UnicaPhoto [n.20]

Page 1

Unicaphoto#20

a revista de fotografia da Unicap

ISTO NÃO É UMA FOTOGRAFIA ISTO NÃO É UMA FOTOGRAFIA

Há cem anos do nascimento de Diane Arbus, Unicaphoto anota a importância de saber respeitar as diferenças. Em um país que volta a navegar pela democracia, você viaja com o povo Mundukuru, do Tapajós, e em canoas indígenas de outros rios do Nordeste. Entre a sociologia dos vivos & mortos, uma viagem pela tecnologia: não ao cinema transcendental ao hipercinema. Nesta edição, a hipermodernidade, o mundo da hiper inteligência, o hiperativismo. E no meio disso todas as nossas fragilidades.

Há cem nascimento de Arbus, Unicaphoto anota de as diferenças. Em um que a pela você viaja com o povo Mundukuru, do Tapajós, e em canoas indígenas de outros rios do Nordeste. Entre a sociologia dos vivos & mortos, uma viagem pela tecnologia: não ao cinema transcendental ao hipercinema. Nesta edição, a hipermodernidade, o mundo da hiperinteligência, o hiperativismo. E no meio disso todas as nossas fragilidades.

a síndrome da hiperrealidade

Neste 2023, se comemora o centenário de nascimento da fotógrafa e escritora estadunidense Diane Arbus, morta em 1971. Diane, conhecida como “a fotógrafa da representatividade” é a homenageada desta vigésima edição de Unicaphoto. Renata Victor apresenta a fotógrafa e você pode ler entrevista com o cineasta André Antônio, professor da Universidade Federal de Pernambuco, sobre as reverberações, as escolhas e a “indecifrável estranheza” em Arbus, e como isso se vê ainda hoje na fotografia e o quanto esses ecos se fazem presentes (e urgentes) na luta pela igualdade e respeito à diversidade. Aproveitando o tema, na sua coluna “Audiodescrição”, Liliana Tavares apresenta uma das obras mais representativas de Diane (sobretudo em tempos de guerra, de atentados às nossas crianças e às escolas, tempos de ascensão de grupos neonazistas nas redes sociais, no mundo inteiro).

Porém, na parte do país que busca navegar pela democracia, a Unicaphoto viaja com o povo Munduruku, do rio Tapajós, no ensaio de Paulo Airton Maia, onde florestariopovo são uma entidade indissociável. Noutro ensaio, sob os remos do poeta João Cabral, o historiador Gustavo Maia apresenta viagens ainda pitorescas, com rastros do pintor alemão Rugendas e o fotógrafo brasileiro Marc Ferrez, sobre a pesca artesanal, em canoas de ancestralidade indígena, de outros rios e mares do Nordeste. Por sinal, Ferrez, que aparece no artigo de Gustavo Maia, também faz dupla data redonda neste ano. O brasileiro nasceu em 1843. E morreu em 1923. Unicaphoto prepara novidades para registrar as datas. Ainda sobre representatividade e democracia, você pode ler entrevista com a cineasta afrociberativista pernambucana, brasileira, Yane Mendes. E saber sobre suas inquietações, suas mensagens, suas metáforas. Sobre o fim de todas as metáforas, a morte, apresentamos importante ensaio do antropólogo Antonio Motta e, se podemos resumi-lo, e não podemos, se trata de uma “sociologia dos mortos”, das necrópoles

oitocentistas do Brasil. Para isso, o palco é o campo-santo do Bom Jesus da Redenção de Santo Amaro das Salinas, no Recife.

Sobre mortes ou falsas mortes e falsas memórias, a matéria de capa não foge ao debate sobre a inteligência artificial e seus impactos. Que caixa (de Pandora) se abre com o novo panorama na produção e consumo de imagens? O admirável mundo novo das IAs. Destaque para o “projeto Pseudomnesia, do artista alemão Boris Eldagsen, autor, dentre outras obras, da imagem “The eletrician”, vencedora do Sony World Photography Awards, uma instalação artística que desafia a nossa percepção da realidade.”

Ao ler a nossa matéria de capa, atente para a nota editorial ali. Mais não diremos.

Da hiperinteligência ao hipercinema. Em tese de doutoramento defendida recentemente na UFPE, com indicação para publicação, Paulo Souza responde à nossa entrevista sobre essa tal hipermodernidade na sua pesquisa sobre cinematografia digital, e comenta certa “arte da geração de imagens sintéticas”. Nas entrevistas, tanto ele quanto o professor-cineasta André Antonio respondem também sobre os avanços das inteligências artificiais no mundo da arte visual. E do mundo real. Em ponto paralelo, ainda, a psicóloga e crítica Simonetta Persichetti discute o que é e o que não é fotojornalismo a partir de recente polêmica sobre foto de Gabriela Biló, publicada pela Folhapress Hiperinteligências. Hiperativismos. Hiperestesias. Hipercinemas. Hipermodernidades.

Em meio a esse hipermundo vasto mundo, você aproveita, nos entremeses, os ensaios fotográficos, trágicos: “Frágil”, de Nivaldo Carvalho; e “Lado oculto”, de Clarice Melo, além da clássica seção “Aconteceu”, do curso de Fotografia, da Escola de Comunicação da Unicap. Esperamos que você goste.

editorial

COORDENAÇÃO-GERAL

Renata Victor

EDITOR

Sidney Rocha

CONSELHO EDITORIAL

Filipe Falcão, Renata Victor e Sidney Rocha

ASSISTÊNCIA EDITORIAL

Quel Valentim

IMAGEM DA CAPA

“Pseudomnesia: The Electrician”, Boris Eldagsen

FOTO DA QUARTA CAPA

Renata Victor

QUEM É QUEM NESTA EDIÇÃO

Adelson Alves é fotógrafo

Arnaldo Sete é fotógrafo

André Antônio é professor no curso de Artes Visuais da UFPE e cineasta

Antonio Motta é antropólogo

Clarice Melo é estudante de fotografia na Unicap

Filipe Falcão é doutor em Comunicação, pesquisador em audiovisual, professor da Unicap

Gabriel Costa é estudante de fotografia na Unicap

GG Silva é estudante de fotografia na Unicap

Gustavo Maia é fotógrafo e historiador

Letícia Alves é estudante de fotografia na Unicap

Liliana Tavares é psicóloga e idealizadora do festival VerOuvindo

Nivaldo Carvalho é fotógrafo

Paulo Airton Maia é fotógrafo

Paulo André Pedrosa é estudante de fotografia na Unicap

Paulo Souza é doutor em Comunicação pela UFPE

Renata Victor é mestre em História e coordenadora do curso de Fotografia da Unicap

Ruan Pablo é estudante de fotografia na Unicap

Simonetta Persichetti é jornalista, crítica de fotografia e doutora em Psicologia

Yane Mendes é cineasta

como olhar para as diferenças por Renata Victor audiodescrição, em quantos caracteres? por Liliana Tavares

“nela, a vida brilha com indecifráfrável estranheza” entrevista com André Antônio

“rios todos com nome/ e que abraço como a amigos” por Gustavo Maia Munduruku, guardiões do Tapajós por Paulo Airton Maia

mulher. cineasta. negra. periférica. educadora entrevista com Yane Mendes

Escaneie o código QR abaixo, através de aplicativo no seu smartphone, e acesse todas as edições da revista pelo nosso site.

Artigos e os seus comentários publicados não refletem necessariamente a opinião da revista

Unicaphoto é uma publicação semestral do Curso Superior de Tecnologia em Fotografia da Universidade Católica de Pernambuco. Esta sua 20a edição vem a público em 18 de maio de 2023.

(ISSN 2357 8793)

8 18 20 24 42 58

66 o gênio saiu da garrafa 86 102 108 114 124 127

os mortos no espelho dos vivos por Antonio Motta

lado oculto por Clarice Melo nos tempos do hipercinema entrevista com Paulo Souza SouzaCâmara Lima frágil por Nivaldo Carvalho não, não é fototojornalismo por Simonetta Persichetti aconteceu

Stripper with bare breasts sitting in her dressing room, 1961 © The Estate of DianeArbus Lady on a bus, 1957
7 6
© The Estate of Diane Arbus

como olhar para as diferenças

Renata Victor

Diane Arbus foi uma das fotógrafas mais influentes do século XX, conhecida por suas imagens ousadas e provocativas de pessoas que muitas vezes eram marginalizadas pela sociedade. Em 14 de março de 2023, Diane Arbus teria completado 100 anos, e sua obra continua a inspirar e desafiar todo o mundo.

Nascida em Nova York em 1923, Diane Arbus começou sua carreira como fotógrafa na década de 1940, trabalhando com seu marido, Allan Arbus, em uma agência de fotografia para publicidade. Ela se tornou cada vez mais insatisfeita com esse trabalho e decidiu seguir sua paixão pela fotografia, focando em pessoas comuns em situações incomuns.

Diane acreditava que a câmera era uma ferramenta poderosa para revelar a verdade sobre as pessoas e as coisas, e suas imagens muitas vezes retratavam indivíduos que eram vistos como estranhos ou excêntricos. Ela se concentrou em temas como anões, transexuais, artistas de circo e pessoas com deficiência mental, que muitas vezes eram invisíveis para a sociedade em geral.

O trabalho fotográfico de Diane Arbus é caracterizado por sua

abordagem direta e íntima, que muitas vezes revela a vulnerabilidade e a complexidade dos indivíduos retratados. Diane estava interessada em capturar a essência das pessoas, em vez de simplesmente registrar sua aparência física, e muitas de suas imagens são consideradas retratos psicológicos.

A linguagem visual utilizada por ela é marcada por uma escolha cuidadosa de luz, enquadramento e composição. Ela frequentemente utilizava luz natural ou luz artificial dura para criar sombras intensas e contrastes dramáticos em suas imagens. Diane também costumava usar enquadramentos apertados, que destacavam os detalhes faciais e corporais de seus sujeitos e aumentavam a sensação de proximidade com eles. Além disso, a composição aplicada por Diane muitas vezes era simétrica e centrada, o que dava às suas imagens uma sensação de equilíbrio e harmonia. No entanto, sua escolha de sujeitos incomuns e inesperados causaram muito impacto.

A linguagem de Diane também é caracterizada por uma abordagem ética de sua relação com o fotografado. Ela se aproximava

A fotógráfa e escritora estudunidense Diane Arbus (1923 — 1971), retratada por Roz Kelly (c. 1968).
9 8 homenagem
Three female impersonators N.Y.C., 1962 © The Estate of Diane Arbus

da pessoa com uma atitude de curiosidade e empatia, e muitas vezes estabelecia uma relação pessoal com eles antes de fotografá-los. Ela também estava preocupada com a representação justa e precisa de seus sujeitos, e muitas vezes permitia que eles se retratassem da maneira que queriam ser vistos.

A obra de Diane Arbus é considerada uma das mais importantes do século XX e influenciou muitos fotógrafos e fotógrafas. Infelizmente, sua vida foi marcada por lutas pessoais, incluindo depressão e um divórcio doloroso. Em 1971, Diane cometeu suicídio, deixando para trás um legado impressionante de imagens que continuam a desafiar e inspirar.

Ao comemorar o 100º aniversário de Diane Arbus, é importante reconhecer o impacto duradouro que sua obra teve na fotografia e na arte em geral. Seus retratos ousados e honestos de pessoas incomuns e marginalizadas continuam a nos lembrar da beleza e da humanidade que podem ser encontradas em todos os lugares, mesmo nos lugares mais inesperados.

A Jewish giant at home with his parents in the Bronx, 1970
11 10
© The Estate of Diane Arbus Woman with a veil on Fifth Avenue, 1968 © The Estate of Diane Arbus Female Impersonator on a Bed, 1961
13 12
© The Estate of Diane Arbus Patriotic Young Man with a Flag, 1967 © The Estate of Diane Arbus Tattooed Man at a Carnival, 1970
15 14
© The Estate of Diane Arbus
A
young man in curlers at home on West 20th Street © The Estate of Diane Arbus ‘A Naked Man Being A Woman, 1968
17 16
© The Estate of Diane Arbus

Exposições, sites de notícias, sites de artistas, redes sociais, visitas guiadas gravadas ou ao vivo, filmes, livros on-line, cada modalidade audiodescrição (AD) tem suas especificidades. O tempo estimado para ouvir a AD de uma fotografia vai depender do ambiente, do local em que ela está exposta, e do tempo de que a pessoa dispõe.

Geralmente, a AD de uma fotografia é começa pelo aspecto mais relevante da imagem. Muitas vezes, o título ou a legenda já revela isso, como nesse caso com a fotografia de Diane Arbus.

Numa exposição, o conjunto da

obra se sobrepõe, fazendo com que o audiodescritor busque ser ainda mais suscinto, de acordo com a quantidade de fotos e com a dinâmica proposta pela expografia. Uma AD longa demais pode fazer com que o usuário fique enfadado e perca o interesse. Uma AD curta demais pode omitir informações, o que poderia reduzir as possibilidades de o usuário imaginar, devanear e inferir. Assim, numa mesma exposição, é possível que o artista ou a produção combine com o audiodescritor estratégias para capturar a atenção do visitante mais em algumas imagens do que em outras.

audiodescrição, em quantos caracteres?

Liliana Tavares

Audiodescrição:

Com Acessibilidade Comunicacional

Roteiro e narração:

Liliana Tavares

Consultoria:

Michelle Alheiros

Edição de áudio:

Júlio Reis

Diane Arbus – Menino com uma granada de brinquedo no Central Park, Nova Iorque, 1962.

Child with a toy hand grenade in Central Park, 1962.

Em preto e branco, fotografia de um menino de 7 anos. Ele é branco e muito magro. Está de pé, com os braços estendidos rentes ao corpo. A mão direita segura uma granada de brinquedo e a mão esquerda está rígida, flexionada para cima, com os dedos arqueados em forma de garras, como se segurasse outra granada. Ele olha em nossa direção com olhos arregalados, enquanto pende sutilmente a cabeça para a esquerda e contrai a boca na horizontal. Tem cabelos claros, lisos e grossos, com franja curta; olhos castanhos, grandes, e nariz comprido. Os joelhos se sobressaem como duas bolas escurecidas nas pernas finas. Usa camisa clara de mangas curtas, com estampa quadriculada escura, shorts escuros com suspensório, meias grossas até a canela e sapato escuro com cadarços claros. Uma das alças do suspensório está caída até o cotovelo da mão esquerda. Ele está em um caminho calçado, marcado pela fraca luz do sol que atravessa as folhas das árvores. Por trás dele, na altura dos ombros, dois troncos de árvores. À direita, levemente desfocadas, quatro pessoas vêm andado pelo mesmo caminho, uma criança de mãos dadas com uma mulher e um homem que empurra um carrinho de bebê. Ao fundo, na amplitude do parque, também em desfoque, a luz suave do sol ilumina as árvores, provocando um efeito de névoa.

19 18 audiodescrição
© The Estate of Diane Arbus

entrevista

“nela, a vida brilha com indecifráfrável estranheza”

Uma conversa sobre fotografia e história da arte com o cineasta André Antonio se transforma fácil em polifonias. No meio da tarde, para falar do “eu” e o do “outro” e de Sontag, quando apontávamos para Diane Arbus com alguma ideia de profundidade, André dispara: “Deleuze disse nA lógica do sentido: ‘o mais profundo é a pele’” e o papo se amplia para Velazquéz, os surrealistas, os julgamentos morais, o posicionamento do fotógrafo, a espetacularização do estranho, “ou do pobre”; e as comparações e aliterações seguem de Bresson a Brassai, (“Este teve de engatinhar para Diane andar”); até Salgado. E a conversa seguiu pelos temas banais em Diane e noutros artistas, a erotização, a (des)heroificação, em James Joyce e seu Ulisses e nos invernos de Ítalo Calvino.

Porque o espírito de Joyce se mexeu durante nossa conversa, enquanto editava a entrevista, enviei ao professor um trecho de “Retrato do artista quando jovem”, do irlandês, que talvez sirva como síntese da nossa conversa em torno de Diane Arbus, da sua relação com quem estava sob seu olhar:

“Não queria brincar. O que queria era encontrar no mundo real a imagem sem substância que a sua alma tão constantemente baralhava. Não sabia onde a descobriria, nem como; mas um pressentimento o advertia sempre de que essa imagem, sem nenhum ato aparente seu, lhe viria ao encontro. Haviam de se encontrar sem alvoroço, como se já conhecessem um ao outro e tivessem marcado uma entrevista talvez num daqueles portões ou noutro lugar mais secreto. Estariam sós, cercados pela treva e pelo silêncio; e nesse momento de suprema ternura ele seria transfigurado. Dissolver-seia dentro de qualquer coisa impalpável, sob os olhos dela. E depois então, num momento, se transfiguraria.”

A conversa continua pelo aplicativo de mensagens. Por enquanto, enviamos a entrevista [S.R.]

“Uma artista empenhada em desconstruir o exótico”.

Unicaphoto – Para usar uma expressão que se lê em “Aquele lustro queer” (Index ebooks, 2015), de Bruno, Horta: “Diane Arbus aquém e além dos monstros”, diga para gente: para além do universo “freak”, que mundo a obra de Diane Arbus pode nos mostrar?

AA– Não conhecia esse livro, mas acho que a frase tem tudo a ver com a fotografia de Diane Arbus. De fato, ela sempre estava aquém dos “monstros” fotografados por ela, isto é, dos sujeitos cuja aparência – e por diferentes motivos – destoavam do padrão das imagens midiáticas e oficiais da época. Quem visita o trabalho de Arbus esperando encontrar aqueles antigos freakshows de parques de diversões, com palco, cortina colorida e um holofote espetacularizador, vai se decepcionar. O que vemos nessas imagens é algo aquém do espetáculo: são esses sujeitos em uma singeleza e um despojamento absolutamente banais, habituais, cotidianos, comuns. E ela também estava além dos monstros porque seu trabalho nunca foi sobre monstros. Mas, pelo contrário, mostrar que o próprio real – por ela capturado em fotografias – é, ele sim, um manancial monstruoso e infinito do insólito. Na obra dela, não é que algumas pessoas sejam estranhas, destoando da normalidade. Tudo – a própria vida – brilha com uma indecifrável estranheza. Diane estava além: suas fotos construíram uma visão muito ampla e instigante da vida. Então acho que é esse o mundo que podemos ver na obra de Arbus: um mundo muito mais complexo do que aquele que categorias binárias habituais – feio e bonito, bom e mau, normal e monstruoso, banal e estranho – conseguem dar conta.

Unicaphoto – Susan Sontag dizia que Arbus transformava “comuns mortais” em monstros e explorou as dores dos retratados em “imagens repelentes” que tornaram os espectadores insensíveis. Grosso modo, o comentário pode nos induzir à ideia de que sua fotografia talvez ferisse a dignidade dos retratados e retratadas. Dignidade,

portanto: onde o verbete veste bem ou não veste a ética em Diane Arbus?

AA– Faz tempo que li essa análise que Sontag fez de Arbus. Esse tema interessava mesmo a Sontag, basta pensarmos nas suas famosas reflexões a respeito da representação da dor do outro. Mas, se me lembro bem – e conhecendo o desprezo que o gosto de Sontag nutria por obras com efeitos sentimentalistas, as quais, para ela, só poderiam ser redimidas pela sensibilidade camp – acho que a autora estava elogiando Arbus quando falava desse jeito! Realmente, as imagens de Arbus são repelentes – e o eram ainda mais na época de sua primeira publicação – porque não são o que se chamaria de imagens “bem feitas”. Não existe nelas aquele rigor, aquele primor, aquele apelo monumental da fotografia modernista de antes dos anos 1970 (Evans, Bresson, Lange ou qualquer dos outros). Arbus dialoga muito mais com a fotografia contemporânea, onde o debate não é mais sobre certo cânone de bom gosto da imagem fotográfica, mas sobre um conceito que amarre bem sua prática fotográfica. Uma ideia, um dispositivo, um jogo que faça você questionar seu olhar habitual, mesmo que o resultado seja imagens desfocadas, mal-enquadradas e até mesmo medíocres. Imagine ver essas fotos – ainda por cima com modelos que eram considerados freaks, aberrações – tomando as paredes das galerias e chegando a ir, inclusive, à Bienal de Veneza? Existia um valor de choque associado às imagens de Arbus –valor ao qual a arte contemporânea sempre dá boas vindas. Se os espectadores ficam insensíveis a essas imagens é porque antes era muito fácil se sensibilizar, mostrar emoção: as imagens do fotojornalismo monumental eram apelativas, sensacionalistas. Você tinha que chorar, berrar, se ajoelhar, não sei. Agora as imagens de Arbus tinham uma banalidade que era quase ofensiva para quem ainda cultivava um certo gosto pelo alto modernismo fotográfico da Life. Mas, justamente, a inovação do olhar de Arbus foi fazer o espectador sentir outra coisa quando visse pessoas com aquelas aparências – não sentir pena,

André Antônio, professor no curso de Artes Visuais da UFPE e cineasta, apresenta pontos de possíveis leituras à obra de Diane Arbus, para Unicaphoto. Foto:Arquivo pessoal/Divulgação
21 20

não ser condescendente, não julgar e se frustrar ao não conseguir apontar para a foto e dizer quem eram os vilões e os heróis da história. Por causa disso, e sendo bem direto, acredito que é válido sim falar que há dignidade na representação dos modelos nas fotografias de Diane Arbus.

Unicaphoto – O exótico e o extremo são pontos de chegada ou de partida, em Diane Arbus? De partida. Inclusive por tudo que expus até agora. É conhecido o método de Arbus, que ela mesma compartilhou: ela pesquisava pessoas cuja aparência destoasse do padrão pelos mais aleatórios motivos. Podia ser uma drag queen ou alguém com gigantismo. Uma vez encontrando seu modelo, Diane produzia uma imagem “decepcionante”: absolutamente banal, sem espetacularização. Você podia encontrar doçura nas fotos, mas não sensacionalismo. Mas esse método já bastante comentado pelos estudiosos da sua obra fala apenas sobre uma parte de sua produção. Diane também ia atrás das pessoas ditas “normais”: ela tem fotos de casais heterossexuais, crianças brincando na rua, e por aí vai. Mas, se olharmos bem, esse casal hetero está vestido de forma ridícula. A criança na rua fez uma careta para a lente da câmera. De fato, ninguém é normal ou nossa frágil noção do que é a normalidade se esfacela. Por isso acho que ela era uma artista empenhada em desconstruir o exótico, nossa noção comum do outro – e não o contrário.

Unicaphoto – Sobre um ponto caro aos fotógrafos: “o instante decisivo”, essa ideia que se popularizou mais a partir de Cartier-Bresson. Em Diane, parece que não há essa perseguição, ou me engano? A gente pode pensar que essa ideia de flagrante não existe para ela. Talvez certo delicado vouyerismo. Se puder, defina isso para gente: essa estética em Diane Arbus. Essa atmosfera, talvez.

AA– Você tem razão. Aquela sensibilidade heroica bressoniana de viajar para outros países capturando instantes mágicos parece não pertencer muito a Diane, cuja estética se filia a um tom menor, mais cotidiano. Ao mesmo tempo, ela não usava estúdio e não investia muito em pensar poses, como na fotografia de moda. É documental, mas não fotojornalística. Pouco antes do suicídio, ela deu uma masterclass na NYU, cujo áudio pode ser acessado no Youtube. Há um momento que ela diz algo como: “Quando estou diante de alguém, eu faço incontáveis cliques, sem economizar. Muita coisa vai ficar chata e pouca coisa vai se salvar. E, pra falar a verdade, eu até gosto quando fica chato”.

Ora, isso é o oposto do que Bresson diria! A fotografia dele nunca é chata – sempre é um espetáculo a ser admirado. A atmosfera em Diane tem a ver com ela deixar os modelos à vontade. Se acreditamos no que ela fala nessa palestra, ela pedia para o modelo contar sobre sua própria vida, ela criava um momento de descontração e aí – clique! Por causa dessa doçura, as fotos fugiam do sensacionalismo, era o registro de um momento doce de conexão entre fotógrafa e fotografado. Arbus na mesma ocasião falou: “Descobri que essas pessoas só queriam falar um pouco sobre si, sobre suas vidas. Elas só queriam ser ouvidas. Quem não quer?”

sua sobrevivência. Psicológica. Social. E hoje, em épocas de tanta exposição, o que as pessoas ainda escondem? Vivemos o fim da intimidade e do segredo? Num exercício de imaginação, que mundo e segredos Diane Arbus fotografaria hoje? AA– Nossa, essa pergunta é difícil! Eu gostaria de ver, por exemplo, para onde Sontag levaria os debates dela a respeito da dor do outro a partir dos reality shows de hoje. Mas com relação a uma obra fotográfica como a de Arbus, não sei onde encontraríamos algo parecido com isso hoje. Flusser dizia que a câmera fotográfica é como um jogo cujos quebra-cabeças os fotógrafos vão desvendando. É comum ouvir de um fotógrafo: “saí pra brincar um pouco com a câmera”. Sem dúvida, Arbus decifrou um quebra-cabeça em sua obra. E foi algo assombroso, um choque, ver essas imagens na época pela primeira vez. Uma câmera nunca havia mostrado algo daquele jeito – e só havia chegado perto, talvez, na fotografia de Brassai, na década de 1930. Hoje, vemos incontáveis continuadores do “Código Arbus” (continuo falando como Flusser), mas já estamos acostumados. Não nos choca mais. Estamos jogando esse jogo há bastante tempo e começamos a ficar entediados. Em épocas de inteligência artificial e fake news, acho que o novo quebra-cabeça, o novo código, vai ser desvendado em ambientes e aspectos imagéticos que nem conseguimos imaginar ainda.

Unicaphoto – Por falar em inteligência artificial, neste número, Unicaphoto discute um pouco não a fotografia digital, mas as imagens geradas por IA. Qual sua visão sobre o tema?

real?”. Enfim, o assunto é complexo e estamos apenas começando a nos acostumar aos seus termos. Mas o que Benjamin e outros autores ensinaram é que não adianta moralizar a questão, ou enxergá-la através de extremos binários. Foi exatamente assim quando a fotografia surgiu. Uns achavam que era a maior inovação já testemunhada na face da Terra. Outros, apocalipticamente, decretavam o fim da arte. Como alguém poderia fazer arte assim tão fácil, apertando só um botão? O tempo passou e hoje vemos que ambos esses lados extremos estavam enganados. A fotografia não era tão inovadora assim. Desde o século 18, pelo menos, os artistas já faziam imagens de perspectiva monocular a partir de câmaras escuras e de lentes. A novidade foi só a descoberta química de uma forma de fixar a imagem. Por outro lado, nossa ideia de arte mudou tanto que, sim, você pode hoje fazer arte apertando um botão, ou fazendo até menos do que isso. Então acho que devemos começar a ver as imagens geradas por IA com parcimônia e sem julgamentos precipitados.

Unicaphoto – Se [você fosse] um viajante numa noite de inverno e tivesse no bolso uma única foto de Diane Arbus, que imagem seria essa? Ah, e por quê?

AA– Difícil escolher! Mas eu tenho um afeto especial pela série que ela fez sobre a comunidade das dykes (uma gíria da língua inglesa que poderíamos traduzir mais ou menos por “sapatão”) no Central Park, em Nova York. Os looks são tão incríveis! Então, se eu estivesse nesse trem numa noite de inverno, adoraria ter uma dessas fotos. Pelo menos eu estaria olhando para pessoas com um estilo que considero incrível.

Unicaphoto – “Uma fotografia é um segredo sobre um segredo. Quanto mais você diz, menos sabe”, ensinava Diane Arbus. A obra de Arbus era sobre pessoas estigmatizadas, cujo segredo era vital para

AA– Eu estaria mentindo se dissesse que estudei o assunto o bastante para ter uma opinião. No entanto, a sensação que eu tenho diante desse tema é a de estar vendo imagens que trazem novas questões, novos modos de ver e de sentir. A imagem do papa com casaco acolchoado ou as imagens que, agora, são facilmente geradas nos aplicativos de IA textoimagem. Você digita “paisagem de praia como se fosse feita por Pablo Picasso” e em minutos você tem diante de si um quadro nunca antes visto feito “com o estilo” de Picasso. Walter Benjamin falou que de tempo em tempos, mudanças sociais e tecnológicas nos levam a redefinir o que entendemos como arte. Sinto que talvez estejamos diante de um momento onde precisaremos rever a própria ideia de prática artística, de direitos autorais, e por aí vai. A crença que temos na imagem fotográfica atualmente ainda é imensa. Me pergunto: será que a partir de agora não conseguiremos mais olhar para uma fotografia sem nos perguntamos: “é

Self portrait © The Estate of Diane Arbus
23 22
Nota: o documentário citado por André Antonio, Masters of photography – Diane Arbus (documentary, 1972), está disponível em https://www.youtube.com/ watch?v=Q_0sQI90kYI, em 11/mai/2023

“rios todos com nome/ e que abraço como a amigos”

Gustavo Maia
ensaio Arez, RN 24

Os versos que dão título a este ensaio são de autoria

João Cabral de Melo Neto.

Aqui, o historiador e fotógrafo Gustavo Maia trata não somente do rio como um amigo, “em que a água sempre está por um fio” (ainda seguindo o curso do poema de Cabral), mas dos homens e o mar [“que deste mar de cinza/ vai a um mar de mar]; pescadores artesanais, trabalhadores e trabalhadoras, sobretudo do Nordeste. No excelente artigo, Maia apresenta seu work in progress “com passo de rio, que é de barco navegando”, trabalhos de fotógrafo experiente, mostra algumas fotos inéditas, enquanto continua sua pesquisa histórica sobre as influências índígenas na pesca da região.

As fotos que compõem este ensaio foram especialmente escolhidas, recorte de um conjunto maior e mais abrangente de pesquisa histórica e artística, com documentação fotográfica, para a temática da pesca artesanal. Em princípio, o trabalho acadêmico de conclusão do curso de História buscou investigar em campo a possível herança da cultura indígena nas artes da pesca praticadas atualmente.

Em um outro momento, durante um trabalho de levantamento e documentação fotográfica realizado em 2007, em sítios arqueológicos de pinturas rupestres, e outros com gravuras, ao acompanhar e trabalhar para uma equipe de arqueólogos da UFPE, na região sertaneja do Seridó, no Rio Grande do Norte, o fotógrafo ficou bastante impressionado com o que viu e conheceu. Esta experiência, de tão marcante e emocionante, provocou um novo interesse de estudo, uma nova maneira de olhar para estes povos antepassados e originários.

Dessa forma, a temática indígena ficou, entre outras, naturalmente incorporada aos interesses e valores pessoais e profissionais deste autor.

Para a pesca artesanal, o trabalho de campo foi realizado em algumas praias, rios, mangues e lagoas, pontos localizados nos litorais de Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Em certas ocasiões tornou-se necessário o aluguel de um pequeno barco para adentrar os lugares, através dos rios, caminhos entre águas e manguezais, ambientes ricos em natureza, naturais para a atividade da pesca artesanal.

27 26
Atapuz, PE (detalhe)
A
pesca artesanal em Coruripe, AL
29 28
Embarcação de Forte Velho, PB (detalhe)
Embarcação em Maragogi, AL 31 30

Entretanto, estes mesmos elementos na paisagem receberam a atenção deste autor em tempos anteriores, por tratarse de temáticas de interesse autoral natural. Fazem parte da construção de um acervo com quase trinta anos baseado em trabalhos de pesquisa e documentação fotográfica nas áreas de Patrimônio.

O material registrado em campo, fotografias e anotações, conduziu a outras etapas da pesquisa, para as fontes bibliográficas, e para a iconografia disponível sobre o tema.

Enquanto fonte histórica, a fotografia pode relacionar-se e associar-se a outras, de alguma maneira, para compor um conjunto. Assim, transcendendo a beleza, a poesia e a estética, naturais da linguagem e expressão fotográfica, o documento fotográfico adquire outros importantes sentidos adicionais. No campo das Ciências Humanas, e particularmente, no estudo da História, este tipo de documentação possui importante relevo, sendo frequente a este pesquisador, sempre que possível, sua utilização como ferramenta de trabalho.

A propósito de trabalhos com documentação iconográfica, é importante lembrar que, antes da fotografia, as grandes expedições realizadas ao continente americano, apenas para exemplificar, entre outros profissionais, contratavam artistas. Eram pintores, desenhistas e gravuristas, que documentavam as viagens exploratórias, as paisagens, os grupos indígenas encontrados durante o percurso da expedição, com suas características particulares, além dos muitos registros da fauna e da flora tropical.

Para o século 17, o legado artístico e iconográfico deixado por artistas e cientistas do período holandês, principalmente para Pernambuco, e outras capitanias vizinhas, constitui documentação de inestimável importância para diversos tipos de estudo. Vários desses documentos tornaram-se icônicos, a exemplo de pinturas de Franz Post, e de Albert Eckhout, além dos belos documentos cartográficos. Ao avançar no tempo para a iconografia histórica brasileira do século 19, em breve comentário, como esquecer as aquarelas, gravuras e desenhos de Johann Moritz Rugendas ou Jean-Baptiste Debret? E o século 19 trouxe a grande novidade, a fotografia! As paisagens fotográficas registradas por Marc Ferrez, em diversas regiões do país, e os retratos feitos por ele, grandes obras de arte, fariam falta à nossa história e memória, caso não existissem. Sem, no entanto, esquecer tantos outros importantes fotógrafos, imigrantes e brasileiros, que instalaram seus estúdios fotográficos principalmente nas cidades do Recife, Salvador e Rio de Janeiro. Em retorno a este ensaio fotográfico, como exemplo e sem grandes pretensões, várias leituras tornar-se-iam plausíveis a partir do conjunto imagético aqui apresentado. Este, natural ou hipoteticamente, poderia conduzir a uma leitura histórico-social, étnica, antropológica, cultural, entre outros aspectos, envolvendo os pescadores como sujeitos históricos importantes e principais, onde essas visões e leituras se interrelacionam.

Fazem parte e alegram a paisagem litorânea, inseparáveis de seus pescadores, os barcos, construídos artesanalmente em madeira, com

o rio Una, PE
33 32
Pescadores em Coruripe, AL

Viagem pitoresca através do Brasil.

O pintor alemão Johann Moritz Rugendas (1802 — 1858), e o fotógrafo brasileiro Marc Ferrez (1843 — 1923), citados no artigo de Gustavo Maia, contribuiram para uma nova perspectiva do olhar sobre o Brasil, suas populações, seu território, seus costumes.

“Canoa indígena”. Gravura de 1835, de Adam Victor, (1801-1866). Acervo da Biblioteca Nacional do Brasil.

Copacabana, com o Morro Dois Irmãos ao fundo, c. 1895. Marc Ferrez. Acervo IMS

suas pinturas em cor. Movem-se e flutuam poeticamente sobre as ondas e a paisagem marinha, e dos rios e das lagoas. Associada a estes, a presença humana dos pescadores, mulheres e homens, conferem vida e movimento à paisagem iluminada dos lugares. São, naturalmente, motivos atrativos a alguns artistas. Invisíveis à sociedade em geral, de existência à margem, certas comunidades de pescadores possuem como principal fonte de renda a atividade da pesca artesanal, seja para a própria subsistência, ou para comercialização de pequena escala, nos mercados locais ou regionais.

No que refere à história da pesca no Brasil e no Nordeste, presente na historiografia, as primeiras informações registradas provêm dos relatos de cronistas e viajantes, ao longo dos séculos. No início da colonização, ao tratar sobre o assunto da pesca, em geral entre outros assuntos, alguns destes comentam sobre a habilidade natural dos indígenas para a pesca, profundos conhecedores da natureza, exímios pescadores de arco e flecha, entre outras técnicas e habilidades.

Este torna-se, em seguida, um tema historiográfico trabalhado por poucos pesquisadores, ao menos até o século 20. Com merecidos destaques, entre outros, para o professor, jornalista e historiador literário paraense José Veríssimo, com A pesca na Amazônia, publicado em 1895. Assim como para o pesquisador e antropólogo potiguar Luís da Câmara Cascudo, com dois livros publicados: Jangadas: uma pesquisa etnográfica (MEC, 1957) e Jangadeiros (1957),

entre outros escritos desse autor sobre a pesca. Em seu livro Os pescadores na História do Brasil: Colônia e Império, publicado no Recife (1988), resultante de uma pesquisa patrocinada pela Comissão Pastoral dos Pescadores, o historiador

Luiz Geraldo Silva conseguiu, provavelmente pela primeira vez no Brasil, sistematizar um conjunto de informações sobre “a história de uma categoria sócio profissional durante o Brasil Colônia e o Brasil Império: os pescadores artesanais.”

O autor escolheu justamente a região Nordeste como universo de estudo, admitindo poder transcender a região ilustrada.

Para Luiz Geraldo, em contexto

mais amplo, “a história dos pescadores no Brasil Colônia está profundamente ligada à história dos grupos oprimidos da sociedade colonial – os indígenas e, posteriormente, o negro africano.”

Seu trabalho focaliza importantes processos econômicos e sociais envolvidos, relevantes para a compreensão do processo histórico. Doutor pela Universidade de São Paulo, Luís Geraldo Silva é Professor Titular do Departamento de História da Universidade Federal do Paraná – UFPR.

35 34
Jequiá da Praia, AL
Aldeia Indígena Tramataia, Marcação, PB 37 36
39 38
41 40
Nas páginas duplas, anteriores, pescador de Barra de Mamanguape, PE Nesta página, na foto maior, paisagem no município de Arez, RN. Na fotos menores, a pesca astesanal na Ilha de Itamaracá, PE, e canoa fotografada em Coruripe, AL.

Munduruku, guardiões do Tapajós

Paulo Airton Maia
ensaio 43 42

Quando se navega sobre o rio Tapajós numa canoa, as bordas dela ficam quase rentes à água. Naquela paisagem a visão que se tem do céu nos faz ter impressão que ele está mais próximo, quase sobre nossas cabeças, ou quase encontrando-se com a água. Toda essa paisagem nos provoca uma sensação de estar imersos no rio e ao mesmo tempo flutuando entre as nuvens no céu. Enquanto vamos nos inebriando com a paisagem, a leve canoa desliza sorrateira sobre as águas do rio, cortando delicadamente suas pequenas ondulações.

O Tapajós é imenso. Tudo parece uma grande composição harmônica: a água, o vento suave, o calor escaldante, a umidade e as centenas – e dificilmente identificáveis – cantorias dos pássaros. São muitos os sentimentos que o contato com aquela natureza nos provoca. Estar de frente a esse mar fluvial nos leva a uma experiência quase mística, como se retornássemos às nossas origens.

45 44

O Tapajós nos recebe e acolhe com sua história, que também é nossa história. É como um retorno à morada que habitamos na história por meio de nossos antepassados. Adentrar naquele espaço imenso, banhado por tanta água e tanto verde, é como um retorno à antiga casa, de onde se originou e ainda se origina muita vida.

Foi ali, às margens daquele imenso rio que encontrei algumas comunidades do povo Munduruku. Povo amável, atencioso e também guerreiro. Como filhos do Tapajós, são os guardiões da natureza que os envolve. Vivem a cada dia do que lhes dão a floresta e o rio. O povo Munduruku, a floresta e o rio vivenciam uma cumplicidade, partilham da mesma realidade e compartilham a mesma história.

Ao chegar a uma aldeia Munduruku, creio que para a maioria dos visitantes, primeiro salta aos olhos o carinhoso olhar das crianças. Apesar de não falarem português, as crianças são excelentes anfitriões. Falam a língua da alegria e do acolhimento.

Em geral, uma comunidade Munduruku se caracteriza por ser formada por um núcleo familiar. Isso quer dizer que sua organização social se dá por meio da relação de parentesco. Quando um membro ou um grupo de membros saem de sua comunidade originária, significa que este pequeno desmembramento aconteceu para que se inicie uma nova comunidade. E foram comunidades assim, familiares que nos acolheram para que pudéssemos realizar nosso trabalho e conhecer um pouco de sua história.

Dentre o que nos alcançou

47 46
50

aprender, destaco o aspecto de seu pertencimento à terra. Ao procurar uma nova terra para morar, apesar de não ser algo determinante, eles aspiram encontrar um “katomp”, um lugar de “terra preta”, ou seja, territórios considerados sagrados por já terem sido ocupados por outras gerações de sua etnia no passado. Esses lugares, além de bons para o cultivo da agricultura, são verdadeiros sítios arqueológicos, uma vez que teve intensa ocupação e atividade humanas. Trata-se, portanto, de um espaço territorial que os liga diretamente às suas ancestralidades, não simbolicamente, mas espiritual e materialmente, pois segundo a sua complexa cosmovisão, há distintos modos de seu povo assumir formas de estar neste plano material.

A relação de pertencimento à terra, às águas e à floresta não corresponde à compreensão ocidental de propriedade que compartilhamos neste período moderno. O seu pertencimento é de cuidado com a terra, o que significa também cuidar de sua ancestralidade, e ao fazer isso, estão cuidando de sua própria identidade. Portanto, a luta constante que esse povo trava contra as mais distintas forças que insistem em fazêlos sucumbir, não é uma luta somente deles, mas de todos

nós que esperamos viver em um mundo melhor. Não é uma luta localizada “lá entre eles”. A Amazônia é a última fronteira a ser rompida por aqueles que desejam explorar o que temos de mais precioso. Por isso, escutar atentamente o que dizem os povos da floresta, pode ser um primeiro passo importante, para aprendermos a construir um mundo melhor para todos. Como nos disse o cacique Osmarino Manhuary Munduruku: “Para nós, o rio significa a nossa vida. A mata significa a nossa mãe. A gente pede à mãe, e quando a mãe morre, a gente não tem mais a quem pedir”.

A ideia de pertencimento, de ancestralidade e do cuidado com a natureza nos dá a compreensão que isso não é uma luta e consciência “lá deles”, mas que precisa ser nossa, também.

53
55 54
57 56

mulher. cineasta. negra. periférica. educadora.

As inquietações de Yane Mendes e sua compreensão política de que tudo deve estar a serviço de sua luta. Sua alma, mas também seu corpo.

“Nada se trata somente de mensagens, mas de metáforas”, ela explica nesta entrevista a Renata Victor, com fotos de Arnaldo Sete, para a Unicaphoto.

Entre os grandes desafios de Yane Mendes, que ela faz questão de repassar para os mais jovens, é o de não desistir. Nunca.

Foto nesta página: Yane Mendes

entrevista
mulher. cineasta. negra. periférica. educadora. 59 58

Yane Mendes é cineasta periférica da favela do Totó, no Recife.

Sua militância envolve várias lutas. Afrociberativista, ela coordena a rede Tumulto, no trabalho de articulação, comunicação e formação e educação social, em outras periferias da cidade.

É integrante de Articulação de Negras Jovens Feministas e do Instituto Nu. Entre seus trabalhos, se destaca “A live delas”, (2020, Brasil, 10’, DCP, Acervo IMS).

Além desse trabalho, outras realizações da cineasta, como “Podia ter sido eu” e “PensaDOR”, “Mandala num compasso diferente” e “No sábado eu dou autógrafo” que podem ser conferidos online.

Unicaphoto – Como você se identifica enquanto cineasta negra e periférica, e como isso influencia o seu trabalho?

Yane Mendes – Sou Yane Mendes, sou cineasta, é… periférica, também sou articuladora de favelas. tanto regional, territorial e nacional, trabalho também como educadora social. Então, eu me identifico como cineasta periférica, é porque eu acredito no cinema que eu faço, utilizando a metodologia que eu aprendi na favela, né, que é uma maneira mais coletiva, uma maneira onde a gente, vamos dizer, tem menos hierarquia, pelo menos dentro dos becos e das ladeiras? Tá ligado? Assim é como funciona, né, e tentando aprender vivendo, né, na coletividade e pá. Nas experiências que às vezes dão certo ou não. Então, por isso que eu identifico que o meu cinema, ele pega essa metodologia, eu tento aplicar a vivência da periferia, por isso que me identifico como cineasta periférica e sou uma jovem preta. Isso influencia diretamente no meu trabalho. Primeiro que o meu corpo é político, então onde ele chega, ele abre a boca pra falar de cinema, as pessoas muitas

vezes infelizmente ainda estranham, né, como eu digo, eu me autointitulei cineasta. Não tenho um papel que comprove isso. Foi fazendo filme, foi tendo retorno das pessoas que assistiram o meu filme, foi entendendo o poder que os meus filmes têm. Então acho isso suficientemente legítimo para eu me intitular cineasta. Então o impacto e a influência que isso tem no meu trabalho, é que eu acredito num cinema preto também, mas não somente feito por pessoas pretas, mas um cinema que tenta enegrecer a tela, sabe, não só colocando personagens pretos como personagens principais, narrativas principais, mas colocando profissionais pretos pra trabalhar, que são profissionais com a qualidade técnica também muito grande. Por vezes não tem a oportunidade de trabalho. Então eu acho que falar de periferia, fala de negritude em conjunto, fala do cinema que eu faço, fala sobre o cinema que acredito e que luto pra todo mundo conseguir acessar e conseguir produzir. Mas com recurso, né. Falar de dinheiro, que é importante.

Unicaphoto – Quais são os principais temas e mensagens que você busca transmitir através dos seus filmes?

YM –Então, eu tenho hoje uma filmografia que é muito ligada à documentário, mas eu digo que a minha marca maior é ter filmes provocativos e de inquietação. Ele não dá resposta, não coloco a minha única verdade dentro deles e nem defendo isso. Mas eu coloco provocação, né, porque a gente não tá olhando pra aquele lugar, daquele jeito. Se eu olhasse essa narrativa, esse tema, por esse lado. Despertar um pouco as pessoas para o não óbvio também. O nosso olhar tá muito viciado no que a gente tem aí, escutando, assistindo e tendo acesso, então eu tento trazer filmes que falem desse protagonismo que a favela já tem dentro dela mesmo, mas expandindo e dizendo que se eu tenho que colocar numa imagem de uma câmera 4k pra que as pessoas consigam enxergar, né, o quanto a minha favela e outras periferias têm potência, eu vou fazer isso, e venha fazendo isso. Então têm mensagens subliminares, que eu diria mensagens-metáforas. Eu acho que eu não passo muitas mensagens, eu passo metáforas dentro dos meus filmes. Metáforas que por vezes eu consigo ter 10, 20 leituras, que não foi nenhuma que eu pensei antes de filmar, antes de pensar na ideia. Eu acho que é isso também o interessante. E enxergar que o processo, também, como eu faço o filme, né? Ele já é um processo à parte, mas também já é um audiovisual também, a partir do momento que eu defino um roteiro, como que eu vou dirigir aquele filme? Montar

equipe, que eu acho que ali já começa uma trajetória, uma narrativa que com certeza esses processos filmados já dariam um outro filme. A possibilidade de mil narrativas quando a gente junta um monte de pessoas faveladas para produzir, né conteúdo narrativo e audiovisual.

Unicaphoto – Quais são os principais desafios que você enfrentou na sua carreira como cineasta negra e periférica. E como lidou com eles?

YM – Eu acho que na verdade os desafios, eu enfrento, né. Só que vai mudando os graus de desafios. Mas eu acho que o primeiro desafio foi essa questão de reconhecimento enquanto cineasta. Eu acho que hoje existe um hackeamento aí, que eu consigo hoje ser um pouco mais legitimada por algumas pessoas da área do cinema, que conhecem e admiram e trocam sobre o meu trabalho, né. Eu acho que as pessoas que assistiram os meus filmes e fazem eles circularem, eu acho é que uma das escadas principais pra eu conseguir espaços hoje, e reconhecimento como alguém que produz audiovisual e que dirige filmes. Eu acho também que o meu trabalho, é que eu junto o audiovisual, mas com o meu trabalho de articulação. Ele também proporciona, né, para que eu consiga fazer o hackeamento. Por exemplo os dois filmes que eu consegui hoje, vamos dizer assim, usando com recurso, mesmo que pequeno, ele veio muito a partir do meu trabalho com articulação, do meu trabalho de conexão de pessoas e aí consegui ter uma visibilidade a partir disso, e consegui ter um acesso pra fazer o meu audiovisual. Ainda nunca acessei um edital público e consegui um recurso assim, de importância pra conseguir fazer um filme com a qualidade que eu sonho em fazer um dia. Então eu acho que os desafios, primeiro você ir para espaços onde as pessoas estão falando coisas interessantes sobre a sua vida, mas você não compreender aquela linguagem porque muita gente faz questão de colocar palavras difíceis para que fique numa bolha só aquelas informações. Então consegui hackear um pouco e entendi que eu precisava estudar e aproveitar também as oportunidades que eu tinha pra entender e criar a minha própria estratégia de tá produzindo, também foi um dos maiores desafios. E acho que hoje um dos meus maiores desafios também é não desistir. Não desistir de tantas barreiras que dizem que eu não posso trabalhar com cultura. Que eu não posso trabalhar com articulação. Que eu não posso trabalhar implementando e lutando pra trazer projetos para minha região aqui do Nordeste. Que eu não posso dizer o Totó um dia vai ser uma terra com várias oportunidades para jovens e

61 60

com menos criminalização do que a gente tem hoje, né. Então eu acredito que leva tanto não na cara todos os dias, ou então conhecer pessoas que estão vivendo nos seus emprego, amigos, e tipo, se lembrar também de como era quando eu não trabalhava na área cultural. e não conseguia me manter disso, e sempre tá muito perto do abismo de precisa voltar para esses trabalhos normais, vamos dizer assim. Eu acho que é um dos meus maiores desafios. Como é que não vou ter essa certeza de que consigo tá trabalhando com arte e com cultura, e produzindo conteúdo?

Unicaphoto – Como você enxerga a representatividade e a diversidade no cinema brasileiro atual?

IM – Acho que é um pouco da continuidade da pergunta três, né. Eu acho que conseguir ter autoestima e entender o corpo político e o que eu faço é político. Hoje, conseguir falar disso sabendo da minha importância, sabendo do meu diferencial, né, nas minhas produções, e das minhas falas também é algo que foi todo um processo de muitos anos, para eu conseguir “me dizer” isso, né, e acreditar no que

eu to falando, e falar e debater tendo a certeza do que é que eu tô falando. Então eu acho que eu enxergo a questão da representatividade e a diversidade dentro cinema como uma crescente, né. Tá longe ainda de ser para todo mundo, mas eu vejo como uma crescente, principalmente a questão racial, e de mulheres, que têm cada vez mais, aumentado o número de pessoas conseguindo produzir. Apenas eu acho que a gente não pode cair no baú da ilusão de dizer que “ah, os números tá crescendo, então tá tudo certo”. Não, a gente sabe que o número tá crescendo mas que a quantidade de produtos como por exemplo os longas, que aí a gente tá falando de milhões e de vários zeros, continua ainda nas mãos dos homens brancos de classe média. Então eu acredito que tá crescendo, mas a gente tem que olhar sobre como tá sendo dividido essa questão do bolo, né, quando a gente fala de dinheiro, quando a gente fala de possibilidades de criação, falando do cinema em específico. Eu acho que as nossas histórias também tão sendo contadas de outras maneiras. A gente tem a própria TV aberta aí hoje se modificando também, né, a novela das sete hoje, “Vai na Fé”, que é de uma mulher negra e

diretora também, Juh Almeida. Tá na casa do povo, e tem a ver com o cinema sim, porque é o que tá na casa do povo. Às vezes é a referência mais próxima de cinema que as pessoas têm. É uma novela, é um conteúdo audiovisual que chega. E que tá mudando, né, tá mudando como as nossas famílias estão sendo representadas, como é que as nossas histórias estão sendo contadas. É tudo em passos muito lentos, tudo com mais dificuldade, mas eu acredito que a gente tá aqui para somar com quem quer mudar também, e vai sim conseguir fazer com que pessoas pretas e periféricas consigam ocupar a tela do cinema. Seja ela fazendo, produzindo, consumindo e dirigindo também. E eu digo que nem só no cinema também. Tem que chegar no cinema, tem que chegar na TV, tem que chegar na internet. Tem que chegar nos canais que chegam nas pessoas, sabe. Que o cinema precisa também se tornar mais acessível. A gente tem cinema na cidade, mas em bairros que as pessoas não conseguem ir, né, por conta de transporte, por conta de tudo, assim. E acho que a gente precisa conseguir convidar mais as pessoas e possibilitar que as pessoas consumam o nosso cinema. E que debatam mais sobre ele, e que enxerguem a possibilidade de ter diversos cineastas também dentro das favelas, que eu tenho certeza que tem muita gente aí que ainda vai ser descoberta.

Unicaphoto – Quais são os projetos em que você está trabalhando atualmente?

YM – Então, hoje eu tô encerrando um ciclo neste primeiro semestre, dentro do Fórum Construtivo do Instituto Nu, que é um instituto da Nubank onde eu construí por um ano, né, esse instituto junto com mais seis lideranças nacionais que são pessoas muito referências dentro dos seus estados. Tô finalizando esse ciclo, tô reestruturando a rede Tumulto junto com as minhas companheiras Flora Luena e Fernanda Paixão. A gente tá redesenhando o que é a rede tumulto, depois de tantos trabalhos emergenciais como as distribuições das cestas básicas, voltando

a trabalhar mais com o nosso eixo central que é a comunicação. Acredito também tem os meus planos pessoais de produções audiovisuais. Que tem muito filme aí ainda pra vir. Tem o uso da internet também, que cada vez mais é um espaço que eu tô ocupando, com meu afrociberativismo, que é a nomenclatura difícil que eu aprendi pra dar a algo que eu acredito, que eu tenho que ocupar a internet, com a minha vivência cotidiana. Entendendo que quando eu danço um brega é político, tão quanto eu coloco uma fala de três minutos, tendo não sei quantos views. Então tem curso online e presencial que eu quero dar, que eu acredito nesse poder da multiplicação, né, eu conseguir viajar a alguns estados. E nesses estados conhecer experiências que dão certo, experiências que passaram por desafios e que tão por aí. Então quero muito compartilhar também com as pessoas o que eu venho aprendendo e o que eu venho trocando. E quero também aplicar a minha metodologia de ensino de audiovisual em vários estados e quem sabe também fora do país, né, que hoje não é um sonho tão distante, também né, conhecer periferias fora do país e poder levar também os meus trabalhos. Acho que é muita coisa pra esse ano, mas acredito que tudo vai caminhar, sabe. As águas de Iemanjá vão me jogar para onde ela achar que eu tenho que ir. E sonho não falta aqui, não.

Unicaphoto – Como você acredita que cinema pode contribuir a para luta contra o racismo e outras formas de discriminação?

YM – Eu acredito que o cinema é uma arma. Eu costumo dizer que a minha câmera é uma arma, e por isso ela pede que a gente pense muito antes de filmar qualquer coisa, antes de exibir qualquer coisa, antes de contar a história de alguém e inventar uma história e inventar um alguém. Então eu acredito que pode contribuir e que já contribui, né, só que ela contribui às vezes pra fortalecer, infelizmente o racismo e a discriminação. E ela precisa ser mais utilizada para o contrário, sabe? A gente precisa contar outras narrativas para que os jovens e as crianças tenham outros exemplos, para que eles se vejam na tela e consigam se reconhecer ao assistir o material, sabe. Para que os professores e as professoras consigam levar os nossos filmes para debater dentro da sala de aula também, para que a gente consiga levar para os jovens que tão dentro dos presídios aí, sabe. Tipo que erraram e que tão pagando pelo seus erros, mas que muitos inclusive tão ali e não passaram por esse processo de ter uma compreensão política sobre o seu corpo e sobre o que a sociedade faz com seu

63 62
A cineasta em oficina de audiovisual no bairro do Arruda, Recife, para o coletivo Lá do beco.

corpo preto. Então acho que os filmes podem contribuir com a participação da sociedade para querer usar. Os filmes são ferramentas. Eu não acredito que um filme de certa maneira modifica a pessoa. Ele provoca a pessoa a se modificar. O que modifica as pessoas são as atitudes dela, quando ela acorda no outro dia, porque assistir a um filme meu e chorar, ou então dizer que “ai, fiquei muito emocionada”, e no outro dia você iniciar o dia fazendo tudo de novo igual, eu acho que não é muito efetivo, sabe. Então eu acho que a utilização dessa ferramenta do cinema, ela precisa estar em mais lugares, sabe. As pessoas também precisam ter apoio, né, pra poder ter estrutura, né, pra usar os nossos filmes também. É, eu acredito que aí sim ela vai conseguir contribuir para acabar com as discriminações.

Unicaphoto – Quais conselhos você daria para jovens cineastas negros e periféricos começando suas carreiras?

YM – Primeiro eu diria: “Pronto, você se ferrou” (risos). Gostar de cinema é aquela música que diz “Eu me apaixonei pela pessoa errada”, mas tô brincando! É, eu queria dizer que você vai pensar muitas vezes em desistir. Você muitas vezes não vai ter certeza de nada, e muitas vezes vai achar que isso não é pra você. E aí por vezes vai ter que ser você, o espelho e seu filme, pra você acreditar que “vou conseguir viver disso”, “vou conseguir fazer com que isso circule”, então eu acho que é não tentar se encaixar, porque cada um tem sua história e cada um tem suas possibilidades. Eu comecei com uma câmera de cinco megapixels pra hoje conseguir ter minha a Sony 7s. Eu comecei com uma 5 megapixels onde eu filmava e pedia pra galera exibir lá no projetor na Oi Kabum, onde eu fazia o curso, e eu ia editar dentro da lan house. Então sei que é muito mais difícil o caminho pra gente. Não tem como negar, mas acreditar, estudar. Estudar dentro de uma universidade, mas estudar também conversando com as pessoas, conversando com os mais velhos também, usar outras plataformas quem não conseguem fazer um filme, mas faz um vídeo curto. Eita, se junta com quem tem um computador pra editar. Se junta com quem tem um celular melhorzinho pra fazer um filme, sabe. Eita, hoje eu não tenho um microfone, então será que eu não consigo apoio de um mercadinho do bairro pra ver se eu não consigo alugar um microfone, né? Em uma dessas locadoras, né?

Eu acho que fazendo o que a gente faz, a gente já taria na favela, então utilizar o que a gente usa na favela pra se virar. Quando, às vezes, a gente tem dez reais pra comer, três pessoas na hora do lanche, e utilizar essas metodologias pra gente fazer filme por aí, sabe? E não que tem que ser assim direto não, porque ao mesmo tempo a gente tem que tá entender que existe edital, que existe política pública, e que esses nomes difíceis, a gente estudando e trocando com quem sabe, e tá onde tá tendo debate sobre isso a gente tá pra dizer “oh, tô fazendo filme aqui com cem conto, que eu consegui trabalhando entregando Ifood, mas eu não quero, não! Quero ter num sei quantos mil, porque eu tenho história pra contar e tenho muita coisa boa pra mostrar aí ainda. É sobre isso”

Unicaphoto – Como você enxerga o futuro do cinema nacional em relação à inclusão e à diversidade?

YM – Eu acho que o cinema nacional precisa ter mais histórias contadas por pessoas negras, periféricas, mas

ele precisa valorizar as pessoas que já estão aí, sabe, também. Tem tanta gente boa produzindo, tem tantas cineastas negras com boas produções, com pouca circulação nas suas produções, com pouca valorização, com poucas premiações. Acho que precisa valorizar quem tá fazendo, estipular quem quer fazer e ampliar as possibilidades também, para que mais pessoas consigam acessar esse cinema nacional. Independente de querer trabalhar com cinema ou não, mas que eles consigam entender o que é que o seu país produz. O que é que a sua região produz, né? Quais as histórias que já tem aí? E que a gente pode contar a partir dessa ferramenta do audiovisual. É, eu acho que prefiro enxergar um futuro onde a gente vai dizer que no cinema vai ser uma programação de uma família de favela, com seus três filhos. Ele dizer assim “pô, no sábado eu quero e eu vou pro cinema, e levar os filhos para o cinema”, né. Esses filhos irem pro cinema e ver história que eles digam: “Pô, mainha, sou eu ali também, oh”. E que a gente tenha atores pretos tão incríveis valorizados e ocupando as telas do cinema também. Então acho que enxergo um futuro nacional que compreenda que o Nordeste é potencialidade e que tem nas favelas muita história também, que precisa ser exibida e valorizada. Quando a gente fala de inclusão não é só ter pessoas pretas e periféricas, né? Mas de ter as pessoas de baixa visão, pessoas surdas, as pessoas que possuem deficiência, que consigam entrar no cinema e assistir um filme. Que a gente realmente seja um cinema pra todo mundo, sabe?

Unicaphoto – Qual é a importância da sua produção cinematográfica para a cultura e sociedade brasileira?

YM – Eu acredito que as minhas produções, como eu já falei um pouco anteriormente, são produções de inquietação. São meus gritos, ali colocados em imagem e nem sempre são minhas as vozes, mas sempre são os meus gritos. São reflexões que eu chamo de castelo, no popular, sendo colocadas como filme. Acreditando que aquilo vai tocar em alguém e que alguém talvez consiga tocar em outro alguém, e consiga tocar em outro alguém, e consiga tocar em outro alguém. É a minha expectativa quando eu faço filme. Meus filmes são importantes, porque eles são filmes que falam de gente de verdade. São filmes que falam sobre temas da vida real. E são filmes que falam de uma parte da gente da favela, que muitas vezes ninguém quer saber, porque não é muito interessante não ver a gente só se fodendo. Ver a gente cantando. Ver a gente dançando. Mas também ver a gente

provocando e dizendo que tá puto porque a galera tá fazendo as coisas erradas. É ver a gente reclamando, mas ver a gente múltiplo, mas que meus filmes são importantes porque eles são gritos coletivos, sobre diversos temas. São sorrisos coletivos sobre diversos temas. São provocações e metáforas, que têm a minha individualidade, mas que sempre tem alguém favelado que diz “Ei, Yane, que castelo do carai, eu também castelava sobre isso!” Então é sobre se identificar ou não. Então é “não é sobre se identificar ou não”. É sobre se sentir provocado ou não.

Unicaphoto – Como você gostaria de ser lembrada no futuro como cineasta negra e periférica? Primeiro que eu gostaria de ser reconhecida no presente, né? Essa história de que a gente é semente só depois que a gente morre… Eu acho que isso é um pacto que a branquitude inventou e que eu não quero pra mim, nem pras minhas. Quero ser reconhecida no futuro, quero ter possibilidade de fazer mais filme, quero ter possibilidade de fazer filme com recurso, pra eu pagar todo mundo do jeito que tem que ser. E poder aumentar as minhas possibilidades de ferramentas criativas, porque eu tenho muita vontade, mas com pouco recurso não dá pra gente fazer tanta coisa do jeito que a gente quer, né. Eu quero conseguir a partir do meu trabalho de articulação trazer pra região, trazer pra Pernambuco um olhar nacional para que as pessoas valorizem. Valorizem as pessoas que tão aí, eu não sei há quanto tempo, mas valorizem as pessoas que têm a sua filmografia invisibilizada. Então não é como eu gostaria de ser lembrada. Eu vou ser lembrada como alguém que produz os seus filmes e de maneira periférica, sabe. Eu quero ser valorizada pela minha intelectualidade, pela minha técnica e pelo meu olhar político. E como eu, várias pessoas precisam ser também. Mas já que eu to falando de mim – é uma dificuldade que tenho responder perguntas de cunho mais individual, mas é um exercício que eu quero fazer, principalmente neste ano. Eu quero ser valorizada em vida. Não quero ser Carolina Maria de Jesus, que tem seus diários sendo transcritos e traduzidos aí, depois que a mulé foi simbora, sabe? Quero homenagem em vida, fazer muito filme, ver muita gente feliz a partir de tá comigo na equipe, a partir de tá assistindo aos meus filmes. Quero ver muitos jovens também conseguindo dizer que quer ser cineasta, e quero ser lembrada por um trabalho de impacto.

Dizer que eu fiz e faço uma revolução pernambucana a partir do direito à cidade e a partir do direito da produção de cultura.

65 64

os mortos no espelho dos vivos

Rua do Pombal, 1821. CEP 50100170. Este é o endereço e código postal do Cemitério Público do Bom Jesus da Redenção.

Talvez o nome ainda possa soar estranho ao recifense. Mas os livros de História dão mais informações: “Cemitério do Bom Jesus da Redenção de Santo Amaro das Salinas”. Ou simplesmente Cemitério de Santo Amaro, no Recife, como é conhecido pela maioria. Sua inauguração se deu em 1851, diante do pânico e da mortandade causados pela epidemia de febre amarela, entre1849 e 1850. Quando as autoridades sanitárias decretaram o fim da Covid-19 como uma emergência de saúde pública, a fotógrafa e coordenadora do curso de Fotografia da Unicap, Renata Victor, Gabriel Costa, GG Silva, Letícia Alves, Paulo André Pedrosa e Ruan Pablo, estudantes de fotografia, visitaram Santo Amaro.

E prepararam este ensaio para acompanhar a belíssima colaboração de Antonio Motta, referência na antropologia cultural brasileira, especialmente sobre certa “sociologia” da morte e dos cemitérios brasileiros oitocentistas. O excerto é parte do seu À flor da pedra: formas tumulares e processos sociais nos cemitérios brasileiros, publicado pela Editora Massangana, em 2008.

Mesmo que se trate de evento individual, a morte impõe-se como fato social, a produzir repercussões sobre diferentes dimensões da vida humana. que a maioria dos grupos sociais não consegue referir-se a si mesmos, tampouco existir em sociedade, senão através das representações de sua própria unidade e continuidade, por meio de um passado comum elaborado tanto pela ajuda da memória individual quanto coletiva.

Quando fraturado ou confrontado com a extrema ruptura que o grupo, cada um à sua maneira, busca integrar tal fenômeno ao seu universo de representações mentais e de práticas institucionais, o que confere à morte um sentido singular em relação ao que cada povo ou cultura adota como sua própria concepção de vida. Entretanto, se existe uma enorme diversidade em relação às formas rituais (danças, banquetes, cultos, cerimônias) e aos costumes mortuários (enterramento, mumificação, cremação, exposição do cadáver ao ar livre, imersão em água, canibalismo, etc.), há também elementos que os aproximam: a morte é percebida na maioria das sociedades como a manifestação de uma desordem.  Com efeito, foi Robert Hertz um dos primeiros a chamar a atenção para a importância da morte como acontecimento social no qual o grupo ou sociedade costuma inscrever sua própria identidade. Ao estudar práticas de enterramento em uma sociedade tradicional, os Daiaque, na ilha de Bornéu, Hertz buscou mostrar como o tratamento dado ao corpo do morto adquiria um significado simbólico importante para a comunidade, então relacionado à representação do destino da alma. A primeira parte do ritual post mortem nessa comunidade assegurava ao morto uma espécie de “residência temporária” enquanto se concluía a dissolução completa do cadáver e ao grupo, a possibilidade de realizar o luto. Para isso, o corpo do morto era colocado sobre uma plataforma, no interior de uma cabana elevada e isolada, ou envolvido na casca de uma árvore e colocado sobre os seus galhos, enquanto a carne se decompunha e o cadáver se reduzia apenas à ossatura. Durante esse período, os mais achegados ao morto tornavam-se vulneráveis, pois acreditava-se que o espírito do falecido vagueava entre os vivos. Consumada essa fase, ocorria o “segundo enterro”, ocasião os ossos eram recolhidos e sepultados, seguido de um grande banquete, quando existiam recursos econômicos suficientes para realizá-lo, sendo compartilhado pelos enlutados e membros da comunidade, o que efetivamente marcava a incorporação do espírito do morto no mundo dos ancestrais. restituindo a autoridade e a temporalidade ao grupo envolvido1 .

Na literatura etnológica não faltam referências à morte, aos rituais e aos papéis funerários como elementos organizadores e integradores da vida social.

artigo
Antonio Motta
Foto: Renata Victor
67 66
Foto: Renata Victor 69

Também alguns exemplos mostram que a oposição ou divisão primária entre vivos e mortos depende do ponto de vista que cada cultura concebe e elabora suas próprias categorias classificatórias, seus laços de parentesco, suas representações escatológicas e suas formas de apreensão do mundo2

A morte não é apenas algo negativo e destrutivo, mas algo criativo à medida que oferece condições para ritualizar e reatualizar o sistema simbólico que mobiliza e estrutura determinados grupos. Ao estudar as práticas de enterramento dos Merina, em Madagascar, Maurice Bloch e Jonathan Parry identificaram nos funerais deste grupo – já que se trata de uma sociedade baseada em modelos tradicionais de autoridade – que a revitalização dos elementos simbólicos e valorativos era realmente o que mais interessava, ou seja, aquilo que, em última instância, dava sentido e significado à reprodução da ordem social existente no grupo, levando-os a concluir que “aonde não há necessidade de criar uma autoridade transcendental, os mortos podem ser deixados em paz”,3

Nas sociedades ocidentais, as que de fato nos interessam aqui analisar, embora cessando suas relações jurídicas como pessoas, os mortos, na maioria dos casos, continuam a deixar marcas indeléveis sobre os mais próximos, sejam elas motivadas por crenças religiosas, por razões afetivas ou orientadas por outros elementos reguladores da vida social. Talvez, por isso mesmo, mais importante é se levar em consideração as formas, as atitudes e significados que os vivos costumam exprimir em relação aos mortos, atribuindo um sentido particular à sua falta. Trata-se, pois, de elementos reveladores do comportamento humano, importantes marcadores socioculturais que podem ajudar a entender diferentes lógicas que regulam as ações e os significados que cada indivíduo estabelece com o seu próprio grupo e com o corpo social mais amplo.

Mas, no mundo dos vivos, os mortos passam a ter vida a partir do trabalho contínuo de memória e recordação de indivíduos achegados ou do grupo social ao qual o morto pertenceu. É por isso que os ritos permitem tanto exorcizar a morte de alguém quanto presentificar esse alguém na memória dos vivos. Geralmente definidos como atos sociais performativos, os ritos post mortem correspondem geralmente a uma necessidade social e emotiva de interiorizar a perda de um membro da comunidade, à medida em que reconfortam, reintegram, revitalizam indivíduos e o grupo social ao qual o morto pertenceu. Todavia, são rituais realizados pelos vivos e para os vivos, chegando

a propiciar momentos de intensa sociabilidade, na maioria das vezes capazes de restaurar e fortalecer liames familiares, congregar e reaproximar membros de outras gerações, reunir indivíduos pertencentes a diferentes grupos.

A depender de operadores classificatórios, próprios a cada sociedade, os ritos também cumprem cuidadosamente a função de isolar os mortos no seu próprio mundo ou de torná-los separados do convívio mais próximo. Afinal, na maioria das sociedades ocidentais, sobretudo aquelas que cultivam a oposição entre vivos e mortos, costuma-se dizer que um morto não bem enterrado ou uma morte não bem consumada volta sempre a atormentar e terrificar a mente de quem vive4. Daí a importância exercida pelos ritos na elaboração do luto, não importando suas formas de expressão, na medida em que essas restauram e reafirmam a ordem social existente, pois, em última instância, são os ritos que “’fazem’ os bons mortos”5 .

Como já assinalou Hertz, uma das eficácias da ação ritual é a de localizar e identificar um espaço próprio para a ocultação do cadáver, posto que a demarcação de fronteiras impede, no plano simbólico, a irrupção do morto no mundo da vida, ou ainda, como sugere, na mesma linha de raciocínio, Louis-Vincent Thomas: “os vivos não estão completamente do lado da vida enquanto o morto não estiver completamente do lado da morte”6 .

Portanto, a ruptura máxima que a morte instaura se deve ao fato dela produzir um cadáver, não somente símbolo de ausência ou de falta absoluta, como também marca concreta de dissolução do corpo: decomposição, apodrecimento, asco e horror.7 Provavelmente, nesses elementos reside o caráter fantasmático e “contagioso” que um corpo é capaz de transmitir na iminência de se decompor. Por isso mesmo a necessidade premente de sua ocultação, já que a maioria das sociedades não pode prescindir de rituais de pureza e de impureza, que funcionam como importantes mecanismos autorreguladores da vida social: vida/ morte; forma/ não-forma; ordem/desordem, sagrado/profano, etc.8

De certo modo, cadáver e impureza constituem faces de uma mesma moeda, criando a necessidade de ocultar o processo de decomposição da carne, dissimulado, pelo menos na cultura ocidental, através da construção de um túmulo, hermeticamente fechado, que possa materializar e perpetuar a lembrança da pessoa morta, que no plano imagético atua como mecanismo de revivescência do defunto, conforme projeções e fantasias de seus familiares.  Neste sentido, os cemitérios ocidentais, especialmente aqueles construídos no século XIX, cumpriram

de forma exemplar tal desígnio, desempenhando uma espécie de eficácia simbólica da conservação, materializada na monumentalidade arquitetônica de seus jazigos individualizados, em torno dos quais se desenvolveram práticas, cultos e produções de natureza simbólica diversa. Em última instância, seria esta a função precípua de representação que os vivos esperam de um túmulo ou monumento funerário, isto é, o de “produzir esse estranho efeito de comunicação sugerindo a permanência corporal do defunto”.9

Tem toda razão Jean-Didier Urbain quando chama a atenção para a ruptura que se instaura entre os sistemas de enterramento precedentes e aquele predominante no século XIX, com o advento dos primeiros cemitérios secularizados, nos quais se consolidaria a ideia de conservação em túmulos, e de forma individualizada, dos restos mortais de segmentos mais abastados da sociedade europeia e, posteriormente, de outros povos ocidentais.10 Melhor do que qualquer outro espaço, os cemitérios oitocentistas refletiram a visão de mundo que cada sociedade possuía tanto em relação à vida quanto em relação à morte. Isto porque tais espaços foram capazes de reproduzir diferentes aspectos da

vida social, através de suas formas de organizar e de classificar os indivíduos (filiação, linhagem, transmissão, estratificação, etc.), passando pelas representações de mundo e práticas correlatas (mitos, ritos, cosmologias, religiões, tabus, interditos, ritos de passagem, etc.), até à noção de pessoa e seus valores (idade, ciclos vitais, corpo, sofrimento, honra, prestígio, etc.). Enfim, a morte e, sobretudo, o destino que se dá ao corpo de um morto são capazes de gerar dinâmicas e representações socioculturais diversas sobre as quais se apoiam e regulam grupos e atividades humanas.

Além da preservação da memória individual e familiar dos mortos, os cemitérios oitocentistas, com suas sepulturas individualizadas, cumpriram também importante papel na estratificação social: individualização, hierarquia, distinção, transmissão, filiação, genealogia, etc. Ao se desvincularem do mundo sobrenatural e das ordens religiosas, esses espaços, pouco a pouco, começaram a ganhar um ambíguo estatuto laico em que determinadas camadas urbanas, a maioria delas abastadas e ascendentes, puderam registrar suas particularidades de gosto, e ao mesmo tempo de classe, através da aquisição e propriedade de jazigos especiais para acolher os seus membros.11

1

Embora lugar-comum na literatura especializada, não convém contudo deixar de considerar o quanto foi importante e significativo, no século XIX, o impacto causado pela extinção das sepulturas ad sanctos, ou seja, a perda de domínio da Igreja sobre os sepultamentos e os rituais fúnebres e, com ela, o controle sobre a morte e os mortos no Ocidente – evento que transformava o cemitério numa nova instituição social e cultural.12

Tal como são reconhecidos ainda hoje, os cemitérios europeus constituem, em certa medida, uma invenção recente, que data apenas da primeira metade do século XIX, quando o sepultamento deixou de ser uma prática exclusiva das confrarias e irmandades, no interior das igrejas católicas, e se deslocou para os novos espaços secularizados, projetados e construídos nas periferias das cidades, ocasionando o que Philippe Ariès chamou de “les morts en exil”. Esse fato, não é novidade, acarretaria mudanças profundas nas atitudes diante da morte, o que veio a provocar uma verdadeira mutação da sensibilidade coletiva face ao destino dos defuntos.  Primeiro porque a morte, a partir de então, ficaria subordinada ao controle do poder público, isto é, da racionalidade administrativa do Estado, rompendo

71 70
Foto: Letícia Alves

com os elos escatológicos precedentes, que tinham no princípio da inumação dos corpos, no interior das igrejas, uma de suas garantias simbólicas, a da salvação e ressurreição dos mortos. Dito de outra maneira: quanto mais os enterramentos fossem realizados próximos ao altar ou das relíquias dos Santos, mais a alma de alguém estaria apta a ser recompensada na vida extraterrena. Inversamente proporcional, os que não podiam pagar para ter tal privilégio, viam-se obrigados a negociar outros espaços, situados nas galerias laterais das igrejas, nos corredores, nos adros e até mesmo no entorno das igrejas, no chamado churchyard, conhecidas como sepulturas ad ecclesiam.  Segundo, porque instaurava de fato uma ruptura radical em relação “à coexistência dos vivos e dos mortos”, anteriormente marcada pela proximidade física e espiritual de ambos.13 Isto significa dizer que quanto mais os enterramentos eram realizados no centro das cidades, no interior e entorno das igrejas, mais próximos estavam também a morte e seus ritos do centro da vida, integrados à comunidade, a regular o sistema simbólico e a organização social do grupo. Quanto mais afastados das cidades, mais se distanciavam os mortos do convívio doméstico, sendo banidos completamente do cotidiano das famílias e, por isso, o luto deixava de ser expressão de sentimentos coletivos para se converter em uma experiência individual, sendo compartido unicamente pelos membros da família, o que, de certo modo, tendia a minimizar a importância do morto na esfera pública.14

Também o fato de se estabelecer uma rígida demarcação entre metropolis e necropolis concorreu para que houvesse maior disseminação da crença no poder da ciência sobre a morte. O resultado desse processo, que contava a seu favor com a urbanização e modernização crescentes das cidades, era notado de forma mais visível nas reações que os vivos puderam expressar diante de seu inexorável destino, particularmente, já no final do século XVIII.  É também verdade que na Europa já vinha de muitos anos uma preocupação com a higiene pública, ameaçada pelos enterramentos nas igrejas, como de resto, nas abadias, nos mosteiros, nos conventos, nos colégios e outros espaços em que se mesclavam cadáveres e gente.15 Entretanto, foi somente a partir do corolário iluminista, baseado na laicização e secularização da vida social, somado ao progresso da medicina, que a crítica aos enterramentos ad sanctos e ad ecclesiam atingiu seu ponto culminante. Por toda parte se faziam ouvir clamores contra os perigos das emanações pútridas advindas dos locais

de sepultamento – reação negativa influenciada pela difusão da doutrina dos miasmas nauseabundos considerados como maléficos à saúde humana. Uma nova “vigilância olfativa”, por sua vez, se fazia também presente em alguns dos principais centros urbanos europeus, notadamente em Paris, o que tornava intolerante para a maioria de seus cidadãos qualquer tipo de odor que remetesse à putrefação cadavérica, que exalava das fossas comuns, locais destinados às inumações coletivas de corpos, sobretudo dos chamados segmentos “desprestigiados” da população na época.16 Convém lembrar que essa modalidade de enterramento surgiu durante as epidemias que assolaram o continente europeu na Idade Média, fixando-se enquanto prática, pelo menos, até o final do século XVIII e, em alguns casos, nos primeiros decênios do XIX.17

Além disso, eram as fossas ou valas comuns os locais mais temidos pelas populações pobres ou classes laboriosas das cidades. Deste modo. não

surpreende que o fantasma da morte biológica, em seu último estágio, aumentasse ainda mais o pavor individual diante da irremediável situação de alguém se ver jogado num verdadeiro poço, obrigado a compartilhar a decomposição de seu próprio corpo com o do anônimo vizinho, igualmente em processo de putrefação. Ao fim e ao cabo, tudo isso resultava na profusão de substâncias líquidas, emaranhados de ossos humanos em meio aos quais se perdiam completamente os vestígios do morto e, como tais, os traços de sua pretensa identidade.  O efeito mais imediato desse processo de transformação urbana foi posto em prática no ano de 1786, em Paris, com a demolição do Cemitério dos Inocentes (Cimetière des Saints-Innocents), encravado bem no coração da cidade, com suas catacumbas amontoadas de ossos e, sobretudo, suas valas repletas de cadáveres que, segundo alguns relatos da época, costumavam odorar o ar da redondeza com seus vapores pútridos.18 Todavia, como observa Ariès, sua destruição aconteceu sob a mais profunda indiferença da população. Atitude, aliás, que já prenunciava o que, de certo modo, deveria ocorrer alguns decênios mais tarde, de forma muito mais radical, com a construção de novos espaços secularizados de enterramento e também a recepção calorosa e otimista da população em relação a eles, dos quais o Père-Lachaise se tornaria exemplo paradigmático na França.  Associado à ideologia da salubridade, que foi determinante na gestão administrativa da morte pelo Estado, estava também presente todo um conjunto de motivações e de práticas coletivas, que já vinha sendo fomentado algum tempo atrás e cuja ambição maior era materializar o desejo póstumo de muitos: a construção de túmulos diferenciados. Sendo assim, a repulsa pelo sepultamento anônimo, cuja versão mais aviltante era a inumação coletiva nas valas, não tardou a lograr adeptos nas camadas populares urbanas do século XIX, especialmente com a criação, na Inglaterra, do chamado mutualismo ou sociedades funerárias (burial clubs) que reivindicavam para si uma condição mais digna na hora da morte, já que a desigualdade em vida inevitavelmente se reproduzia, e talvez de forma ainda mais flagrante, no espaço

póstumo.19 Diante disso, segmentos da classe laboriosa inglesa organizaram-se, através de sociedades especiais, com o intuito de capitalizar recursos para o enterramento com direito à sepultura individualizada e ritual compatível com aquilo que, em vida, puderam economizar para gastar com um enterro mais digno.  De qualquer modo, fosse entre as camadas mais desfavorecidas da população ou entre as elites prósperas da época, a ênfase fundamental sobre os enterramentos, na maioria das vezes, estava posta no desejo de individualização do corpo. É o que se fazia notar com os novos padrões de conduta urbanos e, com eles, uma diferenciada sensibilidade face à morte, transformando os cemitérios não somente em lugar de conservação dos vestígios do morto, mas, sobretudo, em lugar de culto, cuja visita e recordação constituíam as sequências mais importantes do novo ritual urbano. Evidentemente, tal fenômeno tinha suas raízes no processo de secularização, o qual não se deve interpretar em oposição direta à Igreja, tampouco à religião católica, mas a uma tendência ou movimento de desclericalização da sociedade burguesa.20 Daí a plasticidade com que a própria Igreja foi capaz

Foto: GG Silva
73 72
Foto: Renata Victor Foto: Gabriel Costa
75 74
Foto: Renata Victor
Foto: Renata Victor Foto: Renata Victor Foto: Paulo André Pedrosa 77

de se moldar a esse rito. Vale acrescentar, todavia, que um século antes ela detinha o controle da morte e de seus próprios rituais – embora desacreditasse a importância do corpo e do túmulo em favor do dogma teológico da vida eterna –; enquanto que em menos de um século depois, soube rapidamente aderir e capitalizar, de maneira muito positiva, o novo culto dos mortos, que se faria de forma individualizada, em torno do fetichismo dos túmulos, coisa que ela própria tanto havia criticado anteriormente. Ademais, o novo culto dos túmulos ou “religião cívica” tivera sua origem no positivismo de Comte, exprimindo-se, sobretudo, através da visita cemiterial e da prática de recordação dos mortos que, em última instância, pretendia religar os vivos às gerações desaparecidas, sendo orientado pelo ideal de filiação, de continuidade e, fundamentalmente, de historicidade.21

2

A essa altura não parecia haver muita dúvida quanto ao grau de afeição que os novos espaços de enterramento conseguiram despertar nos mais diversos setores da população. A glorificação do cemitério, enquanto espaço de culto, estava associada ao papel cívico que este passou a desempenhar, assumindo, como qualquer outra instituição do Estado, a função de manutenção e continuidade da vida social. Além do que também representava uma espécie de extensão ou até mesmo parte intrínseca da cidade que, segundo o ideário positivista, deveria assegurar e manter a solidariedade dos vivos e dos mortos.22 Para se ter uma ideia da força e penetração dessa nova mentalidade urbana, basta lembrar a indignação e protesto da burguesia parisiense quando o Barão Haussmann, por volta de 1864, resolveu levar adiante seu ambicioso projeto de urbanização, desta vez incluindo a remoção dos principais cemitérios (PèreLachaise, Montmartre e Montparnasse) para fora da cidade, com a perspectiva de vir a transformá-los em um único grande espaço de enterramento: o de Méry-sur-Oise, na região de Pontoise. Isto porque a centralidade dos principais cemitérios parisienses dificultava o plano de expansão da malha urbana que o Barão tanto buscava concretizar, obrigando-o inclusive a invocar o argumento higienista da época anterior. Registre-se que antes havia ele tido o cuidado de expulsar a chamada classe laboriosa, considerada como classe dangereuse, do centro de Paris, transferindo-a para a periferia sob o pretexto de demolir parte da cidade medieval.23 Impiedosamente, agora seria a vez dos mortos, novamente deportados ou expulsos para fora da cidade, já que os cemitérios, como no século

78
Foto: Renata Victor
Foto: Ruan Pablo Foto: Renata Victor 80

anterior, tinham se integrado rapidamente à paisagem urbana que àquela altura havia atingido alto valor aquisitivo.

O mais importante, todavia, foi a reação da população, especialmente das elites intelectuais e políticas, o que incontestavelmente era prova do quanto o espaço cemiterial havia adquirido importância na sociedade civil francesa, como de resto na sociedade europeia. Um verdadeiro bombardeio de críticas se fez ecoar de todos os lados. Dos católicos fervorosos aos positivistas mais ferrenhos, como era o caso do professor de matemática Pierre Laffite, e do médico Jean François Eugène Robinet, o Dr. Robinet, a quem se atribui a autoria da sentença: “pas de cimetière, pas de cité”. Afinal, era a ciência que dava o veredicto, provando desta vez que não havia risco nenhum na presença dos cemitérios no entorno urbano e que os pavorosos miasmas, denunciados e temidos um século antes, não passavam de equívocos ou superstições que já não mais se coadunavam com o espírito da vida moderna, tampouco com o progresso na era da ciência positivista, como sentenciava o Dr. Robinet: “O Teatro da Ópera só por si fornece, por ano, 13 vezes mais ácido carbônico do todos os cemitérios juntos.”

Assim, em 1865, o projeto de Haussmann fora definitivamente deixado de lado, ano em que o PèreLachaise já contava com 17.000 mausoléus.

Desde então, intensificar-se-iam ainda mais o culto e a veneração aos túmulos, fixando-se no calendário oficial o dia dois de novembro como o Dia de Finados, que geralmente se confundia com o de Todos os Santos.

Já no início do século XX, durante a celebração de Finados, em 1902, o número de visitantes nos cemitérios parisienses chegou a 350.000, o equivalente, à época, a mais de 10% de população da cidade.

A cada ano, esse número de visitantes aumentava e, proporcionalmente, os túmulos. A eles eram conferidos cuidados especiais, sendo-lhes acrescidos elementos alegóricos que costumavam evocar a pessoa do morto, seja através de peças escultóricas, seja através de medalhões com fotografia em sépia, acompanhados em geral de epitáfio ou simples epigrafia onomástica. Grande parte dos jazigos era construída para abrigar no seu interior verdadeira árvore genealógica, cuja

raiz era encabeçada por um antepassado fundador. É o que se nota na forma de construção de alguns deles: no Père-Lachaise, no Cemitério de Montparnasse, em Gênova, no Monumental de Milão, no Vecchio, em Nápoles, no Central de Viena, no Cemitério Central de Estocolmo.

Para esses casos, a morfologia mais recorrente tornouse conhecida como capela funerária, uma espécie de réplica em miniatura de capela ou de construção monumental do passado, chamando a atenção pelo ecletismo de suas formas e estilos: pirâmides egípcias, templos gregos, castelos, palácios renascentistas, templos neogóticos, neoclássicos, etc.  Vale a pena assinalar que nos países de tradição cristã os túmulos repetiram basicamente três tipologias: o túmulo epitáfio, o túmulo horizontal e o túmulo vertical. O primeiro, o mais antigo, consiste em pequena abertura recoberta de placa em pedra sobre a qual se apresenta o epitáfio. Provavelmente, tem origem nos lóculos onde eram depositados os ossos do defunto após a sua transferência da primeira sepultura provisória, sendo muito comum na época dos enterramentos nas igrejas. Já o horizontal, comumente denominado campa-rasa, possui a dimensão do corpo humano, é recoberto por laje de pedra em toda a sua extensão, conhecendo variações diversas ao longo do tempo. Finalmente, o vertical apresenta uma morfologia mais rica e complexa, tendo como uma de suas principais características a monumentalidade, recebendo interpretações diversificadas, como por exemplo, a morfologia de capela, de mausoléu, de monumento, etc.

As edificações tumulares, antes de tudo, eram para ser vistas, admiradas e reverenciadas por todos.

Ao se distanciar de outros segmentos médios da população, que tinham nas necropolis das periferias urbanas o seu lugar de enterramento, a burguesia afortunada da segunda metade do século XIX cultuou entre si o desejo de distinção e de individualização em espaços de sepultamento altamente segregativos, o que de praxe também se repetia em suas vivendas das cidades. Assim deveria se pautar a lógica dos espaços cemiteriais e a construção dos túmulos, que começaram a se povoar de figuras: estátuas, fotografias e outros signos alusivos aos que ali eram sepultados.

Foto:
83 82
Renata Victor

1 Sobre o assunto ver HERTZ, R. « Contribution à une étude sur la représentation collective de la mort », in Sociologie religieuse et folklore (1928), Paris, PUF, 1970, p. 45.

2 Ver LEVI-STRAUSS, C. “Les vivants et les morts”, In Tristes Tropiques, Paris, Plon, 1955, p. 259-277. Ver também CUNHA, M. C da. Os Mortos e os Outros: uma análise do sistema funerário e da noção de pessoa entre os índios Krahó. São Paulo, Hucitec, 1978.

3 O foco de análise de Bloch e Parry incide sobre os rituais de fertilidade. Nos funerais dos Merina, de Madagáscar, a autoridade é atribuida aos mais velhos e do sexo masculino, ocasião em que são reatualizados e reforçados alguns valores do grupo [....] 4 [....] Evidentemente não se pode reduzir a diversidade e riqueza das culturas funerárias a práticas ocidentalizadas, nos modes aqui descritos de separação primária entre vivos e mortos. Há de fato uma enorme variedade de ritos mortuários, sobretudo entre populações indígenas tradicionais, que não correspondem à conhecida oposição vivos/mortos. A título de exemplo, basta lembrar que os Tupi tinham como costume funerário o enterramento de seus mortos dentro da própria cabana, no mesmo lugar em que armavam suas redes para dormir. Já os Bororo tinham como prática o enterro duplo, nos moldes do que descreve Hertz. Os Krahó, também praticavam a inumação secundária, isto é, algum tempo depois retiravam os ossos, lavava-os, pintava-os de urucu e realizavam um outro enterramento. Por outro lado, os Ianomami costumavam fazer uma pasta de banana, misturando-a com as cinzas do morto, para em seguida deglutí-la. No que concerne aos Krahó ver: CUNHA, M. C da. Os Mortos e os Outros Op. Cit.. CLASTRES, P. Ver também SEBAG, L. “Cannibalisme et mort chez les Guayakis”, in Revista do Museu Paulista, nº s. XIV, pp.174-181.

5 A expressão “les rites “font” les bons morts” é utilizada de FABRE, D. «Le retour des morts», in Études Rurales, nº 105-106, janvier-juin, 1987, p. 19.

6 Ver TOMAS, L-V. Le cadáver. Paris, Payot, 1982, p.11. O referido autor é um dos precursores na França sobre a abordagem sócio-antropológica contemporânea da morte, com uma obra bastante diversificada sobre o tema, destacando-se como referência o livro: (1975) Anthropologie de la mort,

Paris, Payot, 1980.

7 Ver URBAIN, J-D. La Société de Conservation. Étude sémiologique des cemitières d’Occident. Paris, Payot, 1978.

8 Sobre crenças e práticas rituais de pureza e impureza nas sociedades ocidentais e não ocidentais ver DOUGLAS, M. Purity and Danger. An Analysis of Concepts of Pollution and Taboo. London, Routledge et Kegan Paul, 1966.

9 URBAIN, J-D. L’archipel des morts. Le sentiment de la mort et les dérives de la mémoire dans les cimetières d’Occident. Paris, Payot, 1998, p. 175

10 Ver URBAIN, J-D. La Société de Conservation. Étude sémiologique des cemitières d’Occident, Ob. Cit.

11 É interessante consultar o trabalho de CATROGA, F. O céu da memória. Cemitério romântico e culto cívico dos mortos em Portugal (1756-1911), Coimbra, Minerva, 1999. O trabalho do historiador português apresenta um quadro bastante interessante e completo do que ele chama de “revolução romântica dos cemitérios” em Portugal, fenômeno que se repete na maioria dos cemitérios europeus da época.

12 A morte é um tema que vem merecendo a atenção de pesquisadores das mais diversas sensibilidades. A ênfase é quase sempre posta sobre os sistemas de morte nas sociedades ocidentais, a partir de uma perspectiva de longa duração. É este o caminho seguido pela historiografia francesa, notadamente, por alguns de seus mais conhecidos especialistas, considerados referências no assunto: ARIÈS, Ph. Essais sur l’histoire de la mort em Occident. Paris, Seuil, 1975; VOVELLE, M. La mort et l’Occident de 1330 à nous jours. Paris, Gallimard, 1988.

13 [....] Sobre os mecanismos de controle da Igreja sobre as atitudes diante da morte, bem como a separação entre Igreja e Estado consultar ARIÈS, Ph. Essais sur l’histoire de la mort en Occident. Du moyen age a nos jours. Paris, Seuil, 1975. Ver também, do mesmo autor Images de l’homme devant la mort. Paris, Seuil, 1983.

14 Ver ARIÈS, Ph. Images de l’homme devant la mort, Ob. Cit.

15 Sobre o assunto ver CHAUNU, P. La mort à Paris: 16e, 17e, 18e siècles. Paris, Fayard, 1978.

16 Sobre os vapores mefíticos no interior das igrejas e a emergência de uma mentalidade higienista, ver os estudos de: CORBAIN, A. Le Miasme

et la Jonquille. L’odorat et l’imaginaire social 18e-19e siècles. Paris, Aubier Montaigne, 1982; VIGARELLO, G. Le Propre et le Sale. L’hygiène du corps depuis le Moyen Age, Paris, Seuil, 1985.

17 É interessante consultar

MCMANNERS, J. Death and Enlightenment. Changing Attitudes to Death among Christian and Unbelievrs in Eithteenth-century France Oxford, Oxford University Press, 1981.

18 Como relatam alguns historiadores, o principal episódio que levou ao seu fechamento, em 1780, assim como a sua demolição, em 1786, foi o rompimento de uma de suas fossas comuns, liberando odores pútridos que produziram pânico na vizinhança, já que este lugar de enterramento se encontrava bem no coração de Paris, praticamente vizinho ao velho mercado de Halles, zona muito densa de construções. Sobre o assunto, é interessante consultar ARIÈS, Ph. Essais sur l’histoire de la mort en Occident, Op. cit.; CHAUNU, P. La mort à Paris, Op. cit.

19 Sobre o assunto ver os seguintes trabalhos: GITTINGS, C. Death burial and the individual in early modern England London, Routledge, 1984; WILSON, A. e LERY, H. Burial Reform and Funeral Cost, London, Oxford University Press, 1938, LITTEN, J. The English Way of Death: The common Funeral since 1450, London, Robert Hale Ltd., 1991; MORLEY, J. Death Heaven and Victorians London, Studio Vista, 1971; GITTINGS, G. Death, Burial and Individual in Early Modern England. London, Routledge, 1988.

20 “N’a-t-on pas trop longtemps appelé christianisme un mélange de pratiques et de doctrines qui n’avaient parfois qu’on lointain rapport avec le message évangélique et, s’il en est ainsi, doit-on encore parler de “déchristianisation”

”.Ver DELUMEAU, J. Le Catholicisme entre Luther et Voltaire Paris, Press Universitaires de France, Coll. Nouvelle Clio, 1971, p. 330. 21 Ver COMTE, A. Cours de philosophie positive. Paris, Anthropos, 1969; Système de politique positive. Paris, Anthropos, 1969.

22 Em 1874, observava Pierre Laffitte: “La tombe développe le sentiment de la continuité dans la famille, et le cimetière dans la cité et dans l’humanité”. Ver LAFFITE, P. Considérations géneral à propos des cimetières de Paris, Paris, 1874, p.8.

23 Sobre o episódio é interessante consultar o clássico estudo de CHEVALIER, L. Classes laborieuses et classes dangereuses Paris, Pluriel, 1978.

Notas
85 84
Foto: Renata Victor

o gênio saiu da garrafa

Nesta imagem que você vê, os surfistas não são reais. Nem o mar, Nem as ondas. Na verdade, esse local não existe.

Tudo nesta imagem é falso, Foi gerado por inteligência Artificial, pixel a pixel, e é o resultado de combinações de infinitas fotografias pré-existentes, fruto de milhões de imagens que as pessoas carregaram na internet por dezenas de anos.

Esta imagem, uma falsa fotografia, ganhou importante prêmio na Austrália. Ela foi gerada por uma ferramenta de Inteligência Artificial, similar às mais usadas, como a DALL-E, Midjourney e Stable Diffusion, embora os criadores não confessassem

qual ferramenta utilizaram para gerar a imagem.

O grande avanço da tecnologia das IAs tem assustado o campo das artes, como a fotografia.

Nesse caso, a imagem gerada pela empresa Absolutely AI, instituição por detrás do feito, é representa um mar revolto onde surtistas desafiam o infinito e a natureza.

O resultado visual é impactante.

Tanto foi assim que os jurados da DigiDirect, promotora do concurso, se deram por satisfeitos.

Acreditaram que a “fotografia” teria sido feita a partir de um drone e lhe deram primeiro lugar no concurso, na categoria

“Verão”, inscrita sob o pseudônimo de Jan van Eyck, nome de importante artista europeu do século 15. Segundo a empresa, a ideia não era quebrar as regras, mas estabelecer alguma polêmica: “Demonstrar como devemos nos preparar para o ‘Novo Mundo’, com as inteligências artificiais, com imagens paradas ou em movimento, cada vez mais realistas. Diante do resultado, os “vencedores” devolveram o prêmio: 100 dólares australianos. Mas ficaram com a fama de terem produzido a primeira imagem gerada por Inteligência Artificial a ganhar um concurso de fotografia.

capa
87 86

No mundo da fotografia, a tecnologia está desempenhando um papel cada vez maior, com a inteligência artificial (IA) liderando o caminho em muitas áreas. Recentemente, uma fotografia vencedora de um concurso chamou a atenção do mundo da arte e tecnologia, pois foi criada inteiramente por uma IA.

A fotografia, intitulada “The electrician”, foi gerada por uma rede neural alimentada com milhares de imagens. A IA criou a imagem com base em algoritmos que analisaram e combinaram diferentes características das imagens fornecidas, culminando nesse resultado, duas mulheres, em tons sépia, onde se destacam faixas de luz, como “fotografia espirituais” do início do século XX. Apesar de ter sido escolhido como vencedor, Eldagsen optou por recusar o prêmio.

A fotografia, vencedora do Sony World Photography Awards, da World Photography Organization, foi inscrita pelo

artista alemão Boris Eldagsen, e gerou uma série de críticas e debates no mundo da fotografia. Embora tenha sido amplamente elogiada por alguns, muitos críticos de fotografia levantaram questões sobre sua qualidade artística e mensagem.

A premiação à foto falsa abriu debates sobre o uso na fotografia — sobretudo para fenômenos chamados deepfakes, imagens que são muito realistas e de difícil detecção de sua origem. A estudiosa Susan Sontag, famosa por seu ensaio “Sobre a Fotografia”, argumentava que a fotografia deve ser analisada por sua capacidade de capturar a realidade. Na sua opinião, a fotografia deve refletir a verdade e oferecer uma perspectiva objetiva da real. Sontag talvez questionasse se “The Electrician” cumpre esse critério. Outro crítico notável, Roland Barthes, em seu ensaio “A Câmara Clara”, argumentou que uma fotografia é uma “pequena morte”, um momento congelado no tempo que nunca poderá ser reproduzido. Ele enfatizou a importância de como uma imagem evoca emoções e sentimentos em quem a vê. No entanto, alguns críticos de fotografia questionaram se “The Electrician” atinge esse objetivo, argumentando que a imagem não parece transmitir uma mensagem clara ou emocionante.

Críticos que enfatizam a importância da composição e da forma na fotografia, argumentam que a qualidade de uma imagem não é determinada apenas pelo assunto, mas também pela forma como ele é retratado.

E questionaram se “The Electrician” atinge esse objetivo, argumentando que a imagem parece desorganizada e não tem uma composição forte.

Acredite se quiser.

No final do século 19, surgia, na Inglaterra, o Círculo Espiritual de Crewe, sociedade secreta que se dedicava ao estudo de fotografias ‘espirituais’. Durante as primeiras décadas do século 20, coordenado pelo fotógrafo William Hope, o Círculo de Crewe produziu grande variedade de fotos onde humanos de carne e osso se confundiam com entidades espirituais. “The eletrician” parece suscitar essas fotografias.

89 88
Venceu e não levou. “The electrician”, o imagem vencedora do Sony World Photography Awards, da World Photography Organization.

Théâtre d’Opéra Spatial. Nesta página, a imagem criada por Jason M. Allen usando a plataforma generativa de Inteligência Artificial Midjourney. A pintura se tornou notícia quando ganhou a competição anual de belas artes da Feira Estadual do Colorado em 5 de setembro de 2022, tornando-se uma das primeiras imagens geradas por IA a ganhar tal prêmio. Artistas acusaram Allen de trapacear. “Não vou me desculpar por isso. Ganhei sem quebrar nenhuma regra”, disse ele.

Machina eMnemósine. Na sequência, fotos da série projeto Pseudomnesia, de Boris Eldagsen: na página seguinte, “Love” (“Amor”); nas páginas 96 e 97, “The Breath” (“A Respiração”), “The Mask” (“A Máscara”) e “The Illusion” (“A Ilusão”). Na página 99, “ The Torso” (“O Torso”) e “The Veil” (“O Véu”).

93 92

Apesar disso, outros críticos elogiaram “The Electrician” por sua capacidade de capturar um momento no tempo e por sua qualidade técnica. Eles destacaram a iluminação e a nitidez da imagem, bem como a forma como os perosnagens são retratados em sua atividade diária.

Independentemente das opiniões divergentes, é inegável que a imagem gerou um debate acalourado e destacou a importância contínua da fotografia como uma forma de arte e meio de comunicação. No mundo da fotografia, a tecnologia está desempenhando um papel cada vez maior, com a inteligência artificial (IA) liderando o caminho em muitas áreas. Recentemente, uma fotografia vencedora de um concurso chamou a atenção do mundo da arte e tecnologia, pois foi criada inteiramente por uma IA.

A criação da fotografia vencedora é um marco importante na história da fotografia, pois prova que a IA pode ser usada para criar arte em um nível semelhante ao humano. Além disso, essa fotografia destaca a interseção entre tecnologia e arte e questiona a definição tradicional de arte.

Embora a ideia de uma IA criando arte possa parecer intimidante para alguns, é importante reconhecer que a tecnologia não está substituindo a criatividade humana, mas sim ajudando-a a evoluir. A IA pode ser usada para criar imagens incrivelmente complexas e originais que os seres humanos podem não ser capazes de produzir sozinhos.

Além disso, a IA pode ser

usada para resolver problemas criativos em diferentes campos, desde a engenharia até a medicina. A capacidade da IA de analisar grandes quantidades de dados e encontrar padrões é uma ferramenta valiosa para a resolução de problemas complexos.

No entanto, é importante reconhecer que a IA não é uma panaceia para todos os problemas criativos.

A criatividade humana ainda é necessária para avaliar e interpretar as criações da IA e dar-lhes significado. A tecnologia não pode substituir a visão e o julgamento humanos, mas pode ser usada como uma ferramenta para aprimorar e desenvolver a criatividade humana. No futuro, podemos esperar ver mais e mais exemplos de IA sendo usada na arte e na fotografia, à medida que a tecnologia se desenvolve ainda mais. Será interessante ver como os artistas e fotógrafos incorporam a IA em seu trabalho e como a tecnologia continua a evoluir.

Por fim, a fotografia vencedora do concurso criada pela IA é um marco importante na história da arte e da tecnologia. Ela destaca a capacidade da IA de criar arte em um nível semelhante ao humano. Embora a IA possa ser usada como uma ferramenta para a resolução de problemas criativos, ainda é necessário o julgamento humano para avaliar e interpretar as criações da IA. À medida que a tecnologia continua a se desenvolver, podemos esperar ver mais exemplos de IA sendo usada na arte e na fotografia, à medida que os artistas incorporam a tecnologia em seu trabalho e aprimoram sua criatividade.

95 94

Nem Deus nem o Diabo: a inteligência está nos detalhes.

Talvez alguns dedos a mais, ou um “um jeito de corpo”, nem tudo é glorioso no reino das imagens geradas por IA.

O canal no Discord mostra resultados duvidosos (ou pavorosos), chamado failed-diffusions, produzidos pelo Stable Diffusion ferramenta de geração de imagens.

Algumas delas foram compartilhadas pelo tecnólogo americano Andy Baio, e viralizaram nas redes. (Nesta página, imagens: Discord/Divulgação)

a falsa memória de Boris Eldagsen

O projeto Pseudomnesia, criado pelo artista alemão Boris Eldagsen, autor, dentre outras obras, da imagem “The eletrician”, vencedora do do Sony World Photography Awards, é uma instalação artística que desafia a nossa percepção da realidade. O projeto é composto por uma série de fotografias manipuladas digitalmente, que criam cenas surreais e oníricas, aparentemente retiradas de nossos sonhos mais profundos. No entanto, essas cenas não são criações imaginárias de Eldagsen, mas sim baseadas em eventos e locais reais, que o artista visitou e fotografou em suas viagens pelo mundo. O nome do projeto, Pseudomnesia é uma referência à condição psicológica conhecida como falsa memória, na qual uma pessoa se lembra de eventos que nunca ocorreram. Essa condição é muitas vezes associada a traumas emocionais, e é comumente relatada por vítimas de abuso infantil. No entanto, no caso de Eldagsen, a falsa memória é deliberadamente criada, como parte de uma exploração artística da natureza da percepção e da realidade. Para criar as imagens em Pseudomnesia, Eldagsen usa uma técnica de manipulação digital que envolve a

98

sobreposição de várias camadas de fotografias em uma única imagem final. Essas camadas podem incluir fotografias de paisagens naturais, edifícios, objetos e até mesmo pessoas, que são combinadas para criar uma imagem única que parece extrairse de um sonho.

No entanto, apesar da aparência surreal das imagens em Pseudomnesia, Eldagsen enfatiza que todas elas são baseadas em eventos e locais reais.

“Eu viajo muito e gosto de explorar lugares que tenham um certo mistério ou atmosfera sobrenatural”, diz o artista.

“Depois, quando começo a trabalhar em uma nova imagem, tento criar algo que capture essa atmosfera, mas que também pareça possível, como se pudesse ter realmente acontecido”. A manipulação digital das imagens em Pseudomnesia é realizada com um cuidado meticuloso, a fim de garantir que as cenas pareçam naturais e plausíveis, apesar de seu conteúdo surreal. Eldagsen também presta muita atenção

à iluminação e às sombras nas imagens, a fim de criar uma sensação de profundidade e textura.

“Acho que a iluminação é uma das coisas mais importantes na fotografia”, diz ele. “Se você pode criar a iluminação certa, você pode fazer qualquer coisa parecer real”.

Embora as imagens em Pseudomnesia sejam impressionantes em sua qualidade e complexidade, elas também são altamente evocativas, sugerindo histórias e narrativas que não são explícitas na imagem em si.

Talvez seja esse um dos pontos criticados no seu trabalho: a falta de objetividade ou “excesso de imaginação”.

Eldagsen gosta de deixar essas histórias abertas à interpretação do espectador, permitindo que cada pessoa crie sua própria narrativa a partir das imagens.

“Eu acho que é importante deixar um pouco de espaço para a imaginação das pessoas”, diz ele.

“Eu não quero contar a história toda, eu quero que as pessoas criem sua própria história”.

Boris Eldagsen é um artista visual alemão.Suas obras, que exploram temas como a identidade, a tecnologia e a natureza humana, têm sido exibidas em galerias e museus ao redor do mundo.

Nascido em 1970, em Bonn, Eldagsen estudou fotografia na Universidade de Artes e Design de Karlsruhe e mais tarde fez mestrado em fotografia e imagem em movimento, na Academia de Arte e Design de Bergen, na Noruega. O trabalho de Eldagsen é marcado por uma forte influência do cinema e da literatura, criando imagens que desafiam as convenções estéticas e narrativas. Entre suas obras mais conhecidas está a série “Bilderbuch”, que combina fotografia e ilustração em um formato de livro de histórias. Outro destaque é a instalação “The Feast of Trimalchio” exibida no CAC de Adelaide, na Austrália, em 2018. Boris Eldagsen tem sido reconhecido por sua contribuição à arte contemporânea. Seu trabalho continua a desafiar espectadores em todo o mundo.

Nota do editor: Todos os textos desta seção foram gerados por uma inteligência artificial, o ChatGpt, chatbot online desenvolvido pela OpenAI.

Foto: Thomas Gerwers
101 100

lado oculto

ensaio fotográfico
Clarice Melo
103 102
105 104
107 106

nos tempos do hipercinema

Unicaphoto procurou o pesquisador Paulo Souza para comentar sobre essa tal ”hipermodernidade”, entre outros neologismos como “hipercinema”. Os termos estão na sua tese Cinematografia digital: da arte do índice à arte da síntese, que acaba de ser aprovada, e recomendada à publicação pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito à obtenção do título de doutor em Comunicação. No centro do estudo, a direção de fotografia na era digital ou o que singulariza essa cinematografia. Nesta entrevista, Souza comenta alguns pontos da pesquisa, na construção, segundo ele, de novos tempos, novos paradigmas, no surgimento de uma “arte da geração de imagens sintéticas”.

Unicaphoto – Há um termo recorrente no seu trabalho, ou um universo de onde você parte: a hipermodernidade. Você pode conceituar esse termo e como ele é útil para entendermos as transformações culturais, sobretudo da fotografia no cinema?

Paulo Souza –

A hipermodernidade é um termo que descreve uma fase ou estágio avançado da sociedade contemporânea, caracterizada por mudanças rápidas e profundas em várias esferas da vida. É uma extensão do conceito de modernidade, mas com ênfase nas transformações aceleradas e intensificadas pela influência das tecnologias digitais, da globalização e da sociedade de consumo.

(Altas) luzes, câmeras, ação. Em busca do controle absoluto. Filmagem do longa Hardcore: Missão Extrema (Hardcore Henry, Ilya Naishuller,2015) Atores-dublês filmam com duas GoPro’s montadas lado a lado, para facilitar a captura de imagens com ajustes de exposição diferentes para cada um dos dispositivos.

Fonte: Imagens de divulgação da STX Entertainment

Na hipermodernidade, a tecnologia desempenha um papel central na vida cotidiana, permeando todos os aspectos da sociedade, desde as interações sociais até as instituições governamentais e econômicas. A Internet e as redes sociais tornaram-se ferramentas essenciais de comunicação e informação, permitindo a conexão instantânea e global entre pessoas e culturas.

Além disso, a hipermodernidade é marcada pela aceleração do tempo e da velocidade das mudanças. As pessoas estão constantemente

Foto:Arquivo pessoal/Divulgação 109 108 entrevista

“Brutalmente real”. Cena do longa “Tangerina” (“Tangerine”, Sean Baker, 2015). o filme recebeu alguns prêmios pelas singularidades de sua fotografia. A obra, fotografada por Sean Baker e Radium Cheung, utilizou um Apple iPhone 5S com um adaptador anamórfico da Moondog Labs acoplado na lente do aparelho para a filmagem.

“Devido à leveza do celular e de suas lentes seria impossível evitar uma grande trepidação nas situações de câmera na mão, o que poderia aproximar o longa dos milhares de vídeos amadores gravados diariamente com telefones portáteis – uma estética que não interessava à dupla de fotógrafos”. Souza cita Maria Marina Cavalcanti Tedesco, quanto à portabilidade e mobilidade em produções de audiovisual, no que toca à direção de fotografia na era digital, ponto de partida do seu estudo.

expostas a um fluxo contínuo de informações e estímulos, o que leva a uma sensação de urgência e pressão para acompanhar o ritmo acelerado da sociedade.

Na esfera cultural, a hipermodernidade é caracterizada pela fragmentação e pela diversidade de estilos e expressões. Não há um único padrão dominante, mas sim uma multiplicidade de gostos, opiniões e identidades. As fronteiras entre alta cultura e cultura popular tornam-se borradas, e novas formas de expressão artística e cultural emergem constantemente. No entanto, é importante destacar que o conceito de hipermodernidade é objeto de debate entre estudiosos e teóricos sociais. Alguns críticos argumentam que a hipermodernidade é apenas uma continuação da modernidade, enquanto outros a veem como uma ruptura significativa com os paradigmas anteriores. A interpretação e definição da

hipermodernidade podem variar dependendo do contexto e das perspectivas teóricas adotadas.

Unicaphoto – Que parâmetros marcam as rupturas, intensificações e transformações da direção de fotografia na hipermodernidade?

PS –A quebra da hegemonia dos meios de produção é uma marca importante. Antes, a produção audiovisual estava centrada nos grandes estúdios de cinema ou redes de televisão. Com o digital e o consequente barateamento das tecnologias, a centralidade da produção está agora nas mãos dos usuários, os chamados prosumidores. Em volume, produz-se muito mais para redes sociais do que já foi produzido em toda a história do cinema. Um segundo ponto a ser destacado é a consolidação de uma sociedade de tecnovigilância, inundada por máquinas de ver, armazenar e analisar imagens. A inteligência algorítmica é uma

marca da contemporaneidade. Esses dispositivos de vigilância, como câmeras, drones, celulares, dispositivos vestíveis, entre outros, são fortemente incorporados ao rol de equipamentos fotográficos do hipercinema. Por último, destacaria uma caminhada rumo ao virtual, um escape de nosso universo natural em busca de fotografar dentro das redes digitais, dos aplicativos de comunicação, de relacionamento, utilizando a internet como locus de um novo cinema, com novos códigos. Além disso, vemos a consolidação do cinema digital, a criação de universos inteiramente gerados por computador, dando vazão à imaginação humana com uma qualidade fotorrealista antes não alcançável.

Unicaphoto – No ponto de vista tecnológico, o que caracteriza (ou singulariza) a cinematografia digital, hoje? Se pode falar de um estilo, nessa dimensão, atualmente?

PS – Em geral, penso na adoção de dispositivos antes inexistentes ou dedicados a outros usos. A tradicional câmera cinematográfica é apenas mais um dos dispositivos de filmar. Como a produção de imagem está disseminada na sociedade, isso transparece e se integra aos filmes. No entanto, não vejo a cinematografia digital como um estilo, mas sim como um fenômeno cultural e tecnológico. As implicações estilísticas são derivadas desse fenômeno e, claro, existem. Maneirismos do cinegrafista doméstico são muito mais comumente utilizados, como movimentos irregulares de câmera, perdas de foco e zooms abruptos, surgindo agora para naturalizar a imagem cinematográfica digital e compatibilizar seu uso com o contexto dos personagens. Podemos falar em um novo estilo também quando pensamos nas ações desenvolvidas em um universo fílmico que habita as redes. Hoje, podemos ver um casal flertar sem o tradicional plano e contraplano de troca de olhares, mas sim com hesitações na digitação de um texto no WhatsApp e troca de emojis. Essa nova gramática audiovisual certamente compreende um novo corpo estilístico que vem sendo explorado.

Unicaphoto – A tecnologia oferece impactos, certamente nessa produção. Mas que outros fenômenos terminaram por mudar nossa forma de produzir

(e consumir) imagens, de toda ordem?

PS – Acredito que o fenômeno formal, tecnológico ou de linguagem não se dissocia do contexto social e cultural em que acontece, transformando-o e sendo por ele transformado. A condição hipermoderna, de uma sociedade acelerada, individualista, com desejos de participação, personalização e necessidade de intensificação do prazer, acaba por refletir na busca de estratégias por parte da instância criativa. Os estúdios de cinema percebem a mudança social, o sucesso de indústrias vizinhas, como a dos games, nas quais há muito mais interação e engajamento por parte do jogador/consumidor. A partir daí, naturalmente, criamse filmes espetáculo, cadeiras que vibram, tecnologias imersivas, lançamentos megalomaníacos, roteiros com premissas de interatividade projetada, entre outras tentativas de atualizar o imaginário do consumo de cinema.

Unicaphoto – Vivemos, portanto, o fim da era “romântica” do cinema? Podemos falar, hoje, de um cinema novo, um hipercinema, a partir de tantas mudanças?

Se sim, como se deu essa transformação? E que mudanças mais experimentaremos nesse hiperconsumo de imagem? PS – Não acredito em mortes do cinema, mas sim em ciclos que se alteram e tensionam

111 110

demandas distintas a cada tempo. No cinema comercial, nos blockbusters, há uma tendência ao consumo acelerado, à intensificação e ao espetáculo. No entanto, o cinema não se resume apenas a isso, felizmente. No cinema de horror, por exemplo, observamos um fenômeno interessante: filmes mais densos, com menos sustos gratuitos, explorando o medo atmosférico em detrimento da geração anterior, em que a aceleração e o caos na ação levavam o espectador ao limite. Outra tendência importante que tenho observado é a dos filmes que buscam trabalhar com a questão sensorial, um cinema háptico, no qual as sensações e percepções não cognitivas ganham protagonismo. Aqui, vemos filmes mais contemplativos, nos quais a experiência do tempo é mais comumente explorada por meio de planos longos, movimentos solenes de câmera e o estabelecimento de vínculos afetivos com a audiência que nada têm a ver com tecnologia ou fragmentações.

Unicaphoto – O cinema, você menciona em seu trabalho, sempre dialogou com o amadorismo. Você cita experiência onde a tecnologia, no passado, entrou em casa, como foi o cado do Superoito. E, hoje, com tanta tecnologia, tanta “democracia de acesso”, como drones, e Dashcams, para ficar nesses mais simples, onde se pode fazer cinema sem tantos recursos (e sempre com consideráveis facilidades técnicas oferecidas smartphones e aplicativos etc) a tendência

é que esse amadorismo vire a regra na produção de imagem ou que todos nós viremos hipercineastas? O que acabou e o que começou, afinal?

PS – Uma das principais características do cinema amador na era digital é a capacidade de criação e distribuição de conteúdo por qualquer pessoa com acesso aos recursos tecnológicos necessários. Isso permite que indivíduos expressem sua criatividade, contem histórias pessoais e compartilhem suas visões com um público potencialmente amplo.

A facilidade de uso dos dispositivos digitais e o acesso a softwares de edição de vídeo também contribuem para o crescimento desse fenômeno. As pessoas podem capturar, editar e aprimorar seus vídeos de maneira relativamente simples, sem a necessidade de conhecimentos técnicos avançados. Além disso, a capacidade de compartilhar esses vídeos nas plataformas de mídia social permite que os cineastas amadores alcancem audiências maiores e interajam com elas. Assim como nos ciclos do super oito, cinema direto ou nos novos cinemas, a produção com dispositivos mais portáteis e com fluxo de produção e distribuição não hegemônicos sempre coexistiu com as produções mais formais e estruturadas. O que há de novo no contemporâneo é a naturalidade com a qual as grandes indústrias passam a incorporar linguagem e tecnologia, antes amadoras, aos seus grandes filmes.

Unicaphoto – Neste número, Unicaphoto discute um pouco não a fotografia digital, mas as imagens geradas por Inteligência Artificial? Qual sua visão sobre o tema, levando em conta suas pesquisas?

PS – Nos últimos anos, com o avanço da inteligência artificial e do aprendizado de máquina, tem havido desenvolvimentos significativos na geração de imagens por meio de algoritmos. Por exemplo, as redes neurais generativas adversariais (GANs, do inglês Generative Adversarial Networks) têm sido usadas para gerar imagens realistas, que parecem ter sido criadas por seres humanos.

As GANs consistem em dois componentes principais: o gerador e o discriminador. O gerador produz amostras a partir de ruído aleatório ou de um conjunto de dados existente, enquanto o discriminador avalia se as imagens geradas são verdadeiras ou falsas. Esses dois componentes são treinados simultaneamente em um processo de competição, o que permite ao gerador aprimorar sua habilidade de gerar imagens mais realistas ao longo do tempo. Embora os resultados tenham melhorado significativamente, ainda existem desafios a serem superados para alcançar um nível de perfeição e criatividade

equiparável ao do ser humano.

A geração de imagens envolve muitos aspectos complexos, como compreensão de contexto, emoção, estilo e interpretação visual, que são habilidades intrinsecamente humanas.

Estamos na pré-história das imagens geradas por Inteligência Artificial, mas é impressionante – e assustador –imaginar seu potencial.

A ideia de uma máquina capaz de se auto avaliar e melhorar o resultado de seu próprio processamento é impressionante.

Estamos frente a diversos novos dilemas éticos no campo da imagem e discussões urgentes precisam ser travadas.

Os sons ao redor.

Na sua tese, Paulo Souza registra certa familiaridade visual entre movimentos de cinema independente, como a Nouvelle Vague como influências indiretas para o nascimento de novos “estilos” (o entre aspas são nossos, porque talvez o autor não concorde com o termo). Entre as novas tendências está o mumblecore. A palavra vem de mumble, algo “como murmúrio, fala ininteligível, e está diretamente associada a má qualidade sonora de muitos dos filmes do ciclo”. A criação do termo se atribui ao editor de som, da equipe de Andrew Bujalski.

Na cena ao lado, Sara (SeungMin Lee) e Alan (Justin Rice) estão procurando algo em “Mutual Appreciation”, (“Admiração Mútua”, no Brasil), 2005, escrito e dirigido pelo estadunidense Andrew Bujalski, considerado o “pai do momblecore”, um dos diretores, entre vários, abordados na pesquisa de Paulo Souza.

113 112

frágil

ensaio
Nivaldo Carvalho
115 114

Um filho recém-nascido, uma cidade nova.

Três corpos tendo que deixar um espaço e ocupar outro.

Uma casa inteira sendo embalada pra gente carregar. Corpos, coisas e caixas a casa uma grande caixa com coisas a serem manuseadas com cuidado.

A luz, o movimento, a passagem, a transição: como se chegou até aqui?

No fim, somos nós que nos reorganizamos no próprio corpo, frágil.

117 116
119 118
123 122

fotojornalismo

não, não é fotojornalismo

Toda foto é política. Não existem imagens ou olhares ingênuos. Existem a imagem histórica, o contexto e o olhar do período.

O debate que tomou conta das redes sociais a respeito da imagem (não a defino fotografia de propósito) de Gabriela Biló, publicada na capa do jornal Folha de S.Paulo já estava há muito tempo para explodir. A imagem de Gabriela Biló não é a primeira e nem será a última a criar polêmicas. Com isso dito, é importante ressaltar que discordamos frontalmente do ataque que a fotógrafa vem sofrendo nas redes sociais. Este tipo de ofensa é inaceitável, assim como a violência demonstrada. Devemos refletir, no entanto, sobre o que poderia ter criado tanto impacto na imagem divulgada: o papel do fotojornalismo e sua função na criação de leituras de histórias tem sido deixado de lado. Nenhuma imagem é unívoca ou tem apenas uma interpretação, mas a decodificação de seus códigos depende do momento sóciohistórico vivido.

Se é verdade que o fotojornalismo ou as fotografias jornalísticas foram desde sempre manipuladas (poderíamos ter uma lista de fotografias que falsificaram a história) e que a fotomontagem foi muito usada por artistas e publicadas em revistas, também é verdade que nem tudo que é publicado na mídia é fotojornalismo. Além disso, estas imagens – sem inocentá-las – estavam dentro de um tempo histórico e de uma circulação restrita e não escancaradas e circulantes pelas redes sociais. O fotojornalismo por mais expressivo que possa ser tem suas normativas, uma delas é a da noticiabilidade, assim como regras éticas que constam da maioria dos manuais de redação – se é que alguém os lê. No fotojornalismo contemporâneo – que se inicia no final dos anos 1990 e é muitas vezes apoiado por editores de fotografia (quando existiam) – esta busca pela “expressividade criativa” foi muitas vezes estimulada como uma nova forma de linguagem; não era. A partir daí essa vertente “criativa” foi se potencializando com a única função de criar discussões e não debates.

Em que momento sócio-histórico se dá a publicação da referida imagem? O de uma eleição conturbada e da tentativa de golpe acontecida no dia 8 de janeiro, além

do recrudescimento das fakes news do sentimento de sermos enganados e vilipendiados pelas notícias ou pela falta delas. Ou seja, não há momento mais inadequado. Já em 2017 “fake news” foi eleita a palavra do ano pelos dicionários internacionais e desde lá se tornou vocábulo comum em todas as conversas.

Em contrapartida, nos últimos anos (que coincidem com a pandemia) o fotojornalismo ressurgiu em seu papel fundamental em tentar restabelecer a ordem dos acontecimentos. Por outro lado, encontramos toda uma “geração TikTok” que usa a imagem sem conhecê-la e que de forma paradoxal não consegue interpretá-la, logo a vive de forma literal. É aí que a imagem se torna perigosa.

A estranheza da imagem de Biló está também na legenda que procura explicar – não se sabe para quem – múltipla exposição. Conceitos vazios para a maioria das pessoas. Não se trata aqui de usar técnicas, mas se trata aqui de encaminhar o pensamento para algo que de fato não existiu. Manipular uma fotografia não é usar editores de imagem, é alterar seu sentido. A escolha criativa se dá na gramática que você utiliza para apresentar um fato e não na sua distorção. Todo jornalista – e, sim, o fotojornalista é antes de mais nada um jornalista e não um artista –é sim responsável por aquilo que torna público e não pode se isentar afirmando que cada um interpreta como quer. Não. Existe uma credibilidade intrínseca em quem procura determinada mídia para se informar. Quando o jornalista se torna personagem da própria notícia que está buscando, se inserindo por meio de vídeos, selfies e gracejos, transformando tudo em memes – que não é humor, mas alienação – estamos caminhando por um terreno um tanto perigoso. Espanta a estética das redes sociais que se impõe de forma leviana sobre todas as áreas do conhecimento sem a devida reflexão. Falar que jornalismo se tornou entretenimento já está ultrapassado numa sociedade que trata tudo como espetáculo. Esta discussão foi muito falada pela tão citada Susan Sontag, que cria uma divisão entre estético e político, e pela escola francesa pós-estruturalista, que desdenha a fotografia documental, jornalística, a ideia de autoria. Aliás a ideia de autoria ou do reconhecimento do autor pressupõe uma responsabilização. Como afirma a pesquisadora Ariella Azoulay: “A criação ou a imaginação não são o oposto do político”. Existe sim, uma intencionalidade política na imagem divulgada pela Folha de S.Paulo junto a um texto que leva a uma leitura da imagem.

A partir da publicação da foto do presidente Luiz Inácio

Lula da Silva, a doutora, jornalista e crítica de fotografia

Simonetta Persichetti tece uma reflexão sobre a imagem, o fotojornalismo e suas políticas.

Matéria originalmente publicada na revista Arte!Brasileiros, em 20/01/2023.

Foi triste o momento da publicação desta imagem, mas quem sabe desta polêmica não possa nascer um bom debate e reflexão de como estamos construindo nossa história a partir do jornalismo e que retornemos a respeitar a verdade factual dos acontecimentos.

125 124 Foto: Gabriela Biló/ Folhapress
aconteceu 127 126

com 5 estrelas pelo Guia Quero/ Estadão

08/11 – Visita técnica à Rede Globo

Os(as) alunos(as) do segundo módulo da graduação fizeram uma visita técnica aos estúdios da Rede Globo, guiada pelo supervisor de cinegrafia da empresa: Antônio Henrique.

um livro. Niedja Dias cuidou da produção fotográfica, junto com a professora Carla Teixeira, do curso de Jornalismo.

AGOSTO

29/08 - Aula inaugural da 2ª turma do MBA Cultura Visual Participação da professora Marina Feldhues

SETEMBRO

01/09 - Encerramento da aula de História e Estética da Fotografia e do Audiovisual

Disciplina ministrada pela professora Jualianna Torezani e pelo professor Álvaro Brito.

Um passeio de Catamarã

Passeio fotográfico pelo rio Capibaribe, em parceria com a empresa do Catamarã.

Turma do segundo módulo da graduação.

02/09 – Visita à Fundaj

Turma do quarto módulo da graduação. Disciplina de Captura de Vídeo e Edição, ministrada pelo professor Filipe Falcão. Na ocasião assistiram ao filme: “Maria: Ninguém Sabe a Minha História”, que conta a vida de Maria Bethânia.

09/09 – Convidado Felipe

André Silva

Turma de graduação. Felipe

André Silva é cineasta, escritor e curador, ele falou sobre como fazer cinema com baixo orçamento, experiências com direção e set de filmagem, trabalho com atores, desenvolvimento de estéticas audiovisuais e muito mais.

20/09 – Palestra sobre cultura visual Com a pesquisadora Alice Martins, falou sobre “Estudos

da Cultura Visual: uma breve cartografia”.

24/09 – Manhã Fotográfica com as Crianças da Biblioteca

Caranguejo Tabaiares

Dia de vivência com crianças da biblioteca Caranguejo Tabaiares, vendo um pouco do analógico e digital, com apoio dos alunos do segundo módulo da graduação.

OUTUBRO

01/10 a 13/10 - Exposição fotográfica no Convento de São Francisco

Parceria do curso de fotografia da Unicap com o convento de São Francisco, em Olinda.

A mostra é composta por produções de professores e alunos do segundo módulo, intitulada “Nosso Olhar Sobre o Convento”.

03/10 – Prêmio Pernambucano de Fotografia 2021

O evento elegeu 15 fotógrafos para serem premiados e dentre eles, o nosso ex-aluno Rafael Cândido.

Ex-aluna Paloma Aquino recebe prêmio internacional

Premiada no concurso

Outstanding Maternity Award

06/10 – Alunos da

Especialização recebem a visita de João Vieira Júnior

O professor Marcelo Pedroso, da disciplina “Processos Criativos e Gestão de Projetos em Fotografia” recebeu o produtor cinematográfico e sócio da Carnaval Filmes, que falou de sua experiência de montagem dos seus longas-metragens, internacionalmente conhecidos e demais produções.

17 a 21/10 - Exposição fotográfica “Por trás da Lona”

O ex-aluno Arnaldo Sete, teve a sua mostra inaugurada na Biblioteca Central da Unicap.

18/10 – Alunos de fotografia à exposição “Por trás da lona”

Alunos do segundo módulo da graduação visitaram a exposição e tiveram uma conversa com o próprio autor sobre seu processo criativo.

20/10 – Feira de Profissões 2022

O curso de Fotografia e demais graduações participaram de ação intitulada “Feira de Profissões”, no colégio Santa Maria. Com o intuito de engajar os alunos, a coordenadora Renata Victor, com apoio da aluna Letícia Lima e do aluno Pedro Augusto, leva estúdio

fotográfico para registro dos estudantes.

NOVEMBRO

04/11 – Avaliação Cinco Estrelas

O Curso de Fotografia foi avaliado

09 a 11/11 – FotoVídeo Décima primeira edição do evento que se tornou referência no calendário do curso de Fotografia. Três dias de imersão ao universo fotográfico e audiovisual, com oficinas, com temas diversos, palestras e mostras de vídeos, abertas ao público.

18/11 – Convidada Ana Yoneda

A ex-aluna da pósgraduação, Ana Yoneda foi convidada para uma conversa com os alunos do segundo módulo, sobre arte conceitual, vídeo performance, processos criativos e as relações entre fotografia e audiovisual.

28/11 – Convidada Milena Travassos

Presença da artista visual, pesquisadora e professora Milena Travassos, para uma conversa sobre as ações do projeto “RelâmpagoTrovão”. A ideia foi pensar sobre a linguagem de forma expandida (linguagem dos homens e linguagem em geral, W. Benjamin).

29/11 – Manhã de fotos com as crianças do Procriu Grupo composto por 36 meninos e meninas do Projeto Minha Vida na Comunidade, do Centro de Revitalização e Valorização da Vida, conhecido como Procriu, visitaram o nosso estúdio fotográfico, para uma tarde de registros. As crianças criaram textos e ilustrações publicados em

30/11 – Exposição Interdisciplinar 2022.2 Graduação de Fotografia inaugura, no hall da Biblioteca Central Unicap, exposição composta por trabalhos desenvolvidos ao longo do semestre: Iluminação, As Artes e as Novas Tecnologias, Linguagem Fotográfica I, Semiótica da Fotografia e a disciplina introdutória, incluindo, também, as disciplinas dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda. A mostra teve exibição até o final de fevereiro de 2023.

30/11 – Oficina de Pinhole com alunos do Liceu Os alunos do colégio Liceu de Artes e Ofícios, vivenciaram a experiência do princípio da fotografia analógica, com a professora Niedja Dias, através da técnica de Pinhole, que consiste em fotografar com latinhas.

DEZEMBRO

03/12 – Exposição Coletiva “Reflorestar”

Visita guiada pela Christal Galeria, com alunos do segundo e do quarto módulo da graduação.

14/12 – Resultado do 3º Concurso Fotográfico “Consciência Negra” Campeã do júri técnico: Franciele Isabel de Souza Campeão do júri popular: Ítalo Henrique Gomes Filho

14/12- Resultado do 2º Concurso Fotográfico SOS Oceanos

Campeão do júri técnico: Paulo Henrique Romão Dias Campeão do júri popular: Douglas Fagner Correia de

129 128

Almeida

20/12 – Confraternização à conclusão de mais uma turma de graduação

Na ocasião, professores, alunos e alunas da graduação, MBA, Especialização e equipe de trabalho, se uniram para confraternizar-se ao final de mais um semestre.

JANEIRO

18/01 – Especialização em retorno às aulas

A quinta turma da Especialização

“As Narrativas Contemporâneas da Fotografia e do Audiovisual”, teve sua primeira aula sobre Direção de Fotografia com o professor Paulo Souza.

FEVEREIRO

01/02 – Última aula do professor Paulo Souza

A turma da especialização “As Narrativas Contemporâneas da Fotografia e do Audiovisual” se despediu do Professor Paulo Souza, que ministrou a disciplina “Direção de Fotografia”. Como convidada, receberam Sylara Silvério, diretora de fotografia e assistente de câmera.

Paulo foi aluno do Curso Superior de Fotografia, e também já passou pela especialização, até lecionar para as turmas. Encerrando mais um ciclo, agora vai seguir sua carreira no Rio de Janeiro.

131 130

Priorizar atividades que coloquem o campus em contato com a sociedade.

Esta é uma das diretrizes do curso de fotografia da Unicap, além de estimular a prática de saberes e vivências diversas, compartilhadas.

Exposições, prêmios, visitas à instituições de pesquisa e órgãos de comunicação, consultas, atividades de formação continuada, serviços à comunidade, marcaram as ações do curso de fotografia da Unicap, de agosto de 2022 a fevereiro de 2023.

133 132

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.