Andressa A. Santos
AnĂĄlise da foto de SebastiĂŁo Salgado
Como disse o jornalista Janio de Freitas: “Sebastião Salgado é um portador do mistério da arte. O que quer dizer que sua fotografia não se descreve: sente-se.”. É complicado expressar através de palavras o que se sente ao observar uma das fotos de Salgado, e sua ficha técnica não é precisa nem verídica, As únicas informações que encontrei sobre a imagem é que ela foi clicada no dia 28 de Agosto de 2009, ás 19:45:27, com uma câmera Ultraity Ultra (x-finity), então me concentrarei em uma livre interpretação dela. Nas fotografias de Sebastião Salgado em geral, nós somos levados a um universo a que não estamos acostumados. Não seria diferente na foto que eu escolhi como objeto de análise:
ANTARCTICA
/
2005
Quando vi essa foto pela primeira vez, a primeira coisa que fiz foi procurar sua legenda, e mal pude acreditar que essa fotografia foi feita na Antártica, um dos lugares mais remotos do mundo, onde não há quase nenhuma presença de população humana. É de se imaginar ( Ou pelo menos assim eu imaginava) que por lá só houvesse gelo, o que tornaria o cenário de lá sempre o mesmo, regiões extensas de puro gelo em vários formatos diferentes e com ausência de cor, apenas o branco extenso e a única coisa que poderia variar seria o céu; É isso que minha mente está acostumada a ver em fotografias, sejam de livros didáticos, seja de outros fotógrafos que se arriscaram a chegar perto deste lugar tão misterioso, por puro fascínio de registrar algo fora do lugar comum. Mas como sempre, Salgado está aqui para nos impressionar com suas fotos, pela sua complexidade em nos fazer imaginar os motivos por trás dela e para descobrirmos um pouco mais sobre nosso mundinho grande, em que os seres humanos não tiveram acesso em grande parte por questões de difícil acesso, ou pelos riscos que aquele lugar poderia oferecer. Como sempre, o tratamento feito por salgado na fotografia cumpriu seu papel. A ausência do elemento cor na fotografia fez com que os meus olhos não se desviassem da situação retratada, o que com certeza aconteceria se nela tivesse presença de cor, por se tratar da Antártica, uma Terra em que suas cores lhe são características e puristas, pois não houve a influência da mão humana para alterá-la, o que faria meus olhos se perder através da explosão de informações,
talvez por isso a foto tenha me causado tanto fascínio, o fato de eu não ter identificado o lugar da foto ao olhar para ela, pois não havia nada nela (para pessoas leigas) que pudesse ambientá-la de fácil identificação. Não sei se essa fotografia poderia representar uma denúncia feita por Salgado, o simples alerta de que algo está errado neste ambiente; mas foi isso que eu senti ao olhá-la, minha mente ignorante me disse ao observá-la de relance: “Cadê a neve?”. Talvez, isso não tenha ocorrido de propósito; Todos nós sabemos que a influência do homem está alterando a natureza de forma ruim, destruindo as geleiras e aumentando o nível do mar, o que prejudica seriamente a vida selvagem animalesca de lá, mas também sei que em algumas épocas do ano por lá realmente o gelo diminui, então é algo sobre essa fotografia que nunca irei saber, a não ser que eu tenha um encontro com o autor dela, e pergunte eu mesma. Todos sabem que Sebastião Salgado é adepto de fotografias que sejam clicadas no “momento decisivo”, pois bem, ele aprendeu bem com seu mestre e fotógrafo Francês Henri Cartier Bresson; Nesta fotografia, está muito clara que foi estrategicamente calculada, que aquele momento foi único, perfeito, e é claro, não pode ser visto em nenhuma outra fotografia já registrada; os pássaros no céu na parte direita da foto nos direcionam para o mesmo caminho que o solo daquele lugar nos direciona, por ser uma região montanhosa e
consequentemente inclinada, a fotografia nos leva a querer que a foto continue, que tenha mais informações, que possamos “subir a montanha” junto com os pássaros e com o fotógrafo. As nuvens no céu parecem assumir o mesmo papel, por serem pequenas no lado direito e caminharem cada vez maiores até o lado esquerdo, até que se tornem ininterruptas e constantes no fim da imagem. A única coisa que me ambientou na foto, mas que eu só pensei nisso depois foram os patos, que não são muito comuns em outras partes do mundo, pelo menos não esse tipo de pato. Outra coisa que me causa estranhamento na foto: eles não deveriam estar nadando? Porque eles estão junto à vegetação ao invés de estarem em um lago? Tudo parece tão seco nesta foto, que meus olhos custam a acreditarem que realmente ela descreva um cenário da Antártica. O pato no primeiro plano foi muito bem pensado, pois se ele não estivesse ocupando o primeiro plano, meus olhos se perderiam pela fotografia; A primeira coisa que meus olhos captaram nesta fotografia foi este pato, o que fez com que meus olhos caminhassem pela trama da fotografia livremente, sem nenhum elemento que sobrasse ou faltasse que poderia travar meus olhos e dificultar minha livre interpretação da foto. Aliás, essa é uma coisa que me agrada muito nas fotografias do Salgado, por mais que ele tenha uma mensagem para mostrar com aquela fotografia, ele ainda nos dá uma margem para fazer uma livre interpretação nós mesmos, assim, nós podemos
aprender com o fotógrafo e sua fotografia, e ele também pode aprender um pouco com as pessoas e suas interpretações, aperfeiçoando cada vez mais seu trabalho já fascinante. A vegetação da foto também chama muita a atenção, por ser extensa e grossa, e sua inclinação faz parecer que no momento do clique estava vento sobre a região, e é como se ela abraçasse o pato presente no primeiro plano, quase como se fosse seu ninho. Esta foi a minha livre interpretação da imagem de Salgado, que me fez admirá-lo ainda mais e é uma verdadeira inspiração de composição de fotos e de cliques muito bem planejados, as eternizando no tempo e na mente das pessoas.