Miscellanea APAV #6

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Os crimes de ódio da invisibilidade à agenda Europeia e nacional Mar ta Carmo, Mafalda Valério

Apesar de cada vez mais estudados, os crimes de ódio são, ainda, um fenómeno cuja real dimensão é desconhecida. Concorre para tal o fraco registo sistemático de dados (inexistente em vários países da UE, de entre os quais Portugal) sobre os crimes motivados pelo ódio; a inexistência de uma definição única; o baixo número de denúncias quer perante as autoridades competentes quer junto dos serviços de apoio; a dificuldade de identificação do motivo de ódio/ preconceito/discriminatório que subjaz a prática do ato de violência ou do crime, ou de prova que o consubstancie. Não obstante, estatísticas oficiais e alguns inquéritos de larga escala realizados nos últimos anos na Europa sobre intolerância ou qualquer tipo de violência ou atos discriminatórios, como os crimes de ódio ou o discurso de ódio, revelam níveis preocupantes destes fenómenos. Um dos questionários mais abrangentes realizados pela FRA, destinado a recolher dados sobre as experiências das pessoas LGBT relativamente a discriminação, assédio e violência, mostrou que um quarto (26%) dos inquiridos experienciou uma situação de violência física ou sexual no ano anterior ao inquérito e que, destes, 59% acredita que o incidente ocorreu por terem sido percebidos pelo/a agressor/a como LGBT. Outro exemplo são os comportamentos xenófobos e racistas que, como mencionado, têm aumentado nos últimos anos na maioria dos Estados-Membros da UE, como é, aliás, o caso de Portugal. Vejam-se os recentes dados divulgados pela Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial no seu Relatório Anual de 2017, que recebeu 179 participações, queixas e denúncias consoante tenham sido remetidas por outras entidades, pelas vítimas, ou por terceiros, o que constitui um aumento significativo por relação ao ano anterior, na ordem dos 50%.

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Estes dados, aliados ao facto de muitos episódios de crimes de ódio não serem identificados por parte dos profissionais que mais diretamente contatam com vítimas destes crimes, quer sejam órgãos de polícia criminal ou autoridades judiciárias quer os serviços de apoio à vítima, remetem estes fenómenos criminais à invisibilidade, sem investigação e prossecução criminal, ficando as suas vítimas relegadas ao silêncio e impedidas de acesso aos seus direitos ou a serviços de apoio especializados. A APAV, reconhecendo a premente necessidade de desenvolver procedimentos específicos e especializados de apoio às vítimas de crimes de ódio, bem como de contribuir para suprir a notável falta de informação e formação sobre o tema entre os profissionais do sistema de justiça penal e dos serviços de apoio, mas também do público em geral e, em particular, das vítimas e potenciais vítimas miscellanea APAV 19


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