Traços de um rio : Caderno de Viagem

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AQUECENDO OS MOTORES Quinta-feira, cinco de novembro de 2015, o dia em que o maior crime ambiental do país teve início. A barragem de fundão, uma das maiores reservas de rejeitos da mineração de ferro sobre a terra, se rompeu liberando toneladas de lama e lixo tóxico no rio Gualaxo do Norte; diversos distritos de Barra Longa e Mariana tiveram suas casas enterradas e diversas vidas levadas; por cerca de 200 quilômetros, a lama, que descia a velocidade avassaladora e volume assustador, comeu as margens do rio e suas encostas foram cortadas, deixando uma cicatriz aberta; pouco abaixo da junção com o rio Piranga, já chamado rio Doce, a lama é contida no reservatório de Candonga, comprometendo uma usina; desse ponto em diante a destruição se dá pela contaminação em suas diversas formas. Hoje o Rio Doce está contaminado em toda sua extensão e milhões de pessoas foram atingidas pela inutilização da água, em seus vários usos: consumo, irrigação, pesca, lazer, surfe. As ilustrações aqui apresentadas refletem as impressões e pesares de: Regência Augusta, onde um povo sem seu velho caboclo, Bernardo, passou a não mais pescar e surfar; de Areal, onde botocudos não reconhecidos dependem de galões de água e de farinha com açúcar para repor o que o rio lhes dava; de Tumiritinga, onde assentados em sua mais diversa defesa do rio são atacados diariamente e agora impedidos de produzir; de Sem Peixe, que viu concretizada a profecia primeira de seu nome; de Paracatu de Baixo, em Mariana, onde, de suas dezenas de famílias, pouco mais de 5 pessoas continuam a viver em suas casas; e, de toda uma população não entendida, vista como inexistente pelos interesses maiores que faz calar um povo em toda sua riqueza, manifestação e cultura. 4


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