Uruena

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Viagem Urueña

A vila liliputiana é um gigante dos livros António Colinas, poeta espanhol, subiu às muralhas e ali escreveu um poema sobre o “lugar onde vão morrer as árias de Händel”, uma “terra com mais céu do que terra”. A primeira Vila do Livro de Espanha é, pois, território de música e literatura, uma povoação que quase cabe na palma da mão mas acolhe onze livrarias, quatro museus e um centro de promoção do livro, além de quixotes itinerantes. Ana Pedrosa (texto) e António Sá ( fotos)

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rueña é tão pequena que cabe na palma da mão. Este poderia ser o início de um livro infantil ou uma frase dita por uma criança ao avistar a vila pela primeira vez, suspensa no topo de uma colina. Exageros literários e imaginação à solta, já se vê. Ou talvez não. Já que não medimos a aldeia em números concretos, podemos dizer que atravessá-la de ponta a ponta, da Puerta del Azogue à Puerta de la Villa, não demora cinco minutos em passo tranquilo. Mas, e se quisermos ser exaustivos, percorrer cada uma das suas onze ruas e cinco pracetas, parando para observar os brasões das casas antigas, os maciços portões de madeira vetusta, as paredes pardas de taipa, fazendo uma paragem solene na Igreja de Santa Maria del Azogue? E se depois

a curiosidade nos fizer alçar até às muralhas para espreitar o interior dos pátios que nos estão vedados da rua, com poços antigos e baloiços à sombra dos alpendres? E se ainda nos detivermos a espiar os gatos furtivos a passear pelos telhados e logo seguir o voo das cegonhas que passam a poucos metros de nós, à altura dos olhos? Nesse caso teremos passado em deambulações ociosas uma hora, se tanto. Há centenas de lugares assim em Espanha, repletos de monumentos antiquíssimos espalhados por quelhos silenciosos, alcandorados no cocuruto de montes ou resguardados em pregas de montanhas. Lugares de amplos pergaminhos, habitados por um punhado de almas. Urueña poderia bem ser mais um povoado belíssimo mas quase

14 | FUGAS | Público | Sábado 21 Abril 2012

anónimo, não fosse dar-se o caso de ter mais actividade cultural do que muitas cidades portuguesas. Imagine-se Sortelha ou Monsaraz, ou qualquer outro povoado habitado por cerca de cento e cinquenta pessoas. Agora acrescente-se onze livrarias, quatro museus, um Centro de Promoção do Livro, uma galeria de arte contemporânea, estúdio de gravação, atelier de design e oficina de encadernação artesanal. E ainda uma mercearia gourmet e uma loja de brinquedos de antigamente, que não destoariam nos locais mais in de Madrid ou Barcelona, além dos restaurantes e unidades de turismo rural que foram surgindo à medida que o fluxo de visitantes crescia. O resultado é a Vila do Livro, a primeira de Espanha (na realidade, a única), um conceito que engloba


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