APRESENTAÇÃO A campanha “Igualdade de Oportunidades na Vida, no Trabalho e no Movimento Sindical”, desenvolvida pela CNMT-CUT desde 1998, tem como um dos eixos prioritários a questão da igualdade de remuneração. Ao mesmo tempo, a inserção do enfoque de gênero nas pesquisas e produtos do Observatório Social, em especial na verificação do cumprimento dos direitos sociais pelas empresas, tem apontado a necessidade de se construir indicadores e parâmetros de interpretação mais consistentes acerca da igualdade de oportunidades e de tratamento entre homens e mulheres no trabalho, particularmente em relação à igualdade de remuneração. Com base nessas preocupações, durante o ano de 2000, a CNMT e o Observatório Social desenvolveram um estudo temático sobre a Convenção nº 100 da OIT e promoveram o seminário internacional “Salário igual para trabalho de igual valor: avanços e desafios para a implementação da Convenção nº 100 da OIT”, realizado em São Paulo/SP, nos dias 4, 5 e 6 de abril de 2001. Na sua viabilização, contou-se com o importante apoio do Centro de Solidariedade e AFL-CIO dos Estados Unidos, do Ildes-Fundação Friedrich Ebert e da própria Organização Internacional do Trabalho – OIT. Este seminário constituiu-se num momento ímpar na discussão sobre a igualdade de remuneração no Brasil: contou com a apresentação de experiências de vários países (da Europa, da América do Norte e da América Latina) e de Secretariados Profissionais Internacionais, além das iniciativas nacionais. Sua realização se deu no marco do 50º aniversário da Convenção nº 100, e também no momento em que a ISP – Internacional de Serviços Públicos – está elaborando uma campanha mundial para a garantia da igualdade de remuneração. Dada a riqueza das experiências apresentadas e a profundidade no tratamento dessa temática, publicamos aqui algumas das iniciativas e desafios apresentados no seminário. Trata-se de experiências de campanhas e de ação sindical, de reflexões teóricas e conceituais acerca da problemática do valor do trabalho e da avaliação de empregos, e de pesquisas realizadas que trazem novos argumentos sobre o custo do trabalho de homens e mulheres e que demonstram a existência da discriminação de gênero em outros aspectos para além da remuneração. Com esta publicação, esperamos divulgar tais reflexões para lideranças sindicais e pesquisadores, bem como contribuir para a elaboração e implementação de políticas de promoção da igualdade de gênero no mundo do trabalho.
Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora da CUT Internacional de Serviços Públicos – ISP Brasil Observatório Social
SALÁRIO IGUAL PARA TRABALHO DE IGUAL VALOR avanços e desafios na implementação da convenção n°- 100 da OIT SUMÁRIO EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS 1. Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor Constance Thomas .................................................................................................................
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2. A luta pelo reconhecimento do trabalho das mulheres no Québec Claudette Carbonneau ........................................................................................................... 18 3. Iniciativas para a promoção da igualdade de remuneração nos EUA Gloria Johnson ..................................................................................................................... 23 4. Elevar salários é tocar na questão do poder Heidi Scharf ......................................................................................................................... 27 5. Estratégias sindicais para a igualdade no emprego no Uruguai Ofélia Ogara ........................................................................................................................ 30 6. Igualdade de remuneração já! Campanha mundial da ISP Jane Pilinger ........................................................................................................................ 34
EXPERIÊNCIAS NACIONAIS 7. Igualdade de oportunidades na vida, no trabalho e no movimento sindical Maria Ednalva Bezerra de Lima e Waldeli P. Melleiro .............................................................. 45 8. Igualdade de oportunidades como eixo da negociação coletiva Neide Aparecida Fonseca ....................................................................................................... 51
EXPERIÊNCIAS DE PESQUISA 9. Custos do trabalho de homens e mulheres na América Latina: mitos e realidade Laís Abramo ......................................................................................................................... 54 10. Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas Márcia Miranda Soares e Mércia Consolação Silva .................................................................. 61 11. Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades Paola Cappellin ................................................................................................................... 70
ANEXO 12. Convenção nº 100 e Recomendação nº 90 da OIT ..................................................................... 85
IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO PARA TRABALHO DE IGUAL VALOR
Coordenadora da Agência para a Igualdade e Emprego da Organização Internacional do Trabalho - OIT*
remuneração diferenciada continua sendo uma das mais persistentes formas de desigualdade entre mulheres e homens. Desde que as mulheres passaram a compor a força de trabalho, elas têm, em geral, recebido salários menores do que os homens. Até algum tempo atrás, em muitos países, esta diferenciação era uma política explícita que não se baseava em evidências de que as mulheres eram menos produtivas do que os homens, mas na assunção de que elas não precisavam ganhar um “salário para viver”, uma vez que seus maridos sustentavam a família. Até bem recentemente, poucas mulheres trabalhavam fora de casa e, quando isso ocorria, tanto os empregadores quanto aqueles que tinham a atribuição de estabelecer políticas a respeito (freqüentemente homens) eram também, muito provavelmente, motivados pela crença de que as mulheres deveriam ganhar menos do que seus maridos, vendo na situação inversa uma ameaça ao tradicional equilíbrio de poder no seio da família. Não obstante a participação das mulheres no mercado de trabalho tenha crescido notavelmente ao longo da última década em muitas partes do mundo, elas ainda sofrem discriminação. A discriminação no mercado de trabalho resulta em acesso desigual ao emprego. Reflete-se em práticas discriminatórias, na defasagem salarial, numa persistente segregação dos empregos femininos aos mais baixos segmentos do mercado de trabalho, no maior número de mulheres no setor informal e nas maiores taxas de desemprego para as trabalhadoras. Todos esses fatores estão relacionados à aludida diferença de remuneração em relação aos homens. No campo da igualdade de direitos, há duas Convenções da OIT que servem de parâmetro. A primeira é a Convenção sobre Igualdade de Remuneração (nº 100), de 1951, atualmente
ratificada por 148 países. Ela torna operacional a previsão do Estatuto da OIT que propugna pela igualdade de remuneração para homens e mulheres trabalhadoras quando se tratar de trabalho de mesmo valor – um conceito que vai muito além da mera igualdade de remuneração para trabalho igual. A outra é a que, no âmbito da OIT, figura como carrochefe sobre o assunto – a Convenção sobre Discriminação no Emprego e na Ocupação (nº 111), de 1958, que propõe a promoção da igualdade em todos os aspectos relativos ao emprego e também ao trabalho fora da relação empregatícia. Nela se proíbe a discriminação quanto a vários aspectos, abrangendo raça, cor, sexo, religião, nacionalidade, opinião política e origem social, com a possibilidade de que o país ratificante adicione novos assuntos, que se submeterão às mesmas regras. Embora não seja considerada central em questões de trabalho, a Convenção sobre os Trabalhadores com Responsabilidades Familiares (nº 156) – que exige que, tanto quanto possível, sejam oferecidos aos homens e mulheres com responsabilidades familiares o mesmo tratamento e as mesmas oportunidades dados àqueles que não as têm – é também essencial para que se conquiste a igualdade substantiva entre homens e mulheres. As principais preocupações da OIT acerca de direitos humanos foram consolidadas na Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, e em seus instrumentos de acompanhamento (informe global e informe anual), de 1998. Ela prevê uma obrigação genérica inclusive para os Estados que não tenham ratificado as Convenções fundamentais da OIT sobre liberdade de associação e negociação coletiva, abolição do trabalho forçado, trabalho infantil e discriminação, a respeitar seus princípios básicos, enquanto se trabalha para obter a ratificação. A Declaração faz referência específica à Convenção sobre Igualdade de Remuneração (nº 100) e à Convenção sobre Discriminação (nº 111).
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Tradução: Carlos Magno de Abreu Neiva.
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
Constance Thomas
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A DIFERENÇA DE REMUNERAÇÃO A diferenciação salarial entre homens e mulheres varia de país para país e, no interior de um mesmo país, entre os setores público e privado e entre diferentes setores da economia. A Comissão de Especialistas da OIT tem constatado a grande extensão desta diferenciação. Internacionalmente, em média, as mulheres recebem dois terços dos salários recebidos pelos homens (1). Um exame completo desses dados não é possível neste artigo, mas apresentaremos alguns exemplos. Numa avaliação geral, muitos países fizeram algum progresso na redução da diferenciação mas, como os exemplos mostram, nem mesmo isso é verdade para todos. Em alguns casos, os ganhos obtidos com a redução da diferenciação foram diminuídos quando ocorreram privatizações em larga escala. Além disso, algumas vezes a menor diferenciação apurada pode camuflar a saída das mulheres do mercado de trabalho.
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
Todos os países europeus experimentam esta diferenciação, a despeito de algum progresso. Quando a diferença é pequena, isto ocorre apenas para um seleto grupo de mulheres com formação de alto nível, no topo do mercado de trabalho. Em outros casos, a maior parte do progresso ocorre em serviços de escritório e em ocupações fundamentais. Na Finlândia, França, Suécia e no Reino Unido, as mulheres empregadas em escritórios ganham entre 3% e 8% menos do que os homens. A maior diferenciação ocorre nas profissões tipicamente femininas (2).
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Na Europa Central e Oriental, as mulheres recebem salários aproximadamente 20% menores do que os homens, mas antes de 1989 isso não representava muito em termos absolutos, devido à relativamente pequena diferença entre os salários mais altos e os mais baixos. Durante a transição a diferenciação salarial entre homens e mulheres aumentou. Na Federação Russa, em 1997, os salários das mulheres eram estimados em apenas 55% dos recebidos pelos homens. Na República Tcheca a diferença é maior para as mulheres de melhor nível educacional (3). Disparidades de remuneração existem em certos setores da economia da Lituânia, como serviço social, onde os ganhos das profissionais mulheres são equivalentes a menos de 50% dos recebidos por seus colegas homens. Estreitas disparidades foram
notadas na Bulgária, onde os ganhos médios mensais das mulheres no setor público variam de 85% a 91% dos ganhos mensais dos homens, dependendo do tipo de trabalho desenvolvido (4). Como há esta tendência de maior paridade salarial entre homens e mulheres no setor público, as demissões nele ocorridas acabam tendo impacto negativo sobre os ganhos gerais das mulheres em relação aos homens, já que estes ganham mais no setor privado. E também é certo que esta diferenciação reduzida pode, na verdade, encobrir a saída forçada de mulheres do mercado de trabalho. O tamanho da diferenciação nesses países em transição é especialmente preocupante, dado o pano de fundo de forte redução nos salários reais, o que torna as mulheres especialmente vulneráveis ao risco da pobreza. O cruzamento de alguns dados permite verificar se as diferenças de gênero têm demonstrado uma tendência para diminuição com a participação crescente das mulheres no trabalho remunerado, e onde isso tem ocorrido. Em alguns países industrializados, como os Estados Unidos, as diferenças de remuneração diminuíram à medida que as mulheres aumentaram sua participação no mercado de trabalho. No Japão, a diferenciação aumentou, com os ganhos mensais das mulheres chegando apenas a 51% do que os homens recebem. Em Hong Kong, as mulheres (excluídas as migrantes) ganham em média 18% menos por mês. Isso representa uma diminuição da diferença à medida que jovens com maior nível educacional entram no mercado de trabalho e que os empregos industriais de menor qualificação se concentram na China. Um estudo recente na Índia (5) revela que as disparidades de remuneração, tanto no setor agrícola quanto nos demais, está aumentando. Os ganhos médios diários dos homens em operações na agricultura são de 21,52 rúpias, enquanto para as mulheres são de 15,38. No setor manufatureiro foram encontradas disparidades ainda maiores, com os ganhos diários na indústria de componentes de computadores sendo 87,4 rúpias para homens e 44,8 para as mulheres. As mulheres se encontram nas categorias não-qualificadas ou, na melhor das hipóteses, nas semi-qualificadas, não importando o treinamento que possuem, a experiência requerida ou a natureza do trabalho desenvolvido. No Brasil, em 1993 as mulheres ganhavam 49,4% dos salários
Com o objetivo de determinar a verdadeira extensão das diferenciações salariais baseadas em questões de gênero existentes, a Comissão de Especialistas da OIT preparou uma Observação Geral em 1998, assinalando que para que se possa avaliar a natureza, a extensão e as causas da diferenciação salarial, e para verificar o cumprimento da Convenção nº 100, faz-se necessária a obtenção de informações mais completas, incluindo: (1) a distribuição das mulheres por níveis salariais e horas de trabalho (classificado por ramo de atividade econômica, ocupação ou grupo ocupacional ou nível educacional/de qualificação, antigüidade, grupo etário e número de horas efetivamente trabalhadas ou pagas; e (2) dados estatísticos sobre a composição dos ganhos (indicando sua natureza: salário mínimo, ordinário ou básico, pagamento de horas extras e diferenciais de turno, verbas de custeio, bônus e gratuidades, e remuneração por tempo não trabalhado) e horas de trabalho. Os governos têm, por isso, sido instados a analisar a situação nacional para determinar a extensão e a natureza das diferenças, se possível por setor, como um ponto de partida para o enfrentamento da questão da igualdade de remuneração. No âmbito da União Européia, o Conselho Consultivo sobre Igualdade de Oportunidades para Homens e Mulheres e sobre Igualdade de Remuneração publicou um Parecer em junho de 1999, no qual enfatizava a necessidade de maiores informações acerca dos sistemas e estruturas de remuneração, de modo a permitir uma comparação por setor e entre os níveis setoriais, entre grupos sócio-demográficos e entre diferentes Estados-membros.
CAUSAS DAS DIFERENÇAS DE REMUNERAÇÃO FUNDADAS NO GÊNERO Hoje se reconhece que as causas das diferenças de remuneração entre homens e mulheres são encontradas tanto no interior do mercado de trabalho quanto fora dele. Muitas das dificuldades existentes para que se atinja a igualdade de remuneração estão estreitamente relacionadas ao status das mulheres
no emprego e na própria sociedade. De modo a viabilizar condições que favoreçam a aplicação do princípio da igualdade de remuneração, a participação das mulheres na força de trabalho deve ser incentivada, e a elas deve ser garantido acesso igual aos empregos e às ocupações. A diferenciação salarial homem/mulher tem sido mapeada principalmente da seguinte forma (6):
1. Diferenças no capital humano relacionadas à produtividade Aqui incluem-se características que são adquiridas, como educação completa, treinamento e experiência; inatas ou melhoradas, como destreza, inteligência; ou que aparecem pela socialização ou pela influência da família, como a tendência a ser uma pessoa cuidadosa, cooperativa, agressiva ou decidida. Há poucos motivos para esperar que haja diferenças substanciais entre homens e mulheres no que diz respeito a características inatas, e a diferença em termos de força física não significa muito na maioria dos empregos modernos. Contudo, as características normalmente atribuídas aos sexos, que refletem valores sociais ou preconceitos, são valorizadas diferentemente para homens e mulheres. Aqueles com alto investimento em educação, treinamento, mobilidade de trabalho e oferta de empregos podem legitimamente esperar ganhar mais. Mas estes investimentos são, em geral, menores para as mulheres. Em outras palavras, isso representa a subvalorização do trabalho das mulheres.
2. Diferenças nos empregos existentes A segregação ocupacional horizontal e vertical das mulheres afeta seus salários diretamente, por atribuir a elas os serviços pior remunerados, e indiretamente, limitando seu acesso a certas ocupações. A discriminação pode, antes de mais nada, emergir da segregação ocupacional, pela qual certas categorias ocupacionais e serviços são reservados (usualmente de forma implícita) para as mulheres. Tipicamente, empregos e setores nos quais as mulheres predominam tendem a pagar menos do que aqueles em que os homens são a maioria. A segregação de homens e mulheres em diferentes ocupações, ofícios e empregos específicos nas empresas, é geralmente resultado de atitudes fortemente impregnadas na sociedade ao longo de sua história. Onde a segregação ocupacional existe, as mulheres são excluídas das
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
mensais dos homens. Em 1999, esta porcentagem aumentou para 60,7%.
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posições melhor pagas, tradicionalmente ocupadas por homens (construção, maquinaria, minas, etc.) e são recrutadas apenas para serviços tradicionalmente femininos (secretárias, datilógrafas, digitadoras, day care workers *, etc.). As mulheres também podem ser vistas em posições pior remuneradas devido à existência de segregação ocupacional vertical, a qual tem o efeito de mantêlas em posições inferiores. Em virtualmente todos os países, há um número desproporcionalmente pequeno de mulheres empregadas nos postos mais elevados. A segregação de gênero continua forte em todos os países da Europa. Mesmo quando as mulheres têm um nível proporcionalmente elevado de educação, elas ocupam uma pequena porção das posições de gerência e chefia nos vários setores da economia. Por exemplo, a Comissão de Especialistas da OIT descobriu, em 1997, que as mulheres na Bielorússia representavam 56,8% dos trabalhadores com educação universitária. Elas tinham um nível consistentemente mais elevado de educação do que os homens em vários setores, embora continuassem a ocupar um espaço menor (45,5%) das posições de gerência e chefia em muitos setores da economia nacional. No setor industrial, o mais importante da economia, as mulheres ocupavam apenas 35,9% dos postos de gerência, embora representassem 54,2% dos empregados com formação técnica específica.
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
3. Diferenças nos empregos aceitos
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Devido à necessidade de cuidar da casa ou da família, as mulheres podem escolher ou ser forçadas a aceitar serviços que sejam compatíveis com tais responsabilidades. Por exemplo, tendem a ocupar postos que exigem menor número de horas-extras do que os ocupados pelos homens. Pelo mesmo motivo, podem ir para empregos nos quais há uma perda relativamente pequena de habilidades e menor depreciação de capital humano decorrentes de interrupções no período de trabalho. Mulheres freqüentemente ocupam empregos de tempo parcial, em geral em razão das responsabilidades familiares, e este fato pode contribuir para diferenciações salariais. A discriminação pode ser direta com relação aos trabalhadores de tempo parcial, pagandose a eles menos por hora trabalhada do que para os de tempo integral; ou indireta, tal como no caso do Reino Unido, onde a Comissão de Especialistas da OIT apurou que a consideração dos pisos salariais
como base de incidência para contribuições de seguridade em âmbito nacional, tem um impacto discriminatório e afeta a remuneração das mulheres, em parte porque estas constituem a maioria dos trabalhadores em tempo parcial.
4. Diferenças na estrutura de remuneração ou sistema de seguridade social A discriminação direta pode ser devida a diferenças nas estruturas de remuneração de homens e mulheres no interior das ocupações, empresas ou setores, seja implícita seja explicitamente. Em alguns países, particularmente na agricultura, acordos coletivos podem ainda refletir taxas masculinas e femininas, e em outros, são estabelecidos diferenciais de produtividade para homens e mulheres. Três dimensões da estrutura de remuneração foram identificadas como tendo influência sobre a igualdade de remuneração (7):
a extensão e a classificação das diferenças de remuneração por indústria e por ocupação (quanto maior a dispersão da remuneração, maior a diferença salarial entre os gêneros); o sistema de classificação ou avaliação de empregos; a forma pela qual os planos de carreira freqüentemente estabelecem objetivos de variação salarial além dos previstos no sistema básico de classificação de empregos – tais como horas-extras, antigüidade, mérito, que podem camuflar reais diferenças nos totais pagos.
O estabelecimento de padrões mínimos centralizados, pouca dispersão e transparência de estruturas de pagamento foram identificados como fatores que podem chamar a atenção para as diferenças nas estruturas de remuneração e ajudar a reduzir a defasagem salarial entre os gêneros.
5. Custos do trabalho Os valores menores pagos às mulheres têm sido atribuídos, em alguns casos, ao fato de que os custos para empregar mulheres são maiores do que os dos homens.
* A expressão day care worker refere-se às várias profissões relacionadas a supervisão, assistência e cuidados em geral com crianças, idosos e doentes (assistentes sociais, enfermeiras, etc.). (N. do T.)
Desde sua fundação, em 1919, a OIT tem se preocupado em assegurar o direito de homens e mulheres trabalhadoras à igualdade de remuneração para trabalho de igual valor. O texto original do Estatuto da organização reconhecia que este princípio era de especial e urgente importância. O princípio foi reafirmado pela sua incorporação à Convenção nº 100 sobre igualdade de remuneração, adotada em 1951, e na Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, de 1979. O Programa de Ação de Copenhague e a Plataforma de Ação de Beijing acentuaram a permanente relevância e o caráter fundamental do princípio, e ambas conclamaram todos os Estados para que ratificassem e aplicassem a Convenção nº 100. Mais recentemente, foi incluído como um dos princípios essenciais que estão na base da Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho (OIT, 1998). Um dos indicadores de sua significativa aceitação internacional é o fato de que, em 22 de setembro de 2000, 148 Estados-membros, de 175, tenham ratificado a Convenção nº 100. É o segundo acordo sobre trabalho mais ratificado, e está entre os acordos mais ratificados dentre todos os referentes aos direitos humanos. Todos os Estadosmembros da Europa ratificaram a Convenção. Uma importância idêntica tem sido dada a este princípio no âmbito da União Européia, que o consagrou no Tratado de Amsterdã, firmado em 2 de outubro de 1997 e que passou a vigorar em 1º de maio de 1999. Nele se estipula que cada Estado-membro deve assegurar que o princípio da igualdade de remuneração para trabalho de igual valor seja aplicado (8). Com isso, se reafirmou a Diretiva 75/117, de 1975, da Comunidade Européia, que decidira pela sua aplicabilidade (9). A Comissão Européia também elaborou um Código de Conduta sobre Igualdade de Remuneração para orientar empregados e trabalhadores sobre como implementar o princípio (10).
O alcance do conceito de igualdade de remuneração Na Convenção da OIT e sob as normas do tratado europeu, remuneração é definida de forma
ampla, incluindo o salário básico, mínimo, ordinário, e quaisquer proventos adicionais pagáveis direta ou indiretamente, seja em dinheiro ou em espécie, pelo empregador ao trabalhador, e que decorra da relação de emprego. Pagamentos adicionais e benefícios como uniformes, moradia, custeio de viagens, equipamentos e valores relacionados à existência de dependentes estão incluídos no conceito de remuneração; é freqüentemente quanto a esses aspectos que as diferenças baseadas no sexo são identificadas. O conceito refere-se apenas aos pagamentos feitos pelo empregador. Isso não quer dizer que todos os pagamentos para homens e mulheres devam ser idênticos – pois exigir esse grau de igualdade criaria, na verdade, ineficiência nas estruturas de pagamento além daquilo que é demandado pela aplicação do direito humano da igualdade de gênero. O princípio da igualdade de remuneração não é violado pela prática de se pagar adicionais relacionados ao mérito ou verbas especiais para recompensar antigüidade, produtividade ou quaisquer outros benefícios, desde que o critério para pagamento dessas várias vantagens e complementos não estejam fundados, direta ou indiretamente, no sexo do beneficiado. Mas é evidente que, em muitos casos, eles estão.
O conceito de igual valor O termo igual remuneração para trabalhadores homens e mulheres para trabalho de igual valor se refere a taxas de remuneração estabelecidas sem discriminação baseada no sexo. Valor, embora não seja definido especificamente na Convenção da OIT ou na legislação européia, se refere ao valor relativo do emprego, para o fim de cálculo da remuneração. A Convenção da OIT não limita a aplicação do conceito de igual valor à sua implementação por meio da metodologia de valor comparável, mas certamente indica que algo além das forças de mercado devem ser consideradas para assegurar a aplicação do princípio. Como detalhado na seqüência, tal critério sugere que a avaliação de empregos pode ser utilizada para determinar este valor. Embora os sistemas de avaliação de empregos sejam ainda uma forma comum de fixação de salários, outras bases para o seu cálculo – incluindo pisos salariais, pagamento de produtividade, e novos sistemas salariais baseados na competência – estão abrangidos pelo princípio.
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
O DIREITO À IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO PARA TRABALHO DE IGUAL VALOR
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A obrigação dos governos de assegurar e promover a aplicação do princípio A Convenção da OIT estabelece que cada Estado ratificante “deve, por meios apropriados aos métodos vigentes para determinação das taxas de remuneração, promover, e até onde seja compatível com tais métodos, assegurar a aplicação, a todos os trabalhadores, do princípio de igualdade de remuneração para homens e mulheres para trabalho de igual valor”. Esta previsão refere-se a todos os trabalhadores, sem exceção. As medidas exigidas de um governo para o cumprimento desta obrigação são flexíveis, e dependentes dos métodos já existentes para determinação de salários e remuneração. Os governos têm a obrigação de assegurar a aplicação do princípio de igual remuneração quando:
for o empregador ou de algum modo detenha o controle do empregador; exerça influência direta ou indireta sobre o processo de fixação dos salários, como quando os salários são fixados em lei, regulamentos ou qualquer outra norma governamental.
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
Caso o Estado em questão não esteja em posição de assegurar a aplicação do princípio da igual remuneração, como quando está excluído dos processos de negociação coletiva, ainda assim deverá promover a aplicação do princípio. Por exemplo, pode fazê-lo por meio de legislação, exigência de planos de pagamento eqüitativos, elaboração de Códigos de Conduta, ou patrocinando pesquisas para a identificação de áreas onde há diferenças salariais, suas causas e os meios pelos quais podem ser removidas.
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A Convenção da OIT prevê ainda que o princípio de igualdade de remuneração para homens e mulheres para trabalho de igual valor pode ser aplicado por meio de várias medidas, incluindo:
leis nacionais ou regulamentos; mecanismos legalmente estabelecidos ou reconhecidos para determinação de salários; acordos coletivos entre empregadores e empregados; uma combinação de todos esses meios.
As normas européias exigem que o princípio seja incluído na lei e que sejam incentivados acordos coletivos sobre o assunto.
⇒ Legislação nacional Tem havido um notável crescimento, nos últimos anos, na adoção de leis específicas determinando o pagamento de igual remuneração para homens e mulheres para trabalho de igual valor. Por exemplo, em 1998 a Comissão de Especialistas constatou com satisfação que a Constituição do Equador e o Código do Trabalho da República do Benin foram emendadas para dar expressão legal ao princípio, de acordo com a Convenção. A República Tcheca acaba de emendar sua lei, passando a prever tal exigência. Outros exemplos interessantes em outras regiões incluem um novo Código de Trabalho no Tchad, o qual além de tornar expresso o princípio, também prevê que os vários componentes da remuneração devem ser estabelecidos de acordo com idênticos padrões para homens e mulheres, que as categorias e classificações profissionais e os critérios de promoção devem ser comuns para trabalhadores de ambos os sexos, e que os métodos para avaliação de empregos devem ser baseados em critérios idênticos e objetivos, fundados essencialmente na natureza do trabalho em questão. Na Guiana, o Ato de Prevenção à Discriminação, de 1997, define igualdade de remuneração como as taxas de remuneração que forem estabelecidas sem diferenciação baseada no sexo, e define trabalho de igual valor em termos que exigem que se considerem aspectos como níveis de habilidade, deveres, esforços físicos e mentais, responsabilidade e condições de trabalho. A recente revisão da legislação sobre igualdade de remuneração na Irlanda amplia a abrangência do trabalho de avaliação, incluindo o objetivo de comparação de salários de homens e mulheres. A legislação deve ser efetivamente implementada e, quando for violada, a reparação deve estar ao alcance do prejudicado, por meio de mecanismos e procedimentos adequados e efetivos. O Comitê Consultivo da União Européia propôs uma modificação na Diretiva 75/117 sobre Igualdade de Remuneração para conclamar os Estados-membros a assegurar que as inspetorias do trabalho ou órgãos com poderes similares supervisionem a implementação da legislação sobre igualdade de remuneração, incluindo o recurso a auditorias sobre o assunto; e que os responsáveis por essa fiscalização recebam treinamento adequado. Outra modificação proposta visa a permitir ações coletivas
classificação dos empregos e em sistemas de avaliação. Nele se propõe que:
⇒ Mecanismos para determinação dos salários Muitos países possuem órgãos nacionais que estabelecem pisos salariais e/ou estabelecem linhas gerais sobre os níveis dos salários em geral. Embora não seja exigido pela Convenção nº 100 (11), o sistema de pisos salariais é um importante meio pelo qual se garante a aplicação da Convenção. A composição desses órgãos e os critérios nos quais baseiam suas diretivas são relevantes para sua efetividade na promoção da igualdade de remuneração entre homens e mulheres.
⇒ Acordos coletivos Formas indiretas de discriminação salarial têm sido encontradas em acordos coletivos, como é o caso da garantia de benefícios relacionados à situação marital e familiar ou o uso de escalas de salários flexíveis ou rígidas, nas quais as primeiras são destinadas às mulheres e as segundas aos homens, sem que haja uma avaliação objetiva, livre de viés de gênero, como levar em conta a natureza do trabalho que está sendo desenvolvido. Os acordos coletivos não têm sido utilizados tanto quanto poderiam para promover a igualdade de remuneração para trabalho de igual valor. É interessante notar que há algum tempo os sindicatos eram cuidadosos no uso da avaliação de empregos, uma vez que tais projetos acabavam servindo como meios artificiais de redução de salários para níveis abaixo do mercado ou das taxas negociadas – e em alguma medida esse comportamento perdura. Em muitos lugares os sindicatos iniciaram e participaram ativamente em projetos de avaliação de empregos. O Código de Conduta sobre Igualdade de Remuneração da Comunidade Européia, de 1995, objetiva munir de sugestões concretas as partes em negociações coletivas, de modo a assegurar que o princípio seja aplicado a todas as formas de pagamento. O Código é de adoção voluntária, e foca especialmente o local de trabalho. Em particular, objetiva a eliminação da discriminação sexual quando as estruturas de pagamento estão baseadas na
os negociadores, em todos os níveis, que estejam envolvidos na determinação de sistemas de remuneração, seja do lado dos empregadores ou dos sindicatos de trabalhadores, devem levar a cabo uma análise do sistema de remuneração e avaliar os resultados para detectar discriminação sexual nas estruturas de salários, de modo a encontrar saídas; e um plano de acompanhamento deve ser concebido e implementado, de modo a eliminar qualquer discriminação sexual que se evidencie nestas estruturas.
⇒ Cooperação com os parceiros sociais Tomando por base a estrutura tripartite da OIT e sua abordagem para solução do problema, o artigo 4º da Convenção exige de cada país ratificante que coopere da melhor forma com as organizações de empregadores e trabalhadores para dar efetividade à Convenção. Além do engajamento nas negociações coletivas, a cooperação dos parceiros sociais pode também tomar a forma de participação na elaboração da avaliação de empregos e na sua implementação, e no desenvolvimento de políticas nacionais de salário e de igualdade salarial (embora alguns sindicatos tentem reduzir a diferença salarial tratando-o como remuneração baixa ou insuficiente, e não apenas como uma questão de discriminação de gênero). O Comitê Consultivo da União Européia propõe as seguintes ações a serem desenvolvidas pelas partes para implementar a igualdade salarial e aumentar os baixos salários:
examinar negociações centralizadas x descentralizadas. Estudos demonstram que os sistemas centralizados de negociação coletiva são mais efetivos no combate às desigualdades e insuficiências de remuneração, e seu desmantelamento pode ter um efeito desfavorável à remuneração das mulheres. Quando a descentralização ocorre, devem ser examinadas medidas para reduzir qualquer possível efeito negativo na diferença de remuneração entre os sexos; levar a cabo projetos de avaliação de trabalho tanto para empregos de período integral quanto
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
para denunciar e reclamar o cumprimento, ao invés de privilegiar ações individuais. O Comitê Consultivo também propôs que empregados e trabalhadores possam consultar especialistas independentes, em caso de disputas a respeito da questão.
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para os de tempo parcial, com a assistência técnica do Estado; introduzir medidas, inclusive pela criação de fundos especiais em níveis setoriais, para melhorar a situação dos empregos que estão sub-avaliados; e rever a distribuição de homens e mulheres na mesa de negociação, de modo a torná-la mais equilibrada.
Avaliação de empregos
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
A Convenção da OIT prevê que sempre que a avaliação de empregos puder ajudar a dar efetividade às diretivas da Convenção, devem ser tomadas medidas para promovê-la de forma objetiva, tomando-se por base o trabalho que é efetivamente realizado. A adoção do conceito de igual remuneração para trabalho de igual valor necessariamente implica alguma comparação entre os empregos. Como homens e mulheres tendem a exercer diferentes funções, para eliminar a diferenciação salarial baseada no sexo é essencial estabelecer técnicas e procedimentos apropriados para medir o valor relativo de empregos com conteúdo variado. A aplicação deste conceito veio a ser conhecida como valor comparável. Isso envolve um conceito administrativo do valor de um emprego oposto ao conceito econômico (que determina esse valor a partir da relação entre oferta e demanda). O conceito administrativo, assim, substitui os procedimentos de avaliação de empregos baseado nas forças do mercado, aparecendo como o mecanismo apropriado para determinação do seu valor relativo (12).
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⇒ Metodologia para avaliação de empregos Muitas empresas de consultoria desenvolveram o seu sistema próprio de avaliação de empregos. Um elemento comum de todos estes sistemas é o estabelecimento de uma descrição do emprego, a qual é um detalhamento preciso do trabalho feito pelo seu titular. Na forma mais simples de avaliação de empregos, é feita uma apreciação global do valor do emprego, e não uma análise de cada um de seus aspectos – a descrição do emprego serve como base para comparação. Mais freqüentemente os sistemas comparam os empregos por meio de fatores préselecionados, como habilidade, esforço, responsabilidade e condições de trabalho, e a avaliação é baseada em descrições de empregos
elaboradas de antemão. Os esquemas que se utilizam de fatores como estes são chamados de analíticos, enquanto os esquemas que fazem comparações globais são denominados não-analíticos. Na prática internacional, os tipos de avaliação de empregos são divididos em: de ranking, de classificação, de comparação de fatores e de atribuição de pontos. Os métodos de ranking e de classificação são não-analíticos, e os de comparação de fatores e o de atribuição de pontos são analíticos. Em geral, considera-se que os métodos analíticos de avaliação de empregos permitem uma comparação mais aprofundada do valor relativo dos empregos. No método de comparação de fatores, uma amostra representativa de empregos é analisada de acordo com os fatores selecionados, e técnicos decidem quanto da taxa básica de remuneração vigente, aplicável a cada emprego, é atribuída a cada um dos fatores, proporcionalmente à sua importância. No método de atribuição de pontos as exigências do emprego são identificadas e separadas, e a cada uma delas é dado um certo peso, com a atribuição dos pontos correspondentes. A Convenção não dá preferência a nenhum dos métodos de avaliação, nem a OIT recomenda ou condena algum deles. Contudo, é forçoso dizer que muitos países usaram a metodologia analítica e há um crescente consenso de que são estes os que, na prática, tornam mais facilmente aplicável o princípio da igualdade de remuneração. Aquilo que mais preocupa a Comissão, e o que ela realmente defende, é que deve-se tomar o máximo cuidado na seleção dos fatores que serão usados para comparação do valor, incluindo-se fatores suficientes para dar conta dos trabalhos femininos, de forma que o grau de subjetividade e o viés de gênero sejam minimizados.
⇒ Necessidade de evitar os estereótipos dos sexos na avaliação As avaliações de empregos freqüentemente são feitas sobre fatores inerentemente subjetivos. Isto, por si só, não é um motivo para não realizá-las. Qualquer base para determinação de taxas de remuneração envolve, em última análise, algum elemento de subjetividade. Por isso, costuma-se enfatizar que é necessário evitar que os estereótipos de sexo entrem no processo, pois isso pode resultar em uma sub-avaliação de tarefas normalmente feitas por mulheres, ou daquelas percebidas como
As qualidades mais freqüentemente atribuídas às mulheres – destreza, facilidade para lidar com necessidades emocionais, como é o caso dos empregos que envolvem cuidados com pessoas, etc. – tendem a ser sub-avaliadas pela sociedade, em comparação com aqueles cujas qualidades costumase dizer que os homens possuem. O que não é surpreendente, já que os valores sociais refletemse também no sistema de salários. Em termos de sua concepção e construção, os sistemas de avaliação de empregos também mostram um evidente viés de gênero. Os esquemas tradicionais tendem a medir apenas os aspectos mentais e físicos do trabalho, e não incluem fatores que meçam adequadamente certos aspectos de trabalhos de cuidar ou relacionar-se com outras pessoas, ou dos que requerem organização ou coordenação de atividades ou de pessoas. Além disso, existe um evidente viés relativo às funções de comando em muitos dos fatores dos esquemas tradicionais, pelos quais se sub-avalia ou se ignora o trabalho de suporte e não-gerencial desenvolvido pelas mulheres. Assim, a escolha dos fatores nos quais a avaliação será baseada é uma questão crítica.
⇒ Engajando-se na avaliação Além de escolher cuidadosamente os fatores usados para avaliação, um sem-número de outras medidas devem ser tomadas para assegurar o sucesso do procedimento. É importante que empregadores e trabalhadores, homens e mulheres, estejam envolvidos, de forma que concordem que um dos objetivos do processo é reduzir a discriminação salarial baseada no sexo, e que ambos os lados tenham confiança no processo. Em muitos casos, o objetivo de igualar a remuneração de homens e mulheres é um dos muitos a serem buscados num processo de avaliação de empregos.
Na verdade, pode ocorrer que este objetivo seja mais facilmente atingido em um processo geral de racionalização dos salários, de modo que muitas das armadilhas existentes no processo de se comparar apenas o valor da remuneração de homens e mulheres seja evitado. Treino adequado e apropriado deve ser dado a todos os envolvidos, tanto empregadores quanto trabalhadores, de modo que haja uma real compreensão da discriminação salarial e se aceite que ela precisa ser eliminada. É recomendável que um analista independente de empregos seja selecionado e que suas sugestões sejam submetidas a um comitê de trabalhadores/ empregadores para acordo e aplicação. Finalmente, ao serem estabelecidas as descrições de empregos que serão usadas, deve-se tomar cuidado para atribuir-lhes nomenclaturas neutras em termos de gênero, ao invés daquelas que fazem pressupor o sexo de seu titular – por exemplo, “assistente de vendas” deve ser usado preferencialmente a vendedor ou vendedora.
⇒ Extensão da comparação na avaliação de empregos É evidente que abordagens que limitam a comparação no processo de avaliação a empregos na mesma organização não atingirão o objetivo de eliminar a discriminação sexual quanto à remuneração: a segregação sexual se estende além de qualquer organização, uma vez que as mulheres estão concentradas em organizações e setores diferentes dos homens. A Comissão de Especialistas da OIT afirmou, a esse respeito, que a extensão da comparação deve ser tão ampla quanto possível no sistema salarial existente. A Comissão apurou que os níveis de remuneração variam conforme o setor e são geralmente mais baixos nos setores predominantemente femininos. Isto geralmente se deve ao fato de que os tipos de trabalho feitos em setores como as indústrias têxtil e de vestuário são considerados tipicamente femininos, e uma extensão das tarefas domésticas da mulher. Os níveis de remuneração são geralmente mais altos nos setores com predominância masculina. Acresce-se a isso o fato de que a diferença de remuneração entre homens e mulheres é freqüentemente maior nos setores masculinos. Os níveis de remuneração por setor também reproduzem o padrão de dominação masculino/feminino, aumentando e diminuindo
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
intrinsecamente femininas. Assim, é essencial que se encontrem meios de assegurar que as avaliações de empregos sejam feitas com base em critérios objetivos. Estes critérios não devem sub-avaliar habilidades normalmente exigidas pelos empregos que são, na prática, ocupados por mulheres, como os que envolvem cuidados com pessoas, os que exigem destreza manual ou habilidades em relações humanas, nem podem sobre-avaliar aquelas habilidades tipicamente associadas com empregos tradicionalmente ocupados por homens, como os que exigem força física.
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conforme o sexo que predomina no setor. Por esta razão, a Comissão apontou a necessidade de um sistema que permita a apreciação objetiva dos empregos, comparando seu valor relativo em todos os setores. Se tudo o mais não fizer tanta diferença, um sistema centralizado de fixação de salários, com o maior campo possível de comparação, parece dar a melhor garantia contra a discriminação salarial. Na verdade, a experiência tem demonstrado que a diferença de remuneração é menor nos países com um sistema centralizado de fixação de salários, seja ele operacionalizado por meio de regulação ou por negociação coletiva. Em contraste, estruturas fragmentadas de remuneração e aquelas com grandes disparidades em faixas salariais oferecem maiores oportunidades para que o viés de sexo seja introduzido nos salários. Nos lugares onde há uma forte tendência no sentido de descentralizar a fixação dos salários, há necessidade ainda maior de manter um mínimo de proteção. Isso é particularmente importante para as mulheres, as quais representam a maior parte dos trabalhadores com menores salários em quase todos os países, e que têm mais probabilidade de receber o piso salarial.
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
EXEMPLOS DE MEDIDAS TOMADAS PARA IMPLEMENTAR A CONVENÇÃO
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Faz-se necessária uma abordagem abrangente para a redução e eliminação da disparidade entre o que é pago aos homens e o que recebem as mulheres, envolvendo intervenções sociais, políticas, culturais e no mercado de trabalho. A aplicação do princípio de igualdade de remuneração para trabalho de igual valor faz parte dessa estratégia, e traz vantagens que as estratégias não-trabalhistas do mercado, por si sós, são incapazes de atingir. Além da legislação, a Comissão de Especialistas apontou medidas positivas tomadas por alguns Estados ratificantes com o fim de implementar a Convenção na prática. Seguem-se alguns exemplos. No Japão, a defasagem salarial deve-se, primeiramente, à concentração das mulheres nas posições mal-remuneradas e à falta de iguais oportunidades de emprego para as mulheres. A esse respeito, o Japão recentemente adotou o Ato Assecuratório de Iguais Oportunidades e Tratamento no Emprego entre Homens e Mulheres. O Ato proíbe
aos empregadores discriminar as mulheres quando do recrutamento, na seleção para serviços temporários, nomeações, promoção e treinamento, benefícios, aposentadoria compulsória, aposentadoria e demissões. Além disso, o Japão aboliu certas restrições relativas a horas extras e trabalho noturno das mulheres, bem como as concernentes a trabalho nos feriados, de forma a expandir as oportunidades de emprego para as mulheres e promover igual tratamento entre trabalhadores e trabalhadoras. Reconhecendo que o sistema de antigüidade é também uma causa primária da diferenciação salarial (13), o Japão está promovendo ativamente várias medidas para harmonizar a vida no trabalho com a vida familiar, oferecendo um sistema de atendimento às crianças e à família, de forma a dar atenção ao impacto que as diferentes responsabilidades na família têm sobre a remuneração de homens e mulheres. Alguns governos estabeleceram planos de igualdade de remuneração ou planos gerais de igualdade, contendo um componente de igualdade de remuneração, elaborado para promover a aplicação do princípio da Convenção. Por exemplo, no Canadá o Ato de Igualdade de Remuneração de 1996 determinou que os empregadores com mais de 50 empregados estabelecessem um plano de igualdade de remuneração, a ser posto em prática em até quatro anos após sua promulgação. Estes planos devem ser desenvolvidos em quatro estágios: 1) identificação de classes de emprego com predominância de homens e de mulheres; 2) descrição do método e dos instrumentos de avaliação de empregos; 3) realização da avaliação de empregos e determinação dos ajustes necessários para compensação; e 4) determinação dos termos e condições de pagamento. No caso de empregadores com 100 ou mais empregados, uma comissão de igualdade de remuneração deve ser criado. Comissões bipartites devem ser criadas em certos setores para facilitar o estabelecimento de planos de igualdade de remuneração. O Ato também criou uma Comissão de Igualdade de Remuneração que desenvolve uma série de atividades, incluindo monitoramento, aconselhamento, pesquisa, incentivo e funções regulatórias. Ela pode receber reclamações individuais e empreender investigações por sua própria iniciativa, ou acompanhar uma disputa ou reclamação envolvendo questões de igualdade de remuneração. A Comissão também está autorizada a lidar com quaisquer problemas que
A Finlândia oferece um exemplo interessante de como o princípio de igual remuneração para trabalho de igual valor pode ser perseguido como um objetivo nacional, e como ele pode (ou não pode) ser adaptado com a introdução de novos sistemas de salários. O exemplo finlandês demonstra a importância da participação dos parceiros sociais, de especialistas em salários e em igualdade e de vários Ministérios para lidar efetivamente com a questão. Primeiro, foi realizado um levantamento completo dos sistemas de classificação salarial, graus de empregos e sistemas de avaliação em todos os setores. Ao mesmo tempo, foi feita uma análise da remuneração de homens e mulheres em áreas nas quais a diferenciação salarial foi identificada. Metodologias de avaliação de empregos foram examinadas. Determinou-se que uma metodologia de avaliação nacional não seria apropriada, e deixouse a cada setor e aos empregadores a decisão sobre qual o sistema de avaliação seria utilizado. O ombudsman que cuida de assuntos relacionados à igualdade formulou linhas gerais para ajudar os empregadores na formulação dos planos de igualdade para suas empresas. Estas orientações explicavam os deveres dos empregadores relativos à igualdade de remuneração e ofereciam exemplos de como as questões de pagamento deveriam ser resolvidas em planos de igualdade. Os planos formulados pelos empregadores variam, com alguns deles demandando a criação de um sistema de remuneração construído sobre avaliações de empregos, como meio de atingir uma maior igualdade de remuneração; outros requerem uma análise de remuneração a ser empreendida a intervalos regulares, de modo a permitir a identificação e a correção de discriminações quanto à remuneração; enquanto outros enxergam na realocação e na reorganização de trabalho o melhor método para promover a igualdade. Algumas das novas abordagens sobre avaliação de empregos neutra quanto ao gênero conceituam
o trabalho como sendo caracterizado também por habilidades emocionais e relacionais, além dos aspectos mentais e físicos. Por exemplo, um esquema desenvolvido na Nova Zelândia inclui três fatores sob o critério de esforço. O primeiro deles – exigência física – mede o tipo e a duração do esforço físico. Tal medição leva em conta o uso extenuante ou repetitivo de músculos (incluindo movimentos de pequenos músculos), tanto quanto as exigências requeridas por trabalhos nos quais o corpo fica em posição contraída ou desconfortável e/ou em velocidade. A necessidade de manter a utilização do músculo todo o tempo ou manter uma posição contraída eleva o nível de esforço físico. Este fator, assim, vai além da medição da força física necessária para certa função e introduz uma maior eqüidade na consideração das exigências inerentes aos trabalhos das mulheres, tanto quanto às dos homens. O segundo fator mede as exigências mentais requeridas em termos de concentração. Mede a intensidade e a freqüência desta exigência mental, atentando para o tipo de trabalho e a necessidade de precisão. O terceiro fator mede as exigências emocionais da função desempenhada, sejam as decorrentes diretamente das necessidades de pessoas que requerem cuidados, atenção, instrução ou assistência, sejam as que se relacionam a situações de trabalho inerentemente estressantes ou frustrantes, como conflitos relativos a nomeações, dificuldades inerentes à comunicação, trato com pessoas irascíveis, que se aborrecem facilmente ou “difíceis”, pressão do tempo e prazos fatais. É particularmente evidente que este último fator de exigências emocionais tem considerável aplicação a muitas das funções exercidas predominantemente por mulheres. Este é apenas um exemplo de tentativa de evitar o viés de gênero pelo aumento do número de fatores em um esquema de avaliação, de forma a contemplar também os aspectos de trabalhos nos quais muitas mulheres estão envolvidas. Em 1998, a Comissão de Especialistas constatou que o Escritório Federal de Igualdade entre Homens e Mulheres da Suíça formulara dois instrumentos para a avaliação objetiva de empregos: a analítica Avaliação de Trabalho (ABAKABA) e “Eu ganho o que eu mereço?” (VIWIV) . O ABAKABA inclui critérios como a repetitividade e a precisão de movimentos, responsabilidade pela vida dos outros, responsabilidade pelo ambiente, número de interrupções do trabalho, empatia e habilidades
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
digam respeito à igualdade de remuneração entre uma classe de empregos predominantemente femininos e outros predominantemente masculinos, em empresas que empreguem menos de dez empregados. Recentemente, como resultado desta iniciativa, o Governo Canadense concordou em pagar às mulheres que trabalham no setor público uma indenização a título de compensação pelo período em que receberam salários menores.
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organizacionais. VIWIV pretende complementar o ABAKABA e permite aos próprios trabalhadores aferir se estão ou não sofrendo discriminação salarial. Na República Tcheca, o Ministério do Trabalho formulou uma metodologia analítica para avaliação de empregos que inclui critérios baseados, entre outras coisas, nas exigências específicas de certos empregos no que tange à experiência prática, destreza, complexidade, trato com informações, atividades no trabalho e relações de trabalho, responsabilidade por danos, segurança e saúde ocupacional, requisitos de gerenciamento, exigências físicas, psíquicas, sensoriais e neuropsicológicas, além de imprevisibilidades relacionadas à posição ocupada.
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
A Bélgica recentemente reconheceu a importância de melhorar a classificação de empregos vigente. Um estudo encomendado em 1996 pelo Ministério do Emprego e Trabalho mostrou que, de 141 classificações de empregos por setor na Bélgica, apenas 16% tinham uma base analítica. Os esquemas não-analíticos de classificação não foram considerados neutros quanto à questão de gênero. O estudo concluiu que a modernização dos esquemas de classificação setorial era uma exigência imediata. O Plano Belga de Ação, Investimento em Pessoas e Emprego, de 1998, descobriu que as mulheres trabalhavam em um número restrito de setores e empregos, e que uma importante causa da desigualdade de remuneração podia ser atribuída a esquemas desatualizados de classificação de empregos, os quais não levavam em conta o valor das qualificações e atributos femininos (em empregos ocupados principalmente por mulheres).
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Jurisprudência recente da Corte Federal do Trabalho da Alemanha aponta que uma classificação mais elevada deve ser atribuída a empregos que, embora fisicamente exijam menos, envolvem especial empenho mental e nervoso. Além disso, a categoria de trabalhos físicos árduos, que são melhores remunerados, inclui empregos que envolvem não apenas esforço muscular, mas também outras atividades dos seres humanos que possam resultar em reações físicas. Suécia e Dinamarca lançaram grandes campanhas para a promoção da igualdade de remuneração para trabalho de igual valor, focando problemas internos e externos ao mercado de trabalho.
A NECESSIDADE DE UMA ABORDAGEM ABRANGENTE Durante a preparação da Convenção nº 100 e sua respectiva Recomendação, a Conferência Internacional do Trabalho (33ª Sessão, Genebra, 1950) reconheceu que há relações múltiplas e complexas entre a igualdade de remuneração e a posição e o status de homens e mulheres quanto ao emprego e na sociedade. Estas considerações levaram a Conferência a propor uma série de medidas na Recomendação nº 90 para facilitar a aplicação do princípio da Convenção nº 100 (vejase o parágrafo nº 6 da Recomendação nº 90). Assim, políticas sociais que pretendam facilitar a aplicação do princípio devem incluir medidas destinadas a assegurar que trabalhadores e trabalhadoras tenham facilidades iguais ou equivalentes para orientação vocacional, treinamento e colocação, acesso igual a empregos e ocupações e serviços sociais e de bemestar concebidos de modo a atender as necessidades das mulheres trabalhadoras, particularmente aquelas com responsabilidades familiares. Esses objetivos genéricos intrínsecos à Convenção foram, subseqüentemente, incorporados em outros instrumentos da OIT, como a Convenção sobre a Discriminação (Emprego e Ocupação), de 1958 (nº 111) e a Convenção sobre os Trabalhadores com Responsabilidades Familiares, de 1981 (nº 156). Como demonstrado neste artigo, as fontes de discriminação salarial são diversificadas e complexas. Por esta razão, a discriminação salarial não pode ser enfrentada efetivamente a menos que a ação dirija-se a todas as fontes simultaneamente. É importante discutir a igualdade de remuneração e a avaliação de empregos no contexto de uma proteção mais geral contra a discriminação, tal como proposto nas Convenções nº 111 e 156. Políticas que lidem apenas com a discriminação no mercado de trabalho são inadequadas, uma vez que os fatores que nascem fora dele (relativos a concepções tradicionais sobre o papel da mulher e o conflito entre trabalho e responsabilidades familiares) parecem ser uma fonte mais significativa de desigualdade de remuneração do que os fatores que se originam no mercado de trabalho. O oposto é igualmente verdadeiro. A legislação tem sido um fator decisivo na eliminação da discriminação e na promoção do princípio de igualdade de remuneração para trabalho de igual valor, particularmente em casos de discriminação flagrante e direta. Mas a
O valor comparável é uma importante ferramenta para combater a desigualdade salarial, já que tem o potencial de combatê-la de um modo generalizado. Para alguns tipos de discriminação funciona também como uma solução eficaz. Se ele deve ser obrigatório como uma política nacional para todas as empresas é algo menos certo, e depende de vários fatores, sendo um dos mais importantes o grau de centralização da estrutura de salários no país em questão. Para pequenos empreendimentos, a avaliação de empregos pode ser conduzida de uma forma simplificada, pelo exame da escala remuneratória e pela identificação de áreas nas quais uma ação corretiva precisa ser feita. O que está claro é que deve ser tratada como uma política a ser aplicada no serviço público e, de alguma forma, incentivada no setor privado. Alguns dos desafios postos pela promoção da igualdade de remuneração para trabalho de igual valor incluem a mudança na direção de uma determinação de salários baseada prioritariamente na competência e na performance, ao invés de se considerar o emprego em si. A maneira pela qual o igual valor em termos de performance é aplicado deverá ser determinado, e há um trabalho em andamento, exatamente com este objetivo, na Harvard University. Outras abordagens podem emergir para novas formas de organização do trabalho ou fixação de salários. A transformação do trabalho, incluindo as mudanças na estrutura de produção, na organização do trabalho – incluindo multiplicidade de tarefas e equipes de trabalho – o aumento de empregos flexíveis e contratos temporários, mudanças no padrão de mobilidade no trabalho e na natureza flutuante do setor informal são os desafios que devem ser enfrentados na descoberta de qual forma de igualdade de remuneração pode ser assegurada para todas as trabalhadoras e trabalhadores, para trabalho de igual valor.
NOTAS 1. Report of the Committee of Experts on Application of International Labour Conventions and Recommendations, International Labour Conference, 89ª Session, 2001, p. 36-50. 2. Idem, p. 6. 3. Idem, p. 7. 4. Os relatórios governamentais foram submetidos à OIT nos termos do art. 22 de seu Estatuto. 5. KRITI, Equal Remuneration in Índia, ILO, New Delhi, 2000. 6. Lim, Lin, More and Better Jobs for Women, ILO, Geneva, 1996. 7. Rubery, et. Al. Gender Pay Differentials. ILO, 1998, Ruber et al, Payment Structures and gender pay differentials: some societal effects, International Journal of Human Resource Managemente 8 : 3 April 1997. 8. O artigo 119 do anterior Tratado da Comunidade Européia (Tratado de Roma) meramente estipulava o princípio de igual remuneração para trabalho igual. Tal dispositivo tinha precedência sobre qualquer outra legislação secundária. Assim, interpretava-se que o princípio de igual pagamento para trabalho igual consagrado no tratado da Comunidade Européia incluiria – por interpretação – o princípio de igual pagamento para trabalho de igual valor. Com o Tratado de Amsterdã, de 1997, a Comunidade Européia estabeleceu um claro mandamento, no sentido de se aplicar o princípio do igual pagamento para trabalho de igual valor, removendo, assim, as dúvidas acerca da interpretação. 9. Caso 69/80, Jenkins v. Kingsgate (Clothing Production) Ltd. (1981) E: C; R:911, p. 927. 10. Para um resumo da experiência européia cf. Heide, Ingeborg, Supranational action against sex discrimination: Equal Pay and Equal Treatment in the European Union, International Labour Review, Vol. 138 (1999), nº 4. 11. Há três convenções da OIT sobre a fixação de pisos salariais: números 26, 99 e 131. 12. Gunderson, Morley, Comparable Worth and Gender Discrimination: an International Perspective, International Labour Office, Geneva, 1994. 13. Nesses sistemas, quando as mulheres se ausentam em função da maternidade ou outros motivos relacionados à família, elas freqüentemente caem para o nível mais baixo da carreira, não importando quanto tempo tenham na função ou na empresa, perdendo assim as promoções e os aumentos salariais decorrentes do tempo de serviço.
Igualdade de remuneração para trabalho de igual valor
persistência da defasagem salarial tem levado alguns governos a introduzir medidas pró-ativas (ao invés de procedimentos baseados em denúncias), tais como exigir que os empregadores implementem e mantenham planos de igualdade de remuneração, muitas vezes negociados com os sindicatos de trabalhadores, quando estes existirem.
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A LUTA PELO RECONHECIMENTO DO TRABALHO DAS MULHERES NO QUÉBEC Claudette Carbonneau Primeira Vice-Presidente da Confederação dos Sindicatos Nacionais – CSN *
A luta pelo reconhecimento do trabalho das mulheres no Québec
sta é uma excelente oportunidade para compartilharmos nossas experiências e realizações com vistas a assegurar que a ratificação, por nossos países, da Convenção nº 100 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) conduza a um real reconhecimento do valor do trabalho das mulheres. É muito freqüente, nestes tempos da globalização, em que o comércio internacional não pára de crescer, que pensemos estar sozinhas diante de tais desafios. Por isso envio agradecimentos especiais à CUT, ao Observatório Social e também à OIT por nos permitir esta troca de idéias sobre uma questão tão importante quanto a igualdade salarial para as mulheres.
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Pediram-me apresentar as estratégias sindicais com vistas à efetivação da igualdade salarial, e o contexto legislativo sob o qual elas se dão. Se as regras da pedagogia me dizem que devo tratar de cada um desses assuntos separadamente, as regras da lógica e da história me obrigam a abordá-los em conjunto. Com efeito, as escolhas estratégicas não podem ser compreendidas e descritas senão em função do quadro legislativo no qual têm sido elaboradas. Se temos hoje, no Québec, uma lei próativa em matéria de igualdade salarial, isto não pode, de nenhum modo, ser atribuído ao acaso. Ao contrário, ela é fruto pacientemente cultivado por uma luta conduzida durante mais de uma década. Até pouco tempo atrás, no Québec, a discriminação salarial contra as mulheres era praticada abertamente. À parte alguns intervalos históricos, como durante a Segunda Guerra Mundial, nos quais a mão-de-obra masculina tinha diminuído e as necessidades da indústria claramente aumentado, julgava-se que as mulheres não pertenciam ao mercado de trabalho e que os empregos que elas conseguiam eram acessórios,
considerados como um prolongamento de seus papéis de esposa e mãe. Afortunadamente para as mulheres e para a sociedade do Québec, esta época ficou definitivamente para trás. O reconhecimento do princípio de salário igual para trabalho igual é ponto pacífico há vários anos. As mulheres hoje representam 45% da mão-de-obra do Québec. Esta grande presença no mercado de trabalho e nas negociações, muitas vezes difíceis, nos permitiram superar esta etapa. Entretanto, é forçoso constatar que salário igual para trabalho igual não resolve tudo. Diferenças salariais importantes entre homens e mulheres persistiram e ainda persistem. No Québec, em 1997, o salário médio das mulheres que trabalhavam em período integral ainda representava somente 72,5% dos rendimentos anuais recebidos pelos homens. Alguns fatores históricos e sociais, bastante conhecidos, podem explicar esta diferenciação salarial persistente entre homens e mulheres, tais como níveis de escolaridade, regulamentação dos empregos e experiência. Portanto, a discriminação continua central para explicar a diferenciação marcante entre a remuneração das mulheres e a dos homens. Ou seja, a luta contra a discriminação salarial com respeito às mulheres não terminou. Nesta batalha contra a discriminação salarial, nós, mulheres e organizações sindicais, conseguimos que constasse, em 1976, na Carta de Direitos e Liberdades da Pessoa do Québec um princípio que estipula que “todo empregador deve, sem discriminação, dispensar tratamento idêntico ou pagar salário igual aos membros de seu quadro de pessoal que realizem trabalho equivalente no mesmo local”. Assim, já faz mais de vinte anos que o Québec reconhece o direito das mulheres a um salário igual não só para trabalho igual, mas também para um trabalho diferente mas de valor equivalente.
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Tradução: Carlos Magno de Abreu Neiva.
As queixas sobre discriminação que foram apresentadas pelas trabalhadoras dos serviços públicos (saúde, serviço social, educação e certos órgãos de governo) e nas quais a CSN é a autora, em nome coletivo, são um exemplo eloqüente das dificuldades geradas por um tal enquadramento legislativo, quando se trata de passar da consagração de um princípio de direito em lei ao reconhecimento concreto deste mesmo direito. A CSN apresentou as primeiras queixas em 1987 e, até hoje, elas ainda estão em estudo pela Comissão dos Direitos da Pessoa e dos Direitos da Juventude. Audiências, investigações, contestações por parte dos empregadores, determinações, protelações por meio de recursos, é isso o que impõe um procedimento de queixas. E alguns ousam dizer que as mulheres não são pacientes... Mas é verdade que várias de nós começam a experimentar aquilo que um homem célebre do século passado qualificava de virtude revolucionária: a impaciência, sobretudo a que surge em razão de uma situação injusta e injustificável. Ainda que só raramente seja intencional, esta discriminação salarial com respeito às mulheres é sistêmica, isto é, ela se acha inscrita no sistema de remuneração pela sub-avaliação das características dos empregos ocupados majoritariamente pelas mulheres. Desse modo, para eliminar esta discriminação, deve-se proceder a um exame específico de todas as estruturas de remuneração. À época, a arma legislativa seria essencial para esse fim. Seria indispensável uma lei que obrigasse que os empregadores, em parceria com as organizações sindicais e com as mulheres, fizessem um tal exame. A despeito das disposições contidas na Carta, a
discriminação persistia. Assim, não era suficientemente persuasivo apoiar-se unicamente sobre o enunciado da lei, mesmo que ele fosse, como era o caso, inequívoco quanto ao direito das mulheres de receber um salário livre de discriminação.
A união das mulheres frente à oposição dos empregadores O objetivo estava, assim, claramente identificado: obter uma lei que obrigasse os empregadores, tanto do setor privado como do setor público, a aplicar o princípio da igualdade salarial e a eliminar a discriminação salarial com respeito às mulheres. Para concretizá-lo, precisávamos de tempo, negociações, até mesmo de greves, de discursos, manifestações, petições, passeatas; e nós fizemos tudo isso. Era preciso estabelecer uma real correlação de forças e desenvolver alianças com outras organizações sindicais e os diferentes grupos de mulheres. Em 1991, a CSN, com outras entidades, iniciou a caminhada no interior de uma grande coalizão: a Coalizão em favor da igualdade salarial, que representava 50 entidades e mais de 400.000 mulheres e homens provenientes de organizações sindicais e dos mais diversos grupos. Foi necessário esperar que ocorresse, em 1995, a Marcha das mulheres por pão e rosas – que, entre outros, encampava este objetivo que unia vários milhares de mulheres – para que o governo do Québec se resolvesse a propor uma lei pró-ativa à Assembléia Nacional. Ocorreu então um verdadeiro braço de ferro com as associações patronais. A despeito do apoio da população, de um grande consenso dos grupos sociais, organizações sindicais e grupos de mulheres e, ainda, do esforço do governo, os empregadores continuaram a fazer de tudo para impedir a aprovação de uma lei pró-ativa. Devo dizer que contamos com o apoio indefectível de muitas mulheres, o que obrigou a ministra responsável pela questão a, por diversas vezes, enfrentar tumultos no conselho, reagrupando todos os ministros. Esta oposição feroz dos empregadores às medidas propostas para pôr fim à discriminação refletia a vontade explícita de a fazer perdurar, assegurando a continuidade dos lucros obtidos sobre as costas das mulheres. Mas a que é que se opunham os empregadores? A uma lei bastante clara, mas sobretudo ao seu caráter pró-ativo. Eles admitiam a
A luta pelo reconhecimento do trabalho das mulheres no Québec
Se àquela época tratou-se de um avanço importante, rapidamente esta espécie de legislação demonstrou seus limites. O procedimento de queixa, inerente à Carta, repousa sobre a premissa de que a discriminação salarial com respeito às mulheres é uma exceção, e não a regra. Assim, elas são obrigadas a provar, sobre uma base individual, que são vítimas de discriminação salarial baseada no sexo. O ônus da prova incumbe às mulheres. Nesse contexto, não surpreende a constatação de que poucas tenham apresentado queixa perante a Comissão dos Direitos da Pessoa e dos Direitos da Juventude, e que as queixas existentes tenham sido feitas por mulheres sindicalizadas, que podem contar não somente com sua própria determinação mas também com o apoio de sua organização sindical.
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A luta pelo reconhecimento do trabalho das mulheres no Québec
existência de discriminação salarial com respeito às mulheres, mas se opunham a todas as medidas que lhes obrigassem a rever seus sistemas de remuneração e eliminar as diferenças salariais fundadas nos estereótipos sexistas. Pediam ao Estado que não fossem obrigados a tomar as providências. No entanto, a verdade é que não tomavam qualquer iniciativa, escondendo-se atrás do mecanismo de queixas, que já demonstrara exaustivamente sua ineficácia. Assim, a lei que se debatia deixava às empresas a escolha do processo e dos instrumentos, e as obrigações fixadas para os empregadores levavam em conta nossa realidade industrial e as características que variam em função do tamanho das empresas.
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A batalha se deslocou. Os lances de bastidores ficaram cada vez mais importantes e o discurso público cada vez mais radicalizado. Era necessário que nós, mulheres e organizações sindicais, utilizássemos os mesmos instrumentos que os opositores às mudanças se fartavam de utilizar. Em nome da sacrossanta competitividade das empresas, o patronato, reunido em uma frente comum, exigia que as mulheres renunciassem ao seu direito a um salário igual por trabalho de valor equivalente. Contudo, os empregadores sabiam que teriam quatro anos para realizar uma tentativa de estabelecer a igualdade salarial. Também sabiam que disporiam de outros quatro anos para fazer os ajustes salariais. Por fim, sabiam que uma empresa em dificuldades financeiras poderia se valer de um período suplementar de três anos para completar os ajustes.
A igualdade salarial é parte da luta contra a pobreza Nesse contexto, permito-me suspeitar – e tratase de uma suspeita que dificilmente passará – que as empresas que não conseguirem planejar os ajustes salariais em um período de oito a onze anos têm não somente um problema de igualdade, mas antes de tudo um problema de gestão a resolver, do que se conclui sem esforço que estão de má-fé e querem manter a todo custo a discriminação feita às mulheres. Os empregadores deveriam saber que o reconhecimento do trabalho das mulheres constitui um modo de lutar contra a pobreza que atinge a elas e as suas crianças. Eles sabem ou deveriam saber, já que se trata de um princípio que Henry Ford compreendera muito antes deles, que o
aumento do poder aquisitivo beneficia inevitavelmente as empresas e toda a sociedade. Isso era verdade para os trabalhadores dos Estados Unidos no início do século passado, e continua sendo hoje, para as mulheres do mundo inteiro. Tratar como opostos, por um lado, o direito das mulheres à igualdade salarial e, por outro, a luta contra a pobreza, o desemprego e a precariedade dos empregos cheira a demagogia. É necessário salientar que a pobreza do Québec, assim como alhures, atinge as mulheres. Que a precariedade de empregos atinge prioritariamente as mulheres. Que os países nos quais as diferenças de remuneração entre homens e mulheres são as menores não são aqueles onde as taxas de desemprego são maiores. No que diz respeito às repercussões negativas da igualdade salarial sobre o nível de emprego, não existe nenhuma pesquisa que permita esta conclusão. Aliás, em Ontário, única província canadense além do Québec onde existe uma lei pró-ativa em matéria de igualdade salarial, que visa ao mesmo tempo ao setor público e ao setor privado, um relatório concluiu que, no conjunto, os efeitos de uma tal lei sobre o nível de empregos é insignificante.
A conquista de uma legislação pró-ativa A despeito desses conflitos e dessa gritaria, em 21 de novembro de 1996 a Assembléia Nacional promulgou, em votação unânime, uma lei pró-ativa em matéria de igualdade salarial. Nós nos orgulhamos deste passo que o Québec deu na direção do reconhecimento do valor do trabalho das mulheres. Tanto mais porque a CSN, pela força de seus associados e de seus dirigentes, conseguiu determinar o conteúdo da lei para que por meio dela fossem alcançados nossos objetivos. A economia geral da lei repousa sobre a implantação de um único programa de igualdade salarial para o conjunto da empresa e na consideração dos salários médios dos homens que ocupam empregos de valor equivalente como referência. Em outras legislações, como a de Ontário, prevê-se, ao contrário, programas por setor específico da empresa, o que minimiza o alcance da comparação. Enfim, a lei de Ontário prevê que o salário que deve servir para determinar as diferenças salariais é o valor dos mais baixos salários masculinos. Trata-se de elementos nãonegligenciáveis, que fazem da legislação do Québec a mais avançada da América.
“A presente lei tem por objeto corrigir as diferenças salariais decorrentes da discriminação sistêmica fundada sobre o sexo com respeito às pessoas que ocupam categorias de empregos de predominância feminina. Tais diferenças são aferidas no âmbito da mesma empresa, salvo se não existir nenhuma categoria de empregos de predominância masculina.” Para que se permita a concretização deste princípio, a lei obriga o conjunto dos empregadores cujas empresas tenham mais de dez empregados a rever sua estrutura salarial para corrigir a discriminação com respeito às mulheres. De forma inovadora, a lei se inscreve no quadro das relações de trabalho e prevê a participação das trabalhadoras e dos trabalhadores nos processos de igualdade, condição indispensável para que se atinja o resultado esperado. Nesse contexto, ela exige de nossa central sindical, de nossas federações, de nossos sindicatos, de nossos dirigentes e das mulheres, que encarem o desafio da igualdade. De modo mais específico, para as empresas que tenham entre 10 e 49 empregados (17% das empresas), a lei impõe uma obrigação de resultados. Ela não diz ao empregador qual o processo que deve ser utilizado, mas apenas que ele tem a obrigação de pôr fim às desigualdades salariais. Para as empresas com mais de 50 e menos de 100 empregados, deve ser implantado um programa de igualdade salarial conjuntamente com o sindicato já existente. Para as empresas com mais de 100 empregados, o empregador deve formar uma comissão de igualdade salarial, treinando os membros da comissão e os liberando, sem prejuízo do pagamento.
Instrumentos para efetivar a igualdade salarial Para viabilizar a aplicação de uma lei como esta, é necessário também ter estruturas institucionalizadas especializadas na matéria, que dêem suporte e façam a vigilância. No Québec, existe a Comissão de Igualdade Salarial. Infelizmente, se é verdade que os meios estão presentes, falta a vontade de agir para garantir os
objetivos da lei. As instituições não podem ser separadas das pessoas que as dirigem, e eu tenho a profunda convicção de que a causa das mulheres seria melhor defendida por outras pessoas que não estes comissários. Tudo isso é para lhes dizer algo sobre a importância da escolha dos meios para que se atinja a igualdade salarial. A lei prevê também um processo que assegura um exame rigoroso das estruturas salariais e de remuneração. Os empregadores, juntamente com os sindicatos, devem criar um método específico que preveja, entre outras coisas: a identificação das categorias de empregos, a determinação da predominância sexual das categorias, a descrição do método e dos instrumentos de avaliação, a elaboração de um método de pesquisa, a avaliação dos empregos, sua comparação, a estimativa das diferenças salariais e o cálculo dos ajustes necessários. Assim, no âmbito da CSN, depois da edição da lei, um novo desafio emergiu: implantar os programas de igualdade salarial em todas as empresas. Informar, fornecer meios para tal e formar mais de mil sindicatos. A tarefa não é simples, e se alguém acreditou que a edição da lei traria um cessarfogo com os empregadores, a reação destes prova o contrário. De uma estratégia ofensiva, passaram à defensiva, elaborando mil e um ardis para não aplicar a lei, ou então deixando simplesmente passar o tempo, à espera de obter algum ganho com isso. Conforme o tempo passa, torna-se necessário conduzir os debates, por vezes forçando a tomada de consciência e encetando negociações. É muito cedo para fazer um balanço da aplicação da lei. Com efeito, os empregadores têm pouco tempo para realizar o conjunto de obrigações que lhes foi imposta e seria arriscado pretender quantificar os resultados e afirmar o fim da discriminação salarial com respeito às mulheres. Mais de quatro anos depois da adoção desta lei, eu não diria que a desilusão é brutal, mas devo dizer que nem tudo foi conseguido, e que tenho a convicção profunda de que a luta não acabou. Ao término desta primeira etapa de aplicação da lei, um balanço rigoroso se imporá. Desde logo, lacunas importantes são visíveis. Sublinho três delas, que deverão receber particular atenção. Em primeiro lugar, parece-me evidente que nos meios não-
A luta pelo reconhecimento do trabalho das mulheres no Québec
O artigo 1º da lei não poderia ter sido mais claro quanto a isso:
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sindicalizados, as mulheres mal conseguirão fazer valer seus direitos, porque, queira-se ou não, a implantação de um programa de igualdade salarial em uma empresa supõe o estabelecimento de uma relação de força entre as partes, a qual é bastante desvantajosa para as trabalhadoras quando estas não dispõem de uma voz coletiva para representá-las.
A luta pelo reconhecimento do trabalho das mulheres no Québec
Por outro lado, terá de ser seriamente questionada a ausência de regulamentação do processo de implantação a ser feito pelas empresas de pequeno porte (10 a 49 empregados). As principais falhas quanto a este ponto são a nãoobrigatoriedade da participação das trabalhadoras na pesquisa e a não-fixação de prazos para que sejam atingidos os resultados considerados necessários. Por fim, a lei do Québec prevê que os empregadores que, depois da verificação da Comissão de Igualdade Salarial, sejam considerados como tendo realizado a igualdade salarial em suas empresas, não sejam obrigados a retomar o processo. Esta disposição, aparentemente justificável, revela-se na verdade uma forma de escapar das obrigações, em razão da acomodação e da conhecida parcialidade, em favor dos empregadores, do organismo que tem a responsabilidade de fazer as verificações. Tanto mais quando se vê que os maiores empregadores de mão-
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de-obra feminina têm invocado estas disposições, incitando assim todas as empresas à desobediência à lei e à acomodação. Daí a minha insistência na importância de que se reveste a escolha das pessoas responsáveis pela aplicação da lei. A igualdade salarial, mais do que uma questão de vontade ou de legislação, é uma questão de respeito. Ela exige de nós debates no interior de nossas organizações, entre trabalhadoras e trabalhadores, pois a adesão de todos é indispensável para que se concretize este direito para as mulheres. Como movimento que atua no âmbito das relações de trabalho, esta luta contra a discriminação salarial feita às mulheres deve se inscrever na ordem de nossas prioridades sindicais. Nós soubemos, no Québec, nos dotar de meios para obter o reconhecimento do direito das mulheres a um salário igual por um trabalho de valor equivalente. Mas eu não poderia concluir sem situar este objetivo no quadro mais amplo da luta contra a pobreza das mulheres, pois ela está tão presente na sociedade do Québec quanto, de forma mais acentuada, em outros países. E se o Québec pode se orgulhar de uma lei pró-ativa em matéria de igualdade salarial, deve ser muito mais humilde com respeito a um outro flagelo social, o da pobreza, que também se conjuga no feminino.
INICIATIVAS PARA A PROMOÇÃO DA IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO NOS EUA
Integrante do Conselho Executivo da Federação Americana do Trabalho-Congresso das Organizações de Trabalhadores nas Indústrias – AFL-CIO *
luta por salário igual pelo trabalho de igual valor já dura muitas décadas nos Estados Unidos, e gostaria de compartilhar meu envolvimento pessoal com relação a esta questão. Como representante das trabalhadoras filiadas ao Sindicato Internacional de Trabalhadores do Setor Elétrico (IUE), era minha responsabilidade observar quais as questões prioritárias para os 37% do total dos membros de nossos sindicatos que eram mulheres. Como primeira medida para determinar essas prioridades, a IUE promoveu sua primeira conferência de mulheres em 1957. Mais de 300 mulheres de todas as partes dos Estados Unidos, representando todos os setores e ocupações de meu sindicato, participaram dessa conferência. Nas oficinas e plenárias realizadas, a questão número um foi claramente remuneração igual. Gostaria de mencionar que em 1942 o Conselho de Guerra sobre Trabalho determinou que as mulheres deveriam receber a mesma remuneração que os homens (que estavam na guerra). Entretanto, a guerra acabou antes que a norma entrasse em vigor. Já em 1956, nosso sindicato se aliou a outros sindicatos, grupos de mulheres e organizações de direitos civis na luta por remuneração igual. Fazíamos parte do Comitê Nacional por Salários Iguais. A meta do Comitê era muito simples: a legislação de salários iguais, garantindo que homens e mulheres que realizassem o mesmo trabalho recebessem a mesma remuneração. Apenas em 1961 começou a haver algum progresso. A militante Esther Peterson tornou-se diretora do Departamento da Mulher do Ministério do Trabalho dos Estados Unidos. Nesse papel, era sua responsabilidade pressionar a legislação, coletar
dados, construir alianças e ganhar aliados. Um projeto de lei sobre salários iguais foi apresentado. Esse projeto original incluía valor comparável (o conceito de equidade na remuneração) e exigia que isso fosse posto em prática. Os sindicatos lutaram em vão pela aprovação desse projeto de lei. Teríamos que esperar até 1963 para que um projeto de lei enfraquecido fosse aprovado, porém considerado “um marco no movimento pela ampliação dos direitos humanos”. Em agosto de 1963 ocorreu em Washington a maior marcha pelos direitos civis e direitos trabalhistas para todos já realizada, liderada pelo falecido Dr. Martin Luther King Jr. Um ano depois, a histórica Lei dos Direitos Civis foi aprovada, a qual incluía o capítulo VII que, entre outras coisas, bania a discriminação contra a mulher. A história mostra que essas leis reduziram a discriminação salarial contra a mulher. Apesar dos problemas causados pela interpretação estreita dessas leis, elas tornaram menos comum a prática de remunerar as mulheres menos que os homens pelo mesmo tipo de trabalho. Entretanto, há ainda muito trabalho a realizar para eliminar o problema. Em 1979, 20 grupos de mulheres, organizações de profissionais e sindicatos, formaram o Comitê Nacional pela Equidade Salarial (NCPE). Essa organização tem liderado a forma de educar, fazer pressão e construir alianças para equidade salarial. Alguns anos atrás, ela iniciou o Dia do Salário Igual; o dia em que as mulheres devem trabalhar no ano corrente para ganhar igual aos homens até 31 de dezembro do ano anterior. O Dia do Salário Igual tem sido basicamente um dia de conscientização nacional, através da qual as parceiras têm conseguido colocar o salário justo na Agenda Nacional. Em 2001, 3 de abril foi o Dia
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Tradução: Solidarity Center, AFL-CIO, escritório no Brasil.
Iniciativas para a promoção da igualdade de remuneração nos EUA
Gloria Johnson
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do Salário Igual. O tema para o dia focalizou o fato de que as leis atuais não eliminaram a discriminação salarial. Todas as parceiras foram incentivadas a promover atividades que produzissem resultados reais para a mulher trabalhadora. A Vice-presidente executiva da AFL-CIO foi eleita recentemente como Presidente do Conselho de NCPE, o que tem ajudado a criar uma maior união do trabalho por salário igual do Departamento da Mulher Trabalhadora da AFLCIO com o trabalho da NCPE. No dia 3 de abril, em Washington, D.C., Linda Chavez-Thompson (vice-presidente executiva da AFL-CIO) e a presidente da NCPE se uniram em uma coletiva de imprensa em Capitol Hill com defensores das mulheres e dos trabalhadores. Dentre os membros do Congresso que participaram no evento, incluíram-se os senadores Tom Harkin e Hillary Clinton, e as deputadas Eleanor Holmes Norton e Rosa DeLauro, promotora da Lei de Justiça no contracheque.
Iniciativas para a promoção da igualdade de remuneração nos EUA
Harking e a National Urban League apresentaram um novo estudo sobre disparidades salariais que concluiu que um terço da diferença salarial entre mulheres e minorias de um lado, e os homens de outro, entre os que trabalham para empreiteiros federais, é causado pela discriminação no emprego. Ele e Norton discutiram a Lei de Salário Justo, que apresentaram no Congresso naquele dia.
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A Lei de Salário Justo é um projeto que exige que os empregadores paguem salário igual por trabalho de igual valor, quer os empregos sejam idênticos ou não. A Lei de Justiça no Contracheque é um projeto que prevê o pagamento por perdas e danos, além de pagamento retroativo para mulheres, às quais foi negado salário igual por trabalho igual. Desde 1997, o Departamento da Mulher Trabalhadora da AFL-CIO lidera a luta por uma legislação sobre igualdade salarial em 30 estados. E neste ano, o departamento está fazendo um grande esforço para educar os membros do Congresso sobre a Lei do Salário Justo e a Lei de Justiça no contracheque e incentivar co-patrocínio desses dois importantes projetos que eliminariam as práticas injustas nos Estados Unidos. É importante nos determos um pouco em algumas vitórias ocorridas nos Estados Unidos na
questão da igualdade salarial através de diferentes estratégias. Novamente os sindicatos estão na dianteira. Meu próprio sindicato adotou uma política importante contra discriminação salarial/sexual, que exige um exame das classificações dos cargos nas empresas para determinar nos quais há concentração de mulheres. Os resultados têm demonstrado repetidamente que as mulheres se concentram nas classificações de remuneração mais baixa – o que é também verdadeiro para o país como um todo. Esses estudos conduziram a esforços para que os patrões tratassem do problema voluntariamente. Eles também levaram a várias ações na justiça, que resultaram não apenas na promoção das mulheres, mas em grandes indenizações.
As conquistas em matéria de igualdade salarial 1981 – No caso “Condado de Washington (Oregon) versus Gunther”, a Suprema Corte decidiu que o Capítulo VII da Lei dos Direitos Civis se aplica mesmo quando os trabalhos são diferentes. As carcereiras ganhavam apenas 70% do salário dos carcereiros, embora suas funções tivessem os mesmos pontos de avaliação de trabalho. Essa vitória marcante fez com que obtivessem 95% do salário dos carcereiros. 1981 – A ação de 1974 da IUE contra a Westinghouse é resolvida logo após a decisão Gunther. A IUE negocia um novo contrato que proporciona elevação de 95 categorias de trabalho predominantemente femininas, indenização e salário maiores. 1981 – Os trabalhadores municipais de San Jose (CA) são os primeiros trabalhadores a entrar em greve por equidade salarial. A vitória deles introduz US$ 1.5 milhões em ajustes salariais (e mais em contratos subseqüentes). 1982 – O estado de Minnesota aprova a primeira lei de igualdade salarial para funcionários púbicos. Trabalhadores da saúde e administrativos são os principais grupos afetados; 90% dos que tiveram aumentos salariais são mulheres. 1983 – Projetos para estudo da equidade salarial no âmbito federal são apresentados no Congresso. O Estado de Washington foi considerado responsável por faixas salariais discriminatórias.
1986-1987 – A província de Ontário (Canadá) é a primeira autoridade no mundo a aprovar lei de igualdade salarial para os setores público e privado. Projetos de igualdade salarial (sexo e raça) para funcionários federais apresentados no Congresso. 1990-1991 – Em 1991, a AFSCME em Nova Iorque ganha US$ 1 milhão em indenizações para mais de 1.000 operadoras do número 911 (callcenter), em uma ação iniciada em 1983. Em 1991, as principais empresas tecnológicas médicas fecham um acordo de US$ 4.000 com as trabalhadoras químicas em Detroit. A Hofstra University (Long Island, NY) completa os ajustes salariais iniciados após a greve de 1989.
1992-1993 – Operadoras de call-center de Detroit ganham igualdade salarial em 1993. 1994-1995 – 20 de julho de 1994, a Lei do Salário Justo de 1994 apresentada no Congresso por Eleanor Holmes-Norton (Democrata) exigindo que os empregadores paguem com justiça trabalhos equivalentes. Em 7 de abril de 1995, a Lei do Salário Justo de 1995 é reapresentada no Congresso. Milhares de mulheres assinam a Petição Nacional por Salário Justo, coordenada pelo Comitê Nacional por Igualdade Salarial.
Ações estaduais pela igualdade salarial Hoje, o foco principal na questão da igualdade salarial tem ocorrido nos estados. Em fevereiro de 2001, 21 estados apresentavam salários iguais. Alguns exemplos ilustram o tipo de ação que se busca:
Arizona – amplia as leis de igualdade salarial existentes para incluir raça e sexo. Cria uma Comissão de Igualdade Salarial para identificar as causas e medidas contra desigualdades nos setores público e privado. Califórnia – cria a Comissão sobre Igualdade Salarial. Geórgia – cria o Comitê de Estudo sobre Igualdade Salarial.
Illinois – propõe que nenhum empregador poderá discriminar funcionários ao determinar os salários apenas com base no sexo do empregado. Indiana – cria o comitê de igualdade salarial; exige que o comitê estude o alcance das disparidades de salário entre os sexos ou minorias e não minorias, fatores que causam essas disparidades, as conseqüências sobre as famílias afetadas e as ações que levem à eliminação e à prevenção de tais disparidades. Maine – propõe estudar a maneira como as leis federais e estaduais existentes que exigem igualdade salarial para trabalho igual são implementadas em colocadas em prática. Mississippi – cria a Lei do Salário Justo de 2001 com a finalidade de eliminar práticas salariais discriminatórias com base em sexo, raça, origem nacional; dá provisões contra práticas de emprego ilegais; exige certas divulgações de salário ao empregado pelo empregador; prevê medidas contra violações dessa lei. Nova Iorque – propõe uma Emenda Constitucional; faz a relação de igualdade salarial com trabalho igual; provê que todas as pessoas terão igualdade salarial para trabalho que exija habilidade, esforço e responsabilidade comparáveis e que seja realizado sob as mesmas condições. Pensilvânia – proíbe discriminação no pagamento de salários devido a sexo, raça ou origem nacional. Provê remédios. Confere poderes e impõe deveres ao Departamento de Trabalho e Indústria. Faz uma revogação. Carolina do Sul – sanciona a Lei do Salário Justo de 2001, que torna ilegal um patrão que emprega 3 ou mais pessoas para discriminar entre empregados com base em sexo, raça ou origem nacional ao pagar salários com faixa diferente para trabalho equivalente; provê medidas.
Atualmente nos Estados Unidos a mulher recebe apenas 72 centavos de cada dólar recebido pelo homem médio. Para a mulher afro-descendente, o abismo salarial é ainda maior. As afro-americanas recebem apenas 65 centavos para cada dólar que os homens brancos ganham, e as hispânicas apenas 52 centavos. Não há dados disponíveis para as americanas de origem asiática. O que isso significa? Na média, as trabalhadoras estão trabalhando uma semana por mês
Iniciativas para a promoção da igualdade de remuneração nos EUA
1985 – Los Angeles negocia ajustes de US$12 milhões para igualdade salarial com a Federação dos funcionários dos estados, condados e municípios dos Estados Unidos (AFSCME). A AFSCME e o estado de Washington concordam com um ajuste de US$100 milhões.
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gratuitamente. Uma mulher de 25 anos deverá perder uma média de meio milhão de dólares em sua vida devido a esse abismo salarial. O crescimento econômico recente não tem reduzido a diferença salarial. Nos últimos anos, os homens tiveram maior crescimento salarial que as mulheres. Em 1999, os ganhos médios das mulheres que trabalharam em tempo integral o ano inteiro foram aproximadamente US$ 26.000 comparados com os US$ 36.000 dos homens. Ainda assim, muitos homens estão perdendo também – homens que têm empregos considerados tradicionalmente como “trabalho de mulher”. Mas não são apenas as trabalhadoras ou os homens que desempenham trabalhos considerados “femininos” que perdem: a desigualdade salarial rouba a segurança econômica de famílias inteiras. Atualmente, é maior o número de mulheres que compõem a força de trabalho, e seus salários são essencialmente para sustentar a família. Mais de dois terços de todas as mães americanas trabalham por um salário.
Iniciativas para a promoção da igualdade de remuneração nos EUA
Se as mães solteiras ganhassem tanto quanto os homens, suas taxas de pobreza seriam cortadas pela metade, de aproximadamente 25% para 13%. Essa perda de renda torna difícil para muitas mulheres suprirem as necessidades básicas de suas
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famílias – como comida, creches ou contas médicas. A discriminação salarial também ameaça a renda da aposentadoria, criando mais pobreza no futuro. Uma forma de assegurar a proteção contra a pobreza, hoje e no futuro, é criar um sindicato. A representação sindical é uma ferramenta comprovada e poderosa para elevar os salários dos trabalhadores, particularmente daqueles mais sujeitos à discriminação no mercado de trabalho: mulheres e minorias. A trabalhadora sindicalizada típica ganha 38% a mais por semana que uma mulher que não pertence a algum sindicato. Pesquisas mostram que tanto as mulheres como os homens estão profundamente preocupados com a desigualdade salarial. Em uma pesquisa recente feita pela Lifetime Television, a maioria das trabalhadoras colocou a igualdade salarial como a principal prioridade para o Congresso em 2001. Quando responderam à Pesquisa “Pergunte à Mulher Trabalhadora”, as mulheres concordaram que leis mais fortes sobre igualdade salarial são sua prioridade legislativa número um. Com as mulheres e as pessoas não-brancas ganhando menos que homens brancos, está claro que a igualdade de salário real está ainda muito longe de ocorrer e as leis atuais não são suficientes.
ELEVAR SALÁRIOS É TOCAR NA QUESTÃO DO PODER
Sindicalista da IG-Mettal da Alemanha *
á décadas as mulheres tentam obter igualdade de remuneração para trabalho igual. Na Alemanha, temos leis de igualdade de gênero para o serviço público, mas não para o setor industrial privado. O que nós temos nas grandes empresas são acordos nos conselhos de trabalho para incentivo às mulheres. Contudo, os vencimentos das mulheres são ainda 25% menores do que os dos homens para os trabalhadores em geral, e 30% para os que têm vínculo de emprego. Mesmo hoje, o pagamento do trabalho feminino mostra muito claramente a discriminação de gênero. O trabalho das mulheres ainda parece valer menos do que o trabalho dos homens. Nós dizemos: “Elevar salários significa tocar na questão do poder!” Por que? No passado, nós tínhamos os chamados níveis de baixos salários. Principalmente as mulheres pertenciam a estes níveis. Os empregos assim classificados requeriam:
trabalho fisicamente leve; trabalho sem esforço mental; o mesmo movimento, repetido várias vezes durante o dia; trabalhos auxiliares.
Nos anos 70, por iniciativa das mulheres, houve lutas em muitas empresas contra os níveis de baixos salários. O slogan era: “Pelo fim dos níveis 1 e 2 de baixos salários!” Esta campanha foi bem sucedida apenas em algumas empresas, mas grandes conquistas foram alcançadas em decisões da Corte do Trabalho em 1979 e 1981. Por exemplo, as mulheres da empresa Heinze (1979) ganharam um processo na mais alta Corte de Trabalho da Alemanha. O resultado foi que todas as mulheres passaram a ganhar o mesmo salário de seus colegas homens. Esta vitória foi muito estimulante para que outras mulheres lutassem por aumento salarial. Suas
ações tiveram grande importância para o surgimento de um novo espírito nas lutas salariais conduzidas pelos sindicatos. Desde então, os chamados “aspectos típicos” do trabalho das mulheres passaram a ser considerados quando da classificação das condições de trabalho. Os aspectos típicos do trabalho atribuído, em geral, às mulheres são:
destreza; trabalho monótono; falta de estímulo; sobrecarga da sensibilidade e dos nervos; sobrecarga dos músculos.
Em 1988, um novo acordo coletivo foi assinado. Nele foram incluídos novos fatores para uma melhor avaliação do trabalho desenvolvido, o grupo 1 foi abolido e aqueles que pertenciam aos níveis 2 e 3 passaram a ganhar mais. Os novos fatores do acordo coletivo eram:
antes de mais nada: todo trabalho requer algum conhecimento, não importa como ele tenha sido adquirido e qual foi a experiência que propiciou sua aquisição; sobrecarga da sensibilidade e dos nervos; sobrecarga física.
Deve ser dada mais importância à sobrecarga mal-distribuída dos músculos. Isto se aplica principalmente quando o trabalho é feito em ciclos. E deve-se considerar que a sobrecarga aumenta na proporção da falta de desafios. Ambos os fatores devem ser incluídos no processo de avaliação. Muita força e persistência foram necessárias para fazer com que as empresas considerassem esses fatores. Nossos colegas homens, que tinham a responsabilidade pela condução do processo de avaliação nas empresas, tiveram que mudar seus
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Tradução: Carlos Magno de Abreu Neiva.
Elevar salários é tocar na questão do poder
Heidi Scharf
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conceitos e aplicar o novo acordo coletivo. O padrão descrito nos antigos acordos coletivos era o de um modelo de homem trabalhador. Contudo, dali em diante os fatores específicos do trabalho das mulheres tiveram de ser levados em consideração. Nós começamos, então, outra campanha com o slogan: “De pé – Para cima” *. E com “para cima” nós queríamos dizer: “para cima com os níveis de salários”. Naturalmente, a campanha somente foi desenvolvida nas empresas que tinham conselhos de trabalho ativos e poderosos, tão logo eles passaram a entender o novo sistema. Alguns dos membros dos conselhos de trabalho, que já tinham mandato há muito tempo, não conseguiram apreender o sentido do novo sistema. Por isso, nós incentivamos muitas jovens trabalhadoras que compunham os conselhos para que fizessem um bom trabalho nos comitês bipartites, com composição igualitária de membros da direção das empresas e dos conselhos. Naturalmente, elas receberam algum treinamento para isso. Nesses comitês, as partes têm que chegar a um acordo. Levou cerca de três anos para que fosse alcançado o acordo coletivo.
Elevar salários é tocar na questão do poder
Em algumas empresas em Stuttgart, cerca de 2.000 mulheres conseguiram chegar aos níveis salariais mais altos. Na Bosch, por exemplo, 1.000 mulheres chegaram a esses níveis. Contudo, ainda há algumas empresas, sobretudo as de pequeno porte, nas quais as mulheres têm problemas para chegar aos níveis mais altos.
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No momento, nós estamos negociando um novo acordo coletivo. O principal ponto é encontrar um modo de comparar empregos e avaliar os trabalhos realizados pelos trabalhadores em geral e por aqueles com vínculo empregatício, e com isso obter a igualdade de remuneração para trabalho de igual valor. Além disso, este acordo deverá conter o direito à qualificação profissional para todos os empregados e deverá prever o direito de proteção contra a sobrecarga. Com este acordo, todos os trabalhadores terão a chance de obter melhor qualificação e melhores salários. E isto será de grande importância, especialmente para as mulheres sem qualificação profissional. É que elas perderão seus empregos pela racionalização num futuro próximo. Se as
mulheres quiserem obter empregos mais qualificados na indústria no futuro – e não trabalhos de tempo parcial ou não-qualificados nas residências privadas, no comércio ou no serviço público – elas devem ser treinadas, e isto deve ser financiado pelo empregador. Outra exigência é o direito de proteção contra a sobrecarga. Nós exigimos o direito de reclamar e o direito de co-determinação para os conselhos de trabalho. Atualmente nós estamos realizando uma campanha nas empresas sob o slogan “bom trabalho”. É surpreendente como as pessoas participam desta campanha: fazem reuniões, discussões, etc. A fase mais importante será a conclusão das negociações e a elaboração do acordo coletivo. Independentemente da conclusão do novo acordo, há vários projetos dirigidos às mulheres sem qualificação. Um deles tem por título “Servindo de mentora”, no qual as mulheres promovem a qualificação das próprias mulheres. O primeiro treinamento, com início em setembro de 2001, está previsto para durar dois anos. Depois disso, esperamos que as mulheres estejam devidamente qualificadas. Isto também significará a possibilidade de obter um emprego como uma trabalhadora qualificada, e ser classificada nos níveis salariais mais altos. O maior problema é que muitas mulheres são estrangeiras – em geral migrantes da Turquia, da Espanha, da Grécia e também da Europa Oriental – e falar alemão é difícil para elas. O projeto é desenvolvido por mulheres de várias organizações e inteiramente custeado pelo Escritório do Trabalho, pelas empresas e pelo Fundo Social Europeu. Este é um primeiro passo no caminho para a igualdade de remuneração para trabalho de igual valor. Agora, mulheres e homens, desde que tenham o mesmo conhecimento e a mesma experiência, ganharão a mesma coisa. Nós demos alguns passos no longo caminho para a igualdade de gênero, e por isso é muito importante iniciar as campanhas. Ações e publicidade podem ajudar mais do que negociações intermináveis. É um fato que as mulheres são capazes de trabalhar tanto quanto os
* No original inglês “Stand up – Get up”; em alemão “Auf geht´s – Rauf geht´s” (N. do T.).
Com a globalização, será cada vez mais importante que trabalhemos muito próximas.
Precisamos de padrões internacionais mínimos e necessitamos urgentemente de solidariedade internacional entre os povos do mundo. E eu espero que possamos intensificar nosso trabalho conjunto.
Elevar salários é tocar na questão do poder
homens, e elas freqüentemente fazem isso. Por estas razões, elas devem ganhar a mesma coisa.
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ESTRATÉGIAS SINDICAIS PARA IGUALDADE NO EMPREGO NO URUGUAI Ofélia Ogara Integrante da Comissão de Mulheres do Plenario Intersindical de Trabajadores-Convención Nacional de Trabajadores – PIT-CNT *
Uruguai, a exemplo de muitos outros países, ratificou a Convenção nº 100 sobre igualdade de remuneração. Contudo, como é também a experiência do movimento sindical internacional, apenas este fato não garante a sua aplicação.
Estratégias sindicais para igualdade no emprego no Uruguai
A Comissão de Mulheres do PIT-CNT tem disposto, dentre outros, de um instrumento fundamental para intervir nas políticas de igualdade no emprego. Este instrumento é a Comissão Tripartite de Igualdade de Oportunidades e Tratamento no Emprego. Esta comissão foi instalada formalmente no Uruguai no âmbito do Ministério do Trabalho e Seguridade Social – MTSS, em 7 de março de 1997, por uma resolução ministerial. Ela foi criada fundamentalmente como um órgão assessor do ministério, com o objetivo de impulsionar a adoção de políticas ativas de igualdade entre homens e mulheres.
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Sua origem remonta ao Programa Tripartite sobre Políticas de Emprego e Igualdade de Oportunidades, inspirado no Centro de Formação da OIT em Turín, em junho de 1995. Deste programa, no qual participaram representantes do governo, dos trabalhadores e dos empresários, surgiu um grupo de enlace de caráter informal que teve a incumbência de incorporar a perspectiva de gênero nas temáticas vinculadas ao emprego. Assim, em novembro de 1996, se organizou um Seminário Tripartite em nosso país, conjuntamente com a OIT, contando com uma participação mais ampla dos três setores, donde se concluiu pela necessidade da criação de um âmbito específico, também tripartite, para abordar o tema da igualdade no emprego. A coordenação da Comissão Tripartite de Igualdade de Oportunidades e Tratamento no
Emprego está a cargo do Ministério do Trabalho e Seguridade Social, que participa com um representante da Inspeção do Trabalho e outro da Direção Nacional de Emprego. Participam também um titular e um suplente de cada setor, conforme segue:
Instituto da Família e da Mulher, ligado ao Ministério da Educação e Cultura – MEC Trabalhadores, representantes do PIT-CNT Empregadores, representantes das Câmaras de Comércio e Indústria.
A comissão se reúne de forma relativamente regular, a cada 15 dias, no Ministério do Trabalho, que tem a responsabilidade de proporcionar o apoio técnico (por exemplo: fotocópias, secretaria e comunicações) necessário ao seu funcionamento. Criou-se uma biblioteca própria da comissão como forma de facilitar o acesso ao material específico que pode ser de utilidade para qualquer um dos setores.
Áreas de intervenção da Comissão Tripartite Ainda que não exista uma delimitação formal, a Comissão Tripartite funciona como uma instância assessora do Ministério do Trabalho e Seguridade Social, e pode propor medidas específicas em matéria de igualdade de oportunidades e de tratamento no emprego. Se entende também que ela deverá cumprir um importante trabalho no que se refere à difusão dos direitos da mulher trabalhadora. Do ponto de vista institucional, ainda que em suas origens tenha sido criada por uma resolução ministerial e tenha atuado como uma mesa de trabalho, hoje podemos dizer que foi institucionalizada por decreto de ambos os Ministérios (do Trabalho e da Educação e Cultura), fato este que foi um dos objetivos fundamentais desta comissão alcançado em dezembro de 1999.
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Tradução: Waldeli P. Melleiro.
Os mesmos estão claramente especificados no decreto de institucionalização, e são: a)
b)
c)
d)
e)
f)
g)
Contribuir para o equilíbrio do mercado de trabalho, mediante estratégias que respondam ao propósito de gerar igualdade no emprego. Promover, a partir do setor governamental e conjuntamente com os atores sociais, uma política ativa de igualdade de oportunidades no emprego. Incidir na implementação de ações que permitam incorporar uma visão de gênero nos três programas substantivos do Ministério do Trabalho e Seguridade Social: Direção Nacional de Emprego, Direção Nacional de Trabalho e Inspeção Geral do Trabalho. Impulsionar e apoiar iniciativas que os atores sociais envolvidos decidam adotar em matéria de igualdade de oportunidades. Gerar instâncias de coordenação que fortaleçam as iniciativas dos setores governamentais e não governamentais em matéria de igualdade. Oferecer assessoria técnica a iniciativas que sejam apresentadas em âmbito parlamentar relativas ao tema. Implementar estratégias de difusão, promovendo a igualdade de oportunidades e de informação sobre a legislação trabalhista vigente.
Principais atividades desenvolvidas
Desde a sua criação, podemos identificar as seguintes atividades:
Como espaço de intercâmbio de informação entre os setores sociais e de assessoria para o Ministério do Trabalho e Seguridade Social no assunto. Como órgão canalizador de denúncias que, em caso de discriminação por razões de sexo no emprego, se apresentem perante o Ministério do Trabalho. Como impulsionador das instâncias de capacitação e sensibilização, buscando incorporar a visão de gênero em suas atividades, como por exemplo:
o trabalho desenvolvido pelos funcionário do Ministério do Trabalho e Seguridade Social. Por exemplo, em novembro de 1997
organizou-se um seminário para os funcionários da Direção Nacional do Trabalho e da Inspeção Geral do Trabalho; o “Seminário Nacional sobre a Igualdade na Formação Profissional e no Emprego”, realizado em novembro de 1998; o curso organizado para funcionários do escritório de serviço civil, “A perspectiva de gênero na capacitação”, como forma de tornar mais permeável a perspectiva de gênero nas políticas públicas; a oficina de avaliação e fortalecimento interno da Comissão, realizada em junho de 1999; o seminário nacional “Bases para a construção da equidade no mercado de trabalho – rumo a um plano nacional de igualdade no emprego”, realizado em dezembro de 2000.
Como geradora de iniciativas de coordenação inter-institucional com a Comissão de Direitos da Mulher, criada na órbita do Ministério da Educação e Cultura, com a Comissão de Equidade e Gênero do Parlamento, com a cátedra de gênero da Faculdade de Ciências Sociais (Universidade da República), com diferentes Organizações Não Governamentais que atuam neste tema, com a Comissão da Mulher do Governo Municipal de Montevidéu e Junta Nacional de Emprego. Como impulsionadora do programa de formação profissional (experiência piloto para 500 mulheres desempregadas ou com emprego precário) elaborado pela Direção Nacional de Emprego (DINAE), e apresentado para a Junta Nacional de Emprego (JUNAE); projeto este que levou quase dois anos até sua aprovação final e mais de um ano e meio para alcançar sua implementação. Como participante ativa na elaboração do boletim da Rede de Comissões Tripartites do Mercosul para a Igualdade de Oportunidades. Com instâncias da Comissão Tripartite acordou-se de forma consensual a inclusão da cláusula de igualdade, a qual passou a integrar o Protocolo Sócio-laboral da Declaração do Mercosul (subgrupo nº 10). Também com instâncias da Comissão discutiuse uma proposta de consenso para a manutenção da Convenção nº 103, postura essa que foi adotada pelos três setores durante a 87ª Conferência Anual da OIT.
Estratégias sindicais para igualdade no emprego no Uruguai
Objetivos da Comissão Tripartite
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Como impulsionadora de um pedido de cooperação através do MTSS ao governo da Espanha que consistiu no envio, por três meses, de uma especialista em Políticas Públicas, com o objetivo de transitar em direção a um plano nacional de igualdade no emprego. Um produto dos compromissos governamentais obtidos a partir da cooperação espanhola foi a assinatura de um convênio entre o MTSS e o Instituto Nacional de Estatísticas (INE) para incluir a desagregação dos dados por sexo nas pesquisas domiciliares, bem como outros indicadores, que nos servissem como subsídios para aprofundarmos o conhecimento da situação em nosso país.
Balanço da atuação da Comissão Tripartite
Estratégias sindicais para igualdade no emprego no Uruguai
Para além das dificuldades que existem na própria Comissão, assim como em cada um dos setores que a compõem (já que não é um tema prioritário na agenda de nenhum deles), consideramos que é o nível mais alto já alcançado para o tema de gênero e emprego e que, através de sua atuação constante, tem se convertido em uma referência para o tema da Igualdade de Oportunidades, tanto nacional, regional e internacionalmente, dando visibilidade à questão de gênero de uma maneira inédita em nosso país. A Comissão possui uma potencialidade não desprezível na resolução de conflitos, dada a situação geral do mercado de trabalho e, em particular, a forma de inserção das mulheres trabalhadoras nesse mercado.
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Finalmente podemos dizer que, sem dúvida, o setor mais desenvolvido e ativo é o sindical, e que tem sido muito difícil o envolvimento tanto do setor empresarial como do Instituto da Família e da Mulher do MEC.
Perspectivas futuras Atualmente está em curso, com o apoio da OIT, uma pesquisa sobre os custos do trabalho das mulheres. Esta pesquisa, que está sendo aplicada em uma ampla gama de empresas, tanto privadas como estatais, nos permitirá averiguar não somente o seu objetivo explícito, como também rebater com dados fidedignos certos mitos que existem sobre o comportamento das mulheres no mercado de trabalho (como por exemplo: permanência no emprego, absenteísmo e causas). A médio prazo
prevê-se realizar o terceiro seminário nacional tripartite onde, além de tratar temas como a brecha salarial entre homens e mulheres, serão apresentados os resultados da pesquisa anterior. Ao longo do ano, será dada continuidade ao trabalho iniciado junto à cooperação espanhola, pretendendo culminar com o consenso de todos os setores envolvidos com o Plano Nacional de Igualdade no Emprego. Este plano terá como objetivos:
aprofundar o conhecimento da igualdade no mercado de trabalho. revisar a legislação e propor as modificações necessárias. envolver ativamente a Administração Pública com ações concretas (maior incorporação de mulheres e maior incorporação destas em cargos de responsabilidade). Envolver e comprometer a Inspeção do Trabalho para que cumpra com as suas competências, velando pela aplicação das leis de igualdade.
A convenção nº 100 da OIT No Uruguai, a Lei nº 16.045 proíbe a discriminação em função do sexo nos critérios de remuneração. Apesar das normas existentes, é em termos de remuneração onde se detectam as situações discriminatórias mais evidentes. Ainda que praticamente não existam diferenças salariais entre homens e mulheres para um mesmo trabalho, estas últimas ocupam postos que estão socialmente subvalorizados no mercado de trabalho. A subvalorização das tarefas desempenhadas pelas mulheres contribui para manter a segmentação do mercado de trabalho com um evidente prejuízo para aquelas. É assim que nos encontramos com uma brecha salarial entre homens e mulheres de 64%, e ainda naquelas atividades nas quais predominam as mulheres seu salário alcança 85% dos salários dos homens (como, por exemplo, no ensino e na saúde). Isto se deve ao fato de que os cargos de maior responsabilidade, e portanto melhor remunerados, são ocupados pelos trabalhadores homens. Outra causa que contribui para manter a brecha entre o salário dos homens e das mulheres no mercado de trabalho é que, apesar do ingresso
Daí é que consideramos fundamental e imprescindível a atuação da Comissão Tripartite como geradora de políticas públicas que contribuam para modificar essa situação. Recordemos, entre outros, o Programa de Formação Profissional para 500 mulheres em carreiras não tradicionais, a implementar-se com a aprovação da Junta Nacional de Emprego (JUNAE). Por fim, o principal objetivo perseguido pela Comissão é a efetivação de tais compromissos e a concretização do Plano Nacional de Igualdade no Emprego.
Estratégias sindicais para igualdade no emprego no Uruguai
das mulheres no mesmo ser constante e progressivo, não acontece o mesmo com o tipo de atividade e com a qualidade do emprego ao qual elas têm acesso – reproduzindo no mercado de trabalho as tarefas tradicionalmente feitas no lar. Tanto é assim que, apesar dos homens estarem ampliando a gama de categorias de atividades às quais têm acesso (aproximadamente 156 diferentes), as mulheres praticamente se restringem às categorias trabalhistas consideradas femininas (não mais de 11 diferentes).
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IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO JÁ! CAMPANHA MUNDIAL DA ISP Jane Pilinger Consultora na Campanha da Internacional de Serviços Públicos - ISP *
ISP – Internacional de Serviços Públicos – conta atualmente com 20 milhões de trabalhadores em sua base, possuindo mais de 500 sindicatos filiados em 146 países. As mulheres compõem a maioria do setor, constituindo 65% do total da categoria.
Igualdade de remuneração já! Campanha Mundial da ISP
A promoção da igualdade de gênero tem sido uma prioridade da ação sindical da ISP, principalmente através do desenvolvimento das chamadas ações afirmativas. Vale destacar que desde 1993 vem se aplicando o princípio de equilíbrio de gênero na entidade e que garante-se a participação de 50% de mulheres em todas as atividades promovidas pela organização. Do ponto de vista da ação sindical, a ISP vem desenvolvendo uma campanha mundial pela proteção dos direitos da maternidade.
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Desde 1999, o Comitê de Mulheres da ISP reconheceu que a igualdade salarial constitui-se numa questão prioritária. Assim, encontra-se em fase de elaboração uma Campanha Mundial pela Igualdade de Remuneração. Esta campanha tem o objetivo de efetivar o cumprimento da igualdade de remuneração e aumentar a capacidade das mulheres e dirigentes sindicais para pautar e negociar esse tema. Ela é uma resposta à contínua diferença salarial por motivo de sexo, que é um obstáculo importante para a igualdade do local de trabalho. O objetivo é fazer com que a campanha repercuta em resultados concretos relativos à igualdade para o conjunto dos filiados à ISP. Espera-se também contribuir com a formação de lideranças e, em particular, proporcionar-lhes as aptidões necessárias para assumir funções destacadas em seus sindicatos, em especial nas negociações coletivas, que repercutam na igualdade de remuneração.
Como fase preparatória ao desenvolvimento da Campanha pela Igualdade de Remuneração, foi realizado um estudo, envolvendo o conjunto dos sindicatos filiados à ISP, relativo às suas experiências e estratégias de igualdade de remuneração. A sistematização desse estudo foi submetida a uma consulta técnica, da qual participaram dirigentes sindicais e especialistas no tema, com vistas a elaborar um Pacote de Recursos para subsidiar a ação dos seus sindicatos filiados na promoção da igualdade de remuneração. O lançamento da Campanha Mundial pela Igualdade de Remuneração, bem como o do Pacote de Recursos, deverá ocorrer no próximo Congresso da ISP, previsto para setembro de 2002, em Ottawa. A seguir apresentamos uma síntese do estudo desenvolvido até o momento junto às filiadas da ISP e que fundamenta a elaboração da Campanha pela Igualdade da Remuneração.
IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO NO CONTEXTO INTERNACIONAL As garantias legais existentes no âmbito internacional, na Europa e em diversos países, têm sido de vital importância para as campanhas sindicais e para as negociações pela igualdade de remuneração. O crescimento da participação das mulheres no mercado de trabalho nos países desenvolvidos vem sendo acompanhado de legislação sobre igualdade de oportunidades e de remuneração, que tem levado à remoção dos piores excessos da discriminação. Em um mercado de trabalho crescentemente desregulamentado, marcado pelo emprego informal e pelos empregos de tempo parcial, há tentativas de enfrentar, por meio de novas regras, alguns dos efeitos discriminatórios da flexibilização exigida pelo processo de globalização. A lei tem sido utilizada como base para a negociação da igualdade de remuneração, com os sindicatos levando a questão à mesa e
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Tradução: Carlos Magno de Abreu Neiva.
Na Europa Central e Ocidental ocorreram mudanças econômicas, políticas e sociais, ao lado de grandes transformações nas negociações coletivas e nos empregos do setor público. Ao redor do mundo, alguns países carecem dos recursos básicos para prover os serviços públicos, quanto mais para oferecer salários decentes. Ao mesmo tempo, o crescimento da participação das mulheres no mercado de trabalho tem se concentrado em empregos de baixa remuneração, nos quais ganham em média de 50% a 80% dos salários recebidos pelos homens. Estas desigualdades de remuneração são piores nos países pobres e em desenvolvimento. A legislação internacional é de importância crucial para as estratégias sindicais em busca da igualdade salarial. Isto inclui a Convenção nº 100 sobre Igualdade de Remuneração para Trabalho de Igual Valor (1951), a Convenção nº 111 contra a Discriminação no Emprego e na Ocupação e a Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, todas da OIT. É importante observar que a Convenção nº 100 se refere a trabalho de igual valor, permitindo, com isso, a comparação salarial entre grupos e segmentos ocupacionais. O ano de 2001 marcou o 50º aniversário da Convenção nº 100. Em 2003, um relatório sobre a anti-discriminação, incluindo a Convenção nº 100, será feito pela OIT como parte do acompanhamento da Declaração. Instrumentos elaborados pelas Nações Unidas, como a Declaração contra todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e a Plataforma de Ação de Beijing são igualmente importantes por identificar a importância dos direitos econômicos e humanos das mulheres em âmbito mundial. A Declaração e a Plataforma de Ação de Beijing consideram o papel das mulheres na economia como uma das doze áreas críticas de ação. A diferenciação salarial e a discriminação no emprego baseadas no gênero receberam destaque nas ações propostas, e as negociações coletivas são consideradas um direito e um mecanismo “para redução das desigualdades salariais que atingem as mulheres e para a melhoria das suas condições de trabalho”. Na Europa, a despeito de um substancial conjunto de decisões judiciais e da legislação nos países da União Européia, que se baseiam no art. 141 do Tratado de Amsterdam (antigo art. 119), e na Diretiva sobre Igualdade de Pagamento para
Trabalho de Igual Valor (1975), a diferenciação salarial com base no gênero continua grande. Durante a Presidência exercida pela Bélgica, em 2001, uma nova ênfase foi dada ao assunto, incluindo a prioridade na identificação de novos indicadores e um novo programa de ação pela igualdade de gênero (2001-2005), o qual destaca a igualdade de remuneração como um objetivo central. Nos sindicatos europeus o interesse renovado na igualdade de remuneração se reflete em:
A Central Européia de Sindicatos (ETUC), ao fixar suas linhas mestras sobre a Coordenação de Negociações Coletivas na Europa, resolveu, em dezembro de 2000, recomendar que os sindicados utilizem a negociação coletiva para reduzir a diferenciação salarial por meio do “combate ao baixo salário e pela garantia de igual remuneração entre homens e mulheres para trabalho igual e trabalho de igual valor”. A Campanha por Salários Iguais da ETUC estimulou a ação sindical a enfrentar a questão da igualdade de remuneração pelos meios que se têm mostrado mais eficazes, em especial através pelas negociações coletivas. Um banco de dados e um site foram desenvolvidos para disseminar experiências e práticas bem sucedidas. O Plano de Equalização da ETUC, de 1999, elegeu a igualdade de remuneração como uma das três prioridades estratégicas. No relatório do Plano, de 2001, recomendou-se a introdução de um objetivo de redução da diferenciação salarial da ordem de 2% a 5%. Isso exige que os sindicatos sejam mais pró-ativos, inclusive redirecionando suas atividades para áreas como empregos de tempo parcial. A Comissão pela Igualdade de Gênero da Federação Européia de Sindicatos do Serviço Público fez da igualdade de remuneração prioridade máxima no seu Plano de Ação pela Igualdade de Gênero 2001-2004. Pensa-se em estabelecer objetivos anuais de redução da diferenciação salarial.
A IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO E A DIFERENCIAÇÃO SALARIAL ENTRE OS SEXOS O que é igualdade de remuneração? Há uma variedade de sentidos do termo “igualdade de remuneração”. A Campanha pela
Igualdade de remuneração já! Campanha Mundial da ISP
forçando os empregadores a enfrentá-la – se quiserem evitar os custos das prováveis ações judiciais.
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Igualdade de Remuneração da ISP a vê como uma definição ampla, que engloba desigualdades salariais e baixos salários. Inclui:
Remuneração igual para o mesmo trabalho, ou de mesma natureza, quando dois empregos idênticos são comparados; Remuneração igual para trabalho de igual valor ou de valor comparável, quando os empregos não são idênticos mas têm o mesmo valor ou valor comparável, como por exemplo uma enfermeira e um marceneiro; Estratégias voltadas para a luta contra os baixos salários das mulheres e para a promoção de salários dignos, por meio do estabelecimento de pisos salariais mínimos nacionais, ou então melhorando ou eliminando os níveis mais baixos de salário.
Os sindicatos do serviço público têm lutado pela igualdade de remuneração de várias maneiras: negociação coletiva, ações judiciais, avaliação de empregos/esquemas de valor de cada trabalho, e melhorando o salários dos trabalhadores que ganham menos. Nos últimos anos tem sido enfatizada uma maior amplitude das estratégias sindicais, que também incluem o ataque aos baixos salários por meio de campanhas por salário digno/de sobrevivência ou salários mínimos decentes.
Igualdade de remuneração já! Campanha Mundial da ISP
A diferenciação salarial com base em gênero
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As limitações nos dados disponíveis e o caráter inadequado das análises da diferenciação salarial com base no gênero, quando considerados os diversos setores, dificultam comparações globais dessa diferenciação no serviço público. Tais limitações ocorrem particularmente nos países em desenvolvimento. Os dados disponíveis mostram que nos países da OCDE a diferenciação foi ligeiramente reduzida entre 1985-1995. Em 1995, em todos os países, as médias salariais das mulheres eram mais baixas do que as dos homens, com a maior diferença ocorrendo no Japão e na Coréia, e a menor na França, Bélgica e Dinamarca. A incidência da maternidade também afeta de forma significativa os ganhos das mulheres, resultando em uma diferenciação cada vez maior entre pais e mães e entre mulheres que são mães e as que não são (OCDE, 2001). Na União Européia os ganhos das mulheres, considerados como um todo, eram 26%
menores que os dos homens. Na Bélgica, Dinamarca, Luxemburgo e Suécia o salário médio das mulheres era 84% do dos homens, enquanto na Irlanda e no Reino Unido era apenas 70%. Um fato preocupante é que na Suécia a diferenciação salarial vem aumentando nos últimos anos, e na Dinamarca ela estagnou. Análise do Painel dos Domicílios da Comunidade Européia de 1996 mostra que no setor público os ganhos horários das mulheres representam 86% dos auferidos pelos homens (Comissão Européia, 2001). A diferenciação salarial com base no gênero é resultado de um complexo conjunto de fatores relacionados às características da inserção das mulheres na força de trabalho, à estrutura do mercado de trabalho e às mudanças nas relações entre os sexos. A discriminação aparece em sistemas de remuneração, na subvalorização das habilidades e capacidades femininas, na segregação ocupacional e na divisão desigual das responsabilidades familiares e domésticas. Em alguns países a elevação nos níveis de escolaridade das mulheres, o decréscimo da participação masculina e concomitante aumento da feminina no mercado de trabalho tiveram impacto sobre as diferenças de remuneração. Mulheres mais jovens e com maior escolaridade experimentam menor diferenciação. Há também uma relação entre as desigualdades em geral e as desigualdades de gênero. Países menos desiguais e com menor diferenciação salarial são os mesmos há vinte anos; do mesmo modo, os países com maiores desigualdades e uma grande diferenciação salarial com base no gênero mudaram pouco. Em um grande número de países as desigualdades de remuneração (entre ricos e pobres) aumentaram substancialmente, implicando num efeito adverso sobre a igualdade. Diferenças de educação e treinamento, de segmentos ocupacionais e de empregos são somente parte da explicação da diferenciação salarial. Imagens específicas de gênero, profundamente enraizadas nos sistemas de remuneração, exprimem a idéia de que as mulheres tendem a ganhar menos em razão das habilidades que lhes são próprias, e os homens ganham mais graças às suas; o resultado é que o aumento de mulheres em uma ocupação específica é associado a um declínio da remuneração respectiva (Acker, 1989). Do mesmo modo, não se pode explicar a diferenciação salarial simplesmente com base na desigualdade de oportunidades de educação, já que em muitos países as mulheres ultrapassam
As estratégias sobre igualdade de remuneração também exigem uma compreensão do efeito que os pagamentos de bônus, pensões, horas-extras, comissões, seguro-saúde, outros benefícios, como carros ou moradia, e treinamento têm sobre a remuneração. A pesquisa da ISP sobre igualdade de remuneração indica que as mulheres têm menos chance de receber estes pagamentos adicionais, uma vez que ocupam empregos nos quais eles não são sequer oferecidos. Um aspecto mais profundo é a maneira pela qual alguns ganhos aparentes na igualdade de remuneração mascaram uma deterioração nos salários dos homens, decorrente do aumento nas desigualdades entre os próprios homens e da tendência de diminuição da diferenciação salarial com base no gênero (Breugel, 1999).
beneficiárias potenciais de um salário mínimo nacional (Unison, 1997 e 2000). Nos Estados Unidos, mulheres afro-americanas ganham dois terços dos salários dos homens e as mulheres hispânicas ganham menos de 60% (AFSCME – Federação dos Empregados dos Estados, Condados e Municípios, Departamento de Mulheres, 2001). As experiências de desigualdades salariais de mulheres negras, migrantes e pertencentes a minorias étnicas são as mais marcantes, tanto nos países desenvolvidos quanto nos países em desenvolvimento.
Pobreza e baixos salários
A igualdade de remuneração é também diretamente afetada pelos sistemas nacionais de regulação e determinação de salários. Por exemplo, pesquisas feitas no Reino Unido, Austrália e países da União Européia mostram que sistemas centralizados de negociação coletiva têm efeito positivo sobre a igualdade de remuneração, enquanto sistemas descentralizados têm efeito negativo (Dickens, 2000; Grimshaw, Whitehouse and Zetlin, 2001). De maneira similar, sistemas de remuneração mais simplificados favorecem a igualdade de remuneração, removendo classificações que dão um valor menor às habilidades femininas.
A questão dos salários mínimos interessa diretamente às mulheres, pois pode ajudar a igualar seus salários aos dos homens e a aproximar a renda das diversas famílias. A diferenciação salarial significa, para muitas mulheres e suas crianças, viver na pobreza. Nos países desenvolvidos e em desenvolvimento as mulheres continuam a ganhar, em média, 75% do que os homens ganham, o que reduz significativamente seus ganhos ao longo da vida e pode significar uma velhice na pobreza. Em muitos casos as mulheres não ganham um salário que lhes permita viver e no caso de mães sem companhia a incidência da pobreza é especialmente alta. Os ganhos de toda uma vida são particularmente afetados, de forma negativa, quando as mulheres são obrigadas a deixar o mercado de trabalho em razão de responsabilidades pela casa ou pelos filhos. Baixos salários significam que muitas mulheres são economicamente dependentes dos homens. A dependência das mulheres dos benefícios do Estado, particularmente na velhice, significa que o Estado está subsidiando os baixos salários e a pobreza das mulheres.
A questão étnica/racial e as desigualdade salariais
Empregos de tempo parcial, horas de trabalho e igualdade de remuneração
Igualmente importante são as evidências cada vez mais fortes de que as desigualdades salariais estão ligadas à questão de raça, sendo o caso mais extremo o que existiu sob o apartheid na África do Sul, cujo legado histórico e cultural continua a ser sentido. No Canadá, pesquisas mostram a extensão da pobreza ligada à raça e a diferenciação salarial pelo mesmo motivo, que permanece em 25% (Grace-Edward Galabuzi, 2001). No Reino Unido, a Unison mostra que as mulheres negras tendem a ganhar menos no setor público e são, assim,
Como as mulheres trabalham menos horas do que os homens, têm menor probabilidade de fazer horas-extras e de trabalhar em tempo integral, seus rendimentos semanais, mensais e de toda a vida são substancialmente menores que os dos homens. As taxas salariais por hora nos dos empregos de tempo parcial são freqüentemente menores que nos empregos de tempo integral, e quando se examinam os ganhos semanais ou mensais as disparidades são ainda maiores. Contudo, isso varia entre os diversos países. Por exemplo, na Holanda a diferença de
Igualdade de remuneração já! Campanha Mundial da ISP
os homens em qualificação. Embora a questão da igualdade de remuneração ainda esteja ligada à da igualdade educacional, particularmente nos países em desenvolvimento, isso não explica porque as mulheres continuam a ganhar 70% do que os homens ganham.
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salários entre as duas formas de trabalho é insignificante. Muitos trabalhadores em tempo parcial têm menos direitos a benefícios, tais como adicionais noturnos, horas-extras, pensões e outros prêmios. As estratégias sindicais para a igualdade de remuneração têm, necessariamente, que atentar para a questão das horas de trabalho ou ao menos exigir o pagamento de horas-extras conforme manda a lei. Nos países nórdicos alguns acordos no setor público permitem que os trabalhadores em tempo parcial aumentem suas horas de trabalho, e em alguns casos trabalhem em período integral. Na Holanda, a flexibilidade para aumentar as horas de trabalho nos empregos de tempo parcial (largamente ocupados por mulheres) e para reduzir as horas do período integral (em grande parte ocupados pelos homens) tem sido parte de uma estratégia de redistribuição do trabalho entre homens e mulheres (Pilinger, 2000). Nos Estados Unidos a AFSCME vem negociando a melhoria dos salários dos empregados em escritórios pela conversão de empregos de tempo parcial para trabalhos de tempo integral, de modo a obter igualdade de remuneração e oportunidades de carreira. Nas escolas estaduais e comunitárias do Massachussetts 530 posições de empregos de tempo parcial temporárias foram transformadas em empregos permanentes e de tempo integral. Isto ajudou a melhorar os ganhos semanais e mensais das mulheres e a tirá-las da armadilha dos baixos salários dos empregos de tempo parcial.
1995; Gregory, Sales & Hegewisch, 1999). Estes novos desafios, em um setor público mais desregulamentado e privatizado, estão levando a estratégias sindicais novas e mais defensivas. Isto é sentido particularmente na Nova Zelândia, onde o mercado de trabalho altamente desregulamentado e a revogação da Lei de Igualdade no Emprego levaram a uma deterioração na remuneração e nas condições de trabalho das mulheres.
O PROBLEMA DA IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO NOS PAÍSES DESENVOLVIDOS E EM DESENVOLVIMENTO Há inúmeras vantagens sociais, econômicas, para os negócios e para a qualidade dos serviços que podem resultar do alcance da igualdade de remuneração nos serviços públicos. Nos Estados Unidos e no Canadá mostrou-se que mulheres que pertencem a sindicatos são menos propensas a sofrer discriminação salarial. Por exemplo, nos Estados Unidos, em 1996, a AFSCME relatou que as mulheres sindicalizadas ganhavam salários semanais que eram quase 36% maiores do que os das não-sindicalizadas (AFSCME, Press Release, 24/06/1997).
Igualdade de remuneração já! Campanha Mundial da ISP
Novos desafios para os serviços públicos
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Um problema que vem surgindo com relação aos serviços públicos é a fragmentação da negociação coletiva. Na Europa Central e Oriental muitos trabalhadores não têm com quem negociar. No Reino Unido e na Nova Zelândia a tendência rumo a estruturas organizacionais mais fragmentadas significa que freqüentemente não há um empregador com quem negociar. Em um grande número de países em desenvolvimento a ausência de sistemas de negociação coletiva em todos os níveis é um grande obstáculo para que se assegurem as pautas de igualdade dirigidas aos locais de trabalho. Boas condições de trabalho e ganhos em igualdade de remuneração nos serviços públicos nos países desenvolvidos vêm sendo solapados pela privatização e pelos cortes nos orçamentos públicos (Grimshaw & Rubery, 2001; Escott & Whitfield,
A igualdade de remuneração pode melhorar o status do trabalho das mulheres nos serviços públicos. O crescimento das expectativas e demandas das mulheres por igualdade no trabalho, igualdade de remuneração e tratamento justo não podem ser ignorados se os serviços públicos quiserem ser encarados como empregos de primeira linha. O emprego no serviço público será visto como atrativo se as decisões sobre remuneração forem feitas de forma objetiva e justa. A igualdade de remuneração é essencial para que se tenha uma força de trabalho altamente motivada. Premiar o corpo de funcionários por suas habilidades pode ser altamente motivante; fazer o contrário pode criar uma imagem muito negativa dos serviços públicos. A igualdade de remuneração pode ajudar, além disso, a melhorar a qualidade dos serviços para todos os usuários. A igualdade de remuneração pode ajudar a mudar a cultura de uma organização e melhorar a qualidade do serviço prestado. Se os clientes são tratados com dignidade e respeito os trabalhadores devem ser tratados do mesmo
Finalmente, de acordo com a Coalizão pela Igualdade de Remuneração no Canadá, que é uma organização lobista formada por sindicatos e organizações de mulheres, “A igualdade de remuneração é boa para a economia. Quando as mulheres são remuneradas de acordo com o real valor de seu trabalho, elas têm mais recursos para prover suas próprias necessidades, as de suas famílias e de suas comunidades locais. A igualdade de remuneração é freqüentemente a diferença entre viver na pobreza e ter uma vida decente. Afeta as aposentadorias das mulheres, evitando a pobreza na velhice. Empregadores que cumprem o Pay Act se beneficiam de um ambiente de trabalho positivo e produtivo.”
AS PRINCIPAIS BARREIRAS, DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA OBTER A IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO A pesquisa da ISP revelou um certo número de barreiras, desafios e oportunidades para atingirmos a igualdade de remuneração. À luz disso é importante identificar o que funciona, sob que circunstâncias e com que recursos e capacitação nos sindicatos. Uma mudança na ênfase já pode ser vista na atividade sindical, que tem deixado a mera constatação da discriminação e tem partido para estratégias mais pró-ativas que englobam a inserção e priorização da igualdade de remuneração nas negociações coletivas, além de dar poder às mulheres para que participem das decisões e nas negociações. Em alguns países isso também é fruto de mudanças legislativas que levaram a abordagens mais pró-ativas, nas quais se inclui o dever de promover a igualdade, a participação e a garantia de que as mulheres ocupem posições de comando (Hepple, 2001; McCrudden, 2000). Uma grande barreira para implementar a igualdade de remuneração é a ausência de estatísticas e indicadores de remuneração para medir as desigualdades. Um grande desafio é tornar mais visíveis e transparentes os salários dos homens e
Glossário Gender Mainstreaming (Promoção da questão de gênero) Avaliação e desenvolvimento sistemático de processos políticos a partir da perspectiva de gênero, de modo que a questão da igualdade entre os sexos seja incorporada em todos os níveis e estágios pelos responsáveis pela elaboração de políticas. Valor comparável Comparação do valor de empregos através de avaliação de empregos, de modo a identificar e eliminar a discriminação salarial entre mulheres e homens em cada local de trabalho, indústria ou setor. Igual valor Comparações feitas entre dois ou mais empregos que, mesmo sendo diferentes em seus conteúdos, são iguais quanto às habilidades ou preparo requeridos. Normalmente é determinado por meio da avaliação de empregos. Avaliação de empregos Sistema de comparação entre empregos diferentes pela observação das características que os definem, classificando-os de acordo com seu valor, de forma a determinar o nível de remuneração. Igualdade de remuneração Elevação dos salários das mulheres através de vários mecanismos, incluindo reivindicação por pagamento equânime, igualdade de remuneração para trabalho de igual valor/valor comparável, salários mínimos e reavaliação dos empregos “femininos”.
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modo. Isto pode beneficiar positivamente a qualidade do serviço e do trabalho de cada um. Evitar ações judiciais. Essa é uma questão relevante para os empregadores, e isso tanto é um ponto favorável ao desenvolvimento de sistemas de remuneração justos e transparentes, quanto serve para fazer com que a igualdade de remuneração seja tomada a sério nas negociações coletivas. Os empregadores que pagam às mulheres salários que efetivamente remuneram o valor do trabalho criam um ambiente de trabalho positivo. Isto pode ajudar a aumentar a produtividade, reduzir o absenteísmo e licenças por motivo de saúde, e a criar uma imagem positiva junto aos usuários. A igualdade de remuneração no setor público pode ter um impacto positivo sobre o desenvolvimento econômico local. O setor público pode ser um modelo de boas práticas no emprego e contra a corrupção. Salários justos no setor público podem ter impacto nos níveis salariais de outros empregadores da mesma área geográfica. Eliminar a diferenciação salarial entre os sexos é parte de uma agenda positiva que abarca os direitos humanos, a inclusão social e a igualdade de oportunidades. Torna os locais de trabalho mais coesos e justos. Quando as mulheres são remuneradas eqüitativamente, o reconhecimento do valor de seu trabalho aumenta o poder das mulheres, melhora sua auto-estima e sua independência financeira.
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das mulheres, incluindo diferenças entre salários de empregos de tempo parcial e de tempo integral, e entre diferentes setores econômicos. Por exemplo, a pesquisa sobre a Estrutura de Ganhos da União Européia não inclui alguns setores chave do serviço público, como administração pública, defesa, educação, saúde e trabalho social, e outros serviços comunitários, pessoais ou sociais. Com relação ao local de trabalho (que é o nível onde as negociações acontecem) a ausência de dados sobre os trabalhadores e níveis de salário para diferentes grupos de empregados em ocupações distintas é uma grande barreira para que se façam auditorias de remuneração e esquemas de avaliação de emprego. O objetivo é que os indicadores da remuneração conforme o sexo ajudem a explicar a diferenciação salarial entre mulheres e homens, e tornem possível que instrumentos de monitoramento sejam postos em prática (Plasman, 2001).
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Em muitos países a igualdade de remuneração teoricamente existe no serviço público porque mulheres e homens ganham a mesma coisa quando trabalham nos mesmos graus da carreira. A remuneração é comumente fixada por meio de estruturas de vários níveis, estabelecidas como resultado de negociações ou decorrentes diretamente da lei. Exemplos disso podem ser encontrados nas Filipinas (Lei de Padronização de Salários) ou na Letônia (Código do Trabalho). Em alguns casos, pisos salariais podem ser negociados para cima nos locais de trabalho, enquanto em outros os níveis salariais são previamente determinados, havendo pequeno espaço de manobra, em especial com relação aos baixos salários. Nos países nórdicos, os acordos nacionais têm sido importantes para estabelecer os princípios e padrões que devem ser atingidos nas negociações locais. Esta prática demonstrou favorecer a negociação pela igualdade (Dickens, 2000; Pilinger, 2000). Além disso, diferentes estruturas e sistemas de pagamento têm impacto diferenciado sobre a igualdade de remuneração, do mesmo modo que o grau de centralização da regulamentação e das negociações. No Reino Unido, a tendência rumo às negociações descentralizadas no setor público teve efeito negativo sobre a igualdade de remuneração, forçando os sindicatos a ter estratégias também descentralizadas. Assim, negociações descentralizadas podem ser prejudiciais à negociação da igualdade, pois tornam os sistemas de remuneração menos visíveis e
transparentes, colocando obstáculos à necessidade de padrões mínimos de igualdade (Rubery, 1998). A pesquisa da ISP mostra que formas tradicionais de determinação de salários podem ter efeito negativo sobre a igualdade de remuneração e que negociações individualizadas e descentralizadas dificultam a transparência dos sistemas e das estruturas de remuneração. Isso tem importantes implicações para as estratégias a serem desenvolvidas. A experiência dos sindicatos também mostra que fatores históricos e culturais têm grande influência sobre a fixação dos salários e benefícios. Por outro lado, as ações judiciais podem levar muito tempo, e pode ser caro para os sindicatos sustentá-las. Isso tem levado os sindicatos a reformular suas estratégias, no sentido de:
Avaliar melhor o valor dos empregos femininos por meio da avaliação de empregos ou de esquemas que aufiram o valor do trabalho, de modo a atacar os esquemas discriminatórios e revelar assunções ocultas feitas sobre o valor dos empregos e as habilidades dos homens e das mulheres. Atacar a segregação ocupacional nos locais onde as mulheres ficam confinadas em empregos com baixa remuneração, considerados femininos, por meio da avaliação e reclassificação de empregos e renivelamento salarial. Trabalhar a questão dos salários mínimos. O nível no qual este é fixado pode ter impacto significativo na igualdade de remuneração, porque as mulheres têm maior probabilidade de ocupar os níveis mais baixos. Fixar um salário que ao menos garanta a sobrevivência é, portanto, de vital importância para as estratégias ligadas à igualdade de remuneração. Promover negociações de igualdade e questionar negociações entre empregadores e sindicatos que ignorem o fato de que o processo de negociação coletiva é extremamente marcado pela questão de gênero. Considerar a influência das políticas de jornada de trabalho na igualdade de oportunidades, assegurando que as mulheres tenham acesso aos empregos que exigem jornada mais longa, políticas de assistência à família, horário flexível e uma distribuição mais eqüitativa das horas de trabalho entre mulheres e homens. Nas situações em que as mulheres trabalham em tempo parcial devido à ausência de creches
A pesquisa da ISP revela que há várias estratégias que são utilizadas pelos sindicatos em sua luta pela igualdade de remuneração. As principais são:
RECOMENDAÇÕES E ESTRATÉGIAS FUTURAS PARA A ISP E SUAS FILIADAS
Há um grande número de questões estratégicas que a ISP e suas filiadas precisam atacar para que se atinja a igualdade de remuneração. Estas recomendações são baseadas na pesquisa feita nos países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Ações judiciais; Inserção e priorização da questão nas negociações coletivas; Avaliação de empregos e de valor do trabalho; Estabelecimento de pisos salariais e salários que permitam viver dignamente.
a) Além disso, os sindicatos desenvolvem campanhas, capacitação técnica, treinamento e uma variedade de recursos para atingir a igualdade de remuneração. Na prática, nenhum sindicato se utiliza exclusivamente de uma dessas estratégias, e em muitos casos acabam combinando todas elas. A AFSCME, por exemplo, defende que as estratégias para obtenção de pagamento justo pode tomar vários caminhos, dentre eles: eliminação dos níveis mais baixos da estrutura, elaboração de estudos sobre igualdade de remuneração, avaliação de empregos, negociação de aumentos pontuais, campanhas por salários dignos, organização das mulheres, defesa do Fair Pay Act e do Paycheck Fairness Acts, aprovação de legislação local ou nacional sobre o assunto e monitoramento regular das desigualdades salariais. Muitos sindicatos relatam que consideram a negociação coletiva como o principal processo, mas que ela precisa ser respaldada pela ameaça de ações judiciais e por avaliação de empregos ou esquemas de valor de trabalho. Cada vez mais os sindicatos entendem que as auditorias e avaliação de empregos sem viés de gênero são de grande importância para revelar desigualdades, e podem também ser usadas nas
b)
Os sindicatos precisam desenvolver estratégias que tenham um foco claramente definido. Surge a questão sobre como combinar adequadamente políticas de igualdade com as que tentam resolver os problemas dos baixos salários. Isso significa reconciliar o objetivo da igualdade entre mulheres e homens com o das campanhas por salários suficientes para a sobrevivência, uma vez que os dois problemas partem de abordagens distintas. Uma consideração ainda mais importante é a maneira pela qual raça, classe, gênero e outros tipos de discriminação se relacionam e o modo como as múltiplas formas de discriminação incidem nas estratégias pela igualdade de remuneração. Em particular, é preciso dar maior atenção ao desenvolvimento de estratégias para combater a discriminação racial, em particular a “racialização” das desigualdades de remuneração. Um problema chave enfrentado pelos sindicatos do serviço público, particularmente nos países em desenvolvimento, é o acesso a estatísticas precisas sobre a determinação dos salários por gênero e classificação. Uma grande barreira à implementação das estratégias de igualdade de remuneração é a ausência de estatísticas e indicadores de remuneração que meçam as
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ESTRATÉGIAS SINDICAIS E ABORDAGENS DA QUESTÃO DA IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO NO SETOR PÚBLICO
negociações. Cada vez mais os sindicatos estão incorporando políticas e estratégias de gender mainstreaming e desenvolvendo análises baseadas no gênero. Isso torna necessária a coleta de dados, o questionamento de estereótipos e a compreensão de como os fatores sociais, econômicos, políticos e culturais influem na questão da igualdade de remuneração. À medida que os sindicatos adotam estratégias de gender mainstreaming, o impacto potencial sobre as negociações aumenta, particularmente assegurando que as mudanças nos sistemas de remuneração e salários sejam avaliados e analisados em termos de suas conseqüências para mulheres e homens.
ou outros auxílios, torna-se mais difícil atingir a igualdade de remuneração, simplesmente porque as mulheres são obrigadas a trabalhar menos horas do que os homens. Atacar a falta de fundos no setor público para resolver a questão da diferenciação salarial, lutar por alocação de montantes específicos para este fim e questionar a destinação de poucas verbas aos serviços públicos.
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c)
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d)
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desigualdades. Um grande desafio é fazer com que os salários das mulheres e dos homens sejam mais visíveis e transparentes, considerando-se inclusive as diferenças entre os níveis salariais dos empregos de tempo parcial e dos de tempo integral. Nos locais de trabalho a ausência de dados dos empregados precisa ser resolvida, incluindo-se dados sobre níveis salariais de diferentes grupos de empregados em diferentes ocupações, de modo a tornar os sistemas de remuneração transparentes e para possibilitar a realização de auditorias e esquemas de avaliação. Como as mulheres estão concentradas em empregos considerados “femininos” e em tempo parcial, há necessidade de agir nessas duas frentes. As estratégias de igualdade de remuneração se dirigem a todos os fatores que contribuem para a desigualdade, incluindo jornada de trabalho e emprego de tempo parcial, classificações de habilidades, sistemas de negociação de salários, e aprendizado em geral (treinamento e experiência de vida). Além disso, a igualdade de remuneração está indissociavelmente ligada à segregação ocupacional vertical e à divisão desigual das responsabilidades domésticas e com o cuidado de crianças. Isto significa que questões como jornada de trabalho e poucas horas de trabalho são centrais para a igualdade de remuneração. Um outro fator chave é a capacidade dos sindicatos, por si próprios, enfrentarem a questão. Isto requer uma enorme mudança em sua organização, nos processos de tomada de decisão e nos sistemas de recrutamento, de modo que sejam mais representativos das mulheres, seja nas estruturas de poder seja nas atividades políticas e de negociação coletiva. Isto é igualmente importante para os países desenvolvidos e em desenvolvimento, onde o recrutamento de mulheres para os sindicatos e, no seu interior, o acesso a posições de comando são necessários para assegurar que estejam diretamente envolvidas na formulação de políticas e nas equipes de negociação coletiva. Só assim as políticas de igualdade se tornarão centrais para os sindicatos. Há necessidade de treinamento específico sobre processos de negociação coletiva para os membros dos sindicatos e assessores, com ênfase em como fazer da igualdade de remuneração uma questão central. Em alguns
f)
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países isso pode exigir treinamento que ajude a criar as estruturas de negociação coletiva, enquanto em outros o treinamento deve ser dirigido a fazer com que as equipes compreendam como a igualdade de remuneração pode vir a ter função central, integrada e enfatizada em todas as negociações. Será importante, para a ISP e suas filiadas, pressionar a OIT para reforçar sua assistência técnica a fim de promover a ratificação de suas convenções, em especial as de nº 100 e 111. Governos, organizações do setor público, empregadores e sindicatos poderiam trabalhar mais próximos à mídia de modo a fornecer informações e fazer crescer a preocupação com a igualdade de remuneração. Campanhas de sensibilização e informação sobre a igualdade entre os sexos e igualdade de remuneração também são necessárias, com a participação de sindicatos, governos e legisladores. Uma sugestão é que essas questões sejam incorporadas a todos os recursos de treinamento da ISP. A OIT pode ajudar a superar alguns dos maiores problemas associados à ausência de dados e indicadores sobre igualdade de remuneração, fornecendo assistência técnica aos Ministérios do Trabalho, empregadores e sindicatos sobre como coletar dados e elaborar estatísticas. Isto poderia ser um objetivo para os países em desenvolvimento que não possuem sistemas de monitoramento adequados sobre igualdade de remuneração. O financiamento das estratégias e campanhas sobre igualdade de remuneração é outro ponto que merece atenção, já que um grande número de sindicatos têm recursos e fundos limitados. Em alguns casos as campanhas podem resultar de uma reorientação das verbas existentes, por exemplo, realocando verbas destinadas a publicidade, negociação coletiva, fins organizacionais e de recrutamento. Em outros casos podem ser necessários fundos para publicações específicas, eventos, conferências e ações. A ISP pode fornecer suporte através do Pacote de Recursos e pelo seu programa de educação e treinamento. Isso inclui a necessidade de programas de treinamento e capacitação dirigidos para a questão. Finalmente, é preciso atentar aos problemas específicos dos países em desenvolvimento,
Desenvolvimento organizacional, mostrando como criar estruturas que considerem as mulheres e como melhorar a capacidade formativa dos sindicatos; Usar a igualdade de remuneração como uma motivação para organizar as mulheres trabalhadoras; Programas formativos e de capacitação, com foco na igualdade de remuneração e no convencimento dos homens e das mulheres dos sindicatos; isto, tanto quanto o treinamento em avaliação de empregos e habilidades de negociação, pode aumentar a preocupação com a questão. Desenvolvimento de habilidades de negociação em igualdade de remuneração, de modo a assegurar que ela se torne questão estratégica nas negociações; Construção de alianças e trabalho conjunto com outros sindicatos, organizações de mulheres, ONGs, instituições acadêmicas e de governo, de modo a ampliar o debate sobre igualdade de remuneração e obter recursos. Intervenções políticas e atividades de lobby, nacional e internacionalmente.
O PACOTE DE RECURSOS DA ISP O Pacote de Recursos será desenvolvido para dar suporte à Campanha da ISP sobre igualdade de remuneração. O objetivo é fornecer ferramentas práticas, recursos e informações sobre como desenvolver a igualdade de remuneração por meio de campanhas, ações judiciais e sistemas de negociação coletiva que sejam aplicáveis aos países desenvolvidos e em desenvolvimento. A abordagem deve ser pró-ativa e prática. Uma questão chave é como a igualdade de remuneração pode ser colocada no centro das políticas sindicais e das negociações coletivas. Na pesquisa apresentada um certo número de estratégias foi explorado e alguns dos recursos e
ferramentas desenvolvidos pelos sindicatos podem ser aplicados, adaptados e usados no pacote. Os aspectos que se sugere incluir são:
Definição de igualdade de remuneração. De onde vem a desigualdade? Esta seção explorará os diferentes aspectos da igualdade de remuneração: igualdade de remuneração para trabalho igual, igualdade de remuneração para trabalho de igual valor/de valor comparável, salários que garantam a sobrevivência e remoção dos baixos níveis de salários. Também incluirá uma discussão sobre as principais causas das desigualdades de remuneração. Serão dados exemplos sobre como a questão da igualdade de remuneração foi enfrentada pelos sindicatos de diferentes setores.
Legitimando a igualdade de remuneração Esta seção irá explorar os argumentos favoráveis à igualdade de remuneração, inclusive com dicas sobre como os sindicatos podem persuadir empregadores e governos sobre os benefícios ao emprego, organizacionais, econômicos, sociais e políticos de sua implantação.
Atividades voltadas para o crescimento da preocupação com o assunto Estas atividades serão desenvolvidas para tornar maior a preocupação com a questão, como parte integrante da luta pela igualdade entre os sexos. Deverão destacar o papel da igualdade de remuneração como uma função central dos sindicatos e a sua natureza multifacetada.
Estratégias para atingir a igualdade de remuneração Esta seção trará os vários exemplos e experiências de diferentes formas de luta para atingir a igualdade de remuneração, incluindo:
Uma relação de aspectos a serem destacados para que a discriminação não contamine as negociações coletivas; Uma relação de objetivos a serem buscados quando das negociações coletivas; Um guia sobre como efetivar uma revisão de remuneração no local de trabalho, sob o foco da igualdade de remuneração.
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nos quais a questão passa pelo empenho para que as mulheres ocupem posições de comando, por campanhas de educação participativa e pela disponibilização de recursos e especialistas para auxiliar os sindicatos na compreensão e no desenvolvimento de estratégias de igualdade de remuneração. Questões que podem estar incluídas:
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Planos de ação: internamente aos sindicatos e externamente nos locais de trabalho
Como completar estatísticas e indicadores
Esta seção tratará de revisões de remuneração com foco na igualdade de remuneração e respectivos planos de ação, trazendo as experiências bem sucedidas de diferentes países. Fará sugestões práticas sobre como realizar a revisão e como elaborar um plano de ação.
Um guia para as estatísticas que existem na Europa, e internacionalmente, e suas limitações. O que as estatísticas devem incluir? Como podem ser feitas? Que argumentos precisam ser apresentados para que empregadores e governos participem de sua elaboração? Que tipos de indicadores podem ser usados para monitorar a igualdade de remuneração?
Lobby por mudanças legislativas Esta seção apresentará uma variedade de modelos de ação voltados à implementação da legislação sobre igualdade de remuneração. Focalizará particularmente o modo como a legislações nacionais podem ser desenvolvidas. Poder-se-á elaborar um guia e uma relação de questões que os sindicatos podem suscitar aos políticos de seus países.
Avaliação de empregos Um pequeno guia e idéias gerais sobre os tipos de questões que devem ser objeto da avaliação de empregos ou esquemas de valor de trabalho, de modo que estejam livres do viés de gênero e sejam não-discriminatórios. Um modelo será apresentado.
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Salários de sobrevivência
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Incluirá informações com destaque para a necessidade de integração das questões de raça e gênero quando das campanhas por salários de sobrevivência. Esta seção também tratará das diferentes experiências e abordagens que podem ser adotadas nestas campanhas. Serão privilegiadas informações práticas sobre os argumentos favoráveis à introdução de salários de sobrevivência, além de guias para seu cálculo.
Treinamento para a igualdade de remuneração Linhas gerais dos módulos de treinamento, incluindo quais os aspectos a serem tratados e como dar início ao processo. Também incluirá como fazer uma ação judicial requerendo a igualdade de remuneração, como garantir sua inserção e priorização nas negociações coletivas, como auditála, como desenvolver uma campanha e quais argumentos em favor da igualdade de remuneração podem ser apresentados a empregadores e governos.
Fazendo campanhas pela igualdade de remuneração Guia para desenvolver, organizar e colocar em prática uma campanha para organizar as mulheres trabalhadoras usando a igualdade de remuneração como principal foco. Trará experiências de campanhas existentes em vários sindicatos. Elaborando uma política de igualdade de remuneração para os sindicatos, locais de trabalho ou setores econômicos Um guia sobre como elaborar uma política de igualdade de remuneração com informação sobre os aspectos a serem incluídos e quem envolver.
IGUALDADE DE OPORTUNIDADES NA VIDA, NO TRABALHO E NO MOVIMENTO SINDICAL Participação das mulheres no mercado de trabalho no Brasil e diferenciais de remuneração
Maria Ednalva Bezerra de Lima Coordenadora da Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora – CNMT/CUT
Waldeli P. Melleiro
Brasil assistiu, a partir da década de 80, um ingresso cada vez maior das mulheres no mercado de trabalho. Em 1999, as mulheres eram 51,6% da população e constituíam 41,4% do mercado de trabalho.
Assessora da CNMT/CUT
Economicamente ativas Ocupadas Desocupadas Não economicamente ativas Total
Homens
%
Mulheres
%
TOTAL
46.480.921 42.813.014 3.667.907
58,6 59,7 48,0
32.834.366 28.863.205 3.971.161
41,4 40,3 52,0
79.315.287 71.676.219 7.639.068
16.517.698 63.019.733
32,6 48,5
34.219.343 67.076.057
67,4 51,6
50.737.041 130.052.328
Fonte: IBGE/PNAD-1999
Porém, a significativa participação das mulheres no mercado de trabalho vem acompanhada de uma maior taxa de desemprego, que atinge proporcionalmente mais às mulheres (12%) do que aos homens (7,9%). Elas possuem, em média, 4 anos a mais de escolaridade do que os homens (11 anos e 7 anos, respectivamente) e são responsáveis pelo sustento de quase 1/3 (um terço) das famílias no Brasil. Entretanto, em matéria de remuneração, as desigualdades entre os sexos são ainda muito grandes.
Distribuição das pessoas com 10 anos ou mais de idade, segundo o sexo e a classe de rendimento mensal, em salários mínimos (SM) – 1999 Homens Mulheres Total 14,6 18,2 16,4 até 1 SM 16,1 11,5 13,7 Mais de 1 a 2 SM 12,4 6,8 9,5 Mais de 2 a 3 SM 10,4 4,7 7,5 Mais de 3 a 5 SM 9,3 4,3 6,7 Mais de 5 a 10 SM 4,2 1,8 3 Mais de 10 a 20 SM 2,5 0,7 1,6 Mais de 20 SM 29,2 51,4 40,6 Sem rendimento (*) 1,3 0,6 0,9 Sem declaração * Inclusive as pessoas que receberam somente em benefícios Fonte: IBGE/PNAD-1999
Igualdade de oportunidades na vida, no trabalho e no movimento sindical
Pessoas com 10 anos ou mais de idade, segundo o sexo e a condição de atividade – 1999
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No Brasil há uma forte concentração de renda e os rendimentos dos trabalhadores são, de forma geral, bastante baixos. Porém em todas as faixas de remuneração há uma grande disparidade entre os
sexos, com clara desvantagem para as mulheres. Segundo a PED/Dieese, de 2001, o rendimento médio das mulheres é cerca de 35% inferior ao dos homens.
Rendimento médio mensal em salários mínimos das pessoas com 10 anos ou mais de idade, por Grandes Regiões, segundo o sexo – 1999 Homens
Mulheres
Total
2,4 1,8 4,0 3,7 3,5 3,2
1,2 0,9 1,8 1,6 1,5 1,4
1,8 1,3 2,8 2,6 2,5 2,3
Norte urbana Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Média nacional
Fonte: IBGE/PNAD-1999
Igualdade de oportunidades na vida, no trabalho e no movimento sindical
As desigualdades de remuneração se agravam quando comparadas, simultaneamente, as variáveis de sexo e cor: 23% da população brasileira é composta de mulheres negras (pretas e pardas), e estas são 44% da população feminina. As famílias
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chefiadas por elas são as mais pobres e as mulheres negras chegam a receber rendimentos 55% menores do que as mulheres brancas (IBGE/PNAD 1999), o que demonstra a existência de uma forte hierarquia na remuneração da força de trabalho.
Índice do rendimento médio mensal segundo raça e sexo (em R$ de junho de 2001) (tomando-se por base o rendimento médio mensal do homem não negro=100,0) Regiões Metropolitanas
Mulheres negras
Homens negros
Mulheres não-negras
Homens não-negros
São Paulo Salvador Recife Distrito Federal Belo Horizonte Porto Alegre
46,0 44,1 43,1 33,5 29,2 35,5
78,3 65,9 62,3 53,2 46,7 53,6
63,4 67,5 70,7 62,8 59,6 62,2
100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
Fonte: Boletim DIEESE – Edição Especial – Novembro de 2001. “20 de Novembro – Dia Nacional da Consciência Negra” OBS: Raça negra: pretos e pardos; raça não-negra: brancos e amarelos.
O Brasil ratificou a Convenção nº 100 da OIT em 1957, e no âmbito nacional a proibição da discriminação por motivo de sexo está consagrada na Constituição Federal e na CLT – Consolidação das Leis do Trabalho. A atual Constituição Federal foi promulgada em 1988, no período de redemocratização do país, e contou com ativo processo de mobilização da sociedade e dos movimentos sociais também de mulheres, principalmente através das Emendas Populares, o que possibilitou inúmeros avanços em relação à garantia de direitos. A seguir destacamos os principais artigos relacionados à igualdade de direitos das mulheres, à proibição de discriminação e à contratação de funcionários públicos.
aspectos do mundo do trabalho. Define princípios fundamentais e normas legais, estabelecendo termos para contratação, condições de trabalho e para a resolução de conflitos entre trabalhadores e empregadores. Destacamos a seguir alguns artigos. Art 373º A - Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado: I-
II Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV -
promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, (...) nos termos seguintes: I-
homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.”
Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: IV -
salário mínimo, fixado em lei, nacional e unificado, capaz de atender as suas necessidades vitais básicas e as de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil. A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, datada de 1943, sistematiza a legislação trabalhista brasileira e fornece orientações em diversos
III -
publicar ou fazer publicar anúncio de emprego no qual haja referência ao sexo, à idade, à cor ou situação familiar, salvo quando a natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir; recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez, salvo quando a natureza da atividade seja notória e publicamente incompatível; considerar o sexo, a idade, a cor ou a situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidade de ascensão profissional; (...)
Art. 461o - Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade. § 1o - Trabalho de igual valor, para os fins deste capítulo, será o que for feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de serviço não for superior a dois anos.
Iniciativas desenvolvidas pela CNMT/CUT em relação à igualdade de remuneração Em que pese a existência de uma legislação nacional que proíba diferenças de tratamento, de oportunidades e de remuneração entre homens e mulheres, esta tem sido insuficiente para reverter o quadro de desigualdades entre os sexos no mundo do trabalho e também em outras esferas sociais, como por exemplo na representação política. Mesmo com o grande crescimento da participação das
Igualdade de oportunidades na vida, no trabalho e no movimento sindical
A legislação nacional para garantia da igualdade de remuneração
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mulheres no mercado de trabalho, o aumento de sua importância econômica (também na responsabilidade pelo sustento da família) e o seu destaque profissional em vários setores, a sociedade brasileira ainda revela fortes traços do modelo patriarcal. Não são raras as situações de discriminação e de opressão às mulheres, como a violência, inclusive doméstica, o assédio sexual, etc.
Igualdade de oportunidades na vida, no trabalho e no movimento sindical
A esfera do trabalho, ao mesmo tempo que reflete valores sociais que atribuem um papel secundário às mulheres, contribui para a reprodução desses valores e das chamadas “imagens de gênero”, o que pode ser observado através da divisão sexual do trabalho/segmentação ocupacional, das barreiras ao acesso, permanência e promoção no emprego, das menores possibilidades de acesso à qualificação profissional e de ascensão profissional, dentre outras. Tais desigualdades de tratamento e de oportunidades contribuem, também, para a existência de diferenciais de remuneração entre homens e mulheres.
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No Brasil, dada a sua história de colonização marcada por um passado de escravismo da população de origem africana, os princípios de igualdade tornam-se ainda mais distantes quando se trata das mulheres negras. A discriminação de sexo se mescla com a discriminação de cor e aprofunda a exclusão dessa parcela significativa da sociedade brasileira. Diante dessa realidade, reverter a discriminação em relação às mulheres no Brasil passa, necessariamente, por uma intervenção articulada que considere simultaneamente as dimensões de gênero e de identidade/origem étnico-racial. Com vistas a contribuir para a superação das diversas formas de discriminação das mulheres – na sociedade, na esfera do trabalho e também no sindicalismo, a Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora da CUT vem desenvolvendo, desde 1995, a Campanha “Cidadania: igualdade de oportunidades na vida, no trabalho e no movimento sindical”.
buscou-se uma “linguagem” que se direcionasse também às mulheres, através de slogans diferenciados: “fique sócia” e “fique sócio”. Outro eixo de ação desenvolvido foi a produção de subsídios para os sindicatos filiados com vistas à inclusão de cláusulas, nos acordos e convenções coletivas, de proteção e valorização do trabalho feminino. Como resultado, foi elaborada uma minuta padrão de reivindicações com propostas de cláusulas para orientar os processos de negociação coletiva. Num segundo momento desta campanha, a ênfase foi em relação aos processos de reestruturação produtiva, buscando apreender os seus impactos e conseqüências para o trabalho das mulheres, articulando-os com os processos de formação profissional. Como resultado, elaborouse um conjunto de propostas com vistas a garantir a participação das mulheres nos programas de qualificação profissional e a incluir a dimensão de gênero na abordagem desses programas. Em junho de 2000, o 5º Encontro Nacional sobre a Mulher Trabalhadora, reafirmou como estratégia a campanha pela igualdade de oportunidades e atualizou seus eixos de ação para o período 2001/2003. São eles: 1. Combate a todas as formas de discriminação no mundo do trabalho e no movimento sindical:
Convenções da OIT sobre Igualdade de remuneração (nº 100), Proteção social da maternidade (nº 103/183) , Responsabilidades familiares (nº 156) e Proibição de todas as formas de discriminação (nº 111). Negociação coletiva Direitos sociais e trabalhistas Orientação sexual Trabalho doméstico Emprego e renda. 2. Intervenção nas políticas públicas:
Inicialmente, a campanha teve como um de seus eixos prioritários a organização e participação das mulheres no próprio movimento sindical, nas instâncias da CUT e nos seus sindicatos filiados, através da implantação das quotas de gênero nas direções executivas (no mínimo 30% de participação de cada um dos sexos) e da intervenção nas campanhas de sindicalização da CUT. Para isso
Maternidade como função social (amamentação e paternidade responsável) Violência contra a mulher Descriminalização e legalização do aborto Planejamento familiar Saúde da mulher trabalhadora Formação profissional/reestruturação produtiva
Desenvolvimento de parceria com o
3. Organização das mulheres na CUT:
Consolidação das comissões estaduais sobre a mulher trabalhadora Forma de organização das mulheres na CUT Formação política e sindical das mulheres Ações afirmativas
4. Fortalecimento da interface com todas as políticas e projetos da CUT. 5. Fortalecimento da interface com o movimento sindical internacional, movimentos sociais e ONGs na defesa dos direitos das mulheres trabalhadoras. As iniciativas desenvolvidas (e ainda em curso) sobre a igualdade de remuneração, que ganharam destaque a partir do 5º Encontro Nacional, são relatadas a seguir. Elas pretendem sensibilizar o sindicalismo e a sociedade para o problema da desigualdade de remuneração e, principalmente, elaborar estratégias que garantam a aplicação da Convenção nº 100 da OIT e promovam a efetiva igualdade de remuneração entre homens e mulheres.
Boletim “salário igual para trabalho de igual valor: pela aplicação da Convenção nº 100 da OIT”. Com o objetivo de informar e divulgar a existência de diferenciais de remuneração, sensibilizando homens e mulheres para esse problema, esse boletim foi lançado em outubro de 2000. Buscando envolver também outros movimentos sociais e dar visibilidade a essa questão, seu lançamento ocorreu durante as manifestações da Marcha Mundial de Mulheres. Propõe-se, então, as seguintes ações:
Realizar uma campanha nacional pela aplicação da Convenção nº 100 da OIT. Incluir, nas convenções e acordos coletivos, cláusulas que garantam a não discriminação de sexo/cor na remuneração. Envolver outros atores sociais na luta pela promoção da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, em especial no acesso ao emprego e à qualificação profissional. Elaborar um diagnóstico da situação salarial e dos diferenciais de remuneração entre mulheres e homens, brancos/as e negros/as nos diversos setores profissionais.
Observatório Social, formalizando uma cooperação técnica e política na temática de gênero. Tem o objetivo de contribuir no aprimoramento das pesquisas para verificação do cumprimento dos direitos fundamentais do trabalho por parte das empresas, incorporando o enfoque de gênero, e identificar possibilidades de ação sindical nesse tema. Iniciada em abril de 2000, as principais atividades desenvolvidas no âmbito desta cooperação foram:
Realização de um estudo temático acerca da Convenção nº 100, buscando resumir o percurso da temática “Salário igual para trabalho de igual valor” e construir indicadores que pudessem evidenciar/comprovar a diferença de remuneração nas empresas por motivo de sexo. Realização de oficina técnica com pesquisadores para apresentação do enfoque de gênero como subsídio para análise das pesquisas. Acompanhamento dos relatórios técnicos de observação nas empresas, com sugestões de fontes de informação, metodologia e instrumentos para as pesquisas.
Desafios em relação à garantia da igualdade de remuneração Um primeiro desafio é sensibilizar o próprio movimento sindical para a inclusão desse tema de forma prioritária na agenda e nas ações sindicais. O sindicalismo continua sendo um espaço predominantemente masculino que, em parte, reproduz valores culturais que atribuem papéis e lugares diferentes para homens e mulheres. Convencer homens e mulheres trabalhadoras da importância e da contribuição do trabalho feminino para o desenvolvimento sócio-econômico constitui-se também num outro desafio. Para isso, é importante desmistificar idéias que colocam o trabalho feminino como secundário e com menor responsabilidade social, ou apenas como complementar ao orçamento familiar (uma vez que caberia aos homens a responsabilidade pelo sustento da família). A negociação de cláusulas nos acordos e convenções coletivas que efetivem o cumprimento da igualdade de remuneração, de tratamento e de oportunidades tem se colocado também como
Igualdade de oportunidades na vida, no trabalho e no movimento sindical
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uma dificuldade. Mesmo quando essa questão é incluída nas pautas de reivindicações dos trabalhadores, não há garantias de sua efetiva negociação. Em geral, as mulheres não estão presentes nas mesas de negociação e este tema, ou não é considerado prioritário no processo de negociação ou não é suficientemente “defendido” e argumentado pelos sindicalistas envolvidos no processo. Essa dificuldade tem sido agravada pelo contexto de alto índice de desemprego no país e pelas tentativas de flexibilização de direitos, o que tem feito com que a agenda prioritária do sindicalismo seja a luta pela manutenção do emprego e pela preservação de direitos trabalhistas básicos garantidos em lei.
Igualdade de oportunidades na vida, no trabalho e no movimento sindical
Em relação às pesquisas em curso, que poderiam evidenciar/comprovar a desigualdade de remuneração bem como oferecer dados e
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argumentos para os processos de negociação, a dificuldade tem sido a construção de indicadores específicos e suficientes para verificação desses diferenciais. O que se tem conseguido verificar é a utilização de critérios “subjetivos” por parte das empresas para promoção no emprego, devido à ausência de políticas claras de seleção e de planos de cargos e salários, e a existência de uma segmentação ocupacional das mulheres – sua concentração nos postos de trabalho com menor remuneração e, por vezes em ocupações onde não há possibilidade de comparação com os homens, e sua menor presença nos postos de chefia e melhor remunerados. Tais fatores, sem dúvida, implicam na desigualdade de remuneração entre homens e mulheres, mas demonstram sobretudo a desigualdade de tratamento e de oportunidades entre os sexos.
IGUALDADE DE OPORTUNIDADES COMO EIXO DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA
Secretária de Políticas Sociais da CNB/CUT e Presidenta do INSPIR – Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial
introdução da temática da igualdade de oportunidades como um dos eixos da campanha salarial para a negociação coletiva na categoria bancária traduz o esforço que os sindicalistas vêm fazendo para que gênero, raça/cor, orientação sexual, e outras marcas superficiais de identidade não continuem sendo utilizadas de forma discriminatória na distribuição de renda, bens, equipamentos sociais, de direitos e oportunidades. Essa iniciativa na categoria bancária teve início há alguns anos, e os resultados começam a aparecer de forma lenta, porém consistente. Para se falar do ano 1999, quando esse tema virou eixo de campanha, e ter minimamente idéia da construção de uma conquista histórica, precisamos entrar no túnel do tempo. O grande desafio colocado para o movimento sindical em geral, tem sido o de introduzir nas negociações coletivas a temática da igualdade de oportunidades, de modo a conciliar reivindicação de caráter econômico com uma ação voltada para a cidadania, que a rigor não se descola de aumento na renda. A estratégia que a categoria bancária vem desenvolvendo vai para além da igualdade de remuneração, visando também a ascensão profissional e a igualdade de oportunidades. O novo modelo de organização do trabalho tem propiciado um aumento da presença feminina na categoria. De 38% nos anos 80, passamos para 45% no início dos anos 90, e neste início de século as mulheres são 47% da categoria. O mesmo ocorre com a presença de negros e negras: se antes não chegavam a 1% da categoria, no início dos anos 90 passaram a ser 4%, e hoje representam 10% da categoria. Pesquisa do IADES, entre julho e dezembro de 1992, no Estado de São Paulo, demonstrou que
nos bancos privados de capital nacional a presença feminina era de 44,2%, nos de capital estrangeiro era de 34,8% e nos bancos federais em torno de 37%. A exceção ficava por conta dos bancos estaduais, onde a presença feminina sempre esteve em torno de 60%. Hoje a realidade é outra. Em alguns bancos como Itaú, a presença feminina é de 53%. No BBV, um banco estrangeiro, as mulheres que eram 41%, hoje são 47,54%. Essa presença em massa de mulheres deve-se às transformações no sistema financeiro, como a terceirização, etc. No ano de 1992, no Estado de São Paulo, 78,2% das bancárias eram sindicalizadas. A cada 100 bancários, 45 eram mulheres e, entre essas, 34 eram sindicalizadas. Não havia diferença substancial entre mulheres e homens sindicalizados. Hoje a realidade também mudou: as mulheres em nível nacional representam 51,4% das sindicalizações, embora sejam 47% da categoria. A pesquisa demonstrou, e ainda hoje continua sendo verdade, que as mulheres possuem um nível de escolaridade maior que os homens. E que 70% das mulheres participavam com seu salário na composição da renda familiar. E ainda, que 51,6% tinham dupla jornada. Essa pesquisa feita no Estado de São Paulo, com o recorte de gênero, foi a primeira realizada na categoria, servindo como parâmetro para as discussões específicas e possibilitando, mais tarde, no ano de 1996, que a CNB – Confederação Nacional dos Bancários, contratasse o Data Folha para realizar uma pesquisa nacional. Desta pesquisa, entre outros dados, pudemos concluir que a realidade das condições de trabalho, principalmente da mobilidade, de mulheres e negros continuavam as mesmas. Neste sentido, o primeiro registro de debate sobre uma Convenção da OIT acerca da discriminação na categoria bancária, que se tem notícia, foi no ano de 1992, num encontro nacional realizado na cidade do Rio de Janeiro. O debate aconteceu em torno da
Igualdade de oportunidades como eixo da negociação coletiva
Neide Aparecida Fonseca
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Convenção nº 111, logo após a CUT ter feito um relatório à OIT sobre seu descumprimento, e de uma campanha pela implementação da Convenção nº 111, que teria início ainda naquele ano.
Igualdade de oportunidades como eixo da negociação coletiva
No relatório da CUT entregue à OIT constavam dados do Dieese e de órgãos do próprio governo, como o IBGE, que demonstravam de modo inequívoco as discriminações de gênero e raça no mercado de trabalho, e que a falta de “igualdade de oportunidades” tanto para as mulheres como para negros e negras influenciava negativamente no ingresso, ascensão, promoção, qualificação, etc. Naquele mesmo encontro discutimos ainda a questão do assédio sexual. Porém se tratou de um ponto polêmico, com debates acalorados, e não se chegou a uma conclusão de cláusula naquele momento. Quanto à Convenção nº 111, embora fosse consenso a existência das discriminações, não houve uma proposta de cláusula específica. Aprovou-se, no entanto, que os sindicatos participassem da campanha pela sua implementação.
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A nossa responsabilidade tem sido desde então, em primeiro lugar, quebrar o silêncio em torno desta temática, pois muitos ainda desconhecem o impacto das discriminações no trabalho, e que as diferenças salariais baseadas em gênero e raça significam apropriação da riqueza de forma diferenciada, e sindicalistas não podem compactuar com a economia política da discriminação negativa. E em segundo lugar, preparar os sindicalistas para uma atuação articulada e contundente.
A Comissão de Gênero, Raça e Orientação Sexual – GROS Em 1994, reunimos um grupo de mulheres sindicalistas que desenvolviam trabalhos em seus estados sobre a questão de gênero, e nos articulamos com um documento próprio para o 1º Congresso da CNB, intitulado “A mulher bancária e o mercado de trabalho”. Estava plantada a semente do que mais tarde viria a se constituir em uma Comissão Nacional. O enfoque principal neste ano foi implementar as resoluções do 5º Congresso Nacional da CUT, principalmente no que diz respeito ao assédio sexual, às quotas de participação, e à constituição de comissões que tratassem da “igualdade de oportunidades no emprego e na ocupação”.
Três anos depois, no 2º Congresso da CNB, em junho de 1997, criamos a GROS - Comissão Nacional de Gênero, Raça e Orientação Sexual, que hoje é um dos mais importantes e bem organizados mecanismos de luta da categoria. Foi um avanço na organização das bancárias em todo o Brasil: ampliamos o debate para a discussão de gênero e incorporamos as temáticas de raça e orientação sexual. Demonstramos de forma inequívoca que o combate às discriminações é importante, principalmente quando a discriminação retira a titularidade de direitos e de oportunidades das pessoas. A partir da criação da comissão, as nossas campanhas salariais têm sido permeadas pelo debate da igualdade de oportunidades, sempre reivindicando na minuta, mesa paritária com a patronal (Fenaban), para discutir as discriminações baseados nas Convenções nº 100 e nº 111 da OIT, bem como a extensão do plano médico aos parceiros dos funcionários e funcionárias homossexuais e aos maridos das funcionárias. Até a campanha salarial de 1999/2000, não obtivemos êxito. Entretanto, após a campanha salarial de 1997, fizemos uma avaliação e vimos que era preciso, para dar certo, iniciar um processo de sensibilização dos dirigentes (homens e mulheres) para a temática. Neste sentido, em fevereiro de 1998, a GROS deu início a esse processo e promoveu uma campanha nacional de sindicalização específica, tendo como tema: “Nunca desista”. Foram realizadas várias atividades, tais como palestras, oficinas, agitações de rua e em agências bancárias. Sem contar com uma estrutura que desse suporte para realização de reuniões, a comunicação era feita via Internet, surgindo então, no site da CNB, os temas gênero e raça. Ainda em 1998, mais precisamente no mês de julho, a GROS realizou, em parceria com o Dieese e com a Secretaria de Formação da CNB, o seminário de sensibilização para negociação de cláusulas de gênero, raça e orientação sexual, na tentativa de subsidiar nossos negociadores na mesa de negociação. Levantamos os empecilhos e as ações necessárias para se pensar numa estratégia de manter essas questões na pauta de negociações. Um dos frutos dessa estratégia foi que, em 1999, dirigentes dos bancos Bradesco e HSBC deram enfoque de gênero em suas minutas específicas.
Intensificando a nossa organização e luta, no início de 2000, CNB e o Sindicato dos Bancários de São Paulo assinaram uma parceria com o FIG – Fundo de Gênero do Canadá, para a realização do Projeto “A categoria bancária rumo à construção de relações mais igualitárias no mundo do trabalho”. O projeto prevê três campanhas: igualdade de oportunidades; assédio sexual no local de trabalho e paternidade responsável. Em março de 2000 demos início à primeira fase da campanha: igualdade de oportunidades. O primeiro passo aconteceu em abril de 2000, com a realização de um seminário com a Executiva Nacional dos Bancários, Federações e Sindicatos, para apresentar o projeto, e fazer uma simulação de
negociação de cláusula sobre as Convenções nº 100 e nº 111. A campanha salarial de 2000 foi longa e complicada. Entretanto, demos um passo significativo na luta pela igualdade de oportunidades, ao contrário de 1999, quando embora o tema fosse um dos eixos, os banqueiros não admitiram debater alegando a sua inconstitucionalidade. Finalmente, no ano de 2000, acordamos a cláusula de nº 51, que sujeitava o debate da igualdade de oportunidades à apresentação, pela CNB, de pesquisa sobre a discriminação de gênero e raça na categoria. O mapa intitulado “Os rostos dos bancários – mapa de gênero e raça do setor bancário brasileiro”, foi elaborado pelo Dieese, que pesquisou seis regiões metropolitanas no período de janeiro de 1998 a julho de 2000. O desafio na próxima campanha salarial será conquistar a mesa temática permanente para debater, propor e acompanhar a implementação de ações afirmativas que eliminem a discriminação negativa por gênero, raça e orientação sexual na categoria bancária.
Igualdade de oportunidades como eixo da negociação coletiva
O nível de organização das mulheres da GROS fez com que no ano de 1999, durante a discussão de construção da minuta de reivindicações, a igualdade de oportunidades passasse a ser um dos eixos da campanha. Ou seja, este tema passou a ter o mesmo patamar de importância das reivindicações econômicas.
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CUSTOS DO TRABALHO DE HOMENS E MULHERES NA AMÉRICA LATINA: MITOS E REALIDADE Laís Abramo Especialista regional em temas de gênero para a América Latina
Custos do trabalho de homens e mulheres na América Latina: mitos e realidade
entrada massiva das mulheres no mercado de trabalho é um fato marcante das últimas três décadas, tanto no Brasil como no conjunto da América Latina. Esse movimento tem sido acompanhado por um significativo aumento tanto dos níveis de escolaridade das mulheres quanto da sua participação econômica, medida em termos da sua contribuição ao PIB (Produto Interno Bruto) e ao rendimento familiar.
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Os traços mais marcantes da evolução da participação feminina no mercado de trabalho na América Latina nos anos 90 são os seguintes. Em primeiro lugar, e confirmando a tendência já verificada nas décadas de 70 e 80, aumentam significativamente as taxas de participação (1) das mulheres (passando de 34% em 1990 a 45% em 1998). Também se observa um aumento significativo (e ainda mais acentuado) da taxa de participação das mulheres mais pobres, e isso é uma novidade em relação às décadas anteriores. A taxa de participação das mulheres mais pobres costuma ser significativamente inferior à das mulheres que provêm de famílias com rendimentos médios ou altos, devido a vários fatores: menores níveis de escolaridade e qualificação, maiores barreiras culturais para sair em busca de um trabalho remunerado, maiores dificuldades de contar com qualquer apoio ao cuidado infantil e às demais responsabilidades domésticas e familiares. Justamente por isso é tão importante o dado observado nos anos 90: o ritmo de incorporação das mulheres mais pobres ao mercado de trabalho foi mais intenso que aquele registrado para o conjunto da força de trabalho feminina (2). Consequentemente diminuem, nos anos 90, tanto as brechas de participação (3) entre homens
e mulheres como as brechas de participação entre as mulheres pobres e as demais. Em segundo lugar, aumentam, nos anos 90, as oportunidades de emprego para as mulheres. Em outras palavras, as mulheres ocuparam uma proporção relativamente maior dos postos de trabalho gerados na década. Nesse período, a sua taxa de ocupação (4) aumentou 4,1% ao ano, enquanto a dos homens aumentou 2,6% (OIT, 1999). Em terceiro lugar, aumenta a contribuição das mulheres aos rendimentos familiares. Essa contribuição é cada vez mais importante para que uma parcela significativa de famílias latinoamericanas consiga garantir a sua sobrevivência, superar a linha da pobreza ou melhorar as suas condições de vida. Entre 25% e 35% (a depender do país) de famílias latino-americanas são atualmente chefiadas por mulheres. Além disso, em 1/4 das famílias urbanas nas quais ambos os membros trabalham, as mulheres contribuem com 50% ou mais da renda total. Há pesquisas que comprovam que, no que se refere à utilização dos rendimentos do trabalho, aqueles obtidos pelas mulheres são fundamentais para romper o ciclo de reprodução inter-gerações da pobreza: uma maior proporção deles, se comparados aos rendimentos dos homens, se destinam a itens tão fundamentais quanto a saúde, educação e nutrição dos filhos (CEPAL, 1995). Por outro lado, aumenta a continuidade das trajetórias ocupacionais das mulheres. Aumenta a proporção delas que não se retira do mercado de trabalho quando tem filhos, e é justamente entre as mulheres em idade reprodutiva (e com filhos pequenos) que a participação laboral e econômica aumenta mais acentuadamente. A inserção das mulheres no mundo do trabalho continua marcada por fortes desigualdades. Sem dúvida, o principal aspecto negativo dos anos 90 foi o significativo aumento das taxas de desemprego feminino, assim como a ampliação da brecha de
Também se observa uma brecha de informalidade entre homens e mulheres no mercado de trabalho latino-americano (6). Isso significa que a porcentagem de mulheres ocupadas no setor informal sobre o total da ocupação feminina é superior a dos homens e aumentou nos anos 90. Em 1990, 41% da força de trabalho masculina e 49% da feminina estavam ocupadas no setor informal. Em 1998 essas cifras elevam-se, respectivamente para 45% e 52%. No entanto, o processo de informalização foi mais acentuado para os homens: 70 de cada 100 novos empregos masculinos gerados nos anos 90 foram informais. No caso das mulheres essa proporção foi de 54 (OIT, 1999). A brecha de rendimentos (7) entre homens e mulheres ainda é muito acentuada na América Latina. No final dos anos 90, as mulheres recebiam, em média, 64% do que recebiam os homens, configurando portanto uma brecha de 36%, que é bastante alta em termos internacionais. Na reprodução das desigualdades de gênero, que continuam sendo observadas no mercado de trabalho após três décadas de um aumento constante da participação feminina, incidem diversos fatores. Muitos deles de caráter estrutural, vinculados aos determinantes mais gerais de uma ordem de gênero e de uma divisão sexual do trabalho que têm um caráter muito arraigado na sociedade e que tendem a se reproduzir, inclusive em contextos de grandes transformações como o da atual reestruturação produtiva. Entre as características mais marcantes e permanentes dessa ordem de gênero, está uma distribuição muito desigual das tarefas reprodutivas e das responsabilidades familiares, que onera em muitos sentidos a mulher, em especial a mulher trabalhadora. Também influi significativamente o caráter das políticas públicas, a depender dos seus conteúdos, tanto na reprodução dessas desigualdades como nos avanços rumo à sua superação. Entre os elementos mais importantes das políticas públicas, que podem incidir em um ou outro
sentido no que se refere à promoção da equidade de gênero, estão as políticas de emprego e formação profissional, a legislação de proteção à maternidade e as políticas relativas ao cuidado infantil. Finalmente, as imagens de gênero sobre os homens e as mulheres no trabalho são também elementos poderosos na reprodução das desigualdades que continuam sendo observadas e vividas pelas mulheres trabalhadoras. Os estereótipos relativos aos homens e mulheres no trabalho, que em geral desvalorizam a mulher como trabalhadora, continuam tendo forte permanência, apesar de mudanças muito significativas que vem ocorrendo na realidade. Entre estes estereótipos (ou imagens de gênero) que mais contribuem à persistência e reprodução de distintas formas de discriminação contra a mulher estão aquele que define a mulher como uma “força de trabalho secundária” e aquele que afirma que os custos associados à sua contratação são superiores aos custos da mão de obra masculina. A discussão desse último tema é o objetivo principal desse artigo.
QUANTO CUSTAM AS MULHERES? É muito freqüente a idéia de que os custos da mão-de-obra feminina são superiores aos custos da mão-de-obra masculina, apesar de que, como já foi assinalado, suas remunerações são em média bastante inferiores. Essa idéia constitui uma importante barreira para as possibilidades de acesso das mulheres a mais e melhores empregos, assim como para um melhor aproveitamento das suas potencialidades como cidadãs e trabalhadoras e da sua contribuição ao desenvolvimento das empresas e da sociedade em geral. O argumento dominante, presente em muitos setores da sociedade, é que é mais caro empregar uma mulher devido aos custos indiretos associados à sua contratação, em particular aos dispositivos legais de proteção à maternidade e ao cuidado infantil. Outros problemas, relacionados às responsabilidades familiares que continuam sendo assumidas principalmente (quando não exclusivamente) pelas mulheres, são considerados também fatores adicionais de custos. Entre eles uma suposta maior taxa de absenteísmo, um menor compromisso com a empresa, uma menor
Custos do trabalho de homens e mulheres na América Latina: mitos e realidade
desemprego (5) entre homens e mulheres. Se, em 1990, a taxa de desemprego feminina era de 5% em média na América Latina, essa cifra se eleva a 13% no ano 2000 (OIT, 2000). Por outro lado, se em 1990 a taxa de desemprego das mulheres era 19% superior a dos homens, em 1998 passou a ser quase 50% superior (OIT, 1999).
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disponibilidade para trabalhar horas extras, turnos noturnos, viajar ou capacitar-se. Esse argumento pretende também justificar a desigualdade recorrente da remuneração das mulheres em comparação com a remuneração dos homens. Afirma-se, em muitos círculos, que os menores salários das mulheres em comparação com os dos homens não se devem à existência de qualquer tipo de discriminação, mas sim estariam relacionados à necessidade que as empresas têm de compensar o seu maior custo de contratação, decorrente das normas especiais que protegem o seu trabalho (especialmente a maternidade) e dos “problemas” causados pelas responsabilidades familiares, que continuam sendo assumidas principalmente pelas mulheres.
Custos do trabalho de homens e mulheres na América Latina: mitos e realidade
O grande problema é que essas noções (muito freqüentes entre aqueles que tomam as decisões de contratar ou não uma mulher, de promovê-la ou não, de investir ou não na sua formação técnica e profissional) não estão baseadas em cifras e estatísticas. Na América Latina, as cifras relativas aos custos do trabalho, às enfermidades e acidentes profissionais, às ausências e licenças, em geral não existem (ou não estão disponíveis) em forma desagregada por sexo.
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Visando produzir cifras e dados objetivos sobre os custos relacionados à contratação de homens e mulheres, a OIT decidiu realizar na América Latina uma pesquisa sobre esse tema. Os objetivos mais gerais dessa pesquisa foram definidos da seguinte forma: se, a partir dos seus resultados, se chegasse à conclusão de que os custos de contratação das mulheres não são superiores aos dos homens, estaríamos contribuindo a desfazer um mito que, como já se disse, tem grande importância na reprodução de uma série de desigualdades sofridas pelas mulheres no trabalho. Se se chegasse à conclusão de que esses custos são superiores e estão relacionados ao papel das mulheres na reprodução da sociedade, estaríamos contribuindo para o debate sobre a definição de políticas mais eqüitativas para enfrentar esse tema (o da reprodução social) que, evidentemente, não interessa apenas às mulheres, mas ao conjunto da sociedade. A pesquisa foi realizada durante os anos 19992001, em cinco países (Argentina, Brasil, Chile, México e Uruguai). Foram analisados os custos de
contratação dos assalariados de ambos sexos, excluindo o serviço doméstico. Utilizou-se, nessa pesquisa, as cifras oficiais (demográficas e ocupacionais) existentes em cada país e, quando disponíveis, registros relativos às licenças maternidade. Foram realizados também estudos de caso a nível das empresas e uma pesquisa especial no Chile, na qual foi aplicado um questionário a 135 empresas industriais, de comércio e serviços. Além dos custos salariais diretos dos assalariados e assalariadas, foram computados também os seus respectivos custos salariais indiretos (13º salário, férias e outras remunerações) e os seus custos não salariais (contribuições do empregador à seguridade social, custos relacionados à demissão e contratação, acidentes e enfermidades do trabalho). Especial atenção foi dada aos custos não salariais de proteção à maternidade e ao cuidado infantil. Para calcular esses custos foram considerados apenas aqueles advindos dos benefícios garantidos pelas legislações nacionais. Outros possíveis componentes de custos, derivados de processos de negociação coletiva ou de políticas especiais de recursos humanos adotadas por algumas empresas, não foram considerados nesta etapa do estudo. A metodologia utilizada foi basicamente a seguinte: o cálculo do custo anual de cada prestação foi resultado da multiplicação da freqüência esperada de casos no ano pela duração média de cada caso no ano e pelo custo monetário por caso ou período. O resultado desse cálculo foi relacionado com a massa salarial anual feminina (de trabalhadoras assalariadas registradas), com o objetivo de determinar a sua magnitude em relação a esse montante. Ou seja, com o objetivo de definir o custo adicional representado por essas prestações no caso de contratação de uma mulher. Foi computado apenas o custo adicional diretamente a cargo do empregador, referente às trabalhadoras registradas, que são as que têm direito a receber as prestações ou benefícios considerados nessa análise. Os resultados da pesquisa indicam que os custos monetários para o empregador relacionados à contratação das mulheres são muito reduzidos. Eles representam menos de 2% da remuneração bruta mensal das mulheres.
A licença-maternidade O primeiro elemento que costuma ser associado a um suposto “custo mais elevado” das mulheres em relação aos homens é a licença maternidade. Nos cinco países considerados na pesquisa, a licença maternidade tem uma duração que vai de 12 semanas (Argentina, México e Uruguai) a 18 (Chile). No Brasil a licença é de 16 semanas, e a nova Convenção da OIT de Proteção à Maternidade (número 183, aprovada no ano 2000), estabelece que a licença maternidade deve ser de, no mínimo, 14 semanas. Além disso, a legislação dos cinco países estabelece que as mulheres devem receber, durante a licença maternidade, um salário maternidade que eqüivale a 100% do seu salário habitual. Também definem que as mulheres trabalhadoras têm direito a receber assistência médica durante a gravidez e o parto. A Convenção 183 da OIT, por sua vez, define o mesmo em relação às prestações médicas e estabelece que as mulheres devem receber, durante a licença maternidade, pelo menos 2/3 de suas remunerações habituais, recomendando o aumento progressivo dessa proporção. A pesquisa revela, em primeiro lugar, uma baixa incidência anual de gestações, e, por tanto, de licenças maternidade e outras prestações a ela associadas entre as trabalhadoras assalariadas. Essa incidência vai de um mínimo de 2,8% na Argentina a um máximo de 7,5% no México. No Brasil, o número total de licenças maternidade concedidas em 1999 corresponde a apenas 3,0% do total das trabalhadoras assalariadas no setor privado (excluindo o serviço doméstico). Esse dado é importante, porque, muitas vezes, quando se fala nos “custos” das mulheres associados à maternidade, a impressão que fica é que as mulheres trabalhadoras teriam um número de filhos muito maior do que o que aparece nos dados acima citados, ou que o “risco” da maternidade seria algo quase permanente. Mas a razão que explica porque os custos adicionais derivados da legislação protetora
associados à proteção da maternidade e ao cuidado infantil são tão reduzidos não é principalmente de ordem demográfica. Ele está relacionado às políticas públicas e ao caráter da legislação de proteção à maternidade. O que explica principalmente esses baixos custos é que os benefícios médicos e monetários associados à maternidade não são financiados diretamente pelos empregadores que tomam a decisão de contratar uma mulher, mas sim por fundos públicos (no caso do Chile) ou pelos sistemas de seguridade social (nos casos da Argentina, Brasil, México e Uruguai). Além disso, as contribuições dos empregadores aos sistemas de seguridade social (que incluem aquelas referentes à maternidade) não estão relacionadas nem ao número nem à idade das mulheres que empregam. Essa forma de financiamento visa garantir um valor fundamental: a proteção das mulheres frente a uma possível discriminação associada à maternidade, consagrada tanto nas legislações nacionais dos cinco países analisados (assim como na maioria dos países latinoamericanos) como nas Convenções da OIT de Proteção à Maternidade. Pode-se argumentar que, de qualquer forma, haveria um “custo social” associado à proteção à maternidade. Ou seja, mesmo que seja através de fundos de caráter compensatório, alguém paga esses custos. Em outras palavras: a proteção à maternidade “onera” os sistemas de proteção social que, em ultima instância, são financiados pelos empregadores (nos casos do Brasil, Argentina e Uruguai), ou de forma tripartite (México). Levando em consideração esse argumento, e tratando de avaliar de forma objetiva a sua validade, procedeu-se a calcular esse “custo social”. E o resultado é que este tampouco é elevado: os benefícios monetários recebidos pelas trabalhadoras assalariadas durante a licença maternidade representam menos de 2% da massa salarial feminina registrada (0,7% na Argentina, 1,1% no México e 1,7% no Chile e Brasil).
Os serviços de cuidado infantil (as creches) O outro custo associado à contratação de mulheres é o da creche. As disposições legais referentes às creches são mais diferenciadas nos cinco países analisados. Na Argentina, Brasil e Chile, a lei estabelece que os serviços de cuidado infantil devem ser financiados diretamente pelos
Custos do trabalho de homens e mulheres na América Latina: mitos e realidade
COMPONENTES DE CUSTOS ASSOCIADOS À PROTEÇÃO À MATERNIDADE E AO CUIDADO INFANTIL
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Custos do trabalho de homens e mulheres na América Latina: mitos e realidade
empregadores em empresas que tenham um número mínimo de mulheres (20 no caso do Chile e 29 no caso do Brasil). Na Argentina existe uma lei similar, que até agora não foi regulamentada, o que faz com que, na prática, esse benefício não seja obrigatório. No entanto, ele é um tema bastante presente na negociação coletiva. No México têm direito à creche todas as trabalhadoras que contribuem à seguridade social. No Uruguai não existe nenhuma lei a respeito e o tema está muito pouco presente na negociação coletiva. Em termos de duração do benefício, no Brasil esse direito se estende até que a criança tenha 6 meses e, no México e no Chile respectivamente 4 e 6 anos.
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É necessário assinalar que, no caso das creches, a legislação vigente nos países analisados é ainda muito insuficiente. Inclusive no México, onde a legislação é mais avançada, na prática, a cobertura é muito reduzida. No Brasil, Argentina e Chile, a legislação existente apresenta dois problemas básicos. Em primeiro lugar, exclui desse direito todas as mulheres que trabalham em micro ou pequenas empresas que, como se sabe, constituem a grande maioria nesses países, e concentram uma grande parcela da mão-de-obra feminina. Em segundo lugar, o direito à creche continua sendo associado apenas à mulher trabalhadora (e não à criança ou, indistintamente, ao pai e à mãe, ou seja, aos trabalhadores/as de ambos sexos com responsabilidades familiares). Isso, além de reforçar a tradicional e desigual distribuição das responsabilidades familiares ente homens e mulheres, constitui, como se verá a seguir, um fator que dificulta o acesso da mulher ao emprego. Os resultados da pesquisa indicam que os gastos relacionados à creche são o principal componente dos custos diretos de contratação de uma mulher para o empregador no Chile e na Argentina. Ainda assim, são custos bastante reduzidos: 1,2 e 0,8% de sua remuneração bruta mensal respectivamente. No Brasil esse custo representa 0,3% da remuneração bruta mensal das mulheres e, no México esse item não constitui um custo direto para o empregador porque está coberto pela seguridade social, da mesma forma que a assistência médica e o salário maternidade.
Direito a lactância A legislação dos cinco países considerados estabelece o direito da mulher de realizar duas
interrupções diárias de ½ hora cada uma na sua jornada de trabalho para a amamentação. Estabelece também que esse tempo dever ser considerado tempo de trabalho e remunerado enquanto tal. A duração desse benefício varia de até que a criança tenha 6 meses (Brasil, México e Uruguai) a 2 anos (Chile). No caso do Chile o direito é mais amplo que o da amamentação: se refere à alimentação da criança. A Convenção 183 da OIT também estabelece esse direito, por um período a ser definido pela legislação de cada país. Apesar de consagrado nas legislações dos cinco países considerados, também nesse caso existem muitos problemas para que esse direito seja observado. Na verdade, ele tende a ser concretizado apenas nos (poucos) casos em que existe uma creche no local de trabalho, garantindo com isso a proximidade física entre a mãe e a criança durante a jornada de trabalho. Devido a isso, muitas vezes, simplesmente se ignora essa disposição legal e, outras, se negocia a redução da jornada da mãe que está amamentando em uma hora na entrada ou saída do trabalho. Apesar desse ter sido um dos temas mais polêmicos no processo de revisão da Convenção 103 da OIT de Proteção à Maternidade, o resultado da pesquisa indica que o custo desse benefício é extremamente reduzido: representa 1% ou menos da remuneração bruta mensal das mulheres. No Brasil, ele eqüivale a 0,8%.
Custos de substituição da trabalhadora durante a licença maternidade Outro argumento corrente se refere aos supostos custos relacionados à substituição de uma mulher que se afasta do trabalho durante a licença maternidade por um período que, como já vimos, varia entre 3 a 4,5 meses nos cinco países considerados. É verdade que pode existir um custo indireto de substituição de uma mulher durante a licença maternidade relacionado à produtividade e a organização do processo de trabalho. Mas, além do fato de que essa ausência é previsível e, portanto, a substituição da trabalhadora pode ser planejada, não existe qualquer evidência confiável para calcular objetivamente esse componente. Qualquer análise mais objetiva do tema demanda novas investigações.
Outra noção muito freqüente é que o absenteísmo feminino é superior ao masculino e
Remuneração Bruta Creches Lactância Substituição Licença anual (exames de prevenção de câncer) Soma dos custos da maternidade e cuidado infantil Custo médio para o empregador
que esse é um outro importante componente de seus custos indiretos. Mas tampouco existe evidência confiável ou dados estatísticos a respeito. Os dados sobre enfermidades e acidentes do trabalho e outras licenças disponíveis nesses cinco países não estão desagregados com essa finalidade. Apesar desse tema ter sido tratado na pesquisa, os resultados a que se chegou não são conclusivos, devido ao limitado número de empresas que foram estudadas. Sobre esse tema também são necessárias novas investigações.
Argentina
Brasil
Chile
México
Uruguai
100.0 0.8 0.1 0.1
100.0 0.3 0.8 0.1
100.0 1.2 0.5 0.1
100.0 0.0 0.1 0.1
100.0 0.0 0.2 0.0
0.0
0.0
0.0
0.0
0.3
1.0
1.2
1.8
0.2
0.5
101.0
101.2
101.8
100.2
100.5
CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados da pesquisa indicam, em primeiro lugar, que os custos associados à proteção à maternidade e ao cuidado infantil são muito reduzidos nos cinco países considerados, e de forma nenhuma justificam os diferenciais de salários entre homens e mulheres neles existentes. Indicam também que a principal razão para que isso seja assim não é de ordem demográfica, ainda que o número de casos de licença maternidade e, portanto, também dos outros benefícios a ela associados, seja muito mais reduzido de que o estereótipo freqüente de que as mulheres trabalhadoras estariam sempre prestes a engravidar, constituindo por isso um “risco” muito elevado para os empregadores que decidem contratá-las. A principal razão para que estes custos sejam tão reduzidos está situada justamente no âmbito da legislação trabalhista e das políticas públicas: os benefícios médicos e monetários associados à maternidade não são financiados diretamente pelo empregador que decide contratar uma mulher, mas sim por fundos públicos (no caso
do Chile) ou pelos sistemas de seguridade social (nos casos da Argentina, Brasil, México e Uruguai). Além disso, as contribuições dos empregadores para os sistemas de seguridade social (que incluem os benefícios relacionados à maternidade) não estão relacionados nem ao sexo nem à idade dos trabalhadores que ele decide contratar. Por tanto, em relação a esses aspectos, a contratação de uma mulher representa um custo adicional nulo (= 0) para os empregadores. Os resultados da pesquisa evidenciam também a necessidade de contar com informação estatística permanente e confiável sobre custos do trabalho desagregados por sexo, assim como sobre temas relacionados, tais como ausências, licenças, enfermidades profissionais, acidentes de trabalho. Essa informação é cada vez mais necessária justamente para que se possa avançar a discussão sobre a forma de enfrentar os custos da reprodução social e a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no trabalho em um terreno menos marcado por mitos e preconceitos.
Custos do trabalho de homens e mulheres na América Latina: mitos e realidade
Devido a isso, e nessa primeira etapa da pesquisa, tratou-se de calcular os custos monetários diretos relacionados à substituição de uma mulher durante a licença maternidade (as férias,13º salário proporcional e outros benefícios). A conclusão a que se chegou é que, uma vez mais, eles são muito reduzidos: representam 0,1% ou menos da remuneração bruta das trabalhadoras assalariadas.
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Quanto aos aspectos de política, os resultados da pesquisa apontam em quatro direções: a)
b)
c)
Custos do trabalho de homens e mulheres na América Latina: mitos e realidade
d)
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a necessidade de manter e fortalecer as legislações nacionais de proteção à maternidade e, especialmente, os atuais sistemas de financiamento dos benefícios médicos e monetários vinculados à proteção da maternidade das trabalhadoras existentes nos países considerados, justamente porque eles estão inspirados no objetivo de evitar a discriminação da mulher no emprego por razões vinculadas à maternidade; melhorar e ampliar os serviços de cuidado infantil e financiá-los através do mesmo sistema que garante um caráter não discriminatório aos benefícios médicos e monetários relacionados à maternidade; além disso, ampliá-los aos trabalhadores com responsabilidades familiares de ambos sexos, no espírito da Convenção 156 da OIT sobre Trabalhadores com Responsabilidades Familiares; estimular a adoção, no âmbito das empresas, de políticas de recursos humanos que visem promover um maior equilíbrio entre o trabalho e a família, para trabalhadores de ambos sexos; promover a negociação coletiva como um instrumento fundamental para garantir a aplicação da legislação de proteção à maternidade e o cuidado infantil, assim como ampliar os direitos aí consagrados e introduzir novos direitos.
NOTAS 1. Taxa de participação: porcentagem de pessoas em idade de trabalhar que está trabalhando ou procurando ativamente um trabalho. 2. A taxa de crescimento anual da população econômicamente ativa (PEA) entre as mulheres mais pobres foi de 6,2%, enquanto a das de rendimentos médios foi de 4,7% e a das de rendimentos altos foi de 3,9% (OIT, 1999). 3. Brecha de participação entre homens e mulheres: relação entre as respectivas taxas de participação. 4. Taxa de ocupação: porcentagem da população em idade de trabalhar que está ocupada. 5. Brecha de desemprego entre homens e mulheres: relação entre as respectivas taxas de desemprego. 6. recha de informalidade: se refere à relação entre a porcentagem de mulheres ocupadas no setor informal e a porcentagem de homens nessa mesma situação. 7. Brecha de rendimentos entre homens e mulheres: relação entre os respectivos níveis de remuneração.
BIBLIOGRAFIA CEPAL, 1995. Panorama Social de América Latina, CEPAL, Santiago de Chile. OIT, 1999. Panorama Laboral de América Latina, número 6. OIT, Escritório Regional, Lima. OIT, 2000. Panorama Laboral de América Latina, número 7. OIT, Escritório Regional, Lima.
UM OLHAR SOBRE A QUESTÃO DE GÊNERO NAS EMPRESAS
Pesquisadoras do Observatório Social
s Convenções 100 e 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) estabelecem a igualdade de remuneração, ocupação e emprego entre homens e mulheres. Tendo sido ratificadas pelo Brasil, elas definem um direito internacional e nacional do trabalhador(a). Mas, até que ponto este direito vem sendo respeitado pelas empresas em nosso país? Esta é uma das questões que busca responder o Observatório Social (OS), uma instituição de pesquisa criada em 1997 por iniciativa da Central Única dos Trabalhadores (CUT) em cooperação com o Centro de Estudos de Cultura Contemporânea (Cedec), o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos SócioEconômicos (Dieese) e a Rede Inter-Universitária de Estudos do Trabalho (Unitrabalho). O seu propósito é exatamente desenvolver pesquisas que possibilitem o conhecimento aprofundado da atuação das empresas e governos frente ao cumprimento dos chamados direitos fundamentais do trabalho, tais como defendidos pela OIT. Como tal, envolve os seguintes direitos: liberdade sindical (convenções 7 e 151); direito de organização e negociação coletiva (convenções 98 e 135); proibição do trabalho infantil (convenções 138 e 182); proibição do trabalho forçado (convenções 29 e 105); saúde e segurança ocupacional (convenções 148, 155, 170, 174); preservação do meio ambiente e proibição de toda discriminação (convenções 100 e 111). O objetivo principal do OS é produzir e difundir informações que instrumentalizem a sociedade (trabalhadores, sindicatos, empresas, governos, consumidores e movimentos sociais) na luta pela efetivação destes direitos, em toda e qualquer parte do mundo, impulsionando assim a globalização dos
direitos, o que pode vir a ser uma contrapartida positiva do processo de globalização econômico em curso. A metodologia utilizada parte de critérios técnico-científicos definidos pelo Observatório Social e busca contar com a parceria e envolvimento de entidades sindicais, trabalhadores e empresas em todo o processo de pesquisa. Isto tem possibilitado uma ação educativa junto a estes atores, sensibilizando-os para questões na maioria das vezes ausentes ou subdimensionadas nas suas atuações. A questão de gênero é exemplar do aspecto destacado acima: apesar das pesquisas estarem centradas nas condutas das empresas, muitas vezes nos deparamos com situações no meio sindical não muito diferentes daquelas observadas nas organizações empresarias. Enfim, o envolvimento dos sindicatos, trabalhadores e empresários em todo processo de pesquisa é um meio não somente de obter as informações que necessitamos para uma avaliação de determinada empresa, mas tem já um fim em si mesmo: colocar as temáticas, no caso, a questão de gênero, na pauta de suas reflexões e ações. O OS tem um acúmulo de 12 pesquisas em empresas já concluídas e outras 15 em andamento (1). Para o presente texto, apresentamos alguns resultados sobre a questão de gênero obtidos nas seguintes pesquisas: Wal Mart, Bom Preço, Parmalat e Santander. Estas pesquisas tiveram a contribuição da Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora (CNMT) da CUT. Objetivamos com este texto apresentar alguns pontos de reflexão sobre a questão de gênero no mundo do trabalho. Sabemos que, como resultado de lutas históricas das mulheres pela igualdade de condições, houve consideráveis avanços na situação da mulher em todos os campos da sociedade. Porém, a plena igualdade de condições entre homens e mulheres é ainda uma realidade muito distante.
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
Márcia Miranda Soares Mércia Consolação Silva
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ALGUMAS NOTAS SOBRE A PARTICIPAÇÃO DA MULHER NO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO Diversas pesquisas têm mostrado uma melhoria considerável da situação da mulher no mercado de
trabalho brasileiro, quando comparada às décadas passadas. Sendo maioria da população, segundo dados do último censo realizado pelo IBGE, as mulheres aumentaram significativamente a sua participação no mercado de trabalho, apesar de os homens continuarem sendo a maioria da força de trabalho em quase todos os setores, como mostra a tabela abaixo.
Distribuição percentual de homens e mulheres por alguns setores de trabalho Setores Bens de Capital Alimentos Calçados Couro Informática Telecomunicações Têxtil Vestuário
Mulheres
Homens
13,6 31,4 47,2 17,9
86,4 68,8 52,8 82,1
30,8 34,2 46,8 76,1
69,2 65,8 53,2 23,9
Fonte: PNAD/IBGE – 1998 (Extraído de: Guimarães e Consoni, 2000. “As desigualdades reestruturadas”, Pesquisa CUT –Finep).
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
No aspecto qualitativo – tipo de trabalho – as mulheres estão concentradas em setores e funções menos valorizados, recebendo menor remuneração e exercendo trabalhos mais precários em termos de saúde e segurança ocupacional. Cumpre destacar que as diferenças salariais estão diminuindo, mas ainda são bastante elevadas, isto em um contexto em que o nível de escolaridade das mulheres é superior aos níveis de escolaridade masculino.
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O aumento da presença feminina no mercado de trabalho tem paralelamente trazido novos problemas para as mulheres, que são as maiores vítimas de doenças ocupacionais como as lesões por esforços repetitivos (LER/Dort).
PESQUISA WAL-MART Os dados da Rais (Relação Anual de Informações Sociais) e do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), para o setor supermercadista e de hipermercados em 1999, nos três municípios escolhidos para pesquisar a empresa (São Paulo, Osasco e Bauru), apontam a clara desigualdade entre homens e mulheres no aspecto
salarial, com as mulheres recebendo o eqüivalente a 70% dos salários dos homens. Estes dados são corroborados na pesquisa do Wal Mart, através de entrevistas com trabalhadores e de alguns dados, como 82 homologações de rescisões de contrato de trabalho entre março de 1999 e janeiro de 2000 em Bauru, que mostram uma diferença significativa entre a remuneração de homens e mulheres, com as mulheres recebendo salários equivalentes, em média, a 75% dos salários dos homens (2). O que explica estas diferenças salariais são, basicamente, uma divisão sexual do trabalho, que aloca as mulheres em setores e funções da empresa de menor remuneração. Agravando ainda mais esse quadro, podemos observar que essas funções “feminilizadas”, é exemplar a função de caixa, são as que mais causam doenças ocupacionais por esforços repetitivos (LER/ Dort). Os depoimentos de trabalhadores e trabalhadoras, recolhidos através das entrevistas, ratificam a existência de uma pronunciada segmentação dos postos de trabalho masculinos
Ainda com base nas entrevistas, a ocupação de cargos de chefia é desigual, já que as mulheres estariam em franca minoria. À medida que se observa a ocupação dos cargos nos escalões mais altos da empresa, o número de mulheres diminui. Os entrevistados descartaram discriminação na seleção e contratação de funcionários, embora digam que há preferência por contratar pessoas de um ou outro sexo dependendo da atividade e setor de trabalho. De modo geral, os entrevistados disseram que as mulheres grávidas recebem condições especiais de trabalho, sendo transferidas para postos de trabalho mais adequados. No entanto, alguns depoimentos contradizem tais afirmação, dizendo que o tratamento dispensado por gerentes desconsidera o estado especial das trabalhadoras gestantes. Os entrevistados também não identificam qualquer discriminação contra as mulheres nas oportunidades de treinamento oferecidos pela empresa. Um problema que apareceu com certa freqüência nos depoimentos dos entrevistados foi o do assédio sexual sobre as trabalhadoras. Apesar da empresa seguir uma política de “portas abertas”, reconhecida pela maioria, ela não parece ser suficiente para evitar o problema.
PESQUISA BOMPREÇO A primeira questão que se coloca sobre a discriminação no trabalho é a existência de diferença salarial entre homens e mulheres que exerçam trabalhos iguais ou de igual valor (Convenção 100). Os dados disponíveis oferecem inferências sobre essa questão no Bompreço. Estando concentrado no Nordeste, com destaque para a Bahia, um primeiro conjunto de informações provém da Rais, de onde foram selecionados os dados de remuneração dos empregados nos estabelecimentos supermercadistas de Salvador com mais de 100 empregados. A comparação simples mostra que a remuneração média das mulheres corresponde a 75% do que recebiam os homens.
Mas, para validar a hipótese de que práticas discriminatórias causem esta desigualdade salarial é preciso afastar a alternativa de que tais diferenciais estejam relacionados à complexidade do trabalho e a qualificação requerida para sua execução. Para comparar a remuneração em ocupações com complexidade semelhante e nível de qualificação profissional equivalente, foram selecionados os vínculos de emprego classificados no mesmo subgrupo ocupacional da CBO, cujos ocupantes tivessem igual nível de escolaridade, duração do emprego e faixa de idade. O estudo desses dados aponta que a remuneração média nos subgrupos ocupacionais onde estão concentradas as mulheres é menor que naquelas em que os homens são a maioria, a distribuição da ocupação das mulheres é concentrada em poucos subgrupos ocupacionais comparativamente à maior diversidade do emprego de homens, as mulheres representam apenas 20% das chefias intermediárias e menos de 25% dos ocupantes de postos de gerência. O segundo conjunto de dados vem das guias de recolhimento do imposto sindical de Natal e de Campina Grande. Na loja de Campina Grande, os salários das mulheres eqüivalem a 77,8% dos salários dos homens, em média. Além disso, a distribuição dos salários das mulheres é mais concentrada em torno da média (menor desvio padrão) e o maior salário é bem menor do que o máximo percebido por empregado do sexo masculino. Selecionando apenas os empregados no setor de atendimento, que engloba as operadoras de caixa e que é o único setor onde o número de mulheres é maior que o de homens, nota-se que a desigualdade persiste, tanto no salário médio quanto no grau de dispersão dos salários, sempre favorecendo os homens. O mesmo se verifica no Hiper Bompreço de Natal, onde a média salarial das mulheres corresponde a 88% do que recebem os homens e estes tem faixa salarial mais ampla, para cima. Quando se compara os salários médios de homens e mulheres por setor desta loja, novamente percebese que na maioria dos casos os valores são mais altos para os primeiros. Em apenas quatro dos dezoito setores, as mulheres tem salário médio maior que os homens. Mas, a presença feminina se concentra no Atendimento, na Administração e no Têxtil, e nos dois primeiros a média salarial das mulheres é muito menor que a dos homens.
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
e femininos. A presença de mulheres em várias áreas é limitada quantitativamente.
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Salário Médio por Setor no Hiper Bompreço de Natal - (Maio/2000 - em R$)
Atendimento Administração Depósito Segurança Hortifruti Carnes e Peixes Frios e Sal Eletrod. Têxtil Bazar Mercearia Padaria Ind Limpeza Manutenção Admin. Hiper Refeitório Higiene e Limpeza Padaria e Confeitaria Totais
HOMENS Sal. Médio Número 376,64 34 740,19 10 401,63 21 400,34 20 323,97 20 384,47 20 367,25 22 837,83 12 280,62 5 301,40 9 468,92 14 334,80 9 329,75 6 492,47 9 0 211,20 3 347,95 6 328,70 3 415,98 223
MULHERES Número Sal. Médio 49 276,23 31 448,71 3 339,00 3 307,20 3 418,70 3 218,50 0 8 653,21 14 408,34 6 550,70 0 2 243,30 5 293,58 0 9 247,73 4 445,28 0 2 240,00 142 366,41
Mulheres em % aos de homems 73,34 60,62 84,41 76,74 129,24 56,83 77,97 145,51 182,71 72,67 89,03
210,83 73,01 88,08
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
Fonte: Sindicato.
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Os dados apresentados até aqui são inegáveis quanto à existência de uma significativa desigualdade salarial entre pessoas do sexo masculino e feminino. Entretanto, deve-se reconhecer que as informações são incompletas, por não abrangerem o universo dos trabalhadores da empresa, bem como não estarem acompanhadas de dados sobre a ocupação, qualificação profissional, jornada de trabalho, tempo de permanência no emprego, entre outros. Outra importante lacuna por não fornecerem elementos sobre desigualdades entre pessoas de diferentes raças ou cor de pele, religiões, opinião política, etc. Uma vez que nos princípios assumidos pela Ahold figura a não discriminação no trabalho, é de se esperar que a sua subsidiária, a Bompreço, se disponha a examinar a possível existência de discriminação salarial em seus estabelecimentos. Um primeiro passo seria a abertura das informações sobre esse assunto para exame das entidades representativas dos trabalhadores, que são os primeiros interessados. Entretanto, os sindicalistas entrevistados disseram que a empresa não desenvolve qualquer política ou programa dirigido
para a promoção da igualdade de oportunidades entre seus empregados. Essa questão foi colocada de forma ampla, abrangendo não só a dimensão de gênero, mas também a de raça. Nas avaliações feitas nas entrevistas e na Oficina Sindical, fez-se referência à segmentação da ocupação em determinados postos de trabalho por homens e mulheres. Estas últimas não costumam ser empregadas para determinadas funções ou são alocadas em certas áreas dos estabelecimentos. Mesmo assim, estaria havendo uma mudança paulatina, pela substituição de mulheres por homens na função de operador de caixa. Segundo alguns sindicalistas entrevistados, essa substituição de mulheres por homens estaria relacionada a uma visão da gerência de que as mulheres teriam menos tempo para dedicar-se ao trabalho na empresa sendo, portanto, menos produtivas do que os homens. O papel que é atribuído à mulher na sociedade traria prejuízos para a sua carreira profissional. Outro indicador da discriminação contra mulheres e negros, segundo os entrevistados, é a
Um dos fatos que ilustra a importância dos mecanismos legais para condicionar a empresa a adotar uma conduta não-discriminatória é o caso da contratação obrigatória de deficientes físicos e mentais. Os entrevistados relataram que após ter sido fiscalizada pelas autoridades do trabalho, a empresa passou a manter o número de pessoas deficientes previstos em lei. Segundo os entrevistados “eles só cumprem porque é lei”. Em relação à discriminação no local de trabalho, os sindicatos que representam os trabalhadores do Bompreço nas cidades pesquisadas, já vem desenvolvendo algumas ações. O sindicato de Salvador está lutando para estabelecer na convenção coletiva de trabalho uma cláusula que determine uma percentagem de participação de trabalhadores negros no quadro de pessoal das empresas. A reivindicação é de que, no mínimo, de 50 a 60% dos trabalhadores sejam afro-descendentes. Essa reivindicação foi incluída na pauta de negociações, mas as empresas não a aprovaram. Em João Pessoa, o sindicato questionou a participação minoritária das mulheres nos cargos relevantes e conquistou o fim da revista pessoal íntima, a estabilidade de 120 dias após a licençamaternidade e o direito à amamentação. Quanto ao problema do assédio sexual, para um dos entrevistados eles existem no Bompreço, mas não são denunciados pelas mulheres em função do temor de represálias. Um dos principais problemas em relação ao assédio sexual, na opinião dos entrevistados, e que seria comum à questão da discriminação, seria a dificuldade de comprovação. Em Salvador, por exemplo, teriam sido abertos
alguns processos individuais na justiça sobre práticas de racismo, mas a dificuldade de encontrar colegas de trabalho dispostos a serem testemunhas, levaria quase sempre a uma insuficiência de provas.
PESQUISA PARMALAT Em relação ao setor de alimentos, a partir de estudos feitos com dados da Rais/Caged e da PNAD pode-se afirmar que continua havendo uma preferência por homens na maioria dos setores industriais, e as mulheres negras tem tido maiores dificuldades de acesso a postos de trabalho na indústria. Há ainda que se observar que muitas barreiras de acesso estão atreladas a níveis de escolaridade e que isso recai novamente sobre a população negra em especial à mulher negra; e também uma outra forma de discriminação que ocorrem no acesso ao trabalho está nas diferenças de remuneração. As barreiras de acesso tanto para negros como para mulheres tem se diluído, porém ainda há um indicativo da permanência de uma certa preferência, no recrutamento, por homens brancos. Com relação às formas de inserção no espaço de trabalho: as mulheres ficam mais tempo em uma determinada função para alcançarem algum tipo de promoção e incremento de salários; os homens negros, seguidos das mulheres negras, têm uma menor mobilidade hierárquica e portanto uma menor remuneração em relação ao homem branco. Isto pode ser decorrência da baixa escolaridade mas também é fruto de uma discriminação interna, para evitar mulheres ou negros em cargos de chefia ou lideranças com salários mais elevados e poder de mando. Os dados utilizados na pesquisa realizada na empresa Parmalat vieram tanto do sindicato quanto da própria empresa, que abriu suas portas para equipe do Observatório Social, permitindo entrevistas com funcionários do alto escalão da empresa e fornecendo os dados necessários para a pesquisa. Como o foco da pesquisa era o núcleo industrial da Parmalat que fica em Jundiaí, a maioria dos dados se referem as fábricas deste município, porém as conclusões podem ser estendidas para todo o Brasil. O sindicato da Alimentação de Jundiaí, recebe mensalmente lista de contribuição sindical de todos os funcionários das três unidades. Como a
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
escassa ocupação de cargos de chefia e gerência. O número de mulheres ocupando cargos de direção ou chefia seria muito baixo e o de negros quase inexistente. Para a ocupação de tais cargos, mais uma vez, entraria como um critério importante a aparência. Há depoimentos no sentido de que se exigiria das poucas mulheres que ocupam cargos de chefia além da boa aparência, um comportamento semelhante ao dos homens: “Para chegar a cargo de chefia no Bompreço, a mulher tem de atender aquele perfil que a empresa está precisando, ou seja, tem que ser uma mulher que se vista como mulher, que esteticamente seja mulher, mas que haja como homem.”
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contribuição sindical é obrigatória, a lista nos fornecia o salário, a função e o sexo de todos os funcionários das três unidades de produção da empresa. A lista usada na análise dos dados se refere ao mês de maio de 2000. Para efeito de análise o conglomerado da Parmalat no Brasil foi sub-dividida por linhas de produtos, essa divisão permite comparar fábricas com perfis mais parecidas.
Unidades de produção de leite e derivados
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
Em todas as unidades de produção de leite e derivados a distribuição da mão-de-obra feminina é muito semelhante, o percentual de mulheres nessas fábricas varia entre 9 e quase 27%. As exceções são a unidade de Carazinho (RS) que apresenta o menor número de mulheres empregadas em relação ao número de homens (5,4%), e de Manhuaçu que apresenta um percentual de 17,8% de mulheres empregadas. A média das outras unidades gira ao redor de 12 a 15%, ou seja, para cada 100 empregados, há entre 12 e 15 mulheres trabalhadoras.
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Porém, o mais importante é perceber que as mulheres estão trabalhando nas mesmas atividades, ou seja, há um perfil da ocupação da mão-de-obra feminina nas unidades de produção de leite, uma verdadeira distribuição espacial do trabalho feminino, uma divisão sexual das mulheres em regiões e contextos absolutamente diferentes. As mulheres praticamente não trabalham nos cargos de entrada, ajudante geral e operadores (máquina, caldeira, empilhadeira, etc.). Esses são cargos masculinos, a empresa considera que exigem força bruta. As exceções são as unidades de Santa Helena e Manhuaçu onde mais da metade das mulheres empregadas encontram-se alocadas nos cargos de ajudante geral e operadoras. Será preciso avançar na pesquisa em uma segunda fase mas é possível especular sobre algumas hipóteses. É possível que nessas duas unidades haja maior investimento em maquinário de última geração, o que facilitaria o emprego de mulheres. A Parmalat, em linhas gerais (com algumas exceções) acompanha a velha divisão sexual de trabalho entre funções operacionais, “pesadas” e masculinas, e a área administrativa, considerada “leve”. Uma consideração importante diz respeito à divisão sexual do trabalho entre atividades e tarefas “leves” e “pesadas”. Em visita à fábrica do Leite, a equipe do OS constatou que o processo industrial
de produção de leite e derivados é quase todo informatizado, sendo que cerca de 90% das máquinas atendem a comandos computadorizados de controle local e alguns são controlados por uma central de computação. A maioria de mão-de-obra ativa na fábrica de leite é do sexo masculino. Segundo o gerente industrial da unidade, o tipo de trabalho realizado na maior parte dos cargos poderia ser executado por mulheres, porém, ele não soube explicar o motivo da preferência por homens. São os líderes, supervisores e, em última instância, o gerente industrial responsável, quem escolhe o perfil dos novos contratados. Indagado sobre os processos de promoção, o gerente industrial respondeu que ele, juntamente com seus líderes e supervisores, fazem o processo de observação e promoção de um funcionário. E a escolha dos funcionários que podem ser promovidos não obedece critérios preestabelecidos ou formais de conhecimento prévio dos funcionários, como, por exemplo, o tempo de casa na empresa. Não há plano de cargos e salários para os trabalhadores envolvidos nas atividades operacionais. As escolhas são, segundo a mesma fonte, de acordo com a indicação do líder, supervisor ou do próprio gerente industrial.
Unidades do biscoito e do chocolate Essas duas unidades conformam um outro perfil para a mulher trabalhadora da Parmalat. São unidades que foram adquiridas no segundo momento de expansão da empresa no Brasil, quando a estratégia competitiva adotada foi orientada para a diversificação de produtos de maior valor agregado. Dessa forma, a Parmalat ingressou no segmento de biscoitos em Jundiaí (1994) e de chocolates Nuegebauer (1999). Nas duas unidades, o número de mulheres representa praticamente metade do total de empregados. São 322 trabalhadores na Nuegebauer e 164 mulheres (50,9%). Em Jundiaí, são 391 trabalhadores e 193 mulheres (48%), dados referentes a maio de 2000. Na unidade de Jundiaí, visitada pela equipe do OS, as mulheres estão concentradas na função de Ajudante geral I e Ajudante geral. Aqui a discriminação é de outra natureza. A gravidade da situação da unidade do biscoito de Jundiaí diz
O mais grave é o fato da maioria das mulheres estar alocada na função de Ajudante Geral ou Ajudante Geral I. Durante a visita à fábrica foi possível questionar o motivo de tal preferência. A resposta encontrada esteve baseada em alto grau de subjetividade de parte dos supervisores, líderes e do próprio gerente industrial da unidade. O serviço exigiria um grau de “delicadeza” e “paciência”, “higiene” e “calma”, atributos “naturais” das mulheres, os homens não desempenhariam bem esta função, além do que não gostariam de realizar este trabalho. As mulheres permanecem mais tempo na mesma função sem que comecem a exigir uma “promoção”. No caso dos homens é o contrário. Segundo o gerente industrial, as mulheres são “menos ambiciosas” e esta permanência garante um melhor controle na qualidade da produção e embalagem dos produtos, pois não há muita rotatividade. Os homens são promovidos e/ou demitidos mais rapidamente do que as mulheres. Quando se perguntou ao gerente industrial da unidade do biscoito o porquê de tantos homens no cargo de líderes de equipes de mulheres (as equipes compreendem toda a linha de produção dos biscoitos), já que as mulheres respondem por quase 50% do total de trabalhadores, ele afirma ser o responsável direto pelas promoções e que teve receio de colocar mulheres como líderes pois no início de cada linha a equipe de masseiros era basicamente composta por homens. Ele teve receio de que estes não se sentissem a vontade ao serem comandados por mulheres. Disse ainda que a empresa não segue uma política ou instrução formalizada sobre os processos de contratações ou promoções no que diz respeito à gênero. Fica a cargo dos supervisores e líderes e dele mesmo os critérios de escolha para as promoções e contratações. A unidade da Neugebauer em Porto Alegre aprofunda ainda mais a discriminação vertical e salienta uma outra característica do emprego feminino nas duas unidades tipificadas. Na
Neugebauer, provavelmente, o índice de mecanização e informatização da fábrica é muito menor do que na unidade do biscoito. Isso explica o fato de mais da metade dos trabalhadores empregados estarem alocados no cargo de ajudante geral, são 322 no total para 154 empregados neste cargo. A questão de fundo é que dos 154 ajudantes gerais, 98 são mulheres (63% do total de ajudantes). Há 42 mulheres empregadas como ajudantes gerais além do número de homens empregados na mesma função. Como explicar esse comportamento da Parmalat se em todas as unidades do Leite e do CEDI o número de mulheres empregadas nessa função é insignificante ou inexistente? Se a unidade apresenta uma divisão sexual tão equilibrada em termos absolutos, por quê a empresa emprega 60% do total de mulheres no mesmo cargo, com o salário piso de entrada de R$ 303,46? A Parmalat, em especial nestas unidades, pratica discriminação horizontal por colocar um número maior de mulheres empregadas nos cargos de entrada na empresa. Dessa forma, os cargos que exigem maior qualificação e, portanto, têm salários mais elevados, ficam para os homens. Do total de 322 trabalhadores, 90 são homens que trabalham como ajudante geral e operador de máquina. No caso das mulheres, são 155 trabalhadoras que desempenham as mesmas funções, ou seja, há 72% mais mulheres do que homens nessas duas funções, apesar do número total de mulheres ser praticamente o mesmo do número de homens em todas as funções e cargos da fábrica
Unidade de conservas e derivados de tomate Em relação à gênero, a composição da mãode-obra da unidade de Araçatuba é semelhante a da maioria das unidades da Parmalat, com uma diferença importante. Mais do que a unidade da Neugebauer, em Araçatuba o processo de seleção, processamento e envase das conservas e derivados de tomate deve ser muito intensivo em mão-de-obra. Do total de trabalhadores, 336 (50%) trabalham como ajudante geral e 106 como operador de máquina (16%). Dois terços do total de trabalhadores desempenham uma dessas funções. Há 97 mulheres como ajudantes, cerca de 28,8% do total empregado nessa função, e 26 mulheres empregadas como operadoras, ou 24,5%
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
respeito ao fato de que o espectro de funções onde há homens alocados é muito maior que o espectro feminino, estas últimas contam com uma variação de cargos de apenas sete (7) funções diferenciadas enquanto que os primeiros têm como possibilidade de mobilidade hierárquica cerca de 20 (vinte) cargos diferenciados, quase uma relação de 1 (uma) mulher para 3 (três) homens.
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do total empregado nessa função. A massa salarial das mulheres, considerando a média (salários somados por cargos e divididos pelo número de homens e mulheres) é inferior à dos homens, considerando a proporção total de mulheres em relação aos homens. Essa conta é mais fácil de ser feita para a unidade de Araçatuba porque dos 661 trabalhadores, 442 trabalham em apenas duas funções, ou seja, 66,9% do total.
Centros de distribuição
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
Os CEDIs – Centros de Distribuição – apresentam um perfil bastante diferenciado no que se refere à mulher trabalhadora. Ao contrário do que acontece nas fábricas, a maior parte das mulheres não estão empregadas nos cargos de entrada. Ao contrário, não há mulheres alocadas como ajudantes nos CEDIs pesquisados. Elas encontram-se empregadas na estrutura administrativa e como promotora de vendas. Em terceiro lugar, as mulheres estão colocadas como vendedoras em diversas outras funções relacionadas à área de vendas.
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Ao mesmo tempo, não há uma distribuição equilibrada entre homens e mulheres entre as diferentes funções e cargos. Tanto na área de vendas como na área de promoção, as mulheres empregadas são em número muito inferior ao de homens. Há maior equilíbrio apenas na área administrativa. Mas isso não confere a elas, em média, salários mais elevados. Os salários mais elevados são o de vendedores que partem de um patamar mínimo de R$ 800,00 a R$ 900,00 reais, dependendo da localização do CEDI. Nesse cargo, os homens superaram o número de mulheres empregadas. Ao mesmo tempo, a área administrativa reserva às mulheres alguns cargos bem remunerados que fazem com que a média salarial das mulheres ocupadas nos CEDIs seja maior do que a dos homens.
PESQUISA SANTANDER Os problemas observados no Banco Santander em relação à temática de gênero são conseqüências, em primeiro lugar, da falta de uma postura de prevenção para evitar que a discriminação de gênero, e também de raça e outras, seja uma realidade na empresa. O resultado é que o Banco Santander reproduz (em sua ação) a desigualdade de gênero existente no mercado de trabalho brasileiro e, especificamente, no setor bancário, estando portanto
muito longe da observância das Convenções 100 e 111 da OIT. Os seguintes problemas foram levantados pela pesquisa:
Há claros indícios da existência de desigualdade na ascensão profissional (promoção) e no aperfeiçoamento profissional entre homens e mulheres. Há uma clara distribuição sexual das funções no Banco: as mulheres têm ocupado predominantemente alguns postos de trabalho, como Caixas, Telefonistas, Atendentes, Gerências de Vendas ou de Atendimento. Esta divisão sexual do trabalho significa patamares salariais distintos para homens e mulheres, com prejuízo destas últimas. Existe clara desigualdade na ocupação de cargos de chefia, não há proporcionalidade entre o número de mulheres trabalhando no Banco e a presença destas nos cargos de chefia, e segundo os dados levantados não há presença de negros nestes cargos. Portanto, a chefia (gerência, diretoria e outros) no Santander é predominantemente composta por homens brancos. Há indícios de que muitos cargos/funções femininas estão diretamente relacionados à aparência. A mulher é usada como ornamento e atrativo, uma mercadoria cujo valor é determinado por padrões estéticos, o que tende a excluir grande parte das mulheres negras. Não há um plano de cargos e salários que possibilite uma maior transparência e objetividade nos processos de continuidade e promoção dos funcionários. Isto acaba por preterir mulheres e/ou não brancos e criar uma situação de subjetividade e exposição muito grande das mulheres. Não há programas ou políticas que busquem promover a igualdade de gênero, de raça e outras no Banco. É exemplar disto a inexistência de quaisquer cláusulas antidiscriminatórias no Código de Conduta da empresa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS O que chama a atenção na breve apresentação dos resultados de pesquisa feita nestas quatro empresas, representando três setores muito distintos, é a congruência das problemáticas levantadas.
A falta de um política de promoção da igualdade plena no ambiente de trabalho, no intuito de erradicar as formas de discriminações existentes na sociedade e reproduzidas dentro da empresa, pode ser constatada pela falta de um plano claro de carreira e pela inexistência, à exceção do Wal-Mart, de qualquer menção nos Códigos de Conduta distribuídos aos funcionários, de uma postura de defesa da igualdade entre homens e mulheres, brancos e negros e outros. Vale destacar que a temática de gênero tem pontos de forte conexão com a questão racial, a combinação da condição de mulher e negra agrava sobremaneira a problemática da discriminação.
É também preocupante a não existência de cláusulas para a promoção da igualdade de gênero, e também de raça, nos acordos coletivos de trabalhos celebrados entre empresas e sindicatos, o que remete ao quanto tal temática ainda está distante da pauta de reivindicações do movimento sindical. Sem contar, que muitas vezes vemos reproduzidas na estrutura sindical as desigualdades que constatamos nas empresas, vide a composição das diretorias dos sindicatos. Em suma, a promoção da igualdade de gênero no mundo do trabalho é algo que envolve a conscientização e mudança de postura dos atores empresarias, sindicais e dos trabalhadores. Este é o ponto de partida das pesquisas levadas à cabo pelo Observatório Social. NOTAS 1. Para maiores informações sobre o Observatório Social e as pesquisas realizadas, visitar nosso website: www.observatoriosocial.org.br. 2. A empresa não se dispôs a participar da pesquisa e com isto não tivemos acesso a dados mais precisos sobre a distribuição sexual das funções e salários.
Um olhar sobre a questão de gênero nas empresas
As pesquisas mostram que em relação a igualdade de remuneração entre homens e mulheres (Convenção 100) o problema principal está na divisão sexual do trabalho, que estabelece categorias de gênero para as funções, alocando as mulheres naquelas menos valorizadas em termos de remuneração e status. Isto explica porque as chefias são predominante ocupadas por homens.
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GLOBALIZANDO OS DIREITOS: DO SALÁRIO À IGUALDADE DE OPORTUNIDADES Paola Cappellin Socióloga, professora do programa de pós-graduação em sociologia e antropologia e pesquisadora do AMORJ/UFRJ.
Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades
uando se enfatiza a globalização como ampla abertura mundial de intercâmbio econômico, acaba-se assumindo como única dimensão das transformações hoje em curso a dinâmica produtiva e, como agentes, os empresários. Mas os processos de globalização vão bem além desta perspectiva. Como processo, a globalização também envolve as ações internacionais promovidas pelas classes trabalhadoras em defesa de direitos adquiridos e de “direitos futuros”. Mais ainda, as referências à globalização seriam incompletas se fosse esquecido o protagonismo das mulheres trabalhadoras em defesa da igualdade de tratamento e de oportunidades no mercado de trabalho.
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Este artigo aborda particularmente os significados e as inovações institucionais que promovem a formatação e a aplicação da Convenção nº 100 e da Recomendação nº 90 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A Convenção dispõe sobre o princípio da igualdade de remuneração. Foi adotada pelo Conselho de Administração da OIT em 1951 e ratificada pelo governo brasileiro em 1957. Finalmente, na parte final deste texto, registramos o prosseguimento das propostas da globalização dos direitos das trabalhadoras encaminhadas pelos países aderentes à OIT, sugerindo a introdução da plataforma da igualdades de oportunidades.
A emergência dos direitos internacionais das mulheres trabalhadoras A formação da OIT evidencia que suas diretrizes são permeadas, desde seu surgimento, no início do século XX, pela luta contra as discriminações de
gênero 1 . Mesmo que muito rapidamente, relembramos alguns eventos que estimularam a introdução da igualdade na formação dos princípios norteados da OIT – constituída no interior dos Pactos de Versalhes, fechando o primeiro conflito mundial e antecipando a Revolução Russa. Cabe a pergunta: será que as guerras alteram a ordem familiar, do trabalho, das relações de gênero?2 A historiografia feminista evidencia que as guerras assumem um papel importante no longo processo de emancipação, na medida em que nos países beligerantes os conflitos “afetam as relações sociais entre homens e mulheres, redefinindo real e simbolicamente as relações masculino e feminino”3. Como afirma F. Thébaud, a guerra é um teatro de sombras e luzes, onde há bloqueios e evoluções que abrem brechas na distribuição dos papéis entre homens e mulheres. Por um lado, a Primeira Guerra Mundial é um parêntese que irrompe no movimento de emancipação que já havia começado em toda
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A OIT foi fundada logo após a Primeira Guerra Mundial, em 1919, com a meta de proporcionar a paz num contexto de justiça social. Sua original estrutura tripartite – representantes do governo, dos empregadores e dos trabalhadores – permite uma ampla gama de investimentos em favor dos direitos dos trabalhadores. 2 Nos referimos neste momento não somente à divisão sexual do trabalho, mas às relações de gênero, na medida em que estas fazem específica referência às construções culturais e sociais que oferecem significados à feminilidade e à masculinidade e, conseqüentemente, orientam as práticas e os papéis sociais de homens e mulheres. 3 No capitulo “Mobilização dos homens, mobilização das mulheres”, F. Thébaud aponta como “a mobilização dos homens fortifica os sentimentos familiares e dá vida ao mito do homem ‘protetor da pátria mãe’”. Mas há imagens diversas e ambíguas que retratam os sentimentos masculinos com respeito à mulher e à vida. Símbolo de vida e de liberdade, a mulher, sua companheira e a mãe de seus filhos, é para os soldados a “imagem invertida da guerra” o anjo que permite pensar no futuro bem além dos horrores de sua situação atual (pág. 47, tomo X). Lembramos que no primeiro conflito mundial mobilizou mais de dezenas de milhões de homens, dos quais aproximadamente dez milhões não voltaram dos campos de batalha . Ver R.Villari, “Storia dell’Europa contemporanea”, La terza, Bari, 191975, pág. 436 e seguintes.
As historiadoras registram como a guerra não é uma empresa exclusivamente masculina, mas que abre espaços para novas responsabilidades e novos campos profissionais para as mulheres, chefes de famílias, operárias nas fábricas de armamentos, condutoras nos transportes, funcionárias nas repartições públicas, inclusive auxiliares do Exército. Mas é bom lembrar que neste período são suspensas todas as leis sociais. Isto contribui a deteriorar as condições de trabalho e de vida destas novas trabalhadoras nos ambientes insalubres e perigosos. Nas fábricas de armamento, a remuneração contrastava por proporcionar salários bem mais altos que os dos setores tipicamente femininos, que, ao contrário, preservaram-se como espaços de trabalho a domicílio, mantendo baixos salários. A economia de guerra sem dúvida provocou a necessidade de incluir as mulheres em novas atividades urbanas – na metalurgia, na eletricidade, na química, sobretudo nas grandes empresas, e no trabalho a domicílio – às vezes, solicitadas por circulares ministeriais que convidavam os empresários a adotar esta nova postura5. Mas ao lado deste fenômeno, que sem dúvida é presente em alguns dos países beligerantes, a guerra proporciona experiências de mobilização sem precedentes. Nos locais de trabalho as mulheres não se afastam da luta sindical. O aumento de salário é pauta de muitas greves deste período de guerra na busca de conter a alta dos preços e a precarização da vida da população civil. Lembramos por exemplo que nos Estados Unidos, sob a pressão do movimento de mulheres, foram formadas em 1918 as primeiras agências federais para facilitar o emprego das mulheres na indústria. A National War Labor Board (NWLB) composta por sindicatos, governo e empregadores, comprometeu-se pela primeira vez com o princípio de igual salário para igual trabalho e com o salário mínimo para ambos os sexos6. Na Rússia, durante a guerra e o período revolucionário, as mulheres são protagonistas de diversas conquistas. Ao mesmo tempo, assumem
os desafios de transformar social e politicamente este imenso continente. Primeiras a ter reconhecida a condição de ser eleitas e eleitoras, a não estar subordinadas ao poder patriarcal do chefe de família, a alcançar a igualdade entre os cônjuges junto aos filhos, a ter garantida a licença-maternidade e a proteção ao trabalho, as mulheres, no modelo soviético, alcançaram a autonomia bem além do cotidiano do trabalho. Estas breves referências permitem entender que a formação da OIT e a escolha de seus princípios de igualdade representam a adequação de anseios já presentes em vários contextos nacionais. As propostas das convenções estavam na agenda de reivindicações das federações internacionais das mulheres operárias, dos setores femininos, das organizações internacionais de mulheres. Com efeito, o tratado de Versalhes, além de proporcionar um reordenamento político – territorial, além de definir os assim chamados “objetivos de guerra”, de estabelecer as vantagens econômicas e as posições políticas dos países vencedores, incorpora as metas e princípios para uma reconstrução moral e civil onde estão inscritos os direitos de igualdade e liberdade no mundo do trabalho. Mas não podemos deixar de reconhecer que sobre estes últimos não havia um consenso nas propostas de reconstrução do pós-guerra. O ideal de igualdade entre os sexos não aglutinava todos os governos. Menos ainda podemos afirmar que a incorporação das mulheres ao mundo do trabalho fosse aceita como ideal. Basta pensar as políticas pró-família que são bem lembradas por R.M. Lagrave. A autora afirma: “As reconstruções nacionais são empresas de repopulação. A diminuição da natalidade, o aumento da quantidade de trabalhadores, o retorno dos homens às fábricas e aos campos, tudo isto desencadeia uma nova ofensiva ideológica de grande envergadura, com o propósito de que as mulheres retornem ao lar como donas de casa”.
4 Lembramos as grandes manifestações de 1899 e de 1907 que foram liderados pelas diversas iniciativas da International Council of Women (ICW), pela International Women Suffrage Alliance. 5 Ver J. Thébaud quando fala do governo françês. op.cit. pag 38. 6 Ver J. Thébaud op.cit. pag 53
Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades
Europa e que evidenciava novos modelos de feminilidade economicamente e sexualmente independentes. Por outro, bloqueia os movimentos feministas coesos na reivindicação comum: o sufrágio universal4.
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Em 1938, a OIT adota uma resolução que convida todos os países membros a aplicar o princípio de igualdade de tratamento, renunciando a qualquer medida de exceção que possa estabelecer diferenças que prejudiquem os trabalhadores pela raça, ou por credo religioso, no acesso aos empregos públicos e privados.
Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades
A preocupação em defesa da igualdade entre homens e mulheres, como princípio fundamental que norteia suas ações, programas e medidas internacionais, é reafirmada na declaração da 26a reunião de Filadélfia, em 1944 (EUA), quando são enunciados os fins e os objetivos da OIT7. Nesta Conferência de Filadélfia, os países membros da OIT reafirmam o preâmbulo construído em 1919, que atualiza seu ideário internacional. Persegue a justiça social, incluindo as melhorias das condições de trabalho, as regras de determinação da jornada de trabalho, a favor da luta contra o desemprego, pela garantia de um salário vital adequado, pela proteção contra as doenças. Mas também pelo reconhecimento do princípio de salário igual para trabalho de igual valor. É nesta busca de fortalecer um regime de trabalho realmente humano que emerge a proposta da igualdade entre os sexos.
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Logo após a Segunda Guerra Mundial, muitas das propostas em favor da igualdade se consubstanciam em políticas com força normativa na medida em que a legislação internacional – as convenções e recomendações – consegue imprimir inovações à regulamentação dos direitos em nível nacional em vários países.
Por que salário igual? Referências históricas O período entre 1944 e 1950 que precede a redação da Convenção número 100 abre um novo cenário, marcado pela reorganização do emprego na transição entre a guerra e a paz8. Para a Europa, a análise do Anuário de Estatísticas Internacional da Sociedade das Nações mostra que há algumas distinções marcantes9. De um lado, os países do Norte, sobretudo Dinamarca, Suécia, Noruega, Inglaterra e Finlândia, países industrializados desde meados do século XX, verificam aumento de mulheres no mercado de trabalho, mesmo com uma leve variação nos anos 30. Por outro lado, na Europa do Sul a tentativa é superar patamares menores. Na Grécia, Itália e Espanha a incorporação é mais lenta.
Nos Estados Unidos, já a Primeira Guerra Mundial tinha oferecido uma abertura ao problema da condição feminina. O aumento da demanda do trabalho determinado pelo desenvolvimento da indústria de guerra abriu espaços até então considerados exclusivamente masculinos. É o caso da produção de equipamentos para o transporte e a indústria de máquinas, onde as mulheres chegam a representar mais de 20% da mão-de-obra10. Sem dúvida, a evolução das condições industriais, econômicas e sociais modifica os desafios para a proposta de igualdade salarial que, aliás, dialoga nesta década com novos recursos em matéria de educação, qualificação profissional e, consequentemente, com procedimentos para proporcionar a eqüidade de tratamento entre homens e mulheres. Desde então, as atividades e as normas elaboradas pela OIT, como pautas internacionais, fazem-se mais operacionais, incorporando novas aquisições colocadas à disposição pelos estudos e diagnósticos realizados pelas comissões e comitê especializados, que se debruçam nas análises comparativas internacionais. Após ter revisado as recomendações e convenções sobre o trabalho noturno das mulheres, o trabalho na agricultura, o trabalho nas minas, o emprego em fase de transição da guerra à paz, ter proporcionado até algumas revisões parciais sobre estas temáticas, a OIT, em 1951, redige a Convenção número 100 e a recomendação número 90 sobre a igualdade de
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É importante lembrar que em 1944 a OIT/ILO define que a paz permanente, baseada na justiça social, se realiza reconhecendo que “Todos os seres humanos, sem distinção de raça, credo, sexo, têm o direito de perseguir seu bemestar material e seu desenvolvimento espiritual em condições de liberdade e dignidade, de segurança econômica e em igualdade de oportunidades”. Mais ainda: “obter as condições que permitem chegar a este resultado deve constituir o propósito central da política nacional e internacional”. Em sua constituição, preocupa-se em “examinar e considerar, tendo em pauta este objetivo fundamental, todo programa ou medida internacional de caráter econômico e financeiro” (ver Constituição OIT/ILO www.ilo.org). 8 Uma boa síntese das diferentes iniciativas desde 1919 até 1994 pode ser recuperada consultando o artigo de M. Gaudier, “La question des femmes a OIT et son evolution 1919- 1994”, Institut Internacional d’Etudes Social. OIT, ver www.ilo.org/femme. 9 Ver R.M Lagrave, “Una emancipacíon bajo tutela. Educacíon, trabajo de las mujeres en el siglo XX”, Historia de las Mujeres, vol. 10. 10 Ver o relato de Etta Olgiati, “Le politiche di equitá salariale negli Stati Uniti”, Universitá degli Studi, Milano 1990.
O princípio de igualdade de remuneração para a OIT tem como referência o salário igual para trabalhos de igual valor, que é aplicado para o setores privado e público, para a indústria e os serviços. Na Recomendação número 90 há uma específica sugestão a fim que os governos assegurem a aplicação deste princípio para os empregados do setor público, enquanto encoraja que este direito possa ser aplicado também para outros setores não-públicos. As formatações da Convenção número100 e da Recomendação número 90 podem ser compreendidas de duas formas. Não só levando em consideração as repercussões do segundo conflito mundial que tinha, mais uma vez, solicitado uma abertura à incorporação das mulheres nas atividades produtivas externas aos lares. Mas, sobretudo, por reverter as profundas distorções nos níveis de remuneração entre homens e mulheres. Naquele momento, são evidenciados alguns aspectos, hoje considerados tradicionais da desigualdade: a tendência a separar os homens e as mulheres em ocupações distintas – a assim chamada segregação horizontal – e a tendência a designar lugares distintos dentro de uma mesma ocupação ou grupo de ocupações – a assim chamada segregação vertical. As demandas provindas dos fóruns e das organizações das mulheres já tinham incluído a igualdade salarial como uma plataforma, mas até então parecia bem mais um anseio que uma realidade. A substituição da mão-de-obra masculina pela feminina estava em curso. Também havia o próprio aumento do seu efetivo no mercado de trabalho, sobretudo industrial, paralelo ao aumento do contingente das mulheres jovens nos setores de serviços, no setor público, na administração e nos escritórios. Nos anos 50, evidenciava-se que podia haver sempre mais espaços de incorporação produtiva para as mulheres, sem por isso colocar em discussão a tradicional prática empresarial de remunerar diferentemente homens e mulheres. A idéia do trabalho feminino como forma de complementação do orçamento familiar, a percepção de uma maior irregularidade dos vínculos de emprego, o próprio paternalismo que carateriza as modalidades de gestão das empresas, a menor
preparação profissional, eram, entre muitas, algumas das tantas justificativas que argumentavam a favor da diferenciações salariais entre os sexos. Mais ainda, é irrefutável, o registro nas estatísticas de emprego desta época da grande segregação horizontal, provas de comportamentos, atitudes, perspectivas empresariais que mantinham para homens e mulheres espaços de competências distintos, preservando dois pesos e duas medidas para calcular até o nível salarial. Assim, além de uma marca da sexualização profissional das competências que permitia diferenciar as remunerações, havia uma subestimação dos saberes técnicos e das responsabilidades que atingiam de forma desfavorável sobretudo as mulheres. Nos Estados Unidos, o baixo custo do trabalho das mulheres – pouco mais de 50% do trabalho dos homens – coloca para o Ministério do Trabalho a necessidade de instituir o Women’s Bureau, para recolher informações e pesquisas sobre a condição feminina. A economia parece assim reforçar a prática de distribuir os sexos com uma lógica da segmentação da mão-de-obra e a divisão sexual do trabalho segundo dados “naturais”. Se a economia de guerra tinha feito progredir o campo técnico desenvolvendo, por exemplo, os centros e universidades de engenharia, encontramos não mais de algumas centenas de mulheres engenheiras, químicas, em cada país. Mas no setor dos serviços a ordem sexual estabelece uma bipolaridade dos empregos, evidenciando uma segregação vertical a partir da profunda hierarquia interna das profissões. Como bem sintetiza Rose Marie Lagrave, o ideário deste período pode ser evidenciado num retrato com quatro imagens: a jovem mulher que pode escapar da condição de operária e camponesa empregando-se como enfermeira, secretária, professora ou no amplo setor dos serviços; as mulheres casadas e com filhos, que redescobrem os encantos da casa e da família; e as jovens da burguesia, convertidas em intelectuais, que negociam seu título num mercado de trabalho matrimonial. Por último, o reverso da medalha, as mulheres operárias. Esses protótipos vão configurando assim fronteiras hierárquicas onde há setores feminilizados no comércio, nos bancos, nos serviços para a coletividade e para o privado, enquanto os homens
Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades
remuneração, seguida , em 1952, pela Convenção número 103 sobre a proteção à maternidade.
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progridem nas qualificações profissionais técnicoindustriais e lideram os quadros hierárquicos11.
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A reivindicação de igual salário para igual valor tem sem dúvida raízes antigas que se assentam ainda no século passado, no interior dos movimentos para o voto feminino, nas plataformas dos reformistas e nas reivindicações do próprio movimento sindical. Um exemplo, nos Estados Unidos, é dado pela ação da National Labor Union, que se declara em 1868 a favor de salário igual para igual trabalho. Para as organizações sindicais, esta demanda se insere num panorama reivindicatório que ressalta a preocupação mais ampla sobre as conseqüências sociais negativas do processo de industrialização baseado no laisserfaire e sobre a necessidade de definir sobre ele um controle social. Dele deriva a proposta de tutela do trabalho das mulheres para preservar o “futuro da raça”. Neste momento específico, a paridade salarial não atingia a proposta da igualdade de oportunidade, mas se conformava ao objetivo de solucionar os problemas sociais como a pobreza, a moralidade e a saúde das mulheres, com a meta final de garantir seu papel reprodutivo. Para os sindicatos de então, a paridade salarial protegia indiretamente os trabalhos e as retribuições dos homens da concorrência de baixos salários femininos, aliviando assim as condições de pobreza da classe operária. Mais ainda, nos Estados Unidos, o sindicato tinha a convicção que a paridade remunerativa ajudaria a frear a possibilidade da redução salarial com a entrada das mulheres. Este cálculo se apoiava na idéia de que a disparidade salarial entre os sexos danificaria as conquistas sindicais conseguidas a partir da revolução industrial12. Ainda no contexto da Segunda Guerra Mundial, não podemos deixar de lembrar que as políticas em voga entre os empregadores implementavam uma distância de mais de 50% entre os salários das mulheres e a dos homens. Isto favorecia a substituição da contratação de homens por mulheres, sobretudo na industria eletro-mecânica. A concorrência desleal (“unfair competitive practice”) se evidencia em muitas estratégias empresariais que argumentavam e justificavam a menor remuneração das mulheres pelos assim chamados fatores sociais: o diferente grau de produtividade, o caráter transitório do trabalho feminino, a relativa instabilidade da presença das mulheres na indústria, entre outros. O primeiro caso onde o princípio de paridade salarial é sancionado
em nível federal acontece nos Estados Unidos, quando em 1942 há um conflito entre a United Automobile Workers e a empresa General Motors. A entidade sindical, ao denunciar a arbitrariedade com a qual são estabelecidos os limites entre trabalho masculino e feminino, dá origem ao primeiro caso de demanda de salário igual para trabalho de valor comparável, isto é, equal pay for work of comparable worth13. Com este caso, há uma primeira definição da proposta: “...sobre a base da comparação do conteúdo dos trabalhos em termo de capacidade, de esforço e de responsabilidade se evidencia que os trabalhos realizados tradicionalmente por mulheres são pagos menos do que aqueles realizados pelos homens e que esta sub-remuneração, que é sua conseqüência, constitui uma discriminação baseada no sexo”.14
A desigualdade de remuneração: um debate não só terminológico De posse dessas referências históricas, a Convenção nº 100 assume uma importância estratégica, na medida em que não só continua seguindo uma antiga pauta, salário igual para trabalho igual, mas avança, incorporando o parâmetro: salário igual para trabalho de igual valor. Isto é, conscientes de que há uma profunda segmentação profissional e desigualdade no plano das escolhas e itinerários profissionais entre homens e mulheres, os países membros da OIT passam a propor que sejam definidos parâmetros da remuneração de trabalhos de igual valor, superando a indicação da igual remuneração simplesmente para trabalhos iguais. Esta passagem exige novos conteúdos que estão na base da tradição que diferencia o valor econômico dado ao trabalho de mulheres e homens.
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Ver R.M. Lagrave, “Una emancipacíon bajo tutela. Educacíon, trabajo de las mujeres en el siglo XX”, Historia de las Mujeres, vol. 10, pag 94 e sgs. 12 Recuperamos as anotações de Etta Olgiati quando aponta que nos EUA já na Primeira Guerra Mundial dois organismos federais, WAR LABOR BOARD e a U.S. Railway Administration, sustentam o princípio da paridade salarial . Op.cit. pag 28.a 13 Ver Etta Olgiati op.cit. pag 33 e R. Milkman 1985 “Women Workers, feminist and the labor movement”, in Women, Work and Protest. NÚMERO York, Routledge & Kegan Paul. 14 Ver Etta Olgiati op.cit. pag 35, quando cita W. Newman e J NÚMERO Volhof: “separate but equal” Job segregation and pay equity in the wake of Gunther. In Labor Law Review vol.2, 1981.
A diferença no capital humano Nos anos 80, teve início um intenso debate entre sociólogos e economistas americanos sobre como a distância de pagamento entre homens e mulheres pode provir das diferenças de capital humano. O capital humano considera que as rendas refletem um retorno econômico a um capital adquirido através da educação, treinamento e experiência, ou pelas características pessoais – jeito de ser, força, inteligência – consideradas inatas e/ ou originadas da socialização. O capital humano faz referência a um investimento – um custo contraído – com a perspectiva de rendas mais altas no futuro. Para os economistas, o capital humano foi definido como a “analogia entre a habilidade e o equipamento capital”15. A renda de um trabalho tenderia a refletir os custos despendido para uma quantia de capital humano exigidos pelo desempenho do trabalho. Assim, como uma máquina tem um custo, o capital humano também tem; uma quantia tem que ser paga por este investimento. Há uma espécie de sacrifício durante o tempo gasto na escola ou no treinamento que oferece um retorno quando o indivíduo se insere sucessivamente no mercado de trabalho. Assim, a diferença nos níveis de renda entre um trabalhador com aptidões específicas e outro trabalhador sem estas aptidões pode ser, metaforicamente, descrita como o “retorno” do investimento em treinamento que gerou tal aptidão. Em teoria, cada pessoa cuidadosamente calcula se é válido fazer um certo investimento em seu capital humano. A economista Barbara Bergmann,(1986) criticando esta perspectiva, levanta várias argumentações para desmistificar o capital humano como capaz de fomentar a distância salarial16. Para ela, os economistas têm uma tendência a supervalorizar a responsabilidade deste capital para entender todas as diferenças de renda. Seguindo Barbara Bergmann, mesmo que as mulheres tenham uma certa desvantagem em
relação aos anos de experiência, à educação, ao treinamento, a prática demonstra que a diferença salarial continua presente quando homens e mulheres estão acumulando a mesma quantia de capital humano. Assim, a razão de possíveis diferenças salariais só pode ser dada pela marca da discriminação. A análise estatística de regressão múltipla tem apontado alguns resultados nesta direção. Por exemplo, em 1979, Mary Corcovam e Gregory J. Duncan, da Universidade de Michigan 17 – com uma amostra de 5.212 americanos assalariados – evidenciou que 2% da diferença salarial é devida ao fato de que os homens têm um pouco mais de educação que as mulheres. Bem mais importantes são outros resultados a favor dos homens: a) b)
c)
d) e) f)
11% tem como referência os benefícios oriundos de treinamento extra; a diferença entre homens e mulheres em relação a anos fora do mercado de trabalho realmente conta 6% para a distância salarial; 8% dessa distância pode ser atribuída ao fato de as mulheres terem uma maior proporção de trabalho de meio expediente; 12% da distância pode ser deduzida do fato de as mulheres terem menos anos de trabalho; 3% ficam por conta da experiência que os homens têm com trabalhos anteriores; 3% pode ser atribuído à falta de prioridade que as mulheres dão ao trabalho – falta por motivos pessoais.
O resultado dessa pesquisa ressalta que o capital humano não tem toda a responsabilidade pela distância salarial. Para B. Bergmann, se 45% dessas dimensões fazem referência ao capital humano, os 55% restantes podem ser atribuídos à discriminação de gênero.
A diferença no trabalho desejado Alguns autores têm considerado que existem diferenças de trabalho e renda que podem ser 15
Retomamos aqui o debate entre a socióloga B. Bergmann e os economistas americanos, entre outros G. BECKER. Consultar G. Becker Human Capital, New York 1964 16 Nos referimos ao livro de Barbara Bergmann THE ECONOMIC EMERGENCE OF WOMEN, New York, 1986 17 Mary Corcovam e Gregory J. Duncan, “Work history, labor force attachment and earnings differences between the race and sexe” Journal of Human Resources vol XVI 1979.
Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades
Seguindo as sugestões de M. Gunderson, (1994) a desigualdade de remuneração entre homens e mulheres pode fazer referência, entre outros, a estes elementos: a diferença no capital humano; a diferença no trabalho desejado;a diferenças no trabalho disponível.
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atribuídas ao sexo, devido à escolha pessoal das próprias mulheres. Quando os economistas conservadores negam a importância da discriminação social, amparam-se na idéia de que a distância de pagamento é causada pela falta de devoção das mulheres ao trabalho. Eles afirmam que a mulher têm menos competência e compromisso, que a mulher não está à disposição para locomoção e treinamento; interrompe sua carreira para ter filhos e cuidar deles18. Gary Becker chega a afirmar que as mulheres estão muito cansadas dos trabalhos já feitos em casa e não produzem o suficiente ao chegar no trabalho. Solomon Polachek (citado por Bergmann) sugere que a distância das rendas entre os sexos se dá porque as mulheres escolhem trabalhos que são fáceis para sair e reentrar no mercado de trabalho. Consequentemente, esses trabalhos, por não exigir tanto compromisso, têm menor remuneração.
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Muito além dessas observações, pode-se reconhecer que todo trabalho carrega uma marca de gênero. Isto é, os trabalhos são emblemas de gênero porque alguns mostram e confirmam a “feminilidade” da mulher, e outros mostram e confirmam a “masculinidade” dos homens. Consequentemente, para Bergmann, a maioria das mulheres evita a dor de serem rotuladas como trabalhadoras “não-femininas”. Parece que muitas delas se conformam com os padrões exigidos até mesmo em sua estética, com relação a corte de cabelo, maquiagem e sapatos altos, por exemplo. Se é possível considerar que há fatores surgindo do lado de fora do mercado de trabalho (ex.: dentro de casa, ou nas instituições educacionais), a desigualdade de pagamento é importante. Para Bergmann, são os trabalhos diferentes que podem aumentar mais a distância entre os salários. Esta segregação, diz a autora, parte desde a infância, quando as crianças já vão tendo em mente quais são os trabalhos das meninas e quais são os dos meninos, para que em cima disso elas possam começar a cultivar o desejo de desempenhar tal função. Finalmente, Bergmann, refuta que as diferenças salariais decorrem dos trabalhos desejados, sugerindo outras explicações. Os homens e as mulheres não estão competindo no mesmo mercado. Os homens e mulheres estão vendendo seu capital humano em mercados
segregados. Para a autora há um mercado separado para cada sexo. Nas diferenças sobre os trabalhos de homens e mulheres, é patente o fato que os trabalhos masculinos têm mais oportunidades de uma longa ascensão do que os femininos. Os trabalhos da mulher, em geral, não dispõem de um futuro promissor que a levará para o topo da hierarquia de sua empresa. Pelo contrário, ela estará sempre sujeita a posições que são supervisionadas por homens.
Diferenças dos trabalhos disponíveis As qualificações das pessoas são uma parte importante da história da oferta e demanda. No Estados Unidos, as mulheres ganhavam – na década de 80 – cerca de 60% do que os homens ganhavam. Na realidade do mercado de trabalho americano, na década anterior, as mulheres exerciam praticamente a metade das funções dos chamados “trabalhos de homens”. Mesmo com a diminuição desta segregação entre as décadas de 70 e 80, as diferenças de pagamento ainda existem dentro do mesmo grupo ocupacional. Para B. Bergmann, esta diferença se dá: 1. 2.
3.
porque as mulheres estão segregadas em setores de menor remuneração dentro do grupo; porque os empregadores somente contratam homens para trabalhos com remuneração acima da média; e pelo próprio hábito de os empregadores pagarem homens e mulheres com trabalhos similares, de formas diferentes.
Ao afirmar que a discriminação é o que mantém homens e mulheres em mercados separados, é reconhecido que os próprios empregadores fomentam as discriminações, preferindo perpetuar a inserção das mulheres em “trabalhos de mulher”. Eles incorporam, apoiam, reproduzem e inovam os estereótipos de gênero, restringindo a entrada das mulheres em certos trabalhos, ou segregando-as em outros. Existem vários fatores que influenciam os costumes e os regras organizacionais nas empresas. O estudo destes tem mostrado a importância das relações sociais subordinadas no locais de trabalho, enfatizando a dominação e subordinação baseada
18
Ver as argumentações enunciadas por M. Gunderson op.cit. pag 5/ 15
em características como raça, idade, estrato social e também sexo.
definido depois que o empregador decide se será preenchido por homens ou mulheres.
Há alguns exemplos que desmascaram a lógica exclusivamente econômica dos empregadores quem contrata. Esta seleção está, acima de tudo, nas mãos das pessoas responsáveis pela admissão, colocação e promoção do empregado. Estes profissionais podem, em seus comportamentos, fomentar a discriminação entre os sexos. Nos Estados Unidos, até os anos 80 ficou famosa a segregação ocupacional promovida por algumas empresas. A segregação sexual no Bell System estava explicitamente declarada em todos os manuais da companhia, acordos coletivos, descrições dos trabalhos, suas publicações, anúncios e requisição de empregados etc. Em outra firma, a Western Electric Company, havia somente 1,9% de gerentes mulheres; entre os 548 funcionários considerados profissionais, somente 6,8% eram mulheres; mas, dos trabalhos sem nenhuma qualificação exigida, 97,5% eram realizados por mulheres e somente 2,5% por homens; 141 tipos de trabalho eram oferecidos a homens e somente 47 tipos de trabalho para as mulheres; e as ocupações das mulheres sempre estavam em uma escala mais baixa de remuneração.
Como definir um salário igual? Alguns critérios
1. 2. 3.
evitar misturar mulheres e homens em lugares onde eles devem interagir como iguais; evitar mulheres supervisionando homens; reservar treinamentos para candidatos masculinos e para trabalhos masculinos de alto nível20.
Francine Blau, uma estudiosa deste tema – School of Insdustrial and Labor Relations, da Cornell University, Estados Unidos – observa que o salário para um trabalho em muitas empresas é
Segue uma segunda fase na busca de salário igual por trabalho de igual valor. É esta “a idade de bronze da igualdade de remuneração”. Teve início no começo da década de 80, estimulando um processo legislativo que ampliou a busca de igualdade salarial confrontando os trabalhos realizados por homens e mulheres. Ao estender a igualdade de remuneração pela comparando do valor das atividades, muitos legisladores estabeleceram critérios de avaliação do trabalho. Em geral, os critérios fazem referência aos anos de formação e experiência requeridas, ao nível de responsabilidade, ao caráter mais ou menos penoso das tarefas e às condições de trabalho em conjunto. Assim, graças à utilização desses parâmetros, a confrontação das ocupações é possível, sem por isso afirmar que é suficiente para efetivamente equiparar todas as características, muitas vezes complexas, da execução dos trabalhos. Finalmente, para Eyraud, os anos 90 marcam a “idade de ouro da igualdade de remuneração”, quando inauguram-se entre os legisladores as discussões para desmascarar as discriminações indiretas. Há assim uma visão ampliada que encara a discriminação no emprego. Nesta “idade de
19
Estes casos são citados no capítulo “Sex segregation on the job: the root of women’s disadvantage” in The Economic Emergence of Women, New York 1986, pag. 87/118. 20 Ver B. Bergmann op.cit. pag 138 e 139. 21 François Eyraud “Igualdad de remuneración y valor del trabajo en los países industrializados”, Revista Internacional del Trabajo, OIT, volume 112, número 2, 1993.
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Em outra empresa, a Hertz Corporation, a afirmação para justificar a segregação vertical era de que as mulheres não podiam ser promovidas porque não podiam sair para treinamento19. Para B. Bergmann, uma das maiores razões para a segregação ocupacional é que empregadores tendem a manter as mulheres em trabalhos que não as preparam para a ascensão de carreira. Ainda nos anos 80, os “códigos de segregação” evidenciavam que os empregadores raramente procuravam promover a interação entre homens e mulheres. A autora cita como exemplos algumas orientações empresariais:
A definição do salário igual para trabalho de igual valor sem dúvida é um momento importante de um longo percurso legislativo iniciado pela luta de trabalho igual para trabalho igual. Segundo François Eyraud21, esta fase pode ser vista como “a idade da pedra da igualdade de remuneração”. Na “idade da pedra”, para a autora as mulheres não só estavam ganhando menos ao fazerem os mesmos trabalho que os homens, mas, principalmente, estavam segregadas em trabalhos onde não havia a possibilidade de comparação com os homens.
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ouro” procura-se estabelecer critérios de apreciação do valor do trabalho para identificar quais são as discriminações. Eyraud apresenta como fundamental uma definição operacional do princípio de comparabilidade, mas admite ser este um momento difícil, pois, para que uma definição justa seja encontrada, é preciso avaliar o conteúdo de um trabalho, o valor de mercado, o valor do empregado de acordo com sua contribuição para a empresa. O que propõem estas opções? Diferentes experiências tem permitido identificar três critérios gerais e referências até nas argumentações de processos de litígios trabalhistas:
valor do conteúdo das tarefas valor comercial valor produzido pelos trabalhadores O valor do conteúdo das tarefas
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Este critério, o mais usado nas legislações nacionais de muitos países, faz explícita referência a alguns parâmetros para reavaliar o conjunto das ocupações pelo esforço físico e emocional, responsabilidades, formação profissional exigida, experiência acumulada e condições de trabalho.
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Quando as ocupações são atribuídas aos homens ou às mulheres, há um conjunto de dimensões econômicas, sociais e culturais que são reconhecidas como próprias do saber profissional, por parte da análise empresarial. Por que? Porque a empresa produz sua interpretação de gênero nas ocupações a ser desempenhadas no seu espaço. Na organização do trabalho variam profundamente as modalidades de execução, as condições de trabalho, as exigências demandadas pela gerência nos esforços exigidos. Em outra palavra, no local de trabalho – na empresa – circula um conjunto de dimensões – econômicas, culturais e sociais – que são referências culturais que justificam como a empresa distribui homens e mulheres nas tarefas. O estudo desta designação sexual do trabalho é uma fonte importante porque permite reconhecer que a empresa elabora suas próprias divisões entre os trabalho dos homens e os das mulheres. A literatura aponta que existem
vários parâmetros que explicitam as designações de gênero das ocupações. São relativos à: a) b) c)
d)
relações com o objeto do trabalho; relações com o espaço (a mobilidade entre casa e emprego); relações com o tempo (disponibilidade e permanência de responsabilidade entre trabalho doméstico e trabalho fora de casa); relações com o poder – as esferas de influência: a esfera doméstica, sem regras e leis, mas os costumes e as tradições – autoridade familiar; a esfera do trabalho em espaços públicos, com regras, normas e institucionalização da autoridade da empresa, da autoridade do sindicato, do Estado, etc.
O valor comercial Com este critério de eqüivalência, supõe-se que há um grau de comparação que tem validade para os dois atores sociais em disputa: os trabalhadores e os empregadores. Com este critério do valor comercial, é o mercado ou, mais ainda, a raridade que está em jogo. Numa empresa, dois empregos diferentes mas classificados como equivalentes sobre a base do sistema de avaliação das tarefas, podem ser remunerados de maneira diversa quando existe uma modificação na oferta e a demanda da qualificação exigida. Mas a argumentação que nega a possibilidade de o trabalho ser considerado uma simples mercadoria no jogo de mercado faz com que seja proibido em muitas legislações considerar o valor de mercado como critério válido para proporcionar a igualdade de remuneração entre homens e mulheres. Algumas experiências foram implementadas nos Estados Unidos, quando houve uma tendência de adaptar os critérios de classificação das tarefas às exigências de mercado.
O valor produzido pelos trabalhadores A comparação de valor do trabalho graças ao valor agregado fica sendo um critério de nãoimediata medição. Isto porque é bastante difícil imaginar indicações precisas – num contexto complexo de produção – sobre a contribuição dos trabalhadores, considerados individualmente. Mas há sem dúvida muitas práticas empresariais que oferecem incentivos, prêmios, que acabam atuando como diferenciadores nas remunerações.
Sem dúvida, não é fácil delimitar indicadores específicos, visto que o cálculo completo, não do salário de base, mas de todos os componentes de salário, pode ser de difícil averiguação em algumas legislações nacionais. A estas dificuldade se acrescenta o fato que as empresas consideram estas informações de caráter reservado e sigiloso. O estudo internacional de F. Eyraud aponta como a remuneração adjunta, os prêmios e os incentivos, pode considerar-se uma fonte discriminatória na medida em que esta se destina à categorias profissionais de trabalhadores em geral de sexo masculino. Para a autora, é de fundamental importância para reduzir as práticas discriminatórias o estudo dos sistemas de remuneração. É também válido reduzir a importância dada à simples análise do salário médio, indicador estatístico clássico, porque este não contempla a possibilidade de identificar as estratégias de diferenciação salarial entre homens e mulheres. Seguindo o desafio da OIT em definir regras internacionais de comportamento econômico a favor de direitos trabalhistas, F. Eyraud sugere que a definição de critérios e de parâmetros ainda demanda um aprofundamento estudando os procedimentos nas definições da igualdade de tratamento entre homens e mulheres. Este necessário investimento em pesquisa, segunda a autora, decorre da grande variedade das modalidades em curso na definição do sistema de remuneração por parte das empresas nos diferentes países.
Passos à frente na globalização dos direitos: a igualdade de oportunidades As considerações até agora apresentadas ofereceram indicações de como o princípio da Convenção nº 100 da OIT proporcionou diferentes reflexões sobre a igualdade de remuneração. Mas fazer referência só a Convenção nº100 seria reduzir as necessidades, os contextos, as pautas propositivas, as iniciativas em direção à globalização dos direitos entre homens e mulheres no mundo do trabalho. O empenho em perseguir a institucionalização da igualdade inclui outras convenções internacionais. Em 1952, em sua 35a reunião anual, a OIT prossegue sua política de fomento à igualdade de tratamento, escolhendo a defesa de direitos sobre a maternidade das trabalhadoras. A Convenção sobre a proteção da maternidade (nº 103) se aplica às mulheres empregadas em empresas industriais e em trabalhos agrícolas e não-industriais, incluindo até as mulheres assalariadas que trabalham em seu próprio domicílio. Este texto – que foi tema de reavaliação na reunião de junho de 2000 – estabelecia um descanso de no mínimo 12 semanas, distribuído entre períodos anteriores e posteriores ao parto. Neste período de interrupção do trabalho, a mulher tem o direito de receber um pagamento em dinheiro e assistência médica. O texto faz específica menção à assistência durante os diferentes momentos (gravidez, parto e pós-parto) e ao sistema de seguro social obrigatório com fundos públicos. Em 1954, o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas confia à OIT a tarefa de realizar um estudo sobre a discriminação em matéria de emprego e ocupação. Deste estudo nasce a elaboração da Convenção nº 111, em 1958, formulada em sua 42ª reunião. Esta estabelece o princípio internacional contra a discriminação no emprego e na ocupação, priorizando a igualdade em detrimento das diferentes formas de discriminações, entre as quais também aquelas baseadas na diferença de sexo. A OIT incorpora esta ampla temática como uma expressão já enunciada na Declaração Universal dos Direitos do Homem. Aqui, há uma definição de quais seriam as práticas consideradas discriminatórias: “Discriminação compreende qualquer distinção, exclusão ou preferência baseada em motivos de raça, cor, sexo,
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É claro que a lógica da igualdade e da nãodiscriminação não é sempre respeitada, visto que muitos requisitos para atingir a estes incentivos não são completamente transparentes. Mais ainda, fazem parte deste critério que reconhece as diferenças salariais os prêmios de antigüidade na empresa, ou as horas-extras que atuam como estímulo à produtividade e são contemplados nas legislações nacionais para diferenciar salários quando as atividades poderiam ser de fácil comparação. Em alguns estudos, é considerado que avaliar a permanência e a fidelidade à empresa pode representar uma desigualdade entre trabalhadoras e trabalhadores levando em consideração as paradas e as interrupções. No Japão, por exemplo, existe uma particular ênfase na composição do salário dada pelo tempo de emprego na empresa, que acaba protegendo o mercado interno da empresa.
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religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tem como efeito anular ou alterar a igualdade de oportunidade ou de tratamento no emprego e na ocupação. Pelos termos de emprego e ocupação, faz-se explícita referência ao acesso à formação profissional, à admissão ao emprego, e às condições de trabalho”.
Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades
Como sua finalidade, a OIT inclui nas convenções a exigência de que os governos nacionais signatários se comprometam a obter a cooperação das organizações dos empregadores e dos trabalhadores e de outros organismos na tarefa de fomentar o aceite e o cumprimento das políticas. Mais ainda, solicita que sejam promulgadas leis, corrigidas antigas disposições e promovidos programas educativos que, por sua especificidade, possam garantir a execução desta Convenção. Finalmente, obriga que os governos que a ratificam respeitem diretamente esta Convenção em todos os empregos submetidos ao controle de sua autoridade nacional22.
80
A Convenção nº 111 introduz, na cultura e nas práticas no âmbito das relações de trabalho, uma temática inovadora: a definição das discriminações que fomentam diferenciações desfavoráveis entre os/as trabalhadoras. É neste sentido que amplia-se a análise dos mecanismos que apoiam os comportamentos de aceitação e de exclusão não apenas com referência às mulheres em relação aos homens, mas também aos negros em relação aos brancos, de quem tem diferente origem social ou étnica, de quem provem de outros países de origem, das pessoas que professam distintas religiões, outras crenças ou outras opiniões políticas. A discriminação é um complexo conceito que compreende o acesso ao emprego e o exercício profissional. Considera também os momentos relativos à formação, à admissão ao emprego, às diferentes ocupações como às condições de trabalho. Isto é: “Discriminação é qualquer distinção, exclusão ou preferência (baseada em determinados motivos) que tem como efeito anular o alterar a igualdade de oportunidade ou de tratamento no emprego e na ocupação”.
Esta primeira definição, puramente descritiva, contem três elementos:
um fato – a existência de uma distinção, exclusão, preferência que, constitui uma diferença de tratamento; um motivo determinante desta distinção; um resultado objetivo de tal diferença de tratamento.
A esta definição, instituída em 1958, vários países têm acrescentando novas significações. Nos Estados Unidos, chega-se a incluir a segregação, a separação e as restrições consideradas como formas significativas de comportamento discriminatório nas medidas que diretamente e indiretamente explicitam ferir o princípio de igualdade de oportunidade. Neste sentido, a igualdade de oportunidade é um princípio que diz respeito a um direito substantivo que, chega a supervisionar até as condutas que normalmente poderiam parecer estar livres de controle, abertas à simples discrição dos atores na vida econômica e social. Mais ainda, graças a esta percepção, há a preocupação de introduzir e definir o caráter intencional da discriminação. Há assim a discriminação direta, vinculada ao caráter ilegal da diferenciação com a intenção do seu autor, como há a discriminação indireta, que define atos ou práticas de diferenciação que supõem uma vontade de praticar ou que se referem exclusivamente a um autor identificável23. A discriminação indireta se refere também a situações em que regulamentos e práticas aparentemente neutras têm como resultado alterar a igualdade em prejuízo de pessoas que apresentam determinadas caraterísticas ou que pertencem a alguns grupos com determinadas características (raça, cor, sexo, religião, inclinações e opções sexuais, caráter legítimo e ilegítimo do
22
Ver Malô S. L. Ligocki op.cit. pag. 54. Nos Estados Unidos, há referências específicas a atos e práticas discriminatórias dos empregadores, das organizações sindicais e das agências de colocação. Neste pais, é formulada a noção de “distinção suspeita”, que foi elaborada para garantir o controle da aplicação do princípio de não-discriminação pelas autoridades federais ou pelas instituições públicas. É suspeita toda e qualquer distinção que afeta um grupo que tradicionalmente é vítima de hostilidade e preconceito, colocada à margem da sociedade ou é objeto de concepções estereotipadas de tal porte que deixam grandes dúvidas de que seus interesses tenham sido adequadamente considerados no curso do procedimento legislativo.
23
A reflexão sobre as discriminações indiretas tem alimentado diferentes modalidades e interpretações nas legislações nacionais, seja estas dispositivos constitucionais, legislativos ou regulamentos, registradas no estudo realizado pela OIT em 1986. Por exemplo, no Canadá, desde 1982 a Carta dos Direitos da Pessoa denomina como discriminação sistêmica aquela que se manifesta por políticas neutras que, mesmo quando se aplicam de forma uniforme, impedem alguns grupos de ter iguais oportunidades que os demais24. Em algum país, considera-se a discriminação indireta não a partir da motivação mas das condições em que se origina. Por exemplo, na Itália, desde 1977, é chamada discriminação indireta aquela que se efetua por sistemas de pré-seleção ou veiculada pelos anúncios de oferta de emprego. Finalmente, em outros países a legislação não define a discriminação indireta, mas proíbe práticas que se podem classificar como tais. Por exemplo, na Inglaterra, desde 1975, quando alguém impõe uma exigência ou uma condição a todos os candidatos homens e mulheres, mas a satisfação da exigência só pode ser cumprida por uma porcentagem muito menor de mulheres, claramente inferior aos homens, considera-se um ato discriminatório, por lei. Algumas exigências de limite de altura mínima, de peso, de idade, podem ser casos que exemplificam esta modalidade25. Este conjunto de formulações é valioso para considerar as práticas no acesso ao emprego, na medida em que supervisionam as diferentes posturas, aparentemente livres por parte das empresas, em recrutar sua mão-de-obra. Em todos estes casos, as discriminações indiretas ampliam e aprimoram o controle sobre o leque de comportamentos a ser avaliados. Em primeiro lugar, se destacam as conseqüências da segregação na formação profissional contra as mulheres nas empresas. Segundo, se consideram que as responsabilidade “tipicamente masculinas” ou “tipicamente femininas” podem ser fruto de discriminação. Há muitas justificativas para enfatizar uma divisão sexual do trabalho, que
fomentam a produção e a reprodução na aceitação de arcaísmos, de estereótipos de gênero, que desvalorizam a capacidade profissional das mulheres. Os espaços reduzidos e segmentados das tarefas atribuídas às mulheres provêm das concepções culturais e econômicas, das preferências dos empregadores26. Num processo de progressiva abrangência, que vai desde os locais de trabalho até as políticas de instituições que colaboram com o acesso ao emprego, a OIT se dedica, em 1981, a formatar uma convenção a favor da eqüidade de oportunidades entre homens e mulheres trabalhadoras que assumem as responsabilidades familiares. Assim, na Convenção nº 156, a meta é que se corrigiam todas as situações de constrangimento ou de discriminação para os trabalhadores (homens e mulheres) que mantêm, sob sua responsabilidade, o exercício do emprego e a gestão da família. Neste caso, a Convenção chama a atenção dos governos signatários para que estes se preocupem em definir programas e medidas de desenvolvimento de serviços comunitários, a fim que uma pessoa sozinha possa conciliar a vida profissional e cumprir com as responsabilidades familiares.
A ação integrada da OIT nos anos 90 As propostas internacionais da OIT atualizam-se pela forças das mudanças no contexto do mundo do trabalho. Um dos últimos diagnósticos é explícito em evidenciar algumas novidades, lado a lado, da persistente permanência de situações de desvantagem das mulheres no mundo do trabalho. O estudo de L.L. LIM (1996) aponta para algumas renovadas constatações da natureza e das expressões da desigualdade de oportunidades entre homens e mulheres27. 1 - Apesar de que sempre mais mulheres entram no mercado de trabalho, dando conta de um aumento
24
Ver OIT, “Igualdad en el empleo y la ocupación”75 reunión, 1988, op.cit, pág. 24. 25 Ver OIT, “Igualdad en el empleo y la ocupación”75 reunión, 1988, op.cit, pág. 44 26 Ver os exemplos citados na publicação OIT 1988, op.cit. pág. 40/44. 27
Ver Lin Lean LIM, “More and better jobs for women”, OIT, 1996.
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nascimento, os antecedentes clínicos, heranças celular ou de sangue consideradas atípicas, por exemplo).
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quantitativo de sua presença, não houve um progresso qualitativo de melhoria das condições de trabalho. Os ajustamentos estruturais, a reforma econômica, a transição do planejamento da economia para a abertura dos mercados e a globalização têm exacerbado a vulnerabilidade das mulheres em várias formas de insegurança e têm, mais ainda, aumentado a marginalização e a pobreza da presença econômica das mulheres. As mais importante razões desta posição desvantajosa estão no fato que as mulheres ficam sub-representadas nas estruturas do poder econômico e em todos os níveis e áreas, incluindo as instituições produtivas e as estruturas de negociação coletiva. No contexto mundial, só 14% as mulheres ocupam cargos de alta responsabilidade na administração e na direção, e só 6% em cargos de sênior management.
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2 - Desde 1985 até hoje, mesmo com o aumento da taxa de presença, a participação tem mudado muito. Esta situação é mais agravada pela presença de formas de trabalho atípicas, que contrastam com o tempo permanente, regular e pleno de regime de trabalho. O trabalho temporário, a tempo parcial, o trabalho a domicílio, o emprego no setor informal, as formas de trabalho atípicas ou fora do padrão, expõem as mulheres a um trabalho e a uma remuneração bem mais insegura, colocando-as em perigo de vir ser marginalizadas no mercado de trabalho. Este perfil é mais grave se consideramos que todas essas formas estão associadas a um baixo salário, menores e baixos salários indiretos, ausência de direitos de proteção social e limitados investimentos em formação profissional e de ascensão e carreira. 3 - O desemprego é uma possibilidade de alto risco, que atinge com maior intensidade as mulheres. A recente recessão da economia agravou esta realidade em muitos países de economia desenvolvida e em desenvolvimento. Este problema é particularmente grave para duas faixas etárias: quem começa uma carreira e quem está prestes a se aposentar. Por um lado, a juventude e o primeiro emprego, por outro a idade madura, são momentos onde o perigo do desemprego é particularmente grave. Também deve-se considerar as difíceis experiências das mulheres, mais que dos homens, em encontrar uma reinserção, na medida em que as mulheres estão mais atingidas pelo desemprego de longa duração. Neste sentido, há uma preocupação de mostrar como delimitar o significado do
desemprego em diferentes situações – sem emprego e em busca de emprego – pode se tornar uma definição difícil e prejudicial para as mulheres desempregadas, na medida em que a busca de emprego tem estratégias muito diferenciadas entre os sexos. 4 - As desvantagens e discriminações enfrentadas pelas mulheres se vinculam bem antes e depois da entrada no mercado de trabalho. Para isso, é necessário distinguir duas situações: aquelas nas quais os empregadores não contratam ou não promovem as mulheres, ou pagam menos que os homens, baseando-se em cálculos de custos e de produtividade; e aquelas situações onde emergem preconceitos de gênero. A discriminação é assim muito complexa a ser detectada. Pode aparecer como uma suposição, uma concepção ou um preconceito decorrente das práticas dos empregadores, mas também dos familiares, da comunidade e da sociedade no que diz respeito à divisão sexual do trabalho. Esta têm suas raízes cravadas na cultura, nos credos religiosos, nas convicções da tradição. Os empregadores discriminam negativamente as mulheres, diretamente e indiretamente, através da elaboração dos critérios, dos procedimentos, das exigências em uso no local de trabalho. 5 - Os impactos e as implicações do progresso tecnológico no setores da indústria e do serviço podem ser hoje positivos como negativos. Por um lado, as oportunidades de emprego podem aumentar onde há uma ampliação de formas de subcontratação ou de atividades externas típicas nos ramos de confecções, microelêtronica. O telework, o telemarketing, são típicos exemplos desta expansão. Por outro lado, há mudanças nas habilidades requeridas pela estrutura do trabalho, com a introdução de tecnologias modernas. Essas atividades mais recentes são atribuídas sobretudo aos homens. Em geral, as mulheres acabam sendo contratadas para as faixas mais baixas desses novos lugares, que também exigem qualificação, polivalência e preparo técnico. Finalmente, as inovações tecnológicas, ao implicar mudanças das exigências de qualificações e habilidades, podem estimular a nova substituição das mulheres por homens. Assim, as mulheres tendem a ser fortemente vulneráveis nos impactos tecnológicos, considerando o fato que sua contratação é dirigida para qualificações de baixa intensidade e complexidade tecnológica.
raça, elementos étnicos, religiosos e mais amplamente ideológicos, além de ser marcados por contextos geográficos, econômicos e políticos. É com esta percepção que chega-se a afirmar que o gênero, desde quando é visto como uma construção social, não pode permitir que seja menosprezado o ambiente econômico, social e religioso. A eqüidade influencia a percepção dos papéis, das responsabilidades, dos constrangimentos, das oportunidades, das necessidades.
Não poderíamos deixar de mencionar nesta parte final deste texto algumas indicações gerais que a OIT propõe no âmbito das políticas de apoio ao emprego e à igualdade de oportunidade. As fontes e as variedade de situações de desvantagem estimulam o fomento de ações integras de programas que saibam superar as dificuldades de grupos específicos: as trabalhadoras sem qualificação, as trabalhadoras em idade madura, as trabalhadoras/mães e chefes de família. A integração de estratégias é assim uma proposta que sobressai deste relatório. Algumas importantes sugestões são enumeradas:
Por fim, L.L. LIM (1996) avança nas propostas, recuperando as políticas das Ações Afirmativas. Estas ocupam um lugar de destaque. Lembrando que as plataformas de Copenhague e Bejing haviam dado uma indicação precisa de sua importância, a autora considera as Ações Afirmativas como ações cruciais que deveriam saber envolver os governos, os empregadores, as organizações sindicais e os grupos de mulheres. Seguindo a análise dos complexos mecanismos discriminatórios – diretos e indiretos – que ainda hoje permitem que os empregadores selecionem arbitrariamente o sexo dos trabalhadores, as ações afirmativas, ao assumir as velhas conseqüências das discriminações, podem ser sugestões para implementar e monitorar as práticas que pretendem diminuir a distância econômica, social e cultural na ocupação de postos de trabalho por mulheres e homens. Estas ações podem ser adotadas pelas empresas se houver suporte legal e incentivos por parte do Estado.
procurar articular medidas de emprego com estratégias mais amplas; relacionar discriminações e desvantagens enfrentadas pelas mulheres para evitar os processos cumulativos que separam as mulheres dos homens; coordenar ações econômicas, institucionais, legislativas e práticas de sensibilização; reconhecer sempre os papéis inseparáveis das mulheres entre produção e reprodução ajuda a promover uma melhor harmonização entre trabalho e responsabilidades familiares; os esforços de coordenação e de cooperação entre níveis diferentes de gestão dos governos – internacional, nacional e local – as organizações dos trabalhadores e dos empregadores, as outras instituições nãogovernamentais e os grupos comunitários devem ser claramente estimulados para permitir o envolvimento de mais atores e sua mobilização a mais longo prazo.
Seguindo a autora (1996) a integração dessas estratégias é hoje uma necessidade premente, visto que as tradicionais medidas de proteção ao sexo não esgota as formas de ação possíveis. Com efeito, os papéis de gênero são afetados pela idade, classe,
Sem dúvida o percurso por nos traçado evidencia que desde o início deste século a configuração internacional da OIT tem proporcionado o ambiente para que se assentem as condições de promoção da igualdade de oportunidade no mundo do trabalho. Fica também evidenciado que o processo de globalização dos direitos, como regulação internacional não é concluído. Deves-se considerar que as estruturas diferenciadas de remuneração enfrentam múltiplos obstáculos que se assentam em procedimentos tradicionais de preferencias e de comportamentos dos empregadores que fazem aparecer a disparidade salarial como topo de um iceberg. Se seus contornos são de fácil percepção, difícil é visualizar de imediato sua complexa configuração. A progressão das convenções e a diversidade dos mecanismos desenhados pelos diferentes países comprovam como as políticas de igualdade de
Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades
Decorrente desses achados, L.L. LIM (1996) sublinha que é necessário evidenciar hoje, mas que nunca, que há uma composição cumulativa de desvantagens que atinge as mulheres. O reconhecimento de que alguns processos em curso – reestruturação industrial, desregulamentação do mercado de trabalho, impactos dos ajustamentos estruturais – sugerem um maior cuidado na análise dos balanços sobre aumento ou redução da taxa de ocupação entre homens e mulheres.
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Globalizando os direitos: do salário à igualdade de oportunidades
oportunidades devem se assentar na analise das configurações das relações e condições de produção aliados ao estudo dos mecanismos de contratação e gestão empresarial. As profundas modificações decorrentes dos processos de restruturação das economias nacionais, da flexibilidade e falta de transparências dos sistemas de remuneração nas empresas, mantêm vivo o desafio de elaborar e identificar critérios adequados para reagir à globalização econômica com a globalização dos direitos.
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A globalização das políticas de promoção da igualdade de remuneração mostram como seja sempre mais necessário hoje agir numa dupla direção: identificar as áreas e os mecanismos de intervenção nos locais de trabalho e, de outro, fortalecer a articulação de critérios nacionais e internacionais de promoção de direitos. Só agindo contemporaneamente na formatação de políticas de empregos nacionais e internacionais será possível vislumbrar um lento processo de regulação social no qual os direitos vão se globalizando.
CONVENÇÃO N°- 100 DA OIT sobre a igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, Convocada em Genebra pelo Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho e reunida, em 6 de junho de 1951, em sua Trigésima Quarta Reunião; Tendo decidido adotar proposições relativas ao princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor, o que constitui a sétima questão da ordem do dia da reunião;
fixação de tabelas de remuneração, e, na medida de sua compatibilidade com esses métodos, assegurar a aplicação, a todos os trabalhadores, do princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor. 2. Esse princípio pode ser aplicado por meio de: a) b) c) d)
Tendo decidido que essas proposições se revistam da forma de uma convenção internacional, adota, no dia vinte de junho do ano de mil novecentos e cinqüenta e um, a seguinte convenção que pode ser citada como a Convenção sobre a Igualdade de Remuneração, de 1951:
leis ou regulamentos nacionais; mecanismos legalmente estabelecidos e reconhecidos para a fixação de salários; convenções ou acordos coletivos entre empregados e trabalhadores, ou a combinação desses meios.
Artigo 3º 1. Quando esta ação facilitar a aplicação das disposições desta Convenção, medidas serão tomadas para promover uma avaliação objetiva de empregos com base no trabalho a ser executado.
Para os fins desta Convenção: a)
b)
o termo “remuneração” compreende o vencimento ou salário normal, básico ou mínimo, e quaisquer vantagens adicionais pagas, direta ou indiretamente, pelo empregador ao trabalhador em espécie ou in natura, e resultantes do emprego; a expressão “igual remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor” refere-se a tabelas de remuneração estabelecidas sem discriminação baseada em sexo.
2. Os métodos a serem seguidos nessa avaliação serão decididos pelas autoridades responsáveis pela fixação de tabelas de remuneração ou, onde forem fixadas por convenções, acordos ou contratos coletivos, pelas partes contratantes. 3. As diferenças entre as tabelas de remuneração, que correspondem, sem consideração de sexo, a diferença no trabalho a ser executado, conforme verificadas por essa avaliação objetiva, não serão consideradas como contrárias ao princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor.
Artigo 2º Artigo 4º 1. Todo País-membro deverá promover, por meios apropriados aos métodos em vigor para a
Todo País-membro deverá colaborar, com as
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Artigo 1º
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organizações de empregadores e de trabalhadores interessadas, da maneira mais conveniente para fazer cumprir as disposições desta Convenção.
Artigo 5º As ratificações desta Convenção serão comunicadas, para registro, ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho.
Artigo 6º 1. Esta Convenção obrigará exclusivamente os Países-membros da Organização Internacional do Trabalho cujas ratificações tiverem sido registradas pelo Diretor Geral. 2. Esta Convenção entrará em vigor doze meses após a data em que as ratificações de dois Países-membros tiveram sido registradas pelo Diretor Geral. 3. A partir de então, esta Convenção entrará em vigor para qualquer País-membro doze meses após a data do registro de sua ratificação.
Artigo 7º 1. As declarações enviadas ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho, nos termos do Parágrafo 2 do Artigo 35 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, indicarão:
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a)
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b)
c)
d)
os territórios a respeito dos quais o Paísmembro interessado compromete-se a aplicar, sem alterações, as disposições desta Convenção; os territórios a respeito dos quais assegura que as disposições da Convenção serão aplicadas, embora sujeitas a modificações, juntamente com os detalhes das ditas modificações; os territórios a respeito dos quais a Convenção é aplicável e, nesse caso, as razões de sua inaplicabilidade; os territórios a respeito dos quais adia suas decisões para uma avaliação mais profunda da situação.
2. Os compromissos a que se referem as alíneas a) e b) do Parágrafo 1 deste Artigo serão considerados como parte integrante da ratificação e produzirão os mesmos efeitos.
3. Todo País-membro, com base nas alíneas b), c) ou d) do Parágrafo 1 deste Artigo, poderá cancelar, em qualquer tempo, no todo ou em parte, por uma declaração subsequente, quaisquer restrições feitas em sua declaração anterior. 4. Todo País-membro poderá, em qualquer tempo em que a Convenção estiver sujeita à denúncia, de acordo com as disposições do Artigo 9º, enviar ao Diretor Geral declaração que modifique em qualquer outro sentido os termos de qualquer declaração anterior e informe sobre a situação atual desses territórios especificados.
Artigo 8º 1. As declarações enviadas ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho, nos termos do Parágrafo 4 ou 5 ou do Artigo 35 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, indicarão se as disposições serão aplicadas no território concernente sem modificações ou sujeitas a modificações; quando a declaração indicar que as disposições da Convenção serão aplicadas sob reserva de modificações, especificarão as modificações. 2. O País-membro ou os Países-membros ou uma autoridade em causa poderão, em qualquer tempo, por declaração subseqüente, renunciar total ou parcialmente ao direito de invocar qualquer modificação indicada em declaração anterior. 3. O País-membro ou os Países-membros ou uma autoridade internacional em causa poderão, em qualquer tempo em que esta Convenção estiver sujeita a denúncia, de acordo, com as disposições do Artigo 9º, enviar ao Diretor Geral declaração que modifique em qualquer outro sentido os termos de qualquer declaração anterior e informe sobre a situação atual com referência à aplicação da Convenção.
Artigo 9º 1. O País-membro que ratificar esta convenção poderá denunciá-la ao final de um período de dez anos, a contar da data de sua entrada em vigor, mediante comunicação, para registro, ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho. A denúncia não produzirá efeito antes de se completar um ano a contar da data de seu registro.
Artigo 12º Quando considerar necessário, o Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho encaminhará relatório à Conferência Geral sobre desempenho desta Convenção e examinará o conveniência de incluir na ordem do dia da Conferência a questão de sua revisão total ou parcial.
Artigo 10º 1. O Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho dará ciência a todos os Países-Membros da Organização do registro de todas as ratificações, declarações e denúncias que lhe forem comunicadas pelos Paísesmembros da Organização. 2. Ao notificar os Países-membros da Organização sobre o registro da segunda ratificação que lhe tiver sido comunicada, o Diretor Geral lhes chamará a atenção para a data em que a Convenção entrará em vigor.
Artigo 11º O Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho comunicará ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, para registro, em conformidade com o Artigo 102 da Carta das Nações Unidas, informações circunstanciadas de todas as ratificações, declarações e atos de denúncia por ele registrados, nos termos do disposto nos artigos anteriores.
Artigo 13º 1. No caso de adotar a Conferência uma nova convenção, que reveja total ou parcialmente esta Convenção, a menos que a nova convenção disponha de outro modo: a)
b)
a ratificação, por um País-membro, da nova convenção revista implicará, ipso jure, a partir do momento em que entrar em vigor a Convenção revista, a denúncia imediata desta Convenção, não obstante as disposições constantes do Artigo 9º supra; a partir da data de entrada em vigor da convenção revista, esta Convenção deixará de estar sujeita a ratificação pelos Países-membros.
2. Esta Convenção continuará de qualquer maneira em vigor, na sua forma e conteúdo, para os Países-membros que a ratificarem, mas não ratificarem a Convenção revista.
Artigo 14º As versões em inglês e francês do texto desta Convenção são igualmente oficiais.
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2. Todo País-membro que ratificar esta convenção e que, no prazo de um ano após expirado o período de dez anos referido no parágrafo anterior, não tiver exercido o direito de denúncia previsto neste Artigo, ficará obrigado a um novo período de dez anos e, daí em diante, poderá denunciar esta Convenção ao final de cada período de dez anos, nos termos deste Artigo.
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RECOMENDAÇÃO Nº- 90
sobre a igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, Convocada pelo Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho e reunida, em junho de 1951, em sua Trigésima Quarta Reunião; Tendo decidido adotar proposições relativas ao princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor, o que constitui a sétima questão da ordem do dia da reunião;
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Tendo decidido que essas proposições se revistam da forma de uma recomendação que suplemente a Convenção sobre a Igualdade de Remuneração, de 1951, adota, neste dia vinte e nove de junho do ano de mil novecentos e cinqüenta e um, a seguinte Recomendação que pode ser citada como a Recomendação sobre a Igualdade de Remuneração, de 1951:
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Considerando que a Convenção sobre a Igualdade de Remuneração, de 1951, estabelece certos princípios gerais a respeito da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor; Considerando que a convenção dispõe que a aplicação do princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor será promovida ou assegurada por meios adequados aos métodos em vigor para definir tabelas de remuneração nos países em questão; Considerando a conveniência de indicar alguns procedimentos para a progressiva aplicação dos princípios estabelecidos pela Convenção;
Considerando ser também conveniente que todos os Países-membros, ao aplicar esses princípios, levem em conta os métodos de aplicação tidos como satisfatórios em alguns países, a Conferência recomenda que todo País-membro aplique, nos termos do Artigo 2º da Convenção, as seguintes disposições e relate ao secretariado da Organização Internacional do Trabalho, conforme requer o Conselho de Administração, as medidas tomadas para lhes dar cumprimento: 1. Medidas adequadas devem ser tomadas, após consulta às organizações de trabalhadores concernentes ou, onde não as houver, aos trabalhadores interessados: a)
b)
para assegurar a aplicação do princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor a todos os empregados de departamentos ou órgãos da Administração pública; para incentivar a aplicação do princípio a empregados de departamentos ou órgãos de governos estaduais, provinciais ou locais, quando competentes para fixar tabelas de remuneração.
2. Medidas adequadas devem ser tomadas, após consulta às organizações de empregadores e de trabalhadores interessadas, para assegurar, tão rápido quanto possível, a aplicação do princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor em todas as ocupações, além daquelas mencionadas no Parágrafo 1, em que tabelas e remunerações estejam sujeitas a regulamento estatutário ou a controle público, especialmente com relação: a)
à fixação de tabelas de salário mínimo ou de outros nas indústrias e serviços em que essas tabelas são determinadas pela autoridade pública;
c)
a indústria e empresas operadas como propriedade ou sob controle públicos, e se for o caso, a trabalho executado nos termos de contratos públicos.
3. (1) Nos termos dos métodos em vigor para a fixação de tabelas de remuneração, deve ser provida, por dispositivo legal, a aplicação geral do princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor. (2) A autoridade pública competente deve tomar todas as providências necessárias e apropriadas para assegurar que empregadores e trabalhadores sejam plenamente informados sobre essas exigências legais e, quando for o caso, sejam assessorados na sua aplicação. 4. Quando, após consulta às organizações de trabalhadores e empregadores interessadas, onde as houver, não parecer viável implementar imediatamente o princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor, com relação a emprego mencionado pelos Parágrafos 1, 2 ou 3, medidas adequadas devem ser ou fazer que sejam tomadas, tão logo quanto possível, para sua progressiva aplicação, com o fim de: a)
b)
diminuir as diferenças entre tabelas de remuneração de homens e tabelas de remuneração de mulheres por trabalho de igual valor; onde houver um sistema de aumentos em vigor, prover aumentos na mesma proporção para homens e mulheres trabalhadores que executem trabalho de igual valor.
5. Para facilitar a fixação de tabelas de remuneração, de acordo com o princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres por trabalho de igual valor, todo País-membro deve, com a anuência das organizações de empregadores e de trabalhadores interessadas, estabelecer ou estimular, quando for o caso, o estabelecimento de métodos para uma avaliação objetiva do trabalho a
ser executado, pela análise da ocupação ou por outros procedimentos, com vista à classificação de ocupações sem consideração de sexo; esses métodos devem ser aplicados de acordo com as disposições do Artigo 2º da Convenção. 6. Para facilitar a aplicação do princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor, devem ser tomadas, quando necessário, para aumentar a eficiência produtiva de mulheres trabalhadoras, medidas como: a)
b)
c)
d)
assegurar que trabalhadores de ambos os sexos tenham facilidades iguais ou equivalentes de orientação profissional ou de profissional ou de aconselhamento de emprego, de formação profissional e classificação; prover meios adequados para estimular as mulheres a fazer uso das facilidades de orientação profissional ou de aconselhamento de emprego, de formação profissional e de classificação; prover serviços sociais e de bem-estar que atendem às necessidades de mulheres trabalhadoras, particularmente daquelas que têm encargos de família, e financiar esses serviços com fundos públicos ou com recursos da seguridade social ou do bem estar industrial providos por investimentos em benefício dos trabalhadores, sem distinção de sexo, e promover a igualdade de homens e mulheres trabalhadores com relação ao acesso a profissões e empregos, sem prejuízo das disposições de regulamentos internacionais e de leis regulamentos nacionais concernentes à proteção da saúde e do bem-estar das mulheres.
7. Todo esforço deve ser feito para promover a compreensão, pela opinião pública, das razões por que deve ser aplicado o princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor. 8. Pesquisas oportunas devem ser empreendidas para promover a aplicação deste princípio.
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b)
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Expediente CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES - CUT Executiva Nacional João Antônio Felicio (Presidente), Mônica Valente (Vice-presidente), Carlos Alberto Grana (Secretário Geral), Remígio Todeschini (1º Secretário), João Vaccari Neto (Tesoureiro), José Maria de Almeida (1º Tesoureiro), Kjeld A Jakobsen (Secretário de Relações Internacionais), Gilda Almeida (Secretária de Política Sindical), Altemir Antônio Tortelli (Secretário de Formação), Sandra Rodrigues Cabral (Secretária de Comunicação), Pascoal Carneiro (Secretário de Políticas Sociais), Rafael Freire Neto (Secretário de Organização).
Diretoria Executiva José Jairo Ferreira Cabral (Secretário de Relações Institucionais), Maria Ednalva Bezerra de Lima (Coordenadora da Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora), Rita de Cássia Evaristo, Luzia de Oliveira Fati, Elisângela dos Santos Araújo, Lúcia Regina dos Santos Reis, Jorge Luiz Martins, Temístocles Marcelos Neto, Júnia da Silva Gouvêa, Lujan Maria Bacelar de Miranda, Wagner Gomes, Gilson Luís Reis e Júlio Turra.
Suplentes José Gerônimo Brumatti, Francisco Alano, Wanderley Antunes Bezerra, Rosane da Silva, Dirceu Travesso e Mônica Cristina Custódio. Endereço: Rua Caetano Pinto, 575. São Paulo/SP. CEP 03041-000. Fone (11) 3272.9411. Fax: (11) 3272.9610. E-mail: cnmt@cut.org.br Home page: http://www.cut.org.br
INTERNACIONAL DE SERVIÇOS PÚBLICOS - ISP Willian Lucy (Presidente); Rodney Bickerstaffe, Alberto Maguid, Tsuneo Enomoro, John Akoto, Jan Davidsen e Herbert Mai (Vice-presidentes); Hans Engelberts (Secretário Geral); Cameron Duncan (Secretário Regional). Endereço: 45, avenue Voltaire, BP 9 012211 – Ferney Voltaire Cedex France. Fone: (33 4) 5040.6464. Fax: (33 4) 5040.7320. E-mail: psi@world-psi.org Home page http://www.world-psi.org
No Brasil Abelardo de Oliveira Filho (Diretor), Junéia Batista (Representante no Comitê Mundial de Mulheres), Jocelio Drummond (Secretário Subregional). Endereço: Alameda Jaú, 796 – Ap. 1007. São Paulo/SP. CEP 01420-001. E-mail : ispbrasil@uol.com.br.
OBSERVATÓRIO SOCIAL Conselho Diretor Kjeld A. Jakobsen (Presidente) - CUT Brasil - Secretaria de Relações Internacionais, Maria Ednalva B. de Lima - CUT Brasil - Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora, José Olívio M. de Oliveira - CUT Brasil Organização Internacional do Trabalho, Rafael Freire Neto - CUT Brasil - Secretaria Nacional de Organização, Pascoal Carneiro - CUT Brasil - Secretaria Políticas Sociais, Mara Luzia Felter - DIEESE, Lúcia Regina dos S. Reis - DESEP, Sidney Lianza - UNITRABALHO, Tullo Vigevani - CEDEC.
Membros da Coordenação Geral Coordenação Geral Kjeld A. Jakobsen (Presidente), Arthur Borges Filho (Coordenador Administrativo), Clemente Ganz Lúcio (Coordenador Técnico Nacional), Clóvis Scherer (Coordenador do Satélite Sul), José Olívio Miranda de Oliveira (Representante no Conselho de Administração da OIT), Maria José Coelho (Coordenadora de Comunicação), Odilon Luís Faccio (Coordenador de Desenvolvimento Institucional), Pieter Sijbrandij (Coordenador de Projetos), Rogério Valle (Coordenador da sede RJ ), Karina Paschoariello (Coordenadora da sede SP). Endereço: Av. Luiz Boiteux Piazza, 4810. Florianópolis/SC. CEP 88056-000. Fone: (48) 261.4093. Fax: (48) 261.4060. E-mail: observatorio@observatoriosocial.org.br Home page: http://www.observatoriosocial.org.br
Salário igual para trabalho de igual valor – avanços e desafios na implementação da convenção nº 100 da OIT é uma publicação conjunta da Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora da CUT, da Internacional de Serviços Públicos – ISP Brasil e do Observatório Social. Edição: Waldeli P. Melleiro. Arte, Fotolitos e Produção Gráfica: Inform. São Paulo, abril de 2002.