ESCREVENDO REALIDADE: ESTRATÉGIAS DE PRESENÇA E INSCRIÇÃO NA CULTURA BRASILEIRA E CONTEMPORÂNEA Karl Erik Schøllhammer
Num ensaio do início da década de 1970, “Kool Killer ou a Insurreição Pelos Signos”, o sociólogo francês Jean Baudrillard escolheu Nova Iorque como exemplo de uma cidade industrial e produtiva, em que as relações históricas com a produção de mercadorias estavam chegando a seu fim, em que a produção foi exterminada ou descentralizada, levando a cidade a não ser mais o espaço-tempo de relações sociais sustentadas no mercado para tornar-se o regime semiocrático do poder da codificação social em si. A revolta radical nestas condições, observa Baudrillard, está inicialmente em dizer: “Eu existo, eu sou tal, eu habito esta ou aquela rua, eu vivo aqui e agora”. Mas isso ainda seria apenas a revolta da identidade: combater o anonimato reivindicando um nome e uma realidade próprios. Os grafites vão mais longe: ao anonimato eles não opõem nomes, mas sim pseudônimos. Eles não buscam sair da combinatória para tentar reconquistar uma identidade de todo modo impossível, mas para voltar a indeterminação contra o sistema – transformar a indeterminação em exterminação. Retorsão, reversão do código segundo a sua própria lógica, no seu próprio terreno, e vitoriosa em relação a ele por superá-lo no irreferencial (BAUDRILLARD, 1979, p.315).
Nos meados dos anos 1970, esse movimento já deixou de existir em Nova Iorque; mas em São Paulo, a maior área urbana no Brasil com mais de 20 milhões de habitantes, as primeiras intervenções de grafite apareceram em 1979 e, nas décadas seguintes, tornaram-se uma manifestação forte da cultura urbana junto com outros movimentos como o hip-hop, o surf de trem e o skate. Meu objetivo, hoje, é enfocar no equilíbrio difícil entre inscrição como busca de identidade, por um lado, e, por outro, a resistência no anonimato. Nas artes 217