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De 26 de fevereiro a 3 de março de 2004
NACIONAL REFORMA UNIVERSITÁRIA
Ministro apóia privatização do ensino Proposta de Tarso Genro desvia recursos públicos para instituições privadas e legaliza lucro de filantrópicas
s donos das universidades particulares são os maiores beneficiados pela primeira proposta do novo ministro da Educação, Tarso Genro, para o ensino superior. Essa é a análise de defensores da educação pública, que consideram a sugestão do ministro – reduzir impostos das instituições privadas, em troca de abertura de vagas especiais – uma ofensiva para ampliar a mercantilização do ensino no Brasil. Batizada de Programa Universidade para Todos, a proposta abre 25% das vagas nas instituições privadas para estudantes de baixa renda, os vindos de escolas públicas, negros, índios, portadores de deficiência física e ex-presidiários. Como contrapartida, as universidades teriam isenção de impostos.
O
cá-la via medida provisória ou se vai propô-la ao Congresso por um projeto de lei.
Victor Soares/ABr
Letícia Baeta da Redação
MERCANTILIZAÇÃO
“Aula de protesto” contra cortes nas verbas para o setor da educação
da abertura de vagas. Apenas a Associação dos Mantenedores de Educação Superior, representante das entidades particulares, participou do debate sobre a proposta. Dentro de dois meses, Genro disse que decide se vai apli-
Genro quer mexer também com as instituições filantrópricas e sem fins lucrativos, hoje proibidas de terem lucros. O ministro argumenta que isso não ocorre, na prática, e propõe como solução a legalização da distribuição de lucros em troca
Públicas agonizam com descaso Os investimentos em universidades públicas têm diminuído a cada ano, agravando a situação de instituições tradicionais do ensino brasileiro. Vera Lúcia Chaves, do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, diz que a política de mercantilização do ensino coloca em risco a “única chance de o país produzir conhecimento e construir um país soberano”. Ela explica: “A universidade pública é um dos pilares essenciais para a construção de um Estado soberano. Quem detém o conhecimento,
rios sem equipamentos básicos, laboratórios ociosos por falta de componentes químicos, prédios com infiltração, salas de aula deterioradas e pessoal terceirizado. Os professores não ficam fora do contingenciamento. O ano letivo começa com oito mil vagas nas universidades federais esperando por docentes. “Dinheiro há, mas está sendo gasto com juros da dívida externa”, afirma Vera Lúcia. Só esse ano, o governo desviou mais de 60% do orçamento para pagar R$ 144 bilhões de juros da dívida. (LB)
detém a política, a economia e a ideologia. Sem isso, somos levado à submissão”. Em 2004, o governo vai investir R$ 610 milhões nas universidades públicas, o que representa apenas 6% do total de investimentos em educação superior. Há 20 anos, o investimento público representava 20% do total. Sem verba, 11 instituições federais de ensino superior (Ifes) de Minas Gerais fecharam o ano com um déficit de R$ 42,8 milhões. Os efeitos do estrangulamento são hospitais universitá-
Os críticos argumentam que a proposta não favorece os alunos pobres, como parece à primeira vista, mas sim donos das escolas particulares. “A isenção dos impostos e o financiamento estudantil ajudam as universidades privadas a conseguir alunos que, sozinhas, elas não conseguiriam”, analisa o presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), Luiz Lucas. Depois de um período de expansão, incentivado pelo governo Fernando Henrique, o ensino superior privado atravessa dificuldades financeiras. Hoje, há 37,5% de vagas ociosas nas instituições. Algumas possuem índice de inadimplência maiores que 40%. Se a sugestão for aprovada, o governo vai abrir mão de recursos que poderiam ser investidos no ensino gratuito e repassá-los para os donos das instituições privadas. Uma decisão que promete agravar a situação de universidades tradicionais, como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que em 2002 não tinha recursos para pagar a conta de energia nem do hospital universitário (veja quadro).
URGÊNCIA Para Vera Lúcia Chaves, coordenadora do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, essa proposta não surgiu à toa. Segundo ela, o novo acordo firmado com o Fundo Monetário Internacional (FMI) impõe ao país a privatização do ensino superior, por meio de uma reforma universitária. Um grupo de estudos
PRIVATIZAÇÃO NA AMÉRICA LATINA
matrícula no setor privado Rep. Dominicana El Salvador Colômbia Brasil Chile Paraguai Peru Venezuela Guatemala México Nicarágua Costa Rica Equador Argentina Honduras Bolívia Panamá Uruguai Cuba
71,2% 69,1% 64,1% 58,4% 53,6% 46,7% 35,9% 35,6% 28,8% 25,5% 34,2% 23,9% 23,2% 20,3% 12,5% 8,5% 8,4% 6% 0%
Fonte: Unesco - 1998
teria sido montado no governo para estudar a questão. “A reforma vem criar condições para que, em janeiro de 2005, o Brasil passe a incluir a educação como mercadoria na Organização Mundial do Comércio (OMC)”, afirma Vera Lúcia. Para a deputada Luciana Genro (sem-partido), o PT está legalizando a “pilantropia”. “As universidades filantrópicas cobram altas mensalidades, têm baixa qualidade e obtêm lucros que não sabemos para onde vai”, critica a parlamentar. A diretora da União Nacional dos Estudantes (UNE), Lúcia Stunpf, acredita que a proposta do governo “atende a demanda imediata de excluídos da educação superior”. Mas enfatiza que a reivindicação do movimento estudantil é pelo fortalecimento da educação pública, “e isso o projeto Universidade para Todos não prevê”.
MULHERES
Líderes combatem a violência e a impunidade Essa situação provocou uma articulação da sociedade civil capixaba, que criou em 1999 o Fórum Permanente contra a Violência e a Impunidade-Reage Espírito Santo, do qual participam representantes de cerca de 100 entidades de todos os setores. No Natal de 2001, após denúncias contra o crime organizado, ela e outros representantes do Fórum foram ameaçados de morte, e não puderam sair de casa. Marta também trabalhava em parceria com a equipe de repressão ao crime organizado da qual fazia parte o juiz Alexandre Martins Castro Filho, assassinado em março de 2003, em Vila Velha, região metropolitana de Vitória (ES). A militante indigna-se: “Temos procurado proteção para essas pessoas e não encontramos. Aqui o crime afronta a Justiça”, diz, reafirmando, contudo, que não vai desistir, “a não ser que sejamos impedidos”.
de 2000 conheceu o MTST e há três anos realizou o sonho da casa própria: mora no assentamento urbano Anita Garibaldi, em Guarulhos. Lucimeire orgulha-se do fato de a maioria dos representantes da coordenação do movimento e dos chefes de família serem mulheres. “Elas são mais determinadas”, diz a líder, que foi ameaçada de morte diversas vezes. Em uma delas, um ocupante, que não precisava de moradia, levantou a camiseta e perguntou: “Você conhece isso aqui?”, mostrando um revólver. “A fábrica que fez isso aí, não fez só essa”, respondeu. Também já recebeu telefonemas anônimos ameaçadores e “muita borracha” em manifestações.
Analfabeta até cerca dos 20 anos, a coordenadora do MTST vai começar a cursar faculdade de pedagogia. E lembra um momento que marcou muito sua vida: o despejo do acampamento Carlos Lamarca, em Osasco, em janeiro de 2003. “Vi cenas muito fortes, mulheres que preferiram atear fogo em seus barracos a nos verem derrubados pela polícia”, recorda. Lucimeire diz que a maior dificuldade de ser uma militante não está na polícia, nem nos despejos, mas dentro de casa: a conciliação da luta com a vida familiar. “Agora trouxe meu marido para o movimento, mas antes tínhamos sérios problemas”.
Anderson Barbosa
ARTICULAÇÃO SOCIAL
Jorge Pereira Filho
Ela tem 47 anos e há 30 trabalha na defesa dos direitos humanos no Espírito Santo. Marta Falqueto vive e trabalha no Estado onde o crime organizado mais se sofisticou no país. Há 30 anos ela defende causas relacionadas à violação dos direitos humanos no Espírito Santo, onde têm vindo à tona escândalos de lavagem de dinheiro, casos de violência e a possível ligação de políticos com o narcotráfico. Conselheira nacional do Movimento Nacional de Direitos Humanos e membro da coordenação do Fórum Reage Espírito Santo, Marta começou a militar nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), no município da Serra, na década de 70. Mes-
a existência de grupos criminosos ligados e infiltrados nos principais poderes do Estado.
mo com a oposição da família, nunca pensou em desistir, até mesmo quando ouvia provocações como: “Por que não vai cuidar da sua casa e da sua filha? Isso aqui não é para você”, uma referência indireta ao fato de sua filha ser portadora de deficiência. O Movimento Nacional de Direitos Humanos há mais de dez anos tem acompanhado e denunciado as ações do crime organizado no Espírito Santo. No final do governo Albuino Cunha de Azeredo, do PMDB (1991-95), foi constatada Divulgação
Tatiana Merlino da Redação
LUTA POR MORADIA
Marta Folguedo (no detalhe) e Lucimeire encaram de frente a violência
Representante da coordenação estadual do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Lucimeire Freire Oliveira nasceu no Ceará e vivia numa casa com nove irmãos, dos quais sete mulheres. “Dois deles morreram de morte severina”, diz, falando da fome e fazendo referência ao poema “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Melo Neto. Quando tinha 15 anos, mudouse para São Paulo. Nunca mais voltou. Trabalhou como empregada doméstica e metalúrgica e militou nas CEBs em Guarulhos. No final
São Paulo, 19 de fevereiro de 2004 - Militantes do Movimento dos SemTeto do Centro protestam contra o governo do Estado de São Paulo. Eles reivindicam solução para o problema de cerca de 500 pessoas despejadas do Edifício Ana Cintra, no centro de São Paulo, em janeiro. As 97 famílias estão acampada nas vizinhanças do prédio, onde aguardam uma resolução do governo de Geraldo Alckmin (PSDB-SP)