ANYSSA CRISTINA FERREIRA
ANYSSA CRISTINA FERREIRA
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Curso de Graduação em Design – Comunicação Visual, do Centro Universitário SENAC, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel.
ORIENTADOR: PROF. VITOR MIZAEL
São Paulo, 2011
Ă€ minha famĂlia, por estar sempre ao meu lado. A Allyson, pelo apoio e ajuda essenciais.
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Fabrizio Poltronieri pela inspiração e orientação na pesquisa. Ao Prof. Vitor Mizael pela orientação e direcionamento do projeto. A toda minha família, em especial meus pais Izabel e Antonio, meu irmão Glenarison e minha tia Amélia, que sempre procuraram ajudar e apoiar como fosse possível em todos os momentos. A Allyson Souza, que em nossas discussões sobre design me ajudou em minha evolução, além de sempre ter estado ao meu lado neste caminho. Aos meus colegas e amigos, pelas dicas, questionamentos, informações, apoio, e pelos momentos de concentração e distração. A Thaís Castanheira pela ajuda com a revisão do texto em inglês. A todos os professores do Centro Universitário SENAC que contribuíram não só para este trabalho, mas para minha formação como designer e como pessoa.
“O intelecto pouco importa na estrada da descoberta. Há um vão na consciência – chame-o de intuição, ou como queira – e a solução vem, e não sabemos de onde ou por quê.” Albert Einstein
RESUMO
Este trabalho busca investigar as possíveis contribuições que a arte conceitual pode proporcionar ao design contemporâneo. Analisando o desenvolvimento histórico, os fundamentos em que ambas as áreas estão estruturadas e suas respectivas práticas, foram desenvolvidas reflexões acerca das características das experiências por elas geradas. A partir disso foram procurados caminhos que respondessem como o design poderia ser pensado para gerar uma experiência mais efetiva que vise desencadear reflexões e percepções nos usuários e, simultaneamente, propor novas perspectivas acerca do próprio design. Considerando todos os aspectos que compõem a prática da atividade, o design foi apresentado sob um prisma mais aberto ao mundo, onde tudo pode ser e ter design, em uma comunicação permeada de significado, múltiplas interpretações e interação em um jogo imaginativo, em prol de uma experiência transformadora através do qual se ganha liberdade e autonomia.
Palavras chave: Design Contemporâneo, Arte Conceitual, Experiência Transformadora.
ABSTRACT
This works aims investigating the possible contributions that conceptual art may provide to the contemporary design. After analyzing the historical development – elements where both areas are structured at and their respective use – reflections where developed around the experience’s characteristics generated by them. After that, paths where searched to answer how design could be elaborated to create more effective experience, focusing the initiation of reflections and perception on users and, simultaneously, bringing new perspectives on the design itself. Taking into consideration all the aspects that bring the practice of activity to life, the design was presented under an world opened prism, where anything can be and have design, in a communication permeated with meanings, several interpretation and interaction inside an imaginative game, aiming a transforming experience through which one can gain freedom and autonomy.
Keywords: Contemporary Design, Conceptual Art, Transforming Experience.
LISTA DE FIGURAS
Fig. 1 - Uma e três cadeiras. Joseph Kosuth, 1965.
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Fonte: http://uploads4.wikipaintings.org/images/joseph-kosuth/one-and-three-chairs.jpg. Acesso em 17/11/11.
Fig. 2 - Projeto para Wall Drawing 630 e Wall Drawing 631.
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Fonte : http://edwardlifson.blogspot.com/2008/06/doit-yourself-sol-lewitt-wall-drawings.html Acesso em 17/11/11.
Fig. 3 - Wall Drawing 630 e Wall Drawing 631
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Fonte : http://edwardlifson.blogspot.com/2008/06/doit-yourself-sol-lewitt-wall-drawings.html Acesso em 17/11/11.
Fig. 4 - Beach Culture. Edição especial No-Emigre-Fonts, 1990
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Foto: Anton Corbijn Fonte: http://www.davidcarsondesign.com/?dcdc=top/n&r=1&dirf=works. Acesso em 15/05/11.
Fig. 5 - Beach Culture. Sculpturer Darrin Pappas, 1991 Foto: David Carson Fonte: http://www.davidcarsondesign.com/?dcdc=top/n&r=1&dirf=works. Acesso em 15/05/11.
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Fig. 6 - Ray Gun. Hot for teacher
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Foto: David Carson Fonte: http://www.davidcarsondesign.com/?dcdc=top/n&r=1&dirf=works. Acesso em 15/05/11.
Fig. 7 - Waldemar Cordeiro, Idéia Visível, 1956
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Fonte: http://www.geifco.org/actionart/actionart03/ entidades_03/exposiciones/sofia/imagenes/7.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 8 - Waldemar Cordeiro. O Beijo, 1967
36
Fonte: http://www.cibercultura.org.br/tikiwiki/ arquivosanexos/0077560010130605343001307459455.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 9 - Lygia Clark,. Bicho.
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Fonte: http://barogaleria.com/wp-content/uploads/2011/03/LClark_bicho2site.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 10 - Lygia Clark,. Bicho.
38
Fonte: http://achadosdailha.files.wordpress.com/2011/11/clark-lygia-bicho.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 11 - Lygia CLark. Caminhando, 1964
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Fonte: http://www.geifco.org/actionart/actionart03/ entidades_03/exposiciones/sofia/imagenes/17.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 12 - Hélio Oiticica. Nildo da Mangueira, com Parangolé, 1964 . Fonte: http://modernidadeartes.blogspot.com/2009/11/ arte-contemporanea-vanguardoide_28.html Acesso em 20/11/11.
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Fig. 13 - Hélio Oiticica Parangolé P 08 Capa 05 ; P 05 Capa 02; P 25 Capa 21; P 04 Capa 01.
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Imagem do filme H.O. de Ivan Cardoso, 1979. Catálogo Hélio Oiticica. The Body of Color, 2007, p. 317 Fonte: http://www.southernperspectives.net/region/latinamerica/decoloniality-in-latin-american-art Acesso em 20/11/11.
Fig. 14 - Hélio Oiticica. Parangolé.
40
Fonte: http://zoolander52.tripod.com/theartsection3.10/id1.html Acesso em 20/11/11.
Fig. 15 - Nelson Leirner. Série Assim é se Lhe Parece, 2003
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Fonte: http://cenaabertadotcom.files.wordpress.com/2011/09/sdc15973.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 16 - Nelson Leirner. Figurativismo Abstrato, 2004
42
Fonte: http://jameswagner.com/mt_archives/LeirerNelsonstickers.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 17 - Nelson Leirner. Maracanã, 2003
43
Fonte: http://jameswagner.com/mt_archives/LeirnerNelson.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 18 - Cildo Meireles - Inserções em circuitos ideológicos Projeto Cédula
43
Fonte: http://db-artmag.com/cms/upload/62/onview/biennale/40_meireles2.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 19 - Cildo Meireles - Inserções em circuitos ideológicos Projeto Coca Cola
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Fonte: http://sinstendhal.tumblr.com/post/8645973502/ cildo-meireles-insercoes-em-circuitos Acesso em 20/11/11.
Fig. 20 - Ray Gun nº54, Março de 1998. Capa do Radiohead. Fonte: http://www.citizeninsane.eu/media/m1998-03RayGun-01.jpg Acesso em 17/05/11.
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Fig. 21 - Livro The Architecture of Patterns.
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Fonte: http://aap.cornell.edu/Private/images/workimage_salomon_full.jpg Acesso em 20/11/11.
Fig. 22 - Ray Gun nยบ43, Fevereiro de 1997. Capa do Nine Inch Nails
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Fonte: httphttp://www.versionindustries.com/blog/2009/05/09/ray-gunmagazinethe-arg-advertising-at-large/. Acesso em 17/05/11.
Fig. 23 - CD The Fragile, Nine Inch Nails. Fotografia e Design por David Carson Fonte: http://www.designartculture.com/wp-content/ uploads/2011/03/nine-inch-nails-the-fragile-art.jpg Acesso em 20/11/11.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 19 1| INTERFACES ENTRE ARTE E DESIGN
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1.1| RELAÇÕES ENTRE ARTE CONCEITUAL E DESIGN CONTEMPORÂNEO
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1.2| CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS ENTRE ARTE CONCEITUAL E DESIGN CONTEMPORÂNEO 1.3| RELAÇÕES ENTRE ARTE E DESIGN NO CENÁRIO NACIONAL
2| AS EXPERIÊNCIAS DA ARTE E DO DESIGN 2.1| ABERTURA E INTERAÇÃO
3| CONTRIBUIÇÕES DA ARTE PARA O DESIGN
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3.1| DESIGN COMO AGENTE E VEÍCULO DA FRUIÇÃO IMAGINATIVA 51
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS 59
INTRODUÇÃO
Uma das questões mais debatidas atualmente no campo do design é acerca de suas relações com a arte, quais os pontos de convergência e de divergência, quais os limites e intersecções entre os dois. Design e arte se desenvolveram paralelamente influenciando um ao outro, principalmente no ultimo século onde movimentos artísticos modernos e pós-modernos coexistiram com um design cada vez mais definido como atividade e consciente de si (MEGGS e PURVIS, 2009). Um destes movimentos artísticos em especial me chamou a atenção por sua postura mais próxima ao design. A arte conceitual, movimento surgido por volta da década de 60, baseou-se nas ideias de Marcel Duchamp para desenvolver um tipo de arte que se preocupava mais em apresentar ideias a respeito da natureza da arte do que fazer explorações formais e estéticas, utilizando-se de projetos e sistemas como processos criativos. O design contemporâneo tende a um equilíbrio entre a sobriedade e a intemperança, porém corre o risco de se engessar, perder o espírito de experimentação. Basear-se na arte que é a busca pelo novo sempre foi o que o design fez para se renovar. A arte conceitual se diferencia por ser uma espécie de meta linguagem, discutir a respeito de si, e espelhar-se nisto pode ser uma boa forma de se pensar um design melhor. Este foco nas ideias que são inerentes à arte conceitual também pode mostrar ao design como projetar experiências mais completas em vez de objetos vazios de experiências construtivas. Da mesma forma, o design
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pode se tornar mais aberto ao admitir e incorporar em seus projetos o imprevisto e o acaso como elementos transformadores e ampliadores de possibilidades. De qualquer forma, com a proximidade cada vez mais evidente entre arte e tecnologia e ciência, antigos paradigmas são superados em prol da evolução de ambos os lados, assim a arte conceitual e o design podem desenvolver diálogos que sejam benéficos para os dois. No primeiro capítulo “Interfaces entre arte e design” tracei uma linha de desenvolvimento das duas áreas, paralelamente ao longo da história. Da origem etimológica dos termos arte e design até os primeiros diálogos entre ambos, traçando as relações, convergências e divergências, inclusive no cenário nacional. Já no segundo capítulo, procurei analisar “As experiências da Arte e do Design”, de acordo com ideias de Kant e Schiller apresentadas por Benedito Nunes, sobre as dimensões da experiência, fontes de conhecimento e impulso lúdico. Trato ainda da abertura da obra e a interação por ela gerada. A partir destes conceitos, no terceiro capítulo “Contribuições da Arte para o Design” fiz uma comparação das experiências da arte conceitual e do design contemporâneo de acordo com estes fatores, e uma análise dos métodos e trabalhos de David Carson, como exemplo de designer que fez experimentações aproximadas à experiência gerada pela arte conceitual. Toda esta pesquisa foi baseada em seleção, leitura e análise de material bibliográfico, alguns sugeridos pelo professor orientador, outros selecionados por mim conforme a demanda da pesquisa. Com esta primeira fase totalmente focada em uma exploração teórica, o maior desafio foi conseguir condensar ideias tão complexas, às vezes complementares e outras vezes totalmente opostas, em algo concreto e viável, levando em conta questões que sempre condicionam a prática do design atualmente.
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Parti de um assunto (a arte conceitual) do qual não possuía conhecimento algum. Apesar de encontrar algumas dificuldades acredito que consegui compreender com certa profundidade a proposta deste tipo de arte. Sua relação muito próxima com o design fez com que o trabalho se desenvolvesse
em torno de discussões estruturais, para que fosse possível entender as diferenças e possibilidades que existiam entre os dois. Arte, tecnologia e design flertam desde que surgiram, vivem momentos de harmonia e de desacordo. Porém, quando se unem geram frutos que modificam a forma como vemos a sociedade, cultura e ciência. O ato de criar é inerente a todas estas áreas. E cabe a nós, como participantes deste meio a responsabilidade de buscar um desenvolvimento cada vez melhor.
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1|
INTERFACES ENTRE ARTE E DESIGN
Design, termo inglês, derivado do latim signum, é o nome que usamos atualmente (embora não seja uma unanimidade) para nos referirmos a uma atividade que vem ganhando cada vez mais espaço em nossa sociedade e, consequentemente, vem sendo tema de inúmeras discussões. Uma das questões mais debatidas atualmente é a relação que o design mantém com a arte (FLUSSER, 2010). Houve um momento em que o homo sapiens sapiens aprendeu a representar suas ideias com signos – desenhos, palavras, números – abrindo assim infinitas possibilidades, entre elas o registro, a comunicação e a expressão de seus desejos, pensamentos e sentimentos. Foi esta atitude que permitiu que o homem entendesse que ele era capaz de codificar e decodificar o mundo de acordo com sua necessidade e vontade. Esta descoberta viabilizou, entre outras coisas, o surgimento da Arte, o da Escrita e o da Ciência e deu início àquilo que chamamos de História (MEGGS e PURVIS, 2009). Revolução semelhante à da escrita, que permitiu ao homem o armazenamento de conhecimento, encontramos na invenção da impressão tipográfica, aperfeiçoada por Gutenberg, que viabilizou a disseminação em massa deste conhecimento e que consequentemente exigiu uma geração de profissionais mais qualificados tecnicamente. Mais tarde, a revolução industrial gerou uma necessidade de uma produção de peças gráficas mais impactantes e atraentes, que se sobressaíssem às demais.
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Anúncios e cartazes dominavam a demanda de impressões tipográficas, o que exigiu também uma revolução no desenho das fontes, que deixaram de ser signos fonéticos e se tornaram visuais. A tecnologia avançava rumo à mecanização da impressão, à fotografia, às grandes indústrias, enquanto a arte e o design tentavam se adaptar às novidades e possibilidades deste novo mundo (ibidem).
1.1| RELAÇÕES ENTRE ARTE CONCEITUAL E DESIGN CONTEMPORÂNEO A arte e a ciência (técnica), em particular, tinham uma relação estreita desde sua origem. Nunes (1991:17) demonstra que suas raízes etimológicas evoluíram do mesmo conceito: Ars, artis, palavra latina da qual a nossa derivou, corresponde ao grego tékne, que significa todo e qualquer meio apto à obtenção de determinado fim, e que é o que se contém na ideia genérica de arte.
Nesta definição, podemos perceber que o que une estes dois conceitos é a ideia de um fazer criativo e artificial. Ou seja, tanto a arte quanto a técnica almejam a criação de novas concepções que venham solucionar questões práticas, intelectuais e espirituais da vida do ser humano através do uso de artifícios que burlem as leis da natureza. Contudo, ao longo da história, arte e ciência tornaram-se opostos. Os termos design, macchina, tecnica, ars e arte estão estreitamente ligados entre si, nenhum deles é pensável sem os outros e todos têm a sua origem na mesma visão existencial do mundo. Todavia esta correspondência interna foi negada durante séculos (pelo menos desde o Renascimento). A cultura burguesa moderna fez uma nítida separação entre o mundo das Artes e o mundo da técnica e das máquinas, pelo que a cultura foi cindida em dois ramos que se excluem mutuamente: o ramo científico, quantificável e ‘duro’, e o artístico, qualificativo e “flexível”. Esta divisão perniciosa começou a torna-se insustentável por volta do fim do século XIX (FLUSSER, 2010:11).
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O mundo todo começou a se transformar no final do século XIX, principalmente nos campos das Artes e da Ciência. A humanidade entraria no período chamado de Modernidade, que se caracterizaria por uma grande mudança geral de pensamento. Nas artes a visão de mundo objetiva já não satisfazia as necessidades das emergentes vanguardas europeias.
Alimentados por estas questões, juntamente com os horrores da guerra e os avanços tecnológicos e industriais, alguns artistas procuravam por uma nova linguagem estética que lhes permitisse tratar das questões culturais, econômicas e sociais. Alguns destes movimentos influenciaram profundamente o desenvolvimento da linguagem gráfica e comunicação visual. “A evolução do design gráfico do século XX está intimamente ligada à pintura, poesia e arquitetura modernas.” (MEGGS e PURVIS, 2009:315) Com o esgotamento “daquilo que era dito”, ou seja, dos temas que até então haviam sido predominantes os motivos religiosos, retratos, paisagens e até naturezas mortas, a arte finalmente tomou uma postura formalista. Disto resultaram movimentos artísticos que procuravam uma abordagem nova da forma. Nunes (1991:78) define esta postura como formalismo, que é a afirmação da autossuficiência estética da forma, abstratamente considerada, como toda aquela relação sensível capaz de, por si só, constituir-se em fonte de prazer desinteressado, e de justificar, em função desse prazer adequado à nossa capacidade sensível, a comunicação dos mais diversos conteúdos pelas diferentes artes. O formalismo, portanto, na acepção ampla, que é a que estamos considerando, inverte a tese do conteudismo, anteriormente exposta: aqui a forma é mais relevante do que o significado, sempre anestético, acrescentado a uma entidade que se basta, devido ao efeito imediato que exerce sobre a sensibilidade. Assim, ritmo e simetria, proporção, harmonia, unidade na variedade, são entidades provedoras de impressões estéticas, que sustentam as sutilezas da expressão artística propriamente dita.
Em termos de linguagem, as vanguardas modernistas logo chegaram a limites de exploração das formas. Com a evolução das técnicas de reprodução de imagens, o advento da fotografia, do cinema e da televisão e até da impressão, da ciência e tecnologia em geral experiências e vivências que antes seriam impossíveis, tornaram-se parte do cotidiano. O grande acesso da massa a todos esses tipos de novos estímulos fez com que a magia da imagem e de todas as outras sensações estéticas começasse a se tornar cada vez mais comum, e por consequência, cada vez menos mágica. Frente a este novo contexto, a arte formalista começou então a ser vista como mero exercício estético. Na nossa época, temos um ambiente drasticamente mais rico com relação à experiência. Uma pessoa pode voar em torno da Terra em questão de
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horas ou dias, não meses. Temos o cinema, a televisão a cores, assim como o espetáculo fabricado de luzes de Las Vegas, ou os arranha-céus de Nova York. O mundo todo está ai para ser visto, e o mundo todo pode assistir de suas salas de estar o homem andando na lua. Certamente não se pode esperar que a arte, ou os objetos de pintura e escultura possam competir com isso em termos de experiência? (KOSUTH, 2006: 223)
Outros movimentos e artistas começaram a partir para outra busca. Logo, começaram a surgir críticas, no sentido de questionar sobre como esta arte formalista poderia acrescentar algo a vida das pessoas, a sociedade e a cultura em geral. A crítica formalista é considerada apenas “uma análise dos atributos físicos em particular, que por acaso existem em um contexto morfológico” (ibidem: 216), ou seja, uma crítica preocupada apenas com as questões estéticas de objetos, cujas quais só se podem fazer juízos de gosto. Em objeção a esta vertente formalista, logo surgiram outros movimentos, como o dadaísmo que foi o que buscou mais intensamente uma postura mais crítica, reagindo fortemente à guerra, à decadência da sociedade europeia, à superficialidade, à fé cega no progresso e às convenções morais de um continente em convulsão. Denominavam-se um movimento antiarte, valendo-se do protesto, do choque, do absurdo e da aleatoriedade para questionar a própria arte e alcançar assim a total liberdade. Uma figura em especial abalou novamente as recém-formadas estruturas da arte. Foi Marcel Duchamp, que já havia desenvolvido obras com influências cubistas e futuristas, o primeiro a levar a arte a questionar suas funções em prol de uma liberdade (MEGGS e PURVIS, 2009). Isso significa que a natureza da arte mudou de uma questão de morfologia para uma questão de função. Essa mudança – de “aparência” para “concepção” – foi o começo da arte “moderna” e o começo da arte “Conceitual”. Toda arte (depois de Duchamp) é conceitual (por natureza), porque a arte só existe conceitualmente (KOSUTH, 2006: 217).
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Para Duchamp, “arte e vida eram processos que combinavam probabilidade aleatória e escolha intencional” (MEGGS e PURVIS, 2009:327) e esta combinação era usada para transmitir ideias que causassem uma reflexão ao público. Ao pintar um bigode em uma representação da Monalisa, Duchamp não desfere um ataque ao quadro de Da Vinci, mas transmite uma ideia de crítica à tradição. Marcel Duchamp plantou assim as raízes do que mais tarde viria a ser chamado de arte conceitual.
Todas estas transformações pelas quais o mundo estava passando durante o século XX também serviram para que as pessoas percebessem que havia a necessidade da instituição efetiva de uma atividade mais abrangente que organizasse, estruturasse e ainda assim refletisse todas estas questões de forma prática em suas vidas. Há muito tempo já existia a tipografia, o projeto de livros e cartazes, mas foi somente em 1922 que William Addison Dwiggins, um designer de livros e aluno de Goudy, cunhou o termo Design Gráfico para descrever sua profissão, que já começava a abranger novos campos como o de identidades visuais (MEGGS e PURVIS, 2009). Assim, o Design começou a se tornar uma área independente, ao conseguir unir a objetividade da técnica e a expressão artística: A palavra design inseriu-se nesta brecha e fez de ponte entre os dois ramos, na medida em que o termo exprime uma conexão interna entre arte e técnica. Por isso, na época contemporânea, design indica, grosso modo, o lugar em que a arte e a técnica (juntamente com suas respectivas modalidades científicas e críticas) coincidem de comum acordo e abrem caminho a uma nova forma de cultura (FLUSSER, 2010:11).
Com as evoluções tecnológicas cada vez mais inseridas no cotidiano das pessoas, o design passou a ter um papel mais importante na indústria, no comércio, na cultura e sociedade em geral. Tão logo começou a se estabelecer, o design passou a compartilhar os mesmo questionamentos da arte. Assim como a objetividade dos temas simples e a superficialidade das explorações estéticas já não serviam à arte, os designers começaram a procurar em seus trabalhos não mais a mera informação narrativa ou ilustrativa, e sim a expressão de ideias e conceitos. (MEGGS e PURVIS, 2009). Este desconforto com as situações da arte e do design, gerado após os grandes acontecimentos do século XX, teve como consequência o desenvolvimento, a partir da década de 50, de um novo pensamento que afirmava a necessidade de uma fundamentação conceitual na base de qualquer atividade criativa. Nas artes, surgiu a arte conceitual, cujas raízes nasceram da obra de Duchamp, que só anos mais tarde pode ser efetivamente compreendida e desenvolvida por uma nova geração de artistas (KOSUTH, 2006). “A ideia se torna a máquina que faz a arte” (LEWITT, 2006: 176).
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Fig. 1 - Uma e três cadeiras. Joseph Kosuth, 1965.
Joseph Kosuth, artista conceitual norte-americano nascido em 1945 em Ohio, estudou belas artes em Nova York. Empenhou-se em entender a arte de Duchamp e desenvolveu vários trabalhos conceituais. Um dos mais conhecidos é a obra “Uma e três cadeiras” (Fig. 1) de 1965, que contrapõe uma fotografia de uma cadeira, o objeto cadeira e uma definição de cadeira do dicionário (KOSUTH, 2006). A justaposição das “cadeiras” nos faz refletir como um único conceito pode ser representado em três linguagens diferentes, cada uma com suas particularidades e nos apresenta um paradoxo: quantas cadeiras estamos vendo? Esta exploração no sentido semântico dos conceitos é bem característica de Kosuth.
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Sol LeWitt também desenvolveu trabalhos minimalistas e de arte conceitual. Afirmava que o artista deve seguir sua premissa inicial e seu projeto mecanicamente, evitando a subjetividade. Novas ideias que surgissem pelo caminho não deveriam interferir no curso do projeto, mas serem usadas para novos trabalhos. Ele desenvolvia também trabalhos seriais (Fig. 2), que eram projetos que geravam uma sequência de trabalhos a partir de uma ideia (LEWITT, 2006).
Fig. 2 - Projeto para Wall Drawing 630 e Wall Drawing 631 (juntos à esquerda, em duas versões) e Wall Drawing 684A (à direita, em baixo).
Fig. 3 - Wall Drawing 630 e Wall Drawing 631 sendo executados por estudantes de arte, para exposição na galeria MASS MoCA, nos EUA em 2008.
O design não demorou a mais uma vez inspirar-se na arte, que agora estava cada vez mais disponível e acessível como referência. A atividade que havia surgido para dar formas à matéria agora visava dar formas às ideias.
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1.2| CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS ENTRE ARTE CONCEITUAL E DESIGN CONTEMPORÂNEO De fato, com os limites entre as duas áreas cada vez mais indefinidos e próximos, é cada vez mais comum o surgimento de trabalhos híbridos. Mas ainda assim existem características que são particulares à arte e ao design, senão não haveria sentido em haver uma separação entre os dois. Consideremos, para isto, os objetivos de cada um. A arte conceitual busca refletir sobre a própria natureza da arte, ou seja, está voltada para si. Assim, cada trabalho de arte se torna uma proposição analítica (cuja validade depende exclusivamente dos símbolos que ela contém) a respeito da arte. Uma obra de arte é uma tautologia na medida em que é uma apresentação da intenção do artista, isto é, ela está dizendo que aquela obra de arte particular é arte, o que significa que ela é uma definição de arte (KOSUTH, 2006:218).
Podemos entender a problemática da arte contemporânea sob uma posição mais radical, onde “em cada obra de arte que se produz está em jogo o destino da arte; em cada uma delas o artista arrisca-se a matá-la ou a fazêla existir” (NUNES, 1991:120). Sendo a arte um modo de conhecimento que “é sua própria realidade e seu próprio fim” (FUENTES, 2006:23), encontramos a diferença fundamental: as ideias que o design informa não são suas. O design é veículo da informação, toma posse de mensagens demandadas por uma necessidade de comunicação específica, e as informa e comunica através de um processo de síntese. No design o objetivo maior é sempre ser o meio pelo qual é enviada uma mensagem, codificar e decodificar, traduzir ideias e conceitos em uma linguagem visual sempre pensando em um outro, isto é, o design é feito de alguém para alguém (ibidem). A primeira semelhança que podemos notar entre ambos é que, tanto na arte conceitual como no design, o trabalho só se desenvolve através de métodos. Joan Costa (apud FUENTES, 2006:15) coloca que:
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Etimologicamente, um método é um caminho em direção ao objetivo, uma ação eficaz, uma ‘linha guia’ ou guideline. [...] Dispor de um conjunto
de métodos é dispor de critérios que permitam, em cada bifurcação, em cada encruzilhada mental, optar pelo melhor caminho, por aquele que, em princípio, deve conduzir o mais diretamente possível à solução mais efetiva.
Tanto a arte conceitual quanto o design gráfico baseiam sua práticas nos métodos, estabelecendo assim um plano ou projeto que definirá quais os procedimentos a serem executados para se alcançar o objetivo desejado. E em ambos os casos existe o debate da mesma problemática, a da superação dos métodos sobre as técnicas, do pensar e do fazer e da confusão que muitas vezes se faz entre os dois. Novamente Joan Costa observa que: Entretanto, muitos ainda confundem os métodos com as técnicas, quando na realidade os métodos servem para a estratégia de pensar e planejar, e as técnicas servem para “fazer”. Nesta confusão também se influi a crença de que a criatividade se trata de um estalo mágico, genial, de uma ideia que surge na cabeça de alguns designers privilegiados (COSTA apud FUENTES, 2006:15).
O design não é, portanto, uma atividade de pura criação instantânea. Sua prática depende da metodologia que vai dar todo o suporte e sustentação ao ato criativo. E esta é também a principal diferença entre a arte convencional e a arte conceitual, antes do produto final, o que interessa é a ideia inicial e os métodos utilizados. Assim, na arte conceitual o principal valor estará na qualidade da ideia e das possíveis reflexões que esta poderá gerar nos indivíduos. O objetivo do artista que lida com arte conceitual é tornar seu trabalho mentalmente interessante para o expectador, e por isso ele normalmente quer que o trabalho fique emocionalmente seco. Entretanto, não há nenhuma razão para supor que o artista conceitual pretenda entediar o observador. Apenas a expectativa de um impacto emocional, com o qual uma pessoa condicionada à arte expressionista está acostumada, impediria o observador de perceber essa arte [conceitual]. (LEWITT, 2006: 177)
Segundo esta observação de Sol LeWitt, podemos perceber que, apesar de ser uma retomada do conteúdo como elemento primordial, ao contrário da forma de arte tradicional, a arte conceitual não tem a emoção ou a estética incorporadas a seu impulso inicial. No entanto, isto não significa que elas sejam inexistentes ou desnecessárias, ou até mesmo evitadas. 31
Quando um artista usa forma de Arte Conceitual, isso significa que todo o planejamento e tomadas de decisões são feitos de antemão, e a execução é um assunto perfunctório (LEWITT, 2006: 176).
Este aspecto demonstra também uma ideia de reprodutibilidade da arte, quebrando o paradigma da obra de arte única, objeto de desejo e de consumo. A arte conceitual, portanto, não visa gerar obras de arte, no sentido de objetos, mas pretende encontrar meios para suscitar reflexões e novas ideias, que podem ou não se materializar em objetos. O design contemporâneo procede de maneira semelhante. A partir de uma ideia elabora-se um projeto que será desenvolvido e executado. Porém, apesar de não existir uma forma de projeto padrão adotado universalmente ou mesmo normas unânimes que delimitem a forma como um designer deve proceder em seu trabalho, algumas diretrizes são mais aceitas atualmente. Um projeto de design contemporâneo geralmente segue etapas como, por exemplo, brieffing, pesquisas (de histórico, público, concorrência, mercado), análise, concepção, execução, produção, implantação e acompanhamento (FUENTES, 2006). Este modelo visa uma facilidade para que o desenvolvimento de um projeto seja feito de forma mais ágil e eficiente. Porém, precisamos estar atentos para percebermos até que ponto estes modelos estão nos ajudando e melhorando o processo de concepção ou apenas os utilizamos pelo conforto de não precisarmos pensar em novos métodos que abram novas possibilidades em vez de limitar e condicionar o resultado antes mesmo do início do projeto. Assim, a definição da metodologia a ser seguida fica condicionada a alguns fatores mais práticos, como tempo disponível, viabilidade de execução, habilidade do designer; e outros fatores mais flexíveis como a criatividade e predisposição do designer para experimentação de métodos não convencionais.
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Em algumas vertentes do design, como o Estilo Internacional, movimento surgido na suíça nos anos 50, a comunicação deveria ser clara, simples, objetiva, sem nenhum tipo de expressão subjetiva ou ruídos na mensagem comunicada. Com influências da Bauhaus e do DeStijl este estilo prosperou por mais de duas décadas. Um de seus grandes expoentes foi o suiço Max Bill, que mais tarde viria a fundar a escola de design de Ulm, onde
estudaria Alexandre Wollner. Teria também grande influência sobre o estabelecimento do design e também da arte concreta no Brasil (MEGGS e PURVIS, 2009). Já outros movimentos, como os poetas gráficos da Europa (décadas de 1970 e 80) propunham uma expressão mais emocional e comprometida do designer, projetando suas ideias e sentimentos pessoais sobre a mensagem comunicada. Com o advento da informática na rotina do designer, muitas explorações técnicas e estéticas passaram a ser feitas (ibidem). Tratando-se de experimentações, o trabalho de David Carson é um exemplo. Surfista profissional norte-americano, formado em Sociologia, Carson fez apenas um workshop de duas semanas em design gráfico na Universidade
Fig. 4 - Beach Culture. Edição especial No-Emigre-Fonts, 1990
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Fig. 5 - Beach Culture. Sculpturer Darrin Pappas, 1991 (Foto: David Carson)
Fig. 6 - Ray Gun. Hot for teacher. Artigo sobre rock stars que se apaixonaram por suas professoras.
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do Arizona. Destacou-se profissionalmente diagramando revistas como a Beach Culture (figuras 4 e 5) e Ray Gun (figura 6) nos anos 80 e 90. Ele não criou projetos gráficos convencionais, focados em legibilidade, clareza ou outras regras vigentes no mercado editorial, como apontam Meggs e Purvis (2009), Blackwell e Carson (1995). Carson priorizava em seu trabalho sobretudo a expressão, tanto estética quanto conceitual, exigindo do usuário que decifrasse cada página para, não necessariamente entender, mas apreender os significados das coisas. Cada letra, foto, ruído ou espaço em branco, cada signo traz consigo uma carga expressiva que contribui, acrescenta ou até mesmo modifica o significado da mensagem original. O todo se torna mais que a soma das partes.
1.3| RELAÇÕES ENTRE ARTE E DESIGN NO CENÁRIO NACIONAL Em 1952, o grupo Ruptura composto por Geraldo de Barros e Waldemar Cordeiro e outros artistas, realiza uma exposição de mesmo nome no Museu de Arte Moderna – MAM em São Paulo, considerada como o início oficial da arte concreta brasileira. Esta forma de arte é herdeira de conceitos desenvolvidos pelo grupo DeStijl de Piet Modrian e Theo van Doesburg, bem como dos ideais da Bauhaus e de Max Bill e sua escola em Ulm, busca um ideal formal de clareza e exatidão em representações estritamente plásticas, opondo-se a qualquer tipo de figurativismo, bem como o abstracionismo, pois para os concretos abstrair ainda é uma forma de representar o mundo. Assim, pontos, linhas, planos e cores não representam nada, são apenas elementos plásticos, ou seja, concretos (ITAÚ CULTURAL, 2010, online). Além do grupo Ruptura também se destaca no Rio de Janeiro o grupo Frente, que realizou sua primeira exposição em 1954. Diferentemente do grupo paulistano, os cariocas tinham uma postura mais livre, onde havia uma diversidade na exploração de estilos, técnicas e materiais. Entre os artistas do grupo destacam-se Lygia Clark e Hélio Oiticica, que mais tarde também viriam a integrar o grupo Neoconcreto (ITAÚ CULTURAL, 2010, online). Tanto Waldemar Cordeiro, quanto Lygia Clark e Hélio Oiticica acabam se afastando do rigor concretista. Por volta da década de 60, cada um ao seu modo, estes artistas se voltam para uma arte mais inserida na realidade e no cotidiano.
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É o início de uma noção de um tipo de arte mais voltado aos conceitos e linguagem, à realidade do que à forma. Paralelamente, vários artistas brasileiros começam a desenvolver trabalhos que se aproximam do tipo de arte conceitual.
Fig. 7 - Waldemar Cordeiro, Idéia Visível, 1956
Fig. 8 - Waldemar Cordeiro. O Beijo, 1967
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Waldemar Cordeiro passa a criar a partir de objetos do cotidiano e de sucata. Ao entrar em contato com a Pop Art norte-america desenvolve o conceito de Arte Concreta Semântica. Observa que a arte, até então predominantemente abstrata, e cuja maior expressão considerava ser o
Concretismo, estava agora em busca de uma nova reflexão da realidade, não como o figurativismo que já havia sido superado, mas como um novo humanismo. Waldemar, em 1965, observa que: Redimensionando o domínio da imagem com respeito ao do conceito, estruturada a linguagem visual de acordo com as necessidades comunicativas do homem moderno nas condições da revolução industrial, a arte de vanguarda engaja-se agora na luta por um novo humanismo (CORDEIRO, 2006: 108).
No final da década de 60 realiza as primeiras pesquisas sobre arte computacional e introduz o uso de computador na arte no Brasil. É considerado um dos pioneiros internacionais desse tipo de arte (ITAÚ CULTURAL, 2010, online). Lygia Clark, com a série Bichos, iniciada em 1960 sua obra atinge um novo nível. Lygia eleva a obra de arte ao status de jogo e o expectador ao status de participante. Segundo Lygia em seu texto onde explica a série Bichos: É um organismo vivo, uma obra essencialmente atuante. Entre você e ele se estabelece uma integração total, existencial. Na relação que se estabelece entre você e o “Bicho” não há passividade, nem sua nem dele (CLARK, 2009a, online).
Com esta série, Lygia Clark torna-se uma das pioneiras da arte participativa mundial. As dobradiças tornam a obra aberta. Pode ser montada de qualquer forma que não perde sua essência. E o participante é inserido como peça importante no jogo artístico. Porém, já em 1963 dá outro grande salto. Concebe Caminhando, obra que consiste em uma fita de Moebius (uma tira de papel que tem suas duas pontas coladas após uma torção) que é cortada no sentido de seu comprimento em uma tira fina que só acaba quando acaba a própria fita de Moebius. A arte deixa de estar em um objeto. A experiência artística extrapola a matéria, já não está contida em nada nem mediada por coisas, existe apenas na ação e na vivência misturada com a vida.
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Fig. 9 - Lygia Clark,. Bicho.
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Fig. 10 - Lygia Clark,. Bicho.
Fig. 11 - Lygia CLark. Caminhando, 1964
Que se passa então de tão importante com o ready-made? Nele, encontramos ainda, apesar de tudo, toda transferência do sujeito ao objeto, separação de um e de outro. Com o ready-made, o homem ainda tem a necessidade de um suporte para revelar sua expressividade interior. Mas isso já não é mais necessário hoje, pois a poesia se exprime diretamente no ato de fazer (CLARK, 2009b, online).
Lygia chega então à noção de obra anônima, onde o artista não tem controle sobre como a arte se concretiza, pois a existência da arte dependerá do outro, de sua participação, de sua ação e interferência.
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Hélio Oiticica também desenvolve obras que somente se baseiam na participação e vivência. Após a morte de seu pai, Hélio começa a frequentar o morro e a Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira. Entusiasmado pelo samba, torna-se passista e integra-se na comunidade do morro da mangueira (PROJETO HÉLIO OITICICA, 2010, online). Em 1964 nascem os parangolés: A partir de uma cena marcante presenciada em rua da Zona Norte do Rio e Janeiro, Oiticica vê uma espécie de construção improvisada por um mendigo com estacas de madeira, cordões e outros materiais; em um pedaço de juta consegue ler a palavra “Parangolé” e passa a designar como tal, obras que está desenvolvendo naquele momento (PROJETO HÉLIO OITICICA, 2010, online).
Fig. 12 - Hélio Oiticica. Nildo da Mangueira, com Parangolé, 1964 .
Fig. 13 - Hélio Oiticica Parangolé P 08 Capa 05 Mangueira, 1965; P 05 Capa 02, 1965; P 25 Capa 21Nininha Xoxoba, 1968; P 04 Capa 01, 1964.
Fig. 14 - Hélio Oiticica. Parangolé.
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Os parangolés eram feitos de materiais comuns e corriqueiros como lonas e tecidos, em forma de capas, bandeiras ou tendas, em um ritual de manifestação cultural coletiva de dança, poesia, música e cores. (ITAÚ CULTURAL, 2010, online). Em 1965, durante a exposição Opinião 65 no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro Oiticica e seus parangolés protagonizaram uma grande polêmica. O artista e um grupo de passistas da Mangueira usando os parangolés foram proibidos de desfilar nas dependências do museu. Revoltado, Hélio se retira então da exposição e desfila pelo jardim do museu, onde é ovacionado pelos artistas, jornalistas, críticos e público presente. Oiticica falece em 1980. Desde 1999, quando foi inaugurado o Centro de
Arte Hélio Oiticica com uma grande exposição retrospectiva que percorreu a Europa e os Estados Unidos, já foram feitas mais 39 exposições no Brasil e 51 no exterior (PROJETO HÉLIO OITICICA, 2010, online). Nelson Leirner no início de sua carreira estudou engenharia têxtil nos Estados Unidos. De volta ao Brasil, estudou pintura. Mas foi em 1966, quando fundou o Grupo Rex, com Wesley Duke Lee, Geraldo de Barros, Carlos Fajardo, José Resende e Frederico Nasser, que seu trabalho ganhou projeção, ganhando prêmio na Bienal de Tokio. Tinham até seu prórpio jornal, chamado Rex Time (lê-se time mesmo, e não táime). O grupo durou apenas um ano, mas fez proposições importantes. Em 1967 finalizou suas atividades com a Exposição-Não-Exposição, um happening – do inglês acontecimento, uma ação artística em que o público-participante é protagonista – onde as pessoas que fossem visitar a exposição poderiam levar as obras, isto é, se estivessem dispostas a arrancá-las de seus suportes (LEIRNER, 2010, online). Esta ação se opôs radicalmente ao paradigma da redoma de cristal em que os museus se encontram, onde as obras não podem nem ao menos ser tocadas. No mesmo ano, envia ao 4º Salão de Arte Moderna de Brasília um porco empalhado. Após a “obra” ser aceita para o salão, Nelson publica textos questionando a aceitação da obra pelo júri (LEIRNER, 2010, online). Mais recentemente Nelson Leirner se dedica a desenvolver instalações compostas pela apropriação de objetos corriqueiros e sua recomposição e combinação para gerar novos significados. Na série Mapas, mapas-múndi são sobrepostos e preenchidos com stickers (adesivos) de personagens
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infantis, encontrados em práticamente todas as bancas de jornais e papelaria. Notamos uma grande relação com o design, no sentido não só do uso de produtos de design – como os mapas e os stickers – como na forma de usar estes elementos para gerar significados. Já a série Hobby, são instalações compostas por bonecos, estátuas, e uma variedade de outros colecionáveis. Ele se apropria destes elementos cotidianos de produção em série para criar cenas de desfiles e jogos de futebol, até missas e guerras. Atualmente tem uma carreira muito reconhecida internacionalmente.
Fig. 15 - Nelson Leirner. Série Assim é se Lhe Parece, 2003
Fig. 16 - Nelson Leirner. Figurativismo Abstrato (2004)
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Fig. 17 - Nelson Leirner. Maracanã (2003)
Cildo Meireles também começou a desenvolver trabalhos que exploravam os objetos industrializados produzidos em série. Porém, seu trabalho tinha um cunho muito mais político. Na década de 70 desenvolve as Inserções em circuitos ideológicos com o Projeto Coca-Cola e o Projeto Cédula, onde Cildo imprimia frases subversivas em branco nas garrafas retornáveis de refrigerante que só se tornavam visíveis quando fossem cheias novamente e carimbadas nas notas de dinheiro, que voltavam à circulação normal após a intervenção (ITAÚ CULTURAL, 2010, online).
Fig. 18 - Cildo Meireles - Inserções em circuitos ideológicos Projeto Cédula
Fig. 19 - Cildo Meireles - Inserções em circuitos ideológicos Projeto Coca Cola
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Ao invés de fazer o público ir até a obra ele leva a obra até o público. Uma arte que se insere no sistema para criticá-lo e questioná-lo. Ao interferir com a arte em um meio específico do design, como as embalagens e as cédulas de dinheiro, Cildo demonstra como a arte pode se usar do design, e vice-versa, em prol de uma ação conceitual. É o segundo artista brasileiro a ter uma exposição retrospectiva na Tate Modern em Londres, 2008, que no ano anterior expôs obras de Hélio Oiticica (ITAÚ CULTURAL, 2010, online). Por estes exemplos citados, percebemos que, após o concretismo, durante as décadas de 60 e 70, o Brasil tinha um cenário artístico muito aquecido e produtivo no que havia de mais avançado no universo da arte: a arte conceitual, em toda sua pluralidade, que não pode ser classificada por estilo ou semelhanças entre as obras. No Brasil, esta arte tinha várias vezes um cunho político, ou ao menos, questionador para a sociedade. Isto fez com que a arte se infiltrasse nos sistemas e processos comuns do cotidiano das pessoas para levar suas mensagens. Daí surge um ponto forte de convergência, onde a arte se associa e faz uso do poder de comunicação, disseminação, circulação, designação e organização do design para expandir seu alcance e horizontes. Esta diversidade e qualidade de experimentações, em vários sentidos acabaram por se tornar referência até mesmo internacional, e influenciou muito do que temos atualmente não só em termos de artes plásticas, mas desde o cinema até arte computacional, e principalmente, o design gráfico.
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AS EXPERIÊNCIAS DA ARTE E DO DESIGN
Consideremos então o processo criativo sob esta perspectiva: uma ideia que dispara métodos e técnicas, que geram resultado. Nunes (1991) explica que, segundo Aristóteles, os processos criativos humanos (como a arte e o design) geram objetos contingentes e artificiais, através de uma dinâmica entre matéria e forma. A matéria (do grego hylé, que significa madeira ou material) é estofo, simples potência ou possibilidade, mas que necessita de uma forma (morphe), uma ideia que a determine e molde. Do ponto de vista crítico de Kant, são duas as fontes do conhecimento: a Sensibilidade e o Entendimento. Por meio da Sensibilidade é que percebemos o mundo de acordo com os nossos sentidos. O Entendimento é responsável pela geração de conceitos objetivos. Portanto, para Kant, só alcançamos uma experiência efetiva de conhecimento quando as percepções se ajustam a conceitos e, por outro lado, os conceitos nos remetem a experiências sensíveis. A faculdade mental responsável pela intermediação entre as percepções e os conceitos é a Imaginação. Trata-se, diz o próprio Kant, de um jogo da imaginação com as representações ou intuições, jogo esse que, utilizando livremente as representações ou intuições em face da ordem do Entendimento, nem infringe a sua estrutura, nem está subordinado a um de seus conceitos. (NUNES, 1991:51). 45
Este jogo da imaginação busca uma livre harmonização entre aquilo que percebemos e aquilo que entendemos. Friedrich Schiller aprofundou-se nestas ideias de Kant. Admite a existência de um impulso lúdico, que se exerce acima das necessidades básicas da vida, apresentando-se, sobretudo, como um jogo estético. Força eminentemente livre, o jogo estético neutraliza tanto o rigor das formas abstratas, produzidas pelo intelecto, quando a imediatidade das sensações passageiras, e, “dando forma à matéria e realidade à forma”, liberta o homem do jugo da Natureza exterior e das exigências racionais exclusivistas (ibidem: 55).
Não só a arte como o design também se utiliza deste jogo em sua prática. Temos uma visão dividida da vida, visão que muito bem pode ter sido necessária para a solução de problemas físicos, mecanicamente, mas hoje chegou a ser o principal obstáculo para resolver os problemas criados pela mecanização. Ao desenhar, esta dificuldade aparece como a separação entre o racional e o intuitivo, entre o prático e o criativo. Mas um rápido estudo sobre o modo como trabalham e pensam os mais famosos artistas, engenheiros, cientistas, designers, etc., sugere que todos têm algo em comum: encontraram formas de enganar esta divisão, de combinar a razão com a imaginação, de ser tanto criativos como práticos, de saber quando é racional ser irracional e quando é racional trabalhar através da experiência. A essência do design é conciliar o que parece oposto. Resolver as contradições. Para tanto, há de se confiar no próprio sistema nervoso, na própria inspiração incontrolável, na sua mente-corpo. (JONES apud FUENTES, 2006: 113).
Tanto no processo de criação, quanto no usufruto do produto final, é gerada uma experiência. Segundo Nunes (1991:13): Kant admite três modalidades de experiência: a cognoscitiva (do conhecimento intelectual propriamente dito), inseparável dos conceitos, mediante os quais formamos ideias das coisas e de suas relações; a prática, relativa aos fins morais que procuramos atingir na vida; e a experiência estética, fundamentada na intuição ou no sentimento dos objetos que nos satisfazem, independentemente da natureza real que possuem.
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Cada experiência é composta por elementos destas três dimensões, cada um a seu modo contribuindo para a efetividade da experiência como um todo.
2.1| ABERTURA E INTERAÇÃO A arte e o design, ao abandonarem a tradicional prática fundamentada em estilos, convenções e tendências visuais libertaram-se das restrições impostas à criação desde a concepção de um trabalho, impondo rótulos baseados em critérios como os materiais e técnicas empregados e a semelhança com outros trabalhos, o que não é suficiente para classificar ou julgar o valor da arte, como Kosuth (2006) afirma. Umberto Eco (1991:41) propõe que: A poética da obra “aberta” tende, como diz Pousseur a promover no interprete ‘atos de liberdade consciente’, pô-lo como centro ativo de uma rede de relações inesgotáveis, entre as quais ele instaura sua própria forma, sem ser determinado por uma necessidade que lhe prescreva os modos definitivos de organização da obra fruída.
Esta transformação do público (aquele que assiste) em usuário (aquele que usufrui) gera uma abertura nos projetos, torna a obra um campo de possibilidades. Ela pode permitir uma abertura desde um nível mais básico, das interpretações e entendimentos possíveis, que praticamente tudo possui, pois é impossível para alguém que cria algo ter o controle absoluto sobre a experiência que será gerada, até uma intervenção mais efetiva, que exija uma ação consciente e autônoma de modificação ou colaboração. As aberturas às possibilidades podem se dar de várias maneiras. Pode-se escolher não finalizar a obra ou produto, mas fornecer pistas ou até mesmo instruções para que outras pessoas possam deduzir como executar ou modificar a ideia original. Pode-se projetar um sistema colaborativo ou um programa que dependerá da interação e contribuição dos outros. O design pode projetar diferentes modalidades de jogo, que vão gerar diferentes experiências ricas estética e intelectualmente. Como exemplo destes níveis e formas de abertura, podemos citar a obra de David Carson, que apresenta a abertura na fase metodológica, incorporando elementos e processos não previstos a sua produção; e no produto gerado, onde o usuário participa do projeto ao desvendar e jogar com os significados propostos. Lygia Clark já atua de maneira diferente. Em seus processos define a ideia e a executa, de forma que o usuário-
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participante terá liberdade para modificar a forma do objeto. Cildo Meireles incorpora a abertura, por exemplo, ao fazer arte com objetos que estão em circulação nos sistemas econômicos da sociedade. Ele não pode prever Até onde suas garrafas chegarão, ou quando suas cédulas serão tiradas de circulação ou rasgadas. O fato é que, todos estes artistas ou designers se utilizam de situações as quais a maioria das pessoas tenta controlar ou prever, para criar projetos (sejam de arte ou design) que contém um pouco da vida em si, para prover experiências de algum modo construtivas para os usuários.
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CONTRIBUIÇÕES DA ARTE PARA O DESIGN
Analisando especificamente a experiência gerada pela arte conceitual, desde a concepção de um projeto até o efeito da obra sobre o público podemos perceber que: •
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endo a função básica da arte conceitual apresentar-se como proposição S a respeito do que o artista considera arte, temos então uma experiência tautológica, ou seja, onde a arte exprime uma ideia sobre arte. Esta posição metalinguística da arte conceitual procura entender os próprios fundamentos expandindo assim seu domínio. Como a arte conceitual não se baseia em modelos metodológicos ou procedimentais, os projetos são abertos, dependentes da ideia a ser trabalhada. Podem ser elaborados sistemas, programas, fórmulas, ou quaisquer outros métodos que melhor atendam as premissas da ideia inicial. Assim, os processos de concepção são considerados tão artísticos quanto a obra final. Sol LeWitt, fala sobre o processo de concepção em seus trabalhos: A própria ideia, mesmo no caso de não se tornar algo visível, é um trabalho de arte tanto quanto qualquer produto terminado. Todos os passos intermediários – rabiscos, rascunhos, desenhos, trabalho malsucedido, modelos, estudos, pensamentos, conversas – interessam. Os passos que mostram o processo de pensamento do artista às vezes são mais interessantes do que o produto final (LEWITT, 2006: 179).
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Como aponta LeWitt, a obra resultante deste processo também é aberta, já que a percepção (como ele denomina a percepção sensível e o entendimento) apresenta possibilidades diferentes a todos, inclusive ao próprio artista. Não é muito importante com o que o trabalho de arte se parece. Ele precisa se parecer com alguma coisa se tem uma forma física. Seja qual for a forma que possua no final, ele deve começar com uma ideia. É com o processo de concepção e realização que o artista está envolvido. Uma vez que tenha recebido do artista sua realidade física, o trabalho está aberto para a percepção de todos, inclusive do artista (ibidem: 178).
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O público deixa então de ser um elemento passivo, com função meramente contemplativa, e passa a ser peça fundamental no processo de criação, com o papel ativo de ampliar as dimensões cognitivas e estéticas da experiência, condicionado ao seu próprio repertório e consciência. O efeito da experiência deixa de ser meramente reativo (de resposta) e passa a ser interativo (de troca, mutualidade), um verdadeiro jogo imaginativo, onde o usuário joga com a obra, com o artista e com os outros, ampliando o alcance da arte. uanto à estética, ela se torna um elemento gerado indiretamente pelo Q processo de entendimento do conceito artístico. Em vez do tradicional fluxo: percepção > estética, temos percepção > entendimento > estética. Com os conceitos e a estética intrincados em um mesmo processo temos uma experiência mais rica.
Analisando sob a mesma perspectiva a experiência do design contemporâneo em geral, desde o projeto até os efeitos por ele causados, verificamos que: •
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A função primordial do design é demandada antes de tudo por uma necessidade de comunicação. Assim, muitas vezes abdica-se das explorações e questionamentos em torno das estruturas e fundamentos do design em nome de uma comunicação mais prática. A metalinguagem no design é tida como secundária. A determinação dos métodos é feita levando-se em consideração estas questões práticas. Muitas vezes, seguem-se paradigmas que tanto podem
ajudar otimizando os processos quanto podem condicionar a criação e os caminhos do projeto à propriedades não desejadas. •
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Os produtos gerados pelo design apresentam uma linha geral de comunicação, mais clara e objetiva, e podem oferecer caminhos paralelos de entendimento e percepção. Este grau de abertura de possibilidades pode variar bastante. Ao ter contato com um objeto de design, muitas vezes são oferecidas as possibilidades da mente pode escolher seguir o caminho mais curto para a compreensão da mensagem ou aceitar jogar, estética e intelectualmente, decodificando a mensagem e seus signos, capturando o sentido da mensagem. A estética é gerada pelo entendimento do designer, que a transformará em um elemento a ser percebido pelo usuário diretamente. A percepção estética é paralela ao entendimento das ideias.
Considerando ambas as experiências, observamos o quanto o design parece ser bem mais condicionado a fatores externos, pois a arte no geral já alcançou um alto grau de autonomia, histórica e socialmente. A arte conceitual é um movimento relativamente recente e, apesar de o design sempre ter buscado se espelhar nas evoluções da arte desde que surgiu, ainda não conseguiu incorporar efetivamente em sua estrutura esta riqueza da experiência e jogo intelectual e estético presente principalmente na arte conceitual. Porém, seria possível existir um design que se libertasse destes condicionamentos, em prol de uma experiência tão rica quanto a da arte conceitual, para designer e usuário, de forma viável?
3.1| DESIGN COMO AGENTE E VEÍCULO DA FRUIÇÃO IMAGINATIVA Para responder à pergunta anterior, proponho uma análise mais aprofundada sobre o trabalho de David Carson, sob os mesmos aspectos em que foram analisadas as experiências da arte conceitual e do design anteriormente. 51
Fig. 20 - Ray Gun nยบ54, Marรงo de 1998. Capa do Radiohead.
Fig. 21 - Livro The Architecture of Patterns.
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Fig. 22 - Ray Gun nยบ43, Fevereiro de 1997. Capa do Nine Inch Nails
Fig. 23 - CD The Fragile, Nine Inch Nails. Fotografia e Design por David Carson
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ssim como todo projeto de design, os trabalhos de Carson possuem A função comunicativa. A primeira vista, parece dificultar a comunicação propositalmente, mas a comunicação existe, apesar de algumas vezes exigir certo esforço do usuário. orém, ao mesmo tempo em que expressa, a mensagem também P questiona ao design sobre seus princípios e limites. Comunica e paralelamente procura expandir fronteiras e propor novas visões do design. Linguagem e metalinguagem se misturam. arson afirma que, como não havia estudado design aprofundadamente C quando começou a trabalhar, não conhecia as normas do bom design e procurou fazer suas próprias explorações, portanto não houve paradigmas que limitassem sua criação. O fato é que, em seus projetos ele busca incorporar experiências, sejam expressões pessoais, obras do acaso e imprevistos, entre muitas outras possibilidades. E cada elemento contribuirá para o significado e impressão geral (BLACKWELL e CARSON, 1995). ssim, os trabalhos de Carson chegam ao público com um alto grau de A abertura. As figuras 11 e 12 são capas da revista Ray Gun. Percebemos que apesar de o nome das bandas não estar completo, desde que tenhamos o mínimo de referência sobre elas conseguimos entender. Entramos então em uma segunda análise, de que esta incompletude não é casual. Cabe a nós não só decodificar como também decifrar o que está implícito. o entrarmos em contato com as formas, cores e outros signos, temos A uma reação estética. Contudo, ao decifrarmos a mensagem abaixo desta superfície, novamente temos o deleite estético. Assim temos um fluxo de experiência mais completo: percepção > estética > entendimento > estética.
Analisando e comparando os fatores que condicionam estas experiências, podemos concluir que a resposta para a pergunta feita anteriormente é sim. O exemplo de David Carson nos mostra que há viabilidade na prática de um design que gere experiências mais ricas. Assim como a análise dos artistas conceituais e suas obras demonstra que, não só existe esta proximidade
entre a arte conceitual e o design, como existe também colaboração entre as áreas. Trocam-se métodos, técnicas, conselhos e ideias, que influenciam os processos e projetos gerados. Porém, copiar o modelo de Carson ou dos artistas conceituais não nos levaria a atingir este objetivo, pois a resposta que procuramos não se encontra no produto final. É necessário entender como cada processo funciona para sermos capazes de desenvolver nossos próprios métodos, de acordo com nossa realidade. Para isso é preciso uma dose de ousadia, não simplesmente ao escolher uma fonte ou cor, mas ao nos posicionarmos, para que seja possível abrir-se para as opções que podem parecer as mais improváveis, mas que na verdade, podem se revelar grandes ideias.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O design, ao longo de toda a sua história sempre encontrou na arte uma fonte de renovação, sempre se espelhando nos caminhos que a arte trilhava para revigorar-se não só criativa como reflexivamente. Contudo, há um momento em nossa história recente em que a arte, em sua eterna busca pela ampliação de sua área de conhecimento, deu grandes passos em direção a explorações das áreas relacionadas à linguagem e dos conceitos, ultrapassando a barreira dos olhos e atingindo nossa reflexão, aproximando a arte do cotidiano e dos sistemas sociais, consequentemente, do design. A recente arte conceitual com essa proximidade tem muito a contribuir para o design contemporâneo que ainda não foi explorado como nas formas de arte anteriores. Alguns aspectos específicos cooperam para estas contribuições. Podemos perceber que ao abrir o projeto para que haja uma incorporação de possibilidades imprevisíveis (sejam geradas pelo acaso ou pelos outros) conseguimos alcançar espaços inexplorados, tanto na comunicação a ser efetuada quanto nos domínios estruturais do design gráfico. Entender e questionar os fundamentos e fronteiras da atividade que exercemos também é essencial para que haja evolução, não só do designer como profissional, mas também do design como uma disciplina. É preciso então pensar o design de uma nova forma. O designer tem não só uma função de definir e prever o futuro, mas de prover possibilidades e 57
tornar-se mais consciente dos processos aos quais está envolvido e suas propriedades e consequências. Da mesma forma, é preciso pensar em uma experiência interativa, onde quando o usuário entra em contato com experiências de design que forneçam um desafio, ele passa a jogar com o design, provocando uma troca, e assim ele é estimulado a desenvolver-se intelectual e esteticamente e em contraponto a fazer o mesmo com seu ambiente, expandindo os significados da mensagem para si e para os outros. Este jogo de imaginação (entre conceitos e percepções) é a atividade que permite a evolução. Com uma prática do design fundamentada em uma comunicação de vários níveis, ela deixa de ser supérflua e passa a ser mais estimulante. Ao espelhar-se na arte conceitual e absorver estes conceitos, a principal contribuição é com relação à experiência gerada. Através da abertura, da dinâmica entre entendimento e estética, do jogo e de um questionamento, a experiência gerada torna-se não só mais efetiva como transformadora. Seja uma modificação de um ponto de vista, ou uma nova consciência sobre algo, a intenção é que, ao entrar em contato com a arte, a pessoa seja transformada. E é nesta experiência transformadora que está na plenitude da arte conceitual. O design ao buscar esta experiência potencializa seu efeito comunicativo e transforma não só o mundo como as pessoas ao seu redor, instigando o desenvolvimento de pensamentos e ações.
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REFERÊNCIAS
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