arquitetura em processo: por uma abordagem possível

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ARQUITETURA EM PROCESSO por uma abordagem possível

Bianca Feijão de Meneses orientação de Daniel Ribeiro Cardoso coorientação de Bruno Melo Braga


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará Biblioteca Universitária Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

D32a

de Meneses, Bianca Feijão Arquitetura em processo: por uma abordagem possível / Bianca Feijão de Meneses. -2018 260 p. : il. color. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) - Universidade Federal do Ceará, Centro de Tecnologia, Curso de Arquitetura e Urbanismo, Fortaleza, 2018. Orientação: Prof. Dr. Daniel Ribeiro Cardoso. Coorientação: Prof. Me. Bruno Melo Braga. 1. habitação de interesse social. 2. processo. 3. flexibilidade. 4. assessoria técnica. I. Título CDD 720


Universidade Federal do Ceará Curso de Arquitetura e Urbanismo trabalho final de graduação

ARQUITETURA EM PROCESSO por uma abordagem possível

banca examinadora

prof. dr. Daniel Ribeiro Cardoso orientador - dau ufc

prof. me. Bruno Melo Braga coorientador - dau ufc

prof. dr. Carlos Alberto Batista Maciel professor convidado - ea ufmg

Bianca Feijão de Meneses fortaleza, dezembro de 2018


AGRADECIMENTOS neste constante processo de construção de ser quem sou, trago em mim um pouco das tantas pessoas com quem tenho a sorte de conviver, uma maneira de mantê-las sempre por perto. e neste processo que foi caminhada, agradeço a todos os que cruzaram meu caminho e, principalmente, aos que caminharam comigo: àquilo que não se pode ver ou tocar,

admiráveis. por acreditar nos recomeços

mas que se faz presente nos pequenos

e pela humildade de buscar ser melhor

detalhes, todos os dias. por ser, ao

em cada um deles: por me despertar a

mesmo tempo, motivo e apoio para

vontade de ser assim também.

acreditar e permanecer neste caminho. ao vinícius e à pietra, por nossas ao professor daniel, por aceitar seguir

diferenças e por todos os momentos

junto neste processo, mesmo quando

desafiadores

era tudo ainda incerto, e por todos os

proporciona. ao theo e à gabi, pela

sacrifícios para que isso fosse possível.

companhia silenciosa durante as tardes

por acreditar, às vezes mais do que eu

em casa.

que

a

rotina

nos

mesma, no que eu trago aqui. aos meus avós, pela leveza das pausas, ao bruno, exemplo pra mim desde

aqui e em qualquer lugar. pelo cuidado,

o

pela doação e pela generosidade.

primeiro

trabalho,

que

na

sua

tranquilidade me instiga a ser melhor sempre; por somar como coorientador.

ao tio júnior, por me fazer crer cada vez

ao carlos alberto maciel que aceitou, com

mais que o saber nada significa sem

tanta gentileza e prontidão, contribuir

a entrega ao outro, principalmente a

ainda mais neste processo ao compor a

quem mais precisa. ao tio neto, por ser

banca.

exemplo de entrega.

à minha mãe, por ser por mim mesmo

ao querido daniel, a quem o apreço

quando eu não sabia, e mesmo nas

vai tão além das palavras. por confiar

vezes em que eu não fui. por todas as

em mim e caminhar junto. por ser

certezas. ao meu pai, pela determinação

calmaria e amparo neste momento tão

e pela solicitude tão genuínas quanto

turbulento.


à brenda, à carol, à mai e à mari, por

às tantas trocas enriquecedoras que este

tornarem esta caminhada mais leve,

trabalho me possibilitou. à ocupação raízes

engraçada e doce. pela companhia nos

da praia, à dona rosa, ao seu assis, por serem

dias de aula, nas noites de trabalho e nos

fortaleza. à ocupação gregório bezerra, à

planos para o futuro.

rita, por serem persistência. aos moradores das ocupações que acreditaram em mim e

ao lehab e ao professor renato pequeno,

nas minhas ideias, e que aceitaram compor

por dar nome, rosto e voz a quem, por

esta

tantas vezes, tem sido silenciado. aos

possível a proposta aqui apresentada.

construção

conjunta,

tornando

laços feitos, por todos os momentos inspiradores e os cafés despretenciosos

às pessoas que transpassaram este

da cantina.

processo, por somarem e construírem este trabalho comigo: igor, do mcp;

aos vínculos construídos nestes últimos

jefferson, da unidade classista; andré,

anos, dentro e fora da universidade. à

felipe, renata e larissa, do sinduscon;

consultec, ao victor e à raíssa, primeiros

joão neto, da federação de bairros e

exemplos na busca por uma arquitetura

favelas; eduardo, da habitafor.

mais acessível. ao ricardo fernandes e à márcia cavalcante, por me receberem em

aos amigos que, principalmente na reta

seus escritórios. ao escritório donald insall

final, se fizeram presentes e dedicaram

e, principalmente, ao peter (in memoriam),

seu tempo para somar neste processo:

cujos gestos de gentileza ficarão para

bela, breno, font, macedo, maiara, raíssa,

sempre guardados comigo. às amizades

raquel e raviolo.

da certare, por compartilharem a rotina - e os seus aperreios, os almoços, as

às marcas de afeto que permeiam estas

brincadeiras e o jeito de falar. por tornarem

páginas e este trabalho: felicidade por

o dia a dia mais leve.

saber que não estou só.


partida

narrativas

transiçþes

10

17

68


novos processos

precedentes

partida

referĂŞncias

90

113

137

254

ordem de leitura proposta ordem percorrida


PARTIDA Este caderno nada mais é do que o

capaz de mudar - a desigualdade que

registro de um processo. Aqui, referir-

estampa casas e, se formos além, ruas,

se à arquitetura enquanto processo é

bairros, cidades.

reconhecer que há ponto de partida, mas não de chegada. É também inserir a

Esta inquietação tem sustentado uma

arquitetura - e seu fazer - num contínuo

busca constante por soluções, e é então

processo de mudança e aperfeiçoamento.

nas idas e vindas entre investigação e desenho, entre imersão e diálogo, que

10

Um olhar ligeiramente mais atento à

um cenário futuro passa a ser delineado,

cidade revela uma desigualdade latente,

menos desigual e mais justo. Esse cenário,

em momentos forçosamente silenciada e,

no entanto, pode parecer ainda muito

em outros, resistente a qualquer controle.

distante para o que vivemos hoje: surge

Deste olhar emergiu uma inquietação que

então a ideia de transição, onde se finca

pede respostas para a moradia, reflexo

o propósito primeiro deste processo, que

edificado desta disparidade. O desenrolar

não intenta uma produção arquitetônica

deste processo aponta uma questão que

completamente inovadora, mas que

me acompanha até aqui: de que maneira

enxerga, nas pequenas mudanças, uma

o fazer arquitetônico mantém - ou, sob

abordagem possível para direcionar-se

uma perspectiva mais esperançosa, é

ao cenário que se almeja.


11

figura 01. sobre desigualdades visíveis e diferentes apropriações do espaço: quadra santa cecília, classificada como assentamento precário em fortaleza (à esquerda) e relação com colégio santa cecília (à direita) acervo pessoal


PROCESSO A capacidade de mudar o porvir

A flexibilidade em arquitetura aparece

requer, antes de tudo, conhecer o hoje.

neste

Assim, a proposição é precedida por

reconhecer a matéria edificada não

uma investigação do nosso contexto

como um produto único, mas como uma

atual. A fim de entender a produção de

série de contribuições que a modificam

moradias, em um primeiro momento,

e dão vida, em constante transformação.

explora-se

quem

participa

momento,

uma

maneira

de

desta

produção, por diferentes narrativas,

Partindo de todas essas compreensões

relativas

e

ao

Estado,

ao

mercado

apoiado

no

estudo

de

alguns

imobiliário e à população. A temática da

precedentes, o ensaio deste novo

informalidade transpassa a abordagem

processo se dá em dois momentos: o

dos três agentes, levantando outros

primeiro em um projeto de um novo

questionamentos a respeito da produção

edifício,

arquitetônica: afinal, o que significa uma

norteadoras

boa moradia?

segundo em um edifício subutilizado,

que

traga desde

estas o

questões

princípio;

o

cuja adequação nos permite testar a

12

Aos poucos, a investigação sobre os

aplicabilidade do processo proposto a

agentes conduz à discussão sobre

contextos predefinidos.

como o arquiteto e urbanista se insere nestes processos, e do modo como se

A noção de processo em arquitetura

dá o fazer arquitetônico, na tentativa de

presente aqui reconhece que o edifício

desenvolver um olhar crítico a respeito

não chega a um produto final, pois

e caminhos para estruturar possíveis

isto seria reduzir seu potencial a um

transições.

recorte de tempo específico, alheio a imprevisibilidades - e possibilidades -

O embasamento teórico amadurece

futuras. A sua potência reside, portanto,

e

uma

na possibilidade de mudar, adequar-se

proposta para novos processos de

e aperfeiçoar-se ao longo do tempo e

produção arquitetônica, que busquem

das suas demandas. Portanto, não se

conciliar aspectos importantes destes

compreende partida, caminho e chegada;

agentes,

alimenta

a

elaboração

conforme

seus

de

potenciais,

as partidas não chegarão ao fim. Talvez

reinterpretando o papel do arquiteto

estas possibilitem novos caminhos, que

frente ao processo e resultando em

conduzirão a novas partidas, rumo ao

um sistema de corresponsabilidades.

cenário delineado.

quadro 01. sistematização das etapas, objetivos específicos e procedimentos metodológicos adotados no trabalho elaborado pela autora


OBJETIVOS Da curiosidade de explorar o potencial da

de um edifício novo e da adaptação

arquitetura como gerador de mudanças

do processo proposto em um edifício

sociais, busca-se elaborar um novo

existente.

precedentes

novos processos

transições

narrativas

processo da prática arquitetônica que abrace a sua não-linearidade, sem que

Assim como a proposta, o caminho

se sobreponha a outros processos e que

trilhado até aqui não foi linear. Para

seja permeável o suficiente para receber

torná-lo

contribuições externas, assumindo a

uma sistematização das suas etapas,

ausência de um estágio de produto final,

vinculando-as aos objetivos específicos

ou acabado. Este novo processo orienta

e aos procedimentos metodológicos

e culmina em dois ensaios, do projeto

adotados.

objetivos específicos

metodologia

explorar

produção

habitacional

claro,

entrevistas e visitas

mercado imobiliário e população, suas

coleta de dados

potencialidades e fraquezas

cartografia temática

aprofundar

a

inserção

do

fazer

arquitetônico nas produções estudadas

optou-se

por

levantamento bibliográfico

atual relativa à atuação de Estado,

13

levantamento bibliográfico coleta de dados estudos de caso

estruturar uma prática arquitetônica

levantamento bibliográfico

que busque conciliar as potencialidades

elaboração de um processo

dos diferentes agentes investigar

referências

projetuais

e

elencar questões norteadoras

estudo de referências projetuais elaboração de um quadro com questões norteadoras

ensaiar, partida

a

mais

a

partir

da

demanda

de

verificação

do

processo

proposto

Fortaleza, duas propostas projetuais,

por meio de dois projetos junto a

uma para um novo edifício, outra em um

comunidades

edifício existente


partida

narrativas

transiçþes


novos processos

precedentes

partida

referĂŞncias



PANORAMA A vivência do espaço urbano nos

mediante o acúmulo de capital político,

permite

multiplicidade

institucional ou simbólico. A segunda

que o compõe, em diversos sentidos.

perceber

a

lógica, de mercado, é unidimensional

Essa multiplicidade se reflete muito

e utiliza-se das relações de troca de

claramente no espaço edificado, que

recursos monetários para viabilizar este

buscamos aprofundar por diferentes

acesso.

narrativas, vinculadas à atuação de atores distintos e suas respectivas

Abramo (2009) faz uma ponderação

singularidades.

importante ao identificar a emergência de uma terceira lógica na realidade

Não apenas múltiplas, as cidades são

dos países latino-americanos. Diante

verdadeiros territórios de desigualdade

de uma urbanização acelerada após a

(ABRAMO, 2009). Esta desigualdade

Segunda Guerra, as disparidades sociais

estabelece vínculo estreito com o acesso

e as dificuldades financeiras dos Estados

às riquezas, tema aprofundado por Pedro

Nacionais que permearam esse período

Abramo. Assim, emerge o conceito de

motivaram o surgimento da “lógica

lógicas de coordenação social das ações

da necessidade”, onde não se requer

individuais e coletivas, por meio das

acúmulo de capital, seja ele político,

quais é possível ter acesso a riquezas,

institucional ou monetário. Para o autor,

que, para este estudo, dizem respeito

a necessidade de dispor de um lugar

inicialmente ao solo urbano. De início,

na cidade basta para acionar a terceira

duas lógicas podem ser percebidas. A

lógica de coordenação social, que é ao

primeira é a lógica do Estado, ou tradição

mesmo tempo motivo e instrumento

contratualista, que atribui ao Estado o

de acesso ao solo. Desta forma, na

papel de coordenador social. Sua função

estrutura

de mediador social determina o modo

latino-americanas,

de acesso à riqueza, que pode ocorrer

simultaneamente as três lógicas.

intraurbana

das

cidades

materializam-se

figura 02. sobre desigualdades visíveis e diversas narrativas contadas no espaço: quadra santa cecília e edifícios residenciais ao fundo acervo pessoal

17


O autor nos conduz à compreensão de

nomeia estes contextos como posições

três importantes agentes na produção

sociais, que se dão pela combinação

habitacional:

de diferentes recursos, divididos em

Estado,

mercado

e

população. Em uma outra abordagem,

financeiros

(recursos

econômicos),

mais voltada ao fazer arquitetônico,

culturais

Silke Kapp (2016) explora as questões

sentido amplo do termo) e políticos

da assessoria técnica ao traçar um

(rede de relações pessoais através da

panorama da atuação destes agentes.

qual se consegue ter acesso aos outros

(conhecimento

em

um

recursos). A autora divide o cenário de produção ou melhoria habitacional ou urbana

Dentre os agentes e os recursos

em

posições:

abordados, o Estado é apontado como

movimentos sociais (que abrangem tanto

um lugar social onde se concentram

beneficiários quanto lideranças), o Estado

os

(prefeituras e demais órgãos públicos), os

concentram os recursos financeiros e

capitais (construtoras, empreendedores,

os técnicos, por sua vez, concentram

bancos)

os recursos culturais. Os movimentos

quatro

e

“partidos”

os

ou

técnicos

(arquitetos,

engenheiros, sociólogos, entre outros). 18

recursos

políticos.

Os

capitais

sociais, por fim, enfrentam maiores dificuldades de acesso aos três recursos.

A produção habitacional e urbana tem

Apesar da noção desta dificuldade

sua complexidade por uma série de

no acesso ao solo, considera-se a sua

questões que envolvem os agentes,

força de trabalho como um importante

para além desta divisão preliminar. As

recurso na produção habitacional, em

práticas desta produção são precedidas

consonância com Ferro (2006) Maricato

por contextos distintos, que de certa

(1982).

maneira condicionam a atuação de cada partido, com as perspectivas que

Por esta contextualização, percebe-

lhes cabe e as pressões que sofre. Kapp

se

a

produção

habitacional

como


um campo onde todos estes agentes

tomam espaço cooperações em certos

participam com o mesmo intuito, mas

momentos e desacordos em outros.

partindo de contextos distintos e por

Abordá-los individualmente é muito

meio de diferentes lógicas. Kapp (2016)

mais uma decisão metodológica (ainda

acrescenta ainda as prioridades de cada

que suas interações venham à tona em

agente na produção habitacional: para

certos momentos) do que suposição de

os movimentos, são o tempo e a boa

uma atuação isolada. Posteriormente,

condição da moradia; para o mercado,

aborda-se a inserção do técnico neste

o lucro; para o Estado, o controle

cenário, o quarto agente, com foco no

burocrático e os recursos políticos

arquiteto e urbanista.

oferecidos pelo processo (discursos e imagens) e, por fim, os técnicos

O panorama traçado é sintetizado

priorizam a remuneração, bem como

no quadro a seguir, e considera, por

a qualidade do resultado final, a partir

fim, uma divisão da atuação dos

de suas áreas de atuação e convicções.

agentes em dois grandes grupos,

Estas divergências de condicionantes,

provisão convencional/formal e não

lógicas de coordenação e prioridades

convencional/informal (WERNA et al.,

fazem das políticas habitacionais um

2004). A partir desta sistematização,

“lugar de disputa” (KAPP, 2016).

busca-se aprofundar cada agente e sua respectiva atuação, a fim de observar

Para o presente estudo, portanto,

suas potencialidades e fragilidades.

consideram-se três agentes: Estado

Partindo

(prefeituras e demais órgãos públicos),

estruturas podem ser discutidas e

mercado (construtores, incorporadores)

modificadas (KAPP, 2016), o desenrolar

e população (seja de movimentos

das

sociais ou não). O contexto em que

o entendimento da maneira como

estes atuam é complexo, múltiplo,

estamos hoje, frente às perspectivas

repleto de sobreposições, no qual

que desejamos alcançar.

da

ideia

diferentes

de

que

narrativas

estas

embasa

quadro 02. síntese sobre agentes, respectivas atuações, suas prioridades na produção habitacional elaborado pela autora com base em Abramo (2009), Kapp (2016) e Werna et al. (2004)

19


agentes e recursos

Estado

prioridades

controle burocrático e os recursos políticos oferecidos pelo processo (discursos e imagens) provisão convencional/formal

(recursos políticos)

20

mercado

lucro

população (força de trabalho)

tempo e boas condições de moradia e urbana

provisão não convencional/informal

(recursos financeiros)


atuação

campo

regulação

programas de urbanização políticas públicas

associação

programas habitacionais

novos imóveis

formal 21

estoque imobiliário

produção habitacional loteamentos periféricos

informal

associação

estoque imobiliário

novos imóveis

autoconstrução intervenções em imóveis existentes


SISTEMÁTICAS Dentre os agentes estudados, o Estado é o primeiro abordado. Sua atuação ocorre sobretudo por meio de recursos políticos

e

materializa-se,

para

o

presente estudo, de duas maneiras: por meio da regulação, normatizando e controlando o uso do solo, e por meio de políticas públicas que, no âmbito da moradia, direcionam-se à construção ou melhoria de moradias através de programas habitacionais e/ ou programas de urbanização. Como mostra Kapp (2016), partindo da função primeira de manter a sociedade coesa,

o

Estado

necessariamente

controla e planeja, em maior ou menor grau. Desta condição decorre um aparato 22

burocrático, obrigatoriamente. Assim, o aprofundamento do Estado se inicia da regulação, uma de suas principais atribuições, na tentativa de compreender sua relação com as desigualdades. Algumas pistas já nos são dadas: A distinção entre cidade formal e informal está por definição ligada à regulação, mas está intrinsecamente conectada a uma carga simbólica que condiciona e é condicionada pela falta de visualização da cidade informal. - COSTA LIMA, 2017, P. 23


A reflexão sobre regulação e direito à

A

moradia remonta ao início dos anos

destes conceitos no espaço urbano

2000,

ocorre

quando

pensamento espaço,

emergiu

para

a

repercutindo

um

produção na

novo

perspectiva

de

por meio

materialização das

legislações

do

municipais, norteadas pelo Estatuto.

elaboração

Desta forma, ao transferir para as

de importantes documentos nacionais

gestões dos municípios a definição

como o Estatuto da Cidade (lei nº 10.257

dos parâmetros e demais regulações

de 2001) e políticas como o Sistema

relativas ao uso do solo, assume-se

Nacional de Habitação, regulamentado a

que estas gestões têm propriedade

partir da lei nº 11.124 de 2005 (FREITAS;

para estabelecer o que corresponde

PEQUENO, 2015, p. 45).

aos três conceitos de acordo com as especificidades locais. Na cidade

O Estatuto da Cidade fundamenta-

de Fortaleza, portanto, a produção

se sobretudo na função social da

do espaço e o uso do solo passam

propriedade, no direito à moradia

a ser amparados pelo Plano Diretor

digna, à terra urbanizada e à cidade,

Participativo (PDP), elaborado pela

e na participação nos processos de

Prefeitura Municipal de Fortaleza

planejamento, bem como uma gestão

(PMF) e aprovado em 2009.

democrática, três principais conceitos da lei federal (PEQUENO, 2017). Assim,

Compreendendo o vínculo entre o

por meio do combate à especulação

Plano Diretor e o Estatuto da Cidade,

imobiliária, da regularização fundiária

buscou-se verificar de que modo

e da gestão democrática e participativa,

os conceitos do Estatuto têm sido

viabilizados

de

aplicados na realidade de Fortaleza.

instrumentos direcionados a estes

Para isso, optou-se por espacializar

conceitos, seria possível a apropriação

onde eles não são garantidos, ou

do espaço urbano “em prol do bem

seja, quanto do espaço construído no

coletivo, da segurança e do bem-estar

território não está em conformidade

dos cidadãos, bem como do equilíbrio

com o PDP, uma delimitação espacial

ambiental”

preliminar

pela

(BRASIL,

Cidade, 2001).

aplicação

Estatuto

da

para

abordagem

decorrer desta investigação.

no

23


limites municípios delimitação das quadras assentamentos precários

24

2.5

0

2.5

5km

N


A

territorialização

856

ao saneamento ambiental, à infra-

assentamentos precários (mapa 01)

estrutura urbana, ao transporte e

permite-nos

que

aos serviços públicos, ao trabalho e

a produção em conformidade com

ao lazer, para as presentes e futuras

os parâmetros do Plano Diretor, na

gerações” (BRASIL, Estatuto da Cidade,

prática, não acontece em uma porção

2001) prevista em lei. Esta garantia

significativa do território - porção esta

torna-se restrita, acessível a uma

que abrange mais de 40% da população

minoria que tem condições de seguir a

(FORTALEZA, 2016). Quase metade

regulação vigente e não contempla as

da população, portanto, não atende à

variadas realidades socioeconômicas

regulação jurídica e/ou urbanística, além

da população. Assim como afirma

da parcela informal que apresenta boas

Maricato

condições de habitabilidade, não incluída

nacional, Fortaleza mostra-se como

neste parâmetro.

mais uma cidade onde Plano Diretor

então

dos visualizar

(2014)

para

o

contexto

segue uma tradição, na qual se realiza Uma vez

que

certa

o que favorece uma minoria, ao passo

de

em que se ignora o que os contraria.

informalidade a uma condição de

Deste modo, a quem está fora desta

precariedade, subjetiviza-se a noção

minoria e não tem condições de pagar

da “garantia do direito a cidades

para estar em conformidade com a lei,

sustentáveis,

resta, com maiores chances, a condição

correspondência

se do

encontra conceito

entendido

como

o

direito à terra urbana, à moradia,

de precariedade.

mapa 01. assentamentos precários em Fortaleza Fortaleza em Mapas sobre base da SEFIN

25


Desta abordagem emerge o conceito de

PDP

enquadram

uma

edificação

informalidade, cuja definição estabelece

como

informal.

Esta

percepção

um vínculo estreito com a regulação

possibilita, por sua vez, uma outra

e, consequentemente, com a atuação

noção acerca da informalidade: se por

do Estado. Freitas (2018) e Costa Lima

um lado há uma série de parâmetros

(2017) adotam para a informalidade a

e regulações a se cumprir para que

definição de Castells e Portes, na qual

um

o atributo central consiste em ser uma

formal, por outro lado, a produção

atividade “não regulada pelas instituições

informal do espaço abrange inúmeras

da sociedade, em um ambiente legal e

possibilidades de “não conformidades”

social em que as atividades similares

com a regulação existente, de modo

são reguladas” (CASTELLS; PORTES,

que uma generalização tornaria sua

1989 apud COSTA LIMA, 2017, p. 31).

definição imprecisa e multidimensional

Qualquer atividade em que haja regulação

(FERNANDES,

é passível de estar em condição informal,

a

sendo a moradia uma delas.

informalidade, que perpassa diferentes

edifício

extensa

contextos,

26

seja

reconhecidamente

2011).

abrangência classes

Isto

reitera

relativa

sociais,

à

bairros,

Desta forma, em Fortaleza, o não

sem estar restrita a algum recorte ou

cumprimento

contexto específico.

aos

parâmetros

do


27

As

muitas

enquadrar

possibilidades

uma

construção

para

os bairros geralmente carecem de

neste

serviços básicos e de infraestrutura, e as

conceito entravam o estabelecimento

habitações podem não cumprir com os

de um parâmetro que o caracterize com

regulamentos vigentes de planejamento

clareza e precisão. Para possibilitar no

e construção, podendo ainda localizar-

território uma noção aproximada de

se em áreas de risco (ONU-Habitat III,

onde as definições do PDP não se fazem

2015, p. 1). Em Fortaleza, este conceito

presentes,

mapa

aproxima-se do que se define por

anterior, utilizou-se como parâmetro os

assentamentos precários, a partir Plano

assentamentos precários, consciente da

Local de Habitação de Interesse Social

limitante de que estes não englobam este

(PLHIS), de 2016. Segundo o PLHIS,

cenário por completo. Esta decisão partiu

são

da definição do Habitat III, conferência

- sob o viés jurídico ou urbanístico

da ONU realizada em 2016 em Quito,

-

que considerou como assentamentos

de

informais áreas residenciais onde os

morfologia destoante do entorno e cujos

moradores não têm segurança da posse,

moradores são de baixa renda.

representadas

no

áreas e

que

ocupadas

irregularmente

apresentam

infraestrutura

e

deficiências acessibilidade,


O contexto de restrição do aparato

facilidades

regulatório explorado anteriormente e

(SANTOS, 1988, p. 42), ou seja, têm

seus reflexos no território nos permitem

acesso aqueles que possuem recursos,

questionar a quem suas definições

enquanto os demais são excluídos

realmente interessam e quais seus

daquilo que, em teoria, seria um direito

impactos: a falta de alternativas acessíveis

básico. Os assentamentos precários

impossibilita parcela significativa da

são ainda restritos da liberdade e da

população de acessar o mercado formal,

proteção do Estado (COSTA LIMA,

induzindo a busca da informalidade como

2017), o que significa submetê-los a

uma solução tangível para suas demandas

diversas inseguranças, como risco de

(COSTA

desapropriações ou de realocações.

LIMA,

2017,

FERNANDES,

“privilégios

distintivos”

2011) e fomentando o “ciclo vicioso da

(FREITAS,

A informalidade no campo da moradia,

PEQUENO, 2015, p. 50). Desta maneira,

informalidade

urbana”

portanto, é sujeita a inúmeros prejuízos

para além dos números, a condição

espaciais,

‘informal’

causados e mantidos pelas próprias

precisa

ser compreendida

também a partir das suas limitações:

sociais

e

econômicos,

definições inacessíveis da regulação, que se torna um instrumento de segregação

28

Ao definir o limiar entre padrão

ao restringir os direitos a quem pode

legal e o ilegal, empurra-se para a

pagar, tornando-os privilégio.

ilegalidade e/ou para a periferia um grande contingente populacional que

É preciso reconhecer também que

não tem acesso ao padrão vigente na

estes prejuízos extrapolam a parcela da

cidade ‘planejada

população atingida diretamente pois, ao mesmo tempo em que significam

- FREITAS, 2018, P. 24

um alto custo para os residentes (insegurança

da

posse,

perigos

O não acesso ao padrão vigente da cidade

ambientais e para saúde, desigualdade

planejada, ressaltado por Freitas (2018),

dos direitos civis), são também onerosos

vincula-se

aplicação

para os governos locais, tanto para a

restrita e concentrada das facilidades

realização de programas de melhoria

do

habitacional

diretamente

consumo

coletivo

à

urbanístico

e

urbanização,

quanto

(infraestrutura e serviços básicos, por

impactos indiretos da informalidade,

exemplo). Assim como afirma Santos

como problemas de saúde pública e de

(1988), é essa restrição que torna tais

violência (FERNANDES, 2011).


Por meio do estreito vínculo com a regulação, é possível atribuir um maior papel desta na manutenção da produção informal do espaço, contrariando a noção de que a informalidade seria um resultado de um desenvolvimento rápido e desordenado. Evidencia-se,

29

ainda, não a regulação como motivo da informalidade, mas a “rede de arbitrariedade e exclusão que a envolve” (COSTA LIMA, 2017, p. 47).

Em um primeiro momento, aprofundar a participação do Estado no espaço construído permite perceber uma inadequação do aparato regulatório às diferentes realidades socioeconômicas, que condiciona parcela da população a uma situação de inseguranças e restrições de direitos, uma resposta possível moradia.

diante

da

demanda

por


fortaleza

5

0

5 10km

N

municípios da região metropolitana demais municípios

ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS 856 assentamentos 248.258 imóveis calculados em Fortaleza

30

DEFICIT HABITACIONAL 124.661 domicílios calculados em toda a região metropolitana


FALSOS CONTROLES A função de manter a sociedade coesa

quais deve haver uma maior produção

faz do Estado um agente importante

habitacional para suprir a demanda

na regulação, que, para o nosso estudo,

derivada de coabitações, altos aluguéis

se desenrola enquanto norteadora do

ou habitações com altas densidades).

uso e ocupação do solo. Ballegooijen e Rocco (2013) enfatizam o papel

Segundo o relatório da Fundação João

do Estado também como relevante

Pinheiro (FJP), em 2014, dentre as

provedor de desenvolvimento urbano.

regiões metropolitanas destacadas, a

Esse lembrete traz junto uma cautela, da

Região Metropolitana de Fortaleza (RMF)

importância do olhar crítico de perceber

ocupa a 5ª posição quanto ao déficit,

- e questionar - o quanto as políticas

compreendendo

urbanas têm priorizado esta questão.

No entanto, os 856 assentamentos

Para uma aproximação da atuação do

precários apenas na capital, previamente

Estado enquanto ação materializada no

mapeados, englobam um valor estimado

espaço, abordam-se as políticas públicas

de 248.258 imóveis (FORTALEZA, 2016).

de moradia, sobretudo os programas

Este levantamento (mapa 2) nos permite

voltados à provisão de habitações.

inferir que provavelmente boa parte

124.661

domicílios.

do déficit é oriunda de uma produção Outro conceito se faz pertinente para

informal, mas o contrário não se constitui

nossa abordagem: parte das políticas

uma verdade (o déficit compreende,

habitacionais têm buscado suprir a

em números, próximo da metade das

deficiência do estoque de moradias,

moradias dos assentamentos precários).

quantificada

déficit

Assim, uma vez que parcela significativa

habitacional. A Fundação João Pinheiro

das habitações informais não se enquadra

(2016) divide o déficit em reposição de

no contexto de inadequabilidade adotado

estoque (moradias cuja precariedade

pela FJP para calcular o déficit, reitera-

as

se que a produção informal não ocorre

inviabiliza

por

de

meio

serem

do

habitadas,

que necessitam de substituição) e

necessariamente

vinculada

a

uma

incremento de estoque (situações nas

precariedade de qualquer tipo (mapa 02).

mapa 02. comparativo entre assentamentos precários e déficit habitacional PLHIS; Fundação João Pinheiro 1 A relação proposta entre a produção habitacional informal e déficit habitacional não pretende

sugerir correspondência entre os dois conceitos. No entanto, compreendendo o estigma que abrange a informalidade e a associa necessariamente a condições de precariedade, busca-se utilizar o comparativo entre os critérios adotados pela FJP relativos à carência habitacional para desvincular tais conceitos necessariamente à informalidade, onde a produção por parte da população, por exemplo, tem mais espaço.

31


o Ministério das Cidades, a partir de 2015 houve uma maior instabilidade no programa. Entre 2016 e 2018, o número de unidades habitacionais entregues no país por ano caiu em torno de 85,85%

2 Segundo

32

Entende-se, então, que há dois grupos:

O primeiro recorte, das décadas de

uma produção informal precária e uma

70 e 80, corresponde a um momento

outra em relativas boas condições (não

em que, em paralelo a uma forte

se pode afirmar com propriedade dada

segregação centro-periferia, as políticas

a falta de registro sobre a situação

habitacionais

destas

parte pelo BNH (Banco Nacional de

moradias).

possibilita

Tal

dividir,

segmentação

por sua vez,

providas

em

grande

a

Habitação) aumentavam tal segregação

postura do Estado em duas: provisão

ao passo em que expandiam a malha

de habitações de interesse social com

urbana para além da área ocupada, por

vista a suprir o déficit habitacional

meio dos empreendimentos em áreas

existente, melhorando as condições de

não dotadas de infraestrutura (mapa 03).

moradia da população; e urbanização de

com

O segundo momento, durante a década

regularização das habitações informais

assentamentos

informais,

de 90, compreende um enfraquecimento

em boas condições (com possíveis

do forte distanciamento entre centro

melhorias habitacionais) e melhorias do

e

espaço urbano.

condomínios fechados de alto padrão

periferia

pela

emergência

dos

na periferia, em paralelo à estruturação Freitas e Pequeno (2015), em uma

de assentamentos precários espalhados

análise sobre a produção habitacional

em áreas mais centrais, as quais eram

recente na Região Metropolitana de

dotadas de infraestrutura e, muitas

Fortaleza, discorrem sobre as políticas

vezes, ambientalmente frágeis.

habitacional e urbana nos últimos 50 anos: ao longo desse tempo, a postura

Neste momento, após o fim do Sistema

do Estado frente a estas necessidades

Financeiro de Habitação, na década de

apresentou

nos

80, houve uma elitização do mercado

permitem uma leitura em três recortes

alternâncias

imobiliário formal, ao passo em que, no

temporais - décadas de 70 e 80, década

campo das políticas públicas, investiu-

de 90 e, por fim, anos 2000 até 2015.

se mais em urbanização de favelas.

Considerando

contexto,

O programa Habitar Brasil BID deste

acrescenta-se o recorte 2016-2018,

período foi, de certo modo, uma forma

que compreende a contenção em curso

de conduzir o olhar às favelas não

o

presente

dos investimentos nestas explorado neste estudo.

que

políticas2,

não

mais como uma criminalização a ser removida das cidades.

mapa 03. conjuntos habitacionais sobre esgotamento sanitário LEHAB; Fortaleza em Mapas; graduação do esgotamento sanitário por quebras naturais (jenks)


2.5

0

2.5

5km

N

33

conjuntos habitacionais esgotamento sanitรกrio 0 - 16,33% 16,34 - 37,04% 37,05 - 64,67% 64,68 - 88,61% 88,62 - 100%


Por fim, com o novo modo de pensar

redução dos processos de exclusão urbana

a produção do espaço no Brasil, que

das camadas menos favorecidas.

emergiu nos anos 2000 e possibilitou uma mudança sensível nas políticas

A produção habitacional dos últimos anos

públicas,

houve

programas

uma

de

compunham

o

dos

nos mostra que uma atuação limitada à

urbanização

redução

(que

construção de conjuntos não será eficaz

programa

PAC

se não atuar, em paralelo, com o aparato

Urbanização de Favelas), em paralelo

regulatório que mantém as disparidades e

à consolidação do programa federal

aumenta a produção informal no território.

Minha Casa Minha Vida (PMCMV), de

O

estímulo à produção habitacional para

investimentos, significou uma produção

classes intermediárias, visando reduzir

habitacional periférica com um processo

a elitização do mercado imobiliário de

de dispersão urbana semelhante ao do

períodos anteriores.

BNH, acrescentando-se o fato de que,

PMCMV,

apesar

dos

volumosos

quanto menor a renda a qual se destina,

34

Freitas e Pequeno, ao longo do artigo,

mais distante o empreendimento; não há,

expõem como a produção habitacional

ainda, a relação da média a que se destina

da

e a renda média onde se insere (mapa 04).

RMF

nesse

período

significou

muito mais um descolamento entre os investimentos da habitação e os objetivos

A não utilização de instrumentos de

da política urbana do que uma real

controle do preço da terra, em paralelo

solução para a demanda de moradias.

a uma ativação do mercado imobiliário,

O

questão

inviabilizou a construção em terrenos

fundiária, possível por meio do combate

não

enfrentamento

da

mais centrais devido ao seu alto valor

à especulação e não empreendido pelo

(FREITAS, PEQUENO, 2015, MARICATO,

programa, acabou pondo em risco o

2014). Desta maneira, “apesar da base

objetivo de conter a proliferação dos

legal para fazer mudanças, a propriedade

assentamentos informais na cidade. O

fundiária

simples aumento da produção imobiliária

fomentar a desigualdade social e urbana”

não significa, segundo os autores, a

(MARICATO, 2014, p. 77).

e

imobiliária

mapa 04. empreendimentos do PMCMV sobre renda média por domicílio LEHAB; censo 2010; caixa econômica federal

continua

a


empreendimentos mcmv

2.5

0

2.5

5km

N

faixa 1 faixas 1 e 2 faixas 1, 2 e 3 faixa 2 faixas 2 e 3 faixa 3

35

renda média por domicílio R$ 0 - 1.800 (faixa 1) R$ 1.801 - 2.600 (faixa 1,5) R$ 2.601 - 4.000 (faixa 2) R$ 4.001 - 7.000 (faixa 1) > R$ 7.001


empreendimentos mcmv

2.5

0

2.5

5km

faixa 1 faixas 1 e 2 faixas 1, 2 e 3 faixa 2 faixas 2 e 3 faixa 3

36

deficit habitacional 237 - 745 746 - 1153 1154 - 1698 1699 - 2384 2385 - 3366

N


Pequeno e Rosa (2015), em uma análise

do programa sobre o déficit habitacional

sobre o PMCMV em Fortaleza, ressaltam

em Fortaleza (mapa 05) revela que não

o descolamento entre a implantação

há uma relação tão clara entre as regiões

dos empreendimentos e o zoneamento

de maior déficit e empreendimentos

existente, tanto em Fortaleza quanto

nas proximidades que possam suprir a

em municípios da região metropolitana.

carência de moradias.

Sobretudo no início do programa, as construções se davam em zonas

Por

fim,

Freitas

(2018)

evidencia

menos recomendadas pela ausência

como o incremento da produção de

de infraestrutura e de equipamentos,

habitações de interesse social (HIS) dos

tais como de ocupação restrita e de

últimos 20 anos também provocou

requalificação urbana.

um crescimento da informalidade por três motivos: o aumento da demanda

Quanto à periferização dos conjuntos

habitacional

decorrente

do

grande

habitacionais do PMCMV, Maricato em

volume de remoções para as obras da

seu livro “O impasse da política urbana

Copa de 2014 (Fortaleza foi uma das

no Brasil” ressalta, empiricamente, que

cidades-sede do megaevento); retomada

“apesar da maior parte dos recursos e

da produção imobiliária de HIS e sua

das unidades se concentrarem entre 0

contribuição para o enfraquecimento

e 3 s.m. é provável que sua localização

das iniciativas públicas de urbanização

não se dê nas regiões que concentram o

de favelas de períodos anteriores e, por

déficit” (MARICATO, 2014, p. 81). De fato,

último, o aumento do preço da terra pela

a espacialização dos empreendimentos

ativação do mercado imobiliário.

mapa 05. empreendimentos do PMCMV sobre déficit habitacional por incremento de estoque LEHAB; Fundação João Pinheiro; graduação do déficit por quebras naturais (jenks)

37


ENTRE ESCALAS Para além do viés urbanístico, na

a homogeneidade do tecido urbano

tentativa de compreender a produção

construído

habitacional de programas do Estado,

comércio informal, seja no entorno

busca-se

ou

investigar

os

programas

os motiva a expandir o

mesmo

dentro

das

unidades

públicos de HIS também como matéria

habitacionais, apesar das proibições

construída, partindo da escala do

neste último caso.

edifício e aproximando-a, até que se possa adentrar o módulo habitacional.

Os prejuízos da monofuncionalidade vinculam-se também a uma crescente

Em Casa

38

uma

análise

Minha

Vida

sobre em

o

Minha

reclusão

dos

moradores.

Como

Fortaleza,

mostram Pequeno e Rosa (2015), o

Pequeno e Rosa (2015) estudam três

conteúdo programático cada vez mais

empreendimentos específicos, exploram

reduzido, somado à falta de espaços

características dos projetos e de suas

públicos coletivos nas proximidades

construções que põem em cheque

dos empreendimentos, não estimula

sua qualidade. Em primeiro lugar, a

qualquer integração entre as famílias,

distância dos edifícios de áreas com

comprometendo

serviços condiciona seus moradores a

destas e remontando a problemas de

enfrentar grandes deslocamentos para

programas habitacionais dos períodos

atender suas necessidades. Além disso,

anteriores.

a

sociabilidade


39

figura 03. cidade jardim - fase 2: um dos principais empreendimentos do PMCMV em fortaleza Diรกrio do Nordeste


Aproximar o olhar para entender

O modo como a estruturação da planta

melhor a qualidade a nível do módulo

habitacional tem se baseado no espaço

habitacional também levanta pontos

mínimo tornou-a engessada, de modo

relevantes: plantas similares (senão

a

iguais) com área inferior a 40 m² geram

pelos

insatisfações tanto pelas reduzidas

espacial também causa conflitos com

dimensões

moradores.

personalização Sua

limitação

quanto

os mobiliários e equipamentos, que nem sempre equivalem ao espaço

conforme relatam os autores. Além

disponível e que se sobrepõem a

disso, nos casos estudados, mais de 8%

outros usos ao serem transferidos

das habitações abrigam seis ou mais

para outros cômodos. Fala-se também

moradores, consistindo em tentativas

em problemas como patologias na

de combate ao déficit que se enquadram

estrutura e nas instalações (PEQUENO,

no cálculo do déficit habitacional por

ROSA, 2015), além de questões como

incremento de estoque, dada à alta

má aeração, mau isolamento acústico

densidade.

e

uma

cômodos

qualquer

inadequada,

por

dos

impedir

distribuição

iluminação

(LIMA,

BARROS

NETO, 2011). Ressalta-se ainda os

40

A lógica da habitação mínima, adotada

casos de intervenções - informais -

em projetos para habitações de interesse

nas habitações, seja para melhoria da

social e fortemente limitada para caber

unidade ou alterações no layout previsto

nos custos, reduz os ambientes de

para adequação a necessidades diante

modo a torná-los inadequados às suas

das dimensões reduzidas.

próprias funções, à sua atribuição essencial. A inadequação surge não

O

argumento

do dimensionamento mínimo, mas de

assentamento

precário

uma falta de racionalização que impede

habitação

de

os ambientes de se adequarem tanto

qualidade

da

às suas próprias funções, quanto de

encontra correspondência na realidade.

atender a demandas não previstas que

Contrapor

possam surgir por parte dos moradores

os assentamentos informais e seus

(LIMA, BARROS NETO, 2011).

resultados

as na

de

migrar

de

um

para

uma

interesse

social

pela

moradia,

então,

não

tentativas prática

de

nos

conter permite


visualizar que estas não se estruturam como respostas adequadas ao problema que visam solucionar: a base construída até aqui revela inadequações que partem da escala do território (localização periférica, preços elevados) e alcançam escala do edifício (falta de flexibilidade, isto é, não adaptação às necessidades dos moradores, má qualidade construtiva e

de

condicionamento

ambiental),

motivando ainda intervenções informais, as quais teoricamente seriam sanadas. Em suma, a produção de HIS tem ocorrido muito mais sob o interesse dos agentes ligados ao mercado imobiliário do que interesses coletivos (FREITAS, PEQUENO, 2015). Debruçar-se

sobre

os

programas

habitacionais e suas consequências, partindo do território até a edificação, possibilitou a percepção de que estes não têm sido capazes de sanar os problemas habitacionais aos quais se propuseram porque, sobretudo, não se voltam a estes, da concepção à pós ocupação. Neste segundo momento, portanto, percebe-se uma inadequação dos programas habitacionais às reais demandas dos moradores, do território ao edifício.

41


plantas similares e engessadas

engessamento dos programas habitacionais

mau condicionamento ambiental

patologias na estrutura e nas instalações

má qualidade de projeto e/ou construção

ausência de espaços públicos coletivos

conteúdo programático reduzido

programa de necessidades restrito

inadequação às reais demandas dos moradores

políticas habitacionais

inadequação dos cômodos e conflitos de usos

monofuncionalidade do tecido urbano

42

não relação entre a implantação de his e o déficit

espraiamento da malha urbana

implantação em áreas sem infraestrutura/serviços

redução da urbanização de assentamentos

marginalização da produção informal

regulação

insegurança da condição informal (remoções)

alto custo do mercado formal

zoneamento restrito

alto custo para obedecer a regulação

inadequação aos diferentes padrões socioeconômicos

periferização de his e dispersão da malha urbana


ESTADO E INADEQUAÇÕES A

sistematização

das

informações

previamente apresentadas possibilitou a elaboração de um quadro que gera uma leitura de uma escala a outra (regulação a políticas habitacionais, ou vice-versa). Por este quadro, diversos fatores foram listados e posteriormente agrupados em características mais abrangentes. O levantamento desses grupos nos permitiu a leitura de duas inadequações distintas - porém simultâneas. A atuação do Estado acontece, portanto, atrelada a um contexto de inadequação que transita entre diferentes escalas, resumido

no

Inicialmente,

quadro a

uma

a

seguir.

inadequação

do aparato regulatório às diferentes realidades

socioeconômicas

da

população e, depois, a uma inadequação dos programas habitacionais às diversas necessidades de seus moradores.

quadro 03. síntese sobre a produção do Estado, abordando regulação e políticas habitacionais elaborado pela autora

43


44


ATUAÇÃO MERCANTIL O

estabelecimento

capitalista

e

o

do

sistema

funcionamento

p. 26). Por este conceito, percebe-se que

de

a regulação não se comporta como um

uma lógica mercantil para o acesso a

condicionante para que ocorram as

bens propiciaram um cenário onde

transações mercantis, o que dá abertura

os recursos financeiros ocupam uma

para compreender, em alinhamento

posição central na realização das

com o autor, que existe um mercado

atividades da sociedade. A partir da

compatível com as definições do aparato

lógica de mercado, como mostra

regulatório, nomeado por mercado

Abramo (2009), o acúmulo de capital

formal, e um mercado incompatível, ou

monetário torna-se um condicionante

mercado informal. O nosso campo de

para o acesso à terra urbana. Dentre

estudo investiga os dois mercados.

os agentes estudados, o mercado é compreendido como o principal

No mercado formal é possível a

atuante sob esta lógica, tanto por se

identificação de dois submercados: o

constituir um lugar social onde se

primário, abrangendo imóveis novos,

concentra este capital, quanto por

recém produzidos ou na planta, e o

priorizar sua obtenção por meio do

secundário, de estoque, ou de imóveis

lucro na produção arquitetônica e em

usados. Abramo (2009) encaixa as

outras produções.

práticas

mercantis

informais

no

conceito de submercados. Desta forma, O economista define mercado como

no âmbito informal o mercado primário

“um encontro regular de compradores

corresponde

e vendedores de bens e serviços, cujas

periferia urbana e periurbana (fundiário),

transações mercantis se reproduzem a

enquanto o mercado secundário refere-

partir de certa liberdade de ação e decisão

se à venda e aluguel de imóveis em

dos seus participantes” (ABRAMO, 2009,

assentamentos populares (imobiliário).

aos

loteamentos

na

45


MERCADO FORMAL Por muito tempo o alcance do mercado

em dois submercados, sendo um de

imobiliário

restrito

imóveis novos (recém-lançados ou na

às classes mais altas. Retomando a

formal

esteve

planta), ou mercado primário, e outro de

abordagem

ao

imóveis do estoque existente, ou mercado

Estado, com o fim do BNH, em 1986, a

secundário. No que tange à produção

falta de programas habitacionais mais

habitacional, prioriza-se a compreensão

abrangentes fez com que houvesse

de como o mercado influencia o fazer

uma atuação estatal mais limitada à

arquitetônico neste âmbito.

histórica

referente

parcela de renda superior a 5 salários

46

mínimos, onde está apenas 8% do

Com a perspectiva de empreendimentos

déficit habitacional. Naquele momento,

habitacionais regulados ou financiados

a prioridade do mercado privado recaía

pelo Estado, como o PMCMV, emerge

sobre a produção de luxo, em paralelo a

um significativo interesse de diversos

um cenário de crescimento progressivo

capitais,

dos assentamentos precários em todo

bancos

o país (MARICATO, 2005). Nos anos

ali oportunidade de grandes lucros

2000, o Programa Minha Casa Minha

garantidos. A busca por aumentar o lucro

Vida, resumidamente, buscou reativar a

faz deste processo o mais padronizado,

participação do mercado privado para a

rápido e barato possível, sem muito

classe média, abrindo espaço para uma

espaço para interferências. Prioriza-se

atuação mais forte do Estado na produção

tudo o que pode reduzir o tempo ou os

habitacional destinada à parcela de

custos do processo. Assim, qualquer

renda abaixo de 5 salários mínimos, que

tentativa de incluir os futuros moradores

concentra 92% do déficit.

no processo decisório ou da construção,

seja ou

de outros,

construtoras, que

de

enxergam

em grande parte dos casos, torna-se Esta

mais

mera formalidade, visando muito mais

coerente a abordagem do mercado

contextualização

torna

um retorno publicitário do que um real

imobiliário formal, sem que o foco

impacto nos empreendimentos (KAPP,

recaia sobre a produção de luxo, mas

2016).

justamente a participação em programas habitacionais de maior abrangência.

A reduzida participação no processo

Abramo (2009) divide o mercado formal

decisório extrapola os futuros moradores


e influencia também o papel do

é confiada a função de otimizar todo

arquiteto,

Alberto

o projeto para a maior produtividade

Maciel (2013) mostra ao discutir as

como

Carlos

dentro do que é permitido na lei.

interferências que a prioridades do

Atuando dentro destas limitações e

mercado imobiliário podem exercer

baseando-se em uma planta quase que

sobre este fazer. Partindo da sequência

padrão, cabe a ele realizar pequenas

de

e

diferenciações entre seu projeto e o que

comercialização, o autor identifica dois

planejamento,

implantação

é visto no entorno, utilizando sempre

tipos de condicionantes: pragmáticos

de artifícios com venda garantida, tanto

e

nas áreas privadas e quanto coletivas.

não-pragmáticos.

Dentre

estes

últimos, destaca-se o tempo: a busca por sua otimização tem resultado na

Assim como revelam os estudos acerca

simplificação das formas dos edifícios,

da atuação do Estado, certas prioridades

que, no entanto, não pode ser dita

dos agentes por vezes entram em

racionalização dos processos, pelo

conflito com o fazer arquitetônico,

contrário.

provocando

Geram-se

edifícios

sem

inadequações

com

modulação, com uma planta rígida

prejuízos para além da concepção e da

e engessada, poucas possibilidades

construção, impactando diretamente

de

no uso que o edifício pode vir - ou não

adequação

e

quase

nenhuma

racionalização a não ser a própria

- a ter.

repetição da planta por meio da verticalização.

O aprofundamento sobre o mercado imobiliário formal reafirma, em um

A prioridade de otimização dos custos

primeiro momento, a preponderância

ocorre em paralelo à busca pela

que o capital monetário adquire

maior comercialização possível. Neste

no

contexto, inserem-se agentes como

consequência, tal centralidade reduz

incorporadores e corretores de imóveis,

interferências

dotados de autonomia suficiente para

ou negativas, que o processo pode

determinar premissas como público-

vir a ter, mantendo-se ao máximo

alvo, tipologia e tecnologias construtivas

dentro dos resultados com maior

dos empreendimentos. Ao arquiteto

produtividade e mais vendas.

processo

e

no

edifício.

externas,

Em

positivas

47


MERCADO INFORMAL Da mesma maneira como há uma

por mais que esteja fora dos marcos de

relevância da atuação do mercado na

direitos, o mercado informal conta com

provisão

convencional,

uma estrutura institucional própria,

o cenário de autoprodução não está

ou instituição informal, que garante

alheio à existência de práticas mercantis

a reprodução temporal das práticas

informais.

aponta

mercantis, de compra, venda e aluguel

a emergência do mercado informal

de solo e imóveis (ABRAMO, 2009a).

como uma resposta a uma legislação

A eliminação da impessoalidade e a

urbanística cujo diálogo é reservado

personalização das relações contratuais

aos estratos de renda mais elevados.

(através de relações familiares e de

A repetição em grande parte das

amizade), por exemplo, atuam como

cidades

garantia para que ocorram as relações

habitacional

Abramo

(2009b)

latino-americanas

faz

crer

que esta lógica - a emergência de uma

mercantis no meio informal.

legislação urbanística restrita seguida

48

do estabelecimento de um mercado

Para o aprofundamento do mercado

informal - comporta-se como uma das

informal,

principais características da formação

parâmetros

socioespacial dessas cidades.

mercantis informais, como o conceito

Abramo formais

encaixa as

em

práticas

de submercados. No âmbito informal, No

entanto,

a

não

conformidade

destacam-se dois, um mercado primário

com o aparato regulatório não faz do

relativo aos loteamentos na periferia

mercado informal uma prática sem

urbana e periurbana (fundiário)3 e um

padrão ou relativa ordem. Quando a lei

mercado secundário vinculado à venda

não funciona como uma garantia nas

e aluguel de imóveis em assentamentos

relações de mercado, outras formas de

populares (imobiliário). Na dinâmica do

garantia devem se desenvolver para

funcionamento destes, há momentos

estabelecer as relações de confiança

de

entre as partes envolvidas. Deste modo,

complementaridade, isto porque os dois

concorrência,

mas

também

de

3 Além do mercado, o Estado, bem como movimentos sociais e associações populares, inserem-

se como agentes loteadores (KAPP et al, 2014), mas este estudo concentra-se na atuação do mercado como agente loteador.


podem ser identificados na estrutura

projeto seja aprovado ou conforme

urbana em áreas bastante precisas e

as exigências legais. Há ainda o não

de funcionalidades distintas (ABRAMO,

atendimento às exigências de provisão

2009b)

de infraestrutura, que por vezes consistem apenas em promessas aos

O primeiro submercado, de loteamentos,

moradores.

volta-se para o fracionamento de glebas na periferia das cidades, constituindo-se

Os

autores

levantam

no principal vetor de expansão da malha

loteamentos

urbana, que se direciona para áreas

ocupação mais tolerada pelo Estado do

carentes de infraestrutura e serviços

que as invasões, por não interferirem

públicos, porém dentro do poderaquisitivo

em questões de propriedade privada.

informais

ainda como

os uma

de parcela significativa da população. Os produtos desse submercado são

O segundo submercado, ou mercado

relativamente

sendo

imobiliário informal, se faz presente

suas distinções relativas a dimensões

homogêneos,

em pontos por toda a cidade, não

físicas, topográficas, e às externalidades

restrito às periferias, mas sobretudo

exógenas de urbanização (ABRAMO,

onde há assentamentos populares

2009a).

informais. Neste caso, o relativo acesso à infraestrutura acompanha muitas

O caráter informal destes loteamentos,

vezes a vulnerabilidade ambiental e

segundo Werna et al. (2004), está

os riscos que dela decorrem. A partir

sobretudo

de

aos

no

índices

não

atendimento

urbanísticos,

porém

uma

infinidade

individualizados,

de

processos

descentralizados

e

respeitando a propriedade do terreno.

autônomos, cresce o estoque edificado

Trata-se,

informal, ou imóveis usados, principal

assim,

de

um

terreno

privado que o proprietário realiza

produto

deste

submercado.

Neste

seu parcelamento, mas sem que este

contexto, a construção visa atender

49


inicialmente a demanda habitacional

verticalização, através de uma produção

das famílias, e não a comercialização

compacta da cidade. Esta dinâmica

imediata dos imóveis. Assim como

propicia a manutenção de um ciclo

expõe o autor:

extremamente prejudicial para a cidade:

(...) a comercialização de habitações

O mercado informal, ao promover um

informais, em sua grande maioria,

território cada vez mais difuso, impõe

se dá a partir de imóveis do estoque

custos de transportes crescentes

imobiliário informal. Os imóveis

aos trabalhadores que vivem nesses

novos informais produzidos para

loteamentos, mas, quando o mesmo

serem comercializados, geralmente,

mercado produz uma compactação

representam

fracionamento

nos assentamentos consolidados, ele

familiar,

do

lote

um

seja

causa uma precarização do habitat

verticalizando, seja ocupando parte

original

popular com o aumento da densidade

do lote e/ou casa (produção de

(predial e domiciliar) e verticalização

quartos), mas com a manutenção

com

da residência (ou parte) da unidade

indicadores

familiar original).

(escassez de ar, sol, etc.) que essa

todas

as de

implicações

dos

habitabilidade

compactação promove.

50

- ABRAMO, 2009A, 28 - ABRAMO, 2009B, P. 72

A distinção

dos

dois

submercados

a que o autor se refere tem reflexos

Dentro dos moldes estudados, o mercado

também distintos no espaço construído.

informal produz o espaço sob uma lógica

Resumidamente, enquanto o mercado

duplamente inadequada, submetendo as

fundiário expande a malha urbana, sob

famílias a más condições de salubridade,

uma lógica difusa, nos assentamentos

a nível da habitação, e de difícil acesso a

informais há uma densificação crescente,

serviços básicos e infraestrutura, a nível

seja por fracionamento dos lotes ou

do território.


mercado formal

otimização do processo com simplificação das formas e racionalização limitada

preponderância da obtenção de lucro

inadequação às reais demandas dos moradores

redução das interferências externas

51

mercado informal

difusão da malha urbana com reduzido acesso à infraestrutura e aumento do custo de vida duas lógicas prejudiciais complementares compactação de assentamentos e consequente precarização do habitat

quadro 04. síntese sobre a produção do mercado em suas duas configurações, formal e informal elaborado pela autora


52

figura 04. quem, afinal, produz a cidade? - “as cidades são as pessoas”: intervenção do projeto narrativas possíveis na travessa quixadá, no benfica acervo pessoal


53


PRÁTICAS PARALELAS É

preciso

práticas

temática possível para esta aproximação.

microscópicas, singulares e plurais

Para o presente estudo, entende-se por

que

autoconstrução:

um

‘analisar

as

sistema

urbanístico

deveria controlar ou suprimir e que (no entanto) sobrevivem à sua

(...) provisão de moradia onde a

caducidade.’ (...) Há práticas no e

família, de posse de um lote urbano,

sobre o espaço que jogam e vencem

obtido

o jogo viciado da disciplina; que

informal, decide e constrói por conta

tecem,

própria a sua casa, utilizando seus

efetivamente,

determinantes

da

condições

vida

no

mercado

formal

ou

social.

próprios recursos e, em vários casos,

Nas cidades se vê, de fato, uma

mão-de-obra familiar, de amigos ou

contradição

ainda contratada.

contínua

entre

‘o

modo coletivo da gestão e o modo individual de uma reapropriação.’

- MORADO, 2016, P. 19

- CERTEAU, 1980,

Apesar de presente na maior parte do

APUD SANTOS, 1988, P. 28

território, por muito tempo a temática da produção do espaço pela população

54

Estudar a moradia sob o viés da regulação

não foi debatida. As discussões sobre a

ou a partir da produção formal nos torna

real atuação do profissional arquiteto na

parciais por limitar nossa visão a um

cidade - e a percepção de seu alcance

lado, apenas. Santos, através de Certeau,

limitado - ganharam espaço a partir

instiga a exercitar o olhar, tentar imergir

da segunda metade do século XX,

na realidade das práticas microscópicas

firmando-se até a década de 70. É neste

para tentar compreender - apesar

momento, também, que emerge a busca

das limitações - como é estar em seu

por uma postura mais ativa do usuário

lugar. A tentativa de assimilar estas

no fazer arquitetônico.

práticas permitiu reconhecer na “outra produção arquitetônica” (KAPP, 2008),

Neste contexto, estrutura o Team X,

representada pela autoconstrução, uma

dentro dos Congressos Internacionais


momento muito particular, marcado por

de perguntar “por que” a moradia

pós-guerra, recuperação econômica e

deve ser o mais barata possível, e

reestruturação de cidades destruídas,

não, por exemplo, relativamente

o grupo questionava o funcionalismo

cara; “por que”, em vez de fazer

modernista frente às complexidades

todo esforço possível para reduzi-

da situação urbana e à necessidade de

la a níveis mínimos de superfície,

um aprofundamento sobre identidade,

de espessura, de materiais, não

transpondo o foco do projeto para

deveríamos tentar torná-la espaçosa,

a matéria construída e vivida por

protegida, isolada, confortável, bem

pessoas. O pluralismo defendido pelo

equipada, rica em oportunidades

Team X ampliou o debate para além

de

da prática arquitetônica, alcançando

intercâmbio, criatividade pessoal.

privacidade,

comunicação,

inevitavelmente uma reflexão de cunho político e gerando questionamentos que,

- DE CARLO, 1968,

de certa forma, conduziram ao fim dos

APUD FRAMPTON, 2008, P. 338

congressos, no final dos anos 50 . Como escreve Giancarlo De Carlo a respeito da

A discussão sobre a transferência da razão

declaração do CIAM de 1928:

dos técnicos para os usuários também compõe alguns trabalhos disciplinares.

Hoje, 40 anos depois do Congresso,

A exposição Arquitetura sem Arquitetos

constatamos que aquelas propostas

(Architecture without Architects) em

transformaram-se em casas, bairros

1964, de Bernard Rudofsky, ressignifica

e subúrbios, e depois em cidades

o olhar para o vernacular, por registros

inteiras, manifestações palpáveis de

fotográficos

um abuso perpetrado de início com os

questionando a capacidade dos arquitetos

pobres e em seguida com os nem tão

frente a uma arquitetura que, “longe de

pobres assim: álibis culturais para a

ser acidental (...) dá evidências tangíveis

especulação econômica mais feroz e

de modos de vida mais humanos e

a incapacidade política mais obtusa.

inteligentes”4 (MOMA, 1964).

de

diversas

culturas,

livre a partir do original: “Far from being accidental, this non-pedigreed architecture gives tangible evidence of more humane, more intelligent ways of living”

(...) Ao mesmo tempo, temos o direito

4 Tradução

de Arquitetura Moderna (CIAM). Em um

55


56


57

figura 05. instalações da exibição architecture without architects - MoMA, 1964 DIGITAL IMAGE © 22 jun. 2018, The Museum of Modern Art/Scala, Florence


VELHAS QUESTÕES Em

paralelo

a

estas

reflexões,

o

espaço, com poder de decisão sobre a

arquiteto e planejador britânico John

habitação (ESPINOZA; GRAPPI, 2017;

Turner introduziu aos países ocidentais

BALLEGOOIJEN; ROCCO, 2013).

a temática da urbanização informal em países em desenvolvimento, através de

Em suma, tais liberdades e, sobretudo,

numerosas publicações no periódico

a possibilidade das habitações de se

“Architectural Design”. O seu trabalho

expandirem

com as Barriadas, em Lima, trouxe à tona

progressivamente,

uma questão que ainda hoje perdura no

Turner

tecido urbano. Contrário às habitações

integração socioeconômica” (TURNER,

- projetadas e produzidas - em massa

1968, p. 19).

um

e

serem

aperfeiçoadas

significam

“poderoso

agente

para de

disponibilizadas pelo Estado, ele enxerga

58

na autoconstrução uma maneira de a

Conduzindo esta temática para o

comunidade exercer o poder de decisão

cenário brasileiro, muito da produção

sobre o seu próprio espaço, onde, a

de Carlos Nelson Ferreira dos Santos

partir de sua vivência, tem propriedade

se volta à autoprodução. Entusiasta

para adequá-lo às suas preferências e

das teorias de Turner, o arquiteto e

demandas específicas.

antropólogo é um dos pioneiros no país a defender o urbanismo como

Ao

aprofundar

a

produto de um processo participativo

produção autoconstruída, o arquiteto

(ESPINOZA; GRAPPI, 2017). Em seu

estrutura a noção de liberdade, que se

livro “A cidade como um jogo de cartas”,

divide em três: a primeira trata-se da

do final da década de 80, o arquiteto traz

liberdade para uma escolha própria

um desdobramento teórico inicial que

da comunidade, sem depender da boa

o permite contrapor os processos de

vontade da administração local ou de

planejamento do espaço às suas reais

aluguel social; a segunda é a liberdade de

apropriações. Em seguida, questiona

administrar o processo de acordo com o

a dicotomia que transpassa as cidades

recurso próprio, ou seja, a possibilidade

brasileiras e toma este contexto como

de

a

mote para uma proposta que possa

habitação ao longo dos anos; e, por

“retomar e rever linguagens” (SANTOS,

fim, a liberdade de moldar o próprio

1988, p.17).

desenvolver

a

noção

sobre

gradualmente


Um

dos

atuação

pontos a

de

sua

A aproximação do arquiteto à realidade

compreensão

da

da maioria da população na tentativa de

habitação autoconstruída para além

superar o caráter elitista da profissão,

do objeto arquitetônico. Defendendo

no entanto, teve um caráter pontual no

a ideia de que “a desordem é só uma

século passado, que logo perdeu espaço

ordem que exige uma leitura mais

(MONTANER, 2001). Décadas depois,

atenta” (SANTOS, 2009), o arquiteto

a

busca

simplificações

uma das grandes questões do espaço

assentamentos

urbano construído: possivelmente sua

informais, ressaltando que não há

permanência instigou um retorno desta

como desconsiderar seu contexto. Em

temática

sua abordagem, o problema da moradia

teórica

é discutido em um quadro mais

estabilizado. Temas como a participação

abrangente, reforçando a relação entre

dos usuários, a recuperação da cultura

informalidade,

popular, a abordagem do urbanismo

do

é

centrais

combater

significado

as dos

regulação,

políticas

públicas e escala de interesses.

informalidade

à e

permanece

produção prática,

de

como

arquitetônica, modo

mais

informal e a continuidade das críticas da década de 60 ganham mais espaço nas

É de surpreender a contemporaneidade

discussões - e nas cidades. Como afirma

da abordagem sobre a autoconstrução,

Montaner ao abordar a passagem do

mesmo se considerarmos o longo

século XX para XXI:

recorte temporal: não fossem as datas, as produções de Turner e Santos

Outra transformação importantíssima

poderiam estruturar-se a partir da

nessa virada de século foi a inclusão

conjuntura

definitiva

atual.

Especialmente

da

arquitetura

do

dentro

da

as soluções apontadas - moradia

urbanismo

vinculada

teoria e da prática da arquitetura

ao

desenvolvimento

informais

e

e

erudita. Livros, revistas e escolas

necessidade de projetos participativos

de arquitetura têm incorporado a

e valorização da cidade informal -

informalidade e os bairros marginais

mostram-se ainda coerentes para as

a seus temas e projetos.

das

atividades

dos

moradores

demandas de habitação social do nosso contexto (ESPINOZA; GRAPPI, 2017).

- MONTANER, 2016, P. 103

59


60 figura 06. sobre o potencial de adequação ao longo do tempo - campo do américa acervo pessoal


61


Entre as abordagens contemporâneas,

demandas imediatas em paralelo às

Denise

e

possibilidades de mudança futura por

coordenadora do laboratório PRAXIS,

Morado,

arquiteta

adaptações e aprimoramentos, e, por

da UFMG, reúne em Saberes [auto]

fim, a autonomia dos moradores para

construídos

experiências

decidirem sobre o espaço. O potencial

de diálogo entre a Universidade e os

inúmeras

de modificação destas moradias revela

autoconstrutores de ocupações de Belo

a autoconstrução como um processo

Horizonte. Ao tratar de outra lógica

dinâmico e constante, e que precisa

da prática, Morado discorre sobre a

ser reconhecido como tal (MORADO,

complexa questão habitacional frente

2016).

aos interesses econômicos e políticos,

62

os quais geralmente se sobressaem.

Mais do que uma qualidade formal

Além disso - ou por causa disso - parcela

ou inovação construtiva, a beleza da

expressiva da população encontra-se

autoconstrução, valorizada por Turner,

numa situação de ilegalidade urbana,

Santos,

sendo “não mais a exceção, mas a regra”

das soluções e em sua capacidade de

(MORADO, 2016, p. 18), motivando a

responder a demandas emergenciais

necessidade de repensar os meios de

sem

intervenção no espaço.

adaptações que atendam a demandas

Morado,

inviabilizar

está

na

potência

flexibilizações

e

futuras, materializando o poder de A autora diferencia a autoconstrução

decisão sobre a moradia, o poder de ação

em três universos: os loteamentos

no espaço. A autoconstrução representa,

periféricos, as favelas e as ocupações

portanto,

urbanas. Como pontos comuns entre

intenção em ato, em estética e política

os três, ela destaca a transformação

hibridadas” (LOPES, 2016, p. 41).

“forma-ação,

conteúdo

e

da moradia ao longo do tempo, valores como dos

cooperação envolvidos,

e

cumplicidade

atendimento

das

Acrescenta-se que, além do potencial de

modificação

característico,

esta


prática significa sobretudo um forte

O

perigo

mecanismo de resistência e denúncia

a

desigualdade

de inadequações e disparidades que

autoconstrução exige um olhar que não

transpassam o espaço urbano. Ao

a romantize, distanciando-se de uma

tratar destas disparidades, Ananya

conduta neoliberal que possibilite uma

Roy (2013) ressalta que enquanto

ausência ainda maior do Estado. É preciso

o rico tem ajuda do Estado, resta ao

reconhecer seu potencial, mas sem

pobre a sua própria ajuda. Então, se

deixar de lado suas fragilidades, afinal,

por uma lado a autoconstrução retrata

trata-se muito mais de necessidade do

a capacidade de grande parcela da

que de escolha (KAPP; BALTAZAR DOS

população suprir suas demandas por

SANTOS; MORADO, 2008). A valorização

si, por outro ela evidencia a ausência

da autonomia dos moradores não basta

de esforços institucionais na garantia

se não a apreender como consequência

de

população

direta da posição marginal no sistema

por inteiro. Assim como alertam

econômico e em decorrência da exclusão

Ballegooijen e Rocco:

da arquitetura produzida formalmente.

direitos

A partir

básicos

de

uma

à

de

desconsiderar que

toda

envolve

a

compreensão

Assumindo o relevante papel do poder

progressista e empoderadora de

público na promoção do desenvolvimento

como as bases são capazes de levar

urbano, reafirma-se que, se existe uma

suas vidas com as próprias mãos,

parcela

esta tem se tornado uma ferramenta

demanda por conta própria, é porque a

para

discursos

população

suprindo

sua

que

atuação deste poder tem sido ineficiente,

defendem a rejeição do Estado

não contemplando tal parcela como deveria.

como um articulador válido de

Neste contexto, a solução encontrada

desenvolvimento

neoliberais

da

urbano.5

por ela, apesar de suas vantagens, não necessariamente provê uma condição de

- BALLEGOOIJEN; ROCCO, 2013, P. 1794

5 Tradução

vida satisfatória (MARICATO, 1982).

livre a partir do original: “From a progressive and empowering understanding of how the grassroots are able to take their lives into their own hands, it has become a tool for neoliberal discourses defending the dismissal of the state as a valid articulator of urban development.”

63


AUTOCONSTRUÇÃO E INSEGURANÇAS A falta de conhecimento sobre as reais

alheias ao aparato regulatório podem

condições da produção autoconstruída,

significar expor a vida dos moradores

uma vez que geralmente não há

a

fiscalização ou controle do Estado,

insegurança, sem que haja um controle

vincula

destes

a

ela

uma

invisibilidade,

condições

de

insalubridade

parâmetros.

Como

e

mostra

dificultando a garantia de que atenda

Costa Lima (2017), estas condições

às demandas de seus moradores e

perpassam

que esteja em conformidade com os

(instabilidade

padrões de salubridade. A inadequação

mal

da regulação às diferentes realidades

instalações insuficientes) até o espaço

socioeconômicas

primeiro

urbano (ocupação de espaços públicos,

entrave à produção do espaço dentro

ocupação de áreas ambientalmente

do processo formal; assim, edificações à

frágeis,

margem das normas ou completamente

carroçáveis).

é

um

a

escala

resolvidas,

poucas

da

habitação

estrutural,

plantas

escadas

calçadas

íngremes,

e

vias

Percebe-se, a partir do quadro a seguir, que mesmo tratando-se de uma poderosa ferramenta de ação no espaço, em meio à falta de alternativas 64

para morar, autoconstruir também pode significar submeter-se a diversas inseguranças na tentativa de assegurar um lugar na cidade (COSTA LIMA, 2017). Sob outro olhar, a possibilidade de modifição da produção autônoma, se vista como qualidade, pode ser potencializada com novas alternativas técnicas que considerem-na no lugar de negá-la (KAPP, 2008).


rede de exclusão - invisibilização

atendimento a demandas imediatas e futuras

poder de ação sobre o espaço

administração a partir dos próprios recursos

liberdade de autonomia sobre a moradia

agente de integração socioeconômica

condições de insalubridade e insegurança edificação

instabilidade estrutural plantas mal resolvidas

território

ocupação de espaços públicos ocupação de áreas ambientalmente frágeis

escadas íngremes instalações insuficientes

poucas calçadas e vias carroçáveis

quadro 05. síntese sobre autoconstrução elaborado pela autora

65


partida

narrativas

transiçþes


novos processos

precedentes

partida

referĂŞncias


ENTRE MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS É da prática arquitetônica que esta

permite antever um cenário desejado.

investigação se origina: a investigação

Santos (1988), ao remeter o projeto à

sobre os demais agentes é um breve

origem da palavra, encontra em pro-

percurso que nos possibilita voltar ao

jectus um mote que reitera o constante

início com diferentes perspectivas e

processo de aperfeiçoamento no qual se

vontades. Repensar o projeto pode ser

insere a arquitetura.

um bom começo: O desenho, que se lança antes, baseiaÉ

68

certo

que

nossos

“projéteis”

se em precedentes e anseia materializar

jamais atingirão os alvos em cheio.

um cenário que não necessariamente

Não importa; o fundamental é que

- e muito provavelmente não - será

permitam

contínuas

concretizado, em maior ou menor

feitas por nós e pelos outros, até que

grau. Porém, à medida em que a

se chegue a um consenso sobre o que

cidade é construída, criam-se bases

é mesmo o alvo e sobre a direção em

para avaliação e reformulação desta

que se pode supor que esteja. [...] É

matéria construída, tanto por quem

mais oportuno, portanto, retomar e

elaborou o projeto, quanto por quem

rever linguagens.

o vivencia. Como nos mostra Santos

reavaliações

(1988), é nesta capacidade de avaliação - SANTOS, P. 17, 1988

e aperfeiçoamento que se ampara significativa potência da arquitetura, a

O arquiteto e urbanista tem no desenho

possibilidade de ser flexível o suficiente

uma comunicação própria, uma abstração

para absorver as contribuições de seus

provida de códigos e simbologias que

colaboradores.


69

É preciso aprofundar, no entanto, o

condição

de

autoridade

significado relativo ao desenho quando

do processo como todo, por mais que

inserido no processo da produção

seus produtos se deem principalmente

arquitetônica e, assim como quando

de maneira abstrata (desenhos) e não

implantado no território. O Renascimento

necessariamente

é um recorte temporal onde relevantes

(KAPP; BALTAZAR DOS SANTOS, 2004).

questões deste tema são levantadas:

O estabelecimento desta preponderância

através das formalizações de direitos

e seus reflexos percorrem o canteiro

autorais, o trabalho arquitetônico foi

de obras e o extrapolam, contribuindo

mais claramente vinculado a um trabalho

para a emergência e a manutenção das

intelectual, provendo ao arquiteto uma

desigualdades, aqui exploradas.

concreta,

intelectual

edificada


Em um primeiro momento, o desenho

Através desta centralização do arquiteto

se insere no processo de produção

no processo, compreende-se que em

de

convencionalmente

um primeiro momento ele recebe as

adotado, fragmentado em quatro etapas:

demandas e, durante a concepção, as

demanda,

arquitetura

e

codifica em forma de programa de

uso. Ainda que o arquiteto se debruce

concepção,

construção

necessidades e, posteriormente, de

muito mais sobre uma das etapas, de

desenho. Avançando para a construção,

concepção, sua atribuição como detentor

esses desenhos são decodificados e

do conhecimento o torna mediador

tornam-se matéria construída, com o

entre todas etapas, coordenando os

mínimo possível de interferências. Por

demais agentes e intervindo para que

fim, é entregue para uso um edifício

se concretize o mais próximo do que foi

que provavelmente retrata muito mais

pensado no projeto. Assim, aquilo que

os anseios do arquiteto que do usuário,

contraria ou foge ao desenho perde sua

que fica sem grande liberdade mesmo

validade, é visto como ruído no processo

para modificá-lo ao longo do tempo e

(KAPP; BALTAZAR DOS SANTOS, 2004).

das diferentes demandas.

70

desenho

codificação

demanda

decodificação

concepção

cliente

construção

uso

construtor

cliente

arquiteto

quadro 06. processo de produção de arquitetura convencionalmente adotado elaborado pela autora com base em Kapp e Baltazar dos Santos (2004) e Santos (1988)


Sob esse olhar, o desenho adquire

Porém,

até

centralidade e valida o processo em sua

preponderância

totalidade, tornando-se uma mediação

arquiteto se deu de modo mais

necessária (FERRO, 2006), e o arquiteto,

contido, sobretudo por estar restrita

um articulador do início ao fim. A

aos

fragmentação do processo em quatro

abastadas. Até o surgimento das

etapas fragmenta também os agentes e

metrópoles industriais, as moradias

estabelece uma hierarquia muito clara,

eram

na qual um agente específico detém o

pelos próprios habitantes, artesãos

conhecimento da totalidade e coordena

e oficiais. Frente à industrialização

os demais, que limitam-se a cumprir

e os consequentes crescimento e

sua função em momentos pontuais,

adensamento das cidades, fracassaram

tornando-se muito mais reprodutores

os meios arquitetônicos e urbanísticos

do desenho, sem muito espaço para

tradicionais, abrindo então um maior

intervir:

campo de atuação para o arquiteto.

projetos

o

século do

de

concebidas

XX,

profissional

famílias

e

a

mais

empreendidas

Dentro da divisão do trabalho imposta

É nesta conjuntura que a perda

no canteiro pela manufatura, aparece

de

a figura do arquiteto. A concepção de

sistema de produção capitalista tem

totalidade do produto é entregue a

a produção do espaço incorporada na

ele que, com seu desenho, separa e

mesma lógica, legitimando a produção

segrega os diversos trabalhos. No

arquitetônica

canteiro de obras a fragmentação e a

profissional dotado de conhecimento

hierarquização criam uma ‘pirâmide’

técnico. Por outro lado, reiterando a

que define o grau de acesso a

realidade na qual o mercado formal

informações, partindo do mestre

não é acessível, não se extingue e nem

capacitado a ler os desenhos até

se controla a produção autoconstruída,

os inúmeros serventes que apenas

que permanece no tecido urbano,

transportam cargas sem saber de

desta vez excluída do cenário de

nada.

legitimidade anterior e exposta a

autonomia

condições - ARANTES, 2002, P. 114

de

dos

indivíduos

assumida

por

precariedade

no

um

(KAPP,

BALTAZAR DOS SANTOS, 2004).

71


percentual dos que construíram ou reformaram nunca construiu ou reformou

já construiu ou reformou

46%

54%

imóvel residencial 51%

reformou 31%

imóvel comercial 3%

construiu 20%

3%

percentual dos que utilizaram serviço de arquiteto e urbanista e/ou engenheiro entre os que construíram ou reformaram 72

utilizou

não utilizou

14,60%

85,40%

razões porque não contratou/contrataria serviço de arquiteto e urbanista não contratou, mas contrataria

não contratou e não contrataria

70%

24%

financeiras

45%

46%

não houve/haverá necessidade

38%

19%

outras

23%

37%

quadro 07. parte dos resultados relativos ao diagnóstico sobre arquitetura e urbanismo no Brasil CAU/BR, Datafolha, 2015.


Esta nova lógica que emergiu durante

enxergar

necessidade.

Confirma-se,

o século XX remonta às reflexões sobre

assim, que o serviço de arquitetura ainda

o contexto atual: uma produção formal

é restrito tanto economicamente quanto

inacessível estimula e mantém uma

em termos de conhecimento sobre sua

produção informal, que acontece de

atuação.

maneira precária, com graves prejuízos à população e ao território, gerando o

Kapp e Baltazar dos Santos (2004)

“ciclo vicioso da informalidade urbana”

possibilitam a estruturação de uma linha

(FREITAS; PEQUENO, 2015). Já as

que tem em seu princípio as mudanças

tentativas de reduzir a informalidade

no processo de produção arquitetônica

têm sido em sua maioria inadequadas,

e uma consequente centralização do

não solucionando as demandas às quais

desenho - e do arquiteto - neste cenário.

se propõem e alimentando este ciclo.

Estas mudanças recaem inicialmente sobre o canteiro de obras, até que podem

Em 2015, o Conselho de Arquitetura e

ser percebidas na cidade, conduzindo

Urbanismo do Brasil (CAU/BR) realizou

à

uma pesquisa de nível nacional, a

associada a condições de insegurança

fim de analisar as percepções da

e

sociedade

Os

ao potencial percebido por Santos

resultados obtidos têm enorme relação

(1988), o desenho, a partir dos casos

com

os

sobre

a

profissão.

questionamentos

sobre

manutenção precariedade.

da Em

informalidade contraposição

a

explorados, insere-se em uma relação

preponderância do arquiteto e sua real

na qual a possibilidade de avaliação e

participação na produção do espaço, e

intervenção por uma multiplicidade

confirmam seu alcance restrito. Entre

de agentes perde espaço à medida em

os mais de 50% entrevistados que já

que o arquiteto adquire maior poder no

construíram ou reformaram, apenas

processo (KAPP, 2008). Este maior poder

15% utilizaram serviço de arquiteto e

adquirido, no entanto, não se reflete

urbanista e/ou engenheiro (no caso da

em maior atuação no território, pelo

região Nordeste, em específico, esse

contrário: o serviço de arquitetura ainda

valor cai para 7%). Já entre os 85% que

se mostra profundamente restrito para

não utilizaram, é interessante ressaltar

as variadas realidades socioeconômicas,

que o principal motivo levantado é de

distante de onde recaem suas maiores

cunho financeiro, e o segundo, por não

demandas.

73


TRAJETÓRIAS O percurso realizado até

aqui nos

arquiteto torna-se um ponto-chave no

abre o olhar para perceber que as

processo, compreendido como o agente

atuações estudadas - e suas linguagens

que tem a competência necessária

materializadas no espaço - perpassam o

para a elaboração dos projetos nos

mesmo território e, junto a elas, tantas

moldes “ideais” e, teoricamente, de

outras linguagens que influenciam e

maior

se deixam influenciar, compondo a

bagagem técnica e formal que carrega

multiplicidade que é o espaço urbano.

consigo. Assim, cabe a ele identificar as

Tal

necessária

necessidades e realizar todo o projeto

para desvincular a matéria edificada

para o usuário, que perde quase que

necessariamente a uma só linguagem:

integralmente seu poder de decisão

talvez estes momentos de confluência

sobre o próprio espaço.

percepção

se

faz

qualidade,

diferenciado

pela

enriqueçam nosso tecido urbano e tragam novos discursos e materialidades

Esta

ruptura,

como

se

viu,

não

à cidade, sem o propósito de negar as

extingue e nem controla a produção

múltiplas linguagens em defesa de uma

autoconstruída, mas a exclui do cenário

só, mas de equilibrá-las.

de legitimidade anterior, expondo-a a condições de precariedade (KAPP,

74

Entretanto, os momentos de confluência

BALTAZAR DOS SANTOS, 2004). Nestas

são poucos quando comparados aos

condições sobrevivem as favelas, os

conflitos, diante de um contexto em

cortiços, as ocupações, os loteamentos

que só uma arquitetura é reconhecida:

informais, tantas denúncias da atuação

aquela em conformidade com o aparato

fragmentada dos agentes e como esta

regulatório e em moldes específicos,

fragmentação não tem sido, na prática,

por mais

a melhor resposta.

inacessível

que

seja.

O


75

O espaço perde por ora a condição somente de abrigo, vai além, torna-se um forte instrumento de comunicação e expõe em tantas ruas, em tantos bairros, que a multiplicidade do espaço não pode se resumir a apenas uma de suas linguagens: ela não é capaz de conter as demais. É desse pensamento que se estrutura a intenção de entender as convergências entre as diferentes linguagens.


Traçados o contexto e a problemática

qualquer conhecimento em detrimento

enfrentada, é delineado um cenário

dos demais, considerando sua validade

desejado e, no decorrer do processo,

particular no contexto em que se

estruturam-se maneiras que intentam

originou. A superioridade de um saber

alcançá-lo. A centralização do arquiteto

perde então seu vínculo necessariamente

nesta abordagem, ciente do emaranhado

a um nível de institucionalização e

de outros agentes que compõem este

profissionalização,

tema,

desconsiderar

contribuição programática a práticas

responsabilidade

específicas. Desta maneira, será possível

ou

não

pretende

reduzir

uma

e

de qualquer um destes, mas tenta

entrelaçar

compreender como estruturar novos

para promover práticas sociais:

processos

que

partam

da

diferentes

migra

para

conhecimentos

prática

arquitetônica e se direcionem a este

Este descentramento dos saberes

cenário.

é fundamental para que a ecologia dos saberes atinja os seus objectivos:

Esta reflexão encontra coerência na

a promoção de práticas sociais

ecologia

eficazes e libertadoras a partir da

saberes,

desenvolvida Santos

interpelação cruzada dos limites e

(2009). Pautada sobretudo em uma

das possibilidades de cada um dos

ressignificação

saberes em presença.

por 76

dos

se

Boaventura

em

dos

um

desconstruir

de

Sousa saberes,

primeiro a

busca-

momento

superioridade

de

a

- SANTOS, B., 2009, P. 473


Para o autor, o terreno para a ecologia

algumas divergências foram reveladas,

dos saberes é o da vida prática: a ecologia

mas também pontos de encontro dos

dos saberes acontece na artesania das

quais podem emergir novos processos,

práticas, onde se planejam ações e se

nossa intenção inicial.

pesam oportunidades, riscos, prós e contras. O espaço urbano, no nosso

Surge

a

necessidade,

estudo, torna-se campo de experimentos,

investigar

base onde conhecimento técnico e

encontro, momentos em que diferentes

popular tecem novos conhecimentos,

linguagens dialogam. Para isso, o mutirão

desta vez sem conotação de formal ou

autogerido, o Minha Casa Minha Vida

informal, válido ou não.

Entidades e a Lei da Assistência Técnica

os

possíveis

portanto,

de

pontos

de

e programas de concessão de subsídios Assim, voltamos ao discurso de Carlos

são práticas cujo aprofundamento trouxe

Nelson Ferreira dos Santos quanto ao

aspectos relevantes, sejam positivos

potencial de retomar e rever linguagens

ou negativos, para a proposta que se

a partir do desenho. Em consonância

delineia.

com a ecologia dos saberes, ele ressalta a necessidade de “encontrar os meios para fazer com que conhecimento popular e erudito se encontrem e dialoguem” (1988, p. 17). Nesse sentido, ao olhar para as diferentes produções habitacionais,

77


DIÁLOGOS MUTIRÃO AUTOGERIDO: ENTRE ATO E POLÍTICA A estruturação do mutirão autogerido

diferente. Primeiro, como já vimos,

deriva dos questionamentos sobre as

por introduzir a política e romper

contradições do canteiro de obras. De

o “círculo de ferro” que isolava a

maneira programada (FERRO, 2006), a

reprodução da classe trabalhadora.

ruptura entre arquiteto e canteiro faz do

Segundo, porque estabelece uma

desenho uma mediação fundamental.

nova relação de produção, sem

Cabe ao arquiteto o domínio do projeto,

patrões e alienação. Terceiro, porque,

seguido de uma hierarquização onde

auxiliado

os operários apenas seguem ordens

restituir um saber e uma estética,

sem que tenham consciência de sua

permitir o “engenho programado e

participação no processo. A edificação

escolhido” e assim uma “poética da

vira mercadoria.

economia” que extraia dos poucos

por

arquitetos,

quer

recursos o máximo arquitetônico.

78

A autoconstrução, por outro lado,

Nesse caso, o desenho volta a ser

permite novamente este encontro ao

fundamental, não como abstração-

materializar no espaço um “valor de

alienação, mas como instrumento de

uso” que suprirá as necessidades de

um projeto coletivo.

quem tanto desenhou quanto construiu a edificação, ainda que viabilizada em

- ARANTES, 2002, P. 191

tantos casos por um trabalho não remunerado. No entanto, está sujeita

A Usina CTAH (centro de trabalho para

a

e

o ambiente habitado) há quase 30

inadequações. Um outro ponto de

anos tem voltado-se para experiências

encontro seria possível através do

sociais, espaciais, técnicas e estéticas,

mutirão

viabilizadas através da autogestão. Sua

precariedades,

insalubridades

autogerido,

como

explica

Arantes:

atuação perpassa planejamento, projeto e

construção,

englobando

também

Tal como a autoconstrução, o mutirão

o contato junto ao poder público na

autogerido é reencontro, uma vez

mobilização de fundos, estimulando uma

que o mutirante é ao mesmo tempo

maior preponderância das comunidades

autor, produtor e futuro usuário,

neste processo, utilizando-se de práticas

mas pretende ser um reencontro

alternativas e contra-hegemônicas.


figura 07. uniĂŁo da juta: conjunto de 160 unidades habitacionais e centro comunitĂĄrio acervo usina ctah

79


O mutirão autogerido, porém, não está

O trabalho não pago dos mutirões,

alheio a tender para certos aspectos

abordado logo antes, diz respeito à

do canteiro tradicional, ao qual se

sobreacumulação de capital, ou seja,

contrapõe. As práticas vivenciadas na

uma situação na qual o empregador

Usina enfrentam questões de teor mais

reduz o custo da moradia na previsão de

prático, tais como prazo, sobreposição de

salário de seu empregado, que recorre

lideranças e isenção de responsabilidades,

à autoconstrução como uma maneira

que inevitavelmente surgem no decorrer

de suprir esta demanda dentro do seu

da obra. Além disso, nem todos os

poder aquisitivo (FERRO, 2006; LOPES,

mutirões atingiram o processo desejado,

2006).

contemplando um desenho democrático e qualidade espacial desejada.

Chico de Oliveira (2005) traz a questão da sobreacumulação como um ponto

80

Infelizmente, ao envolver poder público,

chave para as contradições do mutirão:

assistência técnica e mutirantes, é

ao invés de solucionar o problema

necessário um grande empenho por

habitacional pelos meios do capital, ou

parte dos três que possibilite ultrapassar

seja, combatendo a sobreacumulação, ele

as

urgentes,

o soluciona por meio dos trabalhadores,

adentrando em aspectos mais estruturais

necessidades

mais

ao propor o mesmo trabalho não

do processo. Na escala urbana, ainda

remunerado. Além disso, a produção

há o desafio de incorporar o mutirão à

voltada ao valor de uso e executada por

cidade, expandindo-se para além de suas

seus próprios moradores inviabiliza,

próprias fronteiras (ARANTES, 2002).

para ele, um mercado imobiliário, que fica restrito à classe média.

Deste modo, o mutirão autogerido não está resguardado de certas contradições.

Lopes (2006) e Ferro (2006), por outro

Chico de Oliveira (2005), João Marcos

lado, levantam pontos distintos sobre a

Lopes (2006) e Sérgio Ferro (2006)

autogestão, primeiramente ao deslocar o

constroem

debate,

foco do produto (objeto construído) para

questões

o processo, ressaltando as mudanças

um

evidenciando deste processo

importante

importantes

estruturais possíveis pela autogestão,


em concordância com Arantes (2002).

A migração de ação política para

Posteriormente, os autores admitem a

programa, abordada por Lopes, abre

viabilidade de um mercado imobiliário

caminho para aprofundar o Programa

no contexto de autoconstrução, também

Minha Casa Minha Vida Entidades

percebido por Abramo (2009).

(PMCMV-E),

uma

modalidade

do

PMCMV. O programa foi uma conquista A transição entre os ideais do mutirão

de

autogerido para suas práticas é outro

populares,

cenário que levanta questionamentos

autogestionárias

e contradições. Lopes (2006) ressalta

recursos do programa.

o

modo

como

questões

reivindicações

dos

englobando na

movimentos as

práticas

provisão

de

práticas,

tais como as diferentes prioridades

A diferenciação desta vertente para

entre arquitetos e construtores e as

o

dificuldades da rotina, geram conflitos e,

participação

de

de certo modo, abrem espaço para um

associações

e

esgotamento das concepções originais:

governamentais (ONG’s), que tornam-

programa

tradicional

está

entidades, organizações

na

como não

se responsáveis pela viabilidade dos Parece que é no momento em que

empreendimentos, gerindo o dinheiro

a “ação política” vira “programa”

público e todo o processo, nas esferas

que seu conteúdo político se esvai,

jurídica, de engenharia e social, frente

transformando o que era ação em

ao órgão financiador. Dessa forma,

pura ação instrumental.

o PMCMV-E representa um passo importante de inserção das entidades no

- LOPES, 2006, P. 225

processo da produção de HIS.

Ainda assim, a vivência autogestionária

Apesar da relevância já mencionada,

torna-se

fundamental

sua aplicação teve caráter limitado,

(ARANTES, 2002), uma vez que permite

destinando apenas 1,85% (ou 60.000

o enfrentamento destas questões - e de

unidades) dos empreendimentos a esta

outras não previstas -, aprimorando o

modalidade, comparado à produção

processo para o que há por vir.

total.

um

ponto

81


figura 08. fase 1 do residencial luiz gonzaga, no bairro ancuri, em fortaleza: o maior do pmcmv-e no paĂ­s (3.520 UH; em obras) acervo pessoal

82


Nesta

modalidade,

Organizadoras

(EO)

as

Entidades

passam

em cinco contratos, abrangendo três

por

entidades: Cearah Periferia, Habitat para

requerimentos similares aos das empresas

a Humanidade e Federação de Entidades

do mercado formal de construção civil, em

de Bairros e Favelas, e duas construtoras.

termos jurídicos e financeiros, impondo às entidades uma adequação para que

A visita ao empreendimento esclareceu

participem do programa, incoerente com

mais sobre o desenrolar do processo

sua realidade. De certo modo, o PMCMV-E

no

foi um distanciamento do que se propunha

dos engenheiros da obra, o trabalho é

no mutirão autogerido no sentido de não

dividido em dois focos: a construção e o

respeitar as particularidades da prática

trabalho social. Este segundo é realizado

autogestionária, como explica Teixeira:

por meio do Programa Técnico Social

empreendimento.

Segundo

um

(PTS), que se dá por oficinas, reuniões Um programa habitacional voltado

e visitas às obras com os futuros

para Entidades com a autogestão,

moradores, mensalmente. Além disso, os

com ou sem mutirão, deve ser

beneficiários compõem dois conselhos, o

específico e estar de acordo tanto

CAO (Conselho de Acompanhamento de

com

produzidos

Obra) e o CRE (Conselho de Representação

(atendimento a famílias com perfis

os

produtos

do Empreendimento). Inseridos nestes

diferenciados) quanto ao processo

conselhos, participam dos processos

de produção autogestionário (tempo

decisórios relativos às obras e à alocação

de construção, reajustes adequados),

dos recursos.

que não se equiparam ao modo de produção do mercado formal da

A experiência na obra, no entanto,

construção civil.

não

revelou

tantas

diferenças

do

canteiro tradicional. As plantas das - TEIXEIRA, 2018, P. 27

unidades seguem o padrão dos outros empreendimentos do MCMV, com blocos

O

desta

H, bem como métodos construtivos

modalidade, o residencial Luiz Gonzaga,

maior

empreendimento

semelhantes. No canteiro, trabalham

localiza-se em Fortaleza, no bairro Ancuri.

funcionários contratados pelas próprias

A primeira fase, de 1.760 UH, é dividida

construtoras.

83


BLOCOS DE APARTAMENTOS - 1:500 UNIÃO DA JUTA USINA CTAH

RESIDENCIAL LUIZ GONZAGA MCMV-E

2,5 0 2,5 5

10m

PLANTA UNIDADE - UNIÃO DA JUTA - 1:75 0,5

área de serviço

0

0,5

84

banheiro cozinha

sala de estar

circulação

quarto 1

quarto 2

1

2m


A

comparação

entre

as

unidades

um comparativo mais claro: no União

habitacionais propostas esclarece outras

da Juta, percebe-se cômodos espaçosos,

questões acerca da transição de ação

amplas aberturas e separação entre

para programa político. O União da Juta,

diferentes funções das áreas de serviço.

construído pela Usina junto aos mutirantes,

O Residencial Luiz Gonzaga, por outro

apresenta unidades que variam entre 63 e

lado, apresenta restrições de espaço, que

68m², enquanto a unidade do Residencial

também restringem as disposições dos

Luiz Gonzaga, com mesmo programa de

móveis a poucas opções. As aberturas são

necessidades, apresenta uma diferença de

menores e, em alguns momentos, entram

20m², com aproximadamente 44m² de

em conflito com o layout proposto. Por fim,

área.

principalmente na área de serviço e na sala de estar, nota-se um conflito com o

Através da inserção de mobiliário de

mobiliário, como se vê na mesa de jantar e

mesma medida nas duas plantas, é possível

na área de serviço, que fica junto à cozinha.

PLANTA UNIDADE - RESIDENCIAL LUIZ GONZAGA - 1:75 0,5

0

0,5

1

2m 85

área de serviço cozinha

sala de estar

banheiro circulação

quarto 1

quarto 2


figura 09. fase 1 do residencial luiz gonzaga, no bairro ancuri, em fortaleza: o maior do pmcmv-e no país (3.520 UH; em obras) acervo pessoal

86

A experiência do MCMV-E em Fortaleza,

caminho para reinventar o processo

portanto,

gradativamente,

evidencia

um

relativo

partindo

do

olhar

descolamento do que se propunha nos

crítico ao que foi realizado, para então

ideais do mutirão autogerido, assim

aprimorá-lo:

como mostrou Lopes (2006), com produtos similares ao que é visto no

É

MCMV, diferenciando-se apenas pela

percorrido, verificar as reduções e

gestão por entidades e pelas pontuais

sínteses equivocadas, olhar melhor para

participações dos beneficiários. No

a lacuna entre oposições irredutíveis e

entanto, o mesmo autor permite uma

reinventar a própria ação.

reinterpretação a

inserção

deste de

necessário

aclarar

o

caminho

pensamento:

entidades

abre

- LOPES, 2006, P. 226


ASSISTÊNCIA TÉCNICA: APROXIMAÇÃO POR SUBSÍDIOS De maneira mais individualizada, o

Mesmo 10 anos após o decreto da lei, sua

esforço para aproximação do arquiteto

concretização tem se dado de maneira

à população não amparada por seus

pontual. Em Fortaleza, por exemplo, sua

serviços tem como um de seus produtos

aplicação tem ocorrido sobretudo dentro

a Lei da Assistência Técnica (Lei nº

da universidade, por meio de escritórios

11.888/2008) que, como parte da

modelo e de tecnologia social (ETecS)

garantia do direito à cidade, assegura

e por algumas entidades, sem grande

o acesso à assistência técnica pública

abrangência de profissionais atuantes

e gratuita a famílias com renda de até

no mercado.

três salários mínimos, para o projeto e a construção de habitação de interesse

São então os programas de subsídios

social, com financiamento público.

que, nesta conjuntura, podem fomentar a procura pela assistência técnica.

O reconhecimento do poder público

A sanção da lei que institui o Cartão

do

do

Reforma (Lei nº 13.439/2017) prevê

mercado formal, diante da discrepância

serviço prestado por arquiteto como

das

fração

difícil

acesso

condições

aos

padrões

socioeconômicas

da

do

subsídio

fornecido,

de

população, é um grande passo para

R$5.000,00, destinado a investimentos

democratização deste mercado, mas

em habitação para conclusão, ampliação

vale ainda compreender seus moldes.

ou reforma.

Baltazar e Kapp (2016), ao distinguir assistência de assessoria, evidenciam

No sentido inverso às políticas de provisão

como uma postura assistencialista pode

habitacional, o apoio governamental

abrir margem para uma relação de

por subsídio dá mais autonomia aos

dominação, na perspectiva de encaixar

beneficiários, que decidem de que

as pessoas em necessidades e padrões

maneira alocar os recursos, sem ter que

pré-estabelecidos

presta

moldar-se a padrões estabelecidos. No

assistência. Em contramão, a assessoria

por

quem

entanto, este tipo de programa tem se

assume a relação assimétrica entre os

dado muito mais no âmbito da melhoria

agentes envolvidos, mas busca realizá-la

habitacional, sem exemplos expressivos

sem dominação.

na construção de moradias.

87


partida

narrativas

transiçþes


novos processos

precedentes

partida

referĂŞncias


QUESTIONAMENTOS Compreender o espaço urbano a partir

à confirmação da grande lacuna entre

dos diversos agentes que o compõem

estes dois cenários.

tem trazido inseguranças, de certo modo. Inseguranças por perceber a

Diante desta lacuna, anseios para um

imposição do arquiteto e as limitações

novo cenário começam a dar-lhe forma:

que decorrem deste posicionamento.

busca-se uma prática arquitetônica

Surge então uma dúvida de até onde

mais

propor, a partir de quando não intervir.

parcela da população que alcança, da

abrangente,

em

termos

da

participação dos usuários no processo e

90

A partir de algumas conclusões com base

dos aperfeiçoamentos que comporta. Ao

na própria vivência na cidade, e agora

buscar uma abordagem possível para

também pela investigação teórica, tem

esta problemática, não se pretende negar

sido cada vez mais clara a percepção das

outras abordagens, muito menos propor

diversas inadequações que perpassam o

uma solução definitiva: isso nos faria

espaço, e como a produção reconhecida

contradizer todo o aprendizado exposto

não tem significado necessariamente a

aqui. Ora, se estamos em um ponto

garantia do cenário otimista esboçado

inicial, cientes de nossas limitações, e

pelo Estatuto da Cidade. Na verdade,

sabemos onde queremos chegar, existe

podemos agora afirmar que, mais do

um caminho a ser trilhado entre um

que assegurar boas condições do espaço,

ponto e outro. As investigações deste

a formalidade em arquitetura tem

trabalho intentam, portanto, percorrer

sobretudo sustentado uma disparidade

caminhos,

muito clara.

delinear respostas ao cenário traçado.

investigar

possibilidades,

São, portanto, uma transição: É díspar, assim, o cenário que se pretendemos chegar frente ao cenário

Se é preciso criar uma cultura

que vivenciamos

hoje.

arquitetônica

questionamentos

sobre

Diante

dos

processo,

arquitetos

comum e

mutirantes,

entre ela

dimensões distintas foram levantadas: o

deve ser francamente debatida e

processo de produção da arquitetura, o

experimentada até consolidar um

processo de participação dos usuários, o

novo imaginário do que seja o habitat

processo de constante aperfeiçoamento

popular numa grande cidade.

da arquitetura, do projeto ao uso. Estes questionamentos têm nos conduzido

- ARANTES, P. 209, 2002


Esta

reflexão

nos

permite

trazer

novamente o pensamento de Santos (1988), quando afirma que, ao mirarmos o alvo, não o acertaremos em cheio. Seria muita presunção assumir o projeto aqui apresentado como uma solução única: mais do que isso, busca-se desconstruir este pensamento em detrimento de uma proposta em constante processo de

91

avaliação e aperfeiçoamento, que permita novos

processos.

Esta

proposição,

ainda, não significa negar os processos atuais. Como mostra Boaventura de Sousa Santos (2009), é o cruzamento entre diferentes conhecimentos que nos permite promover práticas sociais efetivas e libertadoras.

As inseguranças, aos poucos, dão lugar a hipóteses, pequenas ideias que começam a clarear dúvidas, fechar raciocínios, visualizar possibilidades.


DECISÕES COMPARTILHADAS Diversos agentes permeiam o território

uma rede de exclusão e invisibilização, a

e o produzem e organizam por meio da

autoconstrução submete os moradores

materialidade construída. A abordagem

a condições de precariedade, presentes

por diferentes narrativas permitiu a

da escala do território à arquitetônica,

visualização de potenciais e limitações

e reforçadas com a existência de um

relativos a cada um, expostas a seguir.

mercado informal.

Da produção convencional ou formal,

A partir do que foi levantado, é possível

inicia-se pelo Estado que, através

inferir que, mesmo compreendendo

das

tem

processos distintos, tanto a produção

investido recursos volumosos no setor

políticas

convencional quanto a não convencional

habitacional (apesar de reduzidos nos

têm

últimos três anos), exemplificado pelo

moradores a condições inadequadas.

programa Minha Casa Minha Vida, de

Um ponto chave neste pensamento a

nacional6.

abrangência

92

habitacionais,

submetido

parcela

de

seus

No entanto,

ser evidenciado é que, embora ambas

como se viu, tal produção habitacional

gerem inadequações, estas ocorrem por

têm se mostrado inadequada, desde

razões distintas: entende-se aqui que

a inserção urbana às condições das

o Estado e o mercado formal possuem

unidades. O mercado formal, por sua

recursos para investir em moradia,

vez, ao priorizar o lucro também põe

mas não têm voltado suas propostas às

em risco a adequação da moradia às

reais demandas da população; por outro

demandas das famílias.

lado, os autoconstrutores têm maior poder de decisão sobre a habitação,

Por outro lado, a produção autoconstruída

porém, por motivos como a falta de

representa um importante poder de

conhecimento técnico e dificuldade de

decisão

(LAMOUNIER;

acesso a recursos, esta produção não

NASSIF SALOMÃO, 2016), por meio

no

espaço

necessariamente tem ocorrido em boas

do qual os autoconstrutores moldam

condições.

o espaço às suas reais necessidades, garantindo

ainda

possibilidades

de

O

quadro

a

seguir sintetiza

este

adequações futuras, por alterações ou

raciocínio e permite a visualização de

expansões. No entanto, inserida em

que há uma relativa complementaridade

6 No

período entre 2009 e 2015, foi aplicado um investimento superior a R$ 244 bilhões no PMCMV, relativos a mais de 3,76 milhões de moradias contratadas, segundo a Secretaria de Governo da Presidência da República. Disponível em: <http://www.secretariadegoverno.gov. br/iniciativas/internacional/fsm/eixos/inclusao-social/minha-casa-minha-vida>. Acesso em: 21 jun. 2018.


entre os dois agentes. Assim, a proposta

entre agentes que constroem o espaço

parte da ideia de que Estado e mercado,

e agentes que decidem, em coerência

aplicando seus recursos em edificações

com a divisão entre suporte e recheio, de

de cunho genérico, podem prover

Habraken (2000). Para ele, esta divisão

melhores condições à população de

no edifício estabelece uma relação

moldar o espaço interno à sua maneira,

intrínseca com os níveis de decisão:

a partir das suas demandas individuais,

enquanto o recheio é decidido com base

a custos mais baixos e a condições

na vivência individual, a decisão dos

mais adequadas do que no cenário de

suportes é coletiva. Suporte e recheio

autoconstrução. Para isso, propõe-se

não

inicialmente um processo decisório

a quem constrói o espaço e, como

compartilhado, de modo que diferentes

esclarece Lamounier (2017), também

agentes participem em um mesmo

não referem-se necessariamente ao

processo somando suas potencialidades,

uso (coletivo e individual), mas ao

diferindo da separação anterior.

controle sobre o espaço. O processo de

necessariamente

correspondem

decisão compartilhado entre os agentes O reconhecimento de mais de uma

resulta, portanto, da noção quanto à

agente decisor sobre o espaço se dá por

importância do controle sobre o espaço,

um entendimento inicial da distinção

independente da construção e do uso.

maior disponibilidade de recursos

inadequações às diferentes demandas dos moradores

provisão convencional/formal provisão não convencional/informal

inseguranças devido à dificuldade de acesso a recursos

respostas individualizadas

quadro 08. complementaridade entre a produção convencional/formal e a não convencional/informal elaborado pela autora

93


FRAGMENTAÇÃO E FLEXIBILIDADE A divisão da edificação em genérico e

migra do edifício como todo para o uso

específico (a partir de suas demandas)

do edifício no tempo (LAMOUNIER,

encontra coerência na flexibilidade. Para

2017).

isso, o aprofundamento na composição do edifício apresenta-se como uma

Frank Duffy, arquiteto especializado

maneira inicial para posterior atribuição

em projetos de escritórios, desenvolveu

dos agentes no que tange a demandas e

uma categorização apoiada no tempo

potencialidades.

de depreciação do setor de escritórios. Por esta lógica, ele dividiu a edificação

Bernard Leupen (2006), ao investigar

em quatro camadas, ou 4s: casca (shell),

as relações entre frame7 e espaço

serviços

genérico, opta por uma ferramenta de

e conjunto (set). Em sua divisão, é

classificação que permita a análise desta

estabelecida uma relação inicial entre

relação. Assim, ele divide os elementos

as camadas e um tempo de vida útil

do

referente a cada uma.

edifício

em

grupos,

chamados

(services),

cenário

(scenery)

camadas. Outras divisões em camadas

94

já foram feitas: no nosso caso, destacam-

Stewart Brand desenvolve uma divisão

se as divisões de Frank Duffy, de Stewart

similar a partir do seu trabalho com

Brand e de Leupen.

reforma de edifícios, expandindo a divisão de Duffy: o edifício passa a ser

As

Brand,

compreendido em seis camadas, ou 6s,

estruturadas durante a década de

divisões

de

sendo terreno (site), estrutura (structure),

90, pautam-se na noção de que o

pele ou fachada (skin), serviços ou

edifício não compreende um todo: ele

instalações (services), planta (space plan)

abrange, na prática, diversas camadas

e objetos (stuff). Assim como Duffy, ele

de

atrela tempos de vida útil às camadas,

longevidade

Duffy

de

e

componentes

construídos. Assim, o objeto de estudo

destrinchados em um esquema.

quadro 09. sistema de camadas 6s estruturado por Stewart Brand elaborado pela autora com base em BRAND, 1994, apud. LEUPEN, 2006; LAMOUNIER, 2017 7 Em

seu livro Frame and Generic Space, Leupen explora uma relação na qual o permanente (ou frame) dá condições para que ocorram mudanças no espaço que delimita, sendo este espaço mutável denominado espaço genérico. Para evitar confundir os termos, optou-se por manter o termo frame e não traduzi-lo para estrutura, por exemplo.


“shearing layers of change”

(fragmentação das camadas mutáveis) em consequência dos diferentes períodos de mudança dos componentes, o edifício está em um processo constante de fragmentar-se.

objetos 1 dia - 1 mês objetos não arquitetônicos; mobiliário

planta 3 - 30 anos layout interior: paredes, forros, pisos, portas, etc.

serviços 7 - 15 anos instalações, cabeamentos, tubulações compreende escadas e elevadores

pele 20 anos superfícies exteriores

estrutura 30 - 300 anos fundações e elementos portantes

terreno eterno configuração geográfica, localização urbana e o terreno legalmente definido (lote)

95


serviços (instalações) suprimento e descarga de água, energia, informação, ar etc.

estrutura (sistema estrutural) o que transmite a carga ao chão

pele (fachada) o que separa dentro e fora

96

cenário (paredes e acabamentos) organiza o espaço interno

acessos (escadas, elevadores etc) garante acesso dos espaços coletivos e individuais

quadro 10. sistema de camadas proposto por Bernard Leupen elaborado pela autora com base em Leupen (2006)


Destaca-se das divisões de Duffy e Brand

A partir do levantamento de diferentes

a relação entre flexibilidade e tempo

sistemas de camadas, a convergência

de vida útil: interpreta-se neste estudo

das abordagens de Brand e Leupen

que, para além da compreensão da

embasa a proposta de um sistema que

flexibilidade como potencial de adequação

reconheça diferentes tempos atrelados

do edifício ao longo dos anos (e dos usos),

às camadas, bem como as articule sob

esta contempla também a percepção

uma lógica de diferenciação entre fixo

dos diferentes períodos para demandas

(frame) e mutável (espaço genérico). Não

dos componentes construtivos, como

incluindo a camada de objetos, de Brand,

manutenção ou modificações.

e reiterando a camada de acessos, adotase um sistema de seis camadas: terreno,

Leupen posteriormente desenvolve um

estrutura, pele, planta, serviços e acesso.

sistema em camadas propondo uma adição que compreenda os edifícios

Acrescenta-se, em seguida, a separação

de

contemporâneos:

entre coletivo e individual abordada

acrescenta-se a camada de acessos, dada

apartamentos

anteriormente e embasada por Habraken

a importância de escadas, corredores,

(2000): o coletivo pode ser interpretado

elevadores e galerias nestas edificações.

como um frame, e o individual, como

Assim, ele chega em um sistema de

espaço genérico.

97

cinco camadas, que abrange estrutura, pele, cenário, serviços e acessos.

Assim,

uma

atribuição

preliminar

começa a estruturar o edifício. O frame, Para o autor, uma camada torna-se

de uso coletivo, pode compreender

frame quando provê liberdade à camada

terreno, estrutura e acessos (os mais

que enquadra, que se torna espaço

duráveis e, de certo modo, menos

genérico. Por consequência, é o projeto

mutáveis). Já o espaço genérico passa a

do fixo (frame), que abre espaço para que

abranger planta, serviços e pele (mais

mutável, ou o imprevisível, aconteça.

passíveis de modificações).


processo decisório compartilhado

coletivo suporte frame estrutura genérica provido pelo estado

individual recheio espaço genérico demandas específicas desenvolvido pela população

terreno estrutura acessos

98

quadro 11. incorporação do sistema de camadas ao processo decisório compartilhado elaborado pela autora

planta serviços pele


serviços e pele. No entanto, a citada

disponibilidade de recursos como um

divisão

forte condicionante em relação às suas

total não contempla o terreno, que

contribuições na construção. Assim,

empiricamente podemos afirmar que

buscou-se compreender de que modo

significa um custo considerável. Esta

estes recursos seriam alocados no

informação foi encontrada no trabalho

processo, divididos pelas camadas.

de Maciel (2013), que divide os valores

Mascaró (2014) elaborou em uma

relativos

tabela a participação de cada elemento

imobiliário,

no custo total de uma edificação

terreno e os diversos agentes que

residencial,

A

participam deste processo (investidor,

elementos

construtor, corretor e arquiteto)8. Para

foram alocados conforme as camadas

os fins do nosso estudo, a porcentagem

adotadas. Como não havia elementos

dos

vinculados diretamente à camada de

e

acessos, somado ao fato de que ela

compreender terreno e construção.

em

porcentagem.

partir desta tabela,

os

a

dos

a

agentes

elementos

um

no

empreendimento

incluindo

não

custo

foi

construção,

a Belo Horizonte. Devido às restrições de acesso a esse tipo de informação, não foram encontrados dados relativos à cidade de Fortaleza.

A abordagem dos agentes revelou a

8 Os valores adotados nesta tabela são referentes

CAMADAS E RECURSOS

considerada,

porcentagem total

passou

a

está sendo interpretada como coletiva, necessariamente, optou-se por não

Como resultado, a partir da divisão

incluí-la nesta categorização.

inicial entre terreno e construção, incorporamos também as porcentagens

A

em

relativas às demais camadas, incluídas

quatro camadas e suas respectivas

divisão

resulta,

portanto,

na porcentagem total referente à

porcentagens:

construção, que se encontram a seguir:

estrutura,

planta,

99


participação de cada elemento (%) no custo total da obra edifício padrão simples sem elevador fundações estrutura telhado alvenarias

6,55% 17,45%

estrutura

5,91% 10,95%

pisos

6,55%

pintura

5,02%

instalações elétrica e telefônica

6,62%

instalações sanitária e de gás

8,12%

aparelhos sanitários

4,30%

aberturas

8,20%

revestimentos externos

6,10%

vidros

1,54%

revestimentos internos

8,28%

instalações provisórias

2,82%

acabamento e outros

1,59%

planta

serviços

pele

desconsiderado

100

proporção de valores relativos em um empreendimento imobiliário em Belo Horizonte, MG (2010) arquiteto

0,39%

corretor

8,00%

construtor

9,00%

investidor

35,80%

terreno

21,21%

obra

60,40%

desconsiderado

total terreno + obra

quadro 12. valores em percentual dos elementos construtivos na obra9 e do empreendimento como todo Mascaró (2014) e Maciel (2013) 9 Instalações provisórias e acabamento foram desconsiderados por não remeterem a nenhuma camada,

especificamente. Já os revestimentos internos não foram incluídos, assumindo que as áreas molhadas podem conter apenas aplicações pontuais destes revestimentos, reduzindo consideravelmente este percentual.


participação de cada elemento considerando obra e terreno edifício padrão simples sem elevador terreno

terreno 26%

26,00%

fundações

5,55%

estrutura

14,79%

telhado

5,01%

alvenarias

9,28%

pisos

5,55%

pintura

4,26%

instalações elétrica e telefônica

5,61%

instalações sanitária e de gás

6,88%

aparelhos sanitários

3,65%

aberturas

6,95%

revestimentos externos

5,16%

vidros

1,31%

estrutura 25,35%

planta 19,09%

construção 74%

serviços 16,14%

pele 13,42%

101

divisão final vinculando valor em porcentagem às camadas adotadas terreno 26%

construção 74% estrutura 25,35%

planta 19,09%

serviços 16,14%

pele 13,42%

quadro 13. valor em porcentagem do sistema de camadas na construção elaborado pela autora com base em Mascaró (2014) e Maciel (2013)


flexibilidade planta serviços

pele

estrutura

102

terreno pele

serviços

planta

estrutura

quadro 14. cruzamento das informações dos sistemas de camadas e seus custos na obra elaborado pela autora com base em Leupen (2006), Mascaró (2014) e Maciel (2013)

custo terreno


PROPOSIÇÕES INICIAIS A abordagem do edifício em camadas

uma etapa de decisão coletiva, de modo

nos permitiu, em um primeiro momento,

a elaborar um produto maior e sem

desconstruir a percepção dele como

especificidades, seguida de uma etapa

um todo, mas como um conjunto de

de decisão individual, na qual o produto

elementos construtivos. Em seguida, foi

da etapa anterior atua como frame e

possível entender que este se insere em

possibilita aos agentes moldar o espaço

um processo constante de modificação,

interno conforme suas demandas e

que ocorre em períodos diferentes, a

preferências específicas.

depender das camadas. Os momentos de decisão coletivo e Relacionar a abordagem em camadas

individual também estabelecem relação

com o custo delas na construção

com a escala: enquanto coletivamente

possibilita uma outra compreensão

são decididas questões como a inserção

acerca

Quando

urbana e a articulação dos módulos

cruzamos os percentuais obtidos com

(edifício), individualmente são tratadas

a longevidade estabelecida por Stewart

as unidades habitacionais. Assim, o

Brand, conclui-se que elementos que

passo seguinte foi estabelecer uma

possuem maior durabilidade são mais

ordem lógica entre as escalas, que

dispendiosos, e o contrário, portanto,

inicia na inserção urbana até chegar à

também é verdadeiro. Esta conclusão

unidade.

da

flexibilidade.

reforça nossa ideia em encarregar os moradores de desenvolver a parte

Compreendendo que os agentes podem

mais flexível, mais específica para suas

participar em momentos distintos, de

demandas, bem como onde há menor

acordo com suas potencialidades, foi

demanda de aplicação de recursos.

pensada uma alocação inicial destes em cada uma das escalas abordadas, mas

Assim, chega-se a uma proposta de

mantendo uma assessoria técnica do

abordagem para o projeto, síntese

início ao fim, não para intervir e sobrepor

do raciocínio estruturado até aqui. O

suas decisões, mas atuar na integração e

processo se divide inicialmente em

nos diálogos destes agentes.

103


O processo, portanto, é dividido em três etapas: 1. inserção urbana Em um primeiro momento, há um diagnóstico para um levantamento inicial da demanda junto à disponibilidade de terrenos livres nas proximidades. Este levantamento, apesar de prever a participação apenas do Estado junto às assessorias, deve ser levado à fase seguinte como diferentes possibilidades a serem decididas junto à população

2. articulação dos módulos

104

Uma vez realizado o levantamento das

Estas

demandas e dos terrenos, aproxima-

posteriormente

se o olhar para a escala do edifício.

compor

Compreendendo que o edifício base

conciliar os desejos de seus futuros

abrange as partes mais custosas da

moradores

construção, e resulta, na nossa proposta,

legislação e às restrições relativas ao

em um frame, esta fase conta com

Estado que possam surgir em cada

participação do Estado junto à população.

caso. A segunda etapa traz como

Assim, após a escolha do sítio, a população

resultado a construção de um edifício-

pode

demandas

base, ou frame, junto aos espaços

quantitativas (em termos de área desejável

públicos que a ele são vinculados, para

para cada habitação) e relacionadas a

que posteriormente a população ocupe

espaços livres e institucionais.

o seu interior.

apresentar

suas

demandas um

serão

então

articuladas edifício,

às

que

para busque

determinações

da


Na última etapa, as decisões são de

Levanta-se ainda a possibilidade de

caráter

referem-se

um subsídio do Estado para a unidade

especificamente à unidade habitacional,

individual,

pois

habitacional10, que pode se dar por meio

sobre a qual os moradores devem ter

de um instrumento similar a um cartão

total controle. Definida a área para

reforma, para que os moradores possam

as unidades a partir das demandas

decidir a maneira como investir os

levantadas, as famílias podem, junto à

recursos na unidade, se contratarão um

assessoria técnica, elaborar os projetos

serviço para construção, se comprarão o

das habitações, caso a caso.

material, ou qualquer outro investimento.

+adaptação para edifícações existentes Por fim, acrescenta-se a possibilidade da

adaptação

do

processo

para

edifícios subutilizados: a partir de uma reconfiguração inicial do edifício de modo a gerar um frame utilizando a estrutura existente, o processo segue a partir da etapa de decisão individual,

10 Vale

com as devidas adequações de caso a

ressaltar que o levantamento de custos para cenário, serviços e pele considera o edifício como todo. No caso da nossa proposta, cada família deve arcar apenas com os próprios custos, ou seja, uma fração do valor.

3. flexibilidade da unidade

caso.

quadro 15. síntese do processo proposto elaborado pela autora

105


processo decisório coletivo

inserção urbana 106

articulação dos módulos


processo decisório individual

flexibilidade da unidade

usos e modificações tempo

107


processo decisório coletivo

assessoria técnica + estado

inserção urbana

assessoria técnica + estado + população

articulação dos módulos

108

levantamento do número de famílias

levantamento de possíveis terrenos

levantamento demanda de moradia em números e equipamentos

através da fragmentação do processo em dois momentos de decisão, coletivo e individual, é possível orientar a adaptabilidade desta base para aplicação em vazios construídos. Assim, se em um primeiro momento houver uma adaptação de edifícios desocupados para estruturação de um frame (desde que a estrutura esteja consolidada) , é possível dar sequência a partir do processo decisório de caráter individual

projeto frame e equipamentos


processo decisório individual

assessoria técnica + população

flexibilidade da unidade

usos e modificações tempo

construção frame e equipamentos pelo Estado e/ou mercado

definição de um subsídio às famílias

projeto das unidades habitacionais

construção decidida pelas famílias

adaptação do frame sobre construção existente

tempo

flexibilidade da unidade

usos e modificações

109


partida

narrativas

transiçþes


novos processos

precedentes

partida

referĂŞncias


112


PRECEDENTES A proposição de um cenário desejado

Entre os projetos estudados ao longo do

gerou outras necessidades: foi preciso

processo, sete são aprofundados aqui.

fincar

referências,

Este estudo se desenrola em consonância

maneiras de entender como as questões

com o diagnóstico, transitando entre

levantadas nesta investigação foram

escalas. Deste modo, entre edifício e

articuladas e espacializadas em outros

território, três critérios são evidenciados:

contextos.

inserção

bases,

buscar

urbana,

articulação

dos

módulos e flexibilidade da unidade O passo seguinte foi então conduzir

aspectos também presentes no processo

o olhar para precedentes que nos

proposto. Ao mesmo tempo em que se

pudessem esclarecer estas questões.

buscou compreender os projetos em

Com este objetivo em mente, diversos

sua completude, a categorização destes

exemplos foram explorados: de outros

significou abrir o olhar para questões

períodos, da atualidade, de outros

específicas e relevantes para o nosso

lugares, do nosso lugar.

objetivo.

inserção urbana

território

articulação dos módulos

flexibilidade da unidade

113

edifício

Ao final deste aprofundamento, alguns elementos vinculados aos três aspectos foram evidenciados em cada projeto. Estes elementos são trazidos, então, como questões norteadoras. A partir delas, surge um raciocínio que parte do módulo habitacional e alcança o território, orientando a proposta por vir.

quadro 16. categorização dos precedentes elaborado pela autora


inserção urbana

114

sistema dom-ino

unidade de habitação

quinta monroy

tila housing project

le corbusier

le corbusier

elemental

talli

1914

frança - 1946-52

chile - 2003

finlândia - 2010

flexibilidade da unidade


articulação dos módulos

tempo

solid 11

moradia estudantil unifesp

transformação de 530 habitações

tony fretton architects

arquitetos associados

lacaton vassal

holanda - 2010

brasil - 2014

frança - 2016

intervenção em edifício existente

115


SISTEMA DOM-INO le corbusier 1914 Um sistema estrutural foi projetado -

um

frame

-

completamente

gerador

de

esqueleto

outros contínuo.

edifícios,

um

Identificado

independente da planta da casa:

com a definição de Leupen (2006), o

o frame compreenderia apenas os

sistema comporta-se como um frame

pavimentos e as escadas. Deveria

a partir do momento em que a pele e o

ser

cenário tornam-se independentes da

fabricado

padronizados,

por

componentes para

estrutura. Assim, não carece de um

permitir uma grande variedade de

programa de necessidades de base

conjuntos de

montados

casas.11

e nem necessariamente implica em resultados formais pré-estabelecidos.

- LE CORBUSIER APUD. BOESIGER, 1972, P.10

A flexibilidade tem repercussões para O 116

desenvolvimento

sistema

além do âmbito estético, por meio da

inicialmente

diferenciação do processo de concepção

para suprir a demanda habitacional

e construção em dois momentos: o

após a Primeira Guerra Mundial e

primeiro em que se debruça sobre a

resultou em uma estrutura base

construção de um elemento estrutural

para a reconstrução de casas que

e um equipamento para circulação

compreendia a redução do custo por

(nesse

meio da pré-fabricação. Apesar de

momento posterior no qual a liberdade

sua famosa perspectiva nos sugerir

para definir os complementos que

que ele em si é o edifício, o Dom-

conformam espaços habitáveis e os

ino foi elaborado como um princípio

qualificam para uso (MACIEL, 2015).

Dom-ino

motivou-se

do

caso,

as

escadas),

e

um

figura 10. perspectiva do sistema e utilização do módulo em edifícios fonte: http://www.fondationlecorbusier.fr/ 11 Tradução

livre a partir do original: “A structural system was designed - a frame - completely independent of the plan of the house: the frame carried only the floors and the stairs. It was to be made of standard components, put together to allow great variety in the grouping of houses.”


-

inserção urbana

-

articulação dos módulos

-

flexibilidade da unidade

-

princípio gerador de edifícios

117

articulação do sistema dom-ino no projeto de edifícios racionalizados em termos de projeto, construção e custo


UNIDADE DE HABITAÇÃO le corbusier frança - 1946-52 Um dos mais emblemáticos projetos de

Na torre, as unidades habitacionais

Le Corbusier, a Unidade de Habitação

articulam-se

em

de Marselha foi o primeiro protótipo,

pavimentos,

compostos

seguido

de

cinco

outras

pares

de

três

por

dois

unidades

duplex em L e, entre os dois, uma rua

construídas, quatro situadas na França e

interna de acesso às unidades e às

uma na Alemanha. Muitas das principais

circulações

ideias do arquiteto, aperfeiçoadas ao

longitudinalmente

longo da carreira, foram materializadas

apenas cinco ruas conectam todo o

nestes projetos, como as ruas internas e

edifício. Nos 7º e 8º pavimentos, é feita

os apartamentos em duplex.

uma diferenciação do pavimento-tipo

verticais, o

que

atravessa

bloco.

Assim,

para abrigar diversos estabelecimentos Ressalta-se,

inicialmente,

a

verticalização dessas habitações como 118

comerciais e de serviços. Há ainda um terraço e uma pequena piscina.

um aspecto positivo do projeto, uma vez que proporcionou uma otimização

A

do espaço ao abrigar aproximadamente

preenchimento proposta no edifício

separação

entre

estrutura

e

2.500 pessoas em cada edificação, ainda

reitera o aprimoramento de ideias de

disponibilizando boa parte do terreno

Corbusier, como a distinção explorada

para circulação de pedestres e espaços

anteriormente no sistema Dom-ino.

livres.

No caso da Unidade de Habitação, cada unidade habitacional tem uma estrutura

A organização espacial do edifício

própria, porém não independente, como

consiste em um pilotis livre para

se elas fossem alocadas na estrutura

estacionamento de carros, bicicletas

principal, do prédio como todo. Apesar

e circulação de pedestres, com o hall

de as unidades serem pré-definidas, o

de entrada. A transição entre o pilotis

princípio do esqueleto de concreto e sua

e o primeiro pavimento abriga alguns

separação do cenário permite projetos

maquinários do edifício, como os dos

de habitações diferentes, combinados de

condicionadores de ar e geradores.

maneiras diversas (LEUPEN, 2006).

figura 11. perspectiva externa e cortes esquemáticos fonte: acervo pessoal; pinterest


-

inserção urbana

-

articulação dos módulos

-

flexibilidade da unidade

-

corte com duas unidades habitacionais em duplex e rua interna

corte com destaque para os pavimentos de comércio e serviços (em vermelho)

119

edifício multifamiliar 337 unidades de 23 tipos programa definido vista externa da unidade de habitação


QUINTA MONROY elemental chile - 2003 Quinta Monroy era o nome de um

um processo de expansão orientado no

assentamento em Iquique, no Chile, que

qual as famílias podem decidir sobre

teve início na década de 60 e ampliou-

função e materialidade. A construção é,

se ao longo do tempo, abrangendo 97

portanto, permeável o suficiente para

famílias. Por muito tempo se tentou

receber intervenções dos moradores ao

resolver a situação de precariedade

longo do tempo.

enfrentada pela comunidade, porém o valor do terreno consistia em um grande

As casas são implantadas através da

empecilho naquele contexto.

criação de pátios com agrupamentos menores

120

das

100

famílias,

de

Em 2001, ao Elemental foi entregue

aproximadamente 20 famílias cada,

a demanda de projetar 97 habitações

gerando uma escala social intermediária,

em um terreno próximo, de 5.000 m²,

suficiente para que as famílias estejam

pressupondo uma moradia dinâmica

de acordo entre si e mantenham laços

sem dívida e por meio de um processo

sociais.

participativo.

Além

disso,

havia

a

intenção de valorizar a propriedade, de

Em

modo que as famílias se apropriassem

construir apenas metade da casa, o

paralelo

à

economia

ao

e tivessem interesse em se manter ali

desenvolvimento de uma tipologia que

(ARAVENA, 2011).

permitisse atingir uma densidade alta foi uma maneira inicial de enfrentar o

Na escala da habitação, frente às

valor elevado do terreno, mantendo as

limitações orçamentárias, o investimento

famílias em uma região bem localizada

foi direcionado sobretudo às partes mais

e de fácil acesso às oportunidades

onerosas e passíveis de problemas às

da

famílias, tais como banheiros, escadas

transporte

e cozinha. A casa construída, então,

(2017) considera este projeto, dentre as

compreende metade do seu potencial

experiências estrangeiras e sob aspectos

construtivo e, quanto à outra metade,

socioeconômicos e culturais, o que mais

esta

própria

se aproximaria do caso brasileiro em um

edificação, porém não controlada: existe

horizonte possível de arquitetura aberta.

é

emoldurada

pela

cidade,

como e

saúde,

trabalho.

figura 12. processo de expansão e inserção no terreno fonte: https://www.archdaily.com.br/br/01-28605/quinta-monroy-elemental

educação, Lamounier


inserção urbana

-

articulação dos módulos

-

flexibilidade da unidade

-

térreo + duplex 93 unidades programa definido parcialmente

121 dezembro - 2004 | 2006 - julho

10

0

10

30m

N

-

planta de situação, com destaque para os quatro pátios


TILA HOUSING PROJECT talli finlândia - 2010 O Tila Housing Project é um projeto

Assim como explica Lucchesi (2012), os

piloto do escritório finlandês Talli, no

moradores têm acesso a um guia para

qual o apartamento é vendido vazio e os

os apartamentos, feitos pelo arquiteto

moradores produzem o espaço interior

em colaboração com o departamento

conforme a preferência e a necessidade.

de construção e planejamento. Este guia

reconhece

alterações

futuras

O edifício se desenvolve em 5 andares.

pelos moradores e traz informações

Destes, o térreo é mais voltado para

estruturais e de instalações, orientando

serviços, tais como lavanderia e lixo,

modificações

e a cobertura destina-se a espaços de

construção do segundo andar.

ou

expansões

pela

lazer coletivos, sauna e terraço. Cada

122

apartamento tem uma varanda própria,

Em uma visita ao edifício em 2010,

5m de pé-direito e área interna de 50m²,

Habraken considerou o Tila Housing

podendo ampliar para 100m² através

Project um exemplo bem sucedido

da criação de um novo andar dentro da

da teoria dos suportes. Para ele, o

própria unidade, em conformidade com

experimento

a legislação. Os banheiros são os únicos

fabricadas dá ao morador um produto

elementos fixos internos aos apartamentos.

de consumo completo.

em

figura 13. fachada principal e apartamentos fonte: https://www.talli.fi/en/projects/loft-building-tila-housing-block

habitações

pré-


-

inserção urbana

-

articulação dos módulos

-

flexibilidade da unidade

-

edifício multifamiliar 39 unidades programa indefinido

123

estrutura da fachada (construção base) que não evidencia as adaptações internas

apartamento entregue e pós ocupação


SOLID 11 tony fretton architects holanda - 2010

124

O Solid 11 faz parte dos solids,

O edifício é construído como um sólido -

edifícios nos quais o morador não

o nome solid associa-se a uma tipologia

é previamente conhecido e onde há

altamente durável e sustentável - e

uma metodologia por diferentes níveis

permite

de decisão, coletivo e individual, que

sobre tamanho, configuração e uso do

correspondem

ao

espaço interno. Um diferencial são os

suporte e ao recheio (LAMOUNIER,

shafts para instalações distribuídos no

2017). Sua construção se dá em

pavimento-tipo, que deixam o resto da

duas fases: o suporte, fornecido pelo

planta livre para definições posteriores.

empreendedor imobiliário, e o recheio,

Assim, os moradores terão liberdade

responsabilidade do inquilino. Essa

de deixar o espaço à sua maneira,

divisão torna o investimento rentável

optando por sistemas padronizados ou

ao reduzir os custos de manutenção

contratando um projetista.

respectivamente

aos

moradores

decidirem

e reformas para o empreendedor, ao passo em que dá maior liberdade ao

Por

morador (MONTANER, 2016).

recheio,

meio os

da

divisão

moradores

suportetornam-se

proprietários do seu recheio e pagam A

configuração

torres

o aluguel correspondente à área do

central

suporte. Além disso, com a divisão

respeita o masterplan já existente e

de responsabilidades, a inclusão dos

gera um espaço público no interior.

moradores no processo de decisão e o

As torres foram concebidas de modo

seu reconhecimento como produtores

a permitir modificações no interior,

e controladores no espaço, foi possível

mas ainda preservando seu aspecto

uma apropriação do edifício por eles,

externo, tais como revestimento e

tanto espacialmente como afetivamente

esquadrias.

(LAMOUNIER, 2017).

separadas

por

em um

duas pátio

figura 14. vista da rua, dos acessos aos apartamentos e dentro da área dos apartamentos fonte: http://www.platform31.nl/uploads/media_item/media_item/8/52/P31_Evaluatie_Solids-1371030821.pdf


-

inserção urbana

-

articulação dos módulos

-

flexibilidade da unidade

-

edifício multifamiliar número indefinido programa indefinido

125

modulação da fachada que disfarça as diferenças internas

corredores de acesso aos apartamentos e vão livre do pavimento tipo


5

0

5

10

20m

segundo pavimento | unidades habitacionais

126

primeiro pavimento | unidades habitacionais

figura 15. apesar do programa livre, as moradias ocupam um espaรงo delimitado e modulado fonte: https://www.architonic.com/en/project/talli-architecture-and-design-tila-housing/5103963


O Tila Housing Project e o Solid 11

ocupe como desejar, porém, enquanto

encontram-se em consonância com a

o primeiro apresenta uma modulação

teoria dos suportes, na qual o edifício

muito clara que se reflete na planta, o

oferece um suporte ao usuário, que

segundo, ao definir apenas os shafts

o complementa com o recheio. Entre

internos, vai além ao dar suporte para

eles, porém, emerge uma diferença

divisões internas distintas e mutáveis,

inerente

contemplando um universo maior de

à

concepção:

ambos

são

estruturados de modo que o usuário o

5

possibilidades de ocupação.

0

5

10

20m

127

o edifício é entregue apenas com estrutura, shafts e circulação vertical (esquerda) os moradores adquirem a área que lhes convém para o apartamento (direita)

figura 16. pavimento tipo ocupado de maneira mais irregular fonte: http://www.platform31.nl/uploads/media_item/media_item/8/52/P31_Evaluatie_Solids-1371030821.pdf


MORADIA ESTUDANTIL arquitetos associados brasil - 2014 O conceito para a moradia estudantil

cômodos de permanência estão voltados

parte da compreensão do edifício como

para leste, enquanto as áreas de

um elemento estruturador da paisagem.

serviço e cozinha voltam-se para oeste,

Elencando e sobrepondo três elementos

resguardadas da forte radiação solar

principais - um sistema modular regular,

pelo espaço de circulação e pelos brises

um vazio articulador e um redesenho da

verticais externos.

topografia - o projeto se realiza a partir

128

de dois sistemas construtivos distintos:

Utiliza-se ainda um núcleo duro de

um sistema modular e industrializado,

instalações, que permite um rearranjo

que organiza os espaços típicos em que

das unidades a longo prazo. Ao núcleo

há ordem e repetição, e uma construção

duro se sobrepõe uma diversidade

em concreto armado, redesenhando o

ambiental referente ao sistema de

chão e a paisagem, abrigando os espaços

circulações, que gera uma variedade

atípicos

espacial e ambiental nas áreas de convívio.

A partir da estruturação de um módulo de 4,80 x 4,80m e da articulação de

À racionalidade do projeto soma-se uma

quatro destes módulos (9,60 x 9,60m),

racionalidade construtiva, que se reflete

abrigam-se moradia e circulação coletiva.

em vários aspectos: para o presente

Os núcleos de moradia articulam-se a

estudo, destaca-se a estrutura por

partir de nós de circulação vertical, que

um sistema metálico modulado e com

também abrigam os espaços de uso

pequenos vãos, módulos hidráulicos

coletivo intermediário a cada pavimento.

industrializados, modulação de vedações e caixilhos, escadas metálicas e divisões

Um critério do projeto é prover às

internas em gesso acartonado, que

moradias

rigorosamente

permitem

de

integração das unidades num plano

iguais

em

condições termos

condicionamento

área

ambiental.

e Os

reorganização

interna

futuro.

figura 17. moradia estudantil: perspectiva externa e lógica dos módulos habitacionais fonte: http://www.arquitetosassociados.arq.br/?projeto=moradia-estudantil-unifesp-sao-jose-dos-campos

e


-

inserção urbana

-

articulação dos módulos

-

flexibilidade da unidade

-

módulo habitacional compreendido inicialmente como estrutura, em seguida com o núcleo duro de instalações e vedações e, por fim, com mobiliário

edifício multifamiliar 67 unidades de 5 tipos programa definido

perspectiva da moradia, ressaltando os dois sistemas construtivos

129


TRANSFORMAÇÃO DE 530 HABITAÇÕES lacaton vassal frança - 2016 Entre as diferentes apropriações da

habitacional

frase “menos é mais”, de Mies van der

unidades, do início da década de 60.

Rohe, Lacaton & Vassal buscam aplicá-

O principal ganho parte da decisão

la por meio da constante busca em

de manter a edificação original com

realizar, na prática arquitetônica, o

poucas alterações, compreendendo que

máximo com o mínimo, em custo, em

seus residentes já haviam construído

área e em uso. Criticando a visão da

seu próprio espaço a partir de seus

cidade como uma massa inerte para

diferentes anseios. Assim, foi possível

modelar, eles a apreendem como uma

concentrar esforços na extensão das

coleção de capacidades e energias para

unidades

expandir, cenário no qual o ordinário

de grandes varandas e jardins de

torna-se

inverno em todos os pavimentos. O

extraordinário

(LACATON;

VASSAL, 2015).

de

mais

habitacionais,

de

por

4.000

meio

projeto também contou com outras intervenções, sobretudo para adaptação

130

Deste pensamento derivam projetos

do edifício em termos de instalações e

como o plus, que crê em uma cidade

acessos, bem como melhorias nas áreas

em constante mudança, mas que busca,

comuns.

em respeito à vida que a permeia, uma maneira de mudá-la mais por adição

Talvez esteja na extensão das unidades

que por subtração. Sua concretização se

a maior materialização do discurso de

dá na adaptação de edifícios existentes.

gentileza e generosidade dos arquitetos, não necessariamente no aumento da

A transformação de 530 habitações

área, mas em abrir possibilidades para

intervém parcialmente em um projeto

um espaço imprevisível, de desejos.

figura 18. comparação pré/pós intervenção em perspectiva isométrica e fotografia fonte: http://www.lacatonvassal.com quadro 17. síntese dos precedentes, acrescido das questões norteadoras elaborado pela autora


-

inserção urbana

-

articulação dos módulos

-

flexibilidade da unidade

-

131

intervenção em edifício existente 530 unidades acréscimo de varandas

antes da intervenção | após da intervenção


sistema dom-ino

unidade de habitação

quinta monroy

le corbusier

le corbusier

elemental

1914

frança - 1946-52

chile - 2003

inserção urbana

área de ocupação reduzida com a verticalização

permanência em área central

articulação dos módulos

separação entre estrutura e preenchimento

expansão orientada da habitação

132

flexibilidade da unidade

princípio gerador de edifícios


tila housing project

solid 11

moradia estudantil unifesp

530 habitações

talli

tony fretton architects

arquitetos associados

lacaton vassal

finlândia - 2010

holanda - 2010

brasil - 2014

frança - 2016 133

diferenciação entre modular (típico) e redesenho do terreno (atípico)

unidade definida programa livre

unidade e programa livres

espaço para o imprevisível


partida

narrativas

transiçþes


novos processos

precedentes

partida

referĂŞncias


136


PARTIDA (…) ao se interpretar o “problema

Assim como expõe o autor, o problema da

habitacional”

déficit

habitação vai muito além de um número.

de unidades de moradia de um

O seu pensamento, descrito acima, serve

determinado padrão ao invés de um

de síntese para tudo o que se investigou,

déficit de localizações adequadas,

bem como orienta nossa proposta. Para

de acomodações de baixo aluguel,

além de um novo processo ou abordagem

de

terrenos,

como

de

um

equipamento

para a problemática levantada, o próximo

comunitário e de serviços públicos,

passo é sua materialização, uma proposta

fixamos políticas impossíveis de

arquitetônica a ser testada.

atingir. Turner - TURNER, P. 18, 1968

(1968)

define

ainda

três

prioridades para a habitação:

- abrigo - segurança - localização -

O autor esclarece que o grau de prioridade entre estes três pode variar, com base na realidade e nas expectativas das famílias. A dificuldade - ou a potência - de propor para o desconhecido reside então na elaboração de uma base que possibilite o cumprimento às três prioridades, sendo adequada aos diferentes cenários. Em consonância com as questões norteadoras levantadas pelo estudo de precedentes, a proposta articula diferentes escalas, entre inserção urbana, articulação dos módulos e flexibilidade da unidade. Longe de ser algo fechado, esta proposta é uma nova partida, desta vez um pouco mais consciente, em direção ao cenário delineado.

137


-

abrigo

-

segurança

-

localização

-

A busca por conciliar os diversos

conjunto a priori de entidades fixas.

interesses inevitavelmente começa a

Neste processo, na tentativa de reduzir a

ser desenhada, em linhas, que passam

lacuna entre arquiteto e outros agentes,

a

esquadrias,

o desenho de um tipo busca orientar

telhados, casas. Tal busca, no entanto,

uma proposta futura, não condicioná-la.

representar

paredes,

não será efetiva se não incorporar o poder de decisão dos agentes no

Assim, por um módulo mínimo de 3x3m

processo. Ainda assim, entende-se a

(9m², capaz de abrigar um cômodo12),

importância de desenhos preliminares

define-se

se nos permitirem um diálogo inicial, que

mínimo com dois módulos iniciais

levante alterações e melhorias. As ideias

que, quando combinado com outro

iniciais conduziram ao desenvolvimento

habitacional,

de um tipo, não um modelo, capaz de

construtivo. O módulo construtivo é o

abrigar o recheio das famílias.

que aqui se considera como tipo. Estando

um

módulo

estrutura

habitacional

um

módulo

o abrigo intrinsecamente relacionado a O

138

conceito

de

tipo

definido

por

demandas de famílias que não se pode

Quatremère de Quincy, trazido por

generalizar, buscou-se condicionar ao

Argan (2008), é pertinente ao esclarecê-

mínimo o espaço interior ao edifício base.

lo como um elemento que serve de base para um modelo. Este “objeto vago e

Algumas indicações em termos de usos

indistinto” remete a outras experiências

e medidas acabam por ser esboçadas,

que, apesar de estarem vinculadas a

tendo em mente prover melhores

conjunturas específicas, suprem uma

condições às unidades habitacionais.

lacuna para solucionar questões de

No entanto, cabe aos futuros moradores

novos cenários, ou seja, são adaptações

optarem ou não por segui-las. Por fim,

de formas que derivam de necessidades

compreende-se que, no que tange aos

do passado às necessidades do presente

módulos, o tempo de ocupação pode

(COLQUHOUN, 2008).

variar ao longo tempo; soma-se a isso a definição preliminar de módulos

O tipo torna-se imagem ou signo, parte

para expansão das unidades, a serem

de qualquer processo de criação que não

articulados no edifício. Estas questões -

a mimese; é muito mais um princípio

e outras - são exploradas nos desenhos

passível de inúmeras variações que um

seguintes.

12 Segundo a Minuta de Lei do Código da Cidade (2016), nas áreas mínimas para Habitação de

Interesse Social e Casas Populares, a sala de estar é o único cômodo que escapa a esta lógica, sendo necessário um mínimo de 10m², o que pode ocorrer com a combinação dos módulos.


módulo mínimo: 9m² (3x3m) possibilidade de abrigar confortavelmente um cômodo

módulo habitacional mínimo: 18m² agrupamento de 2 módulos de 3x3m maior probabilidade de prover ventilação e iluminação naturais aos cômodos

3m

3m

sacada

3m

shaft

circulação

3m

139

módulo construtivo sugerido: 52,20m² agrupamento de 4 módulos de 3x3m (com adição de circulação e varanda)

posicionamento dos pilares nos cantos shaft entre duas unidades sugestão de circulação e sacada

figura 19. lógica para estruturação de um módulo construtivo mínimo elaborada pela autora figura 20. isométrica do módulo construtivo elaborada pela autora


140


corredor de acesso em toda a extensão das habitações maior liberdade para proposição de aberturas

posicionamento do shaft entre duas habitações dada a proximidade do shaft, acredita-se que deste lado ficarão os cômodos de serviço acesso externo para facilitar manutenção

estrutura que resolve o módulo por si possibilidade de verticalização (proposta inicial de até 5 pavimentos)

141

possível divisão entre duas habitações os módulos podem ser combinados de acordo com a demanda das famílias

possibilidade de sacada ou varanda de certo modo, é mais fácil de induzir os cômodos de permanência para este lado indica-se a priori a sacada voltada para leste

estrutura margeando o espaço destinado às moradias menor interferência possível na planta


142

figura 21. planta preliminar com questões norteadoras para aplicação no edifício escala 1:175


1,5

0

1,5

3m N

143

figura 22. diferentes possibilidades de ocupação dos módulos escala 1:175


3

0

3

6m

144

módulos ocupados

módulos para expansão das unidades

figura 23. corte transversal e elevação com possíveis ocupações escala 1:250


145

bloco habitacional | individual

acessos horizontal e vertical | coletivo

figura 24. testes de articulaçþes das partes coletiva e individual em edifícios sem escala


-

abrigo

-

segurança

-

localização

-

Turner define a segurança da posse

desvinculado do direito à propriedade.

como

Assim,

uma

maneira

essencial

de

é

possível

ressignificar

o

prover o pertencimento das famílias às

aluguel, que passa a ser uma forma de

moradias, somada à estabilidade que se

posse da moradia, não de propriedade.

conquista. Esta pode ser uma primeira

No caso de um edifício dividido em

maneira de garantir que a família não

suporte e recheio, acrescenta-se ainda a

tenha problemas como altos aluguéis ou

possibilidade de variação entre compra

falta de perspectivas para a habitação.

e aluguel: pode-se comprar o suporte

No entanto, os programas habitacionais

e comprar o recheio, alugar o suporte

como o PMCMV mostram que só o papel

e comprar o recheio ou alugar tanto o

da casa não é suficiente para assegurar

suporte quanto o recheio (VAN ZIJL,

que

2016 apud. LAMOUNIER, 2017).

as

necessidades

das

famílias

sejam atendidas e que estas de fato se apropriem do espaço.

A apropriação das famílias é um fator crucial para que tanto a propriedade

146

Lamounier (2017) mostra que, além

quando o aluguel social sejam efetivos no

da propriedade da habitação, existe

edifício: a divisão de tarefas junto a um

a alternativa do aluguel social: por

poder de decisão delas tende a prover

esta modalidade, o direito à moradia é

este sentimento de pertencimento.


-

abrigo

-

segurança

-

localização

-

A localização é a última prioridade

(IPTU progressivo, desapropriação com

definida por Turner. Para ele, uma boa

pagamento em títulos públicos, direito

localização das habitações significa uma

de preempção).

redução do custo de vida e a garantia de maior acessibilidade das famílias (a

A

transporte público, trabalho, serviços),

resposta em um edifício subutilizado

possibilidade

de

ensaiar

uma

bem como maior acesso a infraestrutura,

requer respostas para sua viabilização,

equipamentos e serviços básicos.

considerando o contexto de alto custo para permanecer em áreas centrais

A

produzir

da cidade. O FICA (Fundo Imobiliário

moradia bem localizada é respondida

dúvida

sobre

como

Comunitário para Aluguel), é um fundo

de maneira muito sucinta por Rolnik

gerido pela Associação pela Propriedade

(2010) ao afirmar que a utilização dos

Comunitária, que trabalha com doações

instrumentos do Estatuto da Cidade

e receitas de projetos para a aquisição

é a resposta. O Estado tem a seu favor

de imóveis do centro de São Paulo e seu

instrumentos que possibilitam o maior

aluguel por preços não especulativos.

controle dos preços da terra, bem como

Assim, o fica associa-se a políticas

maneiras de desapropriar os terrenos

públicas para garantir moradias bem

bem localizados que estão parados

localizadas e mais acessíveis.

Pouco

a

pouco,

os

147

momentos

de imersão dão espaço para que aconteçam diálogos, momentos em que as bases construídas até aqui servirão para fomentar trocas, na tentativa de conciliar este conhecimento com tantos outros válidos e importantes.


da imersĂŁo 148


ao diรกlogo 149


2.5

0

2.5

5km

N

NOVO EDIFÍCIO processo aplicado desde o princípio raízes da praia 2009 bairro: vicente pinzon 84 famílias

150

EDIFÍCIO EXISTENTE testar a aplicabilidade em cenários predefinidos ocupação centro não iniciada bairro: centro número indefinido de famílias


ESTUDOS DE CASO O processo desenvolvido abriu portas

no campo da vivência, incorporando

para dois ensaios: um projeto para um

outros

novo edifício, que trouxesse a lógica

imprevisibilidade passou a compor este

proposta desde o início, e um projeto

percurso, interferindo negativamente

para um edifício existente, que testasse a

em certos momentos (sobretudo no

aplicabilidade da proposição em contextos

tempo), e potencializando a proposta em

pré-determinados.

tantos outros.

Das

premissas

deste

processo,

a

Os

atores.

dois

Inevitavelmente,

ensaios

ocorreram

a

em

permeabilidade tem sido uma constante,

diferentes ocupações: para a proposta

de modo que, além de desejadas, as

do novo edifício, o trabalho se deu na

contribuições externas fossem possíveis.

ocupação Raízes da Praia; já a aplicação

Os momentos de troca - as oficinas -

do processo em um edifício existente

tornaram-se maneiras de investigar a

se deu junto à ocupação do movimento

real potência da proposição enquanto

Unidade Classista, no centro de Fortaleza.

instrumento de base e de diálogo para

Aqui a abordagem é dada em sequência,

o fazer arquitetônico, com o anseio de

primeiro desenvolvendo um ensaio e

construir um processo aberto.

posteriormente o outro; na prática, o desenrolar em conjunto dos dois ensaios

Assim,

aos

transitar

poucos,

entre

passou-se

imersão

e

a

foi tanto necessário quanto positivo,

diálogo,

à medida em que foram possíveis

trocas embasadas pela teoria e testadas

contribuições e trocas entre ambos.

Aplicar

Assim,

reais

o

exigiu

processo

em

constantes

situações

tirando

partido

do

caráter

adequações

técnico da arquitetura, entende-se como

para que não se tratasse de projetos

maior contribuição nos dois estudos de

hipotéticos de cunho exclusivamente

caso a produção de discursos para as

acadêmico. Tais adequações consistiram

ocupações, transformando os projetos

em tentativas de gerar contribuições

em instrumentos de diálogo e de

práticas e palpáveis às comunidades.

argumento com outros agentes.

mapa 06. localização dos estudos de caso elaborado pela autora

151


INTERFACES E INTERAÇÕES - AS OFICINAS Moradias não podem ser produtos de designers. Mas moradias podem ser um resultado de pessoas comuns tomando decisões sobre coisas feitas por especialistas e quem, ao fazê-lo, cria.

13 Programa

152

de Educação Tutorial do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará (UFC)

- HABRAKEN, 2016

Entre todos os momentos de troca -

O trabalho em duas ocupações diferentes

reuniões, conversas, visitas - realizar as

e, portanto, duas realidades diferentes,

oficinas junto às comunidades foi dos

significou também diferentes modos de

mais difíceis de todo o processo. Se a

trabalhar em cada uma. Na ocupação

imprevisibilidade é algo característico,

Raízes da Praia, já acompanhada pelo

foi nas oficinas onde tudo esteve mais

ArqPET13 e por outras assessorias, há

imprevisível.

uma postura mais ativa dos moradores, as

atividades

propostas

ocorreram

Baltazar dos Santos e Kapp (2016)

com maior fluidez. Por outro lado, na

estabelecem algumas diretrizes para

ocupação do centro não houve tanto

a

importante

envolvimento no início, com atividades.

reconhecer a assimetria que há entre

assessoria

técnica:

é

Conversar sobre experiências, relatar o

técnicos e assessorados e pensar em

comum geravam maior participação do

aberturas para algum ganho de autonomia.

que maquetes e desenhos.

Ocupar a condição de técnica exigiu um

Mesmo difíceis, as oficinas fizeram

preparo antes de cada oficina, de material

dos projetos o que são. Foram os

e de discurso. Apesar de nem sempre ter

diálogos entre técnica e moradores que,

as respostas, existe uma expectativa por

gradativamente,

elas: a assimetria é clara, e nem sempre os

e formas, que também são reflexos

meios pensados para ganho de autonomia

de anseios meus e deles, nossos. Este

foram tão efetivos quanto desejados.

percurso é contado a seguir.

tornaram-se

linhas


figura 25. oficina com maquetes na ocupação raízes da praia e exposição de fotos das oficinas na ocupação do centro acervo pessoal

153


OCUPAÇÃO RAÍZES DA PRAIA Na madrugada do dia 3 de julho de

ao mercado imobiliário. Novamente, em

2009, sob organização do Movimento

2014, foi feita uma proposta de inclusão

dos Conselhos Populares (MCP), cerca de

no MCMV, desta vez na modalidade

80 famílias que residiam no entorno da

Entidades, que também foi recusada.

Praia do Futuro ocuparam um terreno vazio próximo à faixa de praia, no bairro

Por nove anos, a comunidade tem

Vicente Pinzón. Esta foi a origem da

mantido sua postura e persistido no

ocupação Raízes da Praia, que tem

terreno que, além da boa localização,

naquele momento um marco simbólico,

dispõe de fácil acesso a comércios

dia em que fincou raízes em forma de

e serviços, bem como ao transporte

resistência e por um objetivo maior: a

público. Isto não significa, no entanto,

conquista do direito à terra e à moradia.

condições adequadas de moradia: a falta de saneamento gerou um acúmulo

154

O percurso trilhado até então tem sido

de efluentes em um trecho de cota

de resistência aos proprietários dos

mais baixa do terreno, propiciando o

terrenos ocupados, em um cenário

surgimento de doenças que afetam

de vazios vigiados por especuladores

cotidianamente

(MENESES et al., 2016). Utilizando-se da

estratégia de manter um grande número

condicionamento ambiental no interior

de pessoas no terreno, enfrentaram

das casas. A recusa das propostas

destruição

de

suas

estruturas

também

os reclamações

moradores. de

mau

e

aparenta significar, portanto, muito

intimidação por milícias armadas, que

mais a busca por uma alternativa que

foram incapazes de expulsá-los.

garanta a permanência da comunidade no terreno do que uma satisfação com

Muitas foram, também, as propostas

as condições de moradia.

feitas à comunidade, tanto por órgãos públicos quanto construtoras: além

A noção da importância do terreno tem

de projetos feitos por escritórios, em

reflexos importantes: a ocupação Raízes

2010, a proposta feita pela Secretaria

da Praia foi responsável pela primeira

Municipal

Desenvolvimento

entrada de processo de usucapião

Habitacional (Habitafor) para a inclusão

coletivo no país, ainda em curso. Assim,

no Programa Minha Casa Minha Vida

com parcela dos terrenos desapropriada,

foi recusada pelos moradores, frente

busca-se

ao receio de instabilidade do processo,

parcela, uma solução ao entrave do

que poderia implicar na perda daquele

terreno e uma perspectiva mais otimista

terreno e sua posterior reincorporação

para propostas habitacionais futuras.

do

a

incorporação

de

outra


155

figura 26. ocupação raízes da praia acervo pessoal


156

figura 27. ocupação raízes da praia acervo pessoal


157


ira ilve s lo

s óvi

cl av.

uri

m rua

ais arr

158

ia

ma

sar

cé av. s

cal

1

ro

nei

ar io c

rua

ôn ant . r d

2


OCUPAÇÃO E PLANEJAMENTO A ocupação Raízes da Praia localiza-

favela. Segundo o plano, ela fica fora

se no bairro Vicente Pinzon, adjacente

da área de risco e, somando-se o fato

à orla de Fortaleza, entre as avenidas

de estar fora de ZEIS, não consta nas

Clóvis Arrais Maia e César Cals (leste-

prioridades de intervenção para a

oeste), e entre as ruas Murilo Silveira e

prefeitura.

dr. Antônio Carneiro (norte-sul). Há no entorno inúmeros terrenos vazios ou

O mesmo plano aponta como solução

subutilizados, e pequenas edificações de

para a Raízes da Praia a consolidação

habitação, comércio e serviço. A presença

com

significativa de vazios no entorno é

características físicas e ambientais

reiterada pela delimitação de uma Zona

do terreno permitem urbanização no

Especial de Interesse Social (ZEIS) tipo 3,

todo ou em parte do terreno, mas seria

de vazio, próxima à ocupação.

necessária a remoção de parte dos

reassentamento,

ou

seja,

as

domicílios (por ocupação em áreas de Nomeada no plano Fortaleza 2040 como

risco, em áreas com restrições legais

como Antonio Carneiro, a ocupação

à ocupação, ou por necessidade de

é incluída nos 856 assentamentos

desadensamento), a serem reassentados

precários da cidade, classificada como

em outros terrenos. 159

zeis 3 - vazio edificações raízes da praia edificações do entorno terrenos vazios/subutilizados pontos de ônibus 1

terreno passível de desapropriação

2

areninha praia do futuro

50

0

50

100m N

1

implantação raízes da praia esc. 1:2500


PANORAMA À parte do que trata o aparato normativo, existem outras informações levantadas na Raízes da Praia, com destaque para o levantamento das famílias realizado pelo ArqPET. Este outro levantamento é abordado com o intuito de não apenas dispor de mais informações, mas de transpor o olhar, de modo a não se limitar à abordagem do conjunto nomeado “assentamento precário”, mas de compreender melhor as famílias que compõem a Raízes, aproximando-se de suas realidades e demandas específicas. 25

0

25

50m N

O levantamento foi sistematizado e permitiu obter informações relevantes, como a expressiva representatividade 160

feminina (onde 84% das famílias têm uma mulher enquanto titular), e a relevante demanda por acessibilidade, seja por famílias com idosos (11%)

60+

4%

11%

ou com portadores de necessidades especiais (4%).

MORADIAS

Foram ainda levantadas informações sobre a quantidade de pessoas por moradia,

complementadas

pelo

levantamento das moradias a partir de

80 moradias

satélite. Com base neste levantamento,

+ 1 centro comunitário

60% das casas têm até 40m². Além disso, a maioria das famílias (56%) tem até três integrantes.

quadro 18. panorama da ocupação em termos de família e moradia elaborado pela autora com base no levantamento realizado pelo ArqPET e no Google Earth

INTEGRANTES POR MORADIA

18,67%

21,33%


ocupação raízes da praia

84 famílias

75 famílias levantadas (244 pessoas no total)

16% 12 famílias cujo titular é homem

84% 63 famílias cujo titular é mulher

161

85%

60% 48 moradias de até 40m² 39,58m² área média

40% 32 moradias de mais de 40m²

+ 16,00%

20,00%

13,33%

10,67%


PROPOSTA 01 - BLOCOS DE APARTAMENTOS 144 unidades habitacionais

conjunto

PROPOSTA 02 - CASAS SOBREPOSTAS 86 unidades habitacionais

162

conjunto

PROPOSTA 03 - BLOCOS DE APARTAMENTOS 160 unidades habitacionais

conjunto

N 25

0

25

50m

5

0

5

10m


PROJETOS EXISTENTES 2014 ~46,5 m²

O longo percurso da Raízes da Praia tem sido compartilhado com outros agentes, por meio do acompanhamento e da assessoria aos seus moradores. Estes agentes incluem assessorias de direito,

de

arquitetura,

estudantes,

funcionários públicos, entre outros, cujo acompanhamento tem como seus produtos várias propostas de moradia já realizadas para/junto da ocupação. Assim, antes de qualquer proposta,

unidade

optou-se por primeiramente entender 2015

os projetos previamente elaborados.

~43m²

Tanto a Habitafor quanto o ArqPET desenvolveram propostas habitacionais para a ocupação. Destes, três foram disponibilizados integralmente, todos pela secretaria de habitação, e são expostos ao lado. As

diferentes

propostas

permitem

inferir que: primeiramente, não há uma definição clara da solução para a demanda unidade

da Raízes, uma vez que duas propostas 2018

~43m²

apresentam blocos verticais nos moldes do PMCMV, enquanto a proposta de casas sobrepostas se volta para a possibilidade de mutirão. Em segundo lugar, ainda assim, o maior contato dos moradores com projetos arquitetônicos, sejam apenas expostos ou desenvolvidos em conjunto (como é o caso do trabalho do ArqPET), provavelmente já gerou um importante ganho de autonomia, potencializando o desenvolvimento de uma nova alternativa,

unidade 2,5

0

2,5

5m

no caso deste estudo. quadro 19. propostas habitacionais elaborado pela autora a partir dosprojetos disponibilizados pela Habitafor

163


A abordagem na Ocupação Raízes da

novo processo proposto, considerando

Praia se deu por meio da aplicação do

três principais escalas, a seguir:

1. inserção urbana As duas primeiras oficinas realizadas

As maquetes utilizaram como unidade o

voltaram-se

à

módulo construtivo proposto, e foi dada

implantação do edifício no terreno. A

em

maior

parte

aos moradores a liberdade de encaixar

primeira delas considerou o terreno

os módulos no terreno a partir de suas

como está hoje, até que partiu da

preferências, mas também considerando

comunidade a demanda de elaborar

condicionantes como os recuos e a taxa

também uma alternativa para um

de ocupação. As propostas obedecem os

cenário de desapropriação do terreno

índices urbanísticos, bem como parte das

vizinho: a segunda alternativa, então,

exigências do MCMV (distância mínima

foi pensada na segunda oficina.

entre blocos, via de manutenção etc).

2. articulação dos módulos Partindo 164

das

duas

propostas

de

má intenção de parte dos moradores

implantação decididas nas oficinas, o

para incluir pessoas de fora no cadastro

passo seguinte foi o estudo da articulação

a fim de receber uma moradia maior. Ao

dos módulos habitacionais no edifício.

questionar sobre famílias muito grandes em casas muito pequenas, a resposta dos

A priori, a intenção era de propor

moradores foi muito clara: “ora, se a família

unidades habitacionais de tamanhos

é muito grande, divide em duas casas!”

diferentes, uma

relação

que

estabelecessem

proporcional

com

o

Para

adequar-se

a

diferentes

número de moradores. Com base no

possibilidades, a articulação dos módulos

levantamento das famílias, viu-se que

é feita por cenários, mas sempre com

essa alternativa exigiria menos área

uma unidade habitacional padrão para

do que em um cenário de módulos

as famílias (de até 4 pessoas). Entre os

iguais. No entanto, para os moradores a

cenários, aprofunda-se neste estudo

diferença de área pode dar margem para

uma proposta de moradia com espaço

injustiças entre as famílias, bem como

para expansão.


3. flexibilidade da unidade Devido ao tempo, a proposta para a

A unidade habitaiconal tipo, portanto,

unidade habitacional não pôde ser

conta com estes três espaços, e todo

realizada em oficina. Para responder a

o restante da área é um vazio a ser

diferentes - e imprevisíveis - demandas,

preenchido, inclusive uma área de

priorizou-se no projeto a definição

expansão junto à unidade habitacional.

de elementos mais duráveis e mais

Ao fim deste estudo, três possibilidades

onerosos

áreas

são testadas para o módulo, buscando

molhadas, correspondendo ao banheiro,

na

construção:

as

conciliar diferentes realidades e diferentes

à cozinha e à área de serviço.

usos da expansão (total, parcial).

165

quadro 20. processo proposto na Ocupação Raízes da Praia elaborado pela autora quadro 21. encontros e oficinas em paralelo ao desenvolvimento do processo elaborado pela autora


processo decisório coletivo

movimento social movimento dos conselhos populares

inserção urbana

assistência técnica + estado + população

articulação dos módulos

166

84 famílias duas possibilidades de terreno: 1. terreno atual 2. terreno atual + terreno adjacente

84 habitações + centro comunitário + pontos comerciais diferentes cenários para a articulação dos módulos

processo realizado em oficinas


processo decisório individual

assistência técnica + população

flexibilidade da unidade

usos e modificações tempo

proposição de uma unidade habitacional tipo predefinido: banheiro, cozinha e área de serviço diferentes apropriações da unidade

proposição sem oficinas

167


reunião sinduscon 06.09.2018

conversa sobre a situação da ocupação para o mercado e afirmativa de interesse por parte do sinduscon em construir o conjunto reunião assessoria jurídica popular (EFTA) 27.08.2018

reunião habitafor 13.09.2018

conversas iniciais e orientações para o MCMV Entidades junto à secretaria

informações sobre o terreno e o processo de usucapião coletivo em curso

168

oficina 01 13.10.2018 conversa com lideranças 01.09.2018

primeira oficina realizada, com introdução aos índices urbanísticos e arranjo da implantação no terreno 01 (sem desapropriação)

apresentação às lideranças e conversa sobre a história da ocupação assembleia popular da cidade 9 anos raízes da praia

reunião ocupação

14.07.2018

08.09.2018

primeiro contato

reunião para decisão à participação no programa MCMV, junto do MCP, do EFTA e do PET da arquitetura


reunião pet 21.10.2018

perspectivas das eleições e definição de prioridades para a ocupação

reunião habitafor 21.11.2018

direcionamentos para a realização do MCMV na ocupação

tempo

oficina 02

oficina 03

25.10.2018

17.11.2018

segunda implantação proposta, considerando a possibilidade do terreno atual acrescido do terreno adjacente (em caso de desapropriação)

apresentação do dois estudos preliminares para a ocupação (a partir das implantações propostas nas oficinas)

reunião habitafor 26.11.2018

comparação da proposta das oficinas com as exigências do PMCMV junto ao arquiteto da secretaria

169


170

figura 28. oficinas realizadas na ocupação raízes da praia acervo pessoal


171


172


173

figura 29. oficinas realizadas na ocupação raízes da praia acervo pessoal


1. implantação proposta em oficina

2. disposição das circulações verticais

Partindo

Considerando as distâncias máximas

da

implantação

decidida

durante as oficinas, pequenas adequações

exigidas

foram feitas, tendo em vista ajustar a

posicionou-se

implantação dos blocos aos recuos, bem

vertical, que passam a atuar como

como garantir boas distâncias entre eles

elementos articuladores dos blocos de

(6m entre cada bloco)

moradia

terreno 01 1:2500

174

terreno 02 1:2500

nas

normas caixas

de de

incêndio, circulação


inserção urbana

3. separação entre coletivo e individual

4. separação entre cheios e vazios

Da articulação por meio das caixas de

Por fim, para a proposição do frame, os

escada partem os corredores de acesso

blocos de moradia foram preenchidos

aos blocos. Assim, configura-se uma

com a estrutura e os shafts, porém sem

separação entre coletivo e individual no

planta. A priori, as caixas de escada

edifício, bloco habitacional e acessos,

passam a constituir-se cheios, e os

respectivamente

blocos, vazios a serem preenchidos

terreno atual - sem desapropriação

175

com desapropriação

moradias - individual acessos - coletivo


176


figura 30. implantação do estudo para o terreno 01 elaborada pela autora + francisco macedo sobre base 45° imagery

inserção urbana

177

POSSIBILIDADE 01 - TERRENO ATUAL (SEM DESAPROPRIAÇÃO) parâmetros área total do terreno taxa de ocupação índice de aproveitamento

projeto

5033,33 m² max. 50%

36,49%

0,10 - 2,00

1,46

taxa de permeabilidade

min. 40%

40,53%

gabarito

max. 36m

12m

fonte: Projeto de Lei Complementar do Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo do Município de Fortaleza


178


inserção urbana

habitações 3 pavimentos + coberta

179

pontos comerciais

rampa comunicação entre diferentes níveis do terreno associação comunitária

pontos comerciais trechos planos no mesmo nível dos blocos articulação entre as rampas faixa de pedestres elevada ligação entre edifícios e a faixa de praia


2

2

2

A +7,34 inc: 1,88% 180

1

5

1

unidades habitacionais

2

pontos comerciais

3

associação comunitåria

0

5

10m N


inserção urbana

1

2 3

A

+6,27 +6,27

181

B

B

inc: 4,00%

2

+6,77 inc: 2,18%

1

+6,27

1

1

planta térreo - estudo 01 esc. 1:500


A 182

5

0

5

10m N


inserção urbana

A 183

B

B

2

planta pavimento tipo - estudo 01 esc. 1:500


inc: 10%

A 184

5

0

5

10m N

inc: 10%


inserção urbana

inc: 10%

inc: 10%

inc: 10%

A 185

B

inc: 10%

B

inc: 10%

3

planta coberta - estudo 01 esc. 1:500


186


figura 31. implantação do estudo para o terreno 02 elaborada pela autora + francisco macedo sobre base 45° imagery

inserção urbana

187

POSSIBILIDADE 02 - TERRENO ATUAL + DESAPROPRIAÇÃO parâmetros área total do terreno taxa de ocupação índice de aproveitamento

projeto

5033,33 m² max. 50%

35,28%

0,10 - 2,00

1,40

taxa de permeabilidade

min. 40%

40,15%

gabarito

max. 36m

12m

fonte: Projeto de Lei Complementar do Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo do Município de Fortaleza


188


inserção urbana

habitações 3 pavimentos + coberta

189

pontos comerciais

rampa comunicação entre diferentes níveis do terreno associação comunitária

pontos comerciais trechos planos no mesmo nível dos blocos articulação entre as rampas faixa de pedestres elevada ligação entre edifícios e a faixa de praia


2

2

A inc: 1,88%

+7,36

190

1

1

2

+6,77

2

1 2

5

1

unidades habitacionais

2

pontos comerciais

3

associação comunitåria

0

5

10m N

2


inserção urbana

1

2 3

A

+6,27

191

+6,27

B

B

inc: 4,86%

2

inc: 1,55%

+6,27

+6,77

1

1

1

planta térreo - estudo 02 esc. 1:500


A 192

5

0

5

10m N


inserção urbana

A 193

B

B

2

planta pavimento tipo - estudo 02 esc. 1:500


inc: 10%

inc: 10%

A 194

inc: 10%

inc: 10%

inc: 10%

5

0

5

10m N


inserção urbana

inc: 10%

inc: 10%

inc: 10%

A 195

B

B

inc: 10%

3

planta coberta - estudo 02 esc. 1:500


caixa d'água sobre as caixas de escada

blocos referência quanto aos níveis mesma cota da rua adjacente

196

+19,27 coberta +16,27 3º pvto +13,27 2º pvto +10,27 1º pvto +7,27 térreo

5

0

5

10m


inserção urbana

nivelamento do terreno por aterro eliminação da vala existente

conjunto de blocos de cota 1m abaixo adaptação à topografia existente e à cota da rua

197

1

corte AA


figura 32. perspectiva externa do conjunto elaborada pela autora + maiara lacerda

198


inserção urbana

199


200


inserção urbana

ACABAMENTOS PROPOSTOS existente

pisos

piso cimentício piso cimentício pigmentado forração

vedações

concreto aparente bloco de concreto bloco de concreto pintado

201

figura 33. perspectiva dos corredores internos elaborada pela autora


coberta + caixa d'água

terceiro pavimento

202

segundo pavimento

primeiro pavimento

térreo

figura 34. estudos de diferentes apropriações possíveis para o edifício base (frame) elaborada pela autora


articulação dos módulos

edifício base

203

ocupação inicial - módulos alternados + comércio no térreo

ocupação inicial + expansões + comércio no térreo

edifício base, ou frame unidades habitacionais


cenário 01

cenário 02

204

cenário 03

cenário 04

edifício base, ou frame unidades habitacionais


articulação dos módulos estudo 01 (terreno atual - sem desapropriação)

estudo 02 (com desapropriação)

76 unidades habitacionais 5 caixas de escada 18 pontos comerciais 1 associação comunitária 23 vagas para veículos

101 unidades habitacionais 6 caixas de escada 26 pontos comerciais 1 associação comunitária 31 vagas para veículos

unidade 36 + 18 m² (com expansão) pontos comerciais/associação comunitária/pilotis no térreo

84 unidades habitacionais 5 caixas de escada 23 vagas para veículos

112 unidades habitacionais 6 caixas de escada 31 vagas para veículos

unidade 36 + 18 m² (com expansão) moradias no térreo

205

114 unidades habitacionais 5 caixas de escada 18 pontos comerciais 1 associação comunitária 23 vagas para veículos

153 unidades habitacionais 6 caixas de escada 26 pontos comerciais 1 associação comunitária 31 vagas para veículos

unidade 36m² (sem expansão) pontos comerciais/associação comunitária/pilotis no térreo

132 unidades habitacionais 5 caixas de escada 23 vagas para veículos

174 unidades habitacionais 6 caixas de escada 31 vagas para veículos

unidade 36m² (sem expansão) moradias no térreo figura 35. estudos de diferentes apropriações possíveis para o edifício base (frame) elaborada pela autora


cobertura em telha metálica | inc: 10% cobertura em telha metálica | inc: 10%

porta de correr porta de correr guarda-corpo metálico guarda-corpo metálico

206

folha projetante folha projetante folha pivotante folha pivotante venezianas venezianas

porta de correr porta de correr guarda-corpo metálico guarda-corpo metálico rebaixo na laje para instalações rebaixo na laje para instalações

1

corte BB

0,75

0

0,75 1,5m

pontos comerciais fechamento com painel de vidro pontos comerciais fechamento com painel de vidro


articulação dos módulos

figura 36. vista frontal do bloco habitacional elaborada pela autora + francisco macedo

207


0,90

0,90 1,65

208

2,25

1,50

2,25

6,00

3,00 9,00

1

unidade habitacional tipo esc. 1:75

figura 37. estudos de diferentes apropriações possíveis para a unidade habitacional proposta elaborada pela autora + raquel carvalho

6,00

3,00

área de expansão 18 m²

3,00

unidade habitacional 36 m²


flexibilidade da unidade

36 + 18 m² 1 quarto cozinha banheiro espaço de estética +1 expansão

45 + 9 m² 2 quartos sala de estar cozinha banheiro área de serviço +1/2 expansão

54 m² 2 quartos sala de tv cozinha banheiro área de serviço comércio

2

diferentes apropriações esc. 1:125

209


210


figura 38. perspectiva interna da unidade habitacional elaborada pela autora

flexibilidade da unidade

211


212

figura 39. processo de desenvolvimento do bloco de moradias: projeto, construção e uso elaborada pela autora


ARQUITETURA EM PROCESSO Abrir o processo de arquitetura para o

ao Estado ou ao mercado, apontando

imprevisível é negar que se chegue a um

abordagens possíveis para a demanda

final. O projeto apresentado aqui não

habitacional; seja para a discussão da

termina, pelo contrário, sua forma é ainda

arquitetura e sua abertura para um

um começo para quem for vivenciá-la: é

contínuo aperfeiçoamento.

na modificação, na apropriação, que o projeto ganha sentido.

Assim, entre projeto, construção e uso, entre inserção urbana, articulação dos

Mesmo que apenas no campo das

módulos e flexibilidade da unidade,

ideias, o projeto tem sua potência

o que se busca por este projeto é o

enquanto gerador de discusos, seja

reconhecimento da permanência por

para os moradores da ocupação junto

meio da transição.

213


figura 40. ocupação no centro acervo pessoal

214


OCUPAÇÃO NO CENTRO A antiga Escola Jesus Maria e José, no

Em paralelo a este processo, outras

centro de Fortaleza, tem sua história

pessoas se instalaram no edifício, à

marcada por algumas ocupações. Os

espera de também conseguir uma

traços de abandono estão nas paredes,

moradia. Este momento tem sido de

no forro a cair, em alguns telhados

transição: uma ocupação está em

que desabaram. Mesmo assim, frente

conclusão, em paralelo à estruturação

à necessidade de ter um lugar para

de uma nova. Uma vez que a Gregório

morar, a ocupação da escola tem sido

Bezerra teve sua demanda atendida, o

uma alternativa.

projeto foi voltado às pessoas da nova ocupação.

Entre as ocupações que passaram pelo prédio, a última foi a Gregório

Existe uma indefinição em diversos

Bezerra,

Unidade

aspectos quanto à nova ocupação: não

Classista. Em março deste ano ocorreu

do

movimento

há ainda um número estável de famílias,

o dia da conquista, quando o prefeito

nem perspectiva do que farão a seguir. A

reconheceu a demanda habitacional da

aplicação do processo se deu, portanto,

ocupação para que as famílias possam

muito mais a partir dos anseios das

receber as casas pelo PMCMV. Uma

novas famílias do que com base em

parte já recebeu, outra parte saiu da

números e demandas específicas. O

escola e está com parentes ou com

resultado não se justifica em números,

conhecidos enquanto aguarda o sorteio,

mas justamente na adaptação de um

e uma minoria ainda está na ocupação.

prédio existente a novas funções.

215


216


figura 41. ocupação no centro acervo pessoal

217


218


figura 42. intervenção realizada no edifício ocupado acervo pessoal

219


220

1

implantação cemja esc. 1:2500


221

CEMJA edificações do entorno imóveis vazios imóveis subutilizados pontos de ônibus teatro josé de alencar

1

praça josé de alencar

2

praçacapistrano de abreu

3

hospital geral dr. césar cals

4

shopping metro

5


A abordagem na Ocupação do Centro

processo proposto, considerando três

se deu por meio da aplicação do novo

principais escalas, a seguir:

1. inserção urbana A escolha de um edifício subutilizado

edifício definido não fosse divulgado,

se deu com base, principalmente, na

o que dificultaria qualquer escolha

disponibilidade de informações e de

em conjunto. A partir dos dados

desenhos. Deste modo, não houve

disponibilizados, optou-se por trabalhar

uma

moradores

com o Centro de Especialidades Médicas

nesta etapa. Por se tratar de uma

participação

dos

José de Alencar, na rua Guilherme

ocupação, foi sugerido pelo movimento

Rocha, junto à praça José de Alencar, no

que o acompanha que o endereço do

centro de Fortaleza.

2. articulação dos módulos

222

As primeiras oficinas ocorreram com

então apresentar a proposta para que

o edifício já definido. Diferente dos

os moradores analisassem. Entre as

moradores da ocupação Raízes da Praia,

decisões, destaca-se a dos pontos de

não há uma mobilização tão forte no

comércio no térreo: nas conversas

centro. Além disso, houve uma maior

sobre a importância de ter outras

dificuldade para conseguir uma postura

funções no edifício e a sugestão de

mais ativa dos moradores: muitos deles

pontos comerciais, responderam “ponto

ficavam desconfiados, outros limitavam-

comercial é muito caro para pagar

se a concordar.

aluguel, box é melhor que é menorzinho, cada um tem o seu”. Assim, o comércio

A diferença na postura dos moradores

no térreo segue essa orientação e pode

do

mudança

servir tanto aos moradores quanto aos

de postura também nas oficinas. Os

vendedores ambulantes que hoje ficam

relatos, presentes desde o primeiro

do lado de fora.

centro

motivou

uma

contato, geravam discussões e, ainda que não refletissem imediatamente em

Os módulos habitacionais seguem uma

decisões projetuais, embasaram muitas

lógica parecida com a proposta para a

decisões posteriores. Assim, ao invés de

Raízes da Praia, exceto por não contarem

encontros com vista a propor junto com

com expansão. Em cada pavimento, na

a comunidade, buscava-se entender

parte que não se encaixa nos módulos

quais as preferências para a moradia,

optou-se por propor espaços coletivos

propor em um segundo momento e

escolhidos pelos moradores.


3. flexibilidade da unidade Assim como na Raízes da Praia, a

todo o restante da área é um vazio a ser

proposta para a unidade habitacional

preenchido. Neste caso, a unidade tem

não pôde ser realizada em oficina

uma área maior, porém não há espaço

por

unidade

para expansão. Ao fim deste estudo,

habitacional tipo da proposta segue

três possibilidades são testadas para o

uma lógica semelhante e conta com

módulo, buscando conciliar diferentes

cozinha, área de serviço e banheiro:

realidades em cada uma.

conta

do

tempo.

A

223

quadro 22. processo proposto na Ocupação do Centro elaborado pela autora quadro 23. encontros e oficinas em paralelo ao desenvolvimento do processo elaborado pela autora


processo decisório coletivo

assistência técnica + estado

inserção urbana

assistência técnica + estado + população

articulação dos módulos

224

número indefinido de famílias edifício definido: cemja

24 habitações + espaços comunitários + pontos comerciais

proposição sem oficinas

processo realizado em oficinas


processo decisório individual

assistência técnica + população

flexibilidade da unidade

usos e modificações tempo

proposição de uma unidade habitacional tipo predefinido: banheiro, cozinha e área de serviço diferentes apropriações da unidade

proposição sem oficinas

225


encontro na ocupação 22.10.2018

primeiro contato e apresentação da proposta do projeto na ocupação

226

oficina 01 27.10.2018

conversa com liderança unidade classista 01.09.2018

apresentação das demandas da ocupação e decisão sobre planejar uma alternativa de habitação em um edifício subutilizado

introdução à noção de camadas e diferentes tempos vinculados ao edifício; primeiras impressões e preferências sobre moradia


tempo

oficina 02

oficina 03

oficina 04

03.11.2018

10.11.2018

17.11.2018

definição de núcleos estruturantes em todos os andares, com base nas áreas molhadas do prédio existente; pré definição das unidades habitacionais

decisão acerca dos espaços que fugiam à área padrão das unidades habitacionais; levantamento de possíveis espaços coletivos nestes espaços

apresentação do estudo preliminar para a ocupação (a partir das decisões das oficinas anteriores)

227


228


figura 43. oficinas realizadas na ocupação do centro acervo pessoal

229


figura 44. oficinas realizadas na ocupação do centro acervo pessoal

230


231


232 figura 45. implantação do edifício em estudo no centro elaborada pela autora sobre base 45° imagery


inserção urbana

233


O EDIFÍCIO O edifício proposto para o ensaio é

Tendo em vista compreender a aplicação

o CEMJA - Centro de Especialidades

do

Médicas José de Alencar, situado na rua

intervenção se dá no térreo e nos cinco

Guilherme Rocha, no centro de Fortaleza.

pavimentos superiores. Para isso, prioriza-

Projetado por Sylvio Jaguaribe Ekman,

se a permanência de tudo o que é mais

o engenheiro Luciano Pamplona Filho, no dia 13.11.2018

234

14 esta informação foi confirmada durante em conversa com

calculado por Luciano

Pamplona14

processo

no

edifício,

a

maior

e

durável, sobretudo a estrutura e as áreas

construído em meados da década de 50,

molhadas. Estas passam então a orientar

o prédio abrigava inicialmente a sede do

uma nova planta, abrigando unidades

INSS. Em 2014 foi fechado para reforma

habitacionais.

e, sob o argumento de falta de recursos, permanece abandonado.

Por tratar-se de um edifício histórico, não se propõe nenhuma alteração significativa

O prédio é composto por térreo,

nas fachadas, à exceção de algumas janelas

cinco pavimentos, casa de máquinas

propostas no quinto pavimento.

e

um

subsolo.

Sua

estrutura

é

modulada com transição de pilares

A intervenção no CEMJA extrapola a

em alguns pavimentos. O pé direito

discussão sobre vazios construídos e

consideravelmente mais alto (de 3,60m)

alcança outros temas, como a intervenção

possibilita esta transição ao permitir

em patrimônio para abrigar moradias e

vigas mais robustas sem prejudicar as

a adequação de diferentes usos em um

atividades em seu interior.

mesmo edifício.


inserção urbana

235

figura 46. Centro de Especialidades Médicas José de Alencar - CEMJA acervo pessoal


existente levantamento de todas as รกreas molhadas e pilares, elementos a serem preferencialmente mantidos

236

N รกreas molhadas existentes


após demolição definição de núcleos de áreas molhadas com base no levantamento anterior, orientando a divisão das unidades habitacionais

proposto proposição de unidades habitacionais com 3 áreas padronizadas a partir da modulação, e de espaços de uso coletivo externos aos núcleos quinto pavimento

quarto pavimento

terceiro pavimento

segundo pavimento

primeiro pavimento

térreo

núcleos de áreas molhadas

núcleos de áreas molhadas espaços de uso coletivo

237


proposição de um novo núcleo de circulação vertical

B

238

A

B

espaço de comércio com estruturas montadas o aluguel deste espaço pode gerar recursos para o edifício

2.5

0

2.5

5m

N


articulação dos módulos

239

A

espaço de coworking/proposta de uma assessoria técnica o aluguel deste espaço pode gerar recursos para o edifício

entrada principal mantida

1

planta térreo - proposta esc. 1:200


B

UH tipo 5 45,83 m²

A UH tipo 4 31,90 m²

FG

UH ti 31,90

FG

B B

240

UH tipo 1 50,10 m²

FG

UH tipo 1 53,70 m²

FG

A

UH 50,1

B

2.5

0

2.5

5m

N


articulação dos módulos

A UH tipo 4 31,90 m²

ipo 4 0 m²

FG

planta quinto pavimento - proposta

3

esc. 1:200 241

UH tipo 3 65,60 m²

FG

UH tipo 1 50,10 m²

2

FG

A

FG

tipo 1 10 m²

FG

planta pavimento tipo - proposta esc. 1:200


nĂşcleo de ĂĄreas molhadas proposto

242

2.5

0

2.5

5m


articulação dos módulos

núcleo de circulação vertical proposto

+28,59

+26,25 terraço

+22,74 casa de máquinas

+19,14 5º pvto 243

+15,54 4º pvto

+11,94 3º pvto

+8,34 2º pvto

+4,74 1º pvto

+1,14m térreo -1,93m subsolo

4

corte AA esc. 1:250

5

corte BB esc. 1:250


figura 47. perspectiva do corredor interno elaborada pela autora

244


articulação dos módulos

245


3,93 2,07 1,85

246

6,00

unidade habitacional 50,10 m²

1,80

6,55 8,35

1

unidade habitacional tipo esc. 1:75

figura 48. estudos de diferentes apropriaçþes possíveis para a unidade habitacional proposta elaborada pela autora + raquel carvalho


flexibilidade da unidade

50,10 m² 2 quartos sala de estar sala de jantar cozinha área de serviço banheiro

50,10 m² 1 quarto sala de estar cozinha área de serviço banheiro lan house

50,10 m² 2 quartos sala de estar sala de jantar cozinha banheiro área de serviço

2

diferentes apropriações esc. 1:125

247


248


flexibilidade da unidade

figura 49. perspectiva interna da unidade habitacional elaborada pela autora

249


POR NOVAS PARTIDAS O processo traçado até aqui se inicia por

que não precisamos ficar inventando,

uma problemática e, partindo do fazer

que não podemos fazer diferente. E

arquitetônico, intenta estruturar uma

então, em meio ao desânimo, aparecem

abordagem possível para respondê-la.

motivos para continuar tentando:

Neste percurso, entende-se que não há solução definitiva: a demanda por

Acho que invento a felicidade para

moradia existe e permanecerá existindo.

compor todas as coisas e não haver

Entre o cenário atual e um futuro

preocupações

desejado, o foco recai então sobre a ideia

inventar algo bom é melhor do que

de transição.

aceitarmos como definitiva uma

desnecessárias.

E

qualquer realidade má. A felicidade deste

também é estarmos preocupados

processo: entre formal e informal,

só com aquilo que é importante. O

entre imersão e diálogo, uma proposta

importante é desenvolvermos coisas

começa a se delinear e é então ensaiada,

boas, das de pensar, sentir ou fazer.

Muitas

foram

as

transições

conciliando projetos ideais e cenários

250

reais, conhecimento técnico e popular.

- TRECHO DE “O PARAÍSO SÃO OS

A proposta pouco a pouco ganha forma,

OUTROS”, DE VALTER HUGO MÃE

representando não apenas um edifício, mas anseios de um futuro mais justo.

Este não é um fim. Que uma qualquer realidade má nunca seja definitiva.

As trocas, no entanto, nem sempre são

Que sempre haja ânimo para novas

fáceis: em uma das reuniões, ouvimos

partidas.


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a capa faz referência à arte ‘empena viva’, do escritório nitsche arquitetos

capa, diagramação e brochura feitas por:

AMARRILHO @caderno.amarrilho caderno produzido com capa em kraft 420g e miolo em papel pólen creme 90g




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