Linguagens visuais: literatura, artes e cultura

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O QUE É UMA IMAGEM?

LITERATURA E FOTOGRAFIA: ENTRE CONCEITO E REPRESENTAÇÃO Elisa Maria Amorim Vieira

Começo esta breve reflexão acerca dos diálogos que a literatura e a fotografia têm estabelecido ao longo dos últimos dois séculos, lembrando o menosprezo e a desconfiança com que a nova técnica de produção de imagens foi saudada por Charles Baudelaire, no famoso texto que escreveu sobre o Salão da Academia de Belas Artes da França, de 1859. Nessa ocasião, o poeta não escondeu seu profundo rechaço por aquilo que considerava como uma aberração e objeto de fanatismo das multidões. Em sua opinião, o mecanismo que prometia reproduzir a natureza tal como ela era não seria mais do que um refúgio de pintores fracassados e corrupção da verdadeira arte. Entre as funções que o poeta atribuiu à fotografia estava a de enriquecer rapidamente o álbum do viajante, auxiliando as memórias fracas, além de apoiar as pesquisas científicas e salvar do esquecimento tudo aquilo que estivesse ameaçado de desaparição: ruínas, livros, manuscritos, etc. A nova técnica, incapaz – em sua opinião − de produzir fantasia e exercer qualquer função criativa, estaria condenada a ser uma ferramenta das ciências ou simples diversão, mas jamais um instrumento da arte. Apesar de toda a aversão expressa nessas considerações, é bastante conhecida a atração de Baudelaire pelos retratos. Por outro lado, o fato de ter-se deixado retratar inúmeras vezes pelos grandes fotógrafos do seu tempo, entre eles Félix Nadar, não significava que tivesse deixado de considerar a fotografia como a responsável pela decadência do gosto francês. Essa discussão, que tinha como parâmetro as chamadas belas artes, especialmente a pintura, tomará novos rumos no início do século XX. A princípio, a fotografia adotara os modelos estéticos da pintura, almejando muitas vezes alcançar e merecer um pouco do prestígio de uma expressão artística consolidada. Essa submissão foi responsável por uma longa produção de fotografias que buscavam se assemelhar a pinturas, dando origem, no final da década de 1880, ao 151


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