Espaços compartilhados: Coabitação na Av. São João [ TFG FAUUSP]

Page 1

Espaços compartilhados: Coabitação na Av. São João

Bruna Caroline Teixeira



Espaços compartilhados: Coabitação na Av. São João Trabalho Final de Graduação Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU USP) Bruna Caroline Teixeira Orientadora: Profa. Dra. Helena Aparecida Ayoub Silva São Paulo, Julho 2020



“(..) acredito que, ainda que lentamente, o espírito de comunidade acaba se formando, quando pessoas começam a conviver em coletivo.” Tadao Ando. Tadao Ando Arquieto, 2008.



agradecimentos

À Profa. Helena Ayoub, pelas orientações enriquecedoras, pelo apoio e presença constantes, e pelas conversas tranquilizantes durante este semestre. Ao Prof. Francisco Spadoni, pela orientação no primeiro semestre que foi essencial para a realização deste trabalho. Ao Prof. Milton Braga e ao Pablo Hereñú, por concordarem gentilmente em fazer parte da banca examinadora. Aos amigos que tanto me acompanharam e torceram por mim. Aos amigos da FAU, em especial Ana, Maria Alice, Benjamin, Teo, Augusto, Victor e Carol Nossig, pela trajetória conjunta desde o primeiro semestre da graduação, pelo aprendizado coletivo, pelo apoio durante todos esses anos e por tornarem tudo mais leve. Ao Júlio, por todo amor, amizade, força, auxílio e motivação. À minha família, principalmente aos meus pais e minha irmã Mariana, pelo apoio incondicional em todos momentos. Por acreditarem em mim e me incentivarem. Por tudo.


resumo

O trabalho investiga o tema do compartilhamento na habitação coletiva. A coabitação sempre existiu em diversas formas, sejam elas planejadas ou espontâneas. Atualmente se tornam conhecidas diferentes formas de habitação compartilhada, principalmente os colivings que frequentemente são descritos como as “novas formas de morar”. Procura-se entender como o desenho das novas formas de habitações compartilhadas se diferenciam de habitações tradicionais e como o projeto de coabitação pode repensar os espaços da moradia e as relações domésticas pela valorização dos espaços comunitários e o pelo estimulo da sociabilidade entre seus habitantes. Assim, desenvolve-se o estudo da habitação compartilhada por duas frentes: pela pesquisa histórica e contemporânea articulada ao exercício do projeto de um edifício de coabitação de interesse social na

Av. São João, em São Paulo. O terreno de projeto escolhido abriga o antigo Cinespacial, atualmente desativado, o que dá ao projeto de coabitação a oportunidade de expandir seu programa abrigando também lojas, coworking, um equipamento cultural em seu embasamento e a reativação do antigo cinema. Ainda, o trabalho propõe um plano de massa no terreno vizinho ao de projeto, de maneira que se pensa um projeto integrado entre as duas quadras, procurando criar espaços públicos livres de permanência e um programa de usos diversos. Destacam-se projetos de cooperativas habitacionais como grandes referências de projeto pelo caráter permanente desse tipo de coabitação, pela grande diversidade de tipologias habitacionais (compartilhadas ou unifamiliares) e pela criação de vida comunitária estimulada pelos seus espaços comuns.

palavras chaves: coabitação, equipamento cultural, projeto de arquitetura


abstract Shared spaces: cohabitation on São João’s Avenue The project aims to investigate the subject of shared spaces in collective living. Cohabitation has always occurred in several forms, being those either planned or spontaneous. Different ways of living are being built and discussed lately, specially colivings which are often described as the “new way of living”. This research delineates the design’s difference between these new forms of shared living and the single-family home, as well as speculates ways in which a cohabitation project could help rethink the living spaces and the domestic interactions by the valorization of community spaces and the stimulation of social engagement. Therefore, the study concerning shared living is developed through the historic and contemporary research along with the design exercise of a cohabitation social building on São João’s Avenue, in São Paulo. The plot chosen for the project development used to be the former site of the ancient street cinema

Cinespacial, which is currently deactivated. The old cinema is then incorporated into the building’s program, in the addition to a cultural public center with coworking and retail facilities. Furthermore, a mass plan is designed including the plot in the other side of the street, thus creating an integrated project with a mixed program in which public spaces are proposed as more than just passages. The most remarkable references for this project were some cooperative housings, due to their permanent shared living features, as well as for their great diversity of units, both shared and single-family homes, and for the strong communities stimulated by their common areas.

key worlds: cohabitation, cultural center, architecture project



sumário

Introdução

12

1. Coabitar não é algo novo 1.1. Coabitação 1.2. As antigas cooperativas habitacionais inglesas 1.3. As habitações soviéticas e o caso do Narkomfin

16 18 24 26

2. Coabitar hoje 2.1. O potencial da coabitação 2.2. A mercantilização da habitação compartilhada 2.3. Cooperativas habitacionais: outra forma de coabitação

32 34 40 46

3. O lugar 3.1. Proposta de um morar compartilhado em São Paulo 3.2. Contexto urbano 3.3. As quadras de projeto 3.4. Cinespacial

56 58 64 76 80

4. O projeto 4.1. O plano de quadras abertas 4.2. O projeto no Terreno do Cinespacial 4.3. O programa: centro cultural e coabitação 4.4. Conjunto habitacional: partidos

82 84 94 96 98

Considerações Finais

136

Referências Bibliográficas

138

Referências de Projeto

140


introdução

O presente trabalho final de graduação tem como objetivo o estudo e a proposição de uma habitação com espaços compartilhados em São Paulo. O conceito de coabitação é comumente associado às moradias partilhadas temporariamente por um grupo de indivíduos, em que o espaço é compartilhado espontaneamente sem que fosse desenhado para tal finalidade. Contudo, recentemente tornam-se mais debatidos e realizados projetos de coabitação planejada, como as cooperativas habitacionais, os cohousings e os colivings, que apesar de possuírem diferenças consideráveis, propõem uma vida comunitária e normalmente são caracterizados como “novas formas de morar”. Este panorama suscitou a vontade de se aprofundar sobre o tema ao questionar inicialmente como se constituíam tais tipologias habitacionais e se eram realmente uma “nova forma de morar”, o que as motivavam, a que público se direcionavam e se eram moradias permanentes. Essa aproximação inicial procurou especular se o compartilhamento dos espaços na moradia, sobretudo em uma permanente, demandava de fato um novo desenho arquitetônico, ou se uma organização social entre os habitantes já lhe era suficiente. A pesquisa e o projeto

12

de coabitação em São Paulo, aos quais este trabalho se propõe enfrentar, foram também motivadas por um contato prévio em uma disciplina de intercâmbio que abordou o caráter social da coabitação e me apresentou suas potencialidades. O trabalho parte da investigação de que a coabitação não é uma forma de moradia inovadora, mas um antigo conceito incorporado e reinventado em diversas formas ao longo da história em que se optou pela vida em comunidade, fosse por motivos religiosos, sociais, econômicos ou políticos. Nessa perspectiva, o trabalho destaca as habitações experimentais soviéticas na década de 1920 em que o morar compartilhado possuía fortes intenções de transformações sociais, bem como políticas e econômicas. Em seguida, a pesquisa se direciona a coabitação hoje, em que se percebe o compartilhamento da habitação como uma das respostas ao problema da falta de moradia e da especulação imobiliária nas metrópoles. Do mesmo modo, analisa-se as potencialidades da coabitação que além de econômicas, são sobretudo sociais pelo estimulo à sociabilidade e às interações domésticas fora do eixo familiar. Neste contexto, o trabalho reflete sobre duas tipologias de habitação compartilhada: os colivings e as cooperativas habitacionais.


Maquete do edifício Apartamentos de Serviço, Sriracha (Tailândia). Disponível em: < https://kaihoh.jp/news/ project/service-apartment-in-sriracha/>. Acesso em: 2 out. 2019.

13


Maquete do edifício Apartamentos de Serviço, Sriracha (Tailândia).

Disponível em: < https://kaihoh.jp/news/project/service-apartment-in-sriracha/>. Acesso em: 2 out. 2019.

14


Enquanto os primeiros são um produto do mercado direcionados à um público especifico e de caráter temporário, nas cooperativas habitacionais há uma preocupação social, abrigando à baixos custos variados arranjos familiares em uma habitação permanente, em que se cria um significativo potencial de vida comunitária. Por esses motivos, as últimas foram importantes referências ao projeto proposto.

interrogada pela pesquisa e pelo exercício do projeto, no qual o programa se expande ao procurar beneficiar o entorno a sua volta.

A partir desta base teórica, se propõe um projeto de conjunto habitacional de coabitação em São Paulo que estimule novas interações sociais e domésticas entre os habitantes, bem como questione a relação entre a esfera coletiva e privada, no interior das unidades e nas áreas comunitárias. O projeto se insere na Av. São João, próximo ao Elevado João Goulart na Santa Cecília e contempla dois grandes terrenos do qual se executou um plano de massa com a premissa de quadras abertas e um programa integrado. Em um dos terrenos foi desenvolvido o projeto mais aprofundado, onde se localiza o Cinespacial, emblemático cinema de rua hoje desativado. A presença do Cinespacial e a análise do contexto estipularam como programa complementar ao conjunto habitacional, o projeto de um centro cultural integrado ao cinema, que reforce o valor cultural da área e garanta a vitalidade urbana da quadra. Assim, a coabitação é

15



1. Coabitar não é algo novo


1.1. coabitação

Embora a ideia de alguém compartilhar a sua moradia com um indivíduo que não pertença a sua família possa parecer um fenômeno novo, produto unicamente da era da economia compartilhada, o desejo das pessoas de morarem juntas existe desde “tempos imemoriais”, como coloca Je Ahn1, arquiteto e autor da pesquisa Living Closer (Londres, 2018) sobre moradia compartilhada. Segundo Ahn (2019): “A partir da aspiração de Pitágoras de construir uma comunidade estritamente vegetariana na Grécia Antiga até os tempos medievais quando, como sugerem pesquisas, os lares eram espaços de reunião de pequenos grupos que se deslocavam, em vez de unidades familiares, a história está repleta de exemplos de assentamentos baseados na colaboração mútua, que ofereciam modelos de convivência criados em resposta ao desejo de maior segurança e proteção, e de maior liberação espiritual, econômica, e inclusive sexual.” 2

Assim, coabitar, ou seja, compartilhar o espaço da moradia entre indivíduos sem relação familiar, não é um conceito novo, mas um antigo fenômeno que sempre existiu

sobretudo de forma espontânea. No entanto, os modelos de coabitação planejada, nos quais os espaços já são projetados com essa finalidade, também já se apresentaram em diversas formas na história: desde monastérios a comunas. Provavelmente, nos dias de hoje, a forma de coabitação planejada mais conhecida seja a habitação ou alojamento estudantil - moradia concebida para estudantes no período de seus estudos. Ainda que a coabitação seja geralmente associada a uma moradia de jovens solteiros e estudantes, existem formas de habitação compartilhada que englobam famílias e indivíduos de diversas idades, como é o caso dos cohousings e das cooperativas habitacionais. Embora essas moradias tenham ganhado mais notoriedade contemporaneamente, segundo Ahn3, elas não devem ser vistas como novas formas de habitação, uma vez que já no final dos anos 1960 surgiram projetos precursores de vida em comunidade. De fato, foi nessa época que surgiu o conceito de “moradia compartilhada” como reconhecemos atualmente. De acordo com Ahn4, em 1967 um artigo da jornalista dinamarquesa Bordiel Graae defendia que atividades relacionadas ao cuidado das famílias deveriam ser compartilhadas. Tal artigo inspirou um grupo

AHN, Je; TUSINSKI, Olivia; TREGER, Chloe. Viver mais perto no passado. Revista PLOT, Mundos Compartilhados, Redefinir os limites da habitabilidade, São Paulo, n 50, p. 152, set/out.2019. 2 Ibid. p. 153 3 Ibid. p. 154 1

18


Conjunto Sættedammen, Hillerød (Dinamarca):Espaço verde central para lazer e jogos. As refeições comunitárias ocorrem em media de duas a três vezes por semana, e cada mês uma família é a responsável pela limpeza e pela preparação das refeições.5

Disponível em: < https://blog.jubilares.es/2019/07/23/del-primer-cohousing-en-dinamarca-a-la-lucha-contra-el-aislamiento-social-en-massachussets-ejemplosinternacionales-xvi/>. Acesso em: 17 maio 2020.

4 5

Ibid. p. 155. Ibid. p. 159. 19


de cinquenta famílias a organizarem, entre 1969 e 1972, a comunidade de habitação compartilhada Sættedammen, na cidade de Hillerød, em uma região semiurbana próxima de Copenhague, Dinamarca. O objetivo principal era de criar seus filhos em uma comunidade familiar em que se compartilhasse os recursos do lar no cuidado das crianças. O conjunto Sættedammen do arquiteto Theo Bjerg, foi considerado o primeiro cohousing do mundo e se compõe de 27 unidades privadas moduladas organizadas em duas fileiras, criando um pátio central verde e comunitário. O projeto introduz a casa comum, um elemento com a finalidade de abrigar espaços coletivos como a cozinha com refeitório para refeições comunitárias, lavanderia e sala de jogos. A organização espacial e o programa do Sættedammen inspiraram o desenvolvimento de outras comunidades de cohousing ainda no século XX na própria Dinamarca, em outros países europeus em que havia uma escassez de oferta de moradias economicamente viáveis e nos Estados Unidos. Do cohousing surgiram variações urbanas do morar compartilhado moderno, como os colivings e as cooperativas habitacionais. Estes dois modelos serão aprofundados neste trabalho ao longo do segundo capitulo (ver p. 40 e 46), mas é necessário já pontuar

6

20

a diferença básica entre eles: o coliving é um modelo de coabitação coorporativo como um serviço do mercado, enquanto a cooperativa habitacional possui um caráter social, geralmente administrada pelos próprios moradores que participam também da concepção do projeto. Portanto ambas são moradias compartilhadas, mas que atuam de formas distintas. O coliving representa um estilo de vida cosmopolita e é pensado para um público específico que aceita morar temporariamente por um custo de vida mais alto do que a média pela contrapartida das comodidades, da oportunidade de conhecer novas pessoas e pela localização estratégica em metrópoles. Enquanto nas cooperativas habitacionais um grupo de famílias e indivíduos colabora para gerir uma habitação compartilhada de menor custo e de caráter permanente, na qual compartilham tarefas do dia-a-dia em espaços comuns, como também se auxiliam no cuidado de idosos e crianças, criando relações comunitárias muito potentes.6 Antes de investigar a habitação compartilhada no contexto contemporâneo, entendendo suas potencialidades e seus desafios, cabe analisar brevemente casos históricos de compartilhamento de espaços na habitação que antecederam os modos de coabitar como entendemos hoje. Entre tantos casos históricos de compartilhamento de espaços em diferentes

MEDINA Florencia; KOMMERS WENDER, Rodrigo. op. cit., p. 1 e 2.


The Collective Old Oak, Londres (Reino Unido): Jovens trabalhando em um dos vários espaços de convivência do coliving.

Disponível em: < : https:// www.plparchitecture.com/ the-collective-old-oak.html>. Acesso em: 25 ago. 2019.

La Borda, Barcelona (Espanha):Refeição conjunta dos moradores em espaço comunitário da cooperativa habitacional.

Disponível em: < : https:// www.world-habitat.org/worldhabitat-awards/winners-andfinalists/la-borda/>. Acesso em: 17 maio 2020

21


La Borda, Barcelona (Espanha): O conjunto foi fruto de um processo de construção participativo entre os arquitetos do escritório Lacol e os futuros moradores, que hoje autogerem o edifício.

Disponível em: < https://xximagazine.com/c/new-forms-of-conviviality>. Acesso em 17 maio 2020.

22


níveis de cooperação e criação de vida doméstica comunitária, o presente trabalhou estudou os dois casos históricos analisados na tese de mestrado “Domestic Conflits. Forms of living in metropolitan London” (2017), de Ilias Oikonomakis, da Architectural Association Graduate School em Londres, Reino Unido. A escolha das cooperativas habitacionais inglesas no fim do século XIX e das habitações experimentais soviéticas como casos por Oikonomakis baseia-se no conceito de que o compartilhamento de moradias espontâneo e acidental é distinto da coabitação planejada. Em ambas habitações estudadas há o planejamento de espaços compartilhados na habitação coletiva, de maneira, entre outros motivos, a responder à problemas causados pelo compartilhamento espontâneo, como a superlotação da moradia. No primeiro caso o compartilhamento de espaços será limitado à cooperação de serviços, enquanto no segundo os edifícios habitacionais serão de fato comunais.

23


1.2. as antigas cooperativas habitacionais inglesas

Em sua tese de mestrado, Oikonomakis analisa algumas cooperativas habitacionais projetadas ou construídas entre 1840-1920 na Inglaterra, em que houve casos de compartilhamento de espaços especificos dos edifícios, como o salão de jantar. Nesses exemplares buscavase resolver o problema da superlotação da moradia e diminuir o custo da habitação pela coletivização de instalações e serviços. Segundo o autor, a classe trabalhadora vivia em deploráveis situações de moradia no Reino Unido. Cortiços estavam congestionados, com 12 a 14 pessoas compartilhando um único quarto, sem condições adequadas de salubridade, privacidade e qualidade de vida. Esse compartilhamento forçado ocorreu devido razões econômicas: “A afixação econômica da classe trabalhadora, sua inabilidade em competir no mercado imobiliário e a falta de vontade do governo em resolver problemas urbanos devido ao princípio não intervencionista. “ 7 É nesse período que a questão da moradia se torna um debate, devido a uma grande influência de projetos utópicos socialistas. Apesar dessa influência, projetos com formas comunais de habitação não foram considerados. Em seu lugar, optou-se por uma solução menos radical: a criação de habitações com cooperação em serviços

domésticos. Nesse contexto, os arquitetos pensaram em novas tipologias que garantiriam uma habitação de menor custo e com melhor qualidade de vida, através da criação de serviços e espaços comuns centralizados. Assim, a habitação individual prevalece, mas os espaços coletivos da casa como a sala de jantar tornam-se espaços comunitários.8 Antes de 1925, quinze cooperativas habitacionais foram construídas na Inglaterra. Paradoxalmente, esses projetos tiveram como público alvo apenas a classe média, devido ao investimento privado. As interações entre famílias dificilmente ocorriam, pois eram majoritariamente os empregados que circulavam e ocupavam as áreas comunitárias, de forma que cada família mantinha a privacidade da casa. A ideia não era a socialização entre famílias, mas a redução dos custos dos serviços pela centralização de instalações e pela subsequente redução do número de empregados. Para o autor, a força da instituição da família e do individualismo na época Vitoriana eram barreiras para a expansão desse modelo de moradia. 9 Ainda, essa forte ligação entre a casa e a família estipulava uma separação muito clara entre espaços privados e coletivos, de forma que pretendia-se minimizar a sensação dos moradores de viverem em uma habitação

OIKONOMAKIS, Ilias. Domestic Conflicts. Forms of living in metropolitan London. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Desenho Urbano) - AA Projective Cities, Architectural Association Graduate School. Londres, Junho/2017. p. 41e 43. Disponível em: < https://issuu.com/projective/docs/domestic_conflicts >. Acesso em: 4 set. 2019. 8 Ibid. p. 43 e 46. 9 Ibid. p. 46 7

24


coletiva, e criar a impressão oposta, ou seja, de que as unidades eram habitações independentes, como casas. Para tanto a estratégia na organização espacial dos edifícios era de locar as unidades habitacionais distantes dos espaços de convívio e fazer uma circulação, geralmente externa, que não estimulasse o encontro e convivência dos habitantes, mas sim a evitasse.10 Em todas as habitações analisadas por Oikonomakis, a cozinha e a sala de jantar são os únicos espaços coletivos. A Cooperative House for Mrs. E. M. King, (1874), de Edward Goodwin (ver a planta abaixo) é a única exceção. O programa da habitação são unidades com quartos, banheiro e sala de estar, e os espaços coletivos abrangem cozinha, sala de jantar, uma sala de recreação e uma sala

de aula para crianças. O projeto foi pensado para 100 adultos e 200 crianças, e foi o único com uma expansão da coletivização através da cooperação para o cuidado das crianças.11 Assim, pode-se afirmar que as cooperativas habitacionais foram utilizadas como um instrumento econômico para reduzir os custos da habitação através da centralização de espaços e da cooperação de serviços. Porém, as experimentações habitacionais não prosseguiram, pela falta de recursos financeiros e pela força da ideia de que a habitação familiar deve ser um espaço inteiramente privado. Assim, o potencial que as cooperativas habitacionais tinham de institucionalizar uma habitação compartilhada formal e planejada, não foi concretizado. Finalmente, ele o seria nas habitações coletivas soviéticas.

Cooperative House for Mrs. E. M. King. Inglaterra: Planta do térreo com sete apartamentos e o salão de jantar.

Disponível em: < https://issuu.com/projective/docs/domestic_conflicts >. Acesso em: 4 set. 2019

10 11

Ibid. p. 50 Ibid. p. 48 e 50. 25


1.3. as habitações soviéticas e o caso do narkomfin

Além das cooperativas habitacionais inglesas, Oikonomakis analisa em sua tese as habitações comunais na URSS e o pensamento político e social que as regeu. O presente trabalho estudou principalmente qual era esse pensamento e suas consequências espaciais, e selecionou o edifício de habitação comunal Narkomfin (1928-30) como estudo de caso. O livro “Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa” de Anatole Kopp (1988) foi também uma importante fonte para esse estudo. De acordo com Oikonomakis, devido a Primeira Guerra Mundial e a Guerra Civil da URSS o governo revolucionário tinha que lidar com graves problemas econômicos e de produção, que geraram um enorme número de desempregados, enquanto ainda os habitantes viviam em péssimas condições na área rural e também urbana. As condições de vida começam a melhorar devido a Nova Política Econômica depois de 1925 e indústrias se instalam nas periferias das cidades, promovendo o êxodo rural em direção às cidades industriais. Contudo, esse aumento populacional das cidades resulta na falta de moradia e por consequência leva ao compartilhamento das habitações e à superlotação. 12 A falta de moradia era considerada um problema econômico e social, no qual via-se a oportunidade de transformação do modo de

vida em direção a uma sociedade socialista, pela construção de um morar comunal, com uma vida doméstica coletivizada. Para Kopp13, a arquitetura soviética dos anos 1920 terá como objetivo criar as condições de vida para o projeto socialista da Revolução de 1917, de maneira que a arquitetura se apresenta como um importante instrumento social e político para tal feito, estimulando as pesquisas arquitetônicas a contribuir para a edificação dessa sociedade. O novo modo de vida, do qual as habitações comunais deveriam ser intermediárias, era de fato uma mudança total de hábitos tanto de trabalho como outros cotidianos. Entre os diversos preceitos destacam-se a sobreposição do coletivo em detrimento do individual e a oposição à instituição da família. Esta era uma célula econômica e individualista do sistema capitalista, e assim como ele fora substituído pelo socialismo, a família deveria ser substituída por novas relações coletivas. Pregava-se, portanto, que na sociedade socialista, com a dissolução da família, as crianças seriam filhas da sociedade, que delas se ocuparia. 14 Os primeiros esforços de vida comunal foram comunas espontâneas que compartilhavam apartamentos burgueses e que em diferentes escalas, coletivizavam o modo de vida. Assim, além do compartilhamento de espaços havia também o de tarefas domésticas e de

OIKONOMAKIS, Ilias. Op. cit., p. 63 e 67. KOPP, Anatole. Quand le moderne n’ était pas un style mais une cause. Paris: Ecole nationale supérieure des beaux-arts, 1988. p. 84 14 Ibid. p. 85, 95 e 100. 15 Ibid. p. 103 - 107 12 13

26


rotinas (como refeições em conjunto). Um dos objetivos da coletivização é dar aos habitantes o tempo livre para desenvolver-se intelectualmente, profissionalmente e ainda fisicamente. As comunas eram consideradas como uma pré configuração da estrutura da sociedade socialista, sendo uma referência aos arquitetos construtivistas, que pensavam as habitações comunais a partir dessas experiências espontâneas. Cabe comentar que as comunas surgiram, antes de tudo, pelas péssimas condições de moradia da época.15 Nesse contexto, as pesquisas por novas tipologias habitacionais separam a habitação em dois domínios fundamentais: a célula de habitação privada e os espaços comunais. A inovação tipológica consiste na transferência de espaços e atividades domésticas do espaço privado para o comunal, de forma que a célula de habitação tem seu tamanho reduzido para o dormir, repousar e para o trabalho individual.16 O mais importante é que os espaços privados e comunais funcionam por interdependência, ou seja, são indissociáveis. Assim, o centro de gravidade da habitação passa do espaço privado das unidades, para os espaços comunais. 17 Ainda sobre tais habitações comunais, a ideia estruturante é que fossem condensadores sociais, ou seja, deveriam ser edifícios capazes

de integrar os habitantes ao novo modo de vida, de modo a diminuir o individual em prol do coletivo. 18 Para Kopp, o exemplo de maior sucesso de habitação comunal foi o Narkonfim (1928-30) de Moisei Ginzburg e Ignaty Millins. O projeto era uma preparação, uma transição ao novo modo de vida, de forma que não empunha a coletivização, mas a encorajava. No Narkonfim haviam unidades destinadas a famílias (como a unidade K), logo ainda era possível o viver na esfera doméstica familiar, e todas as tipologias de unidades eram equipadas com uma pequena cozinha. Dessa maneira, ao mesmo tempo em que se estimulava o uso da grande cozinha comunal, esse uso não era imposto, visto que cada unidade tinha sua pequena cozinha, respeitando momentos da esfera íntima.19 Para Oikonomakis 20, a diminuição gradual de espaços privados tinha exatamente a intenção de transferir as atividades domésticas ao coletivo. A ideia era de que os espaços privados e coletivos se complementassem. Dessa forma, espaços comunais tornam-se mais complexos, possuindo maior diversidade de funções e serviços. No Narkomfin, buscavase o equilíbrio entre o individual, o familiar e o comunal. O Narkomfin foi uma experiência da pesquisa “The Stroikom Units”, em que um grupo de

Ibid. p. 110. OIKONOMAKIS, Ilias. op. cit., p. 70. 18 KOPP, Anatole. Op. cit., p. 113. 19 Ibid. p. 114. 20 OIKONOMAKIS, Ilias, op. cit., p. 78. 16 17

27


unidade mínima | F unidade F2 unidade maior | K espaços comunais

Narkomfin, Moscou (URSS):De baixo para cima: térreo, primeiro, terceiro, quarto e quinto pavimento. Os dois primeiros pavimentos possuíam os apartamentos duplex de tipologia K com três dormitórios, enquanto os três últimos possuíam apartamentos de tipologia F, considerado a unidade mínima para uma família. Outro bloco continha as áreas comunais como cozinha, biblioteca, ginásio e creche, conectados por uma passarela ao bloco de habitação.21 Disponível em: < https://www.architectural-review. com/essays/making-sense-of-narkomfin/10023939. article >. Acesso em: 4 set. 2019. Edição da autora.

21

28

CURTIS, WIlliam. Arquitetura moderna desde 1900. Porto Alegre: Bookman, 1996. p. 209


arquitetos, incluindo Ginsburg, fazia parte. Preocupava-se com a célula de habitação e seus padrões mínimos funcionais, que poderiam ser reproduzidos em massa22, e também em como projeta-la evitando o compartilhamento e a subsequente superpopulação. Como se percebe no Narkomfin, o The Stroikom Units possuía a ideia de que as pessoas deveriam ter uma vida doméstica compartilhada porque assim desejam, e não porque são obrigadas a compartilhar, por viverem em uma habitação mínima. O compartilhamento era entendido como processo a ser estimulado pelos arquitetos, e jamais imposto, sendo o Narkomfin, de fato, um exemplo da arquitetura como ferramenta para a transição do novo modo de vida. 23 Em contraposição ao Narkomfin, houve projetos de menos sucesso, devido a uma transição imediata ao novo modo de viver, adotando totalmente a vida comunitária e diluindo a família pela criação de unidades que separavam pais e filhos, como a Casa Comunal do Instituto Têxtil (1930) de Ivan Nikolaev, em Moscou. O edifício é um exemplo de experiência extrema de coletivização que restringiu drasticamente a privacidade dos habitantes. A célula era um quarto com espaço para um ou dois indivíduos apenas, enquanto os espaços comunais eram gigantescos e abrigavam todas atividades da vida doméstica, a exceção do dormir. Ainda não havia espaços

intermediários para a esfera familiar. Para Oikonomakis, os projetos comunais com tais características levaram o coletivo ao extremo e de forma abrupta, em um contexto em que a mentalidade política e social dos indivíduos não estava preparada para tanto. 24 Ao comparar a questão da esfera íntima dos dois edifícios comunais, no Narkonfim as células habitacionais ainda possuem atividades domésticas, que devem, gradualmente, ser transferidas ao espaço comunal, enquanto que na Casa Comunal do Instituto Têxtil os espaços privados são destinados apenas ao descanso e à reprodução. Entende-se que no Narkonfim há uma transição gradual de tarefas entre as duas esferas e um conceito de espaços domésticos privado e coletivo que se sobrepõem. Em ambos os projetos, o corredor funciona como importante espaço de transição entre os domínios privados e comunais. 25 Tal estratégia é ainda hoje utilizada por diversos edifícios de coabitação, assim como o conceito de sobreposição das esferas privadas e coletivas no espaço doméstico, que será abordado no próximo capítulo. Por fim, além de ser ferramenta política e social, a habitação comunal era também viável economicamente. A redução de custos ocorria pela centralização de instalações, como foi feito nas habitações cooperativas inglesas,

Ibid. p. 209. OIKONOMAKIS, Ilias. op. cit., p. 79 e 84. 24 Ibid. p. 84 e 94. 25 Ibid. p. 94 22 23

29


pela coletivização do trabalho doméstico e pela diminuição do custo da construção com células de habitação estandardizadas, funcionais e com elementos pré-fabricados. 26 As habitações comunais, com suas tipologias inovadoras, foram uma resposta à intersecção de fatores sociais, políticos e econômicos que, em conjunto, demandaram uma radical transformação na forma de morar.

26 27

30

Ibid. p. 96 CURTIS, William. op. cit., p. 209


Narkomfin, Moscou (URSS): Os corredores externos possuiam uma função simbólica de expressar as aspirações comuns dos habitantes.27

Foto: Robert Byron. Disponível em: < hthttp://socks-studio. com/2016/12/04/thenarkomfin-building-in-moscow1928-29-a-built-experiment-oneveryday-life/>. Acesso em: 11 nov. 2019.

Casa Comunal do Instituto Têxtil, Moscou (URSS): Bloco de espaços comunais do conjunto habitacional. Disponível em: < : https:// thecharnelhouse.org/tag/ communal-house - of-the textile-institute/>. Acesso em: 27 mar. 2020.

31



2. Coabitar hoje


2.1. o potencial da coabitação

O compartilhamento de espaços entre diferentes indivíduos em uma mesma unidade habitacional é comumente associado às “repúblicas”, portanto, uma habitação compartilhada entre estudantes ou pessoas jovens. Contudo, nos últimos anos, o compartilhamento na habitação tem se expandido para outros públicos, como nota o jornalista britânico Owen Hatherley:

“Por alguma razão, ainda é considerado senso comum que para as habitações, independente de sua qualidade, devem ser mais privativas possível. (...). Ao mesmo tempo, há a suposição de que cada unidade individual, não importa o quão de má qualidade, é inviolável. Mas na prática, principalmente em grandes cidades, a habitação é coletiva por acidente.“28

No artigo, Hatherley argumenta que a crise econômica na Inglaterra estimulou pessoas com mais de 30 anos, portanto que não se enquadram majoritariamente como estudantes, a também compartilharem unidades habitacionais e problematiza que geralmente os apartamentos compartilhados não foram projetados para tal organização. Dessa forma, o autor questiona se uma solução para a crise imobiliária no Reino Unido não

seria a coabitação pensada desde o princípio para o compartilhamento de áreas até então privativas. Destaca-se que a crise de habitação não se limita a este país, mas é uma questão global e ainda mais preocupante nos países em desenvolvimento. Segundo a ONU, em 2030 a população mundial haverá crescido em 1.1 bilhão de pessoas, de forma mais concentrada demograficamente na Ásia e África.29 Para Oikonomakis30 , a coabitação é fundamentalmente uma resposta das metrópoles ao alto preço dos imóveis. Assim, devido a especulação imobiliária que torna os preços nos centros urbanos inviáveis à maioria da população, a coabitação é uma opção para tornar o aluguel desses imóveis acessível. Além da crise habitacional vivenciada em diversos países, o contexto de auge da economia colaborativa também influi no aumento da coabitação, uma vez que a ideia de compartilhar bens e espaços tornou-se também possível de ser aplicada na moradia, o que ajudou com que a coabitação fosse mais discutida, ganhasse outros formatos e fosse impulsionada para outras classes sociais.31 Ainda, principalmente aos jovens, vê-se uma oportunidade de socialização na coabitação em reposta a individualidade e alienação das metrópoles. O autor conclui que a opção pela coabitação ocorre prioritariamente por

HATHERLEY, Owen. Communal Living – forget stereotypes, it could solve the UK’s housing crisis. The Guardian, 30/10/12. Tradução nossa. Disponível em: < https://www.theguardian.com/commentisfree/2012/oct/30/communal-living-answer-uk-housing-crisis >. Acesso em: 4 set. 2019 29 MEDINA Florencia; KOMMERS WENDER, Rodrigo. op. cit., p. 3. 30 OIKONOMAKIS, Ilias. op. cit., p. 27 -28. 31 MEDINA Florencia; KOMMERS WENDER, Rodrigo. op. cit., p. 1 32 OIKONOMAKIS, Ilias. op. cit., p. 27 -28. 28

34


necessidade econômicas, mas que para pessoas com melhores condições financeiras, o fator da sociabilidade pesa mais na decisão por esse tipo habitação.32 De fato, essa conclusão de Oikonomakis é comprovada pela pesquisa do projeto One Shared House 203033 sobre possibilidades de habitação compartilhada até 2030. O site do projeto promoveu uma enquete quanto a diversas questões do tema, e em resposta aos principais motivos pelos quais as pessoas optariam pela coabitação, os resultados foram pela oportunidade de socialização e pelo compartilhamento de custos. Nesse contexto, a coabitação tem um grande potencial do ponto de vista da sociabilidade e de promover uma boa saúde mental aos seus moradores. Segundo o arquiteto e pesquisador Itai Palti, do Centre for Urban Design and Mental Health (UD/MH), habitações compartilhadas tem o potencial de criar importantes laços entre seus habitantes, diminuindo a chance de solidão e, portanto, melhorando suas saúdes mentais. Ainda, para Grace Kim, fundadora do escritório de arquitetura Schemata Workshop e moradora do Capitol Hill Urban Cohousing em Seattle, a socialização e a criação de um senso de comunidade em coabitações ocorre principalmente nas refeições comunais e nos momentos de trabalho coletivo. Contudo, um projeto de habitação compartilhada que restringe a privacidade do indivíduo

e a utilização de espaços para seu uso individual pode causar estresse, afetando negativamente o bem-estar dos habitantes.34 Cabe destacar que o medo da falta de privacidade é a principal preocupação das pessoas quanto a coabitação, de acordo com a enquete do One Shared House 2030.35 Tal fato demonstra a importância de um projeto adequado para coabitação, mesmo que ela já ocorra espontaneamente. Normalmente, a moradia compartilhada ocorre em apartamentos já existentes projetados para famílias, e, portanto, pensados a partir das relações hierárquicas existentes na estrutura social da família tradicional. Assim, há uma discordância entre a maneira de viver na coabitação e a tipologia da unidade habitacional pensada para a família, sendo esta a tipologia dominante oferecida nos empreendimentos nas cidades.36 Essa constatação também é importante se pensarmos que o modelo tradicional familiar para qual majoritariamente se projeta tem diminuído sua demanda. De acordo com o arquiteto suíço Yves Dreier 37, a maior parte dos incorporadores constroem pensando no modelo tradicional familiar – pai, mãe e dois filhos -, porém atualmente a demanda por esse tipo de habitação é de apenas 30%. Embora a fala do arquiteto seja referente à Suíça,

ONE SHARED HOUSE 2030. Disponível em: < http://onesharedhouse2030.com/results/ >. Acesso em: 25 abr. 2020. SPACE 10. Can shared living improve our mental healh and wellbeing?. Medium, 17/05/2018. Disponível em: < https://medium.com/space10/can-shared-living-improve-our-mental-health-and-wellbeing-ff5498b02d4a >. Acesso em 31 out. 2019. 35 ONE SHARED HOUSE 2030. op. cit. 36 OIKONOMAKIS, Ilias. op. cit., p. 27 -28. 37 GAITSH, Sophie. L’habitat du futur sera partagé. Le Temps, 01/12/2015. Disponível em: < https://www.letemps.ch/ lifestyle/lhabitat-futur-sera-partage >. Acesso em: 10 set. 2019. 33 34

35


sabe-se que no Brasil também a constituição das famílias está muito longe de se restringir a um único modelo, mas assim a diversos, como por exemplo: avós que moram com os filhos e netos, mães solteiras ou divorciadas que moram com os filhos, adultos que moram sozinhos, grupos de amigos que moram juntos, etc. Dessa forma, é importante que hajam moradias que contemplem os diversos tipos de arranjos existentes. Nesse contexto, o autor alemão Niklas Maak no livro “Living Complex” (2015) critica o modelo tradicional de moradia vigente e investiga novas formas de morar em comunidade. De acordo com Maak, a indústria civil e as políticas urbanas são limitantes para o desenvolvimento do pensamento de um morar diferente. Maak destaca que é importante pensar novas formas de moradia, devido a crescente demanda, e que tais moradias possam dar mais liberdade à moradores que querem ou precisam de um modelo fora do tradicional. Assim, essa moradia não deve ser vista como uma norma, mas como um tipo de habitação.38 Ainda, ao citar o manifesto “Community Area Model” do arquiteto japonês Riken Yamamoto, Maak chama atenção para o fato de que as unidades tradicionais muitas vezes não permitem a flexibilização das famílias, e que a construção majoritária dessas unidades trata outros arranjos familiares ou de indivíduos

que moram juntos sem relação familiar, como apenas exceções.39 Sobre o compartilhamento de espaços em tipologias unifamiliares, Oikonomakis analisa a ocupação do espaço e a organização social entre os habitantes. Para ele, a clara distinção entre espaços comuns e espaços privados na habitação é o que permite a coabitação na unidade tradicional, sendo os espaços comuns o momento de conexão entre a vida dos indivíduos. Ainda, o autor aponta que a coabitação espontânea é primeiramente um acordo social entre os indivíduos para uma boa convivência e uso do espaço, de forma que há uma separação entre a vida privada dos indivíduos e a vida doméstica da habitação. Esses acordos informais de convivência na coabitação mostram o seu potencial, uma vez que se criam novas interações no espaço doméstico, principalmente em relação a cooperação para as atividades domésticas. A expansão da coabitação evidencia esse potencial: as pessoas estão aceitando, mesmo que sobretudo por motivos econômicos, compartilhar espaços e criar novas relações de moradia fora das relações familiares. De acordo com Oikonomakis, o compartilhamento da habitação potencializa transformações no modo de viver e nas interações entre as pessoas, assim cria-se um

MAAK, Niklas. Living Complex – From Zombie City to the New Communal. Munique: Hirmer, 2015. p. 13-26. Ibid. p. 137. 40 OIKONOMAKIS, Ilias. op. cit., p. 28 e 32 38 39

36


Apartamentos Yokohama, Kanagawa (Japão): Quatro estúdios para artistas são unidos por um quintal compartilhado que além de ser uma extensão dos espaços privados, também acolhe exposições. Foto: Koichi Torimura. Disponível em: < https://www. archdaily.com/303401/yokohama-apartment-ondesign-partners>. Acesso em: 13 jul. 2020.

37


La Borda, Barcelona (Espanha): Espaço comunitário central em pé-direito duplo da cooperativa habitacional. Foto: Luc Miralles. Disponível em: < https://www.archdaily.com/922184/la-borda-lacol>. Acesso em: 14 abril 2020.

38


novo espaço doméstico com uma diferente forma de morar. 40 Por fim, destaca-se que a habitação compartilhada pode possuir distintos nuances de compartilhamento: em uma moradia comunal, a vida em comunidade sobressai a individual, de sorte que a comunidade divide todas as tarefas e tem sua própria rotina coletiva, ou seja, a comunidade possui uma única vida doméstica, a comunal. Enquanto, por exemplo, em uma moradia de cooperativa habitacional as atividades domésticas são compartilhadas em alguns aspectos como o cozinhar e fazer refeições conjuntas, de forma que a as vidas domesticas individuais dos habitantes se intersecionam em algumas atividades, logo, não há necessariamente uma vida doméstica coletiva. De qualquer forma, essas organizações sociais de coabitação demandam tipologias habitacionais arquitetônicas projetadas para acolhê-las.41

e aprimorando da saúde mental dos indivíduos -, como também econômico – possibilitando a moradia a menor custo em regiões de localização privilegiada e como um dos instrumentos de resposta a crise habitacional. .

Assim, como inicialmente questionado por Hatherley, o compartilhamento na habitação necessita de fato de tipologias habitacionais projetadas para esse fim e que possam acolher e estimular as relações domésticas e de sociabilidade além das familiares, sem que a privacidade dos habitantes seja ameaçada. Desta maneira, a coabitação pode realizar seu potencial social – criando laços em comunidade

41

Ibid. p. 35-38. 39


2.2. a mercantilização da habitação compartilhada

Ao abordar habitação compartilhada, frequentemente pensa-se em colivings. A incorporada The Collective, uma das pioneiras no ramo, define colivings como: “Coliving é uma nova forma de viver inspirada no antigo, com experiências coletivas e em comunidade como sua base. Começando com o básico, oferece espaços compartilhados como bares, restaurantes, academias, bibliotecas, lavanderias, terraços na cobertura, mesas de trabalho e mais. Usando os espaços para juntar as pessoas, estamos criando ambientes colaborativos e inspiradores que possam expor seus membros a novas pessoas, novas ideias e novas experiências. “42

Como na fala acima, frequentemente os colivings são apresentados como “o novo modo de morar” tanto pelos incorporadores e arquitetos desses edifícios, como pela mídia leiga e especializada. Como já visto, o morar coletivo não é algo novo, mas é atualmente resignificado, tornando-se um produto do mercado e da especulação imobiliária. Segundo o arquiteto e professor da Universidade de Westminster (Londres), Matthew Stewart, o “novo modo de morar”

é na verdade um antigo modo de morar mercantilizado e os projetos de colivings: “(...) não são propostas antagonistas nem as causas originais das habitações compartilhadas nem a cultura de alienação das metrópoles, mas uma extensão dela. “ 43

Para Oikonomakis, os colivings também são uma afirmação e representação da alienação das metrópoles, além de um produto do mercado. Por esse motivo, os colivings ao utilizarem termos como “coletivo” e “comunal” estão suprimindo seus significados originais, que tinham um caráter político de transformação social radical e transformação da vida doméstica, como nas habitações experimentais soviéticas dos anos 1920. 44 Um caráter dessa mercantilização da habitação compartilhada é apontado por Stewart: há um recorte de idade e de classe para com os quais os colivings são geralmente direcionados, de forma que os projetos tratam da habitação compartilhada como um estilo de vida, e não como uma reação à problemas econômicos e sociais. Os projetos atuais de coliving, tem como público alvo os jovens

“Co-living is a new way of living inspired by the old, with community and collective experiences at its core. Starting with the basics, it offers shared spaces such as bars, restaurants, gyms, libraries, laundry, roof terraces, hot desks and more. Using space to bring everyone together, we are creating collaborative and inspiring environments that expose members to new people, new ideas and new experiences.” THE COLLECTIVE. Tradução nossa. Disponível em: < https://www.thecollective.com/faqs >. Acesso em: 01 nov. 2019 43 “Such projects are not an antagonist proposal either to the root causes of housesharing nor to the alienated metropolitan culture but rather an extension of it.” STEWART, Matthew. The Collective is Not a New Way of Living – It’s an Old One, Commodified. Failed Architecture, 2/12/2016. Tradução nossa. Disponível em: < https://failedarchitecture.com/the-collective-is-not-a-new-way-of-living-its-an-old-one-commodified/ >. Acesso em: 31 out. 2019 44 OIKONOMAKIS, Ilias. op. cit., p. 108 42

40


The Collective Old Oak, Londres (Reino Unido): Coliving projetado pela PLP Architecture encomendado pelo The Collective.

Disponível em: < https://www. plparchitecture.com/the-collective-old-oak. html >. Acesso em: 20 ago. 2019.

Kasa 99, São Paulo: Foi projetado por Itamar Berezin com projeto gráfico de Nitsche Arquitetos. É considerado o primeiro coliving do Brasil.

Foto: Pedro Mascaro. Disponível em: < https://www.archdaily.com.br/br/895365/ desconstrucao-civil-nitsche >. Acesso em: 24 set. 2019.

41


(solteiros) e são justificados a partir de um discurso generalista sobre os jovens quererem flexibilidade, conveniência e valorizarem experiências no lugar de posses materiais. 45 No Brasil, os projetos de colivings seguem o mesmo perfil de morador, com um recorte de classe bem definido: jovens adultos de até 35 anos, solteiros ou divorciados de classe média-alta, e que priorizem a localização e a praticidade. Esse nicho parece ter interessado as imobiliárias brasileiras, que começaram a investir em colivings – ou edifícios que se dizem ser- no país: segundo a plataforma VivaReal, em 2017 mais de 190 construtoras investiam nesse tipo de edifício, até mesmo as mais tradicionais como Brookfield e Gafisa.46 Nesse cenário, destaca-se o Kasa 99, construído entre 2016 e 2018, na Vila Olímpia, em São Paulo. O Kasa 99 se apresenta como o primeiro coliving do Brasil pela sua incorporadora, o Grupo Gamaro, e o projeto segue o modeo de colivings internacionais.47 Essa desarticulação entre a ideia inicial das habitações compartilhadas serem habitações acessíveis economicamente, portanto destinadas as classes mais baixas, e a construção de colivings destinadas para a classe média-alta, trás limitações na própria ideia de compartilhar. Para Lucas Vargas, da plataforma VivaReal, pode haver um limite no compartilhamento, uma vez que para a classe

média – citada como público alvo – pode haver um receio de perder sua privacidade, de maneira que as pessoas estariam dispostas apenas a compartilhar grandes áreas menos privativas como lavanderia e salão de festa.48 Paralelamente, como já dito sobre as habitações para cooperativas inglesas, elas também eram destinadas as classes médias e limitavam o compartilhamento às áreas de serviço e cozinha. Outra característica que se destaca nos colivings em contraposição à outras formas de coabitação é o caráter transitório dessa moradia: no The Collective Old Oak, em Londres, que já foi o maior coliving do mundo com 550 unidades e tornou-se uma referência, o tempo de estadia é de 4 a 12 meses apenas.49 Assim, os projetos traduzem essa transitoriedade seguindo a tipologia de hotéis com quartos pequenos – no The Collective Old Oak por exemplo, há apenas a opção de estúdio ou suíte - que já vem mobiliados, enquanto os espaços comunitários são em sua maioria alocados no embasamento dos edifícios. Como apontado por Stewart, as unidades ainda lembram muito dormitórios do modernismo inglês, de forma que não há uma novidade espacial, mas uma apropriação do discurso de “novo modo de morar”.50 Ainda, em contraposição ao oferecido nos colivings, segundo a pesquisa do One Shared House

STEWART, Matthew. op. cit. PULICE, Carolina. Imóveis: a onda do coliving veio para ficar? Exame, 20/09/2017. Disponível em: < https://exame. abril.com.br/seu-dinheiro/imoveis-a-onda-do-coliving-veio-para-ficar/ >. Acesso em: 24 set. 2019. 47 KASA 99. Disponivel em< http://kasa.com.br/#apartamentos >. Acesso em: 24 set. 2019 48 PULICE, Carolina. op. cit. 49 PLP ARCHITECTURE. The Collective Old Oak – London, UK. Disponível em: < https://www.plparchitecture.com/thecollective-old-oak.html > Acesso em: 25 ago. 2019. 50 STEWART, Matthew. op. cit. 45 46

42


The Collective Old Oak, Londres (Reino Unido): O coliving possui coworking e diversas 930 m2 de áreas coletivas, como cozinhas, convivência, lavanderia, spa, academia e cinema.51 Disponível em : < https://www.treehugger.com/ could-co-living-help-solve-our-urban-housingcrisis-4855695 > Acesso em: 20 ago. 2019.

Kasa 99, São Paulo: O projeto segue os modelos de colivings internacionais com diversos espaços compartilhadas, como coworking, cozinha e academia, que totalizam cerca de 1000 m2.52 Disponível em: < http://kasa.com.br/galeria/ >. Acesso em: 24 set. 2019.

PLP ARCHITECTURE. op. cit. MARRA, Renan. Novo estilo de moradia compartilhada, coliving é tendência em São Paulo. Folha de S.Paulo, 25/11/2018. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/sobretudo/morar/2018/11/1984613-novo-estilo-de-moradia-compartilhada-coliving-e-tendencia-em-sao-paulo.shtml >. Acesso em: 24 set. 2019

51 52

43


À esquerda : “The Minimal Flat” no Isokon, Londres, 1934. À direita: Suíte no The Collective Old Oak, Londres, 2016.

Disponível em: < https://failedarchitecture.com/ the-collective-is-not-a-new-way-of-living-its-an-old-

Kasa 99, São Paulo: Tipologia de estúdio compartilhado, o quarto já inteiramente mobiliado. Disponível em: < < http://kasa.com.br/galeria/ >. Acesso em: 24 set. 2019.

44


2030, a maioria dos indivíduos gostaria que fosse possível mobiliar seu próprio espaço de privativo, portando gostariam de se apropriar do espaço e sentir que ele lhe pertence. 53 Além disso, observa-se que as próprias tipologias de apartamentos já limitam o público dos colivings a pessoas solteiras ou casais. Cabe comentar que o caráter de moradia temporária dos colivings se contrapõe ao seu principal discurso: criar laços em comunidade. Para Irene Pereyra, uma das fundadoras do One Shared House 2030, os colivings se comparam a Airbnbs, em que se aluga temporariamente o espaço para morar ou trabalhar, de forma que não se cria uma comunidade com vínculos reais. Ademais, Pereyra ressalta que os colivings não cumprem o principal objetivo da moradia compartilhada, o de oferecer moradia acessível no centro, justamente por serem um produto institucionalizado.54 Para Stewart, essa questão justamente é o maior problema do The Collective Old Oak, e, dos diversos colivings que por ele foram influenciados, como o Kasa 99. Ou seja, a coabitação é vista como uma oportunidade de especulação imobiliária e não como uma questão social, de maneira que se esquece a importância histórica e o objetivo principal desse tipo de habitação de melhorar as condições de qualidade de vida das massas.55 Portanto, os projetos de colivings são produtos

do mercado, de forma que estão desarticulados de uma questão social e política, diferentemente dos projetos de coabitação originais e de outras formas atuais de habitação compartilhada, como as comunidades de cohousing e as cooperativas habitacionais. Por esse caráter coorporativo, os colivings possuem um público alvo, logo se comunicam com indivíduos de um recorte de classe e geração específicos, atuando mais como um serviço do mercado imobiliário de habitação temporária do que como uma resposta definitiva às demandas sociais. Por consequência, são projetos que não somente não cumprem em sua totalidade o discurso a que se propõem de criar uma comunidade, como também são projetos de habitação coletiva que não lidam com os problemas sociais reais da maior parte da população, como por exemplo, no Brasil, a falta de moradia.

ONE SHARED HOUSE 2030. op.cit. PEREYRA; Irene. One Shared House. [Entrevista concedida a Lisa Naudin]. Revista PLOT, Mundos Compartilhados, Redefinir os limites da habitabilidade, São Paulo, n 50, p. 11, set/out.2019. 55 STEWART, Matthew. op. cit. 53 54

45


2.3. cooperativas habitacionais: outra forma de coabitação

Entre as diversas formas de coabitação, as cooperativas habitacionais contemporâneas destacam-se por inovarem tanto em questões de gestão da habitação quanto pelas soluções espaciais estimuladoras da sociabilidade que são propostas em seus projetos. Ainda, são de baixo custo, voltadas à classe baixa e médiabaixa, são residências permanentes e procuram acolher no compartilhamento não apenas uma geração específica, mas habitantes de diversas idades, solteiros e famílias. Os projetos das cooperativas podem ser considerados como divisores de água na produção coletiva pelos seus processos de desenvolvimento que envolvem discussões mais abrangentes que a construção do edifício. A autopromoção, a ideia de propriedade coletiva da habitação e o desenho arquitetônico que tem como partido promover a vida comunitária são as principais condicionantes desses projetos.56 Tal partido permite o desenho de espaços domésticos não unifamiliares, como apartamentos compartilhados por um grupo de amigos ou complexos (clusters em inglês) em que diversas unidades dividem alguns espaços sociais, como cozinha e sala. Para Maak 57, os projetos que constroem com sucesso esses espaços, criam uma arquitetura que simultaneamente preserva a intimidade dos habitantes e que elimina o isolamento

em nome da privacidade. Além disso, são construções que criam maior liberdade espacial e de menor custo. De fato, o baixo custo das cooperativas habitacionais é uma de suas maiores vantagens: os coabitantes da cooperativa são também coproprietários, ou seja, a propriedade é coletiva e não há produção de lucro. Assim, cada coabitante paga uma quantia acessível à cooperativa.58 Essa gestão participativa da cooperativa habitacional torna a moradia muito mais permanente que em comparação com outras formas de coabitação, como os colivings. O caráter de permanência da moradia nas cooperativas habitacionais e a característica de vida comunitária, demandam que as construções sejam adaptáveis às transformações da vida contemporânea. Dessa forma, a infraestrutura permite que a arquitetura seja flexível e que seus usos se reconfigurem ao longo do tempo.59 Esse conceito e as estratégias projetuais para aplica-lo, poderiam também ser utilizados no caso de uma habitação de interesse social comunitária, estimulando a permanência dos habitantes na habitação por longos períodos da vida, contemplando as transformações inerentes à ela. Nesse contexto, diversas estratégias são

LACOL; LA CIUTAD INVISIBLE. O projeto arquitetônico das cooperativas de habitação. Revista PLOT, Mundos Compartilhados, Redefinir os limites da habitabilidade. São Paulo, n 50, p. 42, set/out.2019 57 MAAK, Niklas. op. cit., p. 154. 58 Ibid. p. 164. 59 LACOL; LA CIUTAD INVISIBLE. op. cit., p. 42. 56

46


Conjunto Kalkbreite, Zurique (Suiça): Moradores da cooperativa habitacional em reunião. Disponível em: < https://www.kalkbreite. net/en/kalkbreite/general-council/>. Acesso em 20 abr. 2020.

Conjunto Kalkbreite, Zurique (Suiça): Os moradores doam suas coleções de livros para a biblioteca comunitária.

Disponível em: < https://www.kalkbreite. net/geschichte/ >. Acesso em 20 abr. 2020

47


usadas nos projetos para tornar os edifícios mais adaptáveis, tais como: incorporar os futuros moradores no processo de projeto, estimular os moradores a se apropriarem dos espaços, ampliar as áreas comuns e criar uma grande variedade tipológica que permita que moradores possam mudar de unidade habitacional dentro do conjunto em diferentes momentos da vida, evitando que os coabitantes necessitem sair da cooperativa pela mudança de suas necessidades.60 Inclusive, segundo a pesquisa do One Shared House 2030, os moradores de coabitações preferem quando há essa possibilidade de mudança de unidade dentro do conjunto habitacional.61 Um exemplo de projeto que cria essa possibilidade é na cooperativa habitacional Mehrs als Wohnen, do escritório Müller Sigrist, em Zurique. Vale destacar a importância da apropriação dos usuários em relação aos espaços comunitários e às unidades habitacionais. Segundo LACOL e LA CIUTAD INVISIBLE 62 os espaços comuns são mais utilizados pelos moradores em cooperativas habitacionais do que em edifícios tradicionais. Nesses espaços, o mobiliário e as atividades propostas devem criar um significado aos seus habitantes e por consequência intensificar o uso dessas áreas. Um exemplo de apropriação de espaço pelos moradores foi a criação de uma biblioteca comunitária no hall de entrada da cooperativa

habitacional Kalkbreite, também do escritório Müller Sigrist e em Zurique. Ainda, esse projeto estipula espaços indeterminados que podem ter seu uso escolhido em conjunto pelos moradores por determinado tempo. 63 Quanto a apropriação dos espaços dentro das unidades, os projetos de cooperativas habitacionais tendem a ser mais flexíveis permitindo que ocorram modificações como a mudança no número de dormitórios ou o formato dos banheiros e cozinhas.64 Ademais, os projetos de cooperativas habitacionais devem essencialmente dialogar com a comunidade local, tanto para determinarem seus programas comunitários como também para repensar as transições entre público e privado, que se tornam mais complexas pela redefinição da abrangência do espaço doméstico que na coabitação não se limita mais somente à unidade habitacional. As circulações ganham maior importância ao articularem os espaços dos encontros e da sociabilidade em diversas formas de edifícios de coabitação. 65 Devido a isso as cooperativas habitacionais geralmente possuem programa misto, com um embasamento de acesso público, buscando-se a integração e união do bairro, e, nos níveis superiores, a esfera doméstica que consiste de espaços comunais e privados. Por tudo isso, os projetos de cooperativas

Ibid. p. 43. ONE SHARED HOUSE 2030. op. cit. 62 LACOL; LA CIUTAD INVISIBLE. op. cit., p. 43 63 THOELE, Alexander. Um prédio para pessoas que gostam de compartilhar. Swiss Info, 11/10/2014. Disponível em: < https://www.swissinfo.ch/por/arquitetura-ecológica_um-prédio-para-pessoas-que-gostam-de-compartilhar/41074802 >. Acesso em: 24 set. 2019. 60 61

48


habitacionais tornaram-se importantes referências de projeto a este trabalho, principalmente pelos espaços que estimulam a vida comunitária e pela oferta de diversas tipologias de coabitação, além das unidades unifamiliares, respeitando a intimidade dos habitantes. Tais estratégias projetuais empregadas desenham edifícios de fácil apropriação, flexíveis às novas necessidades dos habitantes conforme os diferentes períodos da vida e que também dialogam com o entorno e a comunidade local. Assim, nas páginas seguintes apresenta-se três projetos de cooperativas habitacionais que foram importantes referências para este trabalho.

64 65

LACOL; LA CIUTAD INVISIBLE. op. cit., p. 43. Ibid. p. 42. 49


KALKBREITE Müller Sigrist | Zurique | 2012 - 2014 A cooperativa habitacional Kalkbreite, é um grande edifício de uso misto: além dos 256 moradores, o projeto é local de trabalho de 200 pessoas que trabalham em escritórios, comércios e nos espaços culturais. 66 O Kalkbreite nasceu em 2007 por meio de um workshop público em que foi proposto construir o edifício de cooperativa habitacional em um terreno onde antigamente era um depósito de trens.67 O térreo é caracterizado por cafés, bares e lojas, enquanto a entrada do edifício se da por um grande terraço que pretende funcionar como praça pública no terceiro pavimento. O edifício abre-se para seu interior: mais do que praça, o terraço se mostra como espaço central e pátio interno da habitação, em que seus principais espaços de uso comum (a creche, a cozinha comunal e o salão de jantar dos apartamentos compartilhados) estão no mesmo nível e são acessados diretamente. 68 O projeto procurou criar um senso de comunidade, ser acessível – o aluguel custa abaixo da média da cidade - e ser um edifício ecológico, promovendo a redução de energia e o reuso d’agua. Cada habitante possui 32 m2 de espaço privado enquanto o edifício possui 800 m2 de áreas comunais, entre elas uma biblioteca comunitária e “salas box” que

os habitantes podem utilizar para realizarem pequenos projetos próprios.69 A habitação também se distingue pelo seu complexo programa habitacional que abrange apartamentos unifamiliares, compartilhados com até nove quartos e os clusters que são conjuntos de estúdios com uma quitinete e banheiro que dividem cozinha e salas box. Assim, há diferentes níveis de compartilhamento e privacidade no edifício. Por exemplo, há um conjunto de 22 apartamentos compartilhados e unifamiliares (“the large household”) que aglomeram 50 moradores e compartilham uma única cozinha. Segundo moradores, a cada noite pelo menos 30 desses moradores, jantam juntos. Já os clusters, são 3 nos edifícios, que variam de 9 a 12 estúdios e também funcionam com uma ideia de comunidade residencial oferecendo, entretanto, maior nível de privacidade. Outra inovação do projeto, foi a ideia de onze quartos que podem ser alugados complementando o espaço dos apartamentos ou acolhendo visitantes. 70

MÜLLER SIGRIST. Residential and commercial settlement Kalkbreite, Zurich. Disponível em:< http://www.muellersigrist. ch/arbeiten/bauten/wohn-und-gewerbesiedlung-kalkbreite-zuerich/ >. Acesso em: 8 set. 2019. 67 MAAK, Niklas. op. cit., p. 153. 68 Ibid. p. 153. 69 SIEGFRIED, Samanta. Zürcher Kalkbreite: As in the village - but in the city. Tages Woche, 18/02/2015. Disponível em: https://tageswoche.ch/gesellschaft/zuercher-kalkbreite-wie-im-dorf-aber-in-der-stadt/ >. Acesso em: 24 set. 2019. 70 THOELE, Alexander. op. cit. 66

50


Conjunto Kalkbreite, Zurique (Suiça): Praça de acesso público na cobertura.

Disponível em: < http://www. muellersigrist.ch/arbeiten/bauten/ wohn-und-gewerbesiedlung-kalkbreitezuerich/>. Acesso em 8 set. 2019.

terceiro pavimento espaços comunitários espaços complementares alugados

conjunto de apartamentos (the large household) conjunto de estudios (clusters)

quarto pavimento

0 5 10

20

Conjunto Kalkbreite, Zurique (Suiça): Acima plantas do terceiro e quarto pavimento. Ao lado conjunto de estúdios (clusters) no quarto pavimento.

Disponível em: < https://www. archdaily.com/903384/kalkbreitemuller-sigrist-architekten>. Acesso em 8 set. 2019. Edição da autora

0

2

4

6

10

51


Cooperativa Habitacional no Rio Spreefeld Carpaneto Architekten + Fatkoehl Architekten + BARarchitekten | Berlim | 2008 - 2013 A Cooperativa Habitacional no Rio Spreefeld, tinha como objetivo criar um conjunto habitacional que fosse justo socialmente, autossustentável e economicamente estável. A cooperativa contratou três escritórios para o projeto, cada um responsável pelo projeto de um bloco, mas todos com o mesmo partido de se projetar edifícios que fossem abertos à vizinhança e ao rio, por meio de terraços individuais e comunais – todos os habitantes têm acesso a um terraço – e por espaços abertos no térreo público.71 O programa do edifício é divido entre espaços privados, comunais e públicos e se organiza verticalmente nesta respectiva ordem. Mais da metade da área do conjunto destinase à habitação, essa possuindo tipologias de apartamentos unifamiliares e também 6 conjuntos de coabitação (clusters) abrigando de 4 a 21 pessoas. Os conjuntos são compostos de estúdios com banheiro e quitinete e espaços comunitários como sala, cozinha e terraço comunal. O principio é de se compactar o espaço privado e ampliar o uso do espaço coletivo, de forma que isso não seja imposto de maneira forçada. Dessa forma, embora os habitantes possuam unidades pequenas, há uma significativa área de espaços comunitários como lavanderias, academia, salão de festas, terraços nas coberturas, sala de música e sala para crianças. 72

O projeto utiliza-se da estratégia de transpor algumas funções da esfera privada para a esfera coletiva, que além de estimular o encontro, também reduz os custos da construção, tornando-a acessível.73 Como já visto, tal estratégia de projeto já era usada nas habitações soviéticas. Por fim, os espaços públicos (comércios, serviços, coworkings) no térreo, procuram ser uma contribuição à cidade e à vida urbana. Além dos usos citados, existem também os “espaços opcionais” que são salas abertas à vizinhança para projetos sociais e culturais. Dessa maneira, os “espaços opcionais” são uma extensão da cidade no edifício da cooperativa, abrigando festas, exposições e refeições para toda a comunidade local. 74

71 ARCHDAILY. Coop Housing at River Spreefeld / Carpaneto Architekten + Fatkoehl Architekten + BARarchitekten. 17/01/2015. Disponível em: <https://www.archdaily.com/587590/coop-housing-project-at-the-river-spreefeld-carpaneto-architekten-fatkoehl-architekten-bararchitekten >. Acesso em: 16 set. 2019. 72 Ibid. 73 MAAK, Niklas. op. cit., p. 154. 74 Ibid p. 154.

52


Cooperativa Habitacional no Rio Spreefeld, Berlim (Alemanha): Terraços comunitários são propostos em todos pavimentos. Foto: Ute Zscharnt. Disponível em: <https://www.archdaily.com/587590/coop-housing-project-at-the-river-spreefeld-carpaneto-architekten-fatkoehlarchitekten-bararchitekten>. Acesso em 16 set. 2019.

Cooperativa Habitacional no Rio Spreefeld, Berlim (Alemanha): Isométrica dos estúdios em coabitação. Em amarelo os espaços comunais: sala de estar, cozinha, banheiro e terraço.

Disponível em: <https://www.archdaily. com/587590/coop-housing-project-atthe-river-spreefeld-carpaneto-architektenfatkoehl-architekten-bararchitekten>. Acesso em 16 set. 2019.

53


Mehr als Wohnen Duplex Architekten, Futurafrosch, Müller Sigrist, pool Architekten, Miroslav Šik Zurique | 2009 - 2015 Mehrs als Wohnen é uma cooperativa habitacional com 380 unidades e 1200 habitantes, localizados em 13 edifícios em uma mesma área de Zurich, projetados por quatro escritórios de arquitetura – um deles o escritório que projetou o Kalkbreite. 75 Assim como no Kalkbreite, devido motivos ecológicos e econômicos, as áreas privadas são reduzidas – 35 m2 por habitante, enquanto a média na Suíça é de 50 m2, segundo Gaitish. Contudo, se compensa pelas generosas áreas comunais, em que vários espaços têm seus usos escolhidos pelos habitantes. Os edifícios abrangem unidades convencionais de áreas variadas – que podem ser unifamiliares ou compartilhadas por diferentes indivíduos estúdios e andares em clusters que são um conjunto de pequenas unidades privativas com quarto, sala, banheiro e quitinete unidos pelas áreas comuns compartilhadas como salas e cozinhas. Além de serem espaços que estimulam a sociabilidade, os clusters também permitem a redução de áreas e, portanto, economia.76 A variedade de unidades habitacionais procura dar a possibilidade aos moradores de mudarem de apartamentos dentro da cooperativa habitacional de acordo com o momento na vida. Um exemplo disso, são as unidades complementares que podem ser

GAITSH, Sophie. op. cit. Ibid. 77 Ibid. 75 76

54

alugadas por moradores que desejem acolher por um tempo um parente idoso ou jovens que escolham alugar para possuírem maior independência da família que mora também na cooperativa. 77


Cooperativa Habitacional Mehr als Wohnen, Zurique (Suiça): Bloco E do escritorio Müller Sigrist. Pátios do conjunto são também espaços de convivência. Disponível em: <hhttp://www.muellersigrist.ch/arbeiten/bauten/mehr-alswohnen-zuerich-leutschenbach/ >. Acesso em 8 set. 2019.

Cooperativa Habitacional Mehr als Wohnen, Zurique (Suiça): Pavimento tipo do Bloco A do Duplex Architekten com dois conjuntos de estúdios em coabitação. Disponível em: <https://dac.dk/en/knowledgebase/architecture/mehr-alswohnen/ >. Acesso em 2 out. 2019.

55



3. O lugar


3.1. proposta de um morar compartilhado em são paulo

O estudo da coabitação em suas diversas formas e momentos, como realizado nos capítulos anteriores, foi base e referência para a realização da proposta principal deste trabalho: um projeto de conjunto habitacional de coabitação em São Paulo que reflita sobre a relação entre espaços privados e coletivos da moradia e proponha novas interações sociais e domésticas entre os habitantes.

ao segundo modelo, em que os moradores pagariam a locação social ao poder público, seriam responsáveis individualmente por unidade, contas como luz e gás, e dividiriam os custos dos espaços coletivos. Ademais, os programas complementares – coworking, cinema e lojas – do projeto poderiam gerar renda aos moradores do conjunto habitacional, auxiliando no pagamento da locação.

Cabe pontuar que ainda não há uma legislação específica de moradia compartilhada no Brasil. No caso dos colivings, atualmente ele é entendido dentro da Lei do Inquilinato (8245/91).78 Portanto este trabalho atua em uma nova fronteira, em que a viabilidade para a construção futura de uma moradia deste porte dependeria de um estudo mais aprofundado deste tema e de parâmetros determinados pela “Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (LPUOS) “, bem como pelo “Código de Obras e Edificações de São Paulo”. Ainda, a questão da gestão do espaço é crucial para a viabilidade de uma moradia compartilhada. Enquanto nos colivings os moradores alugam os dormitórios e o espaço é gerido por um administrador, nas cooperativas habitacionais é o próprio coletivo dos moradores que autogere o espaço e determina um acordo de divisão dos custos. Neste contexto, o trabalho propõe que o conjunto habitacional seja de interesse social com a gestão do espaço similar

Com essas ressalvas, pensa-se na inserção desse conjunto habitacional na cidade. Uma vez que a questão do compartilhamento está frequentemente conectada ao morar e trabalhar, era importante que a coabitação fosse projetada em uma região de alta densidade populacional (habitante/hectares), próxima a áreas de concentração de empregos e que pudesse ser acessada por transporte coletivo de massa. Esse último aspecto possibilita ao morador da habitação o direito à cidade, podendo usufruir do transporte público em sua locomoção diária ao trabalho, bem como equipamentos, serviços, comércio e lazer. O acesso à essa infraestrutura diminui as distâncias e tempo de deslocamento, assim como a possibilidade de morar e trabalhar em localidades próximas, de forma que o individuo ganha em tempo livre para outras atividades e qualidade de vida. Entre outras áreas da cidade, essas determinantes encontram-se na Santa Cecília: o distrito possui alta densidade

CABRAL, Eloá. Coworking e coliving – Aspectos jurídicos na era da economia compartilhada. Jusbrasil/ Disponível em: <https://eloacabral.jusbrasil.com.br/artigos/611158415/coworking-e-coliving?ref=serp>. Acesso em: 10 jul. 2020.

78

58


Mapa de densidade e transporte no centro de São Paulo: área de projeto demarcada em branco.

0 500 1000

2500

Imagem Google Earth. Edição da autora.

Densidade: até 92 hab/ha 92 - 146 hab/ha 146 - 207 hab/ha 207 - 351 hab/ha 351 - 30346 hab/ha Linhas do metrô Linhas da CPTM Estação de metrô Estação da CPTM

59


60


Vista aérea do encontro do Elevado João Goulart com Av. São João: vista parcial dos terrenos de projeto no canto inferior esquerdo. Foto: Nelson Kon. Disponível em: < http://www.nelsonkon. com.br/sao-paulo/ >. Acesso em: 14 jul. 2020

populacional, assim como os distritos próximos de Bela Vista e Consolação, mas também está muito próximo ao cento da cidade que possui grande quantidade de empregos, embora esteja esvaziado em moradia. Ainda na Santa Cecília está a Linha 3 – Vermelha do metrô e corredores de ônibus, logo transporte de massa. Assim, o conjunto de coabitação se insere na região central de São Paulo, em dois grandes terrenos na Avenida São João e extremamente próximos ao Elevado Presidente João Goulart, mais conhecido como Minhocão, e ao metrô Santa Cecília É uma área complexa, urbana e socialmente, hoje deteriorada principalmente como consequência da implantação do Elevado João Goulart no centro da cidade, sendo este uma infraestrutura rodoviária controversa desde sua inauguração, e que ainda hoje é pauta de discussões de diversos grupos da sociedade sobre as suas implicações no tecido urbano. Além disso, a região é emblemática na memória da cidade: a Av. São João é uma das avenidas mais tradicionais de São Paulo, já tendo sido um de seus espaços públicos mais relevantes na primeira metade do século XX.

61


síntese

M IN HO CÃ

O

O NH MI

largo santa cecília

CÃ O

0

62

50

100

250

santa casa da misericórdia


estação júlio prestes sebrae-sp

terminal princesa isabel

sala são paulo

praça princesa isabel

AV

SÃ O

JO ÃO

largo do arouche

praça da república

Imagem Google Earth. Edição da autora.

63


3.2. contexto urbano

O complexo tecido urbano da região do projeto é o resultado de diversas camadas de ações históricas no território, que resultaram em uma área de paisagem urbana heterogênea, muito bem servida de infraestrutura de transportes e de significativo caráter cultural. Embora essa área atualmente apresente diversos problemas urbanos e sociais, também possui potencialidades consideráveis.

São João, Calliari classifica como um exemplo do foco e da pressa de implementação de soluções viárias em São Paulo, no período de 1966 a 2002. Pela lógica rodoviarista, foi priorizado a construção do viaduto para automóveis que fragmentou o centro da cidade à custa da deterioração de todo entorno do Elevado. Segundo Callliari:

Mauro Calliari em seu livro “ Espaço público e urbanidade em São Paulo” (2016) analisa a relação de São Paulo e seus espaços públicos em diversos momentos da história. Para o autor, a avenida São João foi o local mais emblemático da cidade no período da primeira República, de 1889 a 1930. A São João era a avenida mais relevante de São Paulo e a face europeia da cidade burguesa, uma avenida larga e moderna com espaços públicos de fruição para a burguesia. Nas décadas posteriores, a avenida torna-se importante eixo dos cinemas de ruas como o Comodoro, o Ipiranga, o Marabá e o inovador Cinespacial, de Emilio Guedes Pinto, inaugurado em 1971.79 O Cinespacial desativado desde 1994, localiza-se no terreno principal de projeto escolhido para este trabalho e, portanto, será melhor abordado posteriormente.

“A construção do Minhocão, por exemplo, causou uma das grandes fissuras urbanas da cidade: um viaduto colocado sobre uma avenida sem nenhuma preocupação com a qualidade de vida dos moradores e dos pedestres nem com os efeitos sobre o entorno. Por todos esses efeitos deletérios, o Minhocão é chamado de ‘via desurbanizadora’ por Regina Prosperi Mayer, que vê nele um ‘ícone da arbitrariedade urbana’, ainda mais porque, na época em que foi construído, já se questionavam as vias expressas no ambiente urbano, e muitas delas, como as de Boston, começavam a ser postas abaixo. “ 80

Já o Elevado Presidente João Goulart, construído em 1971 e que cobre parte da Av.

Assim, o Minhocão é uma barreira e o seu entorno, antes uma área de fruição pública, tornou-se um lugar de passagem, como observa-se ainda hoje. Em outras palavras, para o arquiteto Valter Caldana “A área central foi transformada, pela presença do Minhocão, de sala de estar em corredor.“ 81

CALLIARI, Mauro. Espaço público e urbanidade em São Paulo. São Paulo: Bei Comunicação, 2016. p. 111 Ibid. p. 141 e 143 81 Ibid. p. 181 79 80

64


Av. São João em 1930.

Foto: J.B. Duarte. Disponível em: <https://participe.gestaourbana. prefeitura.sp.gov.br/parque-minhocao>. Acesso em: 15 jul. 2020

65


Av. São João nos anos 1930.

Disponível em: < http://www.arquiamigos.org.br/foto/ index-campos.php >. Acesso em: 14 jul. 2020

Av. São João antes da construção do Elevado Presidente João Goulart.

Foto: Antonio Aguillar. Disponível em: <http://m.acervo. estadao.com.br/noticias/acervo,como-era-sao-paulo-semo-minhocao,9070,0.htm>. Acesso em: 14 jul. 2020

66


67


Construção do Elevado Presidente João Goulart na Av. São João em 1970. Disponível em: <http://www.saopauloinfoco. com.br/especial-minhocao/>. Acesso em: 14 jul. 2020

68


Ainda, o arquiteto pontua que o Elevado é também um marco simbólico da passagem da São Paulo que se espelhava na cidade europeia, para a São Paulo que se espelha no modelo rodoviarista americano. Dessa forma, os terrenos de projeto estão localizados em uma região que possui remanescentes de duas fases do urbanismo de São Paulo: a cidade europeia da fruição pública para a burguesia na Av. São Joao e a fase rodoviarista de construção de avenidas e viadutos para dar vazão aos automóveis. Além do Minhocão como grande responsável da deterioração da região, houve também a decadência do centro da cidade nas últimas décadas do século XX. A vida urbana do centro perdeu gradualmente sua vitalidade e diversidade, na medida que a cidade crescia enquanto escritórios, serviços e comércios migravam para outras regiões. 82 Contudo, Calliari aponta que nos últimos anos há algumas tendências que evidenciam uma mudança de movimento em relação ao pensamento rodoviarista do fim do século passado, em que hoje se prioriza a fruição do espaço público e a reapropriação de espaços pela sociedade.83 Um exemplo é justamente o fechamento do Minhocão para carros nos finais de semana e feriados, e sua ocupação por pessoas de distintas áreas da cidade

82 83

para as mais diversas práticas, de maneira que o viaduto se torna um espaço público livre de lazer e que ainda eventualmente será transformado em um parque em definitivo. Tal movimento evidencia o grande potencial da região de tornar-se mais permeável com espaços públicos de permanência, convivência e lazer, e não apenas de passagem. Nessa perspectiva dos espaços livres, percebese que no contexto urbano do local do projeto, abrangendo áreas da Santa Cecília, República e a Luz (ver mapa Síntese p. 62), há espaços livres relevantes e marcos simbólicos da cidade como a Praça da República, o Largo do Arouche e o Largo da Igreja de Santa Cecília. Destaca-se principalmente a República por sua vida urbana, que além de lugar de passagem pela localização central e acesso ao metrô, é palco de feiras e atividades culturais, como concertos, shows e o carnaval de rua. Além dos já citados metrôs Santa Cecília e República, a região também é facilmente acessada pela estação da Luz e pela Estação Júlio Prestes da CPTM, assim como pelo Terminal de Ônibus Princesa Isabel e Amaral Gurgel. Ademais, a região ainda hoje tem uma vocação aos equipamentos culturais, sobretudo para teatros, cinemas e casas de shows (ver Mapa Equipamentos culturais e Transportes p. 72), provavelmente uma herança da época

Ibid. p. 187 Ibid. p. 165 69


auge do cinema de rua na Av. São João como também pela importância que a área central possuía antigamente como catalisadora de diversas atividades, entre elas a cultura e o lazer. Nesse contexto, atualmente percebe-se que no entorno do local de projeto, os usos predominantes por quadra são de atividades comerciais com uso residencial ou apenas residencial de médio/alto padrão (ver Mapa de Usos Predominantes na p. 74. ). Assim, percebe-se que a localização do projeto na área central da cidade, próxima a diversos meios de transportes e a confluência entre a Av. São João e o Minhocão está dentro de um importante contexto urbano e simbólico da cidade de São Paulo, marcado por diferentes políticas urbanas que se sobrepõem e deixam suas marcas no território. Os debates sobre o futuro do Minhocão e seu entorno, onde enquadra-se o projeto, são ainda pertinentes e evidenciam o potencial nos espaços públicos da área, hoje marcados sobretudo como espaços de passagem. Além disso, a região possui grande valor e potencial cultural, tanto pelos diversos equipamentos hoje existentes quanto pelos antigos cinemas de rua da Av. São Joao. Por fim, essas conjunturas tornaram este contexto um lugar instigante para a inserção do conjunto habitacional.

70


Uso do MinhocĂŁo como parque urbano nos finais de semana.

Foto: Joel Nogueira. DisponĂ­vel em: <https://www.archdaily.com.br/br/940186/prefeiturade-sao-paulo-abre-concorrencia-para-projeto-de-acessos-de-pedestres-no-minhocao >. Acesso em: 15 jul. 2020.

71


equipamentos culturais e transporte

Teatros, cinemas, shows Museus Espaços culturais Bibliotecas Linhas de metrô Corredor de ônibus 0

72

50

100

250


Imagem Google Earth. Edição da autora.

73


uso do solo predominante

Residencial Vertical médio/alto padrão Comércio e serviços Residencial e comercial/serviços Sem predominância Linha 3-Vermelha do metrô Corredor de ônibus Ponto de ônibus no corredor

74

0 2

10

25


Imagem Google Earth. Edição da autora.

75


3.3. as quadras de projeto

Além do conhecimento do contexto urbano do local, também se faz necessário o entendimento da localidade ao nível da quadra. Como já comentado anteriormente, o trabalho se debruçou inicialmente sobre dois terrenos na Av. São João e próximos ao Elevado João Goulart. Os terrenos de projeto possuem uma escala de quadra urbana, com mais de 3000 m2 cada um, estando ambos localizados entre três vias, que lhes conferem acesso. O primeiro terreno de projeto é, na verdade, o remembramento do grande lote, que contém o Cinespacial, e dois pequenos lotes ao lado. Embora o antigo cinema faça parte hoje de um estacionamento, a estrutura da sua sala circular foi preservada, assim como seus espaços de serviço. Contudo, o projeto do estacionamento criou um segundo nível no terreno, com 4,5m de altura, o que cria um muro para as ruas Frederico Steidel e Vila Adelaide. O muro aumenta a sensação de insegurança nesta rua, já presente pelo seu pouco movimento. Enquanto isso, a Vila Adelaide, uma rua sem saída e com casas baixas e antigas, dá a sensação de segurança e conforto para o usufruto do espaço público pelos moradores. As edificações nas ruas internas das quadras e próximas ao Elevado João Goulart possuem baixo gabarito, em contraste com os edifícios

altos da Av. São João. Nesse aspecto, destacase um edifício recente e residencial de 20 pavimentos, construído no lote ao lado do Cinespacial e que evidencia o processo de gentrificação em curso no local. O segundo terreno de projeto também foi resultado de um remembramento de dois terrenos maiores de estacionamento, uma casa de shows e um pequeno clube comunitário de bairro, sendo esse o único equipamento esportivo da região, estando localizado no limite da quadra com a rampa de acesso ao Elevado. Tanto a casa de shows quanto o clube comunitário foram incorporados no projeto proposto. Além disso, ambos terrenos estão em quadras estipuladas de Zonas de Interesse Social (ZEIS) 3, portanto pelo Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo (2014)84 as futuras construções devem ser majoritariamente habitações de interesse social, como foi respeitado no projeto. Ademais, o uso das ruas no entorno das quadras possui caráter sobretudo de passagem, no movimento de travessia do metrô Santa Cecília, cruzando embaixo do Minhocão pela Rua Ana Cintra, para o centro da cidade, virando na Av. São João em direção à República ou continuando em linha reta em direção à Luz.

SÃO PAULO. Nº 16.050 de 31 de julho de 2014. Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo. São Paulo, SP, 2014. Disponível em: < https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/arquivos/PDE-Suplemento-DOC/PDE_SUPLEMENTO-DOC.pdf >. Acesso em 20 jul. 2020.

84

76


Vista do antigo Cinespacial, atual estacionamento. Foto da autora.

Vista do Elevado Presidente JoĂŁo Goulart: Destaque ao volume do Cinespacial e ao muro que separa o terreno da rua Frederico Steidel. Foto da autora.

77


Durante a semana o pouco uso do espaço público para a permanência e a convivência ocorre pela extensão de padarias, restaurantes e bares para o espaço público, com as mesas nas calçadas. Nos finais de semana e feriados o Minhocão é fechado para os automóveis e adquire o caráter de parque urbano. Nesse sentido é importante destacar que, como observado pelo urbanista e arquiteto Jan Gehl, mais importante do que o número de indivíduos que usam as ruas, é o por quanto tempo esses permanecem nelas.85 Do mesmo modo, de acordo com Calliari, a qualidade de um espaço público pode ser medida pelo número de encontros e trocas que nele se dão, e ainda mais pela sua capacidade de estimular as pessoas a permanecerem nesses espaços.86 Ainda, são espaços diversos, que atraem diferentes usuários em diferentes momentos do dia e horários. 87 Tais terrenos do projeto inserem-se em um entorno heterogêneo, caracterizado pelo grande fluxo de transeuntes e prédios altos, na Avenida São João, e a reminiscência de um bairro mais tranquilo na Vila Adelaide, corroborando, assim, os contrastes urbanos inerentes às cidades brasileiras. Nesse local o uso das ruas é principalmente de passagem dos habitantes, entre o transporte e o trabalho, comércio ou moradia, enquanto o uso do espaço público como lazer ou permanência

CALLIARI, Mauro. op. cit. p. 70. Ibid. p. 57 87 Ibid. p. 168 85 86

78

é praticamente nulo, à exceção dos períodos em que o Minhocão é aberto como parque ou na pequena Vila Adelaide. O entorno oferece pouca oferta de lugares para encontros e trocas com o outro, poucos são convidativos para uma pausa, um descanso ou permanência de quem chega, desestimulando o usufruto da cidade pelas pessoas.


79


3.4. cinespacial

O Cinespacial, inaugurado em 1971 na Av. São João, foi um projeto ímpar de cinema em São Paulo. Projetado pelo Arquiteto Emilio Guedes Pinto, o cinema possuía uma sala circular com uma cabine de projeção suspensa no meio da sala, em que um único projetor transmita simultaneamente os filmes em três telas a 120 graus. Esse formato inovador demandava que as fileiras de poltronas fossem organizadas concentricamente, o que fazia com que nenhuma fileira fosse muito perto ou longe da tela e ainda que a distância entre a primeira e a última sempre fosse equivalente a um terço da sala. Além disso, com a sala circular o piso não precisava ser inclinado para que os espectadores das últimas fileiras tivessem visão da tela. Na verdade, o formato da sala propiciava que o espectador tivesse um ângulo de visão correto de qualquer ponto da sala. 88 Infelizmente, com o processo de esvaziamento pelo qual o centro da cidade sofreu nas últimas décadas do século XX, assim como a ascensão dos cinemas em shoppings, os cinemas de ruas de São Paulo perderam gradualmente seu público. Assim, em 1994 o Cinespacial foi desativado.

Cinema Circular. Revista Acrópole, ano 28, n. 336, p. 32-33, janeiro 1967. Disponível em: < http://www.acropole.fau. usp.br/edicao/336/28>. Acesso em: 19 nov. 2019.

88

80


Plantas da sala de cinema do Cinespacial demonstrando, da esquerda para a direita: a variação de distâncias entre as fileiras, o ângulo de visão correto e a projeção de filmes simultânea em três telas. Disponível em: <http://www.acropole.fau.usp.br/edicao/336/28>. Acesso em: 19 nov. 2019.

Perspectiva interna da sala de cinema.

Disponível em: <http://www.acropole.fau.usp.br/ edicao/336/28>. Acesso em: 19 nov. 2019.

81



4. O projeto


4.1. o plano de quadras abertas

VIL

AA

DEL

coabitação centro cultural comércios AID

E

L EIDE O ST ERIC FRED RUA

coabitação cinema

AV . SÃ OJ OÃ O

comércios

coabitação centro cultural coworking

84


O projeto foi realizado em dois momentos: o primeiro em escala de plano de massa abordando os dois terrenos, enquanto no segundo o projeto foi desenvolvido de forma mais aprofundada no terreno que abriga o Cinespacial. Dessa forma, é proposto que os terrenos sejam quadras abertas que conectem por espaços de permanência seu complexo entorno e que abriguem o conjunto habitacional de coabitação e seus programas complementares de maneira integrada.

ÃO

OC

NH

MI

coabitação equipamento esportivo

Desde o início os terrenos foram pensados como quadras abertas, podendo ser acessados por todas as suas frentes de quadra, de forma que diversos caminhos fossem criados no interior do lote. Do mesmo modo, a partir da constatação do entorno ser um espaço de passagem, a ideia era de oferecer espaços públicos de convívio entre os edifícios, como uma gentileza urbana à cidade. De acordo com esse partido, os terrenos não alcançaram a taxa de ocupação máxima, liberando o térreo para a formação de pequenos espaços livres, que possam abrigar diferentes usos. Como apontado por Calliari, espaços públicos que ofereçam diversos usos atraem pessoas diferentes em horários distintos ao logo do dia inteiro. 89 Essa diversidade de usos no espaço público pretendida culmina no diverso programa do Plano de Quadras Abertas: a proposta principal é o conjunto habitacional de

casa de shows comércios

89

CALLIARI, Mauro. op. cit. p. 67. 85


coabitação que se estabelece nos dois terrenos, ocupando aproximadamente 80% de toda área computável enquanto, como programas complementares, o terreno principal abriga um centro cultural público com cinema e coworking, e o segundo abriga um equipamento esportivo público, estando presente os comércios em ambos. O programa foi pensado em um sistema integrado de cultura, lazer e esporte em que no primeiro terreno o foco é a valorização da cultura, ao “devolver” a sala de cinema do Cinespacial à cidade, e no segundo a conformação de um equipamento de esportes e lazer público a partir da incorporação e expansão do clube comunitário existente. A escolha por esses usos foi corroborada por um segundo fator: assim como na coabitação as relações e vivências humanas são estimuladas, esses usos também oferecem uma experiência de sociabilidade e incentivam a criação de uma comunidade local do bairro. Dessa forma, a intenção de propiciar o encontro e o compartilhamento entre indivíduos, está gradativamente presente nos diferentes programas do projeto. Ainda sobre esse programa, cabe destacar a inclusão do Cinespacial no projeto. Entendese que foi um espaço de valor arquitetônico e social para a cidade na sua época de funcionamento (1971-1994), bem como um marco simbólico dos cinemas de rua da Av.

86

São João. Por isso, sua incorporação ao projeto não apenas oferece uma opção de lazer e cultura à população local, mas também incentiva o uso de outros espaços do projeto como comércio e espaços livres, além de estimular a permanência dos cinemas de rua que ainda resistem em São Paulo. O volume do Cinespacial foi determinante para o desenho da implantação e da volumetria de todo o projeto. O gabarito dos usos não residenciais das quadras foi estipulado pelo volume desse edifício, fazendo com que o nível da cobertura do cinema seja também o primeiro pavimento dos edifícios do conjunto habitacional. Esses pavimentos possuem o caráter de uma transição visual e espacial entre a habitação e o programa complementar no embasamento. Desse modo, a volumetria dos edifícios sugere o programa, bem como integra as duas quadras como um único projeto. Tal impressão é também afirmada pelo mesmo gabarito dos edifícios das duas quadras, à exceção do bloco acima do Cinespacial, que ganha maior altura para fazer a transição visual entre os demais edifícios do projeto e a torre de 20 pavimentos, no lote vizinho. Sendo assim, no nível do plano de massa, o projeto busca formar um conjunto integrado nas duas quadras pela sua volumetria, programa e inserção na cidade. Propõe


incentivar o encontro e a atração de pessoas diferentes ao longo do dia pela sua diversidade de usos: seja os moradores do conjunto, seja os praticantes de esportes, aqueles que queiram ir ao cinema, frequentar o comércio, trabalhar no coworking ou apenas utilizarem os espaços livres para convivência. Dessa forma, busca-se a transformação do caráter do lugar através de sua apropriação pela comunidade de moradores do conjunto, bem como pela a comunidade local do bairro. Segundo, Calliari:

“O estabelecimento de um sentido, portanto, transforma o espaço. O lugar é o espaço vivido. O significado é o que torna um espaço um lugar. “ 90

90

ÁREAS Área Terrreno Cinespacial Área Terrreno Minhocão Área Total

3565 m2 3347 m2 6912 m2

PLANO DE MASSA 4 Coeficiente de Aproveitamento 60% Taxa de ocupação 15725 m2 Área Computável no Terreno Cinespacial 11922 m2 Área Computável no Terreno Minhocão 27547 m2 Área Computável Total

Como as quadras fazem parte de um sistema integrado, o potencial construtivo das quadras foi utilizado em conjunto. Portanto, houve um compensamento de área entre as quadras, respeitando a área computável máxima total permitida pelo Coeficiente de Aproveitamento máximo da região.

CALLIARI, Mauro. op. cit. p. 58. 87


situação 88


0 10

25

50

89


implantação 90


A partir do partido das quadras abertas, os edifícios se implantam nas laterais dos terrenos para possibilitar diversos caminhos e liberar o centro do lote. Nesse sentido, o terreno principal, o do Cinespacial aproveita o seu desnível para criar uma longa arquibancada como um convite à estadia. Ainda, na Av. São João a vista abrese para o Cinespacial: além de não haver nenhuma construção entre o cinema e a avenida, diferentemente de como é hoje, o edifício de frente à Av. São João avança pelo terreno de modo que emoldura a vista do cinema. Os acessos ao lote e aos edifícios se dão em diferentes níveis conforme se ajustam a topografia. Já no segundo terreno, a implantação do conjunto habitacional se distancia do Minhocão, protegendo as habitações de problemas de acústica e privacidade. Em contraposição, uma marquise do equipamento esportivo se aproxima do Elevado em sua mesma cota, e abriga em sua sombra uma quadra poliesportiva, como uma extensão do equipamento, assim como os demais espaços livres. Na Rua Ana Cintra se localiza a casa de shows incorporada ao projeto, e pequenos comércios que visam atender principalmente o movimento de travessia para o metrô Santa Cecília. Por fim, a inserção dos edifícios busca dar vitalidade a Rua Frederico Steidel, pela alocação dos comércios e entradas aos equipamentos.

0

5 10

25

91


MINHOCÃO

corte transversal das quadras 92

coabitação e equipamento esportivo


RUA FREDERICO STEIDEL

coabitação e equipamento cultural

01

10

20

93


94


4.2. o projeto no terreno do cinespacial

O projeto desenvolvido no terreno principal foi organizado em três edifícios abrigando o conjunto habitacional de coabitação e o centro cultural. O conjunto habitacional propõe diversos espaços comunitários em diferentes escalas procurando criar gradações de coletividade e um equilíbrio entre espaços comunitários e privados. Nessa perspectiva, há uma grande variedade tipológica de unidades unifamiliares, conjugadas e compartilhadas, que procuram não somente contemplar os diversos arranjos familiares existentes, como sobretudo buscar novas articulações de moradia com respeito a intimidade dos indivíduos. Dessa forma, com as variadas combinações das unidades nenhum pavimento é idêntico ao outro. O partido de flexibilidade demandou uma infraestrutura aberta: o projeto emprega as lajes nervuradas cogumelos que permitem grande vãos, chegando a até 13,5 m nos pavimentos habitacionais. Nas áreas comunitárias, as varandas que são sempre conectadas por escadas externas, são importantes espaços de convivência e sociabilidade, em que se criam os vínculos entre os moradores. Tal dinâmica se repete nas varandas do coworking, pensadas do mesmo modo como espaços de encontro e conectadas por escadas. O centro cultural é partilhado no

embasamento entre os três blocos, incluindo o Cinespacial, que se conectam por passarelas externas no primeiro e no terceiro pavimento. Acima do Cinespacial se eleva o bloco mais alto do conjunto em que uma viga vierendeel de concreto permite que se dobre o vão entre os pilares do edifício, de forma que a cobertura do cinema não é impactada. Essa é suspensa pela viga vierendeel por tirantes, e do mesmo modo a cabine de projeção do cinema é suspensa pelas vigas metálicas da cobertura do cinema. No conjunto habitacional, as coberturas são verdes. A unidade visual do projeto é garantida por meio de brises pivotantes de painéis metálicos nas fachadas com maior insolação solar. Os brises pivotantes ainda tornam a fachada um objeto dinâmico e conferem a liberdade do movimento ao usuário. Finalmente, a leitura visual do conjunto entre volumes superiores da habitação e o centro cultural no embasamento, é concebida pelo pavimento de transição da habitação que possui seus espaços comunitários afastados da fachada.

95


unidades habitacionais: unifamiliares conjugadas compartilhadas

varandas: circulação encontro uso comunitário

espaços comunitários fechados: usos variados decididos pelos moradores

coworking sanitários

administração anexo cinema

exposição escola de dança espaço multiuso

acolhimento e cafeteria

serviços vestiário convivência

cinema e anexo foyer

acesso habitação acesso habitação convivência lojas

serviços acesso secundário centro cultural

96


4.3. o programa: centro cultural e coabitação

Como já abordado, a proposta principal do projeto é o conjunto habitacional de coabitação, e o centro cultural público, integrado ao Cinespacial e ao coworking, complementam o programa que combina moradia, cultura, lazer e trabalho. O projeto reforça o caráter cultural do local, com um equipamento cultural que abrigue salas de exposição, escola de dança e espaços de multiuso e leitura. Do mesmo modo, o coworking faz parte do centro cultural atraindo usuários que desejam compartilhar um espaço de trabalho agradável e com infraestrutura. O encontro e a sociabilidade são estimulados pelas varandas, bem como pelos espaços de convivência dispostos pelo centro cultural. Um espaço de acolhimento com café no edifício da Av. São João é o acesso principal ao centro cultural. Neste espaço, uma escada conduz às varandas do coworking, enquanto a circulação principal dá frente para uma pequena praça, abraçada pelo acolhimento e o espaço de convivência. Um prolongamento da arquibancada externa adentra o centro cultural e aumenta o pé-direito desse espaço. Logo acima, no segundo pavimento, localizam-se dois espaços de exposição em pé-direito triplo, que são compartimentados por uma leve divisória, podendo essa ser removida de acordo com as necessidades das amostras propostas. No outro lado do edifício estão localizados em todos pavimentos os sanitários e o coworking. Um segundo acolhimento, em menor escala, se insere no edifício da Rua Frederico Steidel e Vila Adelaide, e em frente aos espaços comerciais propostos. A sua circulação vertical, sempre

rodeada de espaços de convivência, acessa os espaços de multiuso e leitura no segundo pavimento, a escola de dança com pé-direito duplo no terceiro e a administração no quarto. A escola de dança possui pé-direito duplo e é acessada por um corredor avarandado. Uma parcela da administração com secretaria, sala de reuniões e almoxarifado encontra-se neste edifício, enquanto a administração geral está no anexo ao Cinespacial. É por ele que se acessa o foyer e a sala de cinema circular. A cabine de projeção, suspensa no centro da sala, determina a cota do mezanino que lhe promove acesso e que oferece um espaço de convivência aos funcionários. No quinto pavimento inicia-se o conjunto habitacional por um nível de espaços comunitários livres e fechados de usos múltiplos, como academia, salão de jogos, lavanderia comunitária, etc. O programa dos espaços comunitários pode ser decidido e reinventado pelos moradores conforme as necessidades coletivas. Por essa razão, tanto neste pavimento quanto nos demais, espaços multiusos flexíveis e de diferentes escalas são projetados para servirem às mais distintas finalidades. Nos demais pavimentos as unidades habitacionais unifamiliares e compartilhadas são permeadas por espaços comunitários com distintas características que acolhem diversas atividades. Entre eles, os espaços comunitários de pé-direito duplo nos últimos pavimentos abrigam as cozinhas comunitárias e salões de refeição. Estes espaços com amplitude e vistas generosas são significantes por acolherem o momento mais propício para a criação de vínculos da comunidade: o compartilhamento de uma refeição.

97


14 13 12 11

10

9

8

7

6

98


4.4. conjunto habitacional: partidos

VARIAÇÃO TIPOLÓGICA

ESPAÇOS COMUNITÁRIOS DIVERSOS

O conjunto propõe 21 variações tipológicas que contemplam estúdios e unidades de 1 a 3 dormitórios, tanto unifamiliares quanto em coabitação. As unidades são projetadas como moradias permanentes e não possuem um público alvo em específico. A grande variação tipológica também almeja proporcionar que os habitantes mudem de unidade habitacional conforme o momento de suas vidas.

O projeto visa espaços comunitários de diferentes características espaciais e graus de coletividade, que acolham as atividades mais diversas, algumas delas normalmente restritas à esfera privada, como o cozinhar e o descansar. Por consequência, a apropriação desses espaços estimula intercâmbios entre os moradores e criação de vínculos que constituem a vida comunitária. Destaca-se os pequenos espaços comunitários em meio nível que criam uma esfera mais íntima, em contraposição as varandas que funcionam como uma extensão das moradias, além de serem espaços propícios ao encontro e o convívio.

unidades unifamiliares 3 dormitórios 2 dormitórios 1 dormitórios estúdio estúdio adaptado unidades compartilhadas 3 dormitórios 2 dormitórios estúdio estúdio adaptado arranjo de estúdios em coabitação espaços comunitários internos nos estúdios em coabitação externos

COMPARTILHAMENTO O projeto propõe diferentes escalas de coletividade no interior das unidades de coabitação, respeitando a privacidade dos moradores e os respectivos desejos de vida comunitária. Assim, se propõe apartamentos compartilhados de dois ou três dormitórios, em uma forma de habitar mais coletiva, em que o espaço privado se restringe aos dormitórios. Já nos “estúdios em coabitação” há uma significativa vida comunitária, porém com maior privacidade. Foram propostos 3 destes arranjos no conjunto habitacional, com 4 ou 6 estúdios cada e uma área compartilhada com uma cozinha comunitária e espaço de estar, além de uma varanda coletiva em dois destes complexos. Dessa forma, os espaços comunitários são uma expansão desses estúdios e pequenas comunidades são formadas. 99


FLEXIBILIDADE

Propõe-se que as unidades habitacionais possam ser alteradas conforme a necessidade dos moradores. Dessa forma, por exemplo, duas unidades de dois dormitórios podem se tornar uma unidade de 1 dormitório e outra de 3 dormitórios, intercambiando os quartos e mantendo as áreas hidráulicas. Estas reconfigurações são possíveis graças aos grandes vãos da laje nervurada cogumelo e pelas prumadas (shafts) de dimensões consideráveis que permitem futuras alterações nas unidades.

100


CONJUGAÇÃO

Ao pensar nos inúmeros arranjos familiares existentes, se pretende complementar a variação tipológica com unidades unifamiliares que possam ser conjugadas. Para ilustrar, os avós idosos que moram com seus filhos e netos poderiam ter sua unidade própria de 1 dormitório conjugada com o apartamento do restante da família. Assim, os idosos estão próximos de sua família, mas mantêm sua intimidade.

101


ÁREAS DO CONJUNTO HABITACIONAL

UNIDADES

TIPOLOGIA bloco A

bloco B

102

ÁREA COMPUTÁVEL

ÁREA TOTAL

QUANTIDADE

Estúdio Estúdio Acessível 1 dormitório 2 dormitórios_1 2 dormitórios_2 3 dormitórios 2 dormitórios compartilhado 3 dormitórios comparttilhado

35,50 m2 47,50 m2 46,65 m2 60 m2 54,5 m2 66,70 m2 58, 00 m2 71,80 m2

42 m2 56,60 m2 55,60 m2 73,40 m2 64,55 m2 79,00 m2 66,85 m2 85 m2

5 3 3 5 3 5 5 3

Conjunto de estúdios em coabitação Estúdio_1 Estúdio_2 Espaços coletivos

35,50 m2 29,60 m2 65,75 m2

35,50 m2 29,60 m2 105 m2

2 1

Estúdio Estúdio Acessível 1 dormitório 1 dormitório_2 2 dormitórios_1 2 dormitório_2 3 dormitórios

34,55 m2 43,70 m2 40,4 m2 43 m2 56,40 m2 58,50 m2 68,55 m2

46,00 m2 54,70 m2 50,30 m2 53,00 m2 70,85 m2 75,25 m2 88,45 m2

4 2 2 2 2 2 2

Conjunto de estúdios em coabitação Estúdio _1 Estúdio _2 Estúdio Acessível Espaços coletivos

25,70 m2 28,50 m2 37,80 m2 44,00 m2

25,7 m2 28,50 m2 37,80 m2 122,85 m2

2 1 1


ÁREA COMPUTÁVEL

TIPOLOGIA

ÁREA TOTAL

QUANTIDADE

bloco C Estúdio 1 dormitório_1 1 dormitório_2 2 dormitórios 3 dormitórios 2 dormitórios compartilhado 3 dormitórios compartilhado

35,20 m2 46,70 m2 48,85 m2 59,85 m2 85,15m2 57,50 m2 70,30 m2

40,85 m2 55,50 m2 57,35 m2 73,4 m2 99,50 m2 68 m2 86,3 m2

2 1 2 4 3 4 1

Conjunto de estúdios em coabitação Estúdios Espaços coletivos

30,00 m2 180,6 m2

38,80 m2 180,6 m2

6

O CONJUNTO HABITACIONAL NO TOTAL 79 unidades: 34% apartamentos comunitários 66% apartamentos unifamiliares 7,5% apartamentos acessíveis para cadeirante 21 variações tipológicas: Estúdios Estúdios acessível 1 dormitório 2 dormitório 3 dormitório

2 4 4 3 3

Área total computável do conjunto habitacional: Área total de espaços comunitários: Área de espaços comunitários/unidade:

Estúdios em coabitação Estúdio acessível em coabitação 2 dormitórios compartilhados 3 dormitórios compartilhados

4 1 1 1

12100 m2 6590 m2 83,4 m2 103


1. acesso habitação 2. depósitos de resíduos recicláveis e não reciclaveis 3. área técnica 4. recepção 5. café 6. convivência 7. loja 8. sala de manutenção 9. bicicletário 10. foyer cinema 11. bilheteria 12. balcão de comidas e bebidas 13. sala de cinema

739,38

739,75 1

2 3

739,58

740,11 739,07 740,47 4

5

741,00

6 739,07

737,30 737,35

737,20

737,32 13

737,30

3

737,30

7

10

737,29

11 12

1

737,27

737,26

737,30 4

8

3

9 1

2

737,24

2 737,09

737,95 738,67 739,32

primeiro pavimento

104

01

10

20

741.34


14. coworking 15. sala de reunião 16. sala de trabalho alugada 17. terraço coworking 18. exposição 19. espaço multiuso 20. convivência 21. espaço de leitura

15 16 14

17

18

18

19

20

21

segundo pavimento 742,47m

01

10

20

105


1. coworking 2. sala de reunião 3. sala de trabalho alugada 4. terraço coworking 5. sala de dança 6. depósito dança 7. guarda-figurino 8. convivência 9. vestiário 10. depósito de limpeza 11. copa 12. mezanino cinema 13. sala de projeção 2 3

1

4

13

5

7

6

12 5

8 9

10 9

terceiro pavimento 745,53m 106

11

01

10

20


14. coworking 15. sala de reunião 16. sala de trabalho alugada 17. terraço coworking 18. convivência 19. secretaria administração 20. sala de reunião 21. almoxarifado 22. administração

15 14

16

17

22

18 19

21 20

quarto pavimento 748,59m

01

10

20

107


1. academia 2. lavanderia comunitária 3. salão de crianças 4. espaço multiuso com churrasqueira 5. ateliê 6. espaço multiuso 7. salão de jogos 8. playground

1

2

3

8 7

4

5

quinto pavimento 751,65m 108

6

01

10

20


9. estúdios em coabitação 10. espaço multiuso

9

9

9

10

sexto pavimento 754,71m

01

10

20

109


1. estúdios em coabitação 2. espaços multiuso

1

2

sétimo pavimento 757,77m 110

01

10

20


PRODUCED BY AN AUTODESK STUDENT VERSION

PRODUCED BY AN AUTODESK STUDENT VERSION

3. estúdios em coabitação 4. espaço de trabalho 5. espaços multiuso

3

5

4

oitavo pavimento 760,83m

01

10

20

111


1. cozinha comunitĂĄria 2. lavanderia

1

2

1

nono pavimento 763,89m 112

01

10

20


3. biblioteca comunitĂĄria

3

dĂŠcimo primeiro pavimento 770,01m

01

10

20

113


recepção administração espaço de leitura

corte AA 114

lojas espaço multiuso escola de dança


av. são joão

exposição convivência

coworking café e recepção

01

10

20

115


corte BB 116


0 1

5

10

117


corte CC 118


0 1

5

10

119


corte DD com fachada 120


0 1

5

10

121


corte EE 122


0 1

5

10

123


fachada Av. São João 124


0 1

5

10

125


fachada Frederico Steidel | Vila Adelaide 126


0 1

5

10

127


Estúdio adaptado 43,70 m2

2 dormitórios e estúdio conjugados 59,85 m2 | 35,20 m2

ampliações esc. 1-200 128


1 dormitรณrio 46,65 m2

3 dormitรณrios para uso compartilhado 71,80 m2

0

1

5

10

129


Pequenos espaços comunitários em meio nível: usos múltiplos e maior intimidade 130


131


Varandas como extensões das unidades habitacionais: espaços comunitários de lazer, estar, convivio, descan 132


nso, estudo 133


Espaรงos de coworking no segundo pavimento, internos e externos: os terraรงos conectados por escadas pode 134


em acolher reuniĂľes breves, informais 135


136


considerações finais

Ao longo do processo de realização do trabalho procurou-se por meio de espaços compartilhados, repensar a moradia e as interações sociais criadas nas esferas coletivas e privadas. Para tanto a base de pesquisa bibliográfica e projetual, tanto histórica quanto contemporânea, foi essencial para a análise e desmitificação das distintas formas de habitação compartilhada hoje existentes e para a definição do escopo do projeto e os partidos adotados. Da mesma forma, a escolha do lugar na cidade foi fundamental para definição do programa e o desenvolvimento do exercício de projeto. Espera-se que essa proposta de intervenção nas quadras elegidas, se construída, atribua significado ao espaço e o torne lugar de vivência urbana. Assim como, os diversos espaços comunitários propostos na habitação adquiram sentido com a apropriação pelos moradores, estimulando a vida em comunidade. Por fim, este exercício de projeto se exerceu em uma nova fronteira. Dessa maneira, a proposta se coloca sobretudo como uma reflexão sobre um possível morar comunitário, em um futuro não tão distante na cidade de São Paulo.

“(...) a casa é quem a habita, é ‘ele mesmo’.” Lina Bo Bardi. Na Europa a casa do homem ruiu. 1947.7. 137


referências bibliográficas

ANDO, Tadao. Tadao Ando Arquiteto. São Paulo: BEI Comunicação, 2010. 369 p. AHN, Je; TUSINSKI, Olivia; TREGER, Chloe. Viver mais perto no passado. Revista PLOT, Mundos Compartilhados, Redefinir os limites da habitabilidade. São Paulo, n 50, p. 152-159, set/ out.2019. BO BARDI, Lina. Na Europa a casa do homem ruiu. In: GRINOVER, Marina; RUBINO, Silvana. Lina por escrito. Textos escolhidos de Lina Bo Bardi. São Paulo: Cosac Naify, 2009. 208 p. CALLIARI, Mauro. Espaço público e urbanidade em São Paulo. São Paulo: Bei Comunicação, 2016. 207 p. CURTIS, WIlliam. Arquitetura e Revolução na Rússia. In: ______. Arquitetura moderna desde 1900. Porto Alegre: Bookman, 1996. p.201-215. FERNÁNDEZ PER, Aurora. Next collective housing in progress: density, intensity, uses, location, types, details. Vitoria Gasteiz: a + t architecture publishers, 2010. MEDINA, Florencia; KOMMERS WENDER, Rodrigo. Editorial – Mundos Compartilhados. Revista PLOT, Mundos Compartilhados, Redefinir os limites da habitabilidade. São Paulo, n 50, p. 1-3, set/out.2019. FUJITA, Emiko (editor). JA: The Japan Architect, Tokyo, n. 111, Autumn, 2018. KOPP, Anatole. Quand le moderne n’ était pas un style mais une cause. Paris: Ecole nationale supérieure des beaux-arts, 1988. 333p. LACOL; LA CIUTAD INVISIBLE. O projeto arquitetônico

138

das cooperativas de habitação. Revista PLOT, Mundos Compartilhados, Redefinir os limites da habitabilidade. São Paulo, n 50, p. 42-43, set/out.2019. MAAK, Niklas. Living Complex – From Zombie City to the New Communal. Munique: Hirmer, 2015. 240 p. OIKONOMAKIS, Ilias. Domestic Conflicts. Forms of living in metropolitan London. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Desenho Urbano) - AA Projective Cities, Architectural Association Graduate School. Londres, Junho/2017. 215p. Disponível em: < https://issuu. com/projective/docs/domestic_conflicts >. Acesso em: 4 set. 2019. PEREYRA; Irene. One Shared House. [Entrevista concedida a Lisa Naudin]. Revista PLOT, Mundos Compartilhados, Redefinir os limites da habitabilidade, São Paulo, n 50, p. 10-19, set/out.2019. SÃO PAULO. Nº 16.050 de 31 de julho de 2014. Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo. São Paulo, SP, 2014. Disponível em: < https://gestaourbana. prefeitura.sp.gov.br/arquivos/PDE-Suplemento-DOC/ PDE_SUPLEMENTO-DOC.pdf >. Acesso em 20 jul. 2020. ARTIGOS EM SITES ARCHDAILY. Coop Housing at River Spreefeld / Carpaneto Architekten + Fatkoehl Architekten + BARarchitekten. 17/01/2015. Disponivel em: <https:// www.archdaily.com/587590/coop-housing-projectat-the-river-spreefeld-carpaneto-architekten-fatkoehlarchitekten-bararchitekten >. Acesso em: 16 set. 2019. CABRAL, Eloá. Coworking e coliving – Aspectos jurídicos na era da economia compartilhada. Jusbrasil/ Disponível em: <https://eloacabral.jusbrasil.com.br/ artigos/611158415/coworking-e-coliving?ref=serp>. Acesso em: 10 jul. 2020.


Cinema Circular. Revista Acrópole, ano 28, n. 336, p. 32-33, janeiro 1967. Disponível em: < http://www. acropole.fau.usp.br/edicao/336/28>. Acesso em: 19 nov. 2019. GAITSH, Sophie. L’habitat du futur sera partagé. Le Temps, 01/12/2015. Disponível em: < https://www. letemps.ch/lifestyle/lhabitat-futur-sera-partage >. Acesso em: 10 set. 2019. HATHERLEY, Owen. Communal Living – forget stereotypes, it could solve the UK’s housing crisis. The Guardian, 30/10/12. Disponível em: < https:// www.theguardian.com/commentisfree/2012/oct/30/ communal-living-answer-uk-housing-crisis >. Acesso em: 4 set. 2019. KASA 99. Disponível em< http://kasa.com. br/#apartamentos >. Acesso em: 24 set. 2019 MAIRS, Jessica. World’s largest co-living complex promises residents “everything at their fingertips”. Dezeen, 28/04/2016. Disponível em: < https://www. dezeen.com/2016/04/28/collective-old-oak-commonco-living-plp-architecture-willesden-junction-londonhousing/ >. Acesso em: 25 ago. 2019. MARRA, Renan. Novo estilo de moradia compartilhada, coliving é tendência em São Paulo. Folha de S.Paulo, 25/11/2018. Disponível em: < https://www1.folha.uol. com.br/sobretudo/morar/2018/11/1984613-novoestilo-de-moradia-compartilhada-coliving-e-tendenciaem-sao-paulo.shtml >. Acesso em: 24 set. 2019 MÜLLER SIGRIST. Residential and commercial settlement Kalkbreite, Zurich. Disponível em:< http:// www.muellersigrist.ch/arbeiten/bauten/wohn-undgewerbesiedlung-kalkbreite-zuerich/ >. Acesso em: 8 set. 2019.

ONE SHARED HOUSE 2030. Disponível em: < http:// onesharedhouse2030.com/results/ >. Acesso em: 25 abr. 2020. PLP ARCHITECTURE. The Collective Old Oak – London, UK. Disponível em: < https://www.plparchitecture.com/ the-collective-old-oak.html > Acesso em: 25 ago. 2019. PULICE, Carolina. Imóveis: a onda do coliving veio para ficar? Exame, 20/09/2017. Disponível em: < https://exame.abril.com.br/seu-dinheiro/imoveis-aonda-do-coliving-veio-para-ficar/ >. Acesso em: 24 set. 2019. SIEGFRIED, Samanta. Zürcher Kalkbreite: As in the village - but in the city. Tages Woche, 18/02/2015. Disponível em: https://tageswoche.ch/gesellschaft/ zuercher-kalkbreite-wie-im-dorf-aber-in-der-stadt/ >. Acesso em: 24 set. 2019. SPACE 10. Can shared living improve our mental healh and wellbeing? Medium, 17/05/2018. Disponível em: < https://medium.com/space10/canshared-living-improve-our-mental-health-and-wellbeingff5498b02d4a >. Acesso em: 31 out. 2019. STEWART, Matthew. The Collective is Not a New Way of Living – It’s an Old One, Commodified. Failed Architecture, 2/12/2016. Disponível em: < https:// failedarchitecture.com/the-collective-is-not-a-new-wayof-living-its-an-old-one-commodified/ >. Acesso em: 31 out. 2019 THOELE, Alexander. Um prédio para pessoas que gostam de compartilhar. Swiss Info, 11/10/2014. Disponível em: < https://www.swissinfo.ch/por/ arquitetura-ecológica_um-prédio-para-pessoas-quegostam-de-compartilhar/41074802 >. Acesso em: 24 set. 2019.

139


referências de projeto Projetos que foram importantes referências, além dos já mencionados ao decorrer do trabalho.

140

Herzberg Public Housing. AllesWirdGut Architektur + feld72. Viena, Áustria. 2011. Disponível em:< https://divisare.com/projects/259743feld72-alleswirdgut-architektur-hertha-hurnaus-socialhousing-120-units>. Acesso em: 25 nov. 2019

Conjunto Habitacional do Jardim Edite. MMBB Arquitetos e H+F Arquitetos. São Paulo, Brasil. 2013. Disponível em: < https://www.archdaily.com.br/br/01134091/conjunto-habitacional-do-jardim-edite-slashmmbb-arquitetos-plus-h-plus-f-arquitetos >. Acesso em: 14 abr. 2020.

L’Arbre Blanc Residential Tower. Sou Fujimoto Architects, Dimitri Roussel, Manal Rachdi OXO architects, Nicolas Laisné. Montpellier, França. 2019. Disponível em:<https://www.archdaily.com/918762/ larbre-blanc-residential-tower-sou-fujimoto-architects-plusnicolas-laisne-plus-oxo-architects-plus-dimitri-roussel>. Acesso em: 19 jul. 2020

International Dorm-City. On Design. Kanagawa, Japão. 2019 Disponível em:<http://www.ondesign.co.jp/city/2994/>. Acesso em: 19 jul. 2020


Concurso Moradia Estudantil da Unifesp Osasco. H+F Arquitetos. Osasco, Brasil. 2015. Disponível em: < https://www.archdaily.com.br/ br/764878/primeiro-lugar-no-concurso-para-moradiaestudantil-da-unifesp-osasco-herenu-plus-ferroniarquitetos >. Acesso em: 14 abr. 2020.

Centro Paula Souza. Spadoni AA + Pedro Taddei Arquitetos Associados. São Paulo, Brasil. 2013. Disponível em: < https://www.archdaily.com.br/ br/769776/paula-souza-center-spadoni-aa-plus-pedrotaddei-arquitetos-associados >. Acesso em: 14 abr. 2020.

Sede do SEBRAE. gruposp + Luciano Margotto. Brasília, Brasil. 2010. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/01-402/ sede-do-sebrae-gruposp >. Acesso em: 30 maio 2020.

ANIS Office Building. DREAM + Nicolas Laisné. Nice, França. 2018. Disponível em: <https://www.archdaily.com/916756/anisoffice-building-dream-plus-nicolas-laisne>. Acesso em: 30 out. 2020.

141


FAU USP | 2020


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.