Issn1646 6845imaginar59

Page 1

revista da Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual

59


Ficha tĂŠcnica

3


Propriedade intelectual © 1988-2015 Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor

Edição Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual

Registo International standard serial number (ISSN) 1646-6845 Número de registo de depósito legal 25344/88

Periodicidade Bianual

Data Dezembro de 2015

Equipa Editora: Luísa Vidal Comissão Científica, por ordem alfabética: Ana Barbero, Ana Angélica Albano, Ângela Saldanha, Eduarda Coquet, Leonardo Charréu, Manuela Terrasêca, Maria Jesus Agra Pardiñas, Ricard Huerta, Rosa Oliveira, Rosvita Kolb-Bernardes e Simone Cintra Designer e paginador: Isabel Cristina Trindade Revisora: Luísa Vidal

Contacto Luísa Vidal, através do correio eletrónico “revistaimaginar@apecv.pt”

Autores, por ordem alfabética: Amparo Alonso-Sanz, Ana Bela Mendes, Ana Rita Sulz, Ana Sousa, Anabela Batata, André Man-

tas, Bruno Prates, Carmen Arrufat, Clara Botelho, César Israel Paulo, Elisabete Oliveira, Fernando Cacela, Fernando Pinho, Flávia Pedrosa, Gonçalo Gonçalves, Joanna Empain, Luís Filipe Rodrigues, Mariela Dias, Marta Ornelas, Ricardo Reis, Rita Gomes, Rui Alexandre, Sara Torres Veja, Teresa Eça e Teresa Esteves

Capa Henrique Apolinário, O dia em que o rio saboreou o sábio simão ou sapo sinusoidal, 2015. Fotografia analógica Cortesia do artista.


Ă?ndice

5


Editorial - Luísa Vidal

página 7

Evocação a Ricardo Reis

página 9

Porquê e para quê transitar entre a literacia visual e a cidadania visual?

página 25

Ricardo Reis Resenha do livro “Desenho, criação e consciência”, de Luís Filipe Rodrigues

página 31

Rui Alexandre Entre aulas educativas y aulas en la Cultura Visual. Visibilizando relaciones interpersonales y espaciales en ámbitos educativos formales página 33 Amparo Alonso-Sanz Submergir-se entre escolas e museus: perspetivas críticas

página 75

Marta Ornelas e Teresa Eça Estória do Gato e da Lua”, de Pedro Sarrazina. Propostas pedagógicas nas disciplinas de artes visuais

página 105

André Mantas A estética de sentir arte: desafios para a formação de todos até à adolescência e dos seus professores

página 121

Elisabete Oliveira El arte como vehículo de conocimiento

página 139

Sara Torres Vega O ensino das Artes Visuais e os sucessivos modelos de concursos de professores e de habilitações para a docência página 157 César Israel Paulo Desenhando pontes no ensino, na criação e na pesquisa a partir de narrativas visuais Flávia Pedrosa “O Desenho no ensino industrial antes dos Cravos

Ana Rita Sulz

página 175

página 161


Editorial

Finalizava o ano letivo quando a Alice me entregou a carta. Tinha escrito sobre as nossas aulas. Tinha escrito sobre o que sentiu que aprendeu, sobre o que sentiu que cresceu. Num pedaço dessa carta que guardo, sobretudo nesse pedaço, fixou-se-me a atenção. Dizia nele que a arte não é coisa só de artista. Que compreendeu que é – que pode ser – de todos. Porque todos podem, nas suas vidas, a cada dia, ser criativamente ativos. E ser criativamente ativo é fazer arte. E que viver só vale a pena se for assim, artisticamente. Que nos inspire este pedaço da carta que a Alice escreveu. Que nos instigue a permanecer na defesa do lugar imprescindível que deve a arte ocupar na educação de todos. Inspirados, instigados, regressamos. Bem-vindos ao número 59 da Imaginar. Em El arte como vehículo de conocimiento, Sara Torres Vega propõe uma série de reflexões a respeito da relação histórica entre a arte e a educação, ao mesmo tempo que partilha um conjunto projetos desenvolvidos no Museo Pedagógico de Arte Infantil, parte do Departamento de Didática da Expressão Plástica da Universidade Complutense, em Madrid. Porquê e para quê transitar entre a literacia visual e a cidadania visual?, de Ricardo Reis, parte da análise e interpretação das evidências recolhidas durante o trabalho de campo da sua investigação, para problematizar a pertinência de passarmos do já conhecido conceito de literacia visual para um outro,

mais recente, de cidadania visual. Amparo Alonso-Sanz assina Entre aulas educativas y aulas en la Cultura Visual. Visibilizando relaciones interpersonales y espaciales en ámbitos educativos formales, trabalho decorrente da investigação onde analisa a influência das arquiteturas dos espaços educativos formais nas relações pedagógicas entre os estudantes e com os professores. Desenhando pontes no ensino, na criação e na pesquisa a partir de narrativas visuais, de Flávia

Pedrosa, integra a investigação em curso da autora e reflete sobre as possibilidades metodológicas do desenho e das narrativas visuais que tem vindo a desenvolver durante este processo. 7


Em “Estória do Gato e da Lua”, de Pedro Sarrazina. Propostas pedagógicas nas disciplinas de artes visuais, André Mantas apresenta exemplos de atividades pedagógicas desenvolvidas a partir da curtametragem de animação realizada por Pedro Serrazina em 1992, “Estória do Gato e da Lua”. Tomando por base relações entre o sistema económico e o sistema educativo, O Desenho no ensino industrial antes dos Cravos, de Ana Rita Sulz, traça uma análise a respeito da presença do Desenho Técnico no ensino profissional português durante o período do Estado Novo. Marta Ornelas e Teresa Eça assinam Submergir-se entre escolas e museus: perspetivas críticas, onde detalham a participação da Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual no projeto “Innovative Teaching for European Museum Strategies”, do ponto de vista tanto das atividades que dinamizou e do ponto de vista das reflexões que a seu respeito se tornaram possíveis. Em A estética de sentir arte: desafios para a formação de todos até à adolescência e dos seus professores, Elisabete Oliveira articula um conjunto de considerações a respeito dos desafios que vê

colocados à interação entre atores culturais e escolas, enquanto complemento pertinente da formação de alunos e professores em educação artística. Em O ensino das Artes Visuais e os sucessivos modelos de concursos de professores e de habilitações para a docência, César Israel Paulo faz uma análise do atual sistema de recrutamento de professores do Ministério da Educação e Ciência e sublinha a imprescindibilidade de efetivamente fazer cumprir a legislação de habilitações para a docência em vigor.

Resenha do livro “Desenho, criação e consciência”, de Luís Filipe Rodrigues, de Rui Alexandre, encerra o conjunto de trabalhos que compõem este número. Terminamos com uma seção especial, de evocação ao nosso saudoso colega e amigo Ricardo Reis. Prestam homenagem Teresa Eça, Carmen Arrufat, Clara Botelho, Luís Filipe Rodrigues, Teresa Esteves, Fernando Cacela, Anabela Batata, Fernando Pinho, Gonçalo Gonçalves, Mariela Dias, Ana Sousa, Bruno Prates, Rita Gomes, Ana Bela Mendes e Joanna Empain. Despedimo-nos, por ora. Saiba que regressaremos e em breve. Inspirados, instigados – como dizíamos – regressaremos. 8


Evocação a Ricardo Reis Onde chegaria este menino que eu vi crescer intelectualmente, mesmo ali, debaixo dos meus olhos, mesmo ali, entre as minhas mãos, mesmo ali ao longo das conversas e das linhas de uma tese de mestrado? Até logo, meu ainda menino, mas já tão crescido. Ana Bela Mendes

Para sempre ficará o teu sorriso, a tua força, a tua simplicidade, a tua ironia, o teu trabalho, a tua inteligência, as palavras com que até ao fim nos presenteaste nesse teu jeito sincero e crítico de ser. E ficam a faltar palavras. E ficam a faltar dias. E fica um vazio neste primeiro dia de Primavera em que tu

nos deixaste na Primavera da tua vida. Ana Sousa 9


Conheci o Ricardo numa sala de aula da Escola Superior de Educação de Setúbal. Lembro-me como se fosse hoje. A sua competência, sabedoria e paixão pela educação artística era de tal forma contagiante que foi desde logo fácil considerá-lo como um dos melhores professores que tive. “Põe quanto és no mínimo que fazes”. É curiosamente neste verso de Ricardo Reis que encontro o Ricardo profissionalmente. Foi a vontade de ensinar e aprender que fez com que nos conhecêssemos e, mais tarde, nos aproximássemos e apaixonássemos. Tive o prazer de partilhar com o Ricardo imensas experiências, aprendi muito com elas e cresci muito com elas. Pela inabalável dedicação e entrega, por todo o trabalho que desenvolveu, espero que o Ricardo seja uma inspiração para todos e em especial para os professores de Educação Artística tanto quanto foi, é e sempre será para mim. Auguste Rodin, O Pensador, 1904 Esta escultura de Rodin era uma das esculturas preferidas do Ricardo, que tive o prazer de apreciar com ele na Plaza del Castillo, em Pamplona e que neste momento me faz sentido partilhar. “Retrata um

homem em meditação soberba, lutando com uma poderosa força interna.” in Wikipédia Anabela Batata 10


São dois mundos nas mãos. Oferecidos por quem tem a coragem de encarar a vida de frente e de braços abertos. Uma ode a quem um mundo nunca chegou. Uma ode a quem sempre teve uma palavra a acrescentar. Uma ode a quem sempre dedicou a vida a saber um pouco mais que os outros para os outros. Uma ode por quem sempre tive respeito e admiração. O mundo somos nós, sem esquecer que nós somos os outros todos à nossa volta. Neste caso somos os teus amigos. Amigos que se uniram por

tua causa. Talvez seja a melhor mensagem que alguma vez passaste. Bruno Prates 11


Carmem Arrufat 12


Falar do Ricardo é quase como falar de um filho e, por isso, ainda tão difícil agora que há tão pouco tempo nos deixou. Tive o privilégio de o ver nascer para a profissão. Fui sua professora em dois anos intensos, os finais do curso inicial, em disciplinas nucleares que permitiram dar a conhecer o seu talento. Acompanhei directamente o estágio em sala de aula, onde pude apreciar as raras qualidades que aliavam criatividade, método e uma empatia generosa. Depois, vi-o seguir para começar uma carreira e a partir de então sempre fomos tendo encontros regulares, para falar de trabalho e para falar da vida. Fomo-nos acompanhando e a amizade que já havia cimentou-se. Ver o Ricardo singrar e mostrar o seu valor, homem vertical e luminoso, foi um enorme motivo de

orgulho. E um dia ele escreveu-me porque precisava de falar de trabalho e porque lhe tinham diagnosticado a doença que o levou. Não acompanhei tão de perto como talvez devesse os seus últimos tempos, mas estivemos juntos bastantes vezes, nestes meses finais. Para falar da vida e de trabalho, como sempre foi, sabendo ambos que o fim estava próximo. Perder o Ricardo foi quase como perder um filho. Ainda dói demasiado para escrever palavras que estejam à altura do tamanho dele. Um Homem Grande. Que deixou atrás de si – vejo-o bem – um rasto

de luz. Clara Botelho 13


Tive oportunidade de conhecer o professor Ricardo Reis na Escola Superior de Educação de Setúbal, no ano de 2009, quando eu estava a efetuar o curso de Mestrado em Ensino de Educação Visual e Tecnológica. Posso decerto afirmar, com regozijo, que fui seu aluno. Recordo-me bem das suas aulas, bastante dinâmicas, consagradas à reflexão sobre a prática docente, os modelos e conceções pedagógicas da educação artística. O conhecimento e visão crítica apurada, para além da sua boa disposição, que tanto o caracterizavam, sobressaíam com naturalidade e, de facto, com estes ingredientes, conseguia captar a atenção dos alunos e incentivar a sua participação ativa

durante as sessões de trabalho. Ricardo Reis foi, é e continuará a ser um modelo de saber ser e saber estar na vida. Soube, como poucas pessoas, encará-la com especial otimismo. Até mesmo quando ela (ou "ELA") não lhe sorriu de igual modo. Muito haveria a escrever sobre o legado pessoal e profissional de Ricardo Reis. Não tenho dúvidas que, se existir (algures) alguma continuidade a esta suposta existência, ficou na minha perspetiva realmente engrandecida com a sua presença.

Um saudoso abraço amigo para a eternidade. Fernando Cacela 14


15


Fernando Pinho, Bem te queremos Ricardo Reis, 2015

A maior riqueza do homem é a sua incompletude. Nesse ponto sou abastado. Palavras que me aceitam como sou – eu não aceito. Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas, que puxa válvulas, que olha o relógio, que compra pão às 6 horas da tarde, que vai lá fora, que aponta lápis, que vê a uva etc. etc. Perdoai mas eu preciso ser Outros. Eu penso renovar o homem usando borboletas. Manoel de Barros, in Retrato do Artista Quando Coisa, 1998 16


Para mim foi um privilégio conhecer o Ricardo (o Silva)... O percurso académico que trilhámos juntos permitiu-me partilhar com ele ideias e experiências que foram importantes para cimentar uma amizade

sincera e profunda. O homem que partiu era um explorador da cor, da forma, da cultura e do conhecimento. Um conversador nato, que adorava partilhar as suas experiências com os outros e debater os mais variados assuntos, sem qualquer preconceito. A sua ambição e a sua generosidade tornaram-no único... O seu carácter possibilitou-lhe conquistar metas e colher os frutos do seu intenso trabalho dedicado ao estudo da educação pela arte.

É por isso que ainda hoje o admiro e me orgulho de ter sido seu amigo. Gonçalo Gonçalves 17


Joanna Empain 18


Uma saudação que nunca foi um não. Foi generosidade e humildade, sempre com amizade. Um aperto de mão sem senão, aberto a uma ajuda de coração. Creio que foi, mas é e será, um amigo que não fez esperar. Pelo que nunca ninguém desesperará pelo seu retorno celeste do dever de amar o fluir da partilha da vida como se fosse sua filha. Creio que foi, mas é e será, a centelha que semeou. Sementeira que o azar não parou, pois o espírito não desaparece; esconde-se e reaparece em cada seiva que corre na natureza que não morre. Ricardo, lutaste e ensinaste que tudo vale a pena quando a dor é serena. Ricardo, não és memória, és glória! Luís Filipe Rodrigues 19


Mariela Dias 20


Ser professor é ser um eterno teimoso, É quase sempre andar na contramão, A despeito do mundo injusto e furioso, Sua melhor pedagogia vem do coração Ele faz tudo com tremenda satisfação, Professor se doa até virar um bagaço, Dá uma aula sorrindo, ninguém vê o cansaço, Para mim um professor é doido sem noção! Ele é um agricultor de terrenos áridos, E não abre mão de usar boas sementes, Transforma cérebros vis e esquálidos Em luas brilhantes, estrelas luzentes. Todo o mundo vê que ele é mal remunerado, E que sei sacerdócio é uma difícil missão. Ah professor esse teu esforço esmerado Dinheiro nenhum no mundo não paga, não! ia Vasconcelos, Ser professor Ser professor é acima de tudo ser. O professor Ricardo Reis foi um excelente profissional, uma pessoa amiga sempre pronta para apoiar e ajudar o próximo. Para mim, como aluna, foi um prazer enorme terme cruzado no seu caminho, aprendi muito com os seus conhecimentos e ensinamentos transmitidos nas aulas. Considero-o um exemplo de vida a seguir. Ser professor, é ser amigo, é ser artista, ser génio, ser mestre, ser pai, ser irmão, é sobretudo ser um bocadinho de tudo o que um aluno precisa, um profissional que se entrega de alma e coração à sua profissão. Esse bom ser e bom profissional deixounos em pessoa mas permanecerá nos nossos corações... ficando agora uma enorme e eterna saudade.

Um grande obrigada ao professor Ricardo Reis. Rita Gomes 21


Rita desenhando para Ricardo Reis Em Setembro de 2015 a APECV juntou-se a "Amigos Unidos por uma Causa" e dia 5 de Outubro de 2014 muitos estivemos em Óbidos, contigo, no que designamos de "Revolução Solidária". Foi o último dia em que te dei um abraço. A Rita também lá esteve e deixou a sua marca visual 22

Rui Alexandre


Conheci o Ricardo na Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual, no Porto, no final dos anos noventa, era ele ainda um jovem iniciando a sua carreira na docência. Tinha dentro dele um mundo de esperança. Ao longo dos anos vi como se construía dentro da educação artística, com garra, com vontade de fazer e de aprender. Sempre atento, reflectivo, crítico e generoso. Era um investigador brilhante porque acreditava no que estudava e ia mais sempre além; era um professor excelente porque trazia sempre consigo um sorriso carinhoso para ajudar os outros a crescer. Trabalhámos lado a lado em projectos fantásticos. Foi um dos criadores da Rede Ibero-Americana de Educação Artística. Ajudou a

Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual a transformar-se numa organização profissional e científica actualizada , trouxe para a Interrnational Society for Education Through Art a voz dos países do sul da Europa. Publicou artigos em revistas e em livros de projecção mundial. Foi o principal fundador da excelente revista de educação artística “Invisibilidades”. Fez-nos rir, pensar e sonhar. Admirávamos a sua coragem, a sua persistência e a sua resiliência. É muito triste perder amigos assim, fica-nos um vazio e uma saudade sem retorno. Fica-nos também a responsabilidade de continuar os projectos que iniciámos juntos. Dentro de nós a sua

força perdura. Teresa Eça 23


1° Mestrado em Educação Artística da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. 2005

Até Sempre, Ricardo! Teresa Esteves 24


Porquê e para quê transitar entre a literacia visual e a cidadania visual?

Ricardo Reis Universidade de Barcelona. Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto

Este artigo corresponde à comunicação partilhada por ocasião das “III Jornadas Anuales del Doctorado en Artes y Educación: el papel de las imágenes en la investigación”, nos dias 11, 12 e 13 de junho de 2014, na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Barcelona. Resumo: A questão que pretendo trazer à discussão decorre diretamente do trabalho de análise e interpretação das evidências recolhidas durante o trabalho de campo, com jovens e professores. Não se trata de discutir questões metodológicas mas antes partilhar e colocar em discussão as interpretações feitas, de modo a aferir a sua validade no quadro interpretativo da tese e no entendimento que é feito do objeto de estudo – a literacia visual – numa perspetiva sociocultural. Palavras-chave: literacia visual; cidadania visual; análise e interpretação de evidências

25


Importa, antes de mais, apresentar sucintamente o projeto de investigação de modo a que possamos ter

uma base de conversação. A tese pretende indagar sobre o papel da escola no desenvolvimento e valorização social da literacia social, tentando congregar em torno desta questão três pontos de vistas (figura 1):

figura 1 26


a)

os discursos e práticas dos estudantes e professores, entendidos como narrativas ontológicas, ou seja, narrativas através das quais cada um de nós dá sentido ao que pensa e faz. Os discursos e práticas dos estudantes e professores são entendidos como resultado de interações sociais prolongadas no tempo e dentro de uma determinada tradição;

b)

os discursos administrativos, entendidos como narrativas públicas que se ligam a formações institucionais e culturais mais amplas que o próprio indivíduo. No contexto deste trabalho, as narrativas públicas são aquelas definidas pelas normas legais que enquadram o sistema educativo, pelos programas curriculares que definem tanto o corpo de conteúdos das disciplinas como o que fazer dos professores, e pelos documentos orientadores da política de escola que determinam o lugar que cada um dos estudantes e professores ocupa dentro da instituição escolar. Estes discursos revelam não só o lugar que é designado a estudantes e professores nos normativos legais como também o lugar que cada um entende ser o seu, fruto de um processo performativo;

c)

os discursos e práticas do campo científico da educação artística, entendidos como narrativas conceptuais, ou seja, narrativas construídas ao longo do tempo pela comunidade científica da área que, ao definir conceitos, formular teorias e propor novos métodos e técnicas de trabalho baseados no conhecimento produzido, opera novas transformações na sociedade, ainda que temporárias e relacionais. Contudo, estas narrativas conceptuais materializam-se e adquirem sentido através das narrativas públicas e ontológicas, devendo, por sua vez, ser entendidas no quadro das metanarrativas nas quais estamos imersos como atores sociais.

Entender estes pontos de vista em conjunto e não separadamente relaciona-se com a complexidade do

que se pretende estudar e a necessidade de evitar uma visão parcial do tema que o afasta da nossa experiência, pois, como nos lembram Kincheloe & Berry (2007, p. 58) a “vida cotidiana é um todo ininterrupto – são nossas estratégias de pesquisa e nossas abordagens disciplinares que fragmentam e isolam partes do mundo”.O processo de recolha de evidências juntos dos jovens estudantes e dos professores [descrito anteriormente em Reis (2011b, 2013a)] permitiu reunir um conjunto alargado de material visual (partilhado voluntariamente por professores e estudantes), mas também um conjunto de textos que lhes dão sentido. O início de processo de análise e as primeiras interpretações, das quais dei

conta em Reis (2011a, 2013b, 2014), baseadas numa perspetiva sociocultural da literacia visual, levaramme a refletir sobre a pertinência de manter esta designação. 27


Os nomes e os conceitos, ainda que não sejam imóveis e viajem de uma área a outra, carregam um conjunto de preconceções, às quais se vão somando outras, fazendo com que um conceito possa vir a ser equívoco mesmo entre quem partilha uma determinada área do saber. Foi isso mesmo que constatei nas sessões de trabalho com os professores: diferentes conceções de literacia visual estavam na origem das suas verbalizações. Embora todas próximas de uma visão estrutural da literacia visual (domínio da gramática visual) uns mostravam-se mais próximos das perceção, outros do conhecimento dos elementos e princípios, outros do domínio das técnicas. Durante este processo de análise e interpretação das evidências tive conhecimento de um novo conceito que, na altura, me pareceu bastante pertinente considerar pois poderia enquadrar com maior precisão as práticas dos jovens no campo da visualidade e que problematizava o tipo de ensino escolar nesta área: cidadania visual. O conceito era recente e derivava da conferência interdisciplinar Visual Citizenship: Belonging through the Lens of Human Rights and Humanitarian Action1, que decorreu em abril de 2010 no New York University’s Institute for Public Knowledge e na qual participaram teóricos e produtores de imagens que exploraram e, em parte, tentaram definir o que significa ser um “cidadão visual”. A nível académico este foi o primeiro evento que conheço onde o conceito foi abordado e as poucas referências que a ele existem derivam exatamente daqui. Esta conferência propôs-se repensar o conceito de cidadania para lá do mero enquadramento jurídico e considerar que o visual joga um papel importante na determinação, delimitação e reivindicação de um espaço para nós próprios e para os outros na sociedade (Telesca, 2013). Vi um conjunto de vídeos2 onde os diversos conferencistas falavam sobre o seu conceito de cidadania visual. Percebi que não havia um entendimento unânime sobre o conceito e que cada autor,

consoante a sua área de interesse ou de trabalho, valorizava mais um ou outro aspeto. Ao ouvi-los conectei os seus diferentes pontos de vista com o meu trabalho de investigação, pois corroboravam algumas reflexões que resultavam diretamente do material recolhido no trabalho de campo, nomeadamente o desfasamento entre aquilo que a escola e os seus professores têm para ensinar e e aquilo que são as práticas dos jovens no campo da visualidade. Surpreendentemente – tendo em conta o tipo de ensino escolar que parece estar mais ou menos generalizado nesta área e que tem que ver com o domínio da gramática visual – os jovens evidenciam alguma facilidade em integrar processos de análise, 1

http://ipk.nyu.edu/publications/item/10-visual-citizenship

2

Disponível em https://vimeo.com/ipk/videos

28


interpretação, reinterpretação, apropriação, avaliação e relação entre saberes, mas claramente maior dificuldade nos processos de criação, especialmente quando pouco direcionada. Os jovens parecem tirar pouco partido das aprendizagens escolares para o seu dia-a-dia e para a sua produção de produtos visuais mas parecem estar atentos ao que os rodeia e reclamam aos professores uma maior participação no governo da aula, nas atividades, na escolha dos conteúdos e também na vida escolar em geral. Isto representa um (novo) posicionamento dos estudantes que reclama uma participação cívica que lhes tem vindo a ser negada.

Há muito que se reclama uma nova narrativa para o ensino das artes visuais [veja-se, por exemplo (Hernández, 2007)], que tem vindo a ser acompanhada por uma nova visão sobre o papel do observador na arte (Bishop, 2006, 2012; Maio, 2011) e também por uma importante revisão (ou constatação) sobre as estratégias de participação dos jovens na sociedade, especialmente através do uso das novas tecnologias. Essas novas estratégias passam por uma “cultura de participação”, de “remix” e de “recombinação” (mashup) que leva a que os jovens se organizem como “enxames inteligentes” (smart swarms) de pessoas que colaboram e operam coletivamente, combinando material existente de modo a produzir o seu próprio trabalho (Duncum, 2014). Não quero traçar conclusões mas sim problematizar e discutir a validade ou a pertinência de transitar entre o conceito de literacia visual e o de cidadania visual, tendo em conta as primeiras interpretações das evidências, à luz deste enquadramento teórico. Poderia elencar um conjunto de argumentos a favor e contra este trânsito mas quero antes deixar uma reflexão (para discussão) que me leva a questionar esse trânsito: Será que o próprio conceito de literacia visual quando apareceu no início dos anos de 1970 não proclamava já uma determinada forma de cidadania? Entendo que o corpo de conhecimentos que se propunha designava um lugar para os aprendizes que se suponha ser o lugar certo para eles dentro de um determinado papel que lhes era designado como cidadãos, ou seja, estes conhecimentos eram essenciais para que todos pudessem ocupar o seu lugar no mundo. Mas, à medida que a sociedade evolui e reclama novos lugares para os cidadãos, novos conhecimentos e competências vão sendo necessárias. Por isso há o risco de que o conceito de cidadania visual seja tão relacionado com a cidadania como era o anterior, com a diferença que engloba

aquilo que agora consideramos essencial: a participação do sujeito na sociedade. Então, porquê e para quê transitar entre a literacia visual e a cidadania visual? 29


Referências Bishop, C. (Ed.). (2006). Participation. Londres: Whitechapel e MIT Press. Bishop, C. (2012). Artificial hells: Participatory art and the politics of spectatorship. Londres e Nova Iorque: Verso. Duncum, P. (2014). Youth on Youtube as smart swarms. Art Education, 67(2), 32–35. Hernández, F. (2007). Espigador@s de la cultura visual: otra narrativa para la educación de las artes visuales [Gleaners of visual culture: another narrative for visual arts education]. Barcelona, Spain: Octaedro. Kincheloe, J. L., & Berry, K. S. (2007). Pesquisa em Educação. Conceituando a bricolagem. Porto Alegre: Artmed. Maio, F. (2011). A encenação da arte. Leiria: Textiverso. Reis, R. (2011a). A Literacia Visual desde “quem os meus professores pensam que sou?”: uma análise sobre as imagens que os professores mostram aos seus alunos. In S. Pereira (Ed.), Actas do I Congresso Nacional Literacia, Media e Cidadania (pp. 399–416). Braga: Universidade do Minho. Retrieved from http://

www.lasics.uminho.pt/OJS/index.php/lmc/article/view/479/450 Reis, R. (2011b). Investigar a Literacia Visual com os jovens. In F. Hernández (Ed.), Investigar con los jóvenes: cuestiones temáticas, metodológicas, éticas y educativas (pp. 159–171). Barcelona: ESBRINA RECERCA. Retrieved from http://hdl.handle.net/2445/17362 Reis, R. (2013a). Research on visual literacy meanings with students and teachers. In A. Karpati & E. Gaul (Eds.), From Child Art to Visual Culture of Youth - New Models and Tools for Assessment of Learning and Creation in Art Education (pp. 267–282). Bristol: Intellect.

Reis, R. (2013b). Uma perspetiva sobre os jovens como produtores de cultura visual: O papel das tecnologias da visão na construção de noções e práticas em literacia visual. In Investigar con Jóvenes: ¿Qué sabemos de los jóvenes como productores de Cultura Visual?” (Grupo de I., pp. 258–278). Pamplona: Pamiela – Edarte (UPNA/NUP). Reis, R. (2014). Um olhar sobre o papel das tecnologias da visão na construção de noções e práticas de literacia visual entre os jovens. Revista Lusófona de Educação, (26), 67–86. Telesca, J. E. (2013). What Is Visual Citizenship? Humanity: An International Journal of Human Rights, Humanitarianism, and Development, 4(3), 339–343. doi:10.1353/hum.2013.0025 30


Resenha do livro “Desenho, criação e consciência”, de Luís Filipe Rodrigues

Rui Alexandre Nota biográfica ruialexandredesign@gmail.com “Desenho, criação e consciência” de Luís Filipe Rodrigues (Books on Demand, 2010, 407 páginas) (figura 1) traz-nos uma reflexão, reforçada pelo testemunhos de vários artistas portugueses, materializada num diferente olhar para o processo inerente ao desenho.

Esta obra surge pela tese de mestrado do autor, em Educação Artística na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, e estrutura-se em quatro partes: introdução; contexto teórico do desenho e áreas transversais; entrevistas aos atores de criação; e, conclusão.

- o cap. 2 “a relação eu-não-eu e a relação eueu” dá continuidade à construção do ser gerada pelo contacto, quer no mundo objetivo (envolvente), quer no subjetivo (autor) onde interferem, entre outros aspetos, a imaginação, os afetos e as emoções;

A nota introdutória desta obra, entre várias outras perguntas, aponta uma pergunta que se considera ser guia de toda a investigação. Essa pergunta é “Será o desenho criativo, para o seu autor, uma procura de sentido e de uma consciência mais alargada de si próprio?” e terá a resposta durante todo o desenvolvimento da obra, começando pela fundamentação teórica da parte II, correspondente do capítulo 1 ao capítulo 6:

- o cap. 3 “a intuição e a razão” aponta a influência da experiência prévia (aculturação) no direcionamento do pensamento e ações, quer de forma consciente, como inconsciente. Neste contexto, é desenvolvido o processo intuitivo do desenho como essencial para intervir na “razão” podendo, com o apoio das emoções, potenciar ou não a criatividade;

- o cap. 1 “a realidade e as especificidades do desenho” desenvolve a relação do desenho enquanto processo relacional espaço-tempo; corpo-mente; bem como também, através da escolha dos suportes, materiais e instrumentos. Relação esta que é capaz de construir sentido/ significado nas imagens (informação) através da linguagem e expressão, vividas e geradas pelo autor, através do contexto real e/ou imaginário;

- o cap. 4 “cognição no contexto do desenho” o desenho, enquanto aprendizagem física e mental, é revisto como meio imprescindível ao conhecimento, criação e cultura, intensificado pela prática e relação entre visão e percepção. Aqui se referem ainda quais as condições essenciais para que a aprendizagem do desenho aconteça de forma latente, e com base na intuição e desenvolvimento da percepção visual; 31


- o cap. 5 “o fenómeno da consciência no desenho-processo para o encontro de sentido”, recorre a interessantes legados teóricos como os de António Damásio. Neste contexto, a obra retoma o desenho, enquanto processo de criação/representação, como meio de conhecimento/“descoberta”/ diálogo entre si (e meio envolvente) explicando a prática, através do desenho, como geradora de consciência; - o cap. 6 “o contexto da criação”, baseado também no criador do desenho e suas vivências (sistema tácito), analisa o processo espontâneo criativo através do equilíbrio entre esforço e, nomeadamente, prazer como forma de recompensa e valorização pelo outro. Toda esta abordagem, com uma reflexão constante no final de todos subcapítulos, presentes nos capítulos referidos, é posteriormente posta numa investigação de campo de onde são recolhidas e analisadas várias entrevistas e retiradas as devidas conclusões (Parte III e IV, respetivamente). Os entrevistados foram: Alberto Carneiro, escultor; Alcino Soutinho, arquiteto; Álvaro Siza Vieira, arquiteto; Ângelo de Sousa, pintor; António Pedro, escultor; Jaime Silva, pintor; José Rodrigues, escultor; Lagoa Henriques, escultor; Luísa Arruda, pintora; Luísa Gonçalves, escultora; Mário Bismark, pintor; Pedro Saraiva, pintor; e Vítor Silva, pintor. No final da obra, e após a bibliografia, é possível aceder ao anexo de todas as entrevistas.

Finalmente, quanto às conclusões (Parte IV), deixamos em aberto qualquer referência, para que o leitor as possa analisar e perceber de forma pessoal. No entanto, são apontadas várias direções em resposta à ideia do desenho criativo como fenómeno relacional: percepção - pensamento deliberado - pensamento intuitivo, fonte de motivação e autoconhecimento por parte do criador e, meio de reflexão do meio envolvente

A parte III debate o guião das entrevistas, aos artistas referidos, que tentam responder à pergunta inicialmente formulada e vão de encontro com as inferências retiradas da fundamentação teórica. No entanto, como podemos constatar, todos os artistas escolhidos: usam o desenho como meio de criação; são reconhecidos; frequentaram e, comutativamente, ministraram também a disciplina de desenho. .

32


Entre aulas educativas y aulas en la Cultura Visual Visibilizando relaciones interpersonales y espaciales en ámbitos edcativos formales Amparo Alonso-Sanz - m.amparo.alonso@uv.es

Profesora asociada de Educación Artística en la Universidad de Valencia. Miembro del grupo Art & Educació. Licenciada en Bellas Artes con premio al mejor expediente académico y premio alumno cinco

estrellas

de

la

Universidad

Miguel

Hernández, Diplomada en Arquitectura Técnica por la Universidad de Alicante. Doctora en Didácticas Específicas por la Universitat de València. Como artista visual ha presentado exposiciones de pintura y escultura. Transcripción “Relaciones

de

la

conferencia

interpersonales

y

titulada

espaciales

en

ámbitos educativos”, impartida en la Facultat de

Magisteri de la Universitat de València, dentro de las

actividades

d'Educació

en

del Arts

Seminari Visuals

Permanent

“La

Primavera

Valenciana de l'Educació Artística”, organizado por el

Instituto

del

Creatividad

i

Innovaciones

Educativas en colaboración con el Área de Didáctica de la Expresión Plástica de la Universitat

de València y realizado el 15,23, 24 y 30 de Abril de 2013. 33


Resumen . Esta investigación reflexiona sobre las relaciones

. Las imágenes procedentes de producciones

interpersonales y espaciales que se producen en

visuales culturales, al estar situadas junto a las

ámbitos educativos formales, desde las escuelas

imágenes tomadas a la realidad que se representa

de educación infantil hasta los aularios de

fotográficamente, contribuyen a: [1] dirigir la

universidad.

atención, lectura e interpretación de los mensajes

Se pretende visibilizar la información sociocultural

implícitos;

que se transmite a través de las arquitecturas de

internacionales que influyen en la vida social, con

los ámbitos educativos formales. Tomándose

otras imágenes obtenidas en entornos españoles.

como marco de referencia la teoría del currículo

Los

oculto.

pedagógicos subyacentes a la definición de los

A través de la metodología de Investigación

espacios áulicos.

Educativa Basada en las Artes Visuales se reúnen

Las principales conclusiones son reflexiones al

diversas fotografías independientes y fotoensayos.

respecto

La fotografía es un método idóneo para la

profesorado,

construcción

el

direccionalidad, actitudes que se fomentan en el

investigador puede manifestar las relaciones

proceso de aprendizaje, convencionalismos que

halladas en contextos educativos. Los datos

perpetúan estereotipos asociados a determinadas

recogidos provienen por un lado de fotografías de

materias, en función de las distintas disposiciones

aulas donde se desarrollan enseñanzas artísticas

espaciales y tipos de organización física del aula.

de

mensajes

con

los

que

[2]

confrontar

resultados

de:

nos

aproximan

modelos flujos

representaciones

de

de

a

modelos

enseñanza

del

comunicación

y

y por otro lado de imágenes de la Cultura Visual, obtenidas de la televisión e internet

Palabras clave: cultura visual; television; espacios educativos formales; currículo oculto; tendencias pedagógicas 34


Introducción. Importancia de la distribución espacial del aula y su influencia en la enseñanza Estudios como los llevados a cabo por Savin-Badena (2013) sugieren que existe un conocimiento poco profundo sobre el modo en que está implicado el espacio en el aprendizaje, requiriéndose mayor investigación con objeto de alcanzar una mejor comprensión de las implicaciones pedagógicas. Nos interesa la perspectiva sociocultural del espacio áulico en la que se produce el “aprendizaje en

contextos sociales mediante la cooperación entre estudiantes y de éstos con los profesores” (Prada, 2010, p. 190). Desde un corte etnográfico, Naranjo (2011) nos aproxima a la perspectiva sociocultural de la materialidad del aula, en la que se hacen presentes en la vida cotidiana de maestros y alumnos las regulaciones institucionales. Enfocándose en atributos como el diseño espacial, el mobiliario y su distribución en el espacio, de un modo semiótico extrae algunos significados potenciales que deseamos destacar por cómo regulan las relaciones pedagógicas. El diseño de un aula que reduce la visibilidad hacia el patio a través de las ventanas, se entiende según la autora como el aislamiento de los alumnos

de otros entornos que se conciben como distractores del trabajo académico. La distribución del mobiliario en filas se relaciona con la eficiencia social de los alumnos vigilados por la figura de autoridad, a la vez que se dificultan las posibilidades de interacción. Independientemente de que el maestro no use su escritorio, su ubicación es según la investigadora un signo del papel de autoridad que la institución escolar le otorga (fig 1). Los espacios se personalizan, se flexibilizan, se vacían de ciertos significados y se llenan con otros que se adecuan mejor a las necesidades y concepciones de los participantes, sirven como barreras o se hacen porosos frente a los

contextos externos y, en síntesis, se reconstruyen a través de la participación y uso que de ellos hacen los sujetos

35


Este trabajo se encuentra en la línea de la investigación desarrollada por Voldman (2005, 2006), “Foto Aérea del Espacio Áulico”, para interrogar sobre el valor simbólico de la distribución en el espacio relacionada con los vínculos de los alumnos entre sí y con el profesor y la materia, el bien-estar o malestar de los sujetos en el aula. Desde la proxemia podríamos diferenciar las distintas zonas de interacción que pueden producirse en los ámbitos educativos formales donde se desenvuelven como seres relacionales tanto profesores como alumnado. Pero no nos preocupa tanto como varían esas distancias en función de aspectos culturales;

sino cómo influyen en las relaciones interpersonales, las distancias que forzosamente se impone a nivel institucional a los usuarios de las aulas (figura 2).

Figura 2. Cita visual fragmento, de la fig. 5 del Fotoensayo “Relaciones” compuesto por dos fotografías digitales del autor y dos citas visuales literales (Grant, 1954; McCombe, 1969) de la que se escogen las dos primeras, (Mena de Torres, 2012, p. 100).

Figura 1. España vs Finlandia. Fotoensayo compuesto a partir de dos citas visuales literales obtenidas por captura de pantalla de 1’20’’ y 7’43’’ en programa televisivo “Cuestión de educación, Salvados, La sexta” (Legaspi, 2013). 36


Las disposiciones posibles para las clases se encuentran tan arraigadas que es difícil sospechar de ellas, reflexionar sobre la conveniencia de unas estructuras espaciales u otras en función de las necesidades pedagógicas. Se presume que la tradición ya ha garantizado los modelos que mejor funcionaban, pero cabe preguntarse a qué modelos respondían: ¿eficiencia social?, ¿trabajo seriado o en cadena?, ¿aprendizaje individual?, ¿resolución de proyectos?, ¿aprendizaje colaborativo? Por otro lado, ¿cuáles convendrían que siguiesen en vigor en nuestro momento sociocultural? El profesorado debería tomar conciencia de su postura didáctica, y dar respuesta a ella con una distribución espacial que la potencie en cada caso. Para ello debe cuestionarse a cerca de los flujos de comunicación que desea generar y su dirección: entre alumnado, entre alumnado y con el docente, del docente hacia el alumnado... Además de la actitud que necesita fomentar: pasividad en el alumnado frente al docente, implicación entre discentes, participación autónoma… Encontramos que existe una relación muy estrecha entre el tipo de disposiciones de aprendizaje a las que es más proclive cada docente y el estilo de liderazgo que adopta. En la línea del modelo de liderazgo situacional de Hersey, Blanchard & Johnson (1998) que reconoce como posibles patrones de comportamiento del líder: dictar, convencer, participar, delegar. Las disposiciones espaciales tradicionales varían ligeramente según las etapas educativas y las disciplinas. Según Doménech y Gómez (2003) existe una relación entre las creencias psicopedagógicas implícitas del profesor y el modelo de enseñanza derivado con el tipo de organización física del aula propuesto por el mismo. Según estos autores la disposición vertical reflejaría un modelo de enseñanza centrado en el

profesor y en el producto. Las disposiciones tradicionales, verticales, de forma preponderante dividen la zona de aprendizaje en dos partes diferenciadas: la que ocupará el docente frente a la que ocuparán los discentes. Por supuesto sin perder de vista la lucha contra ciertos convencionalismos que perpetúan estereotipos asociados a determinadas materias: se aprende a leer sentado, como si en el metro no se leyesen novelas de pie; se busca información en la biblioteca en silencio y sentado, como si no investigáramos a través del teléfono móvil de pie y en cualquier lugar; se aprende a sumar y multiplicar sentado, aunque

luego solo hagamos cálculo mental en la cola del supermercado a expensas de saber si llevamos suficientes monedas para pagar (figura 3) 37


Figura 3. Teléfono. Fotoensayo compuesto a partir de una fotografía digital de la autora y dos citas visuales literales. Arriba, comunicándose a través de texto e imagen (Mascarell y Martínez, 2013, p.28). Centro, fotografía digital de la autora en sesión con alumnos de música del Máster universitario en profesorado de educación secundaria (obligatoria, bachillerato y formación profesional) y enseñanzas artísticas, de idiomas y deportivas, en la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 11 de enero de 2013 Abajo, imagen de la serie televisiva “Los Simpson” extraída

de

http://3.bp.blogspot.com/-fXCnHQwPDJk/TbCkE4iSssI/AAAAAAAAABg/9kD8s3eLmsM/s1600/simpsons+cel.jpg

el 16 de abril de 2013. 38


La función misma, la educación, está unida al espacio donde ocurre. Y el término “escuela” recoge a la vez el lugar y la institución. En ella otros términos sufren de semejante metonimia (clase, aula) pero… del espacio y el grupo que forma. Eso la convierte en un mundo lleno de áreas, zonas, territorios, campos, con espacios afines y espacios extraños, con zonas accesibles y zonas prohibidas, con áreas preeminentes y áreas subordinadas. El uso del espacio en la escuela opera con todos los ejes, dentro-fuera, arriba-abajo, delante-detrás, proximidad-distancia. Cada eje traduce relaciones sociales generadas en ese mundo o recreadas a partir de relaciones exteriores a él. Cada eje elabora significados y valores y es manipulado por profesores y alumnos en un juego incesante de

estrategias de interdependencia y de autonomía, de colaboración, de inhibición o de conflicto. Incluso la escuela-aula contiene nichos individuales o espacios colectivos, estrados de exhibición o rincones de marginación, posiciones de relevancia, de competencia, de disimulo, etc. La disposición de las mesas y pupitres homogeniza, aunque también jerarquiza, genera complicidades, activa amistades, suscita envidias, expresa en el espacio rendimientos académicos desiguales o vinculaciones diferenciadas. (Velasco, 2008, p. 433)

Los referentes teóricos visuales son una parte fundamental de esta investigación. Esta aproximación teórica la hacemos apoyándonos también en citas visuales literales de la Cultura Visual, mediante fotografías e imágenes que pueden provenir de páginas web, series de dibujos animados infantiles, series televisivas para preadolescentes…

The term visual suggests that we are concerned with substantially visual artifacts. Artifacts often involve codes other than visual ones and engage sensory modes other than sight, but we are interested in artifacts to the extent to which, or when, we infer that they have meaning that is substantially visual. Secondly, the term culture suggests an interest in more than the artifacts themselves. It suggests an interest in the social conditions in which the artifacts have their being, including their production, distribution, and use. Images are viewed in their contextual richness, as part of an ongoing social discourse that involves their influence in social life. (Duncum, 2001, p.103) 39


Porque la Cultura Visual a través de los productos visuales cotidianos informativos, comerciales, de entretenimiento y algunos de carácter artístico (Acaso, 2006) retrata una determinada realidad, recoge producciones representativas de una cultura “glocal”. Aquella que inserta en nuestro alumnado comportamientos globales, principalmente norteamericanos, que luego se reproducen en ámbitos locales como los entornos escolares. Por lo que conviene según Duncum (2001) “examinar cómo funcionan las imágenes dentro y a través de las diferentes sociedades y en los diferentes momentos” (p.103). En ese sentido nos interesa confrontar representaciones internacionales que influyen en la vida social, con otras imágenes obtenidas en entornos educativos formales españoles. La información sociocultural que se transmite a través de las arquitecturas escolares, pero que no se enseña ni se aprende intencionadamente nos aporta un marco de referencia dentro de la teoría del currículo oculto (Prada, 2010). En ese sentido deseamos visibilizar mediante recursos fotográficos esa información oculta. La recopilación de imágenes procedentes de la Cultura Visual y otras tomadas de espacios reales, permite elaborar una especie de catálogo de posibilidades y reflexiones. Es a partir del diálogo entre estas imágenes estructuradas como fotografías independientes y como fotoensayos, que se

conforma este proceso de visualización. La imagen se emplea aquí para la construcción de mensajes, no para la ilustración de los textos (figura 4). 40


41


42


43


Figura 4. Actitudes. Fotoensayo compuesto a partir de 1 fotografía de la autora y 4 citas visuales literales. Arriba, alumnos de 3º de Educación Primaria del C.P.E.I.P. La Cañada de Fenollar de Alicante. Segunda fila, imagen de la serie televisiva “Los Simpson” extraída de http://pichars.org/store/5429_original_tumblr_lpxbnuCGar1qzma4ho1_500.png el 16 de abril de 2013. Tercera fila izquierda, imagen de serie televisiva infantil “El maravilloso mundo de Gumball” extraída de http://images1.wikia.nocookie.net/__cb20121206174530/theamazingworldofgumball/images/thumb/5/5e/ Mr._Small's_Class.png/800px-Mr._Small's_Class.png el 16 de abril de 2013. Tercera fila derecha, figura 19 (Llorens

Rubio, 2011). Abajo, imagen de la serie televisiva “Los Simpson” extraída de http://listas.20minutos.es/lista/fotos-con -frases-d-parte-5-323719/ el 19 de mayo de 2014. 44


Objetivo Este trabajo tiene por objeto aproximar al espectador a una visión de los espacios educativos formales, desde la distribución espacial y las relaciones interpersonales que con ello se condicionan. Visibilizando modelos pedagógicos subyacentes a la forma en que entre docentes y discentes se definen los espacios áulicos. El estudio se centra en la disposición de los espacios, del mobiliario, los materiales y las personas -tanto docentes como discentes-. Tratando de observar cómo se pueden relacionar todos estos elementos entre sí, en función de la distribución espacial establecida en el espacio educativo. El enfoque procura ser próximo a las realidades que caracterizan nuestro conjunto educativo. Procurando el respeto a todos los integrantes de este sistema. Sin embargo, necesariamente nos vemos obligados a tener agudeza crítica para detectar las problemáticas o rutinas poco benefactoras en el aprendizaje. E ineludiblemente capacidad de propuesta positiva, ofreciendo alternativas factibles o adaptables a cada caso (figura 5).

Figura 5. Aulas escalonadas. Fotoensayo compuesto por dos citas visuales literales (en esta página), una fotografía digital de la autora y dos citas visuales literales (en las siguientes páginas). Arriba, aula de Estudios de Grado. Captura de pantalla de página web de la Universidad de Alicante. Imagen extraída de http://www.ua.es el 28 de marzo de 2013. Abajo, variedad de aulas de Brock University. Captura de pantalla extraída de http://

www.brocku.ca/information-technology/teaching/av/brock -university-s-crestron-co-3 el 17 de abril de 2013. 45


Metodología La metodología seguida en este trabajo es la Investigación Educativa Basada en las Artes Visuales (Visual Arts Based Educational Research) (Marín, 2005; Marín y Roldán, 2008, 2009, 2010), que se englobaría dentro de la Investigación Educativa Basada en el Arte (Arts-Based Educational Research) (Eisner & Barone, 2006). La recogida de datos se lleva a cabo en aulas donde se desarrollan enseñanzas artísticas, de ámbitos educativos formales. Mediante la fotografía como instrumento, nos acercaremos al interior de diversos espacios educativos: ya sea a partir de instantáneas tomadas por la propia autora como capturas de pantalla que recortan imágenes procedentes de la Cultura Visual (figura 6).

Figura 6.

Sesión con alumnos de Expresión Plástica de Magisterio, en la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 12 de noviembre de 2010. 46


Tratamos de recoger con nuestro análisis visual

educativos. La ambigüedad en algunos casos a la

imágenes procedentes de diversas esferas, desde

hora de hacer la correspondencia entre ejemplo y

los

los

tipo de centro es premeditada. Se pretende que

universitarios, en cualquier caso nos ceñiremos a

sea el espectador quien asocie conductas a unos u

los ámbitos educativos formales. Pues en la

otros lugares, pues un mismo tipo de dinámica

comparativa de cada uno de estos entornos,

podría ser tan característica de una escuela infantil

delimitados por edades, encontramos una riqueza

como de una Universidad (figura 7).

centros

educativos

infantiles

hasta

de matices que pueden favorecer la flexibilidad, la ruptura de fronteras y estereotipos. Por lo que indistintamente nos referiremos a ejemplos de unos u otros ámbitos

Figura 7. Arriba, captura de pantalla de la serie televisiva infantil “Monster High” en el capítulo “El profe susto tuto” extraída de http://www.youtube.com/watch?v=REwsQBr23F8 el 17 de abril de 2013. Abajo, imagen de la serie televisiva “Los Simpson” extraída de http://desmotivaciones.es/carteles/seran/28 el 17 de abril de 2013. 47


Resultados A

continuación

resultados

se

ofrecerán

respecto

a

los las

principales

clara de los resultados se ha decidido exponerlo

relaciones

de forma clasificada conforme a estos criterios. Se mueve el alumnado

interpersonales y espaciales que se establecen en el aula en función de los elementos que la

Intuitivamente

conforman y que pueden variar de posición o

asiduidad cambios en el aula, es evidente. Las

adoptar distintas ubicaciones según su movilidad.

intenciones pueden ser variadas. Es común que se

De esta forma distinguiremos entre 5 enfoques:

cambie de lugar periódicamente al alumnado, ya

qué ocurre cuando se mueve el alumnado, cuándo

sea

se mueve el profesorado, cuando se mueven los

enseñanza-aprendizaje, de generar condiciones de

materiales, cuando se mueve el mobiliario o

igualdad, para permitir que todos conozcan las

cuando nos movemos de aula o bien fuera del

distintas posiciones más cercanas o alejadas de

aula. Evidentemente estos flujos no se producen

las pizarras u otros focos de interés, para generar

con independencia unos de otros, pues en el

la inclusión de algún miembro, o con el fin de

transcurso de una sesión pueden generarse

ejercer un mayor control sobre ciertos educandos.

movimientos

En estos casos el elemento en movimiento es el

simultáneamente.

de Sin

diversas embargo

tipologías para

con

el

objeto

profesorado

de

favorecer

acomete

procesos

con

de

propio discípulo, mientras que el resto (mobiliario,

una

materiales, docente) permanece estático (figura 8).

exposición más

Figura 8. Fotografía independiente. Sesión con alumnos

de

música

del

Máster

universitario

en

profesorado de educación secundaria (obligatoria, bachillerato y formación profesional) y enseñanzas artísticas, de idiomas y deportivas, en la Facultad de

Educación de la Universidad de Alicante, el 11 de enero de 2013. 48


Este tipo de movimientos imprimen indirectamente

Se mueve el profesorado

un cierto carácter de subordinación al aprendiz,

Con frecuencia el docente toma conciencia de la

que se encuentra sometido a la hierática postura

importancia de sus desplazamientos por el aula y

que adoptan el resto de factores a su alrededor.

abandona la cómoda butaca (a diferencia del

De alguna forma el mensaje erróneo que se

rígido asiento de los pupilos) para situarse en

transmite es que las personas aprenderán en

distintos lugares. Por ejemplo moviéndose tras las

función de todo lo demás que parece tener más

cabezas

importancia. Cuando en realidad la justificación es

exámenes por encima de unas gafas a media

más pragmática, reside en que es más sencillo y

nariz, mientras que las manos permanecen asidas

silencioso desplazar a seres vivos que a pesados

tras la espalda. O tal vez acudiendo al fondo de

o conectados seres inertes (pensemos en una

una gran sala para asegurarse de que la audiencia

estantería o una pizarra digital).

del final mantiene la atención sobre su magistral

del

alumnado,

oteando

nucas

y

monólogo (figura 9).

Figura 9. El profesor se mueve. Fotoensayo compuesto por cuatro fotografías digitales de la autora (una en esta página y tres en la siguiente página). Imágenes de la sesión con alumnos de música del Máster universitario en profesorado de educación secundaria (obligatoria, bachillerato y formación profesional) y enseñanzas artísticas, de idiomas y deportivas, en la Facultad de

Educación de la Universidad de Alicante, el 17 de enero de 2013. 49


Quizá incluso con un leve transitar entre pupitres mientras plantea ideas o establece preguntas. Posiblemente

sentándose

junto

o

entre

el

alumnado, a su misma altura (en sentido real y figurado), para tutorizar con mayor cercanía el desarrollo de un trabajo. No solemos percibir la libertad que goza el enseñante para decidir siempre cómo, cuándo y dónde desplazarse. Frente a la postura de quien aprende que debe contar con permiso para moverse,

en

ocasiones

incluso

unos

leves

centímetros, ni que decir tiene para salir del aula, o para estirar las piernas si se le están durmiendo o si él mismo es quien se está durmiendo. Esto es así porque al Maestro le atribuimos socialmente la maestría, la pericia para discernir lo más adecuado educativamente hablando. Paradójicamente no se forma al profesorado para tomar estas decisiones conscientemente,

aunque

lo

haga

por

convencionalismo, o por reproducir patrones que pudo aprender desde su infancia. No olvidemos que la enseñanza es la única profesión en la que la socialización profesional comienza a los 5 o 6 años de edad, destacando la primacía de la biografía

sobre

la

formación

inicial

en

la

socialización del profesorado en formación (Eisner, 2003; Gary, 2004) por lo tanto desde temprana

edad se aprende cómo se comporta un profesor en clase (figuras 10 y 11). 50


Figura 10. Fotografías digitales de la autora en la sesión con alumnos de música del Máster universitario en profesorado de educación secundaria (obligatoria, bachillerato y formación profesional) y enseñanzas artísticas, de idiomas y deportivas, en la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 17 de enero de 2013. 51


52


53


Figura 11 Libertad de movimientos. Fotoensayo compuesto por tres fotografías digitales de la autora en sesión con alumnos de música del Máster universitario en profesorado de educación secundaria (obligatoria, bachillerato y formación profesional) y enseñanzas artísticas, de idiomas y deportivas, en la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 11 de enero de 2013. 54


Se mueven los materiales Respecto a los materiales podemos distinguir que éstos sean socializados o privativos. Se observa que siendo material socializado se guarda en botes, latas, cajas, cestas… de forma ordenada y al alcance de todos, ya sea en estantes o en el centro de las mesas. Mientras que si se trata de material privado permanece muy cerca del propietario para evitar extravíos (figura 12).

Figura 12. Materiales. Fotoensayo compuesto por cuatro citas visuales literales (en esta página) y una fotografía digital de la

autora (en la siguiente página). En esta página, cuatro imágenes obtenidas por capturas de pantalla de segundos 10, 17, 36 y 57 extraídas en programa televisivo “Cuestión de educación, Salvados, La sexta” (Legaspi, 2013). 55


En ocasiones el docente decide ubicar herramientas, utensilios, papeles… estratégicamente situados para condicionar con ello flujos y movimientos de las personas o relaciones interpersonales durante el trabajo. En algunas disciplinas acontece con mayor frecuencia que en otras. En la Educación Artística es común emplear este tipo de técnicas que fomentan que unos compañeros puedan observar la evolución y progresos del resto a medida que se trabaja (figura 13).

Figura 13. Alumnas de Expresión Plástica de Magisterio, de la

Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 15 de febrero de 2011. 56


Una posibilidad es situarlos en el centro del aula, donde deberĂĄn acudir quienes lo necesiten antes de regresar a sus zonas de trabajo, situados como satĂŠlites entorno a los materiales (figura 14).

57


Figura 14. Interactuando. Fotoensayo compuesto por dos fotografías digitales de la autora en sesión con alumnos del Máster universitario en profesorado de educación secundaria (obligatoria, bachillerato y formación profesional) y

enseñanzas artísticas, de idiomas y deportivas, en la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 25 de marzo de 2013. 58


Otra posibilidad es que la distribución de materiales no sea equitativa, a unos grupos se les otorga más materias primas o de mejor calidad frente a otros. Bajo el criterio de desigualdad se producen interesantes relaciones de poder y subordinación frente a las que es necesario desarrollar habilidades sociales si se quiere acabar el trabajo o proyecto requerido. La limitación de los recursos que se distribuyen a cada grupo es una manera de crear una interdependencia positiva, según Johnson, Johnson & Holubec (1999). De forma más común los individuos circulan en función de los materiales cuando se desarrollan varias actividades en una misma aula en rincones diferentes. Bajo la premisa de que ciertos materiales no deben mezclarse con otros por condicionantes de seguridad, incompatibilidades químicas, de limpieza en el proceso de resolución, desarrollo de distintas fases… encontramos este tipo de situaciones (figura 15).

Figura 15.

Fotografía independiente. Alumnas de Expresión Plástica de Magisterio, de la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, 13 de noviembre de 2009. 59


Propio de las enseñanzas teatrales es modificar la ubicación del mobiliario con fines escenográfico, sin que nadie se extrañe; o de la educación artística ubicar un bodegón o una escultura de yeso de forma que quienes la copian tengan alcance visual; o de la educación musical que un piano no esté arrinconado. Pero desde la perspectiva de la relevancia académica, que otras áreas de conocimiento comenzaran a adoptar conductas similares podría malentenderse como una pérdida de rigurosidad y disciplina. Se mueve el mobiliario Se corren y descorren cortinas, se suben y bajan persianas, se despliegan y recogen toldos porque

alumnado y docente por propia experimentación sabe cuándo le conviene regular las condiciones térmicas o lumínicas (figuras 16 y 17). 60


Figura 16 Fotografía independiente. Alumnas de Expresión Plástica de Magisterio, de la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 3 de noviembre de 2011.

Figura 17

Iluminando. Fotoensayo compuesto por dos fotografías digitales de la autora a alumnas de Expresión Plástica de Magisterio, de la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 11 y 13 de noviembre de 2011. 61


62


Desgraciadamente no siempre se hace tanto por motivos ambientales (environment) generadores de condicionantes de intimidad, intriga, emoción… porque es complicado tomar conciencia de cómo todo ello influye en los contenidos que transmitimos (figura 18).

Figura 18.

Fotografía independiente. Alumnas de Expresión Plástica de Magisterio, de la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 27 de octubre de 2011. 63


Hasta aquí es sencillo porque estos recursos se modifican con facilidad manualmente, y más todavía si están motorizados o regulados mediante domótica. Indiscutiblemente todo el mundo entiende que son condicionantes del aprendizaje, pues influyen directamente en nuestra percepción visual. Y nadie va poner en tela de juicio lo importante que resulta leer, escribir, ver la pizarra con claridad, o la pantalla sobre la que se proyecta con oscuridad. Pero miramos hacia otro lado cuando se trata de mover mesas, pupitres, sillas, bancos corridos, bancadas, estanterías… por el esfuerzo que supone trasladarlos, en el mejor de los casos; o desplazarlos

para volver a restituirlos al punto original, en el peor de los mismos. Incluso podemos justificarnos como docentes en el hecho de que se encuentren atornillados a suelo o paredes (figura 19)…

Figura 19.

Arrinconando. Fotoensayo compuesto por dos fotografías digitales de la autora al aula de música de la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 11 de enero de 2013. 64


Sin embargo desde el punto de vista del alumnado las condiciones del aula pueden ser inadecuadas para el aprendizaje, como relatan estos estudiantes de Máster de secundaria: Básicamente los aspectos más negativos se corresponden con la dificultad en la realización de ciertas actividades en el aula, debido a la distribución del equipamiento del aula con sillas y mesas ancladas al suelo, que impedían en ocasiones la interacción entre los compañeros en actividades cuyo principal objetivo era el movimiento y la interacción (Alu 14). (Carrasco y Giner, 2011, p.123)

Pero ¿quién decidió que era mejor que el mobiliario fuera inamovible?, ¿según qué criterios se diseñó? También es cierto que existen aulas con mobiliario concebido para ser plegado o arrinconado. Tenemos ejemplos versátiles en inventos más recientes, como la pizarra digital que puede ser atornillada a pared o tener patas con ruedas, sin embargo una mesa con ruedas y frenos en clase sería un “rara avis”. En cualquier caso a más de uno le viene fenomenal este impedimento a la movilidad. Incluso nos atrevemos a refrendar ¡que es preferible por la seguridad del alumnado! Apostamos por que el aula sea un espacio dinámico y adaptable a nuestras necesidades donde mesas y sillas deben moverse para obtener espacios libres, escenarios, barricadas, pasillos… Sin embargo existen otras soluciones muy inteligentes, aulas que independientemente de su tamaño se distribuyen a su vez en sub-espacios, favoreciendo que las personas según las necesidades de aprendizaje dispongan de ubicaciones más cómodas para cada actividad. Resultando una de las mejores soluciones y alternativas a la problemática de disponer de un aula versátil que posibilite mover continuamente el mobiliario (figura 20). Es frecuente encontrarse con edificios y aulas universitarias españolas de reciente construcción que, habiendo realizado un esfuerzo meritorio en modernos diseños, iluminación, espacios, etc., siguen manteniendo una estructura rígida de los asientos, bien en bancos corridos, bien con sillas y mesas independientes pero en un número muy elevado en proporción al tamaño de la sala de manera que es muy difícil si no imposible poder moverlas para cambiar su posición.Esta estructura fija de asientos que he observado en algunas Facultades siguen las características tradicionales de la enseñanza frontal: La dirección de los asientos se orientan en dirección única donde suele estar colocada una pantalla, pizarra y mesa del docente, la interacción intersujetos es pobre por la sencilla razón de que se dan la

espalda entre si y a la hora de un intercambio compartido las miradas se dirigen a la persona -profesor/ a- que observa las caras. (Escribano González, 1995, p.96) 65


Figura 20. Versatilidad. Fotoensayo compuesto por fotografía de la autora y cita visual literal. Arriba, sesión con alumnos de Expresión Plástica de Magisterio, en la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 30 de septiembre de

2011. Abajo imagen de la serie televisiva infantil “El maravilloso mundo de Gumball” extraída de http:// es.gumball.wikia.com/wiki/La_Entrometida/Galería el 19 de mayo de 2014. 66


Nos referimos a estancias que albergan por un lado una zona diáfana y otra donde sentarse. O bien a aulas que recogen hasta diez zonas diferenciadas en menos de 60m2, en una honrosa demostración de organización espacial: rincón de asamblea con suelo enmoquetado o acojinado, rincón de apoyo (donde se producen enseñanzas por un maestro que visita puntualmente el aula), zona de juegos, zonas de acopio de materiales, zona de almacenado de trabajos, zona tecnológica, espacio de pupitres y sillas, espacio del maestro, espacio para abrigos, mochilas y tazas (figuras 21 y 22).

Figura 21. Fotografía independiente. Sesión con alumnos del Máster universitario en profesorado de educación secundaria

(obligatoria, bachillerato y formación profesional) y enseñanzas artísticas, de idiomas y deportivas, en la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 25 de marzo de 2013. 67


Figura 22.

Aula infantil. Fotoensayo compuesto a partir de dos fotografías digitales de la autora al aula de infantil de 5 años del C.E.I.P José Carlos Aguilera de Alicante, el 16 de abril de 2013. 68


Nos movemos de aula o fuera del aula Cuando las posibilidades de desplazamiento de cualquiera o de todos estos elementos son limitadísimas, y esto ocurre con excesiva frecuencia, especialmente desde la perspectiva del profesorado, se puede recurrir a otras alternativas. Es necesario empatizar con el docente que dependiendo de la edad del alumnado deberá afrontar a solas la dirección y ejecución de todos los movimientos. Sugerimos escapar de los condicionantes del aula e impartir docencia en otros espacios como patios o aulas multiusos, salas de exposiciones, en la entrada a un museo, en un yacimiento arqueológico, en una pinada, a la orilla de la playa o a la entrada del edificio. Aludiendo a la influencia de la cognición situada, cuando este concepto abarca también la conciencia de que se aprende de diferente manera según dónde nos encontremos, cuando se escoge adecuadamente el emplazamiento en relación con las enseñanzas y con las experiencias vitales del individuo (figuras 23, 24 y 25).

Figura 23.

Fotografía independiente. Alumnas de Expresión Plástica de la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 27 de noviembre de 2009. 69


Figura 24.

Exteriores. Fotoensayo compuesto por dos fotograf铆as digitales de la autora a alumnado de Expresi贸n Pl谩stica de la Facultad de Educaci贸n de la Universidad de Alicante, el 4 y 11 de noviembre de 2011. 70


71


Figura 25. Filas. Fotoensayo compuesto por una fotografía de la autora y una cita visual literal. Arriba, fotografía de alumnado de Expresión Plástica de la Facultad de Educación de la Universidad de Alicante, el 4 y 11 de noviembre de 2011.

Abajo, imagen de la serie televisiva juvenil i-Carly extraída de http://4.bp.blogspot.com/-TihCAanePIk/TZxmWUki3LI/ AAAAAAAABgY/fn4Baj-P3l0/s1600/allfive.png el 17 de abril de 2013. 72


En ocasiones lo más sencillo es desplazarnos a otras aulas que reúnan las condiciones necesarias, si están libres y el centro educativo lo permite, donde la distribución espacial es la adecuada para los procesos de aprendizaje.

Conclusiones Las aulas, donde se desarrollan aprendizajes artísticos, manifiestan una tendencia a una organización espacial variada, que se adapta a las necesidades de enseñanza modificando las estructuras de forma flexible. Este modelo podría ser importado por otras disciplinas que convencionalmente recurren a disposiciones más rígidas. Se visibilizan factores que forman parte del marco del currículo oculto, que se definen según las relaciones pedagógicas entre estudiantes y con el profesorado, como: recursos, materiales, mobiliario, disposiciones y organización áulica. Que puedan existir diferencias visuales significativas entre las aulas de infantil, primaria, secundaria y universidad, en cuanto a lo referente a la organización espacial, no implica necesariamente que sea preciso mantener esas asociaciones entre estructuras de organización del aula y ámbitos educativos. Al visibilizar patrones espaciales se ha facilitado la reflexión a cerca de: El modelo de enseñanza del profesor y el tipo de organización física del aula propuesto por el mismo. Los flujos de comunicación y direccionalidad que el profesorado genera con las distintas disposiciones espaciales. Las actitudes que se fomentan en el proceso de aprendizaje en función del diseño del espacio áulico.

Algunos convencionalismos que perpetúan estereotipos en la distribución espacial asociados a determinadas materias. 73


Referencias Acaso, M. (2006). Esto no son las Torres Gemelas. Cómo aprender a leer la televisión y otras imágenes. Madrid. Los Libros de la Catarata. Carrasco, V. & Giner, A. (2011). Investigación evaluativa de una experiencia de enseñanza-aprendizaje en el Máster de formación del profesorado de educación Secundaria. Enseñanza & Teaching, 29(1), 111-133. Doménech, F. & Gómez, A. (2003). Las creencias psicopedagógicas de los futuros profesores de secundaria y su relación con las demandas de examen y con la organización espacial de la clase. Revista de Investigación Educativa, 21 (2), 489-505. Duncum, P. (2001). Visual culture: Developments, definitions, and directions for art education. Studies in Art Education 42(2), 101-154. Eisner, W. E. (2003). Questionable assumptions about schooling. Phi Delta Kappan 84 (9), 648-657. Recuperado de http://paws.wcu.edu/churley/9_1_eisner.pdf

Eisner, W. E. & Barone, T. (2006). Arts-Based Educational Research. En J. L. Green, G. Camilli y P. B. Elmore (Eds.), Handbook of complementary methods in education research (pp. 95-109). Mahwah, New Jersey: AERA. Escribano González, A. (1995). Aprendizaje cooperativo y autónomo en la enseñanza universitaria. Enseñanza & Teaching, 13, 89-102. Gary, J. (2004). Modelos para la comprensión de las biografías del profesorado en formación y en sus primeros años de docencia. En I. Goodson (Ed.), Historias de vida del profesorado (pp. 149-206). Octaedro. (Ed. Orig. 1992). Hersey, P., Blanchard, K. H., & Johnson, D. E. (1998). Administración del comportamiento organizacional. Liderazgo situacional. México: Prentice Hall Hispanoamericana. Johnson, D., Johnson, J. & Holubec, E. (1999). El aprendizaje cooperativo en el aula. Barcelona: Paidós. Legaspi, V. (2013). “Cuestión de educación”. Salvados. La sexta. Dirección y producción ejecutiva: Jordi Évole y Ramón Lara, Dirección y producción: Vanesa Legaspi, Delegado de contenidos: Carlos Recio, Productor delegado: Carlos Gómez Palacios. Recuperado de www.lasexta.com Llorens Rubio, J. I. (2011). El concepto de espacio público contemporáneo. Una aproximación para la Educación

Artística. Proyecto Final de Máster en Investigación en Didácticas Específicas de las Artes Plásticas y Visuales de la Universidad de Valencia, dirigido por Ricard Huerta. 74


Submergir-se entre escolas e museus: perspetivas críticas Resumo Marta Ornelas Investigadora

em

Pedagogias

Culturais,

Este texto visa dar conta da participação da

em

Associação de Professores de Expressão e

doutoramento na Universidade de Barcelona. Foi

Comunicação

professora de Artes Visuais no ensino secundário

“Innovative

e no ensino superior. É licenciada em Design de

Strategies” (ITEMS) (2010-2012), no que respeita

Comunicação e Mestre em Museologia. É membro

às atividades que dinamizou no âmbito do mesmo

da direção da Associação de Professores de

e às reflexões que se tornaram possíveis, sobre a

Expressão e Comunicação Visual e fundadora da

relação entre escolas e museus em Portugal.

Acesso Cultura. É membro da International

Apesar

Society for Education through Art, da Rede Ibero-

descoberto que as relações entre os profissionais

Americana de Educação Artística e do Group for

da educação (professores) e os profissionais dos

Education in Museums.

serviços educativos de museus (mediadores/

martasobralornelas@gmail.com

educadores)

de,

Visual

Teaching

num

não

(APECV) for

European

primeiro

eram

no

estudo,

fáceis,

projeto Museum

termos

encontrámos,

também, sinais de boas práticas e, sobretudo,

Teresa Eça

vontade de realizar projetos em conjunto. O

Professora de artes visuais no ensino secundário.

projeto ITEMS, para a APECV, foi um ponto de

Investigadora do Núcleo de Educação Artística do

partida para a tomada de consciência das grandes

Instituto de Investigação em Arte, Design e

possibilidades pedagógicas que podem existir nos

Sociedade da Faculdade de Belas Artes da

museus respeitando as diferentes funções e

Universidade do Porto desde 2011. Presidente da

propósitos das instituições. Embora tenhamos

International Society for Education through Art, de

tomado consciência de que existe desigualdade

2014 a 2017. Presidente da Associação de

na relação dos museus com as escolas e de que a

Professores de Expressão e Comunicação Visual,

escola se encontra demasiado voltada para os

de 2008 a 2016. Diretora do Centro de Formação

programas escolares, relacionando-se pouco com

de Professores Almada Negreiros. Artista plástica.

o exterior, os estudos e discussões do projeto .

teresatorreseca@gmail.com

ITEMS permitiram concluir que os serviços 75


educativos dos museus e os professores têm muitos objetivos em comum e que podem criar sinergias que desafiam rotinas e preconceitos. Apresentamos caso de relevo, como o “Projeto 10x10”, da

Fundação

Calouste

Gulbenkian,

através do Programa Educação para a Cultura e Ciência, e o programa educativo do Museu das

Palavras chave:

Comunicações, que superaram constrangimentos

submergir-se; museus; educação; arte; cultura; pa-

na relação que estabeleceram com as escolas e

trimónio; educação museal; educação cultural; edu-

no comprometimento com as comunidades locais.

cação para a cidadania; educação patrimonial

Passagens Diálogo entre escolas e museus. O espaço "Entre” oculto que se transmite pela arquitetura, o modo As razões pelas quais se frequentam os museus

como as peças estão colocadas, o modo como os

podem

categorias

diferentes serviços do museu estão distribuídos e

lúdicos,

o modo como os agentes educativos do museu os

educativos ou reverenciais (Graburn 1977; Falk e

recebem. Muitos autores se têm debruçado sobre

Dierking 1992). As pessoas visitam os museus e

o papel da experiência museal nas vidas dos

têm

visitantes

ser

alargadas

organizadas que

experiências

segundo

integram

facetadas

aspetos

e

únicas

que

(Chang,

2006;

Csikszentmihalyi

e

dependem de fatores como o contexto pessoal, o

Hermanson, 1999; Falk e Dierking, 1992; Hein,

contexto social e o contexto ambiental ou físico

1998; Hennes, 2002; Hooper-Greenhill, 1994). A

próprio do lugar (Lee, 2010). Os alunos aprendem

nós interessa-nos sobretudo a experiência no

no museu, tal como nas escolas a partir de uma

museu dentro de contextos escolares e essas

agenda explícita e de uma agenda menos explícita

experiências são duplamente mediadas: pelo

(Acaso, 2011a). Aprendem através das suas

professor ou professores que organizam as visitas

vivências nos museus, a partir de um currículo

em funções de interesses escolares e pelo

explícito que os curadores e serviços educativos

mediador/educador do museu que oferece uma

transmitem baseados nas coleções ou exposições

orientação para a visita dentro das finalidades e

do museu e também a partir do seu currículo

programa educativo do museu. 76


Este artigo surgiu como uma necessidade de

em Cascais, e após a conclusão do projeto

reflexão após a conclusão do projeto “Innovative

europeu um seminário no Museu de Serralves, no

Teaching

Porto.

for

European

Museum

Strategies” (ITEMS), financiado pelo programa

O projeto ITEMS, para a APECV, foi um ponto de

Leonardo da Vinci, através da agência portuguesa

partida para a tomada de consciência das grandes

Programa de Aprendizagem ao Longo da Vida,

possibilidades pedagógicas que podem existir nos

projeto no qual as autoras participaram como

museus respeitando as diferentes funções e

membros da Associação de Professores de

propósitos das instituições. Serviu para sentir que

Expressão e Comunicação Visual (APECV). O

os

projeto, realizado entre 2010 e 2012, foi liderado

professores têm muitos objetivos em comum e que

por Irene Baldriga, da Associazione Nazionale

podem criar sinergias que desafiam rotinas e

Insegnanti di Storia dell'Arte (ANISA, Itália) e teve

preconceitos. Durante dois anos pesquisámos as

como parceiro coordenador o Centro Europeo per

relações entre algumas escolas e alguns museus

l'Organizzazione

Culturale

em Portugal. Criámos grupos de debate e,

seguintes

sobretudo,

(ECCOM,

Itália).

e

il

Teve

Management

ainda

os

serviços

educativos

criámos

espaços

e

relacionais

vislumbrar que a colaboração é possível e que se

Histoire de l'Art (INHA, França), a Associação de

podem encontrar lugares de passagem entre

Professores de Expressão e Comunicação Visual

muros. Os serviços educativos dos museus e/ou

(APECV, Portugal) e a associação cultural letã

de instituições culturais e patrimoniais e as

TRIS KRASAS. O foco do projeto incidiu sobre o

escolas têm em comum finalidades educativas, os

diálogo entre Escolas e Museus com recurso a

primeiros no âmbito não formal e os segundos no

tecnologias digitais. Para além de ter sido feita

contexto da educação formal, mas ao mesmo

uma listagem de práticas de alguns serviços

tempo têm muros demasiado pesados que cercam

educativos de museus nos países participantes,

muitas vezes as suas práticas e impedem um

foram também realizadas oficinas de formação,

diálogo recíproco. Nesses muros existem, no

visitas a museus e escolas e seminários para

entanto,

professores. Em Portugal foi realizado durante o

inventivas de diálogo e de colaboração que dentro

projeto um seminário no Museu Coleção Berardo,

das respetivas instituições não costumam ocorrer

passagens,

foi

nas

Design Budapest (Hungria), o Institut National d'

algumas

onde

os

brechas

77

instituições

museus

parceiros: a Moholy-Nagy University of Art and

em Lisboa, e na Casa das Histórias Paula Rego,

das

dos

possível

possibilidades

por demasiados constrangimentos burocráticos e/


ou rotineiros. Nesse sentido, o projeto ITEMS em

jogos; leituras; representações dramáticas; e

Portugal criou essas passagens, tal como Maria

concursos de trabalhos escolares em áreas

Jesus Agra-Pardinãs, da Universidade de Santiago

diversas.

de Compostela, tão bem explicou no seminário

também que há museus que têm tido um papel

realizado em outubro de 2012 no Porto, em

pioneiro relativamente às atividades que se

Portugal:

propõem realizar com as escolas. Apresentamos

instersticios

a

instituciones

y

establecidos

no

huecos

los

que

los llegan.

compreender

dinamizado visitas lúdico-pedagógicas, aulas no

se ubican “entre” los museos y las los

permitiu

Contemporânea Graça Morais, em Bragança, tem

espacios de creación-educación que en

estudo

em seguida alguns exemplos. O Centro de Arte

Hay que buscar buscar nuevos

escuelas,

Este

museu e encontros públicos de conversação com

o

artistas. A programação do Museu Coleção

las

Berardo destaca-se pelo número de atividades

sistemas

disponíveis para o público escolar, variando entre

(Agra-

os percursos expositivos temáticos,

Pardinãs, 2012)

debates,

jogos, oficinas e projetos de continuidade iniciados

2. ESCOLAS E MUSEUS EM PORTUGAL:

no museu e posteriormente desenvolvidos ao

RELAÇÕES DIFÍCEIS

longo do ano lectivo (figura 1).

O estudo permitiu compreender que o público escolar constitui a esmagadora maioria dos visitantes dos museus portugueses, por isso os museus propõem um conjunto de atividades

especificamente

direcionadas

às

escolas,

normalmente delineadas num plano anual. Entre essas atividades, encontramos: visitas guiadas, a maior parte com percursos e discursos adaptados aos

vários

complementadas

níveis com

de textos

ensino;

visitas

pedagógicos

e

atividades práticas de caráter lúdico-pedagógico, Figura 1.

como oficinas e ateliers de expressão plástica; atividades sobre dias comemorativos; concertos;

Visita escolar ao Museu Coleção Berardo(2013).

78


A programação educativa da Fundação Calouste Gulbenkian,

em

Lisboa,

tem

apresentado

propostas muito válidas para o desenvolvimento de projetos com jovens em idade escolar, bem como um projeto recente que envolve artistas nas

escolas,

conforme

teremos

oportunidade

Figura 2. Apresentação do Projeto Educativo do Museu das Comunicações (2013).

de

explicar mais adiante neste texto. O Museu de

Os objetivos que os museus pretendem atingir

Serralves, no Porto, tem vindo a desenvolver, ao

com as atividades direcionadas para as escolas

longo de vários anos, "Projetos com Escolas",

são, na generalidade, os seguintes: a divulgação

projetos anuais que juntando professores, alunos

das coleções, tendo em conta as necessidades e

e educadores de museus em trabalhos conjuntos

os interesses dos públicos; a promoção de uma

resultam

são

atitude de formação cívica face ao património; a

expostas no museu no final de cada ano escolar.

criação de relações de empatia entre o museu e o

Um outro museu que merece destaque é o Museu

público escolar; a promoção do debate e da troca

das Comunicações, em Lisboa, cujos projetos

de reflexões, numa atitude de aproximação lúdica,

educativos refletem a dinâmica gerada com as

pedagógica

escolas, nomeadamente através de reuniões com

democratização da cultura em experiências que

professores, para que juntos contribuam para um

pretendem

projeto mais rico e envolvente, como teremos

integrada (sobretudo por parte dos museus

oportunidade também de explicar mais à frente

municipais); a promoção do contacto direto com as

em

produções

neste texto (figura 2).

artísticas

que

79

e

experimental

acolher

os

às

visitantes

coleções; de

a

forma

artes, chegando a apoiar as escolas em relações


de parceria.As dificuldades relativas à conjugação

promover o contacto de alunos com as coleções

dos procedimentos entre as escolas e os museus,

de museus, superando uma longa lista de

devem-se sobretudo ao facto de os discursos e

constrangimentos, de forma voluntária e sem

agendas destes e das escolas serem muito

qualquer recompensa profissional..

diferentes. Muitas escolas voltam-se apenas para projetos internos, pouco abertos à relação com os

3. DESIGUALDADE ENTRE ESCOLAS E MUSEUS Uma grande parte dos museus portugueses

museus, porque se deparam com processos

mantem

burocráticos

desigualdade,

muitas

vezes

demovedores

da

com

as

escolas

apesar

de

uma

relação

existirem

de

projetos

realização de atividades externas, para além de

pontuais bem sucedidos. 20% dos professores diz

não criarem meios ativos de circulação de

que os museus não entendem o funcionamento

informação. Como o transporte entre as escolas e

das escolas, 14% considera que tem dificuldades

os museus é dispendioso, as escolas tentam

em fazer contactos com os museus, 10% crê que

rentabilizar os recursos de que dispõem, pelo que

os museus têm um discurso desadequado e

muitas vezes levam aos museus um número de

defraudam expectativas e 4% chega a acreditar

alunos excessivo e tempo demasiado limitado, o

que os museus não estão interessados na

que resulta na quebra da motivação dos alunos

aproximação com o público escolar (Ornelas,

para as visitas e num consequente decréscimo da

2012). Uma relação justa entre duas partes -

qualidade das mesmas. Verificámos que este

escola e museu - pressupõe que ambas estejam

último fator aqui descrito é também um problema

em igualdade, o que não acontece em Portugal:

frequente noutros países que fizeram parte do

regra geral, à exceção de projetos pontuais, a

projeto, pelo que seria benéfico podermos pensar

escola vai ao museu, mas o museu não vai à

conjuntamente em ações concretas que pudessem

escola. Por isso, a relação entre estas duas

aliviar este problema. Pensamos que, em Portugal,

instituições é uma relação de poder desnivelada e,

os museus deveriam optar por uma prática mais

portanto, desigual, embora noutros países seja

recorrente de chegar às escolas, pois encontram-

possível

se demasiado fechados sobre si mesmos. Muitos

deslocações dos museus às escolas são comuns,

museus têm dificuldades de cariz financeiro e

como por exemplo em Espanha (Garaigorta, 2012;

escassez de recursos humanos, o que os impede

Hernández, 2013). Em Portugal, o museu mostra a

de realizarem projetos mais ambiciosos. Apesar

sua casa, mas não parece ter interesse em

das dificuldades, muitos professores continuam a

80

encontrar

projetos

nos

quais

as

conhecer a casa de quem o visita, porque também


a escola crê que nada terá para lhe ensinar. Para os museus, o conhecimento de que os professores

Noutro registo de relação desigual entre estas

possam ser detentores é anulado porque não é

duas

reconhecido como verdade. O mito da verdade

profissionais

seja verdadeiro no sentido estrito da palavra

assistirmos

a

de

museus

falam

para

uma

assistência composta por profissionais de museus

porque os critérios com que decidimos o que é

e, muitas vezes sobretudo, para professores,

verdadeiro ou falso depende de nós (Ibañez,

enquanto o contrário não se verifica: o museu fala,

2001). Os micro-relatos dos professores deviam

a escola escuta. Raramente estes eventos deixam

ser tidos em conta nestes processos precisamente

tempos para debates, marcando uma posição de

pela mesma razão pela qual são excluídos: a

que apenas uns podem aprender com os outros e

subjetividade que lhes é inerente. Será mais

nunca o contrário.

producente que o museu eduque a partir dos

experiências

comum

sobre a temática museus e educação onde

pós-modernistas, assumindo que não há nada que

as

é

conferências, seminários e ações de formação

universal e absoluta é desmontado pelas práticas

micro-relatos,

instituições,

Muitos dos professores de artes visuais são

pessoais,

artistas, mas nunca são lembrados como tal pelo

subjetivas, atravessando os formatos que se

museu,

pretendem eruditos (Juanola, apud Padró, 2011).

sendo

educadores

No entanto, o museu adota um tipo de discurso

de

comum museus

nos

discursos

durante

as

dos visitas

recorrerem a expressões como "a intenção deste

resolvido, direcionado, que exclui os restantes:

artista" e, mais adiante, "a vossa professora já vos deve ter explicado...", na ideia de que a professora

Por mais neutral que seja um museu, um

é a que ensina e o artista é o que tem direito a

educador,

website

estar no museu. Aliás, até mesmo a escola

qualquer que seja, sempre se transmitirá

contribui para acabar com a artista que há em

algo. Até o famoso CUBO BRANCO que

cada professora que o fora antes de ser

todos os museus têm incorporado como

professora, dando a entender que não se pode ser

sistema de decoração aparentemente

as duas coisas ao mesmo tempo, como ilustra a

neutra,

num

frase que pode ler-se num relatório conjunto do

conceito de classe vinculado a uma

Ministério da Educação e do Ministério da Cultura,

um

acabou

folheto,

um

convertendo-se

classe alta cultural... (Acaso, 2011b)

81

quando ainda eram organismos separados:


nem sempre está vocacionado para mais do que Em Portugal, não há notícia de ter

explicar a história da arte ou o processo criativo do

havido (...) presença de artistas no

artista, sempre com muitas regras explicadas

meio escolar, apesar de terem

antes do início da visita: "não se pode tocar", "não

existido

se pode tirar fotografias", "não se pode falar alto",

ou

experiências

ainda pontuais

subsistirem a

"não se pode transportar mochilas", "não se pode

presença do professor na escola é

comer", "garrafas de água não podem entrar", "não

indispensável, a do artista, não é.

se pode ouvir phones", "não se pode aproximar

(Xavier, 2004)

demasiado das obras". Ainda antes de iniciarmos a

Desta forma, reserva-se o lugar

(...)

de artista

visita, o Museu é já um lugar onde "não se pode",

(maioritariamente uma figura masculina) para o

um lugar de proibições que espera de nós,

que expõe no Museu, e o lugar de professora

visitantes,

(maioritariamente uma figura feminina) para a que

representação do visitante ideal (Padró, 2011). O

ensina na Escola.

controlo da disciplina vai sendo lembrado de vez

Por outro lado, nas visitas chamadas "de estudo" a

em quando com "Chiu!", por parte dos professores

museus, a escola arrasta consigo, muitas vezes,

aos seus alunos.

exigências demasiado centradas nos regimes de

Os textos das exposições são muitas vezes

avaliação dos alunos. Os professores, quando

escritos

levam as suas turmas a museus, não raramente

contendo inúmeras referências a movimentos

lhes pedem que façam um trabalho de pesquisa ou

artísticos da História da Arte e um vocabulário

que preencham uma ficha, em casa ou até mesmo

sofisticado, incompreensível para a maioria dos

no local da visita que "conta para nota". Estas

visitantes a quem resta a contemplação das obras,

estratégias estão muitas vezes desligadas da

crendo no que está exposto e situando-se nos

construção de conhecimento e muito mais se

mesmos valores e conhecimento dos comissários,

identificam

disciplina

sem lugar à subjetividade, como um poderoso

comportamental e, neste sentido, os alunos

veículo para definir a posição relativa que ocupam

tendem a considerar a visita como uma extensão

os indivíduos dentro da sua comunidade (Duncan,

da escola.

1995).

O museu tem o poder de proporcionar um olhar

As visitas guiadas não são de todo dialógicas.

com

o

controlo

da

sobre o mundo que rodeia os estudantes, mas 82

um

em

comportamento-tipo,

linguagem

demasiado

Parece haver uma tentativa, por parte dos

a

técnica,


monitores/educadores de museus, de criar um

as exigências de cumprimento dos programas

diálogo com os alunos com lugar à subjetividade,

escolares, é, para muitos alunos um local de

mas o objetivo final é o de os fazer levar a

aborrecimento onde não existe prazer e poucas

respostas que já estão previamente determinadas,

vezes consegue relacionar-se com o exterior de

sendo que as subjetividades, os micro-relatos

modo

criados pelos alunos, acabam por não servir ao

desenvolvimento de projetos que lhes interessem.

discurso final.

É esta realidade que tem de mudar. Os projetos

Para que se altere esta realidade na relação entre

conjuntos entre escola e museu, partindo de uma

a escola e o museu, o desafio seria, em primeiro

posição igualitária, democrática e com lugar à

lugar, o de torná-la mais igualitária. Partindo de

subjetividade, podem ser a chave para que se

uma posição igualitária poderíamos passar a um

consiga alterar o paradigma educativo nestas duas

trabalho conjunto para desmontar a relação de

instituições..

a

implicar

os

estudantes

no

poder que existe, tanto num como no outro

4. CONSTRUIR PONTES

contexto, entre os que ensinam e os que

No primeiro seminário que foi realizado pela

aprendem, criando espaços para que todos

APECV em Portugal, de 20 a 22 de fevereiro de

possam ter uma voz ativa de forma democrática,

2012, no Museu Coleção Berardo, em Lisboa, e na

aceitando

Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais,

a

subjetividade

de

todos

os

intervenientes, que passam a ser visíveis.

juntaram-se pessoas interessadas em iniciar

Alguns dos professores inquiridos durante o

diálogos entre escolas e museus, técnicos de

estudo elaborado para o projeto ITEMS sugeriram

serviços educativos de museus, de serviços

que tanto a escola como o museu poderiam ter

educativos de centros culturais, de sítios do

uma pessoa responsável por fazer a articulação

património público, assim como professores, na

entre as duas instituições e que isso facilitaria o

sua maioria professores de artes.

processo (Ornelas, 2012), mas é importante que,

Foi nosso interesse criar pontes, embora durante

tanto a escola como o museu, tenham como meta

as discussões que se foram tendo ao largo dos

pedagógica o pensamento crítico e para isso é

dois dias se tivesse constatado que as pontes por

necessário que todas as ações que levem a cabo

si só não são suficientes, muitas vezes as pontes

tenham

dos

existem, mas não são exploradas. Quisemos

participantes da ação educativa (Acaso, 2009). A

também trazer testemunhos de outros países.

repercussões

na

vida

escola, voltada para os currículos e para

real

83

Nesse evento, Georgia Kakourou Chroni, da .


Galeria de Arte Coumantaros, do Museu Nacional

descreveu a experiência da Casa M, uma casa

de Esparta, na Grécia, partilhou as metodologias

comunitária

utilizadas nesse museu em trabalhos de projeto com públicos escolares adolescentes A experiência da Galeria de arte Coumantaros mostrou-nos como é possível criar programas educativos onde escolas, curadores e técnicos dos serviços educativos dos

criada

para

que

a

comunidade

desenvolvesse autonomamente atividades artísticoculturais dentro do âmbito da mesma bienal.

Cristina

Gameiro,

coordenadora

do

Serviço

Educativo do Museu Berardo apresentou-nos uma proposta de visita disponível para as escolas que

museus dialogam e constroem um programa comum de

tem como título "A primeira vez num museu de arte

aprendizagem e de intervenção comunitária envolvendo

contemporânea", tendo em conta que uma parte

atores da educação, do museu, dos media e da cidade,

importante do público escolar que visita aquele

englobando atividades interdisciplinares onde diferentes

museu

artes jogam papéis questionadores para provocar a

contemporânea, numa perspetiva de dar resposta

procura de conhecimento e ação nos públicos jovens.

a questões como a aparente compreensão do

Já dentro do panorama português, Susana Gomes da Silva introduziu, também nesse evento, o excelente programa

dos

serviços

educativos

da

Fundação

Gulbenkian, com especial destaque para o projeto “Heróis e Vilões”, que visou o desenvolvimento da

nunca

visitou

um

museu

de

arte

público perante a arte antiga e a barreira que deve ser desmontada entre o público e a arte que é do

nosso tempo. No seguimento do tema das tecnologias digitais abordado pelo projeto ITEMS,

autoestima a partir do autorretrato com jovens em risco

os mediadores/educadores do Museu Coleção

que apresentavam altos índices de desmotivação e

Berardo exemplificaram como se pode fazer uma

insucesso escolar. Ainda nesse evento foi-nos dado a

visita ao museu com recurso a um equipamento

conhecer, por Leena Hannula, como os serviços

digital para a realização de uma atividade prática,

educativos do Sinebrychoff Art Museum, em Helsínquia,

essencialmente dedicada a crianças e jovens:

na Finlândia, desenvolvem estratégias específicas para

cada participante levou consigo um dispositivo

públicos escolares em conjunto com os professores, dando oportunidade aos visitantes da escola de sentir o espaço do museu como espaço habitável, performático e transformável. Foi também interessante ouvir Estêvão Haeser descrever como na Bienal da Mercosul, em

tradicionalmente destinado a jogos digitais, uma consola Nintendo DS, com o qual foi possível tirar fotografias

e

transformá-las

em

produções

artísticas através do software Art Academy,

Porto Alegre, no Brasil, os projetos pedagógicos se

atividade que foi complementada com a realização

focam

materiais

de um trabalho artístico conjunto, utilizando meios

didáticos sobre os artistas da bienal para os professores

analógicos. Assim, o objetivo desta atividade tem

na

necessidade

de

desenvolver

e escolas, da mesma cidade e país. Michele Zgiet

84 sido criar situações de aprendizagem lúdico-


pedagógicas, desenvolvendo maneiras diferentes

de explorar as obras de arte (figura 3).

qual o impacto das atividades experimentadas no museu na aprendizagem escolar?

como é avaliado esse impacto?

até que ponto as novas tecnologias modificam as praticas? Se é que modificam.

5. ATRAVESSAR PONTES O seminário “Atravessar Pontes entre Escolas e Museus” realizou-se na Fundação de Serralves, de 12 a 14 de outubro de 2012, com um grupo de

Figura 3. Grupo escolar em atividade no Museu Coleção

Berardo,

utilizando

cerca de 120 participantes que eram sobretudo

consolas

Nintendo (2015)

professores, profissionais de museus e de outras

Os debates na audiência deste seminário foram

instituições sociais e culturais e/ou investigadores,

acesos e deram-nos pistas para questionarmos as

de Portugal e do Brasil. A pergunta de partida para

práticas por nós conhecidas e trouxeram algumas

os

guias de trabalho para o nosso estudo. A partir daí

foi:

“Como

professores

e

profissionais

começámos a equacionar a relação entre escolas

educativos

dos

e museus segundo estas perguntas que nos

aprendizagem

serviram de base para a organização do segundo

comunidade?”. As sessões de trabalho foram

seminário sobre o tema, em Portugal:

organizadas através dos seguintes eixos:

o planeamento das atividades de

envolve elementos das duas organizações?

museus

através

dos

criar

das

educadores, serviços

espaços

artes

abertos

de à

práticas educativas promovidas por escolas práticas educativas promovidas por museus para as escolas;

que tipo de estratégias interdisciplinares e de

trabalho de equipa são mais eficazes? 

podem

em museus;

aprendizagem é feito separadamente ou 

debates

práticas educativas dinamizadas por escolas e museus na comunidade.

qual o papel e voz dos alunos e dos

professores nas atividades levadas a cabo nos museus? 85


Durante os três dias do evento, o Grupo C3 1

Durante o seminário descobrimos que as pontes

envolveu os participantes nas seguintes questões:

não servem para nada sem ninguém para

“Que papel tenho eu, hoje, no museu?”, “Que

atravessá-las. Tivemos plena consciência de que

papel quero ter no museu?” e finalmente “Museu/

temos que trabalhar em equipas multidisciplinares.

Escola: o que te sugere esta relação?”. As

Não são apenas os recursos materiais que fazem

respostas dos participantes apontaram sobretudo

os bons programas educativos, mas sim a

para o museu como espaço de imaginação, de

imaginação das pessoas que lá trabalham com

experimentação, de diálogo e de experiências. O

projetos, integrando matérias pluridisciplinares. Tal

seminário foi um espaço de discussão, de diálogo,

como foi demonstrado pela vasta trajetória dos

de encontro e de descoberta entre professores e

serviços educativos da Fundação de Serralves,

responsáveis

de

escola e museu funcionam num espaço de entre-

museus, das experiências levadas a cabo em

ação onde os papéis de professor, artista e

pequenos e grandes museus de Portugal e do

mediador cultural se conjugam e se esbatem.

Brasil. Das discussões durante o seminário foi

Tomámos

claro que se tomou consciência do espaço entre a

estratégias baseadas em trabalhos de projeto para

escola e o museu como um entre-lugar onde se

as escolas no museu, respeitando as culturas

pode aceder a uma experiência híbrida. Falou-se

locais e subculturas geracionais.

da necessidade de criar hábitos de descoberta,

Muitas questões na relação entre escolas e

especialmente por crianças e adolescentes, para

museus prendem-se com a falta de articulação, a

que

equipamentos

falta de diálogo e a ausência de avaliação entre

culturais, sentindo que esses lugares também lhes

pares. Considerámos que é necessário ouvir o

pertencem. Dos diferentes casos apresentados

público, chamar o público a dizer o que pensa, o

durante o seminário, chegámos à conclusão de

que deseja. A perspetiva do educador ou do

que o museu pode e deve ser, também, um lugar

mediador é essencial, mas também é essencial o

de

que cada aluno, criança ou jovem tem para nos

cresçam

inserção

pelos

serviços

utilizando

social,

indo

estes

ao

educativos

encontro

das

necessidades da comunidade e nesse sentido

consciência

da

importância

de

dizer, para nos ensinar, educando-nos também.

muitos projetos com escolas podem ser feitos. 1 O grupo definia-se no cartaz de divulgação pela Internet como um corpo integrado por células ativas que pretendiam realizar ações para tornar a arte visível numa sociedade de pessoas em perigo de perder a sensibilidade e a capacidade de se emocionar. Afirmava-se como um compromisso social de teor subversivo buscando novas estratégias de criação e debate criando células ativas autónomas multigeográficas e interconectadas para lançar vírus artísticos. 86


Nas conclusões do seminário delineou-se que o

jovens. O projeto integrou a criação de narrativas

museu e as instituições culturais podem ser

plásticas e literárias na escola, subjacentes à

campos de relações abertas e diversificadas, com

temática “Arte como meio de comunicação”,

uma identidade muito própria e que em parceria

seguidas de produção de trabalhos plásticos e

com as escolas podem e devem desenvolver

literários que que culminou numa exposição

programas que provoquem nas crianças e nos

partilhada

jovens

e

amigos, bem como, com a generalidade dos seus

de

visitantes. Parece-nos que este tipo de abordagem

inquietações,

desconfortos,

numa

questionamentos

procura

diversificada

com

alguns

artistas,

familiares

e

privilegia a relação contínua do museu com o

alternativas para a compreensão do mundo.

público escolar, na medida em que instiga o

6. CASOS DE RELEVO Nesta secção descreveremos dois casos de

diálogo,

organizações culturais que, em Portugal, nos

institucional “sagrado” aos “leigos” ou “profanos”,

parecem dignos de relevo na relação que

permitindo que os alunos exponham trabalhos

estabelecem

escolares

com

as

escolas

e

no

abrindo

plásticos

as

fronteiras

e

literários

do

no

espaço

museu,

comprometimento com as comunidades locais: o

promovendo a valorização pessoal e social dos

“Projeto

Calouste

alunos e uma relação de partilha de saberes entre

Gulbenkian, através do Programa Gulbenkian

escola e museu. No “Projeto Interculturalidade”, o

Educação para a Cultura e Ciência, e o programa

museu iniciou uma relação bastante pioneira com

do Museu das Comunicações, ambos na cidade

a escola. No âmbito do Ano Europeu para o

de Lisboa.

Diálogo Intercultural, em 2008, um docente propôs

10x10”,

da

Fundação

6.1. Fundação Portuguesa das Comunicações

um projeto de cariz intercultural, com o objetivo de

espaço de diálogo na sociedade global

melhorar a aprendizagem da língua portuguesa

vasta

junto dos alunos de onze países diferentes,

experiência no trabalho com escolas, artistas e

incluindo Portugal. O trabalho contínuo versou o

comunidade local. Por exemplo, na exposição

fenómeno da interculturalidade e da comunicação,

comemorativa

Fundação

a partir do espólio filatélico do museu, que incluía

Portuguesa das Comunicações - “Por Entre as

artefactos das culturas de todos os países dos

Linhas” -, as obras de 10 artistas contemporâneos

alunos envolvidos. A partir do espólio, os alunos

portugueses permitiram explorar a arte como meio

partilharam os vários elementos caracterizadores

O

Museu

das

dos

Comunicações

10

anos

da

tem

de comunicação e aproximar a arte de públicos

87

da cultura do país de origem de cada um, tais


como, fauna, flora, literatura, artes plásticas e

um espaço de reflexão sobre temas que de facto

desporto; discutiram questões como liberdade

interessam

individual e o respeito do outro. Depois, através de

chamando as escolas para trazerem conhecimento

um processo de construção de um selo, cada

e

aluno deu o seu contributo. Na mesma linha de

construtor de saberes.

atuação,

a

Mas é com o projeto “Da Escola ao Museu e do

projeto

Museu ao Bairro” que o museu apresenta a sua

Estabeleceu

mais-valia como organização comprometida com a

parcerias com escolas e organizações locais,

identidade cultural do território onde se insere. O

pegando no repto lançado pela Comissão de

projeto realizado pela Fundação Portuguesa das

Proteção de Crianças e Jovens de Lisboa

Comunicações (FPC)/Museu das Comunicações

Ocidental, em 2010, com o objetivo de fortalecer a

(MC) em 2009, em parceria com alguns elementos

reflexão sobre os direitos das crianças.

da Comissão Social da Freguesia de Santos-o-

Com o projeto “As raparigas nas TIC”, o museu

Velho, onde o museu se situa, e escolas do bairro.

respondeu a uma iniciativa lançada pela União

O museu, enquanto membro da Comissão Social,

Internacional de Telecomunicações (UIT), com o

desafiou a comunidade da Madragoa a integrar o

objetivo de incentivar as jovens a escolher uma

projeto “Do museu ao bairro da Madragoa”. A

carreira

iniciativa

cidadania, “Conheces

promovendo o os

museu teus

profissional

a

educação

desenvolveu Direitos?”.

nas

para o

Tecnologias

de

à

mais-valias

foi

comunidade para

ao

um

onde debate

encontro

da

se

insere,

alargado

política

e

de

Informação e Comunicação (TIC). Resultou numa

aproximação do museu à comunidade onde está

exposição de trabalhos escolares - plásticos e

inserido, envolvendo também a participação das

multimédia - sobre a importância das novas

entidades vizinhas, cujos interesses convergem

tecnologias na vida das raparigas. Foi também

numa

realizada uma conferência com a participação de

enquanto foco de interesse cultural e turístico.

jovens mulheres profissionais de TIC, como

Foram parceiros, para além da FPC/MC e da Junta

oradoras, dirigida ao público escolar, com o

de Freguesia, o Museu da Água da EPAL, o

objetivo de estimular o seu interesse pelas

Museu da Marioneta, a Unidade de Projeto da

disciplinas científicas, tecnológicas e multimédia. É

Madragoa da Câmara Municipal de Lisboa, a

interessante notar como o museu está atento

Escola de Tecnologias Inovação e Criação, o

também

teatro A Barraca e as associações Centro de Inter

às

convocatórias

lançadas

por

política

de

valorização

da

Madragoa

Cultura Cidade e Etnia. Este conjunto de parcerias

organizações locais e ou humanitárias, construindo 88


atesta a vontade do museu em ser uma ponte, ou

ativa dos residentes. Existe um impacto real deste

um cruzamento de sinergias da região onde o

projeto no território e nos habitantes, que se pode

museu se insere, para o desenvolvimento local.

medir pela adesão do público à iniciativa. A

O resultado dos esforços conjuntos resultou na

explicação do sucesso da iniciativa reside numa

concretização de um conjunto de elementos,

aposta no valor do património como poderoso

como:

agente de transformação social promotor da

recolha de testemunhos dos moradores da

identidade e pertença. O processo pedagógico

Madragoa

pessoais

utilizado direcionou-se para a exploração da

subjacentes à temática do turismo (no bairro

memória a partir do património em sentido amplo:

e fora do bairro);

o território, a arquitetura secular religiosa e civil,

programação de uma exposição temporária

aristocrática e popular, os azulejos, os seus

com base na recolha dos objetos pessoais

habitantes no passado e os atuais, as profissões

dos moradores da Madragoa, que esteve

de ontem e de hoje, as festas, a gastronomia, as

patente de 17 de maio a 30 de julho de

canções, entre as quais o fado. Por outro lado, a

2009;

convergência dos moradores - de um bairro com

criação de uma rota/percurso turístico no

fracas condições sócio-económicas - para a

bairro da Madragoa, a iniciar no Museu das

receção aos visitantes orientando o percurso das

Comunicações,

vários

visitas à volta do património que lhes pertence,

parceiros, rotativamente e participada pelos

tem a função enriquecedora de os sensibilizar

moradores;

para a preservação do bairro enquanto elemento

realização de um filme documentário sobre

de identidade. Segundo os responsáveis pelo

as memórias das “viagens” na Madragoa,

programa,

que figurou na exposição e,ainda hoje, é

comunidade nestas dinâmicas gera um sentido de

apresentado ao início de cada saída dos

pertença e de partilha que poderá ajudar a

grupos de visitantes para o bairro.

ultrapassar certos estigmas de condicionamento

sobre

memórias

monitorizada

por

a

participação

dos

membros

da

Este projeto de valorização do bairro enquanto

social e económico.

pólo de atração cultural e turístico mantém-se,

Para os dinamizadores foi um exercício que os

com

desafiou a partilhar, a criar e a desenvolver afetos

uma

programação

de

visitas

guiadas

construindo

organizadas sazonalmente e asseguradas nos termos iniciais, em parceria e com participação .

89

a

sua

identidade

num

globalizado, solidificando o seu sentido de

mundo


pertença a um determinado território e construindo

professores

relações afetivas que são a base de trabalho para

pedagógica, envolvendo-os em processos de

futuros

patrimonial

reflexão e experimentação que estimulem a

recíproca, da Secretaria de Estado da Cultura e da

inovação e a qualidade de ensino em contextos

comunidade local. No projeto, o museu fomenta a

formais,

educação patrimonial procurando reforçar o papel

cruzamento das disciplinas curriculares com as

educativo

aos

práticas artísticas.

que

Este

projetos

da

professores

de

valorização

escola

e

seus

proporcionando alunos

atividades

e

artistas

apostando

projeto

no

procurou

com

potencial

encontrar

experiência

criativo

resposta

do

a

promovem a exploração do património cultural. No

algumas questões que há muito preocupam os

processo pedagógico, o museu apela para aspetos

professores e os especialistas em educação, sobre

como

a

a

sensibilização

para

a

pesquisa,

relação

dos

preservação e comunicação que despertem no

nomeadamente:

grupo

escolar

a

partilha

de

conceitos,

alunos

com

a

escola,

como motivar e captar a atenção e o

conhecimentos e a construção de um “mapa”

interesse dos alunos pelos temas e matérias

patrimonial.

escolares?

Escolhemos este caso porque estamos em crer

como explorar novas ferramentas de forma a

que as suas atividades valorizam o museu na

tornar a informação tratada em sala de aula

comunidade através de parcerias, respondendo a

significativa e pertinente para o aluno,

iniciativas não só do museu, mas vindo também de

relacionando-a com o universo da sua

âmbitos educacionais alargados, criando uma

experiência e da sua vida?

relação

de

continuidade

entre as

entidades

como estimular nos alunos as capacidades

envolvidas, proporcionando o espaço do museu

de

como espaço de pertença dos habitantes do bairro

envolvendo-os na produção de conteúdos

onde eles se revêm e constroem o conhecimento

relevantes?

da identidade plural dos seus habitantes. 6.2.“Projeto 10X10” Fundação CalousteGulbenkian

 2

reflexão

critica

e

de

criatividade,

como fomentar estratégias participativas de construção de conhecimento assentes em

O “Projeto 10x10” (dez professores para dez

práticas

artistas),

parceiros em sala de aula e na abordagem

da

Fundação

Calouste

Gulbenkian,

através do Programa, fomenta a colaboração entre 2http://www.descobrir.gulbenkian.pt/index.php?article=5467&visual=2&area=3 90

artísticas,

do currículo?

fazendo

dos

alunos


como desenvolver nos e com os alunos

No processo de desenvolvimento do projeto poder

competências

-se-ão considerar três fases: uma primeira, de

ao

nível

do

pensamento

residência, uma segunda, que decorreu em sala

crítico e da resolução de problemas? A sua realização envolveu professores, alunos e

de aula com a dupla artista/professor, e a última,

artistas que trabalharam a partir de conteúdos

de apresentação das aulas públicas.

curriculares do ensino secundário, estimulando a

A fase de residência correspondeu a uma semana

interação de perspetivas, dos saberes e da

intensiva de trabalho na Fundação Calouste

criatividade

Gulbenkian, em que dez professores, dez artistas

de

cada

um

na

conceção

e

implementação de aulas em contexto de prática

e

letiva,

abordagens e materiais, trocaram experiências e

durante

Posteriormente,

todo estas

o

primeiro

deram

origem

período. a

duas

integraram

um

moderadoras conhecimentos

conjunto de aulas públicas apresentadas nas

momentos distintos:

escolas

dos

professores

participantes

e na

um

exploraram

primeiro,

cuja

a

partir

novas de

três

dinamização

das

atividades esteve a cargo dos artistas, que

Fundação Calouste Gulbenkian (figura 4).

durante sete sessões proporcionaram a todos

os

participantes

experiências

dinâmicas ligadas à sua área artística; 

um segundo momento, de criação de uma apresentação individual de cada participante (professores

e

artistas),

seguida

de

respostas criativas e construtivas por parte

dos outros elementos do grupo; 

e um último, com a exposição, por parte dos professores,

da

pedagógico

que

sinopse cada

do um

projeto pretendia

desenvolver com os seus alunos como ponto de partida para o trabalho a realizar posteriormente pela dupla.

Figura 4. Projeto 10x10, aulas públicas na Fundação Calouste Gulbenkian (2014). 91


Na segunda fase, o projeto desenvolveu-se durante o 1º período do ano letivo em curso, em cinco escolas do ensino oficial e numa de ensino privado,

situadas

respetivamente

em

Lisboa,

Amadora, Portela de Sacavém, Vila Franca de Xira

A partir da avaliação contínua do projeto pelos

e Alenquer. O trabalho compreendeu ao todo

seus intervenientes e pela avaliadora convidada,

cerca de 24 sessões, cabendo à dupla professor/

Judith Silva Pereira, foi apurado que incentivou e

artista a gestão da respetiva calendarização, de

enriqueceu

acordo com as necessidades e disponibilidades de

predispondo-os para a introdução de mudança nas

cada um. Houve sessões em que o artista apenas

suas práticas letivas; a conjugação das estratégias

observava o trabalho do professor na sua prática

artísticas com os conteúdos curriculares estimulou

letiva, outras em que era o artista que assumia a

competências e criou situações que possibilitaram

liderança

uma

e

outras

ainda

em

que

ambos

os

melhor

artistas

e

os

aprendizagem;

professores,

e

os

alunos

partilhavam a orientação dos trabalhos. Em cada

encontraram interesse e significado próprios nas

sessão, a dupla dava continuidade ao trabalho

atividades que foram desenvolvidas. Os resultados

anterior, adequando as estratégias aos conteúdos

positivos

das

Educação para a Cultura e Ciência a estabelecer

disciplinas

e

avaliando

os

exercícios

levaram

o

Programa

Gulbenkian

de

uma parceria com a Unidade de Investigação em

aprendizagem. A dupla professor/artista refletia e

Educação e Desenvolvimento da Universidade

avaliava o decurso das sessões regularmente.

Nova, que irá acompanhar as próximas edições do

A terceira fase correspondeu à apresentação do

projeto

trabalho desenvolvido por cada dupla com os

documentos de reflexão e avaliação entretanto

alunos na Fundação Gulbenkian, nas respetivas

produzidos.

escolas e em conferências e encontros sobre

reforçar a disseminação dos resultados do projeto

educação, como foi o caso no 25º Encontro Anual

a nível nacional e internacional e, caso a avaliação

da APECV: 25NonSTOP, que teve lugar no Porto,

dos resultados o justifique, estruturar um módulo

nos dias 18 e 19 de maio de 2013. Procurou-se

de formação baseado no reportório de estratégias

dessa forma partilhar os resultados do projeto a

experimentadas com sucesso, que poderá vir a

uma comunidade mais alargada de professores,

integrar

realizados

numa

perspetiva

formativa,

educadores e outros agentes educativos.

(2013/14

2014/15)

Pretende-se

cursos

professores. 92

e

com

superiores

de

e

estudar

esta

os

parceria

formação

de


6.2.1 Posso escrever sobre mim?

escolheriam para se identificarem”; “entrevistas ao

O projeto subordinado ao tema “Posso escrever

alter-ego”; “narrativas com fotografias reais ou

sobre mim?” foi desenvolvido pela professora de

imaginárias”; “autorretrato descritivo”, “biografias

Português Maria Bárcia e pela atriz e encenadora

usando o pronome na terceira pessoa” e “criação

Maria Gil, com alunos do 10º ano do Curso de

de um guião facilitador da leitura do mundo” – que

Ciências e Tecnologia, na Escola Secundária

constituem alguns dos exemplos resultantes do

Padre

principal

cruzamento das necessidades da prática letiva

finalidade a criação do gosto pela escrita e pela

com as estratégias criativas e micropedagogias

leitura regulares. Selecionado o conteúdo do

provenientes do campo artístico.

Programa de Português - “Textos autobiográficos”

Foi ainda estabelecida articulação com outras

-, a dupla concebeu, planificou e executou um

disciplinas, outras áreas do saber e outras

conjunto de atividades que conduzissem os alunos

pessoas do mundo artístico e científico, que deram

a uma prática de escrita fluente e motivante, fator

contribuições importantes para que os alunos

determinante para a evolução e consolidação de

alargassem os seus conhecimentos, realizadas

competências de escrita e leitura por todos os

saídas a bibliotecas e espetáculos e partilhadas

alunos da turma.

experiências com alunos de outra dupla e de outra

Dado que a turma mostrou inicialmente alguma

escola,

resistência face às metodologias utilizadas e à

memórias.

forma como a matéria ia ser introduzida, a dupla

Este projeto conseguiu despoletar nos alunos o

teve a preocupação constante de explicar no início

gosto pela escrita e pela leitura, constituindo uma

de cada aula a tarefa que iam desenvolver,

forma de aprendizagem gratificante e significativa.

tornando claro os seus objetivos e de fazer no final

E nas palavras dos alunos: “… trabalhámos muito,

uma reflexão sobre o que tinha acontecido,

lidámos com pessoas que nos ensinaram muito e

constituindo assim um ritual de abertura e fecho.

ficámos a escrever muito e melhor”, “… no final

Sempre com o objetivo de levar os alunos a

percebemos que demos a matéria.”

escrever, foram implementadas em sala de aula,

6.2.2. “O Caderno como Oficina de Excelência”

pela dupla, um conjunto de estratégias como: o

Reconhecer a utilidade de registar num caderno

exercício dos cheiros que conduz a memórias

os conteúdos teóricos e práticos das diferentes

mais remotas ou mais presentes; “que nomes

disciplinas curriculares, relacioná-los com .

António

Vieira.

Teve

como

93

que

também

trabalhavam

sobre as


experiências da vida real e esbater estas fronteiras

As alunas ao apropriarem-se de um conjunto de

entre conteúdos escolares, identidade-pessoal e

estratégias

conteúdos vivenciais, foi o objetivo do projeto “O

criatividade, foram diluindo os seus receios iniciais,

Caderno como Oficina de Excelência”, realizado

partilhando os seus registos, compreendendo que

pelo professor de desenho Mário Linhares e por

os conteúdos podiam interagir para constituir um

Ricardo Jacinto, músico e artista plástico, com

saber multifacetado que originava aprendizagem.

alunos que frequentavam o 12 º ano do Curso de

Nas suas palavras: “Lentamente fui fazendo

Artes, no Colégio de Santa Doroteia

experiências,

Embora fossem alunas da área das artes, o

misturando

lançamento do desafio de adoção de um único

aprendendo com ele e dei-lhe um bocado da

caderno para registo de todas as disciplinas e

minha alma!; “Há páginas que não são páginas e

restantes áreas da vida das estudantes, pautado

momentos muito altos do projeto, como por

pela total liberdade de registo ao nível formal e de

exemplo o registo acerca de um dos heterónimos

conteúdo, o que era da escola e o que pertencia

de Fernando Pessoa.”; “Continuo a fazer páginas

ao seu “eu” e à relação deste com o meio onde

interessantes e percebi que ter um caderno como

estavam

este me ajuda a progredir. “; “Vou continuar a fazê-

integradas,

foi

uma

proposta

inovadoras

ouvindo as

e

e

desafiadoras

registando

disciplinas,

de

sons,

estudando

e

potenciadora de grande mudança e inicialmente

lo, mesmo quando tiver um emprego.”

geradora de alguns conflitos interiores. O caderno

6.2.3. “Querem vir Comer à Cantina? “

gráfico, o caderno de autor, sob as suas múltiplas

O projeto “Querem vir comer à cantina?” teve

formas, serviu de plataforma para transformação

como objetivo, levar os alunos à compreensão da

da prática de registo das alunas associado a um

natureza global da atividade económica e do

conjunto de exercícios criativos que potenciaram

desenvolvimento

outros olhares e perceções do mundo circundante.

indústria da moda. Este projeto foi desenvolvido na

Também o convite a diferentes profissionais para

disciplina de Integração, onde foi selecionado o

quem

ferramenta

tema “Globalização”, pela professora de Economia

indispensável e criativa de registo - um escritor,

Ilda Dinis e pelo artista António Pedro, músico e

um urban sketcher, dois designers e um professor

cineasta, com alunos que frequentavam o 12º ano

de desenho - procurou promover e consolidar o

do Curso Profissional de Técnicas de Gestão.

uso dessa nova ferramenta-plataforma de registo

A partir do contributo do artista, num primeiro

o

diário

pelas alunas.

gráfico

é

uma

através

de

um

estudo

momento, foi introduzida a realização de

94

da


exercícios de aquecimento, que envolviam a voz e

do terceiro mundo. Todos estes materiais foram

o corpo, iniciavam a aula e permitiam fomentar a

utilizados como um meio para explorar os

coesão da turma e a predisposição para a

conteúdos, alargando grandemente a implicação

aprendizagem e resposta a novos desafios.

dos alunos nas “matérias” e esbatendo a fronteira

Também o espaço físico da sala era reorganizado

entre os conteúdos e as suas vivências. Nas suas

em cada aula, contribuindo para quebrar a rotina,

palavras: “O projeto permitiu desenvolver as

fortalecer a relação pedagógica e facilitar a

capacidades

comunicação.

expressão”; “…

criei um maior

Num segundo momento, eram lançadas propostas

responsabilidade

ao

de

problemas sociais que vi no filme e discuti”.

trabalho

relacionadas

com

conteúdos

a

de

observação,

abordar, tendo sempre presente as vivências dos alunos

e

importância

confrontar-me

com

os

6.2.4. “Falar em Inglês” “Falar em Inglês” foi um projeto orientado pela professora de Inglês Dora Santos e a atriz e

São exemplo dessas estratégias: “Made in” - a

encenadora Sofia Cabrita, que teve como objetivo

partir de um objeto pessoal selecionado, os alunos

desenvolver o vocabulário e a oralidade na

realizaram uma pesquisa sobre as condições

comunicação da língua inglesa relacionada com o

sociais

e

tema selecionado “O Consumo”. Os alunos

gestores da empresa de fabrico e das suas

envolvidos frequentavam, na Escola Seomara da

consequências, que depois materializaram em

Costa Primo, na Amadora, o 11º ano dos Cursos

fotografias e em gravações áudio; montagem e

Profissionais de Técnicos de Gestão e de

edição de um trailer - após visionamento do filme

Comércio.

“China Blue”, foram compilados os extratos mais

Depois de definido o tema e os objetivos e dado

significativos para cada um dos alunos, foi

que a principal dificuldade dos alunos se centrava

realizada uma reflexão conjunta sobre os mesmos

na

e recriado o trailer; “No Logo” - cada aluno

realizadas foram ao encontro da melhoria desta

elaborou um vídeo sobre excertos do livro de

competência e os exemplos apresentados a seguir

Naomi

ilustram algumas dessas mesmas estratégias.

Klein

e

dos

diversificar

sentido de

estratégias para captar a sua atenção e interesse.

económicas

de

e

as

e

a

interação

trabalhadores

simularam-se

situações

e

expressão

oral,

muitas

das

atividades

personagens relevantes na implementação de

Tendo

uma multinacional numa comunidade de um país

programáticos a abordar foram realizados 95

sempre

presente

os

conteúdos


exercícios de role-play, slogans e storyboard,

uma pequena estratégia, pode ter um efeito

simulação

disseminador muitíssimo alargado

de

personagens

e

de

situações

próximas do mundo do trabalho, conducentes à

Neste mesmo espírito de envolvimento de toda a

aquisição de vocabulário e à fluência do uso da

escola, e perante a identificação de uma grande

língua inglesa; foram recriados jogos pedagógicos

necessidade por parte dos professores, a artista

tendo em conta o universo dos alunos, e foi feito o

realizou duas sessões de formação informal onde

seu

os

foram trabalhados a postura e a respiração; o

enunciados a objetivos concretos, aproximando as

volume, o timbre e a articulação da voz; o uso do

ditas “matérias” à vivência dos alunos ou à sua

espaço e da comunicação visual. O sucesso junto

utilidade prática no futuro destes (uma das

dos professores envolvidos e as referências à sua

grandes preocupações dos alunos do ensino

utilidade e influência na mudança de postura em

profissional).

sala de aula, foram muito evidentes.

A produção de slogans destinados a alunos e

A

professores - que começavam por ”students/

desenvolvimento do espírito de cooperação entre

teachers

respetiva

os diferentes elementos da turma, o facto de terem

divulgação por lugares estratégicos da escola, foi

retirado proveito das atividades em que se

uma atividade que tendo surgido no âmbito da sala

envolveram, e que estas foram facilitadoras da

de aula tinha como propósito expandir-se e

compreensão dos conteúdos.

enquadramento

prévio,

want/need/prefer”

-

adequando

e

a

maior

parte

dos

alunos

referiu

o

interpelar a escola toda, proporcionando um

6.2.5. “Palavras, Poesia e Planeta”

espaço mais alargado de comunicação e de

Promover a escrita, a poesia e a ilustração com

reflexão sobre o que os alunos gostariam ou

base em temas da disciplina de Ciências Naturais,

pretendiam que a escola, os professores e os

com recurso a uma metodologia não formal, foi o

próprios alunos fossem/fizessem. O efeito de

objetivo do projeto “Palavras, Poesia e Planeta”,

contágio foi surpreendente e no dia seguinte era

desenvolvido pela professora Ana Nunes e pelo

visível em vários locais da escola outros slogans,

artista plástico, escritor e contador de histórias

em português, executados por alunos de outras

Miguel Horta, com alunos de uma turma integrada

turmas, no seguimento deste movimento de

no Programa Integrado de Educação e Formação,

comunicação e intervenção no espaço escolar.

a funcionar no Agrupamento de Escolas de

Uma manifestação interessante do quanto por

Abrigada.

vezes um pequeno gesto, uma pequena mudança, .

Num primeiro encontro com a turma, a dupla pediu

96


a cada aluno que se identificasse com um animal,

O uso de livros (um elemento habitualmente

aproveitando esta atividade para introduzir a

ausente das práticas quotidianas dos alunos em

temática

Esta

questão) foi constante. O estabelecimento de

primeira

rituais de início e fim da aula - a leitura de um livro

das

ciências

identificação aproximação

da

proporcionou à

relação

natureza. uma

pedagógica

pelo artista – foram determinantes

entre

para a

professora, artista, alunos e tema: “Quem sou eu

construção de um sentido de pertença e de grupo.

no mundo?”

Pequenas

Este tipo de estratégias de aproximação professor-

situações comportamentais pouco propícias à

artista-alunos e de cruzamento entre a identidade

aprendizagem. É o caso dos sussurradores -

de cada um e os conteúdos curriculares pautaram

ferramenta sonora para passar mensagens de

a ação da dupla, criando laços e um grau de

boca a orelha e assim reduzir o bulício e o ruído

compromisso extremamente importantes.

na sala de aula.

No espaço físico da sala de aula - constantemente

Nas palavras dos alunos: “Esteve cá um escritor,

alterado

conferir

pintor …, que fez connosco várias coisas: a

informalidade, de o adequar às propostas a

cartografia que permitiu que nos conhecêssemos

desenvolver

e

aspetos

melhor, a mim próprio e aos outros; a máquina da

relacionados

com

foram

poesia que nos ensinou a fazer poemas e frases

que

de olhos fechados; o passear até outros países

visavam desenvolver competências de escrita, de

para alargar os nossos conhecimentos e despertar

leitura e de conhecimento do meio.

a curiosidade; o sussurrador, que serviu para dar

Viagens virtuais, através do Google Earth, guiaram

conselhos aos amigos”.

com

implementadas

o

objetivo de

de

melhorar

a

lhe os

comunicação

estratégias

-

diferenciadas

criações

permitiram

ultrapassar

os alunos aos continentes e às cidades da sua

7. SUBMERGIR-SE, OU PERSPETIVAS DE

origem, locais onde identificaram familiares e

COLABORAÇÃO E DE AÇÃO

reviveram memórias que iam conquistando a sua

7.1. Investigação

atenção e afetividade permitindo explorar diversos

Os museus e as escolas podem trabalhar em

conteúdos de Ciência. A construção de uma

conjunto. As experiências aqui descritas são

“Máquina da Poesia” da autoria do Miguel Horta,

exemplares dessas práticas. No entanto, em

permitiu ampliar o vocabulário sobre o planeta e o

Portugal ainda estamos no ínicio das práticas de

mundo, enquanto se fazia poesia e se alargavam

diálogo e de construção de saberes entre museus

os referentes linguísticos.

97

e escolas. Pelos resultados apurados neste


estudo, parece-nos que na sua maioria as escolas

uma pessoa que articulasse as parcerias em cada

não recorre regularmente aos museus e os

instituição.

museus não promovem sistematicamente um

7.2. Formação de Professores

trabalho colaborativo com as escolas. Apesar de

O “Projeto 10x10” demonstrou como a formação

existirem projetos pontuais bem sucedidos entre

de professores em regime de residência com

escolas e museus, uma grande parte dos museus

artistas-educadores é um fator de mudança de

portugueses mantém com as escolas uma relação

rotinas e de construção de novas abordagens

de desigualdade. No entanto, parece-nos que

pedagógicas.

começam a existir vontades de mudança e

encontrada

sobretudo reflexões críticas sobre essas relações.

professores da APECV, em colaboração com o

Por exemplo, no Nucleo de Educação Artística do

Museu Nacional de Soares dos Reis, no Porto, o

Instituto de Investigação em Arte, Design e

Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa, o

Sociedade da Faculdade de Belas Artes da

Museu de José Malhoa, nas Caldas da Rainha, e a

Universidade do Porto, Lígia Lima, na sua tese

Culturgest, em Lisboa. Nessas formações, no

doutoral, investiga aprendizagens que se geram

cruzamento

nos alunos a partir de proximidades mediadas

profissionais de museus, muitas situações de

pelas

arte

aprendizagem em rede se puderam realizar,

contemporânea e pelos artistas no espaço da

respeitando os conhecimentos de cada um e

escola, focando o exemplo do programa para as

fomentando o diálogo e a criatividade entre pares

escolas

(figura 5).

instituições

desenvolvido

promotoras

pelo

Museu

da

de

Arte

A

mesma

nos

entre

cursos

evidência de

professores,

tem

formação

artistas

sido de

e

Contemporânea de Serralves e pelos projetos para

escolas desenvolvidos na Casa da Imagem. Segundo esta investigadora, apesar de as escolas enfrentarem

entraves

de

ordem

burocrática,

logística e financeira para se deslocarem aos museus, muitos professores continuam a integrar visitas aos museus nas suas práticas letivas. Do ponto de vista dos professores, a importância do museu na prática letiva é muito importante e sugerem que os museus e as escolas deveriam ter

98

Figura 5. "A arte contemporânea como ferramenta para a sala de aula", formação de professores na Culturgest (2013).


7.3. Concursos Os museus também têm demonstrado abertura e apetência professores

para

construir

através

de

conexões

com

concursos

para

estudantes. Esses concursos são indicadores de abertura ao público escolar, mas podem ter

projetos educativos de raiz onde se desenvolvem

finalidades

o

redes de aprendizagem, construção participada de

concurso “A Minha Escola Adota um Museu, um

material pedagógico e exposição de produtos

Palácio, um Monumento...”, um concurso nacional

finais.

promovido

organismos

No sentido inverso, da escola para o museu, não

governamentais responsáveis pela pela educação

poderemos deixar de referir o concurso da APECV

e pela cultura, hoje denominados Ministério da

para alunos, que todos os anos incide sobre a

Educação e Ciência (através da Direção-Geral da

análise da obra de um artista português. Nem

Educação) e Secretaria de Estado da Cultura

sempre a parceria com as instituições onde as

(através da Direção-Geral do Património Cultural).

obras se encontram é fácil e raramente os museus

Este concurso tem-se apresentado como uma

se mostram motivados para trabalhar em conjunto

iniciativa top-down de formação de públicos, onde

com os professores. Mesmo sabendo que o

as escolas são convidadas a trabalhar o espólio

concurso

de um museu, numa relação sem planeamento

número de visitas escolares durante esse ano, o

conjunto, nem discussão com os professores, nem

sistema hierárquico da entidade “museu” é pesado

construção de material de apoio com as escolas.

e pouco flexível. No entanto, destacamos o caso

Dentro da tipologia concursos para as escolas

exemplar do concurso “À procura das nossas

existem, no entanto, experiências que promovem

raízes”, com Graça Morais', em 2011, um

uma maior colaboração entre as instituições, como

concurso em parceria com o Centro de Arte

o caso do Concurso “Pequeno Grande C” que a

Contemporânea Graça Morais, em Bragança, que

Fundação Calouste Gulbenkian concebeu em

envolveu o planeamento comum de construção de

colaboração com a Associação para a Gestão da

material pedagógico on-line, conferências com a

Cópia Privada (AGECOP), ou o concurso do

artista Graça Morais, visitas orientadas ao museu

Museu das Comunicações, referido anteriormente.

para escolas participantes; seleção de obras e

muito

desde

diversas.

2005

Por

pelos

exemplo,

Nestes dois últimos casos os concursos são

99

vai

aumentar

consideravelmente

exposição das obras dos alunos no museu.

o


7.4. Projetos na Comunidade

Em Melgaço, pequena vila do norte de Portugal, os

Num estudo desenvolvido no Brasil por Soraia

serviços educativos da câmara municipal e o

Freitas Dutra e Silvania Souza Nascimento sobre

Agrupamento

os significados atribuídos pelos professores às

desenvolvido esforços conjuntos no sentido desta

visitas a um museu histórico, o museu foi

construção,

percebido pelos professores como um espaço que

respetivos Planos Anuais. As atividades envolvem

encerra múltiplas possibilidades educativas. Para

normalmente várias disciplinas e são realizadas,

eles, um museu educa quando preserva, acolhe,

tanto nas escolas como nos museus, sobretudo no

produz conhecimento histórico, facilita o acesso

Museu Memória Espaço e Fronteira e no Museu

aos conhecimentos sobre a cidade, possibilita

de Cinema Jean Loup Passek. Refira-se, a título

romper com a rotina da escola, permite ver

de exemplo,

objetos, facilita a aproximação com aspetos da

construção de brinquedos óticos dirigido aos

memória coletiva das pessoas, possibilita o lazer e

alunos dos 8º e 9º anos, realizado no primeiro

promove consciencialização. Se entendermos a

período deste ano letivo e, ao longo do ano, o

escola como uma instituição que cerra as suas

trabalho realizado em conjunto envolvendo alunos,

portas a todo o contacto com o exterior, o que

professores e comunidade. Assim, o trio Madalena

acontece muitas vezes por inúmeras razões, então

Lima (artista plástica), José Manuel Gonçalves

a visita ao museu é também uma porta aberta, por

(professor de Educação Visual) e Clara Rodrigues

vezes a única, para a comunidade e para o sentido

(professora

de pertença à comunidade que se vê representada

trabalharam em conjunto com os alunos do 3º

no museu. Acima de tudo, para os professores, a

ciclo, envolvendo cerca de duzentos alunos, em

visita

das

diversas atividades tais como: realização de

possibilidades educativas e de aprendizagens. No

esculturas para presépios expostos em dois

espaço/tempo

uma

espaços do concelho por altura do Natal (escola

aprendizagem híbrida, produzida na articulação de

sede e largo da câmara municipal), fabrico

referências da cultura escolar e da cultura museal

artesanal de sabão, pintura de painéis nos

(Dutra e Nascimento, 2012). Nesse cruzamento,

espaços da escola e confeção de brinquedos

ou através desse cruzamento poderemos antever

tradicionais, estes últimos tendo sido expostos na

ou vislumbrar outras conexões que poderão talvez

Festa da Cultura que decorreu na primeira semana

é

uma

promessa da

visita

de

expansão

constrói-se

enriquecer tanto o trabalho dos professores nas

de

Escolas

articulando

de as

Melgaço propostas

a realização do

de

Educação

têm dos

workshop de

Tecnológica)

do mês de agosto. Foi gratificante constatar que a

100

.


articulação

conseguida

entre

os

existe nos dois contextos, onde uns "ensinam" e

diversos

intervenientes permitiu proporcionar aos alunos

outros "aprendem";

atividades

2.

significativas

e

apreciadas

pela

Escolas

e

museus

podem

trabalhar

os

comunidade, ao mesmo tempo que interiorizavam

conteúdos de modo a incluir as subjetividades dos

os conteúdos programáticos.

participantes

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

questionar posições hegemónicas;

Neste artigo as autoras submergiram nas relações

3. Escolas e museus podem realizar projetos onde

entre escolas e museus, entre museus e escolas,

professores, educadores de museus e outros

para abarcar uma dimensão relacional mais

atores

abrangente e mais comunitária buscando pistas

artistas,

para, a partir de casos existentes, vislumbrar

construam abordagens criativas aos conteúdos

outras abordagens e outras finalidades para essas

curriculares de modo a fomentar aprendizagens

relações. A partir do estudo iniciado pela APECV

mais ligadas ao mundo real e à comunidade;

em 2010, no âmbito do projeto ITEMS, concluído

4. Escolas e museus devem entender o museu

no final de 2012, com o seminário "Atravessar

como uma instituição que pertence à comunidade

Pontes Entre Escolas e Museus", no Porto,

e, por isso, não é uma instituição à parte que lida

gostaríamos de deixar algumas pistas para que a

com elites sociais, mas sim um espaço de

relação entre escolas e museus se possa

desenvolvimento comunitário local;

questionar com o objetivo de fomentar um efetivo

5. Escolas e museus necessitam de novas

uso

da

práticas para que se entenda o museu como

o

espaço de aprendizagem de todos e de partilha de

dos

recursos

aprendizagem

para

culturais a

no

cidadania

âmbito e

para

nos

(elementos cientistas,

outras

habitantes

com

e

organizações, locais,

lugar

etc.)

todos

1. Escolas e museus devem construir mais

subjetividades.

plataformas de debate numa base de relação

Acreditamos que, desta forma, podemos contribuir

entre pares para professores e profissionais dos

para que a relação entre escolas e museus seja

serviços educativos dos museus, com recurso a

mais profícua, no sentido de que seja mais

seminários, conferências e workshops. Esses

igualitária e inclusiva e que contribua para o

encontros podem ser organizados de modo a

desenvolvimento comunitário através da criação

tornar a relação entre escola e museu mais

de espaços onde todos possam ter uma voz ativa 101

saberes,

de

expositivos

desenvolvimento sustentável.

igualitária, desmontando a relação de poder que

os

discursos

para

de forma democrática, com lugar à subjetividade

as


de todos os que intervêm no processo. Referências Agra-Pardinãs, M. J. (2012). In Actas do Seminário Internacional Atravessar pontes entre escolas e museus. Porto, Fundação de Serralves, 12 a 14 Outubro (paper). Acaso, M. (2009). Lo Rizómico como Alternativa a lo Vertical: el método mupai y su direccionabilidad en desbandada. III Congrés d'Educació de les Arts Visuals: per un diàleg entre les arts. Barcelona (paper). Acaso, M. (2011a). Del paradigma modernista al posmuseo: seis retos a partir del giro educativo (Lo intentamos?). In Perspectivas, Situación actual de la educación en los museos de artes visuales. Colección Fundación Telefónica. Madrid: Editorial Ariel. Acaso, M. (2011b). Questões sobre Educação, Museus e Arte. In Educamuseu, Ano I - Número 06 Dezembro 2011. Disponível em http://www.educamuseu.com/p/opiniao.html e acedido a 25 de maio de 2013. Chang, E. (2006). Interactive experiences and contextual learning in museums. Studies in Art Education, 47(2), 170–186. Csikszentmihalyi, M. & Hermanson, K. (1999). Intrinsic motivation in museums: why does one want to learn? In E. Hooper-Greenhill (Ed.), The educational role of the museum (pp. 146–160, 2nd ed.). New York: Routledge. Duncan, C. (2004). Rituales de Civilización. (Ana Robleda, trad.). Murcia: Nausicaa. (Obra original Civilizing Rituals. Inside Public Art Museums, publicada em 1995). Dutra, S. F. & Nascimento, S. S. (2012). Educação na fronteira entre escolas e museus: os significados atribuídos pelos professores às visitas a um museu histórico. In Atas do Congresso Atravessar Pontes

entre Escolas e Museus, Porto: APECV. Disponível em http://www.apecv.pt/pareceres/atas_serralves.pdf e acedido a 8 de agosto de 2013 Eça. T. & Ornelas, M. (2011). Innovative Teaching for European Museum Strategies: Report From APECV – Portugal. Disponível em http://www.anisa.it/items_documents.htm e acedido a 16 de junho de 2011. Falk, J. H. and Dierking, L. D. (1992). The Museum Experience, Washington, D. C.: Whalesback Books. Falk, J. H. and Dierking, L. D. (2000). Learning from Museums: Visitor Experiences and the Making of Meaning, Walnut Creek, CA: AltaMira Press.

Garaigorta, C. (2011). Yo Pienso o me piensan? In Perspecitvas: Situación Actual de la Educación en los Museos de Artes Visuales (pp.64-69). Madrid/Barcelona: Editorial Ariel. 102


Graburn, N. H. H. (1977, June). The museum and the visitor experience. In The Visitor and Museum, Prepared for the 72nd Annual Conference of the American Association of Museums (pp. 5–32), Seatle: University of Washington Press. Hein, G. E. (1998). Learning in the museum. New York: Routledge. Hennes, T. (2002). Rethinking the visitor experience: Transforming obstacle into purpose. Curator, 45(2), 109–121. Hernández, F. (2013). Modos de Relacionamento entre Crianças e Jovens e Arte Contemporânea na Escola (e o Museu). Conferência A arte contemporanea como ferramenta para a sala de aula. Lisboa, Culturgest, 23 fevereiro (paper). Hooper-Greenhill, E. (1994). Museums and their visitors. New York: Routledge Ibañez, T. (2001). Municiones para disidentes: Realidad-verdad-politica. Barcelona: Editorial Gedisa. Juanola, R. (2010). Diálogo y interpretación: los museos en la educación visual. In Holguin, María (comp.). Educar: aprender y compartir en museos - Memoria CECA Argentina 2007-2010. Buenos Aires: Teseo. Lee, J. (2010). The museum experience in the environment of the Japanese collection at the Metropolitan Museum of Art. International Journal of Education Through Art, Volume 6, Number 3, 1, pp. 343-359. Marques, E. (2012). Seminário Atravessar Pontes entre Escolas e Museus. 12 Outubro. Porto, Fundação

de Serralves (paper). Ornelas, M. (2012). Visitar um Museu: cruzamento de perspectivas de professores, alunos e monitores. Atas do Seminário Internacional Atravessar pontes entre escolas e museus. Porto, Fundação de Serralves, 12 a 14 Outubro. Padró, C. (2011). La culpa es del swing o por qué no hablamos de relaciones pedagógicas también en los museos?. In Acaso, María (coord.). Perspectivas: Situación Actual de la Educación en los Museos de Artes Visuales. Madrid/Barcelona: Editorial Ariel.

Xavier, J. B. (coord.) (2004). Relatório do Grupo de Trabalho: Ministério da Educação e Ministério da Cultura - Despacho Conjunto N.º 1062/2003 DR-II Série de 27 de Novembro. Abril 103


Agradecimentos Este artigo é o resultado de um percurso realizado com muitas pessoas que participaram, colaboraram e se envolveram num conjunto de atividades, conversas, debates, partilhas e reflexões, às quais agradecemos muito. Agradecemos em primeiro lugar às coordenadoras e colaboradoras dos Serviços Educativos que tornaram possível a organização dos seminários, bem como aos seus directores: no Museu Colecção Berardo, à Cristina Gameiro, à Filipa Gordo, à Cátia Bonito e ao Pedro Lapa; na Casa das História Paula Rego, à Adriana Pardal e à Helena de Freitas; no Museu de Serralves, à Elisabete Alves, à Margarida Saraiva e ao João Fernandes. Agradecemos também a todos os oradores nos seminários, que permitiram, além da partilha das suas inquietações, o debate, a reflexão e a contribuição para a criação de espaços intermédios entre escolas e museus. Agradecemos aos monitores/educadores dos museus que dinamizaram as atividades para os participantes nos seminários.

Deixamos ainda um agradecimento especial à Fundação Calouste Gulbenkian, nomeadamente à Susana Gomes da Silva, à Maria de Assis Swinnerton, por terem partilhado connosco as suas ideias, projetos e reflexões, bem como pela criação e dinamização do projeto “10x10”. Agradecemos ainda à Cristina Webber, do Museu das Comunicações, pelo seu interesse e dedicação na criação de práticas para que escolas e museus criem espaços de cooperação e interactividade, espelhados na concepção do programa educativo do museu. Agradecemos também ao Jorge Costa, diretor do Centro de Arte Contemporânea Graça Morais, pelo

empenho que tem demonstrado ao longo dos últimos anos em fazer daquele espaço cultural um local de participação interventiva de professores e alunos. 104


“Estória do Gato e da Lua”,

de Pedro Serrazina Propostas pedagógicas nas disciplinas de artes visuais

André Mantas Professor no Agrupamento de Escolas Baixa-Chiado.

Colaborador do Centro de Investigação em Artes e Comunicação (CIAC). mantas.andre@gmail.com Palavras-chave Cinema; Pedagogia; Educação Visual; Arte Resumo O filme “Estória do Gato e da Lua”, uma curta-

forma de apelar aos valores, respeito pela

metragem de animação realizada por Pedro

diferença e à capacidade de sonhar, afinal tão

Serrazina em 1992, surpreendeu durante quase

próximos do imaginário das crianças.

quinze anos as crianças do 2º ciclo do ensino

As hipóteses de exploração deste filme são

básico que participavam no programa Juventude,

inúmeras e interdisciplinares; no entanto, é na

Cinema e Escola (JCE) na região do Algarve.

exploração da Educação Visual e, num sentido

Ultrapassada alguma reação inicial menos positiva

mais lato, da Cultura Visual, que centro este texto.

motivada pelo confronto com um formato diferente

A partir de experiências feitas com alunos do 5º e

do habitual, com as imagens simples e reduzidas a

7º anos, pretendo demonstrar como os aspetos

silhuetas a preto e branco e uma história

formais e estéticos do filme podem ser a base para

potencialmente demasiado metafórica para as

a exploração de conteúdos e atividades nas

idades em causa, o filme conquistou as crianças

disciplinas do grupo de artes visuais no 2º e 3º

tornando-se uma referência nas relações entre a

ciclos. A reflexão alarga-se para um campo mais

escola e o cinema. A diversidade de trabalhos com

abrangente no domínio da Cultura Visual, a cultura

grande nível criativo produzidos a partir do filme

por excelência das crianças e jovens nos dias de

em várias áreas disciplinares provou-o, ou não

hoje, e a sua relação com a pedagogia nas artes

fosse esta “estória” uma,

visuais. 105


Metodologia

Esta utilização, embora ativa e recorrente, foi mais formalizada

A minha experiência como docente nos grupos

algarvia2 sob o lema “Ver, Aprender e Amar e

com crianças e jovens de vários níveis de ensino,

Cinema”, pretendeu iniciar os alunos na linguagem

desde o 1º ciclo ao ensino secundário. Permitiu

e cultura fílmica através do visionamento de filmes

igualmente uma multiplicidade de experiências e

em sala de cinema, procedendo-se depois a uma

conclusões em relação à forma como o cinema

abordagem dos conteúdos relacionados com o

pode ser utilizado em diferentes faixas etárias no

filme, assim como a história e linguagem técnica

conjunto das disciplinas das artes visuais no

do cinema em integração com os currículos das

currículo do ensino básico. A frequência num

disciplinas do ensino básico. A criação da

mestrado em Comunicação, Cultura e Artes,

disciplina de “Cinema” como opção artística no

especialização em Estudos da Imagem levou-me à

grupo das artes visuais no 3º ciclo resultou do

investigação e teorização do cinema como recurso

sucesso

pedagógico, possibilitando também a extensão de contextos

formais

escolas

que

a

sua nunca

século XXI em Portugal (...) Não há registo de

utilizei o cinema como recurso pedagógico nas

outra experiência nacional como a da criação da

aulas de Educação Visual e Tecnológica (EVT) ou

disciplina de Cinema, no que concerne às

nas antigas áreas curriculares não disciplinares1. A

possibilidades de crescimento e de ligações dentro

sua utilização assumia uma dupla função: o filme

da Educação para os Media”. 3

como motivação para um tema ou atividade teórica

e a crença comprovada da sua importância como

em

verificando-se

"Um dos mais ambiciosos projetos do começo do

Ao longo da minha atividade docente sempre

Comum a ambas, a paixão que sinto pelo cinema

projeto,

participaram no JCE.

educação.

dos aspetos estéticos, técnicos e formais do filme.

do

implementação

de

ou prática, ou a exploração de conteúdos a partir

Juventude,

projeto, nascido no final dos anos 90 na região

permitiu que ao longo destes anos contactasse

dos

programa

ano de 2003 em várias escolas do Algarve. Este

Visual e Tecnológica) e 600 (Artes Visuais),

fora

do

Cinema e Escola (JCE), em que participei desde o

110 (1º ciclo do ensino básico), 240 (Educação

atividades

através

1

Área de Projeto, Estudo Acompanhado e Formação Cívica.

2

O projeto foi criado através de uma parceria entre a DreAlg (Direção regional de Educação do Algarve), o ICA (Instituto de Cinema e Audiovisual) e o Cineclube de Faro. 3

recurso pedagógico em qualquer nível de ensino. 106

Félix, 2001


Esta foi uma das conclusões da Universidade do Minho que incluiu este projeto num estudo sobre a educação

pelos

média

em

Portugal.

Recentemente, o programa JCE surgiu também mencionado no relatório do British Film Institute sobre a literacia fílmica na Europa, como estudo de caso e estratégia única a nível nacional para o ensino de conteúdos ligadas à sétima arte. Os resultados obtidos ao longo dos vários anos e o seu carácter único no país firmaram o projeto como uma referência neste domínio, o que se verifica com a adaptação do seu modelo no Plano Nacional de Cinema, que a Secretaria de Estado da Cultura e o Ministério da Educação e Ciência

do atual governo pretendem implementar no sistema de ensino público. Uma das principais características do JCE é a sua interdisciplinaridade e o facto de não se resumir aos materiais e atividades pré-concebidos pela coordenação do projeto e professores envolvidos. Embora

respeitasse

metodologia,

sempre

esses

adaptei

materiais

e

criei

e

novas

atividades nas turmas e disciplinas onde o desenvolvi. Ao optar por um filme que refletisse a importância da utilização do cinema como recurso pedagógico, não pude deixar de pensar na lista de filmes do

animação “Estória do Gato e da Lua”, de Pedro Serrazina, 1992. O filme sempre esteve no projeto desde o início nas turmas do 5º ano do 2º ciclo e gerou reações comuns nos alunos de várias escolas: alguma desconfiança ou dificuldade na receção após o primeiro visionamento, mas ao mesmo tempo

firmou-se como o filme que mais trabalhos gerou em várias disciplinas, demonstrando a sua força e capacidade em estimular o imaginário do público. No fundo, este sempre foi um dos objetivos do projeto e, numa perspetiva mais alargada, da pedagogia através do cinema: a aprendizagem e consciência de formas diferentes de fazer cinema, abrindo caminho para a interpretação e prazer estético de novas visualidades. Pedro serrazina, nascido em 1968, dedicou-se profissionalmente ao cinema de animação após uma primeira incursão num curso de Arquitetura. A experimentação de diferentes técnicas e materiais na realização dos filmes foi uma constante ao longo do seu percurso, mas através da obra “Estória do Gato e da Lua”, de 1995, revelou a enorme expressividade de figuras definidas pelas silhuetas numa história que apela à diferença e à perseverança. Estreado no Festival de Cannes um ano depois da sua realização, 4

http://www.drealg.net/images/BFI-Countries-profiles-JCE.pdf, acedido a 10 dezembro de 2013 http://www.drealg.net/images/BFI-Case-Studies-JCE.pdf, acedido a 10 dezembro de 2013

programa JCE, por ter sido um projeto onde me vi envolvido durante quase 10 anos. E, neste caso, a escolha pareceu-me óbvia: a curta-metragem de 107


o filme viria a ser premiado com quinze galardões

completam o quadro.

internacionais. A obra conta a estória (aqui como

As possibilidades de exploração do filme são

um neologismo de narrativa, história ou conto popular). dificultada

À

partida pela

uma

união

impossível,

diferença

óbvia

dos

quase infinitas, passíveis de serem trabalhadas em várias áreas disciplinares. O programa JCE para o

dois

5º ano prevê e sugere atividades específicas; no

personagens e pela impossibilidade do gato

entanto, os exemplos a seguir descritos referem-se

conseguir “apanhar” a sua amada. Ao longo do

a trabalhos desenvolvidos em turmas do 5º e 7º

filme, narrado em off por um Joaquim de Almeida

anos nas disciplinas de EVT e Educação Visual,

calmo, sereno e paciente, o gato empenha-se

além de sugerir outras possíveis atividades,

numa demanda pela lua que o faz atravessar oceanos,

correr

pelos

telhados,

ou

independentemente das mesmas turmas terem

ficar

participado no programa JCE.

simplesmente à espera. No final, o gato consegue

Cabe-me agora fazer um parêntese para justificar

finalmente chegar à lua e as duas figuras unem-se

de

numa só. Conseguiu realmente o gato juntar-se à

apresentaram

imaginação opções

das

crianças,

diferentes

e

as

atividades

e

evoluído nos últimos anos para uma perspetiva

que

baseada na Cultura Visual, procurando explorar e

bastante

interpretar a variedade de imagens que rodeiam os

diversificadas, como apresentarei adiante nas

alunos. O próprio currículo das disciplinas, com a

descrições. Inerente à história, o respeito pela

infeliz exceção da reforma curricular do ensino do

diferença e perseverança em não desistir dos

atual Governo Constitucional que procura centrar-

nossos sonhos, numa união à partida impossível.

se numa aprendizagem mais behaviorista,5 dá

A atmosfera lírica e poética do filme, dada pela narrativa e pela voz serena do narrador, é também influenciada pelas técnicas utilizadas. O filme

liberdade

ao

professor

imagens

enquanto

para

trabalha

explorar os

essas

conteúdos

previstos.

apresenta as figuras desenhadas em tinta-da-

O conceito de Cultura Visual tem como foco a

china através das silhuetas e sombras num constante jogo percetivo entre a figura e o fundo.

5

As metas de aprendizagem para as disciplinas de Educação Visual e Educação Tecnológica nos 2º e 3º ciclos do ensino básico preveem metas objetivas e definidas para cada nível de ensino.

Apenas duas cores foram utilizadas: o branco e o preto. A voz do narrador e a belíssima música de Tentúgal

adequada

de aprendizagem no domínio das artes visuais têm

sonho do gato? O final em aberto da história a

mais

metodologias aplicadas ou sugeridas. As teorias

sua amada lua? É apenas a materialização do estimulou

forma

108


apropriação, consumo e interpretação de imagens

alargada, com a sociedade. E dentro destas área

visuais em cada cultura, entendendo-as como

surge inevitavelmente o Cinema, que incorpora

fonte de transmissão e de conhecimento. A sua

várias visualidades e reflete, através de diversos

dimensão, por isso, evolui do domínio visual para o

meios e técnicas, sobre a sociedade.

social e cultural. Coloca a ênfase não só na

Nesta perspetiva, o filme “Estória do Gato e da

observação e leitura de imagens, mas também nas

Lua” pode não ser estudado de forma isolada:

posições subjetivas que essas imagens produzem,

pode ser a ponte para a exploração de outras

posição que assume a presença de significados e

formas de arte, como a Arte Contemporânea.

posições discursivas nas imagens e representações visuais.6 Torna-se também inevitável incluir a Cultura Visual no mediatismo da imagem e da informação, dado o novo paradigma das sociedades contemporâneas onde as tecnologias da informação e comunicação se mostram de forma cada vez mais presente e ativa na socialização dos indivíduos desde a infância. As implicações educacionais são inevitáveis, já que a fácil aquisição ou manipulação de imagens e conteúdos pelas crianças e jovens contribui para uma transformação das aprendizagens à qual se juntam as mudanças próprias no desenvolvimento e socialização num mundo com um ritmo mais acelerado. A escola deve estar consciente destas alterações e assumir um papel mais ativo na educação e formação visual. Sendo a Cultura Visual interdisciplinar, a escola pode explorá-la em vários campos e domínios, sendo a Educação Artística uma área privilegiada por abordar questões diretamente relacionadas com a arte, a imagem, e numa perspetiva mais

Atividades para o 2º ciclo Educação Visual e Tecnológica As

propostas

apresentadas

exigem

uma

exploração atenta e objetiva dos aspetos formais e estéticos da obra, além de convidarem à reflexão sobre a narrativa do filme. Procuram partir das imagens do filme para o estudo de uma artista de Arte Contemporânea portuguesa, Lourdes de Castro. Comum a ambas, o estudo das sombras e silhuetas na representação das formas visuais. Apesar da utilização de suportes completamente diferentes, Pedro Serrazina e Lourdes de Castro

recorreram ao valor expressivo das sombras e silhuetas na sua obra. Após o visionamento do filme por uma turma do 5º ano na disciplina de EVT, o mesmo foi discutido com

base

em

algumas

questões.

Qual

a

mensagem do filme? Quais os temas que podemos identificar, no que diz respeito às relações entre os 6

Hernández, 2011

109


sonagens? O que aconteceu no final? A análise

Será uma sombra projetada? Pode ser representa-

técnica e formal foi o próximo passo, através da

da através de um desenho ou pintura e obter-se o

identificação da técnica e materiais utilizados pelo

mesmo efeito?

realizador. Que cores foram utilizadas? Como

A exemplo do filme, a lua parece aqui ocupar um

estão definidas as formas? O que se torna

lugar fundamental. O que estará a figura a fazer

essencial para que consigamos apreendê-las?

perante a imagem da lua?

Elas são formas livres ou geométricas?

A promoção do debate e a troca de ideias introdu-

A identificação das sombras e silhuetas levam à

ziu assim a narratividade na imagem.

descoberta, com a ajuda do professor, de alguns artistas

que

expressivo.

A

as

utilizaram

obra

de

como

Lourdes

elemento de

Castro

caracteriza-se, a partir dos finais dos anos 60, sobretudo pelas formas definidas através de sombras projetadas ou representadas em vários tipos de suportes. A artista alargou o seu estudo com sombras projetadas em performances, ou no teatro de sombras de tradição chinesa. Como introdução, foi visionada uma fotografia de uma performance de Lourdes de Castro, “Teatro de Sombras: As Cinco Estações”, de 1979 (figura 1). Foram colocadas algumas questões aos alunos. Como está definida a imagem da figura humana? Que semelhanças podemos encontrar com as formas representadas no filme?

Figura 1. Lourdes Castro, “Teatro de Sombras: As Cinco Estações”, 1979 110


A proposta lançada aos alunos foi a seguinte: Como representar a “Estória do Gato e da Lua”, igualmente

através

de

silhuetas,

mas

num

diferente suporte plástico? Como contar a história do filme (ou recontar), a partir de técnicas e materiais que foram utilizados por Lourdes de Castro? Um levantamento dos materiais e técnicas

Figura 2. Alunos em trabalho

utilizadas pela artista na representação das silhuetas (Desenho sobre tela ou tecido, projeção direta

de sombras, silhuetas

recortadas em

plexiglas, etc..) foi o passo seguinte. Os alunos têm acesso a várias imagens na internet e mesmo no

youtube,

nomeadamente

os

vídeos

da

performance “Teatro de Sombras: As Cinco Estações”. O filme de Catarina Mourão, “Pelas Sombras”, 2010, é também um excelente recurso.

Os alunos foram divididos por grupos, onde decidiram

a

técnica

ou

material

a

utilizar,

desenvolvendo de seguida um projeto com o objetivo de contar ou interpretar a história do filme. A definição das formas através da silhueta devia estar presente. A multiplicidade de suportes e técnicas utilizadas revelou aos alunos o valor

Figura 3. Alunos em trabalho

expressivo que as silhuetas e sombras podem gerar (figuras 2, 3 e 4). 111


Figura 4. Alunos em trabalho 112


Veja-se o resultado de trĂŞs dos trabalhos (figuras 5, 6 e 7), onde os alunos utilizaram recortes de

papel colorido, em forte contraste com as cores originais do filme. Em trĂŞs quadros, aludindo aos fotogramas de um filme, conseguiram contar a histĂłria unicamente atravĂŠs das imagens: 113


Figura 5. Exemplo de exercício desenvolvido por aluno

Figura 6 Exemplo de exercício desenvolvido por aluno

Figura 7 Exemplo de exercício desenvolvido por aluno 114


Atividades para o 3º ciclo | Educação Visual A visualização da “Estória do Gato e da Lua” numa turma do 7º ano, na disciplina de Educação Visual, permitiu um debate mais aprofundado pelas referências mais consolidadas dos alunos. O filme introduziu os alunos no mundo das sombras e silhuetas; a observação e reflexão sobre as sombras no envolvimento e na arte foi o passo seguinte. Foram abordadas várias formas de utilização plástica da silhueta, como o Cinema ou a Arte Contemporânea. A obra de Lotte Reiniger foi uma referência obrigatória, através dos seus filmes com projeções de sombras chinesas. O modo como as referências antigas podem influenciar obras contemporâneas foi debatido através do visionamento na íntegra da curta-metragem de animação de Andrey Sushkov, "A Invenção do Amor" de 2000, um filme que homenageou as sombras da realizadora. Cumpriu-se assim um dos objetivos essenciais da educação artística e fílmica: o conhecimento e a aprendizagem da história do cinema e das imagens visuais. Na Arte Contemporânea a seleção de obras obedeceu a um critério puramente estético, diferenciado e com uma linguagem facilmente percetível para os alunos. Foram exploradas obras de Kara Walker, Lourdes de Castro, Kumi Yamashita, a dupla Tim Noble e Sue Ester e alguns exemplos na street-art. Durante a apresentação os alunos registaram gráfica e plasticamente no diário gráfico e participaram de modo ativo. Mostraram-se curiosos sobre os artistas apresentados e indicaram exemplos de outras referências no cinema e video-clips. O desafio foi a produção de um objeto audiovisual com a utilização de sombras e silhuetas. A escolha, discutida entre professores e alunos, recaiu sobre o registo fotográfico de sombras projetadas numa superfície. O concurso “Portas Abertas”, promovido pela Fundação Eugénio de Almeida, em Évora,

apelou à participação de todos em qualquer área artística na realização de um trabalho sobre a Inquisição. A ideia seria explorar os valores e conceitos que associamos a essa época específica na História mas que permanecem na contemporaneidade. O resultado final seria apresentado em fotografia num formato A4. O desafio lançado à turma foi simples mas desafiante: traduzir os valores/conceitos em imagens e captá-las em fotografia e vídeo através da técnica das sombras chinesas. Os próprios alunos projetariam o seu corpo, com a possibilidade da utilização de outros adereços. O produto final seria um objeto audiovisual, nomeadamente um filme de animação, além da seleção de alguns fotogramas para o

concurso. Desta forma, partimos das sombras e silhuetas no envolvimento e nas diferentes formas artísticas para o Cinema. Uma situação inversa à apresentada anteriormente nas atividades para o 2º 115


ciclo, mas potencializadora de desenvolver o espírito crítico e criativo dos alunos. No início da atividade foram apresentados aos alunos as palavras que, estando relacionadas com a inquisição, traduzem igualmente valores e conceitos contemporâneos A turma foi dividida em quatro grupos. Cada grupo escolheu uma ou mais palavras e desenhou vários registos sobre uma situação ou imagem que as representasse. A ideia era conceberem uma sequência simples de imagens que traduzissem o conceito.

Os alunos recorreram aos diários gráficos, a folhas A3 e também à fotografia. Alguns sentiram a necessidade de procurar adereços na sala de aula para aproveitar as formas sugeridas na sua projeção. A segunda parte da aula foi dedicada à captação das imagens. Cada grupo dirigiu-se ao local de trabalho previamente montado num canto da sala e fotografou e filmou as sequências. As sombras chinesas ganharam um novo suporte através da câmara de filmar. Foi valorizada a capacidade de superação de obstáculos e resolução de problemas, expressos na necessidade de animar pequenas sequências através do stop-motion.

Veja-se algumas sequências captadas pelos alunos, construídas a partir das palavras sugeridas (figuras 8, 9, 10 e 11): 116


Figura 8. Exemplo de exercĂ­cio desenvolvido por aluno

Figura 9. Exemplo de exercĂ­cio desenvolvido por aluno

117


Figura 10. Exemplo de exercĂ­cio desenvolvido por aluno

Figura 11. Exemplo de exercĂ­cio desenvolvido por aluno 118


Considerações finais A importância do cinema como recurso pedagógico no processo de aprendizagem dos alunos tem sido suficientemente estudada e fundamentada, além de ter sido consecutivamente provada em projetos em contextos educativos formais ou não formais em vários países. As implicações no processo educativo e a visão contemporânea do seu reconhecimento como forma de expressão ideal para fomentar a literacia das imagens na sociedade atual enquadram o Cinema num território privilegiado da Cultura Visual. Só o Cinema reúne várias visualidades nas mais diversas artes e campos. A multiplicidade de conteúdos que pode conter tornam-no um objeto de caráter pedagógico e interdisciplinar,

com

a

vantagem

de

absorver,

muitas

vezes,

os

temas

e

problemas

da

contemporaneidade que envolvem as crianças e jovens. O filme “Estória do Gato e da Lua” e as atividades apresentadas como exemplo mostram uma multiplicidade de formas de exploração de um mesmo objeto fílmico, em diferentes áreas de aprendizagem e níveis de ensino. O cinema tem esta vantagem, a de poder chegar a vários públicos e contextos diferentes, pois possibilita diferentes interpretações a partir das mesmas imagens. Enquanto nos primeiros exemplos o filme é o objeto base para a exploração de conteúdos disciplinares na disciplina

de EVT, propondo-se a realização de trabalhos plásticos com sombras e silhuetas em diferentes suportes, no segundo caso parte-se do filme para um estudo de diferentes formas de representação visual das silhuetas. De uma forma integradora, foi trabalhado o cinema e outras formas de representação visual, contribuindo para a literacia artística e fílmica. Considero ser este o caminho mais adequado para a utilização do cinema como recurso pedagógico. Na sociedade atual absorvemos velozmente diferentes visualidades que nos chegam de diversos meios e suportes, muitas vezes relacionados entre si. Sendo a escola um

reflexo da sociedade, ela nunca poderá ignorar este aspeto; deve, antes, procurar encontrar as melhores e mais adequadas estratégias para desenvolver uma literacia das imagens. 119


Referências Félix, P. (2011). O cinema na escola. Estudo de caso: a disciplina de opção de Cinema no 3º ciclo, no Algarve. Percurso e efeitos no tempo. Faro: Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade do Algarve. Tese de Mestrado (versão policopiada) Gil, I. C. (2001). Literacia Visual: estudos sobre a inquietude das imagens. Lisboa: 70. Mirzoeff, N. (Ed). (2011). What is Visual Culture? The Visual Culture Reader. Nova Iorque: Routledge. Hernández, F. (2011). La cultura visual como invitación a la deslocalización de la mirada y reposicionamento del sujeto. Barcelona: Universidade de Barcelona. http://www.drealg.net/images/BFI-Countries-profiles-JCE.pdf, acedido a 10 dezembro de 2013 http://www.drealg.net/images/BFI-Case-Studies-JCE.pdf, acedido a 10 dezembro de 2013 120


A estética de sentir arte: desafios para a formação de todos até à adolescência e dos seus professores Elisabete Oliveira Pintora. Doutora em Ciências da Educação pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa. Investigadora do Centro de Investigação e de Estudos em

Belas-Artes.

Professora Auxiliar aposentada. Docente, planeadora curricular nacional e formadora de professores no

ensino secundário (1965-2006). Conselheira mundial da International Society for Education through Art / United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (1988-1997). Autora de livros e artigos. Co-fundadora da Sociedade de Professores da Região Centro, da Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual, da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação. Colaboradora com museus e autarquias. elisabeteo@netcabo.pt

Comunicação proferida no 27º Encontro Nacional da Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual: Sentir Arte, decorrido em 16 de Maio de 2015, no Museu de Cerâmica de Sacavém. Resumo Entendemos que a necessidade prioritária em arte-educação é a garantia de uma formação para todos

até à adolescência. Uma tal formação para todos exigirá uma cobertura escolar e professores formados com qualidade. O contributo de museus e centros culturais e das participações dos actores culturais ou artistas visitando as escolas são pertinentes e em muito complementam a formação escolar e o trabalho do professor: Reflectiremos sobre alguns acertos e desafios que esta interacção tem trazido ao sentir arte.

Palavras-Chave Arte; estética; Educação Visual curricular; formação de professores, actores culturais 121


1.Pontos de partida e análise de situação 1.1. A complementaridade escola-centro cultural: interacção/parceria entre escolas e museus/ outros centros culturais Esta estratégia formativa e práticas não garantem só por si aquela cobertura geral e sistematicamente curricular, não devendo substituir-se-lhe. Para que a interacção escola-museu/centro cultural (E-MCC) não resulte em desvalorização da base curricular obrigatória e da formação oficial dos seus professores, a interacção E-MCC não deve influenciar a desresponsabilização oficial da universidade na formação inicial

do professor e o desapoio oficial às acções de formação, recorrendo sistematicamente a recursos só emanados de fontes privadas. Empobrecida a formação oficial dos professores, urge que não continue a ser crescentemente desvalorizada e questionada, ao ponto de, após mestrado de ensino com supervisão universitária, serem exigidas provas de acesso ao ensino, redutoramente formalizadas como testes de um par de horas - aparentemente, um funil para estreitar o acesso a quadros, com poupança financeira que hipoteca a formação nas escolas, dos futuros professores inovadores. 1.2. O que temos e o que precisamos de ter, nos espaços e tempos escolares? A redução do tempo da formação escolar e aumento do número de alunos por turma, obstaculiza o processo de projecto; tendendo a limitar o sentir arte ao visionamento e incorrendo no risco da redução à circum ou extra-escolaridade no currículo obrigatório. É real a ameaça de não ser facultada a necessária sensibilização e preparação dos jovens para a expressão e visão crítica presentes e para futuras vias profissionais ou de pesquisa numerosas, em crescente necessidade e expansão na sociedade contemporânea, da imagem local-global-virtual… 122


1.3. Salas de aula que se afastam do fazer? Apresentamos um caso-exemplo, em que nos parece ser privilegiada uma concepção de aula para ver vs fazer

(figura

1):

Figura 1. Sala Nº 33 de Alfredo Betâmio de Almeida, no Liceu Normal Pedro Nunes - Escola Secundária Pedro

Nunes, Lisboa. 1998 (Esquerda); 2010 (Direita). Fotos Elisabete Oliveira.

No tempo das aulas de Betâmio, esta sala no alto 2º andar do topo direito da fachada do liceu, apenas tinha, além de armário para trabalhos, a mais, as imagens (de arte, principalmente) expostas na parede do lado da porta - onde ainda se vê o chefe do pessoal, Sr. Espadinha; e a secretária maciça do professor, à frente de uma janela alta, com um quadro preto de cada lado, na parede do lado de onde estas fotos foram focadas. A lavagem de pincéis era no exterior, numa pia de pedra no canto à esquerda da janela, no paramar da escada de acesso à porta. Do lado esquerdo da foto, ficava o gabinete, com um grande armário de modelos e outros recursos, ao qual os alunos acediam livremente: espaço onde, aos sábados, Betâmio costumava vir pintar, especialmente desde meados dos anos ’60 aos de ’70, até deixar o liceu para funções como as de Director Geral do Ensino Secundário, e do ITE. (Elisabete Oliveira partilhou esta sala de aula no estágio em’65-’67 e como professora em ’67-’69). Agora, após a intervenção da Parque Escolar, a janela do fundo foi suprimida, a sala mudou de eixo, vindo de trás a principal luz natural, oposta ao quadro electrónico-écran, computaor e data-show, criando-

se uma grande obliquidade de visão na primeira fila; tem mesas em vez de estiradores reguláveis e vê-se um ponto de água em fundo. Não se observam imagens nas paredes. 123


1.4. Vias que encontramos na actual Formação de Professores/Mestrados de Ensino

1.4.1. Mestrado de Educação Artística Exemplo: Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, onde já se concluíram dois doutoramentos nesta área (tabela 1).

Tabela 1. Qualificação para o saber e a acção em sistemas de referência de cultura, educação estética e artística, do Mestrado de Educação Artística da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa 124


1.4.2. Mestrado em Ensino Artístico Exemplo: Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Aplicação mais directa à formação de professores. A nosso ver, não flui uma investigação-acção que, urge, precisará de fundamentar doutoramentos nesta área. A nosso ver, não flui suficientemente uma investigação-acção centrada no próprio ensino e na realização de projecto de trabalho pelos alunos, em escola ou afim, que urge e precisará de fundamentar mestrados mas também doutoramentos nesta área. Nos estudos, carecerá ainda de aprofundar a investigação dos fundamentos do desenvolvimento integral e dos processos e critérios pedagógicos, uma vez que se nos afigura que essas abordagens vêm sendo principalmente descritivas, assinalando-se já, positivamente, uma extensa recolha de casos; ou que privilegiam a crítica sócio-artística – duas tendências que já se vêm observando nos relatórios e exposição de projectos nos Congressos Matéria-Prima, actualmente de alcance internacional, com registo na revista respectiva coordenada por João Paulo Queiroz. O ensino artístico, interagindo com todos os ramos do desenvolvimento humano e o eco-sistema cósmico e da mundivisão, em micro e macro escala, tem um corpus de conhecimento específico, que os seus professores se devem responsabilizar por expandir, aprofundadamente e em actualização contínua: dialógica e recursivamente, partilhar e receber-incorporar conhecimento.

1.4.3. e 1.4.4. Mestrados em Desenvolvimento Sócio-Cultural e em Educação Exemplo: Instituto de Educação da Universidade de Lisboa. Com vastos âmbitos de aplicação, podem não incluir escolas e formação de professores. 2. Conceitos-ferramentas Partimos das concepções de Malinowski sobre cultura, articulando-as com as competências nas dimensões estéticas para sentir arte

2.1. Não basta ver, é necessária a triangularidade-hologramaticidade Malinovski defende um sistema triangular das dimensões: material, humana e simbólica (figura 2). 125


Figura 2. Interpretação esquemática de Elisabete Oliveira à Abordagem à cultura de Malinowski, B. (1968). Une théorie scientifique de la culture (1944). Paris: F. Maspero. 126


Eisner, E. (1972). Educating Artistic Vision. Nova Iorque: MacMillanPublishing Co Inc defendeu um sistema triangular da educação da visão artística, nas dimensões produtiva, crítica e cultural. Já na orientação pedagógica para o desenvolvimento humano, com objectivos, surgiam abordagens triangulares: - com progressividade, e inovadora, em Eisner: imitação - 2º grau ou de design - expressão; - e, convergentemente por Landsheere, G. (1976): mestria ou reprodução - transferência - expressão. Na espiral (des)contínua do evolver da arte-educação, recorde-se que Dewey, J. (desde os anos 30 e1966) criticara a experiência escolar reduzida à exercitação, defendendo a arte (sentir arte?) como experiência, e que Freinet, C. (anos 40 e escola-mãe, de Vence, anos 60) aplicava uma metodologia do trabalho. Em Oliveira, E. (2010), reflectimos sobre a energia dialogante que emanou, por exemplo, de Bubber (1958): integradora, com sucessivos pensadores-investigadores-actores, veio a abraçar os dualismos e os opostos, por exemplo, com Bono, E. (1970) a defender a complementaridade dos pensamentos lateral e

vertical, e Morin, E. (1977) a explicitar que tudo tem a ver com tudo, desembocando na bordagem à complexidade (1990 incluindo a triangulação, por exemplo, em diálogo - recursividade – hologramaticidade e na visão do século XXI como um religar dos conhecimentos (2001). Barbosa, A. M.(1987), apresenta uma a proposta ou abordagem triangular, base dos currículos escolares e estudos ertísticos no Brasil, nas dimensões: fazer (praticar arte), apreciar (saber ler - analisar, interpretar, julgar - uma obra de arte) e contextualizar (conhecer o contexto histórico). Especificamente,

esta abordagem é mais aprofundada em Barbosa, A. M. & Cunha, F. (2005) e é evocada a sua contextualização, por exemplo, em Barbosa, A. M. (2014), p. 22, com uma referência na badana final, por Azevedo, F.. Em Portugal, a conceptualização integradora e ultrapassagem dos dualismos afirmou-se em obras como as de Abel Salazar ou Bento de Jesus Caraça. Oliveira, E. (1981), publica (com alguma resonância conceptual de Malinowski) um construto triangular das dimensões da educação estética visual (EEV): material (função tecnológica), social (função comunicativa) e ontológica (função de organização-de-vida). E, ao analisar, caracterizar e documentar os períodos do evolver da EEV no currículo escolar de todos os 127


portugueses (escolaridade obrigatória, especialmente na adolescência, até ao actual 9º ano), dos anos 40 até 2010, concluiu que só se acentuou a passagem do exercício para o trabalho de projecto pela segunda metade dos anos ’70, salvo o pioneirismo de professores como João Martins da Costa (1955?), e deste para o projecto de trabalho, nos anos 80. Desde Oliveira, E. (1981) e, mais extensamente, na sua tese de doutoramento (2004-05) e em 2010, enunciámos o seguinte conceito operacional de estética: orientação da energia (transformadora) para a

qualidade, ao (re)criar ou apreciar forma. Quanto a qualidade, provisoriamente, remetemos para o conceito de qualia, em Peirce, C. (1958), que operacionalmente interpretamos como caracter da forma, e consi-deramos que forma compreende tudo o que o homem encontra, vê, em que repara, ou (re)cria, expressan-do-se e inter-agindo. Explicita-se em seguida, sinteticamente (figura 3):

Figura 3. Conceito de competência e âmbitos estruturantes da uma educação estética visual básica para todos, por Elisabete Oliveira. Comunicação: The Structure of a Basic Visual Aesthetic Education. In: Report-INSEA, Rotterdam: 24th INSEA WORLD CONGRESS. 1981 128


2.2. A criatividade. As 13 ferramentas do pensamento da criatividade e os (pelo menos) 8 tipos de

inteligência caracterizados por Howard Gardner Na nossa investigação chegámos à seguinte compreensão do processo da criatividade (figura 4):

Figura 4. Síntese do processo da criatividade, por Elisabete Oliveira.

A investigação contemporânea tem facilitado uma visão mais integradora do pensamento para a

criatividade, como nas 13 ferramentas apontadas por Root-Bernstein, Robert & Michèle. Sparks of Genius (1999): (1) Observing; (2) Imaging; (3) Abstracting; (4) Recognizing patterns; (5) Forming Patterns; (6) Analogizing; (7) Body Thinking; (8) Empathizing; (9) Dimensional Thinking; (10) Modeling; (11) Playing; (12) Transforming; (13) Synthesizing. E recordamos os 8 tipos de inteligência múltipla caracterizados por Howard Gardner (1996): (1)Naturalista; (2) Corporal cinestésica (3); Verbal-linguística; (4) Lógico-matemática; (5) Visual-espacial; (6) Musical; (7) Interpessoal; (8) Intrapessoal. Num Congresso no Pompidou Centre, em Paris, em 2007, onde ambos conferenciámos, na discussão da comunicação de Gardner perguntámos-lhe se a melhoria 129


num dos tipos de inteligência implicava uma subida nos outros. Respondeu-nos que a sua investigação não garantia essa relação. 3. Investigação sobre expressão não condicionada, design e apreciação de formas visuais A razão de ser da pergunta anterior tem a ver com a verificação do seguinte, nesta nossa investigação de uma amostra nacional de 155 respondentes (1990-92, na sequência de uma investigação-piloto) de regiôes portuguesas contrastantes (norte-litoral, Aveiro / sul-interior, Beja / grande cidade, Lisboa / cintura industrial, Seixal), com alunos (F e M) desconhecidos e o critério de recolha: 6 alunos por turma, 3 escolhidos pelo/professor/a incluindo o pior, médio e o melhor e os restantes 3, ao acaso. Para a apreciação foram expostos três cartazes, de Chagall, Popologia e Mostruário de Tintas. A análise foi por SPSS e aferida pelo Método dos Juízes (figuras 5 e 6).

Figura Sentir Níveis

5. arte: de

desenvolvimento da apreciação. In: Oliveira, E. (2010) e Oliveira, E. In: Matéria Prima 4 - Nº 2 - Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. 2015. 130


Figura 6. Da investigação dos (7) níveis de desenvolvimento global em Educação Visual. In: Oliveira, E. (2010) e Oliveira, E. In: Matéria Prima 4 - Nº 2 - Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. 2015. 131


Nesta investigação, em que identificámos e caracterizámos 7 níveis de desenvolvimento global em

Educação Visual, constatámos que só se verificava associação significativa entre os resultados nas 3 modalidades pesquisadas, se se tratava de respondentes com alto nível de desenvolvimento. Nos restantes respondentes, essa associação verificou-se entre os resultados em expressão não condicionada mas não com a apreciação. Principais conclusões: (1) tendo sido caracterizados 7 fases de desenvolvimento global (figura 5), consideramos que há uma

avaliação pelo professor, possível e necessária, do grau de desenvolvimento estético em que se situa o jovem, nela devendo basear-se a orientação deste para a progressão possível, a partir da sua motivação; (2) a verificação da não garantia de progresso numa forma de expressão quando outra se eleva, implica que são necessárias experiências complementares, em formas diversas de expressão; (3) a verificação de a fase de autonomia no critério crítico só ser atingida pela adolescência (final do 9º ano), implica que a base de uma Educação Estética Visual para todos tem de chegar a esse nível, tendo

de ser garantida, portanto, até ao fim do 9º ano da escolaridade obrigatória. Depois, até ao 12º ano, haverá opções, já não cobrindo a totalidade dos jovens e, a esse nível, será desejável a criação de uma disciplina para todos, mas em Cultura. 4. Casos de acerto/inovação em projectos escolares de 2014-2015 em Educação Visual (escolas ou parcerias) com centros culturais portugueses: âmbitos (1) a (11), alguns em interacção (figuras 7 e 8) Investigação de Elisabete Oliveira para o Exploratório da Educação Artística da Universidade de Lisboa (em preparação). 132


1). Tecnologias

Figura 7. Ensaios tecnológicos. Homembichoterra. A partir da obra de Graça Morais. Abril 2015. Agrupamento de Escolas Emídio Garcia, Bragança. Autora junto da sua obra. Foto: Elisabete Oliveira. Figura 8. Cerâmica. Orientação e foto: José Miguel Gervásio. Escola Secundária de Montemor-o-Novo.

(2). Quotidiano / Acaso / Ciência - interdisciplinaridade com a ciência (figura 9)

Figura 9. Uma Mentira Cósmica e outros Calhaus. Fundação Calouste Gulbenkian: Projecto 10x10. Professora Ana Pereira. Escola Secundária D. Dinis, Lisboa – 10º Aº. Colaboração: Miguel Horta. Fotos: Elisabete Oliveira. 133


(4). Design (figura 10)\

Figura 10. Alteamento ergonómico de peça de equipamento. Orientação e foto: professor José Miguel Gervásio. Escola Secundária de Montemor-o-Novo. Protótipo dos Alunos: adaptação às suas necessidades ergonómicas, do equipamento recebido da modernização oficial do es-paço escolar.

(3)

Instalação / (5) Património/História de Arte / (6) Eco-intervenção / (11) Interacção local-global (incluindo arte urbana) (figura 11)

Figura 11. A partir da obra de Graça Morais. Mural e instalação. Agrupamentos de Escolas Abade Baçal e Miguel Torga. Bragança. Um dos autores junto da sua obra. Fotos: Elisabete Oliveira. 134


0) Interacção escrita/poesia (figura 12)

Figura 12. Projecto Do meu caderno. Fundação Calouste Gulbenkian: Projecto 10x10. Professora Isabel Machado. Escola Secundária das Caldas de Taipas, Guimarães. 10º Aº. Colaboração João Girão. Foto: Elisabete Oliveira.

(7) Carácter / Desenvolvimento inter-pessoal, social / (8) Performance / (9) Interacção cinema/teatro (figuras 13, 14, 15 e 16)

Figura 13. Cinema e Fotografia. Filhos de Lumière. Escola Secundária de Serpa. 2015 Figura 14. Educação Física e Geografia. Escola Secundária Patrício Prazeres, Lisboa. 135


Figura 15. A Borboleta e a Flor. Agrupamento de Escolas Prof. João de Meira, Guimarães. Foto: Elisabete Oliveira.

Figura 16. O vôo do Monte (pormenor). Largo da Sé de Bragança. Foto: Elisabete Oliveira. 136


5. Pontos de questionamento e lista de conceitos fundamentais a actualizar continuamente

Pontos para reflexão/investigação-acção contínuas relevantes para o professor e alavanca para o desenvolvimento dos alunos: - questionamento – em vez de modelo, referencial - consciência – responsabilidade cultural/educacional - competência tecnológica – ferramenta, massagem/mensagem

- diálogo-hologramaticidade – interconectividade e abdução - recursividade – relação pedagógica empática - metodologia de solução de problemas – projectos de trabalho - além-transmissão – dinamizar o processo criativo - auto-eco-compatibilização – actualização contínua, do local ao global, sociedade do conhecimento, fazer acontecer o necessário, o currículo de educação EEV para todos até ao final da adolescência Alguns conceitos fundamentais: - educação estética / educação artística – Herbert Read, Irena Wojnar, Louis Amaud Reid, Alfredo Betâmio de Almeida, Arquimedes da Silva Santos, Madalena Perdigão, Elisabete Oliveira - qualia – Charles Peirce, António Damásio - autonomia, criatividade, fluir – Michael Parsons, Mihalyi Csikszentmihalyi - aprendizagem – Jean Berbaum - objectivos educacionais expressivos – Elliot Eisner - diálogo – M Buber, C Rogers - complexidade (diálogo, recursividade, hologramaticidade) – Edgar Morin - consciência e sinapses – Karl Pribram, António Damásio - expansão em rizoma – Gilles Deleuze - inteligências múltiplas – Howard Gardner - cultura – Paulo Freire, Bronisław Malinovsky, Gilles Lipovetsky - cultura visual – Elliot Eisner (educação crítica, cultural e produtiva), Fernando Hernández - decisão na emergência – Philippe Perrenoud 137


- design / indústrias criativas – Ken Baynes, António Sena da Silva - cidadania e globalização – Eduardo Lourenço, Adriano Moreira, António Nóvoa - cibercultura e inteligência colectiva – Pierre Levy - teleantropos (e arquitectura virtual, pioneiro da 2nd life virtual) – Emanuel Pimenta - arte robótica – Harold Cohen, Leonel Moura - trans-humano e pós-humano – Natascha Vita-More - interterritorialidade e transculturalidade – Ana Mae Barbosa, Lillian Amaral - ecologia – Viriato Soromenho-Marques - auto-eco-compatibilização – Elisabete Oliveira - mestre ignorante (não transmissor mas autonomizante) – Jaques Rancière 138


El arte como vehículo de conocimiento Sara Torres Vega Investigadora en Educación Artística en la Facultad de Bellas Artes de la Universidad Complutense de Madrid. Combina su investigación en educación en museos con su labor de coordinación de las actividades educativas del Museo Pedagógico de Arte Infantil. storresvega@gmail.com Este artículo es el resultado de una charla impartida en el curso “A arte contemporânea como recurso interdisciplinar”, en el Culturgest de Lisboa, el 5 de Abril de 2014. Resumen El arte como vehículo de conocimiento propone una serie de reflexiones en torno a la relación histórica del arte y la educación. Dentro del contexto de MuPAI (Museo Pedagógico de Arte Infantil), tenemos una forma de afrontar esta relación a través de los talleres que desarrollamos. Lo hacemos a partir del conocimiento de que, en muchos casos ha sido, es y sigue siendo una relación con resultados positivos para aquellos que han sido protagonistas y testigos de los encuentros entre las dos disciplinas. Después, describimos el proceso que conlleva que arte y educación trabajen juntas. Este proceso está íntimamente ligado con el tiempo que se invierte en desarrollar esta relación y, a través de hacer que estas dos disciplinas, en lugar de estar aisladas, pasen a ser híbridas. Finalmente, describimos cómo en el MuPAI se produce lo que llamamos la remezcla creativa que consiste en el desarrollo de una serie de talleres en los

que arte y educación van de la mano, utilizando el Método MuPAI como estructura básica. Palabras clave: arte; educación; museo; método; MuPAI 139


-1. INTRODUCCIÓN

En algún momento de la historia, algún filisteo o grupo de filisteos que ocupaba una posición de poder decidió aislar el arte de la educación y degradarlo, de la metadisciplina del conocimiento que había sido a la disciplina y artesanía que es hoy. (Camnitzer, 2009) Y desde ese momento, educación y arte caminaron en trayectorias paralelas. De vez en cuando, el arte miraba de reojo a la educación y la educación espiaba al arte. Pero sus miradas, nunca se encontraron. En este texto, arte y educación serán invitados, libres de prejuicios y al mismo nivel de importancia, para un encuentro cara a cara. En un primer momento, viviremos la extrañeza inevitable que produce un encuentro con un desconocido, que poco a poco se da cuenta de que comparte lugares, personas y preocupaciones comunes. Este momento de conocimiento será seguido por un tiempo para el proceso: ¿cómo se relacionan estas disciplinas separadas durante tanto tiempo? Estudiaremos experiencias en las que arte contemporáneo y educación han colaborado en favor de objetivos comunes. Y todo ello ha llevado como consecuencia inevitable a una remezcla creativa. En esta remezcla, profesores y estudiantes se convierten en intelectuales transformativos. Y los artistas, se ven atraídos hacia el mundo de la educación. Y quizá, después de este cruce de miradas, arte y educación se den cuenta de que, como escribió Luis Camintzer, "no hay verdadera educación sin arte, ni verdadero arte sin educación". 2. CONOCIMIENTO 2.1. FIN DE UNA HISTORIA DE AMOR: DIVORCIO ENTRE ARTE Y EDUCACIÓN Es triste empezar a hablar de una historia de amor por el momento en el que esta se rompe. Por ello, queremos ir un poco atrás en este idilio entre el arte y la educación, para atisbar mínimamente los momentos de dicha que ambas disciplinas vivieron juntas. No sabemos el momento preciso en que arte y educación se conocieron. Sin embargo, podemos imaginar dónde. Y podemos imaginarlo porque hubo un momento en la historia en que todas las disciplinas habitaban en el mismo lugar. Este lugar no es otro que el árbol del conocimiento. La metáfora tradicional del árbol del conocimiento acentuó durante siglos las conexiones entre las diferentes ramas y campos. Esto posibilitó que dentro de este árbol habitaran de

manera natural las artes, las ciencias y las letras. Siendo conscientes de sus diferencias, cada una vivía en una rama diferente, pero al igual que en un bloque de pisos, si el arte salía al rellano o las ciencias 140


cogían el ascensor, inevitablemente coincidían con frecuencia. De estos encuentros surgían relaciones, afectos y fricciones. Quién sabe si de estos encuentros accidentales surgió de manera natural, el amor entre el arte y la educación. Lo que sí conocemos son algunas de las consecuencias de esta relación. Viajamos a Indonesia para encontrarnos con una figura muy importante en la historia javanesa que partía de la base de que “Poeta y sacerdote eran uno al principio, y sólo en tiempos posteriores se separaron. Pero el verdadero poeta es siempre sacerdote, del mismo modo que el verdadero sacerdote ha permanecido siempre poeta. ¿Y no

debería el futuro hacer renacer la antigua condición?”. Entendiendo al poeta como un artista y al sacerdote como el transmisor del conocimiento (divino o no), encuentro un nexo de unión entre esta cita de Novalis (Mahony Stoljar, 1997, p. 36) y la función del Dhalang en la tradición del teatro de sombras javanés. Y de alguna manera, todo habla del que posee un conocimiento y debe transmitirlo a los demás. Estamos hablando, por tanto, del docente que utiliza una técnica artística para llevar a cabo su función principal: transmitir el conocimiento. Volviendo a Europa, en el Renacimiento son de sobra conocidos los artistas en cuyo taller formaban a aquellos que habrían de ayudarles a realizar sus obras. Esta situación tiene su punto álgido con el cambio de mentalidad, que sale de la rígida estructura corporativa medieval y se integra en un nuevo sistema de mercado artístico, asumiendo como propio el juego de la oferta y la demanda. Y ante la gran demanda, la solución fue la organización del taller, como medio más general de la producción artística. Estos talleres tenían una actividad constante incluso en ausencia del maestro e incluso, a la muerte del artista, eran los alumnos lo que pasaban a hacerse cargo del taller (Nieto & Checa, 2000, p. 29). Y esta relación entre artista y maestro ha continuado hasta nuestros días, aunque poco a poco, el arte ha ido siendo apartado. Sin embargo, a partir del siglo XIX, los habitantes del árbol del conocimiento fueron realojados a otro tipo de habitáculos. Estos habitáculos son cajones oscuros y sin ventanas. Los que allí habitan viven aislados y los habitantes se llaman expertos. A partir del siglo XIX, el árbol fue sustituido por una metáfora política que hacía hincapié en la autonomía disciplinaria. En algún punto de este cambio, arte y educación se separaron, puesto que lo que durante mucho tiempo había sido una relación natural, con la especialización se convirtió en una relación imposible. Sin embargo, a continuación veremos cómo, a pesar de las dificultades, algunas pedagogías han intentado generar el ambiente propicio para un reencuentro. 141


2.2. MIRADAS FURTIVAS ENTRE ARTE Y EDUCACIÓN Pese a que arte y educación fueron separadas, sabemos que nunca dejaron de vivir completamente la una al margen de la otra. Incluso, en algunos entornos propicios, podría decirse que arte y educación se relacionaban como si nada hubiera cambiado. Este es el caso de las escuelas Reggio Emilia o el sistema Montessori. Y estas escuelas mamaban a la vez de otras fuentes que también creían en la unión entre el arte y las experiencias de la vida cotidiana, entre ellas la educación. Ejemplo de ello son Dewey y la Bauhaus, con su rechazo de los mitos sublimes

del arte, Pierce, Wertheimer, Brunes, Piaget, Arnheim, Gombrich, Read, Lowenfeld, Klee, Mondrian, Magrutte y también Luria, Vigotsky, Wallon… (vvaa, 2005, p.88) Pero pese a que eran numerosas las voces que clamaban por un reencuentro, los sistemas educativos no alteraban las divisiones disciplinarias. Sin embargo, creemos que un reencuentro es posible. Aunque no será sencillo ya que, al haber estado separadas tanto tiempo, han perdido la costumbre de trabajar en equipo. 3. PEDAGOGÍAS DEL REENCUENTRO, ¿ES POSIBLE UNA RECONCILIACIÓN? En el momento presente, encontramos una serie de diferencias entre arte y educación a las que debemos enfrentarnos para que estas dos disciplinas vuelvan a trabajar juntas. Para empezar, arte y educación llevan tanto tiempo separadas que ha comenzado a hablar idiomas diferentes. El arte habla el idioma de las micronarrativas y la educación habla el idioma de las macronarrativas. Entendemos las macronarrativas como el discurso de los que ostentan el poder y las micronarrativas comoel discurso de los que no lo ostentan. Desde la aproximación que tiene la educación a la asignatura de arte, debemos ser conscientes de que la mayoría de ejemplos visuales que utilizamos, son imágenes producidas por el poder. Sin embargo, el arte contemporáneo se caracteriza por producir imágenes que cuestionan este discurso. Por tanto, para que arte y educación se unan, la educación debe incorporar micronarrativas visuales, es decir, imágenes que no se provengan de una producción blanca masculina y heterosexual, para ofrecer al estudiante una visión que fomente su sospecha de los mundos visuales que le rodean (Merodio, 2004, p.54). En segundo lugar, tanto profesor como artista encarnan roles que, a priori, no tienen nada en común. Es por ello que para que arte y educación se unan, estos deben cambiar para aproximarse el uno al otro. 142


Estos nuevos roles son:: 

Educadores como intelectuales transformativos. Según Giroux, los intelectuales transformativos necesitan desarrollar un discurso que conjugue el lenguaje de la crítica con el de la posibilidad, de forma que los educadores reconozcan que tienen la posibilidad de introducir algunos cambios. En este sentido, los intelectuales en cuestión tienen que pronunciarse contra algunas injusticias económicas, políticas y sociales, tanto dentro como fuera de las escuelas. Paralelamente, han de esforzarse por crear las condiciones que proporcionen a los estudiantes la oportunidad de

convertirse en ciudadanos con el conocimiento y valor adecuados para luchar con el fin de que la desesperación resulte poco convincente y la esperanza algo práctico. Por difícil que pueda parecer esta tarea a los educadores, es una lucha en la que merece la pena comprometerse. Comportarse de otro modo equivaldría a negar a los educadores la oportunidad de asumir el papel de intelectuales transformativos. (Santiago, 2004, p.76) 

Educadores como artistas. Victor D’Amico (1958), primer director del departamento de educación del MoMA, se quejaba en la revista School Art que “siempre se les dice a los educadores qué deben hacer y qué no deben hacer. Pero rara vez se les reconoce como artistas produciendo el mayor logro imaginable: seres humanos de gran riqueza cultural”. Pese a que fue en 1958 que Victor D’Amico escibió esto, este reconocimiento aún no ha llegado a los educadores.

Educador como Dj. Para Borriaud (2005, p.18), las actividades de los Djs se catacterizan por la invención de caminos através de la cultura. El DJ activa la historia de la música al cortar y oegar distintos fragmentos procedentes de diferentes fuentes. Y eso es lo que hace un educador que, dentro de los contenidos que debe impartir, decide cómo hacerlo de manera que sus alumnos puedan asignarles sentido.

De la decoradora ocasional a la activista permanente (Acaso, 2013). Es práctica generalizada que en los centros de enseñanza haya momentos puntuales en los que el profesor de arte se convierte en imprescindible. Estos momentos habitualmente son Navidad y el festival de fin de curso. En esos momentos, se espera del profesor de arte que decore el centro de manera que la comunidad escolar pueda disfrutar de una nueva imagen de centro más relacionada con las festividades. El papel del educador queda reducido al de decorador ocasional. Consideramos importante que esto cambie para que el educador pase a formar parte integral de las actividades desarrolladas a lo largo de todo 143


el año, y no únicamente dos días al año. Este es el caso de aeioTU, una empresa dedicada a la educación en la primera infancia en Colombia que, como un miembro más de la comunidad educativa, cuenta con un artista en residencia. 3.1. PROCESO Una vez que arte y educación se han reencontrado y tras hablar han descubierto que han desarrollado idiomas y lenguajes diferentes y que tendrán que asumir nuevos roles para salvar esas diferencias,

pasamos la siguiente fase que es la que habla del proceso: de cómo se va a desarrollar esta relación. En primer lugar, para que esta relación se desarrolle plenamente, debemos planificar a largo plazo. No podemos esperar de ninguna relación profunda que se produzca de manera acelerada. Esta es una idea extraída de los movimientos slow. Estos movimientos proponen alternativas a los ritmos de vida extremadamente acelerados a los que nos abocan el productivismo y el consumismo con una valoración monetaria permanente de los usos del tiempo en términos de coste de oportunidad (vvaa, 2008, p. 412). En segundo lugar, arte y educación deben pasar de ser disciplinas aisladas a ser disciplinas híbridas. Y es aquí donde cada educador debe invitar a aquellas disciplinas con las que piense que puede crear un clima propicio para el aprendizaje. 3.2 REMEZCLA CREATIVA Finalmente, vamos a describir algunos proyectos producto de esta relación entre arte y educación. En la selección de estos proyectos hemos intentado que fueran representativos de diferentes medios y técnicas utilizadas en arte contemporáneo. El contexto en el que estos proyectos han sido desarrollados ha sido el MuPAI (Museo Pedagógico de Arte Infantil). Este museo forma parte del Departamento de Didáctica de la Expresión Plástica de la Universidad Complutense. En este museo, nos encontramos a medio camino entre el arte y la educación, entre la investigación y la práctica diaria y entre la educación formal y no formal. Todos estos talleres se desarrollaron en base al método MuPAI. Este método, desarrollado por los educadores del museo se articula en torno a cuatro fases: Fase 1- Apreciación: Se diseña el recorrido de apreciación de las obras seleccionadas: Visita real en el caso de el taller esté basado en una colección o exposición real Visita virtual articulando obras de artistas contemporáneos relacionados con el tema del taller en el aula 144


Fase 2- Producción Una vez comprendidos los conceptos generales y vistos los artistas que los representan, se pasa a diseñar la fase de producción. En este caso se harán dos cosas: 1. se prolongará la actividad de apreciación para establecer la conexión con la etapa anterior (power point) 2. diseñará una actividad en relación con el tema elegido procurando seleccionar materiales y técnicas que estén en relación con los materiales y procedimientos con los que trabajan los artistas hoy (microrrelatos) Fase 3 Debate Crítico Realizado el taller, se diseñará un debate de tal manera que se pongan en común los productos realizados y se fundamente y debata su proceso de realización y la transmisión de significados en público Fase 4 Reflexión La última parte del taller consiste en una serie de actividades de reflexión sobre el mismo: reflexión sobre lo aprendido y evaluación del taller por parte de los asistentes (vínculo poder-saber) (Antúnez, 2008, p.449) A continuación describimos cinco talleres en los que se puso en práctica el método MuPAI y en los que arte y educación estaban presentes con un objetivo común: ofrecer una experiencia de creación a un grupo de participantes. 3.2.1 VIDEO ARTE: PIXILACIÓN Esta actividad formó parte del programa de verano del MuPAI y los participantes eran de 3 a 5 años de edad. La propuesta hecha a los participantes consistió en la realización de un video en el que los objetos

cotidianos pudieran dejar de ser elementos pasivos, para convertirse en activos que interactuaran con ellos (ilustración 1). Fase 1. Apreciación En esta primera fase, nos acogimos a la posibilidad de realizar una visita virtual a partir de imágenes de artistas, como Jan Švankmajer o Blu. Después de reflexionar sobre cómo se producen estos artistas su obra, pasamos a la fase de producción. Fase 2. Producción

En esta fase cada participante eligió un objeto que fuera parte de su vida cotidiana y con la técnica de la pixilación le atribuyó un movimiento. 145


Ilustraci贸n 1. Secuencia de fotograf铆as que ilustra el proceso de pixilaci贸n. Fotograf铆as de Azahara Algar Martos 146


Fase 3. Debate Crítico Durante el debate crítico pusimos en común los productos realizados y cada participante explicó la razones que le habían llevado a la elección del objeto y el proceso de creación. Fase 4. Reflexión y evaluación del taller La reflexión tuvo lugar durante la visita a la exposición Mèlies. La magia del cine, celebrada en el Caixa fórum de Madrid. Durante esta exposición tuvimos la oportunidad de recordar el proceso llevado a cabo durante la fase de producción.

La evaluación de la actividad fue muy positiva tanto por parte de los participantes como por parte de los educadores. En cuanto al aprendizaje de los participantes, comprobamos que, pese a que eran capaces de explicar el proceso y las decisiones que tomaron, al ver el resultado, muy pocos podían relacionar proceso y resultado. 3.2.2 INTERVENCIONES: HABITAR EL MUPAI Este taller consistió en hacer una visita a la facultad de Bellas Artes de Madrid (Universidad Complutense) y hacer que los participantes se preguntasen sobre los signos de que el edificio estaba habitado (ilustración 2). Fase 1. Apreciación A través de la obra de Andy Goldsworthy, Isabel Carralero, Essi Kausalainen o Ernesto Neto entre otros, introducimos a los participantes en el concepto de habitar y cómo están implicados los espacios, el cuerpo y el tiempo en el proceso. Fase 2. Producción Los participantes realizaron una visita de exploración de la Facultad de Bellas Artes para observar de qué manera podrían ellos dejar huellas de su estancia de un mes con la alteración del espacio y a través del cuerpo. Fase 3. Debate Crítico Los participantes reflexionaron sobre el espacio, el tiempo, el cuerpo y cómo todos ello influye en la experiencia de habitar. Con las zonas intervenidas, organizaron una visita guiada para personas que no tenían nada que ver con la facultad. Fase 4. Reflexión y evaluación del taller 147


Durante la reflexión se trataron temas diversos como la ocupación de lugares públicos con y sin autorización, los derechos de los ciudadanos por el simple hecho de vivir en un lugar y las posibilidades de cambio existentes en sus contextos concretos.

Ilustración 2. Intervención realizada en la facultad de Bellas Artes de Madrid. Fotografía de Henar Cruz 148


3.2.3. ARCHIVO: MECHIVE meCHive es un proyecto de creación de un archivo de educación en museos. Este archivo se ajusta al modelo de archivo participativo que se crea con las experiencias educativas que tienen lugar en diferentes museos. Este archivo tiene por objetivo hacer más visibles los proyectos educativos que tienen lugar en los museos así como los proyectos de investigación, reflexionar sobre la participación tanto durante la actividad como en el propio formato de archivo y crear una herramienta de formación para futuros educadores. El soporte de este archivo es, por un lado online, y por otro como dispositivo de exhibición en la sala del museo. El taller al que nos vamos a referir aquí consiste en la formación de futuros educadores a través del archivo online (ilustración 3). Fase 1. Apreciación En esta fase, nos concentramos en lo que habitualmente se entiende por archivo como organismo que preserva las secreciones de una institución y lo comparamos con la interpretación que algunos artistas han hecho de este concepto. Por otro lado, dimos información a los educadores sobre la evolución

histórica de la profesión, lo que se entiende por investigación en educación en museos, la evaluación y las distintas tendencias en la profesión. 149


Ilustraci贸n 3 Esquema realizado por los participantes durante una de las sesiones de meCHive. Fotograf铆a de Sara Torres 150


Fase 2. Producción Esta fase consistió en, una vez habían comprendido el funcionamiento del archivo online, la aportación por parte de los educadores de información sobre los programas implementados en las distintas instituciones de la ciudad de Madrid. Fase 3. Debate Crítico Cada participante planteó una reflexión sobre cómo los ve la sociedad, como los ve su familia, cómo los ve la institución, cómo se ven a sí mismos y cómo son realmente. Esto fue expresado en un formato visual estilo meme y difundido en redes sociales como facebook, con el fin de ampliar el debate a una comunidad más amplia. Fase 4. Reflexión y evaluación del taller La reflexión final estuvo marcada por las dificultades que las instituciones plantean a la hora de hacer público las cuestiones a mejorar de los programas educativos. También fue un punto relevante el hecho de que los educadores carecen de tiempo para hacer una reflexión profunda de lo que están haciendo. Por esta razón, pese a que la evaluación por parte de los participantes fue muy positiva, los objetivos de tener un número de reflexiones acerca de los programas que los educadores implementaban no fueron satisfechos. Tan sólo una minoría de los participantes llegaron a realizar esta tarea. 3.2.4. PERFORMANCE: FLASH MOB

Este taller surge dentro del programa de verano de 2013 del MuPAI, por la preocupación por la ausencia de la danza en la Facultad de Bellas Artes de Madrid. Por ello, con participantes de 3 a 13 años, decidimos organizar una serie de talleres que mezclaran la danza con el resto de las artes. El taller que vamos a describir, surgió de la posibilidad de introducir la danza en la vida cotidiana de la comunidad educativa de la facultad (ilustración 4). Fase 1. Apreciación En esta fase mostramos a los participantes diferentes piezas de video de diferentes colectivos artísticos

que utilizan la danza y la performance para plantear reflexiones que se salen del quehacer cotidiano, poniendo especial énfasis en aquellos que utilizan lugares públicos para hacerlo. 151


Fase 2. Producción Los participantes diseñaron una performance que podríamos relacionar con el movimiento flash mob. Este flash mob tuvo lugar en la cafetería de la Facultad de Bellas Artes, lugar de encuentro para trabajadores y estudiantes. A las 11 de la mañana, poco a pocose fueron incorporando los participantes a una coreografía grupal que terminó con la participación de algunos de los trabajadores y estudiantes. Fase 3. Debate Crítico Los participantes explicaron cómo se habían sentido al utilizar un espacio destinado a otra cosa como lugar para la danza. Consideraron de gran importancia la capacidad de cambio del espacio a través del comportamiento de las personas. Fase 4. Reflexión y evaluación del taller Tanto participantes como educadores consideraron que el taller había sido una experiencia positiva para ellos. No obstante, a pesar de que hubo entusiasmo por parte de los que habían presenciado la performance, los participantes expresaron cierta decepción por la falta de participación de los testigos de

la performance. A partir de esta reflexión se generaron distintas propuestas para mejorar el hecho de que pocos miembros de la audiencia se sintieran invitados a tomar parte activa en la performance. 152


Ilustración 4. Fotografía tomada durante uno de los talleres de performance dentro del programa Vacaciones

de Colores 2013. Fotografía realizada por Raquel Domínguez 153


154


4. CONCLUSIONES Después de haber visto de qué manera arte y educación fueron separadas y cómo en momentos y lugares han sido una misma cosa, resulta triste para esta relación la situación que se vive en algunos países, entre los que se encuentra España, en los que el arte está perdiendo cada vez más importancia en los periodos de formación obligatorios. Por ello, hemos creído necesario escribir esta reflexión que no sólo va dirigida a los sistemas educativos o a los profesores, sino también a los artistas. Como en una relación amorosa, el fracaso es cosa de dos, y los artistas tienen responsabilidad en la situación que vivimos actualmente. Por ello, en el MuPAI, que ocupamos un lugar dentro de la Facultad de Bellas Artes de Madrid y, gracias a ello, trabajamos en contacto constante con artistas. Para los que trabajamos en este contexto tan particular, arte y educación son lo mismo. El MuPAI, como museo, se estructura como departamento educativo en su totalidad y, dentro de este, se articulan el resto de funciones básicas del museo. Sin embargo, al conocer otros contextos, nos damos cuenta de que es necesario pararse a reflexionar sobre que, si bien esto es para nosotros parte de nuestra identidad como institución, para otros es un

complemento a la formación. Y darnos cuenta de que cuando arte y educación trabajan juntos, ampliamos nuestras posibilidades de aprendizaje hacia lo inesperado. 155


4. REFERENCIAS Acaso, M. (2013). De la EDUpoética a la mediación líquida: recuperando el lenguaje visual como herramienta de mediación en las instituciones culturales. (Web Log post). Recuperado de http:// mariaacaso.blogspot.co.uk/2013/11/2013-de-la-edupoetica-la-mediacion.html Antúnez, N. (2008). Metodologías radicales para la comprensión de las artes visuales en primaria y secundaria en contextos museísticos en Madrid capital (Tesis doctoral inédita). Departamento de Didáctica de la Expresión Plástica. Universidad Complutense de Madrid Borriaud, N. (2005). Postproduction. Culture as screenplay: how art reprograms the world. Nueva Iorque: 11Has&Stenberg Camnitzer, L. (2009). Introducción. En Educação para a arte. Arte para a educação. Porto Alegre: Fundação Bienal do Mercosul Merodio, I. (2004). Las Artes Plásticas como Fundamento de la Educación Artística. Madrid: Secretaría General Técnica Nieto, V. & Checa, F. (2000). El Renacimiento. San Sebastián de los Reyes: Istmo Santiago, G. (2004). El desafío de los valores. Una propuesta desde la filosofía con niños. Buenos Aires: Novedades Educativas D'Amico, V. (1958). Coming Events Cast Shadows: A Reappraisal of Art Education. School Arts, 57 (1):5– 19 Mahony Stoljar, M. (1997) Novalis. Philosophical writing. Abania: State University Press, vvaa (2005). La inteligencia se construye usándola. Madrid: Morata vvaa (2008). La situación del mundo. Innovaciones para una economía sostenible. Barcelona: Icaria 156


O ensino das Artes Visuais e os sucessivos modelos de concursos de professores e de

habilitações para a docência Nos dias que correm tornou-se uma tarefa altamente complexa escrever sobre modelos de concursos de professores e de habilitações para a docência. A dança legislativa é de tal forma recorrente, e a inconstância de modelos tão regular, que o que hoje é uma verdade absoluta amanhã torna-se num limbo impreciso, onde poucos parecem ter a resposta legal e concisa para algumas das dúvidas mais prementes. Quando nos centramos na problemática dos professores contratados a situação é ainda mais grave, tendo em conta que, no que concerne ao regime de concursos de professores, foram, nos últimos anos, inventados “à pressão” novos modelos, que serviriam supostamente para dar mais autonomia às escolas (no sentido destas poderem contratar os profissionais com os perfis mais adequados às funções a realizar). Foi nesta perspetiva que surgiram os regimes de “Contratação de Escola - CE” e de “Bolsa de Contratação de Escola - BCE”. Um dos propósitos mais referidos pela tutela para a criação destes arquétipos de maior autonomia para seleção de pessoal docente contratado a termo por parte das escolas das tipologias TEIP e com contrato de autonomia, é a de que poderiam assim escolher os profissionais mais adequados para a operacionalização das medidas de ação plasmadas nos seus projetos educativos (documentos reguladores que supostamente se consideram de tal forma específicos que não se coadunam com a colocação de professores advindos do concurso nacional, seriados pela sua graduação profissional). Ora, isto levanta-nos duas questões essenciais: a especificidade desses projetos educativos e a quantidade de professores selecionados nesses moldes. Quanto à primeira, julgo que basta cruzar a leitura dos projetos educativos de cada uma das escolas TEIP ou das com contrato de autonomia, com os critérios apresentados para a seleção de professores no modelo de CE e de BCE, para entendermos que não é verdadeiramente significativo qualquer ganho, até porque o trabalho a desenvolver por esse professor selecionado muitas das vezes se restringe a apenas um ano letivo, e a poucas horas semanais atribuídas. No entanto, a questão da quantidade de professores selecionados por estes modelos de concursos parece ser aquela que assume contornos mais interessantes: hoje a percentagem de professores contratados a desenvolver funções nas escolas públicas portuguesas é, infelizmente,

absolutamente diminuta, e a esmagadora maioria dos docentes (diria, mais de 90%) a desenvolver funções nessas escolas TEIP e com contrato de autonomia são professores do quadro do Ministério 157


da Educação e Ciência - MEC, e por isso, no cumprimento da legislação vigente, selecionados pelo

concurso nacional de professores (num total e adequado respeito pela sua graduação profissional). Face ao exposto (e sem enveredar pela discussão das mais ou menos-valias da autonomia das escolas) parece -nos claro o impacto muito diminuto da seleção direta dos professores contratados, nomeadamente através de modelos concursais pouco transparentes, com critérios muitas das vezes de interpretação dúbia, e com procedimentos incompatíveis com uma necessidade de seleção rápida dos profissionais habilitados para o desenvolvimento das funções requeridas. Vejamos ainda que no que respeita ao regime de Contratação de Escola surge uma outra curiosidade - a contratação de docentes ao abrigo da figura de “Técnicos Especializados” - alocando a esta figura disciplinas que dizem diretamente respeito a grupos de recrutamento de professores, e por isso vagas que, nessa medida, deveriam ser ocupados por professores de grupos disciplinares detentores das habilitações legalmente estabelecidas para esse efeito. Mais, segundo informações mais ou menos recentes da tutela, o tempo de serviço obtido no desenvolvimento de funções no âmbito de “Técnico Especializado” não releva para efeitos de concurso no grupo de recrutamento desse docente, embora este cumpra, em espaço de sala de aula, as mesmas funções do que se tivesse sido selecionado diretamente pela via do seu grupo disciplinar. Releve-se, por fim, que na génese da criação dos modelos de CE e de BCE está, segundo a tutela, implícita a possibilidade de uma seleção mais criteriosa dos profissionais mais habilitados para o desenvolvimento dessas funções, e o seguimento de imperiosos limites de rigor e da excelência (tão proclamados pelo MEC e, tal como sabido, mais desvirtuados do que nunca). Relativamente a incongruências nos modelos de concurso e seleção de professores contratados as questões acima enunciadas são apenas algumas nuances (entre muitas e muitas outras) e que têm interferido imenso na vida profissional destes docentes, assim como no dia a dia das escolas. Torna-se, nessa medida, e para entendimento de mais algumas das suas particularidades, essencial cruzar estes regimes de concursos de professores com o de habilitações para a docência, dada a sua complementaridade. É aqui que surge uma questão verdadeiramente fundamental para os professores do grupo de recrutamento de Artes Visuais (grupo 600). Estes profissionais viram diminuir, nos últimos anos, e de forma muito abrupta, o número de horários disponíveis, cabendo, nessa medida, a necessidade de

entender as razões para que tal situação tenha ocorrido. Com a extinção do par pedagógico na disciplina de Educação Visual e Tecnológica (do 2.º ciclo do Ensino 158


Básico, lecionada pelos docentes do grupo de recrutamento 240) a tutela deu origem a um alargado

número de docentes sem componente letiva (os denominados “horários-zero”), na sua grande maioria detentores de habilitação profissional para a docência no 1.º e no 2.º ciclos do ensino básico, mas, legalmente (salvo casos muito específicos) sem essa habilitação para a lecionação de disciplinas do 3.º ciclo e do ensino secundário (cuja habilitação profissional se restringe, na esmagadora maioria, aos docentes do supracitado grupo 600). Para ultrapassar esse “problema”, e sem qualquer pudor, a tutela dividiu a disciplina de EVT em duas áreas, a de Educação Visual – EV e a de Educação Tecnológica – ET. E … voilá! … atribuiu, subrepticiamente, a mesma denominação a duas disciplinas de ciclos diferentes, passando a existir, cumulativamente, uma disciplina de EV no 2.º ciclo e outra no 3.º ciclo, ainda que as habilitações para a docência para a lecionação de cada uma delas sejam diferentes. Nessa medida, e tendo em conta esse pormenor essencial, apenas bastou, de seguida, dar um “curto” passo no sentido de ser devidamente aproveitado um ponto legislativo há muito controverso, recorrentemente plasmado nos despachos de organização do ano letivo - OAL. Refiro-me, no caso deste último OAL (para o ano letivo 2015-2016), ao seu ponto n.º 4 do artigo 4.º, onde se lê que: “Os docentes podem, independentemente do grupo pelo qual foram recrutados, lecionar outra disciplina ou unidade de formação do mesmo ou de diferente ciclo ou nível de ensino, desde que sejam titulares da adequada formação científica e certificação de idoneidade nos casos em que esta é requerida”. Tendo em conta que o conceito de “adequada formação científica” não se encontra devidamente regulado, foi dado pela própria tutela o passo decisivo para que, em muitas escolas do território nacional possamos ter docentes do grupo 240 a lecionar a disciplina de Educação Visual do 3.º ciclo do ensino básico, sem que, em muitos casos sejam portadores da necessária habilitação profissional. Ainda que muitas das vezes a incongruência tenha sido um dos modelos de ação do Ministério da Educação e Ciência (tomando até decisões contraditórias com outras medidas por si legisladas), neste caso concreto a situação é verdadeiramente paradigmática. Ou seja, por um lado procuram-se recrutar professores contratados através de modelos concursais específicos, tendo em vista a seleção dos profissionais mais habilitados para as funções; por outro lado atribuiu-se a docentes de quadro funções para as quais não estão devidamente habilitados, ou não possuem qualquer tipo de experiência. Onde estão então plasmados os recorrentemente referidos critérios de rigor e de excelência?

São estes alguns dos pormenores do mais recente paradigma que vivemos no âmbito do recrutamento e seleção de professores, onde urge a criação de um modelo único concursal, estável, e que respeite a 159


graduação profissional dos professores, assim como as suas habilitações e a sua experiência. No âmbito do recrutamento de docentes de Artes Visuais (3.º ciclo e ensino secundário) é urgente que seja cumprida a legislação de habilitações para a docência em vigor (obrigando, tal como referido em http://www.dgae.mec.pt/web/14654/profissional, que os docentes sejam devidamente portadores de habilitação profissional para as disciplinas que lecionam) reforçando, cumulativamente, a cientificidade desta área, uma vez que a mesma assume a formação de alguns dos limites mais essenciais no indivíduo contemporâneo, cruzando o desenvolvimento da criatividade com a capacidade de desenvolvimento de projetos e com a capacidade técnica de saber fazer, num mundo onde cada vez mais se procuram profissionais com estas competências e onde a escola oferece, cada vez menos, momentos para o seu cirúrgico desenvolvimento.

César Israel Paulo (Associado da APECV e Presidente da Direção da Associação Nacional dos Professores Contratados) 160


DESENHANDO PONTES NO ENSINO, NA CRIAÇÃO E NA PESQUISA A PARTIR DE NARRATIVAS VISUAIS Flávia Pedrosa Professora do Colegiado de Artes Visuais da Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF. Estudante do Doutorado em Educação Artística da Universidade do Porto – UPORTO. Bolsista CAPES Doutorado Pleno no Exterior Proc. Nº 0581/13-5. Líder do Grupo de Pesquisa Multi, Inter e Trans em Artes – MITA/CnPQ. flapedrosa@gmail.com Artigo realizado a partir da investigação doutoral em andamento. Resumo Este texto busca construir interpretações acerca das concepções metodológicas que envolvem o desenho e as narrativas visuais a partir da pesquisa em andamento no Doutoramento em Educação Artística da Universidade do Porto – UPORTO. Analiso as narrativas visuais que venho desenvolvendo na investigação, com foco na sua construção e nas relações de apoderamento com o espaço e o contexto da criação, procurando territorializar os desenhos como parte de uma Pesquisa em Arte/ Educação Baseada nas Artes Visuais (Viadel, 2005) ao unir a produção com uma reflexão acerca de práticas que conectem as Artes Visuais e a Educação Artística na formação de professores. Pretendo suscitar à investigação que articule narrativas visuais e escritas entre territórios do conhecer, na visão e conexão de pontes (Räsänen, 1997) artístico/educativas, experienciando teorias e práticas desde a criação em Artes e na perspectiva a/r/tográfica (Irwin, 2004) do tornar-se professor/artista/pesquisador.

Palavras-chave: desenho; práticas artístico/educativas; professor/artista/

161


Traçando a linha do meio

Figura. 1 Pra quê desenho?. Enquanto observava árvores nos jardins da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Setembro de 2013

Considero o meio como ponto de partida, conforme sugere Lancri (2002), colocando o contexto em uma primeira escolha viável e estratégica para se iniciar uma pesquisa na área de Artes Visuais, se configurando em uma das maneiras mais profícuas de se interpretar realidades profissionais no percurso de uma investigação narrativa. O contexto do qual se move, se constrói, se permutam saberes e fazeres, em que tensões, angústias, questões e descobertas são visibilizados, desdobrados e intricados no processo, revelando outras possibilidades de olhar, de perceber, de criar, de refletir, tornando-as significativas e polissêmicas (figura 1). Tornar significativa uma experiência é torná-la um espaço em que o conhecer é o resultado da ação, do contato com o meio, os outros e o conhecimento. É ampliada a experiência, quando este resultado 162


significativo se aproxima do universo dos sentidos e da memória em uma composição polissêmica, registrada, pela sua relevância. A partir deste meio, e das experiências percorridas em seus territórios de diálogo no ensino e no aprendizado em Artes, no qual a experiência é da mesma maneira intensificada e relida (Dewey, 2010) por seu caráter construtivo no trabalho artístico e no fazer pedagógico, que encontro razões e traço pontes dos conceitos e realizações, discutindo as práticas artístico/educativas e a formação artística na formação dos docentes em Artes Visuais que atuam no nível superior. Como este texto percorre os caminhos de narrativas escritas e visuais, busco trazer a produção em desenhos como apropriação de uma Pesquisa em Arte/Educação Baseada nas Artes Visuais ou “Investigación Educativa Basada en Las Artes Visuales”, termo cunhado por Viadel (2005), na busca por uma compreensão mais próxima da articulação da pesquisa com uso de imagens na Educação em Artes. Este tipo de pesquisa dá abertura ao questionamento dos espaços delimitados, no ambiente acadêmico, da produção em áreas específicas. Tenho em mente que há arraigada nesse ambiente a noção de que o ensino, a criação e a investigação são elementos dissociados e pertencem a paisagens distanciadas nas teorias e nas práticas, que não se imbricam quando se articula o pensamento e os saberes da produção no ensino de Artes Visuais. Tenho me questionado, nos últimos anos, sobre a atuação do docente em Artes Visuais no ambiente universitário. Desenvolvi algumas pesquisas e interpretações, que podem ser encontradas em Vasconcelos (2011; 2012; 2013a; 2013b), as quais tinham como objetivo compreender os espaços da produção, da análise e da reflexão acerca de saberes e fazeres artísticos e pedagógicos no cotidiano de minha atuação, nos exercícios e diálogos com estudantes e colegas, repensando as principais

características, metodologias, protocolos, debates e, principalmente, preocupada com as plataformas de atuação e influência do docente em uma licenciatura. Dessas muitas vivências em pesquisa, produzi artigos que resumem as inquietações e tensões que participei e observei em algumas experiências no ato de lecionar, pesquisar e criar em disciplinas obrigatórias com os estudantes da Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF, no campus de Juazeiro/BA. Além disso, dialoguei conhecimentos em Artes Visuais com estudantes de outros cursos da referida

instituição no campus de Juazeiro/BA e Petrolina/PE, por meio de disciplinas optativas e Núcleo Temático, nas áreas de Engenharia da Computação, Engenharia de Produção, Engenharia Mecânica, 163 desenvolvidas e potencializadas no exercício da prática profissional.


Engenharia Civil, Engenharia Agrícola e Ambiental, Psicologia, Medicina e Educação Física. Como bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Ensino Superior – CAPES, na função de professora/pesquisadora formadora, na Licenciatura em Artes Visuais do Programa de Formação Inicial de Professores – Programa Plataforma Freire, atuei no campus de Juazeiro/BA da Universidade Estadual da Bahia – UNEB. Esta vivência se deu inicialmente por meio da disciplina Cultura e Arte Contemporânea (Vasconcelos, 2013b) e se prolongou em outras disciplinas que tratavam diretamente sobre o ensino de Artes Visuais no contexto da Educação Formal e suas relações com as concepções e narrativas históricas no contexto brasileiro. Das experiências citadas de atuação em nível superior, entendo que a dificuldade de equilibrar os conceitos, a produção artística e o ensino fazem parte das apreensões quando reflito acerca do ensino do desenho na formação inicial dos professores de Artes Visuais. Reconheço que elas permanecem e são reforçadas na construção, no exercício contínuo do tornar-se, do becoming (Irwin e Springway, 2008) professora/artista/investigadora. O becoming demanda esforço no espaço em que são legitimados saberes e fazeres e, como expõe Pereira (2013), habilidades e competências a serem contextualizadas,

Alinhando caminhos de pesquisa e narrativas visuais

Figura. 2 Escolhas, do que é observado na aula de Desenho I daLicenciatura em Artes Plásticas da Universidade do Porto, ao que é desenhado.Setembro de 2013

164


Traço aqui outra linha, ao repensar sobre o uso de narrativas visuais numa Pesquisa em Arte/Educação Baseada em Artes Visuais. O viés de estudo que trata do uso das imagens na Pesquisa Baseada em Arte é, por vezes, questionado, pelos limites que o pesquisador se utiliza para descrevê-las ou, pela sua multiplicidade de significados na relação entre contexto de escrita e os contextos imagéticos de produção e replicação (Mcniff, 1998) (figura 2). Entendo que a Pesquisa em Arte/Educação Baseada em Artes Visuais está atenta às relações entre ensino, produção e reflexão sobre as Artes Visuais. Neste sentido, Hernández (2008) observa que as narrativas visuais estão presentes no âmbito da investigação em Arte/Educação por meio de uma tradição recente de questionamento e revisão acerca da predominância da instrumentalização no discurso científico, que alia imagens despropriando-as de seus possíveis sentidos, como se servissem a função de ilustração descontextualizada do texto e das estratégias de sobreposição do discurso escrito sobre os discursos da imagem. Assumindo uma postura qualitativa de investigação (Robottom e Hart, 1993; Geertz, 2008), encontro mais uma linha, em que territórios geográficos, epistemológicos e experienciais são encontrados nas pontes entre a produção/prática e o conceito/teoria (Räsänen, 1997), se configurando como elementos caracterizantes de processos do ensinar e do aprender, dos quais me aproprio na investigação doutoral que ora realizo e que por meio dela, me refiro ao refletir nestas linhas acerca do desenho, das narrativas visuais e das práticas artístico/educativas. Tendo o título Designare: pontes artístico/educativas na formação docente em artes visuais, busco compreender o ensino do desenho a partir das suas representações epistemológicas, cognitivas e experienciais desde a formação artística de professores que lecionam no nível superior na área de Artes

Visuais, de maneira a refletir sobre os meandros do ensino do desenho na formação de professores. Historicizo e analiso o discursos presentes nos contextos do desenho na formação docente em Artes Visuais no Brasil e em Portugal da década de 1990 aos dias atuais, principalmente na Universidade do Porto – UPORTO, em Portugal e na Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF. A investigação doutoral me trouxe, no decorrer dos percursos das leituras, criações e debates, outras perspectivas, outras formas de enxergar o desenho e seu ensino, a revisitar os discursos que nomeiam as imagens, as denominações e suas implicações na construção de sentidos, na criação artística.

É através das experiências de investigação narradas anteriormente e das memórias de experiências na docência superior, que realizo sínteses das construções em processo sobre o desenho e a relevância do . 165


ensino do desenho quando se detêm sobre o espaço de formação de professores de Artes Visuais. Por isso, utilizo neste texto algumas imagens digitalizadas do processo de observação e criação dos desenhos e dos próprios desenhos que venho desenvolvido ao longo da investigação, trazendo-as como narrativas visuais que recontam uma história da produção investigativa Procuro, ao desenhar, revisitar as leituras, as ideias, os conceitos e as experiências do ensinar, do pesquisar e do produzir que se imbricam na minha práxis. A presença do desenho na pesquisa como narrativa visual, dá amplitude a uma percepção extra, uma fonte de narrativa, que reconecta questões e considerações do desenho e de seu ensino, por meio do pensar e fazer desenho. Por essas razões, considero o desenho uma atividade do conhecer, advindo da necessidade do representar, a qual expande o processo de aprendizagem indo do subjetivo ao concreto, se configurando como um elemento transdisciplinar e, fazendo parte de uma formação integral que colabora diretamente para aprendizado do olhar crítico e reflexivo. Quando desenho, revejo tanto conceitos quanto as questões e as reverberações da linha, das formas que vão aparecendo e sendo organizadas, sistematizo o meu pensamento, alargo os horizontes do conhecer. A respeito do desenho associado às narrativas visuais, convêm recordar o uso das narrativas visuais como forma de contar o que a representação revela, no entendimento da imagem, não apenas como resultado de um processo ativo de ação e reação artística, mas um cruzamento da Arte e da Ciência (Fabris, 1998), tem suas primeiras pesquisas científicas divulgadas amplamente a partir da década de 1990, demonstrando, em muitas delas, as proporções intersubjetivas de trabalhar, na representação das imagens mentais ao aludir, ao reler as linhas em outras formas que derivam do que é observado (figura 1). Atravessando territórios em que é ampliado o conceito de imagem e simbolizado nos espaços e contextos

de

representação,

Mirzoeff

(2003)

e

Martins

e

Tourinho

(2011)

relacionam

suas

ideias

epistemologicamente com as narrativas visuais, ao perceber as imagens como artefatos imagéticos que promovem uma apropriação de sentido de quem as cria, ou seja, possibilitando o acesso ao mesmo artifício pelo leitor, mas não tendo a análise do outro como foco. Nas narrativas visuais, o processo e o produto buscam evidenciar questões de quem produz. Sendo assim, quando menciono narrativas visuais, intento tratar de imagens que suscitam, levantam questionamentos e provocam uma reação de pertencimento, de produção de significado a quem as cria e

que podem ou não produzir o mesmo no leitor. Por conseguinte, o olhar e o representar nas narrativas visuais são constituídos num diálogo intertextual, em discursos explícitos e implícitos, visíveis na cultura 166


de quem as produz, sendo assim as narrativas visuais são também reflexões visuais, funcionando como registro de um tempo e espaço vivenciado. Destarte, percebo que posso inferir algumas ênfases nas narrativas visuais em algumas imagens digitalizadas de desenhos produzidos no diário de bordo, elaborando uma breve análise entre as pontes em que atuo, observo, dialogo e vivencio. Interpreto que essas ênfases são encontradas nos discursos da formação artística na formação de professores de Artes Visuais, sendo elas: desenho como técnica a ser adquirida, criatividade em desenho, pensamento/cognição em desenho e experiência em desenho. Pela sua codificação intersubjetiva e possibilidade de interpretação múltipla, defendo que as narrativas visuais são capazes de uma “associabilidade e de uma latência” do começo de sua existência (DidiHuberman, 2011, p. 73), revelando histórias e entendimentos que de outra forma não conseguiriam ser narrados. Aliadas às narrativas escritas em um processo de pesquisa elas são veículos fortalecedores de significados em uma escrita científica no território da Pesquisa em Arte/Educação Baseada em Artes Visuais. Narrativas visuais e designare

Figura. 3 Desenho de observação em aula de Desenho I na Licenciatura em Artes Plásticas da Universidade do Porto. Outubro de 2013

167


Defendo o ensino do desenho e as narrativas visuais no território da experiência do conhecer em práticas artístico/educativas. As práticas artístico/educativas contestam os modelos previamente demarcados e analisam as teorias nas práticas, focadas com o desenvolvimento do conhecimento na relação de interação, diálogo e construção que a produção artística constitui no ensino e aprendizado em Artes, desconstruindo valores e discursos hegemônicos. Por isto, as práticas artístico/educativas são consubstanciadas em pontes conforme apresenta a pesquisa de Räsänen (1997), pois o aprendizado é interpretado e construído desde a experiência artística, atravessando o ensino e, simultaneamente, no processo, o aprendizado reflexivo possibilitado nas brechas do sistema de escolarização das instituições educacionais (figuras 3 e 4).

Figura. 4 Desenho a partir de imagens mentais. Espaço do ateliê. Janeiro de 2014 168


Por se importarem com o compartilhamento de saberes entre professor e estudante, as práticas artístico/ educativas se aproximam da expectativa agonística de Paiva (2012) e da concepção de ensino artístico e cognitivo de Arnheim (1969), quando compara e reconstrói a percepção, a memória, o pensamento e aprendizagem em movimentos processuais, inquietos e contínuos. Por essa razão, elas tornam-se desse modo experiências comunitárias do contexto educativo com outros contextos. Voltando às narrativas visuais e ao desenho, entendo o designare, expresso em Baldinucci (1681) da sua etimologia ao denominar o representar, o descrever e o delinear sinais, características e formas. Reúno estas denominações e as ressignifico, convertendo o designare ao último e simbólico colóquio do desenho com a necessidade de representação concreta do ser humano. Por conseguinte, visualizo que o ensino do desenho pode fabricar o designare em uma prática artístico/educativa (figura 5).

Figura. 5 Desenho a partir de imagens mentais. Espaço do ateliê. Fevereiro de 2014 169


Assim, o designare traduz a visão de que o desenvolvimento do olhar e do desenho vai além do aspecto do treino das lentes, mas é reflexão crítica em que a produção simbólica é presente no próprio ato de registro. Observo as figuras. 1, 2, 3, 4 e 5. Delas, indagações emergem: que relação as palavras e as imagens desenvolvem na construção de significado? O desenho deve ter uma função? Que visão de desenho devo escolher? O que a linha transporta? Como ligar o que penso e sinto ao que observo, imagino e desenho? A investigação e o desenho retomam que espécies de narrativas visuais? Que significados são implicados por meio dessas narrativas que intentam contar mais uma parte do processo? Coloco-me na posição estética de um movimento criador que procura reunir a observação, a síntese da memória, imaginação e produção, “como um voyer que entra no espaço privado da criação”, e é refletida em uma “sequência de gestos advindos da mão criadora e experienciados de forma concreta, pelo crítico.” (Salles, 2004, p. 19), narrando visualmente histórias expressivas das inquietações, do problema e das descobertas da investigação doutoral. Encaro o desenho da sua origem ao gesto guiado pelo movimento da mão na superfície e ao regesto simbolizado pelas opções encontradas das linhas, dos materiais e suas diferentes texturas e cromos desenhados (Agamben, 2007), do registro em pontos de vista que as lentes dispõem no espaço bidimensional e que se aproximam de uma análise crítico/reflexiva acerca do ensino do desenho como uma prática artístico/educativa. Do designare, das práticas artístico/educativas e do tornar-se professora/artista/pesquisadora

Desenhar em uma Pesquisa em Arte/Educação Baseada em Artes Visuais a/r/tográfica (Irwin, 2004; Irwin & Springway, 2008) tem seus desafios, em consoante com o que discuti neste texto. Das minhas experiências, o desafio mais evidente do trabalho neste sentido é utilizar as narrativas visuais em desenho como processo de investigação que tem sua força, que complementa e não apenas ilustra o estudo bibliográfico, de campo e as narrativas escritas em uma investigação doutoral. É desafio também pelos distanciamentos reforçados no ambiente universitário, em que a teoria, a prática artística e a pedagógica são promulgados em departamentos, palestras e discursos como áreas

separadas, tratando a Arte/Educação e sua complexidade como conceito essencialmente ligado às teorias da educação, que devem ser aplicadas e reproduzidas em concordância à escolarização das instituições 170


educacionais. A investigação a/r/tográfica exige de mim entender e interpretar as situações, ações e composições como professora/artista/investigadora em formação. Diferente da noção de Irwin (2004), em que ela coloca o artista/professor/pesquisador, em meus textos e minhas preocupações, a professora, que atua e revê a sua formação, é a primera citada desde 2011. Naquele ano, encontrei-me com a referida pesquisadora e suas ideias no World Congress da International Society for Education through Art – InSEA, em Budapeste, Hungria. A seguir, retomo a artista, perdida que estava há mais de 5 anos, desde o início da atuação em escolas, quando a burocracia e as solicitações do cotidiano de lecionar me sobrecarregavam de atribuições. A artista e a produção que revisita olhares contextualizadores. Avoco a pesquisadora inquieta, despertada nas primeiras descobertas quando em exercício da docência superior. Desconfiada, inconformada com os cânones, as tradições desarrazoadas e com os locais demarcados do ensino de Artes nas licenciaturas. Ter consciência acerca de um desenho que se constrói, de seu designare em narrativas visuais é o passo que me aproprio como necessário na produção de uma investigação doutoral que reflita sobre o ensino do desenho em práticas artístico/educativas na formação artística de professores de Artes Visuais. Caso optasse por outro meio e, no caminho inverso, ou seja, no trabalho metódico e instrumentalizante realizado sem controle e sem preocupação com a construção de conhecimento, sem experimentação da experiência, do becoming, poderia estar divulgando uma solução pronta para o ensino de desenho, solidificada numa estratégia escolarizadora e academicizada. Esta, arraigada nos propósitos do Renascimento, coloca em lugar de destaque o aprimoramento da técnica e a razão das linhas como

reprodução do que se vê e, esquece da profundidade da observação e da necessidade de treino do olhar. Deve-se dar um espaço para que o olhar respire e se desenvolva, para que ele se torne um olhar de amplitude, de criação e não de duplicata tangível a uma realidade fabricada como realidade ideal em um desenho. Desse olhar que desejo, do olhar que amplia horizontes, une pontes, e, no becoming de professora/ artista/pesquisadora, na compreensão do desenho e de suas possíveis narrativas visuais, insisto na necessidade de analisar as concepções do ensino de desenho a partir dos docentes de nível superior

que atuam em cursos de graduação em Artes Visuais. Que noção de desenho eles priorizam e defendem? O que estas noções podem influir, quando se remete ao ensino de desenho no contexto dos 171


professores de Artes Visuais? Em que sentido um professor de nível superior que atua em disciplinas de criação artística não se considera um pedagogo das Artes? E, por qual razão um professor de nível superior que articula em seu trabalho disciplinas da área educativa, não pode criar nem ser legitimado como artista? Por que aquele que atua com disciplinas das teorias das Artes, pode exercer um discurso que o determina como teórico e não o legitima no campo de pesquisa como professor nem como capaz de enunciar processos e produtos da criação artística? Que idealização é essa das identidades dos docentes universitários, que influi diretamente na sua atuação e na sua compreensão do desenho e de seu ensino, como territórios de saberes e fazeres murados, relembrados em algum desses manuais do século XIX e com uma forte ênfase ao poderio industrial de aquisição de uma técnica com uma função de mercado? Que distorções o ensino do desenho traduz, nos cursos de nível superior em Artes Visuais, ao enfatizar um conceito de aprendizado, em detrimento de outros? Aliando, no discurso e na vivência, narrativas visuais e escritas, vou contra uma atitude profissional que relega a experiência ao espaço do conceito, ou que a torna uma prática preocupada apenas com a própria prática e reflito sobre sua relevância no ensino do desenho.

Das linhas traçadas, enxergo as pontes desenhadas entre ensino, criação e pesquisa, em que o meio como ponto de partida revela o contexto, nos territórios do conhecer, possibilita a desconstrução, o diálogo contínuo dos processos em teorias e práticas, o becoming, o ir do desenho ao designare e as práticas artístico/educativas de uma professora/artista/investigadora. Por isso, arrisco nestes pontos traçados, querendo que os riscos se tornem reticências horizontais, amplificadoras de mensagens, concordo com o que diz De Duve (2012, pp. 49-50) “[...] a imitação reproduz, a invenção produz; a imitação fabrica o mesmo, a invenção, o outro; a imitação visa a

continuidade, a invenção, a novidade.”. No final, desejo que este texto permita a reinvenção de outras lentes para se olhar o ensino do desenho na formação artística dos professores de Artes Visuais. 172


Referências Arnheim, R. (1969). Visual thinking. Berkeley: University of California. Baldinucci, F. (1681).Vocabolario Toscano dell’Arte del Disegno. Florença: Santi Franchi al segno della Passione. De Duve, T. (2012). Fazendo Escola (ou refazendo-a?). Chapecó, SC: Argos. Dewey, J. (2010). A arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes. Didi-Huberman, G. (2011). O que nós vemos, o que nos olha. Porto: Dafne Editora. Fabris, A. (1998). Redefinindo o conceito de imagem. In Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 18, n.35. 217-224. Hernández, F. H. (2008). La investigación basada en las artes. Propuestas para repensar la investigación en

educación.

Educatio

Siglo

XXI,

n.º

26.

85-118.

http://revistas.um.es/educatio/article/

download/46641/44671 Irwin, R. L. (2004). A/r/tography: a metonymic métissage. In Irwin, R. L., Cosson, A. de. (Eds.). A/r/ tography: Rendering self through arts-based living inquiry. Vancouver: Pacific Educational. 27-38. Irwin, R. L. & Springway, S. (2008). A/r/tography as practice-based research. In Cahnmann-Taylor, M. & Seigesmund, R. (Eds). Arts-Based Research in Education. Foundations for Practice. Nova Iorque: Routledge. 103-124. Lancri, J. (2002). Colóquio sobre a metodologia da pesquisa em artes plásticas na universidade. In B. Brites & E. Tessler (Orgs.). O meio como ponto zero: metodologia da pesquisa em artes plásticas. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 15-33. Martins, R. & Tourinho, I. (Orgs.). (2011). Educação da Cultura Visual: conceitos e contextos. Santa

Maria: Universidade Federal de Santa Maria. Mirzoeff, N. (2003). Una introducion a la cultura visual. Barcelona: Paidós. Mcniff, S. (1998). Art-based research. Londres: Jessica Kingsle. Paiva, J. C. de. (2012). Acção/investigação em Educação Artística: em busca de uma narrativa renovada, implicada na construção pertinaz de uma democracia agonística. In Eça, T., Reis, R. (Eds). InVISIBILIDADES: Revista Ibero-Americana de Pesquisa em Educação, Cultura e Artes. Nº 3. Porto, Portugal: Associação de Professores de Expressão e Comunicação Visual – APECV. 162-171.

Pereira, M. V. (2013). Estética da professoralidade: um estudo crítico sobre a formação do professor. Santa Maria: Universidade Federal de Santa Maria. 173


Räsänen, M. (1997). Building bridges. Experiential art understanding: A work of art as a means of understanding and constructing self. Helsínquia: University of Art and Design. Robottom, I. & Hart, P. (1993). Research in Environmental Education: engaging the debate. Victoria: Deakin University. Salles, C. A. (2004). Gesto inacabado: Processo de criação artística. São Paulo: Annablume. Vasconcelos, F. (2011). Narrativas no ensino de Artes Visuais em Juazeiro/BA e Petrolina/PE. 2011. 151f. Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) – Programa de Pós-graduação em Artes Visuais, Universidade Federal da Paraíba e Universidade Federal de Pernambuco, João Pessoa, PB. Vasconcelos, F. (2012). Docência Artista no Ensino Superior: narrativas das práticas educativas na licenciatura em artes visuais da UNIVASF. In: Livro 2. XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP – Campinas, SP: Junqueira & Marin Editores. 23-32.

http://www2.unimep.br/endipe/1843d.pdf Vasconcelos, F. (2013a). Regestos: processos de criação e fundamentos do ensino de artes visuais na universidade. II Diálogos Internacionais em Artes Visuais. Recife, Pernambuco; EDUFPE. 11-22. Vasconcelos, F. (2013b). Narrativas em Cultura e Arte contemporânea; experiência didática via MITEA na formação de professores em Artes Visuais. Cartema. Revista do Programa de pós-Graduação em Artes Visuais UFPE-UFPB. Nº 2. Ano1. Junho. 2013b. 105-115. Viadel, R. M. (2005). La “Investigación Educativa Basada en Las Artes Visuales” o “Arteinvestigación

educativa”. In Viadel, R. M. (Ed.) Investigación en Educación Artística. Granada: Editorial Universidad de Granada. 223-274. 174


O DESENHO NO ENSINO INDUSTRIAL ANTES DOS CRAVOS Ana Rita Sulz Professora de Desenho da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Brasil. Doutora em Educação pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Portugal. Docente do Mestrado em Desenho, Cultura e Interatividade, e investigadora associada do Centro de Estudos e Intervenção em Educação e Formação (CeiEF). sulz@uefs.br

RESUMO A importância atribuída ao ensino do Desenho de linguagem técnica indica comportamentos distintos no que respeita a sua presença e frequência na organização do Sistema Educativo português, apesar de este conhecimento ser reconhecido, até os dias atuais, como competência relevante na formação de diferentes áreas e níveis profissionais, nomeadamente as relacionadas com o setor produtivo e, de modo especial, com a indústria. Neste trabalho apresentamos aspectos relativos à presença do Desenho Técnico no ensino profissional português, num dos mais emblemáticos períodos da história recente do país – o Estado Novo (1933-1974). Neste período, dois marcos históricos da Educação portuguesa são estabelecidos, sendo o primeiro designado por “Reforma de Pires de Lima”, e o segundo conhecido por “Reforma Veiga Simão”. Fazemos alusão, ainda, a um dos manuais mais utilizados na formação de profissionais para o setor industrial, através do qual é possível observar os diferentes graus de

aprofundamento dos conhecimentos do Desenho de linguagem técnica. Tomamos por base argumentativa a relação entre o sistema Econômico e o Educativo, enfatizando especialmente a influência das ocorrências econômicas externas sobre as políticas educativas de Portugal no período que antecede a Revolução dos Cravos, o fim do Estado Novo.

Palavras-chave: Desenho; ensino industrial; história do Desenho; ensino do Desenho

175


,O

cenário: entre Guerras e Regimes

A trajetória da educação técnica e profissional em Portugal indica o ensino do Desenho de linguagem técnica como relevante elemento na formação dos trabalhadores de diversos níveis, nomeadamente do setor industrial, embora os aspectos relativos aos distintos períodos que definem a história econômica, social e política do país ilustrem diferentes cenários, pois como asseguram Magalhães e Stoer (2005, p. 20), “as políticas educativas não têm apenas um significado autêntico e autorizado. Não são planos para a ação política que exprimem intervenções universais e inequívocas. Em vez disso, são textos ideológicos

construídos de um (com)texto histórico e político particular”. Consoante Pereira e Fonseca (1979), a industrialização portuguesa foi impelida pela “necessidade de uma efectiva política de criação de riqueza metropolitana” (p. 20), justificada pelo declínio da economia portuguesa que, ao longo do tempo, fora garantida pelas riquezas proporcionadas pelas colônias, apesar do endividamento que Portugal acumulou com as “descobertas”. Para Penim (2000), o reconhecimento do Desenho como “factor de progresso” teve início durante o Regime Liberal (1820-1910), não obstante a instabilidade que caracterizou este período, especialmente

em decorrência da Primeira Guerra Mundial. O Desenho era ensinado através de duas vertentes distintas – uma relacionada às Artes do Ornamento, e a outra incorporada à Mecânica; além de também estar relacionado aos estudos da Matemática que caracterizavam as bases do Ensino Industrial. O movimento militar que pôs termo a República Liberal deu início a um dos períodos históricos mais vivos na memória dos portugueses, não apenas pela proximidade temporal, mas principalmente pela sua inegável e intensa carga simbólica – o Estado Novo (1933 a 1974), que teve como figura central o jurista e professor da Universidade de Coimbra, António de Oliveira Salazar. Para Teodoro (2001, p. 176), Salazar o foi principal responsável para que fosse estabelecida "uma plataforma política e ideológica capaz de forjar um compromisso de unidade indispensável não só a conservação do poder, mas, sobretudo, à instauração de um regime autoritário, estável e duradouro", no período de transição designado por Ditadura Nacional (1926-1933). Neste período, a ampliação da rede escolar, com consequente aumento do acesso à instrução pública, foi utilizada como forma de conter as aspirações da sociedade portuguesa, ou, como define Stoer (1983, p. 798), uma “mudança social controlada”. A primeira metade do Estado Novo situa-se no período histórico que antecede e registra o início da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), este marcado pelas dificuldades que afetaram, sobretudo, as 176


classes menos favorecidas, nomeadamente pela redução na oferta de alimentos, combustíveis, e bem essenciais, apesar da posição de neutralidade assumida pelo governo português. Rodrigues e Mendes (1999, pp. 314-315) destacam que é neste cenário que a indústria portuguesa é beneficiada, embora a maioria das indústrias fosse tecnologicamente obsoleta e a sua modernização praticamente impossível de ser concretizada, diante das dificuldades inerentes ao conflito mundial e da própria trajetória do setor. Segundo Carvalho (2008, p. 790), em decorrência da realidade que se configurava no país, “o Governo da Ditadura prestou maior atenção ao Ensino Técnico”, pois

Tornava-se urgente preparar homens desembaraçados e decididos para quem a máquina, mesmo altamente sofisticada, fosse um instrumento de trabalho tão facilmente manejável como um martelo ou uma chave de fendas, homens esclarecidos e confiantes nos meios novos de trabalhoque lhes eram colocados nas mãos. (Carvalho, 2008, p. 794) Neste contexto o Desenho se mostrou elemento funadamental na formação dos trabalhadores, nos mais diversos níveis hierárquicos do setor industrial, e como destaca Penim (2008), “a visão do Desenho Técnico como solução para os mais prementes problemas do país faz parte dos enunciados políticos de vários regimes, liberais, republicanos e do Estado Novo” (p. 336). As alterações que transformariam a estrutura do Ensino Industrial foram precedidas por um longo período de debates políticos. Segundo Caetano (2009), Salazar “não via com bons olhos a abertura do ensino, mesmo que técnico, às classes mais desfavorecidas da sociedade” (p. 46), comportamento que Cardim (2000, p. 33) define por discriminatório, pois o ensino técnico “não proporcionava correspondência horizontal ao ensino liceal, nem acesso directo a outros níveis de ensino”. Somava-se ao pouco apreço dos governantes, a insuficiente disposição do empresariado industrial para apoiar as mudanças indispensáveis ao avanço deste nível de ensino, nomeadamente através de estímulos financeiros, apesar de reconhecer a sua urgente e necessária reformulação. Do setor industrial, apenas a Associação Industrial Portuguesa ventilou a possibilidade de “participação financeira, mas com a forte contrapartida de as empresas poderem ter um papel importante na elaboração dos planos de estudo” (Grácio, 1998a, p. 80), o que resultou que esta modalidade de ensino continuasse sob a responsabilidade do Estado. 177


Em 1936, três anos depois de promulgada a Constituição Portuguesa, o Ministério da Instrução Pública passa a denominar-se Ministério da Educação Nacional, conduzido por António Faria Carneiro Pacheco que não destinou “a mínima atenção ao ensino técnico” (Carvalho, 2008, p. 778). O Ensino Técnico Elementar, considerado o nível escolar mais afeito às classes populares, recebeu do governo diversas demonstrações de desprezo até meados da década de 1940. Esta situação foi revertida com a posse de Mário de Figueiredo, que durante a sua permanência no cargo (1940/1944) cria a Comissão de Reforma do Ensino Técnico, e são iniciados estudos que resultaram na proposição de uma ampla reforma, cuja promulgação ocorre em 1947, quando o referido Ministério era ocupado por Francisco Andrade Pires de Lima (Carvalho, 2008; Grácio, 1998b). Assim, ficam estabelecidos dois marcos históricos da Educação portuguesa recente que ultrapassaram o limite temporal deste período político: o primeiro, designado por “Reforma de Pires de Lima”, inicia-se em 1947 e estende-se até a promulgação da lei de 1973, quando dará lugar a Reforma que tornar-se-á conhecida por “Reforma Veiga Simão”, o segundo marco. Este período coincide com o pós-guerra e é marcado por alterações no cenário econômico mundial que irão arrefecer o desenvolvimento industrial português, nomeadamente em virtude da retomada da produção

dos países envolvidos no conflito. Desenho no Ensino Técnico na Reforma de Pires de Lima Segundo Stoer, S., Stoleroff, A. & Correia, J. (1990, p. 14), a Reforma do Ensino Técnico proposta pela Reforma de Pires de Lima, em 1948, foi uma das “mais significativas reformas educativas na relação escola-trabalho”, cujos objetivos eram “fortalecer a ordem moral, inculcar valores gerais, promover a educação geral e técnica e a aptidão profissional”. Dois graus passam a integrar o Ensino Técnico Profissional Industrial e Comercial, e sobre a sua estrutura e forma de acesso, Cardim (2000, p. 43) refere

que O ensino técnico iniciava-se logo após os 4 anos de ensino primário e era constituído por um ciclo preparatório com características de orientação profissional que tinha a duração de dois anos, e por um «curso de formação» cuja duração podia variar entre 3 e 4 anos. A aprovação nos cursos técnicos dava acesso aos cursos preparatórios, com a duração de 1 ou 2 anos. Após a realização dos cursos preparatórios, os alunos podiam candidatar-se aos Institutos Industriais e Comerciais e às escolas de Belas-Artes, não tendo acesso directo à universidade. 178


Inicia-se assim um período de valorização do Ensino Industrial que decorre das novas exigências estabelecidas pelo pós-guerra, através das quais, reconhecia-se a urgência na qualificação da mão de obra, ainda que à custa da “sobreexploração do operariado urbano e rural e do agravamento da situação das classes intermédias”, como refere Teodoro (2000, p. 49). […] a guerra representou, no plano económico, uma oportunidade única para as burguesias industrial e comercial portuguesas, proporcionando uma importante acumulação de capital público e privado, que vai estar na origem do mais importante surto de industrialização do país e da intensificação da ocupação económica dos territórios coloniais. (Teodoro, 2000, p. 49) O ano de 1948 marcaria o início de uma série de dificuldades que interromperia o surto de desenvolvimento que Portugal vinha registrando, cujas causas são relatadas por Maria Fernanda Rollo (1994). A deterioração da situação económica e financeira portuguesa devia-se sobretudo a quatro razões: (i) ao aumento das importações, devido a uma crescente procura em resultado das restrições da guerra e ao aparecimento de algumas tensões inflacionistas; (ii) à forte diminuição das exportações de alguns produtos e mercadorias anormalmente valorizados durante a guerra; (iii) ao aumento das importações de produtos agrícolas devido à escassez da produção de cereais, fortemente atingida pelos maus anos agrícolas de 1946 e 1947; (iv) ao aumento das importações de equipamento industrial destinado a sustentar o programa de industrialização lançado no final da guerra. (Rollo, 1994, pp. 859-860) Neste cenário, mesmo a despeito dos ideais políticos que definiam o Estado Novo, a intervenção de organismos externos se tornava essencial na reorientação política e econômica do país, cujas ações repercutiriam nas políticas educativas, nomeadamente as que se alicerçavam no crescimento econômico centrado na formação de mão de obra qualificada, como destacam Stoer et al (1990, p. 22). Nos anos 50 e 60, a intervenção do Banco Mundial e da OCDE, incluindo o importante papel do GEPAE e do Projecto Regional Mediterrânico (que envolveu

economistas e professores universitários, enquanto agentes do Estado para a 179


formulação da política educativa, numa altura em que a autonomia dos professores era quase nula) caracteriza uma época de recalcitrante mas necessária aceitação das organizações internacionais, por parte do Estado português. No balanço do desequilíbrio das contas do Estado, um saldo positivo registrar-se-á na Educação portuguesa, posto que as transformações provocadas pelo pós-guerra acabariam por desencadear um processo de modernização no panorama educativo do país, definido por Teodoro (2000) como o “fim do isolacionismo” português, que teve na sua origem a participação de Portugal no Plano Marshall1 e na OECE/OCDE. Acompanhado, no plano interno, pelo aumento de influência dos industrialistas na condução de sectores-chave da política nacional, a participação de Portugal no Plano Marshall, e nas organizações que dele decorrem, em particular na OECE/ OCDE, assumiu uma importância decisiva na viragem da política educativa do Estado Novo, legitimando os esforços e as posições daqueles que se mostravam sobretudo preocupados com as carências de qualificação da mão-de-obra nacional

e da consequente necessidade de uma rápida expansão da oferta escolar. Essa participação veio pôr fim no isolamento a que o sistema educativo estivera voltado nos anos trinta e grande parte dos anos quarenta, permitindo a responsáveis políticos e da administração o acesso a foros internacionais de debate e de intercâmbio de informação e de perspectivas, que se mostraram determinantes na evolução das concepções que marcaram as políticas de educação a partir dos anos cinquenta. (Teodoro, 2000, pp. 50-51)

Neste contexto, teve papel fundamental Francisco de Paula Leite Pinto na pasta da Educação Nacional, cargo que ocupou até maio de 1961. Foi responsável por dar “o primeiro passo no sentido de vir a tornarse possível a inserção da escola portuguesa no moderno esquema de correlação do Ensino com a Economia” no ano de 1959 (Carvalho, 2008, p. 795), através do “Plano de Fomento Cultural”, como designado por seu autor, que foi sugerido à OCDE para realização de trabalho conjunto. O referido plano foi acatado e proposto para outros países que possuíam características semelhantes às de Portugal (Itália, Espanha, Grécia, Turquia, Jugoslávia), e que resultaria no “Projecto Regional do Mediterrâneo” (PRM), cujos trabalhos foram iniciados em 1962 (Carvalho, 2008; Teodoro, 2000). 180


No que respeita a orientação do Ensino Industrial para a modernização do setor, ajustes são feitos nos cursos mais voltados à metalomecânica e eletrotécnica que se tornariam mais atrativos, embora as alterações propostas neste período não apresentem mudanças assinaláveis que as distingam de períodos anteriores. Todavia

os

cursos especializados

com

base

no

curso

de

serralheiro

(torneiro_fresador, ajustador de precisão, maquinista, mecânico de aviões, desenhador industrial e desenhador de construção naval) denotavam a preocupação de enfrentar eventuais necessidades da indústria metalomecânica, (…). O ensino dos cursos de metalomecânica – o curso de serralheiro e as suas diversas especializações – era ministrado em meados do século (…) em 47 das 64 escolas existentes, (…) [que após] a «uniformização» das condições de aprendizagem, [observar-se-á] idêntica evolução para o ensino da electrotécnica (com os cursos de formação de montador electricista e a sua especialização de montador rádio-electricista, de electromecânico de precisão e o complementar de aprendizagem de electricidade). (Grácio, 1998b, pp. 118-119) Grácio (1998b) destaca, ainda, a introdução do ciclo preparatório do ensino técnico, de formação geral, como um dos mais importantes avanços para o Ensino Técnico e que coadunava às diretrizes apontadas na Conferência Internacional do Trabalho ocorrida em 1938, em Genebra, e que defendia o conceito de escola “estimulante e não estatificadora” (p. 126). Nesta nova formatação do Ensino Técnico realça a inclusão da disciplina Trabalhos Manuais, que “era propedêutica à aprendizagem profissional e visava, através de uma progressão graduada, levar os alunos a concluir e a executar projectos” (p. 119). A importância atribuída ao Desenho no ciclo preparatório pode ser notada quando comparada à carga horária semanal destinada às demais disciplinas, conforme elenca Grácio (1998b, p. 119). Tirando os Trabalhos Manuais ficavam 23 e 24 horas semanais, no primeiro e segundos anos, respectivamente, repartidas pelas disciplinas de Língua e História Pátria (5 h nos dois anos), Ciências Geográfico-Naturais (4 h), Matemática (3 h), Desenho (6 h no primeiro e 8 h no segundo ano), Religião e Moral (2 e 1 h),

Educação Física (2 horas) e Canto Coral (1 hora). 181


Consoante Carvalho (2008), Inocêncio Galvão Teles assumiu o Ministério da Educação Nacional de dezembro de 1962 até agosto de 1968. Através do Decreto-lei de 9 de julho de 1964, que decorre da necessidade de novos ajustes na estrutura educativa do país, foi ampliada a escolaridade obrigatória para seis anos (antes de quatro anos, na Reforma Leite Pinto). Na década de 1960, a ênfase na educação voltada para o crescimento econômico do país exige, mais uma vez, a intervenção do Estado que, baseado em consulta realizada junto a entidades ligadas principalmente ao setor industrial, no ano de 1963, identifica a necessidade “elevar o nível médio de qualificação da mão-de-obra industrial” (Murteira e Branquinho, 1969, p. 575). Desta forma, o Governo vêse impelido a desenvolver ações no intuito de responder às necessidades do mercado de trabalho e, em 1964, no âmbito do Ministério das Cooperações e Previdência Social, ações de formação profissional são desenvolvidas através do Fundo de Desenvolvimento da Mão de Obra (FDMO), seguindo as orientações da OCDE, estas direcionadas especialmente para a formação de adultos e aprendizes em contexto educacional extra-escolar (Grácio, 1998b, p. 130; Murteira e Branquinho, 1969). De acordo com Murteira e Branquinho (1969), as “profissões mais contempladas estão ligadas à construção civil e à indústria

metalúrgica e metalomecânica” (p. 577), nas quais os conhecimentos relativos ao Desenho de linguagem técnica são seguramente essenciais. A demanda por profissionais do Desenho, neste período, pode ainda ser comprovada através de “um relatório da Administração do Arsenal do Alfeite (1965) [que] acusa a falta de desenhadores e operários qualificados” (Grácio, 1998b, p. 130). Teodoro (2001, p. 240) recorda que nos anos sessenta "Portugal transforma-se num país dominantemente industrial (…), cujo produto interno cresce a ritmos inéditos" e a década de 1960 foi considerada a década de ouro do crescimento econômico português. Porém, o cenário internacional também é marcado por

profundas alterações. No plano externo, a situação mudava rapidamente com a internacionalização dos problemas políticos e a construção de grandes espaços económicos livres e de livre comércio (…). A criação da Organização das Nações Unidas (ONU) e das suas

organizações

especializadas

(UNESCO,

UNICEF,

FAO),

de outras

instituições nomeadamente de âmbito financeiro (Banco Mundial e FMI) e de apoio ao desenvolvimento (OECE/OCDE), associadas à constituição de espaços de comércio e integração económica no plano da Europa ocidental (CECA/CEE e 182


EFTA) e de organizações de defesa militar (OTAN), conduziam a uma progressiva internacionalização das questões políticas e a um debate constante das problemáticas aí, em geral, circunscritas aos espaços de decisão nacionais. (Teodoro, 2001, pp. 242-243) No início do mês de agosto de 1968, Salazar sofre um acidente cardiovascular que o deixaria com a saúde comprometida e Confirmada a incapacitação física de Salazar e não existindo qualquer mecanismo institucional para a substituição, para além do livre arbítrio do Presidente da República ― nem sendo conhecido sucessor indigitado, bloqueados que foram antes todos os caminhos da sucessão ―, a Américo Thomaz coloca-se a delicada e difícil decisão de indicar o novo Presidente do Conselho de Ministros. (…) Thomaz acaba por indigitar Marcello Caetano. (Teodoro, 2001, p. 237) Marcello José Neves Alves Caetano era professor catedrático da Faculdade de Direito, e ocupou a “Presidência do Conselho” de Portugal até o Estado Novo chegar a termo. Neste mesmo mês, Galvão Teles deixa o Ministério da Educação Nacional que passa a ser ocupado por José Hermano Saraiva, advogado e, na altura professor do ensino liceal, que teve uma breve permanência na pasta da Educação, esta marcada por movimentos estudantis contra o regime salazarista. O ministro Hermano Saraiva encerrou o seu mandato a 15 de janeiro de 1970 e foi sucedido por José Veiga Simão, o último Ministro da Educação Nacional. O Desenho na Reforma Veiga Simão Como ratifica Stoer (1983), “diz-se «a Reforma Veiga Simão» com boas razões, até a da comodidade de cristalizar em um nome a trama complexíssima de iniciativas, estudos, acções e vicissitudes de um processo que mobiliza tantas e diversificadas pessoas e instituições” (p. 793). Os últimos anos da Ditadura demonstram A incapacidade do Estado Português de resolver as tensões e crises através da produção e distribuição de bens económicos em escala comparável à das nações industrialmente avançadas (capacidade de elevar o nível geral de vida e de

promover medidas de segurança social, por exemplo) tornou-o fortemente dependente da produção e distribuição de bens simbólicos, tidos como passíveis 183


de substituir os económicos. Aqui, o sistema de ensino era vital. (Stoer, 1983, p. 794) A proposta de “Reforma” foi apresentada em 1971, pelo então ministro da pasta da Educação Nacional, Veiga Simão, e promulgada no “Diário do Governo” do dia 25 de julho de 1973, no qual está assinalado: “Lei n.º 5/73: Aprova as bases a que deve obedecer a reforma do sistema educativo”2. O texto legal estabelece que o “sistema educativo abrange a educação pré-escolar, a educação escolar e a educação permanente”, sendo a primeira destinada a crianças de 3 a 6 anos de idade; a segunda, de carácter obrigatório e com 8 anos de duração estava composta pelo ensino básico, secundário e superior e pela formação profissional. A educação permanente estava organizada de modo a abranger, de forma contínua, a “formação, a actualização e o aperfeiçoamento cultural, científico e profissional”. A formação profissional dirigia-se aos que possuíssem a “habilitação do ensino básico ou do curso geral ou complementar do ensino secundário” que optassem por esta modalidade de ensino, com vistas a “habilitar para o exercício de uma profissão”. Conforme afiança Teodoro (2006, p. 33), a Reforma Veiga Simão tem papel fundamental na renegociação

da inserção de Portugal no sistema mundial, período em “que a educação assumirá um lugar central no processo de recomposição do Estado e nos debates sobre a modernização e desenvolvimento do país”. O Manual de Desenho do Engenheiro “Poole” Segundo Penim (2008, p. 363), neste período os manuais de Desenho não primavam por “formar desenhadores e permitir a sua ascensão social (…). Trata-se sim de formar operários mais eficientes”. Dentre os manuais mais adotados, destaca-se o de autoria do engenheiro Avelino Poole da Costa, editado

em 1955, através do qual é possivel depreender que os conteúdos de Desenho possuíam diferentes graus de aprofundamento, consoante a modalidade do curso, como se pode observar no prefácio da publicação de 1973, intitulada “Desenho de Máquinas Livro I – Noções Preliminares”, nona edição, onde consta: “este volume de Desenho de Máquinas, que se destina ao ensino do 1º ano dos cursos de formação e do 4º ano dos cursos de aperfeiçoamento das profissões metalo-mecânicas e afins das Escolas Industriais” (1973, p. S/N), e no “Livro II – Noções Complementares”, destinado ao “2º ano dos Cursos de Formação e do 5º ano dos Cursos de Aprendizagem das profissões metalo-mecânicas e afins das Escolas Industriais” (1971, p. S/N). 184


No “Livro I: Noções Preliminares”, publicado em 1970 (5ª edição), percebe-se a ênfase atribuída ao Desenho para a formação técnica, bem como a referência à particularidade da utilização do “Método Europeu” de representação em Portugal (item “1” da figura 1) que aparece como justificativa na introdução do estudo das “Projecções ortogonais”. No item “2” (mesma figura) é aludido o uso destas “projecções” no Desenho Técnico, para a “representação de peças simples” (Costa, 1970, p. 83).

Figura 1. Projeções ortogonais. Desenho de Máquinas, Livro I: Noções Preliminares (Costa, 1970, p. 83) 185


A figura 2 demonstra que a abordagem dos temas relativos ao Desenho Técnico não difere muito da trazida nos atuais manuais de Desenho Técnico. Merece destaque, o cuidado do autor na explicação visual oferecida através da utilização de cores diferentes aplicadas às faces da peça, e a identificar as projeções correspondentes, bem como na disposição das vistas após o rebatimento dos planos de projeção.

Figura 2. Representação nos três planos de projeção. Livro I: Noções Preliminares (Costa, 1970, p. 87) 186


A utilização da representação de peças através de diferentes perspectivas é também destacada pelo autor, como se pode observar na figura 3.

Figura 3. Perspectiva Cavaleira. Livro I: Noções Preliminares (Costa, 1970, p. 91)

Há, ainda, a proposição de diversos exercícios organizados de forma a trazer o enunciado no verso da folha anterior, e as vistas ortográficas ou perspectiva na página ao lado, como demonstra a figura 4. 187


Figura 4. Exercício de perspectiva axonométrica em Detalhe do Livro I (Costa, 1970, pp.120-121)

Considerações finais: e chegam os Cravos… Durante a vigência do Estado Novo o processo de industrialização português foi pautado numa indústria pouco desenvolvida que se organizou, especialmente, em decorrência das alterações provocadas pela Segunda Guerra Mundial. A baixa competitividade do país teve como fator principal a falta de consistência da economia na deflagração de uma industrialização que acompanhasse os parâmetros internacionais. Neste contexto, a solução assumida pelo Governo foi a de aceitar e receber ajuda externa, nomeadamente dos Estados Unidos, que também forneceram apoio técnico à reorientação das escolas industriais. Não obstante o declarado desprezo à educação das classes menos favorecidas, o Ensino Industrial recebeu atenção dos poderes públicos diante da necessidade de formação da classe trabalhadora, esta essencial ao desenvolvimento do país, e, nesta modalidade de ensino, o Desenho Técnico se evidenciou como base fundamental à formação técnica industrial. No dia 25 de abril de 1974, um golpe militar com amplo apoio da população portuguesa encerraria definitivamente o Estado Novo e, com ele, a ditadura em Portugal. Os momentos que se seguiram à “Revolução dos Cravos” deflagraram amplas e profundas transformações que modificaram especialmente a vida das pessoas. No Sistema Educativo, entretanto, não foram processadas alterações imediatas, e as

bases da Reforma Veiga Simão permaneceram quase inalteradas, exceto a presença do ensino técnico que fora extinto. 188


Notas 1

European Recovery Program - ERP (Programa de Recuperação Europeia) ou Plano Marshall de ajuda

norte-americana à Europa do pós-guerra. Inicialmente o Governo português recusa a participação efetiva no ERP, mas a sua adesão seria assinada a 28 de setembro de 1948, em Lisboa, através do Acordo Bilateral de Cooperação Económica entre Portugal e os Estados Unidos, embora na “qualidade de país não beneficiário de auxílio financeiro” (Rollo, 1994, p. 859). 2

Disponível: http://dre.pt/pdf1sdip/1973/07/17300/13151321.pdf

Referências Caetano, F. M. P. S. (2009). O Ensino Técnico Artístico no Porto durante o Estado Novo: 1948-1973. Dissertação de Mestrado em História e Educação da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Porto. Cardim, J. C. (2000). O Sistema de Formação Profissional em Portugal. (2ª. ed.). Luxemburgo: Publicações Oficiais das Comunidades Europeias/CEDEFOP. Carvalho, R. (2008). História do Ensino em Portugal: desde a fundação da nacionalidade até o fim do regime de Salazar-Caetano. (4ª. ed.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. Grácio, S. (1998a). Ensino Técnico e Indústria. In M. C. Proença (Org.). O Sistema de Ensino em Portugal (séculos XIX-XX) (pp. 71-85). Lisboa: Colibri. Grácio, S. (1998b). Ensinos Técnicos e Políticas em Portugal (1910-1990). Lisboa: Instituto Piaget. Murteira, A. & Branquinho, I. (1969). A mão-de-obra industrial e o desenvolvimento português. Análise Social,

VIII

(27-28),

560-583.

Retirado

em

documentos/1224254382D1DM9hr3Dq 38CS5.pdf Porto: Profedições. 189

17/05/2010,

de:

http://analisesocial.ics.ul.pt/


Penim, L. (2000). Da Disciplina do Traço à irreverência do Borrão: o currículo de Desenho e de Trabalhos Manuais no ensino liceal. Os discursos, as identidades e os sujeitos entre 1936-1972. Dissertação de Mestrado em Ciências da Educação, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, Lisboa. Penim, L. (2008). A Alma e o Engenho do Currículo: história das disciplinas de Português e de Desenho no ensino secundário do último quartel do século XIX a meados do século XX. Tese de Doutoramento em Educação, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, Lisboa. Pereira, J. & Fonseca, C. (1979). Subsídios para a História da Indústria Portuguesa. Lisboa: Guimarães. Rodrigues, M. & Mendes, J. (1999). História da Indústria Portuguesa: da Idade Média aos nossos dias. Mem Martins: Europa-América. Rollo, M. F. (1994). Portugal e o Plano Marshall: história de uma adesão a contragosto (1947-1952). Análise Social. 1994, XXIX (4º), 128, 841-869. Retirado em 28/10/2009, de: http://analisesocial.ics.ul.pt/ documentos/1223377809U6sZF1oa6Pr69U Q4.pdf Stoer, S. (1983). A Reforma de Veiga Simão no Ensino: projecto de desenvolvimento social ou «disfarce humanista»? Análise Social, 1983, XIX (3º-4º-5º), 77-78-79, 793-822. Retirado em 12/03/ 2009, de World Wide Web: http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1223 465326H7aDW8sd7Bn98GQ5.pdf. Stoer, S., Stoleroff, A. & Correia, J. (1990). O Novo Vocacionismo na Política Educativa em Portugal e a Reconstrução da Lógica da Acumulação. Revista Crítica de Ciências Sociais, Fevereiro 1990, 29, 11-53. Retirado em 01/01/2010, de: http://www.ces.fe.uc.pt/publicacoes/rccs/029/SStoer_et_al._pp.11-53.pdf Stoer, S. & Magalhães, A. (2005). A Diferença Somos Nós. Gestão da mudança social e as políticas educativas e sociais. Porto: Afrontamento. Teodoro, A. (2001). A Construção política da Educação: Estado, mudança social e políticas educativas no Portugal contemporâneo. Porto: Afrontamento. Teodoro, A. (2006). Profesor, para quê? Mudanças e dasafios na profissão docente 190


191


192


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.