ANO LXI | ABRIL 2015 | ASSINATURA ANUAL | NACIONAL 7,00¤ | ESTRANGEIRO 9,50¤
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MOÇAMBIQUE
CHEIAS DEIXAM FAMÍLIAS SEM CASA E SEM QUINTAL
MULHERES FELIZES COM CANETA E LÁPIS Pág. 10 MILHÕES DE CURDOS LUTAM PELA INDEPENDÊNCIA Pág. 18
“LUTEI CONTRA DEUS E PERDI A BATALHA” Pág. 23
CONSOLATA É CHEIA DE GRAÇA, POR DEUS AGRACIADA PARA LEVAR AO MUNDO A CONSOLAÇÃO DE JESUS. CONSOLADOS SÃO OS EVANGELIZADOS, PORQUE AMADOS DE DEUS. CONSOLAR É LEVAR A TODA A PARTE A CONSOLAÇÃO DE DEUS SALVADOR. COMO MARIA TORNAMO-NOS SOLIDÁRIOS COM TODOS. SOLIDARIEDADE É O OUTRO NOME DA CONSOLAÇÃO. COMO ELA SOMOS PRESENÇA CONSOLADORA EM SITUAÇÕES DE AFLIÇÃO. POR SEU AMOR COLOCAMOS A NOSSA VIDA AO SERVIÇO DO HOMEM TODO E DE TODOS OS HOMENS. ALLAMANO DEU-NOS MARIA POR MÃE E MODELO. POR ISSO CHAMAMO-NOS MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA
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MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA
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editorial
AS CICATRIZES DO RESSUSCITADO Havia uma moça que tinha feito parte do grupo de mulheres que tinham acompanhado Jesus até ao calvário. Jovem tímida, silenciosa e reservada. Quando soube da Ressurreição do Senhor não precisou de visões nem de confirmações. Logo acreditou. Levada por uma audácia incrível, fez-se peregrina, pregando sem medo por cidades e aldeias as palavras de Jesus. Impressionado pelo seu testemunho, um homem perguntou-lhe: “Diz-me, qual é o segredo da tua coragem e da tua fé?” “A humildade!”, respondeu. “Foi assim que me ensinou o Mestre”. O homem ficou por momentos em silêncio e continuou: “E para que serve a humildade?” “Simplesmente para te dizer neste momento que te quero bem e estou disposta a dar a vida por ti”. Se é imperioso convencer-me da presença viva e real do Ressuscitado dentro de mim e estabelecer com Ele uma relação pessoal, é igualmente necessário descobrir o seu olhar naqueles que me rodeiam. “Cristo une-nos e manifesta-nos uns aos outros”, dizia Theilhard de Chardin. Cristo Ressuscitado projeta-nos para os outros. Como cristãos somos chamados a anunciar que Ele está presente e vivo no coração do mundo e da história. A sua presença é dinâmica e libertadora. No coração da nossa fé há uma vida “crucificada”, que não terminou no fracasso, mas na ressurreição. Esforços, trabalhos e sofrimentos na luta por um mundo mais humano e uma vida mais feliz para todos, nada disso será em vão. Viver com os que sofrem, estar perto dos mais carenciados, dar a mão a quem resvala… não é absurdo. É caminhar para o mistério de um Deus que cicatrizará para sempre as nossas feridas.
Foi esta a fé do bispo Oscar Romero, que será beatificado no próximo 23 de maio. A sua coragem profética apoiava-se em Cristo Ressuscitado, fundamento de toda a libertação. Defendia que a Igreja não pode ficar surda nem muda perante o clamor de milhões de pessoas que gritam por libertação: “Aquele que, colocando a sua fé no Ressuscitado, trabalha por um mundo mais justo, que grita contra as injustiças do sistema atual, contra a violência de uma autoridade abusiva, contra as confusões dos que exploram, aquele que luta a partir da ressurreição do grande Libertador, somente esse é cristão autêntico”. Neste tempo pascal somos convidados a olhar para as cicatrizes do Ressuscitado. Não faltam na nossa humanidade feridas, cansaços e fadigas, mas há uma esperança que nos sustém. O vencedor da morte um dia “enxugará as lágrimas dos nossos olhos, e já não haverá morte, nem pranto, nem gritos nem fadigas, porque o mundo velho terá passado”(Ap 21, 4) . Perturbados por tantas situações inquietantes, poderemos porventura ficar abalados na nossa própria fé, mas é encorajadora a Palavra do Ressuscitado: “Olhai para as minhas mãos e os meus pés! Sou Eu mesmo, não temais!” DARCI VILARINHO
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sumário Rua Francisco Marto, 52 Apartado 5 2496-908 FÁTIMA Nº4Ano LXI – ABRIL 2015 Tel. 249 539 430 / 249 539 460 Fax 249 539 429 geral@fatimamissionaria.pt redacao@fatimamissionaria.pt assinaturas@fatimamissionaria.pt www.fatimamissionaria.pt FÁTIMA MISSIONÁRIA Registo N.º 104965 Propriedade e Editora Delegação Portuguesa do Instituto Missionário da Consolata Contribuinte Nº 500 985 235 Superior Provincial António Jesus Fernandes Redação Rua Francisco Marto, 52 2496-908 Fátima Impressão Gráfica Almondina, Zona Industrial – Torres Novas Depósito Legal N.º 244/82 Tiragem 24.400 exemplares Diretor Darci Vilarinho Diretor executivo Francisco Pedro Redação Darci Vilarinho, Francisco Pedro, Juliana Batista Colaboração Albino Brás, Álvaro Pacheco, Ângela e Rui, Carlos Camponez, Cláudia Feijão, Elísio Assunção, Leonídio Ferreira, Luís Maurício, Lucília Oliveira, Patrick Silva, Teresa Carvalho; Diamantino Antunes – Moçambique; Tobias Oliveira – Roma Fotografia Lusa, Ana Paula, Elísio Assunção e Arquivo Capa e Contracapa Lusa Ilustração Hugo Lami, H. Mourato e Ricardo Neto Design e composição Happybrands e Ana Paula Ribeiro Administração Cristina Henriques Assinatura Anual Nacional 7,00€; Estrangeiro 9,50€; Apoio à revista 10,00€; Benemérito 25,00€; Avulso 0,90€ Pagamento da assinatura multibanco (ver dados na folha de endereço), transferência bancária nacional (Millenniumbcp) NIB 0033 0000 00101759888 05 transferência bancária internacional IBAN PT50 00 33 0000 00101759888 05 BIC/SWIFT BCOMPTPL cheque ou vale postal (inclui o IVA à taxa legal)
TAREFAS PARA HOJE
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18 UMA OPORTUNIDADE DE PAZ NO CURDISTÃO 03 EDITORIAL As cicatrizes do Ressuscitado 05 PONTO DE VISTA O que (não) fazemos nós com
o que o Papa diz e faz?
06 LEITORES ATENTOS 07 HORIZONTES A primavera existe mesmo 08 MUNDO MISSIONÁRIO
Vencer o Boko Haram na Nigéria pelo combate à corrupção Óscar Romero santo e mártir de El Salvador Meninas do Nepal recusam matrimónio forçado Bispos da Terra Santa lançam apelo para reconstruir Gaza Divisões políticas e egoísmo ameaçam Moçambique 10 A MISSÃO HOJE Quando uma caneta e um caderno transformam as mulheres em crianças 11 PERFIL SOLIDÁRIO Na rua com os sem-abrigo 12 A MISSÃO HOJE Páscoa Missionária “enche o coração dos jovens” 13 DESTAQUE Síria: várias guerras sem fim à vista 14 ATUALIDADE Moçambique alagado pelas cheias 22 MÃOS À OBRA Mulheres indígenas aprendem a costurar 23 TESTEMUNHO DE CONSAGRADO “Lutei contra Deus e perdi a batalha” 24 GENTE NOVA EM MISSÃO O centro da nossa fé 26 TEMPO JOVEM Livres para amar 28 SEMENTES DO REINO E o vencedor é… 30 GESTOS DE PARTILHA 31 VIDA COM VIDA A graça de ser o primeiro 32 O QUE SE ESCREVE 33 MEGAFONE 34 FÁTIMA INFORMA Crianças cantam e encantam
ponto de vista
O QUE (NÃO) FAZEMOS NÓS COM O QUE O PAPA DIZ E FAZ? texto ANTÓNIO MARUJO*
A proclamação, pelo Papa Francisco, de um ano jubilar da misericórdia, recoloca no centro a palavra-chave do pontificado, ainda curto no tempo mas intenso na proposta: a misericórdia, mais do que a lei ou a moral, é o âmago do Evangelho. “No início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte”, escrevia Bento XVI na Deus Caritas Est (nº 1). No Evangelho, o sábado (a lei) é que foi feito para a pessoa e não o contrário; e cada apelo de Jesus à mudança de vida surge no contexto de um encontro intenso e não de uma proposta moralizante. O Papa Francisco não tem feito senão repetir essa mensagem. Dois anos depois da sua eleição, percebe-se que ele pretende levar a Igreja a um maior entusiasmo evangelizador, com o acolhimento e a misericórdia no centro; mas ainda não fomos capazes senão de bater palmas e dizer que o Papa é fantástico, sem mudar modos de agir e propostas pastorais. “No próprio coração do Evangelho, aparece a vida comunitária e o compromisso com os outros”, lê-se na Evangelii Gaudium (nº 177). Mas não reflectimos sobre como colocar as comunidades cristãs nessa perspectiva e não viver autocentradas, como tantas vezes acontece.
alternativas – e até contratam para os seus quadros o ex-presidente da Comissão Europeia, símbolo dessa “economia que mata”. A pastoral missionária exige comunidades que sejam capazes de sair de si e abandonem o argumento de que se fez sempre assim (EG 33). Mas preferimos continuar a guardar as dez ovelhas que (ainda) temos do que ir procurar as 90 que não se sentem interpeladas pela beleza do Evangelho que não sabemos mostrar. Como diz o Papa, é preciso sermos “ousados e criativos nesta tarefa de repensar os objectivos, as estruturas, o estilo e os métodos evangelizadores das respectivas comunidades. Uma identificação dos fins, sem uma condigna busca comunitária dos meios para os alcançar, está condenada a traduzir-se em mera fantasia”. (EG 33) * jornalista do religionline.blogspot.pt o autor escreve segundo a anterior norma ortográfica
O Papa estabelece uma relação clara entre o mandamento “não matarás” e a necessidade de “dizer ‘não a uma economia da exclusão e da desigualdade social’”, que “mata”. Mas continuamos a ter cursos de Economia e Gestão das universidades católicas que preferem reproduzir esse modelo económico e financeiro do que criar Abril 2015
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leitores atentos
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Estatuto editorial FÁTIMA MISSIONÁRIA assume-se como uma publicação de informação geral com a missão de promover os autênticos valores humanos e cristãos, tais como a paz, a solidariedade, a justiça, a fraternidade e a defesa do ambiente. FÁTIMA MISSIONÁRIA tem como objetivo informar os leitores sobre os mais diversos temas que dizem respeito sobretudo a Fátima e aos povos do Terceiro Mundo, nomeadamente aos de língua portuguesa. Pretende ser um veículo de notícias e iniciativas que circulam em ambos os sentidos. FÁTIMA MISSIONÁRIA pretende chegar às cidades e às aldeias, dentro e fora do país; dirige-se a um público muito variado: crianças, jovens e adultos sem distinção de raça nem credo – usando para isso mesmo um estilo simples e acessível a todos. 6
SOLIDARIEDADE
Venho remeter à FÁTIMA MISSIONÁRIA um cheque para a renovação da assinatura de 2015 e apoio ao projeto de solidariedade da Costa do Marfim ou para qualquer situação mais urgente nos vossos projetos. Continuo a dar os parabéns pelo vosso trabalho extraordinário dado às populações carenciadas através da anúncio da Palavra de Deus e não só. É sempre com muito agrado que recebo a vossa revista que me ajuda na minha formação no trabalho que faço na minha paróquia. José Baptista
DE 27 ASSINANTES
Meus bons amigos: faço votos de que o novo ano traga muito amor para todos vós, e muita paz, embora esta última não se esteja a viver. De facto há cristãos que nem a sua fé podem viver em liberdade sem arriscar a própria vida. Que o Senhor tenha dó de nós. Junto envio o dinheiro dos meus 27 assinantes. Peço à Senhora da Consolata que estes não desistam já que não tem sido FÁTIMA MISSIONÁRIA nasceu e mantém a sua sede na cidade de Fátima, cada vez mais um ponto de encontro de povos e culturas, a nível mundial. Como o seu nome indica, quer informar sobre a Missão em geral, desenvolvendo as potencialidades que o tema encerra: evangelização e promoção dos povos; direitos humanos, incluindo a denúncia dos seus atropelos, violações e injustiças; relações entre o norte e o sul do planeta, batendo-se por uma justa cooperação entre as nações; cultura, usos e costumes dos povos, sociedade, religiões e missão da Igreja; divulgação de notícias de todo o mundo, com prioridade para os países menos desenvolvidos; formação para a mundialidade, e apoio a campanhas de solidariedade para com as minorias e grupos humanos mais desfavorecidos, designadamente refugiados e povos ameaçados de extinção.
possível arranjar novos assinantes. Mas quando olho para trás e vejo o pouco campo que semeei a dar algum fruto, fico feliz. Natália
LEIO-A DE PONTA À OUTRA
Venho pagar a minha assinatura desta linda e boa revista que todos os meses me chega às mãos. Leio-a com todo o amor e carinho duma ponta à outra, pois é um trabalho muito bem realizado por todos os que a fazem. Rezo todos os dias por vós missionários e por todos os que levam a paz, o amor e a Palavra de Cristo por esse mundo além. Aproveito para pedir por favor que publiquem uma graça que recebi há tempos por intercessão do beato José Allamano a quem recorri numa doença em que o meu médico dizia que não havia nada a fazer. Obrigada. Benilde
FÁTIMA MISSIONÁRIA é propriedade da Delegação Portuguesa do Instituto Missionário da Consolata. Não tem fins lucrativos, não tem vínculos partidários, nem é órgão oficial de qualquer instituição ou religião. Dirigida pelo seu diretor, equipa de redação e administrador, propõe-se colaborar com os órgãos de comunicação afins e com associações cujos objetivos sejam a defesa dos seus interesses e finalidades. FÁTIMA MISSIONÁRIA compromete-se a respeitar os princípios deontológicos e a ética profissional dos jornalistas, assim como a boa-fé dos leitores. FÁTIMA MISSIONÁRIA é mensal e é distribuída por assinatura, vivendo exclusivamente da contribuição generosa dos seus assinantes, leitores e amigos.
horizontes
A PRIMAVERA EXISTE MESMO!
texto TERESA CARVALHO ilustração HUGO LAMI Sérgio encheu-se de coragem e foi a casa do senhor Rogério. Talvez ele salvasse Simão. – Senhor Rogério, não gosto de fazer pedidos, mas talvez possa ajudar o meu sobrinho mais velho: é bom rapaz mas na aldeia só tem os amigos para se ocupar. A minha irmã não consegue matar a fome aos filhos todos, e com o meu cunhado não se pode contar. Se conseguisse dar-lhe trabalho e fazer dele um homem. Duas semanas depois Simão entrou no quarto que o Rogério lhe preparara num anexo da casa da família. O dia a dia começou duro: do nascer ao pôr do sol havia sempre que fazer – bem diferente de estar sentado com os amigos nos muros do café da aldeia. Quando numa manhã Rogério o convidou a subir ao trator e o ensinou a conduzir, o seu mundo cresceu. A visão do horizonte a partir daquele lugar é uma imagem que não esquece: dali, prometeu a si mesmo que um dia iria à aldeia, com o seu carro, e levaria a sua mãe e os irmãos à terra da avó, como ela tanto desejava.
ser um companheiro divertido e brincalhão. Tinha a confiança de Rogério e de Amélia e isso dava-lhe vontade de assobiar como se aos 18 anos tivesse descoberto que havia música na sua vida. Um dia, Rogério chamou-o ao cimo da colina acabada de desbravar e disse-lhe: – Simão, proponho-te um negócio: esta colina fica só à tua responsabilidade. Tudo o que fizeres nela é teu, mas só podes trabalhá-la nas tuas horas livres. Compro-te o que colheres, mas todo o dinheiro vai para uma conta que só podes usar na compra do teu carro. Se aceitares, ofereço-te a carta de condução. Simão olhou arregalado aquele senhor de braços musculados e mãos calejadas. Pela primeira vez, teve coragem de lhe dar o abraço que muitas vezes desejara. Como resposta, teve o maior e mais sentido abraço de sempre. Naquele momento sentiu-se um homem.
Todos os dias, do alto da colina, Simão olhava com carinho o evoluir das sementes e sonhava. E o sonho ia moldando a sua vontade e o seu esforço. Num dia especial, o desafio de Rogério cumpriu-se: Simão estacionou à frente da casa da mãe um carro reluzente. Entrou em casa. A mãe fazia o almoço com a mesa já posta para os filhos que daí a pouco chegariam da escola. Simão fez-se anunciar com o seu assobio. Aproximou-se da mãe, tirou-lhe o avental e trouxe-a ao quintal. Entregou-lhe uma chave e anunciou muito sério, cheio de orgulho na voz: – Mãe, hoje o teu almoço de aniversário não é aqui em casa. E quem te leva e aos manos, sou eu! Um passarinho passou a cantar, juntando-se à imensa orquestra que explodia em crescendo no coração de ambos.
Todas as semanas Simão “voava” até à caixa multibanco para depositar na conta da mãe metade do seu salário. Em todo o percurso imaginava-a a rezar, agradecida pela comida na mesa, e os irmãos a poderem usar a camioneta para a escola, como os outros miúdos da aldeia. Até talvez pudessem continuar os estudos! O tempo passava e Simão aprendia rápido todos os segredos do campo e da vacaria. O rapazinho inseguro e envergonhado que pensava “ser um triste”, passara a Abril 2015
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mundo missionário texto E. ASSUNÇÃO fotos LUSA
VENCER O BOKO HARAM NA NIGÉRIA PELO COMBATE À CORRUPÇÃO
Entre as causas que deram origem ao grupo islamita Boko Haram está a impunidade e a corrupção das elites nigerianas, assim como a má governação. Elites que, segundo um estudioso muçulmano, o professor universitário Kyari Mohammed, foram educadas no Ocidente. Daí que os extremistas apresentem a corrupção como um produto da cultura ocidental. Recorde-se que a expressão “Boko Haram” significa “educação ocidental é proibida”. O
referido estudioso, enquanto se apressa a condenar com firmeza a violência do grupo islamita, sublinha ao mesmo tempo a necessidade do diálogo com as populações locais e do seu desenvolvimento económico. É urgente tomar medidas concretas para encarar a ameaça do extremismo religioso. “Mesmo que o Boko Haram desaparecesse hoje, deixaria atrás de si uma sociedade dilacerada e violenta”, afirmou o professor. “Todos os grupos sociais
Óscar Romero santo e mártir de El Salvador
1980, enquanto celebrava a missa na capela do hospital. Durante muitos anos, o país viveu tempos difíceis e o processo de beatificação do prelado ficou parado. Hoje, El Salvador “descobre de novo em Monsenhor Romero o filho mais ilustre e o mais forte defensor de todo o povo de El Salvador”, afirmou o responsável pelo processo de beatificação. “Romero nunca odiou ninguém, nem sequer os seus adversários. Pelo contrário, escolhendo sempre os mais pobres queria um El Salvador mais justo, mais atento aos seus filhos mais necessitados”.
O arcebispo mártir de El Salvador “é um testemunho que se levanta contra aqueles que pensam que a violência vencerá”. A afirmação é de Vincenzo Paglia, presidente do Conselho Pontifício para a Família, que esteve em El Salvador a preparar a beatificação de Óscar Romero, que terá lugar na terra natal a 23 de maio. O arcebispo nasceu em Ciudad Barrios a 15 de agosto de 1917 e foi assassinado em San Salvador pelos “esquadrões da morte” em 24 de março de 8
das zonas onde está presente o Boko Haram são vítimas de violência. As ingentes destruições e as percas sofridas fazem com que muitos tenham perdido a confiança no governo”. Atualmente corre-se o risco de aparecer uma nova fonte de instabilidade com a criação de grupos de autodefesa.
Bispos da Terra Santa lançam apelo para reconstruir Gaza
Meninas do Nepal recusam matrimónio forçado A chaga do matrimónio infantil prolifera nas aldeias mais remotas do Nepal, a cerca de 900 quilómetros da capital Katmandu. Devido à pobreza e abandono dessas aldeias, o matrimónio é uma oportunidade para muitas jovens com poucas perspetivas de futuro, a não ser a fome e o trabalho duro. Um quarto dos cerca de 28 milhões de nepaleses vive abaixo do nível de pobreza. Um estudo recente mostra que metade das mulheres com a idade compreendida entre os 20 e 24 anos contraiu matrimónio antes da idade adulta. O Nepal é um dos 10 países onde se regista o maior número de matrimónios precoces. Fatores de ordem económica, social e religiosa contribuem para a difusão desta prática. Por exemplo, o dote matrimonial a entregar aos pais do esposo é tanto mais baixo quanto mais jovem for a futura esposa. Para combater o fenómeno, no distrito de Bajura, um grupo de jovens formaram clubes que promovem várias atividades para combater o flagelo do matrimónio precoce. E os resultados já começam a aparecer: nos últimos cinco anos a taxa de matrimónios infantis baixou cerca de 20 por cento.
Reunidos no convento franciscano de Jerusalém, os bispos católicos lançaram um apelo urgente “para a reconstrução de Gaza para ajudar as famílias que ficaram sem casa depois do último conflito”. Os prelados da Jordânia, Palestina, Israel e Chipre manifestaram a sua preocupação pela situação dos refugiados iraquianos e sírios, assim como pela realidade dos imigrantes africanos e asiáticos. Os bispos afirmam que a grande maioria deles não acalenta a esperança de regressar aos seus países flagelados por conflitos sanguinosos. Além disso, avisam que os recursos fornecidos pela Cáritas estão a diminuir à medida que se prolonga a situação de crise. A progressiva deterioração das condições de vida de milhões de refugiados e deslocados exige a atuação urgente das Nações Unidas e sublinha as responsabilidades da comunidade internacional.
Divisões políticas e egoísmo ameaçam Moçambique Os bispos moçambicanos publicam uma mensagem em que denunciam a ameaça que pende sobre o país causada por grupos políticos obcecados pela ganância do poder político e económico. “Assiste-se a uma evidente injustiça de uma maioria de pobres esmagada por uma minoria que enriqueceu desonestamente”. Os bispos apontam “a falta de transparência na exploração dos recursos naturais e o desprezo total do ambiente” e outros males como a “corrupção, a pilhagem e a reciclagem de dinheiro”.
Papa Francisco do A ao Z Fez há semanas dois anos que o cardeal Bergoglio foi eleito Papa: dois anos durante os quais pela palavra e pelo exemplo ele não cessou de mostrar à Igreja e ao mundo novos caminhos de fraternidade, perdão e paz. Ao visitar algumas livrarias aqui em Roma tenho notado com apreço que nelas estão expostas muitas dezenas de livros acerca da vida e ensinamentos deste grande Pontífice, e entre eles encontrei um intitulado “O alfabeto do Papa Francisco”. O autor escolhe para cada letra do alfabeto algumas palavras típicas explicando o uso que delas tem feito o Papa e nessa linha menciona por exemplo para o “A” a palavra automóvel descrevendo a crítica que Francisco um dia teceu aos padres e freiras que usam automóveis de alto luxo, e assim por diante até ao “Z” de Zucchetto (solidéu) ao qual ele já várias vezes renunciou trocando-o por um outro que lhe era oferecido. Sei bem que isto de reduzir os ensinamentos do Papa a algumas palavras em cada letra do alfabeto é só uma astúcia literária, mas eu vejo nisso também uma maneira de reconhecer que ele tem sido para nós, durante estes dois anos, um alfabeto vivo da vida e da doutrina cristã.
Tobias Oliveira, missionário da Consolata português em Roma
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a missão hoje
QUANDO UMA CANETA E UM CADERNO TRANSFORMAM AS MULHERES EM CRIANÇAS texto e foto JOÃO NASCIMENTO Muitas vezes, não temos consciência da força e do poder que pequenos objetos têm ao serviço do espírito humano. Uma caneta, um lápis, uma folha de papel... Poder inesgotável. Sem medida. Sem limites. Ou talvez não. Diante de mim, trava-se uma batalha inédita. Um grupo de mulheres, na sua maioria oriundas das comunidades rurais mais pobres do norte da Costa do Marfim, agarram o giz com a mesma força com que agarram o cabo da enxada quando penetram ou rasgam a terra. Sobre um pedaço de madeira abrem sulcos, cavam covas, semeiam grãos. A cena é divertida mas também
Grupo de mulheres marfinenses teve contacto com a escrita pela primeira vez
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dramática. Faz rir e dá vontade de chorar. Desenham o limão mas não sabem que é um “o”; desenham o pilão mas não sabem que é um “l”; desenham o grão de milho mas não sabem que é a ponta do “i”; desenham a metade da cabaça, mas não sabem que é o “c”, ou o “u”. A sua alegria por esboçar uns rabiscos torcidos é imensa. Parecem crianças exaltadas, empurrando-se umas às outras para mostrarem a todos as letras deformadas, acabadas de sair do forno das suas habilidades. Ao olhá-las, sinto um aperto imenso no estômago por me dar conta que, a maioria delas, nunca aprenderá a ler e a escrever mesmo que a sua vontade seja tanta. Foram convocadas para um encontro em Marandallah,
Dentro de algumas horas, regressarão a si mesmas, a pé ou transportadas por uma moto-triciclo, em que cada buraco da pista será motivo de tantas gargalhadas. Para trás, ficarão momentos inesquecíveis de alegria por terem tido a oportunidade de se encontrarem durante o dia, de se olharem ao espelho durante a noite e de saberem que há um dia por ano para as mulheres
perfil solidário
de três dias, sobre a importância da alfabetização para o seu próprio desenvolvimento. A maioria é a primeira vez que se senta numa cadeira com um lápis e um caderno nas mãos. Mas a vida está cheia de mistérios. E o que está a acontecer, na sua forma rude e simples, pode ter na vida destas mulheres o mesmo impacto que teve para a humanidade a descoberta do fogo, da roda ou do espaço. O caminho a percorrer é também ele longo e árduo mas possível. Não sabem ler nem escrever mas têm consciência que a alfabetização é o remédio contra a cegueira que as domina, essa doença social causada pela indiferença e agravada pelo egoísmo. Não pedem muito. Pedem apenas que alguém lhes dê um pouco de atenção e as ajude a desenhar, pelo menos uma vez na vida, as letras que compõem os seus nomes: “Soro” Yeo”, “Tuyo”. Uma vez na vida. São elas, as mesmas mulheres que há algumas horas atrás pareciam crianças a exibir as suas primeiras letras sobre um pedaço de madeira, que agora cantam e dançam consoladamente à volta duma árvore imensa onde a Virgem de Fátima construiu o seu ninho. Em compasso, deslizam à direita e à esquerda, rodopiam e, passando à frente da Virgem, levantam para ela os braços e lhe dizem: “Ninguém é pobre quando tem uma mãe como tu!” Dentro de algumas horas, regressarão a si mesmas, a pé ou transportadas por uma moto-triciclo, em que cada buraco da pista será motivo de tantas gargalhadas. Para trás, ficarão momentos inesquecíveis de alegria por terem tido a oportunidade de se encontrarem durante o dia, de se olharem ao espelho durante a noite e de saberem que há um dia por ano para as mulheres. A partir de agora, o pedaço liso de madeira será substituído pelo campo áspero e sem limites, o pau de giz pelo cabo da enxada, o limão voltará a ser limão e o mesmo se passará com o pilão, o grão de milho ou a metade da cabaça. Já não terão mais tempo para o jogo do sapo, de futebol ou para os passeios pelas ruas da vila sem fardos à cabeça. Tudo será esquecido rapidamente. Tudo, exceto o que não se pode esquecer.
NA RUA COM OS SEM-ABRIGO Em Lisboa, serão poucos os que fazem da rua a sua casa que não conhecem Henrique Pinto, 51 anos, cofundador e ex-presidente da Cais – Centro de Apoio e Inclusão dos Sem-Abrigo. Nos 13 anos que esteve na liderança da associação, estabeleceu uma relação de proximidade com os utentes e ainda hoje muitos continuam a telefonar-lhe, para o telemóvel, pedindo coisas, contando pormenores da vida ou revelando projetos futuros. Natural de Loriga, Seia, fez o doutoramento em teologia sistemática, e ocupa parte do seu tempo como docente e investigador da Universidade Lusófona. Foi missionário da Consolata, com passagens pelo Quénia e Tanzânia. Depois disso, tem-se dedicado sobretudo às causas sociais. Ajudou a criar a Universos, uma associação para o diálogo intercultural e religioso e, mais recentemente, a Impossible, através da qual pretende colocar o Parlamento a discutir a criminalização da pobreza. “Sou um desassossegado e criativo por natureza, pelo que qualquer que seja a minha forma futura, sinto que estarei sempre envolvido no debate de ideias e na criação de projetos que consigam ser ao mesmo tempo facilitadores do diálogo entre povos e construtores de maior coesão política, socioeconómica, cultural, espiritual e ambiental”, escreveu num artigo autobiográfico. FP
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a missão hoje
PÁSCOA MISSIONÁRIA “ENCHE O CORAÇÃO DOS JOVENS” Durante quatro dias, a paróquia de São Pedro de Ovar, em Aveiro, recebe os participantes de mais uma edição da Páscoa Jovem Missionária. A experiência é “intensa e marcante” e não pode ser repetida texto JULIANA BATISTA foto ANA PAULA A comunidade de São Pedro de Ovar, em Aveiro, acolhe os jovens que participam na Páscoa Jovem Missionária (PJM), organizada pela Pastoral Juvenil do Instituto Missionário da Consolata (IMC), de 2 a 5 de abril. Ao longo destes dias, jovens de vários pontos do país vivem a Páscoa “com profundidade”, destacou Bernard Obiero, sacerdote
missionário da Consolata. A oportunidade que cada jovem tem para participar nesta iniciativa é apenas uma. “É uma experiência intensa e marcante que enche o coração dos jovens e que só pode ser realizada uma vez”, realçou o sacerdote, em declarações à FÁTIMA MISSIONÁRIA. A iniciativa proporciona aos
Este ano, a iniciativa decorre com o tema “Desperta o mundo com Cristo Ressuscitado”
participantes e comunidade acolhedora momentos de reflexão e alegria. De acordo com o missionário, esta proposta para o tríduo pascal “é um momento para os jovens viverem a Páscoa animando a comunidade e envolvendo quem os acolhe no espírito de alegria”. Durante a PJM, os participantes realizam atividades e reflexões que os fazem “meditar sobre o sentido da fé” cristã. “Eles aprendem que o essencial é o espiritual e não o material”, frisou. No decorrer destes dias, os jovens vivem juntos em São Pedro de Ovar. Segundo o sacerdote, o facto de “passarem tempo juntos ajuda a criar e a cimentar a amizade”. “Há um ambiente de familiaridade e, assim, aprendem o sentido da partilha e a viver em comunidade”, adiantou. Este ano, a iniciativa decorre com o tema “Desperta o mundo com Cristo Ressuscitado”. O mote baseia-se nas palavras do Papa aos religiosos, chamando-lhes a atenção para que sejam testemunhas do Evangelho – “Despertem o mundo”, pediu Francisco. “É isso que nós também queremos transmitir aos jovens para que eles também sejam testemunhas de uma forma diferente de fazer as coisas, de agir e de viver como disse o Papa”, explicou. No fim de semana após a PJM, dias 11 e 12 de abril, os participantes vão partilhar, durante o “Convívio Missionário Juvenil”, a “experiência forte” que viveram em São Pedro de Ovar, conforme disse Albino Brás, coordenador da Pastoral Juvenil do IMC. O encontro decorre em Fátima com o tema “Acorda!” e é aberto a todos os jovens. Testemunhos missionários, de jovens e consagrados, são alguns dos momentos que vão preencher a sessão.
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destaque QUATRO ANOS DE CONFLITOS E UMA CRISE SEM PRECEDENTES
SÍRIA: VÁRIAS GUERRAS SEM FIM À VISTA
texto CARLOS CAMPONEZ foto LUSA Após quatro anos de guerra, a Síria parece cada vez mais longe de uma solução que ponha termo ao conflito. Os prognósticos que anunciavam a chegada dos ventos de mudança da Primavera Árabe revelaram-se errados e o país enfrenta hoje uma situação de destruição sem precedentes e com um fim pouco previsível. Os números oficiais acerca das consequências do conflito são impressionantes. Diminuição em 15 por cento da população; 220 mil mortos e 840 mil feridos; quatro milhões de refugiados; 6,8 milhões de desalojados; queda abrupta da esperança média de vida de 76 para 56 anos; quatro quintos da população em situação de pobreza e, entre esta, 30 por cento a viver em condições de extrema pobreza.
Múltiplas guerras…
Mas o que tornou tão durável e complexa a guerra na Síria? Uma análise do jornal Le Monde fala-nos, a este propósito, não de uma mas de oito guerras que se alimentam umas das outras. Normalmente, os meios de comunicação social apenas falam de três delas: da que esteve na origem do conflito e põe em confronto o exército de Bashar al-Assad e as forças rebeldes; a que opõe os rebeldes ao Estado Islâmico; e, finalmente, a luta entre as forças do Presidente sírio e o Estado Islâmico. Nestes três conflitos, estão implicados os Estados Unidos da América (EUA), a Arábia Saudita, o Qatar e a Turquia, em apoio às
A guerra na Síria já provocou 220 mil mortos e quatro milhões de refugiados
forças rebeldes, e a Rússia, o Irão, o Hezbollah, no Líbano, as milícias chiitas iraquianas e o exército sírio, do lado de Bashar al-Assad. No entanto, um conjunto de outros conflitos misturam-se com estes, tornando a guerra em território sírio mais complexa: o confronto entre as milícias curdas e o Estado Islâmico, na região do Curdistão, fortemente bombardeada pela aviação norte-americana; a guerra entre o Estado Islâmico e os movimentos afetos à Al-Qaeda; entre o Hezebollah e os movimentos jihadistas da Al-Qaeda e do Estado Islâmico na fonteira entre o Líbano e a Síria; o conflito entre as forças do Estado Islâmico e várias tribos da região leste do país; enfim, a guerra entre grupos rebeldes e a Frente Al-Nosra, afeta à Al-Qaeda, em disputa pelo controlo da região oeste do país.
… um fim incerto
Em termos internacionais, o conflito beneficiou do desentendimento entre as principais superpotências com um poder importante nas
Nações Unidas, em particular no Conselho de Segurança. A Rússia, empenhada em não deixar cair o regime de Damasco, é secundada pela China, cuja posição parece oscilar entre a indiferença e o apoio a Bashar al-Assad. Os EUA, que chegaram a prever uma intervenção direta no conflito para depor o Presidente sírio, encontra-se sem soluções que garantam uma alternativa política num cenário pós-queda de Bashar al-Assad, e está longe de poder contar com a Europa que procura manter-se distante da guerra, privilegiando a sua intervenção no domínio de uma insuficiente ajuda humanitária. O que normalmente denominamos por guerra na Síria é, pois, na realidade, um conjunto de conflitos num território espartilhado por interesses de potências internacionais, regionais e locais, que tornam muito incerta a sua resolução, a curto e médio prazo.
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atualidade
CALAMIDADE Há quatro décadas que não chovia com tanta intensidade
MOÇAMBIQUE ALAGADO PELAS CHEIAS Milhares de casas destruídas, famílias desalojadas, estradas cortadas ao trânsito, povoações isoladas, terrenos de cultivo alagados e o receio de um novo surto de cólera. As cheias, que este ano se manifestaram com uma intensidade que não se via há mais de quatro décadas, voltaram a colocar Moçambique em estado de emergência texto FRANCISCO PEDRO fotos DR A viagem avizinhava-se difícil, mas quando partiu do centro do Gurué em direção ao extremo sul da diocese, o bispo Francisco Lerma não contava com tantas contrariedades. Para percorrer os cerca de 500 quilómetros, precisou de 17 horas, e mesmo assim não conseguiu chegar ao destino final: as paróquias de 14
Mualama e Naburi. Pelo caminho, encontrou estradas intransitáveis, pontes destruídas, desabamentos de terras e muita lama. O carro ficou atolado uma meia dúzia de vezes. A experiência, relatada à FÁTIMA MISSIONÁRIA, ilustra bem o estado em que se encontram algumas das províncias moçambicanas afetadas
nos últimos meses por fortes chuvadas, seguidas de inundações. Em algumas zonas, a subida das águas chegou a atingir os 12 metros. Segundo dados disponibilizados pelo governo, em meados de março, as cheias já tinham provocado 160 mortes e afetado
A população moçambicana está habituada a enfrentar as cheias ano após ano, mas desta vez a intensidade da chuva parece ter apanhado toda a gente de surpresa. “Infelizmente, ninguém estava preparado ou esperava uma cheia assim tão grande”, admite Arianna Bobba, da Agência Internacional de Cooperação Japonesa
Francisco Lerma, também ele privado temporariamente de eletricidade, telefone e acesso à internet. Num primeiro balanço às consequências das enxurradas na sua diocese, o prelado traça um quadro desolador. Mais de metade das 10 mil casas invadidas pelas águas, acabaram totalmente destruídas. E perto de 30 mil pessoas ficaram sem teto. Na rede escolar, muitos dos 77 estabelecimentos danificados, ficaram sem cobertura. Para fazer as primeiras reparações com urgência, serão precisos mais de 40 mil euros, segundo o bispo.
“Ninguém estava preparado” Francisco Lerma, bispo do Gurué, prevê tempos difíceis para a população moçambicana
mais de 200 mil pessoas, sobretudo nas regiões centro e norte do país. Só na província da Zambézia, havia o registo de 137 vítimas mortais e de 40 mil pessoas sem casa. O número de desaparecidos rondava as seis dezenas. Nas infraestruturas públicas, os estragos fizeram-se sentir sobretudo em escolas,
pontes, estradas, redes elétrica e de comunicações. Povoações inteiras ficaram isoladas, sem eletricidade e sem telefone. “É com profunda tristeza que acompanhamos os infelizes acontecimentos que estamos a enfrentar nesta estação chuvosa, desde meados de janeiro”, lamenta
A população moçambicana está habituada a enfrentar as cheias ano após ano, mas desta vez a intensidade da chuva parece ter apanhado toda a gente de surpresa. “Infelizmente, ninguém estava preparado ou esperava uma cheia assim tão grande”, admite Arianna Bobba, da Agência Internacional de Cooperação Japonesa (JICA, na sigla em inglês). De acordo com a representante em Moçambique desta organização não governamental, as últimas grandes inundações registaram-se Abril 2015
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em 1971. Este ano, e apesar de não estarem ainda fechadas as contas aos prejuízos, já se calcula que os estragos sejam superiores aos registados há 44 anos. Nos relatórios com a descrição das infraestruturas atingidas, saltam à vista as 650 escolas danificadas e as 800 mil carteiras que deixaram de existir no sistema de ensino. Em declarações à imprensa, o porta-voz do Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano, Eurico Banze, assume o inevitável: “Temos consciência de que, infelizmente,
vamos ter crianças a estudar debaixo de uma árvore e também vamos ter crianças sem carteiras”. Mudando para o sector da agricultura, a devastação também deixa antever problemas graves para os próximos tempos. Nas províncias de Nampula e Cabo Delgado, por exemplo, mais de 20 mil hectares de culturas ficaram destruídas, sobretudo de milho, sésamo, mandioca, feijão e amendoim. Perto de 1.500 hectares foram dados como
Várias povoações ficaram isoladas, algumas sem eletricidade e sem comunicações telefónicas
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perdidos, segundo um documento do Instituto Nacional de Gestão das Calamidades (INGC) a que a FÁTIMA MISSIONÁRIA teve acesso. Na região sul da província do Niassa, em particular nos distritos de Cuamba e Mecanhelas, centenas de culturas alimentares e de rendimento ficaram igualmente alagadas.
Culturas perdidas
Paulinho Imede, coordenador da União Provincial dos Camponeses e Associações do distrito de
Sensibilizada com a dimensão da intempérie, a comunidade internacional também não ficou indiferente ao drama dos moçambicanos, contribuindo com o envio de ajudas financeiras, alimentos, bens de primeira necessidade, kits de higiene e tendas de campanha para abrigar os desalojados
Lichinga, teme consequências ao nível da segurança alimentar. “Em algumas zonas, nomeadamente nas regiões pantanosas, podemos dizer que este ano as culturas estão perdidas. Mesmo nas hortas, a agricultura está um pouco perdida. O milho, por exemplo, não está a crescer de forma normal, enquanto noutras regiões já se encontra bem desenvolvido e até muda de cor”, lamenta o dirigente. Pelo sim, pelo não, o diretor provincial da agricultura no Niassa, Eusébio Tumuitikile, implorou aos camponeses que não baixem os braços. “Peço aos produtores para que não desanimem porque ainda temos tempo para lançarmos a segunda época, sobretudo no que concerne ao cultivo de milho e de hortícolas”, disse o responsável, prometendo, em compensação, a distribuição na província de três toneladas de milho, 900 quilos de feijão e 200 quilos de ramas de batata doce, para que os pequenos agricultores possam retomar a produção. A nível económico, os prejuízos deverão interferir até no crescimento da economia moçambicana. Num boletim publicado pelo Standard Bank, os financeiros do banco africano apontam este ano para uma redução do Produto Interno Bruto (PIB) que pode chegar a um ponto percentual. Outro dos problemas que o país terá de enfrentar é a cólera, uma doença que em meados de março já tinha provocado mais de 40 vítimas mortais e infetado perto de 5.000 pessoas. O surto apareceu na região de Tete, num campo de exploração de minérios onde vivem milhares de pessoas sem as mínimas condições de higiene. Para evitar a rápida propagação, as autoridades de saúde apressaram-se a declarar o alerta máximo em todo o território, com particular
atenção às províncias da Zambézia, Nampula, Niassa, Cabo Delgado, Sofala e Tete, as mais afetadas pelas cheias.
Ajuda internacional
“A situação é muito complexa. Só em Tete, em média, as unidades sanitárias atendem 70 a 75 pessoas com cólera por dia”, admite a diretora-adjunta de Saúde Pública, Benigna Matsinhe. A Organização Mundial de Saúde (OMS) associou-se de imediato às autoridades moçambicanas e prometeu enviar milhares de antibióticos, produtos desinfetantes, luvas e testes de deteção rápida. Sensibilizada com a dimensão da intempérie, a comunidade internacional também não ficou indiferente ao drama dos moçambicanos, contribuindo com o envio de ajudas financeiras, alimentos, bens de primeira necessidade, kits de higiene e tendas de campanha para abrigar os desalojados. No terreno, há equipas do INGC, de várias agências das Nações Unidas, da União Europeia e de organizações não governamentais, que tentam a todo o custo reparar os danos estruturais. E na área do planeamento, a agência representada por Arianna Bobba apostou em projetos de prevenção de cheias, com sessões de formação para os técnicos da Direção Nacional de Águas. Embora seja um homem de esperança e de fé, Francisco Lerma antevê tempos difíceis para o povo de Moçambique. “A situação dramática ainda se vai prolongar durante todo o ano. Não é fácil reconstruir tantas casas, bens e campos de cultivo destruídos”, antecipa o bispo do Gurué.
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dossier
NEGOCIAÇÕES Milhões de curdos lutam pela independência, desejada desde 1984
UMA OPORTUNIDADE DE PAZ NO CURDISTÃO Metade dos 30 milhões de curdos, a maior das nações sem Estado, vive na Turquia. Desde 1984, o Partido dos Trabalhadores do Curdistão luta para obter a independência ou, pelo menos, uma vasta autonomia e direitos culturais. Agora, o líder oferece o fim da luta armada em troca de negociações com o governo de Ancara texto LEONÍDIO PAULO FERREIRA* fotos LUSA importância do apelo feito no Quando Abdullah Ocalan fala, último dia de fevereiro pelo os curdos escutam. Pelo menos líder histórico do Partido dos os curdos da Turquia, 15 milhões Trabalhadores do Curdistão (PKK) de pessoas. Por isso a extrema 18
para que o movimento faça um congresso extraordinário já nesta primavera para acabar de vez com a luta armada e iniciar um processo político que garanta todos os direitos aos 20 por cento de cidadãos turcos de etnia curda. Ocalan foi capturado há 15 anos e vive na ilha-prisão de Imrali. É impressionante como a sua influência se perpetua sobre o PKK, grupo marxista que desde 1984 combate o exército turco no leste da Turquia e conta com bases no norte do Iraque. Da parte do governo de Ancara, há sinais
de que uma solução pacífica para o problema curdo colhe apoios entre o primeiro-ministro Ahmet Davutoglu e o Presidente Recep Erdogan, há mais de uma década o homem forte do país.
Para se perceber a força do PKK é necessário olhar para a história dos curdos, cerca de 30 milhões de pessoas espalhadas por quatro países do Médio Oriente. Ora, os curdos reclamam ter 25 séculos de
Um povo espalhado por quatro países Turquia 15 milhões de curdos (20 por cento da população) Irão 6,5 a 8 milhões de curdos (7 a 10 por cento da população) Iraque 6 milhões de curdos (17 por cento da população) Síria 1,6 milhões de curdos (9 por cento da população)
história. E entre as suas referências estão o Império dos Medos, criado no século VI a.C, e a dinastia fundada por Saladino no século XII. Islamizados há 1.300 anos, recusaram, porém, a arabização, como mais tarde a turquicização. Por isso até hoje a sua língua, de raiz indo-europeia, nada tem que ver com o árabe ou o turco. É próxima do persa. A partir do século XVI, os príncipes curdos fizeram um acordo com os sultões otomanos, que lhes davam autonomia a troco de guardarem as fronteiras leste do império. Abril 2015
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Para a Turquia é prioritária uma resolução para o separatismo curdo. E a oferta de diálogo de Ocalan foi bem recebida, fazendo quase esquecer que não há muito tempo o Numa época em que a religião e os soberanos valiam mais do que a Presidente Erdogan chamava nação, os curdos mantiveram assim terrorista ao PKK. Mas além várias dinastias. Ao mesmo tempo, a da questão dos direitos liberdade dada pelos sultões turcos linguísticos e culturais, uma permitiu que a cultura e a língua solução para o leste turco, curdas se mantivessem. zona pobre, passa também Durante a Primeira Guerra por maior desenvolvimento Mundial e à medida que a derrota económico e nesse campo do Império Otomano, aliado da Erdogan tem créditos: é pai Alemanha, se tornou provável, os do milagre económico turco curdos começaram a pensar no da última década, que pôs o futuro. Durante o último século país no G20, o grupo das 20 várias nações tinham-se libertado do jugo turco, mas eram cristãs, economias mais desenvolvidas como os gregos. Aproveitando a guerra de 1914-1918, e instigado pelos britânicos através de Lawrence da Arábia, finalmente um povo muçulmano se rebelou, os árabes. Os curdos, porém, ficaram fiéis ao sultão.
Em Versalhes, os vencedores da guerra refaziam as fronteiras, num tratado que criava uma nova ordem. Percebeu-se logo que as terras otomanas eram alvo de cobiças várias, com os franceses a retalharem partes do Curdistão para as ligarem à Síria, sua nova colónia, e os britânicos a conseguirem incluir a província de Mossul no recém-criado Iraque. Em 1920, um novo tratado oferecia um Estado aos curdos. Mas o
Datas da luta do PKK 1984 Início da luta armada do PKK, com sucessivos embates no leste da Turquia com o exército. Guerrilheiros contam com bases de retaguarda no Curdistão iraquiano. MEADOS DA DÉCADA DE 1990 Auge da luta separatista do PKK, com milhares de aldeias destruídas no leste turco, região de maioria étnica curda, e uma migração de centenas de milhares
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entusiasmo foi pouco e Mustafa Kemal Ataturk não teve dificuldade em conseguir apoio dos líderes curdos na sua guerra pela criação de um país que congregasse turcos e curdos, unidos pelo Islão. Com a proclamação da República da Turquia, em 1923, Ataturk optou, porém, pela criação de um Estado moderno, laico e unitário, impondo a língua turca a todos os cidadãos. Ao longo dos anos, sucessivos governos foram negando a identidade curda, chamando à etnia “turcos das montanhas”. E é nesse contexto que começa em 1984 a luta do PKK.
de curdos para outras zonas da Turquia. Confrontado com a falta de progressos, apesar de mais de 40 mil mortos no conflito, o PKK desiste de reivindicar a independência e passa a reclamar maior autonomia para os curdos.
1999 Abdullah Ocalan, o líder
histórico do PKK, é detido no Quénia pelos serviços secretos turcos. Transferido para a Turquia, Ocalan fica detido na ilha-prisão de Imrali, no Mar de Mármara. Pouco depois, o PKK anuncia um cessar-fogo unilateral de cinco
Nos países vizinhos, também o separatismo curdo se faz sentir. Reprimido na Síria e no Irão, obteve sucessos no Iraque. Apoiados pelos Estados Unidos da América, os curdos do Iraque conseguiram depois da queda de Saddam Hussein em 2003 obter vasta autonomia, financiada pelo dinheiro do petróleo. Atualmente possuem tanta força que o exército iraquiano pede a ajuda dos peshmergas, os combatentes curdos, para enfrentar o Estado Islâmico. Para a Turquia é prioritária uma resolução para o separatismo curdo. E a oferta de diálogo de Ocalan foi bem recebida, fazendo quase esquecer que não há muito tempo o Presidente Erdogan chamava terrorista ao PKK. Mas além da questão dos direitos linguísticos e culturais, uma solução para o leste turco, zona pobre, passa também por maior desenvolvimento económico e nesse campo Erdogan tem créditos: é pai do milagre económico turco da última década, que pôs o país no G20, o grupo das 20 economias mais desenvolvidas. * jornalista do DN
anos e tenta melhorar a imagem até com mudanças de nome, mas acabando por voltar à velha sigla.
2004 Com o governo turco a
recusar negociar, e o movimento ameaçado por divisões internas, o PKK retoma a luta armada.
2009 Início de negociações secretas entre os governantes de Ancara e o PKK. O movimento curdo volta a declarar um cessar-fogo.
2011 Diálogo secreto que há
dois anos decorria na Noruega é
num avião a caminho da Turquia e de um dos julgamentos mais mediáticos do país. Dentro da sua “jaula” de vidro à prova de bala, Ocalan diria mais tarde aos juízes: “Consigo trazer todos os combatentes das montanhas dentro de três meses. Pode não valer um tostão, mas há 5.000 bombistas suicidas dispostos a morrer por mim”.
Abdullah Ocalan, líder do PKK, está disposto a abandonar a luta armada
DE “MONSTRO” A HOMEM DE PAZ Serviu de prisão a príncipes otomanos, Trotsky passou por lá quando fugia de Estaline e foi palco da execução de um primeiro-ministro após o golpe de 1960 na Turquia. Agora a ilha de Imrali, no mar de Marmara é famosa pelo seu único prisioneiro: Abdullah Ocalan. Mais magro e com o cabelo e o
bigode farto a ficarem grisalhos, longe está a imagem do “monstro” descrito pelos media quando foi detido em 1999 no Quénia numa operação em que as forças turcas contaram com apoio dos EUA e de Israel. Algemado e vendado, o líder do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) embarcava
interrompido em junho, depois de um embate entre os combatentes do PKK e o exército turco fazer 14 mortos entre os soldados.
2013 Ocalan apela a um sinal de boa vontade das duas partes através da libertação de prisioneiros. O PKK liberta oito soldados turcos que estavam retidos no norte do Iraque.
2012 Centenas de militantes curdos presos iniciam uma greve de fome exigindo melhores condições de detenção para Ocalan e o direito de usar a língua curda na justiça e no ensino. O protesto só termina graças a um apelo de Ocalan. No final do ano, o primeiro-ministro Erdogan confirma que existem conversações com Ocalan.
2014 Com a cidade curda de Kobani, no norte da Síria, cercada pelo Estado Islâmico, e a Turquia a impedir os curdos turcos de passarem a fronteira para apoiar a sua gente, geraram-se protestos em mais de 30 cidades.
Palavras de desafio que contrastam com a sua recente oferta de abandono da luta armada. E que refletem o carácter contraditório que desenvolveu na infância. Nascido em 1948, em Omerli, uma aldeia da província de Sanliurfa, no sudeste da Turquia, o mais velho de sete filhos teve uma infância difícil, “entre uma mãe turca, uma pai fraco e uma casa sem muito amor ou disciplina”, escrevia a Al-Jazeera num perfil do líder do PKK. Aluno brilhante, foi na universidade em Ancara que se interessou pela política e pelos ideais marxistas. Em 1978 fundou o PKK e seis anos depois lançou a luta armada que muitos esperam estar agora prestes a terminar.
de um congresso do PKK para encontrar uma solução para o conflito. O objetivo é substituir a luta armada pela luta política. A reação do primeiro-ministro turco, Ahmet Davutoglu (Erdogan agora é Presidente), foi positiva.
2015 Ocalan lança no final de janeiro um apelo à realização
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mãos à obra
MULHERES INDÍGENAS APRENDEM A COSTURAR
Constituído por cerca de 40 mil pessoas, o segundo maior grupo indígena da Venezuela vive sobretudo nas zonas ribeirinhas do delta, alimentando-se da pesca, caça e da agricultura tradicional. Nos últimos anos, o governo tem atribuído mais recursos financeiros ao território Warao, mas isso não se tem traduzido na melhoria do nível de vida da população. Ao contrário, tem-se assistido a um aumento da taxa de alcoolismo, do abandono do cultivo da terra e das atividades piscatórias.
Projeto dirigido à etnia Warao, o segundo maior grupo indígena da Venezuela, permite dar formação a 50 mulheres por ano, na área da confeção de vestuário. As primeiras formandas já fazem roupa para a família e para vender A maioria dos waraos continuam texto FRANCISCO PEDRO foto DR Começou com a compra de cinco máquinas de costura, prosseguiu com um primeiro curso de formação para 20 mulheres da comunidade Yakariyene, nos arredores de Tucupita, e ganhou consistência para ir preparando uma média de 50 novas ‘costureiras’ por ano. Com este projeto, os missionários da Consolata na Venezuela procuram combater a exclusão social e a pobreza extrema em que vivem muitas famílias Warao, que arriscaram sair do Delta Amacuro, à procura de educação para os filhos, ou na esperança de conseguirem um emprego. A primeira ação de formação realizou-se na comunidade Yakariyene, em Tucupita
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a viver no limiar da pobreza extrema, o que leva muitas famílias a mudarem-se para as cidades, na esperança de encontrarem melhores condições de vida,
Memória descritiva Nome do projeto Formação para as mulheres waraos Valor investido 10.000 euros Benfeitores Cáritas Italiana Beneficiários Por contabilizar
infraestruturas e serviços que não estão disponíveis nas suas comunidades de origem. O resultado raramente é o esperado. E a solução acaba por passar pela indigência, ou pela concentração em pequenos bairros periféricos, sem o mínimo de condições de higiene e segurança. Yakariyene é um desses exemplos. Fica a quatro quilómetros do centro de Tucupita, capital do Delta Amacuro, e alberga 70 famílias, que tal como a generalidade dos waraos ‘urbanos’ sofrem de exclusão social e cultural. Foi por isso o local escolhido pelos missionários da Consolata para dar início ao projeto de capacitação de mulheres, na confeção de roupa. Primeiro para consumo familiar, depois para vender e compor o orçamento da família. O primeiro curso começou em finais de 2012. Daí em diante, as ações de formação têm passado por outras comunidades e o objetivo é que prossigam, sem necessidade de financiamento externo.
testemunho de consagrado
Adelino Ascenso escolheu o diálogo inter-religioso como um dos seus projetos pastorais
“LUTEI CONTRA DEUS E PERDI A BATALHA”
Adelino Ascenso nasceu na freguesia do Souto da Carpalhosa, no concelho de Leiria, em outubro de 1954. Entrou no seminário aos 37 anos e foi ordenado sacerdote aos 43. É doutorado em Teologia Fundamental, tem trabalhado no Japão e, recentemente, foi eleito Superior Geral dos Missionários da Boa Nova
de 25 anos, “lutei contra Deus”, mas, felizmente, perdi a batalha e entrei no Seminário com 37 anos de idade. FM Trabalha no Japão desde que foi ordenado. O diálogo inter-religioso é um dos seus projetos pastorais? AA O diálogo inter-religioso tem sido um dos meus projetos pastorais. Tenho desempenhado as funções de sacerdote responsável pelo diálogo inter-religioso da Arquidiocese de Osaka, cargo que deixei em finais de março, para regressar a Portugal. FM O que mais o fascina na sua vida de consagrado? AA A entrega gratuita.
texto FRANCISCO PEDRO foto DR FÁTIMA MISSIONÁRIA Entrou para o seminário aos 37 anos. O que leva uma pessoa com esta idade a concluir que o seu caminho é o sacerdócio?
FM O Papa Francisco tem pedido uma Igreja em saída, mais missionária e mais próxima dos pobres. Revê-se neste apelo do Santo Padre no trabalho que está a desenvolver em Osaka?
Adelino Ascenso Necessidade de entrega total. Quando tinha 11 anos, a minha professora sugeriu que eu desse entrada no Seminário Menor em ordem a seguir o caminho para o sacerdócio. Recusei perentoriamente. Foi aí que começou a minha vocação. Ao longo
AA Sim, certamente. A Igreja terá de ser mais missionária e mais próxima dos pobres. No entanto, há que ter em conta o facto de que há vários tipos de pobreza, o que, no Japão, é claramente demonstrado através da alta taxa de doentes com depressão e de suicídios.
FM Enquanto Superior Geral dos Missionários da Boa Nova o que pensa fazer para despertar o sentido missionário e vocacional em Portugal? AA Sabemos que o “partir” é a tónica fundamental de qualquer missionário. Este “partir” implica, em primeiro lugar, uma saída de si mesmo. Isso significa que deveremos permitir sempre que novas conceções e convicções nos ajudem a uma constante revisão da nossa forma de encontrar o outro. Gostaria que a Sociedade Missionária da Boa Nova – como Sociedade de Vida Apostólica – pudesse dar o seu contributo para despertar o sentido missionário do “partir”, sempre em comunhão com as Igrejas locais, tanto em Portugal como nos nossos outros campos de missão. Simultaneamente, tendo em conta o facto de que a SMBN foi fundada pelo Papa Pio XI, em 1930, respondendo ao apelo dos bispos portugueses, procuraremos realçar a nossa relação profunda com a Igreja portuguesa, apresentando a nossa disponibilidade para o que nos seja solicitado, conquanto esteja dentro das nossas forças.
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gente nova em missão
TEMPO PASCAL Vamos refletir no amor que Deus tem por nós
O CENTRO DA NOSSA FÉ Olá amiguinhos missionários! Já chegámos a abril, mês da Páscoa, a festa mais importante para nós! Esperamos que tenham feito uma boa caminhada quaresmal e que os vossos corações estejam todos lindos e preparados para receberem Jesus Ressuscitado. Aleluia! O que vos propomos este mês é uma reflexão sobre o significado da Páscoa, a de Jesus e aquela que esperamos ser um dia também a nossa. Por isso para todos, uma santa e feliz Páscoa! texto ÂNGELA E RUI ilustrações RICARDO NETO
SIGNIFICADO DE PÁSCOA
É a celebração mais importante da Igreja. Páscoa significa passagem, passagem para a eternidade, a ressurreição de Jesus Cristo. Os hebreus também celebravam a Páscoa, em honra da libertação do povo israelita do Egito, fazendo-o com o sacrifício de um cordeiro. Mas para nós cristãos, o cordeiro é Jesus, que se sacrificou por nós. Finda a Quaresma, inicia-se a Semana Santa com a entrada triunfante de Jesus em Jerusalém, o chamado Domingo de Ramos, sendo que a partir de quinta-feira começa o Tríduo Pascal, conjunto de três dias, Quinta, Sexta e 24
Sábado Santos com três momentos fundamentais, a Paixão, Morte e Ressureição de Jesus (a Páscoa).
AQUELE QUE NOS SALVA
Muitas pessoas duvidam da existência de Deus e algumas há que troçam de nós pela fé que nos foi dada, argumentando que num mundo tão mau, Deus não pode existir. Mas para nós, com Jesus sabemos que não é assim. Deus sacrificou o Seu Filho e Este rezou por nós ao Pai na Sua derradeira hora, suspenso na cruz, salvando-nos dos nossos pecados, pelo seu sangue. Este mistério que para nós é o centro da nossa
fé e também da nossa vida, é para muitos ainda desconhecido. Mas o Espírito Santo não para quieto e desinquieta muitos corações a serem missionários e levarem esta Boa Nova a todos.
A NOSSA PÁSCOA
Refletindo sobre este mistério tão belo, encontramos o que Deus quer de nós. Em todos nós há bem e há mal, há trigo e há joio, mas Deus nunca desiste de nós e ama-nos incondicionalmente. E nós? Amamos a Deus na mesma medida? Claro que não. Mas tentamos. E vocês perguntam: como? No modo como vivemos.
O MEU MOMENTO DE ORAÇÃO
“Os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, os vossos caminhos não são os meus caminhos – oráculo do Senhor! Tanto quanto os céus estão acima da terra, assim os meus caminhos são mais altos que os vossos, e os meus pensamentos, mais altos que os vossos pensamentos” (Is 55, 6.8-9). “Jesus disse-lhe: «Não me detenhas, pois ainda não subi para o Pai; mas vai ter com os meus irmãos e diz-lhes: Subo para o meu Pai que é vosso Pai, para o meu Deus que é vosso Deus»” (Jo 20, 17)
Esta vida que nos foi dada é breve e todos os cristãos refletem sobre a sua própria páscoa. Como será? O que nos perguntará o Pai do Céu, quando diante dele nós estivermos? Seguramente que não será sobre os bens materiais que possuímos. Não será sobre o dinheiro, sobre as roupas de marca, sobre os gadgets eletrónicos ou sobre os títulos que adquirimos. Nada material que é valorizado nesta vida tem importância na eternidade. Por isso o desafio do cristão é encontrar o prazer nas coisas de Deus e cada vez menos nas coisas mundanas. E é também não temer a morte, porque esta é uma passagem, é uma
páscoa. Aproveitem este tempo pascal para, na catequese e junto da vossa família, refletirem sobre tudo isto que no fundo se resume ao amor, o amor que Deus tem por nós, ainda que imperfeitos, o amor que é tudo.
Amigo Jesus: Não me deixes mais viver sem Ti. O teu sacrifício por mim não foi em vão Eu quero ser um bom missionário Sair de mim para me encher de Ti E amar o próximo Caminhar nesta vida despojado do supérfluo E descobrir a verdadeira felicidade Não temendo nada, sendo livre no Amor do Pai Em direção à páscoa que me espera um dia Aleluia! Pai-Nosso… Glória…
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tempo jovem
“QUERO SER LIVRE” É O GRITO DE MILHÕES DE PESSOAS, MAS A QUESTÃO FUNDAMENTAL É SABER O QUE SIGNIFICA REALMENTE VIVER EM LIBERDADE
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LIVRES PARA AMAR
texto LUÍS MAURÍCIO foto LUSA “Eu sou livre de fazer o que quiser com a minha própria vida”, disse um jovem descoberto em flagrante consumo de cocaína quando o seu pai entrou sem bater à porta do quarto. Além da dor partilhada comigo pelos pais do rapaz, o que me causa maior tristeza nestes casos das adições é o facto de não se perceber pela parte dos dependentes, neste caso o rapaz, a dupla falta de liberdade que estas pessoas vivem. Primeiro, enganam-se quase de modo neurótico, dizendo que são livres quando não o são, depois, não aceitam que caíram num círculo vicioso que os mantém amarrados e com muito poucas possibilidades de se libertarem por si próprios. Tal como neste caso, há muitas histórias de vida onde o fator comum é a falta de liberdade e a falta de tomada de consciência desta situação de autoengano: pensar que se é livre quando na realidade não se é. “Quero ser livre” é o grito de milhões de pessoas, mas a questão fundamental é saber o que significa realmente viver em liberdade. São múltiplas as definições da palavra liberdade quando a queremos utilizar para justificar os nossos atos pessoais e sociais. Atrevo-me a denunciar o mau uso, contraditório e ambíguo, que estamos habituados a fazer desta palavra. Na experiência do crescimento humano, a liberdade não é um facto, mas sim uma possibilidade ou um logro da pessoa humana. Noutras palavras, a liberdade deve ser conquistada
independentemente dos obstáculos e condicionamentos a que estamos expostos. Ser uma pessoa livre significa ser “sujeito” e não “objeto” da própria vida. Não nos movemos por determinismo ou imposições como se mexe num móvel. São as razões e os propósitos conscientes que devem marcar a nossa existência. Em definitivo, a liberdade exige que cheguemos a ser nós mesmos, e por isso, na conquista de sermos pessoas livres, uma condição necessária é o autoconhecimento. Estou convencido de que, quanto mais me conheço, mais livre sou e mais aumenta o meu leque de possibilidades de conhecer a liberdade do outro, e portanto de construir relações livres.
chamados a reclamar e a lutar pela liberdade do outro para poder exercer a nossa, porque quando experimentamos a nossa liberdade, não podemos deixar de reconhecer a do outro. No fantástico mundo das relações interpessoais, quando não se respeita o ato sagrado de construir relações livres, a convivência deteriora-se, pois é impossível gerar amor. E sem amor o medo de perder as pessoas leva-nos a querer dispor delas, ficando assim escravos no vício do ter e conservar as pessoas, as ideias e o mundo material. Quem diz que ama, mas não é livre, engana-se, pois o amor só cresce no terreno fértil da liberdade.
Há um ditado que é muitas vezes utilizado no mundo do direito, mas que eu não partilho quando é aplicado ao mundo das relações interpessoais: “A minha liberdade acaba quando começa a liberdade do outro”. Acho que a liberdade não pode ser reduzida a um simples atributo individual, porque isso conduz irreversivelmente a uma liberdade estéril, solitária e escravizante. O jovem com dependência, descoberto pelos pais, é o reflexo desta falsa e estéril versão de liberdade. A verdadeira liberdade que torna livre a pessoa ultrapassa a barreira do individualismo e leva-a a compreender que a própria liberdade começa e se constrói com a liberdade dos outros, simplesmente porque “somos com, por e para os outros”. Portanto, a verdadeira liberdade começa “quando e onde” começa a liberdade do outro. Isto significa que somos Abril 2015
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sementes do reino
E O VENCEDOR É… texto PATRICK SILVA foto BENEDETTO BELLESI Ao longo da sua vida, Jesus “travou” várias batalhas: contra o demónio no deserto, contra as doenças, contra os espíritos impuros. Em todas elas Jesus demonstrou ser um exímio vencedor. Ao seu toque, à sua palavra, tudo se transformava. Mas na cruz, tudo parecia ser diferente… Terá sido abandonado pelo Pai? Será esta a sua derrota?
Leio a Palavra Jo 20,1-9
Tudo aconteceu no primeiro dia da semana, com a manhã ainda escura, a lembrar o primeiro dia da criação, onde nada ainda existia. Também naquele primeiro dia da semana, algo de novo estava para acontecer. Seria o primeiro dia da vitória. Maria Madalena foi a primeira a procurar o “derrotado”. Ao chegar ao lugar da sepultura, a surpresa: “a pedra foi retirada do sepulcro”. Correu a avisar os amigos. Pedro e João correram à procura do “desaparecido”. João corria mais 28
depressa, mas esperava por Pedro. Entraram ambos, observaram, um deles viu e acreditou. Mas nenhum entendeu.
Saboreio a Palavra
Maria Madalena representa toda a comunidade cristã, inicialmente desanimada, desorientada, perplexa pela derrota de Jesus. Procura-o no sepulcro, mas este está vazio. Por sua vez Pedro e João representam duas atitudes. De um lado um discípulo que tem dificuldade em entender a lógica de Jesus; obstinado no seu próprio modo de pensar, recusa aceitar que a vitória de Jesus tivesse que passar pela cruz. Do outro lado, um discípulo que entra na lógica de Jesus, porque vive em comunhão com Ele, está próximo dele e assume na sua vida as Suas propostas.
Rezo a Palavra
Releia o texto e sinta-se parte da alegria do sepulcro vazio. Sem muitas palavras, descubra o significado deste evento. Com
COM ALEGRIA PROCLAME ALELUIA, ELE ESTÁ VIVO E ESTÁ ENTRE NÓS alegria proclame aleluia, Ele está vivo e está entre nós.
Vivo a Palavra
E o vencedor é… Jesus. Escolheu seguir a vontade do Pai, mesmo quando se sentiu abandonado, mesmo quando muitos pensaram que tudo tinha acabado numa cruz, mas o grande vencedor sabia que o Pai nunca o abandonara e tinha um projeto bem maior. Perante a ressurreição, duas são as possibilidades: ver sem nada entender ou ver e acreditar. Assim foi com Pedro e João. Duas atitudes tão diferentes perante a mesma realidade. Pedro representa o discípulo incapaz de se identificar com a lógica dos valores de Jesus, acredita que tudo deveria ter sido diferente. Para ele morrer na cruz é derrota, jamais vitória. João, ao contrário, entrou na lógica de Jesus, mas tal só lhe foi possível, porque estava em comunhão total com Ele. Uma Páscoa feliz! Feliz Vitória!
intenção pela evangelização
A PALAVRA FAZ-SE MISSÃO 05 Páscoa da Ressurreição Act 10, 37-43; Col 3, 1-4; Jo 20, 1-9 É UMA QUESTÃO DE FÉ
Cristo ressuscitou! É a nossa fé que o professa e anuncia. Acreditar não é fácil nem evidente. Evidente foi a crucificação, evidente foi o sangue da paixão, desconcertante foi o grito no alto da cruz. Mas a ressurreição é uma questão de fé, não de evidência. Testemunhas foram os Apóstolos que O viram, tocaram e anunciaram. Na sua está também a nossa fé. Eu sou a ressurreição e a vida; quem acredita em Mim, não morrerá.
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2º Domingo da Páscoa Act 4, 32-35; 1Jo 5, 1-6; Jo 20, 19-31 “FELIZES OS QUE ACREDITAM” Sou feliz porque tenho fé. É a ressurreição que gera a comunidade dos crentes. Se acreditas por ver, isso não é fé. Porque a fé não põe condições. Assenta no testemunho dos apóstolos que nos falam em nome de Cristo. A fé entra em crise quando falha a comunidade de fé na sua vivência e testemunho. Não há fé sem comunidade, não há fé sem partilha. Que o testemunho da minha comunidade faça crescer a minha fé.
22 3º Domingo da Páscoa Act 3, 13-19; 1Jo 2, 1-5; Lc 24, 35-48 “VÓS SOIS TESTEMUNHAS”
Os discípulos eram conscientes desta missão de testemunhar a ressurreição de Cristo. Anunciaram por toda a parte que não há outro nome no qual possamos ser salvos. A nós foi confiada, por graça de Deus, esta mesma missão. Anda em todos os nossos gestos um anúncio de Páscoa, portador de esperança e de paz. Que a minha vida de cristão missionário testemunhe o Senhor Ressuscitado.
29 4º Domingo da Páscoa Act 4, 8-12; 1Jo 3, 1-2; Jo 10, 11-18 UM PASTOR APAIXONADO
Jesus é o Bom Pastor que conhece as suas ovelhas: conhece cada um de nós, ama-nos pessoalmente, guia-nos, vai à nossa procura quando nos afastamos dele, oferece a sua vida para que a nossa seja salva. Como missionário do Pai, não descansa enquanto toda a humanidade não fizer parte da sua família. Neste dia de oração pelas vocações de especial consagração, suscita, Senhor, na tua Igreja, homens e mulheres que tenham a tua mesma paixão pela humanidade dispersa. DV
Para que os cristãos perseguidos sintam a presença confortadora do Senhor Ressuscitado e a solidariedade da Igreja inteira
Cristãos perseguidos Por diversas vezes, nos últimos tempos, o Papa Francisco tem pedido aos fiéis católicos que rezem pelos cristãos a “sofrer de perseguição”, que são “muito, muito numerosos” em todo o mundo. Dizem efetivamente as estatísticas que neste momento há mais cristãos perseguidos do que nos primeiros tempos da Igreja. É por isso de grande atualidade esta intenção pela evangelização.
Na Síria, no Iraque, no Paquistão, na Nigéria, e em tantos outros países, continua a escorrer o sangue de mártires: cristãos torturados, mortos ou expulsos de suas terras por causa da fé em Cristo. O comportamento do chamado Estado Islâmico tem contribuído fortemente para esta dolorosa situação. Há lugares onde se proíbe receber o batismo, ter uma bíblia, ensinar o catecismo ou possuir uma cruz. Fala-se em 45 milhões de mortos, só no século XX, causados por grandes revoluções ou regimes totalitários. Desde que o milénio começou são já cerca de 160 mil os cristãos que foram martirizados. “Os cristãos perseguidos são uma preocupação que me toca muito como pastor”, confessa Francisco para quem a violência em nome de Deus é uma aberração ou contradição em que a própria Igreja no passado incorreu. Que o Deus da misericórdia ilumine os corações. DV Abril 2015
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gestos de partilha
Abrace
esta vida
Acredita que ainda se eliminam crianças na Guiné-Bissau em nome das crenças no sobrenatural, em pleno século XXI? Basta que tenham alguma deficiência, sejam gémeas, ou apenas feias demais para o gosto dos pais, e têm a sentença lida à nascença. A Casa Bambaran, em Bissau, foi criada para acolher estas crianças, rotuladas de Irã ou crianças feiticeiras. E precisa da nossa ajuda.
Dê colo a esta ideia
Alimentar uma criança na Casa Bambaran custa 4,60€ por dia. O custo médio diário de cada utente (alimentação, educação, saúde, vestuário) é de 19,20€ Envie a sua contribuição para: MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA Projeto “Crianças Irã” Rua Francisco Marto, 52 | 2496-448 FÁTIMA NIB 0033.0000.45365333548.05
um abraço entre a fé e a vida
APOIE OS NOSSOS PROJETOS E AJUDE-NOS A CONCRETIZÁ-LOS CRIANÇAS IRÃ Jovens e alunos da catequese (Chainça – Santa Catarina da Serra) 188,00€; Anónimo (Alqueidão) 160,00€; Isabel Rodrigues 20,00€; Lucília Pereira 20,00€; Emília Pinto 10,00€; Amélia Henriques 86,00€; Gracinda Santos 20,00€; Piedade Pombal 20,00€; Anónimo 1,50€; Joana Rocha 10,00€; Salomé Gomes 20,00€; Anónimo (Fiães) 100,00€; Palmira Ribeiro 30,00€; Anónimo (Fiães) 130,00€; Aurora Serra 30,00€; Ester Pinho 100,00€; Eugénia Jorge 100,00€; Lúcia Antunes 6,00€; Conceição Fernandes 33,00€; António Santos 70,00€; Julieta Pereira 40,00€; Carlos Ferreira 10,00€; Manuel Rodrigues 10,00€; Fátima Matias 10,00€; Ermesinde Gonçalves 20,00€. Total geral = 2.084,50€. BOLSA DE ESTUDOS Belmira Carneiro (Cabeçudos) 250,00€; Maria José Ribeiro 250,00€. COSTA DO MARFIM Mulheres Missionárias da Consolata (Mem Martins) 600,00€; Encarnação Martelo 10,00€. CRIANÇAS DE MOÇAMBIQUE Mãe do padre Simão Pedro da Consolata 100,00€. LEPROSOS Alice Guarda 6,00€. OFERTAS VÁRIAS Céu Gomes 50,00€; Fernanda Fernandes 36,00€; Maria Piedade 53,00€
Contactos Pode enviar a sua oferta para a conta solidária dos MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA: NIB 0033.0000.45365333548.05 IBAN: PT50.0033.0000.45365333548.05 SWIFT/BIC: BCOMPTPL ou para uma das seguintes moradas: Rua Francisco Marto, 52 | Apartado 5 | 2496-908 FÁTIMA | Telefone 249 539 430 | fatima@consolata.pt Rua D.ª Maria Faria, 138 | Apartado 2009 | 4429-909 ÁGUAS SANTAS MAIA | Telefone 229 732 047 | aguasantas@consolata.pt Rua Cap. Santiago de Carvalho, 9 | 1800-048 LISBOA | Telefone 218 512 356 | lisboa@consolata.pt Quinta do Castelo | 2735-206 CACÉM | Telefone 214 260 279 | cacem@consolata.pt Rua da Marginal, 138 | 4700-713 PALMEIRA BRAGA | Telefone 253 691 307 | braga@consolata.pt Rua Padre João Antunes de Carvalho, 1 | 3090-431 ALQUEIDÃO | Telefone 233 942 210 alqueidao@consolata.pt Rua Estrada do Zambujal, 66 - 3º D | Bairro Zambujal | 2610-192 AMADORA | Telefone 214 710 029 | zambujal@consolata.pt Alameda São Marcos, 19 – 7º A e B |2735-010 AGUALVA-CACÉM |Telefone 214 265 414 |saomarcos@consolata.pt
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vida com vida PADRE HENRIQUE MANZON
A GRAÇA DE SER O PRIMEIRO
texto AVENTINO OLIVEIRA ilustração HUGO LAMI É sempe uma graça excitante, a de ser o primeiro. O padre Henrique foi o primeiro missionário da Consolata a receber o prémio eterno, com apenas 25 anos de idade, e era então o mais jovem dos nossos missionários em África. A morte é sempre uma pregação sobre a fragilidade da vida. O Henrique nasceu em Turim no dia 21 de março de 1887. Inteligente, entrou para o Seminário Diocesano de Turim. Mas os olhos da sua alma descortinavam algo lá mais longe, e entrou para o Instituto dos Missionários da Consolata. Durante os estudos de teologia deu-se mesmo ao luxo de fazer de professor aos seus colegas mais novos no seminário: “Sabia exprimir-se de maneira simples e clara, dando exemplos do que seria a vida missionária em África”. Quando o fundador, o beato José Allamano, falava aos seminaristas, o Henrique bebia as suas palavras que mais tarde marcariam a sua vida, sabendo que esses ensinamentos atrairiam muitas bênçãos sobre o seu futuro trabalho missionário. Em 28 de outubro de 1909 recebeu a ordenação sacerdotal, e em 9 de janeiro partia para as missões africanas do Quénia. Chegado ao campo dos seus sonhos, trabalhou na Missão de Nossa Senhora da Divina Providência e depois na de Nossa Senhora do Bom Conselho. Passava dias inteiros visitando as aldeias pobres. Dava-lhes a riqueza de Deus ensinando-lhes o catecismo, e também o que podia
em ajuda material e intelectual. No dia 18 de maio de 1912 sentiu-se indisposto, mas não lhe prestou demasiada importância. Nessa mesma noite tiveram de ir chamar um médico que vivia longe e veio visitá-lo apressadamente na manhã seguinte. O médico declarou o caso desesperado, pois ao mal juntara-se uma peritonite. Recebeu com devoção os santos sacramentos e ofereceu ao Senhor diante dos confrades a sua jovem vida com todas as suas aspirações e sonhos missionários. Pelo meio dia de 20 de maio, tornava-se o primeiro dos nossos missionários a encontrar a
Virgem Consolata no Céu. Escreveu o fundador: “A morte do padre Henrique leva-nos a todos a meditar sobre a fugacidade da vida, e como pouco valem as satisfações terrenas. E nos sofrimentos e penas da vida, fixarmos sempre o coração no grande prémio que para cada missionário fiel preparou o Senhor”.
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o que se escreve REZAR NA PÁSCOA – ANO B
INTRODUÇÃO AO EVANGELHO SEGUNDO MARCOS
É o Evangelho que a liturgia nos apresenta neste Ano B. Um Evangelho com uma relevância e um sucesso surpreendentes, nos nossos dias, em contraste com o esquecimento a que foi votado a partir do século II. Quando Marcos escreve o seu Evangelho, nos conturbados anos da guerra judaica (66-70), a Igreja era perseguida e reprimida, quer por parte dos romanos quer por parte dos judeus. São tempos de resistência e de angústia, tal como os nossos dias. Isso explica o grau de exigência que Marcos requer do discípulo de Jesus para o seguir no Seu caminho desde a Galileia até à cruz. Dando seguimento à coleção do biblista António Couto, este livro pode ser útil para ajudar a situar os textos deste Evangelho que vão ser objeto de escuta qualificada ao longo do ano litúrgico. Autor: D. António Couto 136 páginas | preço: 9,50 € Paulus Editora
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É um livro de oração para cada dia do tempo da Páscoa. Integralmente a cores, partindo da liturgia do dia, apresenta uma meditação, uma imagem para contemplar e uma oração, desde o Domingo de Páscoa até ao Pentecostes. As páginas iniciais contêm o texto da visita pascal permitindo o seu uso nessa ocasião. Com uma linguagem simples e direta é de grande ajuda para rezar. O pequeno formato e o preço acessível fazem do livro um excelente recurso de evangelização junto das comunidades. Autor: Rui Alberto 104 páginas | preço: 1, 50 € Edições Salesianas
A MISSÃO É SIMPÁTICA
É uma publicação da Editora Consolata que resulta da seleção de um conjunto de crónicas publicadas na revista FÁTIMA MISSIONÁRIA, ao longo de 20 anos, pelo padre Norberto Louro. Na opinião de Carlos Liz, «é um livro atrevido, de um homem atrevido, que se mete com os outros de forma criativa e aberta». Um livro bem ilustrado com gravuras e cheio de bom humor, próprio do autor, que nos narra a missão com olhos de quem viveu as coisas por dentro, com espírito missionário. Autor: Norberto Ribeiro Louro 190 páginas | preço: 12,00 € Consolata Editora
SONHOS, CERTEZAS E MARTÍRIOS BOA NOITE – LER AO DEITAR
Multiplicam-se as publicações de apoio ao Ano da Vida Consagrada. Faltava este livro que nos apresenta uma centena de poemas que espelham a vida quotidiana de tantos homens e mulheres, felizes no seguimento de Jesus Cristo e no serviço do próximo. Escritos “com rima e ritmo, umas vezes em clave de sol, outras na de fá, sem esconder dificuldades, crises paixões, dúvidas e traições ao Evangelho e aos outros” é um livro em que vale a pena mergulhar. Autor: Felizardo Maria da Cruz 222 páginas | preço: 11,00 € Paulus Editora
O livro apresenta setenta pequenas histórias para ler ao final do dia. Com uma mensagem simples mas profunda, cada uma pretende ajudar o leitor a adormecer com tranquilidade e um sorriso nos lábios. O hábito de ler pequenos contos ao deitar é uma tradição salesiana instituída por dom Bosco que reunia os rapazes no dormitório para lhes contar um facto ou um sonho que tivera. No fim tirava uma lição oportuna para a vida dos jovens. Autor: Pedrosa Ferreira 80 páginas | preço: 2,10 € Edições Salesianas
megafone por Albino Brás
“
Nestes dois anos de pontificado, o poder simbólico da Igreja aumentou, coisa que não acontecia há décadas. Potencialmente, este Papa mostrou que é possível a Igreja aumentar o seu poder simbólico, político e social por via do exemplo
”
Daniel Oliveira político e jornalista, 70 X 7, Ecclesia
Um ‘cristão
que não seja capaz de se divertir com os outros e ser divertido, não é um virtuoso, é um chato. Sem humor nem o amor tem graça
‘oFazer que
amamos. Amar o que fazemos. Ser o que amamos. Amar o que somos
’
O que Há Tirar ‘aprende ‘ ‘ e pessoas proveito aprende e não pratica o que sabe é como o que lavra e lavra e não semeia
Platão Constanza Ceruti filósofo grego arqueóloga, antropóloga e historiadora argentina
’
que quanto mais fazes por elas, menos fazem por si mesmas Jane Austin escritora inglesa
’
de um bom conselho exige mais sabedoria que dá-lo
’
John Churton Collins crítico literário inglês
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Frei Bento Domingos Público Abril 2015
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fátima informa
Encontro visa promover e estimular o envolvimento das crianças na cultura musical
CRIANÇAS CANTAM E ENCANTAM
O Encontro de Coros Infantis reúne em Fátima vários grupos corais. O espetáculo vai acontecer em dia de feriado nacional e as entradas são livres e gratuitas texto JULIANA BATISTA foto SANTUÁRIO DE FÁTIMA Pequenos cantores vão encontrar-se Santarém, Pequenos Cantores da na cidade de Fátima para darem voz Paróquia de São Salvador de Grijó, e Coro de Pequenos Cantores de ao VII Encontro de Coros Infantis. Esposende. O espetáculo, organizado pelo “Em cada ano gostamos de Santuário de Fátima, terá lugar oferecer formações musicais no Centro Pastoral de Paulo VI, com diferentes identidades, dos dia 25 de abril, às 15h30. Vão mais simples coros de catequese, subir ao palco a Schola Cantorum dirigidos de forma voluntária e Pastorinhos de Fátima, Schola amadora, até aos coros académicos Cantorum da Catedral de
Encontro de terapeutas
O 8.º Congresso Nacional de Terapia Ocupacional irá realizar-se em Fátima, de 16 a 18 de abril, com o tema “Pensar a prática, olhar o futuro”. O encontro é organizado pela Associação Portuguesa de Terapeutas Ocupacionais (APTO) com a colaboração do Centro João Paulo II, espaço que acolhe a iniciativa.
Retiro consolador
“Consolar sem dividir” é o tema de mais um retiro proposto pelos Missionários da Consolata, que será orientado pelo padre Elísio 34
Assunção. O sacerdote tem como proposta de reflexão e de trabalho as formas de “orar com o corpo e com o espírito”. O retiro realiza-se dia 18 de abril, entre as 10h00 e as 18h00, no Seminário da Consolata, em Fátima.
Conferência preparatória
Sérgio Diz Nunes, sacerdote da Companhia de Jesus, vai proferir uma conferência de preparação do Centenário das Aparições. “Vigiai e orai” é o tema da sua intervenção, agendada para o dia 19 de abril, às 16h00, no Salão da Casa de Retiros de Nossa Senhora das Dores.
com formação especializada e uma direção artística profissional. Todos realizam um trabalho vital”, destaca o maestro Paulo Lameiro. Com esta iniciativa pretende-se “promover e estimular o envolvimento das crianças na vida musical e artística das paróquias e dioceses”, acrescentou o dirigente da Schola Cantorum Pastorinhos de Fátima, grupo que vai estrear neste encontro a “Schola Infantil (crianças dos cinco aos nove anos) com dois pequenos momentos musicais”. A entrada é livre e gratuita.
Abril em agenda 11/12 Convívio Missionário Juvenil – Seminário da Consolata 11/12 Peregrinação da Sociedade de São Vicente de Paulo 26 Peregrinação da Federação do Folclore Português
Venha visitar-nos Rua Francisco Marto, 52 2495-408 FÁTIMA
Fundada em 1949, a Loja Consolata, contribui com as suas receitas para desenvolver projectos, especialmente onde os Missionários e Missionárias da Consolata trabalham. Cada cliente é, nesta perspectiva também ele um Missionário
Temos uma oferta para si, mediante apresentação desta revista na nossa loja
CRESCEU
Hino ao Ressuscitado Anulam-se as margens do tempo de fora. Nem ontem, nem hoje, nem dia, nem hora. Só este momento que é intemporal. Só esta maneira de dizer Amor. Assim trespassado no alto da Cruz… Assim coroado de sangue e de luz, Ó Enamorado das almas sem norte, Ó Ressuscitado, vencedor da Morte, Anulas as margens do tempo de fora E ficas connosco, aqui e agora! Fernanda Seno, Cântico Vertical