especial O “Grupo dos Onze” em Caçador 01/04/2014
maioria não tinha nada a ver com o comunismo. Era uma resistência a favor da legalidade”, salienta. Ela cita ainda que Leonel Brizola montou uma resistência ao golpe. “Mas infelizmente acabou prevalecendo o golpe militar e nas cidades do interior era assim: quem era do partido do Jango eram consideradas pessoas perigosas e começaram a ser perseguidas. E meu pai foi um deles”, recorda. Walsin Nunes Garcia se casou em São Borja e o pai de João Goulart foi seu padrinho de casamento. “Meu pai, na ocasião, passou um telegrama de apoio ao João Goulart e aí veio o pessoal e levou meu pai e outras pessoas para o campo de futebol. Foi instaurado inquérito policial militar e meu pai respondeu em Curitiba. Ele ficou detido, depois respondeu processo em liberdade. Foi apenado inclusive, diziam que ele tinha ajudado o Jango. Tinha vínculos de partido sim, era simpatizante das ideias do partido trabalhista e tinha ainda o vínculo familiar muito próximo. Meu avô materno era muito amigo do seu Vicente Goulart, pai do Jango. Meu pai teve que ficar foragido uma época. Ficou em Curitiba. Foram anos de chumbo mesmo”, relata Terezinha.
Jorge Tadeu
R
elatórios do Ministério da Guerra produzidos a partir de investigações conduzidas em Caçador citam que o Grupo dos Onze chegou a ser criado no município e que um dos “líderes intelectuais” era o então inspetor de ensino Walsin Nunes Garcia, “pessoa vastamente relacionada em Caçador”, cita o relatório. A advogada Terezinha Nunes Garcia, filha de Walsin, conta que antes de 1964 o Exército já estava se preparando com informantes em vários locais. “E aí quando surgiu o golpe, quem tinha sido simpatizante ou membro do PTB e outros partidos que apoiavam o Governo de João Goulart, vice-presidente do Jânio Quadros e vários partidos que apoiavam eram subversivos”. Ela conta que as pessoas não entendiam muito bem o que estava sendo discutido ou mesmo proposto pelo então presidente Jango. “Pessoas muito conservadoras não queriam mudanças ou evolução na parte dos direitos trabalhistas. Nas conversas se ouvia que Jango ia implantar o comunismo no Brasil, mas as pessoas nem entendiam o que era o Comunismo e pintavam de uma forma terrível, quando na realidade a grande
Terezinha teve sua casa invadida e material apreendido
“Fui incluída como subversiva”
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m 1964 já como advogada, Terezinha Nunes Garcia, estava atuando em Caçador. Dentro do clima de tensão que viveu em função da detenção de seu pai, ainda enfrentou uma invasão em sua casa. “Veio um delegado e levou vários livros do escritório, livros e revistas francesas. Anos depois veio o pedido de desculpas e devolveram o material. Logo fui incluída como subversiva, mas isso foi rapidamente resolvido. Cheguei a ser fichada. Mas logo viram que não tinha nada a ver realmente, que era um idealismo, a luta por um mundo melhor, algo que a gente conserva até hoje”. A situação na época era complicada de acordo com a advogada porque as pessoas tinham
medo de falar. “As pessoas tinha medo de falar, medo de aparecer. Foi traumático para mim, para a família. Quem nos conhecia foi muito solidário, muito leal, as outras pessoas que não nos conheciam, tinham medo, tinham receio. Muitas pessoas ficaram com receio, por não saber ao certo o que era o comunismo. Você não podia fazer a menor critica ao Governo, porque ai a SNI e os agentes anotavam, registravam”. Terezinha lembra que apesar da afronta ao estado de direito das pessoas, em Caçador não houve excessos como registrados em outras regiões do país. “Não houve excessos, mas foi algo que marcou sim, algo impactante. A gente estava até então vivendo num re-
gime democrático, mas isso foi interrompido. Jamais naquela época a gente podia conversar como hoje estamos conversando. A censura funcionou de forma violenta. Não chegou ao ponto de queima de livros, mas foi uma censura muito forte, à imprensa principalmente. Eu tinha livros de Direito e assinava revistas francesas, porque eu estava estudando a língua e queria praticar o idioma francês. Eu praticava o idioma e acompanhava os acontecimentos. Toda a semana eu recebia o Diplomatique, Le Monde e outros. Eles vieram e levaram muitos livros, revistas, jornais. Eu achei até engraçado na época. Pensava: Nossa... quanta ignorância, porque não havia nada. (risos)”.
Um atirador que apoiava a reforma agrária
A
realidade em Caçador na década de 60 era de um desenvolvimento a passos lentos. O transporte de madeiras e de outros produtos era feito com carroças e estas eram emplacadas e com carroceiros devidamente habilitados para guiar. Nesta atmosfera, o jovem Eloi Svirski, então com 16 anos saía da linha Adolfo Konder onde morava com a família para entregar leite na cidade. Com o alistamento fez parte da turma de atiradores de 1967 com o sargento Raul Silva. A movimentação do golpe de 64 era discutida aos cochichos
pela cidade. Ele passou a atuar como cobrador e percorria a pé a cidade toda ouvindo aqui e ali, informações sobre os discursos do Brizola, o regime militar e a situação em geral do Brasil. “Eu simpatizava com os discursos do Brizola. Tinha 16 anos e concordava, em especial, na parte da reforma agrária. Já meus pais e avós não. Eles tinham outra visão já que viveram o sofrimento da guerra, o confisco de bens que aconteceu na Europa”, comenta Svirski. “Era uma época difícil, as pessoas comuns não podiam comprar um pedaço de terra. E
os discursos do Brizola iam de encontro ao que o povo almejava. Para mim o golpe militar aconteceu porque o capitalismo se sentiu ameaçado com os discursos do Brizola. As pessoas que tinham não queriam perder”, completa. No Tiro de Guerra, junto com outros atiradores, Eloi realizou seu treinamento de forma normal, sem interferências mesmo com o estado de exceção no qual o país vivia. “O sargento não passava nada, não falava nada para nós”. Mas o clima de tensão era sentido nas ruas em Caçador. “Os chamados subversivos eram
Elói Svirski foi atirador do TG em 1967 presos, sem conversa. Você não podia emitir opiniões. A cidade era pequena e foram vários presos, todos conhecidos. Chama-
vam de comunistas ou subversivos, mas eram pessoas comuns, que emitiam opiniões sobre a situação do Brasil”, destaca.