculino e as nacionalidades podiam organizar-se com mais liberdade.

Mas, nas vésperas da guerra, a vida política fragmentara-se de tal modo que o governo austríaco não conseguia formar uma maioria parlamentar estável e usava o artigo 14º da Constituição para governar por decreto.

Estas dificuldades têm de ser colocadas no contexto. Apesar do discurso revolucionário do SPD, o partido era respeitador da lei e ordeiro. Quase nenhum dos políticos nacionalistas da Áustria-Hungria exigia a secessão. O que trazia em suspenso os dirigentes de Berlim e de Viena era a situação externa, e não a interna. Num primeiro momento, depois de 1905, uma série de crises diplomáticas por causa de Marrocos e dos Balcãs polarizou os dois blocos de alianças. As crises vieram numa sucessão cada vez mais rápida, cada qual mais aguda do que a precedente, e em cada uma as forças armadas foram colocados estados de alerta mais elevados, os mais perigosos dos quais a acompanhar as Guerras dos Balcãs de 1912-13. Na Primeira Guerra dos Balcãs, uma coligação composta pela Sérvia, o Montenegro, a Grécia e a Bulgária, formada com o auxílio da Rússia, derrotou a Turquia otomana e anexou a maior parte dos territórios europeus desta. Na Segunda Guerra, a Sérvia, o Montenegro e a Grécia derrotaram a Bulgária, e a Roménia, aliado tradicional da Áustria-Hungria e da Alemanha, juntou-se-lhes, perturbando o equilíbrio de poder nos Balcãs em detrimento da Áustria-Hungria. Um segundo momento foi a transformação da corrida aos armamentos. Depois de 1912, a Grã-Bretanha e a Alemanha abrandaram os seus gastos navais, com a Grã-Bretanha a permanecer à frente, mas começou uma disputa em torno dos armamentos terrestres entre os blocos austro-alemão e franco-russo e os Estados-Maiores de ambos os lados adoptaram planos de guerra mais agressivos. Em terceiro lugar, as crises diplomáticas e a rivalidade a respeito dos armamentos cristalizaram a opinião pública nos campos pró e contra estado de prevenção, e um novo nacionalismo vociferante apoderou-se do estado de espírito de antes da guerra.

Em 1914, a maioria dos membros da elite política austro-húngara acreditava que só a força poderia responder à ameaça à integridade do seu império provinda do nacionalismo dos Eslavos do Sul apoiado pela Sérvia. Esses membros viram o assassínio em Sarajevo, em 28 de Junho, do arquiduque Franz Ferdinand, herdeiro do trono, como uma oportunidade para passar à acção. O governo alemão apoiou-os, vendo com bons olhos uma guerra nos Balcãs entre a Áustria-Hungria e a Sérvia e correndo deliberadamente o risco de uma guerra europeia à escala do continente, já que acreditava que, no momento, tinha vantagem na corrida aos armamentos terrestres, mas que, em 1917, a França e a Rússia teriam recuperado o atraso. Quando a Rússia veio em apoio da Sérvia e mobilizou as suas forças armadas, a Alemanha enviou ultimatos à Rússia intimando-a a desistir e à França para que se comprometesse a ficar neutra e, quando nenhum desses países cedeu, declarou-lhes guerra.

Como o plano de guerra alemão, conhecido convencionalmente como o Plano SchlieffenPrólogo : Impasse, 1914-1917 |

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-Moltke dos nomes dos dois Chefes de Estado-Maior que o tinham concebido, implicava lançar primeiro o grosso do exército contra a França e flanquear as fortalezas fronteiriças francesas atravessando a Bélgica neutra, a eclosão das hostilidades provocou de imediato uma crise com a Grã-Bretanha. O governo britânico não tinha obrigação de ajudar os Franceses, mas os seus membros principais acreditavam que a Grã-Bretanha ficaria em perigo se permanecesse inactiva a ver a França ser subjugada. A invasão alemã da Bélgica, um pequeno estado neutral que as potências europeias haviam colocado sob salvaguarda através do Tratado de Londres de 1839, suscitava uma questão de princípio que convenceu a maior parte dos ministros liberais a apoiar uma guerra que a oposição unionista estava disposta a respaldar por motivos de segurança nacional.7 As circunstâncias em que o conflito se desencadeou ajudam a explicar por que é que se tornou tão difícil de gerir. As autoridades alemãs sustentavam que tinham reagido à agressão russa, bem como ao revanchismo francês e a uma rede de cerco inspirada pela Grã-Bretanha. Os Franceses insistiam em que tinham sido vítimas de um ataque não provocado e pareciam justificados pelas revelações em 1918 de que, se Paris tivesse prometido ficar neutra, a Alemanha teria exigido a entrega das fortalezas fronteiriças francesas.8 Mas o governo austro-húngaro - e mesmo o russo - também beneficiaram a princípio de uma unidade inusitada entre os seus cidadãos. A investigação moderna destruiu o mito do entusiasmo generalizado pelas hostilidades, mas os protestos conduzidos pelos socialistas nas primeiras fases da crise de Julho de 1914 depressa perderam vigor e deram lugar à aceitação.9 Do mesmo modo, sabemos agora que muitos chefes militares esperavam uma guerra de até dois anos, mas entre os políticos e o público em geral, prevalecia a esperança de que este conflito, como outros recentes, fosse uma questão de meses.10 Os acontecimentos não tardariam a mostrar como estavam errados.

As ofensivas iniciais levaram a um fracasso quase permanente. No leste, a invasão da Polónia russa pela Áustria-Hungria foi repelida, e o mesmo aconteceu à invasão da Sérvia. Embora a Rússia tivesse ocupado a província austríaca da Galícia nas batalhas de Tannenberg e dos Lagos Masúrios, forças alemãs muito inferiores em número repeliram o avanço czarista sobre a Prússia Oriental. A oeste, as ofensivas francesas contra a Lorena e as Ardenas foram igualmente travadas, a grande manobra de flanqueamento do exército alemão através da Bélgica e do Norte da França foi detida a leste de Paris na Primeira Batalha do Marne, e quando a Primeira Batalha de Ypres chegou ao fim em Novembro, estavam a formar-se da Suíça ao Mar do Norte as linhas opostas de trincheiras que ficariam famosas como Frente Ocidental.

Durante uma geração, as potências europeias tinham sido poupadas à factura de baixas elevadas, mas as perdas já excediam de longe as de 1870 ainda mal as hostilidades estavam a começar. As cifras semanais de mortos e feridos na fase inicial - entre tropas ainda raramente protegidas pelo entrincheiramento - foram algumas das mais altas da guerra. Em finais de 1914, as baixas francesas ascendiam a 528.000, as alemãs, a 800.000 e as britânicas, a 90.000.11 Campanhas móveis significavam 6 | ENTRE

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também devastação, ocupação e atrocidades contra civis,12 que não eram simples ficções de propagandistas aliados. Não obstante, os combates não levaram a uma decisão em nenhum dos teatros de guerra, e se a suspeita e a xenofobia tinham dividido os blocos antes de Julho, agora os obstáculos à conciliação eram incomparavelmente maiores. A Alemanha ocupava a maior parte da Bélgica e as províncias do Norte da França, incluindo grandes cidades como Antuérpia e Lille, bem como áreas costeiras estratégicas, indústrias e jazidas de carvão e de minério de ferro. Negociar enquanto ela permanecia ali colocaria os Aliados numa posição de desvantagem fundamental, mas o governo de Berlim também não podia justificar perante o seu povo o abandono de conquistas que haviam tido um preço tão elevado, a não ser que a compensação fosse adequada. A leste, onde a Áustria-Hungria e a Rússia tinham ambas perdido também território e sofrido enormes baixas, aplicavam-se considerações semelhantes. A “Tripla Entente” de antes de 1914 tornou-se nos Aliados, depois de a França, a Grã-Bretanha e a Rússia terem subscrito o Pacto de Londres em Setembro de 1914, comprometendo-se a não assinar uma paz separada. Com o Japão a declarar guerra à Alemanha em Agosto e a Turquia otomana a juntar-se às Potências Centrais em Novembro, não apenas as clivagens estavam a aprofundar-se dentro da Europa, mas o conflito estava a alastrar para fora dela.

Durante os meses e anos de impasse que se seguiram, as barreiras à paz tornaram-se maiores. Uma razão pela qual a história do armistício de 1918 é tão envolvente é o facto de os esforços anteriores para pôr fim à matança se terem revelado tão infrutíferos. O problema essencial era um triplo impasse interligado nos aspectos militar, de política interna e de diplomacia do conflito, que não só barrava todas as saídas de uma situação muito difícil como levava também os beligerantes a níveis superiores de violência.

O primeiro elemento do impasse - e aquele que desde então tem marcado a imaginação ocidental - era militar. Nada na história anterior era comparável aos 765 quilómetros de fortificações que constituíam a Frente Ocidental. Durante 1915, também se estabeleceram trincheiras estabilizadas na península de Gallipoli, onde os Aliados estavam a tentar chegar a Constantinopla; ao longo do rio Isonzo, depois de a Itália ter entrado na guerra contra a Áustria-Hungria; na Macedónia, depois de as forças aliadas terem desembarcado em Salónica; e, no final do ano, entre a Alemanha, a Áustria-Hungria e a Rússia na Polónia. Em todas as frentes, a tecnologia punha o atacante em desvantagem. A introdução da espingarda de carregar pela culatra desde os anos quarenta, da metralhadora pesada desde os anos oitenta e do canhão de tiro rápido sem recuo desde os anos noventa tinha revolucionado o poder de fogo defensivo. Forças de infantaria escondidas em trincheiras e abrigos subterrâneos, protegidos por arame farpado e abastecidas por via férrea com reforços e munições eram demasiado poderosas para serem vencidas por forças atacantes sem percentagens de baixas que, mais cedo ou mais tarde, as obrigavam a parar. Nem o gás venenoso (usado pela primeira vez na Frente Ocidental em 1915) nem os tanques Prólogo : Impasse, 1914-1917 |

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(introduzidos em 1916) alteraram muito a situação. O núcleo da solução que veio a ser encontrada foi o uso intensivo e inteligente de concentrações de artilharia muito maiores, mas os canhões pesados e os obuses precisavam de anos para serem construídos e dezenas de milhar de artilheiros tinham de aprender a exigente arte de manobrar as suas armas. Ao mesmo tempo que os atacantes refinavam as suas tácticas, o mesmo fizeram os defensores, cujas posições nos sectores mais vulneráveis evoluíram de fossos rudimentares em 1914 a linhas múltiplas estendendo-se vários quilómetros para dentro e incorporando abrigos subterrâneos com nove metros de altura no Somme em 1916 ou centenas de abrigos em betão um ano mais tarde em Ypres. Seria errado, contudo, equiparar simplesmente os dois lados. Os Franceses e a Força Expedicionária Britânica (FEB) tinham de reconquistar território ocupado e eram eles quem estava habitualmente na ofensiva, normalmente com superioridade numérica, mas com equipamento inferior e avançando encosta acima sem o benefício da surpresa. Os Italianos - que não tinham perdido território, mas tinham entrado na guerra para o ganhar - estavam numa posição semelhante, tal, como, mais tarde, a expedição aliada à Macedónia.

O impasse militar não era apenas tecnológico. Reflectia também a distribuição de forças entre os diferentes teatros e as estratégias dos dois lados. Durante 1915, os esforços aliados eram coordenados de modo deficiente, com a maior operação britânica a ser dirigida contra a Turquia em Gallipoli, enquanto os Franceses sofriam perto de mais meio milhão de baixas em ofensivas na Champagne e no Artois. No início do ano, a Áustria-Hungria estava em apuros desesperados, mas, na altura em que a Itália interveio em Maio, os Alemães tinham enviado reforços para a Frente Leste e tinham aliviado a pressão sobre o seu aliado obrigando os Russos a retirar.

Durante o resto do ano, os esforços da Alemanha continuaram concentrados no Leste, onde as Potências Centrais expulsaram a Rússia da Polónia e da Lituânia antes de invadirem a Sérvia e o Montenegro, aliado desta, com a ajuda da Bulgária (que se juntou às Potências Centrais em Setembro), enquanto as forças aliadas que desembarcaram em Salónica em Outubro não conseguiram ser de grande auxílio para a Sérvia. Estava a emergir um padrão nos termos do qual os Russos derrotavam quase invariavelmente os Austríacos, mas os Alemães derrotavam quase invariavelmente os Russos, sendo, porém, obrigados a manter um terço do seu exército na Europa Oriental, ao mesmo tempo que eram incapazes de obrigar o czar a fazer a paz. Não obstante, a Rússia parecia suficientemente enfraquecida para o chefe do Estado-Maior alemão, Erich von Falkenhayn, se virar em Fevereiro de 1916 para a Frente Ocidental e para Verdun, onde desencadeou uma batalha que, inicialmente, se pretendia que envolvesse apenas uma fracção limitada da infantaria alemã, mas infligisse tais perdas com a artilharia que o exército francês se desmoronasse.13 Os combates mostraram-se muito mais equilibrados do que ele esperara e agora foi a coordenação entre as Potências Centrais que fraquejou, já que Falkenhayn não consultara os Austríacos a respeito de Verdun e, em Maio, eles lançaram uma ofensiva própria contra os Italianos no Trentino. Não apenas os Italianos travaram este ataque, mas, para o 8 | ENTRE

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levar a cabo, os Austríacos tinham transferido as suas melhores forças da Frente Leste, onde, em Junho, os Russos desencadearam contra eles a “ofensiva de Brusilov”, baptizada com o nome do general que a comandou. Metade do exército austro-húngaro na Frente Leste transformou-se em baixas (400.000 das quais referentes a prisioneiros) e, mais uma vez, os Alemães tiveram de mandar tropas à pressa em salvamento.

Depois dos seus revezes de 1915, também os Aliados tinham revisto a sua estratégia e, na Conferência de Chantilly em Dezembro desse ano, acordaram lançar ataques sincronizados no Verão de 1916. A ofensiva de Brusilov, congeminada para ajudar os Italianos, foi a primeira, mas depressa foi seguida pela abertura, em Julho, de uma ofensiva anglo-francesa no Somme, em Agosto, por a Roménia se juntar aos Aliados e invadir a Hungria, e por ataques no Isonzo e na Macedónia. Pela primeira vez num ano, os Aliados recuperaram a iniciativa estratégica e submeteram as Potências Centrais à mais forte pressão desde sempre. Tal como Verdun, a ofensiva de Brusilov - que durou até Outubro - e o Somme - que durou até Novembro - foram os protótipos de um novo tipo de batalha, medido, não em dias, mas em meses, e provocando baixas na ordem das centenas de milhar. No longo prazo, essas batalhas ajudaram a causar tanto a Revolução Russa como a intervenção americana, os acontecimentos que iriam dar nova forma ao conflito. Mas, no curto prazo, nenhuma ofensiva alcançou o que os Aliados tinham esperado que alcançasse e, até ao Outono de 1918, eles não empreenderam quaisquer esforços com uma persistência comparável.

Este fracasso aliado resultou em parte de uma mudança de dirigentes em Berlim.

Em Agosto de 1916, a chefia do alto-comando do exército alemão (OHL ou Öberste Heeresleitung) passou de Falkenhayn para Paul von Hindenburg como Chefe do Estado-Maior e Erich Ludendorff como Primeiro Quartel-Mestre-General. A nova equipa encerrou as operações em Verdun, adoptou tácticas defensivas mais flexíveis, assumiu poderes de comando sobre o exército austro-húngaro e mobilizou forças para derrotar e invadir grande parte da Roménia. No início de 1917, os Alemães retiraram para um conjunto novo e menos extenso de defesas no Ocidente, a parte central do qual recebeu a designação caracteristicamente wagneriana de “Posição Siegfried” (embora apelidada pelos Aliados de Linha de Hindenburg). No Somme, o exército alemão foi posto duramente à prova, mas os seus comandantes mantiveram-se crentes em que ele estava à altura da situação.14 Sem se deixarem abalar, os generais aliados, numa segunda conferência em Chantilly em Novembro de 1916, planearam a renovação das suas ofensivas coordenadas logo no novo ano, se as condições atmosféricas o permitissem, mas, em vez disso, na Primavera de 1917, eles sofreram uma série de desastres e a pressão diminuiu o seu aperto.

O primeiro entre esses desastres foi a revolução na Rússia, onde Nicolau II foi derrubado em Março. O seu sucessor, o Governo Provisório Russo, esperou até Junho para lançar a sua ofensiva, que as Potências Centrais depressa travaram para passarem depois à contra-ofensiva. A ocidente, os Aliados ainda estavam na dianteira em Abril. O ataque preliminar britânico na Batalha de Arras demonstrou Prólogo : Impasse, 1914-1917 |

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melhorias tácticas inegáveis, mas, depois de um começo espectacular, ficou bloqueado; e o principal ataque francês contra a cordilheira do Chemin des Dames, normalmente conhecido como ofensiva de Nivelle, do nome do novo comandante francês, Robert Nivelle, foi um fiasco desde a primeira manhã. Esta desilusão fez transbordar o copo e, no Verão de 1917, não apenas o exército russo, mas também o francês foram paralisados por motins. Além disso, para o período da campanha da Primavera, os governos aliados tinham posto o comandante britânico da Frente Ocidental, Sir Douglas Haig, sob a autoridade de Nivelle, e esta primeira experiência de um comando supremo chegou agora ao fim. Durante o resto do ano, os Aliados retornaram ao padrão de 1915 de seguirem vias separadas.

Um elemento do impasse no período central da guerra era, por conseguinte, o facto de nenhum dos lados conseguir obter um sucesso militar decisivo. Um segundo era que ambos podiam recorrer a quantidades enormes de homens e equipamentos.

Embora os Aliados superassem as Potências Centrais em população e no potencial industrial, a eficácia superior do exército alemão (e a do exército austríaco relativamente aos Italianos) anulou durante muito tempo esta vantagem. Uma razão pela qual a situação militar se alterou no Verão de 1916, foi que, por essa altura, os Aliados tinham completado um reforço de longo prazo, durante o qual os exércitos britânico e italiano cresceram rapidamente e o exército russo se reequipou. Mas, embora imponente, o que se alcançara não era bastante, e a pressão sobre as economias internas dos Aliados contribuiu para os revezes que sofreram a seguir.

Mesmo em 1914, os exércitos europeus eram várias vezes maiores do que nas guerras do século dezanove. Em 1916, eram ainda maiores e muito mais bem abastecidos com a panóplia básica de espingardas, metralhadoras, canhões de campanha e obuses, bem como com meios muito mais sofisticados, como gás, canhões pesados e aviação. Este feito fora pago em larga medida através de empréstimos. Nenhum dos beligerantes cobria mais do que uma fracção do custo da guerra através de impostos; e a maior parte dos empréstimos revestia a forma de títulos de curto e de longo prazo comprados pela população de cada país, embora, adicionalmente, as Potências Centrais importassem a crédito dos países neutros europeus e os Aliados, dos EUA. Em resposta às “carências de munições” que todos os beligerantes sofreram em 1914-15, os ministérios da Guerra usaram o rendimento dos títulos para aumentar a capacidade dos arsenais de Estado e para reconverterem as indústrias de engenharia civil e as indústrias químicas para a produção de armas. Recrutaram-se mais trabalhadores entre mulheres e jovens, soldados foram libertados dos exércitos e todos os países registaram aumentos extraordinários da produção. Quase tão impressionante era o fornecimento permanente de efectivos militares, conseguido através do recrutamento de jovens capazes que haviam ficado isentos antes da guerra, pela mobilização de homens de dezoito anos mal chegavam à idade adulta e pelo envio de até três quartos dos feridos de regresso à frente. O treino, tanto para os oficiais como para os soldados, era mais superficial do que em tempo de paz e, se os exércitos de 1916 eram maiores do que os de 1914, os oficiais responsáveis avaliavam a qualidade deles 10 | E N T R E

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como mais baixa. Além disso, as exigências das forças armadas tinham de ser contrabalançadas com as das indústrias de guerra e com a produção civil, especialmente de alimentos. Quanto mais a guerra se prolongava, mais difícil se tornava a quadratura do círculo e mais pesadas se tornavam as consequências de negligenciar a agricultura. Não obstante, as vantagens subjacentes dos Aliados estavam a tornar-se mais evidentes. Com as suas marinhas a bloquearem as Potências Centrais, a Grã-Bretanha e a França recrutavam mais homens nos seus impérios e mercadorias de todo o mundo, desde que pudessem dispor de moeda estrangeira e de navios para as comprar e transportar. Em Outubro de 1916, o comércio aliado com os Estados Unidos tinha quadruplicado em relação ao início da guerra e 40 por cento das compras do governo britânico para o seu esforço de guerra eram feitas na América do Norte.15 No Somme, o exército alemão confrontou-se pela primeira vez com adversários mais bem armados e outra das inovações de Hindenburg e Ludendorff foi o “Programa Hindenburg”, visando uma aceleração drástica da produção de armamento, que, no Inverno amargo de 1916-17, se mostrou demasiado ambiciosa para ser assegurada pela economia alemã. Ao mesmo tempo, contudo, os Aliados estavam a aproximar-se do limite das suas capacidades para financiar compras em dólares, ao mesmo tempo que a corrida aos armamentos por Nicolau II desencadeava uma espiral de inflação desastrosa e colocava uma carga fiscal excessiva sobre os caminhos de ferro russos.

O défice no fornecimento de bens alimentares às cidades daí resultante despoletou as greves e manifestações que, quando a guarnição de Petrogrado se passou para o lado dos manifestantes, derrubaram o regime czarista.

Mesmo assim, da perspectiva dos nossos dias - num mundo incomparavelmente menos tolerante em relação às baixas militares -, não deixa de ser espantoso que os movimentos de protesto entre os beligerantes fossem tão fracos e que tanto os políticos como a opinião pública estivessem tão unidos no apoio ao esforço de guerra. Esta unidade foi mais um factor poderoso na perpetuação da carnificina. O facto de, durante a primeira metade da guerra, os padrões de vida civis se terem aguentado razoavelmente bem, deu uma ajuda. Depois de convulsões iniciais, o pleno emprego regressou às cidades, os agricultores beneficiaram de preços em alta para os seus produtos e as famílias com os seus provedores ausentes receberam pensões de subsistência. Além disso, a repressão desempenhou um papel: na Áustria e, durante a maior parte do tempo, na Rússia, o parlamento foi suspenso e em toda a parte deixou de haver eleições, a imprensa era censurada e os governos assumiram o poder de governar por decreto. Mas a Grã-Bretanha, a França e a Alemanha, pelo menos, eram suficientemente livres para que fosse tão claro quanto possível (na ausência de inquéritos de opinião) que a causa nacional tinha um apoio alargado. O esforço de guerra não podia ter funcionado sem a disponibilidade de milhões de cidadãos para o apoiar, trabalhando em quintas e fábricas e dirigindo organizações de caridade; ao mesmo tempo, no Reino Unido, até 1916, 2,4 milhões de jovens tinham-se oferecido como voluntários para o serviço militar.16 Pró logo : Impasse, 1914-1917 |

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Muitos factores que tinham encorajado o consenso inicial favorável à guerra continuavam a existir. O solo francês continuava invadido, os Britânicos ainda punham em relevo a Bélgica na sua propaganda e o governo alemão ainda argumentava, de modo cada vez menos convincente, que estava a travar uma luta defensiva. E os civis também não estavam ainda resignados a um conflito prolongado: pelo contrário, há muitas provas que indiciam que, mesmo depois de 1914, eles ainda esperavam um desfecho numa questão de meses.17 Foi igualmente fundamental o facto de ambos os lados terem ainda razões para acreditar na vitória, as Potências Centrais porque a maior parte das campanhas lhes era favorável e os Aliados porque tinham mais recursos. Novos acontecimentos reforçaram as provas de que os inimigos eram bárbaros: a guerra submarina, ataques de zepelins a Londres e Paris e o uso de gás venenoso pela Alemanha; mas também o aperto do bloqueio aliado, que tomava os civis como alvo negando alimentos e medicamentos. O aliado da Alemanha, a Turquia otomana, foi ainda mais longe, com a tentativa de genocídio da sua população arménia no Verão de 1915.18 Em ambos os lados, homens da Igreja e intelectuais publicitavam justificações ideológicas para continuar: a Alemanha estava a defender valores espirituais heróicos contra o liberalismo e o materialismo decadentes, ao passo que os Aliados estavam a sustentar a lei e a justiça contra a brutalidade do militarismo.19 À medida que a lista de baixas crescia e poucas famílias permaneciam incólumes, tornou-se ainda mais difícil os governos dizerem basta até estarem em condições de demonstrar que o sacrifício valera a pena. Por todas estas razões, as tréguas estabelecidas entre os partidos políticos mantiveram-se firmes e, até 1917, a probabilidade de qualquer país ser forçado a parar pela revolução ou por convulsões internas foi pequena. Remodelações ministeriais em França e na Itália alargaram as bases dos governos desses países e o novo gabinete de coligação formado em Londres em Dezembro de 1916 sob a chefia de David Lloyd George estava determinado a governar de modo mais decidido e a mobilizar a economia interna mais drasticamente, ao mesmo tempo que se recusava a falar de compromisso.

Se a guerra não podia ser terminada por um avanço militar ou pela revolução, também não podia sê-lo pela via negocial. Pelo contrário, as suas ondas propagaram-se à medida que círculos mais amplos de beligerantes foram entrando e a incompatibilidade entre os objectivos dos dois lados se foi aprofundando. Os objectivos de guerra da Áustria-Hungria, tal como definidos no início de 1916, incluíam dominar os Balcãs Ocidentais através de uma partilha da Sérvia, mas, para evitar absorver minorias pouco leais ainda mais amplas, a Monarquia Dual encarava apenas anexações limitadas. Do mesmo modo, os Alemães queriam apenas pequenas aquisições territoriais na Europa, mas queriam dar segurança ao seu território através de estados-tampão nas suas fronteiras ocidental e oriental. O Luxemburgo seria anexado, tal como a bacia metalúrgica de Longwy-Briey, que se estendia ao longo da fronteira francesa, e a plataforma de transportes de Liège. Mas a Alemanha controlaria o resto da Bélgica indirectamente, estacionando guarnições nas cidades do país, dirigindo os seus caminhos de ferro, constituindo uma união aduaneira, estabele12 | E N T R E

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cendo bases navais na costa da Flandres e encorajando o separatismo flamengo. A leste, a Polónia ocupava uma posição análoga: os Austríacos esperavam trazê-la para o seio da soberania habsbúrgica, mas, em Novembro de 1916, concordaram que a parte da Polónia anteriormente controlada pela Rússia (agora sob ocupação austro-alemã) se tornasse nominalmente independente. Na realidade, a Alemanha controlaria a política externa da Polónia e os caminhos de ferro e anexaria “faixas fronteiriças” nas suas fronteiras norte e ocidental, que seriam repovoadas por alemães. Os Alemães desenvolveram planos semelhantes para o controlo indirecto da Lituânia e da Curlândia e, em 1917, esperavam também separar a Ucrânia da Rússia e convertê-la num satélite alemão. Além disso, queriam uma união aduaneira centro-europeia, uma colónia enorme (e rica em minerais) estendendo-se de costa a costa na África Central e um sistema mundial de bases navais, embora a condição prévia destes objectivos além-mar fosse uma vitória esmagadora sobre a Grã-Bretanha que nunca se afigurou provável e mesmo os planos continentais de estados-tampão dentro da Europa causaram muitos desacordos. O chanceler Bethmann Hollweg estava disposto a compromissos para dividir o inimigo conseguindo uma paz separada com um ou outro dos Aliados. Mas o duo Hindenburg-Ludendorff opunha-se a concessões que, como eles receavam, iriam comprometer o objectivo central de salvaguardar o futuro da Alemanha, e Wilhelm tinha suficiente medo dos seus comandantes para abandonar tanto Bethmann como outros políticos que a OHL considerava demasiado brandos. Uma paz negociada tinha, por conseguinte, poucas probabilidades de sucesso enquanto Hindenburg e Ludendorff acreditassem que a vitória era possível; e os outros objectivos de guerra das Potências Centrais dependiam do êxito alemão.20 Um segundo obstáculo à negociação era o facto de os Aliados não terem nenhuma intenção de se deixarem dividir e não terem tardado a definir objectivos de guerra próprios. Os Russos foram os primeiros a sair dos eixos, com o seu objectivo primacial na Europa a ser a unificação das áreas de população polaca que estavam sob domínio alemão, austro-húngaro e russo num único reino sob o ceptro dos Romanov. Em Dezembro de 1914, o governo francês fez voto público de não terminar a guerra antes de ter reconquistado a Alsácia-Lorena e, nos inícios de 1917, decidiu secretamente exigir, não apenas as províncias perdidas, mas também as jazidas de carvão adjacentes do Sarre, acordando com Nicolau II separar a margem ocidental do Reno da Alemanha e reorganizar a região num sistema de estados-tampão.21 Os Franceses ocultaram estes objectivos dos Ingleses, cujas próprias deliberações decorreram mais devagar. Os Ingleses tinham-se comprometido a restaurar a independência e integridade da Bélgica; além disso, os ministros pressupunham que a Alemanha iria perder a maior parte da sua marinha e das suas colónias e, nos finais de 1916, as forças aliadas tinham conquistado estas, com excepção de parte da África Oriental Alemã. Mas, durante a guerra, o governo britânico nunca definiu uma posição relativamente às fronteiras europeias da Alemanha e, embora Lloyd George e outros acreditassem que uma Alemanha democrática seria menos agressiva, nunca fizeram disso um fim incondicional.22 Pró logo : Impasse, 1914-1917 |

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Os obstáculos a um compromisso eram colossais. A Grã-Bretanha e a Alemanha estavam polarizadas a respeito da Bélgica e das colónias alemãs; a França e a Alemanha, a respeito da Alsácia-Lorena e da Renânia; e a Rússia e as Potências Centrais, a respeito da Polónia. As questões territoriais eram importantes por motivos económicos e estratégicos, mas também por causa do prestígio nelas investido, num conflito que estava a custar milhões de vidas. Mas, na primeira metade da guerra, as sondagens relativamente à paz não foram, de qualquer modo, propriamente muito persistentes. As mais importantes discussões públicas tiveram lugar em Dezembro de 1916, quando as Potências Centrais declararam a sua disposição para negociar e o presidente americano, Woodrow Wilson, convidou ambos os lados a declararem os seus objectivos de guerra, mas os Aliados estavam confiantes sobre as suas probabilidades de sucesso na Primavera de 1917 e rejeitaram a proposta inimiga, que, como com razão suspeitavam, tinha sobretudo fins de relações públicas. Mesmo com base nos objectivos de guerra enganadores que ambos os lados enviaram a Washington, era claro que eles estavam muito distanciados.

Além disso, as coligações tinham-se alargado e novos reclamantes tinham-se juntado a elas. Uma série de guerras paralelas inflamou-se, com novos participantes a procurarem lucrar com o conflito. A primeira extensão foi na Ásia Oriental, onde o Japão declarou guerra à Alemanha em 23 de Agosto de 1914. Embora os Japoneses tivessem estado aliados à Grã-Bretanha desde 1902 e estivessem a responder a um pedido britânico de assistência naval, o seu interesse era conquistar as colónias insulares da Alemanha no Pacífico Norte e a concessão de Qingdao, na China, e, no final do ano, era o que tinham feito. A partir daí, pouca ajuda deram aos seus parceiros.

A segunda extensão foi no Médio Oriente, depois de o Império Otomano se ter juntado às Potências Centrais em Novembro de 1914. Os combates alastraram para o Cáucaso, para a Mesopotâmia (o Iraque de hoje), para o Egipto e a Palestina, para os Dardanelos e para a Península Arábica. Embora o governo de Constantinopla fosse presidido por um Grão-Vizir nomeado pelo Sultão, fora controlado desde 1913 pelos dirigentes do partido dos Jovens Turcos, organizado no Comité da União e do Progresso, ou CUP, que era favorável a políticas modernizadoras, autoritárias e, cada vez mais, nacionalistas turcas para deter a decadência secular do império. De quem tinham mais medo era do seu inimigo tradicional, a Rússia, e eles viam uma aliança com a Alemanha como a melhor probabilidade de segurança. Mas, além disso, esperavam reconquistar território perdido para a Rússia no Cáucaso e contestar o controlo britânico do Canal de Suez.23 Na prática, os Turcos foram obrigados a travar uma guerra sobretudo defensiva, embora, de início, com considerável sucesso, já que, em 1915, repeliram os esforços dos Aliados para conquistar Constantinopla através do desembarque na península de Gallipoli e, em 1916, em Kut-al-Amara, cercaram e aprisionaram uma expedição britânica enviada contra Bagdad. A sua entrada fez as forças russas e britânicas divergirem para o Médio Oriente e deu azo a uma expansão significativa dos objectivos de guerra aliados. Enquanto os Alemães se comprometeram em 1916 a lutar 14 | E N T R E

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tanto tempo quanto necessário para preservar a integridade do Império Otomano, o governo russo conseguiu, na Primavera de 1915, da Grã-Bretanha e da França uma promessa secreta de que poderia anexar Constantinopla e o litoral do Bósforo e dos Dardanelos, e este “acordo dos Estreitos” levou a uma série de ajustes de partição. O mais notório foi o Acordo Sykes-Picot anglo-francês de 1916, que previa o controlo britânico sobre a maior parte da Mesopotâmia, o controlo francês da Síria e do Líbano e a imposição de um regime internacional sobre a maior parte da Palestina.

Era difícil conciliar isto com as iniciativas britânicas na correspondência “McMahon-Hussein”, com Sharif Hussein, de Meca, que desencadeou a revolta árabe em Junho de 1916 em troca de promessas amplas, mas ambíguas, de independência para os territórios árabes sob domínio turco. Não obstante, os Aliados estavam agora de acordo em destruir o Império Otomano na Ásia, enquanto os Alemães esperavam preservar pelo menos esse domínio e os próprios Turcos esperavam engrandecê-lo.

A terceira extensão foi na Europa Mediterrânica, onde a Itália declarou guerra à Áustria-Hungria em Maio de 1915 (e à Alemanha em 1916), na sequência do seu Tratado de Londres com os Aliados selado secretamente em Abril. O tratado prometia aos Italianos não apenas as áreas de língua italiana sob domínio habsbúrgico, mas também o Tirol do Sul, de língua alemã (que ofereceria uma fronteira estratégica no desfiladeiro do Brenner), e os territórios de língua eslovena e croata da Ístria e da Dalmácia (que permitiriam à Itália dominar ambos os litorais do Adriático). O governo italiano queria, por conseguinte, mais do que podia justificar-se com a auto-determinação e estava manifestamente a atacar um opositor que não estava interessado em território italiano, queria evitar a guerra e tentou oferecer um preço para que isto acontecesse. Em grande medida por estas razões, o apoio público à guerra na Itália foi fraco. O governo esperava uma vitória rápida enquanto os Austríacos estivessem sob pressão na Europa do Leste, mas o momento escolhido foi tosco. Formou-se uma nova frente estabilizada do lago Garda ao rio Isonzo, e, entre Junho de 1915 e Setembro de 1917, onze Batalhas do Isonzo custaram aos Italianos centenas de milhar de baixas por um avanço de escassos trinta e dois quilómetros.

Finalmente, de modo faseado, a campanha dos Balcãs também se foi ampliando.

Em Setembro de 1915, a Bulgária, o vencido da Guerra dos Balcãs de 1913, aceitou as promessas austro-alemãs de território sérvio. Aliou-se às Potências Centrais e tomou parte na campanha conjunta que conquistou a Sérvia e o Montenegro. Os Aliados responderam desembarcando em Salónica, a convite de um governo grego encabeçado por Eleutherios Venizelos, que foi quase de imediato substituído por um outro empenhado em manter-se neutro, um desejo partilhado pelo rei Constantino da Grécia. Mas as tropas de Salónica ficaram (e os Aliados intervieram crescentemente na política interna grega) e um novo impasse se abriu na Macedónia, onde unidades francesas, britânicas, italianas e russas (acompanhadas pelo que restava dos Sérvios) se confrontaram com forças principalmente búlgaras, apoiadas por alemães e austríacos. Embora os Aliados atacassem no Verão de 1916 e na Primavera de 1917, pouco conseguiram avançar. Além disso, quando a Roménia se lhes juntou em Pró logo : Impasse, 1914-1917 |

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Agosto de 1916 (tendo-lhe sido prometida pela Áustria-Hungria a área de língua romena da Transilvânia), também ela foi esmagada por uma invasão alemã, austríaca, búlgara e turca. Só o Norte do país não foi ocupado e a frente romena tornou-se um apêndice da frente russa. Em Junho de 1917, a Grécia juntou-se aos Aliados depois de Constantino ter abdicado e Venizelos ter voltado a assumir funções, mas, do ponto de vista militar, os Balcãs ficaram agora mais calmos.

Os Aliados tinham atribuído responsabilidades ao Japão, à Sérvia, à Roménia e aos Árabes; às Potências Centrais, à Bulgária e à Turquia. Estes compromissos aumentavam ainda mais a dificuldade de restabelecer a paz. Em Abril de 1917, as implicações deles revelaram-se, contudo, muito pequenas frente às da intervenção americana, a qual, junto com a Revolução Russa de Março, marcou o ponto de viragem mais importante desde que a Frente Ocidental ficara estabilizada. A escolha do momento da entrada americana foi determinada pelos acontecimentos no mar, onde cada lado estava a tentar privar o outro do acesso a abastecimentos. Em Março de 1915, os Aliados tinham declarado um bloqueio total, aplicável não apenas às importações de material militar, mas também de alimentos e medicamentos, e as suas marinhas conseguiram eliminar a navegação das Potências Centrais da maior parte das rotas marítimas mundiais. Contudo, a Alemanha continuava a importar minério de ferro sueco e bens alimentares holandeses e dinamarqueses e, até 1916, o bloqueio, na prática, estava longe de ser hermético, embora, por outro lado, as marinhas austro-húngara e alemã representassem uma ameaça pequena ao domínio aliado dos mares. Em parte, isto devia-se a razões tecnológicas: desde o final do século dezanove, as minas, submarinos e torpedos tinham-se tornado cada vez mais perigosos para navios de guerra que, se fossem afundados, podiam levar anos a ser substituídos. Wilhelm II construíra a marinha de alto mar alemã tanto para conseguir influência política sobre a Grã-Bretanha como para destruir efectivamente a Marinha Real, e a sua intenção era preservá-la para aquele fim na conferência de paz. A unidade de descodificação na Sala 40 do Almirantado de Londres era capaz de ler as mensagens de rádio inimigas e de lançar um aviso quando os Alemães saíam para o mar, mas Sir John Jellicoe, o comandante da Grande Armada britânica, tinha pouco incentivo para arriscar os seus navios quando o status quo já estava a seu favor.

Assim, durante toda a guerra, as principais armadas de combate britânicas e alemãs só estiveram à distância de tiro durante alguns minutos durante a Batalha da Jutlândia de 31 de Maio de 1916. E, mesmo se a perícia dos artilheiros alemães na Jutlândia infligiu aos Britânicos perdas quase duas vezes mais pesadas do que as sofridas, o comandante da Esquadra de Alto Mar, Reinhard Scheer, achou que escapara por pouco e que a guerra submarina oferecia melhores probabilidades de quebrar a supremacia aliada.

A Jutlândia foi, assim, uma das razões para a resolução dos dirigentes alemães na Conferência de Pless de 9 de Janeiro de 1917 de iniciar desde 1 de Fevereiro uma campanha de guerra submarina sem restrições. Numa “região proibida” em torno das Ilhas Britânicas e do Ocidente da França, tudo o que estivesse à tona de água 16 | E N T R E

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beligerante ou neutro, navio de guerra, mercante ou paquete de passageiros - estava sujeito a ser torpedeado sem aviso. Os Alemães tinham já experimentado uma campanha sem restrições em 1915, mas, até ao momento, dois factores tinham-nos sustido. Em primeiro lugar, tinham demasiado poucos submarinos (e apenas um terço deles era provável que estivesse em patrulha simultaneamente), que transportavam apenas quatro torpedos cada. Em segundo lugar, depois do torpedeamento, em Maio de 1915, do paquete de passageiros britânico Lusitania - com 1.198 mortos, 128 dos quais americanos - o presidente Wilson reagira com muito mais severidade do que fizera contra o bloqueio aliado. Durante meses de confrontação, Wilson exigiu que os submarinos respeitassem as “regras de cruzador” - isto é, vir primeiro à superfície e dar um aviso às suas vítimas, mesmo se isto os tornava mais vulneráveis - e acabou por ameaçar romper as relações diplomáticas. Bethmann Hollweg, que receava a guerra com a América, cedeu às exigências de Wilson, mas, depois da Jutlândia, a marinha fez pressão para que a guerra sem restrições fosse retomada. Por esta altura, a marinha construíra mais submarinos e declarou que podia obrigar os Ingleses a renderem-se no prazo de cinco meses; esperava-se a intervenção dos EUA, mas os submarinos afundariam quaisquer transportes de tropas americanos e a rendição britânica tornaria a América irrelevante. Os almirantes obtiveram apoio da maioria do Reichstag e de Hindenburg e Ludendorff, que queriam cortar os abastecimentos americanos antes das ofensivas aliadas da Primavera de 1917. Wilhem II também se inclinou para o lado dos falcões e Bethmann Hollweg, isolado, deu o seu acordo. Contudo, se os Alemães não tivessem estado com tanta pressa e tivessem continuado a operar respeitando as regras de cruzador com uma esquadra de submarinos alargada, podiam mesmo assim ter infligido perdas pesadas e é razoável partir do princípio de que a Revolução Russa e os motins de 1917 no exército francês teriam acontecido de qualquer modo. E embora, durante quatro meses, os resultados correspondessem às previsões da marinha, os submarinos foram incapazes de manter um esforço total por mais tempo e, depois de Maio, os Ingleses introduziram o sistema de navegação em comboio e os afundamentos diminuíram. A crise suprema da guerra naval chegou um ano mais cedo do que em terra e, em finais de 1917, Lloyd George acreditava que o maior perigo dos submarinos já passara.24 Depois do erro calamitoso da Alemanha de, desde logo, dar início à guerra, a decisão de Pless privou-a da sua melhor oportunidade de se desenvencilhar em termos favoráveis.

Wilson não viu alternativa senão tirar as consequências e quebrar as relações, o que fez em Fevereiro de 1917. Com navios mercantes americanos a serem afundados, sentiu-se, além disso, obrigado a armá-los e guarnecê-los com pessoal da marinha, o que implicava uma guerra de troca de tiros com a Alemanha no alto mar. Contudo, hesitou em recomendar ao Congresso uma declaração de hostilidades, e não conseguiu equacionar esta hipótese até os Ingleses interceptarem, decifrarem e lhe fazerem chegar o “telegrama de Zimmermann” ao presidente do México, do ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, que propunha uma aliança anti-americana entre a Alemanha, o México e o Japão. A tempestade que se gerou na sequência de Wilson Pró logo : Impasse, 1914-1917 |

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ter autorizado a publicação do telegrama significou que, pela primeira vez, ele podia ir ao Congresso na expectativa de que este votasse a favor da guerra. Decidiu fazê-lo, contudo, não apenas porque estava convicto de que o povo em geral iria apoiá-lo, mas também porque acreditava que os Aliados estavam a aproximar-se da vitória e ele e os seus conselheiros esperavam que, em troca de enviarem uma modesta força expedicionária para a Europa e de prestarem ajuda naval e financeira, os EUA pudessem participar na conferência de paz de pleno direito. Wilson acreditava que combater o militarismo alemão era do interesse da América - e tinha esperança na democratização alemã, embora, como Lloyd George, nunca tenha feito disso uma exigência incondicional -, mas também fazia o diagnóstico de que a guerra emanara de um sistema de equilíbrio de poderes cuja diplomacia secreta e corridas aos armamentos o horrorizavam. Já durante o período de neutralidade ele decidira que a política internacional tinha de ser reestruturada e declarara o seu apoio a uma Liga das Nações, à qual esperava que a América viesse a aderir. A condição prévia do sucesso dessa Liga era não apenas derrotar os Alemães, mas também impor restrições aos Aliados, cujas exigências, assim receava, iriam simplesmente alimentar um outro conflito. Por conseguinte, no momento de entrar, os Estados Unidos perfilaram-se como uma “potência associada”, não assinando o Pacto de Londres de 1914 nem se comprometendo a não concluir uma paz separada, e Washington distanciou-se dos acordos inter-aliados a respeito dos objectivos de guerra.

Sem a intervenção americana, é difícil ver os Aliados a fazer melhor do que um empate desfavorável. Mas ela também ameaçava colocar-lhes empecilhos em caso de vitória, tanto mais quanto se seguia à revolução na Rússia. A formação do Governo Provisório em Petrogrado, composto por liberais e socialistas moderados, permitiu aos Aliados retratar a guerra como uma cruzada de democracias contra autocracias.

Mas a revolução também comprometeu a ofensiva dos Aliados planeada para a Primavera de 1917 e o Governo Provisório estava em confronto com o Soviete de Petrogrado, ou Conselho dos Representantes dos Soldados e Operários, cujo apelo a “uma paz sem anexações nem indemnizações” obtinha ampla ressonância. A revolução serviu de inspiração à esquerda em toda a Europa e radicalizou os partidos socialistas e os sindicatos que tinham dado apoio ao esforço de guerra. Como coincidiu também com uma inflação acelerada e com a pressão sobre os padrões de vida, a Primavera e o Verão assistiram às maiores greves e protestos desde que a guerra começara. Em França, uma tendência “minoritária” em crescimento dentro do Partido Socialista (Section française de l’Internationale ouvrière, ou SFIO) opunha-se à participação no governo. Na Alemanha, o SPD expulsou a sua “minoria”, que formou um partido independente (o USPD) e exigiu uma paz de compromisso.

A maior parte do reavivar da controvérsia interna girava em torno dos objectivos de guerra e dois episódios puseram isto em relevo. Um foi a “Resolução pela Paz”, aprovada em 19 de Julho por uma nova maioria no Reichstag, composta pelo SPD, o Centro e dois partidos liberais. Embora a formulação fosse ambígua, a resolução parecia repudiar as anexações e indemnizações. Hindenburg e Ludendorff ficaram 18 | E N T R E

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furiosos e insistiram no afastamento de Bethmann Hollweg, e o sucessor deste, Georg Michaelis, era um candidato da OHL que aceitou a resolução apenas “tal como eu a interpreto”.25 O segundo episódio foi um convite a todos os partidos socialistas para mandarem representantes a um congresso em Estocolmo, no qual os governos alemão e austro-húngaro estavam dispostos a deixar os seus socialistas participar. O governo russo apoiou a iniciativa, mas os governos aliados bloquearam-na recusando os passaportes. Devido à controvérsia, a SFIO cessou a participação no governo francês e o presidente do Partido Trabalhista, Arthur Henderson, abandonou o governo de Lloyd George na Grã-Bretanha, embora fosse substituído por um outro representante trabalhista.

No Verão de 1917, a opinião pública tornara-se mais cansada da guerra e a estratégia aliada de ofensivas coordenadas fora posta de lado, enquanto os submarinos alemães não tinham conseguido vencer a Grã-Bretanha à fome. Parecia haver auspícios favoráveis ao que se tornaram as iniciativas de paz mais consistentes durante a guerra, mas os contactos foram, sem excepção, mal sucedidos. As sondagens começaram com o novo imperador austríaco, Karl, que sucedeu a Franz Joseph em Novembro de 1916. Ele usou o seu cunhado, o príncipe Sixte de Bourbon, para contactar os Franceses, sem pôr os Alemães ao corrente do que estava a fazer, e, em 24 de Março de 1917, precipitou-se a enviar uma carta em que apoiava as “justas pretensões” da França à Alsácia-Lorena.26 Karl não gostava dos Alemães e achava-os arrogantes, ao passo que não tinha nenhuma questão directamente em aberto com a França e a Grã-Bretanha, que não estavam ainda empenhadas em desmembrar a Áustria-Hungria. Aquelas esperavam, contudo, atrair esta a uma paz separada e sentiam-se presas ao compromisso de transferir território austríaco que tinham contraído junto da Itália. Como Karl se sentia demasiado fraco para concluir uma paz separada, e não admitia concessões aos Italianos, as conversas não levaram a lado nenhum. Sondagens russas simultâneas junto da Alemanha encontraram obstáculos semelhantes: o Governo Provisório recusava-se a separar-se dos seus aliados e, como os Alemães queriam que este abandonasse a Polónia e o litoral báltico, tinha pouco incentivo para o fazer.

No Outono, em contrapartida, foram os próprios Alemães a abordar a França e a Grã-Bretanha. O impulso veio do novo ministro dos Negócios Estrangeiros de Michaelis, Richard von Kühlmann. Kühlmann deu sequência a uma sondagem que começara antes de ele ter assumido o cargo, feita por via de intermediários belgas junto do ex-primeiro-ministro francês, Aristide Briand. Briand dispôs-se a encontrar-se na Suíça com um responsável alemão, o barão Oscar von der Lancken-Wakenitz, e supunha que a Alsácia-Lorena estava em cima da mesa, mas, na verdade, os Alemães estavam dispostos a ceder no máximo algumas aldeias fronteiriças. O governo francês conjecturou que o verdadeiro objectivo era separar a França dos seus aliados e vetou o encontro. Mas Kühlmann colocava as suas maiores esperanças em Londres, de onde recebeu encorajamento depois de, em 1 de Agosto, o Papa Bento XV ter apelado a todos os lados a que regressassem ao status quo anterior a 1914. A resPró logo : Impasse, 1914-1917 |

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posta britânica a Bento convidava a Alemanha a clarificar as suas intenções com respeito à Bélgica e, numa conferência no palácio Bellevue em 11 de Setembro, os dirigentes alemães renunciaram temporariamente às suas exigências de bases navais na Flandres, embora Hindenburg e Ludendorff ainda quisessem subordinar o país noutros aspectos. Uma mensagem enviada através de um diplomata espanhol, o marquês de Villalobar, indicava que Kühlmann estava disposto a conversar, e o governo britânico hesitou. Lloyd George estava disposto a concordar com a expansão alemã na Rússia, mas os seus colegas não estavam, e os britânicos consultaram os seus aliados, que se opuseram a mais contactos.

Embora ambos os lados estivessem dispostos a moderar os seus objectivos, as diferenças entre eles continuaram a ser insuperáveis. A Alemanha não queria ceder nem a Bélgica nem a Alsácia-Lorena; a Itália mantinha as suas reivindicações relativamente à Áustria. Cada coligação estava a tentar separar os seus adversários em vez de procurar um acordo geral. Apesar da modificação da opinião pública, os governos eram frouxos ou evasivos nas suas declarações sobre os objectivos de guerra em vez de diluírem a substância destes. E nenhum dos lados tinha também abandonado a esperança de vencer. As revoltas na Rússia permitiriam às Potências Centrais transferir forças do Leste, ao passo que a França e a Grã-Bretanha podiam perspectivar uma vitória com ajuda americana. Este cálculo era explícito em Paris e Londres e partia do princípio tanto de que a intervenção americana lhes dava uma vantagem a longo prazo como de que podiam ainda atingir os seus objectivos de guerra, mau grado a recusa de Wilson a subscrevê-los. Além disso, o Presidente e os seus conselheiros acreditavam que era contra o interesse americano parar os combates enquanto os Alemães estavam na mó de cima, e ele não só recusou passaportes para Estocolmo aos socialistas americanos como rejeitou a nota de paz do Papa, assim definindo um rumo hostil ao compromisso. Fê-lo na crença de que continuar a guerra tornaria os aliados europeus mais dependentes dele e aumentaria a sua influência sobre ambos os campos. Foi, assim, em grande medida uma aposta em circunstâncias imponderáveis o facto de os governos francês e britânico terem rejeitado as lisonjas de Kühlmann e terem continuado. Mas a decisão deles foi confirmada quando o governo francês de Paul Painlevé se demitiu em Novembro e o presidente Raymond Poincaré escolheu como seu sucessor não Joseph Caillaux, que era suspeito de ser a favor de negociações, mas Georges Clemenceau, que estava empenhado em prosseguir a guerra.

Embora os Aliados rejeitassem abordagens no sentido da paz, continuava a não ser claro como é que alguma vez iriam sair vencedores. Três choques puseram este ponto em relevo: em Caporetto, em Petrogrado e em Cambrai. Durante o Verão de 1917, os Italianos lançaram a décima e décima-primeira batalhas do Isonzo e esta, no decurso da qual os atacantes conquistaram o planalto de Bainsizza, colocou os Austríacos sob uma pressão maior do que nunca. Karl solicitou - e recebeu com atraso - ajuda alemã, tendo sete divisões sido transportadas e um Décimo-Quarto Exército especial sido formado sob o comando do general Otto von Below, sendo 20 | E N T R E

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composto em partes iguais por unidades alemãs e austríacas: nas primeiras horas do dia 24 de Outubro, ele caiu sobre o Segundo Exército italiano no sector de Caporetto da parte central do vale do Isonzo. O alto-comando italiano (Comando supremo CS) tinha suspendido os seus ataques e a sua infantaria supunha que a estação de campanhas terminara; o CS sabia dos reforços alemães e recebeu um aviso com antecedência de vários dias, mas fez notoriamente pouco para se preparar. Quando o golpe foi desferido, o seu impacto foi devastador. O bombardeamento, usando gás venenoso contra o qual as máscaras italianas eram inúteis, matou milhares, antes de a infantaria alemã se infiltrar pelo fundo dos vales, isolando e cercando as guarnições nas encostas: cerca de 40.000 italianos foram mortos e feridos, mas 265.000 renderam-se, enquanto 400.000 soldados “dispersos” (sbandati) abandonavam as suas unidades e fluíam para a retaguarda. A implosão do Segundo Exército forçou o Terceiro e Quarto Exércitos adjacentes a retirar igualmente, e território que levara dois anos e meio a conquistar perdeu-se no mesmo número de dias, com os atacantes a avançarem até oitenta quilómetros e a atravessar o Isonzo e o Tagliamento, antes de se deterem nos inícios de Novembro na margem do Piave. Ao longo deste rio, o CS tinha estado a preparar defesas desde há alguns meses e, embora os atacantes tivessem atravessado a vau, foram repelidos. Contudo, as limitações dos vencedores foram tão importantes como a resistência italiana. A OHL planeara que esta fosse uma operação restrita e transferira menos de metade das divisões que os Austríacos queriam. A ruptura das linhas abriu uma guerra de movimento para a qual as Potências Centrais estavam mal equipadas e, na ausência de um plano de avanço acordado ou de uma estrutura de comando, elas competiam por espaço, não tendo camiões ou cavalos suficientes para manter a progressão.

Mesmo assim, o golpe para os Italianos e os seus aliados foi pesado.27 Os ministros britânicos notaram, taciturnos, que mais um aliado fora posto fora de combate e uma conferência convocada à pressa para Rapallo concordou com enviar reforços que não tardaram a totalizar cinco divisões britânicas e seis francesas. Os Aliados insistiram em que o comandante italiano, Luigi Cadorna, fosse demitido, e o novo ministério de Vittorio Orlando estava de qualquer modo ansioso por fazer isso mesmo, substituindo Cadorna por Armando Diaz, com Pietro Badoglio como adjunto deste.28 O primeiro-ministro disse a Diaz que a linha do Piave tinha de ser mantida “a qualquer custo” e, de facto, durante o resto do ano o exército italiano reuniu forças e as Potências Centrais não conseguiram romper as linhas nos sectores de Asiago e de Monte Grappa do seu flanco norte.29 Enquanto os Britânicos e os Franceses se movimentavam na Lombardia, o exército italiano deteve o inimigo sem ajuda, lutando em altitudes extraordinárias sob temperaturas que, de noite, desciam muito abaixo de zero. Contudo, embora os Italianos tivessem reconquistado a capacidade de combate defensiva, os Alemães tinham sacudido a pressão sobre os Austríacos e nenhuma outra grande ofensiva italiana teve lugar até ao último mês da guerra.30 O segundo choque deu-se no Leste. Durante 1917, Hindenburg e Ludendorff aguardaram que o exército russo se desintegrasse, usando a propaganda e a fraterniPró logo : Impasse, 1914-1917 |

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zação para acelerar o processo. O seu contra-ataque depois da ofensiva de Verão russa limpou o território austríaco e, depois disso, concentraram-se na costa do Báltico, onde, em 1 de Setembro, conquistaram Riga. Tal como Caporetto, a Batalha de Riga foi notável - e foi assinalada pelos Estados-Maiores aliados - por tácticas inovadoras de artilharia e infantaria que, em 1918, iriam ser adoptadas numa escala mais ampla. A batalha atingiu um ponto nevrálgico das vias de acesso a Petrogrado e contribuiu, como se pretendia, para a radicalização política da Rússia. O Governo Provisório nem melhorara a situação económica nem acabara com a guerra, e abrira-se uma oportunidade para Lenine e os bolcheviques, o agrupamento russo importante que exigia uma paz imediata. Embora os Alemães financiassem o partido de Lenine e tivessem organizado o seu regresso do exílio em Zurique, ele defendia a tomada do poder com o argumento de que a situação na Alemanha era auspiciosa para que a revolução alastrasse para esse país. Mas ele também não devia fidelidade aos Aliados e colocar os bolcheviques na posição de serem o único partido disposto a entrar em ruptura com eles não só o beneficiava politicamente como estava conforme com a sua análise da guerra como um empreendimento imperialista em que o proletariado não tinha participação. Em Setembro, os bolcheviques conquistaram a maioria no Soviete de Petrogrado e, sob o lema de exigir todo o poder para os sovietes, podiam agora justificar o derrube do Governo Provisório antes de ele abandonar a capital. Mal o governo começou preparativos contra eles, conquistaram Petrogrado com a ajuda da guarnição da cidade em 7-8 de Novembro. Em 15 de Dezembro, seguiu-se em toda a conformidade um cessar-fogo com as Potências Centrais.

Enquanto o que restava do exército russo vagueava de regresso a casa, a Roménia, agora isolada, também assinou um armistício.

A Revolução Bolchevique foi fundamental para a paisagem política e militar de 1918. Desde Novembro de 1917 que a OHL estava a deslocar divisões para ocidente, ao mesmo tempo que começavam as negociações com os Russos em Brest-Litovsk. A Alemanha e a Áustria-Hungria aprofundaram o fosso entre Lenine e os Aliados juntando-se aos bolcheviques na defesa da boca para fora do princípio de autodeterminação nacional, enquanto os Russos embaraçavam os seus anteriores aliados publicando os tratados secretos concluídos com Nicolau II para retalhar o Médio Oriente, ceder território austríaco à Itália e consignar a Renânia ao domínio francês. Contudo, depressa se tornou claro que as Potências Centrais planeavam usar o slogan da autodeterminação como cobertura para a expansão privando a Rússia da Polónia, das suas províncias bálticas do Sul e da Ucrânia e convertendo essas regiões em estados satélites. No seu discurso dos Catorze Pontos de 8 de Janeiro, Woodrow Wilson tentou seduzir os Russos e a esquerda europeia proclamando unilateralmente um programa mais moderado e progressista de objectivos de guerra aliados e americanos e, nas semanas que se seguiram, greves contra a guerra abalaram Viena e Berlim. Foi em vão. Hindenburg e Ludendorff tinham perdido a paciência e, no Conselho da Coroa de Bad Homburg, a 13 de Fevereiro, insistiram em impor a paz renovando o avanço sobre Petrogrado. Os Russos não tinham capa22 | E N T R E

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cidade de resistir e Lenine levou o comité central bolchevique a aprovar um acordo - o tratado de paz de Brest-Litovsk - que não tinha intenção de honrar por mais tempo do que o necessário, mas que manteve o seu regime no poder e retirou a Rússia da guerra. O tratado também endureceu a decisão da OHL de passar à ofensiva a ocidente: o erro fatídico final que tornou possível uma vitória aliada muito mais cedo do que parecera plausível no Inverno de 1917-18.

Na verdade, até esse Inverno, a situação estática da Frente Ocidental mantivera-se, a despeito de indicações de que a vantagem que a defensiva gozava estava a resvalar. Embora o exército francês estivesse agora a recuperar dos motins, o sucessor de Nivelle, Philippe Pétain, renunciara aos ataques totais e procurava reacostumar as suas forças a atacar pondo em acção um poder de fogo colossal para conquistar objectivos limitados. Em La Malmaison, em 23-25 de Outubro, os Franceses avançaram seis quilómetros e conquistaram os cimos do Chemin des Dames, onde haviam fracassado em Abril, mas pagando um preço tremendo em material.31 Ao longo de trinta e dois dias antes do ataque, 266 comboios transportaram até 80.000 toneladas de munições, com o peso de obuses por quilómetro a exceder seis ou sete vezes o da ofensiva francesa de Setembro de 1915 e a custar acima de 500 milhões de francos - duas vezes o total de toda a construção de tanques francesa durante a guerra.32 Uma operação semelhante segundo o modelo da guerra de cerco foi conduzida pelo Segundo Exército britânico sob o comando de Sir Herbert Plumer na Batalha da Cordilheira de Messines entre 7 e 12 de Junho, com os atacantes a fazerem explodir noventa enormes minas que os seus sapadores tinham estado a escavar desde 1915 e a dispararem duas vezes mais obuses do que antes do primeiro dia do Somme.

Embora tivessem conquistado a cordilheira e, por uma vez, tivessem sofrido menos baixas do que os defensores, também esta operação acarretou um dispêndio de recursos perfeitamente desproporcionado em relação ao território ganho.

O problema de saber como os Aliados poderiam vencer foi colocado de modo ainda mais enfático pela Terceira Batalha de Ypres entre 31 de Julho e 10 de Novembro de 1917, mais um combate de desgaste (aprovado pelo governo de Lloyd George com a maior das relutâncias) em que A BEF avançou seis milhas por dentro de uma saliência angular que, como Haig reconheceu, era dificilmente defensável.33 Haig sustentara que um ataque aqui, em conjunção com um desembarque vindo do mar, poderia conquistar a principal via férrea lateral do inimigo e limpar a costa belga: o que aconteceu foi que os Alemães o detiveram, como tinham previsto, em “Flandern I”, a terceira das suas cinco linhas defensivas.34 Nesta altura, os Ingleses não só estavam mais bem equipados como eram mais competentes tacticamente do que no Somme e dispararam seis vezes mais munições de artilharia do que os defensores,35 mas também estes haviam mudado os seus métodos. A artilharia dos Alemães bombardeou a BEF a partir de posições ocultas no planalto de Gheluvelt, usando granadas de gás de mostarda recém-concebidas, e mantiveram o grosso da infantaria muito atrás da linha da frente, reconquistando repetidamente terreno perdido através de contra-ataques imediatos. Ao longo de Setembro, os Ingleses pararam por três semaPró logo : Impasse, 1914-1917 |

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nas antes de tentarem de novo, com Plumer e a sua equipa a sucederem ao comando muito criticado do Quinto Exército por Sir Herbert Gough e a lançarem três ataques planeados com mais cuidado em tempo mais seco. Desta vez, os Alemães sentiram mais dificuldade em estar à altura e a OHL ficou abalada, guarnecendo mais fortemente as linhas da frente na Batalha de Broodseinde, em 4 de Outubro, e perdendo milhares de homens. Mas agora o tempo piorara, ao mesmo tempo que Plumer deixava um intervalo mais curto entre os seus ataques e os planeava menos exaustivamente, com o resultado de que eles perderam de novo o seu ímpeto. Na fase final, forças sobretudo canadianas sob o comando de Sir Arthur Currie conquistaram a cordilheira de Passchendaele ao preço de 16.000 baixas, avançando metodicamente através de uma região deserta e alagada, mas toda a probabilidade de atingir os objectivos iniciais há muito desaparecera. Embora ambos os lados achassem as condições intensamente deprimentes e difíceis, o moral da BEF sofreu mais e os Britânicos sofreram mais baixas do que os Alemães, com um exército mais pequeno.36 Também a batalha final de 1917 da Frente Ocidental em Cambrai, entre 20 de Novembro e 5 de Dezembro, não trouxe muito encorajamento. Seis divisões britânicas com 476 tanques (216 na linha da frente) conseguiram uma surpresa quase completa quando atacaram num sector calmo apoiadas por um bombardeamento de 1.000 canhões sem tiros de ensaio prévios: na primeira manhã, abriram uma brecha com oito quilómetros de largo. Mas mais de metade dos tanques foram atingidos ou avariaram-se no primeiro dia, os reforços alemães chegaram rapidamente e a batalha assentou no padrão habitual de ataques de infantaria repetidos antes de os Alemães, por sua vez, conseguirem surpreender com um contragolpe maciço que se infiltrou nas defesas britânicas improvisadas e recapturou a maior parte do território conquistado. Não havia muita confirmação neste caso de que a resistência do inimigo estivesse a desgastar-se; ou de que mesmo tácticas radicalmente inovadoras pudessem obter mais do que um sucesso transitório, enquanto os Alemães estavam já a ser pioneiros em novos métodos de ataque (que o Estado-Maior de Haig não foi capaz de reconhecer). Alguma coisa correra muito mal e o governo britânico teve a percepção de que tinham sido os militares a seguir o caminho errado.37 Depois de Cambrai, nas palavras de Winston Churchill, “Uma súbita impressão sinistra dominava o Estado-Maior. A exigência de uma nova ofensiva foi-se. O estado de espírito deu uma volta e passou a ser de pura defesa - e em posição muito desvantajosa.”38 Em 7 de Outubro, Lloyd George dissera ao secretário de Estado Maurice Hankey que receava uma outra ofensiva ao estilo da Flandres em 1918. O exército britânico tinha de descansar, como fizera o francês, para vencer como parte de um esforço concertado em 1919, sob pena de ser a América, e não a Grã-Bretanha, a desferir o golpe decisivo.39 Contudo, só no mês seguinte é que as primeiras unidades da Força Expedicionária Americana (American Expeditionary Force - AEF) entraram na linha da frente na Lorena e a estratégia americana, tal como acordado entre o comandante da AEF, John J. Pershing, e o Departamento de Guerra em Washington, previa um reforço gradual e um avanço decisivo para nordeste em 1919. Pétain destinava o seu 24 | E N T R E

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principal esforço de guerra de 1918 para a Alsácia, com vista a conquistar território desejado pela França em negociações de paz, em contraste com as estratégias mais ambiciosas coordenadas com os seus aliados em anos anteriores, e Poincaré registou que os ministros franceses estavam de acordo em que “um terço dos deputados […] desejam a paz, sem ousarem admiti-lo”.40 Mas também Lloyd George e muitos membros do seu governo, bem como o Chefe do Estado-Maior Imperial, Sir William Robertson, duvidavam agora da possibilidade de uma vitória decisiva sobre a Alemanha, pelo menos a um custo aceitável ou num futuro próximo.41 Na Primavera de 1917, eles tinham determinado ganhar o controlo sobre a Mesopotâmia e a Palestina e expedições britânicas reforçadas conquistaram Bagdad em Março e Jerusalém em Dezembro. Em paralelo, num gesto que sabotava o estatuto internacional da Palestina previsto no Acordo Sykes-Picot, os Britânicos emitiram em Novembro a “Declaração Balfour”, uma carta aberta do secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros que apoiava o estabelecimento ali de um “lar nacional” judeu. Para o novo ano, embora Haig quisesse renovar o ataque na Flandres, o governo era a favor de mais um avanço para lá de Jerusalém: o esforço de guerra turco ultrapassara o seu zénite e a tentação era concentrar os esforços no Levante. Nos campos de batalha decisivos da Europa, em contrapartida, não era evidente nenhuma tendência no sentido de uma superioridade aliada, com pouco consenso relativamente à estratégia apropriada.

Depois de Dunquerque, em 1940, Churchill recordou à Câmara dos Comuns que “Durante os primeiros quatro anos da última guerra, os Aliados não viveram mais do que desastres e desapontamentos. […] fazíamos repetidamente a nós próprios a pergunta: como é que vamos vencer?”42 No final de 1917, os Aliados confrontavam-se com um dilema: continuar a combater segundo o modelo da Terceira Batalha de Ypres deixava antever que iria paralisar o exército britânico com tanta certeza como paralisara o francês e o italiano; contudo, um avanço como em Messines e La Malmaison, embora preferível no curto prazo, seria também proibitivo numa escala mais ampla. Diaz, em contrapartida, estava preocupado com como repelir mais uma ofensiva inimiga e os comandantes da Frente Ocidental não tardaram a ser obrigados a segui-lo. Entre os governos, o britânico era o mais pessimista, mas as esperanças francesas assentavam em grande parte nos Americanos, e as esperanças americanas, numa confiança ainda não testada na superioridade de combate dos seus soldados.

Embora as perdas em navios mercantes estivessem a diminuir, eram superiores às novas construções e a tonelagem à disposição dos Aliados estava ainda a decrescer e parecia inadequada às exigências sobre ela que estavam a ser projectadas. Mesmo as economias de guerra aliadas, tão superiores no papel, estavam a passar por uma crise de oferta atrás da outra, ao mesmo tempo que, ao longo de 1917, as opiniões públicas britânica, francesa e italiana tinham todas mergulhado em abismos de desânimo.

A sustentabilidade do esforço de guerra dos Aliados no longo prazo continuava a ser imponderável, ao passo que uma vitória militar no curto prazo parecia enfrentar obstáculos insuperáveis.43 Em suma, as suas perspectivas imediatas eram mais difíPró logo : Impasse, 1914-1917 |

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ceis do que em qualquer momento desde a Primavera de 1916 e as suas tropas exaustas enfrentavam agora uma investida assustadora. Aconteceu que essa investida foi o meio da sua salvação.

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