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Entrevista Tiago Santana

Tiago Santana é provavelmente o fotógrafo brasileiro de maior destaque no cenário contemporâneo. Produzindo um trabalho voltado para o sertão brasileiro Tiago é o segundo fotógrafo brasileiro a publicar dentro da coleção Photo Poché e a OLD tem a honra de entrevistá-lo.

Seu trabalho tem um fator geográfico muito intenso. Você se imagina fotografando fora do sertão?

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O sertão faz parte da minha vida. É o lugar onde nasci e comecei a descobrir o mundo.

Me tornei fotógrafo por conta da experiência de viver nesse lugar. Portanto, é inevitável que o meu trabalho sobre esse universo seja tão intenso. A minha experiência no Sertão, me ajudou a fotografar outros lugares. Tenho outros trabalhos em regiões bem diferentes, são trabalhos que um dia devo encontrar uma forma de mostrá-lo. Mas o meu trabalho no Sertão, assim como a imensidão de sua paisagem, não tem fim. É um lugar que me alimenta e renova o meu olhar. Suas imagens tem uma assinatura muito forte e original. Como foi o processo de desenvolvimento deste estilo? Como você busca variações visuais dentro do seu trabalho sem perder essa assinatura?

Quando se tem uma relação visceral com a fotografia, quando se entrega ao trabalho em um mergulho profundo, é natural que surjam imagens com personalidade, onde o autor está presente na obra. É isso que traz força a uma fotografia, sem adornos ou elementos de efeito, mas sobretudo imagens de respeito ao outro, que é sempre a razão do meu trabalho. O que me interessa nesse processo de construção de imagem é a relação de encontro com o outro. Sou um fotógrafo de paisagens humanas. E são esses encontros que me movem a fotografar.

Como foi o processo de construção da editora Tempo D’Imagem?

Surgiu da necessidade de se viabilizar projetos editoriais que acreditamos ser fundamentais para a uma compreensão da fotografia no Brasil. O livro é o espaço onde o trabalho de um fotógrafo se consolida, se cristaliza e e fica para o futuro. São os livros que ganham outros mundos. Para que os projetos que julgávamos importantes pudessem ser viabilizados, tivemos que criar uma editora especializada em livros de fotografia, a Editora Tempo d’Imagem, que a 15 anos vem trabalhando para que esses projetos se concretizem e contribuam na construção desse inventário da fotografia brasileira. Não dava para esperar que as editoras comerciais se interessassem por nossos projetos. É importante lembrar que nessa época eram pouquíssimos os fotógrafos que tinham seu próprio livro. Hoje a situação mudou bastante, e nos últimos 10 anos o panorama editorial de livros de fotografia cresceu muito, mas mesmo assim, ainda existe uma quantidade de projetos maravilhosos e de autores fundamentais para a fotografia brasileira, que ainda não conseguiram se realizar em livro.

Como você concilia o trabalho de fotógrafo e editor?

Não é fácil conciliar. Minha vontade é estar 100 por cento do meu tempo fotografando e fazendo os meus ensaios. Mas não funciona assim, mesmo com as possibilidades de utilização das leis de incentivos fiscais, é necessário muita dedicação e trabalho para conseguir viabilizar um projeto editorial. O que nos move é o prazer de ver um projeto desse acontecer. Cada livro é um grande aprendizado compartilhado com a equipe que divide o projeto. No fundo são projetos coletivos. Tenho vários parceiros, entre eles a minha irmã Isabel Santana, que fica em SP e é produtora gráfica. Ela cuida com cuidado da produção dos nossos projetos.

Pude ver e conhecer um pouco das suas exposições pela sua fala e da Rosely

Nakagawa e seu trabalho ganha uma nova dimensão a cada montagem. Em que momento do trabalho surgem as idéias para a exposição? É um trabalho coletivo ou individual?

Assim como o livro, a exposição é um momento importante também de um trabalho. É uma pesquisa permanente na tentativa de conseguir passar uma experiência vivencial dentro do espaço expositivo. Assim como todo processo de construção de um trabalho, é sempre um compartilhamento de experiências que se somam e dão forma na montagem. Todo trabalho de uma forma ou de outra é sim coletivo. São as inquietações de autor que, compartilhadas com o outro, ganham forma e força. Acho que a exposição tem que ser acima de tudo uma experiência única para quem visita. Deve ter algo mais que simplesmente colocar as fotos numeradas em seqüências na parede. Existe um dialogo a ser proposto do trabalho com a arquitetura do espaço e a intenção do autor, deixando margens, é claro para a interpretação de quem vê. Como foi o processo de edição para o PhotoPoche? Houve discussão sobre a seleção das imagens para o livro? E sobre a disposição delas dentro dele?

Toda a edição do livro Photo Poche (Sertão), foi coordenada pessoalmente pelo Robert Delpire, criador de coleção que vai completar em 2012 trinta anos de existência. Ele me solicitou que enviasse uma pré-edição de 120 imagens onde ele editaria as imagens para o livro. Durante o processo ele foi muito gentil e atencioso, respeitando o tempo todo a minha opinião. Fiz algumas sugestões que foram prontamente atendidas por ele. Delpire é talvez o maior editor de livros de fotografia do mundo, por toda sua obra e os projetos que editou. Mas, Delpire é sobretudo uma pessoa simples e que parece estar o tempo todo aprendendo com cada novo projeto. Me identifiquei muito com ele. Foi realmente uma das melhores experiências que tive ao longo do meu trabalho como fotógrafo e editor. que de uma certa forma me ajudaram a construir o meu olhar. Muitas vezes identifico um desses fotógrafos nas minhas imagens.

Percebo uma relação entre o suas imagens e as do Gipsies do Koudelka. Você acha que esse paralelo faz sentido? Quais são suas influências para desenvolver seu trabalho fotográfico?

Não é cópia, são releituras e interpretações a partir da sua experiência de vida. Nosso olhar se forma com essas experiências de olhar o mundo através do olho do outro.

Qual será seu próximo tema/trabalho fotográfico?

É difícil dizer quais as influências em um trabalho. Acho que uma obra é resultado de uma infinidade de experiências compartilhadas. Do autor com ele mesmo, do autor com o fotografado, do autor com outros autores, do autor com editor, curador, designer, etc...

Meu trabalho tem sim um pouco do Koudelka, que é um dos fotógrafos que mais admiro. Mas tem também um pouco de um grande número de fotógrafos no Brasil e no mundo

São tantos os trabalhos que gostaria de fazer. O problema é ter tempo pra conseguir viabilizá-los. Estou continuando um trabalho que chama-se “A luz perpétua e o resplendor” que faz parte de um projeto em torno da morte, do dia de finados, dessa relação do homem com a finitude... Estou também trabalhando em um livro sobre o universo de Luiz Gonzaga, que em 2012 faria 100 anos.

Também estamos trabalhando em uma publicação sobre a relação de Juazeiro do Norte e a Fotografia, onde teremos a participação do trabalho de aproximadamente 100 fotógrafos. Outro projeto de mais longo prazo, é um mergulho que estou começando a fazer em toda minha produção desde quando comecei a fotografar. Trata-se do projeto “Incompletudes”, que é dar corpo a uma série de ensaios e imagens produzidas ao longo dos anos e que não fazem parte de nenhum projeto específico. Meu arquivo é cheio dessas “gavetas” de imagens que isoladas não teriam força. A idéia é dar um conjunto, forma a essas fotos, exatamente pelo sentido de serem incompletas. Dar completude a esses fragmentos de imagens e transformá-los em um só corpo, um só ensaio. Uma fotografia incompleta, uma obra incompleta, uma vida incompleta. Estamos sempre em processo e é isso que nos faz continuar produzindo.

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