Brasil de Fato PR - Edição 195

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A Curitiba negra

Acervo | Ippuc

Cultura | p. 7

Esportes | p. 8

Maradona e George Best

Livro resgata a presença e faz mapa dessas memórias

PARANÁ

Craques no campo, problemáticos fora e morreram no mesmo dia Ano 4

Edição 195

3 a 9 de dezembro de 2020

distribuição gratuita

www.brasildefatopr.com.br

Reprodução

IRRESPONSÁVEIS Greca e Ratinho liberaram tudo antes das eleições. Agora voltam atrás Paraná | p. 5 Agência de Noticias do Estado

RodrigoFonseca | CMC

PARA A SOCIEDADE NUNCA ESQUECER Ataque racista de 8 skinheads gerou impunidade, trauma psicológico e físico a jovem negro Giorgia Prates

Direitos Humanos | Pág. 6

Paraná | p. 4

Brasil | p. Editorial | p.6 2

Opinião | p. 2

Ódio aos indígenas

Bomba-relógio

Na falta de projetos

Reportagem mostra mensagens trocadas em grupos de policiais

Passada a eleição, desafio é garantir renda à população

Em falsa oposição, mídia empresarial cobra privatizações do governo


Brasil de Fato PR 2 Opinião

A bombarelógio brasileira EDITORIAL

A

rigor, não podemos falar em segunda onda de Covid-19 no Brasil. O agravamento das condições de vida do povo não deu trégua em momento algum. Os dados mostram que, enquanto a crise econômica fica mais séria, o bolso dos ricos continua saudável. O que vemos é uma absurda concentração de riquezas às custas do empobrecimento do povo em momento tão delicado. Eis que as eleições de 2020 terminaram no mesmo momento de elevação

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Paraná, 3 a 9 de dezembro de 2020

dos perigos mortais da pandemia. Alguns prefeitos omitiram o problema aguardando o final das eleições. A acirrada disputa política nas grandes cidades e capitais brasileiras mostra que existem projetos opostos em jogo para a gestão e para o cuidado com quem as habita. Enquanto alguns prefeitos têm “nojo dos pobres” e apreço pelo Natal das elites, outros colocam a vida em primeiro lugar. O prefeito eleito de Belém do Pará, por

exemplo, anunciou a criação do programa de renda mínima – uma garantia de R$ 450 por pessoa para combater a fome e o desemprego, permitindo cuidado com a saúde, tudo viabilizado pelo município. Devemos observar os benefícios dessa experiência para a economia regional. Afinal, é fato: garantir a renda de trabalhadores já é o grande tema do próximo período. A crise é grave. Os ponteiros da bomba-relógio brasileira voltam a girar.

SEMANA

A receita para o abismo

OPINIÃO

Milton Alves,

Ativista político e social. Autor dos livros ‘A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada contra Lula e o PT’ (2019) e ‘A Saída é pela Esquerda’ (2020)

O

jornal “O Estado de São Paulo”, porta-voz da elite paulista, expressou em editorial, no dia 25 de novembro, o desagrado do “andar de cima” (do grupinho de bilionários do país) com a gestão desastrosa do ministro da Economia Paulo Guedes. Em texto, o Estadão critica a falta de rumo do ministro e aponta o coquetel explosivo em gestação que mistura retração econômica, desemprego, crise social e pandemia -, o que pode levar o país na direção de uma aguda convulsão social nos próximos meses. O Estadão lamenta ainda o fracasso da implementação das privatizações anunciadas pelo governo Bolsonaro. A bronca de fundo do Estadão, na verdade, é com a incapacidade do ministro Guedes de conduzir e implementar, para os de cima, a política econômica neoliberal com mais força e ritmo. Esse é o “xis” da questão para o jornal a serviço dos interesses dos bancos e dos especuladores dos títulos das dívidas do governo brasileiro. O que o Estadão quer é a imposição de mais privatiza-

ções, mais cortes nos gastos sociais e mais arrocho aos trabalhadores e ao conjunto do povo brasileiro. Nas entrelinhas do editorial, o velho jornal revela também o temor dos poderosos com uma latente e possível explosão social no país, a exemplo do que vem ocorrendo no Chile, Peru, Guatemala e outros países da América Latina. A falência da gestão de Guedes é uma clara demonstração do desastre do neoliberalismo no Brasil. O país não cabe nas amarras desse modelo concentrador, excludente, neocolonial e de viés antidemocrático. Há outras saídas para o país, e todos sabemos e lutamos por elas. Mas a receita do Estadão é a da continuidade da escuridão e do abismo.

O que o Estadão quer é a imposição de mais privatizações, mais cortes nos gastos sociais e mais arrocho aos trabalhadores e ao conjunto do povo brasileiro

EXPEDIENTE O jornal Brasil de Fato circula em todo o país com edições regionais em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Paraná. Esta é a edição 195 do Brasil de Fato Paraná, que circula sempre às quintas-feiras. Queremos contribuir no debate de ideias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais.

Brasil de Fato PR | Desde fevereiro de 2016 EDIÇÃO Frédi Vasconcelos e Pedro Carrano REPORTAGEM Ana Carolina Caldas e Lia Bianchini COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Ana Keil, Claudio Ribeiro, Fernan Silva, Júlio César Carignano e Milton Alves ARTICULISTAS Fernanda Haag, Cesar Caldas, Marcio Mittelbach e Douglas Gasparin Arruda REVISÃO Lea Okseanberg, Maurini Souza e Priscila Murr ADMINISTRAÇÃO Bernadete Ferreira e Denilson Pasin DISTRIBUIÇÃO Clara Lume FOTOGRAFIA Giorgia Prates e Gibran Mendes DIAGRAMAÇÃO Vanda Moraes CONSELHO OPERATIVO Daniel Mittelbach, Fernando Marcelino, Gustavo Erwin Kuss, Luiz Fernando Rodrigues, Naiara Bittencourt, Roberto Baggio e Robson Sebastian REDES SOCIAIS www.facebook.com/bdfpr CONTATO pautabdfpr@gmail.com


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Paraná, 3 a 9 de dezembro de 2020

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FRASE DA SEMANA

Apontado como solução, toque de recolher de Ratinho é inconstitucional O decreto do governador Ratinho Junior (PSD), que determina o toque de recolher, é autoritário e inconstitucional. É o que aponta decisão do STF, em decisão sobre medida social extrema adotada pela Prefeitura de Umuarama, em abril deste ano, por conta da pandemia. Segundo a Corte Suprema, a medida para ser adotada deveria ter respaldo de autoridades sanitárias como a Anvisa. O decreto, porém, não restringe o horário de funcionamento do comércio ou impõe regras mais duras em parques. A ordem assinada pelo governador Ratinho Junior define o toque de recolher das 23 horas às 5h proibindo “a circulação e aglomeração em espaços e vias públicas como medida de enfrentamento à pandemia de Covid-19”. Por outro lado, não detalha estudos ou protocolos que justifiquem a medida para esse horário. O toque de recolher foi proibido pelo STF. Segundo o presidente do Supremo à época, Dias Toffoli, destacando na proibição que o toque de recolher “teria sempre o caráter de excepcional e temporário” e que “a simples existência da pandemia que ora assola o mundo, (não pode) servir de justificativa, para tanto”. Giorgia Prates

“Se quiser ter Natal em 2021, não vá a festas neste ano” Diz o médico sanitarista Gonzalo Vecina, fundador da Anvisa. Sobre Bolsonaro, fala: “Esse comportamento do líder do país é extremamente inadequado e leva as pessoas a terem comportamento inadequado... É um desastre o que essa ignorância está provocando...”

Reprodução Youtube

EDITAL DE CONVOCAÇÃO A COOPERATIVA DE AGROINDÚSTRIA E COMÉRCIO TERRA LIVRE – COOPERATIVA TERRA LIVRE, vem através de seu Diretor Presidente Sr. Antonio Deocleciano dos Santos, no uso das suas atribuições, que lhe são conferidas pelo Estatuto Social desta entidade e as leis vigentes, CONVOCA os seus associados para participar da Assembleia Geral Ordinária Semipresencial, a ser realizada no dia 18 de Dezembro de 2020 (Sexta-feira), na sede da Cooperativa, localizada no Assentamento Contestado, município de Lapa – PR, às 08:00 hrs em primeira convocação, às 09:00 hrs em segunda convocação e as 10:00 hrs em terceira e última convocação, para deliberarem sobre a seguinte ordem do dia: 1 – Prestação de contas contendo: Relatório de Gestão; Balanço; Demonstrativo de sobras ou perdas apuradas; Plano de atividades da Cooperativa para o exercício seguinte. 2 – Destinação das sobras apuradas ou rateio das perdas. 3 – Eleição da nova diretoria para a gestão

2020/2023. 4 - Fixação do valor da gratificação de representação para as funções dos diretores. 5 – Eleição dos componentes do conselho fiscal. 6 – Outros assuntos de interesse social. NOTAS: 1. As associadas poderão participar e votar a distância mediante o envio de Boletim de Voto a Distância. Maiores informações serão disponibilizadas por meio do seguinte endereço eletrônico: cooperativaterralivre@gmail. com. 2. Para participar da Assembleia Geral Ordinária semipresencial na modalidade a distância, a associada deve enviar cópia de documento oficial com foto de seu representante legal para o seguinte e-mail: cooperativaterralivre@gmail.com ou físico na sede da Cooperativa, ambos com pelo menos 30 minutos antecedentes ao início da Assembleia. LAPA/PR, 01 de Dezembro de 2020.

Antônio Deocleciano dos Santos Diretor Presidente

COLUNA DA

JUVENTUDE Democracia não acontece só de 2 em 2 anos O segundo turno das eleições aconteceu no último final de semana. Das três capitais que se tornaram o centro das atenções São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre - só no Rio obtivemos uma vitória parcial porque derrotamos Crivella. Olhando para além dos resultados nessas cidades, podemos considerar o protagonismo da juventude em todos os lugares que essa categoria esteve organizada. Construímos campanhas potentes, com muita agitação e propaganda, que foram capazes de construir diálogo com os eleitores/ as. Este trabalho se traduziu em vitórias nas cidades de Belém, Diadema, Contagem, Fortaleza, Mauá e Juiz de Fora. Nosso desafio agora será construir a unidade da esquerda nos próximos dois anos, nos preparando para a próxima corrida eleitoral, em 2022. No entanto, é urgente considerarmos de forma transversal e contínua que a democracia não se constrói apenas de 2 em 2 anos, é no dia a dia, com trabalho de base e com o enraizamento das organizações na sociedade brasileira. A juventude mostrou mais uma vez o gás e a energia que tem, e se bem direcionada e organizada, pode resultar na derrota das forças neoliberais e na construção do projeto popular para o Brasil. Ana Keil e Fernan Silva, são militantes do Levante Popular da Juventude e pesquisadores na área de arte e linguagem


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Paraná, 3 a 9 de dezembro de 2020

Capitão defende bater em indígena até “deixar o lombo mais mole que a barriga” Frase foi dita em mensagem enviada a um grupo de jornalistas e policiais. “Senta o dedo PRF”, respondeu o policial civil Isadora Stentzler

O

policial militar José Batista dos Santos, capitão da 6ª Companhia da Polícia Rodoviária Estadual (PRE) do Estado do Paraná, defendeu em um grupo de troca de informações entre jornalistas e policiais que agentes deveriam bater em indígenas até “deixar o lombo mais mole que a barriga”. A mensagem foi enviada após conflitos entre indígenas da Terra Indígena (TI) Rio das Cobras, de Nova Laranjeiras, e Polícia Rodoviária Federal (PRF) serem registrados e recebeu apoio de policial civil de Pato Branco. A conversa obtida pela reportagem aconteceu no dia 16 de novembro, em um grupo chamado Diário da Informação. Desde o dia 11, uma série de conflitos foi registrada na BR 277, que margeia a TI Rio das Cobras, após a prisão de quatro indígenas Kaingang envolvidos no saque a um caminhão baú, carregado de pneus. Cinco dias depois, os indígenas presos foram transferidos e um ato contra o edital 47/2020 do governo do Estado estava previsto para acontecer na rodovia. Segundo a comunidade, um indígena foi atropelado pela PRF e, por não receber ajuda, uma viatura foi retida, o que aumentou a repressão. Na conversa no grupo, uma nota sobre a transferência desses quatro indígenas presos foi compartilhada, seguido de imagens dos conflitos. Uma pessoa disse que “alguém tem que fazer alguma coisa” e que “essa

gente”, referindo-se aos indígenas, “vai acabar matando mais inocentes na rodovia”. Depois, imagens dos conflitos foram compartilhadas. “Esses ‘seres’ não respeitam nada nem ninguém. Senta o dedo PRF. Fazer essas ‘coisas’ aprenderem na marra a respeitar a lei e os outros”, escreveu o investigador de Polícia Civil Juliano Riboli, do Núcleo de Operações com Cães (NOC), de Pato Branco, sendo respondido pelo capitão Batista. “Tinha que descer PM, PF, PRF, e EB com os grupos de CDC e deixar o lombo mais mole que a barriga”, escreveu o capitão. Juliano concorda: “Ótima colocação capitão. Colocar esses em seus devidos lugares. Bando de .... Eu fico muito irritado com

essa fanfarra que eles fazem”. Na sequência, outras pessoas endossam o discurso de ódio, dizendo que são “um povo q [sic] não se aproveita nada”. “Passa o dia bebendo e fazendo farra. Não dá lucro nenhum para a união”, escreveu um. “Esses índios aí sai [sic] um bando de folgados amparados pela velha política, não trabalham não fazem nada só enchem o rabo de cachaça pois não precisam trabalhar, vivem melhor que nós”, disse outro. Um terceiro enfatiza: “Será que não daria para nós cidadão de bem i junto dar uns tapas também”. E ironiza: “nessa hora duvido que não alguém dos direitos humanos defendendo”. (As frases foram copiadas na íntegra, sem edição dos erros)

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Comunidade teme As conversas se somam a uma série de conflitos na TI Rio das Cobras. Para a comunidade, porém, manifestações são racistas e endossam a repressão local, que tem gerado uma onda de insegurança em um território demarcado para os indígenas ainda no início do século 20, mas que é violado. “Desde os fatos ocorridos na comunidade Indígena, vivemos apreensivos. Eles [PRF] continuam adentrando a terra Indígena pela PR Estadual, com várias viaturas. Ficam no trevo das duas BRs, com as viaturas de prontidão”, aponto Neoli Kafy Rygue Olibio, indígena Kaingang da comunidade. “Fizemos várias reuniões, levamos ao conhecimento das famílias as ameaças, os comentários racistas e até alguns incitando a violência e o uso da força contra a comunidade indígena. Tivemos que alertar o pessoal para ficar atento. A orientação do cacique é para cada um cuidar da sua vida. Mas o grande medo do pessoal é que eles ficam adentrando, rondando a aldeia, e que possa aí começar algum outro atrito e conflito.” A reportagem entrou em contato com a assessoria da PM e a Secretaria de Segurança e, até o fechamento desta edição, não teve resposta. Segundo o Portal da Transparência, o capitão Batista atua na corporação desde 1997 e está à frente da 6ª Companhia de Polícia Rodoviária, em Pato Branco. Juliano atua na Polícia Civil desde 2014. Reprodução | Grupos de Whatsapp


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Irresponsabilidade leva a aumento de pandemia em Curitiba e no Paraná

Giorgia Prates

Unidades de UTI estão lotadas. Casos ativos triplicam de final de outubro até agora na capital Redação

A

s eleições para prefeitos e vereadores aconteceram na capital e em outras cidades do estado com shoppings, academias, clubes, restaurantes, bares, tudo aberto, como se a pandemia já tivesse passado. Nem bem foram fechadas as urnas, a Prefeitura de Curitiba e o governo do estado tiveram de voltar atrás. A Prefeitura decretou a volta da bandeira laranja, com restrições a bares e mudança de horário no fechamento do comércio. Já o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), na terça (1) assinou decreto de toque de recolher no Estado. Essa é a primeira vez, desde o início da pandemia, que o governo do Paraná anuncia tal medida. Para o médico e ex-deputado Doutor Rosinha (PT), é difícil saber se a piora da pandemia na capital e no estado faz parte de uma segunda onda, como na Europa, ou é a mesma desde o começo. “Aqui não entremos nessa onda de baixar e de-

pois voltar uma segunda, como na Europa”, diz. Para ele, o atual momento se deve à falta de políticas públicas na saúde e também em relação a políticas sociais. ”Estados e municípios não fizeram política social, de saúde nem epidemiológica. A irresponsabilidade ou responsabilidade por isso é desses governos”, complementa. Rosinha lembra também que por questões eleitorais não foram feitas medidas de isolamento em Curitiba ou no Paraná. Recorde de contaminação Em três dias, de segunda a quarta desta semana, morreram em Curitiba 46 pessoas por Covid-19. Mais de 3,7 mil pessoas foram contaminadas e, segundo o último boletim divulgado, havia cerca de 13 mil casos ativos, pessoas diagnosticadas e com potencial de repassar a doença. Como comparação, no começo de novembro, no dia 3, eram 3.965 pessoas ativas. No mês da eleição, sem medidas restritivas, o número praticamente triplicou.

NOSSA CURVA SÓ AUMENTA”, DIZ ENFERMEIRA DO HC “A gente não teve aquela diminuição que pudesse caracterizar que saiu da primeira onda, que estabilizou [o número de casos de Covid-19]. Pelo contrário, a nossa curva só aumenta”. Quem diz isso é Juliana Mittelbach, enfermeira do Hospital de Clínicas de Curitiba. Ela foi uma das entrevistadas do programa BdF Onze e Meia, na segunda (30). A fala da enfermeira é baseada em gráficos com dados da Secretaria Municipal de Saúde, que mostram o total acumulado de casos até o dia 16 de novembro. Até então, a cidade

acumulava 77.506 casos. Na avaliação de Mittelbach, “faltou um plano nacional de enfrentamento à Covid-19”. Ela lembra que a cidade de Curitiba, por exemplo, já registrava, desde o início de novembro, aumento de casos confirmados, mas a Prefeitura mascarou a gravidade da situação até passar o período eleitoral. Reprodução

Presos acusados de assassinar liderança do MST em Rio Bonito do Iguaçu Ênio Pasqualin foi sequestrado e morto no dia 24 de outubro Redação

N

a sexta (27), a Polícia Civil de Laranjeiras do Sul concluiu o inquérito sobre o assassinato de Ênio Pasqualin, liderança do MST no Paraná. Três homens, que não tiveram seus nomes divulgados, foram presos. Um acusado de ser o mandante do crime e, outros

dois, os executores. A primeira prisão aconteceu em 20 de novembro, em Chopinzinho. Na quinta (26), ocorreram as outras duas, em Pato Branco e São Marcos (RS). O homem preso no Rio Grande do Sul é apontado como mentor, articulador e contratante do crime. Conforme as investigações, um dos responsáveis pela execução de

Pasqualin tinha dívida de R$ 800 com o mentor, e o crime foi uma forma de saldar o valor. O responsável pela contratação forneceu armas de fogo e levou a dupla até as proximidades da casa da vítima, no Assentamento Ireno Alves dos Santos, em Rio Bonito do Iguaçu. Ênio Pasqualin foi tirado de sua casa e executado com um tiro nas costas.

Conforme a polícia, foi apurado durante a investigação que os dois responsáveis pela execução não conheciam Pasqualin. Já o contratante afirmou que teve um desentendimento com a vítima por conta de um problema com o lote de um familiar. Os presos ficam, agora, à disposição da justiça da Comarca de Laranjeiras do Sul.


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Marcas do racismo: os traumas que ficam

RACISMO E MORTE

Aumento de homicídios de pessoas negras

“Sempre que vejo situações envolvendo racismo, volta tudo o que passei em 2005” Pedro Carrano

W

illian Cezar Martins Cardoso é um trabalhador negro, de 34 anos, dedicado ao trabalho social na associação dos moradores e amigos das Vilas Maria e Uberlândia, no bairro Novo Mundo, periferia de Curitiba. A ajuda ao próximo é um alívio para quem, durante 14 anos, encarou - com apoio de várias pessoas - um processo arrastado, doloroso e de finalização ainda incompleta. Era 2005, Willian tinha só 18 anos. Ele deixava, no começo da manhã, uma balada na Praça Osório, sozinho, quando subitamente ouviu gritos homofóbicos e racistas vindos de um grupo de oito skinheads: “Gays e negros devem morrer”. Avançaram contra ele, que teve o intestino perfurado por uma espécie de punhal, conseguindo ainda reagir e correr por alguns metros até um posto policial na praça. O agrupamento agressor espalhava cartazes pelas ruas e possuía textos, panfletos, discos e bandeiras com apologia ao racismo e ao neonazismo. “A ideologia que seguiam era a de Hitler, pregavam a raça branca. Ainda foram vistos agredindo pessoas na rua ao lado”, conta. Outro jovem homossexual também foi agredido pelo grupo na mesma madrugada, duas horas antes. Esse mesmo rapaz foi assassinado um ano depois. Infelizmente, casos se somam, de violências contra negros e negras, ao lado de LGBTfobia. Há um ano, Thaylanne foi atacada por três homens munidos de pedaço de pau, barra de concreto e facão. A Liga Brasileira de Lésbicas do Paraná organiza campanha de solidariedade devido às consequências e impunidade até hoje das agressões.

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Paraná, 3 a 9 de dezembro de 2020

Traumas Para William, é importante falar sobre o tema e fazer um balanço daquele período, para que agrupamentos, ações e ideologias racistas não se repitam: “Em 2006, fiquei internado em hospital psiquiátrico por 45 dias, abalou mesmo, foi o trauma, na época fiquei tão surtado que queria vingança. Em conversas com a família, percebi o quadro depressivo que eu estava, optamos pelo internamento. Tomo medicação controlada até hoje”, descreve. Júri tardio O júri tardou quatorze anos. Ocorreu apenas em 2019. A denúncia foi oferecida pelo Ministério Público, por meio da Promotoria de Crimes Dolosos Contra a Vida de Curitiba. Enquanto os réus, por sua vez, contavam com advogados e recursos de vulto. A condenação saiu por crimes de racismo, associação criminosa e lesão corporal. As penas variam de um a oito anos de prisão. Ainda assim, o trabalhador acredita que não houve reparação completa. “A tentativa de homicídio caiu para lesão corporal grave (caso do agressor acusado de du-

pla tentativa de homicídio, associação criminosa, racismo e difusão de material ideológico nazista)”, afirma. Agora, tanto os réus como o jovem recorrem da decisão. Racismo ainda hoje Hoje, as redes sociais de Willian têm a palavra de ordem “Vidas Negras Importam”. O episódio recente de agressão e morte de uma pessoa negra no Carrefour, por dois seguranças brancos da transnacional, faz Willian reencontrar a própria vivência. “Sempre que vejo situações envolvendo racismo me volta tudo o que passei em 2005. Revoltante, não interessa a ficha do cara, quem nunca errou? O procedimento do supermercado deveria ter sido diferente”, analisa. Em 2019, Cardoso concluiu os estudos pelo Ensino de Jovens e Adultos (EJA). Pretende agora fazer faculdade de comunicação social e seguir apoiando a população da Vila Maria e Uberlândia. Prudente, antes do fim da tarde, ao fim do trabalho, o jovem sempre chama o Uber: “Desde aquela época não saio mais à noite.” Giorgia Prates

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De 2008 a 2018, o número de homicídios de pessoas negras no país aumentou 11,5%, já entre pessoas não negras caiu 12,9%. O risco de um homem negro ser assassinado é 74% maior e para as mulheres negras a taxa é de 64,4%. Fonte: Atlas da Violência, Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) PUBLICIDADE


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A Curitiba negra dos séculos 19 e 20 Livro resgata histórias, nomes e lugares da presença negra e faz mapa dessas memórias Redação

L

ançado no final de novembro deste ano, “Dos Traços aos Trajetos: a Curitiba Negra entre os séculos XIX e XX” resgata, segundo seus autores, “histórias, nomes e lugares de presença e circulação negra e disponibiliza um mapa a partir dessas memórias.” Segundo as autoras Brenda Santos, Geslline Braga e Larissa Brum, na introdução da obra, o projeto vem sendo gestado há uma década: “Em encontros no salão da Sociedade Operária Beneficente 13 de Maio, sob a Estrela de Salomão. Entre um samba e outro, na ginga da capoeira, ao som do baque dos tambores, as histórias da 13 se desvelaram. A cada descoberta, nas pesquisas lançadas, nos documentos encontrados, nos víamos diante de mais camadas do passado sobrepostas em nosso imaginário. Por meio dos vestígios deixados pelas trajetórias, sem imagens, nos valemos da imaginação como caminho para concluir a montagem.” Outro dos autores, Thiago Hoshino, escreve sobre os ante-

cedentes e o contexto histórico da segunda metade do século XIX, em que mostra que “uma parte significativa da população local era composta por negros e negras e como estas pessoas teceram suas malhas de sociabilidades na cidade nos últimos anos de escravidão.” Já Fer-

nanda Lucas Santiago, no capítulo “O Associativismo Feminino Negro em Curitiba”, destaca a atuação das mulheres na sociedade curitibana. Trabalha com “os Livros Ata e os Estatutos da 13 de Maio, bem como diferentes jornais para a construção e percepção acerca da participação

das mulheres negras na Sociedade 13 de Maio e em outras associações.” O livro tem ainda capítulos como Centro e Arredores, Os Primeiros Sócios da Sociedade 13 De Maio, O Clube 13 De Maio e suas Malhas, Cemitério e Memória, Igrejas e Irmandades. Acervo Ippuc

Grêmio Flor de Maio, anos 1940. S.O.B. 13 de Maio.

Para saber mais sobre a obra acesse https://dostracos.wordpress.com/

DICAS MASTIGADAS

Cuscuz de tapioca Que tempos? Extraem-se lucros até das rachaduras dos tetos de papelão Os abraços caem no vazio do isolamento Espanta-me a barbárie do sistema Não há uma gota de compaixão nas veias da vileza feita de cifras Espanta-me a indiferença nos rastros da tragédia humana A generosidade decolou para além do infinito Espantam-me a passividade e a impotência dos gritos

Os ouvidos dos caixas eletrônicos não sentem o pavor dos dedos A carne é pó exposto aos ventos Não há sequer direito a sepultamento digno O hoje nos tornou números inúteis e inteiros fracionados À beira dos abismos dos descasos Procura-se uma caverna É preciso recomeçar de algum lugar. * Advogado trabalhista, escritor, militante histórico das lutas populares e sindicais

Ingredientes 2 ½ xícaras de leite Terra Viva. 1 xícara de leite de coco. 2 ½ xícara de açúcar orgânico. ½ kg de farinha de tapioca. 250 gramas de coco fresco. 1 colher de chá de sal. Leite condensado a gosto.

Reprodução

Por Claudio Ribeiro*

A cada semana, publicamos receitas com produtos agroecológicos da rede colaborativa Produtos da Terra, da Sinergia Alimentos Saudáveis e da Rede Mandala. Parte dos ingredientes pode ser encontrada no site produtosdaterrapr. com.br

Modo de preparo Aqueça o leite e o leite de coco numa panela, sem deixar ferver. Numa tigela, misture o açúcar, a farinha de tapioca, o coco e o sal. Despeje o leite quente na tigela, misture e transfira para uma fôrma retangular. Deixe descansar até que a tapioca esteja macia (cerca de 1h30). Finalize com coco ralado fresco e leite condensado por cima.


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8 Esportes

De George Best a Maradona

Divulgação

ELAS POR ELA Fernanda Haag

Tão deixando a gente sonhar

Craque irlandês faleceu no mesmo dia de Maradona, há 15 anos, por alcoolismo Júlio César Carignano

P

assou despercebido de parte da mídia o fato de Maradona ter falecido no mesmo dia que o norte-irlândes George Best, um dos maiores jogadores da história e maior ídolo do Manchester United. No dia da morte de Maradona fez 15 anos de sua morte devido aos excessos do alcoolismo. Assim como o argentino, Best também era um “rebelde da bola”. Chegou a ser comparado com Garrincha por dois motivos: a bebida e o drible, sua principal característica em campo. Apelidado de o “Quinto Beatle”, o britânico colecionou polêmicas e frases marcantes como “gastei boa parte do meu dinheiro com bebidas, mulheres e carros rápidos. O resto eu desperdicei”. Há quem diga que foi a grande inspiração de Cantona, outro da linhagem dos geniais/geniosos camisas 7 dos Devils. Além do próprio Maradona, que certa vez citou “somos dois dribladores que criam magia”. Por fim, uma última curiosidade de George Best, essa mais recente. Ele é reverenciado em uma das cenas mais bacanas da sequência de “Trainspotting 2”. Para quem não viu ainda o filme, fica a dica. Save Best! Hasta siempre, Diego!

O futuro se fez presente – parte II Por Cesar Caldas

Não só placares vexaminosos contra times de divisão zero marcaram a ruína futebolística coritibana na gestão Samir Namur, que encerra no dia 12 o fracassado ciclo de seis anos do grupo político instalado no Coritiba em 2014. Ser goleado em casa por Maringá e Foz ou levar de 5 do São Bento são emblemas do naufrágio esportivo da autodenominada “Ala Jovem” – hoje dividida entre as chapas do próprio presidente e de seu semiadversário João Carlos Vialle. Terminar o Estadual no 6º lugar em número de pontos e lanterna do grupo em 2018 foi prenúncio de desastres piores: fez um 10º lugar na Série B e em 2019 foi eliminado pelo Toledo em casa, não chegando à final paranaense. Catástrofe maior, porém, ficou reservada à Copa do Brasil: em seis jogos contra times medíocres, só venceu uma vez. Próprio da incapacidade de vencer Parnahyba e Prudentópolis.

Divulgação

A alegria do Canarinho Pistola dançando após os dois amistosos contra o Equador dão o tom do clima na Seleção Brasileira. A equipe da sueca Pia Sundhage enfrentou as equatorianas na sexta (27) e na terça-feira (1). No placar agregado, ficou 14x0 para as brasileiras, que estão em fase de preparação para as Olimpíadas 2021. Foram os primeiros desafios pós-pandemia e o time já tem mais o padrão esperado pela treinadora: alta intensidade, as linhas mais próximas, marcação alta. Pia aproveitou para experimentar nos dois jogos e testou nomes que ainda não tinham tido chance: Lelê, Camilinha, Giovanna, Julia Bianchi, Valeria, Nycole. No primeiro jogo, a seleção entrou menos concentrada, mas tentando trabalhar mais a bola, fizeram apenas um no primeiro tempo. O Equador, mesmo com uma equipe menos qualificada, segurou e os outros 5 gols saíram mais ao final da segunda etapa. Na partida de terça-feira, o ritmo intenso apareceu logo de cara e Debinha, após assistência de Ludmila, abriu o placar aos 2 minutos de jogo. O time manteve a intensidade e fechou o primeiro tempo com 6 gols. No segundo, com muitas modificações, o rendimento caiu, mas ainda deu para marcar 2 gols.

Última cartada

Queda honrosa

Por Marcio Mittelbach

Por Douglas Gasparin Arruda

Rogério Micale não é mais o técnico do Paraná Clube. Depois de seis jogos, um empate e cinco derrotas, gerando um aproveitamento ridículo de 5,5%, a relação chegou ao fi m de forma natural. Na vigésima rodada, quando Micale assumiu, o time estava na sexta posição, com 28 pontos. Hoje, ocupamos a assombrosa 15ª posição, apenas quatro pontos à frente do Náutico, o primeiro time que figura na zona de rebaixamento. O primeiro passo, que era a demissão, foi dado. Agora é que vem o mais importante. A escolha do próximo treinador do Paraná Clube precisa ser cirúrgica. Não é hora para se pensar em padrão de jogo, tampouco é momento de fazer planejamento a médio e longo prazo. Mais do que um treinador, o Paraná Clube precisa de um gestor de crise. Talvez seja a decisão mais importante da diretoria paranista nos últimos tempos.

O Athletico enfrentou um dos seus maiores desafios da história com uma missão indigesta: superar, com vários desfalques e sem um goleiro reserva, o River Plate, time que foi finalista das últimas duas edições da Libertadores. Tinha tudo para ser um vexame. Mas o que se viu foi um primeiro jogo heroico, de muita superação e que, por pouco, não terminou com uma vitória. O ânimo do time durou até o fim da primeira etapa do jogo de volta, na Argentina. O segundo tempo foi marcado por diversas falhas, o que possibilitou uma avalanche de chances do time argentino. E então o improvável aconteceu: o 3° goleiro, Bento, se mostrou um gigante, em uma das partidas mais incríveis que um goleiro já fez pelo Furacão. Apesar da derrota, sobram motivos para parabenizar o trabalho de superação da equipe.


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