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Por Paulo Miguez
A rua é um lugar especialmente importante para a cidade da Bahia, essencial para a realização de suas tramas culturais. Aqui, na velha Salvador, em prece ou em festa, atrás do santo ou atrás do trio, o que nunca falta é gente, muita gente pra entrar em beco e sair de beco, pra subir ladeira e descer ladeira, pra ocupar uma rua, muitas ruas, e, não poucas vezes, áreas inteiras da cidade. Mas não só fé e folia garantem o rico colorido das ruas de Salvador. Pelo intenso bulício das ruas responde, também, um sem-número de pessoas que, obrigadas a enfrentar o cotidiano de desigualdade e exclusão que apequena e faz sofrer a maior parte do povo da cidade, recorre à informalidade para trabalhar, ocupando o espaço urbano. Pequeníssimos negócios, muitíssimos negociantes. Oferecem de um tudo. De quitutes da culinária baiana a capas e carregadores de telefones celulares. Muitos ocupam pontos fixos em vários lugares da cidade com suas barracas, seus tabuleiros. Muitos outros, estes bem mais numerosos ainda, são vendedores ambulantes, presença intensa e indisfarçável no cotidiano da cidade. Em dias de festa, como o Carnaval, os ambulantes chegam a algumas poucas dezenas de milhares nas ruas. Aliás, até parece regra, não há aglomeração possível em qualquer ponto de Salvador, seja qual for o motivo, que rapidamente não venha a contar com os serviços e produtos de algum ambulante. Ou seja, juntou gente, tem vendedor ambulante na área.
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Há mais de 40 anos compõe esse numeroso e diversificado conjunto de trabalhadores informais que transitam pelas ruas de Salvador um tipo muito especial de ambulantes. São os vendedores de cafezinho. No início, apenas crianças na função, algumas mal passando dos 10 anos. O equipamento, chamado de guia de mão, pra lá de simples: um pequeno caixote de madeira acomodando garrafas térmicas – a quantidade de garrafas na dependência da força física do garoto vendedor – e uma ripa passando por cima das garrafas para permitir o caixote ser carregado. De lá pra cá, bem sabemos, permaneceram inalteradas as condições de vida que empurraram para o mercado informal de trabalho da cidade um número significativo de pessoas; ainda é grande a precariedade com que os ambulantes desempenham suas atividades nas ruas da cidade, e o trabalho infantil, perversidade antiga na vida da cidade, continua presente – hoje, muitos “cafezinhos” ainda são crianças e jovens, embora já haja bastantes adultos, alguns trabalhando no ramo do “menorzinho” desde a infância. Por outro lado, desgraças à parte, o comércio do “menorzinho das ruas”, realizado pelos ambulantes que atendem pelo apelido de “cafezinho”, continua a ter lugar garantido na preferência de variada e numerosa clientela que circula pelo centro da cidade, no dia a dia. São rodoviários, trabalhadores do comércio varejista popular, office-boys, taxistas, vigilantes, porteiros, entregadores, outros trabalhadores informais – cliente é o que não falta para o cafezinho, que pode ser puro ou com leite, ou para um chocolate quente, um sanduíche, um salgadinho, uma balinha, um doce. O que mudou mesmo ao longo do tempo foi o equipamento, a ferramenta de trabalho dos vendedores de cafezinho, o pequeno caixote com garrafas térmicas, suspenso por uma ripa de madeira. Primeiro, ganhou rodinhas. Passou de guia de mão a guia com
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rodinhas. Na sequência, a combinação caixote, rodinhas e muita criatividade deu no que deu, o carrinho de café. Difícil descrever a riqueza de detalhes de muitos dos carrinhos de café que circulam pelas ruas do centro de Salvador, alguns parecendo verdadeiros minitrios elétricos. A imaginação aí corre solta. Talento e criatividade não faltam. Reutilização e reciclagem de materiais, inovações mecânicas para melhorar a direção dos carrinhos, incorporação de equipamentos de som e imagem para entretenimento da clientela, e mais: iluminação cenográfica, fitas, retratos, letreiros, adereços, alegorias, escudos do time de futebol do coração e o que mais possa trazer cor e graça para encantar clientes e transeuntes. A evolução e sofisticação técnica e estética experimentada pelos carrinhos de café transformou-os de meros instrumentos de trabalho em objetos de arte. Passaram a integrar acervos de museus, a estar presentes em exposições dentro e fora do país, a ser objeto de estudos e pesquisas no mundo acadêmico, e estrelaram um documentário. Todavia, se a transformação do caixote em carrinho se deveu às manhas e artes dos vendedores, não foi apenas a evolução técnica e artística que lhes garantiu uma visibilidade para além do espaço das ruas. Para isso, foi decisiva a figura de um francês nascido no Marrocos, que correu mundo, mas assentou praça na cidade da Bahia há muito tempo. Trata-se de Dimitri Ganzelevitch, entre nós (mas já um de nós, é bom que se diga) desde a metade dos anos 1970. Profundamente ligado ao universo das culturas populares, a Dimitri, olho vivo e faro fino como apreciador e colecionador de objetos de arte e militância aguerrida na defesa do patrimônio e das artes populares, não escaparia a riqueza e sofisticação dos carrinhos de café. E não escapou. Em 1987, ele promoveu o 1° Concurso de Guias
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e Carros de Cafezinho. Até 2007, Dimitri conseguiu organizar mais 12 edições do certame. De lá pra cá, não pode mais realizá-lo por falta de apoio oficial mais robusto. "Tem nada não", como se diz aqui na Bahia. Dimitri não desiste – e não desiste da sua paixão e de seu cuidado pelas culturas populares, ao que parece, desde que, aos 14 anos, à beira do Saara, adquiriu as duas primeiras peças de artesanato às quais foi juntando muitas outras dos tantos lugares por onde passou vida afora e que hoje dão corpo ao acervo de sua Casa-Museu, no bairro de Santo Antônio Além do Carmo. Assim é que, se Dimitri não pode realizar o concurso dos carrinhos de café, ele faz um... livro. Este livro. Agora, um cafezinho e boa leitura!! Paulo Miguez é Professor da Universidade Federal da Bahia.
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Por Dimitri Ganzelevitch
Ia descendo o largo do Pelourinho. Dois garotos, 13, 14 anos, sentados nas suas guiase, olhando para mim, fizeram um comentário entre eles. Me aproximei. – E aí! Tudo bem? Tão falando de mim? O mais velho respondeu: – É o senhor que faz o concurso? – Sim, sou eu. – Pô! O senhor deve se dar bem... – Como assim? Dando uma risadinha, o menino meteu a mão no bolso. Me senti apunhalado. Mas como não entender a colocação? Essa gente tão maltratada, tão desprezada, como imaginaria que alguém pudesse fazer algo por eles sem fim lucrativo? – Não, meu amigo! Não é bem assim. A grana que consigo nunca dá pra tudo. Sempre tenho que tirar algum de meu bolso. O olhar deles duvidando... eGuia: caixa retangular de madeira para transportar garrafas térmicas.
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Mas era verdade. Durante 13 concursos em mais de 20 anos, meu desejo sempre foi o de valorizar o trabalho e a criatividade dos vendedores ambulantes de cafezinho. Não de "me dar bem" à custa deles. A ideia do concurso nasceu por acaso de uma breve conversa com o dono de um carrinho enfeitado que nem trio elétrico. O homem se queixava da perseguição dos temidos rapase da prefeitura, que não hesitavam em sequestrar seus instrumentos de trabalho, único meio de subsistência de famílias inteiras. Levavam impiedosamente o carro. Só seria devolvido mediante pagamento de pesada multa. As queixas não eram esporádicas, eram constantes. Sempre me chamou a atenção a crueldade das administrações municipais no trato com os trabalhadores de rua, sejam vendedores de café, de água de coco, de folhas, de vassouras ou de frutas, todo esse povo humilde que parece sair de antigas gravuras de Debret, ilustrações denunciando constrangedora injustiça social. ... eRapa: fiscal da prefeitura que apreende, nas vias públicas, mercadorias à venda sem licença prévia.
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Acabo de descobrir um texto meu, escrito no princípio dos anos 1990. Pode ser um moleque sorridente, bermudão, camisa aberta. Uma gordinha bem-arrumada. Ou um ancião cansado, sem mais expressão no rosto. Pode ser uma guia, pequeno suporte de madeira para duas, três garrafas térmicas. Ou um carrinho, longo e estreito veículo com rodas, volante e retrovisor. Dependendo da energia do “motorista”, poderá conter 10 ou mais garrafas. Com peso que varia entre 5 e 20 quilos, centenas de vendedores de café alegram, com o rérrrrrr dos rolimãs e o som caprichado de seu rádio, as praças e ruas de Salvador, deslizando, vaidosos, seus magníficos brinquedos de sobrevivência. De Salvador e de nenhuma outra cidade do Brasil. Ou do mundo. [...] Não seriam, no imenso anonimato global dos deserdados, os irmãos dos engraxates turcos, dos vendedores de água marroquinos e dos rickshaws cubanos?
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Com um punhado de amigos, tinha fundado um grupo cuja proposta era defender algumas expressões culturais pouco valorizadas. Elaborar a lista completa dos colaboradores me seria hoje difícil. Alguns participaram ativamente durante anos, outros esporadicamente. As motivações também foram diversas, nem sempre condizentes com a minha expectativa. Mas tal uma escada cujos degraus são irregulares, a Associação Cultural Viva Salvador foi progredindo lentamente, dando uma contribuição significativa à cultura da Bahia. O concurso de carros de cafezinho costumava acontecer na traseira do Mercado Modelo, em espaço aberto, protegido porém das intempéries. Só em duas ocasiões, por razões esquecidas, foi hospedado na estação da Lapa, perto do largo da Piedade, uma delas sob a presidência do famoso carnavalesco Joãozinho Trinta. Este se encantou com o desfile e acabou se recusando a avaliar cada carro: "Todos são maravilhosos e merecem a nota máxima!”.
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Organizar o evento era muito trabalhoso. Além da dificuldade de convencer eventuais parceiros em contribuir financeiramente, era necessário encomendar na feira de São Joaquim os mocóse onde os prêmios seriam colocados. Dessa forma, também ajudávamos o artesanato das cesteiras do Recôncavo. Depois íamos comprar os vários componentes dos ditos prêmios: café, açúcar, leite e chocolate em pó, copinhos de plástico e, para os maiores premiados, garrafas térmicas. Efetuadas essas compras, começava outra tarefa, bastante cansativa: distribuir equitativamente os componentes e colocá-los nos mocós. Uma sala no térreo de minha casa era então dedicada a essa fase do trabalho. Dávamos a maior importância para que, qualquer que fosse a beleza do carro, ninguém saísse da festa sem receber algum prêmio. A palavra decepção fora definitivamente barrada do vocabulário de nosso conceito acerca do evento. Convidávamos um artista plástico diferente a cada concurso, para criar a camiseta que seria distribuída entre os participantes e os jurados, todos igualados pela mesma vestimenta. Pouco antes do dia D, após mandar imprimir folhetos anunciando o concurso, eu mesmo fazia a panf letagem no centro da cidade. Comércio, saída do Elevador Lacerda, Lapa, Barroquinha, porta de entrada dos ônibus. Também pedia ajuda aos taxistas para que levassem folhetos a outras partes da cidade. Ao mesmo tempo, convidava membros atuantes dos meios culturais para fazer parte do júri: jornalistas, fotógrafos, antropólogos, artistas, arquitetos, músicos e museólogos. Seriam os melhores divulgadores e formadores de opinião. Também não podia faltar o(a) diretor(a) do Mercado Modelo. Desde o primeiro concurso, resolvemos também convidar um turista e alguém escolhido ao acaso entre a plateia. eMocó: sacola de palha usada para ir às feiras.
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Para os jurados, era preciso prever cadeiras, mesas, água mineral, papel e caneta. Como alguém teria que comentar ao vivo o evento, pedíamos a uma atriz ou jornalista para pegar o microfone e animar o desfile. Inscrição simplificada: nome, idade e endereço. Cada participante recebendo um número de inscrição que seria colocado em evidência no carro e na camiseta. Só então a festa podia começar. E que festa! Era comovente, após chamar o número, assistir a alegria do concorrente desfilar sob os gritos e aplausos dos colegas, rodando o carro como o brinquedo que, sem dúvida, não tivera quando criança. O engenho virava de um lado, do outro, quase caindo, em malabarismos de corredores de Fórmula 1. Imensos sorrisos rasgavam as faces. O júri precisava de uma boa meia hora para avaliar cada participante. Durante esse intervalo, para manter a atenção do público, evitando a dispersão, costumávamos convidar diferentes expressões culturais. No primeiro concurso, foi a banda de percussão do Bagunçaço, projeto social sediado nos Alagados. Sem pretender fazer uma lista exaustiva, não posso esquecer o repentista Bule-Bule e o cantor e compositor Gereba. Quando foi a vez da banda da Polícia Militar, organizamos a primeira “cafeata”, desde o Mercado Modelo até a Associação Comercial, voltando pela avenida da França. Acho que todos os escritórios e repartições estavam na janela para ver os cafezinhos desfilarem com muito orgulho. Havia poucas mulheres trabalhando com cafezinho. Uma delas, que vendia na praça da Sé, ficou minha amiga. Certo dia, resolveu ir com o carro vender café no Rio de Janeiro. Soube que não deu certo e ela voltou. Mas nunca mais a vi.
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A motivação primeira para o concurso foi a de evidenciar a criatividade e a beleza dos carros, geralmente executados com material reciclado. Pensava que, dessa forma, o reconhecimento pelo público e a imprensa funcionaria como escudo contra a agressividade dos rapas. Mas ao encerrar o primeiro evento, tornou-se evidente que as consequências do concurso seriam muito mais profundas. Com a desmedida satisfação dos vendedores e a receptividade ruidosa do numeroso público, percebemos que o concurso significava muito mais que ressaltar o eventual lado artístico dos vendedores de café. Tratava-se da valorização do ser humano. De repente, essa camada da população, historicamente invisível, se tornava não só visível e atuante no cotidiano urbano, mas fotografada e entrevistada pelos jornais e canais de televisão. Os vendedores de cafezinho se transformavam, finalmente, em estrelas, nem que fosse por um dia. Eles viravam gente. No decorrer dos anos, as atividades preliminares da premiação se tornaram problemáticas, já que, com uns 150 concorrentes, a contagem dos votos levava um tempo excessivo. Muitos concorrentes apresentavam o mesmo nível de excelência e passamos a dividir a premiação em três níveis. Também foi criado um Prêmio de Incentivo, pois alguns vendedores, idosos ou dramaticamente miseráveis, precisavam de um empurrãozinho. Os concursos de carros de cafezinhos levaram alguns vendedores para inesperadas aventuras. Atualmente, muitos carrinhos, negociados pelos autores a bom preço, estão em coleções particulares e até em museus, como o Museu do Homem do Nordeste, no Recife (Pernambuco), e o Museu Afro-Brasil, em São Paulo, capital. Um desses carros fez parte da exposição itinerante Relicário dos terrenos baldios (Relicaires des terrains vagues), organizada pelo Ministério da Cultura da França, apresentada em Paris, Mônaco e Rabat (Marrocos).
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Enfim, o evento foi matéria de destaque no programa Fantástico, da Rede Globo, e em canais internacionais de televisão, correu o mundo desde o Uruguai até o Japão. O cineasta Joel de Almeida fez um documentário com o título Preto no branco, apresentado no intervalo do 10° Concurso, com muita receptividade. O tema até virou tese de doutorado na Universidade de Bielefeld, na Alemanha! Poucas são as manifestações de cultura popular que podem se orgulhar de tal chamariz para as terras baianas. E a baixíssimo custo para os governantes. Mesmo assim, como era difícil arrancar alguns reais dos cofres públicos ou de certas empresas produtoras de café! Uma delas até declarou categoricamente que não desejava ver seu nome ligado à popularização de cafezinhos de baixa qualidade. Mas sejamos justos: outras marcas se prontificaram com muita gentileza. O preconceito de certo produtor teve um resultado bastante contraproducente para a marca, pois, ao abrir o concurso, peguei o microfone e denunciei o comentário da empresa ao público, terminando por clamar: "Portanto, peço a todos vocês para não comprarem o Café C...!". Cada um usa as armas que tem a seu alcance.
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Detalhar a criatividade da maioria dos carros de café me seria tarefa impossível. A partir de caixas de maçãs importadas da Argentina, cartões postais, recortes de revistas, cápsulas e adesivos, a imaginação corria solta. Com frequência, as cores escolhidas anunciavam o time de futebol preferido do vendedor. Um dos mais notáveis chegou a colocar um posto de televisão e um aquário com dois peixinhos vermelhos! Entre todas as anedotas que pontuaram esses 13 concursos – algumas divertidas, outras irritantes –, me lembro de um menino, 8 anos, rosto redondinho de criança, uma pobre garrafa térmica na guia velha. Quando apareceu no pódio foi aquele tsunami de emoção. Paixão total. Por unanimidade, os jurados resolveram outorgar-lhe o primeiro prêmio. Decisão contra a qual tive que me opor radicalmente, pois iria ser muito mal interpretada pelos outros vendedores, alguns com carros magníficos. A solução foi justamente o Prêmio de Incentivo. Evitamos o drama e todos ficaram satisfeitos. Mas essa história não para aí. Dias depois, o menino aparece na minha galeria, no primeiro andar do Mercado Modelo. Tímido, mas decidido. Pergunto: – Então, gostou do prêmio? – Sim, gostei. E me conta o que aconteceu: quando ele chegou ao empregador e falou do concurso, o homem exigiu que lhe entregasse o conteúdo do mocó. O menino se recusou dizendo: – Entrei no concurso porque quis. O senhor não me mandou participar. Então, o prêmio é meu! Zangado, o homem botou a criança na rua.
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– Agora é minha mãe quem prepara o café. Graças ao concurso, uma criança de 8 anos tinha conseguido sua independência econômica. Uns 10 anos se passaram. Um dia, vejo um homem bem jovem parar em frente à minha galeria. Camisa de manga comprida e calça social. Não podia reconhecer aquela criança do Prêmio de Incentivo. – Estou morando em Ilhéus. Trabalho num escritório de advocacia. E estudo. Quando me lembro desses fatos, penso que o concurso foi um precioso trampolim para aquele menino. Mas também estou convencido de que ele já nascera com uma forte dose de coragem e determinação. O prêmio não foi mais que a química reveladora. Cada vez que conto essa história, me emociono. Nem que fosse por esse único resultado, valeram os 20 anos de entusiasmo e teimosia.
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Por Eduardo Fróes
Como podemos conhecer uma cidade? Certamente de várias formas e vivências, seja através do seu traçado geográfico, da sua paisagem, do seu conjunto arquitetônico, da sua gastronomia ou da sua formação histórica e cultural, mas é inegável que a essência emana da sua gente e da complexidade das relações sociais que se estabelecem no cotidiano. Salvador é uma cidade que estimula os múltiplos sentidos. Suas ruas testemunham o passado e o presente, ambos materializados por edificações, monumentos, personalidades, objetos, fatos históricos registrados e também pelas desigualdades sociais. Percebemos que as ruas são espaços legítimos de manifestação da cultura popular, de resistência, de quereres e desejos que permanecem em contínuo processo de transformação. Ao transitarmos no centro de Salvador ou por seus bairros com intensa movimentação comercial, evidenciamos a presença de um número crescente de trabalhadores informais que tecem relações geradoras de uma dinâmica socioeconômica habitual às grandes cidades brasileiras. É nesse cenário urbano que se movimentam sujeitos históricos protagonistas de uma atividade comercial iniciada na década de 1970 e reconhecida por um processo criativo que converteu um ofício oriundo de uma atividade exploratória em uma expressão cultural. Tal atividade é desempenhada predominante por homens
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pretos que começaram a atividade quando crianças ou adolescentes, evadindo-se dos bancos escolares nos primeiros anos do ensino fundamental para se dedicar ao trabalho árduo e informal nas ruas. Estamos nos referindo aos vendedores de cafezinho e seus tradicionais carrinhos de café, com características próprias, que os diferenciam de qualquer outro equipamento de mesma funcionalidade, e, por isso, são percebidos como um significante importante da diferença e da identidade do soteropolitano. Os carrinhos de café ultrapassaram os limites de um objeto meramente funcional, pois agregam sentidos e valores. Devido à fácil mobilidade, esses equipamentos se integraram ao dia a dia dos transeuntes e profissionais das ruas, tornando-se componentes da cultura do cotidiano e cumprindo o papel de mediadores das nossas experiências, fortalecendo os costumes, comportamentos e alicerçando a construção de memórias afetivas. Muitos vendedores de cafezinho que exercem o ofício nos dias atuais experienciaram a exploração infantil, perseguições, preconceitos, pouca valorização, mas nenhum desses entraves de percurso foi motivo para o abandono da atividade. Pelo contrário, a venda do café sempre foi e permanece sendo a renda econômica que proporcionou constituir famílias, criar os filhos, adquirir patrimônio e garantir a sobrevivência diária. Essa tradição de vender cafezinho ambulante nas ruas de Salvador é uma prática que está incorporada à cultura da cidade, iniciada por uma necessidade de sobrevivência econômica e que obteve a chancela de perpetuação por fazer parte também dos desejos de uma coletividade que valida esse costume e o modo de fazer desses trabalhadores. O jeito de beber o cafezinho está vinculado às condições sociais, aos hábitos e comportamentos. Apesar de
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despertar interesse e curiosidade em muitos moradores e turistas, os principais clientes também são trabalhadores do comércio informal, são os feirantes, os profissionais autônomos que atuam nas ruas como os taxistas, são os profissionais rodoviários, os trabalhadores formais do comércio varejista do centro da cidade, porteiros de prédios, vigilantes de órgãos públicos e também os aposentados que se reúnem em praças da cidade. Esse modo de fazer tão peculiar, onde é possível aliar originalidade, funcionalidade e muita criatividade, colocou os vendedores de cafezinho em uma posição de evidência no contexto da cultura popular soteropolitana. Seus equipamentos de trabalho, as guias de mão e os carrinhos, estão impregnados de valores que lhes são atribuídos. São valores de um patrimônio adjetivado, provocadores de experiências afetivas e cognitivas, capazes de mediar narrativas. Os valores artísticos e estéticos são, em geral, os mais explorados e enaltecidos pela perspectiva da arte e do design popular. Os carrinhos de café, além da sua importância funcional, revelam o talento de muitos artesãos que os produzem ou confeccionam sob uma estética que é particular no aspecto morfológico, conferindo propriedades físicas que se assemelham aos trios elétricos e caminhões, no uso de
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cores vibrantes, na reutilização de materiais, na inclusão de assessórios eletrônicos e na representação de elementos simbólicos. Com o passar dos anos, os carrinhos de café foram incorporando novos materiais e melhoramentos no processo construtivo. No final da década de 1980 e início de 1990, muitos utilizavam rodas de skate ou rolimã. Posteriormente, foram substituídas por rodas maiores, a exemplo das rodinhas de carrinhos de bebê, passando por rodas com câmera de ar, até chegar nas rodas de silicone. O sistema de direção também passou por uma evolução, proporcionando uma melhor estética aos objetos. As cordas, cabos de aço ou correntes que ligam o eixo central da direção até o eixo dianteiro das rodas, atualmente, são utilizadas por baixo, tornando-se imperceptível e proporcionando um melhor acabamento. A inclusão de potentes equipamentos sonoros, iluminação cênica, monitor LCD automotivo, baterias com maior durabilidade corroboram esse processo evolutivo na construção desses objetos. Os carrinhos de café em movimento na cidade inspiram a construção de novos carrinhos de café. É assim que a cadeia de produção se desenvolve sem a necessidade de desenhos técnicos, protótipos ou projetos de design devidamente planejados e calculados.
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A criatividade, os acessórios e elementos decorativos funcionam como estratégias que visam conquistar os clientes, imprimindo também um elemento de distinção capaz de colocá-los em posição de destaque ou referência na região geográfica em que atuam. Para atrair mais consumidores, investem também na diversidade de mercadorias, disponibilizando café puro, café com leite, chocolate quente, chás, balas, doces, cigarros e sanduiches, sempre objetivando alcançar maior capacidade de comercialização. Os carrinhos de café, evidentemente, materializaram novas funções na tessitura social, despertando olhares, desejos e curiosidade. Possui uma aura que exerce fascínio e estabelece conexões com o tempo presente, tornando-se um mediador entre o indivíduo e a sociedade. Converteram-se em um potencial veículo de significados, e conseguem falar muito além da sua própria função, alcançando o status de ícones materiais. Apesar da notável visibilidade conquistada por esse artefato outorgado como um elemento emblemático, ou mesmo identitário da cidade do Salvador, ainda prevalece um inexpressivo reconhecimento formal desses vendedores e dos seus carrinhos de café enquanto um bem cultural, possivelmente por estarem atrelado à condição de que a
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cultura popular ainda ocupa uma posição subalterna, sendo excluída do processo de formação de um mercado de bens simbólicos legítimos, os quais são definidos por grupos hegemônicos. Mesmo sem uma legitimidade institucionalizada por órgãos de proteção ao patrimônio, o processo de representação do carrinho de café e o reconhecimento da importância da atividade do vendedor de cafezinho estão intrinsecamente associados à noção de pertencimento a um lugar, sendo confirmada através do olhar e a da opinião daqueles que estabelecem relações diretas e indiretas com os tradicionais cafezinhos de Salvador. Incontestavelmente, a existência em sentido simbólico atribuída aos vendedores de cafezinho de Salvador acontece, pela primeira vez, nos anos 1980 quando um primeiro olhar os notabilizou como indivíduos portadores de uma potencialidade que extrapolava a sua atividade informal, na maioria das vezes desvalorizada e marginalizada. A percepção dessa potencialidade também provocou um incômodo na sociedade soteropolitana, na qual alguns segmentos hegemônicos não estavam receptivos em se associar ou se interessar pelas questões atribuídas aos menos favorecidos. Reconhecemos, portanto, o marchand e colecionador Dimitri Ganzelevitch como o idealizador dessas primeiras ações de valorização, que contribuíram para o fortalecimento da tradição dos cafezinhos nas ruas e dos vínculos com os espaços ocupados por eles. A inf luência de Dimitri Ganzelevitch no universo das artes, em particular à estética da criação popular, e a sua militância pela preservação das manifestações culturais e do patrimônio histórico da cidade do Salvador, através da Associação Cultural Viva Salvador, foi, evidentemente, um fator que conferiu credibilidade e reconhecimento à iniciativa da realização de um evento cultural intitulado Concurso de Guias e Carros de Cafezinho, que contou
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com 13 edições em um período de 20 anos, sendo o último realizado no dia 19 de dezembro de 2007. Essa dimensão estética e social proporcionada pelo olhar de Dimitri reverbera até os dias atuais, consolidando-se como um marco na trajetória histórica da atividade dos vendedores ambulantes de cafezinho de Salvador, que os visibilizaram enquanto pessoas dotadas de uma capacidade inventiva e artística, além de reverenciá-los como protagonistas de uma classe de trabalhadores do comércio informal de rua. A apreensão desses valores contribuiu para que outras expressões artísticas como a música, o cinema, as artes plásticas, a fotografia, a literatura levassem esse sujeito e sua inventividade para além dos limites geográficos da cidade do Salvador, despertando o interesse de curiosos, colecionadores, pesquisadores, artistas e grupos midiáticos envolvidos em produções que expressam ou destacam os elementos da cultura baiana. A apropriação dos carrinhos de café ou de sua tematização revela a capacidade do objeto em “dizer” sobre o seu possuidor, bem como o contexto social no qual está inserido. Os carrinhos de café desempenham uma extensão dos vendedores de
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Catálogo da exposição Relicário dos terrenos baldios, Paris, Mônaco, Rabat, 2003. Catalog of the exhibition Reliquary of vacant lots, Paris, Monaco, Rabat, 2003.
cafezinho e são percebidos como um instrumento material da sua própria existência. Compreendemos também que esse objeto não está isento dos processos de transformação inerentes às relações sociais, culturais e tecnológicas. Os olhares mais atentos perceberão que, nos dias atuais, mesmo que ainda manifestada de forma latente, há uma ruptura da tradição dos carrinhos alegóricos de café que circulam nas ruas soteropolitanas. A transformação morfológica desse objeto sinaliza o dinamismo cultural que, aliado ao tempo, revelará no futuro os impactos sobre o ofício dos vendedores de cafezinho. Além disso, a ressignificação desses objetos se perpetuou como uma realidade a partir do momento em que alguns exemplares foram retirados das ruas de Salvador e passaram a integrar as coleções do Museu Afro Brasil, em São Paulo, capital, e do Museu do Homem do Nordeste, em Recife, Pernambuco. Assumiram, portanto, o valor documental e de patrimônio cultural, passando a ser interpretado como símbolo e signo de realidades específicas.
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Outro aspecto de relevância é a refuncionalização dos carrinhos de café ainda como parte do processo de transformação cultural. Sua apropriação para novas funções que visam, principalmente, informar e produzir conhecimento transforma-os em verdadeiras plataformas midiáticas. Serviram de inspiração para o surgimento de carrinhos bibliotecas, como equipamentos para manifestações sociais e de ferramenta para o marketing, além de funcionar também como instrumentos para a realização de eventos de entretenimento. Os vendedores de cafezinho imprimem suas referências por meio da ocupação das ruas e do desenvolvimento da sua atividade, inf luenciando decisivamente os hábitos e elementos simbólicos de Salvador. São pessoas que contribuem para a formação e o desenvolvimento da cidade, não apenas com seu esforço físico, mas também com a sua cultura. Entendemos os carrinhos de café como objetos culturais que vão muito além das possibilidades de classificação ou significação funcional. O vendedor de cafezinho e o seu carrinho de café integram justamente esse contexto de elementos distintivos da cidade. O ofício está enraizado na cultura e no cotidiano de Salvador, portanto, o carrinho de café é coisa da Bahia, é uma tradição soteropolitana, é uma expressão popular que inf luencia e é inf luenciada, enfim, é um Patrimônio Cultural de Salvador! Referência bibliográfica FRÓES, Eduardo de Araújo. Um patrimônio em movimento: os carrinhos de café nas ruas de Salvador. 2018. 205f. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Museologia, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018.
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Autor Franklin Maxado, o Nordestino
Bahia dos trios elétricos Sonoros e enfeitadinhos Também inspira ambulantes A fim de ter cafezinhos Pra quem gosta da bebida Tomada nos seus copinhos. Por isso, seus camelôs
Tornam prático o prazer. Trazem o café já feito, Para o cliente beber, Nas suas garrafas térmicas. Nelas é fácil vender.
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Café tem mais atração Nesse carrinho enfeitado Com pinturas coloridas. Desenhos por todo lado Chamando assim atenção Pro café ser degustado. Ainda, é sonorizado Tendo música de “Axé”, Na capital, tem quem goste De Reggae e de Afoxé. Também, de apreciadores De beber o tal café.
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Tem carrinhos de café Que parecem umas carretas. Guardada a proporção, Cumprem assim as suas metas Que são carregar garrafas Térmicas como estatuetas. Outros são cadilaque. Todo belo e enfeitado. Vendem o chá, chocolate, Capucino acanelado Ou uma água mineral Com teor gaseificado.
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Pode se encontrar rapé Para uma cheiradinha. Limpa o nariz com espirro Para tomar goladinha No café servido em copo, Ouvindo uma musiquinha. E, distraindo o olhar Na pintura e no enfeite. Assim, se toma o café Misturado com o leite Com muito ou pouco açúcar Conforme for o deleite.
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Tem carrinhos com biscoito, Bombom e até bolacha. Uma verdadeira loja! Já tem cliente que acha Que é uma lanchonete Sobre rodas de borracha. Outros, portam o cigarro Para quem é viciado. Tem também caixa de fósforo, O que é necessitado. Tem guardanapo, palito E copo plastificado.
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São utilidade pública, Oferecendo espelhinho Pro freguês se arrumar Enquanto toma cafezinho. Puxa conversa fiada Batendo o seu papinho. Por isso, já estão sendo Patrimônio cultural. Identificam a Bahia No plano internacional Junto com o seu cenário De cidade colonial.
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Eles são tropicalistas Pelo som e a pintura. Leem-se frases gravadas Como parte da cultura. Umas são religiosas. Outras, são literatura. Já são marca da Bahia, Os carrinhos de café Junto de capoeiristas E baianas d’acarajé, Além de seus bailarinos E cantores de “Axé”.
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Tem camelô de café Que tem caixote de pau. Este é chamado de “guia" E cumpre papel igual Aos carrinhos de café Com a venda natural. São carregados no braço E colocados no chão Pra despachar o café, Servido como um quentão. Há ainda uma conversa Pra quem quer mais distração.
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Pode haver informação Pois estes seus vendedores Caminham por muitas partes E são observadores. Entretêm com um bom papo Esses seus consumidores. Tem carrinhos que imitam Um caminhãozão bi-trem. Tem um reboque puxado Pra servir de armazém Carregando mais garrafas Ou caixa de som também.
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Todos têm cores berrantes Para prender atenção E despertar o seu gosto E ainda a audição Com as músicas baianas Formando mais atração. Há carrinhos com desenhos De orixás do Candomblé. Há outros com as figuras De santos pra quem tem fé. Há ainda com bandeiras E esboços de mulher.
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Embora tenha a baiana Aqui muita liberdade, Não se vê muita mulher Vendendo pela cidade O café em seus carrinhos Sendo delas, raridade. Já vendedor ambulante Muito chama a atenção, Pois se veste especial, Tendo anéis e correntão. Cada um é diferente Do colega de profissão.
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Geralmente, são morenos, Pardos e até mulatos. No dizer de Jorge Amado, São bons de conversa e tratos. Tornam fiel, freguesia Que conservam com bons atos. Com carrinhos empurrados, Se destacam na cidade. Seus donos ficam andando Ou param em localidade. Tem quem fique no Comércio Ou na praça da Piedade.
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Mas, se encontram em outros Locais esses tais carrinhos Como lá no Campo Grande, Rua Chile, Pelourinho, Avenida Sete, Ajuda, Até em Santo Agostinho. Quem é um porreta, pode Tomar na praça Tomé De Souza, que tem turista, Indo pra praça da Sé, Fotografando esses carros Que vendem o nosso café.
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De Salvador, são lembranças. Quer esteja em Ondina Com o seu Carnaval. Ou, na praia d’Amaralina. Tudo lembra a bebida Que tem nossa cafeína. O café é preferência Do brasileiro em geral. E, na Bahia, ele vem Em carrinho especial, Sendo carinho registrado No seu cenário central.
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Os carrinhos de café Parecem até brinquedo Que a gente desejava Dirigir de modo quedo Como os reais veículos Imaginando arremedo. E, neles vão os desejos, Sonhos e a fantasia Com café estimulando E causando alegria Nesse estado de ilusão Como é a própria Bahia.
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Se volta até a infância Quando se era traquino. Tomando o café com leite No tempo que foi menino. Não se pensava em nada Nem ligava pro destino. Maria Helena pautou “Alegria Café Quentinho”. Xameguei muito este livro Anunciado por gajinho: Dimitri Ganzelevitch, O repórter do carrinho. Salvador e Feira de Santana, Bahia, fevereiro de 2021.
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By Franklin Maxado, the Nordestino Bahia of the trios elétricos, Loud and decorated, Also inspires street vendors In order to provide coffee For those who like that drink, Which is drunk from little cups. Therefore, its street vendors Make pleasure practical. They bring brewed coffee, For customers to drink, They carry it in their thermos. From which it is easy to sell. Coffee is more attractive In those carts decorated With colorful paintings. Drawings everywhere, Which draw people’s attention To the coffee to be savored. And also, they have a sound system, They play “Axé” music, In the capital, some people like Reggae and Afoxé. And there are those Who enjoy drinking that coffee.
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Some coffee carts Look like trucks. So, in their own way, They fulfill their goals, Which are carrying Thermoses as figurines. Others look like a Cadillac. Beautiful and decorated. They sell tea, hot chocolate, Cinnamon-f lavored cappuccino Or mineral water Mostly carbonated. You can find snuff For a sniff. You clean your nose with a sneeze So you can sip your coffee Served in a glass, Listening to some music. And, as people distract their eye In painting and decoration. They drink their coffee Mixed with milk Either with much or little sugar As they wish. There are carts selling cookies, Bonbons and even crackers. Just like a shop! Some customers think It is a cafeteria On rubber wheels.
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Others carry cigarettes For those who are addicted. They also have matchboxes, Which are necessary. They have napkins, toothpicks And plastic cups. They provide public service, By offering mirrors For customers to get ready While having coffee. Making small talk Chatting away. So, they are considered As cultural heritage. They identify Bahia Internationally Along with its scenery Of a colonial city. They are tropicalists Because of the music and the painting. Sentences can be read As part of the culture. Some are religious. Others are literature. The coffee carts are Bahia’s trademarks Just like capoeira fighters And Bahian women selling acarajé, Besides its Axé dancers And singers.
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There are coffee street vendors Who use a wooden box. This is called a "guide" And plays the same role As a coffee cart With natural sale. The box is carried on the arm And placed on the f loor To dispatch the coffee, Served as a mulled wine. They also hold a conversation With those who want more distraction. They can supply information Because these vendors Walk through many parts of the city And they are observant. They entertain their customers With a good chat. Some carts imitate A double-trailer truck. They pull a trailer That serves as a warehouse Carrying more bottles And a speaker as well. They all have bright colors To catch your attention And awaken your taste And your hearing With Bahian songs, Thus increasing their attraction.
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There are carts with drawings Of Candomblé orixás. There are others with figures Of saints, for those who have faith. Some carts display f lags And sketches of women. Although Bahian women Have a lot of freedom here, You don't see many women Selling coffee from carts Around the city. Actually, they are hardly seen. Street vendors, on the other hand, Draw a lot of attention, As they dress in a special way And wear rings and chains. Each one is different From their colleagues. They are usually dark, Brown-skinned and even mulattos. In the words of Jorge Amado, They are good talkers and polite. They all have loyal customers Which they keep with good deeds. Pushing their carts, They stand out in the city. The carts’ owners either walk around, Or stand at a place. Some of them stay in Comércio Or at Praça da Piedade
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But these pushcarts Can be also found in other places Like in Campo Grande, Rua Chile, Pelourinho, Avenida Sete, Ajuda, Even in Santo Agostinho If you are a cool guy You can have your coffee at praça Tomé de Souza, Where you can see tourists On their way to praça da Sé, Taking pictures of those carts Selling our coffee. Those are memories of Salvador, Whether you are in Ondina With your Carnival. Or at Praia d'Amaralina. Everything calls to mind that drink That has our caffeine. Coffee is the preference Among Brazilians in general. And in Bahia, it comes In a special cart, Having caring displayed In its central view. Those coffee carts Look like a toy That we wanted To drive smoothly, Like a real vehicle, Imagining it was a true copy.
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And those carts carry desires, Dreams and fantasy With coffee stimulating And arousing joy, In a state of delusion Like Bahia itself. You go back to your childhood When you were a naughty boy. Having coffee with milk When you were just a kid. You didn’t think about anything Nor did you care about fate. Maria Helena guided "Joy and Hot Coffee". I cuddled this book a lot Announced by gajinho: Dimitri Ganzelevitch, The cart reporter. Salvador and Feira de Santana, Bahia, February 2021.
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By Eduardo Fróes How can we get to know a city? Certainly, in various ways and experiences, whether through its geographical layout, its landscape, its architectural ensemble, its gastronomy or its historical and cultural formation, but it is undeniable that the essence emanates from its people and the complexity of social relations that are established in daily life. Salvador is a city that stimulates multiple senses. Its streets bear witness to the past and the present, both materialized by buildings, monuments, personalities, objects, recorded historical facts and also by social inequalities. We realize that the streets are legitimate spaces for the expression of popular culture, resistance, wishes and desires that remain in a continuous process of transformation. As we move around downtown Salvador or its neighborhoods with intense commercial activity, we can see an increasing number of informal workers who weave relations that generate a socioeconomic dynamic that is typical of large Brazilian cities. It is in this urban setting that historical individuals move around. They are protagonists of a commercial activity started in the 1970s and are recognized for a creative process that converted a craft derived from an exploratory activity into cultural expression. Such activity is performed predominantly by black men who started the activity as children or teenagers, dropping out in the early years of their schooling to dedicate themselves to hard and informal work on the streets. We are talking about coffee vendors and their traditional coffee carts, with their typical features that differentiate them from any
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other equipment with the same function, and so, they are perceived as an important signifier of the difference and the identity of the Salvadorans. The coffee carts surpassed the limits of a merely functional object, as they add meanings and values. Due to easy mobility, these devices became part of the daily lives of passers-by and street professionals, becoming components of the culture of everyday life and fulfilling the role of mediators of our experiences, strengthening customs, behaviors and underpinning the construction of affective memories . Many coffee vendors currently working on the streets have experienced child exploitation, persecution, prejudice, undervaluation, but none of these obstacles was a reason for abandoning the activity. On the contrary, the sale of coffee has always been and remains the economic income that has provided for starting families, raising children, acquiring assets and ensuring daily survival. This tradition of selling coffee on the streets of Salvador is a practice incorporated into the culture of the city. It was generated by a need for economic survival and obtained the seal of perpetuation for being also part of the desires of a community that validates this custom and the way of working of these workers. The way of drinking coffee is linked to social conditions, habits and behaviors. Despite arousing interest and curiosity among many locals and tourists, their main customers are also informal trade workers, street market vendors, freelance professionals who work on the streets like taxi drivers, road workers, formal retail workers downtown, building porters, security guards of public agencies and also retirees who gather in the city squares. Such a peculiar way of working, where it is possible to combine originality, functionality and a lot of creativity, has placed the coffee vendors in a position of evidence in the context of the popular culture of Salvador. Their work devices, thermos boxes and carts, are imbued with the values attributed to them. They are values of a
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qualified heritage, triggers of affective and cognitive experiences, capable of mediating narratives. Artistic and aesthetic values are, in general, the most explored and praised from the perspective of popular art and design. Coffee carts, in addition to their functional importance, reveal the talent of many artisans who produce or manufacture them based on an aesthetic that is particular in morphological terms, providing them with features that resemble those of trios elétricos and trucks in the use of vibrant colors, in reusing materials, in the inclusion of electronic accessories and the representation of symbolic elements. Over the years, coffee carts have gradually incorporated new materials and improvements in the construction process. In the late 1980s and early 1990s, many were fitted with skate wheels or ball bearing wheels. Later, these were replaced with larger wheels, such as wheels of baby strollers, passing by wheels with tubed tires, until they got to silicone wheels. The steering system has also evolved, enhancing the objects’ aesthetic. Today the ropes, steel cables or chains that connect the central steering axle to the front axle of the wheels run under the cart, being imperceptible and providing a better finish. The inclusion of powerful sound equipment, scenic lighting, automotive LCD monitor and batteries with longer durability corroborate the evolution in the construction process of these objects. The coffee carts moving around the city inspire the construction of new coffee carts. This is how the production chain develops, with no need for planned and calculated technical designs, prototypes or design projects. Creativity, accessories and decorative elements work as strategies that aim to win customers, adding a touch of differentiation that can place them in a prominent position or make them a reference in the geographic area where they operate. In order to attract more consumers, they also invest in diversity of goods, offering black coffee, coffee with milk, hot chocolate, teas, candies, sweets, cigarettes and sandwiches, always aiming to achieve greater marketing capacity.
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coffee carts, evidently, have created new functions in the social fabric, arousing looks, desires and curiosity. They have an aura that fascinates and establishes connections with the present time, becoming a mediator between the individual and society. They have become a potential vehicle of meanings and can do things far beyond their own function, reaching the status of material icons. Despite the remarkable visibility achieved by this artifact considered an emblematic element, typical of the city of Salvador, a formal recognition of these vendors and their coffee carts as a cultural asset is still inexpressive. This may be so because popular culture still occupies a subordinate position, being excluded from the process of forming a market of legitimate symbolic goods, which are defined by hegemonic groups. Even without having their legitimacy acknowledged by heritage protection agencies, the process of representing coffee carts and the recognition of the importance of the activity of coffee vendors are intrinsically associated with the notion of belonging in a place, which is confirmed through the look and the opinion of those who establish direct and indirect relationships with the traditional coffee vendors of Salvador. Undoubtedly, the existence in a symbolic sense of coffee vendors of Salvador was acknowledged for the first time in the 1980s, when a first look distinguished them as individuals with a potential that went beyond their informal activity, mostly undervalued and marginalized. The perception of this potential also caused discomfort in the society of Salvador, where some hegemonic segments were not willing to deal with or care about the issues related to the less favored. Therefore, we recognize the art dealer and collector Dimitri Ganzelevitch as the creator of these early valuation actions, which contributed to the strengthening of the tradition of street coffee vendors and the connections with the spaces they occupy. The inf luence of Dimitri Ganzelevitch in the universe of the arts, particularly on the aesthetics of popular creation, and his militancy
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for the preservation of cultural manifestations and the historical heritage of the city of Salvador, through the Associação Cultural Viva Salvador was, evidently, a factor that gave credibility and recognition to the initiative of holding a cultural event named the Coffee Carts and Thermos Boxes Contest, which had 13 editions over a period of 20 years, the last one being held on December 19, 2007. This aesthetic and social dimension provided by Dimitri's eyes reverberates to the present day, consolidating itself as a landmark in the historical trajectory of the activity of the street coffee vendors of Salvador. He made them visible as people with an inventive and artistic ability, and revered them as protagonists of a class of informal trade workers. The apprehension of those values contributed for other artistic expressions, such as music, cinema, visual arts, photography, literature to take Dimitri and his inventiveness beyond the geographical limits of the city of Salvador, arousing the interest of curious people, collectors, researchers, artists and media groups involved in productions that express or highlight the elements of Bahian culture. The appropriation of coffee carts or their theme reveals the object's ability to “tell” about its owner and the social context in which he is inserted. Coffee carts are an extension of coffee vendors and are perceived as a material instrument of their own existence. We also understand that this object is not exempt from the transformation processes inherent in social, cultural and technological relations. More attentive eyes will realize that, today, even if manifested just latently, there is a rupture in the tradition of the allegorical coffee carts that circulate in the streets of Salvador. The morphological transformation of this object points to the cultural dynamism that, combined with time, will reveal in the future the impacts on the coffee vendors’ craft. In addition, the reframing of these objects became a reality from the moment when some units were removed from the streets of
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Salvador to become part of collections of the Museu Afro Brasil, in São Paulo, capital, and the Museu do Homem do Nordeste, in Recife, Pernambuco. Thus, they assumed a true value as cultural heritage, being interpreted as a symbol and sign of specific realities. Another relevant aspect is the assignment of new functions to coffee carts as part of the cultural transformation process. Their suitability for new functions, which mainly aim to inform and produce knowledge, turns them into real media platforms. They served as inspiration for the creation of library carts, as devices for social manifestations and marketing tools, in addition to working as instruments for holding entertainment events. Coffee vendors imprint their references by occupying the streets and carrying out their activities, decisively inf luencing the habits and symbolic elements of Salvador. They are people who contribute to the formation and development of the city, not only with their physical effort, but also with their culture. We understand coffee carts as cultural objects that go far beyond the possibilities of functional significance or classification. Coffee vendors and their coffee carts are part of this context of distinctive elements of the city. The craft is rooted in the culture and daily life of Salvador, so coffee carts are a Bahia thing, a tradition of Salvador, a popular expression that both inf luences and is inf luenced, in short, it is a Cultural Heritage of Salvador! Bibliographic reference FRÓES, Eduardo de Araújo. Um patrimônio em movimento: os carrinhos de café nas ruas de Salvador. 2018. 205f. Thesis (Master’s degree) – Graduate Program in Museology, Universidade Federal of Bahia, Salvador, 2018.
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By Dimitri Ganzelevitch I was going down the Pelourinho square. Two kids, about 13/14 years old, sitting on their thermos boxes and looking at me, made a comment between them. I approached them. “Hi! What’s up? Are you talking about me?” The older kid replied: “Are you the guy who does the contest?” “Yes, that’s me.” “Wow! You must come out well...” “What do you mean?” Chuckling, the boy reached into his pocket. I felt stabbed. But how not to understand his reasoning? Those people who are so mistreated, so scorned, how could they imagine that someone could do something for them without profit in mind? – No, buddy! It is not so. The money I raise is never enough, so I always have to take some out of my pocket. They look at me suspiciously... But it was true. During 13 contests in more than 20 years, my desire has always been to value the work and creativity of street coffee vendors rather than "coming out well" at their expense. The idea of the contest came about by chance from a brief conversation with the owner of a cart decorated like a trio elétrico (the name given to a truck equipped with an extremely loud powerful sound
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system and a music group on top of it). The man complained about the persecution of the dreaded confiscators, who did not hesitate to confiscate their instruments of work, which were the only means of subsistence for many families. They took the cart away mercilessly, and it would only be returned upon payment of a heavy fine. The complaints were not sporadic, in fact, they were constant. The cruelty of municipal administrations in dealing with street workers has always caught my attention. Whether they sell coffee, coconut water, leaves, brooms or fruit, all these humble people seem to come out of Debret's old prints, illustrations denouncing embarrassing social injustice. ... I have just found a text of mine, written in the early 1990s. It could be a smiling kid, in Bermuda shorts, an open shirt. A smart-looking chubby lady. Or a tired old man with no expression on his face. It could be a thermos box, a small wooden support for two, three thermoses. Or a cart, a long and narrow vehicle, with wheels, a steering wheel and a rearview mirror. Depending on the "driver’s" stamina, it may contain 10 or more bottles. While pushing those carts weighing between 5 and 20 kilos, hundreds of coffee vendors bring joy to the squares and streets of Salvador, with the noise of the ball bearing wheels and the sound of their radios, feeling vain as they smoothly slide their magnificent survival toys. Of Salvador and no other city in Brazil. Or the world. [...] Wouldn't they be, in the immense global anonymity of the disinherited, the brothers of Turkish shoeshine men, of Moroccan water vendors and of Cuban rickshaws?
...
Together with a number of friends, I founded a group whose purpose was to defend some undervalued cultural expressions. It would be difficult for me to draw up the complete list of associates today. Some participated actively for years, others just sporadically. Their motivations were also diverse, not always in line with my expectations. But just like a staircase with irregular steps, the Associação
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Cultural Viva Salvador (Cultural Association Viva Salvador) has slowly progressed, making a significant contribution to Bahia’s culture. The coffee cart contest used to take place behind the Mercado Modelo, in an open space, but protected from the weather. Only on two occasions, for forgotten reasons, was it held at the Lapa station, near Largo da Piedade. On one of those occasions the chairman of the contest was the famous carnival designer Joãozinho Trinta. He was delighted with the parade and ended up refusing to evaluate the carts: “Each one is wonderful and deserves the highest score!” Organizing the event was a lot of work. In addition to the difficulty of convincing potential partners to contribute financially, I needed to order at the São Joaquim market the mocós (straw baskets) where the awards would be placed. In this way, we also helped promote the arts and crafts of the basket weavers of the Recôncavo. Then we went to buy the various components of the said awards: coffee, sugar, milk and cocoa powder, plastic cups and, for the top winners, thermoses. Once the shopping was done, another task began, a quite tiring one: we must equitably distribute the components and place them in the mocós. A room on the ground f loor of my house was allocated for this stage of our work. We made sure that, whatever the beauty of the carts, no one would leave the party without receiving a prize. The word disappointment was definitely barred from the vocabulary of our concept of the event. At each contest, we invited a different artist to create a t-shirt that would be distributed among the participants and the jury members, all equalled by the same outfit. Shortly before D-Day, after having leaf lets printed announcing the contest, I did the leaf leting myself in the city center. Comércio, exit of the Lacerda Elevator, Lapa, Barroquinha, entrance door of buses. I also asked taxi drivers for help to take leaf lets to other parts of the city.
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At the same time, I invited active members of the cultural environment to be part of the jury: journalists, photographers, anthropologists, artists, architects, musicians and museologists. They would be the best disseminators and opinion leaders. The director of the Mercado Modelo could not be missing from that team. Since the first contest, we also decided to invite a tourist and someone chosen at random from the audience. For the members of the jury, it was necessary to provide chairs, tables, mineral water, paper and pen. As someone would have to comment on the event live, we asked an actress or a journalist to pick up the microphone and liven up the parade. Simplified registration: name, age and address. Each participant received a registration number that would be highlighted both on his cart and on his shirt. Only then could the party begin. And what a party! After calling a number, it was thrilling to watch the competitor's joy while parading under the cheers and applause of his colleagues, spinning his cart like a toy he certainly didn't have as a child. The device turned this way and that, almost falling, juggling like a Formula 1 racer. Huge smiles ripped cheeks. The jury needed a good half hour to evaluate each contestant. During this interval, to keep the public's attention and avoid dispersion, we used to invite different cultural expressions. In the first contest, it was the percussion band of Bagunçaço, a social project based in Alagados. I don’t intend to make an exhaustive list, but I can’t forget the repentista (a poet-singer) Bule-Bule and the singer and composer Gereba. When it was the turn of the Military Police band, we organized the first “cafeata” (a parade of street coffee vendors), which went from the Mercado Modelo to the Associação Comercial, going back along Avenida da França. I think people from all offices and departments were at the windows watching the coffee carts parading with great pride.
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There were few women working with coffee. One of them, who was a coffee vendor at Praça da Sé, became my friend. One day, she decided to take her cart to Rio de Janeiro to sell coffee there. I heard that it didn't work out and she came back. But I never saw her again. The primary reason for holding the contest was to highlight the creativity and beauty of the carts, usually made with recycled material. I thought that, in this way, recognition by the public and the press would act as a shield against the aggressiveness of the confiscators. But when the first event was over, it became evident that the consequences of the contest would be much deeper. With the immense satisfaction of the vendors and the noisy receptivity of the large audience, we realized that the contest was much more than just about highlighting the artistic side of coffee vendors. In fact, it was about valuing the human being. Suddenly, this layer of the population that was historically invisible, not only became visible and active in urban daily life, but they were also photographed and interviewed by newspapers and TV channels. Coffee vendors finally became stars, even if only for a day. They became people. Over the years, the preliminary activities involving the award became an issue, since counting the votes for about 150 contestants was a task that took too much time. Since many competitors had the same level of excellence, we divided the award into three levels. An Incentive Award was also created, as some vendors, elderly or dramatically miserable, needed a little push. The coffee cart contests took some vendors on unexpected adventures. Today, many carts, negotiated by their builders at a good price, are in private collections and even in museums, such as the Museu do Homem do Nordeste, in Recife (Pernambuco), and the Museu Afro-Brasil, in São Paulo capital. One of these carts was part of the touring exhibition Relicaires des Terrains Vagues, organized by the French Ministry of Culture and presented in Paris, Monaco and Rabat (Morocco).
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A story about the event was featured on Rede Globo's show Fantástico and on international television channels, having traveled the world from Uruguay to Japan. Filmmaker Joel de Almeida made a documentary about the event, named Black on White, which was exhibited during the interval of the 10th Contest and had great receptivity. The topic even became a doctoral thesis at the University of Bielefeld, Germany! Few manifestations of popular culture can boast attracting so much attention to the lands of Bahia. And at a very low cost for the government. Even so, how difficult it was to get a few reais from public coffers or from certain coffee producing companies! One of these companies categorically stated that they didn’t want to see their name linked to the popularization of low-quality coffee. But let's be fair: other brands volunteered very kindly. The prejudice of a certain producer had a very counterproductive result for the brand because, when opening the contest, I grabbed the mike and denounced the comment made by the company to the audience, and concluded by urging, “So, I ask all of you not to buy Coffee C ...!” Each uses the weapons they have. Detailing the creativity of most coffee carts would be an impossible task. From crates of apples imported from Argentina to postcards, magazine clippings, capsules and stickers, imagination ran wild. Often, the colors chosen announced the vendor's favorite soccer team. One of the most notable added a television set and an aquarium with two red fish to his cart! Among all the anecdotes collected during those 13 contests – some fun, others annoying, I remember a boy, 8 years old, with a child's round face, carrying a poor thermos in his old thermos box. When he appeared on the podium it was a tsunami of emotion. Total passion. The jury unanimously decided to award him the first prize. A decision that I had to oppose radically, as it would be very
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misunderstood by the other vendors, some with magnificent carts. The solution was precisely the Incentive Award. We avoided the drama, and everyone was happy. But that story doesn't end here. Days later, the kid appears in my gallery, on the first f loor of the Mercado Modelo. Shy but determined. I ask him, “So, did you like the award?” “Yes, I did.” And then he tells me what happened: when he arrived at his employer’s and told him about the contest, the man demanded that he give him the contents of the mocó. The boy refused, saying, “I entered the contest because I wanted to. You didn’t tell me to participate. So, the award is mine!” The man got angry and fired the kid. “Now it's my mom who makes the coffee.” Thanks to the contest, an 8-year-old had achieved economic independence. About 10 years have passed. One day, I see a very young man stop in front of my gallery. Long sleeve shirt and dress pants. I couldn't recognize that child from the Incentive Award. – I'm living in Ilhéus. I work in a law firm. And I'm studying. When I remember these facts, I think that the contest was a precious stepping stone for that boy. But I am also convinced that he was born with a strong dose of courage and determination. The award was just a revealing chemical. Every time I tell this story, I get emotional. Even if it were only for that single result, the 20 years of enthusiasm and stubbornness were worth it.
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By Paulo Miguez The street is an especially important place for the cities of Bahia, essential for carrying out their cultural activities. Here, in old Salvador, in prayer or at a party, going after the saint or after the trio, what is never lacking is people, lots of people entering an alley and leaving an alley, going up a hill and down a hill, occupying a street, many streets, and, quite often, entire areas of the city. But not only faith and revelry guarantee the rich color of the streets of Salvador. The intense hustle and bustle of the streets is also caused by the countless people who, forced to face the daily life of inequality and exclusion that belittles and makes most of the people of the city suffer, resort to informality to work, occupying the urban space. Very small businesses, very many businessmen. They offer everything, from delicacies of Bahian cuisine to cell phone cases and chargers. Many occupy fixed points in various places in the city with their tents, their boards. Many others, much more numerous, are street vendors, who have an intense and undisguised presence in the daily life of the city. On festival days, like Carnival, the number of street vendors on the streets reaches a few tens of thousands. In fact, it seems like a rule, whenever there is people crowding the streets in Salvador, for whatever reason, street vendors immediately appear offering their services and products. In other words, wherever there is a crowd, there is a street vendor in the area. For more than 40 years, this numerous and diversified group of informal workers has been composed of a very special type of street vendors. They are the coffee vendors. At the beginning, only
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children did this work, some barely past 10 years old. The equipment, called a hand thermos box, is simple: a small wooden box accommodating thermoses – where the number of bottles depend on the physical strength of the kid – and a stick passing over the thermoses to allow the box to be carried. Since then, as we well know, the living conditions that have forced a significant number of people into the city's informal labor market, have remained unchanged. The street vendors still carry out their activities on the city streets in a very precarious way, and child labor, an ancient perversity in the city’s life, is still present – today, many “coffee vendors” are still children and young people, although there are already many adults among them, some working in the “small coffee” business since childhood. On the other hand, disgraces aside, the trade of the “small street coffee”, carried out by street vendors who call themselves “cafezinho”, continues to have a guaranteed place in the preference of the varied and numerous clientele that circulate in the city center, on a daily basis. They are road workers, workers of the popular retail trade, office-boys, taxi drivers, security guards, porters, delivery men, other informal workers – there are always plenty of customers for coffee, which can be black or with milk, or for hot chocolate, or a sandwich, a snack, a candy, a sweet. What has really changed over time was the equipment, the coffee vendors' work tool, the small box with thermoses, suspended by a wooden stick. First, it got wheels. It went from a hand box to a wheeled box. Then, the combination of box, wheels and a lot of creativity resulted in a coffee cart. It is difficult to describe the richness of details of many of the coffee carts that circulate through the streets of downtown Salvador, some of which look like real mini-trios elétricos. The imagination runs wild there. Talent and creativity abound. Reuse and recycling of materials, mechanical innovations to improve the driving of the
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carts, incorporation of image and sound systems to entertain the clientele, and more: stage lighting, tapes, portraits, signs, props, allegories, shields of the vendor’s favorite soccer team and whatever else can bring color and grace to delight customers and passers-by. The technical and aesthetic evolution and sophistication experienced by the coffee carts have turned them from mere work tools into art objects. They started to integrate museum collections, to be present at exhibitions inside and outside the country, to be the object of studies and research in the academic world, and they even starred in a documentary. However, if the transformation of the boxes into carts was due to the skills and craftsmanship of the vendors, it was not only the technical and artistic evolution that guaranteed them visibility beyond the space of the streets. For this to happen, a Frenchman who was born in Morocco and traveled the world to finally settle in a city of Bahia, played a decisive role. This is Dimitri Ganzelevitch, who has lived among us (and already is one of us, it is worth noting) since the mid-1970s. Deeply connected to the universe of popular cultures, Dimitri, a keen eye and fine nose as an appreciator and collector of art objects and a staunch advocate of heritage and popular arts, would
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not miss out on the richness and sophistication of the coffee carts. And he didn’t. In 1987, he promoted the 1st Coffee Carts and Thermos Boxes Contest. Until 2007, Dimitri managed to organize 12 more editions of the event. Since then, he could no longer do it for lack of more robust official support. It doesn’t matter, as they say here in Bahia. Dimitri never gives up – apparently, he hasn’t given up on his passion and care for popular cultures since, at the age of 14, on the edge of the Sahara, he acquired the first two handicrafts to which he added many others from the many places where he passed during his life and that today are part of the collection of his Home-Museum, in the neighborhood of Santo Antônio Além do Carmo. So, if Dimitri couldn't hold a coffee cart contest, he made a... book. This book. Now, a cup of coffee and good reading!! Paulo Miguez is a Professor at the Federal University of Bahia.
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