Do erodido ao frugal

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Do erodido ao frugal: Proposta ArquitetĂ´nica para o Alagoinha, MaceiĂł, Brasil.



Universidade Federal de Alagoas Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

Do erodido ao frugal: Proposta Arquitetônica para o Alagoinha, Maceió, Brasil.

Trabalho Final de Graduação, orientado pela Profa. Dra. Maria Angélica da Silva, a ser avaliado pela Profa. Dra. Juliana Loureiro, pela Profa. Dra. Juliana Michaello, para obtenção do título de bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

Rodolfo de Albuquerque Torres Maio/2017





SUMÁRIO 1

INTRODUÇÃO

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MAPA INFOGRÁFICO

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1. O LUGAR ERODIDO

10 12 18 26 34 39 42

1.1 CLUBES DE ÉPOCA 1.2 ORIGEM 1.3 PROJETO 1.4 EDIFÍCIO 1.5 DECADÊNCIA 1.6 HISTÓRICO CONSTRUTIVO 1.7 PROPOSTAS PARA O ALAGOINHA

42 43 44 48 50 52

1.7.1 ASSIS REIS, (1976) 1.7.2 WELLNESS CENTER CLUB DO BRASIL, (2007) 1.7.3 OCEANÁRIO, (2007) 1.7.4 CENTRO GASTRONÔMICO, (2008) 1.7.5 MARCO REFERENCIAL DE MACEIÓ, (2011) 1.7.6 MARCO REFERENCIAL DE MACEIÓ, (2016)

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1.8 CONJUGAÇÕES

55 70

1.8.1 PRETÉRITOS 1.8.2 PRESENTE

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2. O LUGAR FRUGAL

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2.1 DIRETRIZES 2.2 PROJETO


INTRODUÇÃO Nestes anos que envolveram a minha graduação em Arquitetura e Urbanismo desenvolvi uma intensa fascinação por edificações. Através de um olhar entusiasta, busquei no cotidiano da minha vida acadêmica pesquisar sobre obras referenciais que pudessem agregar valor à minha formação. No entanto, diante das inúmeras obras que me chamavam atenção, nenhuma se localizava na cidade de Maceió. Assim, desde o início do curso, busquei nas viagens que realizei conhecer pessoalmente algumas destas edificações que, até então, só conhecia através de imagens. Em 2012 tive a oportunidade, através do Ciência sem Fronteiras, de morar em Sydney, na Austrália, onde durante um ano entrei em contato com novas edificações que passaram a constar nesta lista de referências. Porém, diante destas, destaco particularmente uma que representou um momento único na minha fascinação por arquitetura. Conhecer a Sydney Opera House foi uma experiência que transcendeu qualquer outra relação que tinha tido com algum edifício. Projeto do arquiteto dinamarquês Jørn Utzon, a ópera de Sydney, através de seu formato expressivo, desafiou as técnicas construtivas da época. Sua construção foi iniciada em 1959 e concluída apenas em 1973, tornando-se posteriormente símbolo nacional australiano. A edificação é considerada como uma das mais emblemáticas do movimento moderno e responsável por colocar o país sob os olhos do mundo. Curiosamente, nas diversas visitas que fiz à baía de Sydney para contemplar o edifício, este me remetia a estrutura remanescente do antigo Alagoinha (Alagoas Iate Clube), construção da década de 60 localizada no vértice da praia da Ponta Verde, em Maceió. No entanto, até então, eu nunca tinha visitado a edificação e nem tinha familiares que possuíssem algum vínculo com o antigo clube. Minha comparação se limitava às semelhanças geográficas que estas construções possuíam e de alguma maneira, recordava minha cidade natal. Neste processo, esta experiência revelava o poder identificatório dos marcos urbanos que nesta época ainda não era percebido por mim. Apesar de não ter tido um vínculo com o Alagoinha, Lynch (1999) explica que os marcos são pontos de referências considerados externos ao observador e cuja escolha se sustenta em uma característica única. Uma vez que o uso de marcos implica a escolha de um elemento dentre um conjunto de possibilidades, a principal característica física dessa classe é a singularidade, algum aspecto que seja único ou memorável no contexto. Os marcos se tornam mais fáceis de identificar e mais passiveis de ser escolhidos por sua importância quando possuem uma forma clara, isto é, se contrastam com seu plano de fundo e se existe alguma proeminência em termos de sua localização. (LYNCH, 1999, p.88).

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Oba (1998) classifica estes marcos referenciais como os monumentos, as construções, os espaços ou conjuntos urbanos com forte conotação de “lugar", apreendidos por uma grande parcela da população que vê neles uma referência física, cultural, histórica ou psicológica, relevante para a construção do seu espaço existencial. Sendo assim, estes marcos possuem um sentido que vão além de seus aspectos físicos, meramente visuais. São elementos delineadores de uma identidade e desenvolvem um sentimento de pertencer ao lugar. Desde meu regresso, em 2013, comecei então a me interessar pela edificação do Alagoinha, dispondo de uma atenção especial. Este fato coincidiu com as discussões que envolviam o futuro da edificação devido à proposta do governo federal para um marco referencial no local do antigo clube. Através das perspectivas divulgadas, despertei uma curiosidade por este projeto que me levou a participar de um evento organizado pela Universidade Federal de Alagoas. O objetivo desta reunião era promover um debate entre os arquitetos responsáveis pelo projeto, representantes da Secretaria de Turismo de Alagoas e a comunidade acadêmica, no entanto, apenas a última se fez presente. As discussões apresentadas nestas reuniões e em outras manifestações movidas pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFAL, despontaram a temática central e a escolha do local de intervenção do meu Trabalho Final de Graduação. Diante de uma monótona produção arquitetônica, marcada pelas edificações multifamiliares (que há décadas respondem às mesmas regras formais), a edificação do Alagoas Iate Clube, assim como a ópera de Sydney, representa a quebra de um paradigma. Esta aparente dicotomia arquitetônica, presente nas distintas fases modernistas a qual pertencem, expõem que apesar do contraste escalonar e formal, o Alagoinha é também, em seu devido contexto, um gesto vanguardista de uma arquitetura que diverge do meio ao qual se situa. Passados meio século do início da construção destas obras, a atual situação de abandono do Alagoinha alerta a necessidade de uma intervenção. Diante dessa experiência pessoal ao ter relacionado o edifício à minha cidade natal, constatou-se a possibilidade de que enquanto marco, a estrutura remanescente do clube permanece em funcionamento. No entanto, por se situar em plena área marítima esta é ameaçada pelas intempéries que vem atuando em um processo de erosão que ameaça o futuro da edificação demandando que, no mínimo, seja protegida. O lugar erodido, no sentido de uma edificação cujo o potencial nao é aproveitado devido ao seu atual estado decadente, no entanto, detentor de significado e memórias que persistem em uma parcela da sociedade.

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Diante disso, este trabalho se refere a uma proposta de requalificação da edificação que marcou época, através de um projeto de arquitetura para este lugar erodido. Estruturo esta pesquisa em dois capítulos - O lugar erudido e O lugar frugal. Para contextualizar e facilitar a compreensão das informações expostas, disponibilizo um mapa infográfico que podêm situar os eventos aqui descritos. O primeiro capítulo consiste em um levantamento histórico do clube onde apresento uma listagem de fatos que abrangem desde os antecedentes da construção à decadência da edificação. Esta pesquisa se apoia em informações extraídas de diversas fontes que, agrupadas neste trabalho, esclarecem uma boa parte da história do clube. Esta empreitada iniciou-se em pesquisas de jornais de época na Biblioteca Estadual Graciliano Ramos, onde explorei informações que revelaram datas, desejos, pessoas e acontecimentos históricos no clube. Além disto, contei com o apoio de algumas pessoas que colaboraram com a construção deste histórico. Como é o caso do Japson Filho, filho do fotógrafo Japson Almeida cujo acervo de imagens me foi disponibilizado e percorre muitas páginas deste trabalho. Contei também com informações do filho de um dos fundadores do clube, Paulo Nunes, através do qual pude esclarecer muitas dúvidas acerca das histórias e imbróglios que envolviam o Alagoas Iate Clube. Com estes dados, foi possível realizar um histórico construtivo que através de diagramas esclarecem as diversas fases do clube. Por fim, através de visitas a alguns órgãos públicos, pude me inteirar da situação jurídica e das pretensões que envolvem o futuro da edificação. Através destas fontes, foi possível fazer um conglomerado de propostas que já ocorreram para o lugar. Na busca de compreender estas expressões arquitetônicas que dão sentido ao espaço, realizo uma imersão na linha filosófica da arquitetura. Fundamentado através de conceitos como lugar, paisagem e memória coletiva, acredita-se que é possível a realização de um projeto que responda às questões de pertencimento e identidade. O significado de lugar tem como ponto de partida sua distinção da noção espaço, para Tuan (1983) o espaço torna-se lugar na medida que adquire definição. Assim, buscou-se analisar o processo de construção do lugar considerando o entorno no qual o Alagoinha foi construído e que ao mesmo tempo, ele próprio construiu. Analisou-se também a sua trajetória junto a outros elementos que transformaram o espaço natural daquela área situada entre a praia de Pajuçara e Ponta Verde. Através da Fenomenologia, das leituras de Heiddeger sob a ótica do arquiteto Norberg-Schulz (1980), foi possível compreender conceitos que transcendem o espaço físico, como Genius Loci ou espírito do lugar. Nos estudos que envolvem memória coletiva, foi possível ampliar o conhecimento acerca do lugar, compreendendo a forma como os 3


grupos se apropriam do espaço urbano. Acredita-se que estes conceitos são essencias na produção de uma arquitetura sensível ao caráter do lugar. Além disto, diante das discussões que envolvem a relação de contexto que o Alagoinha estabelece com os outros elementos integrantes da paisagem, coube também adentrar por uma discussão teórica acerca do conceito de paisagem, apoiado em autores como Augustin Berque, Michel Collot, Georg Simmel. Através das teorias da Gestalt, foi realizada uma análise da legibilidade proposta por Lynch, resultando em conjunto de fotografias manipuladas que esclareceram novas diretrizes projetuais. Estes estudos motivaram a realização de diversas imersões ao sítio em que a edificação está localizada, onde com um olhar mais atento, investigo a estrutura remanescente sob diversos ângulos. O ambiente identificado, conhecido de todos, fornece material para lembranças comuns e símbolos comuns, que unem o grupo e permitem a comunicação dentro dele. A paisagem funciona como um sistema vasto de memórias e símbolos para a retenção dos ideais e da história do grupo. (LYNCH, 1999, p.140).

Este esforço resultou em um discurso escrito e imagético acerca da edificação do Alagoinha que somados a um questionário divulgado nas redes sociais, evidenciam as ambições de parte da população para a área em estudo. Diante disso, obteve-se o que se considera um legítimo conjunto de orientações que conduzem à proposta arquitetônica para o lugar. Esta proposta vem anunciada em um conjunto de referências composto de palavras e ícones, que extraem do estudo os princípios que compõe o projeto, localizado no segundo e último capítulo deste trabalho. Com isso, após os estudos e análise das referências, a inspiração em uma arquitetura frugal se mostra o melhor caminho para responder as necessidades do lugar e os desejos da comunidade. Segundo Zevi (2010), ao contrário de um estilo de construções infinitivamente reproduzíveis independente do local de sua construção, uma arquitetura frugal pertence a um determinado lugar e a uma determinada cultura. Frugal architecture is an international though non-globalised phenomenon: it does not reproduce a single hegemonic model at the planetary scale, but is defined according to its site and the resources and needs of the local Community... They promote, above all, a new ethic, in oppossition to that of consumption and primarily formalist celebration (ZEVI, 2010, p. 6 e 7).

Sendo assim, a proposta é elaborada a partir destas premissas, buscando uma proposta integrada ao contexto geográfico e respondendo as necessidades reveladas pela comunidade ao longo desta pesquisa. O projeto introduzido através de uma série de diagramas que descrevem as soluções adotadas a estas diretrizes, resultando em um conjunto de imagens fotorealisticas da proposta arquitetônica.

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MAPA INFOGRÁFICO

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O LUGAR ERODIDO


1 - Jornal Gazeta de Alagoas, 04/03/73. 2 - Matinê, Clube Fênix Alagoano.

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1.1 CLUBES DE ÉPOCA A partir do século XIX surge uma grande diversidade de entidades resultante da mobilização social na constituição de associações, clubes e outras manifestações. Segundo Mezzadri (2000, p.23) estes grupos dividiam-se em função de interesses sociais, culturais e esportivos. De acordo com historiadores, a partir de 1850 começam a acontecer bailes e festas nestes clubes privados, que naquela época eram levadas a sério e exigiam dos sócios trajes apropriados. Em Maceió, já se vão muitos anos a nos separar das festas de grandes clubes socias, desde o primeiro, Clube Fênix Alagoana, fundado em setembro de 1886. A partir da década de sessenta, Maceió oferece a uma parcela de seus habitantes diversas opções de clubes sócio-recreativos, dentre os quais se destacaram: O referido Clube Fênix Alagoana, o Clube de Regatas Brasil, Jaraguá Tênis Clube e a União Beneficente Portuguesa. Frequentados pelas elites, estas associações determinavam posições e níveis de influência na cidade1. Durante o carnaval a cidade presenciava uma variedade de festas. As comemorações iniciavam no domingo anterior ao feriado com o tradicional banho de mar à fantasia, realizado na praia da avenida. As festas continuavam em outros trechos da cidade, tais como praças, ruas e nos clubes, onde se realizavam os tradicionais bailes carnavalescos. O evento era visto como objeto de disputa entre os administradores dos clubes, estes, se empenhavam em realizar a festa mais badalada na busca do título de melhor baile da cidade, avaliados pelas crônicas sociais que descreviam as festividades nos jornais. Com o crescimento da cidade, novos clubes foram surgindo e explorando o grande potencial de aproveitamento do mar através da prática de esportes náuticos, ao exemplo do Iate Clube Pajuçara e o Alagoas Iate Clube. Este último, um arrojado projeto sobre os recifes da praia da Ponta Verde e cuja história será abordada neste capítulo.

Bailes de carnaval marcaram glamour de uma época em Alagoas. Tribuna Hoje, Maceió, 8 de Fevereiro de 2015. Disponível em: <http://www.tribunahoje.com/noticia/131337/cidades/2015/02/08/ bailes-de-carnaval-marcaram-glamour-de-uma-epoca-em-alagoas.html>. Acesso em: 05, Jul. 2016. 1

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3 - Paulo Costa faz o pagamento do terreno ao propietário Hélio Vasconcelos, ladeado pelos sócios diretores. 4 - Sede social provisória localizada no sítio Ponta Verde.

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1.2 ORIGEM No início dos anos 40, a cidade de Maceió dotava de um variado número de clubes sociais e esportivos, entre eles, o Clube de Regatas Brasil - CRB, fundado em 1912. O CRB, como no próprio nome já informa, realizava diversas competições de regatas2 que durante anos movimentaram a praia da Pajuçara. Durante esta época, motivados pela prática do esporte náutico, os irmãos Luiz e Paulo Costa junto a outros iatistas e remadores, frequentavam assiduamente as dependências do clube. Com o passar do tempo o clube de regatas optou por caminhos diferentes, distanciando-se da sua principal finalidade e direcionando o seu foco para a prática do futebol, antes com encargo amador, torna-se o esporte razão da existência do clube, levando o CRB à sua atual situação. Com a falta de espaço para a prática do esporte náutico, os irmãos Costa juntamente a um grupo de amigos, verificam a necessidade da criação de um clube verdadeiramente náutico, originando assim, em 1952, o Iate Clube Pajussara. O clube então, se instala em um terreno de frente à praia do bairro da Pajuçara em um terreno doado pela sogra de Luiz Costa, onde este permanece até os dias de hoje. Durante os anos seguintes a inauguração do clube, o bairro da Pajuçara cresce vertiginosamente tornando-se muito movimentado, dificultando a travessia das embarcações do clube para o mar. Além disto, com os obstáculos oriundos do progresso do bairro, o Iate Clube Pajussara já não se encontrava mais com sua finalidade principal focada nos esportes náuticos, como as regatas e os campeonatos interestaduais. Diante disso, surge no dia 6 de janeiro de 1963 a ideia de construir o Alagoas Iate Clube, conhecido posteriormente como Alagoinha, durante reunião realizada na residência de um dos fundadores. Após o encontro e a formação da diretoria do novo clube, ficou decido entre estes visitar a “vacaria" do Sr. Hélio Vasconcelos, então principal proprietário dos terrenos do antigo sítio Ponta Verde, na época praticamente inabitado, buscando um local mais ermo, que oferecesse condições satisfatórias e acessíveis às acomodações pretendidas pelo clube. O trabalho foi enorme para colocar num lugar totalmente desabitado e cheio de mato [...] era muito difícil trafegar de automóvel nas estradas sinuosas de areia frouxa entre o coqueiral. Muitos não conseguiam chegar até a nossa sede e deixavam seus veículos distantes [...]. Não demorou muito e foram construídas pistas asfálticas para veículos e o bairro começou a prosperar.3 Uma regata é uma prova náutica de velocidade entre várias barcos - à vela, a motor ou a remos fazendo um percurso assinalado por balizas (bóias) e definido pela organização. 3 Relato escrito por Paulo Nunes Costa, um dos fundadores do Clube, disponibilizado ao autor através de Paulo Sergio Nunes, filho do próprio, em entrevista concedida em Abril de 2016.

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5 - Gogó da Ema, década de 50. 6 - A Queda do icônico coqueiro Gogó da Ema, 1955.

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Sua sede inicial é então construída próximo onde hoje existem a estrutura remanescente do clube, no sítio do bairro da Ponta Verde adquirido pelos fundadores do clube pelo valor de Cr$ 3.700.000,00 (três milhões e setecentos mil cruzeiros)4. Atual cartäo postal da cidade, a praia da Ponta Verde era conhecida como a Praia das Acanhadas5, pois era frequentada por garotas que queriam se banhar com privacidade. A regiäo herdou o nome do antigo Sítio Ponta Verde, caracterizada pela existência de um vasto matagal e coqueiral que avançavam até sua extremidade em forma de um vértice, sendo esta a razão de seu nome. Antiga região de sítios e chácaras, a Ponta Verde é local de maré mansa e morna, que quando seca, revela aos transeuntes um imenso recife de corais. Ainda em relação à região do sitio adquirido pelo clube, vale ressaltar a proximidade deste com o icônico Gogó da Ema – um coqueiro que, em razão do seu tronco deformado, lembrava ao pescoço da ave. Devido seu formato exótico, o coqueiro tornou-se símbolo da cidade, sendo durante a década de 1930 a 1950, frequentado por casais, fotógrafos e pintores, que, segundo artigo publicado pelo historiador Luís Veras Filhos no folhetim Maceió - História e Costumes (1990 apud ESTANILAU, 2014), tornaram a palmácea reconhecida internacionalmente, estampando postais, gravuras e fotografias que eram enviados com orgulho pelos moradores de Maceió6. Na metade da década de 50, o mesmo mar que avançou e derrubou os coqueiros adjacentes destacando o Gogó da Ema, começara a agir para derrubálo. As autoridades na época improvisaram uma barreira de troncos, aterrada com arrecifes e cimento, uma solução que se mostrou ineficiente para impedir a força das ondas, que em 1955, derrubam vagarosamente o icônico coqueiro. Na tentativa de reerguer a palmácea, foi montada uma operação que contou, inclusive, com a ajuda de um carro guindaste. Alguns meses depois, apesar de todo o tratamento feito após sua primeira queda, o coqueiro foi definitivamente ao chão7. Desta forma, a localização do sitio onde o Alagoinha foi instaurado, além de singular, é munida de muito significado, conforme mencionado por Estanilau (2014). O Alagoas Iate Clube foi erguido próximo ao local que funcionou como um dos primeiros cartões postais da cidade e que permanece como um dos simbolos desta até os dias atuais.

Alagoas Iate Clube, Salve Alagoas. Maceió, 5 de Dezembro de 2012. Disponível em: <http://www. salvealagoas.com/2011/06/alagoas-iate-clube.html>. Acesso em: 01, Abr. 2015. 5 Ponta Verde, Bairros de Maceió. Disponível em: <http://www.bairrosdemaceio.net/site/index. php?Canal=Bairros&Id=35>. Acesso em: 01, Abr. 2015. 6 ESTANILAU, Luísa, Sobre ruínas e fotografias: imersões em torno do Alagoinhas. TFG, Maceió: FAU/UFAL, 2014. 7 A queda do Gogó da Ema, História de Alagoas. Disponível em: <http://www.historiadealagoas. com.br/gogo-da-ema.html>. Acesso em: 10, Abr. 2015. 4

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7 - Ponta Verde, década de 50. 8 - Ponta Verde e Pajuçara ao fundo, foto aérea, década 70.

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O local onde o Alagoinhas foi erguido possuí, portanto, um histórico turístico e mitológico que perpassa uma camada temporal anterior à sua construção. De maneira que, podemos considerar que a vocação icônica do lugar é “natural”, inerente à sua própria localização, que independe da arquitetura, mas que pode ser incrivelmente potencializado por ela. Com a queda do coqueiro e, posteriormente, a construção do Alagoas Iate Clube, o lugar adquiriu uma nova conformação turística, e um novo cartão-postal delineouse. (ESTANILAU, 2014, p. 59).

Através da inauguração, o Alagoinha conta com o prestígio de pessoas influentes, entre elas, o então Capitão dos Portos8 que em uma de suas visitas sugere a construção de uma sede sobre o mar9. Diante disso, foram providenciados os documentos necessários para o requerimento da autorização pelo Ministério da Marinha, que em um curto prazo de tempo, aprovou o aparato que iria exaltar e distinguir a futura sede da agremiação de qualquer outro clube da região. Desta forma o clube, além de se localizar próximo onde antigamente existiu o Gogó da Ema, tinha a autorização do Ministro da Marinha bem como a licença expedida pela Capitania dos Portos10 autorizando a construção da sede náutica sobre os recifes de corais ali existentes11 desde que não prejudicasse a conveniência dos serviços navais e a segurança da navegação naquela região. É a partir deste contexto que se idealiza, sobre o mar, a edificação que iria marcar definitivamente a paisagem litorânea da orla compreendida entre as praias da Ponta Verde e Pajuçara. Jorge Mendonça Tibáu. Informação extraída de relatos escritos por um dos fundadores do clube, gentilmentes cedidas por Paulo Sérgio Nunes. 10 Em 18 de fevereiro de 1964, a Capitania dos Portos de Alagoas, expediu a Licença Avulsa de construção do Alagoinha. 11 Trecho retirado da Ação Recisória Nº 5150-AL. BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, Relatora: Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, Fevereiro, 2006. p. 4. 8 9

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9 - Apresentação do projeto, década de 60. Apesar da resolução, percebe-se as nuâncias da solução circular icônica. Além disso, era previsto a construção de um restaurante internacional e uma piscina olímpica.

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1.3 PROJETO De acordo com SILVA (1991, p. 125) e relatos obtidos em entrevista, foi feito um concurso entre arquitetos e engenheiros de Maceió com o objetivo de apresentarem um croqui da proposta com detalhes viáveis às condições financeiras do clube. Desta forma, a comissão de diretores do referido clube selecionam dois projetos para estudo de viabilidade, sendo eles, uma proposta do arquiteto Mario Lages e outra das arquitetas Zélia Maia Nobre12 e Edy Marrêta. A segunda proposta é a escolhida para execução, de acordo com um dos fundadores do clube, o projeto é eleito devido sua capacidade de execução em três etapas, por tratar-se de uma construção difícil e de alto custo. A sede marítima do Alagoas Iate Clube começou a ser construída em 1965, seguindo um modelo de píer: uma passarela que sai da via pública passa sobre a faixa de praia e termina sobre o mar, numa plataforma de madeira edificada em pilares encravados nos recifes13. A obra, que contou com a participação dos engenheiros Vinícius Maia Nobre e Valter Pessoa de Melo, sofreu modificações durante sua construção e teve sua área restringida. Balizado por aqueles que conheceram a proposta arquitetônica vencedora, afirma-se que não houve muita similaridade entre o projeto original e àquilo que foi edificado (ESTANILAU, 2014, p.61). As obras do clube perduraram até a primeira metade dos anos 80, isso se deu devido à ideia inicial de executar o projeto escolhido em etapas distintas, viabilizando sua execução. Em sua primeira etapa, o clube entrou em funcionamento com a solução de base circular que nos dias de hoje, já se incorporam pelo hábito, à visão das praias da Ponta Verde e Pajuçara14. O acesso ao clube, inicialmente, era feito através da passarela de concreto onde em seu inicio, na beira da praia, se encontravam duas salas adjacentes que serviam de secretaria e recepção. Entre estas salas, no centro, existia um portão e logo em frente um pequeno estacionamento, também construído pelo clube. Arquiteta, atuou profissionalmente dentro de uma linha de concepção modernista, formada em Recife num período em que a escola conta com um quadro de professores seguidores da proposta corbusiana de projeto. Trabalhou no Departamento de Obras Públicas, executando diversos projetos para capital e interior de Alagoas, destacando-se no projeto de residências com os dogmas do Modernismo adaptados ao clima tropical da região. É autora de projetos como, Parque Hotel(1957) Reforma da Escola de Engenharia(1961) onde posteriormente, funcionaria a sede da Reitoria da Universidade Federal de Alagoas, Residência Universitária Masculina e o Restaurante Universitário(1964). Zélia é também uma das pessoas responsáveis pela fundação da Escola de Arquitetura de Maceió (1958) e, posteriormente, na década de 70, Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFAL. 13 Segundo texto da Ação Recisória Nº 5150-AL. BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, Relatora: Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, Fevereiro, 2006. p. 4. 14 SILVA, 1991, op. cit. loc. cit. 12

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10 - Alagoas Iate Clube, dĂŠcada de 70. 11-12 - Reportagem Freitas Neto, Alagoinha na era do turismo. 13 - Alagoinha, dĂŠcada de 70.

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Além disso, a arquitetura do clube se destacava especialmente pela solução circular sustentada por pilares dispostos em todo perímetro onde, contornada por uma platibanda revestida de cerâmica branca, localizava-se o nome do clube. Sua estrutura geral foi erguida sob os corais, também distribuídas em torno do perímetro da edificação. Diante destas características, o Alagoinha representava, em sua primeira etapa, um original exemplar da arquitetura moderna. Em uma matéria de jornal, encontrada pelo autor em pesquisa de campo, o jornalista Freitas Neto15 descreveu in loco como se encontravam as obras da primeira etapa da sede marítima do Alagoas Iate Clube, a data era de Janeiro de 1972. Já dizia São Tomé: “Só vendo, tocando para crer.” Assim é o Alagoas Iate Clube, o “Alagoinha”, que nasceu dentro d’água. O turista que chega à terra, pasmado exclama: no Brasil não existe igual! De fato, é algo fantástico que precisa contar com o apoio de todos os alagoanos. Se morreu o Gogó da Ema dentro d’água, cujo local a atual diretoria vai colocar um mirante com uma frase homenageando o famoso coqueiro, bem pertinho nasceu o Alagoinha, também dentro de uma imensidade de líquido salgado, embora com bases sólidas da arquitetura moderna.16

Esta reportagem revela um gesto vanguardista para época, onde o autor reforça afirmando que "no Brasil não existe igual". Ainda sobre a mesma matéria, o colunista revela que a principal meta do clube era contribuir o desenvolvimento do turismo no estado, não apenas pela infraestrutura que o Alagoinha poderia oferecer, mas por destacar a beleza natural existente no lugar. Este objetivo é fortificado durante a década de 70, quando várias iniciativas são tomadas por parte do Governo do Estado e da Prefeitura Municipal de Maceió no sentido de incentivar a implementação do turismo na região. [...] na década de 70, é criada a Empresa Alagoana de Turismo - EMATUR, que estimula os grupos a construir hotéis. Estes são construídos inicialmente na praia da Avenida. Em 1974 ocorre a urbanização da orla da Pajuçara e no início dos anos 80 as obras da beiramar se estendem ao longo das praias de Ponta Verde e Jatiúca, até o encontro do Hotel Jatiúca. Essas iniciativas, embora concentradas na cidade de Maceió, contribuíram para a divulgação do Estado e suas belezas naturais que paulatinamente foi se consolidando enquanto destino turístico em âmbito nacional.17

Sob esta ótica, o clube anunciava nesta mesma publicação o funcionamento de um restaurante internacional para os turistas e associados e a construção, em uma segunda etapa, de piscinas de água salgada com dimensões olímpicas, além de outras sombreadas para crianças. A diretoria do Alagoinha também destacava João Vicente Freitas Neto, 1949 - 1997, jornalista atuante durante as décadas de 70 a 90. NETO, J. V. Alagoinha na era do turismo. Gazeta de Alagoas. Maceió, 9 jan. 1972. 17 APL Turismo Região das Lagoas, Secretária Executiva de Planejamento e Orçamento e SEBRAE/AL. 2004, p.9. 15 16

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14-16 - Alagoinha sob diversos ângulos na década de 70. Nota-se o ínicio da urbanização da orla da Ponta Verde (Imagem 14) e um pequeno número de edificações verticais no bairro.

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que o clube seria completamente diferente dos demais da cidade, funcionando mais como um clube náutico do que social, evitando a sua transformação de um equipamente sócio esportivo em boate, como acontecia nos demais, porém, não descartavam a possibilidade de realizarem festas e serenatas. A ideia de um espaço diferenciado, inovador a qual o clube se propôs, sofria curiosamente da falta de apoio de uma parte da população, uma vez que se instalava em pleno oceano Atlântico, era alvo de incertezas quanto a capacidade de sua execução, resultando em um grande número de sócios inadimplentes que ameaçavam o avançar das obras. Em entrevista ao mesmo jornalista, o então primeiro Comodoro do Alagoinha, Luiz Costa, relata; [...] apesar do grande esforço da diretoria para a conclusão das obras da primeira etapa, compreendidas de Secretaria, Tesouraria, Salão de Estar, Portaria, Cabelereiro, Bar e Restaurante, não nos foi possível, ainda, concluí-las pelo simples fato de uma grande parte de associados não corresponder com suas mensalidades em dia [...] assumimos a diretoria em setembro de 70 e verificamos que dos 876 associados que formavam nosso quadro social, somente 183 acreditaram e pagaram a mensalidade de Cr$ 5,00 por mês; os demais desprezaram o clube e muitos espalharam boatos de que jamais seria construído [...] hoje estamos com 532 associados pagando as suas mensalidades , muita gente querendo se associar e, embora devagar, a construção indo para a frente.18

A longa duração da obra do Alagoinha pode ser justificada então por dois fatores, o primeiro seria o custo da obra em si, edificada em concreto armado e com uso de mão de obra especializada, e o segundo, o descrédito por parte dos associados, em sua maioria, na sua finalização, dificultando o acúmulo do capital necessário para a conclusão do edifício. Desta forma, passadas aproximadamente uma década desde a compra do sítio, este ainda se encontrava em construção. [...] estamos empregando todos os esforços para ver se inauguramos no próximo mês, entrentanto as perspectivas não são muito boas, uma vez que não há dinheiro e tudo que se emprega no clube é na base do concreto armado e com mão de obra muito cara [...] não vamos dar festa de carnaval, mas vamos realizar uma festa e anunciar com otimismo a possibilidade de um carnaval completo no próximo ano.19

Segundo o antigo Comodoro Luiz Costa, o clube teve sua sede marítima inaugurada em 1972 através de um evento anunciado na entrevista concedida à Gazeta de Alagoas20. No entanto, não foi encontrado nenhuma noticia deste evento inaugural no mesmo jornal para o ano em questão.

NETO, J. V. op. cit. loc. cit. Id. Ibid. 20 Id. Ibid. 18 19

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17-20 - Cobertura do Carnaval de 73, jornal Gazeta de Alagoas. 21 - Desfile de moda no Alagoinha, década de 80, realizado em uma segunda fase do clube, descritas no próximo tópico.

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Conforme anunciado pelo então Comodoro Luiz Costa, em entrevista citada anteriormente, o Alagoas Iate Clube realizou sua primeira festa de carnaval, em 1973, na sua nova sede marítima. Foram quatro dias de festas amplamente divulgadas no jornal Gazeta de Alagoas, que segundo este, apesar da decoração simples, realizou uma grande festa inaugural de carnaval. A sede marítima do Alagoinha, inicialmente, não possuía a característica de boate, frequente em outros clubes. Esta foi local de diversos eventos que eram periodicamente anunciados nas colunas sociais dos jornais da época. Além disto, o clube funcionou como escola de iatismo, participando e promovendo campeonatos náuticos em níveis regional e nacional durante boa parte de sua existência. 24


22 - Ação de marketing para a venda de títulos patrimoniais que ajudaram na execução da segunda etapa do clube.

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1.4 EDIFÍCIO Durante a da década de 70 o Alagoas Iate Clube mantinha duas sedes em funcionamento, a sede social21 e a recém-inaugurada sede marítima. O clube então entra na sua segunda etapa, ou seja, a construção das piscinas e áreas de lazer para os associados. Essas construções vão se configurar através de uma solução arquitetônica diversa da projetada pelas arquitetas vencedoras do concurso. Após algumas vendas de títulos de propriedade, o clube contrata a empresa A. Portela S/A de Salvador para tornar o clube mais acessível ao grande número de associados que não fora previsto anteriormente. O projeto de reforma é então elaborado pelo arquiteto Assis Reis com a proposta de várias dependências no entorno do quadrante inicial da sede marítima. Após o inicio da reforma, verificouse que a receita era insuficiente e os diretores do clube decidem suspender o contrato e prosseguir, através de um projeto próprio, com a construção do segundo quadrante. Este irá se diferenciar em sua estrutura e forma, o que foi edificado sob pilares numa alternativa menos agressiva ao impacto com o mar, agora é aterrado através de um bloco regular. Sobre essa base foram dispostos uma área de lazer com piscinas para o público adulto e infantil e os vestiários, além de uma área coberta localizada atrás da piscina de maior dimensão. Com o avançar do tempo, a natureza sofreu o impacto destas novas obras do Alagoinha resultando num processo de erosão, que aumentou a faixa de areia localizada defronte ao edifício22. Deste modo, em meados da década de 80, o clube inicia uma nova série de construções, desta vez, na faixa de areia próxima a sede marítima. Neste espaço, o clube começa a expandir sua infraestrutura através da construção de um aterro que serviu para a implantação de um curioso prédio administrativo em formato de iate, destoante dos ideais da arquitetura modernista a qual o clube se configurou em um primeiro momento. Com essas reformas o clube vai, durante o fim da década de 80 e inicios dos anos 90, atingir o seu apogeu, com aproximadamente 2.300 sócios e dispondo de áreas como: parque aquático com piscinas de água salgada, para adulto e crianças, departamento náutico-vela e motor (com garagem para barcos), quadra poliesportiva, escolinha de vela, salão vip com espaço para um telão e sistema de transmissão SKY, salão de festas e áreas para lazer, aulas de ginástica rítmica, aulas de hidroginástica e natação, estúdio para aulas de dança de salão, restaurante panorâmico além de pontos exclusivos para pescaria. Não foi encontrado pelo autor, a data à qual o clube se desfez de sua sede social, contudo esta já se encontra demolida e não possuía as características particulares da sede marítima que justificassem sua inserção neste trabalho. 22 Segundo o Relatório de Avaliação Ambiental (RAA) Marco Referencial de Maceió, Maio, 2013, p.2. 21

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23 - Início da segunda etapa, final da década de 70. 24 - Alagoinha com sua segunda etapa concluída, 1982. 25 - Piscina do Alagoinha, meados dos anos 80.

Além de toda a infraestrutura que o clube já possuía, nunca foi concluída a terceira etapa do projeto. Esta englobava, em linhas gerais, a construção de uma piscina com dimensões olímpica e um deck para atracar as embarcações. As obras que chegaram a ser iniciadas, não foram concluídas por falta de dinheiro, sendo possível até os dias de hoje visualizar o perímetro que abrangeria estas construções. A partir de tantas ampliações, o clube multiplicou sua área física se apropriando de uma considerável área do vértice da Ponta Verde, chegando inclusive, a impossibilitar a passagem de quem trafegava pela areia vindo da Pajuçara em direção à Jatiúca. Estas barreiras tanto visuais quanto físicas irão colocar o Clube em questionamento quanto à legalidade de suas edificações e tornarão estas, alvos de ações judiciais que irão contribuir na decadência deste.

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26 - Construção do estacionamento, anos 80. 27 - Construção da sede admnistrativa, anos 80. 28 - Segunda etapa concluída, postal do início dos anos 90. Observa-se a grande área reservada à terceira fase de expansão do clube. 29 - Restaurante do clube.

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30 - Vista aĂŠrea, anos 90. 31 - Estacionamento. 32 - Alagoas Iate Clube, anos 90.

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33 - Alagoinha, 2005. 34 - Alagoinha, 2016.

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1.5 DECADÊNCIA A partir dos anos 2000, após diversas ampliações realizadas pelo Alagoinha, este começa a enfrentar ações judiciais que visavam adequar a área localizada na plataforma oceânica à legislação vigente. No entanto, o Clube justificava que todas as obras realizadas se encontravam autorizadas através da licença expedida pela Capitania dos Portos para a construção da sede marítima em área subaquática. Esse embate resultou em um interminável processo de desapropriação que irá desativar o clube e afundá-lo em um mar de dívidas. Em outubro de 2005, segundo reportagens do jornal Gazeta de Alagoas, a Justiça Federal determinou a interrupção de obras de ampliação que estavam sendo realizadas no estacionamento do Clube. Além disso, a ordem judicial previa a demolição do que já havia sido construído, proibindo qualquer atividade no imóvel destinada aos turistas e associados até o cumprimento da decisão. A ação movida pela União Federal através da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) justificava que o Clube sem autorização da mesma, expandiu-se em direção à praia, área considerada de uso comum do povo, onde é proibido qualquer tipo de construção. O artigo 20 da Constituição Federal prevê que os terrenos de marinha são áreas que pertencem a União, reservadas para fins militares, ordenação da zona costeira e proteção ambiental. Desta forma, como a praia configura-se como terreno de marinha de domínio público e não terreno subaquático, no qual o clube tinha a autorização de construção, a obra seria inadmissível desde a Ordem Régia de 1710 que estabeleceu a proibição de edificar em praias. O Clube então apelou através de uma Ação Rescisória para evitar a demolição das construções feitas na faixa de areia, porém não obteve sucesso. Segundo a Ação Rescisória no 5150-AL, existiam dois processos contra o Alagoas Iate Clube, nos quais se discutiam questões distintas sobre um único objeto, na Ação Civil Pública nº 96.004152-0 a relatora afirma: O Ministério Público Federal pretendia demolir toda a sede náutica do Alagoas Iate Clube, que se projeta no mar entre as praias de Ponta Verde e Pajuçara, na cidade de Maceió. O pedido compreendia toda a construção, incluindo o prédio da sede e o ancoradouro construídos no píer, bem identificados nas fotografias constantes dos autos. Nesse processo, o MPF e o clube firmaram acordo para que o píer seja poupado, em troca de reformas na rede de esgoto e retirada dos destroços de construção existentes sobre a área de recife.23

Segundo texto da Ação Recisória Nº 5150-AL. BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, Relatora: Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, Fevereiro, 2006. p. 3.

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Já na Ação de Reintegração de Posse nº 2000.80.00.006260-6: [...] União Federal insurge-se contra a ocupação irregular da faixa de praia costeira, sobre a qual o Alagoas Iate Clube construiu um prédio dedicado à secretaria, amplo espaço de estacionamento e garagem para embarcações. Não há questionamento quanto ao píer, mas tão-somente da construção posterior sobre a faixa de praia. Além da reintegração da União na posse da faixa de praia, o Juízo de 1º grau determinou “o desfazimento das construções realizadas em detrimento da posse da União Federal e da utilização da área de uso comum pelo povo [...]24

Com uma problemática situação financeira o Alagoinha se encontrava com dificuldade de se manter, os últimos grandes momentos do clube foram os domingos dançantes voltado para o público da 3ª idade. Neste cenário, o Alagoas Iate Clube que já não se encontrava em pleno funcionamento há algum tempo, era palco de apenas alguns eventos25, resultando então no encerramento de suas atividades em Dezembro de 2005. O último acontecimento do clube que hoje só existe juridicamente, sem nenhum bem, foi o atendimento de um desejo do falecido Comodoro Paulo Nunes Costa em doar o Busto do Almirante de Tamandaré, que se localizava na entrada do clube, à Capitania dos Portos de Maceió, onde hoje já se encontra postado em sua sede na Avenida da Paz26. O Alagoinha enfrentou diversos processos trabalhistas, além de dividas do IPTU, questionada pelos diretores27, a situação se agrava com o seu fechamento, uma vez que a taxa cobrada pelos sócios havia sido suspensa e este já não possuía mais dinheiro para reerguer-se. Atendendo então a ordem judicial, em fevereiro de 2006, toda a área edificada sob a faixa de areia é demolida: estacionamento, prédio administrativo em formato de iate, quadra poliesportiva e parte da ponte. Elas bloqueavam a passagem daqueles que circulavam pela faixa de areia, que para atravessar esse ponto da praia eram obrigados a passar por debaixo, quando possível, dos pilares que sustentam o clube ou contornar o complexo pela área urbanizada da orla (ESTANILAU, 2014, p.65). A partir da demolição, o Alagoinha entra em uma fase de imbróglio quanto ao futuro de sua antiga sede marítima. Entre 2006 e 2007, o clube firma uma parceria, através de um Termo de Ajustamento de Conduta, com a empresa "Wellness Id. Ibid. Obras no antigo Alagoinha devem ter início ainda em 2013, garante Estado. Portal G1, Maceió, 10 de Agosto de 2013. Disponível em: <http://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2013/08/obras-no-antigoalagoinha-devem-ter-inicio-ainda-em-2013-garante-estado.html>. Acesso em: 01, Abr. 2015. 26 Informação obtida através do atual comodoro, Luiz de Cerqueira Cotrim Filho. 27 Segundo relatos do então Comodoro Paulo Nunes Costa, o Clube recebeu uma intimação judicial para efetuar o pagamento de IPTU, este providenciou o embargo cujo processo analisado pelo então Juiz de Direito declarou que o Clube não estava sujeito ao pagamento do imposto, determinando que fosse cobrado apenas taxa de lixo e conservação da via pública. 24 25

35


Center Clube do Brasil" para a limpeza, recuperação e construção de novas instalações, mas com o iminente processo de desapropriação a empresa resolve não dar continuidade às obras. Em março de 2007, levando em consideração a reurbanização da orla, o ex-prefeito Cicero Almeida assina o decreto de no 6.728 que visava desapropriar a área do clube para a construção de um mirante e oceanário. O projeto, por questões politicas, não se concretizou. Em dezembro de 2008, o Governo do Estado anuncia28 um projeto de impacto: a implantação de um complexo reunindo Centro de Gastronomia Alagoana, Escola Náutica Integrada com as piscinas naturais da orla da Ponta Verde e Pajuçara, a obra nunca ocorreu devido supostos empecilhos burocráticos. Em Setembro de 2011, a justiça devolve aos sócios a sede do Alagoinha, anulando o decreto devido à perda da finalidade da desapropriação, uma vez que o projeto do complexo citado anteriormente não fora concluído. No entanto, em entrevistas à mídia local, os conselheiros do clube afirmaram que não possuíam recursos para recuperar a sede, pois durante os anos em que esteve sob a responsabilidade do Estado, este sofreu um processo acelerado de degradação, passando a ser utilizado por moradores de rua e tornando-se local de uso de entorpecentes. Por fim, em março de 2012, após diversas reuniãos quanto ao valor da indenização, o Clube fecha um acordo com o Estado, tornando este propietário do Alagoas Iate Clube. No mesmo ano, o Governo do Estado apresenta um novo projeto, o Marco Referencial de Maceió, desta vez, uma proposta verticalizada que contava em linhas gerais com, um elevador que subiria até um mirante de 40 metros de altura, além de aquário, museu de fotografia e escultura, e espaço para apresentações artísticas. O projeto, que possuía verba garantida, deveria ter suas obras iniciadas em 2013, porém, coincidentemente após manifestações contra a obra, o projeto foi reprovado por exigir escavações. Diante dos fatos, apesar das diversas especulações e propostas para o local do clube, este ainda se encontra sem um futuro definido, sofrendo as intempéries do homem e da natureza que aos poucos ameaçam o que restou da antiga sede marítima. Fincado há meio século na paisagem da cidade, o Alagoas Iate Clube anseia por um amparo que faça jus a sua importância histórico-cultural.

28

Martins, L. ALAGOINHA - O naufrágio de uma glória. Primeira Edição. Maceió, 7 Dez. 2009.

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35 - Alagoinha, 2016.

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Diagramas 1-8 - Axonométricas da evolução construtiva à decadência do clube. Estas, revelam um projeto inicial ordenado que posteriormente foi sendo adaptado aos usos que se fez necessário. Estas alterações não dialogavam com a primeira etapa do Alagoinha pois não faziam parte do projeto original do clube. No entanto, percebe-se que o gesto moderno proposto outrora pela arquiteta, permanece nas estruturas que apoiavam a cobertura principal do edifício.

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1965 - 1972

1976 - 1982

Construção da Primeira fase do Alagoas Iate Clube.

Construção e inauguração da segunda fase do Alagoinhas.

Anos 90

2005

Outras construções no interior da área do clube.

Encerramento das atividades do Clube.


1.6 HISTÓRICO CONSTRUTIVO Meados da Década de 80

Fim da Década de 80

Início da construção da ampliação do clube.

Conclusão da ampliação em faixa de areia, ínicio da terceira etapa.

2006

2007 - Dias Atuais

Demolição das construções em faixa de areia.

Outras demolições no interior do clube, sendo mais recente, a Coberta, em 2015. 40


36-37 - Maquete do projeto elaborado por Assis Reis. Neste projeto, destaca-se a ampliação da área construída sob o mar. Apesar da manutenção do elemento circular original, nota-se uma rigidez formal nas áreas ampliadas que constrastam com as curvas da primeira etapa do Alagoinha.

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1.7 PROPOSTAS PARA O ALAGOINHA Desde os anos 70 até muito recentemente, vários projetos foram apresentados visando a compatibilidade das funções com o entorno de força e, ao mesmo tempo, fragilidade ambiental. Este tópico expõe outras tentativas, anteriores a este trabalho, de apresentar soluções para a área. Estas soluções revelam a compreensão de sua força enquanto elemento icônico da paisagem de Maceió e as várias possibilidades que se descortinaram para incrementar o uso da construção. 1.7.1 ASSIS REIS (1976) Durante os anos em que esteve em funcionamento, o Alagoas Iate Clube recebeu em suas instalações diversas benfeitorias. Desde sua fundação, o Clube continuamente ampliou sua infraestrutura para viabilizar o seu funcionamento. Estas alterações, visíveis nas fotografias, foram lentamente transformando o pequeno píer em um verdadeiro complexo náutico e de lazer. Conforme já mencionado neste trabalho, antes mesmo da inauguração do Clube, seus fundadores já aspiravam naquele local uma ampla e diversificada estrutura de lazer. Este desejo pode ser evidenciado através de um projeto de ampliação, em 1976, de autoria do arquiteto sergipano Francisco de Assis Couto dos Reis que se estabeleceu em Salvador e pertenceu a classe de arquitetos da segunda geração do modernismo, que rompem com os paradigmas do estilo internacional na busca de valores ambientais e culturais (NERY, 2002, p.209). O projeto destinava-se ao atendimento de 2.000 sócios titulares com expansão prevista para 5.000. O conjunto seria implantado sobre uma plataforma de concreto pré-moldado apoiada através de estacas da mesma maneira a qual o projeto original se estruturou. Os blocos geométricos propostos pelo arquiteto se distribuem racionalmente em torno da ampla enseada que tomam conta de uma grande área marítima e contrastam com a leveza das curvas do projeto original das arquitetas Zélia Maia Nobre e Edy Marrêta. Nestes blocos, se localizam auditório, instalações de guarda e manutenção de barcos, salão de festas, restaurante, ginásio coberto voltado para a piscina semiolímpica seguida da piscina recreativa com playground. O conjunto apresenta uma área construída de 7.385 m2 sem nunca ter sido edificado.

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1.7.2 WELLNESS CENTER CLUBE DO BRASIL (2007): Este projeto foi realizado após os imbróglios jurídicos responsáveis pela iminente decadência do Clube que resultou no fim de suas atividades em 2005. Diante disso, os sócios buscavam alternativas para recompor a sua antiga glória firmando uma parceria com a empresa Wellness Center Clube do Brasil através de um termo de ajustamento de conduta proposto pelo Ministério Público Federal. O termo se sustentava em algumas considerações, entre elas o fato da propriedade em plataforma oceânica, na época, ainda estar em posse do Clube e a necessidade de reformas para a recuperação socioambiental do antigo complexo náutico na prerrogativa de zelar pelo patrimônio público. Desta forma, os compromitentes do referido termo, se responsabilizariam pela a limpeza dos resíduos e destroços de construção localizados no entorno do Clube, além da recuperação das colunas de sustentação e instalação de caixas de tratamento de esgoto conectando esta à rede pública já existente. O projeto29 proposto pela empresa, do qual não foi possível ter acesso, compreendia em linhas gerais a um restaurante/bar, lojas de souvenir, SPA e toda a infraestrutura necessária para o funcionamento deste, sendo responsabilidade dos empresários os cuidados ambientais no entorno do Clube, através da manutenção e plantio de vegetação específica. O termo ainda incluía em uma das cláusulas um subjetivo tópico quanto ao impacto visual e paisagístico da futura construção, não ficando claro de quem seria a responsabilidade no aferimento da mesma. Por fim, o termo previa a aplicação de multa no descumprimento de qualquer uma das obrigações previstas pelo mesmo. Em entrevista realizada pelo autor a SPU – Secretaria do Patrimônio da União - o superintendente substituto, Mário Gama, afirmou que a realização deste termo pelo MPF não contou com a participação do órgão, proprietário da área em questão, e consequentemente não seria legal a realização da mesma. A secretaria então, interviu e impossibilitou a realização das obras propostas pela a empresa30.

É desconhecido pelo autor a existência de desenhos técnicos ou imagens ilustrativas do projeto proposto pela empresta compromitente. 30 Informações obtidas em entrevista realizada em Janeiro de 2016. 29

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1.7.3 OCEANÁRIO (2007): Em 2007 surge uma outra proposta para a área que se desenvolve em torno do uso como oceanário. O projeto foi uma iniciativa da Petrobras por intermédio da OPA - Organização para a Proteção Ambiental que, através da SEMPLA - Secretária Municipal de Planejamento, elaborou uma proposta em nível de anteprojeto. O projeto de autoria dos arquitetos Tiago Angeli e Hanah Melo, começou a ser desenvolvido em 2006 visando incrementar o turismo local e subsidiar ações preservacionistas e sociais. A área escolhida para a implantação do empreendimento é a área onde está localizado o Alagoas Iate Clube (Alagoinha) na praia da Ponta Verde, hoje em processo de desapropiação, tanto pela sua localização estratégica de interação com o mar como pela facilidade e barateamento de sua operacionalidade, pela disponibilização de área necessária já estruturada, pela facilidade de acesso de moradores e turistas, pela proximidade da maioria dos hotéis, pelo apelo turístico e pelo caráter histórico e cultural que representa para cidade e para o estado.31

O complexo se restringia à área já ocupada pelo antigo clube, sem acréscimo ou alteração das características físicas do píer. O acesso pela orla seria através do estacionamento proposto pelo projeto de reurbanização que estava em execução na mesma época. Como primeiro elemento logo após a ponte, localizar-se-ia o Oceanário, em formato de um caracol, conduzindo o visitante à apreciação dos aquários dispostos em formato de labirinto até chegar ao maior deles, atração principal do complexo. Além disso, neste trecho, o projeto disporia de museu náutico e paleontológico, cinema 360o e mirante, este, contornando toda a forma externa do prédio e possibilitando uma visão geral de toda a orla. O revestimento desse prédio seria feito por elementos soltos da fachada em forma de brises inclinados, inspirados na idéia dos currais de peixes, técnica utilizada por nossos pescadores, segundo os idealizadores do projeto. Na segunda plataforma, haveria uma grande piscina de água salgada servindo de tanque para os animais, onde seriam ministradas aulas práticas com a possibilidade de interação com os visitantes. Neste mesmo bloco iriam se situar o pátio e arquibancada para aulas, os banheiros e um espaço para informações turísticas e compra de souvenires. Na descrição do projeto a justificativa para as escolhas dos materiais e revestimentos de alguns dos espaços do oceanário seria a da padronização junto ao projeto de reurbanização da orla. Destes espaços, apenas o mirante teria acesso público sendo as outras áreas acessíveis através de ingressos pagos. O projeto orçado em 3.5 milhões de reais não será executado. 31

Trecho retirado da apresentação do projeto.

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38 - Layout Oceanário, prédio principal - Térreo. 1- Acesso ao público 2- Acesso mirante 3- Museu 4- Manutenção tanques 5- Aquários 6- Oceanário 7- Terrário 8- Aquário Marinho 9- Acesso 1o Pav. 10- Laboratório 11- Quarentena 12- Cozinha 13- W.C 14- Despensa 15- Apoio

39 - Layout Oceanário, prédio principal - 1o Pavimento 1- Cinema 3D 2- Acesso 3- Administração 4- Apto. biólogo 5- Acesso mirante

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40 - Layout Oceanário, prédio anexo - Térreo. 1- Acesso ao público 2- Bilheteria 3- Mirante 4- Passeio 5- Praça 6- Tanque 7- Tanque de toque 8- Pátio

41 - Layout Oceanário, prédio anexo - Subsolo. 1- Loja 2- Lanchonete 3- Tanque 4- Salão submerso 5- W.C 6- Casa de máquinas 7- Fraldário 8- Depósito 9- Rampa acesso

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42-43 - Perspectivas do Oceanário. 44 - Perspectiva Centro Gastronômico, apesar da resolução baixa é possível perceber o formato de bloco proposto onde, possivelmente, seriam as salas de aula. Além disso, nota-se um píer localizado no segundo quadrante da construção.

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1.7.4 CENTRO GASTRÔNOMICO (2008): Uma outra alternativa de uso foi apresentada em 2008 onde, segundo a documentação consultada, teria o objetivo de criar uma "identidade cultural" da culinária alagoana e fortalecer a ideia do Estado como roteiro turístico gastronômico. Diante disso, foi determinado pelo governador da época, Teotônio Vilela Filho, a desapropriação do Alagoinha. De acordo com o Diário Oficial do Estado publicado em Dezembro de 2008, o imóvel seria destinado à implantação do Centro de Gastronomia Alagoana e Escola Náutica Integrada com Piscinas Naturais da Orla da Ponta Verde-Pajuçara. Segundo materia jornalística32, o centro gastronômico seria administrado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC/AL e buscaria oferecer para o segmento do turismo, cursos profissionalizantes voltados à capacitação técnica. O projeto apresentado ao Governo de Alagoas propunha-se a formar 1260 profissionais por ano e previa ainda a instalação de uma escola de esportes náuticos com píer, balsa de apoio às piscinas naturais e a construção de um salão com 80 mesas e 10 salas de aula, além de quatro laboratórios. A execução da obra, orçada em R$ 3,8 milhões, deveria levar um ano para conclusão sendo uma das principais razões a qual o clube entrou em processo de degradação. Com o andamento do processo de desapropriação, o Alagoinha ficou abandonado, tornando-se alvo de depredações por vândalos e usuários de drogas. Centro gastronômico será implantado, Alagoas 24 horas, 5 de Março de 2009. Disponível em: <http://www.alagoas24horas.com.br/687004/centro-gastronomico-sera-implantado/>. Acesso em: 9 fev. 2016. 32

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45-46 - Perspectivas do Marco Referencial.

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1.7.5 MARCO REFERENCIAL DE MACEIÓ (2011): Após diversos projetos especulados para a área do antigo Alagoinha, foi anunciado em Agosto de 2011 a proposta do então Marco Referencial de Maceió. O projeto foi apresentado sob a premissa de se tornar um novo ícone da capital. A proposta previa sua construção em ambas as plataformas que compusera o Alagoas Iate Clube, mantendo a diferença de cota entre estas. Todavia, o novo projeto elevava consideravelmente a antiga área construída do clube. Analisando os desenhos técnicos divulgados pelos autores do projeto, Marco Vieira e Ovidio Pascual, na primeira plataforma, local onde se encontrava o antigo prédio principal, foi proposta uma área coberta delimitada por uma marquise sinuosa, onde haveria um palco para possíveis apresentações e manifestações culturais e folclóricas. Na área descoberta, barracas e mesas com guarda-sóis viabilizariam um espaço para a comercialização de comidas. Esta plataforma ainda abrigaria área administrativa, bilheteria, banheiros e camarins. Na segunda plataforma, pertencente à primeira ampliação do clube, as piscinas dariam lugar à principal construção do marco referencial. No local, seria montada um estrutura de aço, com formato de velas, que se estenderia a uma altura de 30 a 40 metros chegando a um mirante cujo acesso se daria através de um elevador panorâmico. Segundo reportagens33 da época, o desenho em formato de velas, foi criado como forma de inserir a edificação na paisagem marítima, já que a água é um dos símbolos do estado. Ainda segundo os criadores da proposta, esses elementos seriam construídos com materiais refletores e transparentes para que pudessem espelhar e dar permeabilidade visual ao azul do céu e do mar. Além disso, neste espaço se localizariam um museu fotográfico, biblioteca virtual, salão para exposições e um aquário. A SEINFRA34 - Secretaria de Estado da Infraestrutura, o complexo seria uma “obra sustentável”, pois iria produzir energia própria (eólica e solar), com reutilização de água da chuva e tratamento de efluentes. No entanto, não foi possível localizar nas poucas imagens divulgadas pelos responsáveis, nenhum detalhe ou desenho que demonstrasse esta qualidade do projeto. Em relação aos desenhos e perspectivas expostas na época, estas, apresentam variações em relação à escala dos elementos que dificultam a compreensão do projeto, além do que, a falta de contexto urbano nas perspectivas impossibilita a compreensão da inserção desta obra na paisagem da cidade. Antigo Alagoinha vai virar marco referencial para o turismo de Alagoas, Espalhai, 19 de Agosto de 2011. Disponível em: <http://www.espalhai.com.br/2011/08/antigo-alagoinhas-vai-virar-marcoreferencial-para-o-turismo-de-alagoas/>. Acesso em: 12 fev. 2016. 34 Secretária do Estado e da Infraestrutura 33

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47-48 - Perspectivas do Marco Referencial. 49 - Outdoor posto em frente as ruĂ­nas do antigo clube. 50 - Perspectiva interna do Marco Referencial.

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Com previsão de começar as obras em 2013, o projeto do Marco Referencial dividiu opiniões entre gestores do estado, do município e entre a população em geral, uma vez que o projeto nasceu pronto, não houve discussão pública nem concurso aberto aos arquitetos, gerando uma série de discussões quanto à efetividade da obra. Entre as discussões, destacam-se os materiais escolhidos para compor o edifício que, localizado sobre o mar e consequentemente exposto às intempéries, exigiria frequente manutenção. Além disso, a escala em altura do conjunto, elevador mais a estrutura em formato de velas, ultrapassaria o gabarito exigido pelo código de edificações e o fato de se encontrar isolado em terreno subaquático agravava esta situação. [...]A impressão é que a nova construção ficará apertada sobre o terreno, pois a distância frontal entre a areia e a construção no mar não é a ideal para poder iniciar uma subida tão estendida. O espaço existente parece não comportar a dimensão da proposta arquitetônica do centro de turismo, pois é preciso amplitude para erguer estruturas verticais que tem a pretensão marcar visualmente uma paisagem, senão a arquitetura torna-se uma barreira visual, um bloqueio à sua própria contemplação, assim como da paisagem. (ESTANILAU, 2014, p. 83).

Segundo o Relatório de Avaliação Ambiental (RAA)35 do Marco Referencial de Maceió, pode-se identificar outros problemas na proposta do complexo turístico tais como a localização inadequada de um píer disposto em área sensível do ecossistema recifal. Constatou-se também que as pontes de acesso ao complexo possuía forma inadequada, pois, dificultaria a passagem de pedestres entre os dois lados ao longo da linha da praia, entre as praias da Ponta Vede e Pajuçara. Por fim, a altura elevada da estrutura do mirante provocaria danos através do sombreamento do meio biótico marinho. Apesar de todo o movimento, as obras do complexo foram iniciadas, através da polêmica retirada das estruturas do antigo Alagoinha, desprezando meio século de história do clube que marcou o panorama das orlas da Ponta Verde e Pajuçara. A obra posteriormente foi embargada pelo Patrimônio da União sob alegação de que o Estado não possuía a cessão das áreas compreendidas pelo chamado, espelho d'água e faixa de areia36. O projeto orçado em 17 milhões de reais seria custeado, em grande parte, pelo Ministério da Integração Nacional. Ao final, foi reprovado pelo Governo Federal porque exigia escavações.

Apresentado em Maio 2013. Empreendedor: Secretaria de Estado da infraestrutura (SEINFRA). Estudo Ambiental realizado pela ProSiga Gestão Ambiental. 36 Obra para construção do Marco Referencial é embargada pela União, Alagoas 24 horas, 11 de Julho de 2014. Disponível em: <http://www.alagoas24horas.com.br/434719/obra-para-construcaodo-marco-referencial-e-embargada-pela-uniao/>. Acesso em: 12 fev. 2016. 35

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51 - Perspectiva geral do Marco Referencial. 52 - Concha acústica com fomarto que bloqueia de boa parte da vista do mar. 53 - Praça de Alimentação. 54-55 - Detalhes do acesso à edificação.

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1.7.6 MARCO REFERENCIAL DE MACEIÓ (2016): Após o embargo da proposta que consistia em uma torre mirante, o governo do estado anuncia, em dezembro de 2016, a construção do novo marco referencial de Maceió. A proposta seria o resultado de adaptações do primeiro projeto anunciado em 2011 e será executado em duas etapas. A primeira fase, que já possuí a ordem de serviço assinada, foi orçada em R$ 9.3 milhões e supostamente irá contar com praça de alimentação e eventos, concha acústica, espaço cultural climatizado, geração de energia solar, segurança e dois mirantes com vista para o mar37. Para a segunda etapa, restaria a construção da torre panorâmica e as velas em estrutura de aço inoxidável e vidro. O projeto foi divulgado apenas através de perspectivas que dificultam e omitem a compreensão do que será erguido no local, no entanto, analisando as imagens divulgadas é possível localizar a praça de alimentação e concha acústica no primeiro quadrante da edificação e possivelmente no segundo, o espaço cultural climatizado. Não é possível identificar o espaço reservado para a geração de energia solar nem em que área do projeto o arquiteto especifica como mirante. A proposta intitulada como marco referencial de Maceió desconsidera a paisagem do local, pois, falta integração com o seu entorno. Apesar da construção estar localizada sobre o mar, o projeto é voltado para a cidade, uma vez que as áreas edificadas tomam conta de boa parte do perímetro do terreno enfraquecendo a principal peculiaridade do local, a vista do mar. Além disso, o acesso previsto ao marco referencial será através de uma ponte cuja forma se assimila com o da proposta anterior, criticado no Relatório de Avaliação Ambiental por dificultar a circulação de pessoas entre os dois lados ao longo da linha de praia. Por fim, a falta de imagens e plantas arquitetônicas impossibilitam a compreensão de como e onde será implantada a segunda etapa do projeto, composto pela torre mirante da qual as implicações foram discutidas no subcapítulo anterior.

Marco Referencial de Maceió terá capacidade para 1.500 pessoas, Agência Alagoas, 19 de Dezembro de 2016. Disponível em: <http://www.agenciaalagoas.al.gov.br/noticia/item/12668marco-referencial-de-maceio-tera-capacidade-para-1-500-pessoas>. Acesso em: 15 jan. 2017.

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1.8 - CONJUGAÇÕES 1.8.1 PRETÉRITOS Sob a premissa de que cabe aos arquitetos e urbanistas a compreensão da paisagem no ato de pensar e projetar a cidade e as edificações nela inseridas (VERAS, 2014, p.13), este capítulo buscou desenvolver uma análise teórica sobre o processo da gênese da paisagem ao qual o clube edificou-se. Sendo assim, foram investigados as características e os elementos que, junto ao Alagoas Iate Clube, transformaram ao longo dos anos o espaço indefinido em um conjunto de lugares referenciais constituintes de uma paisagem emblemática, fornecendo unidade e identidade a Maceió. Nos estudos relacionados à filosofia da paisagem, múltiplos autores a colocam como produto de uma experiência emocional da contemplação, da visão que recorta da natureza o território da vida do homem, sendo assim, uma operação cultural processada pela vivência de quem a constrói no curso da história (VERAS, 2014, p.81). Desta forma, considerando a paisagem um fenômeno vivido (CABRAL, 2000), se faz necessário pesquisar a gênese destes lugares, buscando uma melhor compreensão da formação paisagística do trecho de orla ao qual o Alagoas Iate Clube se incorporou, para que seja possível conceber uma proposta arquitetônica que respeite o seu valor enquanto marco da cidade. O surgimento da noção de paisagem, vincula-se a uma maneira de ver e conceber o mundo, de compô-lo em uma cena. Segundo diversos autores, este surgimento se deu através de manifestações empíricas e artísticas, sendo no Oriente a partir do século IV e no Ocidente a partir do século XIV. Segundo Berque (1994, apud VERAS, 2014), enquanto que a paisagem nasceu, no Ocidente, de uma cisão com o espírito religioso, no Oriente a paisagem se enraíza na religião e na moral. As primeiras representações de paisagem do Ocidente surgem através de narrações que descreviam o cenário ao qual o autor se localizava e pinturas desvinculadas de temas religiosos onde as paisagens deixam de ser plano de fundo. Estas formas de apreensão da natureza, sem submissão de regras, livre para a contemplação ilustram a transgressão constitutiva da modernidade em relação à Idade Média (BESSE, 2006 apud VERAS, 2014, p.83). Segundo Simmel (2009 apud VERAS, Ibid. p.75) quando sobre as propriedades intrínsecas da natureza se introduz uma ação e um pensamento, está-se produzindo, por um fluxo exterior, a paisagem, expressão finita da infinitude da natureza.

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Quando um mero contemplador diante de uma massa variável e distinta de elementos da natureza seleciona um determinado recorte da natureza [...] aí onde nós, contempladores sem pretensões artísticas ao nível poético da obra, vemos uma paisagem, não é mais um agregado de objetos naturais, temos uma obra de arte in statu nascendi. (SIMMEL, 1913 apud ROBERTO, 2007, p.71).

A paisagem, então, feita de coisas e de pessoas, não reside apenas no objeto, nem tão somente no sujeito, mas da interação complexa entre eles, em diversas escalas de tempo e de espaço. (BERQUE, 1994 apud VERAS, Ibid. p.101). A paisagem é um fenômeno que coloca no espaço uma história singular. Neste espaço, todas as escalas de tempo se manifestam espacialmente no presente, do passado geológico mais remoto (por exemplo as rochas précambrianas que afloram nas margens do lago) aos eventos mais recentes (por exemplo a chuva que cai neste momento). Este espaço-temporalidade da paisagem é trajetiva. Nela se unem a história inscrita no ambiente, por um lado, e, por outro lado, a memória inscrita em nós mesmos. (BERQUE, 1996 apud MARIA, 2010, p. 70).

Nesta relação entre pessoas, coisas e tempos sobrepostos, as transformações inerentes da continuidade da vida humana e da natureza, revelam na paisagem as permanências que identificam lugares. Porém, não são apenas de marcas visíveis que se constituem paisagens, mas também de marcas invisíveis, como as histórias de vida do cotidiano, que trazem o sentido de paisagem como lugar apropriado (VERAS, Ibid. p.79). De acordo com esta mesma autora, não é por acaso que paisagens que revelam este pacto entre seus elementos - natureza e memórias sobrepostas - e são interpretadas no olhar sensível de quem as percebe, são reproduzidas sob a forma de cartões postais, eternizando a estrutura visível apreendida pelo olhar. Segundo MENESES (2002, p.15-16 apud CAMPELLO, 2009, p.8) o cartão postal foi “um catalisador poderoso dos marcos paisagísticos”, pois, foram nestes pequenos recortes de paisagem que a imagem da cidade difundiu-se. Durante o fim do século XIX e primeiras décadas de XX, esta forma de comunicação possibilitava de maneira objetiva mostrar por quais lugares se tinha passado e principalmente, compartilhar das belezas das paisagens visitadas. Imagens e palavras se complementavam para tornar mais rica, acessível e rápida a comunicação (VERAS, Ibid. p.120). Segundo VASQUEZ (2002, apud VERAS, Id. Ibid.) o fotógrafo de cartões-postais buscava revelar o olhar da multidão, abstraindo-se de suas visões pessoais. Neste contexto, se o cartão-postal congela no segundo da fotografia aquilo que foi capturado pelo olhar sensível da multidão, a paisagem que foi registrada revela, para além da imagem do segundo capturado, a apropriação dos lugares em camadas de tempo sobrepostas (VERAS, Ibid. p.24). 56


Na hipótese de que existem paisagens que identificam cidades, ao exemplo do Corcovado no Rio de Janeiro e de vários outros casos emblemáticos, apreender o trecho de orla da Ponta Verde e Pajuçara como tal, é reconhecê-la como resultado de inúmeras experiências, individuais e coletivas, que ao longo do tempo e em meio as suas transformações fizeram deste cenário, um trecho identificatório da cidade.

Ao pesquisar sobre a cidade de Maceió em sites de buscas e através de outras fontes na internet, a imagem que aparece com maior recorrência refere-se justamente ao trecho entre as orlas da Ponta Verde e da Pajuçara. Portanto, se há um trecho geográfico que habita o imaginário de turistas e de boa parte dos moradores é exatamente o trecho da orla onde encontrase o Alagoinhas. (ESTANILAU, 2014, p. 56).

Existem, possivelmente, inúmeros exemplos de manifestações que contextualizam e dão vida a paisagem do trecho de orla onde o Alagoinha se instalou. Neste trabalho, porém, serão apresentados apenas alguns exemplos, de diferentes épocas que irão facilitar a compreensão da formação paisagística deste trecho de orla. Um destes exemplos, pode ser encontrado neste relato do arquiteto e urbanista Lúcio Costa (1902-1998) que ao bordo do "Bahia" descrevia, em setembro de 1926, sua experiência de paisagem na praia da "Ponta da Terra", hoje, bairro da Ponta Verde. ...Felizmente tomei um bonde que me levou para fora – “Ponta da Terra”, chamam o lugar. Gostei, gostei muito mesmo. Deu-me a perfeita impressão dessas cenas de naufrágio, de ilha deserta, de que os filmes americanos tanto gostam. Algumas casinholas de terra batida e cobertas de sapé, redes, gente sonolenta. E uma praia, mas uma praia diferente de todas as outras praias. Muito plana, muito larga, cheia de coqueiros, desses coqueiros sinuosos, esguios, que balançam e cantam com o vento. E o mar muito calmo, sem arrebentação, sem ondas. Muito calmo e muito verde, um verde lindo, verde esmeralda, ora mais claro, ora mais escuro, com manchas azuladas de recifes à flor d’água. Perto, ancorado, um veleiro de três mastros. E longe, bem longe, as jangadas que deslizam, leves, com as velas em triângulo, muito brancas, cheias de vento. Velas que brilham, velas de porcelana. E uma viração suave, um céu azul e um sol resplandecente. Paisagem de ilha abandonada, apesar dos pescadores e das velas, calma, sonolenta. Paisagem de aquarela. (COSTA, 1997)

O arquiteto então, através de sua experiência sensorial, interpreta e descreve detalhadamente a sua paisagem, da mesma forma que já havia sido feito pioneiramente no início do século XIV, nas primeiras manifestações de paisagem no ocidente. Na medida em que são experienciadas diretamente como atributos do mundo-vivido, paisagens, assim como espaços e lugares, constituem as bases fenomenológicas da realidade geográfica e representam sentido dos nossos envolvimentos com o mundo (CABRAL, 2000, p.40).

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No estudo dos conceitos das palavras "Espaço" e "Lugar", existem diversos textos que teorizaram a temática das mesmas. Em REIS-ALVES (2007) entendese como relação entre os dois conceitos que o lugar é o espaço ocupado, ou seja, habitado, já TUAN (1983) discursa que o significado de espaço se funde com o de lugar, pois, um espaço indiferenciado tranforma-se em lugar à medida que o conhecemos melhor e o dotamos de valor, adquirindo definição e significado. Sendo assim, a paisagem revelada por Lúcio Costa, indica características de um lugar bucólico, marcado pela presença dos poucos pescadores que em suas “casinholas de terra batida” constituem possivelmente a primeira transformação do espaço em lugar, compondo o primeiro momento da paisagem em estudo. Segundo historiadores, apesar do desenvolvimento da cidade38 ter sido iniciado na metade do século 19, foi apenas durante os anos de 1920 que este espaço começou a ser habitado. De acordo com relatos de moradores, a Pajuçara era refúgio de pescadores que jogavam suas redes ao mar ou embarcavam em suas jangadas, deixando a terra e desaparecendo no horizonte em busca do pescado para o sustento de suas famílias. A praia, quase desabitada, era frequentada pelas poucas famílias que ali residiam. Na beira mar se encontravam as velhas jangadas dos pescadores que no dia-a-dia de seus afazeres, rolavam os grossos troncos de coqueiros para levar suas embarcações até as ondas do mar. Além disso, as embarcações deterioradas tinham suas enormes fendas consertadas na praia e muitas vezes já irreparáveis, ali mesmo pereciam. Grande parte do bairro da Pajuçara tinham proprietários foreiros39, no qual os terrenos pertenciam a duas famílias, Aguiar e Campos Teixera, que hoje dão nome a diversas ruas do bairro. Segundo CRAVEIRO (1939), o atual bairro da Ponta Verde correspondia a área do bairro da Ponta da Terra, também inicialmente habitado por pescadores. Estes, dispersados do bairro da Pajuçara devido ao repentino interesse dos mais afortunados em construir casas de veraneio naquela região, construíram suas choupanas cobertas com palhas de coqueiros no desértico sitío Ponta Verde. A Ponta Verde era completamente desabitada, com algumas choupanas de pescadores que diariamente na vazante da maré, despescavam os grandes currais de peixes que ocupavam grande área marítima. Ainda hoje existem alguns desses currais naquela área da Ponta Verde. Os trepadores de coqueiros também habitavam no sitio da Ponta Verde, servindo ao proprietário Álvaro Otacílio que mantinha, ainda do tempo do velho Chico Zú, as mesmas tradições de vacaria e posteriormente com o fabrico da Cal extraída das pedras calcárias do mar da Jatiúca40. A então vila é elevada à condição de cidade, sede e capital com a denominação de Maceió, pela lei ou resolução provincial nº 11, de 09/12/1839. 39 Titular de um ampla fatia da propriedade. Este detém praticamente todos os direitos inerentes à propriedade, devendo pagar ao proprietário uma taxa anual, denominada "Foro" 40 Relatos escritos pelo fundador do Alagoinha e morador da região na época, Paulo Nunes Costa. 38

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56-57 - Paisagens eternizadas nas pinturas do mestre Zumba.

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Com a presença dos pescadores na região, o então espaço inabitado iniciou sua mutação, pois, o lugar é mais do que uma localização geográfica, é a concreta manifestação do habitar humano (NORBERG-SCHULZ apud REIS-ALVES). Deste modo, com a presença dos pescadores, as jangadas, choupanas e os currais são as primeiras intervenções da paisagem, adicionados em consequências do habitar humano e que até os dias de hoje, alguns destes, ainda se encontram marcantes na paisagem atual. Estes cenários descritos por Lúcio Costa e Paulo Costa, fundador do clube, assimilam com algumas das pinturas feitas pelo alagoano, José Zumba (19201996), artista plástico que deixou suas impressões em telas que retratam figuras humanas, predominantemente negras, paisagens, manifestações culturais, festas e costumes populares de Alagoas41. Os panoramas eternizados nas obras deste, retratam a relação íntima que se estabelece entre o mundo interior do artísta com o mundo exterior a qual ele interpretou e representou em forma de paisagem. Suas pinturas têm o valor de registro de época, fixando símbolos que ficaram na memória histórica do estado como o coqueiro Gogó da Ema, as jangadas, os coqueirais e praias em cenários reais e outros imaginados pelo mestre Zumba. Durante o início dos anos 20, um segundo elemento marcante iria compor a paisagem desta região, o Farol da Ponta Verde, construção em forma cilíndrica de alvenaria com faixas horizontais vermelhas e brancas sobre pilares em forma de troncos piramidais de concreto armado. Sua construção data de 1922, porém sua configuração atual se deu apenas na década de 4042. Segundo relatos, as colunas que o circundam foram construídas por uma empresa inglesa de petróleo, no fim desta mesma década. Os ingleses permaneceram na área perfurando um poço por aproximadamente um ano. Com o abandono do trabalho, as pilastras de concreto ficaram sobre os corais sem nenhuma utilidade. Ainda durante os anos 40, um navio encalhou nos arrecifes da Ponta Verde por falta de uma sinalização adequada e após várias tentativas para desencalhar, este jogou toda sua carga no mar. Por mais de um mês as praias de Pajuçara e Ponta Verde viveram uma verdadeira festa, dia e noite, com a multidão levando o que fosse possível, até em carroças servindo de transporte para dar vazão a quantidade de mercadorias como taboas, caixotes de batata inglesa, farinha de trigo, velas, barricas de chá mate, rolos de cabos de vassoura e um grande número diversificado de madeiras de lei e tantas outras mercadorias.43

Sarau Mestre Zumba, UFAL, 11 de Setembro de 2013. Disponível em: <http://www.ufal.edu.br/ noticias/2013/09/sarau-mestre-zumba-sera-realizado-proximo-dia-18>. Acesso em: 05 Mar. 2016. 42 Farol da Ponta Verde, Capitania dos Portos. Disponível em: <https://www1.mar.mil.br/cpal/farol_ ponta_verde>. Acesso em: 10 Mar. 2016. 43 Relatos extraídos de crônicas escritas pelo então fundador do Alagoinha e morador da região na época, Paulo Nunes Costa, cedidos pelo filho, Paulo Sérgio Nunes em entrevista. 41

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58 - Orla da Ponta Verde, anos 60. 59 - Farol da Ponta Verde. 60 - Sete Coqueiros, orla da Pajuรงara nos anos 70. 61 - Orla da Ponta Verde, 2016.

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Desta forma, no final dos anos 40 é inaugurado o Farol da Ponta Verde, no seu conhecido formato. Hoje é frequentemente visitado por moradores e turistas durante a seca das marés, incorporando um dos cenários mais conhecidos da cidade. Vale recordar que nesta mesma época e nesta mesma região, a cidade já possuía o Gogó da Ema como um marco referencial sendo inclusive construída em 1948 uma praça mirante no local44 para as pessoas que o visitava. Um fato inusitado é que de acordo com a crença de alguns, as perfurações em busca de petróleo nas proximidades do Gogó da Ema, onde posteriormente foi construído o Farol da Ponta Verde, foi um dos fatores responsáveis pela queda do coqueiro em 1955. Além do Gogó da Ema, existiu também um grupo de palmáceas conhecido como Sete Coqueiros. O local que hoje serve como ponto de referência da Pajuçara, era ponto de encontro de jovens da época, tornando-se posteriormente, um dos cartões postais da cidade. Estes coqueiros icônicos, apesar de não marcarem mais a paisagem da cidade, ainda habitam a memória de parte da população que os reconhecem como marcos e, portanto, responsáveis pela construção do lugar, tendo em vista que lugar é um espaço qualificado, isto é, um espaço que se torna percebido pela população por conter significados profundos, representados por imagens referenciais fortes. Além disto, segundo Veras (Ibid. p.68) ser cartão postal não se relaciona apenas à estética da forma e da harmonia entre partes e todo, mas à paisagem da memória e das recordações, aquela em que o sujeito se constitui, como parte e condição de sua existência. Estes atributos da cidade revelados nos cartões-postais “não está na própria natureza, ela é instituída por uma certa forma de ver e de dizer as coisas” (BERQUE, 2011 apud VERAS, Ibid. p.40), o que A queda do Gogó da Ema, História de Alagoas, 7 de Maio de 2015. Disponível em: <http://www. historiadealagoas.com.br/gogo-da-ema.html>. Acesso em: 6 mar. 2016. 44

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62 - Cartão postal, Gogó da ema. Destaca-se o mirante construído aos pés do coqueiro e os currais ao fundo. 63 - Praça Mirante Gogó da Ema.

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implica no reconhecimento da relação subjetiva entre coisas e pessoas, o material e o imaterial, constituintes da paisagem. Portanto, estes coqueiros ainda que não mais existentes45, desempenham um papel fundamental na apreensão deste trecho de orla como paisagem característica da cidade, pois são parte da cultura de uma sociedade que estabeleceu relações com e no território (VERAS, Ibid. p.44). Ao mesmo tempo em que revela saudade desencadeada pela memória despertada pela imagem fotográfica de paisagens já transformadas, também revela, em meio às transformações, paisagens que permaneceram e se cristalizaram não mais como cartão-postal, mas como paisagem concreta, além da materialidade do papel cartão. A permanência se dá, então, quando extrapola a sua missão primitiva, a comunicação, e ganha novo argumento, a consolidação do imaginário. (VERAS, Ibid. p.122).

A paisagem é a protagonista da fotografia desde a sua invenção na metade do século XIX e com ela, surge a possibilidade de retratar cenários como se apresentam na realidade. Posteriormente, o cartão-postal torna-se o suporte que vai permitir a circulação desta paisagem captada e, portanto, ao acesso de um grande número de pessoas. Despojados inicialmente de mensagem e endereço, apenas no final de 1890 aparecem os ilustrados. Ao pedaço de papel-cartão com textos, associam-se imagens de múltiplos assuntos, como; eventos comemorativos, propagandas políticas, edificações e paisagens, sendo esta última a mais popular. “Tanto no imaginário popular quanto no mercado editorial, o uso mais nobre, tradicional e requisitado do cartão-postal é a veiculação de paisagens fotográficas” (VASQUEZ, 2002, apud VERAS, Ibid. p.120). Neste conjunto de imagens e palavras, evidenciou-se os lugares que, elegidos por uma maioria, revelavam os símbolos identificatórios de uma cidade, como visto na imagem 62. Na paisagem retratada neste cartão-postal, tem em destaque o icônico Gogó da Ema, considerado um dos primeiros da cidade, podese também observar o antigo mirante e ao fundo, a praia marcada pelos currais da região. No verso deste cartão, encontram-se os seguintes dizeres; Fiquei assustado quando disseram-me que o melhor de Maceió era eu tomar a sôpa46 do Gogó da Ema. Depois soube que sôpa é ônibus e Gogó da Ema, é este original coqueiro. O passeio é, de fato, bonito.

Atualmente existem um novo grupo de coqueiros, plantados no mesmo local onde se encontravam os originais que formavam o lugar conhecido como Sete Coqueiros. 46 Designação genérica do transporte rodoviário coletivo da década de 30, em virtude do transporte ser rápido e bom. O caminhão adaptado, tinha sobre sua carroceria assentos paralelos, cada um com cinco lugares, sem portas e janelas de proteção, com capota, coberta, em madeira forrada com lona e estribos na lateral (semelhante aos bondes elétricos). 45

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64 - Orla da Ponta Verde e Pajuçara, 2016.

Mais tarde, em 1963, o Alagoinha é fundado em um lugar já conhecido por parte da população, uma vez que se situava próximo ao referido Gogó da Ema. Posteriormente, com a construção da sede nos arrecifes de corais em 1972, a edificação ratifica sua influência na paisagem, pois, com a sua localização privilegiada, a obra contrastava com o cenário até então de uma praia desértica. Apesar de se tratar de um clube privado, cujo acesso era restrito aos sócios contribuintes, a edificação se somava ao cenário natural, sendo percebida ao longo de todo o trecho de orla em questão. Além da localização privilegiada o clube era um exemplar de arquitetura moderna e como visto anteriormente, considerado um gesto vanguardista. Estas característica conferiram um maior valor imagético, proporcionando uma maior notoriedade ao clube. Segundo Norberg-Schulz (1980, p.19) para ganhar o suporte existencial o homem tem que ser capaz de orientar-se; ele tem que saber onde ele está.

O homem precisa ler o ambiente em que se insere em busca de referências e orientação, o que ajuda a construir uma percepção do usuário sobre o espaço. Um ambiente de fácil leitura é, então, um ambiente com boa legibilidade. Ou seja, facilmente diferenciável, singular. A leitura da imagem formada pelo usuário denuncia quão legível é esse espaço, bem como o grau da relação habitante-cidade, fator importante no uso desses espaços. (SCOCUGLIA et al, 2006)47.

SCOCUGLIA, Jovanka Baracuhy Cavalcanti; CHAVES, Carolina; LINS, Juliane. Percepção e memória da cidade:. O Ponto de Cem Réis. Arquitextos, São Paulo, Vitruvius, Jan. 2006. Disponível em: <http:// www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/06.068/393>. Acesso em: 13 Jan. 2016.

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Consequentemente, é possível que o Alagoas Iate Clube tenha passado a incorporar um papel fundamental de referência em parte da população da cidade, a partir da época em questão. Com a urbanização da orla da Ponta Verde e Pajuçara durante o início dos anos 70 e posteriormente com a consolidação destes bairros, o Alagoinha marcou o desenvolvimento desta região, testemunhando a concretização do lugar. Neste período, com as construções das avenidas e, posteriormente, das edificações, a paisagem de outrora é transformada, marcando o seu segundo momento, o da paisagem urbana. Segundo CAUQUELIN (2007, apud VERAS, Ibid. p.108) a paisagem urbana é a mais nitidamente paisagem, porque é uma construção mais marcada, culturalmente instituída, o que implica que, da teoria de Simmel sobre o "recorte do homem de uma natureza natural em paisagem", a urbana recortaria dessa paisagem um momento posterior. Sendo assim, pode-se relacionar a criação desta paisagem em ícone à uma vontade coletiva de uma parcela da população. Segundo SIMMEL (1988 apud BARTALINI, 2013, p.42) não há paisagem sem sujeito pois não haverá paisagem, se não houver quem a constitua. Sob esta ótica, o filósofo alemão Martin Heidegger teoriza no ensaio Construir Habitar Pensar (1951), a relação entre lugares e espaços como também o relacionamento entre homem e espaço. Segundo o autor, a referência do homem aos lugares e através dos lugares aos espaços repousa no habitar. Tendo em vista que habitar seria, em todo o caso, o fim que se impõe a todo construir, Heidegger então conclui que construir já é em si mesmo habitar. Para exemplificar em que medida construir pertence ao habitar o autor propõe a metáfora da ponte que transforma a paisagem, fornecendo um lugar que une as duas orlas do rio. Segundo este, "A ponte não se situa em lugar. É da própria ponte que surge um lugar." (2006, p.133). Espaço é algo espaçado, arrumado, liberado, num limite. [...] O limite não é onde uma coisa termina, mas, como os gregos reconheceram, de onde alguma coisa dá início à sua essência. [...] Espaço é, essencialmente, o fruto de um arrumação, de um espaçamento que foi deixado em seu limite. O espaçado é o que, a cada vez, se propicia e, com isso, se articula, ou seja, o que se reúne de forma integradora através de um lugar, ou seja, através de uma coisa do tipo da ponte. Por isso os espaços recebem sua essência dos lugares e não “do” espaço. (HEIDEGGER, 2006, p.134)

Parafraseando Martin Heidegger, podemos estabelecer que os elementos citados anteriormente são respostas do vigor essencial do habitar, estes converteram um espaço genérico em um lugar irrepetível e singular, propiciando estâncias e circunstâncias, designando um novo limite (essência) a uma paisagem construída através dos relatos poéticos, dos quadros dos artistas, nas lentes dos fotográfos ou em outros tipos de manifestações decorrentes do habitar.

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65 - Paisagem da Ponta Verde e Pajuçara, década de 50. 66 - Paisagem da Ponta Verde e Pajuçara, Década de 70. 67 - Paisagem da Ponta Verde e Pajuçara, 2016.

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68-70 - Presenรงa dos pescadores na paisagem.

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1.8.2 - PRESENTE Diante do conturbado processo histórico, o Alagoinha permanece sem futuro definido, com sua estrutura em processo ruína, não há mais resquícios dos tempos de glória da antiga agremiação. Por outro lado, há quase meio século na paisagem da cidade é preciso entender o significado do Alagoinha além de sua estrutura física e da sua história de clube. Pois, enquanto lugar de referência, marca uma das paisagens icônes da cidade, integrando a memória coletiva de um expressivo conjunto da população. Com isso, para promover propostas nesta área se faz necessário avaliar o tipo de relação que estes usuários estabelecem com este lugar, a memória e seus significados segundo as imagens e representações daqueles que circulam no lugar. Reconhecendo a relevância desses estudos e a complexidade das intervenções urbanísticas em áreas já consolidadas, mesmo que estas estejam em processo de degradação ou abandono, seria importante que antes da elaboração de uma proposta de intervenção fosse diagnosticado como esse espaço foi e está sendo, apreendido ou compreendido pelos usuários, pelos cidadãos. (SCOCUGLIA et al, 2006).

Como visto anteriormente, os bairros da Pajuçara e Ponta Verde foram inicialmente habitados por pescadores. Com o posterior interesse dos mais afortunados, esta área da cidade começa a ser urbanizada com a construção de casas, ruas, avenidas e da orla no início dos anos 70. Nos últimos anos, estes bairros vêm sofrendo uma grande especulação imobiliária e neste processo, diversas ruas são transformadas em avenidas e casas em edificações verticais, alterando então, este aspecto visual da cidade. Para HALBWACHS (1990, p.137), é inevitável que as transformações de uma cidade e a simples demolição de uma casa incomodem alguns indivíduos em seus hábitos, porém, segundo este, esses pesares individuais não têm efeito, pois não dizem respeito a uma coletividade. Para o autor, é apenas através de um grupo que as tradições permanecem, encontrando seu equilíbrio antigo sob novas condições. Isto talvez explique o fato deste trecho de orla, hoje urbanizado e local de apartamentos de luxo, seja também local de pescadores. É comum encontrar muitos destes na região perpetuando aquela paisagem de outrora, seja na busca do pescado que provém o seu sustento ou então nos passeios turísticos às piscinas naturais, este último, reflexo destas "novas condições" a qual um grupo se adaptou, pois, com a chegada dos hóteis na região, intensificou-se uma demanda turística.Com a construção do clube, este local da cidade tornou-se, possivelmente, ponto de referência para um grupo que ali habitava, pois, segundo HALBWACHS (Ibid. p.134) os habitantes de 70


71 - Praça Gogó da Ema, destaca-se a construção cuja forma remete ao antigo coqueiro.

uma cidade são levados a prestar maior atenção ao aspecto material desta, sendo sensíveis aos desaparecimentos de ruas, casas, enfim, elementos que influenciam as pessoas que a esses lugares se adaptaram. O autor explica que através do tempo, em contato com tais lugares, as vidas destes habitantes se confundem com as destas coisas, pois, diante das agitações sociais os aspectos das ruas e dos edifícios permanecem idênticos. A impassibilidade das coisas nos põe em equilíbrio, pois, apesar da evolução dos costumes sociais, a cidade, em seu aspecto exterior, muda mais lentamente e devido a isto, a memória coletiva tem seu ponto de apoio sobre as imagens espaciais (Ibid. p.136). Assim se explica que de edifícios demolidos, de caminhos desfeitos, deles sobrevivem por muito tempo alguns ves­ tígios materiais, nem que seja apenas o nome tradicional de uma rua, de um lugar, ou a tabuleta de uma loja: "pela antiga porta", "pela antiga porta de França" etc. (Id. Ibid.).

Este fato possivelmente explica a razão de apesar do clube não estar em funcionamento há mais de uma década, parte da população ainda utiliza o nome deste como referência na orla. Alagoinha pode significar tanto a edificação em si, quanto um lugar que extrapola os seus limites físicos. Isto comprova a vontade de um grupo que o manteve na história da cidade, pois, mesmo que o demolissem, é muito provável que aquela região continuasse a ser conhecida como Alagoinha. Convém ressaltar a existência de uma praça erguida em homenagem ao icônico Gogó da Ema, referido anteriormente e eternizado através de um monumento. Estas 71


manifestações comprovam as relações que a sociedade constrói com o espaço a qual habita, se mantendo para além de suas existências efetivas. Para SCOGUGLIA et al. (2006) a percepção mental apreendida pelo indivíduo, suas avaliações e preferências sobre o ambiente, de caráter subjetivo, mas também sociocultural, não representa toda a cidade, mas indivíduos que compartilham situações semelhantes no tempo e no espaço. Este compartilhamento de experiências, associa-se com o entendimento da memória como um fenômeno construído coletivamente e submetido a flutuações, transformações, mudanças constantes (HALBWACHS apud POLLAK, 1992, p.201). Se destacamos essa característica flutuante, mutável, da memória, tanto individual quanto coletiva, devemos lembrar também que na maioria das memórias existem marcos ou pontos relativamente invariantes, imutáveis. (Id. Ibid.).

Estas representações, sociais e imagéticas, que ocorreram durantes as décadas e destacadas neste trabalho, se vinculam à possibilidade de singularizar este ambiente urbano. Desta forma, destacando esta característica mutável das memórias, o Alagoinha possivelmente representa um dos marcos invariantes a qual um grupo adotou como lugar de referência. Vale ressaltar que este processo se mantém durante as gerações, pois, segundo Pollak, dentro da organização da memória existem os fenômenos de projeção e transferência, numa espécie de memória herdada por pertencimento a um grupo e que vão influenciar no sentimento de identidade, tanto individual como coletiva (POLLAK, Ibid. p.204). Em suma, segundo HALBWACHS (1990), a extinção desses lugares de memória em suas configurações espaciais, significaria a perda do apoio de uma tradição que ampara um grupo, a sua identidade. É inegável a popularidade da edificação na cidade. Muitos provavelmente nunca entraram no clube quando em funcionamento, uma vez que seu acesso era restrito aos sócios contribuintes. No entanto, devido à sua localização privilegiada, o clube se destaca na paisagem desde a construção de sua sede marítima, permitindo que as pessoas apreendam à distância aquela arquitetura na paisagem. Este aspecto visual, teoricamente, é a razão pelo qual o Alagoinha tenha sido escolhido como ponto referencial, pois é devido à sua força na extensão da paisagem que torna este lugar privado simultaneamente público48. Estas propriedades do Alagoinha nos permitem interpretar a situação atual desta edificação sob duas vertentes: a paisagística e a de lugar. Sendo assim, diante da análise destas qualidades, será possível construir fundamentos contextualizados, orientando uma proposta arquitetônica adequada com o caráter da paisagem e com as memórias do lugar. A paisagem tem sua significação modelada tanto pela memória coletiva quanto pela iniciativa individual tornando esta, lugar simultaneamente público e privado, a ser modelado pela atividade constituinte de um sujeito. (COLLOT, apud NEGREIROS, ALVES, LEMOS, 2012)

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1.8.2.1 PAISAGEM Para compreender melhor a atual situação da paisagem da qual o Alagoinha faz parte, foram utilizados os estudos realizados pela escola da Gestalt49. Estes trazem fundamentos que possivelmente auxiliarão o projeto de intervenção no clube, uma vez que os resultados de suas pesquisas aplicados no campo da estética, desenvolveram-se, sobretudo, na análise da percepção visual (FRACCAROLI, 1952, p.8). Em síntese, a teoria gestaltista afirma que não vemos partes isoladas, mas relações, isto é, uma parte na dependência de outra parte, sendo a nossa percepção o resultado de uma sensação global. Nos estudos sobre paisagem conduzidos neste trabalho, foi observado o processo a qual um indivíduo, diante de uma massa variável e distinta de elementos, recorta desta a sua paisagem. Segundo COLLOT (1990, apud CABRAL, 2000, p. 36) esta organização perceptiva não se limita ao material fornecido, pois cada objeto é percebido e interpretado em função de seu contexto, especialmente quando se trata de percepção de paisagem, que é sempre "visão de conjunto". Esta afirmativa, possivelmente, se relaciona aos estudos da Gestalt e reforçam a importância de utilizá-la na apreensão desta paisagem. Diante disso, no estudo desta edificação, enquanto elemento símbolo da paisagem, é preciso analisá-la ultrapassando a sua forma física, entendendo-a como um marco - não apenas por si só, mas também devido à relação que ele possui com os outros elementos integrantes da paisagem. Segundo os princípios da Gestalt, toda nossa atividade perceptiva se subordina a um fator básico designado pregnância. Para esta teoria, uma imagem pregnante é aquela que exprime equilíbrio, clareza, unidade e simplicidade. Sob esta ótica, a Gestalt estabelece o conceito das forças integradoras, estas, responsáveis pela leitura das formas como um "todo" coerente e unificado. Tais forças se dividem em; forças externas, constituída pela estimulação da retina através da luz e as forças internas, que representam a tendência dinâmica de organizar, estruturar, da melhor forma possível, esses estímulos exteriores. Através de suas pesquisas sobre o fenômeno da percepção, feitas com grande número de experimentos, os psicólogos da Gestalt precisaram certas constantes nessas forças internas, quanto à maneira como se ordenam ou se estruturam as formas psicologicamente percebidas. (FRACCAROLI, 1952, p.14).

Sendo assim, através destas constantes das forças internas conhecidas como padrões ou leis de organização da forma perceptual, se constitui as condições Escola alemã de psicologia experimental que desenvolveu, no ínicio do século XX, uma teoria da percepção com base em um rigoroso método experimental, possibilitando a compreensão da maneira como se ordenam ou se estruturam, no nosso cérebro, as formas que percebemos.

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através da qual obtém-se uma forma com boa legibilidade, pregnante. Estas leis se dividem em: Unidade, Segregação, Fechamento, Continuidade, Proximidade e Semelhança. Para a análise desta edificação enquanto paisagem, buscou-se os pontos de vistas na escala de um cidadão comum, localizado no entorno da orla da Pajuçara, distante da edificação em questão. Segundo os gestaltistas, a percepção da forma é o resultado instantâneo da soma de sensações isoladas, e devido a isto, buscouse fragmentar a paisagem seguindo as leis de organização aplicáveis à esta. Sob este ângulo, os primeiros padrões a serem percebidos são os que envolvem alguma forma de agrupamento. A lei da Proximidade entende que elementos, próximos uns aos outros, tendem a ser vistos juntos, isto é, a constituir unidades. Já segundo a lei da Semelhança, é a igualdade da forma e cor que despertam uma vocação em agrupar estas partes semelhantes. De acordo com FRACCAROLI (Ibid. p.24), a Semelhança é o fator mais forte de organização, pois não basta que os elementos estejam próximos, é necessário que estes tenham qualidades em comum. Estas forças, tendem a organizar a unidade mais simples de se perceber em um primeiro momento, quando agem mutualmente, a sensação é reforçada. No caso da paisagem em estudo, estas possibilidades de agrupamento relacionam-se a dois tipos de elementos; os coqueirais, que, próximos e semelhantes entre si, formam uma unidade e os edifícios, que ao mesmo tempo e pela mesma razão também são apreendidos como um todo (Imagens 73 e 74). Esta possibilidade de agrupamento, nos revelam elementos que, individualmente, não se destacam na percepção desta paisagem. No caso das edificações, revelam um padrão na adoção de um único estilo arquitetônico. Apesar da diferença de idade da construção destas edificações, este estilo permaneceu durantes os anos fazendo uso dos mesmos materiais que homogenizam este grupo de construções. Um outro padrão que pode ser aplicado na análise desta paisagem, é o da Continuidade. Segundo a Gestalt, esta lei se refere a uma impressão visual de como os elementos tendem a acompanharem uns aos outros, permitindo a continuidade de um movimento em uma direção. Para esta paisagem, a continuidade promovida em razão do gabarito das alturas das edificações, criam um padrão que nos leva a visualizar uma linha de borda que segue determinada direção. Para efeito comparativo, foi utilizado uma foto-montagem do projeto proposto pelo Governo do Estado (Imagem 75). A escolha deste se deu em razão da sua escala vertical, diferente das outras propostas existentes para este lugar.

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72-75 - AnĂĄlise dos padrĂľes propostos pela Gestalt na paisagem em estudo.

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76-79 - Análise dos padrões propostos pela Gestalt na paisagem em estudo.

Através da manipulação da fotografia, buscou-se deixar em evidência as linhas de borda desta paisagem. Estas montagens revelam uma suave continuidade que se inicia nas edificações, percorre os coqueiros da praça Gogó da Ema, alcança o Alagoinha e o farol até tornar-se constante no horizonte (Imagem 76). Quando a análise se volta ao projeto do Marco Referencial, a estrutura vertical corrompe esta continuidade sútil (Imagem 77). Sendo assim, quando sobrepomos estas linhas de borda, a leitura é evidente e nos denunciam a continuidade mais agradável (Imagem 78). Desta forma, a direção construída na linha de borda da paisagem atual, revela a escala horizontal como eixo mais adequado para um projeto nesta localização.

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Analisando então o conjunto destes elementos, temos a lei da Segregação, que marca a desigualdade destas unidades através dos contrastes. Para a paisagem em estudo, o Alagoinha representa este contraste (Imagem 79). Ainda que em processo de ruína, é devido a esta força contrastante que o clube se distingue dos demais elementos da paisagem. A escala horizontal, a sua forma e a localização continuam a provocar nesta edificação, uma força única, que a distingue dos demais agrupamentos. Sendo assim, o clube ainda é marcante na paisagem mesmo diante de sua situação, tornando este, lugar não apenas de memórias antigas mas também de memórias atuais. Isso ratifica a importância de analisar o clube enquanto paisagem. Afinal de contas, um projeto que considera apenas os limites de um lote ignora o caráter da paisagem construída há mais de meia década e cuja consequências, envolvem o dano ao sentimento de pertencimento e identidade de parte da sociedade. Por fim, ao aplicar as leis de organização propostas pela escola da Gestalt, conclui-se que a paisagem atual em seu conjunto apresenta uma boa pregnância, tendo no Alagoinha o seu contraste, referência que a individualiza. Sendo assim, neste viés paisagístico o Alagoinha se mantém em plena atividade. Estas análises oferecem fundamentos que irão orientar a proposta arquitetônica do lugar, ditando diretrizes em respeito a escolha das cores, formas e escalas da proposta. Assim, respeitando as características da paisagem construída, será possível manter esta boa legibilidade na requalificação do lugar. Temos a oportunidade de transformar o nosso novo mundo urbano numa paisagem passível de imaginabilidade: visível, coerente e clara. Isso vai exigir uma nova atitude de parte do morador das cidades e uma reformulação do meio em que ele vive. As novas formas, por sua vez, deverão ser agradáveis ao olhar, organizar-se nos diferentes níveis no tempo e no espaço e funcionar como símbolos da vida urbana (LYNCH, 1999, p.101).

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80-82 - RuĂ­nas do clube.

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1.8.2.2 LUGAR Após a análise do Alagoinha enquanto elemento de uma paisagem ícone da cidade, este subcapítulo tem por objetivo investigar a situação atual da edificação do clube enquanto lugar. Este pensamento se dá em razão da atual situação de abandono da antiga agremiação que, em seus limites físicos, tem sua estrutura ameaçada pelas forças da natureza, tornando-a propensa à extinção. No entanto, desde o término das atividades, o antigo Alagoinha vem sendo apropriado por uma parte da população o que revela os desejos e necessidades de um grupo ao respectivo ambiente urbano. Em razão da inércia política em estabelecer uma solução para o local, a natureza tem se manifestado na retomada do seu espaço. Após diversas demolições realizadas no interior do antigo clube, a estrutura do Alagoinha tem sofrido com as intempéries da natureza. Em sua situação atual, é possível perceber diversos danos na estrutura do edifício que advertem para um possível desmoronamento. Esta situação desordenada revela um grave dano neste símbolo da cidade, pois, enquanto local de tradição, a edificação não apresenta condições favoráveis à sua utilização. No entanto, é devido a força de provocar o sentimento de pertencimento em uma parte da população que o "clube" persiste no cotidiano da cidade. A sua antiga área tem sido frequentada por pessoas que a utilizam para os mais diversos usos, sejam eles, contemplativos, esportivos ou até mesmo ilícitos, fator este que promove um certo receio em parte dos transeuntes no local. É no mínimo curioso testemunhar que após cinquenta e três anos de existência, o clube que se propugnava funcionar sob um princípio de lazer, esteja cumprido sua função mesmo após o encerramento de suas atividades. A estrutura remanescente do antigo clube foi aparentemente reapropriada por uma pequena parte da população, que a utiliza de forma espontânea. Não é raro encontrar pessoas no que sobro do antigo do clube, é como se o lugar tivesse uma vocação, inerente, independentemente da situação a qual esteja submetido. Dos mais variados usos, o antigo clube, apesar de devastado, é utilizada inclusive em ensaios fotográficos. Segundo MONTANER (2001, p.44), o lugar da atualidade se define como locais de intensa concentração de fluxos, de acontecimentos, fatos transitórios, dinâmicos, ou seja, cenários de fatos efêmeros. Para este autor, estas relações entre os seres e os ambientes, alteram as noções dos limites físicos. Conforme visto anteriormente, o Alagoinha hoje é designado a uma área que transborda os seus limites, isto é resultado deste fenômeno que relaciona a força arquitetônica do edifício com as vivências de um grupo que habita e transforma estes lugares.

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83-84 - Apropriação das ruínas. 85 - Maceió Verão, 2014.

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Para LYNCH (1999) a cidade deve evocar o usuário uma imagem legível, estruturada, com identidades e significados, o autor então classifica cinco tipos de elementos que compõem uma cidade: Vias, Limites, Bairros, Pontos Nodais e Marcos. A legibilidade do Alagoinha enquanto marco, foi discutido através das teorias gestaltistas no subcapítulo Paisagem, no entanto, compreender o clube como um ponto nodal é reconhecer que este desempenha uma função além da contemplativa. O clube enquanto lugar representa na cidade um ponto de interesse, local de referência e manifestação, designando identidade a este ambiente urbano. Diversos eventos em Maceió ocorrem nas suas proximidades e muitas vezes ele delimita estes acontecimentos, a exemplo da rua fechada nos domingos - trecho da Avenida Silvio Viana que abrange do vértice onde se localiza o Alagoinha até o já citado Sete Coqueiros. Além disso, este lugar marca o ponto de chegada e largada de diversas corridas esportivas realizadas na cidade. Ironicamente, apesar da existência de uma praça multieventos neste mesmo trecho de orla, esta área da cidade já foi local de eventos de grande porte, como o Maceió Verão, que ocorreu no ano de 2014 contando com a presença de mais de dez mil participantes50. Em sua configuração mais recente, o Alagoinha hoje é local de diversos foodtrucks, realocados após uma polêmica sobre a permanência destes trailers nas vias de circulação de veículos. Apesar dos eventos aqui destacados, além de inúmeros outros que acontecem rotineiramente, nenhum destes são realizados nos limites da edificação, fator que reforça a necessidade de intervenção no local. No entendimento de que lugares são mais do que uma localização geográfica, NORBERG-SCHULZ (1996 apud BERGAMIN, p.173), introduz o conceito do Espírito do lugar ou Genius Loci. Para o autor, o lugar está cheio de significados, resultados da combinação das necessidades humanas com o sítio natural. Deste modo, o Genius Loci se refere ao conjunto de características sócio-culturais, arquitetônicas e de hábitos que conferem a esse lugar um carácter único, distinguindo-o dos demais. Assim, na busca de integrar o espírito do lugar no projeto arquitônico, entende-se que uma proposta de requalificação relaciona-se com uma recuperação da história e da memória do lugar (MONTANER, 2001, p.36). Diante disso, foi elaborado um questionário cujo tópicos envolveram a busca da compreensão dos desejos e das necessidades da população e de suas opiniões sobre o processo de arruinamento do clube diante de seus vínculos com o lugar. Sendo assim, as respostas obtidas por este serviram como diretrizes para as qualidades a serem integradas na proposta arquitetônica. Festival Verão Maceió reúne mais de 10 mil pessoas na orla da Ponta Verde, Gazeta de Alagoas, 4 de Janeiro de 2014. Disponível em: <http://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2014/01/festivalverao-maceio-reune-mais-de-10-mil-pessoas-na-orla-da-ponta-verde.html>. Acesso em: 20 Jun. 2016.

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86-89 - Apropriação das ruínas. 90 - Foodtrucks no estacionamento do Alagoinha.

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91 - Movimentação nas ruínas do antigo clube.

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92 - Layout do Questionário. Gráfico 1 - Idades dos Entrevistados. Gráfico 2 - Presença no clube. Gráfico 3 - Sugestão de usos.

O layout do questionário contou com perguntas que envolviam a idade, as memórias dos participantes no lugar e as vontades e sugestões de uso em um possível projeto para o local do antigo clube. As perguntas foram disponibilizadas em um sítio na internet51 e obteve, até o momento deste trabalho, 441 respostas. As faixas etárias foram divididas em grupos que correspondem: Menores de 18 anos - Nascidos a partir de 1999 e que no máximo viveram o período que marca a decadência do clube. 18-35 anos - Nascidos entre os anos de 1998 e 1981 e que passaram a infância ou adolescência durante os anos 90, período com o maior número de associados. 36-45 anos - Nascidos entre os anos de 1980 e 1971 e que viveram a infância ou adolescências durantes os anos 80 e a fase adulta durantes os anos 90. 46-55 anos - Nascidos entre os anos de 1970 e 1961 e que passaram a infância ou adolescência durante os anos 70 e a fase adulta a partir dos anos 80. Maiores de 56 anos - Nascidos até 1960 e que no mínimo passaram a adolescência durante a inauguração da sede marítima do clube em 1972. Além disso, os colaboradores deveriam responder se já estiveram alguma vez no clube e, se desejado, compartilhassem alguma lembrança do local. Através destas memórias, revelou-se as relações que os indivíduos possuíam com o lugar, e deve servir de apoio para a proposta arquitetônica deste trabalho. 51

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http://atrodolfo.wix.com/alagoinhas


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93 - Inauguração das piscinas, década de 80. 94 - Alagoinha, anos 90.

Por fim, o participante da pesquisa deveria escolher um ou mais usos que anseiasse para o futuro do lugar. Caso o mesmo não se identificasse com nenhum dos itens apresentados pelo questionário, era possível sugerir um novo uso. Através da avaliação dos dados obtidos neste questionário, será possível contextualizar e inserir valores sócio-culturais no projeto arquitetônico. Na avaliação dos dados, a maior parte dos entrevistados pertecem ao grupo da geração que possívelmente presenciou o auge do clube durantes os anos 90 (Gráfico 1). Nesta época, o clube atingiu a marca de aproximadamente 2.300 sócios contribuíntes e contava com sua infra-estrutura finalizada. Logo em seguida, temos o grupo de 46-55 anos, que provavelmente vivenciaram a construção da edificação na praia. Vale destacar que apesar do questionário ter sido disponibilizado apenas em meio digital, apenas 2% dos entrevistados pertencem ao grupo de menores de 18 anos. Seria este um indicativo da necessidade de requalificar o lugar reforçando a memória do Alagoinha na cidade ? Quanto ao próximo tópico, incríveis 83% dos entrevistados relataram ter visitado o local (Gráfico 2) fator que condiz com as análises realizadas neste trabalho e que certamente revelam que o clube é um lugar referencial na cidade. Entre os 364 entrevistados que responderam que já haviam visitado o Alagoinhas, muitos repartiram as lembranças que possuíam do lugar e, devido à sua força expressiva, compartilho algumas neste trabalho:

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Uma bela vista, algumas artes estampadas nas paredes, uma sensação de estar dentro do mar sem molhar-se. Olhar o céu, o horizonte e as ruínas do Alagoinha. Ver o hoje e tentar imaginar o ontem sem saber o que será amanhã. Será mais um espaço gentrificado? Espero que não... (18-35 anos) Recordo do pôr do sol e dos passeios nos recifes à sua volta para ver os peixinhos. (36-45 anos) Das festas dançantes, das estrelas, da lua, da cidade e do pôr do sol que pode se contemplar de lá. (46-55 anos) Sempre ia ao local com meus pais e o banho era engraçado. Lembro que na primeira vez que tomei banho nas piscinas do clube, fiquei reclamando porque meus pais "me enganaram", pois disseram que iríamos para a piscina, mas tinha água de mar dentro dela. Depois de um tempo, foi difícil me tirar de lá, adorava o local. (18-35 anos) Sou do interior e anualmente acontece um encontro dos amigos [que] moram longe e os que moram aqui em Maceió. Lembro de ter ido à um desses encontros, acredito que em 2003, lá no clube. E lembro o quanto achei aquele lugar maravilhoso. Contraste senti ao voltar cerca de um ano atrás, nas ruínas do Alagoinha para fazer umas fotos. (18-35 anos) Um clube de onde [que] todos os lugares se contemplava o mar. (Maior de 56 anos)

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95 - Alagoinha, 2016.

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Vários eventos aconteciam lá, minha formatura do ABC foi lá também, em 1992. Fora as vezes que minha família ia toda para lá. Era bem divertido. Tinha piscina, um salão enorme, adorava a comida do restaurante de lá. Tenho várias fotos no Alagoinhas. (18-35 anos) Eu fiz hidroginástica na piscina do Alagoinha. Amava, porque saia de casa no início da Pajuçara , caminhava até lá, fazia minha aula de hidro e voltava caminhando. Muito bom, porque a piscina era de água salgada. Delícia de época. (18-35 anos) Piscina de água do mar, família, amigos e domingo de sol e mar. (Maior de 56 anos) Era sócio quando criança e utilizei bastante o clube, para mim existe um valor sentimental. (18-35 anos) Construção interessante dentro do mar que despertava as maiores curiosidades e fantasias na minha infância. Já frequentei em muito para eventos e réveillon, mas nunca como clube de fim de semana. (18-35 anos) Estive apenas nas ruínas do Alagoinha e as lembranças que eu tenho de lá são a vista da orla e do farol, o pôr-do-sol, meninos brincando e pulando no mar e ponto de encontro de uma galera alternativa. (18-35 anos) Só estive no que sobrou do Alagoinhas. De lá é possível ter uma vista incrível do pôr-do-sol e da cidade. (18-35 anos) Trago boas lembranças desse lugar, da vista e do espaço que era utilizado para cultura. Fiz algumas apresentações lá quando estudava numa escola que usava aquele espaço para as suas gincanas. (18-35 anos) Moro em frente desde 1979. Pesquei muito lá, além dos bailes de carnaval. A piscina com água do mar era bem legal, acabaram com minha hidroginástica. (46-55 anos) Nunca estive no clube enquanto em funcionamento, mas visito com frenquência, o pôr do sol sob o ângulo do Alagoinhas é único. (18-35 anos) Tenho várias, as mais antigas são de criança, quando minha mãe não me deixava ir para perto das pilastras, depois entendi que era o lugar onde casais iam dar uns amassos. Mas também fiz oficina de teatro no clube, quando era adolescente e adulta lembro de todo o debate, os protestos, as ocupações em relação à arquitetura. (18-35 anos) Todo domingo ia com os filhos e esposo. Banho de piscina com muitos amigos e um especial almoço com música ao vivo. Muitas saudades desse tempo. Quero que volte. (Maior de 56 anos)

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Grandes festas realizadas, onde a sociedade alagoana se fazia presente. Grande estrutura, vista pelos turistas como um ponto de referência. (46-56 anos) Bom, tenho a primeira recordação como um clube onde tinha muitas festas e lugar muito convidativo a se divertir. Um cenário que chamava atenção por sua estrutura de um "caminho" na água, infelizmente agora as recordações só são boas nas lembranças, pois toda aquela estrutura foi derrubada e destruída. (18-35 anos) Achei um espaço agradável, com um entorno maravilhoso, quando fui uma vez pelo dia. (46-55 anos) Meus pais eram sócios e eu e meu irmão íamos muito para lá, brincávamos demais nós escorregas, íamos a praia também descendo pelo muro quando a maré estava vazia. Muito legal. O restaurante tinha um filé à parmegiana maravilhoso. Bons momentos. Deu até saudades. (36-45 anos) Diversas noites dançantes, o luar. Lazer aos sábados e domingos desfrutando das piscinas com belíssimo visual das praias de Pajuçara e Ponta Verde. (36-45 anos) Aos domingos íamos todos da família, eu, esposo e os três filhos. Ficávamos na piscina do clube ou íamos para piscina natural. O Alagoinhas era um patrimônio, tinha mais de 40 anos e o único no Brasil com aquela arquitetura dentro do mar. (Maior de 56 anos) Uma lembrança muito vaga de ter estado em uma festa, com música e dança, quando era ainda muito pequena. Possivelmente um coquetel ou algum baile. Mas a impressão que tenho mais forte era a sensação confortável de estar em um lugar circular, é como guardei na minha memória. (36-45 anos) Lembro que era utilizado para alguns eventos em 2001, mas lembro que já estava meio abandonado e mal cuidado. Depois disso só lembro dele sendo utilizado como local para moradores de rua e consumo de drogas. Achava o local perigoso. Hoje, já demolido, vejo que pessoas frequentam no fim da tarde para ver o pôr do sol. Por isso acho uma boa ideia a construção de um Píer (obra horizontal, não aquele mirante alto que estava para ser construído) (18-35 anos) Cheguei aqui em Maceió em 1972. Era um dos locais que mais me impressionaram (46-55 anos) Minha lembrança era a de ficar olhando de cima os corais, ouriços e peixes. (36-45 anos) Possuo todas as memórias, atualmente sou o Comodoro do Alagoinhas que só existe juridicamente. (Maior de 56 anos)

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Estas recordações dos habitantes e visitantes demonstram a força referencial do lugar que marcou parte da vida de um grupo. Estas memórias revelam um antigo local de encontro, lazer e contemplação que se destacou no vértice da praia da Ponta Verde. Além disso, apesar de sua situação de abandono, novas memórias vêm sendo construídas uma vez que o antigo clube permanece em "atividade" na apropriação de sua estrutura remanescente. Os eventos cotidianos que ocorrem no Alagoinha, revelam a necessidade da restruturação deste local de modo a responder os desejos desta parcela da sociedade. Sendo assim, o último tópico do questionário envolveu os desejos dos entrevistados para os tipos de usos que a proposta deverá dispor. O participante poderia escolher uma ou mais das opções propostas pelo questionário ou propor novas sugestões. O resultado desta pesquisa apresentou uma preferência pelos usos de uma Praça/Píer com 289 votos (Gráfico 3). Além disso, outros três usos tiveram uma votação expressiva e, possivelmente, se relacionam com a situação atual do lugar, sendo estes - Contemplação, uma vez que não é raro encontrar pessoas tirando fotos na edificação. Esportivo/Lazer, diante das apropriações que alguns fazem da estrutura remanescente na prática de atividades. Restaurante, através dos Foodtrucks que hoje se localizam no antigo estacionamento do clube e das barraquinhas de acarajé localizadas na praça Gogó da Ema. Além destes, foram sugeridos novos usos e orientações que envolviam: espaço para artes, exposições e eventos culturais, projeto integrado com a natureza, artesanato e atendimento ao turista, entre outras recomendações. Houve também os que se mostraram insatisfeitos com a existência da edificação e sugeriam apenas a sua demolição. Assim, diante das análises apresentadas neste capítulo, busca-se-á construir uma proposta que busque responder as demandas deste grupo, porém, respeitando o cárater da paisagem e o espírito do lugar. O projeto arquitetônico deverá ser funcionalmente adequado e voltado à diferentes grupos sociais. Através da transformação de um antigo lugar privado em um lugar público, estimula-se a vida comunitária e reforça o sentimento de pertencimento dos usuários que habitam este ambiente urbano. Deste modo se possibilitará a resignificação e requalificação da identidade e da memória coletiva da sociedade de hoje e das que estão por vir.

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98 - Alagoinha, 2016.




2 O LUGAR FRUGAL


2.1- DIRETRIZES Como visto anteriormente, as análises realizadas neste trabalho geraram uma série de diretrizes para serem usadas de roteiro para a elaboração do projeto arquitetônico. Através destas, acredita-se ter sido realizado uma proposta adequada para a antiga edificação do Alagoas Iate Clube. Assim, destaco nesse tópico um balanço destas principais intenções projetuais. MIMÉSIS: Em contraposição a uma parcela da produção arquitetônica nacional que preza por um estilo difundido internacionalmente, acredito, fundamentando-me em minhas pesquisas e reflexões, que o melhor caminho para este projeto é o aproveitamento da linguagem visual do restante da estrutura do Alagoinha. Penso que o caráter vanguardista do antigo clube merece ser preservado, de modo a evitar mimésis de obras conhecidas e associadas, como visto em propostas descritas anteriormente neste trabalho.

LINHA DE BORDA: Diante dos estudos realizados através das teorias da Gestalt, acredito que a melhor solução para o projeto é aquela que se adequar, na maior medida possível, à escala horizontal, mantendo a harmonia com o panorama a que a comunidade já está acostumada há décadas, e garantindo, assim, a melhor pregnância.

ÍCONE: Por meio do estudo das teorias de Kevin Lynch para marcos referenciais, concluí que a melhor solução para o projeto é a preservação da referência icônica que a edificação desenvolveu ao longo do tempo. Assim, a escolha dos materiais, cores e formas deve enquadrar-se na potencialização deste ideal.

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ANSEIOS: Os questionários elaborados neste trabalho tornaram possível entender como a população percebe o lugar, tomando-se em conta, inclusive, as formas e modos por meio dos quais esta área vem sendo usufruída pela comunidade. Afinal de contas, é imprescindível que qualquer projeto para o local leve em conta a opinião e as expectativas desse grupo. DESGENTRIFICAÇÃO: É preciso reformular a concepção do que se espera do novo Alagoinha: se antes era um clube destinado ao topo da pirâmide social alagoana, hoje é preciso que ele seja um ambiente acessível a todas as pessoas, independentemente de posição social, econômica ou intelectual. ELO: A localização extremamente privilegiada confere à edificação um potencial de mediador entre paisagem urbana e paisagem natural. Entrentanto, esta característica também traz responsabilidade: o projeto deve respeitar as normas ambientas. MEMÓRIA: Através dos estudos sobre memória coletiva e identidade, entende-se que a proposta deve respeitar os vínculos construídos há anos por uma sociedade que elegeu o Alagoinha como um marco, assim, o projeto deve atentar às formas descontextualizadas.

CONTINUIDADE: Diante da atual situação do clube, desvinculado da orla urbana, se faz necessário uma proposta que reintegre a edificação, tornando esta, acessível a todos e potencializando a sua visibilidade na cidade.

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99-101 - Simulação da visibilidade em diferentes pontos de vistas (Pontos Brancos).

2.2 - PROPOSTA Na busca de um projeto que respeita os princípios discutidos nesta pesquisa, foram realizadas novas visitas ao sítio onde se localiza o edifício, além de um levantamento fotográfico aéreo que facilitou a compreensão da edificação e sua relação com o entorno. Assim, as diretrizes levantadas são guias projetuais essencias para um projeto de arquitetura adaptado ao lugar. Em um primeiro momento, foi observado que mesmo o Alagoinha sendo visto praticamente ao longo de toda a orla das praias da Pajuçara e Ponta Verde é justamente quando estamos mais perto que a edificação não é percebida. Esta situação possivelmente se deve a presença de um estacionamento com diversos foodtrucks que dificultam a percepção da edificação no lugar. Para ilustrar esta problemática, foi realizada uma simulação da visibilidade em três pontos próximos ao antigo Alagoinha (Imagens 98-100). Os pontos brancos representam o observador, a área representada em preto e branco corresponde ao espaço não visível enquanto que o espaço colorido, visível. Como ilustrado nas imagens, o transeunte localizado defronte ao antigo clube, tem sua vista bloqueada por diversos elementos, ignorando a amplitude e beleza que paira sobre o lugar.

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102 - Vista do estacionamento. Apesar do Alagoinha estar a poucos metros de distância, este é imperceptível no espaço, 2016.

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103 - Imagem aérea da edificação, ao fundo, o estacionamento.

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Diagramas 9-12 - Diagramas axonométricos da construção da proposta arquitetônica.

Deste modo, acreditando que o espaço dedicado ao estacionamento é inadequado para o local por ser subutilizado, tanto que mais da metade de sua área foi destinada aos foodtrucks, propõe-se a remoção deste uso, sugerindo a realocação dos foodtrucks para áreas adjacentes, como a praça Gogó da ema.

Com a retirada do estacionamento permite-se a continuidade da orla além de criar um espaço amplo e aberto que permite a visibilidade do antigo clube e enfatiza a importância do lugar, provocando o transeunte a seguir em direção a nova edificação. 109


Em todas as propostas analisadas nesta pesquisa, o acesso para o clube se faz diante de uma espécie de ponte elevada. No entanto, devido a existência de um banco de areia no local, esta solução criaria uma espécie de barreira, pois não iria possuir altura suficiente para o transeunte atravessá-la pela praia.

Sendo assim, propõe-se uma solução mista de uma rampa que decai até um nível intermediário onde é possível atravessá-la através das escadarias dispostas em sua lateral. Além disso, são dispostos outros caminhos que tornam o acesso à praia simples e fluído, buscando integrar ainda mais a edificação no lugar. 110


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Diagramas 13-16 - Diagramas axonométricos da construção da proposta arquitetônica. Diagramas 17-18 - Diagramas Preamar e Baixa-mar.

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Na pretensão de destacar o que representou o primeiro momento do clube em 1972, buscou-se diferenciar o piso adotado no perímetro do projeto original criado pelas arquitetas Edy Marrêta e Zélia Maia Nobre. Além disso, o acesso para o segundo bloco da edificação foi reformulado, uma vez que o original era composto por uma rampa fora da norma de acessibilidade. A antiga passagem deu lugar a uma escadaria que se converte em uma rampa dentro das normas definidas para cadeirantes (Diagrama 13). Com o objetivo de destacar a eficiente e expressiva solução estrutural que resistiu as intempéries ao longo dos anos, uma série de luminárias dispostas na mesma malha, expõe este elemento arquitetônico característico do modernismo, direcionando o transeunte a parte posterior do edifício (Diagramas 14 e 15). Acerca do segundo bloco, construído na segunda fase do clube, durante os anos 80, a piscina sempre foi o destaque. Construído na forma de um bloco maciço cravado na praia da Ponta Verde, este espaço foi destinado ao lazer e contemplação dos associados ao Alagoinha. Em grande parte dos depoimentos a piscina e sua relação com o mar eram sempre mencionadas. Deste modo, era imprescindível a sua reformulação buscando destacar este ícone do antigo clube. Assim, é proposta a retirada de parte da estrutura deste espaço, criando uma escadaria que dá acesso ao mar (Diagramas 15 e 16). Através da subtração deste volume, celebra-se o encontro do edifício com o mar. A antiga piscina dá lugar a um grande espelho d'água com um sistema de bombeamento cujo fluxo de água é constante, escorrendo lentamente até seu encontro com o oceano. Na preamar, ás águas se encontram e concretizam o imaginário criado pelos antigos frequentadores do clube, enquanto que na baixa-mar, as escadas incentivam o lúdico, possibilitando tanto o deslocamento quanto o simples ato de sentar e contemplar a paisagem (Diagramas 17 e 18).

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Diagramas 19-21 - Diagramas axonométricos da construção da proposta arquitetônica.

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Após os estudos sobre as diversas teorias que discernem temas sobre lugar, paisagem, memória e identidade, busquei na forma da coberta original inspiração para o gesto que irá simbolizar o contraste na paisagem, o ícone. Através de uma fita de concreto que se desloca em direção a estrutura remanescente, este elemento abraça a edificação e dá a forma que remete, sem repetir, a coberta que marcou durante anos a paisagem da orla da cidade (Diagrama 19). Neste espaço, onde antes funcionava um restaurante, surge uma área multiuso, para os mais variados eventos, sendo acessível a toda população. Este local foi pensado originalmente como uma área livre, porém isto não impede que em eventos específicos o local seja vedado com painéis de vidro. Além disto, bancos espalhados no perímetro da edificação (Diagrama 20), convidam o transeunte a dar uma pausa e contemplar a paisagem sobre o ponto de vista único e característico do Alagoinha. A proposta arquitetônica para o antigo Alagoas Iate clube, buscou sobretudo, resgatar e concretizar a permanência do edifício na paisagem que este ajudou a construir ao longo dos anos. O projeto procurou em seu entorno diretrizes e limitadores que guiaram a construção da proposta. Muitos dos projetos apresentados para este lugar se voltavam exclusivamente para o setor turístico e econômico, ignorando a história construída pelo mesmo. Isto não significa que estas temáticas não devem estar presentes, mas devem ser dispostas obedecendo uma hierarquia, onde os valores históricos e culturais se sobressaem aos valores mercadológicos, tornando possível obter uma proposta sensível ao lugar. Desta forma, este projeto arquitetônico para o Alagoinha vai além de interesses econômicos e turísticos, a solução adotada tem como objetivo restituir um elemento de identificação e suporte da memória dentro de um programa centrado no valor patrimonial e não no seu potencial de consumo.

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Perspectiva Aérea - A proposta buscou a fluidez, evitando ser uma barreira na área. Ela é acessível de diversos modos, pelo mar, pela orla, pela praia. Ela é visível, transponível, o lugar e seus usuários ditaram a diretrizes projetuais.

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Perspectiva Entrada - O elemento principal da edificação se inspira na coberta edificada no início dos anos 70 e que marcou a paisagem da cidade, evocando as memórias.

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Perspectiva Entrada - A iluminação direciona o olhar e destaca o ícone na paisagem noturna.

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Perspectiva Entrada - A rampa de acesso cai suavemente a um nível intermediário e com suas escadarias laterais permitem o fluxo do transeunte que segue pela praia. O edifício não cria barreiras, ele é acessível e integrado ao sítio.

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Perspectiva Entrada - A disposição das palmeiras direcionam não só o olhar, mas o corpo todo para o edifício principal.

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Perspectiva Entrada - Bancos distribuídos ao longo da edificação convidam o usuário a dar uma pausa e observar. Dispostos em diferentes posições, o transeunte define qual vista irá apreciar.

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Perspectiva gesto - Espaço voltado para o uso democrático, livre, aberto, no entanto, se necessário, painéis de vidro se encaixam na forma circular e criam um espaço mais reservado e protegido. Além disso, a diferenciação do piso homenagea o formato original do antigo clube, quando inaugurado em 1972.

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Perspectiva gesto - A iluminação também busca destacar a estrutura existente, o antigo e o novo dialogam de forma harmônica.

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Perspectiva gesto - Luzes dispostas no piso revelam a disposição das colunas que marcam a estrutura original do antigo clube.

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Perspectiva escadaria - AtravĂŠs de uma forma mista de escada e rampa, o usuĂĄrio acessa o segundo bloco do antigo clube.

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Perspectiva espelho d'água - O espelho d'água no formato da antiga piscina do clube provoca e realiza uma memória antiga. Sempre vinculado com o mar, a antiga piscina dá lugar a uma suave queda d'água com uma escadaria que torna possível o acesso ao mar.

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Perspectiva espelho d'รกgua - Escadaria e bancos convidam o usuรกrio a relaxar e desfrutar a paisagem natural.

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Perspectiva Paisagem - A forma contrasta respeitando a histรณria e a escala da paisagem.

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FONTE DAS IMAGENS Capa e Agradecimentos – Rodolfo Torres. Capítulo 1, O lugar erodido – Acervo do fotógrafo Japson Macêdo de Almeida. Capítulo 2, O lugar frugal – Rodolfo Torres. Mapa Iconográfico – Google Maps, modificado. Diagrama 1-21 - Rodolfo Torres. Imagem 1-2 – Foto do acervo da biblioteca pública Graciliano Ramos. Imagem 3-4 – Salve Alagoas, disponível em: <http://www.salvealagoas. com/2mzz1/06/alagoas-iate-clube.html>. Imagem 5 – Acervo do fotógrafo Japson Macêdo de Almeida. Imagem 6 – História de Alagoas, disponível em: <http://www.historiadealagoas. com.br/gogo-da-ema.html>. Imagem 7-8 – Acervo do fotógrafo Japson Macêdo de Almeida. Imagem 9 – Acervo Paulo Sergio Nunes, filho do fundador do clube. Imagem 10 – Mercado Livre, http://colecoes.mercadolivre.com.br/mcz12187-postal-maceio,-al. Imagens 11-12 Foto do acervo da biblioteca pública estadual Graciliano Ramos. Imagem 13 – Acervo Ivaldo Jorge. Imagem 14-15 – Acervo do fotógrafo Japson Macêdo de Almeida. Imagem 16 – Academia Porto Calvense, disponível em: <http:// academiaportocalvenseaphla.blogspot.com.br/2013/06/maquina-dotempomaceio.html>. Imagem 17-20 – Foto do acervo da biblioteca pública estadual Graciliano Ramos. Imagem 21 – Alagoas Boreal, disponível em: <http://alagoasboreal.com.br/ imprimir/post/14/23/ivaldo-pinto/todos-os-encantos-das-belezas-naturais-demaceio-paraiso-das-aguas>. Imagem 22 – Maceió Antiga, disponível em: <https://www.facebook.com/ MaceioAntiga/?fref=ts>.

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Imagem 23 – IBGE, disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/ biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=427040>. Imagem 24 – Acervo do fotógrafo Japson Macêdo de Almeida. Imagem 25 – Acervo Paulo Sergio Nunes, filho do fundador do clube. Imagem 26 – Turma do Flamenguinho, disponível em: <http://turmadoflamenguinho.blogspot.com.br/2014/01/maceio-de-anteontem-deontem-e-de-hoje.html>. Imagem 27 – Acervo do fotógrafo Japson Macêdo de Almeida. Imagem 28 – Maceió Antiga, disponível em: <https://www.facebook.com/ MaceioAntiga/?fref=ts>. Imagem 29-32 – Acervo Paulo Sergio Nunes, filho do fundador do clube. Imagem 33 – Portal G1, disponível em: <http://g1.globo.com/al/alagoas/ noticia/2013/08/obras-no-antigo-alagoinha-devem-ter-inicio-ainda-em-2013garante-estado.html> Imagem 34 – Rodolfo Torres. Imagem 35 – Acervo Jaime Brandão, SONAR - Comunicação criativa. Imagem 36-37 – Acervo Assis Reis, disponível em: <http://www.acervoassisreis. com.br/iate-clube-de-alagoas/>. Imagem 38-43 – Arquivos da apresentação do projeto, SEMPLA. Imagem 44 – Alagoas 24 horas, disponível em: <http://www.alagoas24horas.com. br/687004/centro-gastronomico-sera-implantado>. Imagem 45-48 e 50 – Relatório de Avaliação Ambiental (RAA) Marco Referencial de Maceió. Imagem 49 – Alagoas 24 horas, disponível em: <http://www.alagoas24horas.com. br/473076/ministro-assina-autorizacao-para-a-licitacao-de-marco-referencial/>. Imagem 51-55 – Agência Alagoas, disponível em: <http://www.agenciaalagoas. al.gov.br/noticia/item/12668-marco-referencial-de-maceio-tera-capacidade-para1-500-pessoas>. Imagem 56-57 – Negros, canais, lagoas e outras imagens periféricas, disponível em: <http://outrasimagensperifericas.blogspot.com.br/p/as-imagens-marinhas. html>. Imagem 58 – Acervo do fotógrafo Japson Macêdo de Almeida.

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Imagem 59 – Acervo Jaime Brandão, SONAR - Comunicação criativa. Imagem 60 – Mercado Livre, disponível em: <http://produto.mercadolivre.com. br/MLB-787317626-mcz-6681-postal-maceio-a-l-praia-dos-sete-coqueiros-_ JM#redirectedFromParent>. Imagem 61 – Rodolfo Torres. Imagem 62 – Mercado Livre, disponível em: <http://lista.mercadolivre.com.br/ gog%C3%B3-da-ema-postal#D[A:gogó-da-ema-postal>. Imagem 63 – Acervo Alagoano, disponível em: <http://acervoalagoano.blogspot. com.br/2010/11/coqueiro-gogo-da-ema-localizado-onde.html>. Imagem 64 – Acervo Jaime Brandão, SONAR - Comunicação criativa. Imagem 65-66 – Acervo do fotógrafo Japson Macêdo de Almeida. Imagem 67-84 – Rodolfo Torres. Imagem 85 – Maceió Verão, disponível em: <http://www.maceio.al.gov.br/ veraomaceio>. Imagem 86 – Luz Floripes, disponível em: <https://scontent.ffor2-1.fna.fbcdn.net/ t31.0-8/10957208_1536341313293849_7433411135031967638_o.jpg>. Imagem 87 – Rodolfo Torres. Imagem 88 – Pinterest, disponível em: <https://za.pinterest.com/ pin/479844535279149420/> Imagem 89-92 – Rodolfo Torres. Imagem 93-94 – Acervo Paulo Sergio Nunes, filho do fundador do clube. Imagem 95-102 – Rodolfo Torres. Imagem 103 – Acervo Jaime Brandão, SONAR - Comunicação criativa.

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A paisagem é um fenômeno que coloca no espaço uma história singular Augustin Berque

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