E l a i n e
A r r u d a
Elaine Arruda portif贸lio
Adeus Gravura em metal Ponta seca sobre zinco 1m × 2m 2010
Sem título Gravura em metal Técnica mista sobre zinco 1m × 2m 2010
Mergulho Gravura em metal Ponta seca sobre zinco 2m × 1m 2010
Processo 1 e 2 VĂdeo 6 min. 2010
Processo 1 e 2 DVD
Minha aproximação com a gravura vem sendo marcada por uma intensa investigação procedimental que incorpora novas condições de produção e procura pensar os seus limites. O interesse em expandir a escala das gravuras surgiu como um passo à frente na pesquisa que desenvolvia com procedimentos de cortes diretos sobre o metal, a ponta seca; técnica que devolve à estampa qualidades físicas e intensidades gráficas de grande força expressiva. O caminho aberto pela pesquisa com os processos diretos levou a um repertório ferramental mais amplo – machados, marretas e ponteiras – fazendo incidir sobre a imagem impressa um corpo residual de tinta cada vez mais espesso. O contato com as metalúrgicas navais da Cidade Velha, região portuária de Belém, me possibilitou desenvolver um trabalho que partisse desse encontro de estruturas e saberes diversos. São oficinas que possuem equipamentos adaptáveis à impressão de gravuras em metal (calandras), com medidas que ultrapassam os limites das prensas encontradas nos ateliês de gravura em Belém. Portanto, foram criadas as condições para que o trabalho se redimensionasse, não somente quanto à sua escala, mas, fundamentalmente, à suas possibilidades de produção e circulação. Em 2010, com o projeto ‘Elucubrações’, aprovado no Edital de Pesquisa e Experimentação Artística do Instituto de Artes do Pará, realizei uma incursão no cotidiano dessas fábricas. O estudo que conduziu a criação das obras teve como referência a paisagem, sem que houvesse um compromisso com a representação formal. As imagens possuem intensa carga gestual, com ritmos, profusão de texturas, luzes e sombras, que somadas à escala compuseram um campo sinestésico no qual reverbera a intensidade das relações entre homem e ambiência.
Sem Título Gravura em Metal 30 × 40cm 2011
Sem Título Gravura em Metal 40 × 30cm 2011
Sem Título Gravura em Metal 44 × 70cm 2010
Sem Título Gravura em Metal 57 × 46cm 2010
Sem Título Ponta seca sobre zinco 40 × 30cm 2008
Sem Título Ponta seca sobre zinco 30 × 40cm 2008
Sem Título Ponta seca sobre zinco 30 × 40cm 2008
Sem Título Ponta seca sobre zinco 50 × 20,5cm 2008
Díptico Ponta seca sobre zinco 50 × 20cm 2008
Sem Título Ponta seca sobre zinco 30 × 40cm 2008
A Pele do Cação cartografia de amor, (beleza) e fúria na cidade de belém O calor, de tão forte, parecia sonoro. Leopoldo Lugones, El Libro de los Paisajes.
Uma mulher com uma marreta na mão desfere um golpe numa placa de zinco, pregada na parede. O som abafado do ferro esmagando o corpo do metal: o corpo dos sonhos (gravando todas as tempestades vistas no Guajará) se expande pelo ateliê e alerta os seus vizinhos. A sereia está em pé. Cada pancada, cada mordida no metal, é uma escrita (pesada?) na superfície prateada, opaca, irregular, fina e áspera como a pele de um cação, pendurada no mercado de peixe. A pele de um esqualo cheio de cicatrizes. E o que este peixe viu nas profundezas do oceano (do rio escuro) Elaine Arruda transmite para fora com violência, direto para as matrizes de metal. Um verdadeiro cardume de sentimentos que se movimentam na massa forte das incisões, utilizando instrumentos de batalha que, no dia a dia, despertam os mortos e são apropriadas para as visões incomuns que afundam, rasgando e distorcendo a realidade, abrindo sulcos como rios num deserto de cinzas; abalando a superfície delicada de um espelho e destruindo o retrato visto, no primeiro encontro. Há um embate de forças e desejos diante da gravura em metal. A matriz em pé mostra a nudez de um corpo olhando para a sua própria imagem no mundo. Do outro lado, entre o silêncio do sangue e a música do ferro, as figuras (as projeções de conquista) surgem contornando a sua juventude, como as algas dos Sargaços que antigamente prendiam o espírito dos marinheiros, deixando-os submersos num caldo difícil de figurar. A pele do zinco, a carne do cobre (polida ou não), reflete o desejo de uma mulher (em possuir), de conhecer o mundo (sensorial) das grandes coisas que estão ao seu redor. Isso é esplêndido. O calor é imenso e o destino, incerto. Há um som, uma melodia que incendeia o ânimo ao reconhecer o silvo do cansaço no trabalho de perfurar e amassar, como um chamado, louco, para mergulhar e afundar ainda mais nas águas negras do amor. A cidade de Belém é banhada pelos rios que refrescam, no coração do artista, o desejo pela grande escala. A cidade não pode caber na palma da sua mão por que, o calor (a construção de uma poesia no edifício do corpo) transborda para fora todos os sentimentos difíceis pelas coisas em trânsito. Coisas que migram: que vão e voltam carregadas de peso.
Vão e voltam. Guardem bem estas palavras. O movimento portuário entre estações, o humor, entre a possibilidade de se impor no rigor do corte e da observação, é destruída por completo pela marretada, no relógio temperamental que acerta as horas por intuição. Cada incisão vista nas estampas de Elaine Arruda, são diagramas daquilo que o Ver-o-Peso pode oferecer ao visitante, que absorve a imagem de um lugar estranho aos olhos. O porto é uma medida, um ponto, uma pancada a caminho. Os seres derrubados pela talhadeira estão à vontade. O Ver-o-Peso é uma paisagem trançada por homens do mar e da terra, que visitam o Amazonas. O tempo é um passageiro que deixa o seu cheiro nas ferragens dos arpões, nos mastros e nas bandeiras de lençóis gastos dos pescadores. Homens estranhos enriquecidos de beleza na natureza, em comunhão com os demônios do comércio. Tive a oportunidade de ver bem de perto essa euforia na chegada dos barcos, em 2005, quando fiz uma residência artística em Belém, a convite do gravador Armando Sobral. Foi uma experiência que eu levo para o resto da vida. Não posso esquecer o estranhamento que eu senti com todo aquele peixe (muitos enormes) sendo despejados no granito e fatiados ali mesmo. Não há texto que explique a sensação de ouvir os berros e o canto, as amarras e os urubus, as pessoas e as caixas de madeira numeradas e datadas, como se o tempo pudesse chegar a qualquer momento e surrupiar toda aquela refeição morta, deitada na pedra. Havia medo e uma alegria que me deixava perplexo por que queria entender o desenho do Norte ali, inteiro. Era algo castanho-negro, pesado e extenso; uma escala que só podemos compreender quando estamos dispostos a deixar as referências do Sul adormecidas. Levei comigo um caderno de desenho. Mas o que poderia desenhar com as referências vivas, em movimento? As vísceras eram jogadas no chão. A cabeça dos peixes, atirada para algum Deus da noite, com fome, na espreita, mergulhado na água grossa, vermelho-púrpura que começava a baixar. As coisas poderiam ser vistas cruas como uma ponta seca: uma porrada. Havia tantos urubus, que os telhados das casas ao redor ficavam pretos. Pontos vivos, olhos secos, decidindo o que iriam comer primeiro. O alvo eram as vísceras deixadas pelos lados, escorrendo na sarjeta, ou eu? Compreendo que as gravuras feitas pela artista, possa demonstrar esse grau, profundo, que só o desenho no arquivo dos pés poderia dizer. Uma linguagem. Uma espécie de movimento de carga, enquanto os olhos buscam uma saída para aquilo que o Norte pode
realizar todos os dias, nas horas de maior solidão, com as dúvidas que surgem, ao lado da escala. A gravura em metal, para Elaine Arruda, é o Norte. É o por do sol na fronteira imensa entre o mar e o rio. A terra os afluentes em grandes incisões. O corpo vivo das calandras, não uma peça a parte. O desembarque do peixe na madrugada é um capítulo sobre as memórias arrancadas pela linha de pesca, pela rede de arrasto, pela força da trama, favorecida por Iemanjá. As formas que estão ocultas no fundo do rio - no fundo do mar: são içadas do interior dos barcos de pesca, numa mistura abstrato-figurativa do que é preciso para sobreviver. O doce e o salgado são irmãos. Uma vida alimenta a outra. Um artista alimenta o outro. A linha de pesca encontra a forma pela força muscular, que puxa aquilo que resiste no elemento. A água torna-se pesada. O instrumento, a vara de pescar, uma borduna. E o que a artista realiza, com uma marreta nas mãos? Um a um os peixes vão subindo numa canção de vozes e orações típicas dos mercados em larga escala. Difícil não pensar no Círio de Nazaré, onde uma única corda laça o destino de uma população inteira pela fé. A ponta seca no momento da aurora. Se não estiver no ateliê, não irá ver o nascimento do movimento dos seres, no espaço sob pressão. Não há como negar que as imagens de Elaine Arruda são estranhas e as formas vistas, abertas. Um peixe ou um barco. As ilhas que aparecem e desaparecem no horizonte das placas. Furos. Tintas. O sol e a lua numa galáxia de possibilidades rasgadas pelo tubarão martelo: os barcos transformam-se em pontos de veludo, agrupados no porto escuro, onde a saudade é figurada nas linhas estouradas, por vezes falhadas, da impressão. Em seus trabalhos, a linha da ponta seca é estruturada na linha de uma mulher, que descobre como a água faz parte dos mecanismos abstratos que compõe a vida. O que é a figura, para quem viaja a pé ou de barco? Temos em Belém esta dupla via de acesso ao trabalho da artista, flagrante nos depoimentos incisos em grande escala. Observem como as linhas, unidas no acidente, compõe um cenário portuário no levante das
ferramentas. Mas, não é só isso. Temos as florestas, as árvores enormes que caminham para beber no leito, essa mistura salobra, na cor do papel alemão. Temos o corte como um signo geográfico maior. Não busquem nestas obras uma figuração dos cenários conhecidos. Aliás, nem pensem nisso. A forma, as estruturas criadas a partir de instrumentos usados na construção civil como marretas, talhadeiras, formões, picaretas e pás, deixam clara a tentativa de compor um imaginário novo, uma cidade nova. O calor é a própria essência dos edifícios abertos (e incompletos?), onde a cobertura é o céu. A marreta prepara o solo, o tecido muscular de suas memórias, criando incisões que podem brilhar como gotas de orvalho em um jardim cinzento. Talhadeiras e formões deixam as marcas da vontade nas bordas, nos barcos espalhados no fundo do mar, no fundo do rio. Por que não podemos pensar, em algumas gravuras, como embarcações naufragadas que emergem novamente, para a superfície? A escuridão da ponta seca fragmenta a realidade e deixa a viagem dos fantasmas do tempo, em suspensão, nos olhos das pessoas. Elaine Arruda promove uma cartografia do amor bruto e sólido, ao conduzir a imaginação para os telhados das casas que cercam o porto, onde pousam os carniceiros e os poetas. Amassando, afundando, conduzindo a luz de uma linha de vida tão forte como aquelas deixadas nas mãos dos pescadores de Fortalezinha ou do Ver-o-Peso, a artista constrói o seu leque de escamas: o personagem de suas memórias, livre das grades e dos quartos fechados da pequena forma, do Pequeno Príncipe, para se expressar na paisagem natal, a vontade de respirar a atmosfera além da linha do Equador. Ulysses Bôscolo, 17 de junho de 2011
Sem Título Ponta seca sobre zinco 30 × 40cm 2008
Elaine Andrade Arruda Tv. Gurupá, n° 104 · Cidade Velha · Belém · PA Tel: (091) 8402.2562 · (091) 8898.1224 arruda-elaine@hotmail.com
Formação Acadêmica ··
Psicóloga, formada pela Universidade Federal do Pará (UFPA).
Palestras Ministradas ··
Conferência na Escola de Belas Artes. São Paulo, 2007.
··
Palestra no Atelier Piratininga e Espaço Coringa. São Paulo, 2007.
Experiência Profissional ·· ·· ··
Técnica em Gestão Cultural da Gerência de Artes Visuais do Instituto de Artes do Pará (2008 a 2009). Ministrou cursos de gravura na Fundação Curro Velho (2003 a 2008). Ministrou workshop de gravura na Casa das 11 Janelas, atividade educacional que integrou o projeto “A Gravura no Pará” (2008).
Residências no Brasil e no Exterior ·· ·· ··
Residência no Centre d’artiste Engramme (Méduse). Québec – Canadá, 2009. Realizou pesquisa de experimentação e criação em gravura. Residência no Centro de Estudos da Imagem impressa Press Papier, em Trois-Rivières. Québec – Canadá, 2009.. Residência nos ateliês Piratininga e Espaço Coringa. São Paulo, 2007. Intercâmbio que integrou a programação “A Gravura do Pará”, na galeria “Gravura Brasileira”.
Cursos e Eventos de Aperfeiçoamento ··
Formation sur le logiciel Final Cut Pro, Spirafilm. Québec, Canadá, 2009.
··
Curso sobre processos gráficos em Fotogravura. Québec, Canadá, 2009.
··
Atelier «Direção para Documentários», ministrado por Eduardo Escorel. Instituto de Artes do Pará. Belém, 2009
··
Ciclo de Seminários sobre Estética Contemporânea, ministrado pelo Prof. Dr. Ernani Chaves. Instituto de Artes do Pará. Belém, 2008.
··
VI Colóquio Fotografia e Imagem: Materialidades da Fotografia. Instituto de Artes do Pará. Belém, 2008.
··
Curso Photomorphosis – iniciação à fotografia, do artesanal ao digital, ministrado pelo Prof. Miguel Chikaoka. Fotoativa. Belém, 2007.
··
Curso “Xilogravura como Opção”, ministrado pelo Prof. Ruben Grilo (RJ). Fundação Curro Velho. Belém, 2006.
··
Curso de Gravura em Metal, ministrado pelo Prof. Ulysses Bôscolo (SP). Fundação Curro Velho. Belém, 2006.
Obras Documentadas nas Seguintes Publicações ·· ·· ··
Publicação no Jornal de Resenhas da Folha de São Paulo, 2010. Publicação do livro “Impressões”, editado pelo SESC Pompéia. São Paulo, 2008. Catálogo “Acervo Onze Janelas, Gravura no Pará”, 2008.
Projetos Aprovados em Editais ·· ··
Edital de Pesquisa e Experimentação Artística Edição 2010, concedido pelo Instituto de Artes do Pará (IAP). Edital Espaço Cultural Banco da Amazônia 2010.
··
Participação do Laboratório de gravura, do evento “Gráfica Contemporânea”. Instituto de Artes do Pará. Belém, 2006.
··
Cursos de Gravura, ministrados pelo Prof. Armando Sobral. Fundação Curro Velho. Belém, entre os anos de 2002 e 2006.
··
Oficina de Pintura, ministrada pelo Prof. Armando Sobral. Fundação Curro Velho. Belém, 2006.
··
Oficina Laboratório de Fotografia. Fundação Curro Velho. Belém, 2005.
··
Curso de Cianotipia e Calotipia, ministrado pelo Prof. Eduardo Kalif. Fotoativa. Belém, 2005.
··
Workshop de Gravura em Metal com Prof. Marco Buti (SP). Fundação Curro Velho. Belém, 2003.
··
Palestra “A Gravura como processo”, ministrada pelo Prof. Marco Buti. Fundação Curro Velho. Belém, 2003.
··
“Experimento Dois”. Galeria César Leite. Belém - PA.
2006
Exposições
··
XV Mostra de Arte Primeiros Passos. Galeria do CCBEU. Belém.
2010 ·· ··
·· ·· ··
“Grafias”. Banco da Amazônia. Belém - PA. “Elucubrações”, resultado da Bolsa de Pesquisa e Experimentação Artística concedida pelo IAP (Instituto de Artes do Pará). Fotoativa. Belém - PA. “Estampe amazonienne”, exposição coletiva realizada no Centro Artístico Engramme. Québec, Canadá. “Entre nós”, duo VeryWell (Elaine Arruda e Véronique Isabelle). Fotoativa. Belém - PA. “Paná Paná”, exposição realizada em colaboração com a artista Véronique Isabelle. Galeria Theodoro Braga. Belém - PA.
2009 ·· ··
“Saudade ou le manque habité”, Moulin La Lorraine, Lac-Etchemin. Cidade de Québec, Canadá. “Olhares Cruzados Sobre a Natureza na Gravura Francesa e Brasileira”. Museu Casa das 11 Janelas, Sala Valdir Sarubbi. Belém - PA.
2008 ·· ·· ·· ··
Coletiva “Acervo das 11 Janelas, Gravura no Pará”. Museu Casa das 11 Janelas, Sala Valdir Sarubbi. Belém - PA. 14º Salão Unama de Pequenos Formatos – Prêmio Aquisitivo. Galeria Graça Landeira. Belém - PA. “Mário Grüber e a metafísica dos planos: outros portos”. Galeria do CCBEU. Belém - PA. “Forma Gravada”. Café da Sol.
2007 ·· ·· ··
“Gravura do Pará”. Galeria Gravura Brasileira. São Paulo - SP. “XI Mostra de Arte Primeiros Passos”. Galeria do CCBEU. Belém - PA. “II Salão da Vida”. Memorial dos Povos. Belém - PA.
Obras em acervo ·· ·· ·· ·· ·· ··
Engramme, Canadá. Centro de Estudos da Imagem impressa Press Papier, Canadá. Casa da Gravura Brasileira, São Paulo. Galeria Graça Landeira – Prêmio Aquisitivo no 14º Salão Unama de Pequenos Formatos – Belém. Museu da Casa das OnzeJanelas, Belém. Atelier do Porto, Belém.
ficha técnica Design Gráfico Andrea Kellermann Fotografias Alberto Bitar Elaine Arruda Véronique Isabelle Texto “A Pele do Cação” Ulysses Bôscolo Vídeo Véronique Isabelle
arruda-elaine @hotmail.com www.atelierdoporto.blogspot.com