ID: 60011395
04-07-2015
Tiragem: 33425
Pág: 15
País: Portugal
Cores: Cor
Period.: Diária
Área: 15,88 x 30,12 cm²
Âmbito: Informação Geral
Corte: 1 de 1 RITA FRANÇA
Edifícios das três cidades normalmente inacessíveis podem ser visitados este fim-de-semana
Porto, uma casa aberta que chega a Gaia e também a Matosinhos Arquitectura Abel Coentrão Frente Atlântica mostra 40 exemplos, em edifícios públicos e privados, do melhor da sua arquitectura As visitas são gratuitas Victoria Thornton esteve pela primeira vez no Porto há oito anos. Dessa visita, guardou a impressiva memória de um casco velho cheio de potencial que tardava a ser aproveitado, numa cidade já então marcada por edifícios contemporâneos impressionantes. A fundadora do Open House Londres, que em 1994 abriu duas centenas de edifícios da capital inglesa numa iniciativa, pioneira, de educação para a arquitectura, voltou à cidade de Siza e de Souto de Moura, de Marques da Silva e de muitos outros nomes para acompanhar a entrada do Porto na família Open House. Perguntem-lhe o que define, para ela, um bom projecto de arquitectura. Ela não vos falará de estilos, linhas, materiais ou programas funcionais. Para Victoria Thornton, a boa arquitectura é aquela que lhe “eleva o espírito”. E não foi por estarmos na capela de São José, em Gaia, hino à luz, e à espiritualidade, plantada pelo arquitecto José Fernando Gonçalves na Rua do Dr. Alfredo Guimarães, en-
tre uma ruidosa linha de comboio e uma movimentada estrada de acesso à Ponte do Infante, que a resposta surgiu. Este lugar de sossego até podia ser uma pequena sala de concertos, com o seu altar/palco, retroiluminado por um plano envidraçado que dá para um pátio de gravilha, pontuado por uma trepadeira. E, ainda assim, seria sempre capaz de impressionar quem tiver a calma de, passando defronte, entrar. Victoria Thornton anda há 20 anos a pregar a mensagem: para se começar a gostar de arquitectura basta “abrir os olhos” ao que está à nossa volta. E esta primeira edição da Open House Porto, que na verdade se estende à recém-baptizada Frente Atlântica, juntando-lhe Gaia e Matosinhos, segue, nas suas 40 propostas para visitas, neste fim-de-semana, esta cartilha que, de Londres-1994, se entranhou na programação cultural de mais de 30 cidades, por todo o mundo. Tudo o que há para ver cabe no horizonte que se alcança do Farol de Leça, terceiro ponto de uma visita inaugural — para convidados e imprensa — desta iniciativa que tem a organização da Casa da Arquitectura e da Trienal de Arquitectura, com o apoio dos três municípios. O Farol de Leça, do engenheiro José Joaquim Peres (1926) surge no programa pelo que é — arquitectura sem arquitecto, marca na paisagem de onde tudo se avista. O vereador
da cultura portuense, Paulo Cunha e Silva, quis mostrar essa cidade liquefeita, sem fronteiras e sem receio de que se lhe chame, no conjunto, Porto, a partir das alturas do terraço dos paços do concelho (António Correia da Silva/Carlos Ramos, 1957). E o presidente da Câmara de Matosinhos não quis ficar atrás e pôs a comitiva a subir e a descer o estreito caracol do seu farol favorito, que parece guardar a Casa de Chá da Boa Nova (uma das obras de Siza neste roteiro), com o mesmo zelo que vai guiando, ainda, os marinheiros no Atlântico. O Farol de Leça funciona também como metáfora do que é esta openhouse. Luz intensa, a incidir sobre um mar de cimento, que nos abre os olhos para casas particulares como a que Luísa Penha desenhou para a irmã, na Praça de Lisboa, num gesto contemporâneo a procurar inspiração na tradição das casas burguesas, e nos guia por outros espaços improváveis e também habitualmente fechados aos olhares de estranhos, como a refinaria de Leça, imensidão de ferro e tubos, à beira-mar implantados. É, por isso, uma oportunidade rara. Um convite para sítios onde raramente, ou nunca, se é convidado, primeira lista de uma cidade, ou três no caso, onde cabem várias edições, nos próximos anos, vencida que esteja a desconfiança que levou alguns proprietários a recusar abrir as portas neste ano de estreia.