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De quem é o lixo que está aqui?

DESCARTE INADEQUADO DE RESÍDUOS PROVOCA PROBLEMAS DE SAÚDE E SEGURANÇA

Alice Bezerra

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Estudo realizado pelo Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2020 evidencia que cada brasileiro produz, em média, 379,2 kg de lixo por ano, ou seja, mais de 1 kg por dia. Os dados são frutos de pesquisa realizada e publicada pela Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe).

Propícios para o acúmulo de lixo e entulhos, os terrenos baldios tornam-se, dia após dia, um problema ambiental e de saúde pública, na cidade de Campina Grande. O despejo indevido de todo tipo de sobra tem prejudicado famílias que vivem nos arredores desses locais, e dificulta o acesso de quem precisa transitar próximo a essas áreas.

Essa é a realidade de um trecho no bairro do Santa Rosa, precisamente na rua Henrique Sales Monteiro. A localidade tem se tornado um depósito para pneus velhos, lixo doméstico, comidas fora da validade, entulho, árvores cortadas, móveis e eletrodomésticos inutilizáveis. Além do odor provocado por essa prática criminosa, os pedestres precisam

LIXO | TERRENOS BALDIOS COM LIXO TEM JUNTADO URUBUS NO BAIRRO DO SANTA ROSA

5 mil toneladas DE LIXO

SÃO RECOLHIDOS EM TERRENOS BALDIOS E LOCAIS PÚBLICOS

arriscar-se caminhando pela pista, pois o acostamento fica repleto por uma grande quantidade de lixo, inviabilizando a passagem.

Geuza Macêdo, que mora no bairro há mais de 13 anos, precisa passar pela região diariamente e conta o quanto isso é desagradável.

“Esse lixo é frequente aqui, a prefeitura vem e recolhe de manhã, e de tarde já tá cheio de lixo de novo. As pessoas colocam restos de comida, e isso atrai urubu, barata, rato, até na casa da gente entra barata que vem desse lixo acumulado”. Relata a dona de casa.

Geuza conta ainda, que além dos insetos e do mal cheiro que o lixo acumulado causa, outro grande problema é a segurança: “Todos os dias eu tenho que passar por esse trecho, dividindo a pista com os carros. Não conseguimos usar a calçada porque as pessoas colocam lixo. Eu mesma já presenciei uma amiga ser atropelada por uma moto, porque ela tinha que desviar do lixo e o rapaz da moto a atropelou. Estamos correndo risco todos os dias”.

A cena se repete em um terreno privado no bairro do Monte Santo, onde a população insiste em fazer o descarte de todo o material que não tem mais serventia, além de entulhos e resto de material de construção. O morador da rua, Lucas Araújo, relata que essa realidade sempre existiu, e que já presenciou diversas vezes o descarte indevido nesse terreno.

“As pessoas jogam muito entulho e restos de comida. Junta barata e rato, e o odor é muito desagradável. A prefeitura sempre faz a limpeza do terreno, mas as pessoas continuam jogando, infelizmente.” Conta o morador da rua Francisco Calixto.

Além desses transtornos o acúmulo de lixo pode ocasionar diversas doenças, prejudicando ainda mais a população que mora nos arredores desses ambientes. O Agente de Vigilância Ambiental especializado em combate de endemias, Wellington Marcus, relata que a necessidade de informar para a Sesuma sempre que alguém se depara com essa situação pela a cidade, pois esse lixo potencializa o aparecimento de doenças e endemias.

“O saneamento básico é importante e quando as pessoas descartam baldes, tampinhas e até mesmo casca de ovo, é prejudicial. Isso se intensifica no período de chuva, pois é quando mais se proliferaram os Aedes aegypti e aumentam os casos de Dengue, Zika e Chikungunya. Também aparecem ratos, escorpiões e baratas, que invadem as residências próximas. A limpeza é feita pela prefeitura, mas as pessoas têm que ter consciência de que não pode ser jogado lixo em terrenos abandonados, de que essa realidade prejudica a eles mesmos”. Lucas Araújo conta que no período de inverno toda a sua família foi diagnosticada com a Chikungunya e questiona se o lixo que fica próximo da sua residência pode ter sido a causa da doença. “Meu irmão pegou chikungunya e logo depois minha família inteira teve: minha tia, eu e minha avó de 86 anos. Ela já tem dificuldade para andar, pela idade avançada, e depois da chikungunya reclama diariamente de dores nas articulações. Nós buscamos fazer a nossa parte, sempre fazemos o descarte correto, limpamos os locais com água, mas infelizmente esses terrenos ficam cheios de lixo e objetos que acumulam água parada”.

Mas afinal, de quem é o lixo que se acumula nos terrenos abandonados da cidade? De acordo com o site oficial da Secretaria de Serviços Urbanos e Meio Ambiente (Sesuma), Campina Grande possui 960 terrenos em situação de abandono. Neles, pessoas fazem o descarte de lixo de todo tipo, e a prefeitura se encarrega de limpar mensalmente. A limpeza desses locais tem um custo de aproximadamente R$400 mil para os cofres públicos e o Secretário da pasta, Geraldo Nobre, afirma que esse dinheiro poderia estar sendo utilizado em outros setores, como saúde e educação.

Há informações, ainda, de que a Sesuma retirou cerca de 5 mil toneladas de lixo na última limpeza feita em terrenos baldios e áreas públicas na cidade. No entanto, poucos dias após a limpeza desses locais, já era possível encontrar um cenário parecido com o de antes da limpeza.

Geraldo Nobre utiliza os veículos oficiais da secretaria para alertar a população para a necessidade de manter a cidade limpa e enfatiza que esse é um dever de toda a população, que precisa agir com bom senso e zelar pelo próprio ambiente. Wellington Marcus concorda que a população precisa abrir os olhos: “O problema é a falta de consciência ambiental e educação. É preciso entender que o lixo produzido tem um local correto para coleta. A prefeitura tem por obrigação limpar o espaço, mas é a população que precisa conservar esse ambiente limpo”.

As denúncias sobre descarte irregular de resíduos podem ser feitas pelos telefones 3310-6115 ou 3310-6125, nesses números as pessoas podem também solicitar a limpeza desses locais.

Empreendedorismo Sustentável’

GERADOR DE RENDA E UM CAMINHO PARA UM FUTURO DE SUCESSO, JOVENS DA CIDADE DE AREIA DESENVOLVEM AÇÕES QUE GERAM RENDA E PRESERVAM O MEIO AMBIENTE

Daniel Ribeiro e Sabrina Cabral

Segundo o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, por ano no Brasil são gerados mais de 82 milhões de toneladas de lixo, e pouco mais de 2% são reciclados. A previsão é que até 2040 os resíduos orgânicos produzidos pela população tenham seu índice de reciclagem elevado para 13,5%, podendo ser utilizados como fontes de energia e geradores de emprego e renda através do empreendedorismo.

Segundo o IBGE o Brasil conta com mais de 215 milhões de habitantes, que produzem diariamente cerca de 98% de resíduo orgânico, cuja destinação poderia ser a reciclagem.

Na comunidade Chã de Jardim, zona rural da cidade de Areia-PB, a 128 km da Capital, João Pessoa, vem sendo desenvolvido o projeto Composteca, uma iniciativa da ecó-

loga e mestre em Ciência e Tecnologia Ambiental pela UEPB, Cristiane Ribeiro. O projeto é realizado em parceria com Felipe Oliveira, graduado em Ciências da Computação e atuante na área da Robótica. Juntos, buscam dar destino correto a uma parte do resíduo orgânico produzido pela fábrica de polpa de frutas Doce Jardim, localizada na comunidade de Chã de Jardim.

“No mestrado eu tive uma experiência direta com tratamento do resíduo domiciliar. Na época, o material era coletado no bairro das Malvinas, em Campina Grande, e levavamos para montar o experimento na UEPB”, disse Cristiane .

Seus olhos se voltaram para o lugar onde mora e observou a necessidade de cuidar ainda mais do INOVAÇÃO | Algumas iniciativas fazem toda a diferença para ser um empreendedor sustentável

meio ambiente. Foi quando teve a ideia de tratar parte do resíduo gerado na produção da Fábrica de Polpa de Fruta Doce Jardim. Ela percebeu que uma parte do resíduo era destinado para alimentação animal, e a outra, recolhida pela coleta municipal e levado para o aterro sanitário. “Sabemos que o resíduo orgânico tem um potencial muito grande e é rico em matéria orgânica, foi quando eu pensei: Porque não aplicar aqui a experiência que eu tive na Universidade?”, ressaltou.

Inicialmente, Cristiane e Felipe investiram R$900,00 no projeto da composteira, que teve início em 2014. Mensalmente são coletados 250 kg de resíduos para transformar em adubo. A média é feita a partir dos recipientes utilizados para transporte da matéria-prima.

Compostagem

Os resíduos são colocados na composteira desenvolvida especialmente para o projeto junto com outros materiais orgânicos. A decomposição é feita pelas bactérias aeróbicas, que necessitam do oxigênio para decompor o material. O equipamento contém uma caixa de engrenagens que faz toda a mistura de forma manual.

Segundo Felipe, para manter o processo equilibrado foi criado um controle de temperatura. “Com a robótica foi possível inovar nisso também. Agora podemos fazer a medição usando um sensor de temperatura e os dados são enviados por wireless em tempo real, podendo ser acessados de casa, sem precisar estar lá na hora, medindo.”

Explicou também como funciona o sistema robótico que está desenvolvendo. “Esse é um sistema de monitoramento de tem-

peratura da composteira. É feito por uma placa microcontroladora que vai receber os dados através de um sensor tipo sonda. Que será colocado na composteira. Também está em fase de desenvolvimento um site, que vai receber esses dados por wi-fi.”

A composteira conta com a “internet das coisas”. Ela se comunicará com um sistema mecânico de reviramento automático e de temperatura. Ativará o sistema de irrigação acoplado a bombas que irão manter a umidade do material. Essas são as inovações tecnológicas a serem implantadas na chamada Composteira Inteligente.

Qualidade do adubo

Após 3 meses no processo de compostagem um teste de fitotoxicidade é feito para ver se ele está mesmo maturado e no ponto ideal para aplicar nas plantas. Depois de aprovado, o composto orgânico é peneirado, ensacado em sacos de 1Kg e de 4Kg e destinado para venda na Bodega Vó Maria, localizada na loja da comunidade com preços que variam entre R$5,00 e R$20,00 reais. O projeto que iniciou com um investimento de R$900,00 traz agora um retorno de em média R$200,00 por mês, com a comercialização do produto.

Os recursos adquiridos com a venda dos adubos são destinados para melhoria do projeto como: a participação em eventos para divulgação das idéias, que tem como objetivo incentivar outras pessoas a transformarem a realidade local.

Quando questionados se existe alguma metodologia de disseminação do projeto na comunidade responderam que a questão da sensibilização e da produção de compostagem na comunidade é feita em eventos da própria comunidade, isso acontece através de oficinas anuais, ministradas para uma média de 100 participantes da capoeira que inclui pessoas de várias idades, moradores da própria comunidade.

Divulgação

O projeto tem sido divulgado nas redes sociais (@composteca) e em vários eventos, como a “Mostra Chã de Jardim” que é realizada na Cidade de Areia, onde toda a população é convidada a conhecer as atividades desenvolvidas. Esse modelo de divulgação proporciona o contato com o público em geral, fazendo com que conheçam o desenvolvimento regional e sustentável e como se dá a produção de compostagem. Promovendo sensibilização, a fim de que futuramente possam implantar essa prática no seu dia a dia.

O projeto está há oito anos dando um destino certo ao material que antes iria para o aterro sanitário e que agora, volta para a prateleira como produto gerador de renda. A ideia de Cristiane e Felipe vem ganhando cada vez mais destaque com o Projeto Composteca, pois são pioneiros nesse formato de empreender no Brejo paraibano.

TECNOLOGIA | Algumas iniciativas fazem toda a diferença para ser um empreendedor sustentável

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