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Dell’Architettura Investigação fotográfica sobre a influência italiana na paisagem carioca
Fotografias de Aristides Corrêa Dutra
Istituto Italiano di Cultura Rio de Janeiro
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
R219Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) R219 R219 Raponi, Livia. Raponi, Livia. Raponi, Livia. Dell’Architettura: investigação fotográfica sobre a influência italiana na Dell’Architettura: investigação fotográfica sobre a influência italiana na sobre Dutra. a influência italiana na Dell’Architettura: investigação paisagem carioca / Livia Raponi; fotográfica Aristides Corrêa – Rio de Janeiro: paisagem carioca / Livia Raponi; Aristides Corrêa Dutra. – Rio de Janeiro: paisagem carioca Livia Raponi; Instituto Italiano de /Cultura do Rio deAristides Janeiro, Corrêa 2021. Dutra. – Rio de Janeiro: Instituto Italiano de Cultura do Rio de Janeiro, 2021. Instituto Italiano de Cultura do Rio de Janeiro, 2021. 80 p. : il. Color. ; 21 cm. 80 p. : il. Color. ; 21 cm. 80 p. : il. Color. ; 21 cm. ISBN 978-65-89893-28-8 ISBN 978-65-89893-28-8 ISBN 978-65-89893-28-8 1. Arquitetura italiana – Brasil. 2. Fotografia – Paisagem carioca. I. Dutra, 1. Arquitetura italiana – Brasil. 2. Fotografia – Paisagem carioca. I. Dutra, Aristides Corrêa. II. italiana Título. – Brasil. 2. Fotografia – Paisagem carioca. I. Dutra, 1. Arquitetura Aristides Corrêa. II. Título. Aristides Corrêa. II. Título. CDD: 720.9450981 CDD: 720.9450981 Ficha catalográfica elaborada por CDD: 720.9450981
Ficha catalográfica elaborada por Débora Soares Vicente de Santana – Bibliotecária CRB-9/1914 catalográfica por CRB-9/1914 Débora SoaresFicha Vicente de Santanaelaborada – Bibliotecária Débora Soares Vicente de Santana – Bibliotecária CRB-9/1914 Índice para catálogo sistemático: Índice para catálogo sistemático: 1. Arquitetura italiana – Brasil 720.9450981 Índice para catálogo sistemático: 1. Arquitetura italiana – Brasil 720.9450981 1. Arquitetura italiana – Brasil 720.9450981
Textos Aristides Corrêa Dutra Hernani Heffner Livia Raponi Paolo Miraglia del Giudice Fotografias e pesquisa Aristides Corrêa Dutra Curadoria Livia Raponi Giovanni Maria Ponta di Colnago Fotografias da exposição Marco Antônio Rezende Projeto gráfico e diagramação Mari Morgado Tratamento de imagens Wagner Loeser Primeira edição Gráfica e Editora Cruzado Ltda. Realização Istituto Italiano di Cultura Rio de Janeiro Apoio institucional Consulado Geral da Itália do Rio de Janeiro UIA Rio 2021 IAB Brasil IAB Rio de Janeiro
Copyright © 2021, Instituto Italiano de Cultura do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, para a presente edição 1ª edição 2021
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Os laços que irmanam italianos e brasileiros são antigos, profundos e amplos, compreendendo muitos campos de atuação, dos negócios às artes, da arquitetura ao design, da música ao cinema, do pensamento sócio-político ao direito, dos esportes à gastronomia. Estreitar ainda mais esses laços, e particularmente os laços culturais, tem sido uma ação constante da diplomacia italiana no Brasil. Nosso trabalho procura incrementar o conhecimento e a troca recíprocos, a partir do que aproximou os dois países em centenas de anos de história partilhada. A exposição “Dell’Architettura. Investigação fotográfica sobre a influência italiana na paisagem carioca”, que o Istituto Italiano di Cultura do Rio de Janeiro apresenta, juntamente com as exposições “Le Piazze [In]visibili”, no Centro Cultural Correios, evidencia magistralmente esta proximidade entre a Itália e o Brasil, trazendo exemplos concretos que o visitante poderá contemplar e relacionar, descobrindo a linguagem em comum, em uma justaposição que preserva os espaços particulares de cada país e ao mesmo tempo revela uma das pontes invisíveis que os une. O conjunto inédito de imagens realizado, a convite do Instituto, pelo fotógrafo e professor Aristides Corrêa Dutra, que compõe a exposição “Dell’Architettura”, reproduzidas no presente catálogo, dá conta de forma mais direta dos elos, similitudes e mesclas entre as duas culturas, revelando de forma inédita a presença longeva e a influência pervasiva da arquitetura e da artesania italiana na cidade do Rio de Janeiro, cuja paisagem urbana guarda inúmeros traços salientes do gênio e da mão arquitetônicos italiano. Temos certeza que esta investigação, notável e oportuna, servirá de estímulo para outros futuros estudos, iniciativas e parcerias com o intuito de valorizar o vasto e ainda pouco conhecido legado italiano no Rio de Janeiro. A mostra, inclusive, é um convite ao visitante, para que estenda seu percurso às ruas da cidade, encontrando e conhecendo ao vivo as edificações e os espaços retratados, que, na correria do dia a dia, podem passar despercebidos. Meu agradecimento vai ao Istituto Italiano di Cultura, pela concepção e realização da exposição, e ao Centro Cultural Correios, um parceiro de longa data, pela acolhida e o empenho de sempre em receber da melhor forma nossas iniciativas.
Paolo Miraglia del Giudice Cônsul Geral da Itália
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Dell’Architettura: uma investigação fotográfica sobre a influência italiana na paisagem carioca
A exposição “Dell’Architettura. Investigação fotográfica sobre a influência italiana na paisagem carioca”, idealizada pelo Istituto Italiano di Cultura no ano em que o Congresso da União Internacional de Arquitetos foi sediado na capital Fluminense, retoma de forma mais direta e concreta um movimento recente de redescoberta, estudo e compreensão da presença italiana na cidade do Rio de Janeiro. Especialistas de um lado e de outro do Atlântico, como os brasileiros Cléia Schiavo Weiruch, Ismênia Martins, Júlio Cezar Vanni, Maria Aparecida Rodrigues Fontes e, pelo lado italiano, Angelo Trento, Vittorio Cappelli e Aniello Angelo Avella, têm explorado esse capítulo esquecido da passagem e da fixação de levas de imigrantes oriundos da Península na cidade que foi desde 1763, sucessivamente, capital colonial do Estado do Brasil, do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, do Império e da República brasileiros até 1960. Mais do que o retrato histórico que emerge de arquivos e documentos, indicativo da passagem de quase meio milhão de italianos do século XVI até o início da grande imigração em 1870, em sua maioria presentes ou residentes na cidade do Rio de Janeiro, a exposição fotográfica e as imagens aqui apresentadas reiteram visual e fisicamente os rastros dessa presença longamente enraizada. A produção material remanescente, neste caso no campo da arquitetura, realizada por imigrantes e descendentes, como também por profissionais de variadas nacionalidades, mas sempre associados a uma formação artística ou técnica de cunho italiano, compõe e permite uma outra apreensão, não somente histórica, mas também atual. Mestres da arquitetura italiana de diferentes épocas, assim como seus discípulos, epígonos e admiradores, e suas obras, permeiam o tecido urbano do Rio de Janeiro em uma escala que ultrapassa a do grupo recolhido a uma vila, rua, bairro. Estão presentes em toda a cidade, do centro às zonas sul e norte, dos palacetes da elite local ou dos imigrantes enriquecidos às vilas operárias e edificações populares que abrigaram as levas de ambulantes e artesãos, dos prédios públicos os mais variados aos projetos inusitados de cinemas e sociedades mútuas, da época colonial até o alto modernismo, passando principalmente pelo neo-classicismo, o art-nouveau (conhecido como style liberty na Itália) e o art-déco. O registro em imagens realizado a convite do Instituto, ainda nesse ano marcado pela pandemia, pelo fotógrafo e artista plástico Aristides Corrêa Dutra, revela a filiação comum de obras muito diferentes, por função, estilo, época de realização e planta arquitetônica, como o Moinho Fluminense, na Zona Portuária, o Edificio Seabra, no Flamengo, o Hospital da Cruz Vermelha, no Centro, e a atual sede da Escola de Artes Visuais, no Parque Lage, no bairro do Jardim Botânico. As fotografias de Dutra capturam com rara felicidade os elementos distintivos dessa invisível assinatura italiana, dotados de uma originalidade, artesania e acabamento
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únicos na arquitetura da cidade. A composição explorou vasto repertório: volumetria pronunciada e chamativa, entalhes em pedra de rara delicadeza, estruturas que amam a simetria, mas por vezes surpreendem pelos desvios inusitados, ornamentos em vidro e ferro de exigente execução, e o amoroso e ostensivo elogio das racionais linhas retas, conjugadas com a sutil incorporação das formas circulares, oblongas, e sinuosas livres de qualquer injunção maior, entre tantos outros elementos. A presença resiliente dos prédios ganha aqui uma leitura sensível e também uma memória articulada de um fazer artístico de forte impacto na vida, na paisagem e na cultura cariocas. A influência da cultura visual da península no Brasil, na sua capital imperial e, em seguida, republicana é ampla, profunda e de longa data. Tem-se por óbvio a presença constante de alguns elementos, dada a extensão e peso da arte e arquitetura italianas em praticamente todo o mundo, a partir da expansão do Império Romano pela Europa, Egito e parte do Oriente, e em seguida com o Renascimento e seus desdobramentos no Maneirismo e no Barroco. O que não é tão óbvio é a amplitude dessa influência em um campo de atividade e em uma cidade, descritos até bem pouco tempo como de feição portuguesa e francesa. A presente exposição fotográfica traz múltiplas e significativas evidências concretas a matizar essa redescoberta. As lições aprendidas com a leva atual de estudiosos fornecem o devido pano de fundo para o que ainda podemos constatar em fachadas, pórticos, relevos, empenas e janelas, nas mais diferentes áreas do Rio de Janeiro. A chegada à capital imperial de projetistas, arquitetos-engenheiros, técnicos e artesãos de várias especialidades, vindos em grande parte do Reino das Duas Sicílias, dá-se, de forma significativa, a partir de 1843, ano do casamento de Dom Pedro II com a princesa Teresa Cristina de Bourbon, incentivada pela imperatriz napolitana. Como observado por Avella (2014) o Segundo Reinado seria o “momento decisivo, durante o qual as antigas e numerosas influências italianas no Brasil passaram de episódicas a sistêmicas, criando o húmus no qual iria desenvolver-se a planta das grandes migrações do fim do século XIX”1. Desse período emerge o nome do calabrês Antonio Jannuzzi, que, de simples scalpellino2 tornou-se o maior construtor do Rio de Janeiro na época da reforma Pereira Passos, e foi ele mesmo um grande estimulador da vinda à cidade de obreiros qualificados, oriundos de Fuscaldo, sua vila natal. Ainda de acordo com Avella, os decoradores especializados que no começo do século passado deram seu visual característico às fachadas de inúmeros edifícios da área central da cidade, sob a direção de Jannuzzi, teriam sido herdeiros dos artesãos vindos, meio século antes, na comitiva da Imperatriz. Isto indica não só uma descendência como um enraizamento, destacando-se que esses artistas tinham como grande especialidade a cantaria fina, o trabalho delicado na pedra, normalmente atribuído aos portugueses, que executavam as peças geométricas mais básicas como os paralepípedos, ou o talhe para passeios, na grande tradição dos calceteiros lusos. Trazer à tona a forte participação italiana redefine ou reposiciona a indiscutível influência francesa sobre o traçado e a paisagem urbana carioca. E mesmo dentro da famosa Missão Artística de 1816, encontramos o nome do arquiteto Grandjean de Montigny, que manteve admiração e laços estreitos para com a arquitetura romana e siciliana de fins do século XVIII e primeiras décadas do XIX. Com a chegada da Impera1 AVELLA, Aniello A., Teresa Cristina de Bourbon: uma imperatriz napolitana nos trópicos, Rio de Janeiro, Ed. Uerj, 2014, p. 222-223. 2 Decorador especializado no entalhe fino da pedra. O termo vem de scalpello (cinzel), a ferramenta por eles utilizada.
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triz, Montigny se vale da mão de obra italiana para disseminar uma arquitetura pública pela capital, que representa esse aprofundamento e esse enraizamento das escolas italianas de arquitetura. Por isso, há que se distinguir, como bem mostrado por Cappelli (2010) que mesmo em um momento de transformação, como o da incipiente República, se o modelo urbanístico que serviu de inspiração às autoridades era o de Paris, a projetação, construção e decoração de edifícios públicos e privados, estabelecimentos industriais, hospitais, monumentos e igrejas coube essencialmente aos italianos3. Se os exemplares do século XIX quase não sobreviveram, concentrando-se as fotografias de Dutra em obras da passagem ao século XX e em suas primeiras décadas, ainda se percebe claramente como elementos do geometrismo renascentista ou do excesso barroco, de par com o primor e a elegância do acabamento de portões, janelas, relevos e estátuas, transitam de prédios neo-clássicos para os art déco, como o Clube Naval e o Edifício Guahy, ou de edificações art nouveau para as modernistas, como o Palacete Lage e a Casa Walter Moreira Salles. É interessante apreciar, através das imagens que compõem a exposição e este catálogo, como os elementos fundamentais do pensamento e da prática arquitetônica italianos tenham persistido em sua aclimatação brasileira e carioca, para além do diálogo com as origens e as tradições. Vale lembrar que as cidades brasileiras representaram para muitos criadores da Itália - desde Antonio José Landi, em Belém, até Lina Bo Bardi, em São Paulo e Salvador - um campo fértil para novas proposições e experimentações. “Senti-me num país inimaginável, onde tudo era possível”, comentou Lina Bo ao relembrar o momento da chegada no Rio de Janeiro4. Por outro lado, como a atuação pública tanto de Jannuzzi como de Bo Bardi mostram, nunca perdeu-se de vista a função social da arquitetura e a importância de políticas de habitação popular, representando um outro tipo de herança, vocação e compromisso que os profissionais italianos trouxeram para o Brasil, na tradição da construção residencial pública coletiva, como os conjuntos habitacionais; diferentemente de condomínios de classe média ou alto luxo. Em sua face contemporânea, a alquimia ítalo-brasileira - com o caminho de volta dos arquitetos modernistas brasileiros influenciando também os italianos - se revela, ainda, fecunda. Este movimento, que está longe de esgotar, continua marcado pela busca por uma espacialidade participativa e emancipatória, em que a arquitetura se insere, ainda nas palavras da designer milanesa, homenageada neste ano pela Biennale de Veneza com o Leão de Ouro, “como serviço coletivo e como poesia”.
Livia Raponi Diretora - Istituto Italiano di Cultura Rio de Janeiro
CAPPELLI, Vittorio, Architetti e costruttori italiani nelle città brasiliane (e altrove) tra XIX e XX secolo, in RAMOS, A., DE MATOS, M.I., PATRIOTA, R. (org), Olhar sobre a história, São Paulo, Ed. Hucitec, Ed. PUC-GO, 2010, pp. 49-69. 4 BO BARDI, Lina, Curriculum literário. In: __. Lina Bo Bardi. São Paulo: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi, 1993. 3
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Arquitetura italiana no Rio de Janeiro: surpresas (muitas) e descobertas (algumas)
Os 37 painéis fotográficos que compõem a exposição Dell’Architettura - Investigação fotográfica sobre a influência italiana na paisagem carioca nos convidam a um exercício inesperado, seja para um passante estrangeiro à cidade do Rio de Janeiro, seja para um habitante local familiarizado com suas ruas, vielas, favelas, avenidas, subúrbios, e com o que normalmente se encontra nesses espaços, edificações as mais variadas. A cidade que temos na cabeça, ou no coração, entranhada nos hábitos cotidianos, raramente se descortina como aquilo que é, uma paisagem contínua. Para o carioca, menos ainda, pois a cultura predominante da cidade são suas manifestações imateriais e sua geografia natural. As praias da zona sul da cidade são balizadas por “postos” ou pela pedra do Arpoador. Não ouvi indicações que privilegiassem os prédios da longa orla, mesmo os mais famosos para um conhecedor da arquitetura local. Outro aspecto que dificulta, ou torna invisível, a percepção da paisagem arquitetural carioca é a ausência de uma parataxe temporal mais pronunciada. Os bairros, locais e vias tendem a manter uma uniformidade estilística e uma renovação histórica coesa. Mesmo quando algum sítio ou edificação sobrevive ao processo civilizatório ou ainda à simples especulação imobiliária, tende a não mais ser percebido dentro do novo continuum visual que se forma. A própria cultura arquitetônica contribuiu durante muito tempo com essa formação do olhar, destacando apenas as obras mais renovadoras ou singulares de um passado imediato ou remoto. Se algo mais antigo se destacava desse continuum era o excepcional, não o ordinário, o comum. Nesse sentido, pode-se dizer que a experiência arquitetônica carioca é marcada, em princípio, por uma monótona hipotaxe, em que o valor é pontual, seja o contemporâneo em sua uniformidade avassaladora, seja o histórico, visto quase sempre como mero resquício e que sobreviveu por acaso ou por esquecimento completo. O Rio de Janeiro é certamente um experimento benjaminiano quase radical. A ideia de história como ruína, no caso da arquitetura em boa medida literais, ganha na augusta cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro uma tradução mais próxima do conceito do filósofo alemão. A história como um palimpsesto, uma sobreposição de camadas de tempo que vão se ocultando, tem no espaço social que foi se organizando a partir da Baía de Guanabara desde o século XVI um apagamento sistemático de cada momento, de cada contribuição, seja dos povos originários, seja do imigrante africano, e mesmo do colonizador europeu. A cidade que já foi “portuguesa”, “francesa”, “americana”, e “brasileira”, talvez seja agora apenas “pós-moderna”, ou seja, sem identidade mais pronunciada. O pouco que sobreviveu dos momentos anteriores, existe ainda quase por acaso, e invisível em grande medida em sua convivência recíproca.
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Caminhar pelo Rio como um passante benjaminiano, porém, pode trazer algumas revelações, algumas faíscas de pensamento. Elas ajudam a compor, ou a recompor, outras ideias de cidade que existiram ou que podem ser formuladas. No dizer de Giorgio Agamben, relendo Walter Benjamin, a experiência, que o racionalismo deslocou para o objeto como locus do conhecimento, pode (e deve) voltar para o sujeito sob a forma de um experimento, uma apreensão e uma participação na vida que corre, escorre. Um flanar per vias urbis não submetido ao jugo da obrigação, mas liberto para descobrir, refazer, repropor o conhecimento do mundo (e a ação sobre ele) a partir de si. No limite, se encantar mesmo que no átimo do clarão íntimo. O devaneio intelectual não é de todo despropositado. Casa com o devaneio pelas ruas do Rio. E mantém paralelo com a intuição que se formou a partir das fotos selecionadas para este catálogo de que a paisagem carioca tinha mais presença italiana do que se imagina. A vivência desses mundos se revelou profícua para a constatação inicial e para a proposição de uma investigação que mergulhasse ao inverso na espiral da história. O conjunto de fotografias realizado pelo professor Aristides Correa Dutra buscou tanto essa constatação como revelar talvez algo mais. Qual é de fato a paisagem arquitetural carioca? A do rígido e apertado traçado urbano português, já que suas edificações primavam em sua grande maioria pela simplicidade de linhas e formas, como ainda pode ser constatado no conjunto arquitetônico do Morro da Providência e adjacências? Ou a dos glamurosos jardins, praças e bulevares afrancesados, hoje quase extintos, inspirados em George-Eugène Haussmann, ou seja, uma intervenção no espaço urbano quase sem edificações? Ou ainda a valorização da sinuosa, de Aleijadinho a Oscar Niemayer, um traço “tropical” e escultural a se opor à assepsia, funcionalidade e racionalismo do classicismo, cujas raízes remontam à Antiguidade greco-romana e mais diretamente ao Renascimento italiano? Não vamos tão longe nessa investigação, até porque pouco sobrou das cinco, seis, talvez sete cidades que se formaram e se desfizeram (charcos, morros, cortiços, vilas operárias, favelas, conjuntos arquitetônicos enfim) ao longo dos últimos séculos. E porque a concepção de arquitetura mudou um pouco da segunda metade do século XX em diante. Ainda se fala muito de edificações inovadoras e seus extraordinários artífices, mas já há espaço para a compreensão do conjunto e especialmente de uma arquitetura “modesta”. O arquiteto, crítico e historiador da arquitetura Gustavo Giovannoni já defendia nos anos 1910 a conservação de áreas de edificações supostamente “pouco significativas” como bens culturais da maior importância. Este entendimento se consolidou no Segundo Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos, realizado em Veneza em 1964. De acordo com a Carta de Veneza, recomenda-se que o entendimento de monumento histórico “estenda-se não só às grandes criações, mas também às obras modestas, que tenhWam adquirido, com o tempo, uma significação cultural”1. Daí para a inversão proposta por Agamben (e também por Giulio Carlo Argan) foi um pulo. O lugar, a cena, o habitat, o espaço, qualquer que seja a designação, compreende agora a vivência subjetiva que se forma a partir das relações com traços arquitetônicos, maiores ou menores, traçados urbanos, definidos ou indefinidos, nesse caso a eterna e positiva incompletude carioca, e as rotas humanas, guiadas 1
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CURY, Isabelle. Cartas patrimoniais. Rio de Janeiro: IPHAN, 2000. p. 92.
quase sempre por fatores invisíveis, como o acolhimento, o espaço e a proteção fornecidos pela arquitetura. A definição de estilos, ou falta de, no caso carioca, com seu proverbial ecletismo, ou ainda a questão de sua importação acrítica, ficam relegadas ao debate acadêmico. A vida da cidade introduz incessantemente sucessivas dialéticas de subjetivação e apropriação de espaços e edificações. A informalidade daí decorrente também afeta em grande medida a percepção mais detida do que está à nossa volta. Não só uma filiação mais precisa, como a que se descortina nas fotografias e nos próprios prédios, matizando a grande presença e a influência italianas em um campo até então considerado território sobretudo francês, mas uma descoberta dessa “linguagem” arquitetônica ítalo-brasileira, com a qual se convive ainda nos dias de hoje de forma mais insinuante do que se imagina. A pergunta agora é qual seria essa “linguagem” e qual sua contribuição para a vida carioca? Qual sua história? E como sua presença invisível pode ser sentida, experienciada, apropriada, daqui para frente? A disposição das imagens fotográficas na exposição, em painéis ou pranchas, à maneira warburguiana, por um lado descontextualizando os prédios registrados de um contexto urbano imediato mais amplo (um convite à memória do carioca quanto ao que está ao lado, em frente, por trás, no ponto de fuga da rua), por outro aproximando traços, que talvez articulem essa “linguagem” arquitetônica que viemos sugerindo, convida à parataxe mental (ou sentimental) que reequilibrará a inserção nos fluxos da pantagruélica metrópole. Um primeiro aspecto a se considerar pode ser justamente a maior herança da arquitetura italiana, sua tendência à monumentalidade, e o quanto este valor se associa aos prédios públicos e sua simbologia de poder. O romanismo de edificações como o Palácio do Itamaraty, durante muito tempo sede do Ministério das Relações Exteriores brasileiro, é um exemplo acabado nesse sentido. Ao contrário de vários outros exemplos da exposição, a presença decorativa na fachada é bastante discreta para não dizer sucinta, o que pode ser atribuído ao co-arquiteto, o estadunidense Robert Prentice, mais lembrado pelos inúmeros cinemas da Metro-Goldwyn-Mayer espalhados pelo mundo e pelo Rio de Janeiro. A maioria dos prédios assinados por arquitetos italianos apresenta uma exuberância decorativa que atravessa os períodos neo-clássico, art-nouveau e art-déco, permanecendo como um traço de leveza, beleza, alegria e latinidade. Uma composição dinâmica que seria grandemente atacada pela geração modernista, Lúcio Costa à frente, como nos informa o filme Crônica de uma demolição, de Eduardo Ades. Passear pelas fotografias apresentadas mais à frente no catálogo nos proporciona uma percepção do problema. A condenação da efusividade arquitetônica em uma cidade sempre efusiva talvez explique o esquecimento e ao mesmo tempo a sobrevivência física sem nome ou nota de tantos prédios “italianos”. Ou ainda a sobrevalorização dos exemplos mais tipicamente modernistas, em verdade forjados por arquitetos formados na Itália, mas já despidos da suposta influência negativa. Remeto aqui às obras de Olavo Redig de Campos e Gregori Warchavchik, presentes na exposição e que podem ser tomados como um contraponto artificial, já que a sobreposição de volumes perma-
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nece como uma marca dessa origem em seus projetos cariocas. Os trabalhos mais “enxutos” e nesse sentido, mais propriamente modernistas, são os de Luigi Fossati e de Ferrucio Brasini. A volumetria excessiva, ilógica e por vezes desenfreada é outro traço recorrente. As “teratologias” ou “monstruosidades” denunciadas por Lúcio Costa têm não só uma lógica de sobreposição, por vezes elegante, como na torre da antiga Catedral Metropolitana, na Praça VX, obra de Raffaele Rebecchi, por vezes pronunciada e deliciosamente surreal, como na Basílica de Nossa Senhora de Lourdes, de Antônio Virzi, ou na Igreja Matriz de São Geraldo, obra prima de Riccardo Buffa e dessa tendência, onde o avolumar se confunde com o próprio corpo da edificação, mas exprimem outros traços como a influência mediterrânea e árabe. O fato de a maior parte das obras serem igrejas abre espaço para a presença disfarçada de minaretes e citações à arquitetura da mesquita árabe típica com sua fachada abobadada. Saindo do cerimonioso campo religioso, arquitetos como Antonio Virzi liberavam uma imaginação delirante em casas de fantasia como as salas de exibição cinematográficas, misturando minarete e pagode chinês, caso do primitivo cinema América, na Tijuca, ou assumindo a influência mediterrânea, caso do cinema Americano, em Copacabana, prédios infelizmente desaparecidos. Mario Vodret e Ricardo Buffa refinam a tendência em prédios remanescentes e conhecidos, mas descontextualizados dessas referências, como a famosa Igreja dos Capuchinhos, igualmente na Tijuca, e o ziguezagueante Edifício Guahy, em Copacabana, respectivamente. Mais sutis são Rino Levi, no Hospital de Bonsucesso, e Antônio Januzzi, no prédio do Moinho Fluminense, ambos incorporando o trançado diagonal da janela árabe ou marroquina a porções da fachada e quebrando a racionalidade das linhas de força das edificações. Mesmo o que haveria de mais tipicamente italiano na arquitetura carioca, por remeter mais diretamente à arquitetura romana antiga, como o aqueduto da Lapa, a fachada da primeira Escola de Belas Artes ou o jazigo Begossi, deve ser visto com cautela, pois carrega em alguma medida traços que explodem na virada para o século XX, com a liberação republicana. Aqui um dado pouquíssimo conhecido pode elucidar a ponte invisível que existe entre o passado mais distante e a presença persistente dessa visualidade ítalo-brasileira. O primeiro grande arquiteto a trabalhar no Brasil, o francês Auguste-Henri-Victor Grandjean de Montigny, passou pela futura Itália em fins do século XVIII e começo do XIX, absorvendo não só a formação estrita em arquitetura, como certo vocabulário construtivo, que seria traduzido (negativamente) pelos historiadores brasileiros como um neo-classicismo eclético. O mesmo ecletismo denunciado pelos modernistas no século seguinte. De fato, mesmo a antiga Praça do Comércio, atual Casa França-Brasil, exibe tanto os elementos greco-romanos revalorizados pelo Renascimento (colunas, capitéis, arcos, etc.), como a adição de um decorativismo “clássico” (em verdade barroco), ausente em grande medida fora da Itália na época, e muito distante da experiência das Minas Gerais, muito mais excessiva por sinal. É a proposição de uma polêmica aclimatação que sempre foi rechaçada tanto quanto mal compreendida. A maior parte dos prédios públicos cariocas do século XIX, desenhados por Montigny ou por seus alunos, carregam esse traço de raiz. Se Benjamin fala que a história
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só é possível depois do lâmpejo que a ilumina e a permite como narrativa, uma história possível da arquitetura carioca - sufocada a certa altura pela geração dos engenheiros-arquitetos, formados na Escola Militar da Praia Vermelha, um suposto hiato só superado pela famosa turma de arquitetos modernistas de 1930, oriundos da nova Escola de Belas Artes - só se torna possível pelo reconhecimento da atuação dos artesãos e arquitetos italianos ou formados na Itália no momento em que a República brasileira desponta como um novo projeto civilizatório. A interpretação dada a este contexto por sucessivas e coesas gerações de arquitetos ítalo-brasleiros pouco lembrados nos dias de hoje talvez indique o quanto se afastaram da severidade arquitetônica francesa e dos modelos pensados para uma “nova” arquitetura moderna, preferindo ler a sua maneira o novo país, a nova cidade, que sempre preferiu performar mais por rituais próprios do que aqueles indicados como corretos pelas elites que queriam civilizar a ferro e fogo. A graça, a exuberância, a liberdade, a informalidade, a descontração, em suma, a latinidade que cerca a maioria das edificações que conseguiu sobreviver ao “progresso” e chegou até nós, testemunha assim uma outra história. Mais do que isso, convida a um passeio tanto pela montagem proposta na exposição, como pela cidade em que estão inseridas. Um exercício que acredito esteja apenas começando. A investigação foi fruto de um lâmpejo e muitos outros são possíveis quando nos dispomos a olhar, experienciar, viver o nosso espaço de vivência.
Hernani Heffner Carioca e botafoguense
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O R T S I G O RE C I F Á R G O T FO 18
A exposição representada neste catálogo originou-se de um desafio proposto recentemente pelo Istituto Italiano di Cultura Rio de Janeiro: registrar o legado de arquitetos italianos que projetaram edifícios em terras cariocas. A partir deste mote chegamos a 37 fotografias, sendo 28 de arquitetos com formação italiana mais uma seleção extra de nove de construções diversas que claramente foram inspiradas em edifícios italianos. O período selecionado vai da chegada do neoclassicismo à cidade até a gênese do modernismo. Dentre os arquitetos apresentados, cinco não são italianos, mas estudaram ou complementaram seus estudos na Itália. Nascidos em Portugal, França, Ucrânia, São Paulo e Rio de Janeiro, também eles trouxeram na bagagem a marca de sua formação. No traçado do bloco principal da casa Walther Moreira Salles, por exemplo, o projeto do carioca Olavo Redig de Campos articulado ao redor de um pátio central dialoga tanto com as casas da Roma antiga quanto com os palácios medievais e renascentistas italianos. Também é importante registrar que uma enorme parte dos edifícios do período já foram demolidos, seja pela especulação imobiliária seja por uma determinação bastante questionável dos primeiros modernos em apagar das ruas da cidade essa arquitetura. Nestas fotografias apresentamos alguns dos prédios remanescentes, mas não todos. Há bem mais. Os arquitetos mais prolíficos e bem representados aqui são Antonio Jannuzzi, Mario Vodret e Ricardo Buffa, todos nativos italianos que juntos são responsáveis por doze das obras selecionadas. Desde a antiguidade os arquitetos da península itálica também produziram pensamento e bibliografia sobre arquitetura. A partir do Renascimento a produção se tornou bastante intensa, rica, com muitos textos importantes, dentre os quais vale citar I quattro libri dell’architettura, de Andrea Palladio (1508–1580), reconhecido como um dos livros arquitetônicos mais influentes já produzidos e carro-chefe da expansão internacional do classicismo. E é justamente desta obra de Palladio que decorre o título da exposição, uma tentativa de resgate e um tributo a este legado.
Aristides Corrêa Dutra
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José da Costa e Silva (1747–1819)
Nasceu em Vila de Povos, próximo a Lisboa, Portugal. Estudou arquitetura na Academia Clementina de Bolonha, Itália, onde obteve diversos prêmios e foi nomeado Acadêmico de Honra. Viajou por Roma, Caserta, Pompeia, Herculano, Gênova, Florença e Veneza. Em Vicenza estudou os edifícios de Andrea Palladio. Foi o introdutor do neoclassicismo em Portugal. Em Lisboa projetou, entre outros, o Erário Régio – primeiro edifício público da cidade em estilo neoclássico – e o Teatro de São Carlos. Em 1811, aos 64 anos, Costa e Silva transferiu-se para o Rio de Janeiro a chamado de D. João VI, sendo nomeado Arquitecto Geral de Todas as Obras Reais. Realizou alguns trabalhos de reforma de edifícios já existentes adaptando-os às necessidades da corte. É autor do projeto do Real Theatro de São João (inspirado no seu Teatro de São Carlos, de Lisboa), posteriormente demolido para dar lugar ao atual Teatro João Caetano.
Túmulo de D. Pedro Carlos (1812) Largo da Carioca s/n, Centro
Localizado na capela da Ordem Terceira de São Francisco, no Convento de Santo Antônio, este túmulo neoclássico incrustado numa capela barroca foi feito para receber o corpo do Infante D. Pedro Carlos de Bourbon e Bragança, neto biológico e filho adotivo de D. Maria I, rainha de Portugal.
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Grandjean de Montigny (1776–1850)
Natural de Paris – onde iniciou sua formação – Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny venceu em 1799 o Prixde-Rome, que lhe garantiu uma bolsa para estudar na Academia da França em Roma. Atuou na Itália, França e no efêmero Reino de Vestfália. Sua trajetória na Europa esteve fortemente ligada ao governo de Napoleão. Com a queda do imperador, Montigny perdeu seu espaço e acabou juntando-se ao grupo de artistas atraídos ao Rio de Janeiro, então capital do reino português. Chegou ao Rio em 1816, aos 40 anos, integrando a chamada missão artística francesa.
Praça do Comércio (1819–1820) Rua Visconde de Itaboraí 78, Centro
Posteriormente abrigou a Alfândega e o II Tribunal do Júri. Atualmente sedia a Fundação Casa França-Brasil.
Academia Imperial das Belas Artes (1816–1826)
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Localizava-se originalmente no Beco das Belas Artes, próximo à Praça Tiradentes O prédio foi demolido em 1937, mas a parte da fachada correspondente ao portal foi transferida e hoje encontra-se no Jardim Botânico do Rio de Janeiro
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Antonio Jannuzzi (1853–1949)
Calabrês nascido na pequena Fuscaldo, Antonio Jannuzzi (também grafado como Januzzi) vem de uma família de construtores. Aprendeu seu ofício na prática a partir dos quatorze anos e aos quinze já era mestre de obras. Mudouse para o Brasil em 1874, aos 21 anos. Aproveitando a mão-de-obra especializada italiana que migrou para o Brasil incentivada pelo casamento de D. Pedro II com a princesa napolitana Teresa Cristina, a empresa Antonio Jannuzzi, Irmão & Cia. tornou-se a maior construtora carioca do segundo império e do início da república, sobretudo no período entre a construção da Avenida Central (atual Rio Branco) em 1906 e a realização da Exposição Internacional do Centenário da Independência, em 1922. O Comendador Antonio Jannuzzi foi um grande defensor e protetor da comunidade italiana no Rio de Janeiro, mas foi também um grande patrono de causas sociais. Construiu de palacetes a vilas populares, além de hospitais e orfanatos para a Santa Casa de Misericórdia e igrejas não católicas.
Igreja Metodista do Catete (1886) Praça José de Alencar 4, Flamengo
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Moinho Fluminense (1887)
Rua Sacadura Cabral 290, Saúde
O primeiro prédio do Moinho Fluminense, projetado e construído por Antonio Jannuzzi, Irmão & Cia. tinha inicialmente cinco andares, mais tarde ampliados para sete.
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Società Italiana di Beneficenza e Mutuo Soccorso (1904–1907)
Praça da República 17, Centro
Vilas denominadas Avenida Mariana, Avenida Anna (1912) Rua Barão de Mesquita 117, Tijuca
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Casa dos Jannuzzi (c. 1913)
Rua Monte Alegre 482, Santa Teresa
Antonio Jannuzzi
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Sante Bucciarelli (1848–1894)
Italiano da pequena comuna de Castelplanio, na província de Ancona. Na Itália Bucciarelli trabalhou principalmente como engenheiro associado a outros arquitetos. Em Roma realizou – juntamente com o arquiteto Giulio de Angelis – o Palazzo Bocconi para sediar o primeiro grande magazzino da cidade, o Alle Città d’Italia. Contratado em 1891, aos 43 anos, como professor no curso de arquitetura da Escola Nacional de Belas Artes, Bucciarelli teve no Rio de Janeiro uma atuação curta como arquiteto, abreviada ao ser vitimado pela febre amarela três anos após sua chegada. Foi responsável pela reforma do Conservatório de Música e pelo projeto do pedestal da estátua do General Osório na Praça XV, além do embelezamento da mesma praça. Foi dele a ideia de posicionar a estátua de frente para o mar – de costas para a rua, portanto – para recepcionar os navios que chegavam ao porto. Projetou também uma nova sede para a Escola de Belas Artes e um teatro lírico, mas estes dois edifícios nunca foram construídos.
Reforma e ampliação do Conservatório de Música (1890) Rua Luís de Camões 68, Praça Tiradentes
A reforma incluiu a anexação de dois prédios vizinhos e a construção de um auditório. Atualmente o edifício abriga o Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica.
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Raffaele Rebecchi (1844–1922)
0 Comendador Dr. Raphael Rebecchi (como costumava ser chamado) nasceu em Roma e formou-se engenheiro civil e arquiteto pela Universidade de daquela cidade. Na Itália projetou tanto edifícios públicos em Roma quanto ferrovias no sul do país. Estabeleceu-se no Brasil em 1897, aos 53 anos. Na Exposição Nacional de 1908, na Praia Vermelha, projetou os pavilhões de Minas Gerais e Bahia. Venceu o concurso carioca para a sede do Clube de Engenharia e obteve o 1° lugar no concurso de fachadas da Avenida Central, sendo ainda autor de mais outros quatro projetos na avenida, todos já demolidos.
Torre da Antiga Sé (1905–1913)
Rua Sete de Setembro 14, Centro
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Da fachada original da Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé só permaneceu o portal. O alto da fachada, a torre e a lateral da sacristia são modificações do início do século 20.
Hospital para Tuberculosos de Nossa Senhora das Dores (1910–1914)
Avenida Ernani Cardoso 21, Cascadura
A área dos internos, localizada atrás do pavilhão principal, é constituída de 6 pavilhões circulares espaçados e interligados por uma passarela suspensa vazada para permitir uma boa aeração. Funciona atualmente como Hospital de Nossa Senhora das Dores.
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Tommazzo Gaudenzio Bezzi (1844–1915)
Nascido em Turim e formado em engenharia pela Universidade da mesma cidade, Tommazzo Bezzi (também grafado como Tommaso ou Tomaz) combateu na juventude ao lado de Giuseppe Garibaldi pela unificação italiana, tendo sido duas vezes condecorado por sua atuação. Após uma estadia no Uruguai e Argentina, fixou-se no Rio de Janeiro a partir de 1875, aos 31 anos, executando projetos para o governo imperial. Sua primeira encomenda governamental foi o edifício da Alfândega de Fortaleza. Também atuou em São Paulo com o projeto do Velódromo Paulistano, a reurbanização da Praça da República e o projeto do Museu do Ipiranga, sua obra mais importante e ambiciosa. No Rio de Janeiro Tomazzo Bezzi projetou o antigo Banco do Comércio – na Rua Primeiro de Março – e um edifício para a Secretaria de Estado das Relações Exteriores localizado nos fundos do Palácio do Itamarati. Para a novíssima Avenida Central – atual Avenida Rio Branco – projetou o prédio do Clube Naval. Bezzi é avô materno do arquiteto moderno brasileiro (nascido em Paris) Affonso Eduardo Reidy.
Clube Naval (1905–1910)
Avenida Rio Branco 180, Centro
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Antonio Virzi (1882–1954)
Nasceu em Palermo, na Sicília. Arquiteto com estudos em universidades de Palermo, Nápoles, Roma e Milão, Virzi estabeleceu-se no Rio provavelmente em 1911, aos 29 anos. Seu estilo costuma ser classificado como art nouveau, mas está bem distante da tradição franco-belga, inscrevendo-se mais precisamente na vertente italiana, mais fantasiosa, chamada de estilo Liberty. De forte potência imaginativa e afeito a detalhes decorativos impactantes, criou um dos prédios mais fantasiosos e mirabolantes já construídos na cidade do Rio, a fábrica do Elixir de Nogueira (1916), já demolida. Construiu diversas residências, sempre insólitas, como a Vila Marinha, a Casa Martinelli, a Casa Smith de Vasconcellos, a Casa Villiot e o Villino Silveira, estas duas últimas as únicas ainda de pé.
Villino Silveira (1915)
Rua do Russell 734, Glória
Basílica Nossa Senhora de Lourdes (1919) 34
Avenida 28 de Setembro 200, Vila Isabel
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Gino Coppedè (1866–1927)
Filho do entalhador, moveleiro e escultor Mariano Coppedè e irmão do também arquiteto Adolfo, Gino Coppedè nasceu em Florença e, juntamente com o irmão, iniciou sua formação artística nas oficinas do pai. Estudou na Scuola Fiorentina delle Arti Decorativi e Industriali e na Accademia di belle arti di Firenze graduando-se como professor de desenho arquitetônico. Atuou em Gênova, Messina, Nápoles e em cidades da Toscana. Coppedè é um dos mais importantes e inventivos representantes italianos do estilo Liberty, vertente local do art nouveau internacional. Seu ambicioso conjunto arquitetônico em Roma – constituído de 45 edificações e conhecido como Quartiere Coppedè – é um dos grandes exemplos do estilo da cidade. Os edifícios são diferentes um do outro, mas coordenados no uso dos elementos decorativos. Depois da primeira guerra mundial Gino e o irmão Adolfo trabalharam juntos no design de interiores de navios de passageiros de companhias marítimas italianas. O projeto de Gino Coppedè para a residência Joaquim Silva Cardoso, no Rio de Janeiro, segue o mesmo estilo do Quartiere Coppedè, em Roma, e foi enviado da Itália. É como se o 46º prédio do conjunto tivesse sido magicamente transplantado para o Rio. O arquiteto nunca visitou o Brasil.
Residência Joaquim Silva Cardoso (1916–1918) 36
Praia do Flamengo 158, Flamengo
Conhecido como Castelinho do Flamengo, hoje ele abriga o Centro Cultural Municipal Oduvaldo Vianna Filho.
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Pietro Campofiorito (1875–1945)
Pietro Campofiorito (também grafado como Pedro) nasceu em Roma e estudou no Istituto di Belle Arti da mesma cidade. Foi também pintor, cenógrafo e professor. Em 1899 instala-se em Belém como professor da Escola de Belas Artes do Pará. Em 1913, aos 38 anos, muda-se para o Rio de Janeiro onde realiza alguns projetos, vencendo o concurso para a sede da Cruz Vermelha carioca. Após algumas colaborações em projetos para Niterói, fixa residência na cidade trabalhando como funcionário da Secretaria de Obras Públicas, com diversos projetos. No conjunto cívico-cultural niteroiense da Praça da República ele foi autor ou coautor de grande parte dos prédios. Após aposentar-se do serviço público, Campofiorito foi nomeado diretor do Museu Antônio Parreiras, em Niterói.
Hospital da Cruz Vermelha (1919–1923) Praça da Cruz Vermelha 12, Centro
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Riccardo Buffa (c. 1894–1957)
Riccardo Giacomo Buffa (aportuguesado como Ricardo Buffa) nasceu em Sezzadio, no Piemonte, e formou-se arquiteto pela Accademia Albertina di Belle Arti, em Turim. Chegou jovem no Brasil, em 1921, aos 27 anos. Participou do concurso para a fachada do Palácio da Justiça ainda em 1921 e rapidamente obteve clientela e sucesso na cidade. Em 1929, já bem estabelecido no Brasil, fez a doação de um fundo monetário para sua universidade de formação em Turim para a instituição de um prêmio anual ao melhor aluno do curso de arquitetura, o Prêmio Riccardo Buffa. Seu estilo migrou do eclético para o art déco, destacando-se como um dos nomes importantes deste estilo.
Igreja Matriz de São Geraldo (1931) Rua Leopoldina Rego 344, Olaria
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Fachada do Santuário Basílica Matriz de São Sebastião dos Capuchinhos (1941–1942) Rua Haddock Lobo 266, Tijuca
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Riccardo Buffa Edifício Lage (1924–1925)
Rua do Russel 300, Glória
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Edifício Guahy (1932)
Rua Ronald de Carvalho 181, Copacabana
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Mario Vodret (1893–1948)
Mario Vodret nasceu em Cagliari, na Sardenha, e iniciou seus estudos na faculdade de Bologna, graduando-se em Roma. Em suas primeiras obras na Itália, Vodret foi influenciado pela arquitetura de Gino Coppedè. Chegou no Brasil em 1928, aos 35 anos. Obteve sucesso rápido, desenhando prédios até hoje icônicos, mas teve carreira relativamente breve. Foi o último dos grandes arquitetos italianos de base acadêmica a aportar na cidade, justamente no mesmo período em que chegaram ao Brasil os modernos Warchavchik (1923), Levi (1926) e Redig (1931). E logo no ano seguinte a sua chegada, em 7 de dezembro de 1929 acontecia na Escola Nacional de Belas Artes a famosa conferência de Le Corbusier. A obra de Vodret no Rio representa, portanto, uma espécie de canto de cisne do classicismo italiano na arquitetura carioca.
Edifício Seabra (1931)
Praia do Flamengo 88, Flamengo
Palacete do Parque Lage (1927)
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Rua Jardim Botânico 414, Jardim Botânico
Atual Escola de Artes Visuais do Parque Lage
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Mario Vodret
Grande Templo Israelita do Rio de Janeiro (1928–1932) 46
Rua Tenente Possolo 8, Centro
Projeto em coautoria com o também italiano Guido Levy.
Luigi Fossati (1894–1974)
Luigi Fossati (também grafado como Luiz) nasceu na Itália e formou-se pela Politécnica de Milão. Atuou no Brasil pelo menos desde 1930. É autor do Hotel Balneário Casino Icarahy, em Niterói, que atualmente sedia a Reitoria da Universidade Federal Fluminense. É também autor do imponente Hotel-Cassino Quitandinha, em Petrópolis.
Edifício Unidos (1937)
Avenida Rio Branco 26, Centro
Um dos mais marcantes edifícios da cidade no estilo art déco streamline, de linhas aerodinâmicas.
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Gregori Warchavchik
(1896–1972)
Nasceu em Odessa, na Ucrânia, então pertencente ao Império Russo. Iniciou seus estudos ainda em Odessa, concluindoos no Regio Istituto Superiore di Belle Arti, em Roma. Sua formação foi ainda acadêmica, mas Warchavchik integrou a primeira leva de arquitetos a romper com a tradição na Itália migrando para o modernismo. Chegou ao Brasil em 1923, aos 27 anos, e foi o autor da primeira casa modernista brasileira, em São Paulo, e da primeira casa modernista do Rio de Janeiro, em Copacabana.
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Clube dos Marimbás (1932), com Lúcio Costa Praça Coronel Eugênio Franco 2, Posto 6 de Copacabana
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Ferruccio Brasini (c. 1891–?)
Nasceu em Roma e migrou para o Brasil na década de 1910. É autor do projeto de alguns cinemas cariocas famosos. Com seus 3.500 lugares, o já demolido Cine Olinda, localizado na Tijuca, foi um dos maiores da América Latina. Brasini também é o arquiteto dos cinemas Astória, Novo Popular, Primor e Plaza além de outros edifícios residenciais, comerciais, igrejas, hospitais e escolas na cidade do Rio de Janeiro. Também é autor do projeto da Paroquia Nossa Senhora das Dores, no Rio Comprido. Mesmo já estando instalado no Brasil, ainda atuou em Roma, Nápoles e Paris. Também residiu e atuou em Manaus, onde projetou edifícios religiosos e comerciais. Ferruccio é irmão de Armando Brasini, arquiteto de um neobarroquismo tardio que se tornou figura proeminente na arquitetura italiana do início do século 20 e do período fascista.
Edifício e Cine Plaza (1935) Rua do Passeio 78, Centro
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Rino Levi (1901–1965)
Filho de italianos, Rino Levi nasceu em São Paulo. Com 20 anos de idade, foi estudar na Itália. Após uma passagem pela Escola Politécnica de Milão, graduou-se pela Escola Superior de Arquitetura de Roma, onde foi colega de Gregori Warchavchik. Retornou ao Brasil em 1926, aos 25 anos. Iniciou sua carreira em São Paulo projetando residências e pequenos edifícios para clientes da comunidade italiana da cidade. É autor do primeiro prédio residencial de luxo paulista, o Edifício Columbus. Também projetou diversos cinemas. Foi um dos fundadores e membro atuante do Instituto de Arquitetos do Brasil e atuou como professor da FAU-USP. Foi um dos principais nomes da arquitetura paulista. No Rio de Janeiro, além do Hospital General do Nascimento Vargas projetou também residências e edifícios-garagem.
Hospital General do Nascimento Vargas (1948) 52
Avenida Londres 616, Bonsucesso
Atual Hospital Federal de Bonsucesso.
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Olavo Redig de Campos (1906–1984)
Filho de diplomatas, Olavo Redig de Campos nasceu no Rio de Janeiro e passou parte da infância na Europa. Graduou-se na Escola Superior de Arquitetura de Roma e retornou ao Brasil em 1931, aos 25 anos. Chefiou por trinta anos o Serviço de Conservação do Patrimônio do Itamaraty, tendo construído diversas chancelarias e residências diplomáticas brasileiras no exterior. Foi também o arquiteto da restauração e reforma do interior do histórico Palazzo Pamphilli, em Roma, para sediar a embaixada brasileira na Itália. Juntamente com o diplomata Wladimir Murtinho, Redig de Campos assessorou Niemeyer no programa arquitetônico do Palácio do Itamaraty, em Brasília. Além de seu trabalho no Itamaraty, também projetou edifícios cívicos em Curitiba e residências diversas.
Casa Walther Moreira Salles (1948–51) Rua Marquês de São Vicente 476, Gávea
Atual sede do Instituto Moreira Salles.
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E S E S Õ E Ç Õ A I Ç L A T FI E R P R E T N I RE 56
A influência italiana na arquitetura carioca vai bem além dos mestres que estudaram na Itália e atuaram aqui. Se a própria Roma antiga já tinha se encarregado de espalhar o classicismo greco-romano pela Europa, norte da África e parte da Ásia, será a partir de seu resgate renascentista que ele continuará sua expansão pelo resto do mundo. Assim, bastaria já o uso da gramática clássica para filiar nossa arquitetura - desde a colonial e a barroca - à tradição italiana. Mas esta filiação é ainda maior. Inúmeros arquitetos - com as mais diversas origens e formações - fizeram frequentemente em seus projetos claras referências a detalhes arquitetônicos de prédios italianos, como uma fachada de templo aqui ou uma torre medieval ali. E não é raro que essas referências resultem em modelos diretos para a elaboração dos novos edifícios, constituindo-se em uma verdadeira reinterpretação do original. Vale lembrar que esse procedimento era bastante comum - praticamente institucionalizado - na arquitetura clássica, em um contínuo desdobrar de variações sobre os mesmos temas. O breve adendo da exposição Dell’Architettura apresentado nas próximas páginas mostra alguns exemplos notórios dessas filiações arquitetônicas.
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1
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1
Aqueduto da Carioca (1744–1750) atribuído ao brigadeiro José Fernandes Pinto Alpoim Referência: Aquedutos romanos, como o Acquedotto Alessandrino (226), em Roma
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Jazigo Begossi, no Cemitério de São João Batista data e arquiteto não localizados Referência: Panteão (118–128), em Roma, atribuído a Apolodoro de Damasco
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Fachada da Biblioteca do Palácio do Itamaraty (1927–1930) projeto de Robert Prentice e Anton Floderer Referência: templos greco-romanos
3
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4
Torre do Palacete Oscar Sant’Anna (1942) projeto de Frederico de Faro Filho Referência: Torre do Palazzo Vecchio de Florença (c. 1310), projeto de Arnolfo di Cambio
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Fachada da Igreja de Nossa Senhora Mãe da Divina Providência (1931–1940) arquiteto Mario Vodret Referência: Igreja de San Camillo de Lellis (1906–1910), em Roma, projeto de Tullio Passarelli
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6
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6
Fachada da Igreja de Santa Cruz dos Militares (1780–1811) projeto atribuído a José Custódio de Sá e Faria Referência: Igreja Il Gesù (1568–1575), em Roma, projeto de Giacomo Barozzi da Vignola e Giacomo della Porta
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Fachada da Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro (1928) projeto de Reuben Hunt Referência: Villa Foscari (1550–1560), projeto de Andrea Palladio
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8
9 Galeria de Moldagens do Museu Nacional de Belas Artes (1906–1908) projeto de Adolfo Morales de los Rios Referência: Braccio Nuovo (1817–1822) dos Museus do Vaticano, projeto de Raffaelle Stern
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Fachada da Palácio Tiradentes (1922–1926) projeto de Archimedes Memoria e Francisque Couchet Referência: Galleria Nazionale d’Arte Moderna e Contemporanea (1911–1915), projeto de Cesare Bazzani
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P X E A
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O Ã Ç I S O
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OLARIA
BONSUCESSO
CASCADURA
VILA ISABEL
RIO DE JANEIRO Até a eclosão da arquitetura moderna, a cidade do Rio de Janeiro ocupava mais intensamente o Centro, a Zona Sul e avançava pela Zona Norte. É nessas regiões que estão localizados os prédios selecionados para a exposição Dell'Architettura.
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BOA
GAM
SAÚDE
CATET GLÓR IA ENGO E
CENTRO
CENTRO TIJUCA
FLAM
TA
SAN
ESA R E T
O
ICO
GÁVEA
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DIM
JAR
G FO A T BO
N
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Exposição
Dell’Architettura Investigação fotográfica sobre a influência italiana na paisagem carioca
Centro Cultural Correios Rio de janeiro
09 de setembro a 10 de outubro de 2021
Curadoria Aristides Corrêa Dutra Livia Raponi Fotografias e Pesquisa Aristides Corrêa Dutra Realização Istituto Italiano di Cultura Rio de Janeiro Diretora Livia Raponi Equipe Elizabeth Thompson Francesco Trapanese Giovanni Maria Ponta di Colnago Riccardo Cavagnera Riccardo Scafati Apoio Institucional Centro Cultural Correios Consulado Geral da Itália do Rio de Janeiro UIA Rio 2021 IAB Brasil IAB Rio de Janeiro
Realização
Apoio
A influência italiana na arquitetura carioca é vasta e profunda. Ela certamente começa pela gramática clássica da tradição greco-romana, que foi resgatada pelo renascimento, reinterpretada pelo barroco católico e que serviu de base para nossa arquitetura colonial e nosso barroco tropical. Mas a linha direta Itália-Rio torna-se mais clara e incisiva a partir do início do século 19. Estabelece-se ali uma longa linhagem de arquitetos com formação italiana atuando na cidade do Rio de Janeiro que percorrerão o neoclassicismo, ecletismo, art nouveau, art déco até o moderno. Os arquitetos representados neste catálogo são em sua maioria nascidos na Itália, mas temos também arquiteto português, francês, ucraniano, paulista e carioca, todos tendo estudado em universidades italianas e atuado no Rio. Muitas de suas obras foram devoradas pelo tempo, pelas transformações urbanas ou pela especulação imobiliária. Alguns tiveram mesmo sua marca completamente apagada da paisagem da cidade e hoje já não são mais que um registro histórico. Mas várias dessas edificações ainda existem e persistem em diferentes graus de preservação ou abandono. Esta investigação é um resgate e uma homenagem a este legado.