II Seminรกrio de
Iara Vidal
Advocacia-Geral da Uniรฃo
Nonato de Vasconcelos
DIREITO AMBIENTAL
Iara Vidal
APRESENTAÇÃO
E
ntre os dias 19 e 21 de maio de 2010, operadores do Direito de todo o Brasil, com atuação na área ambiental, reuniram-se na cidade de Poconé, em pleno pantanal mato-grossense, para o II Seminário de Direito Ambiental. O evento foi realizado pela Escola da Advocacia-Geral da União (EAGU) e pela Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF) e teve como tema Os desafios para o desenvolvimento sustentável do agronegócio. A exemplo da primeira edição, realizada no ano passado em Manaus, o II Seminário de Direito Ambiental contou com diversos especialistas na área ambiental, que discutiram temas de grande relevância para o futuro do país, como a importância da sustentabilidade para alcançar a eficiência econômica, a responsabilidade ambiental e a equidade social; Reserva Legal e produção agropecuária; e produção de etanol relacionada à conservação do meio ambiente. O Seminário também discutiu o papel das carreiras jurídicas na preservação ambiental. Nesta revista, você encontra a cobertura completa do II Seminário de Direito Ambiental, com um resumo dos principais temas abordados pelos palestrantes e painelistas do evento.
Boa leitura! Jefferson Carús Guedes, diretor da Escola da Advocacia-Geral da União (EAGU)
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II Seminário de Direito Ambiental | Poconé (MT) | maio de 2010
Nonato de Vasconcelos
Niels Andreas
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“O direito ao meio ambiente não pode prejudicar o direito ao desenvolvimento” Entrevista | Marcos Jank
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Reserva Legal e produção agropecuária
Sustentabilidade: equilíbrio para alcançar a eficiência econômica, a responsabilidade ambiental e a equidade social
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Os impactos econômicos e sociais gerados pela limitação do financiamento ao setor agropecuário por inobservância das questões ambientais
O papel das carreiras jurídicas na preservação do meio ambiente
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Imagens do II Seminário de Direito Ambiental
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Produção de etanol e preservação do meio ambiente
EXPEDIENTE Publicação do II Seminário de Direito Ambiental, realizado em Poconé (MT), de 19 a 21 de maio de 2010 Realização: Escola da Advocacia-Geral da União (EAGU) e Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF) Coordenação-geral do evento: Mauro Luciano Hauschild e Jefferson Carús Guedes Comunicação social: F7 Comunicação Organização: Arana Eventos Projeto editorial: Azimute Comunicação Produção de textos: Iara Vidal | Azimute Comunicação Edição: Alessandro Mendes | Azimute Comunicação Projeto gráfico: Luísa Vieira e Ribamar Fonseca | Supernova Design Diagramação: Mayra Fernandes, Luísa Vieira e Henrique Macedo | Supernova Design Capa: Ribamar Fonseca | Supernova Design Fotos: Nonato de Vasconcelos | EAGU, Iara Vidal | Azimute Comunicação e Niels Andreas | UNICA
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Niels Andreas
entrevista
“O DIREITO AO MEIO AMBIENTE NÃO PODE PREJUDICAR O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO” Entrevista | Marcus Jank O engenheiro agrônomo Marcos Sawaya Jank preside, desde 2007, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), maior organização representativa do setor de açúcar e bioetanol do Brasil. A entidade reúne 119 companhias, que respondem por mais de 50% do etanol e 60% do açúcar produzidos no país. Jank trabalha desde 1987 com temas ligados ao setor sucroenergético e é conselheiro da Presidência da República no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) e membro do conselho consultivo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e do conselho consultivo do setor privado da Câmara de Comércio Exterior do Governo Federal (CAMEX). Nesta entrevista, Jank fala sobre diversos assuntos que dizem respeito ao dia a dia da indústria da cana-de-açúcar, como o aprimoramento do Código Florestal, a relação entre agricultura, desenvolvimento e meio ambiente e a questão da Reserva Legal versus o direito à propriedade, entre outros.
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II Seminário de Direito Ambiental | Poconé (MT) | maio de 2010
Qual a importância da realização de um evento como o II Seminário de Direito Ambiental? Considero muito importante. Os trabalhadores da agricultura e agroindústria apontam que, hoje, as principais dificuldades de crescimento do setor estão ligadas as questão ambiental. No caso da cana-de-açúcar, temos uma agenda ambiental imensa que aborda desde à questões ligadas ao plantio até o debate sobre o clima, que, inclusive, nos é francamente favorável, pois a cana, ao produzir etanol e bioeletricidade, reduz as emissões de gases de efeito estufa e é uma alternativa concreta de energia limpa e renovável que o Brasil desenvolveu. Além disso, este II Seminário tratou, entre outros, de um tema que tem causado bastante confusão e é muito relevante para nós: a Reserva Legal. Entendemos ser necessário um aprimoramento do Código Florestal para adaptá-lo de maneira a possibilitar que o Brasil preserve, o máximo possível, tanto as florestas quanto as áreas já consolidadas e onde existe agricultura há muitas décadas. Eu entendo que a sustentabilidade é o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico, a responsabilidade ambiental e a equidade social, que têm que andar juntas. Ao falar sobre o aprimoramento do Código Florestal, quais pontos destacaria como mais necessários? Defendemos uma adaptação do conceito de Reserva Legal. Nós aceitamos este percentual de 20% imposto ao centro-sul, mesmo que seja um ônus para o setor, mas as Áreas de Preservação Permanentes (APPs) precisam ser incorporadas nessa conta. Afinal, nós estamos recuperando essas áreas e, desde que elas estejam em processo de recuperação, deveriam fazer parte dos 20%. Entendemos que o certo seria que esse conceito de Reserva Legal fosse para a bacia e que compensássemos a diferença nas regiões mais sensíveis, como a Serra do Mar, no que resta de Mata Atlântica, no Cerrado e, eventualmente, até na Floresta Amazônica. Digo compensar no sentido de garantir a preservação
daquele montante de áreas nesses biomas, e não tirar áreas agrícolas que estão produzindo há cem anos. Se tivéssemos que converter área produtiva em floresta em cada propriedade, nós perderíamos a eficiência do nosso negócio, sem contar empregos e divisas. O agronegócio representa um terço do PIB e mais de 40% das exportações do Brasil. Portanto, haveria um imenso impacto econômico. Não estamos questionando o direito ao meio ambiente, mas o direito ao meio ambiente não pode prejudicar o direito ao desenvolvimento. Chamou atenção neste II Seminário de Direito Ambiental o embate entre o direito à propriedade e a questão da Reserva Legal. O que falta para se chegar a um consenso? Esse é o ponto que torna este debate tão importante e que está faltando no nosso país. Avalio que as carreiras jurídicas presentes neste Seminário têm que ouvir todos os lados e formar opinião sobre esse assunto de uma maneira sensata e serena. Se nós só pendêssemos para o meio ambiente, não conseguiríamos manter as pessoas vivendo na cidade e a população não poderia continuar crescendo. Temos que assumir que vai haver crescimento populacional e aumento de renda e de consumo, e que é preciso ser cada vez mais consciente e poupador de recursos naturais. Eu até faria uma analogia. Se um marciano descesse neste local durante os dias do II Seminário, ele constataria a realidade de um país que tem a segunda maior reserva florestal do mundo, a qual tem aumentado ano após ano. Ele veria um país que está fazendo a lição de casa corretamente, é exemplo mundial em termos de áreas consolidadas e sob reserva e também no setor da agropecuária, embora ainda haja um problema de desmatamento ilegal que precisa ser combatido pelo Estado. Ele observaria que, atualmente, 30 países no mundo estão copiando o que o Brasil fez com programas de etanol e de biodiesel. Apenas nos últimos 12
“Se nós só pendêssemos para o meio ambiente, não conseguiríamos manter as pessoas vivendo na cidade e a população não poderia continuar crescendo. Temos que assumir que vai haver crescimento populacional e aumento de renda e de consumo, e que é preciso ser cada vez mais consciente e poupador de recursos naturais.”
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entrevista
“Não existe agricultura sem meio ambiente, mas também não existe desenvolvimento econômico sem agricultura. Como é que a gente equilibra os dois? Esse é um desafio essencialmente jurídico. O que está em jogo não é a abolição do Código Florestal e sim o seu aprimoramento, de modo a permitir ao mesmo tempo a preservação ambiental, da forma mais inteligente possível, e também o desenvolvimento econômico ”
meses, a UNICA recebeu 165 delegações de 83 países para conhecer a nossa experiência de etanol e bioeletricidade. Veria que somos uma referência em produção de carne, de soja e de milho e também o país que mais teve ganho de produtividade na agricultura nos últimos 20 anos no planeta e é exemplo de tecnologia tropical. Então, se esse marciano nos observasse, ele diria: “como em um país que está aumentando as áreas florestadas e tem uma agricultura altamente produtiva pode existir um embate tão insano nessas duas áreas?” Eu responderia que esse embate ocorre porque o tema se politizou e se midiatizou demais. Não existe agricultura sem meio ambiente, mas também não existe desenvolvimento econômico sem agricultura. Como é que a gente equilibra os dois? Esse é um desafio essencialmente jurídico. O que está em jogo não é a abolição do Código Florestal e sim o seu aprimoramento, de modo a permitir ao mesmo tempo a preservação ambiental, da forma mais inteligente possível, e também o desenvolvimento econômico. Falta um debate maduro, sereno, desprovido de posições apriorísticas. Acredito que esse debate deveria ser mais intenso nos meios jurídico e legislativo, nos quais as leis são feitas, aplicadas e o não cumprimento delas é julgado. Esse evento se reveste de imensa importância e gostaria de vê-lo ocorrendo sempre. Quando definimos uma questão como Reserva Legal, não estamos simplesmente definindo a produção do ano que vem ou do outro. Estamos definindo que Brasil nós vamos ter daqui a 100 anos.
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II Seminário de Direito Ambiental | Poconé (MT) | maio de 2010
Outro ponto que chamou a atenção durante o seminário foi o descompasso entre o discurso do setor produtivo e do Ministério do Meio Ambiente. Enquanto o primeiro lista uma série de dificuldades para, por exemplo, averbar uma Reserva Legal, o MMA descreve o processo como absolutamente organizado. Qual sua avaliação sobre essa realidade? Para a implementação do Código Florestal na íntegra, é preciso ter toda a burocracia governamental reformulada, com investimentos pesados. A quantidade de processos esperando georreferenciamento e a confusão que tem havido no campo é imensa. Por outro lado, existe ainda uma demonização do agronegócio muito motivada pela falsa ideia de que há uma grande e uma pequena agricultura, o que não é verdade. Quem fala em barões do açúcar e latifúndios não conhece a dinâmica de crescimento da agricultura brasileira, que é formada, na verdade, por uma região abençoada em termos de sol, água, terras e que, com alta tecnologia, nos últimos 20 anos, desenvolveu uma agricultura admirada e temida no mundo inteiro pela sua competitividade e com o compromisso da preservação ambiental. Eu não aceito a afirmação de que há pressões econômicas contra o meio ambiente. A economia e o meio ambiente andam juntos e a agricultura é o maior exemplo disso. Temos que fazer uma agricultura moderna, tecnológica, que poupe recursos naturais e gere riqueza para a sociedade, sempre economizando e transformando esses recursos da melhor forma possível.
Niels Andreas
Sobra ideologia e política e falta ciência no debate entre agricultura e meio ambiente? Aqui no II Seminário, ouvimos posições diferentes de grupos que têm se defrontado na formulação das políticas. Diria que, dentro do próprio governo, há posições confrontatórias entre as áreas de agricultura e do meio ambiente. O mesmo ocorre no Congresso Nacional. No Ministério Público, é possível encontrar procuradores com diferentes visões. A sociedade é assim e isso é bom. Temos que transformar esse confronto em um debate sadio e construtivo que melhore a vida das pessoas e a preservação ambiental. Em minha avaliação, o maior sinal de subdesenvolvimento do Brasil é a fraqueza das instituições e o quanto este país ainda precisa de regras estáveis, de segurança jurídica, de definição do que é certo e do que é errado. Há áreas cinzentas muito preocupantes, no caso da agricultura e do meio ambiente, que precisam de aprimoramentos, os quais demora-se para fazer. A solução do conflito entre agricultura e meio ambiente passa pelo Congresso Nacional? Eu diria que sim. Mas há pessoas que dizem que o Congresso não vai resolver, que será editada nova Medida Provisória. Alguns avaliam que é preciso reformar o Código Florestal inteiro. Eu sou da opinião que o aspecto da Reserva Legal é importante e carece de maior segurança jurídica, passando por uma reforma rápida. Enfim, existe todo tipo de opinião. Eu gostaria que o Legislativo exercesse seu papel e aprimorasse o Código Florestal no aspecto da Reserva Legal.
Há a avaliação de que os atores envolvidos no debate entre meio ambiente e agricultura parecem não estar dispostos a abrir a mente e mudar de ideia. Qual é a sua opinião a esse respeito? Fui professor durante 20 anos e acho que o processo de aprendizagem é demorado. As pessoas têm que formar novos conhecimentos e refletir. Em eventos como este Seminário, assim como em vários outros dos quais participei, há sempre aqueles participantes que, por trabalharem apaixonadamente de um lado e de outro, defendem arduamente seu ponto de vista. Se, por um lado, há realmente pessoas mais radicais que não vão mudar de opinião, por outro, existe uma imensa maioria que desconhece ou que está mal informada sobre o assunto. Um evento como o II Seminário ajuda a formar opinião, o que considero fundamental no meio jurídico. Participo de vários eventos sobre esse tema, nos mais variados fóruns, tanto no Brasil quanto no exterior. Mas, na área jurídica, eu ainda não havia participado de um tão denso quanto este. Acredito que iniciativas como esta são fundamentais e devem ser reproduzidas. Também creio que o Congresso Nacional precisa se aprofundar nessa matéria, que está diretamente relacionada à vida dos nossos descendentes. Que tipo de país nós vamos deixar para eles em termos ambientais, econômicos, de preservação das florestas e dos ecossistemas? Qual o tipo de agricultura que vamos ter no futuro e qual o potencial dessa agricultura? É disso que se trata.
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abertura
Direito, meio ambiente e desenvolvimento
SUSTENTÁVEL
Iara Vidal
A solenidade de abertura do II Seminário de Direito Ambiental foi realizada no Centro de Convenções do Hotel SESC Poconé, no Mato Grosso, na noite do dia 19 de maio de 2010. A mesa foi composta pelo consultor jurídico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), procurador federal José Silvino da Silva Filho (presidente); pela consultora jurídica da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso Margareth Pozzobon, representando o presidente daquela casa; pelo juiz de Direito Edson Dias Reis, da comarca de Poconé/MT; pelo juiz de Direito José Zuquim Nogueira, da Vara Especializada do Meio Ambiente da comarca de Cuiabá/MT, representando o presidente do Tribunal de Justiça do Mato Grosso, desembargador José Silvério Gomes; pelo presidente da União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (UNICA), Marcos Sawaya Jank; e pelo procurador federal Sebastião Faustino, como representante da Escola da Advocacia-Geral da União (EAGU).
A
plateia, com cerca de 150 participantes, era formada principalmente por operadores do Direito. Juízes, procuradores federais, promotores, advogados da União, delegados de polícia e peritos criminais vieram das cinco regiões do Brasil para participar do seminário e trocar ideias sobre Direito Ambiental. O procurador federal Sebastião Faustino, representante da Escola da Advocacia-Geral da União (EAGU), observou que o tema meio ambiente, em geral, suscita posições apaixonadas das pessoas. Ele recordou-se de um episódio ocorrido em Planaltina (DF), cidade a 44
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II Seminário de Direito Ambiental | Poconé (MT) | maio de 2010
quilômetros de Brasília, em junho de 2000. O lavrador Josias Francisco dos Anjos foi preso em flagrante quando raspava a casca de uma árvore para fazer chá para sua mulher, que sofria de doença de Chagas. A prisão do lavrador provocou enorme polêmica entre cidadãos, ambientalistas e políticos. Três dias depois de ser preso, Anjos foi libertado após decisão de um juiz. Àquela época, relatou, o caso acabou gerando um debate entre os procuradores federais, que discutiram o equilíbrio que deve se buscar para tratar de questões que envolvam o meio ambiente.
Sebastião Faustino, procurador federal e representante da Escola da
Nonato de Vasconcelos
“É preciso buscar o equilíbrio. Não é possível ficar só no lado racional, buscando a qualquer custo defender o meio ambiente em detrimento do desenvolvimento e das pessoas que dele sobrevivem. Mas também não podemos ser racionais ao ponto de achar que o meio ambiente não tem importância.” Advocacia-Geral da União (EAGU)
“É muito importante falar em sustentabilidade, que no fundo é o difícil equilíbrio entre o desenvolvimento econômico, a responsabilidade ambiental e a equidade social.”
Nonato de Vasconcelos
O presidente da União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (UNICA), Marcos Sawaya Jank, ressaltou que o meio ambiente é o tema mais importante da agenda da indústria da cana-de-açúcar, assim como – acredita – da maioria das entidades representativas agrícolas. Ele avaliou como extremamente positiva e simbólica a iniciativa de promover, pela segunda vez, um evento para tratar de Direito Ambiental e destacou que os locais de realização dos seminários – Manaus (primeira edição) e Pantanal – são extremamente sensíveis ambientalmente.
Marcos Sawaya Jank, presidente da União das Indústrias de Cana-de-açúcar (UNICA)
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abertura
Nonato de Vasconcelos
O juiz de Direito Edson Dias Reis, da comarca de Poconé (MT), destacou a importância de debater temas relacionados à proteção do meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável. Ele ressaltou a relação peculiar que os moradores da região do Pantanal mato-grossense têm com a natureza. Reis contou um caso que o marcou em sua trajetória como juiz na área do meio ambiente, ocorrida em uma das primeiras audiências no Juizado Especial. Tratava-se de uma briga entre vizinhos por um papagaio domesticado. A ave passou para a casa do vizinho, que não quis devolver o bicho. Foi determinada, então, a busca e a apreensão do pássaro. Para proferir a sentença, o juiz levou em consideração a vontade do próprio papagaio, que durante a audiência voou para o colo do antigo dono.
”A própria natureza nos dá o ar, nos dá os alimentos e, às vezes, nos dá até a resposta necessária para o julgamento de um processo.” Edson Dias Reis, juiz de Direito da comarca de Poconé/MT
Nonato de Vasconcelos
A consultora jurídica Margareth Pozzobom, do Núcleo Ambiental da Assembleia Legislativa do Mato Grosso, destacou a importância de se debater os desafios do desenvolvimento sustentável para o estado do Mato Grosso. Ela fez um breve resumo das iniciativas da Assembleia Legislativa mato-grossense no tema meio ambiente, contou que o Legislativo estadual tem buscado o entendimento democrático e citou projetos de lei importantes que tratam do assunto. Como o PL 273/2008, que institui a Política de Planejamento e Ordenamento Territorial do estado, mais conhecido como Zoneamento Socioeconômico Ecológico (ZSEE). A matéria foi encaminhada pelo governo estadual ao Legislativo em abril de 2008 e desencadeou um processo de debate junto à sociedade civil organizada.
Margareth Pozzobom, consultora jurídica do Núcleo Ambiental da Assembleia Legislativa do Mato Grosso
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“Ainda existe a necessidade de despender um imenso esforço para gerar conhecimento e tecnologias que possam promover o desenvolvimento sustentável desta região complexa e ainda bastante carente de infraestrutura.”
II Seminário de Direito Ambiental | Poconé (MT) | maio de 2010
“As informações trazidas servirão não só para a nossa atividade do dia a dia, mas também, por certo, beneficiarão toda a população pantaneira.”
Nonato de Vasconcelos
O juiz de Direito José Zuchi Nogueira, da Vara Especializada do Meio Ambiente da comarca de Cuiabá/ MT, falou sobre a importância do debate tanto sobre as transformações já ocorridas quanto sobre as que ocorrerão no Pantanal, ecossistema com quase 140 mil km2 de áreas alagáveis. Ele destacou a relevância do conteúdo programático, a participação de especialistas de várias áreas do conhecimento e a troca de ideias.
José Zuchi Nogueira, juiz de Direito da Vara Especializada do Meio Ambiente da comarca de Cuiabá/MT
“Há uma expectativa colocada pelo próprio mundo na capacidade de produção de alimentos que o Brasil tem. O grande desafio é que ela se faça de forma sustentável.”
Nonato de Vasconcelos
O procurador federal José Silvino da Silva Filho, consultor jurídico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), ressaltou a importância da busca da segurança jurídica que garanta o equilíbrio entre a produção de alimentos e a preservação do meio ambiente. Comentou que o Brasil possui características únicas – “megadiverso, grande importador e exportador” – que lhe garantem um papel importante no mundo e condições de sempre buscar esse equilíbrio nos fóruns internacionais.
José Silvino da Silva Filho, procurador federal e consultor jurídico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA)
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Iara Vidal
palestra inaugural
SUSTENTABILIDADE: equilíbrio para alcançar a eficiência econômica, a responsabilidade ambiental e a equidade social
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presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), Marcos Jank, traçou um cenário sobre a questão ambiental sob o ponto de vista do agronegócio. Ele destacou a segurança jurídica na área ambiental como essencial para que o desenvolvimento do país contemple uma agricultura eficiente, com as florestas preservadas. Embora tenha ressaltado o difícil e frágil equilíbrio entre o crescimento da agricultura e do agronegócio e a preservação do meio ambiente, o executivo mostrou otimismo nos caminhos que o Brasil tem tomado rumo ao desenvolvimento sustentável. Jank falou sobre a liderança brasileira na agricultura, destacando o papel da região Centro-Oeste, que faz do país exemplo para o mundo inteiro em tecnologia agropecuária em região tropical. Ele destacou que os números recordes do setor devem-se, sobretudo, à produtividade e não a avanços na ocupação do território, e que o desenvolvimento do interior do Brasil ocorreu graças à tecnologia agrícola e ao uso dos recursos naturais de maneira inteligente. O palestrante também destacou que o Brasil é um dos países mais ricos e importantes do planeta em termos de biomas sensíveis de meio ambiente tropical, com imensa biodiversidade e riqueza. Ele citou que o país tem a segunda maior reserva de florestas do mundo e que a área ocupada por esse ecossistema tem, inclusive, aumentado nos últimos anos. “Hoje, mais de 60% do território brasileiro é ocupado por florestas”, destacou. Para o presidente da UNICA, esses avanços fazem da experiência brasileira uma história de êxito em preservação e conservação do meio ambiente. Um exemplo é o estado de São
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“Obriga-se o agricultor a desfazer o que ele foi convidado a fazer anos atrás. Há 30 anos, a Amazônia era um vazio a ocupar, hoje é um vazio a preservar. A regra do jogo mudou. A gente corre o risco de assistir a uma destruição de valores sem precedentes na agricultura por conta da insegurança jurídica. Se nós tivermos que abandonar áreas produtivas para converter em florestas, estaremos causando um imenso problema econômico e social. Essa autoflagelação não faz sentido”. Marcos Jank, presidente da União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (UNICA)
Paulo, onde, segundo ele, existe crescimento da área florestada. Jank informou que o setor da cana demarcou 250 mil hectares de Áreas de Preservação Permanente (APPs) em São Paulo, que estão protegidos e sendo lentamente recuperados.
DESMATAMENTO Em contraponto, Jank destacou problemas na área ambiental, como o desmatamento descontrolado na Amazônia. Para ele, a questão está relacionada à segurança jurídica e ocorre pela ausência do Estado e pela falta de fiscalização e de direito à propriedade em locais com imensa extensão de terras. Para Jank, o grande desafio é que o governo, junto com o setor produtivo, encontre a legalidade combatendo a ilegalidade. Ele cita o exemplo do setor de cana-de-açúcar, que tomou iniciativas como a criação das áreas de Zoneamento Agroecológico em São Paulo – que delimita os locais onde pode ser feito o plantio – e o fim da prática das queimadas da cana no estado. Outro exemplo é o projeto de Zoneamento Nacional da Cana-de-Açúcar, que está em andamento e estabelecerá que o cultivo não crescerá com o desmatamento nem será feito na Amazônia nem no Pantanal. Mesmo com ações positivas em curso no Brasil para conciliar a agricultura e o meio ambiente, comentou o
palestrante, o que ganha destaque no exterior são os fatos negativos, como as queimadas e o desmatamento. Ele ressalta que os países que acusam o Brasil de devastador são aqueles que já acabaram com as suas florestas, não têm APPs ou o conceito de Reserva Legal e, infelizmente, têm uma lista de serviços que deixa muito a desejar, mas que gostam de apontar o dedo para os outros. O palestrante sublinhou que o Brasil tem dois gigantes mundiais: a agricultura e o meio ambiente. A relação entre as duas áreas tem sido marcada por uma irracionalidade que precisa que ser superada. Se, por um lado, o país tem potencial para atender à crescente demanda mundial de produção de alimentos, por outro, tem que preservar os valiosos biomas que abriga. Para Jank, o desenvolvimento da agricultura passa pelo uso de tecnologias e tem que ser feito de forma ordenada, buscando a sustentabilidade, que ele traduz como “o difícil equilíbrio entre eficiência econômica, responsabilidade ambiental e equidade social”. Um dos exemplos de “irracionalidade” citado pelo palestrante foi a questão da Reserva Legal, que – segundo ele – traz uma enorme insegurança jurídica por trás do seu conceito e é o principal assunto da área ambiental que atinge a agricultura. O ideal, para ele, seria uma situação em que as florestas existentes são preservadas e o desenvolvimento agrícola em áreas consolidadas é mantido. No entanto, o que se assiste é a invasão das florestas pela agricultura
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palestra inaugural
por ausência do Estado e pela falta do direito à propriedade, e um movimento no qual se quer tirar áreas que têm agricultura há 100 ou 150 anos e converter de novo em floresta, perdendo eficiência econômica. Jank criticou a interpretação que vem sendo dada à recomposição das áreas de Reserva Legal – 20% no Sul, 35% nos cerrados e 80% na Amazônia – a ser feita em cada propriedade. Essa situação resultou em fiscalizações, multas, ações, ações civis públicas e problemas com licenciamento, em meio a uma legislação confusa e a uma enorme insegurança jurídica. Além disso, ao reconstituir a Reserva Legal em cada propriedade, salientou Jank, são criadas ilhotas de vegetação desconectadas e sem sentido ambiental, que só causam impacto negativo na eficiência econômica ao converter áreas de cultivo. A sugestão do palestrante é que o conceito de Reserva Legal seja tratado a partir de um conceito de bacia ou de bioma. Ele defende ainda que, a partir do momento em que existe uma lei que retroage por razões ambientais, tem que haver um debate sobre quem vai arcar com os custos dessas conversões. Enquanto países da Europa e os Estados Unidos arcam com os custos de preservação de certas áreas, diz o palestrante, no Brasil, estão havendo imposições.
RESERVA LEGAL
Zsuzsanna Kilian
Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção da fauna/flora nativas. Instituída pela Lei Federal nº 4.771/65 (Código Florestal) e alterada pela Lei Federal nº 7.803, de 18 de julho de 1989, e pelas Medidas Provisórias 2166 e 2167, de 2001.
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DA CANA-DE-AÇÚCAR À CANA-DE-ENERGIA
http://www.imsc.res.in/
O Brasil é o maior produtor mundial de cana-de-açúcar, cultivada em cerca de 7 milhões de hectares (2% da terra arável do país). Os canaviais estão nas regiões Sudeste, Centro-Oeste, Sul e Nordeste, o que assegura duas safras anuais e produção o ano inteiro de açúcar e etanol para os mercados interno e externo. O pioneirismo do Brasil com a criação, em 1975, do Programa Nacional do Álcool (Proálcool) diversificou a atuação da indústria açucareira e serviu como alternativa para diminuir a vulnerabilidade energética do país em face à crise mundial do petróleo. Em algum momento, o mundo teria problemas com a energia que o dominou por 150 anos. Os brasileiros saíram na frente. Hoje, o país tem o programa mais desenvolvido de biocombustíveis do planeta e o produto mais competitivo. O Brasil é o único país com 50% da frota com veículos flexíveis, que aceitam álcool ou gasolina; conta com 25% de álcool misturado à gasolina e mantém uma rede nacional de distribuição do etanol. Há 30 anos, no início do programa de etanol de cana, eram produzidos 3 mil litros do combustível por hectare. Atualmente, o setor está alcançando 8 mil litros na mesma área e, com as novas variedades de cana que estão sendo desenvolvidas, a previsão é chegar a 14 mil litros. Agora, o setor iniciou um projeto de produção de eletricidade com o bagaço e a palha da cana. O potencial de bioeletricidade nos canaviais brasileiros corresponde a 15 mil megawatts. Já estão sendo produzidos 3 mil megawatts.
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Niels Andreas
painel
OS IMPACTOS ECONÔMICOS E SOCIAIS gerados pela limitação do financiamento ao setor agropecuário por inobservância das questões ambientais
O
primeiro painel do II Seminário de Direito Ambiental, realizado na manhã do dia 20 de maio de 2010, teve como tema “Os impactos econômicos e sociais gerados pela limitação do financiamento ao setor agropecuário por inobservância das questões ambientais”. O debate contou, de um lado, com críticas à atual legislação ambiental e aos requisitos exigidos pelos bancos, em especial o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para a concessão de crédito aos produtores rurais. De outro, com defesas da atual legislação (sobretudo no que diz respeito à implantação de Reserva Legal e Área de Preservação Permanente) e das exigências ambientais obrigatórias para o crédito oficial,
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consideradas essenciais para o desenvolvimento sustentável do Brasil. Participaram do debate o secretário de Meio Ambiente de Mato Grosso, Alexander Torres Maia, que presidiu a mesa; o procurador da Fazenda Nacional e consultor jurídico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) Luís Carlos Silva de Moraes; o superintendente do Meio Ambiente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Sérgio Eduardo Weguelin Vieira; o fiscal federal agropecuário do MAPA Roberto Lorena; o gerente de projetos do Departamento de Economia e Meio Ambiente do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Shigeo Shiki; o coordenador da Assessoria
Técnica da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Rodrigo Justus de Brito; e o presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (ABRAFRIGO), Péricles Pessoa Salazar. O secretário de Meio Ambiente de Mato Grosso, Alexander Torres Maia, observou que diversos produtores mato-grossenses não têm acesso ao crédito oficial devido a implicações ambientais. Segundo ele, o estado tem tomado diversas medidas para mudar essa realidade, entre elas o Programa de Regularização Ambiental e Fundiária, o MT Legal. “Durante muito tempo, fomos apontados como um dos principais vilões no que diz respeito à preservação ambiental e ao combate ao desmatamento. Isso não é verdade. O Mato Grosso produz alimentos para o mundo e tem mais de 64% de seu território – 93 milhões de hectares – totalmente preservados. É claro que temos passivos ambientais a resolver, mas temos trabalhado nesse sentido”, destacou. Segundo Maia, o MT Legal desburocratizou o licenciamento e a regularização ambiental dos produtores rurais do estado a partir de um modelo criado por meio do diálogo com vários atores (Ibama, Ministério do Meio Ambiente e Ministério Público Federal e do Mato Grosso). “O programa permite que os produtores venham até o órgão ambiental estadual dizer quem são, onde estão e se possuem ou não seus passivos de acordo com a lei. Criamos uma janela de tempo em que o produtor, ao declarar qual é o seu passivo, fica isento das responsabilidades penais e administrativas geradas pelo descumprimento da lei”, informou. “Temos feito um forte trabalho de conscientização e incentivado os produtores a aderirem ao programa, que é sem dúvida o instrumento jurídico mais adequado para o momento em que vivemos”, informou. Maia ressaltou a importância de que os produtores se adéquem às exigências ambientais, sobretudo em relação a Reserva Legal e Área de Preservação Permanente, mas critica os “empecilhos” colocados pelo Banco Central em relação à exigência da certidão de regularização ambiental para que os produtores tenham acesso ao crédito. “Quem sai beneficiado nesse sistema, sem dúvida alguma, são as trades, que acabam financiando a produção agropecuária do Mato Grosso e do Brasil de um modo geral”, observou. O procurador da Fazenda Nacional e consultor jurídico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) Luís Carlos Silva de Moraes destacou que a implantação das Reservas Legais terá efeitos econômicos negativos para o Brasil. “Será uma perda, por ano, de 74 bilhões de reais do PIB, ou 58% da média de crescimento anual. Em questão de tributos, serão 22 bilhões de reais. Isso é mais do que o superávit da balança comercial do nosso país em alguns anos”, afirmou. A perda tributária, avaliou o procurador, prejudicará sobretudo os municípios. Dados da Confederação Nacional dos Municípios de 2007 mostram que 58% da arrecadação de impostos ficam com a União, 25% com os estados e 16,5% com os municípios. “Eles são o elo mais fraco da corrente. A pergunta é: os nossos
“Para nós, do setor privado, é muito difícil trabalhar sem um norte definido para que tenhamos a segurança jurídica e institucional para levar adiante os nossos negócios” Péricles Pessoa Salazar, presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (ABRAFRIGO)
municípios sobreviverão a essa queda tributária? Qual a probabilidade de estados e União, que também perderão receita, auxiliarem os municípios, sobretudo em tempos de restrição orçamentária?”, questionou Moraes. “Para mim, tudo isso mostra que a manutenção da área agrícola consolidada não é favor ao produtor rural. É necessidade pública”, disse. O presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (ABRAFRIGO), Péricles Pessoa Salazar, observou que há um emaranhado de leis que tratam do tema ambiental, resultando em enorme confusão para o setor privado, e criticou a política de análise de quesitos ambientais que passou a ser adotada pelo BNDES para concessão de financiamentos. Para ele, há um descompasso entre a teoria e a prática nessa questão do crédito, e as normas editadas pelo banco não atendem à maioria esmagadora da indústria frigorífica brasileira, por deixarem de fora os pequenos e médios e atenderem apenas os grandes. “Para nós, do setor privado, é muito difícil trabalhar sem um norte definido para que tenhamos segurança jurídica e institucional para levar adiante os nossos negócios. Até brinco dizendo que muito se fala na questão da flatulência das vacas, que dizem ser um grande fator de emissão de CO2. Tomara que amanhã ou depois não apareça uma ONG ou um legislador que queira restringir a flatulência das vacas como concessão necessária para o financiamento bancário”, ironizou. Salazar destacou que os empresários do setor frigorífico estão cada vez mais conscientizados da importância da preservação ambiental. “A indústria hoje quer participar e se adequar. Cada vez mais, os frigoríficos brasileiros estão procurando fazer o seu papel. Mas é importante que o Estado esteja presente, regularize e seja eficiente na preservação ambiental. O Estado brasileiro é muito bom para punir e aplicar sansões, mas é péssimo para controlar e dar um rumo seguro para a atividade empresarial”, criticou. O coordenador da Assessoria Técnica da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA),
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painel
“A CNA não aceita que se mande, por decreto, desmanchar 30% da produção do país porque tem uma medida provisória, que ainda não é lei, dizendo para tirar áreas da produção sem comprovação científica de que haverá benefício ambiental com isso. Esse é o ponto. Não há comprovação específica da danosidade do uso, muito menos de qual é o ganho ambiental de se fazer isso”, afirmou. Para ele, a legislação ambiental precisa ser revista com urgência. “É preciso simplificar ao máximo o licenciamento ambiental da propriedade rural, com regras claras, porque hoje ainda há muita confusão. Se não fizermos regras claras, o nosso gigante ficará adormecido, na verdade encalhado. A aplicação da legislação ambiental como está vai gerar um problema muito mais sério do que existe hoje. Temos que resolver essa situação e isso precisa ser feito no Congresso Nacional. A desordem administrativa
Nonato de Vasconcelos
Rodrigo Justus de Brito, contestou os comentários feitos tanto no Brasil como no exterior de que o país virou gigante de tanto destruir a Amazônia. “Isso não é verdade. Temos dados do Ministério do Meio Ambiente que mostram que 80% da Amazônia, 87% do pantanal, 60% do cerrado, 60% da caatinga, 41% do pampa e 26% da Mata Atlântica estão preservados. O crescimento da agricultura e da pecuária brasileira é baseado principalmente em tecnologia e não em desmatamento”, destacou. Segundo Brito, de 1965, ano da criação do Código Florestal, a 2006, a área utilizada na agricultura aumentou 30%, enquanto a produção de grãos cresceu 624%. Já as áreas de pastagem cresceram 24% e a produção de carne, 1000%. “Isso é a prova de que o avanço e a pujança da agricultura e pecuária brasileira vêm da tecnologia”, observou. Brito criticou a legislação ambiental referente a Reservas Legais e Áreas de Proteção Permanente.
O debate, por um lado, trouxe críticas à atual legislação ambiental e aos requisitos exigidas pelos bancos para a concessão de crédito aos produtores rurais. Por outro, contou com defesas das exigências ambientais obrigatórias para o crédito oficial, consideradas essenciais para o desenvolvimento sustentável do Brasil
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e a insegurança jurídica é o maior problema hoje do produtor rural”, lamentou.
RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL O superintendente de Meio Ambiente do BNDES, Sérgio Eduardo Weguelin Vieira, ressaltou que a responsabilidade socioambiental é um dos principais itens do planejamento estratégico do banco. “As empresas estão acordando para a importância da sustentabilidade. O mundo está cobrando isso, então, é importante que o banco esteja na frente. Em todas as modalidades de crédito, exigimos as licenças ambientais, tanto diretas como indiretas, de acordo com a regulamentação 3545 do Banco Central. As novas diretrizes socioambientais do BNDES representam a consolidação de um trabalho em curso com o objetivo de contribuir para a organização e regularização do setor agropecuário em padrões sustentáveis”, disse. Segundo Vieira, para fazer jus ao financiamento do BNDES, os produtores terão ainda mais exigências do ponto de vista socioambiental. Uma delas, informou, é a rastreabilidade de carne, no caso das indústrias frigoríficas. “A partir de 2012, o rebanho precisará ter uma rastreabilidade mínima de seis meses antes do abate. Em 2016, o gado terá de ser rastreado desde o nascimento, para que seja possível saber, por exemplo, se ele tem origem limpa, se mudou de uma propriedade para outra, se passou por área embargada e se está de acordo com todas as exigências”, explicou. Vieira destacou que o BNDES tem investido em linhas de crédito ambientais. “Nós temos o fundo de baixo carbono, para empresas brasileiras que vão gerar crédito de carbono. Temos linhas para investimento em florestas. O potencial no Brasil é gigantesco, temos hoje seis milhões de hectares plantados e podemos dobrar essa área tranquilamente. Vamos fazer também fundos de energia limpa, de saneamento e de tratamento de resíduos, entre outros”, adiantou. O superintendente também citou o Fundo da Amazônia, que visa evitar o desmatamento na região, criar atividades produtivas, desenvolver ciência e tecnologia e cuidar de áreas protegidas e territórios indígenas. O gerente de Projetos do Departamento de Economia e Meio Ambiente do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Shigeo Shiki, destacou que a biodiversidade é fator-chave para a competitividade da agropecuária brasileira e um diferencial do Brasil em relação a outros países. Para ele, ao preservar essa biodiversidade, a Reserva Legal não deve ser interpretada como empecilho para o crescimento da produção agrícola, mas como diferencial que au-
“O potencial no Brasil é gigantesco, temos hoje seis milhões de hectares plantados e podemos dobrar essa área tranquilamente. Vamos fazer também fundos de energia limpa, de saneamento e de tratamento de resíduos, entre outros” Sérgio Eduardo Weguelin Vieira, superintendente de Meio Ambiente do BNDES
menta a segurança da produção e agrega valor aos produtos. “A produção brasileira tem dado mostras de que pode ser integrada ao meio ambiente a partir de práticas que aumentam sua produtividade e sustentabilidade, como plantio direto, manejo integrado de pragas, integração da lavoura com a pecuária e produção orgânica. Se, por um lado, há custos para repor a biodiversidade na reserva legal, por outro, o produtor que mantém essa reserva e adota boas práticas agropecuárias também tem ganhos e benefícios muito importantes”, observou. Shiki destacou que as exigências ambientais por parte dos bancos só tendem a crescer. “Em maio, tivemos uma reunião com os bancos públicos e a FEBRABAN (Federação Brasileira de Bancos). Os maiores bancos já aderiram ao Protocolo Verde, entre eles os bancos oficiais, o Bradesco, o Itaú, o Unibanco. Eles estão olhando cada vez mais esta ligação entre risco ambiental e risco financeiro. O licenciamento é uma garantia de redução de risco ambiental que pode refletir-se no risco financeiro. Esta é a ideia que está se desenvolvendo cada vez mais nos bancos”, afirmou. O gerente do MMA destacou a importância da lei 192, em tramitação no Congresso Nacional, que cria um fundo federal de pagamento por serviços ambientais, com recursos do petróleo, de doações internacionais e do mercado de carbono, entre outros. “O que se vai fazer é tentar criar um mecanismo de gestão bastante rápida”, afirmou. Entretanto, Shiki avalia que estabelecer as políticas de monitoramento e verificação será um grande desafio. “Como medir serviços ambientais é uma discussão homérica. Será preciso estabelecer um processo de modo que o custo de transação não seja proibitivo, porque senão acaba gastando no processo mais do que o dinheiro pago ao produtor rural pelos serviços ambientais”, informou.
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Iara Vidal
painel
Reserva Legal e
PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA
“R
eserva Legal e produção agropecuária” foi o tema do segundo painel do II Seminário de Direito Ambiental, realizado na tarde do dia 20 de maio de 2010. O debate foi marcado por críticas em relação à legislação relativa à Reserva Legal, considerada pelo produtores rurais como excessivamente rígida e longe da realidade principalmente das propriedades de pequeno e médio porte, sobretudo no que diz respeito aos altos custos necessários para a recuperação de áreas degradadas. Produtores e Ministério da Agricultura também destacaram a importância e a urgência da aprovação da reforma do Código Ambiental, atualmente em trâmite no Congresso Nacional.
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P articiparam do painel a procuradora federal e coordenadora-geral de Assuntos Jurídicos do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Gerlena Maria Santana de Siqueira, que presidiu a mesa; o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), Marcos Jank; o coordenador da Assessoria Técnica da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rodrigo Justus de Brito; e o consultor jurídico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), procurador federal José Silvino da Silva Filho. A coordenadora-geral de Assuntos Jurídicos do MMA, Gerlena Maria Santana de Siqueira, descreveu o processo de regularização da Reserva Legal (RL) em várias situações (dentro e fora da propriedade e de
imóvel com percentual de RL inferior), abordou a compensação da reserva nos casos enquadrados como servidão florestal e de cota de reserva florestal e tratou das obrigações de recompor a RL e das sanções a que estão sujeitos os proprietários rurais pelo não cumprimento da lei. “O Código Florestal pode ter se tornado mais rígido ao aumentar o percentual obrigatório de Reserva Legal, mas, ao mesmo tempo, trouxe vários mecanismos e opções para que o proprietário de imóvel rural se adéque em relação à averbação da reserva”, afirmou Gerlena. A procuradora citou como exemplo a compensação da Reserva Legal, que pode ser feita em outra área, própria ou de terceiros, de igual valor ecológico, localizada na mesma microbacia e dentro do mesmo estado, desde que observado o percentual mínimo exigido para a região. Outra possibilida-
de, informou Gerlena, é a aquisição de imóvel dentro de uma unidade de conservação. “É possível resolver a obrigação de recompor a Reserva legal adquirindo terra dentro de uma unidade de conservação, como parques, reservas extrativistas e florestas nacionais, que será doada ao órgão ambiental que gere essa unidade de conservação, que tem ser de domínio público”, explicou. Para Gerlena, abrir mão da área de Reserva Legal é abrir mão dos atributos ambientais que são importantes para a biodiversidade. “A questão que precisamos encarar e refletir é se poderemos prescindir de algo que ambientalmente é muito importante para o Brasil, em que somos diferenciados dos demais países, que é a biodiversidade. O Código Florestal brasileiro é tão aplaudido em outros países porque se preocupou com isso”, destacou a representante do MMA.
Percentuais obrigatórios de Reserva Legal Percentual
Região
80%
Amazônia Legal (AC, PA, AM, RR, RO, AP, MT, regiões situadas ao norte do paralelo 13º S em TO e GO, e oeste do meridiano 44º O, no MA)
35%
Cerrados na Amazônia Legal (20% na propriedade, sendo que 15% podem ser compensados e averbados em outra área)
20%
Campos gerais e demais regiões
“O Código Florestal pode ter se tornado mais rígido ao aumentar o percentual obrigatório de Reserva Legal, mas, ao mesmo tempo, trouxe vários mecanismos e opções para que o proprietário de imóvel rural se adéque em relação à averbação da reserva“ Gerlena Maria Santana de Siqueira, procuradora federal e coordenadora-geral de Assuntos Jurídicos do Ministério do Meio Ambiente (MMA)
RECOMPOSIÇÃO DA RESERVA LEGAL A recomposição da Reserva Legal deverá ser realizada adotando-se as seguintes alternativas, isolada ou conjuntamente: •
Plantio, a cada três anos, de no mínimo 1/10 da área necessária à sua complementação, com espécies nativas;
•
Condução da regeneração natural, desde que autorizada pelo órgão ambiental competente, após comprovação de sua viabilidade, com laudo técnico, podendo-se exigir que a área seja cercada.
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painel
Iara Vidal
O coordenador da Assessoria Técnica da CNA, Rodrigo Justus de Brito, criticou o aumento de 50% para 80% da Reserva Legal na Amazônia e a sistemática pela qual cabe ao produtor arcar com os custos de averbação da Reserva Legal. Ele informou que a CNA ingressou, em 2004, com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) no Supremo Tribunal Federal contestando esse dois pontos. “Em uma pequena propriedade, a recuperação de área custa de cinco mil a quinze mil reais por hectare e a renda anual de um produtor nessa mesma área é de 150 reais. Então, seria de 30 a 100 anos do trabalho do produtor para recuperar um hectare no qual ele não terá mais renda”, afirmou. Brito observou também que, apesar de muito se falar que é possível explorar a área de Reserva Legal por meio de manejo sustentável ou de extrativismo, na prática, a tarefa é muito difícil. “São trabalhos de difícil execução que nem sempre estão afetos ao produtor. Além disso, tanto o manejo quanto o extrativismo são de baixa rentabilidade”, observou. “A reserva de maior sucesso de extrativismo do Brasil é a de Manicoré (AM), que dá uma renda mensal bruta de 115 reais por família. O extrativismo levado a cabo é uma vida subumana no meio da floresta, o cidadão não tem dinheiro nem para vir à cidade reclamar”, destacou. O sequestro de carbono, afirmou Brito, também não é alternativa viável para a exploração econômica da Reserva Legal. “Viver do sequestro de carbono é para poucos, não só pela escassez do dinheiro, mas também por toda a infraestrutura e exigências burocráticas que estão vinculadas. Não quero dizer que não venha a ser também uma oportunidade. Pode até ser um plus, mas nunca substituirá a renda necessária para a subsistên- tiva (recuperada em até 10 anos). Além disso, deveria cia do produtor e de sua família”, avaliou. também ser proibida a conversão de novas áreas para uso agropastoril do solo. Jank sugeriu também a compensação ampla no bioma, retirando restrições como o limite dos territórios das unidades da Federação, e a possibilidade de compensação parcial ou integral da Reserva Legal em bioma diverso do da propriedade, especialmente sob o regime de servidão florestal. P ara Brito, é necessário diminuir a rigidez da legislaJank propôs ainda a manutenção das lavouras conção ambiental. “Isso não significa um retrocesso no solidadas até 2001 em topos de morros, encostas e âmbito prático, desde que se reconheça que há exces- várzeas, desde que o proprietário adote práticas consos que precisam ser ponderados de modo a termos servacionistas de uso de solo e proteção de mananuma legislação respeitada. Hoje, temos um clima que ciais, aprovadas pela autoridade ambiental do estado; não chega a ser de desobediência civil, mas de des- e a permissão para uso como servidão florestal de cumprimento da lei. A guerra que se trava em torno 30% da propriedade no bioma Amazônia (80%-50% do Código Florestal não é um desafio do produtor à da Reserva Legal) para criar valor para a floresta em pé. lei. O produtor tem medo da lei, tem medo do Ibama “Se mantida a legislação atual, a recuperação do e não quer ser autuado ou sofrer ação penal ou ação déficit vegetativo implicará uma redução de, no mícivil pública. Mas é preciso ter o equilíbrio para que a nimo, 3,7 milhões de hectares de produção agrogente possa fazer os ajustes e tornar a lei mais plau- pecuária paulista e de uma receita anual de R$ 7,5 sível. É do interesse dos produtores resolver a situa- bilhões, a um custo de recomposição de R$ 300 mição”, afirmou o representante da CNA. lhões por ano. Os pequenos produtores rurais são os O presidente da UNICA, Marcos Jank, engrossou o maiores prejudicados, pois a obrigação de abandono coro dos que pediram mudanças na legislação que de 20% de sua área agrícola corresponde à perda trata da Reserva Legal. Para ele, as Áreas de Preserva- imediata de sua receita, somando-se a isso o ônus de ção Permanentes (APP) deveriam entrar no cômputo recuperação de uma área já impactada pela prática na Reserva Legal nos casos de possuir vegetação na- agrícola”, afirmou.
LEGISLAÇÃO MENOS RÍGIDA
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“Se mantida a legislação atual, a recuperação do déficit vegetativo implicará em redução de, no mínimo, 3,7 milhões de hectares de produção agropecuária paulista e de uma receita anual de R$ 7,5 bilhões“ Marcos Jank, presidente da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (UNICA)
los governos federal e estaduais para postergar, impedir ou criar novas modalidades de cumprimento do Código Florestal, levando para o futuro a aplicação das normas que tratam das condutas tipificadas como crime ambiental. O representante do MAPA também ressaltou o alto custo de recomposição das áreas degradadas e lembrou que a lei impõe aos estados a obrigação de fornecer mudas ou variedades que possam vir a ser empregadas nessa recuperação. “Mas até agora, por conta de um esgotamento efetivo financeiro dos estados, isso não vem ocorrendo”, lamentou.
Nonato de Vasconcelos
O painelista ressaltou que a indústria da cana-de-açúcar paulista assinou, com as secretarias estaduais de Meio Ambiente e de Agricultura, um protocolo que prevê a antecipação do fim da queima da cana em sete anos, a proteção de matas ciliares, a conservação e proteção de solo e recursos hídricos e a adoção de práticas para minimizar as emissões atmosféricas. “O protocolo é voluntário, mas 90% do setor já assinou”, destacou Jank. O procurador federal e consultor jurídico do MAPA José Silvino da Silva Filho comentou que, após longos debates dos quais o ministério tem participado sobre o Código Florestal e suas implicações na agricultura, há confiança no Congresso Nacional, onde tramita a reforma da lei ambiental. Para ele, a legislação atual é de uma transversalidade muito grande e ainda há muito a ser discutido no que se refere à sua efetiva aplicação. “Tal condição de implementação do Código Florestal causa preocupação aos operadores de Direito. Há só uma maneira de se chegar a uma solução: por meio de um processo amplo de discussão no qual todas as vertentes que são tocadas pela transversalidade do assunto tentem encontrar um meio termo”, afirmou. Silva Filho observou que o Estado perde ao promover ação de recomposição de áreas ocupadas pelo homem e estabilizadas para a produção agrícola há mais de cem anos. Para ele, tal iniciativa poderia trazer prejuízos aos três entes da Federação – União, estados e municípios – com a retirada de áreas produtivas para recomposição de reserva. O procurador se disse preocupado, como operador do Direito, ao constatar a quantidades de iniciativas adotadas pe-
Gerlena Maria Santana de Siqueira (esquerda), Rodrigo Justus de Brito (centro) e José Silvino da Silva Filho (direita), além do presidente da UNICA, Marcos Jank, discutiram a relação entre Reserva Legal e produção agropecuária
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Niels Andreas
painel
Produção de etanol e
PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE
O
terceiro painel do II Seminário de Direito Ambiental, realizado na manhã do dia 21 de maio de 2010, teve com tema “Produção de etanol e preservação do meio ambiente”. Os palestrantes destacaram a importância do setor sucroenergético para o desenvolvimento do país, as gigantescas potencialidades do etanol e ressaltaram a necessidade de que a produção seja feita sempre de maneira sustentável, visando o equilíbrio entre o interesse econômico e a preservação ambiental. Participaram do debate o diretor da Escola da AGU, procurador federal Jefferson Carús Guedes, como presidente da mesa; o presidente da Associação dos Produtores de Bioenergia de Mato Grosso do Sul (BIOSUL/MS), Roberto Holanda; o coordenador da Comissão Técnica de Agroenergia da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (FAMASUL), Luís Alberto Moraes Novaes; o diretor do Departamento de Desenvolvimento Sustentável da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Ricardo Viegas; o coordenador-geral de Açúcar e Álcool do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Cid Jorge Caldas; o diretor do Departamento de Zoneamento Territorial do Ministério do Meio Ambiente, Roberto Ricardo Vizentin; e o Secretário Executivo do Sindicato das Indústrias Sucroalcooleiras do Estado de Mato Grosso (SINDALCOOL), Jorge Santos.
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O presidente da Associação dos Produtores de Bioenergia de Mato Grosso do Sul (BIOSUL/MS), Roberto Holanda, apresentou dados que mostram que o estado do Mato Grosso do Sul está passando da condição de um produtor discreto de cana-de-açúcar para um dos players mais importantes do cenário nacional de açúcar e etanol, com previsão de colher 38 milhões de toneladas de cana nesta safra. Segundo ele, o setor sucroenergético do estado possui 21 unidades em operação, é o sexto maior produtor nacional, o maior empregador da indústria, conduz 30 projetos sociais e 17 ambientais e tem 70% da colheita mecanizada. Segundo Holanda, o setor sucroenergético sul-mato-grossense tem como premissa principal a busca da sustentabilidade como fator essencial para o crescimento. “Não atingir um padrão de sustentabilidade é um tremendo tiro no pé. Seria muito ruim para os negócios. O setor crescerá e o etanol virará uma commodity internacional na medida em que mostrarmos sustentabilidade, que é baseada num tripé que inclui eficiência econômica, responsabilidade ambiental e responsabilidade social. O Brasil ainda tem uma dívida social com o seu povo. Se existe perspectiva de crescimento, de geração de renda e de emprego, com sustentabilidade, em determinada área, por que não (investir)?”, destacou. Holanda foi categórico em afirmar que não existe plantação de cana-de-açúcar no pantanal sul-mato-grossense. “Não existe e não vai existir, por vários motivos diferentes. Além de toda a questão ambiental, a cana não nasce no solo da região, o clima não é propício”, explicou o presidente da BIOSUL/MS. O coordenador da Comissão Técnica de Agroenergia da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (FAMASUL), Luís Alberto Moraes Novaes, observou que a relação entre produção e meio ambiente é uma questão polêmica e que é utópica a visão de que produção não interfere no meio ambiente. “Toda produção, qualquer que seja, interfere sim no meio ambiente. O que propomos é que a gente tenha fundamentos técnicos para produzir com sustentabilidade ambiental,
que é premissa básica para termos sucesso ao longo dos anos. O meio ambiente é para nós ferramenta de trabalho. Então, não estamos aqui para degradá-lo. Muito pelo contrário, temos tido um foco muito grande com a gestão ambiental e trabalhado nisso”, observou. Novaes descreveu os benefícios da produção de cana-de-açúcar, que, entre outros ganhos, contribui com o sequestro de CO2. Ele citou pesquisa da Embrapa Agrobiologia que mostra que o etanol é capaz de reduzir em 80% as emissões de CO2 se usado em substituição à gasolina. O dado, informou Novaes, é reforçado pela Agência Americana de Proteção Ambiental (EPA), que classificou o etanol feito de cana-de-açúcar como um combustível avançado, que reduz a emissão de dióxido de carbono (CO2) em 61% comparado à gasolina. “A cana é usada na produção de um combustível limpo e renovável, ajuda na recuperação de áreas degradadas e é responsável pela geração de emprego e renda em 255 especialidades com média salarial de R$ 1.300, segundo dados do SEBRAE”, destacou. O representante da FAMASUL apresentou também propostas do setor agropecuário para a legislação ambiental brasileira. “Defendemos que cada estado legisle sobre suas peculiaridades; que as APPs sejam mensuradas por estudos técnicos e não por metragens predefinidas por uma lei federal para os diferentes biomas; que a somatória da Reserva Legal com a APP seja admitida, respeitando assim a função econômica da propriedade rural; e que sejam consolidadas as áreas produtivas anteriores à lei, respeitando o direito adquirido”, afirmou. O diretor do Departamento de Desenvolvimento Sustentável da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Ricardo Viegas, descreveu o setor sucroenergético paulista, que possui 199 unidades agroindustriais em atividade, cultiva 5,2 milhões de hectares de terras com cana-de-açúcar e conta com 12 mil produtores rurais. Segundo ele, as indústrias paulistas produziram, na última safra (2009/10), 14,6 bilhões de litros de etanol, o que representa 59% da produção nacional e 17% da mundial, e 20,6 milhões de toneladas
“Toda produção, qualquer que seja, interfere no meio ambiente. O que propomos é que a gente tenha fundamentos técnicos para produzir com sustentabilidade ambiental, que é premissa básica para termos sucesso ao longo dos anos. O meio ambiente é para nós ferramenta de trabalho. Então, não estamos aqui para degradá-lo. Muito pelo contrário, temos tido um foco muito grande com a gestão ambiental e trabalhado muito nisso “ Luís Alberto Moraes Novaes, coordenador da Comissão Técnica de Agroenergia da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (FAMASUL)
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painel
de açúcar, que correspondem a 64% da produção nacional e 13% da mundial. “Além disso, 70% dos municípios paulistas – cerca de 450 cidades – estão diretamente ligados à atividade econômica do setor”, destacou. Viegas citou aspectos ambientais que, segundo ele, podem comprometer a sustentabilidade da atividade sucroenergética. “Temos problemas com a queima da palha da cana, o déficit de cobertura de mata nativa, a perda de solo por processos erosivos, a poluição dos corpos hídricos por vinhaça e atmosférica por falta de controle das emissões e o consumo excessivo de água no processo industrial”, apontou. Segundo ele, o governo paulista, em parceria com a indústria sucroenergética do estado, está desenvolvendo ações para minimizar ao máximo esses problemas. “Um exemplo é o projeto que estamos desenvolvendo para recuperar 1,44 milhões de hectares em APP (Área de Preservação Ambiental)”, citou. O painelista destacou também a criação da Comissão de Bioenergia, com o objetivo de estabelecer ações ordenadas de políticas públicas com foco no desenvolvimento das cadeias produtivas agrícola e industrial, na pesquisa científica e tecnológica e na cogeração de energia; e o Protocolo Agroambiental, cuja proposta foi construir um compromisso com o setor sucroenergético para uma produção mais sustentável de etanol em São Paulo, que considerasse o respeito aos recursos naturais e a redução contínua dos impactos ambientais. Atualmente, os signatários do Protocolo são responsáveis por 94% da produção paulista e a 56% da produção nacional de etanol. Como resultado prático, foram antecipadas as datas para o fim da queima da cana. Nas áreas mecanizáveis, foi adiantada de 2021 para 2014. Nas áreas não mecanizáveis, passou de 2031 para 2017.
“Hoje, utilizamos em torno de 8 milhões de hectares para produção de cana. Desse total, metade vai para a produção de alimento, de açúcar. Ou seja, apenas 4 milhões de hectares de cana estão sendo direcionados à produção de etanol. Comparado ao potencial de 63 milhões de hectares, temos muito espaço para crescer sem a necessidade da abertura de novas áreas” Cid Jorge Caldas, coordenador-geral de Açúcar e Álcool do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA)
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ZONEAMENTO ECOLÓGICO O coordenador-geral de Açúcar e Álcool do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Cid Jorge Caldas, relatou o cenário em que foi conduzido o trabalho inédito de Zoneamento Agroecológico da Cana-de-açúcar pelo ministério, iniciado em 2007. Pauta obrigatória nas viagens internacionais do Presidente da República, o etanol brasileiro passou a sofrer violentos ataques pelo mundo afora. “Circulou-se a afirmação de que a expansão do etanol como combustível em outros países poderia causar desmatamento e substituição de produção de alimentos”, disse. Em resposta às críticas internacionais, foi criado o projeto de zoneamento da cana, com o objetivo de identificar as melhores áreas para expansão da cultura, considerando a responsabilidade ambiental e socioeconômica. “Não foram indicadas áreas em que a produtividade não fosse a mais elevada possível, nem as que utilizavam mão de obra humana na colheita. Foram identificadas áreas para a expansão da agroindústria canavieira voltada à produção mecanizada da cana para a fabricação de açúcar e de etanol”, destacou. Essa ação, informou Caldas, proporcionou um ordenamento pioneiro em nível nacional para um setor considerado estratégico pelo país e tem propiciado aos governos (Federal, estaduais e municipais) subsídios técnicos para traçar políticas públicas específicas, de forma a induzir a expansão sustentável do setor sucroenergético. Caldas destacou que a cana-de-açúcar é a melhor opção para produção de etanol se comparada, por exemplo, ao milho, ao trigo e à beterraba. “A cana é uma planta de alta eficiência fotossintética e que possibilita o uso de coprodutos no processo produtivo. Além disso, tem alta produtividade. Enquanto que para uma unidade de energia consumida na produção de etanol de milho obtém-se quase duas unidades de energia, no caso da cana essa relação é de uma para dez”, exemplificou. Segundo Caldas, há, no Brasil, entre áreas com melhor aptidão, com aptidão média e com aptidão baixa, 63 milhões de hectares possíveis de utilização para expansão da cana-de-açúcar. “Hoje, nós utilizamos em torno de 8 milhões de hectares para produção de cana. Desse total, metade vai para a produção de alimento, de açúcar. Ou seja, apenas 4 milhões de hectares de cana estão sendo direcionados à produção de etanol. Comparado ao potencial de 63 milhões de hectares, temos muito espaço para crescer sem a necessidade da abertura de novas áreas”, observou. O diretor do Departamento de Zoneamento Territorial do Ministério do Meio Ambiente, Roberto Ricardo Vizentin, também elogiou o Zoneamento Agroecológico da Cana-de-Açúcar. “É um trabalho inédito, alinhado, que superou um dos maiores desafios para a sustentabilidade da agropecuária brasileira: a convergência entre as políticas agrícola e ambiental”, destacou. “Historicamente, no Brasil, as políticas agrícola e agrária apontam para uma direção e a política ambiental aponta para outra. Os desafios colocados para o país e para a agricultu-
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Os palestrantes destacaram a importância do setor sucroenergético para o desenvolvimento do país, as gigantescas potencialidades do etanol e ressaltaram a necessidade de que a produção seja feita sempre de maneira sustentável, visando o equilíbrio entre o interesse econômico e a preservação ambiental
ra, em particular, colocam a necessidade de superar essa dicotomia no centro da agenda de desenvolvimento e crescimento”, completou. Vizentin afirmou que, na avaliação do MMA, o etanol representa uma oportunidade extraordinária para o Brasil e que as salvaguardas ambientais e sociais impostas pelo zoneamento foram adequadamente equacionadas e incorporadas para se transformarem em uma política pública. “Temos confiança de que será efetivamente consolidada uma política do Estado brasileiro, pactuada e construída em um processo ativamente participativo”, disse. O representante do MMA destacou que o zoneamento da cana-de-açúcar, ao estabelecer as salvaguardas, não contemplou todos os segmentos envolvidos no debate sobre a expansão da produção de agroenergia, especialmente na questão do etanol. “Uma das medidas foi a exclusão da Bacia do Alto Paraguai e do bioma Amazônia da expansão da cultura de cana. O governo federal foi estratégico, pensando no país e no setor como um todo. O intuito foi fazer com que esse zoneamento carimbasse o etanol com o passaporte verde, para que o Brasil pudesse conquistar o papel de protagonista e de líder internacional na produção de etanol”, afirmou. O secretário executivo do Sindicato das Indústrias Sucroalcoleiras do Estado de Mato Grosso (SINDALCOOL), Jorge Santos, apresentou números de uma pesquisa da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) relacionada à ocupação de solo no Brasil. Segundo os dados, 27% do território nacional é des-
tinado à Unidades de Conservação e Terras indígenas (2.294.343 km²); 32% são destinados à Reserva Legal (2.685.542 km²); 17% são Áreas de Preservação Permanente (1.442.544 km²) e os outros 29% são utilizados por cidades, obras de infraestrutura, agricultura e pecuária (2.455.350 km²). Santos destacou que, atualmente, 80% da cana-deaçúcar de Mato Grosso está localizada em áreas proibidas pelo Zoneamento Agroecológico determinado pelo Governo Federal. Ele ressaltou que ainda não existe lei que corrobore o decreto presidencial. “Isso leva o setor à estagnação por duas razões fundamentais. A primeira é que o setor está proibido de crescer, apesar da existência de, pelo menos, 1 milhão de hectares de pastos sem utilização. A segunda é a crescente recusa de consumidores em relação a produtos oriundos de áreas consideradas ambientalmente incorretas. Continuando assim, em breve, o segmento não terá como vender seus produtos”, afirmou. Para Santos, é importante que a legislação ambiental deixe de ser “altamente restritiva”e leve mais em conta a realidade do produtor rural. “Ao contrário do que o urbano pensa, o frango não nasce no freezer do supermercado. Ele tem que ser criado em uma granja e alimentado com uma série de produtos agrícolas. E feijão também não nasce na gôndola do supermercado em saquinhos de um quilo. Ele é fruto do trabalho, do suor de brasileiros que querem apenas nos alimentar da maneira correta e coerente e que respeitam a biodiversidade mais do que ninguém”, finalizou.
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O PAPEL DAS CARREIRAS JURÍDICAS na preservação do meio ambiente Aprimorar o diálogo para a resolução de conflitos é o principal papel das carreiras jurídicas para superar os desafios para o desenvolvimento sustentável do agronegócio, tema central do II Seminário de Direito Ambiental. Essa foi a avaliação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) José Antonio Dias Toffoli em seu discurso de encerramento do evento, realizado na tarde do dia 21 de maio de 2010, assim como fio condutor do discurso dos representantes das várias carreiras presentes. “Nosso papel é resolver conflitos. Somos pagos pelo povo brasileiro para fazê-lo. Muito mais do que julgar, o desejo é resolver problemas”, declarou o ministro.
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quarto e último painel do seminário teve como tema “O papel das carreiras jurídicas na preservação do meio ambiente” e foi dividido em duas partes. Essa dinâmica permitiu que cada uma das carreiras jurídicas presentes – advogados públicos, promotores, procuradores, delegados de polícia, peritos criminais, membros do Ministério Público e juízes – estivesse representada e apresentasse um pouco da experiência de cada uma. A primeira parte do painel contou com a participação, como presidente da mesa, do juiz federal titular da 5ª Vara Federal Paulo Sérgio Domingues; da procuradora do Estado do Amazonas em Brasília, Sandra Maria do Couto Silva; da subprocuradora da Justiça de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público do Mato Grosso, Ana Flávia Aquino; do perito criminal federal do Instituto Nacional de Criminalística / Departamento de Polícia Federal (INC/DPF) Mauro Seródio Silva Araújo; e do diretor da Região Centro-Oeste da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), promotor de justiça no Mato Grosso do Sul Humberto Lapa Ferri.
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Além do ministro Dias Toffoli, que presidiu a mesa, a segunda parte do painel contou com a participação do delegado de polícia federal Glauco Campos Sales Saraiva; do presidente da Associação Nacional dos Advogados da União (ANAUNI) e representante do Fórum Nacional da Advocacia Pública, advogado da União André Alcântara; da procuradora federal Helena Dias Leão Costa; do juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Amazonas Flávio Henrique Albuquerque de Freitas; do procurador regional da República da 4ª Região Roberto Luís Oppermann Thome; do juiz federal da Seção Judiciária de Mato Grosso Jeferson Schneider; e do procurador da Justiça de Defesa Meio Ambiente do Ministério Público do Mato Grosso, Luís Alberto Esteves Scaloppe.
Membros do Ministério Público Execução das leis Roberto Luís Oppermann Thome, procurador Regional da República da 4ª Região O procurador regional da República da 4ª Região abordou a dificuldade para a execução das leis e o esforço de aprimoramento do Ministério Público Federal nesse sentido.“O Brasil tem sido citado no exterior pela criatividade e excelência de legislação, mas quando um estrangeiro resolve perguntar como se ouve falar de tanto problema de ordem ambiental, temos que dar um sorriso meio amarelo e dizer que, às vezes, é difícil a execução”, contou.
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Em seu discurso final, o ministro Dias Toffoli afirmou acreditar que, por meio do entrosamento entre as carreiras jurídicas e com a sociedade civil, seja possível alcançar a solução de problemas. “O grande debate é como superarmos uma fórmula de resolução de conflitos, no qual muitas vezes todas essas carreiras e instituições, em vez de se dedicarem a resolver conflitos, acabam gerando mais conflitos”, ponderou. Toffoli destacou que todo operador do Direito deveria esgotar todas as possibilidades de solução de conflito do ponto de vista político, legislativo, administrativo ou por meio de acordos, deixando para o Judiciário apenas o que realmente não foi possível resolver. “Os conflitos que devem vir ao Judiciário para a solução binária devem ser residuais. Porque a solução do Judiciário nunca vai ter o apoio de 100%. Ela vai ter 50% e a outra metade vai ser contra, porque vai perder a causa”, colocou.
PONTO DE VISTA DAS CARREIRAS JURÍDICAS
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MEDIADORES DE CONFLITO
O ministro da Suprema Corte José Antonio Dias Toffoli presidiu a mesa na segunda parte do painel, que teve a participação do procurador da República Roberto Luís Oppermann Thome
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“O grande debate é como superarmos uma fórmula de resolução de conflitos, no qual muitas vezes todas essas carreiras e instituições, em vez de se dedicarem a resolver conflitos, acabam gerando mais conflitos” José Antonio Dias Toffoli, ministro do STF
Thome reforçou a necessidade de se negociar de todas as formas nas instâncias extrajudiciais antes de remeter o caso ao Judiciário. Assim, defendeu a larga utilização de instrumentos como Termo de Ajustamento de Conduta e Termo de Conciliação. “É o nosso sistema e o nosso estado de Direito. Com certeza nossa atividade se volta prioritariamente para conciliações e audiências públicas”, afirmou.
Conciliação Sandra Maria do Couto Silva, procuradora do Estado do Amazonas em Brasília e representante da Associação Nacional dos Procuradores de Estado (ANAPE) Sandra Maria do Couto Silva destacou a importância da conciliação para tratar da questão ambiental. “Nós queremos o desenvolvimento sustentável com todos os seus desdobramentos em prol dessa coletividade que tem de ser construída. Ou nós construímos um diálogo que vá levar a essa compreensão, a esse aperfeiçoamento, ou não evoluímos”, opinou. Com a reforma do Judiciário e a aplicação dos procedimentos de repercussão geral e repetitivos, novas reflexões e procedimentos foram colocados para os estados, que buscam, em conjunto, construir precedentes que facilitem a execução das políticas públicas. Nesse cenário, descreveu a atuação da Câmara de Conciliação para solucionar a questão dos cadastros restritivos. Os estados inauguraram as subscrições cautelares e ações ordinárias para discutir esses cadastros coletivamente. Não havia uma uniformidade nas estratégias e, enquanto alguns recorriam à Justiça Federal, outros iam ao STF ou ao STJ. “Nós elegemos uma questão, todos os estados nivelaram, discutiram e fizemos o ajuizamento da ação”, recordou. A partir daí, é construído um termo de conciliação com prazos e sanções em caso de descumprimento. A partir dessa experiência com os cadastros restritivos, os procuradores estaduais afinaram o procedimento coletivo de atuação, reduzindo de 27 petições para no máximo duas ou três. Os procuradores-gerais criaram uma câmara técnica, hoje presidida pela procuradora, justamente para promover encontros e debates entre procuradores e órgãos técnicos.
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Jurisprudência Humberto Lapa Ferri, promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Mato Grosso do Sul e diretor da Região Centro-Oeste da CONAMP Humberto Lapa Ferri apresentou a experiência do MP sul-mato-grossense na padronização de peças processuais com a criação de Núcleos Regionais de Proteção ao Meio Ambiente por bacias hidrográficas. Foi firmado um acordo com o Tribunal de Justiça do estado e as súmulas de entendimentos criadas por esses núcleos passarão a servir de jurisprudência. “Isso é extremamente importante para que haja essa uniformização e o pensamento não do promotor A ou B, mas do MP, seja apresentado”, declarou. Para o promotor, a criação dos núcleos ambientais uniformizou, ao máximo, o procedimento do MP na área ambiental. “Nosso objetivo era que os promotores tivessem uma conduta discutida entre todos, para que não ficasse uma atividade de proteção ambiental por pedaços”, explicou. Ferri abordou uma prerrogativa muito cara às carreiras jurídicas, especialmente ao MP e à magistratura: a independência funcional. “É essencial para qualquer tipo de conduta desses agentes, mas vem gerando um problema que é a falta de uniformização de conduta. E isso é péssimo. Porque nós não trazemos o que a sociedade mais quer que é a segurança jurídica”, avaliou. Ferri destacou a importância de todos os envolvidos na questão ambiental saberem dialogar com os possíveis infratores ambientais. “Tem que se dialogar até o limite que a lei permite, usando e abusando do Termo de Ajustamento de Conduta e, eventualmente, tomando as providências judiciais cabíveis”, colocou.
Desafio mato-grossense Ana Flávia Aquino, subprocuradora da Justiça de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público do Estado do Mato Grosso Ana Flávia Aquino apresentou os esforços que o Mato Grosso tem empreendido para implantar políticas, modernizar os sistemas de controle e atuar mais de perto na questão ambiental. Ela mostrou como foi instituído o
Direito coletivo e difuso Luís Alberto Esteves Scaloppe, procurador da Justiça de Defesa Meio Ambiente do Ministério Público do Mato Grosso Luís Alberto Esteves Scaloppe recordou que o Ministério Público ganhou papel de destaque na nova Carta Magna ao assumir a tutela do direito coletivo. Ele destacou que a promulgação da Constituição Federal de 1988 representou um grande momento para o Direito Brasileiro. “Imaginem a gente sair da ideia do individualismo possessivo do homem, de um corpo, para uma ideia de direito difuso e que você não sabe nem quem é e quem são”. Relembrou ainda da batalha travada no Congresso Nacional para permitir essas mudanças. Scaloppe comentou as dificuldades internas do MP, ao longo das duas últimas décadas, para incorporar a responsabilidade de ter a tutela do direito coletivo e difuso. “A história das mentalidades anda muito devagar. As culturas mudam muito pouco. O Ministério Público demorou tempo para poder aceitar isso”, relatou. Ainda assim, o procurador admite que tem presenciado a construção efetiva de uma nova consciência sobre as necessidades coletivas verdadeiras do homem na sociedade. “Temos rupturas, problemas, incompreensões e temos que enfrentá-las. E afinal, nos propusemos a isso”, destacou.
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Programa Mato-Grossense de Regularização Ambiental Rural (MT-Legal), criado para promover a regularização das propriedades e posses rurais e inseri-las no Sistema de Cadastramento Ambiental Rural e/ou Licenciamento Ambiental de Propriedades Rurais (SLAPR). A adesão ao MT-Legal foi espontânea e teve o prazo encerrado em dezembro de 2009. O processo contou com a participação de muitos órgãos e entidades, inclusive o MP estadual, com uma atuação importante. “Não há cancelamento dos autos de infração e quem já foi autuado permanece com a sua multa. Quem nunca sofreu autos de infração, não sofrerá desde que venha ao órgão ambiental, regularize a sua conduta, firme um Termo de Ajustamento de Conduta e recupere o dano ambiental praticado”, esclareceu. O MT-Legal propõe a inversão do procedimento administrativo e os que aderem entram no cadastro ambiental, que corresponde à primeira fase do licenciamento. Em seguida, apresentam a imagem, quantificam a área de Reserva Legal e APP e toda a degradação apurada. É feito então o TAC, que deverá ser cumprido sob o risco de multa, autuação, cancelamento da licença e até embargo de propriedade. Esse procedimento aflorou a situação de muitas propriedades irregulares e os cartórios passaram a exigir a certidão de legitimidade de origem da propriedade. “Para a nossa surpresa, 90% do estado estava deslocado ou totalmente fora da base ou sobreposto. Não sabemos quantificar, mas o fato é que sem a ajuda de todos os órgãos não conseguiremos resolver”, admitiu.
A primeira parte do painel contou com a participação de Sandra Maria do Couto Silva, Mauro Seródio Silva Araújo, Paulo Sérgio Domingues (presidente), Ana Flávia Aquino e Humberto Lapa Ferri (direita para esquerda).
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POLÍCIA JUDICIÁRIA Ação Mauro Seródio Silva Araújo, perito criminal federal do Instituto Nacional de Criminalística / Departamento de Polícia Federal Mauro Seródio Silva Araújo destacou que, na questão do meio ambiente, o papel da polícia é agir no combate aos crimes ambientais. “Existem bandidos atuando. Organização criminosa dentro de órgão ambiental, dentro do empresariado. Isso tem que ser combatido. O estado não pode deixar de agir”, opinou. Segundo Silva, a promulgação da Lei 9.605/1998 foi o marco legal da carreira. Antes, alguns dispositivos legais tratavam basicamente de contravenções e a lei previa alguns crimes ambientais. Como esse crimes deixam vestígios para comprovação, requerem o exame pericial. “Esses crimes têm muitas normas operacionais em branco, que exigem outras normas de regulamentação e, normalmente, são de caráter técnico”, descreveu. Daí a necessidade de prova técnica pericial para tocar tanto o inquérito policial quanto as ações penais. A valoração dos danos ambientais, observou Silva, é uma grande dificuldade que a perícia criminal enfrenta. A lei prevê e o delegado, o juiz e o MP solicitam o valor monetário do dano ambiental. Às vezes, se chega ao valor da recuperação da área ou de um plantio que deve ser feito. “É difícil avaliar e traduzir o valor da biodiversidade, que é imenso”, afirmou.
Inteligência Glauco Campos Sales Saraiva, delegado de Polícia Federal Glauco Campos Sales Saraiva citou os bons resultados da divisão de meio ambiente da PF, entre eles a redução dos índices de desmatamento ano. Ele citou a operação Arco de Fogo, que conta permanentemente com mais de cem homens em campo, só da PF, que atuam em conjunto com servidores do IBAMA e da Força Nacional. São quase 400 homens trabalhando dia a dia na preservação do meio ambiente. O objetivo é combater o desmatamento ilegal na Amazônia e investigar e fiscalizar a extração, exploração, comercialização e transporte ilegais de madeira. Segundo Saraiva, as grandes extensões da floresta e das instalações de madeireiras e serralherias fiscalizadas, além do volume de material apreendido, são dificuldades impostas ao combate aos crimes ambientais na Amazônia. As grandes distâncias e a dificuldade de acesso aos locais visitados impõem o uso de aeronaves. Para averiguar 15 mil m3 de madeira, leva-se em torno de duas semanas. Um caminhão transporta 25 m3 de madeiras e, em apenas uma operação da PF este ano, foram apreendidos 70 mil m3 de madeira, o que
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“Existem bandidos atuando. Organização criminosa dentro de órgão ambiental, dentro do empresariado. Isso tem que ser combatido. O estado não pode deixar de agir”. Mauro Seródio Silva Araújo, perito criminal federal do INC/DPF
requer 3 mil caminhões para ser transportado. “Depois que se apreende tem que se pensar como vai fazer a retirada dessa madeira do local, porque não adianta a ação ser ineficaz a ponto de deixar isso lá”, observou. Outro aspecto da atuação da PF é a avaliação do impacto de suas operações na economia local. “Procuramos agir com rigor, seriedade e atentando sempre para que não haja destruição da economia local de certas cidades que vivem do setor produtivo madeireiro”, colocou Saraiva.
MAGISTRATURA Imparcialidade Paulo Sérgio Domingues, juiz federal titular da 5ª Vara Federal Paulo Sérgio Domingues propôs uma reflexão sobre o papel exercido pelo juiz na preservação do meio ambiente. Se o papel do magistrado é de neutralidade absoluta para julgar a causa, colocou o painelista, não estaria ele saindo da sua imparcialidade ao exercer o papel de preservar algo? “O juiz defende o meio ambiente, como defende também a ordem econômica, o desenvolvimento, a ordem social, a dignidade humana, a saúde, a educação, a moradia. Ele defende todos os valores que são abraçados pela nossa ordem constitucional e pela nossa ordem jurídica, sem que com isso saia da imparcialidade que ele deve ter”, colocou. Outra atribuição do magistrado ressaltada por Domingues foi a preservação da real igualdade de forças dentro do embate judicial. “No processo em que os litigantes têm todos as mesmas armas, o mesmo
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Segunda parte do painel teve a participação de Luís Alberto Esteves Scaloppe, ministro Dias Toffoli (presidente), Jeferson Schneider e Roberto Luís Oppermann Thome.
poder de fogo, essa espécie de intervenção não é necessária. Mas, quando há desigualdade, o juiz tem que intervir”, observou. Essa intervenção, explicou, não diz respeito à análise do mérito da causa, e sim à condução do processo judicial. “É essa igualdade que vai permitir que o julgamento do mérito de uma causa seja o mais imparcial e justo possível”, destacou Para Domingos, o papel das carreiras jurídicas na preservação do meio ambiente é o de procurar equalizar as forças, dando mais poder a quem não tem. E nessa questão, o que não tem poder é justamente o meio ambiente. “O meio ambiente não tem dono. Ele não contrata perito, nem advogado. Ele não invoca seu direito de propriedade e não tem direito adquirido. É por isso que precisa de estruturas externas que sejam criadas e definidas como responsáveis pela sua proteção e para que, em caso de conflito, não seja ignorado e atropelado como era a poucas décadas atrás”, ponderou.
Razão Jeferson Schneider, juiz federal da Seção Judiciária de Mato Grosso Jeferson Schneider falou sobre a dificuldade que muitas descobertas no campo da filosofia têm para migrar para o campo da aplicação. O magistrado relacionou pontos fundamentais que um operador do Direito não
pode perder de vista e ressaltou o profundo desgaste encontrado no atual conceito de lei. “É um grande erro científico se partirmos para enfrentar as questões ambientais acreditando que temos sobre a nossa mesa uma lei com as mesmas características que foram concebidas na época da Revolução Francesa, entre elas a razão”, afirmou. Ele apontou como grave problema da lei dos tempos modernos o déficit de representatividade democrática. Ele definiu esse fenômeno como a administração da lei, em que, devido à alta complexidade, questões técnicas sobre meio ambiente, por exemplo, acabam sendo passadas para o parlamento. O Legislativo, por sua vez, acaba delegando poderes ao Executivo para que técnicos redijam arcabouço de leis ambientais. “Atos normativos infralegais, que, mais do que regulamentar, dispõem sobre o status de lei, são construídos fora dos parlamentos, que seria em princípio o local mais adequado para que nós, enquanto sociedade, por meio de nossos representantes, dispuséssemos acerca dos nossos direitos”, observou. Comentou que o processo de seleção dos integrantes das carreiras jurídicas exige muito pouco em formação humana e que é feito a partir do conhecimento da lei. Defende que os conhecimentos humano e filosófico sejam componentes no processo de seleção desses servidores. “Porque se o interprete constrói e reconstrói com a sua pré-compreensão o texto da lei, a formação humana desse intérprete é fundamental”, colocou.
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Conscientização Flávio Henrique Albuquerque de Freitas, juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas - Vara Especializada do Meio Ambiente Flávio Henrique Albuquerque de Freitas ponderou que o debate sobre o meio ambiente tem que ser conduzido democraticamente e apresentou a experiência da Vara Especializada do Meio Ambiente do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, cuja atuação envolve um processo de conscientização socioambiental. “Partimos da premissa que a consciência socioambiental pode vir de maneira coercitiva, dada a função típica jurisdicional e a aplicação de sanção, ou pode vir de forma educativa, por atividades de conscientização coletiva”, descreveu. Ele defendeu que o magistrado possa atuar de forma proativa e apaixonada na defesa do meio ambiente sem estar impedido de julgar um processo e sem externar nenhum tipo de antecipação de julgamento. Freitas admite que, de fato, é difícil para o magistrado se posicionar em certos momentos previamente fora do processo, até para não antecipar julgamento. “Eu acredito que qualquer pessoa tem suas pré-concepções, mas isso não quer dizer que ela estará impedida para julgar ou externar qualquer tipo de posicionamento em relação a qualquer processo”, finalizou.
ADVOCACIA PÚBLICA Atuação Proativa André Alcântara, advogado da União, presidente da Associação Nacional dos Advogados da União (ANAUNI) e representante do Fórum Nacional da Advocacia Pública André Alcântara apresentou o histórico da criação da Advocacia-Geral da União (AGU) e relembrou que a Constituição Federal de 1988 inovou na defesa do Estado ao adotar um modelo novo e eficaz que apartou a dupla função antes exercida pelo Ministério Público. A AGU passou, então, a representar o Estado brasileiro judicial e extrajudicialmente e a prestar consultoria jurídica para os órgãos do Poder Executivo. “A AGU veio para atender esse clamor e defender melhor o Estado brasileiro. Aquela ideia de que o Estado era a viúva acabou-se com a criação da AGU”, afirmou. Alcântara apontou que a gestão do ministro José Antonio Dias Toffoli como Advogado-Geral da União foi um marco para a advocacia pública federal. “A partir de 2007, foi estabelecida uma nova forma de atuação, mais proativa. A instituição passou a mane-
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jar ações e a atuar como autora na defesa do interesse público”, destacou. Na avaliação de Alcântara, o trabalho da AGU foi bem sucedido pela ausência de independência dos advogados públicos, característica que propicia uma atuação em bloco. “Hoje, a AGU não tem o problema que o Ministério Público tem, em que cada membro atua de acordo com seu entendimento”, observou. Ele exemplificou com o episódio no qual, em um único dia, foram ajuizadas mais de 100 ações, de forma coordenada e adotando o modelo de força-tarefa, para retirar invasões nas praias do Nordeste brasileiro, atuando em defesa dos patrimônios ambiental e público.
Participação nas políticas públicas Helena Dias Leão Costa, procuradora federal e representante da União dos Advogados Públicos Federais do Brasil (UNAFE) Helena Dias Leão Costa relatou que a AGU procura participar, por meio dos seus órgãos consultivos e do contencioso, da elaboração e implementação de políticas públicas. “A nossa atuação na análise da conformação de uma política pública é um dos elementos essenciais para o sucesso ou o fracasso da concretização da política e dos direitos sociais e humanos”, avaliou. Sobre a Procuradoria-Geral Federal (PGF), comentou que representa um suporte necessário às ações para concretizar o interesse público. “A PGF tem conseguido uniformizar os entendimentos jurídicos aplicáveis a todas as entidades que representa”, descreveu. A procuradora destacou a atuação articulada entre a AGU, a PGF e as entidades que representam, o que tem permitido o avanço das políticas públicas ambientais desenvolvidas de forma conjunta por vários entes públicos, como os ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Meio Ambiente e o IBAMA. Ela destacou ainda o papel da AGU na implantação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). “A AGU atua na defesa judicial e extrajudicial das obras consideradas essenciais ao desenvolvimento sustentável do país”, ressaltou. Para a procuradora, do ponto de vista prático, a resolução administrativa das controvérsias surgidas entre órgãos e entidade públicas só oferece vantagens. “Além de reduzir os gastos públicos decorrentes da utilização da máquina judiciária, também diminui sobremaneira o tempo de disputa, uma vez que os órgãos interessados se comunicam, havendo, portanto, uma troca de informações e experiências, podendo se chegar a um entendimento e à racionalização de toda a atividade da administração pública, que passa a uniformizar sua atuação”, finalizou.
IMAGENS DO II SEMINÁRIO DE DIREITO AMBIENTAL
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Nonato de Vasconcelos Nonato de Vasconcelos Iara Vidal
Nonato de Vasconcelos
Nonato de Vasconcelos
II Seminário de Direito Ambiental, realizado entre 19 e 21 de maio de 2009 no SESC Pantanal, em Poconé/MT, contou com a participação de cerca de 150 operadores do Direito tanto da administração pública quanto da iniciativa privada. O local em que ocorreu o evento, no coração do Pantanal mato-grossense, proporciou aos participantes uma experiência bastante próxima da natureza.
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APOIO
REALIZAÇÃO
ORGANIZAÇÃO
APOIO INSTITUCIONAL