OS LUGARES DO SOM // FAU USP // TFG 2013
OS LUGARES DO SOM BERNARDO LOUREIRO // ORIENTADORA PROF. DRA. GISELLE BEIGUELMAN // FAU USP // TFG // 2013
Para Leila, ĂŠ claro.
Sumário 1. INTRODUÇÃO // 10 2.1 TÉCNICOS: NOVOS ESPAÇOS, NOVOS SONS // 18 2.2 ARTISTAS: NOVOS SONS, NOVOS ESPAÇOS // 31 3.1 EXPERIMENTOS: TECNOLOGIA UTILIZADA // 54 3.2 EXPERIMENTOS: MICROFONIA // 58 3.3 EXPERIMENTOS: CAMINHANDO NO SOM // 64 4. EXPERIMENTO FINAL // 74 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS // 90 6. APÊNDICE // 96 7. BIBLIOGRAFIA // 106 8. ÍNDICE DE IMAGENS // 110 9. ÍNDICE DE ÁUDIO // 112
agradecimentos Agradeço à professora Giselle Beiguelman, pela orientação e pelo apoio constante ao longo deste ano. Agradeço também à professora Daniela Kutschat e ao professor Fernando Iazzetta, pelas conversas esclarecedoras e por participarem da banca deste trabalho. À professora Maria Cristina Leme, fundamental na minha formação, por me incentivar a pesquisar com rigor e interesse pelo novo. Agradeço aos sócios do 23 Sul, Gaú, Ivo, Lucas, Luís, Moreno e Tiago, pela compreensão e também pelo interesse que sempre demonstraram por este trabalho. A minha família, Regina, Luiz e Júlia, pelas dicas, revisões, doação de equipamentos, por aturar todo tipo de sons em casa durante meses e, sobretudo, pelo carinho e apoio. Muito obrigado a todos meus amigos, em especial aos que me acompanharam e me ajudaram nessa jornada do TFG, emprestando-me equipamentos, ideias, mãos e ouvidos. Ao André Sztutman, André Kavakama, Anelise, Artur Kim, Caio, Estevão, Flávio, Fred, Guilherme, João Miguel, Leonardo, Letticia, Mariana, Rafaella, Rafael, Raísa e Selma. E a Leila, obrigado. Por me fazer ouvir o silêncio quando eu precisava, por me fazer soar quando eu achei que era impossível.
silêncio – infiltra nas rochas o canto das cigarras —Bashô mesmo em Quioto, sinto saudade de Quioto – ouvindo o cuco cantar —Bashô
Um haicai é feito com todos os sentidos. Os de Bashô, sobretudo. —Paulo Leminski
1. Introdução
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Este trabalho tem a intenção de despertar interesse e ampliar o debate sobre a importância do som na percepção espacial. A relação entre som e espaço é essencial na percepção do espaço, uma vez que o som nos vincula ao local e ao tempo em que estamos. Como aponta Leitner, “Essa interconexão entre homem e espaço, que é alcançada com sons e que afeta até o nosso ser mais profundo, é como um tipo de diálogo determinado pela acústica local.”.1 O som tem características espaciais que permitem que ele penetre e permeie, ocupe e preencha o espaço. O som tem volume e é imersivo; ele nos envolve e, ao contrário da visão, que nos coloca em frente às coisas, o som nos coloca no meio delas. Nós podemos nos fechar para as imagens, mas é impossível nos fechar para o som. Estamos sempre ouvindo, raramente de maneira passiva – estamos também escutando, separando os sons que nos interessam de outros que se tornam então ruídos ou sons de fundo.2 Apesar da sua importância no fenômeno da percepção espacial, o som é no entanto muitas vezes percebido como algo acessório à experiência visual, ou seja, como “trilha sonora” para as imagens. É como se, ao ouvirmos os sons de um determinado local, esses funcionassem apenas como confirmação para as imagens, ao 1 Leitner, 1985. 2 Connor, 2005, p. 135.
coincidirem com elas – como se o ouvido não pudesse ouvir nada diferente do que os olhos vêem. Meu objetivo com este trabalho é destacar essa importância do som que passa muitas vezes desapercebida, encoberta pela nossa propensão aos estímulos visuais na apreensão do espaço. Acredito que esse tema seja de especial interesse para os arquitetos, em função não só do seu papel como produtores de espaços mas também como produtores de significados e conceitos sobre esses espaços. A arquitetura pode tornar-se muito mais rica ao considerarmos outros sentidos além da visão na sua concepção e apreensão. Tanto na prática quanto na crítica da arquitetura o papel do som tem sido em grande parte relegado a segundo plano, devido a uma série de razões culturais e profissionais. Alguns autores apontam motivos para essa difícil relação entre som e arquitetura, e para os problemas que surgem quando som e espaço colidem na nossa cultura. Leitner indica como a relação entre som, espaço e corpo foi amplamente desconsiderada na construção e na teoria da arquitetura moderna, ecoando a maneira hostil com que o Iluminismo considerava o corpo humano.3 Outros apontam as diferenças práticas entre o ato de produzir sons, leves e efêmeros, e de produzir arquitetura, pesada e de certa forma permanente. Nesse sentido, é significativo o fato do som ser extremamente difícil de ser representado, enquanto a
3 Leitner, 1985.
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arquitetura encontra na representação uma das suas principais formas de expressão.4 O arquiteto e teórico Juhani Pallasmaa tem buscado enfatizar a importância dos cinco sentidos na percepção e na concepção da arquitetura. Em seu livro “Os olhos da pele”, Pallasmaa discute o predomínio da visão na arquitetura em detrimento dos outros sentidos. O autor contrapõe-se a esse predomínio, ao qual ele atribui “a falta de humanismo da arquitetura e das cidades contemporâneas (…), o aumento da alienação, do isolamento e da solidão no mundo tecnológico de hoje (…)”5. Segundo Pallasmaa, “A audição estrutura e articula a experiência e o entendimento do espaço”; embora muitas vezes não percebamos conscientemente, o som fornece “o continuum temporal no qual as impressões visuais estão inseridas.”6 Sua crítica é sobretudo interessante pelo fato de o autor também realizar projetos de arquitetura, apontando assim direções possíveis para uma arquitetura que considere todos os sentidos na sua concepção. Como aponta Ripley, o momento atual parece ser adequado para lidar com essas questões, em função de fatores como o interesse renovado em questões ambientais, na fenomenologia da arquitetura, ou o desenvolvimento computacional que tem permitido a produção de arquiteturas sensíveis ou responsivas.7 Esse 4 Ripley et. al., 2007, p. 7. 5 Pallasmaa, 2011, p. 17. 6 Pallasmaa, op. cit., p. 47. 7 Ripley et. al., 2007, p. 7.
fato é demonstrado também pela dedicação recente de pesquisadores, artistas e arquitetos ao tema. Segundo Kelly, a divisão entre som e as chamadas “artes visuais”, vem recentemente sendo perturbada por “(...) um murmúrio subterrâneo entre um pequeno número de artistas e teóricos preocupados com som [que] subiu à superfície, sendo amalgamado em um corpo de discurso de centralidade inesperada para a arte do presente”.8 Para trabalhar essa tensão entre espaço e som, procurei entender quais seriam alguns dos motivos históricos que levaram a sua ocorrência. Para isso, estudei os desenvolvimentos técnicos e profissionais no campos da acústica arquitetônica e das tecnologias de gravação eletroacústica. Além disso, busquei me aprofundar nos artistas e músicos que têm essa tensão como parte central do seu trabalho e dos seus questionamentos – por exemplo, Cage, Neuhaus e Cardiff, entre outros. Procurei estudar a relação entre som e espaço baseando-me no conceito de paisagem sonora, elaborado por Thompson a partir de Schafer. De acordo com Thompson, “... eu defino paisagem sonora (soundscape) como uma paisagem auditiva ou aural. Da mesma forma que uma paisagem (landscape), uma paisagem sonora é simultaneamente um ambiente físico e uma maneira de percebê-lo; é tanto um mundo quanto uma cultura construída para dar sentido a esse mundo. (…) Uma paisagem sonora, 8 Kelly, 2011, p. 13.
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assim como uma paisagem, tem em último caso mais relação com civilização do que com natureza e, desse modo, está constantemente em construção e sempre mudando.”9
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Ao mesmo tempo, procurei realizar experimentos práticos com som, que serviram tanto como ferramenta de estudo quanto de comunicação dos resultados da pesquisa. Uma vez que a representação do som é algo extremamente difícil, pareceu-me adequado evitar essa tradução do som para a sua representação, trabalhando diretamente com o som em si. Nesses experimentos, busquei explorar tanto as características acústicas dos espaços quanto os sons que compõem as suas paisagens sonoras. Para isso, trabalhei com microfonia, com o tempo de reverberação e outras características acústicas do ambiente, com gravações de campo e espacialização sonora, e com manipulações sonoras que poderiam ser feitas nesses espaços. Ao buscar entender, manipular e subverter a paisagem sonora, procurei evidenciar as maneiras com que o som se relaciona com determinados espaços. Ao final, escolhi um desses experimentos para ser apresentado, e acredito que ele possa comunicar de uma maneira direta e sintética muitas das observações e considerações que serão feitas ao longo deste trabalho. A primeira parte do trabalho começa com uma pesquisa sobre as mudanças na paisagem sonora moderna, abrangendo o período da virada do século XX até 9 Thompson, 2004, p. 2.
a década de 1930. Baseando-me na pesquisa da historiadora Emily Thompson, falo a respeito de Wallace Sabine e do surgimento do campo profissional da acústica arquitetônica, do desenvolvimento de técnicas e das mudanças nesse campo que levaram a um novo paradigma antireverberante na arquitetura. A seguir, resumo o surgimento dos meios eletroacústicos de gravação e reprodução, e as mudanças na paisagem sonora das grandes cidades e subsequentes tentativas de domá-las. Na parte seguinte, trato de alguns músicos e artistas que abordaram essas questões em seu trabalho, tocados pelas tensões entre som e espaço e pelas radicais mudanças na paisagem sonora das cidades modernas. Esses artistas viriam, ao longo da segunda metade do século XX, a questionar como os espaços alteram, moldam e filtram os sons gerados neles; como o som pode ser usado para transformar e criar espaços; qual o valor dos sons da cidade moderna; qual é a diferença entre ruído e música; qual é a relação entre som e lugar e qual é a capacidade do som de transportar-nos para outros lugares. Na terceira parte, falo das técnicas que estudei e dos experimentos que realizei na tentativa de entender melhor a relação entre som e espaço. Dos experimentos desenvolvidos, nem todos foram levados adiante, seja por problemas técnicos, por serem menos interessantes, ou até mesmo por uma escolha deliberada que faz parte de qualquer projeto. No entanto, todos esses experimentos informaram e foram essenciais para o
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finalmente escolhido para ser apresentado, e por esse motivo estão descritos aqui. Na quarta parte descrevo o experimento final, sua elaboração e os resultados esperados para o mesmo. Escolhi usar a palavra “experimento” para essas atividades desenvolvidas pois acredito que ela remete ao mesmo tempo a um trabalho de ensaio, tentativa e erro, e a algo que lida com a experiência, por meio dos sentidos e da percepção. Por fim, concluo com uma avaliação desta pesquisa e, mais especificamente, do experimento final. Tentei sempre que possível inserir ao longo do texto chamadas para trechos de áudio, seja de referências ou de experimentos realizados por mim. Esses trechos são numerados a partir de AUD.01, e estão referenciados em um índice, localizado nas últimas páginas deste caderno. Acredito que esses sons sejam centrais para este trabalho que é, fundamentalmente, sobre algo muito difícil de se representar. Nesse caso, talvez seja melhor “lidar com a coisa em si e não com a sua representação”10 – talvez seja melhor deixar o som falar.
10 Ripley et. al., 2007, p. 8.
2.1 Técnicos: Novos Espaços, Novos Sons
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O período recortado nessa pesquisa começa com a construção do Boston Symphony Hall, inaugurado em 1900 e marco fundador da acústica arquitetônica. Projetado pelos arquitetos McKim, Mead e White, o auditório foi o primeiro a ser concebido segundo cálculos de acústica cientificamente embasados11. O físico e professor da Harvard University, Wallace Sabine foi o consultor acústico do projeto, e é considerado o fundador da acústica arquitetônica moderna. Sabine realizava pesquisas sobre o comportamento acústico de salas desde a última década do século XIX, quando foi convidado a investigar o desempenho acústico ruim da Fogg Lecture Room, em Harvard. Essa sala, que servia como local de palestras, possuía problemas sérios quanto à inteligibilidade da fala. Segundo Eliot, presidente da universidade e responsável pelo convite a Sabine, o problema deveria estar relacionado aos ecos demasiado longos que se produziam na sala, ou seja, devido ao excessivo tempo de reverberação do local. O tempo de reverberação de uma sala pode ser definido conceitualmente como o tempo que um som, gerado no interior da sala, demora para deixar de ser audível no mesmo local. Os sons que ouvimos dentro de uma sala são uma combinação da onda sonora original, vindo diretamente até nós, com os rebatimentos dessa onda nas diversas 11 Thompson, 2004, p. 44.
superfícies da sala. Para poder quantificar uma relação entre as características espaciais da sala e o tempo de reverberação, Sabine realizou um longo trabalho experimental. Durante meses, ele percorreu várias salas em Harvard, nas quais emitia um som de intensidade e frequência padronizada utilizando um órgão e, com um cronômetro, media o tempo decorrido até que esse som deixasse de ser audível. Sabine passou então a manipular os tempos de reverberação dessas salas, introduzindo várias almofadas de cadeira nos locais e então repetindo suas medições, anotando os diferentes resultados para a diferente quantidade de almofadas presentes. As almofadas foram escolhidas para uso no experimento por serem padronizadas e de baixa variabilidade, fáceis de ser transportadas e fáceis de ser encontradas no campus. Com esse experimento, Sabine confirmou sua hipótese de que o tempo de reverberação estava relacionado ao volume da sala e aos materiais encontrados nela. A partir desses resultados, Sabine pôde estabelecer uma relação quantificável entre um determinado material, sua quantidade e o tempo de reverberação de um sala. Ao desenhar um gráfico com diversos valores de tempos de reverberação em função da quantidade de almofadas na sala, ele observou uma relação matemática entre os dois, cuja função era uma hipérbole. Assim, Sabine estabeleceu uma fórmula que poderia determinar a reverberação de uma sala mesmo antes de ser construída, desde que se soubesse suas dimensões e quais materiais seriam utilizados na
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construção e nos acabamentos. Com essa descoberta, nasceu o campo profissional da acústica arquitetônica, e uma relação quantitativa entre espaço e qualidade acústica que havia sido buscada há muito tempo foi finalmente desvendada12. Nos últimos anos da década de 1890, Sabine continuou seus experimentos com vários materiais comumente utilizados na construção civil, determinando os diferentes impactos de cada material no tempo de reverberação dos ambientes. Utilizando-se da sua fórmula durante a fase de projeto do Boston Symphony Hall, Sabine pôde prever o tempo de reverberação do futuro auditório e propor mudanças para que ele se aproximasse de um valor mais desejável. Esse valor foi estabelecido em comparação com o tempo de reverberação medido em outros auditórios, principalmente na Europa, considerados por músicos e maestros como locais de boa acústica. O trabalho de Sabine possibilitou o nascimento da acústica arquitetônica moderna. Seu método permitia prever o tempo de reverberação de um ambiente cientificamente e, até certo ponto, antever como uma sala iria soar mesmo antes de ser construída. Assim, como consultor acústico no projeto do Boston Symphony Hall, Sabine sugeriu grandes alterações no projeto diretamente aos arquitetos, que as acataram prontamente. Como resultado, a acústica do auditório se tornou um grande sucesso de crítica, e é ainda considerada por
12 Thompson, 2004, pp. 41–42.
2.1 Tempo de reverberação em função da quantidade de almofadas; elaborado por Sabine, 1900.
2.2 Boston Symphony Hall, c. 1900.
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especialistas como uma das melhores salas do mundo para apresentações musicais.13 Após os trabalhos pioneiros de Sabine, formou-se um campo profissional para a prática da acústica arquitetônica. Utilizando e aprofundando a equação desenvolvida por Sabine, esses profissionais passaram a trabalhar junto com arquitetos no projeto de auditórios e salas de concerto. Essa equação mostrou-se útil para calibrar tanto a inteligibilidade da fala quanto de um bom desempenho para música. O trabalho dos novos engenheiros acústicos estava sobretudo centrado na questão do controle do tempo de reverberação, e artigos publicados nas primeiras décadas do século XX mostram que esses profissionais passaram a recomendar, sobretudo, a redução da reverberação, de modo a melhorar o desempenho acústico de salas14. Vale a pena também falar aqui de alguns outros desdobramentos, ocorridos durante o século XX, que influenciaram não só o campo da arquitetura e da acústica arquitetônica mas que também alteraram profundamente a paisagem sonora e a cultura auditiva moderna. Um desses desdobramentos foi a invenção de meios eletroacústicos de gravação, amplificação e reprodução do som. Esse desdobramento foi possibilitado por equipamentos como microfones, alto-falantes, transmissores de rádio, amplificadores de válvula e fonógrafos, quase todos inventados ainda no século XIX, 13 Thompson, 2004, p. 57. 14 Idem, pp. 247–248.
e popularizados e disponibilizados comercialmente no século XX. Com essas invenções, não só os profissionais da acústica se viram munidos de instrumentos que se tornariam indispensáveis para o seu trabalho, como também tornou-se cada vez mais fácil para o público em geral comprar aparelhos que os permitiam escutar fala e música fora dos locais onde esses sons tinham sido gerados. Era possível escutar concertos em casa, por exemplo, sem precisar ir a auditórios, ou então ouvir palestras e discursos, através do rádio. Segundo Thompson, o início de uma dissociação moderna entre som e espaço estava se formando, dissociação essa que viria a se ampliar com o paradigma pós-Sabine adotado pelos especialistas em acústica arquitetônica.15 Essa cisão entre o som e o seu local de origem foi batizada por Shafer de “esquizofonia”, em seu livro The New Soundscape.16 Também com a popularização das novas tecnologias de reprodução de som, muitos ouvintes passaram a se acostumar com o som que escutavam de seus rádios e fonógrafos, um som muito mais “seco”, ou seja, não-reverberante, do que aquele encontrado nas salas de concerto. O paradigma da gravação e reprodução eletroacústica era entregar um som seco, por ser tido como mais versátil e inteligível17. Além disso, uma vez que não se sabia quais seriam as condições acústicas do 15 Thompson, 2004, p. 2. 16 Schafer, 1969. 17 Thompson, op. cit., p. 7.
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2.3 Representação “Phonodeik” de uma onda de som, em uma propaganda do fonógrafo Aelion-Vocalion, 1915. Vemos na imagem novas tecnologias de reprodução e representação de ondas sonoras.
lugar no qual os ouvintes estariam, fazia sentido para os especialistas gravar os sons de maneira mais direta e não-reverberante possível, deixando que a reverberação acontecesse, se desejada, no local de escuta final. A reverberação passou a ser vista como a grande vilã da acústica sobretudo com o advento dos filmes falados e da música gravada. Com a tecnologia que permitia associar sons gravados a filmes, os estúdios adotaram o paradigma dominante de gravar o som de maneira direta e sem reverberação. Dessa maneira, fazia sentido para os especialistas em acústica reduzir também a reverberação das salas de cinema, para que elas não interferissem com a mixagem de áudio feita no estúdio. Assim, um dos trabalhos importantes dos profissionais da acústica, a partir do final da década de 1920, consistiu em projetar e especificar materiais para salas de cinema, assim como propor soluções para as salas de cinema que haviam sido construídas na era dos filmes mudos.18 Paralelamente, começaram a ser projetadas salas especialmente para a apresentação de música amplificada. O paradigma nessas era similar ao das salas de cinema. A Radio City Music Hall, completada no fim de 1932 em Nova Iorque é um marco inicial dessa nova tipologia de salas de concerto. Equipada com microfones no palco e caixas de som embutidas no teto e nas paredes ao longo da platéia, a Radio City não precisava mais contar com a reverberação para fazer com que o som chegasse aos ouvintes sentados no fundo da platéia. 18 Thompson, 2004, pp. 259–260.
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Pelo contrário, nessa nova situação a reverberação deveria ser minimizada, de modo a não interferir com o trabalho que era agora realizado pelas caixas de som, responsáveis por levar o som a todos ouvintes da platéia com clareza e de modo direto. Como afirma Thompson, esse desenvolvimento acabou por ampliar a dissociação entre som e espaço, já iniciada pela invenção da gravação e reprodução eletroacústica. Com o novo paradigma de acústica arquitetônica dos cinemas e salas de concerto, tornou-se primeiro objetivo dos especialistas minimizar a reverberação, de modo a anular a interferência do espaço sobre o som. Consequentemente, as salas de concerto passaram a soar cada vez mais semelhantes entre si. Ao mesmo tempo, sons diretos tornaram-se o padrão para um público cada vez mais acostumado com espaços não-reverberantes e consumidor de sons gravados.19 No entanto, reações a esse paradigma antireverberante surgiram ao longo do século XX. Profissionais de acústica começaram a perceber a importância de fatores como como claridade, brilho, calor, intimidade, amplidão, envolvimento e presença na determinação da qualidade acústica de um ambiente. Para poder medir essas características extremamente subjetivas, esses profissionais tentaram então estabelecer parâmetros quantificáveis para poder medi-las, como primeiras reflexões, difusão, proporção da reverberação de graves com relação a agudos, entre outros. Esses fatores passaram a ser considerados conjuntamente com o 19 Thompson, op. cit, p. 321.
2.4 e 2.5 Radio City Music Hall, Nova Iorque, 1933. Com capacidade para 6.200 pessoas,
foi um dos primeiros audit贸rios projetado para o uso de sistemas de alto-falantes.
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tempo de reverberação, de modo a precisar a qualidade acústica de uma sala. Além disso, o consenso na disciplina, a partir da metade do século XX, passou a favorecer tempos de reverberação significativamente mais elevados do que aqueles recomendados pelos profissionais nas primeiras décadas do século.20 Simultaneamente e em certa parte impulsionadas pelos desenvolvimentos tecnológicos, as cidades passaram a ser cada vez mais ruidosas, preenchidas mais e mais por ruídos decorrentes da revolução industrial, como automóveis, trens, bondes, máquinas a vapor, buzinas, freios, sirenes, campainhas, máquinas da construção civil, rádios e aviões. Uma grande mudança na paisagem sonora das cidades modernas estava acontecendo e com ela, começou a ser levantada a questão dos ruídos nas cidades e dos seus impactos, principalmente sobre a saúde humana. Artistas foram igualmente influenciados por esses novos desenvolvimentos, tanto pelas novas tecnologias de gravação e reprodução do som quanto pelas mudanças na paisagem sonora das cidades. Para uma pesquisa mais aprofundada, foram escolhidos alguns dos vários artistas tocados por essas questões, em especial os trabalhos daqueles que possuem uma forte relação entre espaço e som.
20 Mehta, 1998, passim.
2.6 “Fontes de ruído urbano”, Prefeitura de Nova Iorque, 1930.
2.2 ARTISTAS: NOVOS SONS, NOVOS ESPAÇOS Em algum momento durante o ano de 1951, o músico americano John Cage, visitou uma câmara anecóica na universidade de Harvard. Na mesma universidade onde Sabine, mais de meio século antes, fez a descoberta que deu origem ao campo da acústica arquitetônica, Cage teve uma experiência que considerou fundamental no seu desenvolvimento como compositor. Uma câmara anecóica é um espaço totalmente isolado de ruídos externos e que, devido a grande absorção das suas superfícies internas, apresenta praticamente nenhuma reverberação. Num local como esse, Cage deveria ter ouvido um silêncio absoluto. No entanto, ao sair da sala, ele relatou ao engenheiro de som que havia escutado os dois ruídos, um mais grave e outro mais agudo. Segundo a resposta do engenheiro, o mais agudo seria o seu sistema nervoso em funcionamento, e o mais grave, o circulatório.21 Essa história, narrada pelo músico em seu livro “Silence” e depois reproduzida em uma série de outros textos, é geralmente tida como um ponto de inflexão na música de Cage. Segundo ele, a partir dessa experiência foi possível perceber a impossibilidade do silêncio. “Até o dia em que eu morrer haverá sons”, escreveu Cage, “E eles continuarão após a minha morte. Não é preciso temer sobre o futuro da música.”.22 21 Cage, 1961, p. 8. 22 Idem, ibid.
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É interessante aqui destacar alguns pontos desse episódio que demonstram a sua relação com os desenvolvimentos técnicos e científicos narrados anteriormente. Primeiramente, a experiência de Cage foi intermediada por um espaço de características acústicas muito específicas. A câmara anecóica era ao mesmo tempo fruto das pesquisas em acústica e laboratório para desenvolvimentos futuros no campo, principalmente para testes com equipamentos eletroacústicos. O segundo fato importante é o papel que o engenheiro de som desempenhou no episódio. Embora as causas apontadas por ele para os ruídos ouvidos por Cage tenham sido posteriormente contestadas por outros autores e pesquisadores médicos,23 Cage permaneceu fiel à interpretação do engenheiro, relatando a experiência de modo idêntico em depoimento gravado mais de vinte anos depois.24 Assim, a experiência de Cage estava intimamente ligada aos desenvolvimentos da acústica, que possibilitaram a construção de novos espaços sonoros. Ao mesmo tempo, o músico depositou grande confiança em um profissional do novo campo da engenharia de som, aceitando sua explicação para um acontecimento fundamental da sua carreira. Tal foi a importância desse episódio que Cage o apontou como um dos principais 23 Heller e Bergman, em 1953, revelaram que, de um grupo de 80 pessoas sem problemas de audição, 93% afirmou ter ouvido alguma espécie de zumbido ao serem colocadas em uma sala silenciosa, isolada de ruídos exteriores. 24 Cage em depoimento a Nam June Paik, 1974.
motivos que o levaram a compor sua peça mais conhecida: 4’33’’, ou quatro minutos e trinta e três segundos. Composta em 1952, a peça foi apresentada pela primeira vez pelo pianista David Tudor. Nessa execução, Tudor marcou os três movimentos abrindo e fechando o piano, sem tocar nenhuma nota, enquanto contava o tempo de duração indicado no título. Decorridos os quatro minutos e trinta e três segundos, a peça havia acabado, e Tudor não havia produzido nenhum som tradicionalmente tido como musical. Apesar de ser composta inteiramente de pausas musicais, o que escutamos durante a execução dessa peça não é o silêncio, mas sim os sons dos locais onde estamos, sons gerados por máquinas, pelas outras pessoas, pela nossa própria respiração e movimentos, mesmo que mínimos. Por isso, 4’33’’ é muitas vezes interpretada como uma reflexão sobre os sons que nos rodeiam. Cage propõe com a sua composição que não há silêncio em nenhum lugar – de fato, o que ele afirma é que o silêncio simplesmente não existe. Ao compor 4’33’’, Cage está fazendo-nos escutar os sons de cada lugar, sons que são impossíveis de ser anulados. Além disso, ele propõe através dessa peça que escutemos aos sons que nos cercam com a mesma atenção e valor com os quais escutamos música, subvertendo a dicotomia entre música e ruído. Kaprow, aponta dois desenvolvimentos experimentais importantes na música de Cage: “(..) a prática sustentada de usar operações de acaso para arranjar e selecionar sons e durações
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de uma peça, e o acolher de ruídos em uma composição como equivalentes ao som musical convencional.”25 Outro músico e artista que trabalhou questões semelhantes a Cage foi o nova iorquino Max Neuhaus. Neuhaus iniciou sua produção artística na década de 1960 e desde então buscou em seus trabalhos “formar, transformar, criar lugares específicos, somente através do som”.26 Como afirma Potts, Neuhaus concebia seu trabalho como constituído pela relação perceptiva entre a obra e a platéia.27 Muitas de suas obras eram pensadas para espaços públicos, e ele buscava incorporar elementos do cotidiano nelas. “Listen”, classificado pelo artista de uma “palestra de demonstração”, foi apresentado pela primeira vez em 1966, e é um trabalho que articula som e espaço, público e cotidiano. Nesse trabalho, o artista convidava pessoas para encontrá-lo em uma esquina de Nova Iorque, onde carimbava em suas mãos a palavra “LISTEN”. Em seguida, Neuhaus os guiava por caminhadas nas ruas da cidade, sem falar nada, esperando que as pessoas prestassem atenção aos sons que ouviam no percurso. Ecoando John Cage, Neuhaus buscava mostrar que os ruídos que nos cercam podem ser tão interessantes e importantes quanto música, se ouvirmos atentamente. No entanto, diferentemente de Cage, a quem ele admirava mas também criticava, Neuhaus não queria 25 Kaprow, 1987, p 26. 26 Potts, 2009, p. 45. 27 Idem, ibid. 2.7 Poster para “Listen”, 1976.
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trazer sons da cidade para dentro da sala de concerto, mas sim que as pessoas ouvissem os sons da cidade na própria cidade. Segundo ele, o carimbo era “a palestra” e a caminhada, “a demonstração”28 Um outro trabalho de Neuhaus que também trata das questões relativas a importância do som na percepção espacial é “Times Square”, de 1977. Nesse trabalho, o artista instalou sintetizadores digitais dentro de alguns túneis de ventilação do metrô, sob uma ilha de pedestres no meio da Times Square, entre duas avenidas muito movimentadas de Nova Iorque. Sobre a saída desses túneis há uma grande grelha de metal, e os pedestres que passasem ali poderiam ouvir os sons produzidos pelos sintetizadores, ressoando de dentro dos túneis subterrâneos, constantemente. A obra funcionou ininterruptamente, 24 horas por dia, de 1977 até 1992, e depois, de 2002 em diante. Ao criar uma peça sem duração definida, como é o caso de Times Square, Neuhaus altera o foco temporal da música para um espacial. Sua intenção não era distribuir elementos sonoros no tempo, como é feito na música tradicional, mas sim distribuí-los no espaço, deixando que o ouvinte estabeleça seu próprio tempo de escuta. Além disso, o trabalho é interessante pela utilização de uma arquitetura já existente para a sua realização. Na instalação do trabalho, Neuhaus procurou utilizar frequências e localizações específicas para os sintetizadores de modo a amplificar o efeito de ressonância 28 Neuhaus, 1990.
existente na junção dos túneis. Por meio de uma série de tentativas, Neuhaus chegou ao resultado desejado, apropriando-se assim das características acústicas peculiares daquele local. Desse modo, Neuhaus descreve o trabalho como uma “construção”, e não uma “composição” do som. Seguindo essa lógica construtiva, ele elaborou uma “topografia auditiva” do seu trabalho, representando as áreas onde predominam frequências graves, médias e agudas sobre a grade do metrô. Ao ouvir o som contínuo e de rica textura, emanando de dentro das grades do metrô, o ouvinte pode facilmente confundi-lo com algum ruído mecânico, próprio dos sistemas da cidade, como metrô ou energia. Neuhaus se apropria dessa ambiguidade ao não colocar nada que identifique sua obra no local, e com isso enriquece a possibilidade dos seus significados. Assim, o pedestre pode possivelmente ouvir o trabalho de Neuhaus como um som qualquer da cidade, o que abre a possibilidade para que ele também possa escutar sons da cidade como um trabalho artístico. Para aqueles que reconhecem o trabalho de Neuhaus como um som deliberado, inserido na paisagem sonora local, o som funciona como um ativador de uma percepção auditiva e espacial mais aguçada. Por estar nesse limiar da percepção, o trabalho permite não só que o escutemos como um som local, mas que passemos a escutar os sons da cidade com outros ouvidos. Além disso, é significativo o fato de artista ter escolhido a Times Square, um local onde há uma grande
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2.8 Neuhaus na Times Square, 1977.
2.9 Times Square, c. 1990. 2.10 Desenho da topografia auditiva da instalação, por Neuhaus, 1977.
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sobrecarga de informações visuais, para realizar um trabalho sonoro tão sutil. Tratando dos sons da cidade como material artístico, em ambos trabalhos descritos aqui Neuhaus estabelece simultaneamente uma relação entre espaço e som, revelando a conexão entre os sons que escutamos e o local onde eles são gerados e experimentados. Em uma entrevista em 1982, Neuhaus afirmou: “Em termos de classificação, eu colocaria as instalações sonoras no escopo das artes visuais, mesmo que elas não tenham um componente visual, uma vez que as artes visuais, no sentido plástico, têm lidado com o espaço. Escultores definem e transformam espaços. Eu crio, transformo e modifico espaços através da adição de sons.”29 Preocupado em trazer uma maior atenção para os sons urbanos, Neuhaus se opunha ao discurso e às políticas da administração nova iorquina no que dizia respeito ao tema da poluição sonora. Em 1974, o Department of Air Resources de Nova Iorque produziu um panfleto intitulado “Noise Pollution Makes You Sick”, no qual descreviam as implicações negativas, físicas e psicológicas, da exposição a ruídos urbanos. Em resposta, Neuhaus publicou no New York Times seu texto “Noise Propaganda Makes You Sick”, criticando os burocratas por exagerar os efeitos da exposição de ruídos à saúde humana. Segundo Neuhaus, o problema central da argumentação burocrática era condenar arbitrariamente 29 Potts, 2009, p. 46.
como poluição a maioria dos sons gerados nas cidades, gerando assim “ruído onde ele nunca antes existiu”. Como consequência dessa condenação generalizada dos sons urbanos, Neuhaus afirma que “fomos roubados da nossa capacidade de escutar o nosso ambiente”30. Outro nome importante nesse momento de questionamento da natureza e importância dos sons na sociedade moderna foi o canadense Murray Schafer. Músico, escritor e ambientalista, Schafer foi responsável pela difusão do conceito de paisagem sonora, descrita no seu texto “The Soundscape”, de 1977. Ele define uma paisagem sonora como “(...) qualquer campo de estudo acústico. “, e continua, “Nós podemos falar de uma composição musical como uma paisagem sonora, ou de um programa de rádio como uma paisagem sonora ou de um ambiente acústico como uma paisagem sonora.”.31 Schafer começa seu texto com a constatação de que a paisagem sonora do mundo moderno estava mudando drasticamente e que a poluição sonora estava se tornando um problema mundial. Como resultado, especialistas buscavam reduzir as fontes de ruídos, mas Schafer discorda dessa abordagem, pois considera-a demasiado negativa. Ecoando o artigo de Neuhaus no New York Times, ele afirma que “Poluição sonora ocorre quando não escutamos cuidadosamente”, e defende o estabelecimento de uma disciplina chamada “acoustic design”, guiada pelo ímpeto positivo de produzir paisagens sonoras melhores. Após definir quais sons 30 Neuhaus, 1974. 31 Schafer, 1977, p. 111.
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devemos preservar e potencializar, ele escreve, “os sons entediantes ou destrutivos serão suficientemente conspícuos e nós saberemos porque devemos eliminá-los”32. O compositor americano Alvin Lucier tratou na mesma época da relação entre som e espaço na escala da arquitetura. Em 1970, ele compôs a peça “I am sitting in a room”, na qual ele lê um texto que explica o processo do trabalho que está realizando, falando diretamente em um microfone que grava a sua fala. Em seguida e no mesmo local, sua fala é reproduzida por um sistema de caixas de som e captada novamente pelo microfone, para depois ser reproduzida nas mesmas caixas e gravada no mesmo microfone, em um loop contínuo. Nesse processo de sucessivas gravações e reproduções a fala original começa a ser distorcida, revelando assim as frequências ressonantes da sala em que está ocorrendo o processo. O resultado final depende diretamente do local onde se está inserido, das dimensões e características acústicas desse espaço. O que se ouve, já a partir da quarta ou quinta repetição, é um som fortemente distorcido e melódico, praticamente imperceptível como fala humana. No fim, após várias gravações e reproduções, apenas algumas das características originais do ritmo da fala são preservados, enquanto sua mensagem original é completamente perdida. Como Lucier aponta, nesse processo o espaço funciona como um filtro, destacando certas características do som original e suprimindo outras, 32 Schafer, op. cit., p. 110.
fundamentalmente transformando o som que escutamos.33 Ao levar o ciclo de gravação e reprodução ao seu limite, Lucier amplia o processo microscópico de transformação sonora que sempre ocorre quando escutamos sons em qualquer espaço. Assim, descobrimos que “cada sala possui seu próprio conjunto de frequências ressonantes, da mesma maneira que sons musicais possuem harmônicos”.34 Mais recentemente, artistas têm procurado explorar as relações entre som e espaços através de obras interativas ou que utilizam fortemente componentes tecnológicos na sua realização. Um exemplo é o trabalho “Playing the Building”, do artista David Byrne, realizado pela primeira vez em 2005, em Estocolmo. Ao conectar um velho órgão a uma série de motores e aparatos mecânicos espalhados por um prédio, Byrne permite que o visitante toque o prédio como um instrumento ao tocar as teclas do órgão – cada tecla ativa um dos aparatos, gerando um som diferente em um local diferente do edifício. Algumas ativam pequenos martelos, feitos com solenóides, que batem contra os pilares metálicos, repetidamente. Outras, iniciam motores ou apitos que produzem ruídos constantes e de variadas frequências, e outras assopram ar comprimido para dentro das tubulações do prédio. A instalação física do trabalho é também bastante interessante, uma vez que explora esteticamente os componentes necessários para o seu funcionamento. 33 Lucier, c. 1979, p. 112. 34 Idem, p. 113.
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2.11 David Byrne, "Playing the Building", 2008.
Dos fundos do antigo órgão de madeira saem uma série de cabos, pendurados verticalmente em outros cabos, estes formando uma trama na horizontal a cerca de quatro metros do chão, por fim se conectando aos aparatos que produzem os sons. Os próprios cabos, divididos em cores de acordo com a sua função, são um elemento estético do trabalho. Dessa forma, as entranhas do trabalho ficam todas expostas, evidenciando seu funcionamento através da conexão entre suas várias partes. No trabalho de Byrne, os visitantes não estão tocando o prédio apenas por estarem utilizando sua materialidade para gerar sons, mas também por estarem escutando os sons, gerados pelo prédio, dentro do próprio prédio. Esses sons, por sua vez, estão necessariamente sujeitos às especificidades acústicas do espaço. Desse modo, pode-se dizer que os visitantes estão tocando o prédio duplamente, uma vez que ele serve simultaneamente como instrumento e caixa acústica. Como resultado, é evidenciada a duplicidade arquitetônica do edifício como gerador de sons e como veículo para a sua reprodução. Outro trabalho recente que lida com questões semelhantes é “Medium”, realizado pela dupla britânica de experimentação eletrônica Emptyset. Nesse trabalho, os artistas gravaram os sons da sua performance ao vivo em uma velha mansão rural em Manchester. Utilizando uma série de alto-falantes espalhados pelo espaço, foram gerados sons em variadas frequências com ondas senóides simples, de maneira semelhante a
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2.12 Emptyset, frame de "Medium", 2005.
que profissionais da acústica medem as propriedades de um ambiente. Em seguida, os artistas passaram a aplicar filtros e modular as ondas geradas, a partir da resposta obtida com os impulsos sonoros emitidos inicialmente. Com vários microfones eles gravaram a resposta acústica do espaço ao som que eles mesmos produziram, gerando assim “um retrato sônico único do espaço arquitetônico”.35 O trabalho, como os artistas o descrevem, é similar ao processo de ecolocalização, utilizado por certos animais como morcegos, que utilizam ondas ultra-sônicas para se localizar no espaço. Na apresentação do trabalho, o duo exibe um vídeo produzido a partir de imagens captadas no local, juntamente com o áudio. Esse vídeo é gerado digitalmente de modo a corresponder aos sons emitidos no local. Em Medium, podemos ver passagens escuras que vão sendo iluminadas, através de efeitos digitais, progressivamente e em sincronia com o áudio. Ao ver o vídeo, é como se estivéssemos tateando pelo espaço no escuro, e quando escutamos os sons graves e distorcidos produzidos, parece que parte do espaço se revela momentaneamente, até que em seguida volte a escuridão, acompanhado do silêncio. Essa exploração da capacidade dos sons de informar sobre os lugares está também presente na dupla canadense Cardiff e Miller. Nas suas duas obras em exposição no Instituto Inhotiom, o espaço é trabalhando de maneiras muito diferentes, tanto no que diz respeito 35 Emptyset, 2012.
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ao espaço sonoro quanto ao espaço da instalação. Em “The Murder of Crows”, de 2008, os ouvintes escutam a uma peça de 30 minutos, sentados entre 98 alto-falantes dispostos em cadeiras e pedestais. A instalação é montada em um galpão na penumbra, sugerindo um clima introspectivo. Uma voz sussurrante então conta uma narrativa, em tom confessional, e uma série de sons e músicas acompanham essa narrativa. Esses sons são espacializados com muita precisão, de modo que é gerada uma sensação nítida de estarem se movendo através do espaço. Através desse uso do som, é gerado um deslocamento do ouvinte para outros espaços, acompanhando o fluxo da narrativa. Esse uso dos sons e das músicas é bastante descritivo, respondendo literalmente aos fatos narrados pela voz em sussurros. A sensação é próxima a de assistir um filme sem as imagens, somente acompanhando a trilha sonora. Essa trilha segue o fio da narrativa, e embora os deslocamentos espaciais gerados por ela sejam muito eficientes, o uso do som parece estar subordinado a um outro veículo, o da narrativa. Já em “Forty Part Motet”, o outro trabalho exposto no Inhotim, este somente de Cardiff, o som parece salta parar o primeiro plano, sem o apoio de nenhuma narrativa. Nessa instalação, feita em 2001, ouve-se a gravação de um moteto, um tipo de composição medieval, composto no século dezesseis, e executado pelo Coral da Catedral de Salisbury. A artista gravou as 40 vozes do coral separadamente, e as reproduziu através de 40
caixas de som, dispostas em uma elipse. O trabalho é montado também em um galpão, mas ao contrário do anterior, este é bem iluminado e tem todas as paredes pintadas de branco. Os únicos elementos que se destacam são as caixas de som pretas sobre pedestais também pretos, e dois bancos de madeira clara colocados próximos aos dois focos da elipse. A clareza da instalação é paralela à clareza da lógica que rege o trabalho: cada voz foi gravada em um microfone e é por sua vez reproduzida em uma caixa de som. Ao ficar no interior do espaço formado por essas caixas, é como se estivéssemos cercados pelos vocalistas, cada um correspondente a uma caixa, que cantam para nós. O efeito gerado é arrebatador; é como se estivéssemos mergulhados em som, vindo de todos os lados. Como não há nenhum elemento narrativo no trabalho, só resta concentrar na atividade do som. Ao mover-se por entre as caixas, é possível perceber mudanças no campo sonoro, e ao aproximar-se delas é possível escutar as vozes isoladamente com muita clareza. É gerado também um deslocamento espacial, assim como no trabalho anterior, mas muito diverso daquele. O deslocamento aqui é feito para outros lugares não através de uma narrativa, mas através da atividade do som e sensação de imergir-se nele, ao entrar no campo sonoro formado pelas caixas em elipse. Acredito que seja possível traçar um paralelo entre esse trabalho e um espaço muito mais antigo, cerca de quatro mil anos anterior à instalação de Janet Cardiff. Esse espaço é o círculo de pedras neolítico de Brodgar,
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na Escócia, construído entre 2.500 e 2.000 A.C. Com um diâmetro de aproximadamente cem metros, esse local era composto por quase 60 pedras, altas e achatadas, voltadas para o centro do círculo, embora hoje tenham restado só 26 dessas. Pouco se sabe sobre os detalhes do uso desse círculo, mas supõe-se que seria um local de cerimônias e rituais. Uma das características mais interessantes do local são as suas propriedades acústicas. Ao ficar de pé exatamente no centro do círculo e bater palmas ou em um tambor, por exemplo, é possível ouvir ecos vindo de todas as direções e retornando ao centro, com um pequeno atraso. Como aponta o pesquisador David Hendy, alguns antropólogos têm sugerido a possibilidade do uso desses efeitos acústicos em cerimônias ou rituais. O uso desses efeitos acústicos marcaria a passagem de um local cotidiano, do lado de fora do círculo, onde não podem ser percebidos os ecos, para o interior – ou seja, de uma paisagem sonora cotidiana para uma ritual.36 Essa transição espacial é feita através do som, como também acredito que seja feita no trabalho de Cardiff. Esse poder de deslocamento e localização espacial do som foi um dos pontos que busquei apresentar nos experimentos que realizei neste trabalho.
36 Hendy, 2013.
2.13 Janet Cardiff, "Forty Part Motet", 2001.
2.14 "Ring of Brodgar", Esc贸cia, 2.5002.000 A.C.
3.1 EXPERIMENTOS: TECNOLOGIA UTILIZADA
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Uma das primeiras pesquisas feitas foi no sentido de como poderia ser gerada a espacialização sonora para este trabalho, levando em conta os equipamentos disponíveis para a sua reprodução. O sistema ambisônico de espacialização acabou por ser o escolhido, em função da sua versatilidade de arranjos de caixas para a reprodução; da existência de codificadores e decodificadores desenvolvidos em Max/MSP, programa também utilizado na programação dos experimentos; e das suas vantagens sobre outros sistemas de reprodução surround.37 Uma dessas vantagens é o fato de o sistema ambisônico ser isotrópico, o que significa que os sons são tratados igualmente independentemente da sua posição espacial. Em sistemas surround convencionais, como por exemplo o 5.1, muito utilizado em home theaters, os canais frontais possuem predominância, enquanto os laterais e traseiros são utilizados de modo esparso, geralmente para gerar efeitos sonoros pontuais. No sistema ambisônico todos os alto-falantes são utilizados simultaneamente de modo a posicionar o som, gerando assim uma espacialização sonora mais precisa. Isso significa que, mesmo que um som tenha uma localização virtual exatamente atrás do ouvinte, ele ouvirá uma pequena parcela do som também vindo da sua frente. 37 Penha, 2008, p. 1.
Um sistema ambisônico funciona, em linhas gerais, da seguinte maneira. Um campo sonoro é estabelecido virtualmente no formato de uma esfera, e cada ponto na superfície dessa esfera pode ser descrito por um par de ângulos azimute e elevação. Esses pontos correspondem à posição que se deseja estabelecer para as fontes sonoras. Para posicionar uma fonte sonora exatamente à direita de um ouvinte e na mesma altura que ele, por exemplo, deve-se atribuir a ela um azimute de 90 graus e uma elevação zero, assumindo que o ouvinte esteja de frente para o azimute zero. Para que o ouvinte possa ter a sensação de que o som está realmente vindo de uma dessas direções, um programa deverá decompor o som original em seus harmônicos esféricos e depois codificá-la em quatro canais, convencionalmente chamados de W, X, Y e Z. Depois, para cada ponto P na superfície da esfera, podem ser calculadas as potências de cada um dos quatro canais a partir de funções trigonométricas simples. Assim, é possível posicionar um som virtualmente como se estivesse em ponto no espaço ao redor do ouvinte. Para este trabalho, o uso do sistema ambisônico foi extremamente importante uma vez que permitiu, através da criação de campos sonoros virtuais, posicionar não só o som em diversas posições em relação ao ouvinte, mas também posicionar o ouvinte em diversos espaços sonoros, diferentes entre si. Um outro ponto muito vantajoso do sistema ambisônico é o fato da codificação poder ser feita independentemente da quantidade de canais que se deseja
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utilizar na decodificação. Isso significa que não é necessário determinar antecipadamente quantas caixas de som serão utilizadas para a reprodução do som espacializado. Testes, portanto, podem ser feitos facilmente com vários arranjos diferentes ou mesmo até fones de ouvido, antes de decidir o que será utilizado ao final. A reprodução pode ser feita em no mínimo três canais para um sistema planar e seis canais para um sistema tridimensional (cada uma das caixas localizadas nas faces de um cubo), sendo que polígonos regulares e sólidos platônicos são geralmente preferíveis como arranjos espaciais das caixas. Neste trabalho, realizei a maioria dos testes com arranjos de quatro caixas formando um quadrado, com as caixas localizadas nas arestas e voltadas todas para um centro imaginário. Também fiz testes de reprodução em estéreo e binaural, tanto em um par de caixas de som como em fones de ouvido. De modo geral, os campos sonoros foram mais convincentes quando ouvidos no arranjo quadrado, embora eles também mantivessem uma qualidade boa de posicionamento das fontes quando ouvidos em fones de ouvido, tanto em decodificação estéreo como binaural. Nos experimentos realizados neste trabalho utilizei o software Spatium, desenvolvido por Rui Penha a partir do software de programação Max/MSP.38 O software é open source e gratuito, e oferece ferramentas para espacialização ambisônica em até dezesseis canais 38 Spatium foi desenvolvido como parte da pesquisa de PhD de Penha na Universidade de Aveiro, Portugal.
mono, além de uma série de interfaces modulares para a manipulação da espacialização sonora em tempo real. Além de permitir o posicionamento de fontes sonoras em qualquer ponto da superfície de uma esfera, que representa um campo sonoro virtual, Spatium permite variar o raio dessa esfera, graças a um controle de codificação de distância. A variação do raio da esfera significa variação dos componentes direcionais e onidirecionais dos harmônicos do som, e permite com que o ouvinte sinta que a fonte sonora está localizada mais próxima ou mais distante dele próprio, considerando-o posicionado no centro do arranjo de alto-falantes.39 Outra vantagem do Spatium é o fato de o programa poder ser controlado através do protocolo Open Sound Control, ou OSC. Mensagens formatadas em OSC podem ser enviadas entre uma série de programas diferentes como Max/MSP, Pure Data e SuperCollider, elaborados especificamente para fins de áudio. Isso permite o uso de programas diferentes em conjunção, o que é extremamente útil, uma vez que cada programa tem maior eficiência para realizar um certo tipo de tarefa. Para o roteamento de sinais de áudio entre esses programas, utilizei o software Soundflower, e como DAW utilizei o software Ableton Live, responsável pela reprodução das gravações.
39 Penha, op. cit.
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3.2 EXPERIMENTOS: MICROFONIA
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Os primeiros experimentos realizados neste trabalho foram feitos utilizando retroalimentação entre microfones e arranjos de alto-falantes, gerando um efeito conhecido como microfonia. A microfonia é um tipo de retroalimentação acústica, na qual sons captados por microfones são reproduzidos por alto-falantes, por sua vez captados novamente pelos microfones, e assim por diante. Esse loop faz com que os sinais de áudio se somem infinitamente, gerando um aumento de ganho que rapidamente se converte em distorção e em um apito característico. A frequência do som resultante da microfonia é determinada por uma série de fatores, entre eles as características dos equipamentos utilizados e também a acústica do espaço no qual esses equipamentos estão localizados. Devido a um fenômeno conhecido como ressonância acústica, espaços têm a tendência de enfatizar a vibração de certas frequências e de reduzir outras. Essas frequências específicas são geralmente determinadas pela reverberação e dimensões do espaço, de modo que cada espaço tende a ter uma assinatura acústica única. A ideia por trás dos primeiros experimentos realizados era utilizar a microfonia de modo a revelar essas características acústicas do espaço. De maneira análoga ao trabalho de Alvin Lucier “I’m Sitting In a Room”, busquei utilizar a retroalimentação do som, utilizando
o espaço como um filtro, que deixa impressa sua marca nos sons que escutamos.40 Os primeiros testes realizados revelaram as dificuldades de se trabalhar com microfonia. Primeiramente, devido à retroalimentação do sinal, o ganho rapidamente chega a níveis muito altos, gerando distorção indesejada e que pode até danificar os alto-falantes. Outro problema encontrado nos experimentos feitos foi a tendência da microfonia a predominar em frequências altas, acima de 10 kHz, gerando um apito contínuo que predominava sobre todas outras frequências. Para contornar esses problemas introduzi um limitador para atenuar os picos de ganho de sinal e um equalizador paramétrico, com filtro acima de 10kHz. Após essas alterações, as frequências que passaram a dominar a microfonia estavam abaixo de 300 Hz. Isso se deve provavelmente ao fenômeno das ondas estacionárias.41 Na prática, para esse experimento, ocorreu o domínio dessas frequências mais graves, tendendo a estabilizar-se em uma única frequência. O 40 Utilizei nesses experimentos um microfone onidirecional Behringer ECM-8000 e um sistema de quatro caixas de som, dispostas em um quadrado e apontadas para o centro. Eles foram realizados em uma sala de aproximadamente 7,3 por 5,0 metros, com um pé direito de 2,4 metros. 41 Ondas estacionárias são ondas idênticas sobrepostas, mas viajando em direções opostas. Esse fenômeno tende a acontecer em lugares fechados quando o comprimento de onda é múltiplo de uma das dimensões da sala, fazendo com que tais ondas rebatam nas superfícies e retornem sobre si mesmas.
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efeito sonoro resultante era também monótono e pouco interessante. O som gerado não ajudava a informar o ouvinte sobre as características do espaço no qual ele estava, pois sem o conhecimento teórico do que está por trás do fenômeno físico e sem uma base de comparação entre ambientes diferentes, não era possível dizer que o som gerado tivesse qualquer relação direta com o espaço. Além disso, outros fatores como as frequências de ressonância do próprio microfone e caixas de som interferiam no experimento, e seria difícil isolar essa interferência da interferência do próprio espaço no som. Além disso, a pretensão inicial do experimento e deste trabalho em geral não era científica, no sentido de expor uma realidade objetiva da relação entre som e espaço, mas sim revelar como essa relação se manifesta no campo subjetivo da percepção espacial. Para explicitar essa relação, as variáveis trabalhadas deveriam relacionar-se muito mais com os aspectos da percepção do som e do espaço do que com os princípios físicos que regem essa interação, princípios extremamente importantes para o entendimento e realização deste trabalho, mas que não precisariam ser necessariamente comunicados ao ouvinte. O passo seguinte no desenvolvimento desse experimento foi filtrar também através de equalização as frequências abaixo de 300 Hz, de modo a permanecer com uma faixa ativa de frequência entre 300 e 10.000 Hz. Mantive para a reprodução um sistema de quatro caixas de som arranjadas em um quadrado. Na faixa resultante, não havia uma frequência específica que se
estabilizasse e predominasse demasiadamente sobre as outras, de modo que movendo o microfone onidirecional dentro desse quadrado era possível mudar a frequência da microfonia. O resultado sonoro era uma progressão interessante de frequências, e permitia a manipulação do sistema como se ele fosse um instrumento, movendo o microfone através do espaço para gerar determinadas frequências. A sensação era, ao mover o microfone, de fazer a sala “cantar”. Esse resultado era mais interessante do que o dos experimentos anteriores, na medida em que havia uma relação dinâmica entre som e espaço, e essa dinâmica podia ser experimentada e manipulada através da movimentação do microfone. A seguir, realizei outra variação do experimento, na qual o microfone foi colocado em um pedestal, fixado no centro das quatro caixas de som. O ganho do sistema foi então ajustado para que ele estivesse à beira da microfonia, e foram mantidos o limitador e a equalização. Nesse caso, era a minha movimentação no espaço e os ruídos gerados que podiam, a qualquer momento, fazer com que o sistema entrasse em microfonia. Além disso, utilizei interfaces do software Spatium para produzir deslocamentos no campo sonoro gerado pelas quatro caixas de som. Pude através dessas interfaces rotacionar todo o campo sonoro, acelerando essa rotação aos poucos, ou então movendo as fontes sonoras como partículas que colidem umas contra as outras no espaço. Essas mudanças na orientação do som ajudaram a criar a sensação de um espaço de
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instabilidade, e imaginei que poderiam ser eventualmente parametrizadas com relação aos movimentos das pessoas no espaço. Essa variação do experimento introduziu uma nova questão, de como o movimento das pessoas através do espaço, sua atividade e os sons que elas produzem afetam o espaço sonoro. Além disso, movimentarse através do espaço significa também movimentar-se através do som. Assim, ao percorrer diferentes pontos do espaço, estamos simultaneamente percorrendo diferentes áreas de som e podemos escutar as diferenças entre elas. Dessa forma, a relação entre som e espaço tornouse ao mesmo tempo mais clara e mais direta do que nos primeiros experimentos, pelo menos do ponto de vista da interação com o experimento e da percepção dos resultados sonoros produzidos por essa interação. Ao mesmo tempo, devido ao sistema de som utilizado no experimento, no qual qualquer ruído produzido pode ser rápida e repetidamente amplificado até a microfonia, é gerada a sensação de um espaço à beira de um evento crítico. Nesse espaço, aparentemente frágil e instável, há a sensação do ambiente estar “vivo”, respondendo imediatamente a qualquer movimento e ruído produzido dentro dele.42 Entendo essa sensação gerada como a criação de um novo espaço sonoro, interno 42 Não é coincidência que, no jargão da acústica arquitetônica, chama-se uma sala de “viva” quando ela possui tempos altos de reverberação, ou seja, quando ela “responde”, por meio de reflexões nas suas superfícies, a um som produzido dentro dela.
aquele existente, que adiciona camadas novas de informação sonora ao existente ao mesmo tempo que o modifica. O experimento elaborado a seguir buscou trabalhar a partir dessas questões levantadas: a importância da movimentação através do espaço na construção do som, e a transformação e construção do próprio espaço através do som.
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3.3 EXPERIMENTOS: CAMINHANDO SOM “Schafer desenvolveu a ‘caminhada sonora’ (soundwalk). (…) os ouvintes criam uma composição sonora ao mover-se através de uma paisagem específica. A rota é a partitura, se houver alguma.”43
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A partir das questões levantadas nos experimentos anteriores, procurei propor um novo experimento de modo a trabalhar a importância da movimentação através do espaço na percepção e a capacidade do som de modificar espaços existentes e construir novos a partir deles. Esse experimento foi projetado para se localizar no auditório, semi-circular em planta, localizado na área rebaixada entre a FAU e o seu anexo, o LAME. Esse espaço, com uma arquibancada feita em tijolos na sua lateral, foi concebido originalmente para ser um auditório e permanece vazio a maior parte do tempo. Por ser semi-circular e interceptado na diagonal pela longa empena do LAME ele apresenta uma reverberação interessante, com uma série de ecos para os sons produzidos no seu interior. O piso é todo coberto de cascalho, que produz um som característico ao ser pisoteado. Esse experimento consistia em manipular o som do local, captado ao vivo, de modo a deslocar o ouvinte para um outro lugar, ou seja, gerando um outro espaço sonoro dentro do existente. Para isso, a propriedade do som a ser manipulada seria justamente uma das 43 Bosma, 2011, p. 210.
mais intimamente relacionadas a percepção espacial, a reverberação. Seria feita a introdução de um tempo de reverberação muito mais longo do que o existente no local, através da utilização de efeitos digitais, e o parâmetro usado para quantificar a aplicação desse efeito seria a distância percorrida pelo ouvinte com relação a um centro pré-estabelecido. Nesse centro estaria localizado um microfone onidirecional, com a cápsula muito próxima ao chão, de modo a captar melhor o som dos passos no cascalho, e dois de fones de ouvido pendurados em um suporte, para que duas pessoas pudessem participar da experiência ao mesmo tempo. Esses fones teriam cabos longos para permitir a que os ouvintes percorressem o local. Ao colocar os fones de ouvido seria inicialmente possível escutar os sons ao vivo, exatamente como estariam acontecendo ao redor naquele momento, sem nenhum processamento ou manipulação. Ao afastar-se do centro, ouviria-se o som do ambiente cada vez mais modificado através da adição de reverberação, até um ponto em que as vozes se tornassem ininteligíveis e os outros sons praticamente irreconhecíveis. Nessa distância, máxima, os passos no cascalho e todos os outros sons gerariam uma série de longos ecos, e o ouvinte teria a sensação de estar em um espaço diferente daquele em que estava ao iniciar a caminhada. Ao voltar para o centro, o efeito diminuiria progressivamente, até que os sons ouvidos pelo fone se tornassem novamente iguais aqueles que se escutam sem
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o aparelho. Assim, eu esperava criar através do som a sensação de um deslocamento espacial para o ouvinte, de modo que ele sentisse que o espaço tinha sido transformado, ou até que ele havia sido transportado para outro local. Esse deslocamento seria mediado pelo próprio movimento do ouvinte através do espaço. De início, percebi que a medição da distância entre uma pessoa em movimento e um centro pré-estabelecido seria o aspecto de mais difícil execução do experimento. A primeira solução estudada foi a utilização do próprio cabo do fone de ouvido para medir a distância. A lógica era que, ao enrolar esse cabo automaticamente utilizando uma bobina, seria possível medir a rotação do eixo da bobina e, a partir de um cálculo simples, estabelecer uma relação entre ângulo de rotação e distância percorrida. A medição angular seria feita através de um encoder rotativo, um componente eletrônico que informa qual ângulo que um eixo em rotação percorreu, e também se o percurso foi horário ou anti-horário. A informação desse encoder poderia então ser comunicada para um computador através de um microcontrolador como o Arduino, por exemplo. Feito o cálculo de conversão de ângulo para distância, bastaria então aplicar a reverberação proporcionalmente à distância percorrida. No entanto, o processo de enrolar o cabo automaticamente revelou ser muito mais complexo do que o imaginado. Após uma série de testes e tentativas de adaptação de componentes existentes, foram problemas mecânicos que forçaram-me a buscar outra
3.1 Experimento 4, situação proposta.
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solução para o problema da medição de distância. Primeiramente, não há nenhum dispositivo no mercado disponível para enrolar cabos de áudio automaticamente, e isso não é fortuito. Ao enrolar um cabo fixo nas duas extremidades (uma no fone de ouvido, e outra na saída de áudio) são introduzidos esforços de torção no mesmo, que não só danificam os cabos internamente como também tendem a puxá-los para fora das suas conexões. Além disso, uma bobina teria de ser produzida sob medida para o experimento, além da mola em espiral que trataria de introduzir a tração de modo a recolher o cabo automaticamente. Um outro problema seria a necessidade de ter um eixo fixo, para que a mola pudesse ter um ponto de apoio, ao mesmo tempo que a medição de rotação deveria ser feita no próprio eixo de rotação. Procurei então métodos que possibilitassem a medição de distâncias sem-fio. Assim, não haveria a necessidade de recolher o cabo automaticamente nem de medir a rotação da bobina. Os resultados quanto à medição de distâncias sem-fio não foram, no entanto, muito mais animadores. As primeiras pesquisas feitas indicaram algumas possibilidades técnicas, como a medida de potência de sinal, ecolocação e o uso de GPS. Entretanto, uma a uma, essas técnicas mostraram-se ineficientes para o resultado desejado no experimento. No entanto, através dessa pesquisa foi possível descobrir técnicas que seriam posteriormente necessárias para a execução do experimento final.
O uso da potência de sinal para medir distâncias pode ser feito com um par transmissor e receptor, cada um colocado em um dos pontos entre os quais se quer medir. Entre as tipos de sinal poderiam ser utilizados rádio frequência (RF), Bluetooth e Wi-Fi. Dentre esses, o Wi-Fi pareceu-me mais adequado por ser facilmente aplicável entre um computador, que estaria localizado no centro, e um dispositivo móvel, que seria carregado pelo ouvinte. O problema desse método é que relação entre a perda de sinal Wi-Fi e a distância é extremamente dependente de fatores ambientais, como paredes e obstáculos próximos, ambos presentes no local desejado para o experimento. Dessa forma, um aparelho poderia ter um sinal Wi-Fi mais forte mesmo estando mais distante do transmissor, caso ele estivesse perto de uma superfície que reflete o sinal, por exemplo. Além disso, seria extremamente difícil obter uma precisão de pelo menos 2 metros, desejável para o experimento de modo a criar uma variação contínua da reverberação em função da distâncias, sem saltos.44 Já a ecolocação, também conhecida como sonar, apresenta uma precisão de até poucos centímetros. Esse método consiste em enviar uma onda, geralmente ultrasônica, em direção ao objeto que se deseja medir a distância, e calcular o tempo decorrido até o recebimento do rebatimento dessa onda. Para aplicar esse método ao experimento, haveria um sensor ultrasônico no 44 Segundo Günther e Hoene, 2005, a precisão desse método, sem uso de hardware muito especializado, está em torno de 8 metros.
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centro e que seria usado para medir a distância entre ele e os ouvintes. Uma série de problemas, no entanto, impediram a sua utilização no experimento. Primeiramente, as vestimentas comuns apresentam diferentes graus de absorção das ondas ultrasônicas, e o próprio formato do corpo não favorece a reflexão de ondas de volta a um centro fixo. O que é mais problemático no entanto, é o alcance e a abertura do feixe dos sensores ultrasônicos disponíveis no mercado. A maioria desses tem alcance máximo de aproximadamente 4 metros, sendo que somente alguns atingem até 10 metros, e seus feixes são estreitos, de menos de 1 metro de largura. Isso significa que eles precisariam estar diretamente apontados para as pessoas de modo a medir a distância. Como a proposta do experimento era que as pessoas pudessem se movimentar livremente dentro de um espaço definido, essas limitações dos sensores ultrasônicos acabaram por ser proibitivas para seu uso no experimento. Já as tentativas com o uso de GPS foram de início mais promissoras. Utilizando o aplicativo GyrOSC, pude transmitir, via Wi-Fi, os dados de GPS de um tablet para um computador. Esses dados eram então recebidos em tempo real no software Max. Desenvolvi um progama, ou patcher, dentro do Max que calculava a distância entre dois pares de coordenadas latitude e
longitude, sendo um desses correspondente ao centro fixo do experimento.45 Entretanto, esse método também apresentou problemas. Em primeiro lugar, a precisão da determinação da distância em espaços abertos ficou em torno de 5 metros, um pouco abaixo do desejado para a aplicação. Em segundo lugar, percebi que a atualização de posição feita pelo GPS não seguia uma taxa contínua, o que prejudicaria o controle da reverberação, que deveria ser contínua conforme o ouvinte se afastasse do centro. Por fim, e mais criticamente, as coordenadas marcadas como “centro” tendiam a variar em diferentes medições, de modo que, após se afastar e retornar ao centro, a distância calculada não era zero. Uma vez que o aplicativo utilizado para comunicar as informações de GPS do tablet também dava acesso a outros sensores internos, como bússola, giroscópio e acelerômetro, procurei como poderia utilizar essas informações de modo a determinar a distância. É teoricamente possível obter a posição a partir da dupla integral da aceleração. No entanto, uma dupla integral tende a multiplicar qualquer pequena margem de erro por um fator muito grande. Para dar um exemplo, se o acelerômetro errar em um grau a estimativa da gravidade, isso significará um erro de posicionamento de aproximadamente 10 metros.46 Dessa maneira, pareceu45 O cálculo de distância foi feito em JavaScript, utilizando a fórmula de Harversine. Scripts disponíveis em: http://www.movable-type. co.uk/scripts/latlong.html . 46 Sachs, 2010.
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me também impraticável utilizar o acelerômetro para determinar a distância entre o centro e o ouvinte. Foi possível no entanto, realizar uma simulação do que seria o áudio gerado nesse experimento. Para isso, utilizei uma gravação daquilo que seria escutado no local, manipulada com uma reverberação digital acrescentada posteriormente. Escolhi uma reverberação longa para aplicar ao áudio original, de 3,6 segundos e com 75% de difusão, de modo a criar um espaço sonoro bastante contrastante com aquele da gravação original. A reverberação foi aplicada então progressivamente, aumentando a porcentagem de acordo com o ritmo dos passos gravados, até chegar a 100% de efeito; em seguida, diminui a reverberação até chegar novamente ao som original, como se a pessoa houvesse retornado ao centro do experimento. Fiz duas versões dessa simulação: na primeira, o som original é mantido junto com a reverberação; na segunda, conforme a participação da reverberação aumenta, a do som original diminui, até chegar a um ponto em que só se escuta a reverberação. Essa segunda versão pareceu-me causar mais contraste entre o som escutado ao vivo e aquele escutado através dos fones de ouvido, e por isso a sensação de deslocamento causada foi ainda maior. Acredito que esse deslocamento seja a parte mais interessante do experimento, pois ele demonstra como é possível transformar um espaço através do som, ou mesmo transportar o ouvinte para um outro espaço, completamente diferente do qual ele se encontra. Ao
manipular a relação entre som e espaço, acredito que seja possível gerar uma experiência mais aguda da relação entre esses dois fatores na percepção espacial. Essas ideias foram muito importantes para o desenvolvimento do experimento final. Além disso, a pesquisa técnica e as tentativas de implementação dos experimentos descritos até agora forneceram as bases para a realização do experimento final. Os conhecimentos e questões desenvolvidas nesse processo foram fundamentais para que eu pudesse propor e executar o experimento seguinte.
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4. experimento final “(...) uma experiência profunda de escuta de sons ambientais precisa ser mais do que uma mera forma de escuta atenta. O ouvido é ajudado, guiado ou manipulado em uma direção específica através de meios tecnológicos. (…) Entretanto, uma escolha muito consciente deve ser feita de antemão em relação a o que escutar, mesmo que o resultado final não seja inteiramente previsível. Dessa maneira (…) [o músico] cria uma ‘densidade de informação, múltiplos canais ligados todos ao mesmo tempo, enquanto os ouvintes se posicionam nesse campo’; o artista cria um tipo de ‘cena’ para que o ouvinte possa habitá-la.”47 74
O objetivo para o experimento final era tratar dos sons comuns, daqueles que escutamos no dia a dia, trabalhando-os de forma a aumentar nossa percepção da importância desses sons e da sua relação com os espaços que habitamos. Potts, em sua análise sobre os trabalhos de Neuhaus, resume essa intenção como “(...) um projeto que se situa dentro da arena do cotidiano ao mesmo tempo em que ativa uma consciência sensorial aumentada.”48 Como recorte, decidi trabalhar com o espaço da FAU e com a sua paisagem sonora. A paisagem sonora 47 Bosma, op. cit., p. 210. 48 Potts, 2009, p. 46.
da FAU vai além dos diferentes sons que podem ser encontrados no local. Para registrar uma paisagem sonora, é necessário mais do que uma simples amostragem auditiva, uma vez que os sons variam com o tempo e com as ações ocorridas no local. O retrato de uma paisagem sonora jamais será completo e exaustivo, mas sempre corresponderá necessariamente a um recorte deliberado. Parafraseando Emily Thompson, esse retrato dirá tanto sobre o sons e o espaço quanto sobre os seus ouvintes.49 A matéria-prima utilizada não foram só os sons gravados in loco, mas também a ambiência ou atmosfera que eles revelam. Essas são uma combinação de fatores acústicos, que deixam sua marca nos sons; culturais, revelados nas atividades e usos do espaço e também nas maneiras de ouvi-lo; e ambientais, contemplando fatores como clima e atividades de animais. Além disso, há a questão temporal, uma vez que todos esses fatores tendem a variar em períodos diferentes; até mesmo o tempo de reverberação tende a variar com mudanças na temperatura e umidade do ar. Todos esses aspectos são responsáveis por formar a paisagem sonora de um local. A ideia nesse experimento era permitir uma exploração dos sons da FAU, constantemente presentes no nosso cotidiano mas poucas vezes trazidos para um nível de percepção mais aguçada. Ao utilizar os sons gravados no local como um vocabulário, busquei trabalhá-los para destacar certos aspectos da paisagem 49 Thompson, 2004, passim.
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sonora, ou até mesmo criar novos espaços dentro daquele existente. Assim esperava que fosse possível escutar mais atentamente aos próprios sons e a importância deles no local. Para isso, busquei possibilitar a espacialização do som com relação ao espaço em que o experimento foi montado. Além disso, tentei incorporar parâmetros de controle que pudessem ser operados pelos ouvintes e que também estivessem ligados ao local. De início, imaginei o experimento em um espaço acusticamente isolado, em que fosse possível recriar o espaço sonoro da FAU virtualmente. Para isso, imaginei utilizar o mesmo sistema de coordenadas empregado na espacialização ambisônica. Tratando o ouvinte como no centro de uma esfera imaginária, esse espaço se estenderia em todas as direções, as quais poderiam ser ativadas através de uma interface, que funcionaria como uma espécie de lupa sonora. No entanto, durante o desenvolvimento do trabalho e a realização das gravações em campo, concluí que seria mais interessante realizar o experimento não em um ambiente controlado em termos sonoros, uma vez que tal condição seria praticamente o oposto daquilo que se encontra na FAU. No edifício da FAU, no qual as principais características acústicas são a amplidão e expansão dos sons, faria mais sentido escolher um local para a apresentação que incorporasse essas características. O salão caramelo me pareceu-me então mais adequado para montar o experimento, por ser ao mesmo tempo o centro sonoro e espacial do edifício.
Realizei uma série de gravações no prédio da FAU e no seu entorno, em dias e horários variados e durante diferentes atividades que ocorriam no local. Essas gravações foram feitas com um par de microfones estéreo, dispostos em padrão AB ou XY. O padrão AB foi utilizado na maioria das gravações por apresentar uma definição espacial melhor, incluindo a localização das fontes sonoras e dos limites do espaço. Já o padrão XY foi geralmente usado quando desejava-se gravar sons de maneira mais isolada e direcional, ou seja, sem tanta informação sobre o espaço em que foi feita a gravação. Algumas características da paisagem sonora da FAU foram perceptíveis já nas primeiras gravações. Uma das mais marcantes era o fato de ser muito difícil gravar sons isoladamente na FAU, devido à natureza aberta do espaço e ao elevado tempo de reverberação no interior do edifício. Esse é um dado importante na caracterização sonora do local e, apesar de ter representado dificuldades para o trabalho de gravação, foi uma característica que busquei explorar na realização do experimento. Também em função dessa característica do espaço, foi difícil conseguir fazer gravações muito contrastantes entre si, devido a constante contaminação sonora entre os diversos ambientes do edifício. Consequentemente, é possível perceber na maioria das gravações um ruído constante de fundo, que considero uma das principais características da paisagem sonora da FAU. Esse som ao fundo varia de acordo com o momento do dia, mas é interessante perceber que, enquanto há
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4.1 Gravação de campo no edifício da FAU.
atividades ocorrendo no prédio, ele está sempre presente, embora com intensidade variável. Acredito que ele esteja relacionado com a abertura dos ambientes da FAU, pelo fato deles nunca serem isolados acusticamente uns dos outros, e também com o longo tempo de reverberação no interior do edifício, fruto do seu grande volume e da quantidade de superfícies reflexivas presentes. Esse burburinho contínuo ouvido no interior da FAU evoca locais movimentados, como por exemplos praças ou estações de grandes cidades. Um contraste muito maior pode ser registrado entre os sons do interior e exterior do edifício. A medida em que nos afastamos da área interna ao prédio podemos perceber a diferença sonora, principalmente pela redução do tempo de reverberação e do ruído de fundo da FAU, e também pela introdução de sons externos como pássaros, cigarras, vento nas árvores e automóveis. Nos espaços de transição entre áreas interna e externa, podemos perceber bem esse contraste, como por exemplo nas saídas da FAU que dão acesso ao estacionamento, voltadas para a rua do Lago, nos quais podemos ouvir uma combinação dos sons internos e externos à FAU. Outra sensação constante no interior do edifício é a de amplidão, dos sons e do espaço. Devido a grande quantidade de superfícies reflexivas ao som e, consequentemente, o alto tempo de reverberação, os sons tendem a se amplificar e expandir através de todo edifício. Dessa forma, um som de alta intensidade, como algum objeto pesado sendo derrubado, por exemplo,
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tem consequências sonoras que se estendem a todo espaço. Juntamente com essa sensação de abertura e amplidão, há uma certa percepção de falta de privacidade, semelhante a que podemos experimentar em espaços públicos amplos. Não coincidentemente, um dos espaços que parecem ser mais íntimos é justamente a biblioteca, mais especificamente entre as estantes, onde há pouca reverberação e bom isolamento devido à absorção dos livros. Busquei registrar em gravações essas características da paisagem sonora, durante várias atividades e horários e em diversos locais. Essas gravações foram catalogadas, registrando informações como local, horário, atividades presentes, padrão de microfonação e ganho. Em seguida, foram separadas em alguns grupos de acordo com essas informações. Comecei então a espacializar essas gravações, trabalhando com até oito gravações estéreo simultaneamente, sendo reproduzidas em quatro canais, com caixas de som arranjadas em um quadrado. A espacialização apresentava resultados bastante satisfatórios, gerando uma sensação muito clara de posicionamento e movimentação das fontes sonoras. Ao mesmo tempo, comecei a desenvolver, utilizando Max, programas para controlar essas gravações e a espacialização em tempo real. Um desses programas partia de uma situação inicial na qual todas as oito gravações tocavam simultaneamente, cada uma espacializada de acordo com a sua posição relativa a um ponto no centro do salão caramelo, no centro da FAU. Em
seguida, uma rotina usava decisões aleatórias para decidir quais gravações seriam desligadas e quais continuariam tocando. O efeito gerado pareceu-me interessante por permitir que o ouvinte focasse a atenção em determinados sons separadamente, ou nas combinações entre eles, a partir de um todo que representaria uma paisagem sonora. Na primeira tentativa realizada, essa decisão aleatória era feita em um intervalo de tempo fixo de 250 milissegundos. Fiz testes variando esse intervalo, mas percebi um problema gerado, que era a introdução de um pulso rítmico, devido ao fato de ter várias gravações sendo ligadas ou desligadas ao mesmo tempo. Esse pulso se destacava muito, sobrepondo-se às diferenças entre as várias gravações, mais sutis. Passei então a controlar esse intervalo separadamente para cada gravação, introduzindo um outro elemento de aleatoriedade no seu controle. Utilizando esse método para controle do intervalo de decisão, o pulso foi eliminado, e pude observar resultados mais interessantes. Introduzi, além disso, uma segunda rotina, executada após um tempo determinado. A transição para a segunda parte era feita da seguinte maneira: após ter sido feito um número determinado de decisões de ligar ou desligar uma gravação, essa gravação era desligada permanentemente até a segunda parte. Assim, uma a uma as oito gravações, correspondentes a oito locais diferentes, de dentro e fora da FAU, iam sendo desligadas, até que o programa passava para a parte seguinte.
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Nessa segunda parte, as gravações eram isoladas uma a uma, durante um tempo determinado, e em uma ordem aleatória. O tempo em que se ouvia cada gravação isolada era consideravelmente superior aos intervalos de ligar e desligar as gravações da primeira parte, introduzindo assim um ritmo mais lento. Desse modo, esperava que, após ouvir várias gravações combinadas, o ouvinte pudesse se concentrar nelas isoladamente, reconhecendo então o que havia de específico em cada uma que as diferenciava das outras. Após todas as oito gravações terem sido tocadas isoladamente, o programa retornava ao estado inicial, com todas as gravações ligadas simultaneamente, e após um intervalo de tempo reiniciava todo processo, criando assim um ciclo. Simultaneamente, desenvolvi outro programa em Max no qual buscava criar algum controle sobre a reprodução dessas gravações que estivesse relacionado ao local onde foram feitas. Imaginando que o experimento estivesse colocado no salão caramelo, trabalhei com as informações de bússola e giroscópio disponíveis dos sensores de um tablet de modo a controlar o volume de reprodução das gravações. Assim, ao apontar o tablet em uma determinada direção, seria possível escutar a gravação que foi feita no local para o qual se está apontando, ao mesmo tempo que seria gerada a sensação do som estar vindo daquela direção. No primeiro programa desenvolvido para atingir esse resultado, estabeleci que cada ambiente, ao qual corresponde a uma gravação, seria definido por um retângulo projetado na superfície da esfera imaginária,
no centro da qual o ouvinte se encontraria. Assim, o volume de uma gravação seria máximo quando os sensores estivessem apontados para o centro do retângulo correspondente ao seu ambiente, e mínimo assim que eles saíssem da área do retângulo. Assim, os vários ambientes da FAU seriam quadrantes de uma esfera imaginária. Um problema que rapidamente surgiu com esse método foi o fato de haver “áreas de sombra”, ou áreas intermediárias entre um retângulo e outro, na qual se ouvia silêncio. Além disso, era difícil conseguir apontar exatamente para o centro dos retângulos, de modo que em boa parte do tempo ouvia-se silêncio ou apenas gravações muito baixas. Busquei tornar a função entre a distância do centro do retângulo e o volume da gravação uma curva mais suave e, ao mesmo tempo, aumentar a área dos retângulos, sobrepondo-os de modo a reduzir tais áreas de sombra. Observei que os retângulos resultantes precisavam praticamente englobar toda a esfera de modo a ter um resultado sonoro melhor. Tal constatação fez com que eu mudasse a minha abordagem, desenvolvendo um outro método para cálculo do volume. Esse novo método concebia os diferentes ambientes projetados na esfera não como retângulos, mas simplesmente como centros, ou pontos. Ao apontar para um ponto, ou centro de um ambiente, o volume seria máximo para a gravação feita naquele local. A medida que o sensor se afastasse daquele centro, o volume diminuiria, chegando ao mínimo na antípoda dele. Assim,
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o máximo de volume para uma certa gravação estaria em um pólo da esfera, e seu mínimo, no pólo oposto. Com esse método, obtive resultados melhores que o anterior, tanto do ponto de vista sonoro quanto da eficiência do programa desenvolvido. Era possível assim ter um melhor controle dos volumes dos ambientes, não sendo necessário apontar exatamente para o centro deles para ouvi-los, uma vez que a redução do volume era feita mais gradualmente ao se afastar do seu centro. Ao mesmo tempo, esse método permitia escutar melhor vários ambientes diferentes simultaneamente, o que gerou um espaço sonoro muito mais rico e complexo para o ouvinte. O problema seguinte era como selecionar as gravações que seriam espacializadas, usando os oito canais estéreo disponíveis. Percebi que a espacialização produzia um resultado mais interessante quando as gravações eram bem distribuídas na esfera imaginária, de modo que o ouvinte tivesse a sensação de sons vindo de todas as direções. Isso me fez procurar usar gravações de locais que correspondessem a uma boa distribuição espacial a partir do salão caramelo, de modo que houvessem gravações vindo de todas as direções ao redor do ouvinte. Outra preocupação era como gerar contraste entre as gravações espacializadas. De início, tentei escolher gravações bem diversas entre si, como internas e externas à FAU e em períodos diferentes do dia, para espacializar nos oito canais estéreo disponíveis, o que produziu resultados interessantes. No entanto, o uso
4.2 e 4.3 Alternativas de cálculo da espacialização em função dos ambientes.
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do tablet como interface se tornou menos inteligível, uma vez que apontando para certos pontos a partir do salão era possível ouvir os ambientes internos que estavam naquela direção, e em outros pontos, ouvia-se sons externos ao edifício. Resolvi então agrupar as gravações não por contraste, mas por semelhança, e permitir que o ouvinte mudasse entre os diferentes grupos de gravações através de um controle realizado na tela da interface. Por exemplo, um dos grupos era de gravações feitas em vários ambientes dentro da FAU durante uma assembleia; outro, nos mesmos locais durante uma chuva pesada; outro grupo, de locais externos à FAU, nas suas imediações; outro, no mesmo local mas à noite. Assim, consegui um bom contraste entre esses diversos grupos de gravações, ou períodos. Através de um controle a mais, feito na tela do tablet, o ouvinte podia alternar entre esses diversos períodos, usando ainda os sensores de movimento da mesma maneira que anteriormente, para ouvir com mais detalhe certos ambientes dentro desses grupos. Desse modo, o ouvinte poderia comparar gravações feitas em diversos ambientes e em diversos períodos. Considerei também os fatores relativos à montagem do experimento, como a posição das caixas e outros equipamentos de som. Percebi ao realizar testes que a visibilidade das caixas parecia atrapalhar o efeito da espacialização. Alguns ouvintes relacionaram a direção para a qual estavam apontado com as caixas de som, e não com os espaços que estavam além dessas.
Assim, estudei a possibilidade de posicionar as caixas próximas ao chão em um ângulo apontado para a altura da cabeça, de modo a reduzir a atenção dada a elas. Devido aos equipamentos disponíveis, seriam utilizadas seis caixas de som, arranjadas em um hexágono. O resto do equipamento utilizado ficaria afastado das caixas, conectado a elas somente através dos cabos de áudio. Dessa forma, a estética do trabalho seria composta somente a partir das caixas de som e dos seus cabos, e dos desenhos formados por ambos no local. Por fim, realizei um teste no local, antes da apresentação final, de modo a observar se a espacialização e a confusão entre sons gravados e sons ouvidos ao vivo realmente apresentaria bons resultados. Os resultados desse teste e as considerações feitas a partir dele e do processo de todo trabalho forma descritas a seguir. 87
5. considerações finais
90
O teste feito antes da apresentação final foi realizado no edifício da FAU, no salão caramelo. Utilizei quatro caixas de som tipo “bookshelf”, de 100 watts e 8 ohms, de potência inferior aquela que desejava utilizar na apresentação final. Essas caixas foram colocadas sobre cadeiras e arranjadas em um quadrado, de três metros de lado. Apesar da pequena potência das caixas em comparação com o volume do espaço, foi possível observar uma boa espacialização dos sons reproduzidos, com clareza nas direções de origem das fontes sonoras. Uma das pessoas que participou dos testes pôde até observar um erro de espacialização, no qual uma gravação estava deslocada 90 graus com relação ao seu ambiente correspondente. O controle feito através do tablet também mostrou-se satisfatório, apresentando somente alguns saltos esporádicos nos dados informados pelos seus sensores, o que resultava em saltos de volume indesejados nas gravações sendo reproduzidas. Ao alternar entre os diferentes grupos de gravações, utilizando os controles realizados na tela da interface, também foi possível perceber os contrastes entre os diferentes materiais sonoros. A espacialização permaneceu precisa dentro de todo o quadrado formado pelas caixas, de modo geral, e não somente no seu centro. Já, ao se afastar do perímetro do quadrado, tornava-se mais difícil perceber a espacialização, e ela tornava-se imperceptível a alguns
metros de distância. Em uma variação do teste, na qual as caixas de som foram colocadas no chão em um ângulo com a horizontal, apontadas para a altura da cabeça de uma pessoa de pé no interior do quadrado, a espacialização continuou apresentando bons resultados. No entanto, nesse caso, conforme o ouvinte afastavase do centro das caixas, a perda da sensação espacial era maior. Ao posicionar-se no perímetro do quadrado, a espacialização já era praticamente imperceptível. Foi possível também gerar uma confusão entre os sons que eram ouvidos através das caixas e dos que estavam realmente acontecendo in loco. Percebi que essa confusão estava relacionada a relação entre a intensidade dos sons do local e dos sons gravados. Essa variável não havia sido prevista nos testes anteriores, uma vez que eles tinham sido todos realizados em ambientes mais silenciosos. Pareceu-me adequado que o volume dos sons gravados fosse um pouco mais elevado ao dos presentes no local, de modo a gerar uma dúvida nos ouvintes quanto à origem dos sons. Além disso, percebi que imediatamente após desligar o trabalho, era possível escutar os sons presentes no local naquele momento de outra maneira, mais atenta e aguçada. Procurei trabalhar essas questões surgidas no teste para aperfeiçoar o experimento até a apresentação final. Além disso, estudei também criar grupos de gravações que estabelecessem paisagem sonoras impossíveis ou irreais. Isso seria feito tanto utilizando gravações de ambientes que jamais poderiam ser ouvidas em conjunto, quanto criando deslocando as espacializações
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das gravações com relação aos seus ambientes correspondentes. Com isso, espero que seja possível criar um deslocamento que desperte uma maior atenção no ouvinte da relação entre os sons e os seus lugares. No final, espero ser possível retrabalhar e criar espaços sonoros a partir do existente. Como resultado, gostaria de despertar uma maior atenção perceptiva para os modos em que espaço e som estão intimamente relacionados no nosso dia a dia e, como Neuhaus afirmou sobre seu trabalho, “usar som para mudar a maneira em que percebemos um espaço”.50
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50 Potts, 2009, p. 46.
6. APÊNDICE
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Neste apêndice estão contidos os programas, também chamados de patchers, realizados em Max para para a execução do experimento final. Esses patchers recebem os dados dos sensores e da tela do tablet, e utilizam essas informações para calcular os volumes das faixas de áudio sendo reproduzidas. Esse cálculo é feito a partir da posição dos ambientes em relação ao ouvinte que manipula o tablet. A função de cada um dos patchers que se seguem é detalhada melhor em uma curta explicação que acompanha as imagens. Alguns patchers possuem subpatchers, que funcionam dentro daqueles. Para os patchers foi adotada a notação “[nome do patcher]”, e para os subpatchers, segui o formato patcher:[subpatcher]. Na página à direita está uma imagem de tela do software Live, utilizado para a reprodução das faixas de áudio. Nesse software, as primeiras oito faixas foram utilizadas como masters, enviando seu sinal para os oito canais estéreo do software Spatium, responsável pela espacialização sonora. Os vários grupos de gravações estão distribuídos nas outras faixas do Live, e enviam seu sinal por sua vez para essas oito faixas master.
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98 [sensor]
Este patcher é responsável por receber os dados de sensores do tablet, formatá-los e enviá-los para o subpatcher que calcula os volumes das gravações de cada ambiente a partir da distância de um centro pré-determinado.
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sensor:[calc_centers]
Neste subpatcher do apresentado acima, são feitos os cálculos de volume, utilizando o azimute e a elevação informada pelos sensores, comparando-os com as coordenadas pré-estabelecidas do centro de cada ambiente. Essas coordenadas são estabelecidas por outro patcher apresentado mais adiante. Notar que à elevação foi atribuído um peso menor, de 35 por cento, com relação ao azimute.
100 [spatium_setter]
101
spatium_setter:[pipack] e spatium_setter:[setter_line]
Os dois subpatchers à esquerda realizam tarefas computacionais para a transição entre grupos de gravações (e seus respectivos centros de ambientes) diferentes.
O patcher acima estabelece os centros dos ambientes, em azimute, elevação e raio, que depois serão comparados com os dados de sensor do tablet para determinar o volume das gravações. Ele também envia as coordenadas desses centros para o software Spatium, que realiza a espacialização sonora a partir dessas informações.
102 [mastertracks_volume_control] e groups_volume_control:[xfade]
O subpatcher, na parte inferior desta, página realiza os cálculos necessários para esse fade de volume.
Na página de baixo está o patcher responsável por receber o input do ouvinte, referente ao grupo que ele deseja escutar, e efetuar essa transição entre os grupos através de um fade de volume.
O patcher superior é responsável por comandar o volume das oito faixas sendo reproduzidas, e para isso recebe a informação de volume do patcher [sensor].
103
[groups_volume_control]
104 [decide_solo_drunk_interval] e [decide_solo_fixed_interval]
Estes patchers são referentes aos experimentos 5 e 6, responsáveis por isolar determinadas gravações aleatóriamente. No da direita, essa decisão de isolar faixas era feita baseada em um intervalo fixo, enquanto que na esquera, era feita a partir de um intervalo aleatório.
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109
8. ÍNDICE DE IMAGENS Fig. 2.1 - Sabine, Wallace, “Collected Papers on Acoustics” (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1922), pp. 21, 22. Fig. 2.2 - “Symphony Hall, Boston, Mass”, Detroit Publishing Co.. Disponível na Library of Congress Prints and Photographs Division Washington, D.C., http://www.loc.gov/pictures/item/det1994009433/PP/ Fig. 2.3 - New York Times (21 February 1915), seção. I, p. 5. Reproduzida em Thompson, 2004, p. 87.
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Figs. 2.4 e 2.5 - Fotografias, s.d., Museum of the City of New York, Theater Collection. Reproduzidas em Thompson, 2004, p. 232. Fig. 2.6 - Edward Brown et al., eds., City Noise (New York- Department of Health, 1930). Reproduzida em Thompson, 2004, p. 118. Fig. 2.7 - “Listen, Poster: Brooklyn Bridge – South Street”, 1976. Disponível em http://www.max-neuhaus. info/soundworks/vectors/walks/ Fig. 2.8 - “Max Neuhaus in Times Square”, 1997. Reproduzida em Potts, 2009, p. 46. Fig. 2.9 - “Times Square”, c. 1990. Reproduzida em Potts, 2009, p. 55.
Fig. 2.10 - “Rendering of the aural topography of Times Square”, 1977. Reproduzida em Potts, 2009, p. 49. Fig. 2.11 - “Playing the Building”. Disponível em http:// www.creativetime.org/programs/archive/2008/byrne/ project.html Fig. 2.12 - “Medium”, Emptyset. Disponível em http:// vimeo.com/37121530 Fig. 2.13 - “Fory Part Motet”, 2001. Disponível em http:// www.inhotim.org.br/ar”te/obra/view/195 Fig. 2.14 - “Ring of Brodgar”, 2012. Disponível em http:// en.wikipedia.org/wiki/File:Ring_of_Brodgar_in_ summer_2012_%283%29.JPG Fig. 3.1 - Auditório entre FAU e LAME, 2013. Elaborada pelo autor. Fig. 4.1 - Gravação de campo na FAU, 2013. Elaborada pelo autor. Figs. 4.2 e 4.3 - Modos de cálculo da espacialização, 2013. Elaborada pelo autor a partir de Penha, 2008. Figs. 5.1 e 5.2 - Testes do experimento final na FAU, 2013. Elaboradaa pelo autor.
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9. ÍNDICE DE ÁUDIO OBS: Para uma melhor audição da espacialização sonora, é recomendável escutar as faixas de áudio em fones de ouvido, em especial a partir da AUD.07. Estas faixas de áudio estão também disponíveis em: https://soundcloud.com/lugaresdosom/sets/tfg-oslugares-do-som
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AUD.01 - Michal Murray executando a “Chacona em sol menor” de Louis Couperin (excerto), no órgão da Boston Symphony Hall, 1981-82. “Michael Murray Complete Recordings”, Telarc Records. No final da peça é possível perceber nitidamente a reverberação do local. AUD.02 - Orquestra Sinfônica de Boston, sob a condução de James Levine, executando “Daphinis et Chloé” de Ravel (excerto), no Boston Symphony Hall, em janeiro de 2010. Disponível em http://www.youtube. com/watch?v=DMck8f0UH5w. Nessa gravação também é possível perceber a reverberação da sala de concerto. AUD.03 - Obviamente, não faz sentido reproduzir 4’33’’ em uma gravação. Esta faixa tem quatro minutos e trinta e três segundos de silêncio, e pode servir para marcar o tempo para uma performance da peça em qualquer local. Como colocou Cage: “Eu tenho nada a
dizer / e eu estou dizendo-o / e isso é poesia / como eu preciso.” (I have nothing to say/ and I am saying it/ and that is poetry/ as I need it.) Cage, “Lecture on Nothing”, 1949. AUD.04 - Nesta gravação de campo da obra Times Square, de Max Neuhaus, é possível ouvir os sons dos sintetizadores, saindo pela grade do piso, misturados com os outros sons do local. Ao decorrer do áudio, o microfone é afastado da grade, até ficar fora dela, num ponto onde não ouvimos mais o trabalho realizado por Neuhaus. Disponível em: http://www.youtube.com/ watch?v=wINBfsb0WiM. AUD.05 - Em outra gravação do mesmo trabalho de Neuhaus, os microfones foram apontados diretamente para a grade do piso, de modo que podemos ouvir os sons dos sintetizadores com menor interferência da ambiência local. Elaborado por Adel Souto, disponível em: http://www.youtube.com/ watch?v=gahUMGmKzIA. AUD.06 - Excertos de “I’m sitting in a room”, de Alvin Lucier. Note como as frequências ressonantes da sala se sobrepõem ao som original ao decorrer do processo. Disponível em: http://www.youtube.com/ watch?v=2jU9mJbJsQ8. AUD.07 - Excerto de John Keston tocando a instalação “Playing the Building”, de David Byrne. (Esta gravação é binaural, recomenda-se ouvir com fones de ouvido
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para ter uma espacialização sonora mais precisa). Disponível em: http://audiocookbook.org/binauralvideo-of-david-byrnes-installation-playing-thebuilding/. AUD.08 - Excerto de “Medium”, de Emptyset. Disponível em: http://vimeo.com/37369186. AUD.09 - Excerto de “The Murder of Crows”, de Cardiff e Miller. Acervo pessoal. AUD.10 - Excerto de “Forty Part Motet”, de Janet Cardiff. Acervo pessoal. AUD.11 - Trecho do programa “A Ritual Soundscape”, parte da série “Noise: A Human History”. Disponível em http://www.bbc.co.uk/programmes/b01rglcy. 114
AUD.12 - Experimento 01 - Microfonia “cantante”. AUD.13 - Experimento 02 - Microfonia e espacialização. AUD.14 - Experimento 03 - Microfonia, espacialização e interface. AUD.15 - Experimento 04 - Reverberação e distância: simulação. AUD.16 - Som de fundo do edifício da FAU. Gravado no estúdio 5, em uma quarta-feira, às 09:53, padrão AB de microfonação.
AUD.17 - Espaço de transição entre áreas internas e externas da FAU. Gravado na praça entre entrada principal da FAU e diretoria, sob a projeção da cobertura da biblioteca, em uma quarta-feira, às 11:29, padrão AB de microfonação. Notar como é possível perceber ainda o som de fundo vindo do interior da FAU. AUD.18 - Espaço externo entre o prédio da FAU e o LAME. Gravado em uma quarta-feira, às 11:36, padrão AB de microfonação. AUD.19 - Experimento 05 - Isolando ambientes, intervalo fixo. A gravação começa com oito faixas de áudio tocando simultâneamente, que são depois isoladas aleatoriamente em um intervalo fixo de tempo. AUD. 20 - Experimento 06 - Isolando ambientes, intervalo aleatório. A gravação começa com oito faixas de áudio tocando simultâneamente, que são depois isoladas aleatoriamente em um intervalo também decidido de forma aleatória. Em um segundo momento, essas faixas de áudio são isoladas uma a uma. Nesta gravação, esse ciclo se repete duas vezes.
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