Revista OLD [n. 9]

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Revista OLD Número 09 - Abril de 2012

Equipe Editorial - Felipe Abreu e Paula Hayasaki

Direção de Arte - Felipe Abreu

Texto e Entrevista - Felipe Abreu

Capa - Wenderson Fernandes

Fotografias

Rodolfo Tucci

http://rodolfotucci.wordpress.com/

Cássio Vasconcellos

www.cassiovasconcellos.com.br

Wenderson Fernandes

http://www.flickr.com/wendersonfernandes

Entrevista

Cássio Vasconcellos

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Rodolfo Tucci Portfolio Cássio Vasconcellos Entrevista Wenderson Fernandes Portfolio 05 13 23

Essa OLD chega como um presente de Páscoa alguns dias atrasado. Caprichamos nessa edição para já começarmos o aquecimento para nosso primeiro aniversário, que vem cheio de surpresas. Nosso entrevistado do mês, Cássio Vasconcellos, ganhou recentemente o terceiro lugar no prêmio Conrado Wessel, provavelmente o prêmio de fotografia mais disputado do país. Fica nosso parabéns para o Cássio que está cada vez mais enriquecendo seu trabalho e recebendo o devido reconhecimento por isso. O papo com ele foi muito bom e mostrou como é imporante saber o que se passa na cabeça do fotógrafo e não só ver as suas imagens. O pensamento do Cássio sobre seu trabalho garante um novo significado a cada imagem que ele faz.

Nossos portfolios também giram em torno da construção do pensamento fotográfico, aliás, como tudo que é publicado na OLD. Nosso

primeiro trabalho é de Rodolfo Tucci, que passeia muito bem por diversos estilos fotográficos e consegue se relacionar muito bem com abordagens clássicas e contemporâneas no seu trabalho.

O Wenderson Fernandes, que apresenta seu ensaio Cartas para Ninguém, relaciona fotografia e literatura, com seu trabalho inspirado em Vidas Secas. São palavras deixadas nas ruas, sem um leitor específico, mas que atingem a todos, sendo canalizadas através de fotografias belas e escuras, criando uma atmosfera intensa para cada uma dessas pequenas mensagens. Espero que todos gostem dessa OLD e até

o mês que vem, pra gente soprar as velinhas juntos!

Felipe Abreu
Easter Bunny/ Adolph B. Rice Studio

Rodolfo Tucci

Portfolio

Rodolfo apresenta na OLD seu trabalho em PB, construindo grafismos urbanos e dando um clima denso e até sombrio para suas imagens. Um trabalho que se aproxima de grandes clássicos, mas que insere um elemento contemporâneo, garantindo seu diferencial. Você tem uma trabalho bastante diversificado, que transita por vários estilos fotográficos. Quais são as influências da sua produção?

Se passeio por vários estilos na fotografia não me importa, e também não me preocupa.

O que posso dizer é que fotografo aquilo que me toca e me impressiona, aquilo que grita para ser fotografado, e isso é algo que se percebe, que você sente, independente de buscar estilo ou linguagem. O que tento é fazer com que meu trabalho se alinhe com minhas emoções, interpretando sempre o que vejo, do jeito que sinto. Técnica, regras ou influências são o de menos, o que está presente no momento acima de tudo é o coração, além é claro, de toda a carga de informações e experiências incorporadas ao longo da vida. Quer você queira ou não, tá tudo ali naquele instante!

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Você constrói espaços de uma maneira muito interessante. Qual a importância da arquitetura na sua produção?

Procuro desenvolver composições que me agradem, e a arquitetura se faz presente sempre. A geometria que traz equilíbrio, as linhas, o volume, harmonia e energia, sem querer buscar maiores explicações

ou interpretações profundas. Fotografo o que gosto e para mim mesmo, vejo cada objeto ou cena de um jeito único e pessoal, fresco, sem me preocupar com o que fiz no passado. O que se apresenta na minha frente é que determina a magia e o jeito de ser fotografado naquela hora.

Como você separa sua produção entre cor e PB?

O ambiente de luz e cor é que determina como devo fotografar e capturar tal cena, se

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em cor ou pb. Sou refém da situação, ela dita o que deve ser feito no momento. Às vezes me arrependo de não ter fotografado tal e tal cena em cor, mas, procuro sempre dar atenção aos meus sentimentos. As cores expressam tanta força quanto o preto e branco, interpretar é no que estou mais interessado.

explorou e gostaria de experimentar?

Penso em desenvolver algo como “O

Mar”. O movimento, a mutação, o caos, a calmaria, uma série de eventos causadas por fenômenos naturais no mar me encanta. Interpretar isso pode ser bastante interessante.

Qual a importância pra você de viajar e registrar outras culturas com a sua fotografia?

Viajar é tudo! Traz crescimento pessoal e profissional. É onde se descobre novos espaços, outras formas, outros meios e muitas histórias de vida. Através da observação e da inevitável comparação entre culturas, aprendo e descubro mais sobre mim mesmo, sobre meu trabalho.

Que tema fotográfico você ainda não

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OLD entrevista Cássio Vasconcellos

Cássio Vasconcellos dispensa

apresentações. É um dos fotógrafos mais importantes e mais ativos da atual geração brasileira e tem nas fotos aéreas seu principal diferencial e foco de trabalho. Essa conversa aconteceu em sua casa, em São Paulo, junto com a gravação de um dos nossos documentários fotográficos, sobre este ilustre fotógrafo.

Acho que quanto mais técnica, mais recursos forem usados, melhor. Nunca fui contra o digital ou foto por celular, acho tudo sempre muito bem vindo. Inclusive, logo que saíram os celulares com câmera eu participei de uma exposição e os fotógrafos que participaram foram criticados por estarem usando celular e hoje em dia você vê que todo mundo usa celular, então acho que devemos que explorar todos os recursos que temos à mão.

Suas imagens buscam espaços e momentos diferentes do usual, como a noite e o ar. Como surgiu essa proposta?

Sempre foi um projeto ou foi um interesse que foi crescendo aos poucos?

Quando você fotografa do ar, constrói uma sensação de tranquilidade e organização. É assim que você vê nossas cidades? Ou pelo menos como gostaria que elas fossem?

A diversidade na minha fotografia sempre apareceu conforme o trabalho. Eu não tenho um pensamento de projetos futuros. Essa diversidade ocorre porque eu gosto muito de explorar todos os recursos da fotografia.

Eu acho interessante os padrões que vemos do alto com as fotos aéreas. Principalmente as marcas do homem. Então, desde plantações, rodovias, a trama da construção

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das cidades, isso é a nossa marca no planeta e é uma visão à qual não estamos acostumados. Então eu procuro muito isso, que tem uma forma naturalmente gráfica que eu acho interessante e norteia todo o meu trabalho, o grafismo acaba aparecendo em todas as minhas séries.

Essas imagens produzem grafismos muito diferentes do que estamos acostumados a ver. Você busca construir um mundo diferente quando está fotografando ele do ar?

Como começou seu interesse pela fotografia aérea? Quando você começou a produzir mais fortemente esse tipo de fotografia?

O interesse sempre existiu, porque eu sempre gostei de helicópteros, desde criança. Então eu, felizmente, pude juntar o útil ao agradável. É uma maneira de poder voar e fotografar também. O vôo sempre acaba tendo uma finalidade fotográfica, sempre estou com algo em mente, acho mais interessante voar e fotografar do que só voar.

Eu trabalho de duas formas. Hoje em dia eu estou construindo alguns cenários e paisagens, mas também trabalho captando o que eu vejo durante os vôos. Isso acontece de duas formas: às vezes as coisas vão aparecendo durante o trajeto ou eu trabalho com a pesquisa na internet, com o Google Earth, com o qual eu consigo fazer o mapeamento de uma região, já ter uma idéia do que vou encontrar e faço um vôo mais direcionado.

Depois de tantos anos voando e observando vários cenários do alto eu estou construindo algumas cenas surreais. Elas são baseadas em fotos, são de verdade e ao mesmo tempo fictícias. Eu gosto de jogar com essas duas

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Detalhe de A Praia/Cássio Vasconcellos

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coisas ao mesmo tempo. A da Praia trabalha com isso. É uma praia absurda, se você para pra pensar não pode existir uma praia tão grande e tão cheia, mas ao mesmo tempo existe. Ela não é tão mentirosa assim, se você sobrevoar Copacabana no verão é mais ou menos aquilo, mas eu fiz uma escala muito maior e também, por conta da construção, eu consegui dar uma ilusão de que eu estava muito alto, de uma altura que normalmente não se voa de helicóptero, então tem essa ilusão, tem essa jogo da fotografia. Que, na verdade, a fotografia, mesmo sem intervenção, ela tá sempre questionando o que é verdade e o que não é. O fato de fazer um enquadramento já compromete o real. E isso é uma discussão muito ampla.

Nessa construção de novas imagens tem o trabalho dos carros também, que fiz com cinquenta mil carros, como se fosse um gigantesco estacionamento ou pátio.

Isso não existe, mas se existisse, ele seria como eu fiz. Esse trabalho também gerou a dúvida nas pessoas sobre onde era o estacionamento, se era montagem ou verdade. Eu gosto também de jogar com essas construções com o ponto de vista do espectador, levá-lo a ver de longe e de perto

que é uma relação que a gente não costuma ter, já que normalmente uma foto muito grande você só vê de longe, porque

a fotografia, mesmo sem intervenção, está sempre questionando o que é verdade e o que não é. O fato de fazer um enquadramento já compromete o real.
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também,

se você se aproxima você perde definição ou não tem, às vezes, um foco de interesse de muito perto, então eu construo imagens que funcionam de várias distâncias. Ela é uma imagem de longe e de perto ela muda, criando uma outra relação. O trabalho dos Carros de longe ele parece uma textura, nem parece uma fotografia, o que cria uma curiosidade nas pessoas que vão chegando mais perto até descobrir do que realmente se trata, quando você já está muito próximo da fotografia, então é interessante ver uma fotografia que tem 2x12m e observar todos grudados na foto, percorrendo a fotografia e suas histórias.

Sempre é importante pesquisar e experimentar bastante. A gente tem cada vez mais recursos, embora alguns achem que o digital veio para deixar tudo igual, eu discordo e acho que existe um número cada vez maior de recursos e cabe a cada um procurar um caminho interessante para o seu trabalho. Não acho que maneira nenhuma que tudo esteja ficando igual.

Você varia bastante de formato e abordagem estética dentro dos seus trabalhos. Como você chega a essas decisões? O quão importante é a técnica dentro da sua produção?

Você sempre valorizou e desenvolveu muito fortemente seu trabalho autoral. Como você vê a inserção do seu trabalho no mercado de arte? Eu entrei para a fotografia pelo lado do trabalho autoral, embora tenha trabalhado em outras áreas como o fotojornalismo e a publicidade, isso pra mim sempre foi uma coisa à parte, eu sempre fiz meu trabalho

pessoal independentemente do que eu

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estivesse fazendo na época. Claro que hoje em dia a fotografia está ganhando cada vez mais espaço nos museus, nas coleções, nas paredes das casas das pessoas, isso é super visível, fácil de perceber e ainda bem que está acontecendo. De alguma forma chegou a hora, agora a fotografia é super reconhecida. Como eu sempre trabalhei muito nessa área, sempre me dediquei muito a exposições, livros, etc, eu naturalmente já estou inserido neste mercado artístico, o fato é que o mercado não existia antes como existe hoje, eu estou dentro dele desde que comecei, desde quando era uma coisa muito pequena e agora que ele está crescendo, de uns 10 anos pra cá. Eu sempre trabalho norteado pelo que eu quero, não pelo mercado, e foi assim que eu construí meu trabalho, sempre norteado pela minha vontade, minha visão de mundo.

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Detalhe de Coletivo/Cássio Vasconcellos

Wenderson Fernandes Cartas para Ninguém

Cartas para Ninguém é um projeto muito profundo de Wenderson Fernandes, que trabalha com texto dentro da fotografia. Um projeto com uma estética e uma visualidade próprias.

que são interpretadas erroneamente...

Como surgiu o conceito de cartas para ninguém?

Cartas pra Ninguém é de alguma forma uma transposição em imagens disso que considero a maior de nossas angústias, o ato de se comunicar, angústia no sentido de uma necessidade não biológica, algo sem o qual poderíamos viver, mas que em algum momento na história se tornou essencial.

Durante a leitura do livro Vidas Secas de Graciliano Ramos uma das impressões mais marcantes é a dificuldade de se comunicar dos personagens, pensamentos que nunca se transformam em palavras, mensagens

Acredito que toda mensagem é dúbia por natureza, você diz algo e o outro entende o que quer, ou aquilo que está preparado para entender. A mensagem nasce no seu subjetivo, mas depende completamente do outro pra tomar sentido. Todo emissor é

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refém do entendimento do receptor. De alguma forma, foi isso que tentei captar durante a produção do trabalho. Como você busca construir um novo sentido para os textos que estão dentro das suas fotografias? Você busca um complemento entre os textos das fotografias deste ensaio?

que una este ensaio. Aquilo que ficou por dizer, a mensagem que se perdeu, não busco que as palavras tenham um sentido em si. Como foi a busca pelos espaços apresentados em Cartas para Ninguém?

Uma das coisas que mais me interessaram durante o processo de construção do ensaio foi a ambigüidade. Mensagens que poderiam ser interpretadas de várias formas, e na maioria das vezes de forma errônea ou até mesmo textos inteligíveis. Mas apesar do texto ser a tonante do trabalho, busquei que as imagens fossem mais marcantes do que uma seqüência de letras. Primeiramente busco uma união conceitual entre o todo, e também uma unidade estética.

Provavelmente seja a ausência de sentido

O processo de busca e produção das imagens foi longo, sou daquelas pessoas que são consumidas por idéias. Em qualquer lugar eu buscava esses vestígios, essas mensagens sem “nexo”. Normalmente fotografo em espaços urbanos, durante trajetos, gosto de ser surpreendido pelas coisas. A maior parte do tempo estou com minha câmera. Foram poucas as vezes que saí com o objetivo de apenas capturar imagens para este ensaio.

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Vejo uma relação muito interessante do seu trabalho com o de Miguel Rio Branco. Você concorda? Você o tem como uma referência?

trabalho de alguém tão relevante quanto

Admiro muito o trabalho de Miguel Rio Branco, mas só conheci suas fotos alguns meses atrás. Um amigo com quem estou iniciando um projeto (Marcos Oliveira) me mostrou uma imagem e imediatamente fui buscar mais trabalhos dele. Acredito que existe uma relação entre nossa forma de fotografar (guardadas as devidas proporções). Ele tem essa coisa de desconstruir o personagem, e particularmente adoro eliminar as pessoas das minhas fotos e valorizar o humano. Acho que isso faz a imagem ser quase universal, no sentido de que aquela pessoa na imagem pode ser qualquer um. Mas acredito que isso se deva a aspectos de contemporaneidade, de alguma forma o

Miguel Rio Branco acaba atingindo a gente mesmo sem conhecermos a fonte. Mas busco referências em vários campos além da fotografia, na verdade minha maior referência é o cinema.

Você registra o cotidiano, mas constrói uma realidade própria dentro das suas fotografias. Como você busca suas imagens? Como desenvolve essa construção?

O que procuro na maior parte de meus trabalhos são idéias, não sou tão pictórico, apesar de gostar de trabalhos dessa natureza, o que realmente me impulsiona na captura de imagens é o conceito. Alguns de meus trabalhos nascem antes da idéia estar

amadurecida, quando ela ainda está latente, olho pra minhas fotos e começo a enxergar uma conexão entre elas. Outros nascem a

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partir do conceito, como é o caso do meu ensaio Vadios, algo me intriga e então começo a busca por imagens que transmitam a idéia. Não tenho uma forma dogmática de trabalhar, acho que o resultado final é mais importante do que a metodologia. Geralmente trabalho com várias idéias ao mesmo tempo, aí algumas vão se fundindo, se cristalizando e outras são simplesmente descartadas.

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Royal Easter Show, April 1935, by Sam Hood

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