O Presidente vai à escola: Especial Congresso Nacional da AHP

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Ano 14 • Nº 166 • novembro 2019 • Mensal • Preço de Capa: €10 (Portugal)

A REVISTA DO GESTOR HOTELEIRO

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DOSSIER Tecnologia

Turim Hotels Planos de expansão

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Especial congresso Nacional da AHP

O presidente vai à Escola

Sob o mote do congresso “Portugal: Preparar o Amanhã”, Raul Martins, presidente da Associação de Hotelaria de Portugal (AHP), aceitou o desafio de responder às dúvidas dos futuros profissionais do setor.

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“O empregado outsourcing é que quer este regime” Raul Martins, presidente da AHP, foi entrevistado por alunos da ESTHE que o questionaram sobre salários, condições laborais e o estado atual da hotelaria nacional. Texto Rute Simão Fotografia Frame It

Nas cadeiras do auditório 2.19, na Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril, estão sentados dezenas de alunos finalistas do curso de Gestão Hoteleira. Dentro de poucos meses têm encontro marcado com o mercado laboral, num setor sedento de mão-de-obra. O objetivo destes jovens é o de liderar um hotel. Mas sabem, que até lá, há um caminho de baixos salários e várias horas-extra de trabalho a servir à mesa ou na receção. No 31º Congresso da AHP, discute-se o amanhã. Mas é, também aqui, na escola, que o futuro da hotelaria começa. Raul Martins, presidente da associação, aceita o convite e senta-se à conversa perante um auditório que colocou todas as expetativas e preocupação em cima da mesa.

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José: Como é que Portugal pode competir com o nível salarial de outros países? É tudo relativo. Os salários estão, de alguma forma, relacionados com o custo de vida de cada um dos países. Em França, por exemplo, o ordenado mínimo e médio é superior ao de Portugal mas o custo de vida também é superior. Essa relação é que pode ser desequilibrada e, atualmente, vê-se, principalmente em Lisboa e Porto, um grande desequilíbro que decorre da falta de habitação em condições acessíveis para quem tenha ordenados dentro da média. Se fosse possível, as casas habitação e o arrendamento acessível, em Lisboa e no Porto, deveriam destinar-se apenas aos que trabalham nessas cidades. É uma visão estratégica importante que o governo e os municípios deveriam ter. O ordenado médio na hotelaria é superior ao nacional: os dados que temos do _ último levantamento que fizemos junto dos “Se tivermos nossos associados dizem que o nosso ordenado médio foi de 1141 euros, em 2018. O melhor ordenado médio na hotelaria tem vindo a aupessoal mentar nos últimos anos, por força de várias circunstâncias, nomeadamente do aumento de somos instalações hoteleiras. No futuro, penso que melhores com o aumento das receitas do turismo e da hoteleiros ” hotelaria a tendência é a de que os ordenados sejam melhores. Mas nunca chegaremos aos níveis dos países que têm um PIB ou um custo de vida superior ao nosso. Afonso Rito: Qual é o valor médio salarial para um recém-licenciado em hotelaria? Não sei dizer concretamente, mas o ordenado médio deverá ser por volta dos mil euros. Mas o que hoje falta é que os licenciados sejam melhor remunerados e este governo já o veio

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dizer. Não basta subir o ordenado mínimo mas é preciso que os ordenados acima tenham um percurso de crescimento. Claro que isto é uma média, vocês têm formação para ser diretores de hotel mas quando saírem do Ensino Superior vão começar por ser rececionistas e aí estamos a falar de um vencimento inferior. Maia: Têm-nos passado essa imagem, a de que logo que acabemos o curso vamos ser rececionistas. É este o percurso normal no setor? A realidade é essa, não há nenhuma empresa hoteleira que, ao terminarem a faculdade, vos ofereça um lugar de diretor e três mil euros de ordenado. É importante escolherem a área que mais vos agrada para começar o caminho. Seja comercial, F&B, receção etc. Quem quiser ser diretor de hotel é melhor experimentar todos os departamentos. Para podermos dizer como é que se devem fazer as coisas, temos de as saber fazer. Carolina: Uma experiência de trabalho no estrangeiro é uma mais-valia na hora de concorrer a cargos na hotelaria nacional? É sim. E não estamos a falar de apenas experiências no estrangeiro mas em cadeias com um nível de serviço reconhecidamente melhor e isso tem um peso no currículo. 28

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_ ESHTE, A conversa decorreu numa aula com alunos finalistas

Afonso: Há, atualmente, uma grande problemática na hotelaria que diz respeito ao excesso de contratação através de outsourcing e contratos temporários, principalmente em departamentos de F&B. Como é possível resolver a situação? A primeira questão que temos de fazer é: por que é que há trabalho temporário? Porque os hotéis não têm uma ocupação a 100% ou a 80% todo o ano e têm as equipas base e, em alturas de ponta, contratam exteriormente através das empresas de outsourcing. A segunda parte da questão: mas na época baixa também se contrata outsourcing. O empregado de outsourcing é que quer este regime porque acaba por faturar mais e tem mais flexibilidade. Na nossa organização, tenho meia dúzia de colaboradores neste regime a quem repetidamente oferecermos um contrato mas eles recusam e dizem que estão bem assim. Tentamos sempre ir buscar os mesmos funcionários para que não sejamos afetados na qualidade do serviço e para que as pessoas já estejam ambientadas e conheçam as normas. A primeira dificuldade do ousourcing é que são os próprios empregados que querem estar neste regime. Se conseguirem encontrar um horário flexível durante a semana e, aos finsde-semana, trabalhar em casamentos e batizados, é imbatível. Nós, hoteleiros, temos tido

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Afonso: Como é que os hotéis podem ser mais atrativos e seduzir empregados para aceitarem esses contratos em vez de escolherem o outsourcing? A remuneração base é o primeiro fator e depois há empresas que oferecem vantagens colaterais, como prémios em funções dos resultados, por exemplo. Devem procurar quem tenha algumas contrapartidas complementares além do ordenado.

dificuldade em substituir os empregados temporários por efetivos. Hoje há tanta procura que é só escolher. No dia em que houver excesso de empregados, a situação inverte, mas esse dia não está ainda à vista (risos). 30

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José: Com a construção do novo aeroporto do Montijo, que poderá incrementar a atividade turística levando à abertura de novos hotéis, será necessária ainda mais mão-de-obra na hotelaria nacional. Onde é que se vão buscar esses recursos humanos? Vimos buscar essas pessoas aqui mesmo, à escola. O nível de escolaridade dos portugueses tem aumentado nos últimos anos. Quando vamos a um hotel em França ou Inglaterra, constatamos que as categorias com um nível salarial mais baixo são preenchidas por estrangeiros. Em Portugal isso também já está a acontecer. Os naturais dos países CPLP ou de outros países da Ásia, já estão a ocupar essas posições. Vai acontecer, naturalmente, nos lugares em que há dificuldade em preencher nos níveis mais baixos. Esses níveis subirão e é natural que haja portugueses que venham a ocupar esses lugares, posteriormente. Os hotéis, atualmente, até por exigência regulamentar, fazem formação permanentemente. Têm de olhar para dentro e ver o que é que lá têm porque muitas vezes as soluções estão dentro de casa, é uma questão de dar formação a pessoas com características para isso. Não podem ficar só à espera do que vem das escolas. Aquilo que falta em termos de mãode-obra é mais no nível de profissões com uma remuneração mais baixa e essas vão ser difíceis de encontrar em Portugal. Temos de admitir isso e fazer como os outros fazem e não é uma coisa anómala. Há países que têm remunerações inferiores às nossas e estão disponíveis para ocupar esses lugares. Estamos a falar, sobretudo, de housekeeping, por exemplo. Se formos a um hotel a Inglaterra ou Paris, basta ver quem é que lá está - e não são, normalmente, franceses nem ingleses. Ao nível de receção, comercial e outras funções, não há falta de recursos. Podemos fazer isto que estava a referir que é, dentro dos hotéis, promover os que são mais capazes e esta é a forma como os hoteleiros têm de se organizar e os que se organizarem melhor são melhores

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cionais, que normalmente têm um perfil muito definido, apesar de já terem mais do que uma marca para haver uma diferenciação, depois temos os hotéis intermédios, que é um pouco tudo igual e interessa a escala e, em terceiro lugar, são os que se diferenciam pelas suas características. Em Lisboa há um hotel que se chama WC [WC Beautique Hotel], e o quarto é uma casa-de-banho que tem uma cama, basicamente. Pode ser isso ou pode ser um hotel baseado numa produção vinícola em que o spa é feito com vinho. Começa a haver muitos hotéis com temas e estes hotéis é que diferenciam a oferta. Carolina: O crescimento do AL afetou o setor hoteleiro? O AL em relação aos hotéis tem uma experienciação que atrai as pessoas e é muito conveniente para famílias. Os hoteleiros estão a procurar acompanhar essa tendência. Foi isso que nesta nova faixa etária agradou aos turistas e encaixou muito mais dos que os hotéis. Vasco: O ‘boom’ do AL já acalmou ou continuará a aumentar? Os dados deste ano mostram que o crescimento abrandou, o que é natural, também na hotelaria acalmou. Temos 85% de ocupação em Lisboa, e se continuássemos a crescer daqui a dois anos tínhamos de estar a fazer day use. O AL criou um problema, que fez rarear a oferta de habitação, dificultando a vida aos que têm ordenados menores e provocando uma situação de tráfego mais difícil, aumentando a produção de dióxido de carbono. Nesse aspeto, a Câmara Municipal de Lisboa respondeu tarde. A AHP chamou a atenção para essa situação mas só quando os preços para arrendamento dispararam é que tocou a campainha. Normalmente, os empresários estão à frente dos políticos. Os empresários chamam a atenção para as coisas e os políticos só as veem mais tarde. que os outros. Se tivermos melhor pessoal somos melhores hoteleiros. É possível melhorar as instalações hoteleiras, mas a parte do serviço é que faz a diferença e o serviço são as pessoas e é, por isso, que é importante os hotéis darem formação interna. Sara: Há cada vez mais hotéis a abrir. Como é que se distinguem uns dos outros e o que é que estas novas unidades hoteleiras estão a acrescentar à hotelaria nacional? Há três categorias de hotéis: as cadeias interna-

Raul Martins e paula ramalho, O Presidente da AHP com a docente da ESHTE

Teresa: Quais são as características que um diretor de hotel tem de ter? O currículo conta: onde esteve, se esteve em resorts ou num hotel de cidade etc. Há um aspeto que é muito importante que é a liderança. Saber delegar e fazer com que haja espírito de equipa. Segundo, é a capacidade de gerar resultados e não só aumentar as receitas mas a redução de custos também é muito importante. O maior capital que um hoteleiro tem é o pessoal. h A Publituris Hotelaria agradece à ESHTE novembro 2019

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