I N F O R M A Ç Ã O
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C I D A D A N I A
l a i c e p s E ANO V - N0 59 - RIO DE JANEIRO, 29 DE MAIO DE 2017
ESTA EDIÇÃ0: 30 MIL EXEMPLARES DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
www.avozderiodaspedras.com.br / Facebook: A Voz de Rio das Pedras / jornal on-line: http://issuu.com/avozderiodaspedras
CRIVELLA GARANTE
VAMOS VIRAR BAIRRO FOTO DE EVALDO REIS
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Através do programa Minha Casa Minha Vida serão construídas 30 mil moradias de um e dois quartos para todos os nossos moradores.
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As novas habitações, em prédios de até 13 andares, serão financiadas pela Caixa Econômica Federal, que aprovou o projeto da Prefeitura.
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As ruas serão urbanizadas e arborizadas, haverá shopping center, o bairro terá saneamento básico e áreas de lazer e entretenimento.
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Outro projeto prevê o transporte hidroviário, por balsas e barcaças, ligando Rio das Pedras à estação Jardim Oceânico do metrô.
MORADORES APROVAM O PROJETO E DÃO OS SEUS RECADOS
FOTO A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
FOTO DE GUSTAVO DE OLIVEIRA / ARQUIDIOCESE DO RIO
Cláudia Franco Corrêa explica o censo
PESQUISADORA FALA DOS NÚMEROS QUE EMBASAM O PROJETO
BENÇÃO DE DOM ORANI NO DIA DO TRABALHO
O projeto do prefeito é tão importante que vai fazer história como ação social de elevada importância”.
Temos também projeto para criar um sistema de transporte hidroviário ligando Rio das Pedras à estação do Jardim Oceânico do metrô”.
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Carlos Carvalho, empresário
RIO, 29 DE MAIO DE 2017
Flávio Caland, superintendente regional de Jacarepaguá
GOVERNO DÁ AVAL A PROJETO DA PREFEITURA CAIXA ECONÔMICA VAI FINANCIAR 30 MIL IMÓVEIS NOVOS PARA NOSSOS MORADORES REPRODUÇÃO
Com população estimada em 80 mil pessoas e superfície de 854 mil metros quadrados, Rio das Pedras é a segunda maior comunidade do Rio e a terceira maior do Brasil, só ficando atrás da Rocinha (RJ) e Sol Nascente (DF) FOTOS EDVALDO REIS
— São pessoas trabalhadoras, merecem uma intervenção como esta. Então, prefeito, pode contar com a Caixa. A declaração do vice-presidente de Governo da Caixa Econômica Federal, Roberto Derziê, representando o presidente Gilberto Occhi na solenidade de lançamento do programa para reurbanização da nossa comunidade, é o aval da instituição ao esforço de realizar o sonho dos nossos moradores em ter a casa própria e qualidade de vida. A cerimônia, no Palácio da Cidade, di a 15 de maio, representou um chamamento público para selecionar empresas interessadas em desenvolver um modelo de Operação Urbana Consorciada em Rio das Pedras e nos bairros do Itanhangá e Jacarepaguá. O modelo é semelhante ao já adotado na Região Portuária do Rio de Janeiro. A ideia do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) da Subsecretaria de Projetos Estratégicos é utilizar Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepacs) para implantar na comunidade um projeto para transformar Rio das Pedras em um novo bairro. A proposta prevê a construção de empreendimentos comerciais e residenciais na área que permitam que os moradores possam adquirir imóveis por meio de financiame ntos especiais e acessíveis. A cerimônia contou também com a participação dos secretários municipais Índio da Costa (Urbanismo, Infraestrutura e Habitação), Maria Eduarda Gouvêa Berto (Fazenda), de Flávio Caland (superintendente regional de Jacarepaguá), além de Fabrício Santos (presidente da Associação de Moradores e Amigos de Rio das Pedras), empresários do setor de construção, como Carlos Carvalho (Carvalho Hosken) e Ney Suassuna (Acibarra), comerciantes e moradores da nossa comunidade. É O PROGRESSO CHEGANDO O superintendente de Jacarepaguá, Flávio Caland, que conhece de perto a nossa situação, já começou a conversar com moradores para explicar o projeto. Ele comemora: — Os moradores terão oportunidade de sair do aluguel e ter seu próprio negócio ou casa própria e a Prefeitura passará a ter condições de prestar os serviços públicos necessários e fazer a manutenção deles. Hoje, em algumas ruas é difícil a passagem de um caminhão da Comlurb e em alguns locais nem passa, de tão estreito. Explicou que a questão do saneamento também será resolvida, uma vez que faltam serviços de esgoto e não há espaço e condições de desobstruir bueiros, entre outras demandas. — É o progresso chegando e melhorando a vida das pessoas. Vamos deixar de ter uma “Veneza do cocô”, como os moradores chamam uma das vias, para termos um bairro de verdade, com ruas, calçadas, ciclovia, e um entorno organizado, como acontece do outro lado da lagoa — acrescentou. Caland lembra que a Prefeitura também tem projeto para criar um novo sistema de transporte, com o uso de balsas, para o transporte hidroviário, ligando Rio das Pedras à Barra e à estação do metrô. — Assim que o projeto estiver desenhado, serão realizadas reuniões com os moradores para explicar melhor as transformações — explicou o superintendente. Ouvido pelo nosso jornal, o empresário Carlos Carvalho resumiu numa frase seu entusiasmo: — O projeto do prefeito é tão importante que vai fazer história como ação social de elevada importância.
DIGNIDADE E QUALIDADE DE VIDA
Crivella conversa com Carlos Carvalho, observado por Ney Suassuna
Prefeito faz o sinal de positivo ao lado do presidente da Amarp, Fabrício Santos, e do superintendente regional de Jacarepaguá, Flávio Caland
ÍNTEGRA DO DISCURSO DE ROBERTO DERZIÊ FOTO AZIZ AHMED
“É um prazer estar participando deste ato. Disse ao meu amigo prefeito Marcelo Crivella que é um ato de muita coragem e ousadia fazer uma intervenção da forma e da magnitude dessa que ele quer realizar. Mas como tudo isso é para o bem da comunidade, ficará marcado como o antes e o depois da implantação desse projeto. Vai mostrar como é possível fazer uma intervenção dessa grandeza, transformando a vida das pessoas, dando-lhes dignidade e cidadania. Através da secretária municipal de Fazenda, Maria Eduarda, quero cumprimentar os colegas aqui presentes e chamar a atenção de que nós, da Caixa, em razão dessa iniciativa, tere-
mos muito trabalho pela frente. O prefeito, tão logo nos convidou para avaliar o projeto, nos apresentando o vídeo previamente, colocou-nos diante de um enorme desafio. Esse projeto engloba infraestrutura, fala em habitação e tudo isso é o mercado da Caixa, onde a instituição tem que estar apoiando, não só a Prefeitura, como também os investidores interessados em transformar a realidade daquela comunidade. São pessoas trabalhadoras, batalhadoras, merecem uma intervenção como esta. Então, prefeito, parabenizo o senhor pela ousadia. E conte com a Caixa.”
O chamamento público define como objeto do estudo a área delimitada pelas Lagoas da Tijuca e do Camorim, Avenida Ayrton Senna, Avenida Isabel Domingues, Estrada Curipós, Estrada de Jacarepaguá, Rua Aroeira até o encontro com a Rua Mario Tebyrica, daí em linha reta até o encontro da Rua Luís Carlos de Castro com a Rua Colins, por esta até a Rua Armstrong, Estrada de Jacarepaguá, Avenida Engenheiro Souza Filho até o encontro com a Rua Francisco Mangabeira e daí perpendicular à avenida até a margem da Lagoa da Tijuca. Importante ressaltar que a delimitação não restringirá a inclusão de novas áreas. Com população estimada em 80 mil pessoas e ocupando superfície de 854 mil metros quadrados, Rio das Pedras é a segunda maior comunidade do Rio de Janeiro e a terceira maior do Brasil, só ficando atrás da Rocinha (RJ) e Sol Nascente (DF). O local também concentra o maior crescimento populacional entre as famílias cariocas. O projeto prevê a construção de cerca de 30 mil unidades habitacionais com tamanho médio de 45 m². As intervenções em infraestrutura (saneamento básico, drenagem, redes de abastecimento de energia elétrica e telecomunicações subterrâneas, gás), vias e passeios pavimentados, projeto de segurança para pedestres, controle de velocidade dos veículos e câmeras de segurança também fazem parte da proposta. Nossa comunidade ganhará novos espaços públicos e de lazer, com ampliação das áreas destinadas a pedestres e a criação de circuito cicloviário. O investimento previsto pela prefeitura nos estudos que antecederam a PMI é avaliado em R$ 5,4 bilhões que serão aplicados em infraestrutura urbana (R$ 2 bilhões) e na construção de residências (R$ 3,4 bilhões).
Queremos nos redimir de um passado que fez desta cidade uma das mais desiguais do mundo, e, por isso, uma das mais violentas” Marcelo Crivella, prefeito do Rio
Gostaria de dizer aos empreendedores que não haverá prejuízo. Aquele povo trabalhador e ordeiro tem renda para adquirir seus imóveis”
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Marcelo Crivella
FOTO EDVALDO REIS
CRIVELLA APOSTA NA URBANIZAÇÃO azizahmed@uol.com.br
— Sonho que um dia uma pessoa, uma família de trabalhador, vai poder chegar na varanda de um daqueles prédios, olhar para a direita e ver o shopping center, a Península, a lagoa, a praia da Barra. Vai olhar para o outro lado e ver a floresta, frondosa, onde nasce o rio que hoje é uma vala negra que desagua na lagoa. Cabe a nós fazer com que volte a ser limpo, bonito, e que todos ali tenham uma condição de vida digna. A declaração foi feita pelo prefeito Marcelo Crivella, no Palácio da Cidade, depois de exibir um vídeo com o escopo do projeto que visa transformar Rio das Pedras num bairro vertical (veja a reportagem na página 2). Na ocasião, o vice-presidente da Caixa Econômica Federal, Roberto Derziê, ao dar o aval da instituição, classificou-o de “um ato de coragem e ousadia”.
“SONHO VER UMA FAMÍLIA DA VARANDA DE UMA DAS 30 MIL MORADIAS QUE VAMOS ERGUER AQUI OLHANDO A LAGOA, O SHOPPING, A PRAIA E A FLORESTA” MARCELO CRIVELLA, PREFEITO DO RIO
O DISCURSO DO PREFEITO MARCELO CRIVELLA “Estamos dando um passo importante a favor da vida de mais de 80 mil pessoas. Este vídeo que acabaram de assistir nós passamos em Brasília para várias autoridades. E elas ficaram empolgadas. E por quê? Porque é uma experiência que tenho certeza será exitosa e poderá servir de parâmetro para outras intervenções no Brasil. Permitam-me dimensionar, até para compreensão dos nossos vereadores aqui presentes, o tamanho do nosso desafio. Temos um terreno cuja sondagem revelou que vamos ter de cavar muitas estacas, provavelmente de 30 centímetros de diâmetro a uma profundidade de 20 a 23 metros. Aí estamos falando em 300 reais em média o preço do metro dessas estacas para estabilizar aquele terreno e não acontecer o que aconteceu no empreendimento que a prefeitura fez na Vila Pan-Americana. Lá, os prédios estão bem, mas as galerias de esgotos, fluviais, de abastecimento de água e a própria pavimentação cederam. Mas será vencendo esse tipo de dificuldades que vamos nos engrandecer perante o nosso povo. Quando andamos no meio das pessoas no Rio de Janeiro ouvimos falarem que esta
FOTO AZIZ AHMED
É o passo decisivo para atender a manifestação de 76% dos moradores que, em pesquisa realizada pelo Núcleo de Pesquisas e Cidadania da UniverCidade em Rio das Pedras, declaram o desejo de ter sua casa regularizada, com título de propriedade. O plano prevê a construção de 30 mil moradias em prédios de até 13 andares que seriam erguidos em ruas urbanizadas e arborizadas, shopping center, áreas de lazer e outras instalações tendentes a proporcionar uma qualidade de vida digna aos nossos 80 mil moradores. Os imóveis seriam financiados pela Caixa, que já aprovou o projeto. O prefeito, mais uma vez valendo-se do levantamento feito pelo Núcleo, segundo o qual a maioria tem renda acima de três salários mínimos e 61% pagam aluguel, lembrou aos empresários presentes que poderiam ficar tranquilos com o investimento. E garantiu:
cidade é capaz de gastar bilhões em intervenções na Zona Sul e no Centro da Cidade, mas quando chega nas comunidades, acabou o dinheiro, é difícil, tem problemas, e para eles sempre ficam os remendos. O que queremos fazer com este projeto? Queremos nos redimir de um passado que fez desta cidade uma das mais desiguais do mundo e, por isso, uma das mais MED ZIZ AH violentas. FOTO A Moro na Península. Todo dia passo com a minha esposa e agradeço a luta do dr. Carlos Carvalho (disse dirigindo-se ao empresário, que estava na plateia). Ele informou ter levado anos e anos para fazer aquilo ali. Mas a luta dele valeu a pena. Claro que algum dia a gente vai morrer. Mas o sacrifício, o esforço, ficarão eternizados na gratidão do povo do Rio de Janeiro. Nós também. O dia em que fizermos numa comunidade carente muito mais do que um Morar Carioca, um Favela-Bairro, coisas que não são ruins, mas são muito pequenas diante das necessidades que aquelas pessoas têm. E muito pequenas também diante dos recursos que investimos no outro lado da cidade. Então, pergunto: conseguimos tirar petróleo abaixo da camada pré-sal, desenvolvemos tecnologia que não havia no mundo inteiro,
Luciano Teixeira, subsecretário de Projetos Estratégicos da prefeitura, disse que a implantação do projeto representará uma empreitada sem precedentes no Rio de Janeiro
civilizações muito mais adiantadas nos copiaram, e deixamos nossas crianças com dentes estragados correndo no meio do valão e depois morrendo por bala perdida? O Rio de Janeiro precisa desse projeto, mais até do que o povo de Rio das Pedras. Temos que mostrar solidariedade, que respeitamos esse povo trabalhador. Ali não tem tráfico de drogas. A maioria dos moradores — o doutor Levinsohn me mandou uma pesquisa e já havia me falado sobre isso — são os nossos garçons. Cada vez que a gente senta num restaurante com a nossa família, com nossos filhos, nossos amigos, vem lá uma pessoa de Rio das Pedras, sorridente, esquecendo que à noite vai ficar numa casa com cheiro de esgoto e que seus filhos estão correndo num valão. No comércio, quando você se dirige a um balcão, é recebido por uma mocinha simpática, bonita, bem vestida, mas que depois volta para o seu pesadelo. Até quando? Até quando vamos dizer a nós mesmos que não podemos, que temos de cavar estacas, que fica muito difícil, que é complicado. Chegou a hora de dizer que vamos fazer, custe o que custar. Quero, por favor, pedir aos meus companheiros que subam à tribuna com entu-
CONHEÇA MAIS DETALHES SOBRE O PROJETO NA PÁGINA 6
— Aquele povo trabalhador tem renda para pagar o financiamento. Outro que se confessou empolgado foi o subsecretário de Projetos Estratégicos da prefeitura, Luciano Teixeira. Para ele, a sua implantação representará uma transformação total na comunidade “numa empreitada sem precedentes no Rio de Janeiro”. O prefeito, porém, topou o desafio. E explicou: — Conseguimos extrair petróleo abaixo da camada pré-sal, desenvolvemos tecnologia que não havia no mundo inteiro e que civilizações muito mais adiantadas copiaram, mas deixamos nossas crianças com dentes estragados correndo no meio do valão e depois morrendo por bala perdida. Quero que nossos vereadores aqui presentes defendam essa gente, as nossas crianças, porque uma obra dessa magnitude e alcance social é mais importante do que o pré-sal.
siasmo na Câmara de Vereadores. Que defendam nossa gente, que lutem por ela e que digam, bem alto, que vale mais nosso povo, as crianças das nossas comunidades, até mesmo do que o pré-sal. Gostaria de dizer aos empreendedores que não haverá prejuízo. Aquele povo tem renda para adquirir seus imóveis por um preço que vai pagar a obra. A prefeitura vai negociar Cepacs e a Caixa Econômica vai financiar. Então, doutor Carlos Carvalho, não precisa botar a mão no bolso. Fica tranquilo que a Caixa Econômica vai nos ajudar. Vamos ter os recursos, fazer toda a infraestrutura, vamos subir aqueles prédios. Deus criou aquele lugar tão aprazível, mas que infelizmente se tornou um lugar muito difícil de as pessoas poderem morar. Eu sonho que um dia uma pessoa, uma família de trabalhador, vai poder chegar na varanda de um daqueles prédios, olhar para a direita e ver o shopping center, a Península, a lagoa, a praia da Barra. Vai olhar para o outro lado e ver a floresta, frondosa, onde nasce o rio que hoje é uma vala negra que desagua na lagoa. Chegaram a apelidar o rio sabe de Veneza do Cocô. Um rio tão bonito que Deus criou, não para que fosse isso. Cabe a nós fazer com que esse rio volte a ser limpo, bonito, e que todos em Rio das Pedras tenham uma condição de vida digna e de qualidade. Peço a vocês para que possamos estar unidos para enfrentar os grandes desafios que teremos pela frente. Muito obrigado.
A gente trabalha a vida toda e não tem casa própria. Se Deus quiser vou sair do aluguel. Essa obra vai ajudar muita gente que precisa” Pedro das quentinhas
Amenizem os danos que venham comprometer mais ainda esse lugar que recebeu um povo sofrido, carente de amor de respeito”
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Kakau Moraes
RIO, 29 DE MAIO DE 2017
MORADORES FALAM SOBRE O QUE A claudiamulti@uol.com.br
Sâmia Patrícia, 25, operadora de caixa ”Vim do Norte há 2 anos. Moro no Alto do Pinheiro. Quando chove é um horror. Seria muito bom se tivesse um financiamento acessível para quem ganha um salário”
Marlene, 53, ambulante “Votei no Crivella. Estou há quase 40 anos em Rio das Pedras. Agora estou morando de aluguel na rua do Meio. Nunca ninguém fez nada aqui. Espero que ele faça”
Pedro das quentinhas, 53 “A gente trabalha a vida toda e não tem casa própria. Se Deus quiser um dia vou conseguir sair do aluguel. Essa obra vai ajudar muita gente que precisa”
Kakau Moraes, 46, educadora social “Temos que nos preparar para não doer na gente quando as tempestades chegarem. Sempre dói. Amenizem os danos que venham comprometer mais ainda esse lugar que recebeu um povo sofrido, carente de amor de respeito”
Leandro Moura, 27, artista visual “Rio das Pedras é a 2ª maior favela do Brasil. Precisa urgentemente de reurbanização, mas também da conscientização dos moradores e empresários que constroem prédios enormes na favela”
Paulo Gleivison, 31, artista plástico “Sou morador da rua Velha. O projeto de urbanização para nossa comunidade, feita com a seriedade devida, será um grande progresso para a qualidade de vida dos moradores”
Dª Lazica, 74, protetora animal “Crivella, me ajude a ajudar os animais. Preciso de um terreno para transferir meu abrigo. Sou doméstica, está muito difícil manter mais de 200 cães e gatos num pequeno espaço. Precisamos de muita ajuda”
Rodrigo Moraes, 31, mestre Marabô “Prefeito, ajude a voltar o projeto ‘A Cara do Brasil’, que tirava muitas crianças das ruas da Areinha através do esporte. Eu dava aula de capoeira, judô e jiu-jitsu”
Arnon Silva, 27, cabeleireiro “Creio que vai melhorar muito a comunidade, sem falar que vai gerar trabalho pra galera que está precisando. Sucesso total. Eu super apoio”
Monique Barbara, 30, agente comunitária de saúde “A verdade é que a nossa senzala Rios das Pedras está chegando à casa grande-Barra com seus condomínios e shoppings de luxo. Desigualdade incomoda quando visíve”
Jean Souza, 23, auxiliar de depósito “Esse esgoto a céu aberto, na entrada do Amparo, está fazendo até comércio fechar as portas, em frente às Casas Bahia. Só Deus mesmo! Precisamos de mais caçambas de lixo. É muito grande essa comunidade.”
Gilberto Aquino, 40, cozinheiro “Sou cozinheiro e muito feliz na minha profissão. Ainda não conheço este projeto de urbanização”
Francisco Alves de Lima, 75, segurança ”Muitos já prometeram e até agora nada aconteceu. Pago um aluguelzinho aí. Será que com o Crivella essas casas vão sair mesmo?”
Antonio Carlos Ferreira, 69, aposentado “Acho uma boa. Espero que este projeto saia do papel. Precisamos de saneamento, a rua do Amparo está a maior vergonha”
Mazinho, 35, comerciante “Se vier uma chuva daquelas na Engenheiro... A cada dia há mais barracas no meio da rua, calçadas não tem mais. Vai piorar, tá ficando feio. Que a reurbanização venha logo Tomara que saia mesmo”
Que o projeto tenha uma visão aberta ao esporte e à cultura. Temos muitos talentos aqui na comunidade, o que falta é oportunidade” Felipe Cristovão
Seria fantástico se tivesse transporte de balsa daqui para a Barra. A gente não ia precisar enfrentar esse trânsito terrível todos os dias”
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Givanildo da Silva
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ACHAM DO PROJETO DA PREFEITURA Antonio José, 30, feirante “Se vem pra melhorar, para fazer o bem, tudo que vem pra melhorar é bom. Moro de aluguel. Tem que ver a proposta, se vai mesmo ser acessível”
Antonio, 30, mecânico “Olha! Sobre o projeto, a gente espera, né? Mas como São Tomé, a gente só acredita quando vê. Essa é a verdade”
Cauã, 17, feirante “Moro na Av. Engenheiro Souza Filho. Precisamos de praças para crianças, mais escolas, mais Clínicas da Família e bons médicos”
Rosana Santiago, 26, scrap designer “Tá mais que na hora de RdP virar bairro. Moro no Areal 2. A parceria com a Caixa Econômica vai ajudar o morador, o nordestino que vem pra cá construir sua vida e que estará pagando por algo que futuramente será seu”
Leandro Silva, 33, professor “O maior legado seria a criação de um terminal rodoviário. Resolveria engarrafamentos, falta de abrigos e banheiros nos pontos finais. É preciso coibir a ocupação das calçadas por carros e barracas de comerciantes”
Maicon Almeida, 31, técnico em segurança eletrônica “Tomara que dê certo! Hoje os únicos beneficiados são os donos de quitinete antigo. Conseguiram barato e agora querem cobrar valor de apartamento em Copacabana. Vamos morar em ambiente bom, com espaço e pagando algo que é nosso”
Tunika Nunes, 50, artesã “Grande prefeito Crivella, que Deus abençoe e te dê forças para administrar a nossa cidade falida. Votei no Crivella e vou votar sempre”
Francinede Gomes, 33, diarista “Quem sabe, desta vez, eu consiga sair do aluguel. Prefeito Crivella, gostaria de mais incentivo educacional para que não fiquem tantas crianças nas ruas”
Edilza Rangel, 48, cozinheira “Espero que o projeto acabe com o desrespeito à lei do silêncio na Av. Daniel Marinho e que os comerciantes infratores sejam multados. Ia engordar os cofres públicos”
Ronaldo Martins, 31, garçom “Moro no Rio das Pedras desde que nasci. Nunca dependi de pagar aluguel, mas acho que esse projeto vai ajudar muitos moradores a adquirir sua casa própria”
Robson de Souza, 38, técnico de perecíveis “Precisamos de um terminal de ônibus urbano e rodoviário, É frequente a entrada e saída de moradores para outros estados. Também há falta de abrigos nos pontos de ônibus”
Felipe Cristovão, 27, professor de taekwondo “Que o projeto tenha uma visão aberta ao esporte e à cultura. Um polo onde se possa trabalhar isso melhor. Temos muitos talentos aqui, o que falta é oportunidade”
Soly Lopes, 48, gestora social “Há quase 30 anos vivendo e compartilhando dos sonhos desse povo, vejo nessa articulação uma intenção nobre do prefeito. Que venha este projeto, que venha o melhor para nós. Obrigada Marcelo Crivella”
Bebel Santos, 55, comerciante “Prefeito Crivella. Você é a nossa luz no fim do túnel. Precisamos urgente da realização do seu projeto de reurbanização e de nos tornarmos bairro. Nos olham como comunidade (favela), nossos endereços não existem no mapa por não ter CEP. Precisamos de sua ajuda”
Givanildo da Silva, 35, ajudante “Moro em Rio das Pedras e trabalho na Barra da Tijuca, como muitos moradores daqui. Seria fantástico se tivesse transporte de balsa daqui pra lá. A gente não ia precisar enfrentar esse trânsito terrível todos os dias”
O nosso número zero estampava na manchete a voz dos moradores, em letras garrafais: “QUEREMOS VIRAR BAIRRO”. Conseguimos.
Antigo desejo dos nossos moradores, além da melhoria da mobilidade urbana, está previsto uma estação rodoviária no coração do bairro.
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O NOSSO DESEJO FOI ATENDIDO REPRODUÇÃO
PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA VAI GARANTIR MORADIA PARA TODOS OS MORADORES
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ão há coisa mais gratificante na vida do que a gente enfrentar um desafio, vencê-lo, e desabafar em tom triunfal: — Eu consegui! O sonho dos nossos moradores em ver Rio das Pedras transformada em um verdadeiro bairro tornou-se possível. O número zero do nosso jornal estampava na manchete a voz dos moradores, como mostra reprodução ao lado, em letras garrafais, pedindo: “QUEREMOS VIRAR BAIRRO” — Nós conseguimos. Como destaca um vídeo apresentado pela prefeitura no lançamento do projeto revelado pelas reportagens publicadas
nesta edição, com a união e o esforço de todos os segmentos da sociedade, grandes projetos saem agora do papel. A transformação da comunidade em bairro vai trazer obras de infraestrutura, mais mobilidade, com transporte aquaviário, mais habitação, lazer e serviços públicos. Segundo o projeto, através do programa Minha Casa Minha Vida serão construídas, na nossa comunidade, moradias de um e dois quartos para todos os nossos moradores, com toda a infraestrutura, em ruas arborizadas. A manchete desta edição reflete o sonho realizado. O prefeito Marcelo Crivella garante: “VAMOS VIRAR BAIRRO”
A prefeitura forneceu, com exclusividade para nosso jornal, informações técnicas e legais sobre o projeto, que vão publicadas a seguir: Trata-se de uma Operação Urbana Consorciada (OUC), modelo este previsto no Estatuto das Cidades e no Plano Diretor da Cidade do Rio de Janeiro estabelecido pela Lei Complementar 111, de 01/02/2011. Este modelo de OUC é também regulamentado por Lei Complementar (LC) específica para cada Operação e foi utilizada com muito sucesso no Rio de Janeiro na famosa e conhecida implantação do Porto Maravilha, conforme a LC 101/2009, que permitiu a revitalização urbana da então degradada Região Portuária do Rio, que possibilitou a transformação em um novo bairro, com 5 milhões de m2, totalmente infra estruturado, contemplado com saneamento universal, abastecimento de água, energia, fibra ótica para dados, novas redes de drenagem, iluminação pública sustentável à base de Leds, pavimentação, passeios, praças públicas, entre outras. Importante ressaltar que os recursos para realizar estas intervenções, num volume de R$ 5 bilhões, não saíram dos cofres municipais, impostos ou outras fontes públicas, mas sim, foram provenientes da iniciativa privada, através da venda de títulos públicos, aprovados pela Lei Complementar 101/2009 e regulado pela CVM, denominados de Certificados de Potencial Adicional Construtivo, conhecidos como Cepacs. Os Cepacs são traduzidos em valores monetários por metro quadrado de Potencial Construtivo Adicional. Ou seja, um valor por metro quadrado que se valoriza em função da demanda do mercado imobiliário e dos benefícios provenientes das intervenções urbanas que revitalizam as regiões em questão. Em continuidade à lei que estabelece a OUC, ou até mesmo simultaneamente, a prefeitura abre uma concorrência pública para definir o Consórcio Construtor que acatará as obrigações de realizar as obras e serviços públicos, bem como pelos serviços de operação e manutenção dos serviços públicos de sua obrigação, tais como limpeza urbana, iluminação pública, manutenção e conservação dos espaços públicos, entre outros. Estes custos são bancados pelos recursos provenientes dos Cepacs. O modelo de OUC com Cepacs não ocorreu apenas no Rio de Janeiro. A cidade de São Paulo utilizou-se deste programa anteriormente na operação das Águas Espraiadas, que transformou uma região deteriorada por construções irregulares, favelização e sem infraestrutura, no local de maior valorização da cidade de São Paulo, recebendo a famosa Ponte Estaiada, novo cartão postal da cidade. Todos os investimentos ali foram provenientes da venda de Cepacs.
FUNDADOR Ronald Guimarães Levinsohn
ENTENDA OS PRINCIPAIS DETALHES DA OPERAÇÃO URBANA QUE O PREFEITO APRESENTOU NO PALÁCIO DA CIDADE Esta introdução torna-se necessária para servir de entendimento e comparação ao modelo de OUC que está sendo proposto para o Rio das Pedras. Trata-se de uma Operação Urbana Consorciada, que será iniciada através de uma Convocatória para um Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI). Nesta Convocatória, serão convidadas empresas, escritórios, SPEs ou Consórcios que se interessem em elaborar os estudos, projetos, relatórios e análises de diversas matérias definidas na Convocatória, entre elas os temas técnicos, jurídicos, de legislação, de viabilidade econômica e financeira, as questões ambientais, as relativas ao impacto de vizinhança, de desenvolvimento social, entre outros. Para tanto, será necessário a montagem de uma equipe multidisciplinar capaz de resolver, atender e apresentar as soluções preconizadas no edital da PMI. Os concorrentes serão anali-
sado s pelo curriculum das empresas e dos profissionais componentes do grupo, tendo em vista seus conhecimentos, notória especialização e experiência em trabalhos similares. A PMI define um valor máximo de gasto com a contratação dos estudos, tendo em vista que o mesmo poderá vir a ser reembolsável, caso o vencedor da PMI não seja o mesmo grupo vencedor da fase posterior, ou seja a concorrência para a PPP. Uma vez escolhida a equipe da PMI, a Prefeitura emite uma Autorização para prosseguimento dos estudos. Ao fim dos mesmos, a Comissão da Prefeitura analisará os trabalhos apresentados e deliberará pela aprovação total ou parcial. A PMI tornará, assim, o documento técnico necessário ao segundo passo do processo, ou seja, o Edital de Concorrência da PPP. No caso específico do Rio das Pedras, os estudos técnicos abrangerão os seguintes pontos:
1) projeto urbanístico da região da comunidade a ser reestruturada;
2) projetos arquitetônicos das unidades residenciais tipo MCMV;
3) projetos arquitetônicos e urbanísticos para as áreas públicas e equipamentos comunitários; 4) estudos ambientais, impactos, mitigações etc; 5) elaboração do EIA RIMA; 6) elaboração do estudo de impacto da vizinhança (EIV); 7) estudo sobre os solos; 8) apresentação de sondagens dos solos; 9) estudos sobre as fundações das edificações; 10) estudos e lançamentos estruturais das edificações; 11) projeto básico de saneamento universal; 12) projeto básico de infraestrutura: água, energia, gás, drenagem, iluminação pública, comunicação, lógica etc; 13) orçamentação de custos de infraestrutura, construções e demais; 14) estudos de viabilidade econômica financeira; 15) estudos e pesquisas com modelagem para definição do valor das Cepacs; 16) proposta de legislação sobre a OUC, legislação do uso do solo, parâmetros edilícios e construtivos para a região da comunidade e das áreas vizinhas que receberão os novos coeficientes de adensamento constituintes das Cepac 17) delimitação da área de influência da OUC; 18) estudos jurídicos sobre a PMI, PPP e OUC; 19) estudos de impactos sociais e qualidade de vida; 20) estudos sobre a mobilidade, transportes públicos e melhorias viárias de acessibilidade e deslocamentos;
UM MODELO DE REVITALIZAÇÃO O projeto consistirá em implantar infraestrutura completa e total em toda área atualmente ocupada pela comunidade Rio das Pedras, com superfície de 854.000 m2, incluindo saneamento universal com lançamento do esgoto tratado na rede da Barra e emissário submarino, abastecimento de água, energia elétrica, gás canalizado, rede de informática, drenagem, iluminação pública, construção de vias públicas passeios, praças, parques de lazer, construção de escolas, creches e rede de saúde pública. Todas as ruas de Rio das Pedras receberão um completo circuito cicloviário, permitindo o deslocamento rápido às localidades vizinhas, estando previsto uma estação rodoviária no coração do bairro. Além desses investimentos de infraestrutura, está sendo previsto a melhoria da mobilidade urbana, com construção de novos acessos e ligação à Barra, Itanhangá e Jacarepaguá, com pontes, elevados, viadutos e mergulhões de forma a permitir melhor escoamento do transito da região. A
DIRETOR-RESPONSÁVEL Aziz Ahmed Reg.10.863 – MTPS
REDAÇÃO Laerte Gomes
azizahmed@uol.com.br
Claudia Gonzaga
TRATAMENTO DE IMAGENS Eduardo Jardim
gomes.laerte@gmail.com claudiamulti@uol.com.br
EDIÇÃO ESPECIAL Tiragem: 30 mil exemplares
implantação do sistema de transporte aquaviário, com ligações à estação do Metrô, aos sistemas de BRT da Transcarioca e Transoeste, shoppings e terminal Alvorada, integrará a região com transporte lagunar sustentável. Rio das Pedras receberá novo traçado arquitetônico, com avenidas, parques e ruas projetadas, com a consequente criação de quadras residenciais e comerciais, regularizadas e legalizadas, que permitirá a implantação e construção de edifícios de até 13 pavimentos destinados a apartamentos, lojas e escritórios, através do sistema Minha Casa Minha Vida, com financiamento da Caixa Econômica Federal, com direito à título de propriedade e registro geral de imóvel. Será um modelo de revitalização total de uma comunidade, onde, pela primeira vez no Brasil, uma Prefeitura investirá na completa infraestrutura de serviços e transformará residências informais, em unidades habitacionais de qualidade e dignidade humana para os seus cidadãos e moradores.
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O Censo dos Moradores, realizado pelo Núcleo de Pesquisas e Cidadania da UniverCidade em Rio das Pedras, deu subsídios para o projeto da prefeitura.
Vejo em Rio das Pedras um povo guerreiro, trabalhador, porreta, para usar a linguagem predominantemente nordestina da comunidade.”
7 RIO, 29 DE MAIO DE 2017
Cláudia Franco, coordenadora das pesquisas na comunidade
ENTREVISTA/ CLÁUDIA FRANCO CORRÊA
A SENSAÇÃO DO DEVER CUMPRIDO FOTO ARQUIVO PESSOAL
azizahmed@uol.com.br
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rofessora de Direito e pesquisadora, Cláudia Franco Corrêa chegou a Rio das Pedras em fins de 2007. Num trabalho pioneiro, logo mergulhou numa pesquisa sobre a ocupação desordenada e o mercado imobiliário da nossa comunidade. Daí surgiu o material para escrever um livro sobre direito de laje, hoje consagrado por medida do governo. Além disso, comandou o Núcleo de Pesquisa e Cidadania da UniverCidade em Rio das Pedras, que oferecia serviço de atendimento jurídico gratuito aos nossos moradores. Paralelamente, coordenou várias pesquisas, uma delas, o maior censo já feito numa favela: sua equipe ouviu 22.223 moradores durante dois anos. Os resultados desse Raio X serviram ao prefeito Marcelo Crivella para orientar sua equipe na elaboração do plano para transformar Rio das Pedras em bairro, principal assunto abordado nesta edição. Respaldada numa for te experiência com os problemas locais, ela concedeu ao nosso jornal a seguinte entrevista:
— Durante oito anos você coordenou o Núcleo de Pesquisas e Cidadania da UniverCidade em Rio das Pedras. Qual o balanço que faz do seu trabalho? — O balanço que faço é o de dever cumprido. Tenho orgulho do que fizemos em Rio das Pedras. Além de ter realizado pesquisa de campo na comunidade para minha tese de doutorado, falando sobre direito de laje — tese pioneira no assunto, que me trouxe reconhecimento como pesquisadora no Brasil —, atendemos quase cinco mil pessoas, realizamos algumas pesquisas importantes, que se tornaram referências para desenvolvimento de trabalhos sociais ainda hoje. A primeira foi o Levantamento Territorial de Rio das Pedras, quando mapeamos a comunidade, identificando mais de 300 ruas e becos. Entrevistamos quase quatro mil comerciantes. Atuamos em conjunto com a Universidade de Columbia, em uma pesquisa importantíssima na área da saúde pública e, por fim, entrevistamos 22.223 moradores de Rio das Pedras, o que nos possibilitou traçar um perfil real da co munidade. O trabalho, desenvolvido com total apoio da UniverCidade, foi pioneiro e de alto nível. Ainda tem o jornal A Voz de Rio das Pedras, que é, sem dúvida, a maior iniciativa de comunicação de uma favela no Brasil. Nada se compara ao trabalho realizado por esse jornal. Quais foram as maiores demandas? — Em primeiro lugar, as questões familiares. Mas também recebemos muitas reclamações na área do direito do consumidor. Com a ascensão econômica das classes C e D durante aquele período, notamos um aumento considerável de queixas na seara do consumidor em Rio das Pedras. Tínhamos, ainda, um nível de demanda bem considerável referente a conflitos entre vizinhos. No geral, antes de levar qualquer questão para o Judiciário, tentávamos a mediação. Quando conseguíamos, era um sucesso. Muito antes de o Judiciário enaltecer a mediação, já atuávamos com os alunos da UniverCidade nessa atividade. Aliás, isso foi outra coisa pioneira que a UniverCidade fez. O trabalho foi tão sério, e com resultados tão satisfatórios, que serviu de tema para tese de mestrado e doutorado de pesquis adores. Na sua convivência na nossa comunidade, quais os principais problemas que identificou? — Principalmente, a carência na área da educação. Somente a educação pode dar efetiva oportunidade de crescimento social e econômico. As crianças ficam muito pouco tempo nas escolas. Aliás, isso era o que mais chamava a atenção dos pesquisadores estrangeiros que vinham conhecer Rio das Pedras. Ficavam assustados com a presença de crianças nas ruas no horário em que deveriam estar nas escolas. A falta de saneamento básico e o excesso de ocupação do solo, também chamam atenção. Não existe área de la-
COORDENADORA DO CENSO QUE MOSTROU À PREFEITURA O CAMINHO DAS PEDRAS FESTEJA O RESULTADO zer ao ar livre de maneira efetivamente pública. O que se tem de divertimento está reservado a bares e restaurantes. Isto é muito complicado, principalmente para jovens e crianças. O bar não pode ser a única opção de lazer para os mais novos. Por fim, o lixo é um velho problema de Rio das Pedras, que diminuirá não só com uma permanente atuação do Estado, como, sobretudo, com a conscientização efetiva dos moradores. Pobreza não é sinal de sujeira. Durante a apresentação do seu projeto para urbanizar, sanear e verticalizar as habitações de Rio das Pedras, o prefeito do Rio citou dados do Censo dos Moradores, que você coordenou. Em que consistiu esse trabalho? — A pesquisa é uma ferramenta muito importante para desenvolver melhorias em qualquer setor da atividade humana. Isso ocorre, por exemplo, com a pesquisa de mercado, quando uma empresa deseja saber se o seu produto ou serviço será bem absorvido em determinada região ou até mesmo qual o melhor produto a ser oferecido, o que dependerá do perfil da comunidade. O nosso Censo consistiu em traçar um perfil verdadeiro dos moradores e suas principais demandas. Através dele foi possível identificar desde a quantidade média de moradores por residência até o time de futebol preferido por eles. Da quantidade de imóvel alugado, da renda familiar, profissão, até a religião mais praticada em Rio das Pedras. Uma política de
Estado séria, com envolvimento na área habitacional de forma comprometida, precisa partir de dados consistentes. P ortanto, entendo que a pesquisa é uma ferramenta concreta de auxílio para as futuras intervenções que o prefeito pretende realizar para transformar Rio das Pedras não só em um bairro, mas, sobretudo, em um exemplo de ação que priorize a dignidade da pessoa humana. Sente-se recompensada de o Censo haver servido de base estatística para o plano da prefeitura? — Quando me formei em Direito, há quase 30 anos, tinha o sonho de fazer algo que valesse a pena para aos mais necessitados. Sou de origem simples. Nasci em Madureira e lá me criei. Sempre observei a dureza da vida dos mais humildes, principalmente o que é não ter um teto para chamar de seu. Então, sinceramente, sinto-me mais do que recompensada. Sinto-me honrada e espero que, de alguma maneira, possa ter contribuído para a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Que informações mais relevantes você destacaria desse trabalho? — A grande importância está no fato de que tais pesquisas mostraram a verdadeira face de Rio das Pedras. Traçando um perfil efetivo da comunidade é que se pode realmente implantar melhorias sérias e que atendam as reais necessidades, e não suposições. Somente ouvindo as pessoas é que temos
a verdadeira dimensão do que elas precisam. Foi pesquisando que hoje temos o conhecimento do número de comerciantes e suas queixas e reinvindicações. A pesquisa feita com quase 23 mil moradores revelou a maior radiografia em uma favela no Brasil, o que vem sendo estudado por alguns pesquisadores nacionais e até estrangeiros. Certamente isto reverterá em benefícios da população. Por força da nossa pesquisa na área de saúde pública foi possível saber a qualidade da água que bebemos e as principais doenças existentes em nossa comunidade. Que mensagem você gostaria de transmitir aos moradores. — Já dizia Fernando Pessoa, “porque eu sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura…” O que vejo em Rio das Pedras é um povo guerreiro, trabalhador, porreta, para usar a linguagem predominantemente nordestina da comunidade. Muitos vieram com a cara e a coragem das entranhas do Brasil, com um sonho, uma esperança de dias melhores, de uma vida melhor. Somos do tamanho daquilo que sonhamos. Agradeço hoje e agradecerei sempre pelo tanto que aprendi com a minha passagem por Rio das Pedras. Foram muitas conquistas e aprendizados. Que o sonho que um dia tive de ver esse lugar tão querido tornar-se um bairro — como esse projeto da prefeitura pretende transformá-lo —, possa se tornar realidade.
Há um diálogo com o prefeito atual, como havia com anterior, e, naturalmente, com a discussão de assuntos que interessam à população”
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Dom Orani Tempesta, cardeal arcebispo do Rio de Janeiro
FOTOS DE GUSTAVO DE OLIVEIRA / ARQUIDIOCESE DO RIO
azizahmed@uol.com.br
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a mais recente vinda à nossa comunidade, Dom Orani Tempesta rezou a missa do Dia do Trabalho, dia 1º de maio último, na matriz da nossa paróquia São João Batista. Perante dois mil paroquianos, o cardeal arcebispo do Rio de Janeiro reconheceu o grave momento que vive o país, mas pregou a fé e a esperança no futuro, “porque o cristão sabe que com o trabalho ele constrói o mundo”. Sobre o projeto da prefeitura em transformar Rio das Pedras em bairro, financiar casa própria para os moradores e urbanizar a comunidade, ele disse, nesta entrevista ao nosso jornal, que toda iniciativa que venha a dar mais dignidade às pessoas é sempre bem-vinda. No próximo dia 23 de junho, dom Orani completa 67 anos de idade e não será surpresa se aparecer na nossa paróquia para manter a tradição de comemorar junto ao nosso povo, onde confessa q ue se sente feliz.
O sr. celebrou a Missa do Dia do Trabalho na nossa paróquia. Que mensagem transmitiu aos paroquianos? — A Arquidiocese do Rio de Janeiro tem uma tradição, antiga, de celebrar o Dia do Trabalhador em diversos locais significativos, seja anunciando a mensagem oficial da Pastoral Social para os trabalhadores, seja reunindo todas as Pastorais da Arquidiocese. Neste ano, tivemos a oportunidade de celebrar na matriz de Rio das Pedras, não só com o povo dessa comunidade, como também com representantes de toda a Arquidiocese. Diante da situação grave que hoje vivemos, de desemprego, de falta de pagamento de salários e de insegurança social, falamos da importância de estarmos sempre preocupados em olharmos para o futuro e ajudar o País a partir para uma situação melhor, em que haja trabalho digno para todos, para que todos possam viver com dignidade. Falamos também da visão cristã do trabalho, porque o cristão sabe que com o trabalho ele constrói o mundo, a humanidade, porque devido ao pecado, como fala a Escritura, entra também a injustiça. Quanto mais salmos em Jesus Cristo, mais queremos voltar às origens, estabelecendo para mudar este mundo para que construamos um mundo melhor e cuidemos do mundo de Deus. O sr. sempre prestigiou Rio das Pedras, inclusive festejando na sede da paróquia o seu aniversário. Falta menos de um mês para o sr. completar 67 anos. Pretende cumprir a tradição de comemorar com missa, seguida de almoço, na nossa comunidade? — Com relação à minha ida a Rio das Pedras, à Paróquia de São João Batista, confesso que fico muito feliz, porque muito antes de ser paróquia eu frequento esta região, como também outras da Arquidiocese. Dependendo da situação, a cada circunstância, como de inauguração, meu aniversário comemoro em diversos locais. Neste ano, inclusive, nem sei se vou estar no Rio de Janeiro, dependendo dos meus compromissos. O importante é que vamos estar sempre unidos, caminhando com o povo de Rio as Pedras
Ao povo de Rio das Pedras, nosso apreço, minha admiração pelo trabalho, pela missão, pela vida do povo de Deus que aqui caminha”
RIO, 29 DE MAIO DE 2017
Dom Orani Tempesta
ENTREVISTA/ DOM ORANI TEMPESTA
TODA MELHORIA É BEM-VINDA DOM ORANI DIZ QUE APOIA QUALQUER PROJETO QUE DÊ CASA PRÓPRIA E DIGNIDADE ÀS PESSOAS
Há, como se apurou no censo, 22% que não
O prefeito Marcelo Crivella acaba de lançar um projeto para transformar Rio das Pedras em bairro, urbanizar e sanear a favela, erguer 30 mil apartamentos em prédios de 12 pavimentos e destiná-los aos moradores dentro do programa Minha Casa Minha Vida. Como o sr. vê esse projeto? — Todo projeto que venha para melhorar o bairro, para dar mais dignidade às pessoas, dar emprego, saneamento, escola, saúde e, ao mesmo tempo, também residência, é sempre bem-vindo. O importante é que atenda à população, trabalhe junto com a ela e possa proporcioná-la o melhor possível. No Dia de São Jorge, o sr. afirmou que se o santo guerreiro vivesse hoje no Rio teria de derrotar dezenas de dragões, como o da violência e da falta de habitação digna, educação, saúde e trabalho. Quais os dragões que teriam de ser eliminados em Rio das Pedras? — No Dia de São Jorge celebro com o povo, que tem uma devoção muito grande ao santo. Sabemos que naquela figura mítica de São Jorge aparece também o dragão. Podemos traduzir hoje que São Jorge é um exemplo de cristão que não desanimava diante das dificuldades. Logo, quando se fala de São Jorge, aquele que vence os dragões, também significa que temos muitos dragões que hoje ameaçam a vida das pessoas: o do desemprego, da violência, da falta de unidade na família, da redução do salário. Enfim, são esses os dragões que precisam ser vencidos. E cabe a nós se inspirar na vida de São Jorge para nos animarmos e sabermos que, se Jesus Cristo ressuscitou dos mortos, temos a certeza da vida para sempre.
Dom Orani distribui bênçãos às crianças e, junto aos padres Marcos, Márcio e outros membros da Arquidiocese, também asperge água benta em velas no altar da matriz
Pesquisa feita pelo nosso núcleo de cidadania, ouvindo 23.223 moradores, revelou que 42% deles são cristãos católicos, 26% cristãos evangélicos, 10% espíritas e 22% não têm religião. Sua presença frequente em Rio das Pedras pode ter contribuído para esse resultado? — Creio que a presença católica em Rio das Pedras deve-se a esse povo de Deus, que é uma tradição do Nordeste, de um povo muito católico, fervoroso. Também a ação do padre Marco Vinicius, do padre Márcio, tem levado adiante, com toda a sua equipe, o trabalho de evangelização, a formação de comunidades, catequese, ciclos bíblicos, a presença de alimentar os cristãos católicos com a palavra de Deus, com o sacramento e com entusiasmo cristão. Creio que isso se deve à tradição do povo de Rio das Pedras e também aos padres que ali caminham.
maneira concreta, muito popular, junto ao povo de Rio das Pedras. Vejo que, realmente, a presença, a participação, tem feito essa sintonia entre os padres e o povo, e tem levado a um crescimento na fraternidade e, ao mesmo tempo, na presença de valores cristãos e católicos nesta comunidade.
têm religião. A Igreja cogita realizar algum trabalho pastoral para arrebanhar essas “ovelhas desgarradas”? — A questão dos sem religião é um fenômeno muito carioca. No Rio de Janeiro, devido à migração religiosa, acabam as pessoas, depois de tantas migrações, não migrando para religião alguma, ficando apenas uma pessoa religiosa sem igreja, sem uma religião específica. A Igreja Católica deu o anúncio. O anúncio da boa notícia, respeitando a diversidade e a opinião de cada um, que tenha em mente que, se chamado, será acolhido. Na verdade, a nossa obra pastoral é sempre aberta a todos para a formação dos católicos e o anúncio da boa notícia para as pessoas. O sr. tem manifestado apreço pelo trabalho do padre Marcos Vinicio à frente da paróquia. E tem revelado bons resultados? — O padre Marco Vinicius tem formação acadêmica muito importante, como o padre Márcio também. Isso se pode traduzir pela
Quando lhe perguntam sobre suas relações com o prefeito carioca, sabidamente pastor evangélico, o sr. sempre enfatiza as relações amistosas e institucionais entre a Arquidiocese e a Prefeitura. Tem sido assim? — O nosso relacionamento com as autoridades é de respeito e colaboração naquilo que seja possível e, também, firme na necessidade de criticar quando necessário. Creio que nesse aspecto estamos exercendo a nossa liberdade enquanto cidadãos. Há, sem dúvida, um diálogo com o prefeito atual, como havia com anterior, e, naturalmente, com a discussão de assuntos que interessam à população. Se você observar adiante, há pouco tempo que nós temos para esse tipo de conversa e relacionamento. Que mensagem o sr. gostaria de deixar para o povo de Rio das Pedras? — Ao povo de Rio das Pedras, nosso apreço, minha admiração pelo trabalho, pela missão, pela vida do povo de Deus que aqui caminha. Ao mesmo tempo bendizer a Deus pela caminhada feita, não só na igreja como em todo o bairro de Rio das Pedras, que possa continuar sendo presença cristã e transformadora para uma vida mais justa e cristã.