Terceirização e as organizações sociais
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12/01/2016 - 05:00
Terceirização e as organizações sociais Por Renato Nunes e Daniela Alves
Atualmente, o Poder Público utiliza as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos - organizações sociais - para auxiliá-lo na prestação de assistência à saúde aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), cuja parceria é formalizada pelo denominado "contrato de gestão". Tal instituto foi criado pela Lei nº 9.637, de 1998, com o intuito de flexibilizar e tornar ágil a gestão pública da saúde, especialmente para descentralizar suas atividades em razão do crescimento da sociedade e da precariedade do sistema público de saúde. Essa lei foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em abril do ano passado em julgamento da Adin nº 1.923. Os órgãos encarregados das questões de saúde nos âmbitos federal, estadual, distrital e municipal estão autorizados legalmente a celebrar contratos de gestão com as organizações sociais para o fomento e execução das atividades relativas à área em causa, bem como a destinar recursos orçamentários, bens e servidores públicos que sejam necessários para o cumprimento do contrato. Órgãos de saúde federal, estadual e municipal estão autorizados legalmente a celebrar contratos de gestão com essas organizações De outro lado, cabe às organizações sociais, com os recursos financeiros fornecidos pelo Poder Público, contratar pessoal para a realização das atividades, bem como garantir o correto cumprimento das obrigações trabalhistas, fiscais e previdenciárias dos colaboradores que atuam nas unidades de saúde objeto dos contratos de gestão. A previsão (dever) de que as organizações sociais se responsabilizem pela contratação dos empregados que atuam nas unidades de saúde objeto dos contratos de gestão vem sendo questionada pelo Ministério Público do Trabalho, por meio de ações civis públicas, sob o argumento de que os contratos de gestão vêm sendo utilizados como instrumentos de terceirização ilícita da atividade-fim de hospitais e ambulatórios pertencentes à administração. Essa prática é vedada pela legislação trabalhista, consoante interpretação dada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), consolidada na Súmula nº 331. Recentemente, uma instituição de saúde, altamente reconhecida por suas diversas obras sociais passou por essa discussão no Judiciário, cuja matéria foi objeto de recente de decisão do TST. O Ministério Público do Trabalho pleiteou que a organização social se abstivesse de contratar empregados para execução de atividades permanentes e essenciais em estabelecimento que não fosse de sua titularidade. Em outras palavras, a organização social, na gestão da unidade pública de saúde, somente poderia utilizar mão de obra contratada e cedida pelo Poder Público, não podendo contratar trabalhadores em regime privado, sob pena de restar configurada terceirização ilícita de mão de obra. Por via indireta, o que pretendeu foi esvaziar o instituto das organizações sociais, cuja legislação de regência foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Sim, pois a se vedar que uma organização social contrate colaboradores diretamente, como se pode imaginar que esta possa cumprir as obrigações assumidas no contrato de gestão? Deve aguardar 1 de que2a administração promova concurso público? Isso contrariaria frontalmente os objetivos da legislação de 13-01-2016 organizações 15:59 sociais, que visa justamente a imprimir maior agilidade e qualidade na prestação de assistência à saúde.
A ação civil pública, que tramitou originariamente perante a 46ª Vara do Trabalho de São Paulo, foi julgada improcedente, Terceirização e as organizações sociais http://www.valor.com.br/imprimir/noticia/4386982... mas o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, ao analisar o recurso interposto pelo Ministério Público do Trabalho, reconheceu a terceirização ilícita de mão de obra alegada, sob o fundamento de que o artigo 199, parágrafo 1º, da Constituição Federal autoriza a celebração de convênios para a área da saúde, mas em momento algum estipula a cessão de bens públicos para a prestação de serviços na atividade-fim do órgão público, tampouco a terceirização desta. O TST, felizmente, houve por bem reformar a decisão do Tribunal Regional, por entendê-la contrária à Constituição Federal, que assegura às organizações sociais a participação complementar do sistema único de saúde, mediante contrato de direito público ou convênio. Asseverou, ainda, que a sua Súmula 331 não se aplicaria aos contratos de gestão, porquanto é da "essência deste instituto a contratação de pessoal próprio para a execução das atividades em estabelecimentos públicos". Embora o TST e o próprio Supremo Tribunal Federal já tenham reconhecido a validade e constitucionalidade da celebração de contrato de gestão entre a administração pública e as organizações sociais, com vistas ao fomento da assistência à saúde, o Ministério Público do Trabalho ainda não desistiu da tese de que tal regime de contratação deve ser extinto, tendo ingressado com ação civil pública em face da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, pleiteando, dentre outros itens, que esta deixe de celebrar novos contratos de gestão. Em que pese o nobre trabalho exercido pelo Ministério Público do Trabalho na melhora da prática laborativa do país, iniciativas como a aqui comentadas não contribuem em nada para tanto, pelo contrário, representam um retrocesso para a boa gestão da coisa pública. Ao final, quem perde com isso é a sociedade, já que as organizações sociais vêm contribuindo fortemente com a melhora na assistência à saúde, especialmente a voltada para a população carente. Renato Nunes e Daniela Alves são advogados e, respectivamente, sócio e coordenadora da área trabalhista de Nunes e Sawaya Advogados Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
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