O FIO DE ARIADNE NA CONDUÇÃO DA ANÁLISE E AS VICISSITUDES DAS PAIXÕES Denise Cuéllar Cini79 1. Ódio/ amor/ignorância Freud e Lacan, ambos falaram sobre a importância das paixões ligadas à transferência na análise. Freud fez uma aproximação tanto do amor como do ódio às pulsões. Em As pulsões e suas vicissitudes (1915), referiu-se ao amor e ao ódio como transformação da pulsão no contrário pela mudança de conteúdo. No entanto, não podemos confundi-los com as pulsões. Além disso, também designou pares de opostos: amar/odiar, amar /ser amado, amar-odiar /indiferença, pois o amar não admite apenas uma oposição. Nesta mesma obra, Freud afirma que o ódio antecede ao amor, quando o eu primitivo repulsa estímulos externos desprazerosos. Repulsa primordial que o eu narcisista opõe ao mundo exterior provedor de estímulos. Lacan, por sua vez, desvincula amor e ódio das pulsões, e também vai contra a errônea ligação entre o amor e a pulsão de vida, bem como do ódio e a pulsão de morte. Paixões não são pulsões. Não são desejos. Não são afetos. O que são? Em seu artigo “O ser da paixão” (In LEAL, C.E.; HOLK, A. L, 1998), Marcus André Vieira constata que, no Seminário 6 (aula de 14/01/59), Lacan refere-se às paixões como “afetos posicionais”: Este papel das paixões, ao mesmo tempo descrevendo uma estrutura e situando uma posição subjetiva, conduz Lacan a cunhar a expressão "afetos posicionais" para referir-se a elas. Elas indicam uma posição fundamental do sujeito com relação ao ser, que é não exatamente o Outro do simbólico, nem o pequeno outro imaginário, mas aproxima-se do real (p. 5).
No Seminário 20 (1972-1973), Lacan chama o amor tanto de sentimento como de afecção. Para ele, a ignorância, juntamente com o ódio e o amor, aparecem como “essenciais” à transferência na análise. Ele diz que a ignorância vai com o amor e o ódio na transferência: “O sujeito que vem para análise se coloca […] na posição daquele que ignora. Nenhuma entrada possível na análise sem essa referência” (LACAN, 1986a, p. 309).
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Psicanalista, membro da Biblioteca Freudiana de Curitiba desde 1995. Presidente desta instituição de 2012 a 2014. Vice-presidente em duas gestões. Exerce a transmissão da psicanálise e coordena grupos de trabalho há mais de 20 anos. Apresentou diversos artigos em Jornadas, Congressos e Reuniões Lacanoamericanas de Psicanálise.
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