Luciana Rodrigues Luciane Vieira Z M. A. Jr.
Márcia Albuq Marco Antonio Rodrigues Marimar Maurício Santana Pires Milton Maciel R. Muniz Roberta Del Carlo Satoru Hama Thiago Félix de Morais Thiago Lucarini Vanessa de Cássia
Organizadores: Claudio Quirino & Zélia de Oliveira Os Autores:
Andrea Pelegrinelli Angeline Sophie
Coletânea Contos Eróticos
Marca do Anjo
Organizadores: Claudio Quirino & Zélia de Oliveira
Jussara Pires
“...Não havia mais limites nem pudores. Agora, literalmente, ele me conhecia de cabo a rabo. Assim, sucederam-se outros encontros, um momento de cada vez, momentos de intenso prazer, ao menos para mim, em outros dias, tardes, noites. Despi-me de corpo e alma. Expus-me como jamais fiz para um “desconhecido”, não virtualmente. Coloquei minha alma, mostrei meu lado mais secreto, mostrei meu corpo. Confessei meus maiores “pecados”, meus segredos mais lacrados. Agora ele sabe quem sou, não sei muito (ou nada) sobre ele. O que importa? Nada importa. Não importa se é um príncipe que bateu à minha porta, ou se um sapo que saiu do brejo e entrou pela janela. Apenas surgiu, em um momento em que eu precisava me sentir mulher novamente, jorrar, inundar. E, mesmo sozinha, do outro lado da tela, por alguns momentos estive acompanhada, e me senti desejada. Ele conseguiu fazer: “Simples, assim.” E quando vejo aquele sorriso gostoso da sua foto no Face, ainda imagino as loucuras trocadas, rio sozinha, rio de mim por ser assim...”
Angell Yagher Angie Stanley Ariela Pereira
Prefácio Achel Tinoco
Armando Carlos Bárbara Biazioli Camila Alvim Cobra Criada
Coletânea Contos Eróticos
Daniel Barros Diego Beunizam Erick Reis Godliauskas Zen Giovane Luz da Costa Hiago Rosas J. B. Souza
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Organizadores: Claudio Quirino & Zélia de Oliveira
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Contos Eróticos Prefácio Achel Tinoco
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Copyright © 2013 by Claudio Quirino e Zélia de Oliveira Todos os direitos desta edição reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida por qualquer processo eletrônico ou mecânico, fotocopiada ou gravada sem autorização expressa do autor. ISBN: 978-85-8255-086-1 Projeto gráfico: Aped - Apoio e Produção Editora Ltda. Editoração eletrônica: Thiago Ribeiro Beta reader: Maria Lucia Cavalcanti Revisão: Aped - Apoio e Produção Editora Ltda. Capa: Thiago Ribeiro CIP-Brasil. Catalogação-na-Fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros – RJ C658 Coletânea contos eróticos / organizadores Claudio Quirino & Zélia de Oliveira ; prefácio Achel Tinoco. - 1. ed. - Rio de Janeiro : APED, 2013. 184 p. : il. ; 14x21 cm. ISBN 978-85-8255-086-1 1. Ficção brasileira I. Quirino, Claudio. II. Oliveira, Zélia de. 13-05776
CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3
03/10/2013 04/10/2013
Aped - Apoio & Produção Editora Ltda. Rua Sylvio da Rocha Pollis, 201 – bl. 04 – 1106 Barra da Tijuca - Rio de Janeiro – RJ – 22793-395 Tel.: (21) 2498-8483/ 9996-9067 www.apededitora.com.br aped@wnetrj.com.br
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“E a coisa mais divina Que há no mundo É viver cada segundo Como nunca mais...” Vinícius de Moraes
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Prefácio
Ah, essas meninas e esses meninos e suas urgências e suas concupiscências; e seus encantos púberes e seus sexos erotikontos; querem porque querem se encontrar com o Sr. Gray; quiçá, ser o próprio Sr. Gray, que lhes ensine a morrer de amor e a viver o amor em toda sua extensão e dinamismo, em todo seu gozo, até caírem sob o mesmo cansaço e escrever, finalmente, sobre o mesmo assunto. Por mais que o escrevamos, pouco dizemos, quase nada sabemos, e muito ainda precisamos sonhar, fantasiar, viver. Um professor e os seus Cinquenta Tons, quando na verdade bastava-nos um, um tom acima da paixão, um tom abaixo do amor, entre a cama real e o imaginário gozador. Um confessionário tão íntimo, que somente a nós, assanhados leitores, seria possível revelar, numa linguagem tão direta e sensual: suas definições e seus desejos proibidos, sempre em busca de um arrepio a mais, de um toque a mais, de um orgasmo a mais, que nos seja múltiplo, eterno; que nos faça sonhar outra vez e viver dessa lembrança delirante. Somos todos intensamente imperceptíveis: somos Isadora, Diana, Vanessa, Angeline, Thiago, Diego, Marimar, Camila, R. Muniz, Ariela, Daniel, Marco Antonio, Satoru, Hiago, Angie, 7
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Orgs.: Claudio Quirino e Zélia de Oliveira
Márcia, J.B. Souza, Roberta, Andrea, Angell, M. A. Jr, Erick, Cobra, Jussara, Luciana, Marcia, Bárbara. Somos assim, uns amantes sem causa, aqueles amantes que gostaríamos de ser um dia, uma vez, uma noite, uma cama, um amor, um gozo que nos venha e nos mostre que nada mudou no céu. Naturalmente, num despertar da primavera, os morangos de Troy já estarão maduros e poderão ser saboreados entre as suas coxas de seda, sobre os seus pelos de algodão, como a pele que se rejuvenesce depois de um ato apimentado sob gotas de Chandon, umedecendo o seu Ponto G, de modo que sinta uma apaixonante submissão e nos conte depois esses seus pecados... Sim, dona Sinhá, sempre nos restará uma última dose antes que se dispa do seu vestido de noiva e o deixe cair mansamente pelos quadris até amanhã de manhã, como numa louca maratona, como num doce rally, ainda que nos deixe numa estarenga daquelas; ainda que eu não saiba que diabos venha a ser “estarenga”! Mas como se diz: “Antes tarde do que nunca”, não é mesmo? O certo é que essas meninas e esses meninos estão de parabéns, conseguiram jorrar no papel toda a sua criatividade, todo o seu gozo e todo o seu amor.
Achel Tinoco Poeta e escritor baiano
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Sumário
A Amante............................................................................................13 Camila Alvim
A Cidade sem Cuecas.......................................................................21 Maurício Santana Pires
Antes Tarde do que Nunca............................................................25 Vanessa de Cássia
Apaixonante Submissão................................................................31 Angeline Sophie
Apartamento Errado ......................................................................35 Milton Maciel 9
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Orgs.: Claudio Quirino e Zélia de Oliveira
As Irmãs Metralha...........................................................................39 Armando Carlos
Concupiscência.................................................................................45 Thiago Félix de Morais
Confessionário .................................................................................49 Diego Beunizam
Conte-me seus Pecados..................................................................55 Marimar
Definições...........................................................................................59 R. Muniz
Desejo Proibido................................................................................65 Ariela Pereira
Diana, do Pastoril............................................................................71 Daniel Barros
Divino & Profano..............................................................................75 Luciane Vieira Z
Encantos da Puberdade.................................................................81 Marco Antonio Rodrigues
Erotikonto..........................................................................................87 Satoru Hama
Estarenga_la_india@live.com.......................................................95 Erick Reis Godliauskas Zen 10
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Contos Eróticos
Imperceptível....................................................................................99 Hiago Rosas
Isadora ............................................................................................. 103 Angie Stanley
Meu Encontro com Sr. Grey e Seus Tons................................ 111 Márcia Albuq
Meu Professor................................................................................ 117 J. B. Souza
Nada Mudou no Céu..................................................................... 121 Roberta Del Carlo
Naturalmente................................................................................. 127 Andrea Pelegrinelli
No Despertar da Primavera....................................................... 131 Angell Yagher
O Andar de Cima............................................................................ 137 Giovane Luz da Costa
Os Morangos de Troy................................................................... 139 M. A. Jr.
PontoG.com..................................................................................... 145 Cobra Criada
Rally................................................................................................... 151 Jussara Pires 11
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Orgs.: Claudio Quirino e Zélia de Oliveira
Sabor de Chandon......................................................................... 159 Luciana Rodrigues
Sinhá................................................................................................. 163 Marca do Anjo
Última Dose.................................................................................... 169 Bárbara Biazioli
Vestido de Noiva............................................................................ 177 Thiago Lucarini
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A Amante
Camila Alvim
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ra sempre durante o dia, eles sempre se encontravam por volta da 13h30min. A princípio, trepavam e voltavam para suas casas, sem muita conversa. O nome dela é Ana, eu sei e ele sabe que depois disso tem outro nome, talvez Carolina ou Isabel, mas não sabemos ao certo qual seria esse nome e tendo ela aquela mão de dedos alongados não seria ao segundo nome que ele se apegaria. Conheceram-se num bar. Destes bares em que os homens frequentam com outros amigos homens para despejar a vida num copo de uísque barato ou tomar um chope quente, sei dos detalhes que encontrei nas cartas. Ela vestia uma saia que não devia cobrir-lhe as coxas, ele sempre fora louco por bundas redondas e grandes. Uma camiseta desta bem vagabunda, tipo regatinha, que chegava quase ao comprimento da saia, rasteiras no pé, um lindo pé tatuado com estrelinhas. Cabelos compridos e trançados como se fosse uma hippie cheia de rastafáris; ela era branca, muito branca, e usava lenços na cabeça, miçangas e pulseiras de couro. Minha selvagem, referia-se assim ele à ela em todas as cartas, em todas as cinco. 13
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Como sempre provém o destino nestes encontros, ele sem querer derramou alguma bebida gelada na sua blusa transparente, sem proteções, e então passou os anos seguintes todos a aquecer os mamilos dela para compensar o desleixo. É inegável a sua eximia educação. A primeira vez em que eu a vi, confesso que também me excitei por ela, que parecia dançar enquanto, na verdade, apenas caminhava, seu cheiro vinha do outro lado da rua e lembrava-me carambola. Tinha ido até lá apenas para arrancar seus cabelos, trança por trança, porém, afastei o banco do meu carro e com meus dedos gozei sozinha e calada, fingindo ser ela. Certamente saía fodida e melada daquele quarto de hotel quase todos os dias antes mesmo das 14h; em geral, eu, no mesmo horário, estaria lavando louças ou fazendo o dever de casa com meus filhos. Voltei para casa, chorei por horas até o jantar. Fiz a ele uma comida congelada e ignorei as crianças por uma ou duas semanas; amava meus filhos, minhas crias, mas, nem mesmo conseguia pentear-lhes os cabelos. Olhava minhas feias unhas, minha pele gasta no tempo, meu cabelo esbranquiçado; então decidi acabar com aquele cretino, canalha, com quem me casara ainda virgem, antes mesmo dos dezoito. Permiti a mim mesma o ódio, pensei em dar para o padeiro, para o vizinho ou para o entregador de gás. Mesmo gasta de tempo e cuidado com os outros, eu sempre tive boas oportunidades para traí-lo. Optei por uma segunda alternativa. Fui ao salão mais próximo, os meninos para os avôs e a minha menina finalmente pode dormir na casa de uma amiguinha, sem nem mesmo pedir autorização ou consentimento dele, gastei todos os limites dos cartões que eu tinha acesso, comprei roupas, sapatos, jóias, lavei o carro, (agora entendo o prazer dos homens em lavar o carro e fiz isso de short curto e blusa branca transparente na garagem do prédio), paguei equipes de faxina para limparem e organizarem a casa. Mandei colocar tudo que era dele em caixas de papelão e malas, recortei fotografias e algumas camisas, queimei 14
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todas as gravatas a ferro e amarrei minha aliança no cadarço de um tênis qualquer, mudei cortinas e cadeiras, dei-me novos perfumes, alguns com cheiro de frutas; e enchi de flores a sala, comprei um bolo de chocolate e um vibrador enorme que ficava escondido dentro de um urso de pelúcia, fiz questão que o cartão fosse passado no sexy shop utilizando o nome do mesmo na nota da fatura. Tudo isso em uma única tarde. Sentei-me nua na sala de estar, ele era sempre pontual. Mandei que tirassem todas as luzes dos bocais e nem eu mesma sei por que fiz isso, acendi apenas um abajur, algumas velas. Não tinham brinquedos esparramados na casa que oferecessem perigo, apenas eu era o perigo e o brinquedo. A poltrona estava em frente à porta, abri as minhas pernas, deixei a porta destrancada, coloquei algo para tocar no fundo que não tinha lá grande importância, tocava-me e acariciava-me compassadamente e de olhos fechados, meus seios fartos pareciam mais inchados e meus lábios tremulavam. Eu, ali, toda excitada esperando o sexo que há anos não fazíamos, acho que nunca fizemos. Sexo bom, queria trepar, foder, trepidar de tesão, contrair, enlouquecer também, sair dolorida como de uma aula de yoga, queria pingar suor e gozo. Não queria fazer amor, não queria mais ser a amada dele, queria ser amassada como um papel toalha e ser lambida como sorvete, queria ser chupada como uma uva, queria que agarrasse meu cabelo e segurasse meu corpo todo amolecido com apenas uma mão, queria ser devorada feito bicho, soterrada pelo corpo dele. Fiquei ali, aberta de todas as formas, esperando por isso. Eu estava vermelha, com mais sangue circulando no meu corpo, eu me sentia macia e adorava ser mulher naquele momento, adorava minha própria vagina e o cheiro dela. Não vi seu rosto quando entrou, acho que ele não viu o meu, algumas lágrimas escorriam e vez por outra eu apertava a boca e não era excitação; escutei aquela pesada pasta cair no chão e sei que ele levou algumas horas para ter certeza (pareceram horas) e eu permaneci imóvel, com o pescoço caído 15
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para trás, e me masturbando deliciosamente. Era mesmo eu, mais nua do que nunca. Não disse palavra alguma, arrancou a roupa toda, a gravata apertada que eu tinha lhe dado no Natal, as calças, as meias (detalhe importante porque há anos ele não tirava mais as meias). Estava sujo e suado, e eu macia e cheirosa. Ajoelhou na poltrona, ali mesmo, enfiou a língua dentro de mim, sugava-me desesperadamente, enfiou-me os dedos, massageou, era como se visse minha boceta pela primeira vez, apertou minha bunda com tanta força que quando percebi já estava com a virilha encaixada em seu pescoço, corpo jogado para trás na poltrona inclinada apoiada na parede. Justo eu que sempre detestei encostar coisas na parede. Segurava-me apenas com a ponta das mãos, agradeci aos meus anos de balé, que sabia agora não estarem tão enferrujados. Eu gemi alto, eu gritei e então ele mencionou: Cadê as crian... Antes de terminar a frase, dei-lhe um tapa na cara, foi o gatilho para o tapa que ele queria há anos devolver-me, e então chamou-me de vadia, e depois de vadia novamente e aí esqueci completamente meu nome, agora eu era só a vadia. Caí derretida no colo dele, nós que nunca fizemos sexo anal, fazíamos sempre papai e mamãe após as missas de domingo. Sentei-me sobre ele, era lá que queria enfiá-lo, queria guardá-lo, apertá-lo e deixar que ali gozasse enquanto eu controlava a situação. Senti-o gozando, tremendo e o celular tocava sem parar, pequenos bips que eu imaginava de quem eram, cinicamente perguntava: “quer parar?” Deite-me de costas, propositalmente e pedi que me massageasse com aquele gozo escorrido em mim, queria ficar toda melada do gozo dele e fazendo isso, em segundos, já estava lá a tora dele novamente em pé, duro como não mais me lembrava querendo entrar em mim, e assim me colocou de quatro, de lado e finalmente na cadeira, eu jorrava e salivava, eu xingava e rezava. Naquele momento esqueci a esposa e fui tão somente e completamente a amante, tão somente a outra, a vadia. Nada lá eu havia escolhido mais, nada mais ali era 16
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meu ou nosso, não me importava sua agenda e nem a família. Amamentei-o ternamente, aconchegado no meu peito e eu sabia fazer isso, amamentei como a um quarto filho, acariciei seu rosto e dei segurança ao seu corpo. Mamei dele como uma boa vaca e adorei, arranhei-o como privilégio de esposa, como resquício do que fomos, marquei-o feito meu gado. Mordi suas costas, apertei aquela bunda masculina, linda, que tanto malhava na academia e usei meu marido como coisa feita para se usar. Fomos para o quarto e ele nem bem entendia no que tropeçava, estava exausto e assustado, suado mais do que de costume, ansioso e com o coração continuamente disparado. Descansou um pouco na cama enquanto eu preparava-lhe um banho quente, mas não dormiu nem mesmo cochilou. Acesas somente as luzes do espelho, a essa altura já começava a clarear o dia. Sentei-me na cama e perguntei-lhe com voz mansa: Como foi seu dia, meu amor? Quer falar comigo sobre a escola dos meninos? Sobre a diabetes da sua mãe? Sobre o pé amputado de seu pai? Sobre a morte de sua irmã? Quer saber da reunião de condomínio? Quem sabe queira verificar as contas de gás, água, luz ou seus cartões? Enchia-lhe de questões sem dar-lhe tempo hábil para respostas. Então disse: Vem! E foi na banheira que o dia nasceu amolecido na água quente, ainda brincamos com a pele um do outro, fizemo-nos arrepiar por várias vezes, deixei a água sempre aquecida e foi por mais de duas horas que ficamos ali. Sempre soube que o sol nasce na janela do banheiro, ele notou que sobre a pia não estava sua escova de dente, nem o barbeador, nem os óculos de leitura. Ele notou a cicatriz das minhas cesáreas e as acariciou por longo tempo, beijou com amor as rugas no canto dos meus olhos, beijou meus pés molhados, olhou para mim conforme a luz entrava. Ele disse que ligaria para o chefe e diria que não iria trabalhar, estava cansado e mentiria. Nesta hora afirmei: “Mentes bem!” Acho que foi só aí que ele percebeu. Levantou-se, cobriu-se com a toalha e nem notou que a toalha também era nova, 17
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assim como os lençóis, os tapetes, até os sais de banho. Foi até seu livro que ficava dentro da caixa dos sapatos de nossos casamentos. Tirou de lá coisas dele e não achou as cartas de sua selvagem. Voltou à banheira, pálido sentou-se novamente na água. — Está tudo pronto. — Eu disse. — Para quê? — Ele respondeu. — Para eu começar novamente — respondi. — Sozinha? — Indagou gaguejando. — Agradeça a Ana — disse ironicamente, e de fato agradecida. — Zombas de mim? — Irritado, quase gritou. Eu comecei a rir histericamente, há anos não ouvia o termo “Zombas de mim. Lembrei que embora eu fosse alguns anos mais velha que Ana, ele era mais velho do que nós duas. Pedi que ele ainda, naquela manhã, retirasse todas as coisas de nossa casa, sem pausa para dormir, antes que os meninos voltassem, avisei que não queria choro ou drama, e assim ele fez. Não tivemos problemas na separação nem brigamos por visitas e guardas, eu era ótima mãe e ele um excelente pai. Depois de um bom sexo, tudo fica em paz. Sequei-me, passei hidratante, e óleos corporais perfumaram-me; amarrei os cabelos como fazia na faculdade, usando apenas uma caneta ou lápis, andei descalça pela casa. Fiquei gostosa de comer, de olhar e sentir, umedecida. Meus lábios estavam esfolados, inchados, ambos os lábios, e passei manteiga de cacau na boca e depois um gloss vermelho, nada mais de maquiagem. Por bom tempo usei apenas vestidinhos de malha, curtos, com estampas coloridas, saias rodadas longas e blusas coladas, brincos grandes e miçangas. Ele não ousou falar comigo nem quando recebeu as faturas do cartão, levou todas as caixas, malas e sua coleção de copos do time de futebol. Um dia mandou-me flores, eu não abri o cartão e deixei lá as flores por um tempo até que elas começaram a cheirar a velório; aí joguei-as no lixo. Viajei com as crianças, fomos para a Disney. 18
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Um ano depois passei de carro pelo motel deles, era 13h30min e nada, nada dele nem dela, retornei outras vezes, outros meses, em dias de semana diferentes. Sempre nada. Naquela época, nas semanas anteriores a minha separação, eu consegui o telefone de Ana (só Ana) e então liguei. Marcamos um café.
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