Brasil de Fato PR - Edição 170

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Pandemia piora no Paraná Chefe de UTI afirma que situação está longe de ser “normal”

Paraná | p. 4

União de moradores ganha força

Giorgia Prates credito foto

Cidades | p. 6

Crise e descaso de governos acelera união popular

Giorgia Prates

PARANÁ

Ano 4

Edição 170

11 a 17 de junho de 2020

distribuição gratuita

www.brasildefatopr.com.br

Pra romper o cerco autoritário

Trabalhadores adoecem nos frigoríficos

Semana de manifestações no Paraná contra o racismo e o fascismo enfrentou forte aparato policial. Mesmo com a crise sanitária, tendência é que atos continuem em todo o país pela democracia e para combater o autoritarismo Brasil | p. 5

No Paraná e em Santa Catarina, grandes empresas expõem funcionários, não realizam testagens para Covid-19 e ainda demitem indígenas. Cidades | p. 7

Giorgia Prates

Divulgação

Editorial | p. 2

Brasil | p. Opinião | p.63

Porém | p. 3

As máscaras de Bolsonaro

Casa da Resistência: cultura resiste

Greca arrisca novo protocolo

Governo encobre realidade do povo e dados da saúde

A cultura precisa de valorização e autonomia

Em meio ao aumento de casos de contágio no Paraná


Brasil de Fato PR 2 Opinião

Brasil de Fato PR

Paraná, 11 a 17 de junho de 2020

Escancarar o que Bolsonaro quer mascarar

EXPEDIENTE

EDITORIAL

A

s informações são armas no enfrentamento a uma doença mortal como a Covid-19. E Bolsonaro segue em guerra contra o povo brasileiro. Em vez de políticas voltadas ao cuidado com as vidas, investe na desinformação e alimenta seguidores fanáticos com suas mentiras. O general Eduardo Pazuello, na condução do Ministério da Saúde, atrasa e confunde informações oficiais básicas sobre o curso da pandemia no Brasil.

A escalada de mortes prossegue em uma nação ansiosa por respirar em paz. Aliás, a partir do brutal assassinato de George Floyd, justamente por asfixia, multidões em todo o mundo saíram às ruas em defesa das vidas negras. Tragicamente, em meio ao despertar por mudanças, no Brasil uma criança negra de cinco anos caiu do nono andar de um prédio de luxo: Miguel. Sua mãe trabalhava na casa de uma família rica, e não teve trégua

Brasil de Fato PR Desde fevereiro de 2016

dos patrões brancos nem mesmo ao ter contraído a Covid-19. A revolta contra essa violência, que tem por critério estrutural a cor da pele, é engrossada pelos gritos por democracia. Estamos vendo os atos de protesto se espalharem pelas cidades. Dezenas de mascarados, por proteção contra o contágio, escancaram o que as máscaras de Bolsonaro não escondem: a crueldade de um governante em seu projeto autoritário de poder.

O jornal Brasil de Fato circula em todo o país com edições regionais em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Paraná. Esta é a edição 170 do Brasil de Fato Paraná, que circula sempre às quintas-feiras. Queremos contribuir no debate de ideias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais.

EDIÇÃO Frédi Vasconcelos e Pedro Carrano REPORTAGEM Ana Carolina Caldas e Lia Bianchini COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Isadora Stentzler, Rayana Costa e Javier Guerrero ARTICULISTAS Fernanda Haag, Cesar Caldas, Marcio Mittelbach e Roger Pereira REVISÃO Lea Okseanberg, Maurini Souza e Priscila Murr ADMINISTRAÇÃO Bernadete Ferreira e Denilson Pasin DISTRIBUIÇÃO Clara Lume FOTOGRAFIA Giorgia Prates e Gibran Mendes DIAGRAMAÇÃO Vanda Moraes CONSELHO OPERATIVO Daniel Mittelbach, Fernando Marcelino, Gustavo Erwin Kuss, Luiz Fernando Rodrigues, Naiara Bittencourt, Roberto Baggio e Robson Sebastian REDES SOCIAIS www.facebook.com/bdfpr CONTATO pautabdfpr@gmail.com

SEMANA

A Casa da Resistência continua, mas não podemos repetir os mesmos erros OPINIÃO

Javier Guerrero,

Mosaicista, artista plástico equatoriano radicado no Brasil há trinta anos, ex-combatente na organização equatoriana Alfaro Vive

A

Casa da Resistência surge num momento em que os trabalhadores em geral, e das artes e cultura em especial, sentem uma necessidade e uma falta enorme de espaços onde possam expressar suas angústias, suas lutas, suas obras, individuais e coletivas, seus amores. A ideia e a proposta foi amadurecida pelos companheiros que parti-

ciparam da campanha eleitoral de 2018 de manter e robustecer esse espaço na Rua Paula Gomes, 369, centro de Curitiba que, num primeiro momento, foi comitê eleitoral, local de referência forte durante a disputa do segundo turno contra a candidatura de Bolsonaro, e que foi se convertendo numa “Casa de Resistência” na qual aconteciam shows e debates. Com esse objetivo, fomos convidados, alguns artistas e futuros apoiadores financeiros, para se somarem a este sonho. Houve um entusiasmo de todos. Fizemos ativida-

des para arrecadar dinheiro e pagar a reforma da casa; desde feijoadas até campanhas de colaboração virtual. Formaram-se grupos de trabalho: da cultura, de formação política, cineclube etc. Havia uma biblioteca, quase pronta, como também um espaço para as crianças e uma oficina de cerâmica. A Casa estava prestes a inaugurar suas atividades e nos surpreendeu a pandemia de Covid-19. Ao lado disso, o que levou a fechar as portas da Casa foi nossa dependência total dos mecenas e financiadores externos. Isto não pode

se repetir. Temos que criar redes com outros espaços similares e trabalhadores de outras áreas, ao lado dos trabalhadores da cultura. Lutar por organização e autonomia. Devemos desmistificar o trabalho artístico como algo de outro mundo e assim nos aproximarmos de outras profissões e movimentos populares. A Casa da Resistência vai continuar e, para isso, contamos com a colaboração de todos os homens e mulheres do povo. Nos próximos dias teremos já definido um novo local que dará continuidade a este sonho.


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Paraná, 11 a 17 de junho de 2020

Geral | 3

QUE DIREITO

FRASE DA SEMANA

“A gente vive numa sociedade do medo”

Greca adota rodízio de Covid-19 em Curitiba Seguindo exemplo do estado de São Paulo, a Prefeitura de Curitiba adotou o rodízio de Covid-19. Nesta proposta, a gestão municipal criou níveis de isolamento e exposição social, restringindo e liberando atividades conforme cores. São três possibilidades: amarelo (alerta), laranja (risco médio) e vermelho (risco alto). As cores mudam conforme a propagação da doença e capacidade de atendimento do serviço de saúde. Conforme as cores mudam, os estabelecimentos comerciais podem atender as determinações do protocolo sanitário, passando a funcionar com horário restrito ou passar por suspensão (nível amarelo) ao fechamento. O prefeito Rafael Greca (DEM) defendeu o novo protocolo e ainda disse que, independente das cores, a cidade pode fechar se os casos aumentarem. Curitiba tem 1399 casos confirmados e 63 mortes causadas pela doença. Em 22 de maio, quando o governo estadual autorizou a reabertura de shoppings e academias, a cidade registrava 921 casos confirmados e 36 óbitos.

Disse nesta semana, em entrevista ao site UOL, a médica anestesista Ticyana Azambuja. Ela foi agredida por pessoas que estavam numa festa no Rio de Janeiro (entre elas policiais), quando foi protestar pelo barulho, foi espancada por quatro pessoas, teve duas fraturas e rompeu ligamento do joelho. “As pessoas não tiveram coragem de me ajudar. Foi tanta truculência que as pessoas ficaram com medo de agir”, afirmou. Divulgação

NOTAS BDF

Por Frédi Vasconcelos

Tempos loucos Circulou nesta semana, nas redes sociais, postagem do deputado estadual Coronel Lee (PSL-PR), após encontro com o general Heleno em Brasília, em que o deputado ameaça: “Tratamos de assuntos referente ao grupo de terroristas do MST. Nossos Aliados estão chegando.” Faltou perguntar ao deputado sobre suas ações de solidariedade neste momento em que assentados e acampados ligados ao MST doam dezenas de toneladas de alimentos aos mais vulneráveis.

Tempos loucos 2 Na tarde da quarta-feira, 10, um homem portando uma faca tomou como refém a repórter Marina Araújo, da TV Globo, e exigiu ver a apresentadora do “Jornal Nacional” Renata Vasconcellos. Renata foi até o local e o homem libertou Marina. Na nota que soltou sobre o caso, a Globo descartou conotações políticas e afirmou que as duas jornalistas estão bem e que o homem foi preso pela polícia.

Ditadura nas universidades O governo federal editou medida provisória suspendendo eleições e indicações de listas tríplices para os cargos de reitores em universidades e institutos federais. A indicação de reitores pró-tempore seria feita pelo pior ministro da Educação que o país já teve, Abraham Weintraub. Por essa medida, mais a tentativa de esconder dados da pandemia, a hashtag #DitaduraVoltou subiu nas redes sociais.

Tudo por dinheiro O padre pop Reginaldo Manzotti, do santuário Nossa Senhora de Guadalupe, de Curitiba, participou de reunião virtual em que várias pessoas ligadas à igreja católica ofereceram apoio ao presidente Bolsonaro em troca de verbas públicas. Manzotti aparece pedindo a regularização de rádios e diz: “Gostaria de me aproximar do governo para poder fazer essa proposta positiva, isenta, de realmente levar esse trabalho e fazer com que ecoe desde os ribeirinhos até as grandes capitais”. Após a reunião a CNBB soltou nota contra a negociata em nome da igreja católica.

É ESSE? Rubens Bordinhão Neto*

O acesso à informação é um direito nosso Todo cidadão tem direito de acesso às informações dos órgãos públicos de qualquer ente federativo e de qualquer um dos poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), além das empresas privadas que recebem recursos públicos. Esse direito está assegurado na Constituição e garante a transparência nas informações públicas, o que é fundamental para o controle e a fiscalização dos governantes pelo povo. Em 2011 foi publicada a Lei de Acesso à Informação (LAI) que determina, como regra geral, a obrigação de publicidade dos atos governamentais, sendo possível o sigilo apenas em situações excepcionais, por determinação da lei ou de decisão judicial. Pela LAI, qualquer cidadão pode requerer a apresentação de informação diretamente ao órgão público. O procedimento é gratuito e não é necessário justificar. Além disso, a administração pública tem o dever de publicar as informações de interesse coletivo em meio de fácil acesso, como nas páginas na internet. Nesta semana vimos que o governo federal retirou e omitiu inúmeros dados da Covid-19. Contudo, é direito nosso o acesso às informações completas sobre o número de infectados, já que a transparência contribui para os cidadãos avaliarem a gestão dos governantes na contenção do coronavírus. *Membro da Rede de Advogados e Advogadas Populares


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Paraná, 11 a 17 de junho de 2020

Nasce a União de Moradores Localizada no chamado Bolsão Formosa, no bairro Novo Mundo, em Curitiba, experiência de solidariedade e organização popular torna-se urgente com a crise econômica Pedro Carrano, com fotos de Giorgia Prates

A

s ações de solidariedade e organização popular se fortalecem na região sul de Curitiba, no chamado Bolsão Formosa, área urbana de ocupação, que reúne comunidades que lutam por regularização fundiária, asfalto, política de assistência social, trabalho e renda, entre outros problemas, há trinta anos, desde que ocorreu a primeira de uma série de ocupações urbanas que, já naquela época, recebiam combate do atual prefeito Rafael Greca (DEM).

Agora, diante da crise econômica, política e sanitária que o país atravessa, associações de moradores, que ficam praticamente na mesma área, dividida em vilas que se conhecem, mas nem sempre dialogavam, resolveram organizar em conjunto solidariedade, denúncias de problemas e lutas pelas principais bandeiras, entre as quais a moradia e a escritura dos terrenos. Em maio, com uso de máscaras, prevenção e distanciamento, houve reunião de dois representantes de quatro associações de moradores. O encontro contou com a participação das associações de mora-

dores Ferrovila, Formosa, Vila Leão, Uberlândia, além do Clube de Mães da Ferrovila. Desde então, somou-se à experiência chamada inicialmente de “União de Moradores” a associação Canaã. De forma urgente, foram definidas formas de revezamento de ações de solidariedade, cada quarta-feira na sede de uma associação, contando com a força da população local e o convite a todas as pessoas da região. A experiência não é nova e já houve outras iniciativas de unificação. Na avaliação das lideranças, porém, o momento é propício para a unidade. (confira frases abaixo)

“Estamos arrecadando doações. Mas o que vale é o diálogo, a amizade, sentarmos e escutarmos os problemas que temos, juntos fazemos a força, sozinhos nós não fazemos nada, essa é a importância da União dos Moradores”, reflete Claudete da Silva, presidenta da Associação de Moradores da Vila Leão.

SOLIDARIEDADE

MST e Sindipetro entregam gás em comunidades No dia 13 de junho, próximo sábado, o Sindipetro PR e SC e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) promovem uma ação solidária em Curitiba, nas áreas de ocupação Portelinha e no Sabará (CIC). A ação nasceu quando dirigentes do MST e do Sindipetro fizeram o desafio de aumentar o número de doações de itens essenciais para famílias que estão em vulnerabilidade social. As famílias Sem Terra da comunidade Maila Sabrina vão doar 15 toneladas de alimentos, já os petroleiros têm o desafio de doar 500 botijões/cargas de gás de cozinha.

“Com o descaso do governo federal, no Bolsão Formosa está acontecendo um trabalho de solidariedade importante, com apoio da Campanha Periferia Viva e do MST. Vale destacar o entrosamento que vai acontecendo entre os moradores”, afirma Ivan Carlos Pinheiro, presidente da Associação Ferrovila.

“Só vem a ajudar na verdade, pois não tem mais diferenciação de território, todos podem ajudar todo mundo, só tem a contribuir, ainda mais neste momento, um pontapé inicial, neste ponto conseguimos articular bem melhor do que cada um por si”, afirma Fabricio Rodrigues, da associação dos moradores e amigos das Vilas Maria e Uberlândia.

“Tem várias vilas dentro do Bolsão Formosa. Nossos interesses são os mesmos. Regularização fundiária, moradores desempregados, não temos ajuda dos governos, em vez de uma reunião em uma vila, fazemos agora com todos. Saímos do ‘eu, eu, eu’ e vamos unir!”, afirma Odila Raizel, presidenta da Associação de Moradores da Vila Formosa.

“No começo das ocupações (1990), víamos que os presidentes eram bem unidos, o que fortalecia e deixava mais seguro. Havia um sentimento de alegria e facilidade de falar com as autoridades. Com o passar dos anos, cada um lutou no seu território, e daí perdemos essa força boa de lutar pela comunidade. Sinto que o clima agora é bom para a unidade”, diz Vanda Lemos, presidenta da Associação Canaã.


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Manifestação antifacista cercada pela polícia Todos que chegavam eram revistados, diferentemente do que ocorreu em carreatas e manifestações pró-Bolsonaro Redação, com fotos de Giorgia Prates

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uma tarde fria em Curitiba, manifestantes fizeram ato antifascista e anti-Bolsonaro no centro de Curitiba no domingo, 7. Desde o início, houve grande aparato policial, que cercou completamente a Praça Santos Andrade. Todos eram revistados de maneira ostensiva. Para um militante do movimento negro a ação foi desproporcional. “Todas as instituições têm de ser respeitadas, a segurança é importante, mas tem de valer para todos, não só para a população negra, do Tatuquara, da Cidade Industrial. Temos que nos manifestar agora sob o risco de ter um golpe”, afirmou. Durante as cerca de 3 horas da atividade, transmitida ao vivo pela equipe do Brasil de Fato Paraná, tudo transcorreu de maneira tranquila, com pessoas com máscaras e mantendo certa distância para evitar o contágio pelo coronavírus. Para militante e mulher negra, da juventude Rebeldia, é fundamental estar nas ruas, apesar de intimidações do governo e da polícia militar. “Um dos fatores é a intimidação policial, que mata 75 por cento dos negros, e essa necessidade de se fazer um ato é o que faz a gente estar nas ruas. A gente queria estar em quarentena, mas a classe trabalhadora no Brasil

não pode estar em quarentena. Vidas negras importam. O genocida Bolsonaro e seu projeto não são o primeiro governo racista, precisamos acabar com esse sistema”, defende. A forte presença da polícia foi questionada por diversos manifestantes presentes ao ato, com a polícia tendo atitude completamente diferente de atividades pró-Bolsonaro. Aliás, poucos defensores do presidente apareceram e ficaram provocando quem estava na manifestação. Permaneceram atrás dos soldados, com proteção da polícia. “Quero saber quem está do meu lado. Estão falando dos vidros, mas um moleque foi morto a tiros dentro de casa. O que vamos fazer? Lembro bem quem estava no poder quando subiram os morros do Rio. Nós negros somos um recorte da luta de vocês (brancos), estou cansado disso”, critica um jovem negro, referindo-se a vídeos que circularam sobre a manifestação que ocorreu na segunda-feira, dia 1º, com o tema “Vidas Negras Importam” e reuniu mais de mil pessoas nas ruas da capital paranaense. Após o ato na Praça Santos Andrade, saiu marcha de manifestantes até o Palácio Iguaçu, cercada por forte aparato policial, com policiais da Rotam, Rone, guarda municipal, cavalaria e um helicóptero voando baixo.


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Para professor, “É preciso que todos saibam que a vida não está normal e contribuam”, isolamento social ainda é a melhor diz coordenador de UTI medida contra Enfermeiro destaca necessidade de um atendimento humanizado a pacientes pandemia Ana Carolina Caldas Giorgia Prates

O

s profissionais de saúde estão na linha de frente no combate à pandemia da Covid-19. São eles os mais expostos aos riscos de infecção. Em todo o Brasil, segundo o Ministério da Saúde, mais de 30 mil testaram positivo. Trabalhar entre o medo da contaminação e a vontade de salvar vidas é uma rotina diária. Segundo a Confederação Nacional de Saúde (CNS), o Paraná contabiliza 128.208 profissionais de saúde. Entre eles, Keller Koetzler, profissional de enfermagem desde 2007 e que coordena a unidade intensiva (UTI) para Covid-19 em um hospital público. Para ele, sem amor pela profissão, é muito difícil ir em frente. Kesler acredita que o trabalho de enfermeiro na pandemia ressignificou ainda mais o atendimento humanizado. “Os pacientes, ao não verem suas famílias, aumentam a necessidade de ter conforto emocional. PUBLICIDADE

Ana Carolina Caldas

Além de videochamadas, fizemos até festa de aniversário. Além dos pacientes que ficam longe da família, os profissionais da saúde também ficam em isolamento. “Não visito meus pais desde o início. Por causa disso, temos de cuidar muito da nossa saúde mental. Tenho visto, entre meus colegas, essa preocupação.” Pesquisa da Associação Paulista de Medicina (AMP) detectou que num universo de 2.312 médicos ouvidos no país, 86,6% apresentaram a percepção de que seus colegas estão deprimidos.

Kesler espera que logo a pandemia seja apenas uma lembrança, mas acha que ainda teremos que conviver com a doença por um bom tempo. “A gente vem sofrendo com a incerteza, o que sabíamos sobre a doença em março já mudou. Temos de nos atualizar, trocar experiências com outros estados. Porém, enquanto a vacina não aparecer, teremos de ficar um bom tempo convivendo com a doença. É importante que as pessoas saibam que a vida não está normal. E contribuam.”

Na semana em que houve aumento do número de pessoas contaminadas por coronavírus no Paraná, de 50 casos diários para 300, ocorreu também a reabertura de shoppings, academias e igrejas. Medidas que são o contrário do que foi feito em países que tiveram êxito na contenção do vírus. Em entrevista ao Brasil de Fato Paraná, o presidente da Comissão de Enfrentamento e Prevenção ao Covid-19 da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular, Emanuel Maltempi de Souza, analisa a situação. Brasil de Fato – Qual é a situação da disseminação do Covid-19 no Paraná? Emanuel Maltempi – Temos mais de 7 mil casos e 250 mortes confirmadas. Quando analisamos o crescimento dela nas últimas semanas, chegamos a um valor de 1,44 de reprodução da doença. Quando passamos de 1, significa crescimento exponencial. O número de doentes está dobrando a cada 12 dias. Como o tempo de hospitalização é de 2 a 3 semanas, o sistema chegará rapidamente à ocupação total. Saímos de 35% dos leitos ocupados em Curitiba para o atual 60%. Do ponto de vista epidemiológico, o vírus tem um potencial devastador, pois afeta os sistemas de saúde e não temos leitos para tanta demanda. BDF - Com a reabertura de shoppings, academias e igrejas, o que pode acontecer? É bem provável que, daqui 7 a 10 dias, a reprodução da doença seja ainda maior, considerando o cálculo acima e a flexibilização do isolamento. Realmente, neste momento de crescimento exponencial, não seria recomendada a flexibilização. Até hoje, a melhor medida é a rigidez no isolamento social. Há doentes que não manifestam os sintomas, mas que podem disseminar o vírus. A melhor resposta é diminuir o contato entre pessoas, é isso que vai diminuir a taxa de transmissibilidade. BDF – O que seria recomendado fazer no Paraná que não foi feito? O afrouxamento das medidas de distanciamento foi precipitado. Isso só deveria acontecer quando a taxa de contágio estivesse abaixo de 1. Mesmo assim, é preciso manter o controle da situação a partir de testes, examinando todos com sintomas e as pessoas que entraram em contato com os doentes. É preciso fazer a testagem em massa, o que não está sendo feito.


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Com 118 contaminados, frigoríficos de Cascavel são alvo do Ministério Público Órgão pede afastamento imediato e testagem em massa de trabalhadores da Coopavel Lia Bianchini

N

o Oeste do Paraná, os frigoríficos “são uma grande mola propulsora da proliferação do Covid-19”, diz Paulo Porto, vereador em Cascavel. Confirmando o que diz o vereador, na sexta (5), o Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou ação contra a Cooperativa Agroindustrial de Cascavel (Coopavel), proprietária dos frigoríficos Frialves e Frisuínos. Na ação, pede-se o afastamento imediato e remunerado de todos os empregados e trabalhadores terceirizados das unidades pelo prazo mínimo de 14 dias e a realização de testagem em massa desses trabalhadores custeada pela empresa. A ação vem após uma série de recomendações do

MPT à Coopavel em meses anteriores, alertando para a necessidade de adequação dos frigoríficos a normas que garantissem a proteção da saúde dos trabalhadores ao coronavírus. Sucessivas vezes foram desrespeitadas recomen-

dações de levantamento de trabalhadores com doenças crônicas, afastamento por tempo adequado daqueles com suspeita de Covid-19, respeito ao distanciamento entre os trabalhadores, fornecimento de equipamentos de proteção individual e

transporte particular da empresa, que garantisse o distanciamento no deslocamento. “A conduta da ré se configura como gravíssima. [...] Hoje a ré possui o estarrecedor número de 118 casos de trabalhadores contaminados, sendo o segundo Giorgia Prates

frigorífico em número de Covid positivo no Paraná”, afirma o MPT na ação. Contrariamente ao detalhamento de infrações pelo MPT, a vigilância em saúde do trabalhador de Cascavel informa que a Coopavel está cumprindo todas as recomendações de proteção aos trabalhadores. Para o vereador Paulo Porto (PT), o papel da Prefeitura de Cascavel merece atenção e cobrança. “Nos cabe a seguinte pergunta: como é possível que esses mesmos frigoríficos atendam tão bem e de maneira tão imediata às recomendações da vigilância de Cascavel e atendam tão mal, de forma tão intransigente, as recomendações do MP para as mesmas questões de proteção do trabalhador?”, questiona.

JBS doa milhões contra pandemia, mas demite indígenas para não pagar ônibus Isadora Stentzler

A

JBS de Seara, município no Oeste catarinense, demitiu 40 indígenas da etnia kaingang no início de maio por alegados “altos custos operacionais”, após o ônibus que levava os indígenas até a empresa interromper as viagens devido à pandemia do coronavírus. Para o procurador Edson Beas Rodrigues Junior, do Ministério Público do Trabalho (MPT) de Joaçaba/SC, o comportamento da empresa foi discriminatório. Ele move Ação Civil Pública pedindo a reintegração dos tra-

balhadores e o pagamento de indenização de R$ 10 milhões. Na ação, são apontadas outras violações que teriam ocorrido na empresa. Os depoimentos citam que trabalhadores indígenas desenvolviam trabalhos mais pesados que os não indígenas e ficavam mais tempo em serviços que apresentavam risco (como manuseio de faca), sem rodízio. As acusações também falam de refeições diferentes e falta de equipamento de proteção. Os indígenas demitidos são da Terra Indígena Serrinha, localizada entre os mu-

nicípios de Ronda Alta, Três Palmeiras, Engenho Velho e Constantina, no norte gaúcho. Ali moram 716 famílias kaingangs, mais de 3,5 mil pessoas. Entre os trabalhadores demitidos está uma gestante. Com a pandemia, os indígenas foram enquadrados no grupo de risco, conforme portaria da Fundação Nacional do Índio (Funai). Esperava-se que eles fossem afastados do trabalho sem ônus aos salários. O que aconteceu foi o cancelamento dos dois ônibus e do micro-ônibus que faziam o trajeto dos trabalhadores até a indústria

e, em seguida, a demissão de 40 indígenas. Na ação movida pelo MPT após a demissão dos trabalhadores, documentos anexados apontam que a empresa alegou “altos custos operacionais”. Em 11 de maio, porém, cinco dias após a demissão,

a empresa anunciou a doação de R$ 700 milhões para o combate ao coronavírus por meio do projeto Fazer o Bem Faz Bem. No relatório da JBS, a empresa também apontou ter, em 2019, sua maior receita líquida, de mais de R$ 200 bilhões. Arquivo Comunidade da Terra Indígena Serrinha


Brasil de Fato PR 8 | Cultura

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Todas as atrações do Festival de Teatro de Curitiba serão gratuitas

Por Renato Almeida de Freitas

Mas não estamos à venda

Edição deste ano foi adiada para setembro e contará com artistas locais Giorgia Prates

“Queria ter, pra testar e ver, um malote com glória, fama e embrulhar num pacote, ‘cê é isso que cêis qué, vem pegar’, jogar num rio de merda e ver vários pular”, Racionais MCs. Porcos chafurdando na lama. Imaginem a cena, dupla de policiais entra sem mandado numa suposta biqueira, um dos policiais leva o dono da casa para o quarto enquanto o outro rende mais duas pessoas na sala. O primeiro extorque 800 reais do bandido, o outro continua a revista inconformado por não ter encontrado nada de valor. Todo mundo deitado, os dois policiais conversando. Decidem sair, um deles volta e pergunta: “quanto que o ‘stevie’ encontrou no seu quarto, só 600 mesmo?”, sim, mentiu o rapaz

Redação Inicialmente previsto para acontecer nos meses de março e abril de 2020, o Festival de Teatro de Curitiba foi adiado devido à pandemia do coronavírus. Na segunda-feira, 10, a organização do evento anunciou que a sua 29º. edição tem nova data, será entre os dias 17 e 27 de setembro. Desde 1992, a programação principal acontece nos grandes teatros da cidade e são os espetáculos com preços mais altos. Com as incertezas da evolução da pandemia, o festival deste ano acontece em novo formato. De acordo com a organização, a programação terá somente artistas curitibanos, já prevendo possíveis dificuldades de viagens de pessoas fora do estado. A única exceção, por enquanto, será a apresentação do cantor Emicida na abertura do evento. A programação acontecerá em 12 espaços abertos espalhados pela cidade e as atrações serão todas gratuitas. A nova programação será publicada brevemente. Devolução de ingressos Para quem já tinha comprado ingressos para os espetáculos da programação anterior, há três opções. Destinar o dinheiro dos bilhetes para colaborar com a remuneração de artistas e profissionais que trabalharão na edição especial do festival. Continuar com o crédito para adquirir ingressos na edição 2021 ou pedir reembolso integral do que foi pago. A previsão de restituição é até 31 de dezembro de 2021.

para não se prejudicar. 200 reais, nem isso vale a lealdade dessa banda podre. Amadores do mau-caratismo. Profissionais são as empresas que enviam lobistas, políticos que mandam assessores, patrões que ordenam gerentes, réus que compram juízes através de seus advogados, em suma: profissionais são os que terceirizam o trabalho sujo. Recentemente fui abordado por um office-boy dos poderosos. Queria minha “base”, “influência” e “votos” ao seu dispor, assim, como quem diz: “Quanto vale ou é por quilo? ”. - O que podemos fazer por você? Perguntou. - Não é nada pessoal, mas não estamos à venda.

DICAS MASTIGADAS

Bolo de mexerica sem ovos e sem leite Por Rayane Costa

A cada semana, publicamos receitas com produtos agroecológicos da rede colaborativa Produtos da Terra, da Sinergia Alimentos Saudáveis e da Rede Mandala. Parte dos ingredientes pode ser encontrada no site produtosdaterrapr.com.br Ingredientes 1 xícara de suco de mexerica orgânica; 1 limão orgânico; 2/3 xícara de óleo; 1 xícara de trigo; 2 xícaras de fubá; 2/3 xícara de açúcar; 1 colher de vinagre de maçã; 1 colher de fermento químico; 1/2 xícara de água. Modo de preparo Primeiro, bata no liquidificador o suco de mexerica, o suco do limão e o óleo. Em um recipiente, misture bem o trigo, o fubá e o açúcar. Acrescente a mistura ao conteúdo do liquidificador. Em outro recipiente, junte vinagre, fermento e água e mexa com cuidado. Acrescente também à mistura do liquidificador e bata. Unte uma forma com óleo e fubá, adicione a massa e asse em fogo médio.

Rayana Costa


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