Manual de Jornalismo para Rádio TV e Novas mídias Heródoto Barbeiro Paulo Rodolfo de Lima JORNALISMO MULTIMÍDIA DIREÇÃO DE REPORTAGEM WEBJORNALISMO PRODUÇÃO DE PROGRAMAS CONDUÇÃO DE ENTREVISTAS TÉCNICAS DE REDAÇÃO E EDIÇÃO
Sumário Capa Folha de rosto Cadastro Copyright Dedicatória Agradecimentos Nossa proposta Apresentação Prefácio 01. A ética Sugestões Para Conduta Ética O Jornalista E As Fontes Exercícios Propostos Sugestão De Leitura Dicas De Filmes
02. A lei e a liberdade de imprensa Exercícios Propostos
Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
03. De onde vem a notícia Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
4. Jornalismo na web e liberdade Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
05. O poder da mandala Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
06. O príncipe eletrônico A Tecnologia E A Mão De Obra As Novas Ferramentas Jornalismo Multimídia Rádio E Texto Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
7. Os donos do jornalismo Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
08. O chefe do jornalismo Sugestões Para A Atuação Do Diretor De Jornalismo
Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
09. O editor-chefe Características Da Função De Editor-Chefe Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
10. Os jornalistas Exercícios Propostos Sugestões De Livros Dicas De Filmes
11. A reportagem Exercícios Propostos
12. Ancoragem e apresentação Orientações Para O Âncora Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
13. Atores ou jornalistas Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
14. A entrevista Orientações Para A Entrevista Exercícios Propostos Sugestões De Leitura
Dicas De Filmes
15. A pauta Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
16. A produção Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
17. O texto para rádio, TV e internet Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
18. A edição Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
19. Esportes Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Sugestão De Filmes
20. A redação A Prestação De Serviços Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
21. O jornalismo e os direitos humanos Exercícios Propostos Sugestões De Leitura Dicas De Filmes
22. O jornalismo e a sustentabilidade Exercícios Propostos Sugestões De Leituras Dicas De Filmes
Referências Bibliografia
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B187m Barbeiro, Heródoto, 1946Manual de Jornalismo para Rádio, TV e Novas mídias / Heródoto Barbeiro, Paulo Rodolfo de Lima. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.
216 p.: 23 cm ISBN 978-85-352-5335-1 1. Barbeiro, HerĂłdoto, 1946-. 2. Telejornalismo - Manuais, guias, etc. 3. Radiojornalismo - Manuais, guias, etc. 4. Jornalismo - Brasil. 5. Jornalistas - Brasil. I. Lima, Paulo Rodolfo. II. TĂtulo. 12-8283 CDD: 070.4 CDU: 070 12.11.12 14.11.12 040624
Dedicatória
A todos que estão atentos às mudanças do seu tempo, sem esquecer jamais que os limites do jornalismo são a ética, a isenção e a presunção de inocência.
Agradecimentos Gostaríamos de agradecer a Sandra Guimarães de Moraes e Daise Moraes pelo apoio na produção deste livro.
Nossa proposta “O jornalismo é o exercício diário da inteligência e a prática cotidiana do caráter” Claúdio Abramo
Nosso objetivo com a publicação deste livro é incentivar o debate e a reflexão nas universidades e redações de emissoras de rádio e TV, além de diversos outros veículos de mídia espalhados por todo o país que hoje se ocupam com a disseminação da informação, a respeito da qualidade do jornalismo e o impacto das transformações tecnológicas para a profissão. Somos ambiciosos. Pretendemos formar uma nova geração de jornalistas comprometidos com a ética e capacitados para atuar em todos os meios eletrônicos de comunicação, além de fazer com que o leitor entenda quais são os limites éticos do jornalismo e, da mesma maneira, exija uma postura ética dos jornalistas e veículos de comunicação com os quais se relaciona. Por fim, queremos contribuir para que o meio publicitário, responsável pela sustentação econômica das empresas de comunicação, conheça melhor a ética no jornalismo e o processo de produção de notícias profundamente impactado pela fusão das novas mídias.
Apresentação “Um homem que tem algo a dizer e não encontra ouvintes está em má situação. Mas pior ainda estão os ouvintes que não encontram quem tenha algo a dizer-lhes.” Bertold Brecht
O avanço da tecnologia desde o advento da televisão até os dias de hoje, com a expansão da internet, vem provocando mudanças profundas nos rumos da humanidade e tem resultado no processo de convergência das mídias. A sensação de que hoje a vida passa mais rápido do que antigamente tem relação direta com a TV e a internet. Notícias que antes demoravam semanas, dias e horas para chegar ao nosso conhecimento são hoje transmitidas ao vivo, o que aumenta consideravelmente a responsabilidade do jornalista. Dilemas técnicos e éticos da profissão são cada vez mais postos em cheque, daí a necessidade de uma ampla discussão sobre os rumos do jornalismo, não só por jornalistas e empresas de comunicação, mas por toda a sociedade. Esta é a justificativa que usamos para a publicação deste Manual de Jornalismo de Rádio, TV e Novas Mídias, cuja estrutura se apoia nas edições anteriores dos livros Manual de Radiojornalismo e Manual de Telejornalismo, ambos publicados no início dos anos 2000. Incorporamos a este manual as mudanças que foram aprendidas com mais leituras, pesquisa e prática cotidiana. Esperamos que este livro seja uma boa contribuição.
Prefácio 1983: Tenho 11 anos. Chego em casa cheio de novidades para contar e ouço um sonoro psiu de minha mãe. Meu pai estava ali, na sala, lendo o seu jornal. Devidamente posicionado na cadeira confortável, chinelos por perto, o velho (não tão velho assim, confesso) lia isso. E por ler, entenda-se imersão total. O simples relato de uma coxinha suculenta que eu tivesse provado na cantina horas antes poderia fazer com que toda a leitura fosse perdida, afinal, como minha mãe mesmo dizia repetidamente, meu pai estava lendo. Quer teorizar? Ligação emissor-receptor em sua forma mais pura. Vale o mesmo para ouvir o rádio ou assistir TV. Não posso falar, brincar ou fazer barulho. “Menino, seu pai está lendo.” 2012: Chego em casa cheio de novidades para contar e ouço diversos sons direto do quarto de meu filho, de 11 anos. Bato na porta e escuto um hã. Interpreto como algo positivo e entro. Meu moleque (não tão moleque assim, confesso) está de frente para algo que me lembra um painel de controle de alguma aeronave futurista. Um desktop, dois laptops, um iPad, um iPod, um iPod nano, um iPhone, TV, um Xbox 360, um PS3, um Wii, um prato com um sanduíche pela metade, um microfone acoplado a dois fones de ouvido e um controle nas mãos. Se estão todos ligados, não sei; mas acesos com certeza. Dou o primeiro passo e pergunto: — E aí filhão, o que está fazendo? A resposta vem tão pronta quanto seca: — Nada Aprendi no comercial que não basta ser pai e tento participar. Emendo um: — Não vai jogar com o Giovanni hoje? E vem a mensagem quase mediúnica: — Estou jogando com ele. Discretamente, ainda procuro pelo Giovanni atrás da porta e ameaço uma espiadela por baixo da cama, mas entendo a resposta, afinal, sou moderno, pai do século XXI. — Por que vocês não jogam juntos? — Estamos jogando juntos. — Sim, mas digo, assim… Juntos, para poder falar um com o outro. — Estamos falando um com o outro. — Mas, filho, vocês nem se olham. — Papi, ele está aqui na tela, quer falar alguma coisa com ele? Estamos quase zerando o jogo. Ensaio um quase aceno ao Giovanni, que me olha do quarto de cima de meu apartamento por uma câmera que poderia estar em Tóquio, e em alguns segundos interpreto o “Tudo bem, tio?” como um “Dá para deixar a gente jogar?”. Saio discretamente. Vinte e nove anos separam as duas cenas. Tempo para fazer do filho pai e do pai, avô, seguindo a evolução natural da vida. Tempo para revolucionar completamente o modo como emitimos, recebemos e tratamos a informação. A história acima, com maior ou menor grau de variáveis e exatidão, acontece diariamente nas casas de médicos, advogados, professores, padeiros, dentistas, engenheiros, desempregados. Mas afeta,
sobretudo, uma classe específica: os jornalistas. Essa classe, acostumada a ditar normas e opiniões, criada sobre um palco italiano e destinada – até então – a definir o que pensa, quer e consome a maioria da população, agora tem que lidar com a transformação radical do fluxo de informação e suas consequências em seu trabalho diário. É sobre essa transformação radical que afetou os jornalistas e sua relação com o público e os princípios do jornalismo que Heródoto Barbeiro e Paulo Rodolfo de Lima tratam neste livro (ou e-book? ou arquivo?) que você tem em mãos (ou na tela? ou nas telas?) agora. Como bem demonstrou o parágrafo acima, é cada vez mais difícil redigir sem interrogações. Como posso chamar quem lê este texto agora? Leitor? Internauta? Usuário? A pessoa que está do outro lado da página ou da tela? Sim e não. Sim porque você continua lendo e, caso esteja fazendo isso em um meio eletrônico, é um internauta ou usuário de determinado device, mas não posso afirmar que você esteja do outro lado. Ainda que esta não seja uma obra escrita de maneira colaborativa com quem a adquiriu, é impossível prever o quanto as fontes consultadas, opiniões emitidas e fatos narrados foram influenciados por eventuais participações que você possa ter feito em murais, enquetes e demais instrumentos de interatividade. Você saiu do outro lado e misturou-se a estas páginas. Para o jornalista, acostumado desde sempre a buscar audiência, encarar tamanha interatividade não foi nem é tarefa fácil. Principalmente porque o próprio conceito de audiência perdeu força. Audiência vem de áudio, o mais passivo dos sentidos. Quem lê, escreve, fala, vota, grava vídeos, envia fotos, baixa filmes, arquivos em áudio e interfere diretamente na obra com a qual se relaciona é tudo, menos passivo. É qualquer coisa que não audiência. E por qualquer coisa entenda-se um novo termo com o qual os jornalistas passaram a ter que se ocupar: a interência. Este livro faz a ponte entre o que foi audiência e hoje é interência, explicando de maneira didática e eficaz como um transformou-se em outro e quais os efeitos desta transformação. Para além dos profissionais de comunicação, é uma excelente ponte entre os dois meninos de 11 anos e também entre aqueles que virão. Agora, é virar a página ou dar o clique. A viagem apenas começou. Antonio Guerreiro Diretor Geral do R7 Portal da Rede Record
01
A ética “La ética no es una condición ocasional, sino que debe acompañar siempre ao periodismo como el zumbido al moscardón.” Gabriel García Márquez
Ao término da leitura deste capítulo você será capaz de: • Compreender o código de conduta ética que rege o jornalismo. • Promover o debate sobre a conduta ética do jornalista ao elaborar uma reportagem. A ética é uma reflexão crítica sobre a moralidade; ou seja, é um conjunto de princípios e disposições historicamente produzidos voltados para a ação cujo objetivo é balizar as ações humanas. Ela existe como referência para os homens em sociedade, e está associada à ideia de conduta virtuosa e a valores como dignidade, justiça, honestidade, solidariedade. Além disso, ela pode – e deve – ser incorporada por todos como atitude diante da vida cotidiana, mas é preciso ressaltar que não se trata de um conjunto de verdades críticas, imutáveis. A ética se altera historicamente, e para compreendê-la é necessário conhecimento dos movimentos sociais. É importante estar atento para não confundir ética com moral, uma vez que esta é a regulação dos valores e comportamentos considerados legítimos por uma sociedade em determinada época. Trata-se de um fenômeno social particular sem compromisso com a universalidade, com o que é direito de todos os seres humanos. A ética, por sua vez, vincula-se ao conjunto de valores estabilizados na figura de normas e está codificada; portanto, quem não as cumpre está sujeito a punições. A moral é uma excelente servidora da ética, mas é uma péssima senhora dela. Entre moral e ética há uma tensão permanente: a ação moral busca uma compreensão e uma justificativa crítica universal, ao passo que a ética exerce uma permanente vigilância crítica sobre a moral para reforçá-la ou modificá-la. Por exemplo, a morte na fogueira durante a Inquisição era considerado “normal” na Espanha do século XVI, mas essa atitude é inaceitável nos dias atuais. A moral condena andar nu em locais públicos ou ter relações amorosas fora do casamento, já a ética busca refletir antes de formar um juízo e, para isso, levanta questões como: “e se fosse uma sociedade indígena e poligâmica ou poliândrica? Ainda assim esses costumes seriam moralmente condenados?” A ética tem sido o principal balizador do desenvolvimento histórico-cultural da humanidade e sem ela é bem provável que a civilização não tivesse chegado aos parâmetros atuais. Contudo, a ética não basta apenas como teoria e, para garantir seu cumprimento, é necessário que haja consenso e espontaneidade em respeitar esses princípios. A falta de ética acentua a desigualdade e a injustiça social, portanto, não se pode considerar abstratos os efeitos da conduta ética. Ela é mais material do que algumas pessoas supõem, e a aplicação de seus princípios valoriza e reforça a pluralidade e a diversidade, porque plural e diversa é a condição humana. Jornalistas – assim como outros profissionais – necessitam de um código de ética, ou seja, um acordo explícito que estabeleça um compromisso de realizar sua função social de modo compatível com os princípios universais da ética. Tal código é um instrumento frágil de regulação dos comportamentos de seus membros e não pode, coercitivamente, obrigá-los a cumprir seus preceitos; isto é, a pressão é somente de ordem moral. É preciso que o código seja uma convicção dos jornalistas, e sua formulação
deve ter a participação de todos, para que se comprometam com o que foi condensado. O campo da ética não é exclusivo das vontades e do livre-arbítrio de cada jornalista, mas uma construção consciente e deliberada de um conjunto de pessoas em sociedade. Logo, a ética é a aplicação pessoal de um conjunto de valores livremente eleitos pelos jornalistas em função de uma finalidade estabelecida por eles mesmos e considerada boa. Os jornalistas concebem uma deontologia, ou um conjunto de deveres que regulamentam a prática do jornalismo. Por isso, é necessário fazer uma reflexão de tendência universalizante que se desenvolve ao mesmo tempo numa cultura particular. Esses profissionais elegem um Norte que possa guiá-los pelo caminho em que terão de enfrentar questões importantes, como a frágil independência em suas relações com os diversos poderes, a negligência na verificação das informações sob a influência conjugada das leis do mercado, a velocidade da informação e a eficiência dos comunicadores, entre outras. A ética do jornalista deve ser a mesma do marceneiro, ensinou Cláudio Abramo, isto é, a mesma do profissional de qualquer área. Todavia, as circunstâncias nas quais se desenvolve o jornalismo hoje mostram que ele deve ir além: o instrumental teórico e prático à disposição de um jornalista é de tal ordem que é necessário propor condutas éticas específicas. A extrema especificidade do trabalho justifica um ordenamento ético complementar, e transgredir regras morais para se atingir um jornalismo de relevância pode ser ético. Então, no campo jornalístico, os choques entre a ética e a moral são perfeitamente possíveis. Veja, a seguir, algumas sugestões para uma conduta ética.
Sugestões para conduta ética A seguir, você verá uma séria de condutas éticas necessárias ao profissional de jornalismo. Comecemos dizendo que o jornalista só deve dizer a verdade e resistir a todas as pressões que possam desviá-lo desse rumo. Ele não pode guardar para si informação de interesse público e tem a obrigação de buscar sempre a isenção. A isenção deve ser encarada como uma luta diária, uma vez que acompanha as transformações contínuas da sociedade e está submetida às leis que determinam o processo histórico. Em algumas redações, os jornalistas estão mais preocupados em manter o emprego do que em fazer jornalismo e, por isso, não se arriscam a questionar ordens superiores, mesmo que sejam claramente conflitantes com as posturas éticas da profissão. O simples “cumprir a ordem” aos poucos se confunde com o comodismo e é um dos motivos do jornalismo de baixa qualidade e, consequentemente, antiético. A rígida hierarquia da redação contribui para que questionamentos não sejam feitos e anula a capacidade crítica da equipe, o que leva esses profissionais a se eximirem da justificativa de que “apenas cumpriram ordens do chefe”. O mandonismo sub-reptício, não explícito, não escrito, é a maneira mais cruel de se impor uma linha editorial. É uma área cinzenta que incentiva a covardia e a autocensura. Todavia, são fatores como a honestidade do jornalista e do veículo de comunicação no qual ele atua, a sinceridade da análise e do comentário, a isenção para acompanhar, avaliar e fiscalizar as manifestações do poder que asseguram a fidelidade à verdade factual. Boatos e rumores não substituem o fato, logo, o jornalista não pode acreditar em tudo o que ouve e vê. Ele tem o dever ético de duvidar sempre e não pode ser ingênuo a ponto de não perceber que a maioria das notícias afeta interesses. Além disso, quando rumores e fofocas são publicados como notícias precisas, assumem vida própria, e mesmo que não sejam baseados em fatos, geralmente constituem um sofisma e colaboram para reforçar o denuncismo. O jornalista deve saber quais são os limites de seu trabalho, uma vez que a missão de informar também comporta limites, os quais, porém, não podem ser confundidos com cerceamento à liberdade de imprensa. Ele deve ir além da busca dos dois ou mais lados da notícia, ou seja, é preciso investigar, apurar e ter convicção acerca dos fatos relatados, pois apenas ouvir o outro lado é uma forma preguiçosa de fazer jornalismo. Nenhum profissional dessa área está livre de cometer erros, por menores que sejam, mas cabe a ele corrigir qualquer informação errada que venha a divulgar, buscando o melhor meio de reparação. Também é dever ético do jornalista garantir o direito de resposta aos atingidos por suas reportagens. A qualidade do trabalho jornalístico se completa quando reportagens que partem de uma denúncia sólida apresentam provas confirmadas, fontes independentes, e quando são divulgadas sem conclusões apressadas ou com aspectos tendenciosos. Isso se contrapõe às matérias apresentadas como “reportagens investigativas”, mas que, na realidade, se originam de uma única fonte, e também aos rumores ou às repetições de acusações não confirmadas feitas por pessoas anônimas interessadas na divulgação desses fatos. Esse é o caminho mais curto para transformar a redação em um “Tribunal de Inquisição” e a reportagem em um “Auto de Fé”. Portanto, é preciso evitar o uso da clandestinidade ou de outros métodos sub-reptícios de coleta de informações vitais para o público; tais métodos devem ser utilizados apenas como parte da reportagem. É preciso coragem e vigilância para responsabilizar aqueles que têm o poder. Negue tratamento favorável a anunciantes e aos chamados interesses especiais. Dê importância e voz àqueles que não as têm.
A busca da audiência incentiva o jornalista a usar a câmera escondida, mas essa é uma falsa atividade de jornalismo investigativo, uma vez que não é ético gravar entrevista sem o consentimento da pessoa, independente de quem seja. Além de invasão de privacidade, essa atitude põe em risco a integridade dos personagens, que são julgados pela opinião pública por frases isoladas ou declarações truncadas, fora do contexto dos acontecimentos. Em alguns países, essa prática inclusive é ilegal. A tentação de buscar o chocante pode invadir a privacidade dos outros. No afã de conseguir reportagens de impacto, o jornalista às vezes divulga fatos que são irrelevantes para a notícia, mas têm apelos emocionais. É comum pessoas acusadas de praticar um crime serem perseguidas em delegacias e obrigadas a dar declarações ou ter o rosto exibido na TV sem o consentimento. O mesmo tratamento constrangedor não é aplicado a acusados pertencentes à “elite”, que são fortemente protegidos por seus defensores, ou nos casos em que a “ocorrência” envolve um policial, em que prevalece o espírito de corpo e ele é preservado. As principais vítimas dessas situações são as pessoas de classes sociais desfavorecidas. E por haver uma conivência entre policiais e jornalistas para que o acusado seja entrevistado contra a sua vontade, os programas policiais na mídia se aprofundam nessas coberturas em que o jornalista faz o papel de inquisidor. Esse sensacionalismo é contra a missão pedagógica do jornalismo e, por isso, acaba sendo o caminho mais curto para o preconceito. Ao que parece, é a maneira mais rápida de se conseguir audiência, principalmente com a exacerbação da notícia, na qual fundos musicais tenebrosos, apresentação da notícia aos gritos ou com inflexões dramáticas têm como objetivo a conquista da audiência a qualquer custo, mesmo que a história venha a ser desmentida no futuro. As pessoas devem ser respeitadas em suas diversidades de origem, convicção ou opção comportamental, e é dever do jornalista combater o preconceito e procurar ao máximo a objetividade independentemente de em que plataforma trabalhe. A opção sexual das pessoas e a origem étnica têm de ser respeitadas sob pena de se incentivar o ódio contra as minorias, uma vez que cabe às autoridades, e não ao jornalista, julgar o que é ou não uma prática antissocial. Ações de policial ou juiz não fazem parte das atribuições do jornalismo, cabendo a ele apenas acompanhar e divulgar os fatos de interesse social. Em outras palavras, o jornalista denuncia crimes à sociedade, mas quem apura e pune, se for o caso, é o Estado. O profissional de imprensa acompanha o trabalho das autoridades, mas não coopera ativamente, reservando-se a relatar acontecimentos ao delegado, promotor ou outra autoridade somente quando a vida de alguém corre perigo. O caso da Escola Infantil Base, em São Paulo, é emblemático. Nesse episódio, em que os quatro sócios donos da escola foram acusados de pedofilia, os jornalistas assediaram autoridades e assistiram aos interrogatórios em que os direitos dos acusados foram violados e não divulgados à sociedade. Alguns deles revestiram-se de autoridade policial e ajudaram a aprofundar as injustiças cometidas contra os acusados, que posteriormente provaram ser inocentes. A reviravolta só foi possível quando o jornalista Florestan Fernandes Jr., da TV Cultura, resolveu investigar a fonte primária da notícia: o delegado. Qualquer pessoa acusada de delito goza da presunção da inocência até que a sua culpabilidade seja legalmente comprovada, ou seja, a condenação só é decretada após o julgamento. Até então, há suspeitos, denunciados, indiciados, acusados ou réus, e a reportagem não pode parar na porta da delegacia quando algum suspeito é preso. É preciso acompanhar o desenrolar e a conclusão do inquérito ou do processo, se houver. Há críticas procedentes de que a imprensa não dá destaque para a inocência do acusado, como se tal fato não fosse relevante para a opinião pública. Além disso, a informação escandalosa sobre determinado delito atribuído a um acusado pode influenciar um júri popular e levá-lo a condenar um
inocente. Não se deve identificar etnia, crença religiosa, profissão, sexo, nacionalidade e afiliação política das pessoas se tais particularidades forem constrangedoras ou nada acrescentarem à notícia. Além disso, detalhes escabrosos de chacinas e crimes sexuais não devem ser divulgados, pois a omissão, nesses casos, não significa descompromisso com a informação, mas respeito às vítimas da violência e ao público. Entretanto, a facilidade das transmissões ao vivo, com o uso de helicópteros, leva a mídia a cobrir rebeliões e outros eventos que mostram cenas horripilantes no meio da tarde. Não se deve divulgar notícias que ensinam a cometer o crime, como construir bombas, assaltar bancos ou sonegar impostos, tampouco aquelas que ajudam a criar uma imagem simpática ou romântica de criminosos; e o mesmo vale para valores de pagamentos de resgates. Com relação às drogas, divulgar o valor de um carregamento apreendido resulta em incentivo para que se descubra nessa prática uma via ilícita de enriquecimento. O ideal seria divulgar quantas pessoas poderiam morrer em decorrência de overdoses proporcionadas pelo carregamento apreendido. É uma mudança qualitativa no combate às drogas. Os programas jornalísticos não exibem o consumo de drogas ilícitas nem qualificam os dependentes químicos de drogados. Noticia-se o suicídio como um fato social qualquer, não se dando a ele dimensão maior do que o acontecimento, e não se deve jamais transmitir um acontecimento desses ao vivo. O exemplo mais conhecido na TV foi no antigo programa Aqui Agora, do SBT. Em uma de suas edições uma pessoa prometia se atirar de um prédio caso uma equipe do programa fosse até o local… O que aconteceu? A equipe foi e a pessoa se jogou do edifício. Não há comprovação científica de que a divulgação de suicídios possa incentivar atentados contra a vida, mas o respeito ao ser humano também faz parte dos limites do jornalismo. Deve-se ter muita sensibilidade ao lidar com crianças e fontes inexperientes. Compaixão não atrapalha a divulgação da verdade, portanto, livre-se do complexo de Torquemada1, líder da Inquisição Espanhola, perseguidor de hereges, judeus, bruxas etc. É bom saber que a lei proíbe a divulgação de nome, apelido, filiação, fotografia, parentesco e residência de menor de 18 anos envolvido em atos infracionais, e também não é recomendável a divulgação de nomes de crianças e adolescentes em situação de constrangimento. A palavra “menor” não deve ser usada porque seu sentido é pejorativo, e a própria mídia criou o termo “menor infrator”, o que acabou generalizando crianças e adolescentes abandonados. As iniciais dos nomes também não devem ser usadas, pois nada acrescentam à notícia. De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, criança é toda pessoa com idade até 12 anos incompletos, ao passo que adolescente é todo aquele com idade entre 12 anos completos e 17 anos incompletos. Os institutos que zelam por esses direitos costumam identificar como “jovem” o cidadão na larga faixa etária dos 15 aos 24 anos. Em termos jornalísticos, é melhor chamar de “jovens” apenas aqueles já maiores de idade. Além disso, tem direito ao anonimato toda pessoa vítima de violência e humilhação, como estupro, ou envolvida em situação infamante. Divulgar o nome é punir a vítima, exceto quando a pessoa abre mão espontaneamente dessa proteção ou quando há exigência excepcional de interesse público. É preciso tomar cuidado com a história saborosa, sensacionalista sobre um conflito familiar que envolve promiscuidade sexual e o suicídio de uma jovem. Ela pode, por um lado, transformar-se em entretenimento para milhares de pessoas e, por outro, prejudicar a família da vítima, na medida em que esta é forçada a ver os seus problemas mais íntimos divulgados em público. Pessoas envolvidas em atividades ilícitas não têm direito à privacidade em assuntos relacionados a essa ocupação. Cidadãos que têm vida pública perdem, pelo menos em parte, o direito à privacidade, mas o jornalista, porém, não deve avançar além do que for relevante para o conhecimento da sociedade. O jornalista é um espectador da cena na qual se produzem os acontecimentos e, portanto, está
distanciado dos fatos e das histórias sem prejuízo da observação pessoal. Na realidade, a vedete é a notícia, não o jornalista. Ele não deve colocar a vida das pessoas em risco, ainda que isso impeça a divulgação de uma reportagem, uma vez que o direito à vida está acima de tudo. Prevalece o artigo da Declaração Universal dos Direitos do Homem, segundo o qual todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Casos de sequestro, por exemplo, não devem ser divulgados quando houver pedido da família, de autoridades ou a convicção de que a divulgação vai colocar em risco a vida da pessoa sequestrada. Isso, entretanto, não deve ser motivo para que o profissional de imprensa abandone a apuração. O jornalista, como qualquer outro cidadão, tem o direito de escolher religião, partido político, ideologia, time de futebol etc., e não deve esconder de ninguém suas preferências, tampouco instrumentalizar e permitir que outros o façam sob qualquer pena. Todavia, é necessário é necessário separar as atividades pessoais das profissionais e distinguir em que momentos uma pode interferir na outra, portanto, ele não deve, no exercício da profissão, fazer propaganda política ou declarações de apoio a líderes ou grupos partidários e religiosos. Ele deve recusar funções incompatíveis com o código de ética da profissão, bem como ligações com o governo, empresários, publicidade, assessoria de imprensa, relações públicas e vínculos com poderes privados e oficiais que provoquem conflitos de interesse, visto que transgredir essa norma resulta em perda de credibilidade. É incompatível, por exemplo, que um repórter esportivo seja assessor de imprensa de um clube de futebol ou que um analista econômico de determinada emissora seja membro de qualquer associação comercial, pois não se consegue divulgar notícias contra o próprio patrão impunemente, seja ele formal ou informal. Um dos dilemas éticos mais comuns entre os jornalistas brasileiros é o conflito de interesses provocado pelo segundo emprego, geralmente em assessorias de imprensa públicas ou privadas. Pedir favores pessoais a essas empresas pode contribuir para a perda da independência; ou seja, se o telefone de sua casa não funciona, não ligue para o assessor de imprensa da companhia telefônica pedindo para facilitar o conserto. Ele deve estar atento aos presentes que recebe, pois brindes aparentemente inocentes podem criar uma relação de privilégio com o presenteador. O “jabá”, jargão jornalístico para presentes, pressupõe troca. Aceitar convite para almoçar, sim; trocá-lo pela veiculação de uma notícia, não; aceitar uma garrafa de vinho no final do ano, sim; trocá-la por uma entrevista, não. O mais importante é considerar que não há presentes desinteressados, pois não é possível haver amizade entre fonte e jornalista. Determinados setores dos poderes políticos e econômicos esforçamse para cooptar o jornalista e, para isso, dispõem de instrumentos poderosos, que vão da oferta de dinheiro, cargos e presentes, até ameaças de perda de emprego. Entretanto, ele precisa manter uma atitude independente e crítica perante os poderes estabelecidos. Ninguém que faz jornalismo pode negligenciar essas pressões, materializadas em sorrisos e olhares ameaçadores, mas o profissional dessa área precisa administrar essa situação a fim de preservar sua independência. Em casos extremos, deve-se optar por mudar de profissão. Essa pressão pode ser exemplificada pela frase atribuída ao político Antônio Carlos Magalhães, sobre a qual precisamos refletir: “Não dê notícia a jornalista que quer dinheiro, e não dê dinheiro a jornalista que quer notícia.” O jornalista não promete a veiculação de reportagens em troca de publicidade, pois o critério para que uma reportagem vá ao ar é o interesse público. Fere a ética o jornalista que deixa o patrocínio afetar o conteúdo e a apresentação da notícia, e ainda que a pressão do departamento comercial seja legítima, é preciso resistir a ela. É bom lembrar sempre que o limite entre o departamento comercial e o de jornalismo deve ser definido com clareza pela empresa; além disso, é importante ressaltar que o editorial
não está à venda e que eventos comerciais merecem cobertura desde que contenham notícias, pois a troca de patrocínio por divulgação jornalística compromete a credibilidade. A isenção da reportagem pode ficar comprometida se depender do suporte econômico de empresas patrocinadoras de eventos. Nas viagens feitas à custa de empresas privadas ou do governo, o jornalista deve informar ao público oralmente, ou no gerador de caracteres, que a reportagem foi feita a convite de determinada pessoa ou instituição. O texto publicitário não deve ser confundido com o jornalístico. Aquele tem o objetivo explícito de vender um produto, ao passo que este não vende produto nenhum, a não ser a própria notícia. Qualquer espaço que o departamento comercial venda deve estar isento de qualquer motivo, exceto o de informar seus consumidores. O jornalista não deve participar de comerciais nem empenhar sua credibilidade ou opinião para vender determinado produto, quer seja publicidade privada, quer seja governamental, mas isso não o impede de participar de campanhas de interesse social e comunitário sem fins lucrativos. Não se empresta a imagem e a voz para nenhum outro produto da emissora que não seja o jornalístico, sob pena de comprometimento da credibilidade. O jornalista não pode receber nenhum favor do Estado, seja na isenção de impostos, ofertas de empregos ou qualquer outro privilégio. Mesmo se uma isenção de tributos parecer algo difuso, que não compromete individualmente ninguém, a opinião pública conhecedora do fato vai reagir de maneira negativa. A Constituição de 1946 isentava os jornalistas de pagarem imposto de renda, e há também exemplos de isenção de impostos para advogados, recolhimento de percentual de custas para a associação de magistrados, entre outros. A independência no jornalismo exige evitar conflitos de interesse e até a aparência de conflitos de interesse, principalmente aqueles que envolvam favorecimentos econômicos para si ou para a empresa na qual se trabalha. Por exemplo, aceitar a cortesia do test drive por um mês é um conflito de interesse. Não basta ter credibilidade, é preciso também aparentá-la. A aparência de conflito de interesses deve ser evitada, uma vez que nela está a confiança do público e tendo em vista que esses conflitos nem sempre são absolutos. Assessores de imprensa não praticam jornalismo, ainda que tenham título, pois estão apenas comprometidos com a empresa para a qual trabalham, não com a opinião pública. Assim, não é possível ser isento quando o objetivo é divulgar somente fatos favoráveis à imagem de pessoas e instituições privadas ou públicas, ou amenizar os danos provocados por denúncia comprovada. O jornalista não agradece o recebimento de convites no ar nem diz que foi convidado para isso ou aquilo. Agradecimentos só em casos excepcionais, em nome do interesse público. A divulgação de nomes de empresas, instituições e pessoas só deve ser feita se estiverem ligados à reportagem e, nessas questões, que não têm regras rígidas, deve-se sobrepor o critério jornalístico e também o bom-senso. O som e a imagem podem enganar as pessoas, portanto, não é ético usar recursos sonoros ou audiovisuais para induzir a pessoa a acreditar em alguma coisa que não está acontecendo. Além disso, não se admite alteração ou distorção no conteúdo da fala ou da imagem do entrevistado, e as correções devem ser limitadas aos erros efetivos ou falhas na gravação. A manchete de uma reportagem deve corresponder ao fato e, também, não se pode anunciar um conteúdo inexistente apenas para prender a atenção das pessoas e aumentar a audiência. Mas, infelizmente, existem técnicas para divulgar notícias que tentam esconder a informação. Uma delas é a manchete às avessas, encomendada para divulgar ações de grupos políticos e econômicos, cifras enganosas que os jornalistas não conseguem identificar, entre outras coisas, com intenção de destacar apenas o que interessa ao poder. Outra técnica é o lead às avessas, que nada mais é do que deixar o
essencial para os últimos segundos da matéria, dando pouca importância a aspectos negativos e pinçando um lado positivo para dar destaque a ele ou, então, desenvolver amplas matérias com caráter positivo para que as coisas consideradas negativas não tenham tempo nem espaço para serem levadas ao ar. O jornalista deve ser claro na distinção entre fato e comentário, e o veículo tem de ser honesto com o público, ainda que a linha editorial seja marcadamente favorável a determinado fato ou opinião. Não se admitem vetos de qualquer ordem que impeçam a participação nos programas de pessoas diretamente envolvidas no noticiário ou na reportagem; ou seja, o espaço deve ser aberto a todos os que têm notícia para dar ou são parte dela em reportagens. A separação entre notícia e entretenimento deve ser evidente, e o compromisso do jornalista é com a notícia correta, de qualidade e, portanto, ética, e não com o entretenimento. Este deve ser objeto de outros programas da emissora. O jornalista não precisa dizer que está onde não está, uma vez que não depõe contra a reportagem dizer que determinada informação ou narração de evento está sendo feita em off tube, ou seja, quando a informação é dada apenas com base nas imagens recebidas pelo estúdio, sem que o jornalista esteja presente no local do fato… Outro ponto importante é que ofensas contra autoridades devem ser levadas ao conhecimento do público por meio de declarações diretas dos entrevistados e, nesses casos, o texto – ou off – do repórter não deve reproduzir frases ofensivas mesmo que explique se tratar de um slogan. Uma das missões do jornalismo é promover o debate de ideias no espaço público, e para que isso seja possível, é necessário lançar mão do racionalismo, uma vez que a emoção exacerbada é inimiga da informação de qualidade. Quando o avião da TAM caiu, em São Paulo, vários jornalistas de rádio e TV se emocionaram tanto logo depois da queda do avião que muito pouca matéria informativa era percebida em meio às lamentações e hipóteses apressadas, e, consequentemente, absurdas. O mesmo se deu quando o governo Collor confiscou a renda nacional e, na entrevista coletiva, os jornalistas tomaram consciência de que também tiveram o dinheiro bloqueado. Foi uma confusão geral e ninguém entendeu mais nada do que a ministra da Economia, Zélia Cardoso de Mello, e outros ministros queriam explicar. Foi um show de desinformação que teve como principal colaboração a emoção, tanto a dos entrevistadores, quanto a dos entrevistados. É dever do jornalista colocar a informação no contexto e, para isso, ele conta com o conhecimento da metodologia das ciências sociais. Os fatos devem ser relacionados à realidade e à ambientação histórica em que ocorreram, pois o desrespeito a essa prática conduz, por culpa ou dolo, a distorções com prejuízos tanto para a notícia como para os personagens. Por exemplo, não é justo condenar os atuais alemães pelos crimes que os nazistas cometeram durante a Segunda Guerra Mundial, uma vez que estão fora do contexto da Alemanha do governo de Hitler. A reportagem não pode se resumir à sucessão de fatos e datas, que por si só não explicam os acontecimentos. Sendo assim, o raciocínio sociológico deve ser sempre exercido para se obter melhor compreensão dos fatos. Tentar fechar o noticiário a qualquer custo para que vá ao ar não justifica o abandono das regras éticas. Não se faz jornalismo assim. E mais: apropriar-se de uma reportagem exclusiva de outro veículo sem dar o crédito a ele e ao jornalista é pirataria. É importante ter em mente que citar o concorrente não desprestigia o veículo nem promove o concorrente, apenas demonstra respeito, mas plagiar é o mesmo que roubar. Além disso, divulgar qualquer notícia utilizando a expressão “determinado jornal publicou” pode provocar uma imprecisão indesejável. Por fim, alguns grupos de comunicação impedem a citação de outros veículos concorrentes, e isso só contribuiu para o desprestígio de todos, mas é importante ressaltar que notícias de domínio público não precisam ter as fontes divulgadas. Omitir nomes de empresas, órgãos governamentais e entidades em reportagens jornalísticas é demonstração de fraqueza e falta de ética, uma vez que não é a omissão que vai determinar o fracasso ou
sucesso de qualquer um deles. Contudo, a omissão é mais grave quando atinge pessoas autoras ou objetos de ações noticiadas. Não se pode dizer, por exemplo, que “certo deputado” é suspeito de envolvimento com o narcotráfico, porque a generalização atinge pessoas inocentes. Por outro lado, a omissão pode ter a intenção de querer preservar o nome de pessoas e instituições, especialmente quando são alvo de notícias desfavoráveis, e também são aceitáveis em casos especiais, como a proteção de um inocente, ou em situações que não permitam a divulgação de determinado nome. Em princípio não se divulga uma notícia não confirmada. A mídia eletrônica proporciona a divulgação imediata da notícia, mas o desejo de dar um furo (atrativo ao qual muitos jornalistas não resistem) pode comprometer a credibilidade se a informação não for verificada. Mesmo informação atribuída a outro veículo, ou S.I.T.G, deve ser verificada antes de ir ao ar. Lembre-se de que o furo atualmente dura o tempo suficiente para outro fazer a escuta, confirmar e também divulgar, portanto, é preciso critério com a utilização de vinhetas como plantão, urgente, notícia exclusiva etc., pois seu uso indiscriminado leva o veículo ao ridículo e acarreta perda de credibilidade. Quando a pessoa vir ou ouvir a vinheta de um plantão informativo deve ter a certeza de que algo realmente importante está acontecendo. Transformar entrevistas coletivas em exclusivas é maquiar a reportagem. Por exemplo, no final do ano, o presidente manda chamar todos os repórteres setoristas e lhes concede uma “entrevista exclusiva”. É um conluio de quem quer estar na mídia como quem precisa apresentar ao chefe, e não ao público, uma entrevista com o presidente. Não é possível fazer jornalismo sem receber críticas. Considera-se crítica uma análise do material jornalístico na qual o autor aponta o que considera erros e acertos, e propõe outras ideias ou soluções para os problemas. Não confunda crítica com fofoca ou ato de desacreditar o trabalho alheio. Não é a crítica pela crítica. As críticas não podem ser genéricas, e não são admissíveis críticas iniciadas com frases de sujeitos indeterminados, como “disseram”, “reclamaram” e “ouviram”, nem ter baixa qualidade, apresentando reportagem vazia, texto ruim e cobertura pífia. Quem ouve esses termos no seu trabalho tem o dever profissional de questionar o pseudocrítico. Qual é a sua sugestão? É comum que surjam dúvidas sobre se uma decisão jornalística foi moral ou ética. Para dirimir essa dúvida, deve-se perguntar se o princípio que norteou a decisão deveria ser uma lei universal, pois uma decisão é considerada ética quando os jornalistas baseiam-se em um princípio que se dispõe universalizado. A justiça cuida da observância das leis penais e civis do país, mas não interfere no código de ética. Contudo, quando houver dano moral ou material provocado pela inobservância de determinação ética e, ao mesmo tempo, da legislação vigente, não se pode abrir mão da justiça para que a verdade se restabeleça e os ofendidos sejam reparados moral e materialmente. A liberdade de imprensa não pode ser confundida com a liberdade de expressão. Em uma sociedade democrática, com a pluralidade dos veículos de comunicação, é possível saber de tudo o que acontece em várias versões. A pressão sobre determinado veículo para não divulgar uma notícia não impede que outros o façam, e a omissão de um veículo em sociedade aberta só o enfraquece e faz que ele perca a credibilidade, haja vista que outros estão divulgando. Os “interesses da casa” ou das “empresas do grupo” e a “visão do chefe” não podem – e não devem – ser poupados de divulgação, pois é preferível sair na frente e divulgar corretamente para evitar que concorrentes o façam. Também é ético por parte da empresa mostrar a verdade e não esconder possíveis falhas, sob pena de sofrer o mesmo desgaste que sofrem empresas de outras atividades. O jornalista não deve se esquecer de que exerce a liberdade de expressão por delegação da empresa na qual trabalha. Logo, são estes que detêm a real liberdade de imprensa. Todavia, as empresas precisam ser pressionadas para praticar a liberdade de expressão do pensamento e da consciência, tendo em vista que elas também são a base do regime democrático, e é importante que todas as empresas comprometidas
com a democracia ajam dessa forma. Os jornalistas e os meios de comunicação não são simples espelhos da sociedade, mas sim seus agentes estruturadores da realidade. A objetividade é um mito, uma vez que os jornalistas apreendem os fatos a partir da própria subjetividade, e uma prova disso é que alguns fatos são reproduzidos e outros, abandonados. A nudez só é justificada se for fundamental para a reportagem, e cenas degradantes da integridade humana não podem ser exploradas. Havendo dúvida, pode-se utilizar o recurso do mosaico ou da tarja. Em alguns casos é necessário recorrer à ocultação do rosto com recursos eletrônicos, para evitar exposição que possa molestar a vítima. A propaganda enganosa e outras armadilhas contra o consumidor devem ser denunciadas, ainda que os praticantes desses atos sejam anunciantes da empresa de comunicação. Além disso, a emissora comprometida eticamente com o público não pode aceitar a publicidade de um produto qualificado como fraudulento. Atualmente, cobra-se muito que as empresas tenham ética, e a melhor maneira de se comprometer com isso é garantir a liberdade de expressão de seus jornalistas. Mas, para que o resultado seja efetivo e eficiente, é preciso discutir e afinar os preceitos éticos dos jornalistas e das empresas jornalísticas.
O jornalista e as fontes O jornalista não deve ter amizade pessoal com a fonte, pois quem se envolve com suas fontes corre o risco de ficar limitado ou de ser influenciado por ela. O uso de fonte identificada, desde que não haja necessidade de protegê-la, é fundamental para a credibilidade da imprensa. Prometer anonimato à fonte é um ato para ser cumprido, mas antes de empenhar a palavra o jornalista deve questionar os motivos que levam a fonte a pedir o anonimato. A identificação de uma fonte, que em princípio deve ser protegida, só é feita se ela, por dolo ou má fé, gerar uma notícia falsa. O jornalista é responsável por suas fontes e pelos personagens de suas reportagens. No interesse de dar maior credibilidade à reportagem, é comum recorrer a generalizações que, mesmo sem a intenção do jornalista, prejudicam a fonte e pessoas próximas a ela. Afirmar, por exemplo, que a informação foi obtida de “um enfermeiro” em determinada ala do hospital coloca os demais sob suspeita. Quando o jornalista está em condições de assumir uma informação e divulgá-la, não há necessidade de justificar com as habituais retóricas e desacreditadas fórmulas do gênero: “uma fonte segura”, “uma fonte digna de crédito”, “uma fonte do Palácio do Planalto”. O relacionamento com a fonte é uma via de duplo sentido cuja ligação primordial é a confiança entre as partes. É preciso cuidado no relacionamento com elas, pois, vez por outra, no exercício da profissão, o repórter pode desagradá-la. O jornalista não divulga notícias para agradar ou desagradar as fontes; mas é importante lembrar que seu compromisso primordial é com a verdade, com o público. A fonte é uma das matérias-primas que constituem a reportagem, mas é preciso tomar cuidado para não praticar o “fontismo”, ou seja, eleger determinada pessoa como única fonte para o desenvolvimento de um assunto. Elas têm dimensões diferentes no jornalismo impresso e eletrônico, e informação em off subsidia mais a reportagem escrita do que a eletrônica. O jornalista deve sempre avaliar qual a sua ascendência sobre as fontes, pois muitas vezes ele é atendido por uma pessoa importante mais por causa do veículo que representa do que pelo próprio nome e prestígio. A fonte não é estática, isto é, ela muda de acordo com seus interesses pessoais e com os fatos que se sucedem. Em determinada situação, pode ser um ministro ou um enfermeiro, mas o jornalista deve tentar contato com a fonte ou o entrevistado, seja qual for a sua importância social. A tentativa deve ser feita ainda que a pessoa possa, à primeira vista, ser alguém inatingível. Fontes podem gerar furos de reportagem, mas o jornalista tem a obrigação de checar a informação antes de divulgá-la. Ele deve ter compaixão por aqueles que são afetados por seu trabalho e nunca se esquecer de que as pessoas particulares têm direito maior de controlar as informações sobre sua privacidade do que as públicas que buscam poder, influência ou espaço na mídia. Por fim, utilizar o anonimato da fonte para embutir opinião pessoal ou abrigar interesse escuso é uma frontal violação ética. É preciso avaliar até que ponto as relações íntimas com as fontes, o poder, o ativismo e a militância política podem provocar conflito de interesse, e isso não quer dizer que os jornalistas sejam as novas vestais isoladas no Templo de Juno.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Você recebe uma pauta a partir de uma denúncia anônima, informando que existe uma quadrilha especializada em roubo de bagagens atuando no aeroporto. Percebe que se trata de uma reportagem investigativa e que pode contribuir com as autoridades para elucidar um crime. Para conseguir flagrar a atividade ilícita dos envolvidos nos roubos, você se aproxima de um funcionário do aeroporto que tem acesso ao depósito e que, por isso, poderia ajudá-lo fotografando e filmando os ladrões em ação. Mas o funcionário, embora admita ter conhecimento dos fatos, não sabe com que tipo de bandidos estará lidando. Por isso, ele se nega a cooperar com a reportagem, mesmo porque teme colocar sua vida em risco e, também, perder o emprego. Como você agiria em seguida para não perder a matéria, que pode vir a ser um furo de reportagem e lhe garantir um futuro de prestígio no meio? 2. Você entrevistou um famoso político sobre denúncias que o envolvem num esquema de fraude em licitações. Na tentativa de se defender, ele desatou a falar, num acesso de verborragia irrefreável, com respostas longas demais e acusações a políticos adversários. Você terá de editar a entrevista para levá-la ao ar no principal jornal da emissora de TV . Como está convicto de que ele é culpado das acusações que lhe fazem, sabe que muito do que disse nas respostas tiveram apenas o objetivo de confundir e desviar o foco. De que forma você fará a edição e como conduzirá o texto da sua reportagem antes de levá-la ao ar, sem que o resultado fique desconexo ou falte precisão? 3. Numa cobertura externa em sua rádio ou TV, você entrará ao vivo para relatar o caso de interrupção em uma via do Metrô que prejudicou a circulação dos trens por várias horas, deixou as estações lotadas e causou transtornos a milhares de passageiros. O problema foi provocado por uma queda de uma mulher de 70 anos na via, sendo atropelada em seguida pelo trem, não se sabe se por acidente ou suicídio. Qual o seu procedimento para entrar ao vivo no ar? a) menciona a vítima como sendo “uma idosa” e procura narrar em detalhes o estado em que foi encontrada após o atropelamento, para ilustrar melhor a reportagem; b) menciona a vítima como sendo “uma mulher” e evita entrar em detalhes sobre seu estado após o trauma, para não chocar o ouvinte/ telespectadores; c) informa o sexo e idade da vítima e relativiza o seu estado, da forma mais objetiva possível, sem se envolver emocionalmente com os fatos.
Sugestão De Leitura 1. Bucci Eugênio. Sobre Ética e Imprensa. São Paulo: Companhia das Letras; 2000. 2. Hernandes Nilton. A mídia e seus truques: o que jornal, revista, TV rádio e internet fazem para captar e manter a atenção do público. São Paulo: Contexto; 2006.
Dicas de filmes Capote, EUA, 2005 – Dir. Benett Miller O filme traz à tona a discussão sobre a ética profissional, narrando o período em que o jornalista americano Truman Capote escreveu A sangue frio, livro que marcou o início do romance-reportagem e ajudou a consolidar o New Jornalism. Capote usou de todas as formas possíveis, do envolvimento emocional ao financeiro, para conseguir as informações necessárias para escrever a obra que o consagrou. Uma bela abordagem sobre jornalismo literário e um convite a reflexão sobre a ética e isenção no jornalismo. O preço de uma verdade, EUA, 2003 – Dir. Billy Ray Baseado em fatos reais, o filme conta a história do jornalista Stephen Glass, do primeiro time do respeitado jornal Th e New Republic, de Washington, onde atuou entre 1995 e 1998. Mas, dos 41 textos publicados por ele, 27 eram total ou parcialmente inventados e copiados. Quando a farsa vem à tona, desenvolve-se uma interessante discussão sobre a ética no jornalismo e sobre até que ponto um editor deve ir para defender seu redator. 1
Tomás de Torquemada era um frade dominicano espanhol que “queria livrar o reino de heresias religiosas”. Após ser nomeado inquisidorgeral pelo papa Inocêncio VIII, perseguiu judeus, agiotas, bígamos, homossexuais e bruxas. No calabouço, os carrascos submetiam os suspeitos a diversos tipos de tortura: aplicavam parafusos nos polegares, arrancavam unhas e dilaceravam a pele dos presos com pinças em brasa, entre outras barbáries. Enquanto isso, o padre ficava rezando baixinho.
02
A lei e a liberdade de imprensa “Liberdade de imprensa é a possibilidade de o dono de uma determinada empresa divulgar tudo aquilo que quiser.” Clóvis Rossi
Ao término da leitura deste capítulo você será capaz de: • Identificar as questões legais que regem a liberdade de imprensa. • Compreender o conceito de dano moral. • Entender que o jornalista também está submetido às leis. A Constituição Federal veta qualquer forma de censura de natureza política, ideológica ou artística. O jornalismo está nesse bojo e, teoricamente, há garantia de liberdade na informação jornalística. Contudo, as garantias legais de liberdade de imprensa e opinião não dão ao jornalista imunidade na divulgação de suas reportagens. Além das questões éticas, que são tratadas por uma Comissão de Ética eleita em Assembleia Geral da categoria, há os limites estabelecidos pela lei, e o jornalista pode responder tanto civil como criminalmente. Nos conflitos julgados pela justiça há casos de juízes que suspenderam a circulação de jornais, revistas e programas de TV, rádio e internet a pedido de pessoas supostamente atingidas por reportagens produzidas por esses veículos. A lei diz que é para preservar a honra e a imagem dos personagens, mas, na prática, é uma forma de censura prévia. Se a notícia não foi divulgada, como saber se atinge ou não determinada pessoa ou grupo de pessoas, e se não está apenas comprometida com o interesse público? A interdição pode durar até o julgamento definitivo do caso, que pode levar meses ou anos, inviabilizando a carreira do jornalista e a existência da empresa de comunicação. Eis alguns ditames que envolvem questões legais: • A Constituição, em seu artigo 5º, inciso X, assegura a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, além de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. • A Lei de Imprensa, de 1967, que disciplina a liberdade de manifestação do pensamento e de informação não está mais em vigor. Ela admitia a indenização por dano moral e o respeito à vida privada. • Coletar de forma desautorizada e sub-reptícia a imagem de alguém que está no recesso do lar é um ato de violação de intimidade. Pode-se violar a vida privada de alguém sem praticar a violação de domicílio. Por exemplo, o uso de uma lente de longo alcance para filmagens não autorizadas é uma violação de domicílio e pode ser alvo de ação penal. • O direito à intimidade não se confunde com o direito à honra. Este visa a proteção do valor moral e íntimo do homem, como a estima dos outros, sentimentos ou consciência da própria dignidade. O direito à intimidade garante proteção contra a divulgação de confidências, dados pessoais, recordações, memórias, diários, relações familiares, lembranças de família, sepultura, vida amorosa conjugal, saúde física ou mental, afeições, entretenimentos, costumes domésticos, atividades negociais, entre outros. Todos estão protegidos contra a curiosidade pública. • A lei assegura o sigilo às fontes de informação. Ela estabelece que nenhum jornalista poderá ser
compelido ou coagido a indicar o nome de seus informantes, ou suas fontes. Seu silêncio a respeito não pode sofrer qualquer sanção direta ou indiretamente, nem qualquer tipo de penalidade. • A liberdade de opinião é um direito consagrado na democracia e garante a liberdade de informação, ou seja, a liberdade de informar e de ser informado. A Declaração Universal dos Direitos do Homem proclamou em favor de todos o direito à liberdade de opinião e expressão sem constrangimento e o direito correspondente de investigar e receber informações e opiniões e de divulgálas sem limitações de fronteiras. • É preciso ficar atento ao possível conflito de interesse entre a informação e a privacidade. A solução do conflito leva em conta a constatação de que o jornalista não está sendo movido por sentimentos de despeito, ânimo ou ciúme, e exige-se dele a revelação de fatos importantes num certo momento, e não a utilização de modo oportunista, além da relevância social na informação. • Conforme a lei, aquele que, no exercício da liberdade de manipulação de pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito ou causa prejuízos a alguém fica obrigado a reparar os danos morais e materiais. • Se houver violação de direito ou prejuízo por qualquer das formas previstas em lei de imprensa, o veículo responderá pela reparação dos danos à pessoa natural ou jurídica. • A empresa de comunicação que sofre ação pode entrar na justiça contra o jornalista autor da matéria e pedir o mesmo valor da indenização paga. Portanto, o jornalista pode sofrer a regressividade, ou seja, obrigado por decisão judicial a ressarcir o prejuízo da empresa. • Os atingidos por reportagens podem pedir indenização por danos morais no caso da publicação ou divulgação de notícias falsas ou fatos verdadeiros truncados ou deturpados que provoquem danos. No caso de calúnia ou difamação, se o autor da reportagem fizer uma retratação espontânea antes do início de uma ação judicial, ele fica imune a uma ação penal. No entanto, permanece a obrigação de indenizar o ofendido. Além do autor da informação, os seus superiores imediatos respondem solidariamente em ação judicial. É bom saber que, segundo definição da lei, a calúnia consiste em acusar alguém falsamente de um crime. A difamação é o ataque à reputação de uma pessoa, ao passo que a injúria é a agressão verbal por meio de termos ofensivos ou ultrajantes. Pela atual legislação, o jornalista responsável pelo programa pode ser condenado até à prisão, juntamente com o ofensor. A subjetividade é inerente tanto no jornalismo como nos pedidos de indenização por dano moral, por isso as ações são demoradas, admitem inúmeros recursos e as decisões dos juízes são diferentes. Porém, é bom saber que, para haver obrigatoriedade de indenização, é necessária a ocorrência de dano. Se não houver dano, não há responsabilidade jurídica. O conceito de dano moral é avaliado pessoalmente e aceito ou não pela Justiça. Há homens que, por exemplo, se ofendem ao serem chamados de “playboys”; outros não. O mesmo se dá com mulheres chamadas de “peruas”. Lembre-se de que cada juiz é uma sentença. Qualquer cidadão pode exercer seu direito fundamental –e constitucional – de procurar a Justiça, e isso não constitui uma ameaça. Entretanto, é preciso resistir à autocensura movida pelo temor da ação indenizatória por dano moral, pois dificilmente alguém será processado se as denúncias forem feitas com responsabilidade, isenção e ética, e desde que haja espaço para todos os envolvidos com os componentes básicos do bom jornalismo. Lembre-se de que o tempo exíguo de uma reportagem favorece o erro, mas erro não é sinônimo de dolo.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Um importante ministro do STF está licenciado para tratar de problemas de saúde. Um repórter cinematográfico, no entanto, o flagra numa lanchonete de Brasília tomando chopp e conversando animadamente com amigos. As imagens acabam sendo levadas ao ar e o ministro fica enfurecido, porque se sentiu constrangido e, pior, alegou que seu direito à intimidade foi violado, já que não autorizou as imagens. Nesse caso, houve excessos por parte do jornalista ou ele não precisava de autorização, já que as imagens foram feitas em local público? 2. Atualmente, é bastante comum nos depararmos com o excessivo uso da palavra “suposto(a)” e “suspeito(a)” na divulgação de notícias, provavelmente pelo temor dos redatores em acusar pessoas ainda não julgadas e depois ficarem sujeitos a processos, mesmo que muitas vezes o caso tratado tenha sido flagrante, tenha imagens e até mesmo a confissão dos acusados. Existe alguma forma de contornar esse problema? 3. Um jornalista e apresentador de noticiário esportivo é conhecido do público por extrapolar em suas críticas a clubes e profissionais do esporte, causando sérios problemas ao departamento jurídico das emissoras às quais se vincula, tamanha a quantidade de processos que são movidos contra ele pelos atingidos. A direção da emissora para a qual ele trabalha atualmente fez questão de se isentar de responsabilidade em caso de eventuais processos futuros, fazendo constar uma cláusula expressa a esse respeito no contrato de trabalho. Essa atitude é correta? Será que esse cuidado teria algum valor caso alguém resolva processar o jornalista durante o período de seu contrato com essa emissora? Por quê?
Sugestões De Leitura 1. Bucci Eugenio. A imprensa e o dever da liberdade São Paulo: Contexto; 2009. 2. Angrimani Danilo. Espreme que sai sangue – um estudo do sensacionalismo na imprensa São Paulo: Summus; 1995.
Dicas de filmes Sob fogo cerrado, EUA, 1983 – Dir. Roger Spottiswoode Russell Price é um atirado fotógrafo de reportagens que se vê em um dilema entre seu amor pela repórter Claire Stryder e sua amizade pelo marido dela, Alex Grazier. Ele também é torturado pelas incertezas de que caminho seguir quando lhe pedem que tome partido, em vez de apenas tirar fotos, na guerra entre o governo da Nicarágua e os rebeldes sandinistas. Mas quando perde de vista a objetividade e se envolve na escaramuça, Russell pode perder ambas as batalhas e sua vida. Vlado – 30 anos depois, Brasil, 2005 – Dir. João Batista de Andrade Por meio de depoimentos, o documentário reconstrói o caso de tortura do jornalista Vladimir Herzog, morto numa cela do DOI-Codi em SP.
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De onde vem a notícia “Ser livre consiste não apenas em ser parte da natureza ou de seus processos, mas é preciso tomar parte.” Spinoza
Ao término da leitura deste capítulo você será capaz de: • Entender as transformações que a tecnologia trouxe para o jornalismo. • Conhecer as ferramentas que o jornalista tem à disposição para publicação de notícias. A internet e a tecnologia digital tornaram o mundo menor. Não foi a primeira vez que isso ocorreu, mas agora há a instantaneidade global. Os jornalistas aprendem a buscar informações em agregadores, como Google, YouTube, Wikipédia e em muitas outras ferramentas que estão à disposição do público em geral. Por essa razão, ele também atua na divulgação de notícias, ainda que de forma dispersa e descontrolada, e cabe ao internauta acreditar ou não no que recebe em seu smartphone, tablet ou qualquer outro dispositivo. Isso quer dizer que as notícias estão cada vez mais portáteis, personalizadas e participativas – em outras palavras, o jornalismo, mais uma vez, passa por uma reinvenção. Graças às novas ferramentas, a produção de notícias tornou-se muito mais barata, e o Estado não precisa fazer concessões para que uma empresa, uma ONG ou um cidadão possa abrir um espaço na web para emitir textos, áudios, vídeos, ou, então, “abrir” uma rádio, uma TV, um jornal ou uma revista eletrônica, isso sem falar dos blogs e de outros espaços na internet. Assim, o jornalista precisa atualizar-se para estar apto a usar as inúmeras mídias que estão à sua disposição e ser capaz de participar ativamente das diversas etapas do processo de produção de notícias, como apurar, pautar, redigir, editar, falar, fotografar, filmar, apresentar etc. Essa multifunção não diminui a importância social dos jornalistas, pelo contrário, põe em suas mãos mais oportunidades para divulgar informações. A multiplicidade de espaços na web está acirrando o mercado jornalístico da atualidade, para o bem ou para o mal, com uma segmentação cada vez maior, informações direcionadas e um público-alvo cada vez mais identificado. A evolução pode ser acompanhada na linha do tempo do buscador Google na internet, disponível em: www.google.com.br/tenthbirthday/#start. O YouTube é o site de compartilhamento de vídeo mais popular da web e está à disposição para iniciar, complementar ou concluir reportagens jornalísticas presente nas redações e com fácil acesso. É considerado indispensável, e essa facilidade não justifica a publicação de notícias no site sob o pretexto de que a web é mais rápida que o rádio. Publicar sem apurar é agir sem ética, e isso derruba a credibilidade da marca do emissor – o que, no meio de tanta oferta, é fatal. Não podemos ignorar o fato de que as plataformas tradicionais, como papel, tinta, aparelhos de rádios e TVs perderam espaço para a comunicação via web. Sendo assim, as empresas de comunicação também terão que se reinventar, uma vez que há uma mudança no modelo de negócio. É claro que isso reflete na oferta de empregos para os jornalistas, uma vez que estes terão de envolver o seu público, independente da plataforma que utilizarem, e acostumar-se aos comentários apensados pelo consumidor de notícias, pois não se publica mais nada impunemente na web. O jornalista deve estar aberto para receber, como sempre, as críticas, mas também a colaboração vinda dos áudios e vídeos enviados pelo público. O processo de fusão de redações é uma consequência inevitável da nova era. Outras fontes úteis são o
Facebook e o Twitter, ferramentas utilizadas com frequência nos dias atuais. Entretanto, quaisquer informações publicada em tais ferramentas precisam ser verificadas pelo jornalista antes de serem aproveitadas. O público pode dar vários tipos de feedback na internet, e um deles é votar em rankings das notícias mais interessantes, o que permite que se apure, as mais lidas. Existe a possibilidade de se promover enquetes sobre temas relevantes, bem como um mural, para que os comentários sejam postados. Com isso, é possível detectar o perfil de interesse do público, ainda que ele não seja determinante para a seleção das reportagens publicadas. O texto jornalístico na internet pode ser enriquecido com links que remontem a outros textos, fontes, artigos ou mesmo áudios, vídeos, infográficos etc., ficando a critério do público decidir se vai ou não clicar com o mouse sobre e abri-lo. O jornalista deve dar alternativas, e as novas ferramentas à disposição para o jornalismo na internet não derrubam as barreiras para que o público perceba, com transparência, o que é informação, notícia, opinião ou interpretação. O jornalista pode opinar livremente em seu blog sobre certos assuntos e lá defender seus pontos de vista, mas, no espaço dedicado à notícia, precisa manter a busca constante da isenção e da ética jornalística. Esta, por sua vez, tem de ter sempre uma reflexão, e muitas vezes pode haver conflito entre a empresa e o jornalista. Teoricamente, o jornalista tem o direito de publicar suas opiniões pessoais em seu blog, mas, na prática, há conflito, especialmente se ele estiver hospedado na homepage da corporação. Hoje em dia todos os jornalistas possuem uma imensa lista de favoritos em seus computadores com as fontes mais colaborativas para o trabalho do dia a dia. Alguns são sites de grandes empresas nacionais e internacionais e outros, exclusivos, sem contar o Google, é claro, com seus “filhotes”, como o Google Earth, Google Eye e Wikipédia. Contudo, é desejável uma verificação das informações obtidas nesses canais com várias fontes, para diminuir o risco de errar. Essas fontes são úteis tanto para as notícias internacionais como para as nacionais e locais. No ambiente da internet, teoricamente, todos os espaços cibernéticos são igualados no alcance, ou seja, uma rádio comunitária com transmissão via web atinge o público em todo o mundo, bem como uma grande empresa. Todos se globalizaram, e é comum que os sites jornalísticos – e até mesmo o Google e outros buscadores – tenham uma relação de reportagens relacionadas com a notícia principal, ficando a critério do público abri-los ou não. Esse é um dos serviços prestados que estimulam o internauta a permanecer por mais tempo navegando pelo site. O suporte multimídia é outro recurso para expandir as informações, torná-las mais didáticas, interessantes e agradáveis. Entre eles estão vídeo, animações, mapas, infográficos, áudio, textos, podcasts, wikis, videologs, mashups etc. Eles disseminam conteúdo, provocando compartilhamento de opiniões, ideias, experiências, perspectivas, e permitem que o público possa atualizar as informações e interagir instantaneamente entre si.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Em sua opinião, há ou não uma quebra de paradigma no jornalismo como advento da internet? 2. É possível o jornalista especializar-se em uma única função no atual processo industrial de produção da notícia? 3. Em sua opinião, a internet iguala os veículos de comunicação que circulam por ela ou turbina alguns e inibe outros?
Sugestões De Leitura 1. Guzzi D. Web e participação – A democracia no século XXI São Paulo: Senac; 2010. 2. Guerreiro Evandro Prestes. Cidade Digital – Infoinclusão Social e Tecnologia em Rede São Paulo: Senac; 2006.
Dicas de filmes Um sonho sem limites, EUA, 1994 – Dir. Gus Van Sant Suzanne Stone (Nicole Kidman) é uma garota de uma cidadezinha com um grande sonho: tornar-se famosa na televisão. Um sonho que se transforma em pesadelo quando sua ambição se torna uma obsessão. Desiludida com seu casamento com Larry Maretto (Matt Dillon), dono de uma pizzaria, ela se dedica em tempo integral à sua carreira e consegue um emprego numa estação de TV local. Ela decide, então, produzir um documentário sobre adolescentes e pede ajuda a três jovens desajustados que parecem ter pouca es-perança com relação ao futuro. Juntos, eles formam um elo forte e perigoso que ameaça pôr um fi m à sua idílica vida de subúrbio para sempre. Última hora, EUA, 2007 – Dir. Nadia Conners e Leila Conners Petersen Causadas pela própria humanidade, enchentes, furacões e uma série de tragédias assolam o planeta cotidianamente. O documentário, que traz entrevistas com mais de cinquenta renomados cientistas, mostra como a Terra chegou a esse ponto: de que forma o ecossistema tem sido destruído e, principalmente, o que é possível fazer para reverter esse quadro.
Jornalismo na web e liberdade “A tecnologia é um facilitador, não uma solução.” Os autores
Ao término da leitura deste capítulo você será capaz de: • Identificar as mudanças na liberdade de divulgação de notícias proporcionada pela nova tecnologia. • Conhecer as mais recentes tecnologias para disseminação de notícias via web. A web deu um impulso à liberdade de expressão como não se via desde a época de Gutenberg, no século XV. Ele foi o marco de uma mudança de paradigma, que proporcionou o acesso ao conhecimento por meio de uma nova tecnologia que multiplicou a publicação de livros. Uma nova plataforma, que mandou para os mosteiros os copistas, e para o museu as iluminuras. Essa tecnologia influenciou diretamente na evolução política e social da humanidade nos séculos seguintes. A rede digital proporciona um novo paradigma, a capilarização da emissão e recepção de notícias por meio das mídias sociais, que são tecnologias usadas pelas pessoas ou entidades, privadas ou públicas, para disseminar conteúdo, provocando o compartilhamento de opiniões, ideias, experiências e perspectivas diferenciadas. Os usuários, jornalistas ou não, podem atualizar e interagir na construção do noticiário dia e noite, gerando consequências sociais evidentes, como Primavera Árabe. A web aprofunda o conceito das mídias segmentadas, em que a edição não fecha jamais, uma vez que o noticiário se renova incessantemente. As notícias mudam a todo momento, seja sábado, domingo, feriado, seja Natal ou Yom Kippur. E as novas tecnologias - como a web 2.0, que facilita a criação de fóruns, salas de bate-papo e comunicação P2P - aprofundam o processo. Onde houver um celular, haverá uma fonte de irradiação de notícias, seja em Washington ou no Teerã, e mesmo com todas as barreiras nos servidores, elas fluem de nó a nó e, depois de alguns encaminhamentos, ganham dimensão nacional, regional, continental e global. Graças às mais recentes tecnologias, jornalistas e o público em geral podem fazer mais para e por eles mesmos, uma vez que todos são sujeitos do processo de produção, divulgação e interação de notícias. Eles podem realizar mais ações juntos, sem limitações ou hierarquia, pois todos têm a mesma importância, ainda que isso possa deixar os jornalistas melindrados. Esse envolvimento permite a construção de um jornalismo mais crítico, com o acompanhamento e a fiscalização do público; ou seja, a redação passou a ter o mesmo tamanho da rede e de seus nós. A Ágora, o mercado de Atenas onde se debatiam os destinos da cidade-estado, agora é representada pela web, e nesse mesmo espaço se faz jornalismo. Trata-se de um ambiente caótico, que cada um organiza de acordo com suas convicções. Sendo assim, a participação de todos nesse processo depende mais de motivação do que de liberdade, que foi conquistada com a participação e o acesso a essa nova tecnologia de baixo custo. Estar plugado não é o suficiente: é preciso ter banda larga, maior velocidade e cada vez mais wireless, e tudo isso é da natureza da rede. As comunidades virtuais transformaram a internet no meio de integração de todos os meios de comunicação; quer dizer, a internet é uma mídia viva, um fluxo, como a vida humana; daí o seu aspecto revolucionário, como o foi o advento da prensa de Gutenberg. A expansão da mandala da rede pelo mundo permite que uma pessoa esteja em mais de um lugar ao
mesmo tempo e, mesmo em férias, receba e emita notícias para todos. Ela lê o conteúdo de sites e blogs por meio de aplicativos baixados no seu celular, tablet, laptop ou pelos desktops de hotéis e pousadas. Os aplicativos são brindes de marketing de relacionamento dos núcleos de comunicação, uma maneira de agregar massa de audiência. O público lê o noticiário, comenta, manda informações, fotos, vídeos e áudios, e transfere os arquivos que julgar relevantes para os que o seguem. Não há como impedir a divulgação de notícias: nem mesmo o Estado, com toda a sua tecnologia, é capaz de impedir sua circulação, uma vez que a emissão e recepção são cada vez mais descentralizadas. Portanto, há um aprofundamento da democracia, da liberdade de imprensa e de expressão no espaço público, com a possibilidade de interconexão geral, a desintermediação e a comunicação de todos com todos. Não existe mais distinção entre as mídias. As webmedias permitem uma inversão nas escolhas do público: é a troca do “prato feito” pelo on-demand, ou seja, os conteúdos são organizados por temas, o que nos leva a acreditar que a edição rígida, soberana, rigorosa na grade de programação desapareceu na web, pois o receptor escolhe o que e quando quer ler, ouvir ou ver as notícias. O internauta pode compartilhar, arquivar ou procurar notícias correlatas, o que mostra que a seleção é posterior, e não anterior, como na mídia tradicional. Essa é outra revolução: o mouse está sob o controle do público, e não mais do editor. O aprofundamento da democracia com as redes sociais se intensifica e, com isso, o jornalismo ganha. Com o suporte da tecnologia, os cidadãos podem participar diretamente do processo de produção da notícia, uma convergência para uma participação direta. Pesquisas e sondagens dão um indício das opiniões do público sobre assuntos relevantes, como eleições, projetos no Congresso, ações de governantes etc. Por isso, são inúmeros os espaços destinados à exposição de opiniões. Esse processo engaja os internautas nos assuntos que se sustentam ou porque têm interesse, ou porque novas informações vão sendo acrescentadas. Tudo depende do clique no mouse para transformar uma realidade em uma multiplicidade de novas realidades por meio do sistema de buscas, links e hipertextos. A web constitui um volume tão grande de informações que ultrapassa a tradicional distinção entre as diversas modalidades dos veículos de comunicação e colabora decisivamente para a troca de experiências. Segundo o filósofo Habermas, a comunicação não é uma simples troca de sinais linguísticos, mas um fundamento nuclear a partir do qual os processos sociais podem ser compreendidos e, com isso, modificar a realidade. Não se pode esquecer que a comunicação via internet também é resultado de uma relação de poder. Ela não é neutra nem destituída de conotação política, como qualquer um dos meios de comunicação apresentados anteriormente. As unidades informativas se esforçam para disponibilizar ao seu público gravações, editadas e brutas, gravações para reportagens escritas, documentos públicos e endereços, para que o internauta avance até onde acha que deve avançar, a fim de se considerar suficientemente informado. Há um mundo novo para o jornalismo e a democracia na era da internet, porém, tudo isso só será útil para a construção de uma sociedade mais humana se levar em conta a lição de Manuel Castells, que diz que é preciso ter capacidade de “aprender a aprender e saber o que fazer com o que se aprende”. Por isso, insistimos que a tecnologia não é um fim em si mesma, mas sim um caminho para ser percorrido com inteligência crítica.
Exercícios Propostos Sugestões De Leitura 1. Baumann Z. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 2003;. 2. Habermas J. Mudança Estrutural da Esfera Pública. São Paulo: Tempo; 1984.
Dicas de filmes Os gritos do silêncio, EUA/Reino Unido, 1984 – Dir. Roland Joffé Este filme retrata a visão de Sidney Schanberg (Sam Waterston), um jornalista norte-americano, sobre a guerra do Camboja e a amizade feita com Dith Pran (Haing S. Ngor), intérprete cambojano e jornalista local. Mostra ainda as trágicas consequências do conflito, principalmente as ações do Khmer Vermelho. Com a cobertura da tomada de Phnom Penh, Schanberg ganha o prêmio Pulitzer e retorna para o oriente procurando o amigo, que se separou dele em razão da guerra. A embriaguez do sucesso, EUA, 1957 – Dir. Alexander MacKendrick O filme conta a história de um jornalista e um assessor de imprensa que vão fazer de tudo para alcançar o sucesso, expondo os podres da corrupção das metrópoles. O maior colunista jornalístico de Nova York, J.J. Hunsecker, quer a todo custo evitar que sua irmã case-se com Steve Dallas, um músico de jazz. Assim, ele contrata Sidney Falco, um agente inescrupuloso, para atrapalhar o caso dos dois.
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O poder da mandala “A internet foi criada para dar a todos a possibilidade de obter e publicar informações.” Os autores
Ao término da leitura deste capítulo você será capaz de: • Identificar novas ferramentas que possibilitam a difusão de notícias no ciberespaço. • Saber quais são as várias possibilidades proporcionadas pelo webjornalismo. • Conhecer as inúmeras ferramentas à disposição para a prática do webjornalismo. A rede, composta de nodos (ou “nós”), articula-se em todos os sentidos e não tem limites. E é justamente nesse espaço que se pratica o webjornalismo, que permite ler, ouvir, ver, participar de enquetes, murais e até enviar arquivos. Tudo o que é digitalizado passa pela mandala, que não tem limites definidos nem número exato de nodos e de internautas. No ciberespaço, todas as empresas competem em tudo, uma vez que são emissoras simultâneas das chamadas mídias tradicionais: TV, rádio, jornal ou revista. Um jornal tem uma emissora de TV, o site tem uma rádio e uma TV publica textos jornalísticos: uma convergência geral, ampla e irrestrita. Tudo em real time e sem limitação de espaço, por isso cabem as notícias curtas, enxutas, os highlights, mas também artigos com profundidade. Espaço não falta. Algumas empresas emitem em transmídia, isto é, em várias plataformas simultaneamente, como o Jornal da Record News, que é transmitido simultaneamente pela TV, pelo portal R7.com e pela Rádio Record de Florianópolis. Ele começa na internet 10 minutos antes, continua nos intervalos da TV com a participação dos internautas e do entrevistado, e segue por mais 15 minutos depois de ter sido encerrado na TV. Outros telejornais, como o Jornal Nacional, preferem o cross-media, isto é, chamam para mais detalhes e aprofundamentos no portal G1. O webjornalismo proporciona a possibilidade de se reunir atualizações 24 horas por dia com a certeza da publicação, independente da plataforma. Por esse motivo, os métodos como o da BBC, de publicar apenas depois de três confirmações, contribui para a credibilidade do espaço na internet, uma vez que não se pode publicar uma notícia e depois tirá-la do ar sem qualquer comunicação com os internautas. Isso é falta de ética e, acima de tudo, de respeito com quem procura notícias na web. Para ganhar credibilidade, o webjornalismo precisa adotar as mesmas práticas de outras plataformas, porque, como já dissemos, jornalismo é jornalismo, não importa em que plataforma. O internauta que navega pela mandala acessa com facilidade o que deseja, personaliza as páginas e enumera um grupo de endereços nos favoritos. Escalona os assuntos que mais lhe interessam e tem condições de receber avisos das novidades dos assuntos de seu interesse nas telas dos smartphones, tablets ou computadores – como o gol de seu time do coração. Tudo o que é publicado passa a ser de domínio público, a não ser que seja de interesse comercial ou esteja protegido por royalties ou patentes. Uma notícia publicada pertence a toda a rede, e rapidamente pode ser copiada e colada nos sites, blogs ou outros espaços, mas, por uma questão de honestidade intelectual, o post deve ser creditado ao autor ou à empresa. Replicar, em parte ou no todo, texto, áudio, vídeo, infográfico e mapas é uma rotina, e muitos sites e portais já contêm ferramentas para que o internauta possa compartilhar ou reenviar tais informações para a sua lista.
Algumas empresas oferecem gratuitamente aplicativos que possibilitam baixar notícias, vídeos, fotos, textos etc., e a prestação de serviço tem um espaço próprio nos gadgets e já são tratadas como notíciascommodities. Com tudo isso, é possível estar plugado na rede e navegar na mandala dia e noite. Um exemplo é o Google News, que segue uma notícia preferida, acompanhada por várias empresas de notícias, e fica atento às mais recentes atualizações a qualquer momento. Não são apenas os jornalistas que estão pondo em prática a máxima de Darwin, que diz que aqueles que sobrevivem são os que se adaptam, e não os mais fortes. Os fotógrafos e cinegrafistas também têm de se adaptar a uma nova situação, uma vez que tanto eles quanto seu público podem clicar ou filmar. Celulares também fotografam e filmam, e cada vez mais a primeira reação para buscar uma notícia não é mais ligar o rádio, mas abrir o computador ou consultar o smartphone ou tablet. No ambiente digital, as fotos valem mais que mil palavras, uma vez que admitem fotos em 360 graus, e há recursos que permitem mover a câmera de um lado para outro. O uso de outras imagens e mapas possibilitou um ganho ainda maior, pois isso permite que o público identifique melhor não só a localização geográfica, mas a sua paisagem, seu ecossistema, sua vegetação etc. Assim, é comum uma imagem começar com o globo terrestre e, depois, ir se aproximando até o local onde um determinado acontecimento se desenvolve. Os pontos de encontro dos participantes da Rio + 20 eram vistos e divulgados a partir dessa perspectiva, mas também podiam ir de um ponto a outro da cidade com imagens de ruas e avenidas, o que tornava o Rio de Janeiro familiar a quem nunca esteve na cidade. Os infográficos ganharam nova dimensão quando deixaram a plataforma de papel e tinta e apareceram em bits. Eles são valiosos para completar reportagens e tornar didáticas explicações que antes eram complicadas. Com a utilização desses infográficos, assuntos complexos – como tecnologia, finanças, economia e ciência em geral – atingem uma camada maior do público, dado o seu didatismo e sua atração visual. Alguns são dinâmicos, o que os torna ainda mais atraentes. Outras tecnologias, como a do podcast, permitem gravar, editar e ouvir programas em streaming ou por meio do download para o aparelho, que pode ser um smartphone, um MP4 player ou outro do gênero. De posse do conteúdo, é possível repetir e ouvi-lo a qualquer momento. Ferramentas como o Skype e o MSN possibilitam a entrada dos repórteres ao vivo, com som e imagem, e barateiam a presença de correspondentes nacionais e internacionais, que antes precisavam de canais especiais de satélites. Esse é mais um exemplo de que o que mudou foi a tecnologia, e não a importância do conteúdo. Algumas empresas ou sites pessoais incentivam o debate entre especialistas, jornalistas e público em chats, por meio dos quais se pode não só aprofundar o tema, mas também questionar os critérios jornalísticos utilizados para se apurar a notícia. Outro bom campo de debate é o Twitter, pois é uma ferramenta de fácil acesso e que permite a divulgação de ideias e ampla possibilidade de todos participarem democraticamente. Há um significativo espaço e grande facilidade para as discussões mais acaloradas e emocionais, pois a postagem é rápida, assim como as réplicas e tréplicas. Podemos dizer que esse é o espaço ideal para a repercussão de notícias e opiniões. Outra ferramenta são os blogs, que possibilitam que todos possam ter o seu próprio veículo de comunicação no ciberespaço. É comum as empresas jornalísticas retalharem o seu noticiário e criarem blogs para boa parte dos seus jornalistas, tornando-o mais um espaço noticioso, comercial e de marketing. São comuns as chamadas desses blogueiros na homepage dos portais, e esse é um bom exemplo de comunicação multidirecional, ou seja, de muitos para muitos. O Blog do Barbeiro (http://noticias.r7.com/blogs/herodoto-barbeiro/), por exemplo, é um desses espaços, ao lado de dezenas de outros, sediados no portal R7.com.
O público em geral também cria seus blogs, e há empresas de internet especializadas em sediar blogs, com ferramentas simples e ao alcance do grande público. Obviamente, os blogs de empresas jornalísticas, em sua maior parte, estão condicionados à disposição editorial da empresa. Embora existam empresas que restrinjam a participação de seus funcionários em blogs ou no Twitter, é possível que um mesmo jornalista tenha um blog no portal da empresa e outro em um diferente espaço. Contudo, se as opiniões do segundo blog forem divergentes, isso pode gerar problemas, pois as empresas geralmente estabelecem regras para essas aparições na internet e entendem que todos falam em nome dela. Por outro lado, a coincidência de opiniões em blogs faz parte do contrato de trabalho e é acompanhada pelo departamento de recursos humanos. A periodicidade de postagem varia de blog para blog. No caso do Blog do Barbeiro, ocorre uma postagem diária, chamada de “Navalhada do dia”, um artigo semanal, a Coluna do Heródoto, e o Jornal de Taiaçupeba – este, um exemplo de hiperlocalismo sem fins lucrativos –, além de outros posts aleatórios com fotos, vídeos, e-mails do público e dos comentários e críticas dos internautas.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Em sua opinião, existe um processo de confluência de mídia em andamento ou é pura ficção? 2. É possível dizer que as notícias têm dono? E mesmo com a profusão de redes de comunicação, é possível identificar o autor e o veículo? 3. Você acha que as profissões de jornalista, fotógrafo ou cinegrafista correm risco de desaparecer com as novas facilidades das tecnologias atuais? Por quê?
Sugestões De Leitura 1. Lemos Renata, Santaella Lucia. Redes Sociais digitais – a cognição conectiva do Twitter. São Paulo: Paullus; 2010. 2. Blog – Entenda a Revolução que vai Mudar o seu Mundo. In: Hewitt Hugh, ed. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil; 2010. 3. Prado Magaly. Webjornalismo. Rio de Janeiro: LTC; 2010.
Dicas de filmes A rede social, EUA, 2010. – Dir. David Fincher Em uma noite de outono em 2003, Mark Zuckerberg (Jesse Eisenberg), analista de sistemas graduado em Harvard, senta-se em seu computador e começa a trabalhar em uma nova ideia. Apenas seis anos e 500 milhões de amigos mais tarde, Zuckerberg torna-se o mais jovem bilionário da história com o sucesso da rede social Facebook. O sucesso, no entanto, o leva a complicações em sua vida social e profissional. Piratas da informática, EUA, 1999 – Dir. Martyn Burke A revolução começou quando ninguém estava olhando. Aconteceu em uma garagem. Em um dormitório. Em infinitas horas de esforço, imaginação e intriga. O cofundador da Apple, Steve Jobs, e o cofundador da Microsoft, Bill Gates, estavam mudando o jeito do mundo funcionar, viver e se comunicar. A saga dos ardilosos visionários que deram um pulo evolucionário é desvendada em estilo vibrante e incomum em Piratas da informática. A história é quase shakespeareana – um conto de luxúria, ganância, ambição, amor e ódio, reflete o escritor e diretor Martyn Burke. E trata-se de uma história de sucesso, conectada ao mundo de hoje como nenhuma outra.
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O príncipe eletrônico “Para ter valor, a informação precisa ser seletiva. Senão, acabaremos vidiotas ou internéscios.” José Paulo Paes
Ao término da leitura deste capítulo você será capaz de: • Compreender a importância da web para o trabalho do jornalista. • Entender como as novas ferramentas tecnológicas podem auxiliar os jornalistas em seu trabalho. • Definir o que é jornalismo multimídia. • Compreender de que maneira as diversas mídias integradas às novas tecnologias podem ser exploradas pelo profissional de imprensa. O título é uma alusão ao professor Otávio Ianni, que elegeu a televi- são como a mais importante mídia criada pela humanidade. O prín- cipe eletrônico surge em um novo momento histórico, é fruto das transformações recentes da sociedade e um dos seus modificadores. O advento da tecnologia informacional no jornalismo é o encontro de um novo oceano que precisa ser explorado, compreendido, pes- quisado e vencido. Como lembra Peter Drucker, o que chamamos de revolução da informação é considerada a quarta do mundo por ser posterior à escrita, ao livro e à impressão. Novas posturas são introduzidas no dia a dia do jornalista, que vão do uso de um e-mail interno para troca de mensagens entre dois jornalistas – ou, por mais que pareça contraditório quando se fala em redação, entre o chefe com o qual não se pode falar, a não ser por meio da intranet – até a pesquisa solitária na internet para completar as reportagens do telejornal. Hoje em dia, não há mais como fazer jornalismo sem utilizar a web, pois o fluxo de informação é imenso. Entretanto, é necessário veri- ficar as notícias inúmeras vezes para se apurar o grau de veracidade, lembrando que pecado de se divulgar fatos inexistentes não é um privilégio da internet. O telejornalismo já não é o mesmo na sociedade informacional, e o jornalista tem de se preparar para essa nova época, que é de constru- ção, e não de extinção. A polêmica nos remete à discussão sobre se o jornalismo de hoje se faz no que alguns chamam de era do conhe- cimento ou na era da ignorância. A era do conhecimento, segundo seus formuladores, é um conceito descendente da Revolução da In- formática, da Era da Informação e do choque da Terceira Onda, que varreu o mundo provocando transformações profundas.
A tecnologia e a mão de obra Como alguns ainda acreditam, as mudanças infraestruturais mo- dificaram de tal maneira o capitalismo no final do século XX que o conhecimento passou a ser uma commodity. Sem dúvida, quem a exporta e detém são os países do primeiro mundo, que tiveram capital e outras condições de desenvolver uma tecnologia avança- da capaz de fabricar uma mercadoria a ser vendida em regime de monopólio – como os softwares da acesso à internet – ou de cartel – como os hardwares do mercado. Os grupos econômicos, independentemente de onde estejam estabele- cidos ou abriguem seus produtos, induzem às mudanças com grande velocidade e criam novas necessidades que só eles mesmos conseguem atender. Mal começamos a dominar uma máquina e ela já é superada por outra, e por outra, e assim por diante, num turbilhão sem fim. Conforme o jornalismo contemporâneo é industrializado, acaba sendo moldado pelo hipercapitalismo e tratado como uma merca- doria, tendo como agravante o fato de a tecnologia proporcionar uma renovação que fortalece a concorrência entre meios e veículos. As transformações tecnológicas têm seus reflexos no mercado de trabalho e, para conquistar as melhores oportunidades, mesmo sem vínculo empregatício, profissionais das mais diversas áreas buscam a atualização constante. São pessoas munidas da ambição de acúmulo sem limites que se movimentam no meio empresarial. A nova organização econômica permite a retomada do agente au- tônomo dentro do turbilhão de negócios das empresas, acelerados pelas novas tecnologias. Isso abre amplas possibilidades para as transações especulativas em qualquer ponto do planeta. O concei- to de atualidade incorpora a instantaneidade como sua principal coordenada operativa. Nessa nova sociedade em rede, na qual a velocidade é um alicerce do desejo do mercado e os jornalistas, seus construtores, pontifica o jornalismo em tempo real, próprio da era tecnológica. Quem não se lembra de Charles Chaplin, no filme Tempos modernos, apertando parafusos como se fosse parte de uma imensa máquina? O jornalista na era da informática não está arriscado a reproduzir essa cena na frente do computador, mas está arriscado a ser uma peça do sistema que determina não só os produtos consumidos pela massa, mas também o próprio jornalismo. Se depender da ideologia do mercado, o poder vai estar nas mãos do público, uma vez que ele é o consumidor, e este poderá escolher quais programas jornalísticos comprará e instantaneamente fazer a comparação com os programas de outras emissoras.
As novas ferramentas Há perigo de as novas ferramentas tecnológicas ocuparem o centro da cena e colocarem o jornalista, agente da difusão da notícia, para escanteio? Sim, há perigo de que o fascínio provocado pela informática e o pretenso jornalismo instantâneo, ao vivo, ocupem o centro da cena. Isso tem muito mais a ver com as necessidades da organiza- ção da nova ordem econômica mundial do que com a condição da satisfação de um ideal, de uma utopia humana de desenvolver um jornalismo comprometido com o bemestar geral de todos e o res- peito aos direitos humanos. No entanto, os fatos mostrados ao vivo têm força e significado midiático, e os receptores sentem-se em con- dições de avaliar mais criticamente a veracidade do que está sendo reportado. Isso não pode excluir a importância real do acontecimen- to e a sua explicação, na medida em que o receptor não pode abrir mão de ser também uma testemunha ocular, parte ativa de algo que ocorre sob seus olhos. Os atentados terroristas contra as Torres Gêmeas, em Nova York, em 2001, são exemplos clássicos. O mundo todo viu, inicialmente, um incêndio em um prédio, depois um acidente aeronáutico e, em se- guida, uma confusão de entendimento quando um segundo avião se atirou contra outra torre. Só quando o rotativo da CNN informou que um terceiro avião havia atingido o Pentágono, em Washington foi consolidada a hipótese de atentados. Mas em que a velocidade das notícias contribui para melhorar a capacidade cognitiva ou o espírito crítico das pessoas interessadas em notícias? Os jornalistas não podem confundir a exata significação das palavras, das informações, dos conhecimentos e dos dados. Estes são abstra- ções formais quantificadas e armazenadas em arquivos eletrônicos, e estão à disposição dos jornalistas para subsidiar as reportagens que escrevem; isto é, são necessários, mas não falam por si só. São as commodities. Por exemplo, a exibição pura e simples de uma tabela comparativa entre inflação e crescimento do PIB não explica o que é desenvolvimento autossustentável. Embora as informações possam ser armazenadas em arquivos ele- trônicos, elas são abstrações informais que não podem sofrer um reducionismo contido nos dados, pois pressupõem uma elaboração intelectual que o computador não é capaz de desenvolver, mas ape- nas de armazenar ou transmitir para uma ou mais pessoas. Logo, informações não podem ser processadas como dados. Por outro lado, o conhecimento não pode ser armazenado, uma vez que ele é, como diz o professor Valdemar Setzer, da Universidade de São Paulo, uma abstração interna e pessoal gerada a partir de uma experiência também pessoal. Ele não pode perder essas característi- cas sob pena de se converter em informação ou até em dados, e a sua divulgação, ainda que não atinja a totalidade, é um atributo do ser humano, do jornalista, e não do computador. Portanto, as ferramen- tas de informática são capazes de subsidiar, mas não de elaborar, uma comunicação jornalística, por mais que alguns endeusem as possibilidades inesgotáveis dos bits. Se isso fosse possível, o jornalismo poderia dispensar a elaboração intelectual para se completar, como querem alguns homens de negócios interessados em expandir suas empresas com o menor custo possível. A prática jornalística é uma forma de organizar e de se apropriar do mundo, e há quem afirme que a informação nobre é candidata a ser uma commodity.
Jornalismo multimídia O conhecimento da informática, até pouco tempo apontado como um diferencial no currículo, hoje é uma obrigação para o jornalista. Uma pessoa de mediana capacidade intelectual é capaz de, em algu- mas horas de treinamento, obter o mínimo de “conhecimento de informática” exigido por empresas de jornalismo para poder exercer a profissão. Assim, o que parece à primeira vista uma verdadeira Hi- dra de Lerna é, na verdade, um tigre de papel, ou melhor, de bits, nada além de banais exigências de treinamento técnico. Entretanto, isso não é desconhecer o valor dessa ferramenta que nos possibilitou um salto há menos de vinte anos, o mesmo que a Revolução Agrícola nos proporcionou há dez mil anos, a ciência, há trezentos, e a Revo- lução Industrial, há duzentos anos. Os consultores, novos ideólogos da sociedade informacional, recei- tam ao mesmo tempo intenso treinamento nas técnicas de uso do computador e desenvolvimento de processos cada vez mais criativos, flexíveis e independentes. É verdade que não são coisas ex- cludentes, mas não se pode misturar desenvolvimento de espírito crítico e reflexão com a adoção de técnicas repetitivas e desprovidas de aprofundamento intelectual. O questionamento que se faz é se tal diferencial humano tão propagado e responsável por deter- minar o sucesso ou fracasso de uma empresa jornalística está na habilidade do uso da informática ou na capacidade criativa e de superação de dificuldades? Jornalistas precisam estar informados e formados, pois, enquanto colhem notícias, têm de exercer uma atividade intelectual que exige conhecimento, discernimento, reflexão, bom-senso e outras habili- dades bem diferentes de apertar botões e repetir, infinitas vezes, as mesmas operações – aliás, o computador só consegue fazer sempre as mesmas operações! Além do mais, o jornalismo é movido pela importância que tem a informação e pode ajudar o receptor a en- tender melhor o mundo em que vive, a formar juízos de valor e a se aproximar do resto da humanidade. O computador prende o jornalista à lógica desenvolvida por Aristó- teles e Descartes, ou seja, linear, que nem sempre consegue se tornar um instrumento eficaz de análise da realidade. Falta o contraditório, a antítese e a síntese, um método desenvolvido por filósofos como Heráclito e Hegel, incompatível com os computadores existentes nas redações, que não estão aptos a incorporar a crítica e o questiona- mento político. Há quem acredite que o computador quântico será capaz de superar o “isto ou aquilo” das máquinas atuais e, então, desenvolver novas possibilidades. O cientista indiano radicado nos Estados Unidos, Amit Goswami, afirma trabalhar na construção de um computador quântico que, em vez de usar um algoritmo am- bíguo, usa uma superposição de possibilidades e, dessa forma, seria muito mais rápido se comparado aos atuais computadores conven- cionais. Segundo Goswami, o cérebro processa os pensamentos de forma quântica, mas isso não garante a um computador a capaci- dade de “pensar”. Mas vale uma reflexão: o que é mais importante para o processo de produção de notícia, a criatividade ou operar um computador? No que depender dos “adoradores de bits”, a sociedade caminha para uma nova divisão. Além da elite e dos que vivem na exclusão, o mundo será dividido entre os on-line e os off-line. Os on-line vão dominar e dispor das novas tecnologias; serão os “inteirados” com o simultâneo do mundo globalizado. Os off-line serão chamados de lentos, ultrapassados, presos ao tempo linear e, portanto, obstáculos para a implantação da Nova Ordem. Os jovens jornalistas saem hoje das escolas com conhecimentos bá- sicos de informática e inglês. Mas quantos são capazes de fazer um comentário crítico, uma reflexão sobre um fato social, um livro ou uma obra de arte? Queremos o conhecimento em si ou a ascensão social que o conhecimento pode nos dar? A
sociedade informacional nos coloca diante tanto de dilemas falsos quanto de verdadeiros. Um deles é o tempo, totalmente subvertido pelo uso do computador. Ninguém mais se lembra do adágio de que a pressa é inimiga da per- feição ou do jornalismo ético e de qualidade. A pressa é um fim em si mesma, não importa que profundidade ela possa tirar da notícia. É preciso ser rápido, antecipar-se aos fatos mesmo se não houver acurácia do que está sendo noticiado. E os leitores, telespectadores, ouvintes e internautas, por sua vez, devem consumir rapidamente essas notícias para estarem aptos a deglutirem mais uma fornada, que é sempre a penúltima. Mas às vezes a pressa exagera a exaltação das palavras, e há quem afirme que isso faz parte da natureza da própria mídia. Entretanto, deve-se usá-la com cuidado, com o respeito pelos seus significados precisos, pelas suas nuances e com referências ao seu poder. Os cul- tivadores da pressa pela pressa devem ter consciência de que palavras podem destruir ou até mesmo matar tanto pessoas como bens. O jornalismo informacional cavalga no tempo dos eventos imedia- tos, simultâneos e de ações sincronizadas. Segundo a pesquisadora Maria José Tonelli, a antiga noção de tempo como uma sucessão de períodos indivisíveis parece estar sendo logo substituída por uma ideia de tempo circunspecto e repetitivo: o tempo das milhões de instruções por segundo (Mips). Essa é a medida de capacidade dos computadores que alguns suspeitam que tomarão o centro do pro- cesso de geração do jornalismo. Os que aceitam essa tese baseiam-se no conceito de Gordon Moore, o qual previu a duplicação do poder de processamento de um chip de silício a cada 18 meses. Mas quais seriam as implicações dessa mudança? O tempo linear, assim como conhecemos hoje, permite a reflexão, ao passo que o tempo simultâneo digital é aquele do reflexo. Por esse motivo, não se pode desconhecer que vivemos uma nova noção do tempo, a qual é, indiscutivelmente, a mais importante característica da sociedade humana. Mas como se processa o jornalismo? Por re- flexão ou por reflexo? É possível conciliar as duas coisas? É possível acreditar que a “sabedoria tecnológica”, baseada no acúmulo de in- formação, seja totalmente ineficiente para resolver um problema bá- sico da humanidade: o de criar um relacionamento entre o presente e o futuro? Há meios conhecidos de se desenvolver o jornalismo fora desses parâmetros? Não, uma vez que o jornalismo não é apenas uma sucessão de fatos e de datas. Nunca como hoje a noção de perda de tempo passou a fazer parte do dia a dia das redações numa busca fre- nética de fatos para serem incluídos nas matérias, o que, por sua vez, é outra luta: aproveitar o tempo das reportagens contado em frames ou uma das 29 partes nas quais se divide o segundo nas máquinas de edição. É o culto da velocidade que migrou dos aviões e carrões para a informação por intermédio dos computadores. Mesmo com toda a tecnologia digital disponível, o jornalismo de- pende da velha e boa reflexão, bem como da investigação, da acurá- cia e da divulgação. Essa barreira qualitativa não foi e não será rompida, porque faz parte da própria essência do jornalismo, ainda que as mudanças quantitativas continuem aceleradas e mal percebidas por quem as endeusa. Como lembra o professor Ciro Marcondes Filho, o computador atua como um superpatrão que exaure mais os jornalistas, pois tem o total controle de sua produção nas redações. Os jornalistas trabalham mais pelo mesmo dinheiro, esgotam-se mais e estão mais sujeitos ao estresse e à estafa. Mas quem se importa com isso? O produto tem de ficar pronto para a venda e o consumo. A economia de custos – proporcionada pela tecnologia, pela rapidez no processamento e pela busca da audiência – pode comprometer a qualidade do jornalismo. No entanto, não se pode admitir que sejam suprimidos a contextualização, o contestamento e o aprofun- damento sob o risco de os fatos não serem compreendidos em sua importância social. É preciso avaliar corretamente essa escalada da tecnologia contra a reflexão, a investigação e a divulgação, pois a utilização da nova tecnologia não exime o jornalista de questionamentos, aprofunda-
mentos nas reportagens desenvolvidas e do compromisso com o que julga ser certo, bom e justo. Isso é importante porque a sociedade informacional que está sendo construída, cujas principais caracterís- ticas são abstração, virtualidade e conectividade, precisa ser direcio- nada para o trabalho qualitativo. A televisão e o telejornalismo são as vias mais identificáveis desse conflito. Sendo assim, não basta ter 24 horas de notícias, é preciso conter o maior número possível de dados em uma sucessão que dê ao público a sensação de ser informado pela velocidade com a qual os acontecimentos são apresentados, isentando-o de qualquer atitude crítica, como se a velocidade da apresentação fosse um fim em si mesma. A facilidade de obtenção e o tráfego de imagens fazem do video- jornalismo o arauto das notícias. A imagem é um chamariz para a audiência, mas quem quiser se aprofundar vai ter de recorrer a outras mídias, talvez às impressas, para conhecer melhor o que a TV apenas apresentou na forma de petisco. Um dos atributos da superficialida- de contida no processo é a desinformação, e não há como separá-las, visto que uma contém a outra. Essa avalanche arrasta consigo uma boa parte dos jornalistas que, por desconhecimento, comodismo ou necessidade da dupla jornada, abandonam o desenvolvimento de uma base intelectual capaz de dar suporte às mudanças socioeconô- micas abatidas sobre a profissão. Não se trata aqui de exigir esse cuidado apenas dos jovens jornalistas, recém-saídos das faculdades, mas também dos experientes, que teoricamente têm a obrigação de desenvolver mais e mais a capacidade de discernimento e julgamento. Em suma, é preciso sa- ber pensar e distinguir as diferentes visões do mundo, todas respei- táveis, ainda que algumas antagônicas. Isso leva os jornalistas que produzem e dirigem os programas a fazerem alguns questionamen- tos, como: quais são os critérios usados, o do preparo intelectual, emocional, de credibilidade, ou o da simpatia e da preferência po- pular? Há como conciliá-los? Se sim, isso interessa aos veículos que divulgam essas informações? O jornalismo informacional empurra os jornalistas em direção à perda da curiosidade, justificada pela falta de tempo em função da grande quantidade de dados disponíveis, colaborando decisiva- mente para a unanimidade de interpretação. Os que divergem são considerados um estorvo ao processo produtivo de notícias e quase sempre descartados, perdendo lugar no jornalismo veloz e reflexivo. A sintonia com o mercado reforça ainda mais a unanimidade por meio da subserviência dos jornalistas ao poder constituído, seja o Estado ou não, e isso é mais perceptível nos comentaristas econô- micos e políticos, que não se aprofundam em seus trabalhos e di- vulgam nos telejornais dados que acreditam ser mais importantes ao público do que qualquer interrogação ou divergência com relação à orientação oficial. Esses comentários são redigidos com base muito mais nos dados ob- tidos facilmente por meio da internet da redação do que na cons- trução de pensamentos mais elaborados, e há sempre uma pitada de humor para alegrar o público e o instituto que mede a audiência. O ideal é eliminar qualquer raciocínio complexo que possa “dificultar” o entendimento do público. Tudo deve funcionar como um video- game ou como o computador que o público tem em casa. Afinal, o telejornal é feito para informar ou para distrair? É possível conciliar os dois? Essas são questões para se pensar e que certamente gerarão muita controvérsia.
Rádio e texto A interação entre a TV e o computador vai levá-los para junto da nova máquina. Estamos caminhando para o reconhecimento de que será logo possível qualquer experiência, para qualquer um, em qualquer lugar, instantaneamente, sem barreiras de conveni- ência ou custo. Não será preciso comprar um computador, pois as chamadas SmarTVs já oferecem acesso ao e-mail e à internet. Há investimentos pesados na exploração da TV interativa, que de modo abrangente é a utilização do vídeo sob encomenda e grava- dores digitais de vídeo até o comércio pela televisão. Os telespec- tadores podem utilizar seus televisores para apostar em corridas, mudar ângulos de câmeras em eventos esportivos, interagir em game show e obter mais informações sobre o que estão assistindo. Graças à interatividade, as corridas de cavalo aumentaram a recei- ta do governo na Espanha. Nos Estados Unidos, os internautas verificam regularmente os boletins do tempo antes de viajar. Na Grã-Bretanha, há um conteúdo interativo de enorme variedade de programas, incluindo documentários educativos, eventos esporti- vos e reality shows. Há algum tempo os fãs de futebol podem assistir a jogos e optar por uma série de ângulos de câmera, incluindo as que seguem um atleta específico, recurso do qual também pode se desfrutar no tablet ou smartphone. Os espectadores podem pedir estatísticas do jogo em tempo real e acionar os próprios replays instantâneos. Essa fase da TV antecede a sua utilização no computador. Trata-se de uma nova etapa de grandes transformações que vão resultar na confluência de todas as mídias num só eletrodoméstico. A interatividade começa a aposentar os DVDs e Blu-Rays, uma vez que as novas tecnologias permitem gravar um programa enquan- to o espectador vê outro. As possibilidades comerciais abertas pela interatividade são imensas, e o e-commerce vai significar uma fon- te poderosa de faturamento para as empresas do setor. As empresas de software e fabricantes de TV estão investindo cada vez mais em aparelhos que permitem a geração de conteúdo interativo fornecido por empresas locais de TV e que dão acesso a bancos e compras em farmácias e supermercados da cidade. No computador, a comunicação televisiva vai se misturar com tele- fonia, rádio, transporte de internet via cabo, transmissão direta por satélite, suporte em tempo real, pagers, celulares, tablets e laptops, construindo o que se convencionou chamar de convergência das mídias. Com a utilização de um desses dispositivos é possível fazer a transmissão de imagens com todos os recursos tecnológicos em tempo real, mesmo a bordo de um avião. Há equipamentos capazes de transmitir, por meio programas de computador, informações e imagens digitais de qualquer parte do mundo com ou sem a utiliza- ção de satélites. A luta pela conquista de novos mercados de equipamentos de gera- ção e recepção de TV interativa digital está lançando as empresas em furiosas concorrências mundiais para impor um padrão técnico que pode provocar uma nova divisão do mundo em reservas de merca- do das grandes corporações. As propostas tecnológicas variam desde alta definição, múltiplos programas, transmissão de dados, serviços interativos, capacidade para dar suporte a novas aplicações, como a internet, e-commerce, jogos eletrônicos etc. Por exemplo, os cartões plug-in permitem que os usuários recebam programas e serviços de TV digital em seus computadores pessoais. Os consumidores, bombardeados pela publicidade de fabricantes, são motivados a exigir das emissoras de televisão abertas que mudem o seu sistema irradiante. Por sua vez, eles são um fortíssimo mercado para a compra de aparelhos, avaliado no Brasil em US$10 bilhões. As TVs analógicas visam aumentar o faturamento e, ao mesmo tem- po, concorrer com as emissões via
cabo e satélite, que estão mais fortes a cada dia. Essa mudança está em curso no Brasil, ainda que se defronte com as dificuldades econômicas da maioria da população, e é tão importante que há quem a compare ao advento da TV em cores na década de 1970. A TV digital está no bojo das transformações econômicas da globali- zação, e os mercados de anunciantes e consumidores não respeitarão fronteiras nacionais. Assim, o mercado norte-americano será um só e a competição, também. Isso leva a uma mudança no mercado bra- sileiro de emissoras de TV, pois ou as empresas nacionais se abrem para a participação do capital estrangeiro, ou serão expulsas do mer- cado dominado pelos grandes grupos econômicos, principalmente dos Estados Unidos. A web é mais do que a internet e não deve ser confundida com ela. O acesso à web está cada vez mais fácil e, via celulares e aparelhos portáteis, como o dos carros, em breve será possível se conectar a ela em qualquer lugar. A maior parte dos usuários se conecta à internet para entrar na web, receber e-mails e participar das redes sociais, como Facebook e Twitter, mas dizer que a web é a internet é como igualar a TV aberta ao espectro radiofônico. Ou seja, as ondas de rádio podem carregar qualquer tipo de sinais, de rádio, de TV aber- ta, de celular, pagers etc.; a internet, por sua vez, porta as páginas da web, mas, além disso, é capaz de portar qualquer coisa que possa ser executada de forma digital. Então, em um tempo razoavelmente curto, toda a comunicação será via internet, inclusive a televisão; esta vai navegar no bit digital binário. A conexão de todos – pessoas e entidades – não deixa outro caminho livre, e isso faz que o projeto da TV digital propagada via onda eletromagnética nasça ameaçado. A internet abre todas as possibilidades para que o público seja “dono” de sua própria emissora de TV. Com um pequeno estúdio monta- do em casa, celulares com imagem, ilhas de edição baratas e câme- ras automáticas, o telespectador/internauta será ao mesmo tempo operador, programador, ideólogo e editorchefe do conteúdo do ca- nal de TV. Nesse caso, a censura desaparece, uma vez que nem o Es- tado, nem os anunciantes, nem a elite no poder podem mais impedir a transmissão de uma programação, seja ela musical, jornalística, po- lítica, religiosa ou de qualquer outro conteúdo. Daí decorre uma grande segmentação de assuntos e uma identifica- ção com os que falam na rede. O telespectador/internauta vai sair em busca do diferencial, pois qualquer pessoa poderá mixar, editar, acrescentar, apagar ou criar um produto único e diferente.. Nesse aspecto, a utilização da internet via fibra óptica dá um salto imenso em suas possibilidades. Uma fiação de vidro, com o diâmetro de um fio de cabelo, que consegue transportar sem interferências ele- tromagnéticas uma quantidade muito grande de bits, revoluciona novamente a web. Em cada segundo o computador recebe 17 bilhões de bits. Faça- mos uma simples comparação: uma página normal de um livro tem cerca de três mil caracteres; um gigabyte, por sua vez, equivale a mais de seis mil livros com quinhentas páginas cada, o que pos- sibilita a hiperimagem, a movimentação de todas as informações contidas num computador para outro, tornando a comunicação totalmente interativa. A concorrência entre as operadoras de conteúdo vai se desenvolver entre as emissoras individuais, ou do bairro, ou da cidade, ou do país, ou continente, ou do mundo. E o ponto é que essa nova tecno- logia iguala todas as TVs, independente de onde estejam, uma vez que, em nível técnico, estão todas igualmente preparadas. Caem as fronteiras nacionais e globaliza-se, em definitivo, a televisão. Com um simples clicar de mouse é possível ver imagens de Los Angeles, Tóquio, Veneza ou da comunidade da Rocinha. Esse é um mundo novo que se escancara graças à internet, sem a necessidade do satélite ou do cabo, extinguindo as barreiras para o internauta/espectador. Outra característica dessa mudança qualitativa na TV é a intera- tividade, visto que a internet coloca à disposição do telespectador maneiras muito mais eficazes para influir diretamente no conteúdo da programação. Os internautas querem consultar arquivos, ver pro- gramas já apresentados, comunicar-se com a direção da TV, propor questões para apresentadores, comentaristas e programadores, e essa
transformação permite que as pessoas façam diversas coisas ao mes- mo tempo, como ver o que está acontecendo e redigir um e-mail sobre o assunto. A nova TV tem de desenvolver uma grande quantidade de serviços se quiser que o telespectador/internauta esteja conectado. O núcleo de produção vai ser maior na medida em que agrega arquivos, dados, textos e imagens da programação normal. Então a TV vai se trans- formar em um jornal impresso eletronicamente? Não, mas vai contê-lo em suas atribuições. No futuro, será difícil distinguir na rede o que é TV, jornal ou rádio. Algumas emissoras vão vender a sua pro- gramação para o telespectador/internauta, abrindo um novo setor de negócios, como fazem hoje os grandes portais. Só terão acesso a determinados programas ou arquivos aqueles que pagarem por isso. A supersaturação de informação oferecida pela internet é outra es- trutura com a qual TV, áudio e jornal vão ter de aprender a conviver. As programações serão delineadas em hard news e grandes fóruns públicos de debates com interatividade constante. Temas específi- cos serão debatidos com a participação de especialistas, exigindo dos jornalistas da web uma capacidade de análise que explique as origens dos fatos sociais cotidianos e sua inserção no contexto histórico. O público vai questionar cada vez mais, por isso o jornalista deverá estar estruturado para entender o movimento social como um pro- cesso natural regido por leis que não dependem só da vontade, da consciência e das intenções dos homens. Todos os períodos históri- cos têm suas próprias leis, e essa época não é diferente.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Você é um jornalista cheio de ideias, criativo, mas não consegue um bom emprego. Fera no manejo de novas mídias e tecnologias, resolve, juntamente com um grupo de colegas, desenvolver e colocar no ar um site especializado em notícias. Empolgados, vocês serão os chefes e também os funcionários, todos se revezando na produção de conteúdo, busca de anunciantes, divulgação e diagramação do site. O que você e seus colegas fariam de “novo”, de “diferente” para concorrer com os grandes grupos de empresas jornalísticas? 2. Sua web rádio está no ar e é sucesso, ouvida no mundo todo. Você recebe conteúdo de várias partes do planeta e explora inclusive as redes sociais, como Facebook e Twitter, para fazer divulgação. Como controlar, no entanto, as intervenções indesejáveis, já que tudo o que vai para o ar nessa interatividade é instantâneo? Vale a pena instituir filtros de conteúdo neste tipo de atividade, para preservar o nome e a reputação de sua empresa jornalística? 3. Você trabalha em uma empresa tradicional do meio jornalístico que ainda é resistente às novas mídias. Sabendo do potencial difusor da internet, como você sugeriria aos diretores da empresa a inserção nesse importante canal? Quais seriam seus principais argumentos?
Sugestões De Leitura 1. Ferrari Pollyana. Jornalismo digital. 3 São Paulo: Contexto; 2006. 2. Magnoni Dino, Carvalho Juliano Maurício de. O novo radio: cenários da radiodifusão na era digital. São Paulo: Editora Senac; 2010.
Dicas de filmes Doces poderes, Brasil, 1996 – Dir. Lucia Murat Em ano eleitoral, uma jornalista íntegra chega a Brasília para dirigir a sucursal de uma importante emissora de TV. No exercício da tare- fa, ela passa a sofrer toda sorte de pressões e tentações. Manipulação da informação, questões éticas, jornalismo em época de campanha eleitoral, poderes políticos, tudo abordado com ironia fina por Lucia Murat. Ela, que já foi jornalista, aborda, por meio de sua personagem principal, a possibilidade de os jornalistas de- fenderem seu ponto de vista, mesmo diante de vantajosas propostas financeiras de políticos em campanha eleitoral. Além disso, a trama toca em uma importante questão: como esses políticos utilizam as novas tecnologias – especificamente a televisão – para manipular a opinião pública. Boa noite, e boa sorte, EUA, 2005– Dir. George Clooney Edward R. Morrow é um âncora de televisão que entra em confron- to com o senador Joseph McCarthy ao expor as táticas e mentiras usadas por ele em sua caça aos supostos comunistas. Inicia-se, então, um grande confronto público, que trará consequências à recém-im- plantada televisão nos Estados Unidos. Rodado em preto e branco, este filme retrata à perfeição o cotidiano de uma redação de TV.
Os donos do jornalismo “O oficialismo é a característica geral do jornalismo brasileiro, que privilegia fontes oficiais ou detentores de algum grau de autoridade.” Bernardo Kucinski
Ao término da leitura desta unidade você será capaz de: • Saber qual a principal característica das empresas públicas de comunicação. • Entender qual é o compromisso das empresas públicas de comunicação. De acordo com Manuel Castel, o capitalismo vive atualmente uma nova etapa, denominada por ele capitalismo informacional. Em seu bojo, as empresas de comunicação atuam tanto como canais de poder, quanto como geradoras de resultados para seus acionistas. A finalidade última de uma empresa é gerar lucro e, por isso, a notícia corre o risco de se tornar uma mercadoria como outra qualquer. Com as empresas públicas de comunicação, a sociedade se garante arcando com os custos das emissoras que possuem redes de televisão e rádio de alcance mundial graças à internet, aos satélites e à transmissão via cabo. As empresas públicas de comunicação que se dedicam ao jornalismo são conhecidas mundialmente pela excelência de sua produção, e o exemplo mais claro é o da British Broadcasting Company (BBC). Há, contudo, duas emissoras: a interna, que é pública, e a BBC World, subsidiada pelo Ministério das Relações Exteriores da Grã-Bretanha. Outros exemplos de empresas públicas de comunicação são a japonesa Nippon Hoso Kyokai (NHK) e a norte-americana Public Broadcasting System (PBS). Essas empresas, porém, não podem ser consideradas isentas da influência do seu próprio meio, pois transmitem as ideologias de suas sociedades por meio de sua programação. As nações que bancam os serviços internacionais defendem determinados interesses, muitas vezes sutis, mas reais. A principal característica das empresas públicas de comunicação é o comprometimento com o interesse público, considerando o telespectador, leitor ou ouvinte um cidadão, e não apenas um consumidor de notícias como outro produto qualquer. Não se trata de “satanizar” as empresas privadas produtoras de notícias, mas apenas permitir o entendimento da natureza de cada empresa. A corporação de mídia tem a preocupação, em última análise, de gerar resultados, e um dos caminhos é a obtenção de audiência, que pode custar a produção de programas de baixo nível cultural ou de comprometimento social e político. A programação de uma empresa privada não é necessariamente de má qualidade, mas tem seus limites estabelecidos pelos acionistas e pela publicidade. Há o esforço de alguns veículos em separar a redação do departamento comercial, estabelecendo o chamado “the wall”, e, com isso, a independência editorial. Ainda assim, as sociedades avançadas preservam as televisões públicas, e isso prova que os fatos sociais necessitam de mais visões e recortes do que possibilitam as empresas públicas e estatais. Não há excludência, há complementaridade para contribuir com a consolidação da democracia no Brasil. Não se trata também de varrer a publicidade da emissora pública, mas sim de contar com ela em percentual que não comprometa sua essência e seja entendida como parte contributiva da sociedade. Não se deve crer na simplificação de que, no interesse público, o valor que se opõe é o interesse particular. Não é uma luta do “bem” contra o “mal”, como teorizou o pensador Zoroastro alguns séculos
antes de Cristo. O interesse público vez por outra se manifesta e potencializa-se na afirmação de interesses particulares. Pode-se até afirmar, como diz Carlos Chaparro, que o padrão de qualidade do interesse público mede-se e constrói-se pela qualidade de atendimento dos poderes particulares. Entretanto, sem nenhuma autonomia econômica e financeira não se pode fazer jornalismo independente, por isso a decisão de se amparar economicamente uma emissora pública deve ser da sociedade, que, em última análise, paga com tributos, doações ou mesmo adquirindo os produtos e serviços anunciados. As empresas públicas de comunicação têm o compromisso de difundir o jornalismo de reflexão, e não de reflexo, como objetivo de aprofundar o conhecimento da realidade, proporcionando o desenvolvimento do espírito crítico e estimulando uma participação política e social ativa. Essa é uma contribuição para que o cidadão seja o sujeito, e não o objeto da História. A sociedade espera que a ação jornalística não se vincule a nenhum interesse especial e pune com a perda da credibilidade os veículos que se distanciam do interesse público e se atrelam a este ou aquele particularismo. A prova mais evidente para o público é a livre divulgação dos conflitos particulares, estatais e públicos. Quando ocorre uma situação como essa, os interesses conflitantes precisam ser amplamente conhecidos para que haja uma remodelação constante da opinião pública, que se manifesta no sistema democrático. Todavia, as emissoras públicas de conteúdo não se confundem com as estatais, que dependem econômica e politicamente de governos e podem ser manipuladas por eles. A condição de não depender fundamentalmente de verbas publicitárias e, consequentemente, buscar a audiência que justifique esses permite que a emissora pública tenha um ritmo próprio de produção de reportagens que incitam à reflexão. Obviamente, a empresa pública quer audiência, mas não faz concessões ao sensacionalismo como algumas empresas privadas de comunicação, tampouco o dirigismo de algumas estatais. O jornalismo público não prevê a intermediação de demandas populares para órgãos administrativos do governo e, por sua caracaterística de vinculação social, a empresa de conteúdo pública pode avançar jornalisticamente em campos onde emissoras privadas encontram o obstáculo dos patrocínios publicitários. O jornalismo de empresa pública tem a obrigação de ir além dessas barreiras, uma vez que é sustentado economicamente pela sociedade. A empresa pública não se confunde com a estatal, que é refém do Estado, e a emissoras públicas, como a BBC e a NHK, têm audiência considerável em todas as suas plataformas – web, TV ou rádio – tanto nos seus países de origem, como no exterior. No entanto, elas entendem esse alcance como um processo lento, gradativo e que reflete a credibilidade que o veículo vai conquistando ao longo do tempo com o noticiário e demais programas. A TV pública tem de lançar mão de todos os atrativos do bom jornalismo para conquistar audiência, como objetividade, leveza, profundidade e agilidade. Seus programas devem atrair o espectador com notícias que contenham relevância, novidade, surpresa, beleza, enfim, tudo o que se possa fazer para que ele seja cativado por uma programação comprometida com a cidadania. Sua programação da TV pública contribui para a formação complementar do homem e para o exercício pleno da cidadania, e seu jornalismo de emissora pública busca fontes alternativas e autônomas de saber para fundamentar as reportagens. O hard news não dá lugar para a análise, portanto, é preciso que haja complementaridade com outras reportagens O jornalismo público orienta-se por uma pauta pluralista, buscando novas fontes que, geralmente, não são percebidas por outras mídias. A emissora pública persegue o interesse público regido pela ética do cidadão, do qual faz parte sua relação com o Estado, a comunidade e os setores produtivos da sociedade. O jornalismo de emissora pública não objetiva a conquista do mercado, uma vez que não é um produto que está à venda, como nas emissoras comerciais. Dessa forma, é possível se comprometer em profundidade com o conjunto da
sociedade no exercício da busca do interesse público. Esse tipo de jornalismo não se confunde com o assistencialismo nem com a filantropia, pois suas reportagens visam divulgar também ações cidadãs com mais frequência e profundidade do que as concorrentes. As reportagens de interesse público são aquelas que superam os interesses privados, mercadológicos e partidários, e podem ser desenvolvidas tanto pelas emissoras privadas como pelas estatais, visto que nenhuma tem o monopólio do que é de interesse comum. Por fim, é importante dizer que as empresas públicas de comunicação devem estar comprometidas com as grandes causas da sociedade, como a participação ativa em coberturas que visem à proteção de crianças, o incentivo da participação comunitária, a preservação do meio ambiente, do patrimônio histórico e cultural, entre outras iniciativas.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Uma TV pública, a fim de promover uma rápida recuperação de sua situação financeira, resolve investir no segmento de reality shows, como Big Brother Brasil e A Fazenda, tidos como altamente lucrativos. Com essa iniciativa, pretende atrair investidores interessados em divulgação de suas marcas, por meio de venda de espaços no programa no esquema de inserções de merchandising. Seria essa iniciativa considerada válida para sanar as finanças da emissora? Por quê? 2. Por sua natureza de emissora pública, como é possível a uma TV pública obter independência crítica e isenção jornalística para abordar eventuais escândalos políticos que envolvam o governo ao qual sua administração é vinculada? 3. A faixa de horário considerada “nobre” pelos meios de comunicação de massa é ocupada, numa emissora pública, por um programa cuja audiência é próxima do traço, embora considerado de excelente nível cultural e ganhador de diversos prêmios no segmento. Qual deve ser a atitude dos gestores da emissora em relação ao paradoxo qualidade versus audiência? Por quê?
Sugestões De Leitura 1. Manual de jornalismo da Radiobrás: produzindo informação objetiva em uma empresa pública de comunicação. In: Nucci Celso, ed. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas; 2006. 2. Gomes Ana Luisa Zaniboni. Na boca do rádio: o radialista e as políticas públicas. São Paulo: Aderaldo & Rothschild: Oboré; 2007.
Dicas de filmes A montanha dos 7 abutres, EUA, 1951 – Dir. Billy Wilder Este clássico dos filmes sobre jornalismo apresenta um olhar ácido sobre a exploração da mídia e a ética jornalística. Um repórter excluído da grande imprensa vê sua chance de retornar à ativa com uma cobertura sensacionalista a respeito de um homem preso em velhas ruínas indígenas no Novo México. Trata-se da história de um jornalista inescrupuloso, que faz de tudo para voltar a ter prestígio, retardando o salvamento do mineiro para se alimentar da comoção da população da pequena cidade em que foi trabalhar. Todos os homens do presidente, EUA, 1976 – Dir. Alan J. Pakula Dois jornalistas investigam o escândalo de Watergate para o jornal Washington Post. Eles descobrem uma rede de espionagem e lavagem de dinheiro, o que acaba por levar à renúncia do então presidente Nixon. O filme mostra cenas históricas, com destaque para a atuação dos repórteres investigativos Bob Woodward e Carl Bernstein, do Post, no episódio. O destaque fica para o esforço e os méritos de dois profissionais e sua busca incessante da verdade factual, contribuindo para a solução de um caso extremamente obscuro da história política americana.
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O chefe do jornalismo “Uma das características obrigatórias de um bom chefe da redação é possuir um projeto global do jornal na cabeça; deve ainda ter uma concepção ética do mundo. Assim, no trato diário com ele, as pessoas ficam sabendo que tem uma visão ética do mundo e da humanidade e certa capacidade de transferir aquilo para o trabalho do dia a dia. Acho isso indispensável. Para funcionar bem, uma redação tem que sentir certo respaldo moral.” Cláudio Abramo
Ao término deste capítulo você será capaz de: • Compreender a estrutura organizacional das redações. • Ter uma visão geral dos cargos de chefia e familiarizar-se com o ambiente de trabalho nas redações. • Dominar o processo burocrático do dia a dia de uma empresa de comunicação. O chefe de jornalismo, que geralmente tem o cargo de diretor ou gerente de jornalismo e participa, juntamente com gerentes e diretores de outras áreas, da direção da empresa, é o responsável pela linha editorial. Sobre ele despencam os maiores problemas, desde a palavra final sobre a contratação ou demissão de um jornalista até as investidas da área comercial, que têm preferência por determinadas reportagens, mas gostaria de evitar a produção de outras. Isso torna o chefe de jornalismo o “amortecedor” entre quem quer fazer do jornalismo um produto para atender o mercado, os clientes, os anunciantes, o público-alvo e os interesses da empresa, e aqueles que estão comprometidos com os interesses sociais da notícia. As empresas de comunicação são, em sua maioria, privadas e visam acumular resultados para os seus acionistas. Isso motiva alguns conflitos com o departamento de jornalismo, como o corte de pessoal por causa de contenção de gastos, ou mesmo choque de opiniões entre a redação e os proprietários da emissora. É nessa área de conflito permanente que atua o chefe de jornalismo, procurando conciliar a liberdade de expressão e os interesses econômicos e políticos da empresa. O melhor dos mundos seria se não houvesse nenhuma ingerência do alto comando da emissora sobre a linha editorial, mas, como isso nem sempre acontece, ele negocia com a empresa os casos de conflito entre as áreas. Esses conflitos são cotidianos e dependem do empenho do chefe, da dedicação ao jornalismo, da força moral e até física para ampliar a independência editorial da redação e construir uma clara separação entre o interesse público e o empresarial. Há empresas que até hoje se organizam de uma forma autoritária, com um modelo de gestão tradicional, ainda apoiadas nos métodos de Taylor e Fayol. São aquelas que funcionam sempre de cima para baixo, nas quais uns pensam e outros executam, e quem executa não pensa e não dá palpite. Regemse pelo princípio do “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Essas empresas ainda não perceberam que vivem numa época de novos desafios, e o seu caráter mecanicista as torna incapazes de reagir rapidamente às mudanças sociais cada vez mais complexas num mercado globalizado que chega até a notícia. A nova economia está levando as empresas jornalísticas a enfrentar uma hipercompetitividade mundial, e o público está em constante busca de informações de melhor qualidade. Por isso, as emissoras precisam de maior flexibilidade e agilidade para atender os desafios. É preciso acabar com
organogramas e hierarquias adequados para fábricas, quartéis ou organizações religiosas, mas inadequados para uma redação com necessidade de liberdade para ser criativa, isenta e em constante busca do que entende ser a verdade. A seguir, veja algumas sugestões para a atuação do diretor de jornalismo.
Sugestões para a atuação do diretor de jornalismo O chefe de jornalismo participa do processo de produção das notícias, discutindo a pauta, sugerindo entrevistados, conversando com repórteres e âncoras sobre as matérias que vão ao ar, e sempre aberto ao diálogo. Ele não pode ficar inacessível no seu “aquário”, como um vice-rei que nunca erra, não leva as reivindicações da equipe, inclusive salariais, à direção da empresa. Não pode ficar apenas repassando ordens que recebeu do alto comando da empresa, pois esse comportamento é um passo para a perda da liderança. Ele é o responsável pela motivação da equipe. Boa parte dos jornalistas acredita que a melhor motivação é aumentar os salários, embora haja quem discorde. Participar da elaboração da estratégia organizacional e editorial do departamento de jornalismo é um fator motivacional, porém a liberdade de expressão é o melhor motivador para os jornalistas que se veem recompensados pela exibição de suas reportagens com respeito a suas opiniões e visão de mundo. É preciso ficar atento para que o excesso de especialização não torne a redação burocrática e rotineira, vazia de conteúdo profundo, pois isso produz tédio, alienação e falta de comprometimento com a produção de notícias. O desânimo começa a tomar conta do grupo, contribuindo para a pasteurização das relações pessoais. Para inverter esse quadro, é necessário a ação participativa de todos, a divisão de poder e tarefas, a abertura para críticas a todo o processo de produção das notícias, o debate aberto e franco sobre a diversidade de opiniões e o respeito pelas propostas, por mais exóticas que possam parecer. Os sintomas de que a criatividade está sendo substituída por compadrismo, favorecimentos de pessoas, fechamento dos canais de ascensão aos novos talentos é a desmotivação, o descomprometimento e a competição exacerbada entre as pessoas. Uma redação que vive nesse ambiente não dá prazer para ninguém, e o trabalho passa a ter um peso insuportável. Os reflexos na qualidade jornalística são visíveis em pouco tempo. A empresa não pode ter uma comunicação interna deficiente. Por exemplo, as pessoas que lidam com notícias não podem saber dos acontecimentos na empresa na qual trabalham pelos jornais ou pela “rádiopeão”. O chefe de jornalismo deve cuidar do acesso de todos às informações de interesse da redação, enviando e-mails internos ou repassando os que chegam da direção da empresa e do público, com críticas ou elogios. Essa circulação de informações internas é vital para manter o ânimo das pessoas e a certeza de que elas participam do processo. Uma excessiva carga de trabalho para o chefe de jornalismo, mais preso à burocracia do que ao jornalismo, não permite a ele tempo para a reflexão sobre o trabalho desenvolvido em conjunto com a redação. Isso faz que na base do jornalismo se espalhe o tédio, que acaba associando-se à falta de compromisso com o fazer um jornalismo de qualidade e, portanto, ético. A ação do chefe de jornalismo se traduz em uma liderança para adultos. Ou seja, ele não pode tratar os seus liderados como crianças, mas isso é mais comum do que se pode imaginar. O líder deve estar preparado tanto para dar respostas quanto para fazer perguntas corretas, e precisa aprender a liderar um grupo que tem autonomia, criatividade, iniciativa, senso crítico e disposição para fazer jornalismo. Isso é impensável em uma estrutura do tipo “eu mando e você obedece”, ou “eu penso e você executa”, ou, ainda, “não faça perguntas, escreva”, parafraseando Mussolini. É preciso romper o paradigma da organização rígida e aceitar o compartilhamento de lideranças e ações, pois a eficácia é fruto da ação conjunta.
Como a motivação dos jornalistas é diretamente proporcional ao conhecimento da filosofia, dos objetivos e das metas da organização em que trabalha, o chefe precisa identificar fatores que levam à desorganização da redação e avaliar primeiramente qual a sua colaboração para as coisas não se acertarem. Entre os principais sintomas da crise estão desmotivação, falta de comprometimento, boatos, camuflagem de conflitos, falta de liderança, autocratismo e inflexibilidade, entre outros. Um dos elementos desagregadores e desestimuladores do trabalho das redações é a obrigação de se produzir reportagens sem conteúdo jornalístico – as chamadas de “interesse da casa”. Outros interesses que não o de atender ao social acentuam essas ações que desmotivam os jornalistas. Em alguns casos há uma área cinza em que o chefe de jornalismo não diz claramente se determinada reportagem é ou não obrigatória por conta de outros interesses. Muitas vezes isso sobra para os editores-chefes, os quais, por sua vez não dizem explicitamente o que impõe esse comportamento, gerando um “excesso de zelo”, e, por causa da dúvida, leva a equipe a produzir matérias duvidosas. O chefe tem obrigação de lutar contra essas imposições pelos motivos sociais que todos conhecem também porque isso desmotiva os jornalistas imbuídos do compromisso social da notícia. A contratação de novos jornalistas deve ser aberta à participação, indicação e avaliação do grupo que divide a liderança da redação, e o “QI” (quem indicou) deve ser varrido das redações. Quando houver uma vaga, o chefe da redação deve comunicar a todos, para que tenham a oportunidade de apresentar candidatos. A avaliação deixa de ser um ato discricionário e autocrático e passa a ser democrática. Seus esforços devem ser os de desenvolver lideranças que aprendam a administrar o tempo e estabelecer prioridades na redação. A partir do rompimento dos paradigmas das estruturas organizacionais rígidas, estáticas e hierarquizadas, é possível ao chefe do departamento de jornalismo cobrar, acompanhar e avaliar as responsabilidades individuais e do grupo. Espera-se que ele seja flexível, saiba trabalhar em grupo, ouvir e falar, tenha bom relacionamento com todos, amigos ou não, seja confiante, promova o treinamento da equipe, seja tolerante com os erros e saiba avaliar e liderar pelo exemplo. Existem situações emergenciais em que ele precisa tomar decisões rápidas e solitárias. São momentos excepcionais que exigem dele bomsenso, equilíbrio, firmeza, liderança e visão clara da missão social do jornalismo e da empresa. Deve ter também conhecimento técnico do processo, ter habilidade de negociação, conhecer os membros de sua equipe, conquistar a credibilidade do grupo, saber motivar as pessoas, ser transparente e ter trânsito em todas as áreas. Ele deve ser respeitado por suas qualidades, e não temido pelo poder que a empresa lhe delegou. É preciso flexibilidade mesmo com o jornal no ar, para que as últimas e importantes notícias sejam divulgadas e para que determinadas matérias espelhadas sejam derrubadas porque perderam importância diante de outros acontecimentos. O tempo é rígido, por isso precisa ser bem administrado. Essa exatidão do tempo é o “afinamento” que, geralmente, acontece no último bloco e que pode ser feito tanto com reportagens quanto com notas, comentários ou alguns segundos com o “subir créditos”. O jornal eletrônico é dividido em várias partes ou blocos, e entre eles há um intervalo comercial, ou institucional. Geralmente os blocos coincidem com essa divisão, planejados pelo departamento de programação ou de veiculação de publicidade. Por isso, é possível saber com antecedência qual o tempo do telejornal, incluindo o tamanho de cada bloco e intervalo. O editor-chefe deve cuidar para que o telejornal não incorra na omissão, ou seja, na ausência de informações de qualquer natureza sobre determinado assunto de interesse geral. Essa audiência pode ter como causa a incapacidade de apuração, confirmação ou falta de recursos para que os jornalistas completem o trabalho. Sendo assim, é preciso um esforço coletivo para superar os obstáculos que
resultam na missão. Pressões políticas, econômicas e até da própria empresa de comunicação são responsáveis para que haja a sonegação, ou seja, a equipe tem conhecimento da informação, mas ela não vai para o ar. É uma questão de consciência do editor-chefe resistir a essas pressões, mesmo sabendo que em alguns casos o emprego dele está em jogo. O telejornal precisa ser claro, didático e compreensível para quem liga a TV. Isso impede a submissão, ou seja, a exibição de notícias incompreensíveis para uma boa parte da audiência. As 12 maiores agências de notícias enviam de 6 a 8 mil despachos por dia. Uma única pessoa não tem condições de classificar tudo isso, portanto, é necessário o trabalho de vários outros jornalistas, mesmo que em alguns veículos inexistam editorias específicas. O desejo de tornar a notícia didática e compreensível pode provocar um reducionsimo, ou seja, empobrecê-la de tal forma, que ela acabe não retratando a realidade que pretende. Uma das formas mais comuns de reducionismo é a descontextualização. É preciso cuidado com as reportagens que foram construídas com informações de segunda mão e que não foram devidamente apuradas. Elas são aparentemente corretas, mas constituem falsas premissas para abrigar uma reportagem que pretende ser verdadeira. Lembre-se de que, como já foi citado, segundo David Lewis, mais informações foram produzidas nos últimos 30 anos que nos cinco mil anos anteriores. Uma edição de dia de semana do The New York Times contém mais informações do que tudo aquilo que um homem médio do século XV ficou sabendo durante toda a sua vida. Portanto, é preciso editar sempre. O público está à disposição para ver bons programas jornalísticos, portanto, é preciso editá-los corretamente. Nos Estados Unidos, um norte-americano médio vê sete horas diárias de TV. No Brasil, não deve ser muito menos. Como se pode ver, público interessado há, mas é preciso capturá-lo com noticiários competentes, éticos, dinâmicos, interessantes, curiosos, ágeis, bonitos e comprometidos com a verdade. Pratique a interatividade, que é uma ferramenta de trabalho, fonte de pauta, canal de comunicação com o telespectador e funciona como ombudsman dos programas. Divulgue o e-mail e o número do telefone de atendimento ao telespectador. Quando se anuncia que em determinado dia vai acontecer alguma coisa, não se deve esquecer, porque anunciar é estabelecer um compromisso com o telespectador e, por esse motivo, os anúncios devem ser anotados na agenda do programa. A repetição de matérias é possível desde que seja um assunto importante. Além disso, deve-se considerar que muitos telespectadores não podem assistir ao jornal na hora em que vai ao ar. Se a reportagem for relevante, nada impede que seja repetida em outro programa. A maior armadilha que um editor-chefe enfrenta é a de basear suas decisões em apenas parte dos dados disponíveis. Outra é a de não resistir à sedução de versões incompletas. Portanto, é preciso atenção para que isso não ocorra. A equipe mais feliz é aquela em que o editor-chefe tem um papel ativo na produção do programa e no aprimoramento jornalístico. É aquele que arregaça as mangas e mergulha na busca das melhores notícias juntamente com a equipe, que nunca está no pedestal nem assume a postura de supremo algoz aparecendo apenas quando se trata de cobrar possíveis falhas, muitas delas duvidosas. É aquele conhecido como estadista. O editor-chefe é o responsável pelo clima de cordialidade entre os membros da equipe e que se espalha na redação, e a camaradagem deve prevalecer mesmo nesse ambiente competitivo. As disputas, rivalidades e divergências de opiniões são inerentes a esse tipo de organização e devem ser
acompanhadas de bom-senso, honestidade, respeito mútuo e delicadeza. Há chefes que optam por desenvolver um “clima de terror”, desestabilizando a todos, mas essa atitude falsamente conduz ao aumento da produtividade e raramente incentiva a criatividade – isso é o que não se deseja em uma redação. As pessoas estão sempre apreensivas com broncas em público, gritos, palavrões, ou ameaça de demissão, e esse terror é responsável pela competição desenfreada e por tornar a vida das pessoas um inferno no ambiente de trabalho.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Um dos colegas da redação se aposentou. Para a vaga dele, o diretor de jornalismo designa sua filha, recém-formada e ainda inexperiente. Em vez de ajudar, ela acaba se revelando fraca e negligente, prejudicando o trabalho dos demais colegas. Pior ainda: os demais jornalistas da redação começam a não ficar à vontade com a presença dela, sentindo-se “patrulhados”. O que deve ser feito neste caso? 2. Você é diretor de jornalismo de uma emissora de rádio, que acaba de ser adquirida por um grande grupo de mídia. A nova direção exige algumas mudanças na linha editorial da emissora, afetando diretamente a qualidade do jornalismo praticado até então, com cortes de orçamento e restrições à abordagem de certos assuntos, os quais afetam os interesses do novo proprietário. Qual é a sua atitude? Você aceita e repassa as novas imposições ou resiste e luta para manter o padrão de qualidade a que estava acostumado? 3. Um jornalista da redação pede para conversar com você, que é diretor de jornalismo, mas está assoberbado com diversas tarefas administrativas, das quais não consegue se livrar. Com prazos apertados e muita pressão, você não encontra tempo para atender o profissional. Como resolver isso a contento?
Sugestões De Leitura 1. Yorke Ivor. Telejornalismo. São Paulo: Roca; 2006. 2. Meditsch Eduardo. O radio na era da informação – teoria e técnica do novo radiojornalismo. Florianópolis: Insular; 2006.
Dicas de filmes Quase famosos, EUA, 2000 – Dir. Cameron Crowe Um roqueiro adolescente consegue uma oportunidade de trabalhar como jornalista na conceituada revista Rolling Stone. Seu primeiro trabalho é acompanhar um show da banda Stillwater, mas sua paixão pelo rock e por uma groupie o afastam da objetividade jornalística necessária para o trabalho. Crowe dirige um relato meio autobiográfico, pois ele mesmo foi um jovem repórter da Rolling Stone, e a banda que ele acompanhou em turnê foi Th e Allman Brothers. Cidadão Kane, EUA, 1941 – Dir. Orson Welles Primeiro filme longa-metragem dirigido por Orson Welles, o filme encontrou forte oposição por parte do magnata da mídia norte-americana, William Randolph Hearst, que julgava que a obra denegria sua imagem. Na realidade, havia mesmo muitos pontos coincidentes das biografias de Hearst e de Kane. Cidadão Kane marcou sua época por causa das inovações, sobretudo nas técnicas narrativas e nos enquadramentos cinematográficos. O filme começa com o protagonista já morto, mudando-se a cronologia dos fatos, e a cenografia mostra pela primeira vez o teto dos ambientes. Foi considerado por grande parte da crítica especializada como o maior filme do século XX, figurando em primeiro lugar na lista do American Film Institute.
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O editor-chefe “A palavra que tens dentro de ti é tua escrava; aquela que deixas escapar é tua senhora.” Provérbio chinês
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Explicar quais requisitos são necessários para ser um editor-chefe. • Entender a grande responsabilidade que o editor-chefe tem sobre sua equipe. • Mostrar as principais características da função de editor-chefe. Existem alguns cargos na redação responsáveis pela produção do jornalismo. Um deles é o editorchefe, um posto aberto para jornalistas mais experientes e que se dedicam a um aprimoramento contínuo. Qualquer jornalista da redação tem o direito de almejar subir na estrutura burocrática da empresa, mas precisa estar preparado. Acompanhar o dia a dia não é suficiente. O editor-chefe é o responsável direto pelo produto jornalístico. É ele quem escolhe as reportagens que vão ao ar e, em última análise, responde pelos erros e acertos do programa, bem como faz uma avaliação crítica da qualidade das matérias produzidas e debate o resultado com a pauta e a chefia de reportagem. O editor-chefe deve ter a consciência de que é preciso ir além dos fatos para que o público possa entender um assunto importante. Para isso, ele deve ter em mente a diferença entre estar informado e saber, daí a necessidade de se estabelecer uma cobertura que qualifique o jornalismo como mediador. Nessa perspectiva, ele deixa simplesmente de reagir aos acontecimentos e esmiúça temas, antecipa questões sociais relevantes e aponta soluções realistas. Para ser editor-chefe, é preciso saber ouvir críticas, mudar sempre que se constatar que o rumo do bom jornalismo está sendo desviado, ter espírito democrático e ser respeitado por sua experiência e bom-senso. Ele deve saber que uma equipe funciona melhor quando tem um líder, e não apenas um chefe, pois o resultado surge quando todos colaboram para o programa por estarem motivados a fazer um bom jornalismo, e não porque têm medo do chefe. A melhor equipe é a que se parece com uma banda de jazz. Ou seja, cada um tem sua função no conjunto, há improviso, criatividade, arte, coordenação, harmonia e espaço para a individualidade dentro do coletivo. Veja, a seguir, algumas características da função de editor-chefe.
Características da função de editor-chefe O editor-chefe precisa ficar atento para o fato novo, que é a matéria-prima mais importante do jornalismo, e deve escolher um conjunto de fatos que sejam desconhecidos do público-alvo. O destaque deve ser para o raro, o paradoxo, o imprevisto, pois a novidade é a alma de um bom programa jornalístico. É importante pensar que os acontecimentos antigos precisam de fatos novos para surpreender mesmo quem acompanha determinados assuntos todos os dias. Uma informação só faz sentido quando necessariamente se harmoniza com uma referência anterior do público, algo que ele possa identificar, que lhe cause interesse, e o jornalismo releva e destaca o que sai do normal, o joio, como disse Mark Twain, mas isso está além de noticiar apenas quando o homem morde o cachorro, ou o rabo balança o cachorro. O editor-chefe deve ficar atento e sensível ao que interessa ao público-alvo da emissora. Ele é o representante do público na organização do aparente caos que é o emaranhado de fatos que acontecem simultaneamente e tem o mandato para ordenar, classificar e escolher o que vai ser noticiado ou não – daí a grande responsabilidade do editor no sucesso do noticiário. É preciso lembrar que nenhuma emissora tem condições de informar tudo o que acontece no mundo, e isso nem é uma exigência do público. Quem acompanha um noticiário quer uma seleção dos fatos mais importantes do dia, das notícias que possam ter alguma influência em sua vida. A organização das notícias obedece às regras do meio e do veículo específico, e é preciso considerar sempre o perfil do público-alvo para o qual o produto se destina. Não se pode brigar com os fatos, pois eles não falam por si só, precisam ser identificados, mas seguem sempre a óptica do editor-chefe e da equipe. É claro que vale o potencial de cada um de identificar o inusitado, mas não se descarta também a intuição. A tarefa de editar inclui a classificação das notícias em categorias que correspondem a locais específicos, ou seja, “amarradas” com o tema. Assim, uma reportagem sobre uma enchente no Mato Grosso pode vir seguida de outra contando como foi a enchente em Taiwan. Se fosse separada por categorias de “nacional “e “internacional”, provavelmente estariam distantes uma da outra. Portanto, há mais de um critério de organização, e nenhum deles é definitivo ou intocável, e eles mudam dependendo do que acontece no mundo, o que dá condição para que a classificação seja organizada de acordo com o interesse do público-alvo. Em outras palavras, o noticiário deve ter conteúdo e forma capazes de prender a atenção do público, e isso faz com que uma reportagem seja escolhida para abrir o jornal, outra para fechar, e outras para serem chamadas na passagem de um bloco para outro. Um telejornal não precisa sair fechado da redação para o estúdio – é uma quebra de paradigma. De maneira geral, é costume o jornal, tanto da TV quanto do rádio, chegar ao estúdio fechado, como se nada do que acontece de novo pudesse ser levado ao ar, mas, tal procedimento burocratiza e engessa o noticiário. É preciso flexibilidade mesmo com o jornal no ar, para que as últimas e importantes notícias sejam divulgadas, e para que determinadas matérias espelhadas sejam derrubadas porque perderam importância diante de outros acontecimentos. O tempo é rígido, por isso precisa ser bem administrado, e essa exatidão do tempo é o “afinamento” que, geralmente, acontece no último bloco. Ele pode ser feito tanto com reportagens como com notas, comentários ou alguns segundos com o “subir créditos”. Um jornal eletrônico é dividido em várias partes ou blocos, e entre eles um intervalo comercial, ou institucional. Geralmente os blocos coincidem com essa divisão, planejados pelo departamento de programação ou de veiculação de publicidade, por isso é possível saber com antecedência qual o tempo
do telejornal, incluindo o tamanho de cada bloco e o intervalo. O editor-chefe deve cuidar para que o telejornal não incorra em omissão, ou seja, na ausência de informações de qualquer natureza sobre determinado assunto de interesse geral. Essa ausência pode ter como causa a incapacidade de apuração, confirmação ou falta de recursos para que os jornalistas completem o trabalho, o que torna necessário o esforço coletivo para superar esses obstáculos que resultam na omissão. Pressões políticas, econômicas e até da própria empresa de comunicação são responsáveis para que haja a sonegação, ou seja, a informação é do conhecimento da equipe e não vai para o ar. É uma questão de consciência do editor-chefe resistir a essas pressões, mesmo sabendo que em alguns casos o emprego dele está em jogo. O jornal eletrônico precisa ser claro, didático e compreensível para quem liga a TV, o rádio ou o computador, pois isso impede a submissão, ou seja, a exibição de notícias que são incompreensíveis para uma boa parte da audiência. Mas uma única pessoa não tem condições de classificar tudo isso, portanto, é necessário o trabalho de vários outros jornalistas, mesmo que em alguns veículos inexistam editorias específicas. O desejo de tornar a notícia didática e compreensível pode provocar um reducionsimo, ou seja, empobrecê-la de tal forma, que ela não retrate a realidade que pretende (a descontextualização é uma das formas mais comuns de reducionismo). É preciso cuidado com as reportagens que foram construídas com informações de segunda mão e que não foram devidamente apuradas, pois elas podem aparentemente ser corretas, mas constituir falsas premissas para abrigar uma reportagem que pretende ser verdadeira. Segundo David Lewis, mais informações foram produzidas nos últimos 30 anos que nos cinco mil anteriores, por isso é preciso editar sempre. O público está à disposição para ver bons programas jornalísticos, o que demanda uma edição bastante correta. É preciso capturá-lo com noticiários competentes, éticos, dinâmicos, interessantes, curiosos, ágeis, bonitos e comprometidos com a verdade. Pratique a interatividade, pois ela é além de ferramenta de trabalho, também fonte de pauta, canal de comunicação com o público e funciona como ombudsman dos programas. Divulgue o e-mail, endereço da página no Facebook e outras ferramentas, e também o número do telefone de atendimento. Quando se anuncia que em determinado dia vai acontecer alguma coisa, não se deve esquecer, porque anunciar é estabelecer um compromisso com o público, por isso, todos os anúncios devem ser anotados na agenda do programa. A repetição de matérias é possível desde que tratem de um assunto importante. Além do mais, deve-se considerar que muitos espectadores não podem assistir ao jornal na hora em que vai ao ar, portanto, se a reportagem for relevante, nada impede que seja repetida em outro programa. A maior armadilha que um editor-chefe enfrenta é a de basear suas decisões em apenas parte dos dados disponíveis. A outra é a de não resistir à sedução de versões incompletas. A equipe mais feliz é aquela em que o editor-chefe tem um papel ativo na produção do programa e no aprimoramento jornalístico. É ele quem arregaça as mangas e mergulha na busca das melhores notícias juntamente com a equipe, que nunca está no pedestal nem assume a postura de supremo algoz, aparecendo apenas quando se trata de cobrar possíveis falhas, muitas delas duvidosas. Esse tipo de chefe é aquele conhecido como estadista. Ele é o responsável pelo clima de cordialidade entre os membros da equipe e que se espalha na redação. É importante lembrar que a camaradagem deve prevalecer mesmo no ambiente competitivo da redação. As disputas, rivalidades e divergências de opiniões são inerentes a esse tipo de organização e devem ser acompanhadas de bom-senso, honestidade, respeito mútuo e delicadeza. Há chefes que optam
por desenvolver um “clima de terror”, desestabilizando a todos, mas essa atitude falsamente conduz ao aumento da produtividade e raramente incentiva a criatividade – na verdade, isso é tudo o que não se deseja em uma redação. Atitudes como essas fazem as pessoas ficarem sempre apreensivas com broncas em público, gritos, palavrões ou ameaça de demissão. Além disso, devemos lembrar que terror é responsável pela competição desenfreada e por tornar a vida das pessoas um inferno no ambiente de trabalho.
Exercícios propostos Para Refletir 1. O editor-chefe da redação é uma pessoa vaidosa e reconhecida no mercado, e por isso mesmo, refratário às críticas do pessoal da equipe, mesmo quando não está com a razão. Como contornar esta situação, em nome de ter um trabalho jornalístico de nível? 2. Num dia agitado na redação, com vários fatos importantes ocorrendo e competindo entre si, como o editor-chefe deve fazer para se destacar em relação aos jornais concorrentes, sem exacerbar o tempo reservado pela emissora para o programa? 3. Um repórter apresenta um furo jornalístico ao editor-chefe, mas que ainda precisa terminar de apurar, o que terá que retardar sua divulgação. A matéria ficaria pronta a tempo de ir ao ar no programa dominical da emissora, dirigido por outro profissional. Sendo o assunto de relevante interesse público, o que ele deve fazer: aguardar a finalização da apuração e só apresentar no seu jornal ou entregar ao editor do programa dominical?
Sugestões De Leitura 1. Medina Cremilda. Ciência e jornalismo – da herança positivista ao diálogo dos afetos. São Paulo: Summus; 2008. 2. Morais Fernando. Cem quilos de ouro e outras histórias de um repórter. São Paulo: Cia; 2003; das Letras.
Dicas de filmes Jejum de amor, EUA, 1940 – Dir. Howard Hawks Walter Burns, editor de um grande jornal de Chicago, está prestes a ver sua ex-esposa e repórter casando-se novamente, agora com um corretor de seguros. Mas antes ele quer vê-la escrevendo uma última grande história – ou talvez queira tentar reconquistá-la. O filme é uma comédia ágil, veloz e dinâmica, característica comum de muitos filmes que vieram depois, ainda na era em preto e branco do cinema. Passageiro, profissão repórter, Itália, França, EUA, Espanha, 1975 – Dir. Michelangelo Antonioni História de um jornalista cobrindo uma guerrilha na África, que assume a identidade de um amigo morto e, com ela, envolve-se numa perigosa trama. Uma reflexão sobre a relevância do jornalismo.
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Os jornalistas “Sempre manifeste simpatia pelas pessoas ao ascender, pois você as reencontrará quando descer.” Wilson Mizner
Ao término deste capítulo você será capaz de: • Criar um ambiente de trabalho favorável ao exercício do jornalismo. • Entender como um chefe de redação deve se portar. • Entender como se relacionar com seu chefe e seus colegas. Na profissão, ora o jornalista está na “planície”, ora está na “montanha”. São termos que qualificavam os partidos e políticos franceses na Assembleia Nacional durante a Grande Revolução. Portanto, a “planície” é onde se situa a maioria dos jornalistas, ou seja, os que não têm cargos de chefia, mesmo se, como dissemos anteriormente, algumas empresas jornalísticas criarem nas redações uma hierarquia de cargos mais parecida com instituições religiosas ou militares. Uma porção de gente é “chefe”, “subchefe”, “coordenador”, entre outros, e a ascensão funcional nem sempre se dá por critérios de mérito, o que gera insatisfação, desestímulo e queda da qualidade do jornalismo. Os habitantes da “planície” são, em última análise, os que carregam o piano, por isso, precisam ter um relacionamento no mínimo camarada com os colegas de trabalho, os quais, pela própria dinâmica da rotatividade do mercado, ora estão na “planície”, ora estão na “montanha”. É uma peculiaridade da profissão de jornalista. Não é raro alguém ter sido chefe em uma redação e depois ser comandado por um ex-subordinado quando muda de emprego. Nem sempre os chefes conhecem pessoalmente os jornalistas da redação, ainda mais os que ocupam cargos de direção ou gerência, e isso não contribui para a consolidação da equipe nem para uma correta avaliação da atividade e do talento de cada jornalista. Desempenhar bem determinada função é apenas uma das exigências às quais os jornalistas estão submetidos. Os chefes precisam exibir também facilidade de gestão de projetos, liderança, trabalho em equipe, inovação, criatividade e pensamento estratégico. São competências que a “planície” precisa cobrar dos responsáveis pelos cargos de chefia. Subir na hierarquia nem sempre é uma promoção, pois transformar um bom repórter em um mau chefe de reportagem é prejuízo para a empresa e o jornalista. O desentendimento com as chefias tem feito bons jornalistas abandonarem o emprego e voltarem ao mercado em busca não de um salário maior, mas de um local de trabalho no qual o relacionamento com os chefes seja melhor. Assim, um bom chefe é mais eficaz do que um bom salário para manter um jornalista na empresa. Há empresas que, para manter alguns jornalistas em seus quadros, aceleram as promoções e acabam criando chefes incompetentes. Sendo assim, é importante lembra que simples promoção nem sempre habilita o promovido a exercer o cargo. Em algumas redações a estrutura funcional é tão complicada que o chefe recebe responsabilidade demais e autonomia de menos. O resultado? Um engessamento que começa na cúpula e termina na “planície”. A prevalência do bordão do “eu mando, você obedece” aniquila a autoestima da redação, provocando a queda na qualidade do jornalismo. Esse é o cenário ideal para o surgimento dos “torturadores
psicológicos”, ou seja, os chefes que tratam os colegas como seres inferiores. A cobrança de resultados – que, na produção de notícias, é a veracidade, a ética, a atualidade etc. – não pode ser feita aos berros ou com a redação postada diante do chefe, que chama seus subordinados de “cambada de incompetentes”, “lerdos”, “burros” etc. A “planície” não pode admitir esse tipo de tratamento, que certamente não tem o apoio da empresa afinada com a moderna gestão de talentos. Errar é humano, portanto, todos erram: chefes e “planície”. No entanto, alguns chefes se recusam a reconhecer os próprios erros porque acham que com isso perdem poder e prestígio diante dos comandados. A velha frase “chefe se engana, quem erra é o subordinado” é pura fantasia. Se quiserem manter a confiança da redação, os chefes devem ser cobrados sempre que o seu discurso não coincidir com sua ação. Os jornalistas existem também para serem cobrados e elogiados pelo seu trabalho. Não se admite das chefias comentários vexatórios, humilhantes ou em tom acima do coloquial. O tom firme não pode se confundir com indelicadeza ou falta de respeito humano e profissional. A “planície” deve exigir que os chefes acompanhem o processo de produção de notícias, deem palpites, contribuições, e não apenas se portem como fiscais, isto é, se manifestem só quando o resultado está pronto. É muito cômodo ficar de estilingue na mão à espera dos erros da equipe para agir. O chefe deve fazer parte do processo, e é agindo dessa forma que ganha liderança e respeito na redação. O chefe deve formar sua equipe, o que não deve ser confundido com adestrar, ou seja, tentar impedir o desenvolvimento do espírito crítico, um dos pressupostos mais importantes no jornalismo. A insegurança de alguns chefes faz com que se vendam como “insubstituíveis”. São os que não preparam sucessores para o cargo, temendo ser suplantados por outro jornalista mais competente. É bom lembrar que quem age assim dificilmente será promovido, pois quem os superiores deixariam no lugar dele? Chefes que exigem dos subordinados apenas o cumprimento de ordens não podem exigir deles envolvimento no processo, pois só estariam constituindo um bando de “alienados”. Todos devem partilhar dos sucessos e fracassos da redação. A “planície” não pode permitir que os chefes privatizem as vitórias e socializem as derrotas sob pena de perder o ideal que move todos na profissão. O chefe não pode ser apenas um “repassador” de broncas vindas de cima, que de degrau em degrau chegariam ao acionista da empresa. Ele tem de amparar, assumir parte da bronca, evitando criar um clima infernal na redação, uma vez que isso derruba a qualidade do jornalismo produzido. O que a “planície” precisa exigir do chefe é um comprometimento do tipo “estamos todos no mesmo barco”. Para tudo ir bem, é preciso que todos estejam bem. Se entrar água no barco, afundam todos, e não apenas a turma do porão. Chefias e subordinados só vão bem se um perguntar ao outro como pode ajudá-lo. O tempo dos feitores acabou com a abolição da escravidão no final do século XIX, porém alguns chefes ainda não foram avisados e insistem em jargões do tipo “Você vai ter que me aguentar”; “Eu sou assim mesmo e não mudo”; “A porta da rua é a serventia da casa”; “Quem não estiver contente passe no Departamento Pessoal”; “Se vocês fossem competentes estariam empregados na concorrência”. Esses exemplos, não tão imaginários como você pode pensar, são típicos de chefes de algumas redações. Não se pode aplicar como regra geral a dispensa de 10% a 20% da redação no início do ano sob pretexto de renovar o plantel e permitir que profissionais com “sangue novo” tenham vez na empresa. É preciso critério na avaliação se for necessário dispensar alguém que por qualquer motivo teve a chance de avançar e não aproveitou. A “planície” deve utilizar alguns critérios para avaliar o chefe, como: “ele é centralizador e não envolve as pessoas nas decisões?”; “Favorece alguns amigos?”; “É carreirista, nunca reconhece o bom trabalho de ninguém?”; “Só promove os que estão no seu círculo mais íntimo de amizade?”. A chefia da chefia, ou a direção geral da empresa, precisa saber disso caso os exemplos citados sejam constantes. Analise as críticas que seu chefe faz a você, estabeleça o ponto central e peça ajuda dele e dos
companheiros para superar a possível deficiência. O humor não deveria interferir nas decisões do chefe, mas por ele ser uma pessoa como outra qualquer, é sempre preferível esperar que o humor melhore para tratar de questões polêmicas. Não espere juntar uma porção de questões para resolver com a chefia, pois corre o risco de ter lançado sobre você um “caminhão de melancias”. É recomendável que os problemas sejam solucionados à medida que aparecerem. Se há trabalho solidário na redação e a chefia divide a responsabilidade com todos, não há por que acusar o chefe de má gestão, uma vez que o trabalho é coletivo e erros e acertos são da responsabilidade de todos. E os assuntos relativos ao trabalho devem ser discutidos, analisados e resolvidos na empresa. Deixe o barzinho para as comemorações. Não faça com o chefe o que não quer que ele faça com você; problemas são resolvidos com diálogo, e não com gritos, socos na mesa, batidas de portas ou palavras de baixo calão. Reclamar contra o chefe nos cantos da redação é uma atitude antiprofissional e não contribui para ninguém avançar na profissão, nem melhorar o clima no trabalho. Fuja disso. Fale o que você pensa diretamente com ele, sempre com educação e respeito humano. Procure não rotular alguns colegas como “puxa-sacos”, “lambe-botas”, submissos ou outros adjetivos. Ao agir assim, você estará provavelmente na mesma situação na lista de outros colegas. Em caso de grave desentendimento com a chefia, peça para uma testemunha acompanhar a conversa, pois isso evita versões antagônicas de um mesmo fato. Se a situação for insustentável e você tiver de deixar a empresa, escreva uma carta para a direção geral, com cópia para o chefe, recursos humanos e colegas da redação. Há empresas que fazem entrevistas demissionais, mas nem todas. Esse gesto não deve ser entendido como uma vingança ou represália, mas uma contribuição para que um mau chefe não se perpetue no poder.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Seu novo chefe é um colega de redação, promovido por questões salariais, mas inexperiente em termos de liderança. Sob pressão na nova função, ele logo começa a repassar para os subordinados as broncas que recebe, cobrando cada vez mais resultados, ainda que em detrimento da qualidade das reportagens. Acostumado a ter condições de executar seu trabalho com estrutura e prazo condizentes, você sente dificuldades em aceitar a pressão e a busca de audiência a qualquer preço. Qual é a sua atitude? Aceita as novas condições na “planície” ou confronta as decisões da “montanha” e mantém seu padrão de trabalho? Por quê? 2. Agora você é quem foi promovido e passa a atuar na “montanha”. Há tempos vinha tendo problema com um colega da redação, que havia tentado puxar seu tapete várias vezes junto ao chefe anterior. Sabendo de suas características, como você vai se portar em relação a esse mau colega, agora que tem o poder de decidir e dar as ordens? 3. Você procura sempre dar o melhor de si em seu trabalho, mas o relacionamento com seu chefe imediato não é dos melhores. Ele sempre encontra defeitos no que você faz, critica seu trabalho diante de todos e vive fazendo ameaças, tornando sua rotina um inferno. Sabendo que o problema é de natureza pessoal, e não profissional, qual é a melhor postura a ser adotada neste caso? É possível lidar com uma situação dessas sem prejuízo a nenhum dos envolvidos? Como?
Sugestões De Livros 1. Tavares Mariza. Manual de redação CBN. São Paulo: Globo; 2011. 2. Pinto Ana Estela de Souza. Jornalismo diário: reflexões, recomendações, dicas e exercícios. São Paulo: Publifolha; 2009.
Dicas de filmes A fogueira das vaidades, EUA, 1990 – Dir. Brian de Palma Ao se encaminhar com sua amante para Manhattan, um magnata de Wall Street erra o caminho e acaba indo parar no Bronx. Um acidente e um jornalista que espera sua grande chance mudarão para sempre a vida do milionário. A síndrome da China, EUA, 1979 – Dir. James Bridges Uma repórter e seu cinegrafista presenciam um estranho acontecimento em uma usina nuclear da Califórnia. Após a matéria feita por eles ter sido recusada pela emissora de televisão, começam a investigar o porquê do segredo em torno do assunto, com a ajuda de um engenheiro da usina que, gradativamente, toma consciência da gravidade da situação. Lançado nos Estados Unidos no dia 16 de março de 1979, por ironia do destino, o acidente com a usina nuclear de Th ree Mile Island, na Pensilvânia, aconteceu no dia 28 de março, exatamente treze dias depois do lançamento do filme.
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A reportagem “A maneira de obter informação afeta o seu teor.” Alberto Dines
Ao término da leitura deste capítulo você será capaz de: • Entender algumas técnicas importantes da reportagem. • Explicar a relação entre o repórter e a chefia. • Mostrar alguns recursos utilizados na reportagem. A reportagem tem algumas técnicas gerais que se aplicam a todas as plataformas por onde o jornalismo se propaga. No entanto, há uma maior complexidade quando há o uso da imagem para a construção de uma história, seja ela divulgada em uma mídia social, seja na TV convencional. A seguir, você verá algumas sugestões úteis, mas que não dispensam a experiência do dia a dia e a teoria da comunicação. A reportagem é a principal fonte de matérias exclusivas do telejornalismo, e a busca constante da isenção jornalística é a melhor forma de passar as informações para que o telespectador possa tirar suas próprias conclusões sobre o fato relatado. Sendo assim, o repórter deve cultivar suas fontes de informação e acompanhar os assuntos pelos diversos meios de comunicação – como jornais, sites, revistas, emissoras de rádio e TV – pois as pesquisas ajudam no aprofundamento da reportagem. O jornalista não domina todos os assuntos relatados, mas sabe quem pode dar as informações, e também não deve vacilar em ligar para um especialista e pedir que o ajude a compreender o assunto em questão. Ele deve sempre preparar com antecedência as perguntas que vai fazer, além de ser incisivo e firme, mas sem agredir o entrevistado. As perguntas devem ser claras, diretas, curtas e encadeadas, e a sequência de raciocínio do entrevistado é vital para prender a atenção do público O repórter deve obter do entrevistado respostas curtas que satisfaçam às indagações contidas na pauta, uma vez que elas facilitam o trabalho da edição da reportagem. Nos telejornais, as sonoras costumam ser de, no máximo 20 segundos, quando não menos. Perguntas do repórter, em matérias gravadas, podem ou não aparecer na reportagem, mas o importante é usar o que melhor introduz a sonora do entrevistado. Por uma característica própria do veículo eletrônico, as reportagens ao vivo reproduzem sempre o som ambiente, pois isso dá o clima do acontecimento. É impossível impedir que o som ambiente passe para a reportagem, e isso nem é desejável, pois sons de carros no trânsito, chuva, buzinas, execução de uma música, refrão de torcedores e manifestantes dão um “colorido” especial à reportagem. Ao conseguir informações em off do entrevistado, o repórter e a chefia devem identificar o interesse da fonte em divulgar determinada notícia, para evitar erros que possam levar à perda da credibilidade. A falta de entrosamento pode provocar atritos na redação, mais comuns em horário de fechamento do jornal, para decidir se a informação será levada ao ar. O repórter no final da matéria grava o off e deixa um relatório completo para a chefia de reportagem e para o editor, além de apontar o prosseguimento da pauta com novas sugestões. É importante que, ao escrever o off, o texto seja preciso, coloquial e conciso. Na dúvida, o repórter deve pedir ajuda à chefia de reportagem para confirmar uma informação. A crítica dos colegas ajuda a enriquecer a matéria, e não se esqueça nunca de que tudo isso tem como objetivo conseguir contar uma história simples, direta, clara, didática, objetiva, equilibrada e isenta,
como veremos a seguir. O repórter deve desenvolver a compreensão da imagem, lembrandose da regra de que imagem e palavras andam juntas e, portanto, o conflito entre elas deve ser evitado, uma vez que distrai o público; mas, se ainda assim ocorrer, prevalece o poder da imagem. O contraplano é um recurso usado para mostrar o repórter fazendo a pergunta para o entrevistado. Ele se mantém no mesmo lugar, enquanto o cinegrafista, que estava às suas costas, inverte totalmente a posição e vai para onde estariam as costas do entrevistado. O cinegrafista passa a focalizar o repórter, que faz as perguntas mais importantes e cujas respostas devem ser apuradas posteriormente. Esse é um recurso aceito por uns e rejeitado por outros (alegam ser falso), já que o repórter não está verdaderamente falando com o entrevistado. A reportagem deve colher o som ambiente simultaneamente às imagens, e não é recomendável mostrar um local sem som. Esse material é posteriormente oferecido ao editor. Antes de iniciar sua história, o repórter deve ver as imagens e o som do material bruto colhido na rua, e avaliar se há informações sem imagens e se elas podem estar na cabeça ou no pé da matéria porque são importantes e não podem ser deixadas de lado. O repórter deve redigir a reportagem tão logo termine a decupagem da fita bruta, antes que a imagem mental da história comece a desaparecer. Não use na reportagem mais palavras do que a duração das imagens permite, nem escreva sem prestar atenção no conteúdo das imagens. Também é preciso cuidado para não redigir frases que expliquem com exatidão o que as imagens estão mostrando. Qualquer reportagem fracassa se o repórter não disser o que é compreensível para a pessoa comum, ou seja, é preciso saber para que tipo de público se fala e se o veículo é ou não segmentado. O repórter pode usar, em entradas ao vivo ou gravadas, o recurso do stand-up, uma comunicação direta com a câmera e o público que estabelece a presença do repórter no local dos acontecimentos e em geral é de curta duração. Um bom stand-up requer articulação da linguagem falada, boa memória e comunicação fluente e segura, que são alcançadas com muito treinamento. O repórter pode optar por decorar o texto da passagem ou do stand-up, mas, se não estiver tudo na ponta da língua, corre o risco de passar para o público a sensação de falsidade. Há também a técnica de dizer uma ou duas frases para a câmera e, em seguida, esta inicia um travelling, momento em que o repórter pega um papel e lê as outras informações do texto. Mas o ideal é memorizar as ideias principais do fato e discorrer sobre eles de improviso, o que também requer muito treino. É preciso planejar sequências suficientes para a história que pretende contar em sua reportagem, e não se deve deixar para o operador da câmera a escolha das locações da matéria, para que não haja surpresas na hora da montagem, como a dificuldade de encontrar imagens para cobrir o off. Procure economizar o tempo da gravação, pois, quando elas são muito longas, complicam a edição, tomam tempo nas ilhas e ajudam a confundir o editor. Em outras palavras, grave o suficiente para construir a reportagem. E quando se tratar de matérias especiais, mais elaboradas e complicadas, não hesite em pedir a participação de um produtor. O repórter deve pedir para o cinegrafista fazer algumas cenas livres, pois elas são úteis na edição. Este último é uma agente da reportagem, e deve opinar sobre todo o processo de produção, e não somente sobre estética ou paisagens. Mas quando se tratar de uma entrevista, o cenário desta na reportagem deve ser diferente de outras tomadas, como cenas que ilustram o trabalho do entrevistado ou sua maneira de ser. Mas quando a necessidade for mostrar detalhes, como um buraco de bala ou o logotipo em uma folha de papel, é importante que a câmera filme em plano fechado, porque os planos gerais nessas situações não ficam bons.
O repórter cinematográfico deve estudar os melhores ângulos e planos antes de fazer as tomadas e certificar-se de que tudo está sendo gravado com qualidade técnica. Isso é importante porque, se o equipamento não funcionar, a reportagem será perdida. Mas é preciso dizer que o trabalho do repórter não termina depois que colhe as sonoras, grava o off, e depois que a equipe volta para a redação. Se estiver participando de um evento importante – uma coletiva, por exemplo – deve continuar colhendo as notícias e passá-las para a redação. Ele não deve esquecer que a notícia está contida tanto no seu testemunho dos fatos, nas sonoras, como nas imagens gravadas. Em suma, imagem também passa informação. E para não confundir o editor da reportagem, anote o nome do entrevistado – se for necessário, peça a ele para soletrar – e grave na fita. E lembre-se de que, quanto mais curtas as perguntas, mais chances elas têm de ser usadas na edição juntamente com a resposta do entrevistado. O repórter precisa ter o máximo de informação sobre o assunto que cobriu, lembrando que o rigor na apuração dos fatos é determinante para a qualidade da reportagem, que deve responder a todas as perguntas comuns que o telespectador poderia fazer. Na apuração, o que deve predominar é exatidão dos fatos, a qualificação e a idoneidade das fontes, e os fatos devem ser relacionados de forma mais objetiva possível, ainda que a subjetividade acompanhe o trabalho. A reportagem deve ser completa em si mesma, com começo, meio e fim. Portanto, nunca imagine que o público já conhece os antecedentes do fato mesmo que venha sendo noticiado com insistencia. Ela é por dever e método a soma das diferentes versões de um mesmo acontecimento. O ceticismo é uma qualidade do jornalista, ou seja, ele deve desconfiar do que ouve e vê, porque muitas vezes a notícia não está na forma como ela se apresenta, mas escondida em declarações e fatos aparentemente irrelevantes. Sempre que possível, o jornalista deve gravar e guardar as entrevistas com as fontes, ainda que nem tudo seja reproduzido na reportagem, pois a fonte pode se arrepender e voltar atrás no que disse – ela deve ser avisada quando se vai gravar. Não é função do repórter querer mudar comportamentos, e ele também não deve generalizar fatos isolados nem julgar o todo pela parte. Procure também não julgar o entrevistado, e saiba que ele tem o direito de apresentar sua versão com liberdade. Cuidado também com o uso dos adjetivos, pois um fato descrito como sensacional ou dramático pode não ser nem sensacional nem dramático. Prefira os verbos. Para se fazer uma boa reportagem, não é necessário arriscar a vida. O repórter não precisa assumir o personagem de super-homem, entrando em prédios em chamas, pendurando-se em janelas etc., e nunca deve se oferecer como refém em ocorrências policiais, pois essa não é sua função. Deixe isso para o Clark Kent. O repórter deve conferir os números que usa na reportagem, sempre lembrando que é preciso bomsenso ao comparar grandezas, pois às vezes as pessoas tendem a exagerar para mais ou para menos. No cálculo de multidão em acontecimentos públicos, é melhor perguntar para as autoridades presentes, e se houver divergências com os organizadores, cite as duas fontes. Ele deve ser criterioso com as matérias técnicas, pois o excesso de dados pode confundir o telespectador. Também não é admissível tratar com humor a humilhação e o sofrimento das pessoas – por exemplo, um tombo deixa de ser engraçado se alguém se machuca. Detalhes desnecessários para o entendimento do fato devem ser dispensados, pois o ideal é que a narração seja direta, para que o telespectador não se perca. Além disso, a reportagem deve ser iniciada com um fato novo, mesmo que o assunto seja conhecido. Nas suítes, é indispensável rememorar o fato em poucas palavras, para que o público possa acompanhar a informação principal. Já as informações e sons de ambiente, quando possíveis de serem
relacionados ao fato, ajudam a enriquecer a reportagem. As entradas ao vivo, seja por Skype ou outra tecnologia, principalmente as improvisações, exigem do repórter o controle das emoções, um bom vocabulário e concentração para transmitir corretamente o fato observado no momento. É preciso cuidado para não ficar repetindo a informação sem concluí-la, mas lembre-se de que capacidade de improviso se adquire com o tempo e treinamento, e não deve ser confundida com verborragia. Atenção ao tom da voz. Não faz sentido relatar um acidente, por exemplo, com uma voz alegre ou de consternação. O tom ideal, de acordo com cada acontecimento, é alcançado com a prática. Não se esqueça de que jornalismo é trabalho de equipe, portanto, o entrosamento do repórter com a redação e os técnicos que o acompanham na rua e no estúdio é fundamental para a qualidade da reportagem. Mantenha a chefia informada sobre o andamento da reportagem, e quando estiver de posse de acusações ou informações comprometedoras com relação a terceiros não ouvidos na reportagem, cabe ao repórter alertar a chefia para providenciar o direito de resposta ou a checagem de determinadas informações. Entregue um relatório detalhado ao editor, pois informações que não constam na entrevista podem ser importantes para a edição. Ele também deve deve-se sugerir trechos de gravações, bem como discutir o tempo e a cabeça da matéria. As informações obtidas durante uma reportagem podem servir de gancho para nova pauta, para a qual todo repórter deve apresentar sugestões. A velocidade na transmissão das notícias (principalmente via internet) exige mudanças na forma de agir do repórter que está fora do Brasil. Não basta relatar o que aconteceu. O correspondente deve repercutir o fato e relacionar, quando possível, a importância para o Brasil. Um telefonema pode determinar o sucesso ou o fracasso de uma reportagem, portanto, mantenha a agenda atualizada. Além disso, o repórter deve entrar em contato com a redação mesmo fora do horário de trabalho se presenciar algum fato de interesse público. Por fim, o salto da notícia para a reportagem se dá no momento em que é preciso ir além da notificação, e situa-se no detalhamento, no efeito, na interpretação e no impacto, adquirindo uma nova dimensão narrativa e ética.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Você está fazendo uma reportagem sobre um atropelamento em que duas pessoas morreram. O motorista responsável pelo acidente é uma pessoa famosa e influente, que acaba conseguindo a colaboração das autoridades e tem seu veículo liberado, mesmo antes da chegada dos peritos. Qual deve ser a sua atitude nessa reportagem, a fim de obter para seu público todas as informações que cercam a ocorrência? 2. Numa reportagem ao vivo, você é surpreendido por um outro evento, que ocorre nas imediações do local onde se encontra. Como você reage a esse fato novo? Termina sua reportagem e só então parte para a outra ocorrência ou interrompe o que estava fazendo, justificando a interrupção? 3. Você agendou uma entrevista com uma fonte que prometeu denunciar uma esquema de corrupção num órgão público. Na hora da entrevista, a fonte diz que só vai revelar o que sabe se receber determinada quantia em dinheiro do repórter. O você deve fazer numa situação como essa?
Dicas De Filmes O informante, EUA, 1999 – Dir. Michael Mann Em 1994, um ex-executivo da indústria do tabaco deu entrevista bombástica ao programa jornalístico 60 Minutos, da rede norte-americana CBS. Ele dizia que os manda-chuvas da empresa em que trabalhou não apenas sabiam da capacidade viciadora da nicotina, como também aplicavam aditivos químicos ao cigarro, para acentuar esta característica. Na hora “H”, porém, a CBS recuou e não transmitiu a entrevista, alegando que as consequências jurídicas poderiam ser fatais. Baseando-se nessa história real, O informante narra a trajetória do ex-vice-presidente da Brown & Williamson Jeffrey Wigand (Russell Crowe) e do produtor Lowell Bergman (Al Pacino), que o convenceu a falar em público. Vários aspectos do jornalismo são tratados no filme, entre eles até que ponto o compromisso com a verdade valida a atitude do produtor, que pressiona a fonte a revelar o que sabe, mesmo que isso acarrete ao executivo sérios riscos. Jenipapo, Brasil/EUA, 1995 – Dir. Monique Gardenberg Michael é um jornalista estadunidense que trabalha para um jornal brasileiro bilíngue. Certo dia ele é mandado para entrevistar o padre Louis Stephen, um famoso missionário católico que apoia a luta pela reforma agrária em uma comunidade do nordeste. Entretanto, ele precisa enfrentar um problema, pois o padre se recusa a conceder entrevistas. Isso leva Coleman a abandonar a ética jornalística em sua tentativa para entrevistá-lo.
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Ancoragem e apresentação “Quando você estiver escrevendo, não esqueça, em primeiro lugar, de que a atividade jornalística é um exercício de integridade e caráter. Uma boa atitude, no exercício de escrever, o conduzirá a elevadas atitudes na profissão – como, aliás, na vida também.” Sidnei Basile
Ao término da leitura deste capítulo você será capaz de: • Explicar qual é a função do âncora. • Ver como o âncora deve se comportar em transmissões ao vivo. O apresentador de programa jornalístico no rádio ou na TV não é artista nem notícia, mas trabalha com ela. Esse profissional inte- gra um processo para contar a uma parte da sociedade o que outra está fazendo. Embora não seja a estrela, é o rosto mais conhecido e familiar do telespectador, e obviamente a exposição no ar lhe dá notoriedade social que alguns confundem com o seu prestígio social, motivo para que ele fiscalize o ego. A imagem tem atributo de incen- tivar o ego de algumas pessoas a ponto de pôr em risco a qualidade do noticiário. Segundo Baghavat Gita, o ego é um excelente servo, mas péssimo amo. O âncora é o apresentador que acompanha e participa do processo de confecção do telejornal em todas as suas etapas e deve acompanhar a evolução das notícias durante todo o dia, estando ou não na redação. É isso que o distingue de quem apenas grava o off e lê o script. Essa participação ativa em uma ou mais etapas da produção do tele- jornal faz que em muitos casos o âncora seja também o editor-chefe do jornal. Portanto, a condição do âncora não está reduzida aos co- mentários que ele faz no ar. A maioria dos apresentadores não emite opinião em comentários di- retos. Confunde-se afetação com seriedade jornalística. No passado, qualquer gesto que não fosse o facial era considerado um “comentário” sobre a notícia, e por isso deveria ser evitado, uma vez que a extrema sobriedade de gestos e roupas eram confundidos com serie- dade, confiabilidade e credibilidade. Os movimentos das câmeras eram automatizados e as posturas, aca- dêmicas. Esses padrões estão sendo gradativamente rompidos pela descontração do estúdio/redação, para que o telespectador acompanhe um cenário mais amplo, com outros jornalistas em cena, e possa receber e decifrar novas mensagens. A seguir, veja algumas orienta- ções para o âncora.
Orientações para o âncora A postura é um dos defeitos mais comuns dos apresentadores de vídeo. Alguns se curvam para trás na cadeira, outros projetam um dos ombros para a frente e passam uma aparência agressiva ao telespectador, mostrando apenas um olho. Ele deve transmitir uma sensação de uma pessoa calma, relaxada, confiante e segura, portanto antes de começar a ler o script, é necessário sentar confortavelmente na cadeira e, para isso, é importante ajustar a altura dela de acordo com o seu físico. Peça água para a produção de estúdio e deixe-a ao alcance das mãos, mesmo que não tenha o hábito de bebê-la durante a apresentação do programa, pois ela pode ser útil caso a garganta seque. Beba pequenos goles e só, e tome cuidado para não engasgar se beber um gole entre uma reportagem e outra. Os papéis e apontamentos devem estar ao alcance da mão, pois não dá para imaginar o âncora/apresentador levantando da cadeira du- rante o jornal para pegar algum papel. E não se esqueça da caneta, pois ela é mais que uma muleta para quem não sabe o que fazer com as mãos. Use uma canetatinteiro de pena ou de outro tipo que não tenha o “tic-tic” das esferográficas que vazam no ar. Esse tic-tic de- monstra ansiedade e vira BG de entrevistas. Não bata na mesa nem com a caneta, nem com as mãos, pois os microfones amplificam esses sons e distraem o público, além do inevitável comunicado da direção técnica para o jornalismo. Não se preocupe com as câmeras. A movimentação delas não é problema do apresentador. Não deixe o paletó ficar enrugado no ombro e no pescoço. Lembre-se de que o ideal é sentar na ponta do paletó, não encostar no espaldar da cadeira e manter a coluna naturalmente ereta. Mantenha sempre o script organizado na medida em que o jornal se desenrolar, pois o teleprompter pode sofrer alguma pane e deixar o apresentador desorientado, pendurado no improviso. Deixe o espelho ao lado e vá marcando as matérias que foram para o ar. Não se desconcentre nunca, pois qualquer distração pode atrapa- lhar muito. Portanto, não se esqueça de que, se o microfone vaza, a câmera também, e está última é muito pior, porque pode flagrar o apresentador rindo não se sabe do quê, bocejando, conversando com o colega no estúdio, olhando para os rabiscos que faz no script, deitado sobre a bancada, brincando com a caneta, entre outras situa- ções constrangedoras. Há casos famosos na TV que culminaram em demissões. O teleprompter é uma ferramenta de trabalho, e não um salva-vidas. Se ele sumir do monitor da câmera, use o script e chame a próxi- ma matéria. Treine a leitura a partir do script para não ser pego de surpresa. Não se assuste, vá em frente e não tente esconder do teles- pectador que você está lendo, uma vez que isso não diminui a sua credibilidade. Até porque há apresentadores que, mesmo lendo do teleprompter, aparecem no ar segurando o script. É mais do que um estilo, ora ele lê do teleprompter, ora do script, e dá um charme à sua participação. Outra dica é: evite fechar os olhos ou forçar a vista quando se tratar de uma palavra difícil escrita no teleprompter, mas faça o possível para entende-la ou, então, improvise. Caso o VT que contém a reportagem não seja disparado, leia de novo a cabeça da matéria. Caso não entre de novo, leia a matéria seguinte. Caso ela também não entre, faça um pequeno improviso, anuncie um intervalo, e faça um pequeno improviso sobre os pro- blemas técnicos encontrados e anuncie que as reportagens voltarão logo depois do intervalo. Esse tempo permite que o pessoal técnico prepare o intervalo. Se porventura um repórter ao vivo for chamado e não entrar no ar por qualquer motivo, diga ao telespectador que houve um “problema de comunicação”. Não se usa a expressão “problemas técnicos”,
pois ela pode provocar desentendimentos com o pessoal da área técnica. O ponto eletrônico também deve ser entendido como uma ferra- menta, e não uma muleta auricular, se é que isso existe, e seu uso deve ser tão restrito quanto a telefonia em aviação, ou seja, o míni- mo possível com o máximo de informações. É necessário desenvol- ver um bom entrosamento entre o apresentador e o produtor que permanece no switcher para um não atrapalhar o outro, e somente as informações essenciais devem ser comunicadas, nada mais, nem piadas, nem brincadeiras. Se houver qualquer problema, não discuta nada durante o andamento do programa, deixe para depois. Dar um toque discreto do produtor no ponto avisando que a ma- téria está no fim ajuda. No intervalo, ele confere a sequência do script e dá outras instruções, como se deve ou não acelerar o ritmo de leitura em função do tempo. Estouro ou buraco deve ser co- municado quando as matérias entram no ar, e os apresentadores, quando leem textos muito longos ao vivo, procuram movimentar mãos, cabeça e o próprio corpo para fugir do estereótipo do robô que só mexe os lábios. Não permita que uma entrevista com dois entrevistados de fortes opiniões contrárias transforme-se em bate-boca. Um pouco de ca- lor e polêmica ajuda, mas exageradamente, prejudica, pois o públi- co acaba não entendendo o que está sendo dito, o editor não con- segue aproveitar as sonoras para outros programas e o apresentador corre o risco de perder o controle da situação. Daí para frente tudo é imprevisível. O âncora/apresentador precisa ser firme, estimular o debate ou as respostas, e controlar respostas e o ritmo do programa, dando mais ou menos velocidade. Para interromper o entrevistado, espere que ele dê uma pausa. Mas fique atento, senão a oportunidade se perde e, além disso, ouça as respostas e esteja pronto para novas perguntas. Administre o tempo total do programa, isto é, não deixe o entrevis- tado estourar o tempo, mas também não encerre o programa antes. As duas formas prejudicam a programação, por isso é importante que o produtor vá dizendo no ponto eletrônico quanto tempo falta para o encerramento. Nos momentos finais, o aviso é feito de minu- to em minuto. Por fim, os jornalistas devem se esforçar para que as entrevistas sejam programadas com respeito mútuo, a fim de prestar um serviço público. O âncora/apresentador de telejornal precisa se entender muito bem com o produtor e com a equipe técnica de estúdio, pois qualquer desencontro reflete imediatamente na qualidade do programa que está no ar. Embora seja a principal parte visível, ele é não dono do programa, e deve ter muito claro que jornalismo só se faz em equipe e, portanto, erros e acertos devem ser creditados a todos. A opinião explícita jamais cabe ao âncora/apresentador ou aos re- pórteres, mas sim aos comentaristas. Há âncoras que unem as duas atividades, mas isso não é comum. Na TV norte-americana, por exemplo, a maioria dos âncoras não faz comentários. Ele deve citar programas anteriores, referindo-se a reportagens, par- ticipações de comentaristas, correspondentes e repórteres, porque isso familiariza o telespectador com toda a equipe e a programação. Além disso, é mais fácil identificar o negativo do que o positivo na apresentação na tela. Lembre-se que a câmera é uma cruel reveladora de peculiaridades e maneirismos físicos, e o microfone amplia os efeitos da fala. A falta de uma voz bem treinada pode derrubar um jornalista que pretende emprego de apresentador ou repórter, mesmo que tenha bom currículo profissional. No tocante à apresentação pessoal, as emissoras vestem tanto os apresentadores como os repórteres. Cortes de cabelo, barba e maquiagem apropriada são feitos de acordo com as regras da empresa. Quando esses detalhes são de responsabilidade do jornalista, ele deve procurar se vestir de for- ma que não chame a atenção, lembrando que cada ocasião tem o tipo de roupa apropriada.
O âncora/apresentador deve dar preferência ao pronome nós em vez de eu, pois deve lembrar que faz a entrevista como intermediá- rio do telespectador e de si mesmo. Além do mais, o pronome eu, quando usado exageradamente, dá um tom de arrogância dispen- sável no jornalismo. Também nunca use a expressão “quero fazer uma colocação”. Ao chamar o repórter ao vivo, o âncora/apresentador deve apenas falar o assunto e o local em que ele está, lembrando que o lead é do repórter, que presencia o fato, e, portanto, tem melhores condições de informar o que está acontecendo. Todavia, se a participação for gravada, o âncora/apresentador não cumprimenta o repórter. Há programas em que o apresentador se refere aos repórteres como se estivessem ao vivo, mas não engana a audiência, nem os conhecedo- res do veículo. Dizer, por exemplo, “bom dia” em gravações é uma forma de enganar o telespectador, passando a ideia de que o repórter está ao vivo. Em outras palavras, se a reportagem estiver gravada, o apresentador deve limitar-se à leitura da cabeça feita pelo editor, uma vez que ten- tar adivinhar o que o repórter vai dizer no meio da matéria é correr o risco de ser desmentido. Nas saídas para os intervalos, o apresentador deve fazer a chamada do próximo assunto, escolhendo aquele de maior apelo de audiência, porém não se deve exagerar nos termos, prometendo algo inexistente na reportagem a ser exibida. Denúncias ou acusações feitas por entrevistados em programas ao vivo devem ser seguidas de imediato direito de resposta, seja por meio de telefone ou no estúdio. O telespectador deve ser comunicado imediatamente pelo apresentador que a produção está entrando em contato com a pessoa citada e avisa no ar se ele quer falar ou não. Jamais mande abraço no ar, e só receba se a iniciativa couber ao entrevistado. O âncora/apresentador deve sempre agradecer a en- trevista, repetir o nome e o cargo do entrevistado por inteiro, para quem não se lembra de quem está falando, ou para quem pegou a entrevista pela metade. O âncora/apresentador não é ator, ou seja, não pode apresentar um jornal ou programa como se estivesse narrando uma partida de fute- bol e movimentando um grupo imaginário de repórteres para “encher o vídeo”. Ele não deve dramatizar acontecimentos, nem alterar o sentido das frases com impostação desnecessária. Por fim, os no- mes estrangeiros devem ser pronunciados de acordo com seu país de origem, salvo os que tiverem uso já consagrado no Brasil.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Você está ancorando a apresentação de um jornal. Seguindo a ordem do programa, faz a chamada para uma reportagem em que o repórter deve entrar ao vivo. No entanto, quem entra é outro profissional, falando sobre outro tema, que desata a falar e dá conta do recado, impossibilitando qualquer correção. Como você resolve essa confusão? 2. Seu programa é famoso, e você já é reconhecido pelo público quando sai às ruas. Diante dessa popularidade, você começa a ficar tentado a se identificar pelo nome quando precisa resolver um as- sunto pessoal – como conseguir reservas num disputado restaurante ou entrar gratuitamente num grande evento para o qual não há mais ingressos. Qual sua opinião a respeito desta atitude? Isso seria corre- to? Se achar que não é, por qual motivo? 3. Durante a apresentação de um jornal com entrevistas ao vivo, um entrevistado, incomodado com as perguntas do âncora, começa a falar palavrões e ofender o jornalista. Você, na condição de âncora/ apresentador, o que faz diante dessa situação?
Sugestões De Leitura 1. Lage Nilson. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. Rio de Janeiro: Record; 2001. 2. Paternostro Vera Íris. O texto na TV: Manual de Telejornalismo. 2 Rio de Janeiro: Campus; 2006; revista e atualizada .
Dicas de Filmes O jornal, EUA, 1994 – Dir. Ron Howard A rotina do tabloide Th e New York Sun, com os problemas pessoais e particulares das pessoas que trabalham nele. Tudo gira em torno de dois brancos assassinados e dois jovens negros, acusados de terem cometido o crime, e a tentativa de alguns repórteres de mostrarem que os jovens acusados são inocentes. Com uma abordagem interessante sobre o jornalismo, o filme é per- feito para quem deseja conhecer o funcionamento de uma redação e como se dá a produção de um diário impresso. Veronica Guerin – o preço da verdade, EUA/Irlanda/Inglaterra, 2003 – Dir. Joel Schumacher Veronica Guerin é uma repórter investigativa que resolve denunciar o esquema de corrupção e tráfico de drogas em Dublin, cidade em que vive. Graças às suas matérias, ela adquire projeção internacional, porém, passa a sofrer perseguição por parte dos bandidos.
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Atores ou jornalistas “Cem mil lâmpadas sejam acesas em uma sala, todas brilharão e nenhuma interferirá no brilho da outra.” Buda
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Entender que o jornalista não é artista. • Compreender a diferença entre entrevistas feitas em jornalismo e talk-show. No capítulo anterior, entendemos que jornalista não é artista. Não se trata de eleger a maior ou menor importância de cada um deles, pois são profissões diferentes; logo, também têm compromissos diferentes. O jornalista espanhol Iván Tubau afirma que, em algumas circunstâncias, os jornalistas são atores, mas existe, porém, uma clara divisão entre quem lida com a ficção e quem lida com a realidade. Os jornalistas têm o compromisso com a notícia, buscam sistematicamente o que entendem ser verdade e desenvolvem suas investigações dentro dos parâmetros da isenção. O que dizem muitas vezes mexe com as emoções das pessoas, mas eles não representam nenhum personagem, ao passo que os atores vivem da arte de representar e fazem o melhor que podem para emocionar o público no universo do entretenimento. É indiscutível que recursos próprios da arte cênica são usados no telejornalismo; alguns jornalistas chegam a fazer cursos de teatro, inclusive para perder a timidez. O uso de maquiagem, roupas especiais, o jeito de olhar para a câmera muitas vezes dão ao público a sensação de que a notícia está sendo apresentada por um ator, mas o desempenho perfeito no vídeo não pode ser confundido com farsa, pois, assim como na arte cênica, o que existe é muito ensaio e treinamento. É comum que o repórter, espinha dorsal do noticiário, ensaie várias vezes a passagem de uma matéria. Esse momento é precedido de produção, avaliação do cenário (outro recurso do teatro), marcação de entrada e saída de cena etc. Nos telejornais, em geral o comentarista combina antecipadamente com o âncora as perguntas que servem de escada para o seu comentário, e é raro o comentário de improviso. Os dois escrevem o texto e fazem perguntas e respostas como se as estivessem criando na hora, mas na verdade estão lendo no telepromper, o que não fere a ética nem tira o mérito jornalístico. É preciso também separar a atuação do jornalista do jornalismo feito em programas talk-shows. Existem comunicadores que fazem ótimas entrevistas e desempenham bem a função de repórter, mas o compromisso deles, como também no caso dos atores, é com o entretenimento, e não com as regras rígidas do jornalismo. Na TV há vários exemplos, mas o mais marcante é o talk-show do Jô Soares. Treinamentos intensivos podem inverter o processo e levar o jornalista a querer ser na vida real o personagem que é na TV. É comum a visibilidade dada pela TV acender o que jocosamente é chamado de fogueira das vaidades, e o ego do jornalista infla quando ele acredita ser mais importante do que a notícia, mais conhecedor do assunto do que o entrevistado e mais bonito e charmoso do que qualquer ator ou atriz de novela. É importante que ele se tente a isso, pois tal comportamento coloca em risco a credibilidade e a simpatia que o jornalista tem dos telespectadores.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Você, como repórter de TV, conhecido nacionalmente, aceitaria o convite para interpretar o papel de um jornalista em uma novela? Até que ponto ser ator durante alguns meses teria alguma influência na sua carreira? Sua credibilidade como jornalista estaria ameaçada? 2. Você é um repórter de rádio que toca muito bem violão e costuma se apresentar em bares nos fins de semana. O que era no início uma diversão com os amigos passa a ganhar importância na sua vida depois que começa a ganhar cachê em suas apresentações. Numa noite de sábado, quando você começa sua apresentação em um bar da moda na cidade, seu chefe liga e pede imediatamente sua presença na redação para ajudar na cobertura de uma enchente na cidade vizinha. Você vai abandonar sua apresentação e exercer sua profissão de jornalista ou vai dizer o chefe que lamenta, mas está no seu dia de folga?
Sugestões De Leitura 1. Polito Reinaldo. Como falar corretamente e sem inibições São Paulo: Saraiva; 2010. 2. Talese Gay. Fama & Anonimato São Paulo: Cia. das Letras; 2004.
Dicas de filmes Bem-vindo a Sarajevo, EUA-Inglaterra, 1997 – Dir. Michael Winterbottom Este filme retrata a atividade dos repórteres no campo de batalha da Guerra da Bósnia, o envolvimento deles em tragédias humanas do cotidiano local e a fogueira das vaidades que rolava nos bastidores. Ausência de malícia, EUA,1981 – Dir. Sidney Pollack Michael Colin Gallagher (Paul Newman) certo dia acorda pela manhã e vê na capa dos jornais que sua vida está sendo investigada. Ele procura Megan Carter (Sally Field), a autora da matéria, e descobrem que ambos fizeram parte de um plano da imprensa para destruir a vida de Gallagher.
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A entrevista “A ânsia pelo sucesso lubrifica secretas prostituições na alma.” Norman Mailer
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Mostrar que a entrevista é um dos pilares da construção da notícia em todas as plataformas tecnológicas. • Saber quais cuidados se deve tomar para conduzir uma entrevista com bons resultados. A entrevista em vídeo tem o poder de transmitir o que o jornalismo impresso e radiofônico nem sempre consegue: a exposição da intimidade do entrevistado. Os gestos, o olhar, o tom de voz, o modo de se vestir, a mudança no semblante influenciam o público e a própria ação do entrevistador, que, ao adquirir experiência, consegue tirar do entrevistado mais do que ele gostaria de dizer. Boas entrevistas são as que revelam conhecimentos, esclarecem fatos e marcam opiniões. Quando isso acontece, a notícia avança e abre espaços para novas entrevistas e reportagens. A entrevista, o texto, a reportagem e as edições no telejornalismo apresentam alguns fundamentos comuns, responsáveis pela transmissão da notícia. Veja, a seguir, algumas orientações com relação a esse aspecto.
Orientações para a entrevista Ela deve ter começo, meio e fim. Planeje o tempo disponível, informe-se sobre o que vai perguntar. A falta de preparo pode dar ao entrevistado a chance de transformar a entrevista em palanque, púlpito, ou algo semelhante. A pergunta tem que ter tamanho certo, suficiente para que o telespectador entenda o assunto. Alguns entrevistadores falam tanto sobre o tema que acabam respondendo à própria pergunta, deixando o entrevistado sem ter o que dizer. Outro extremo é a pergunta pequena demais a ponto do público não saber do que se está falando. O entrevistador deve, na maior parte do tempo, colocar-se no lugar do público e perguntar aquilo que considera mais importante sobre o assunto pautado. Ela pode ser apenas um bate-papo entre duas pessoas. O entrevistado fala para o espectador e não exclusivamente para o jornalista. Não entreviste um especialista como se você fosse um colega dele. Se isso acontecer, o telespectador vai ficar alijado do processo, uma vez que nem sempre está familiarizado com o assunto da entrevista. O jornalista deve estar preparado para a mudança no rumo da entrevista, e uma resposta pode levar o assunto para um tema mais importante que o preestabelecido. Sendo assim, o jornalista deve procurar entender o que o entrevistado quis dizer nas “entrelinhas”. As respostas devem ser claras e, se houver dúvida, deve-se pedir para o entrevistado explicar melhor a ideia sobre o tema abordado. A entrevista não deve durar mais que o necessário, e poucos entrevistados merecem uma entrevista que aborde muitos assuntos. Os entrevistados falam para o público por intermédio do entrevistador. Eles devem ser tratados com respeito, mas sem formalismos, como Vossa Excelência. Lembre-se de que doutor é título acadêmico. Vale para médicos ou pessoas que tenham defendido tese de doutorado. Não hesite em perguntar ao entrevistado, antes da entrevista, a maneira correta de dizer o nome dele. Se, por exemplo, o entrevistado disser que o nome dele é Dânton, não se deve chamá-lo de Dantôn, como se conhece na pronúncia francesa. Se o nome for Walt Disney e ele insistir que a pronúncia é Valdisnei, respeite o desejo do entrevistado. Há uma muleta que deve ser evitada para se fazer uma boa entrevista: “como o senhor está vendo isso?”. Se ele for bem humorado, é capaz de responder: “Com os olhos.” Outra muleta que cabe em qualquer situação é “Qual é a sua opinião sobre…?”. Fuja do óbvio. Há perguntas que beiram a cretinice, como perguntar a uma mãe que acabou de perder a filha como ela se sente. Não interrompa o entrevistado sem que ele conclua o pensamento. A interrupção no meio da resposta irrita o público e prejudica a edição. Não deixe o entrevistado fugir da pergunta. Quando uma pergunta não for respondida, deve-se insistir imediatamente, e não se deixe intimidar pelo poder ou fama dele ou dela. Tente conhecê-lo o máximo possível e leia pesquisas sobre o tema abordado e o entrevistado. Há entrevistados lacônicos, que respondem apenas sim, não, talvez etc. Estimule-os perguntando sempre “por quê?”. Outros se sentem intimidados diante do jornalista por não estarem acostumados a dar entrevistas ou terem medo das repercussões de suas declarações. Mas, em casos como esse, uma conversa informal, na qual o jornalista pode tentar convencê-lo da importância de sua informação para o público, ajuda a tranquilizar o entrevistado. Muitos são submetidos a cursos de media-trainning e conhecem técnicas para permanecerem mais
tempo no ar. São os que não dão “ponto de corte”, recebem treinamento para terminar as frases “para cima”. Esse tipo de entonação dificulta a interrupção, pois deixa a impressão para o público que o entrevistado foi cortado, censurado. Outra técnica ensinada nesses cursos é a da troca de papéis, ou seja, se o entrevistador não tomar cuidado, o entrevistado acaba tomando conta da entrevista e passando a condutor desta, levando-a para o campo que julgar mais interessante aos seus propósitos. Lembre-se dos riscos de uma entrevista ao vivo. As falhas de um ou dos dois lados não podem ser revistas, pois uma vez falado, não dá para recuar. No caso de entrevistas gravadas ou editadas, é possível obter melhor qualidade, uma vez que os erros podem ser corrigidos pelas partes ou pelo editor. Se você não for fluente em idioma estrangeiro, não se arrisque ao vexame na tradução em entrevista ao vivo. Em situações como essa é melhor a presença de um intérprete profissional, que dê conta do recado. Entrevista não é debate, portanto, é necessário tomar cuidado para que um bate-boca não confunda o público, uma vez que não se trata de um confronto de opiniões entre o jornalista e o entrevistado. Boas entrevistas não são feitas necessariamente por jornalistas. Há apresentadores, humoristas e artistas capazes de conduzir entrevistas inteligentes e que acabam gerando notícias – a internet televisão e o rádio têm vários exemplos de sucesso. Entrevistas esportivas muitas vezes acabam sendo repetitivas também por culpa do entrevistador, que faz sempre as mesmas perguntas e obtém as mesmas respostas. É preciso fugir do “O que você achou do jogo?”. Não se disperse nem se deixe distrair com outras pessoas, e seja criterioso e paciente nas entrevistas coletivas, uma vez que muitas delas são organizadas para atrair publicidade ou como ocasião para que prevaleça apenas o ponto de vista do entrevistado. Mesmo que ele considere relevante o que vai dizer, haverá sempre a possibilidade de que haja uma informação mais importante. Há também coletivas improvisadas, feitas num clima de tumulto principalmente pela concorrência entre os veículos e a falta de bomsenso dos jornalistas. A prática ensina que, em situações como essa, a prioridade nem sempre é fazer perguntas. Ele não deve ser enganado sobre o tema da entrevista, e não se admite entrevista-armadilha; ou seja, não se pode convidá-lo para discutir um assunto e partir para outro ou, então, utilizar recursos como sonoras de inimigos e ofensas de adversários. Entrevista não é linchamento, e o entrevistado tem o direito legal e ético de não responder a determinada pergunta e até mesmo de não dar entrevista, e tem de ser respeitado em sua decisão. Outro erro é induzir o entrevistado a dar a resposta que se quer ouvir. O que o jornalista pode fazer é usar de sua inteligência para conseguir declarações que contenham notícias ou esclarecimentos. Sempre é bom lembrar que existem limites na entrevista, como não invadir a privacidade do entrevistado, preservar sua vida pessoal e agir sempre pautado em ações éticas. Conduzir uma entrevista de forma vigorosa, especialmente com um personagem “liso”, não é maltratar o entrevistado nem ofendêlo. A entrevista é uma ação de mão dupla, onde nem sempre se consegue acuar o entrevistado, e quem pensa em dar pancadas é bom estar preparado para recebê-las também. É importante nunca perder o sangue frio, uma vez que a entrevista é um verdadeiro duelo jornalístico e intelectual com o entrevistado. Edições e cabeças de entrevistas gravadas nem sempre agradam o entrevistado. Ele tem de entender que jornalismo pressupõe alguma subjetividade. Outro ponto fundamental é que não se pode aceitar perguntas previamente apresentadas pelo entrevistado ou por sua assessoria de imprensa, porém sugestões, pautas e conversas esclarecedoras são sempre bem-vindas. O jornalista tem o dever ético de falar a verdade, por isso deve se recusar a mostrar a entrevista antes que vá ao ar, uma vez que ela é a expressão da verdade e está correta na visão do entrevistador. Em caso de dúvidas ou se as circunstâncias não permitirem o preparo para a entrevista, lembre-se de que o
jornalismo tem perguntas básicas, como o quê, quem, como, quando, onde e por quê? Não seja ingênuo, pois é comum a notícia afetar interesses, seja sobre política, economia, esporte etc. Todavia, o entrevistado pode exigir que não se toque em determinado assunto, mas não custa nada negociar com ele, uma vez que o jornalista tem a responsabilidade de perguntar o que o público quer saber e ele tem o direito de dizer se quer ou não responder a alguma pergunta. A entrevista tem sempre o elemento de performance, por isso não fale demais; ou seja, faça perguntas e não afirmações esperando conseguir do entrevistado apoio à sua opinião. A verborragia é totalmente dispensável, portanto, cuidado com alongamentos desnecessários e reduções castradoras de conteúdo. Evite iniciar perguntas com “Posso perguntar?” ou “Você se importa se eu perguntar…?”, e não se esqueça de que a tomada do perfil do entrevistado na tela aparentemente exclui o público do que está sendo falado; sendo assim, a perspectiva da câmera deve estar de 50 a 75 mm acima da linha de visão do entrevistado. Por fim, a entrevista não pode, principalmente em televisão, prescindir da comunicação silenciosa, pois saber usar o silêncio é exercer o poder.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Você trabalha para um grande veículo de comunicação e é chamado às pressas para substituir um colega da área de política numa entrevista coletiva sobre um novo escândalo nacional. Sua área de atuação é o esporte, por isso você não está devidamente informado sobre o assunto que será abordado na coletiva, que começa em menos de uma hora. Diante das circunstâncias, qual é a sua atitude? Como resolver essa situação, lidar com o imprevisto e dar conta do recado? 2. Ao entrevistar um jogador de futebol famoso, porém polêmico por seu comportamento fora das quatro linhas, você tem a oportunidade de tocar em assuntos de sua vida pessoal que interessam ao grande público, mas que são sabidamente desagradáveis. O jogador não gosta de abordar essas questões e isso já é notório no meio jornalístico. Mesmo assim, você resolve arriscar. Feita a pergunta, o entrevistado se cala e demonstra extrema irritação e desconforto. Como você contorna essa situação, para que a entrevista continue? 3. Um importante político é conhecido por sua verborragia em entrevistas, e você terá de entrevistálo ao vivo. Em determinado momento da conversa, você percebe que ele está se desviando do assunto e desatando a falar sem parar em outro projeto de sua autoria, mas que nada tem a ver com o tema da entrevista. Como você faz para trazê-lo de volta ao assunto?
Sugestões De Leitura 1. O Globo. Manual de redação e estilo. São Paulo: Globo; 1995. 2. Karan Francisco José. A ética jornalística e o interesse público. São Paulo: Summus Editorial; 2004;.
Dicas de filmes O poder da imagem, EUA, 1990 – Dir. Peter Werner Jason Cromwell, o “jornalista mais confiável da América”, é um apresentador de um dos programas mais assistidos dos Estados Unidos. Passa semanas inteiras viajando em busca de notícias polêmicas e pegando de surpresa seus entrevistados para levá-los ao ar. A pressa de apresentar um furo jornalístico faz com que uma tragédia aconteça: um bancário comete suicídio depois de ser acusado no programa de desviar dinheiro do banco. O poder da imagem mostra exatamente o poder que a televisão tem de opinar e influenciar as vidas de milhares de pessoas que acabam se tornando personagens desse “jornalismo de emboscada”. Vlado – 30 anos depois, Brasil, 2005 – Dir. João Batista de Andrade Por meio de depoimentos, o documentário reconstrói o caso de tortura do jornalista Vladimir Herzog, morto numa cela do DOI-Codi em SP.
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A pauta “O trabalho da imprensa não pode ser confundido com programa de auditório.” Luís Garcia
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Mostrar que o pauteiro é um elemento importante na construção de uma reportagem. • Explicar quais são as funções do pauteiro. • Entender quais cuidados deve-se tomar ao elaborar uma pauta. A pauta, por suas peculiaridades, tem na mídia eletrônica e informática uma importância maior que em outros veículos. A atenção exigida aos detalhes necessários para a elaboração de uma reportagem com imagem aumenta a importância do planejamento. O pauteiro é aquele que na imensidão dos acontecimentos na sociedade capta o que pode ser transformado em reportagem, pensa o assunto por inteiro e indica os caminhos que devem ser percorridos para que a matéria prenda a atenção do telespectador e atinja o público-alvo da emissora. A informação é um bem precioso e, por meio dela, as pessoas têm condições de desenvolver o espírito crítico e entender melhor a sociedade em que vivem. Cabe ao pauteiro distinguir com clareza o que é jornalismo e entretenimento. O conceito de “good news, no news” também deve ser eliminado. Os sinais positivos, se forem de interesse público, são objeto de pauta, e de forma nenhuma a escolha do joio se confunde com o que é jocoso, tragédia, desumano, anomalias ou perversões humanas. A busca e planejamento de reportagens não devem se limitar aos assuntos do dia, ao que é imediato. É preciso criar, contextualizar e avançar, pois o aprofundamento aguça a reflexão crítica. O pauteiro atua decisivamente na construção da reportagem, sugerindo perguntas e caminhos para o repórter. Este tem liberdade de interpretar a pauta, mudá-la no meio do caminho ou simplesmente comunicar que ela é inexequível por motivos que devem ser explicados à chefia. A preocupação com a imagem está presente em todas as etapas da produção de uma reportagem para a TV ou na internet, desde a pauta, por isso não se pode elaborar o assunto sem avaliar a obtenção de imagens. Tudo o que for relevante para a sociedade é objeto de interesse jornalístico e de pautas: política, economia, cultura, ciência, religião, comportamento, meio ambiente, esporte, os problemas da cidade etc., mas o que deve ser avaliado é a importância dos assuntos a partir da ótica do interesse público. É importante lembrar também que a notícia não é algo mágico, que aparece de repente ante o repórter; na verdade, ela requer apuração, tratamento, elaboração. O pauteiro busca sugestões para o desenvolvimento de reportagens em fontes como agências de notícias, internet, jornais, fax, reclamações do público, relatórios de repórteres e radioescutas, revistas, acompanhando o noticiário de outros veículos, presenciando um fato na rua etc. Mas é óbvio que nem mesmo um competente grupo de pauteiros pode apontar tudo o que está acontecendo, por isso sugerir pautas deve ser uma iniciativa de todo jornalista. Ele, como os demais jornalistas, deve ter uma boa cultura geral, o que o habilita a desenvolver vários assuntos, mas o ideal é que se especialize em determinada área. Os assuntos que vão ser enfocados na programação do dia, o planejamento de reportagens para o dia seguinte e a necessidade de se continuar com determinados assuntos são definidos nas reuniões de pauta.
É dever do pauteiro fazer a proposta de encaminhamento da matéria com informações complementares, como o tipo de imagem que o cinegrafista deve fazer e especificar o equipamento que a equipe de reportagem deve levar. A reportagem pode se dar tanto na cobertura de um acontecimento previsto na agenda do dia como na construção de uma matéria previamente elaborada, mas nunca se deve confundir pauta com agenda, pois esta é apenas um indicativo de determinado acontecimento. O texto da pauta tem de ser informativo, sucinto, com lead e sublead, uma vez que serve de roteiro para o repórter, e o pauteiro também deve sugerir perguntas, mas sem cair no óbvio. Além disso, o material de apoio deve sempre estar anexado à pauta. Outra questão é que os fatos sociais são dinâmicos, por isso é preciso atenção para que, durante o período de elaboração de uma reportagem, novos acontecimentos determinem a mudança do enfoque ou mesmo a queda da pauta. Ganhar tempo é importante, e cabe ao pauteiro incluir na pauta dados sobre os entrevistados, telefones e endereços onde podem ser encontrados, e evitar, se possível, marcações muito distantes um do outro para o mesmo repórter. Geralmente se ouve dois ou mais entrevistados cujas falas são relevantes para ilustrar a história contada na reportagem. Ele deve também conseguir autorizações para que o repórter possa entrar no interior de locais públicos e privados com antecedência, sob o risco do repórter não conseguir desenvolver sua matéria. E nunca deixe um entrevistado esperando se houver queda da pauta ou uma virada em direção de outro assunto, pois é uma questão de respeito avisar que a entrevista foi cancelada. O assédio ao pauteiro por pessoas, instituições e empresas para que seus trabalhos sejam publicados é grande, mas ele deve se guiar pelo interesse jornalístico e, portanto, social do conteúdo das pautas sugeridas, uma vez que esse é o único critério para que uma sugestão de pauta seja aceita. As assessorias de imprensa não devem ser discriminadas, mas não são fontes primárias de informação. Elas são a ponte entre o jornalista e o entrevistado, entre o veículo de comunicação e a empresa pública ou privada. Quando uma empresa fala somente por meio da assessoria de imprensa, deve-se divulgar uma nota de pé com a versão da empresa atribuída à assessoria. Os releases eletrônicos ou não podem ser tanto boas fontes de informação, quanto de erros grosseiros, já que são preparados para fins específicos de divulgação. Portanto, cabe ao pauteiro verificar a precisão das informações que eles contêm e avaliar o interesse para o público. Um grande assunto pode valer uma pauta temática. Durante alguns dias os principais programas desenvolvem um determinado tema e procuram explorar todos os ângulos possíveis do assunto com entrevistas, reportagens, participação de correspondentes de vários locais do Brasil e do exterior, edições, notas, comentários etc. Essa pauta pode ser encerrada com um debate no estúdio entre especialistas de opiniões divergentes. Há entrevistados que sempre são notícia e não precisam de pautas para participar da programação, como o presidente da República, o governador, o prefeito, personalidades de renome internacional, etc. O pauteiro deve elaborar uma agenda com os principais acontecimentos previstos para os finais de semana e feriados. Saber, por exemplo, o que o prefeito e o governador vão fazer no domingo é importante para o planejamento do plantão. É importante dizer que um bom arquivo é fundamental para o pauteiro, pois as informações que não são utilizadas na pauta de hoje podem ser úteis amanhã. Certa vez, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que, pelo que lia nos jornais todos os dias, o mundo e seu governo iam se acabar. Por isso é preciso o bom-senso e a crítica para não se convencer de que todo político é corrupto, de que toda modelo é prostituta, de que todo pai briga com o filho, de que todo dirigente esportivo é mentiroso e de que que todo jornalista é arrogante. As exceções não devem condicionar a realidade. É o caso do copo com metade de sua capacidade com água: está meio cheio ou meio vazio? A tudo isso se opõe uma visão construtiva, ou seja, a noção de informar para transformar.
Em outras palavras, o pauteiro deve ter sempre como objetivo moldar a realidade pela razĂŁo.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Você é pauteiro de uma emissora e sugere uma pauta não factual muito interessante, a seu ver, mas que não é acatada pela chefianas sucessivas reuniões de pauta de que participa. Ou seja: você a considera importante, mas seu chefe, não. Sabendo que daquela pauta podem surgir desdobramentos interessantes e que são de interesse público, como você procede? Insiste com seu chefe, mesmo correndo o risco de continuar a ser ignorado, repassa a ideia a um concorrente ou simplesmente desiste da pauta? 2. Uma entrevista agendada com certa antecedência tem de ser cancelada, porque a pauta caiu. O entrevistado é uma pessoa muito ocupada e teve que desmarcar outros compromissos para atender à sua solicitação. Como você resolve esta situação? 3. A emissora em que você trabalha como pauteiro recebe centenas de sugestões diárias de pautas, vindas de assessorias de imprensa, empresas e ouvintes. Como você faz para filtrar o que realmente considera relevante?
Sugestões De Leitura 1. Folha De São Paulo. Manual de redação Publifolha: São Paulo; 2010. 2. Silva Carlos Eduardo Lins. O Adiantado da hora: a influência Americana sobre o jornalismo brasileiro São Paulo: Summus Editorial; 1991;.
Dicas de filmes O âncora – a lenda de Ron Burgundy, EUA, 2004– Dir. Adam McKay Nos anos 1970, Ron Burgundy era considerado um dos melhores âncoras de telejornais de San Diego. Sua colega, a feminista Veronica, fica responsável pelas matérias de cozinha e de outros interesses femininos, até que se cansa de ser mais um rostinho bonito e começa a querer mais espaço no noticiário. Ron sente-se ameaçado pela presença de Veronica e os dois travam uma guerra nos bastidores, tentando assumir a bancada do noticiário. O poder da mídia, EUA, 2004– Dir. Brian Goeres Hank Robinson, um jornalista norte-americano, vive em Barcelona e anseia por fazer uma grande reportagem para deixar de ficar na sombra do seu pai, um famoso repórter. Essa chance chega quando por acaso ele testemunha algumas mortes, cometidas supostamente por um grupo terrorista, mas não pode filmar o acontecido, pois sua filmadora estava sem fita. Um conhecido repórter, que também foi assassinado no atentado, antes de morrer entrega para Hank uma fita com a filmagem do ocorrido, que vai ao ar como se fosse uma matéria feita por ele. Para ser famoso, Robinson optou pela falta de ética, mas a fama que ele consegue logo o coloca no meio de uma enorme trama, na qual ele pode perder a vida.
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A produção “Eu lhe direi resumidamente o que penso sobre jornalistas: se Deus enfiasse a mão na lama, não poderia tirar das profundezas um só deles.” Nothing Sacred, filme de Ben Hecht
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Mostrar como o produtor atua para que a reportagem seja construída. • Entender os cuidados que um produtor deve tomar ao desempenhar seu trabalho. O produtor é o responsável por boa parte das condições materiais e do conteúdo do noticiário do rádio ou da TV. Ele funciona como elo entre jornalistas e técnicos, e acompanha a edição do programa desde o início. Além disso, participa do switcher, ou da técnica, é responsável pela organização do script e dos VTs e coordena a preparação do programa dentro e fora do estúdio, sempre atento às condições necessárias para que o programa vá ao ar. É ele quem está envolvido na organização e apresentação do telejornal. A participação na produção do telejornal começa no dia anterior, com a reunião de pauta, aberta a todos na redação, quando os temas e as formas dos assuntos que serão mostrados no dia seguinte são apresentados. No caso de emissoras all-news, essa produção é constante, industrial, e não para nunca. Se algo importante ocorrer durante a exibição do telejornal, o fato deve ser levado ao editor-chefe, que vai decidir se entrará ou não no ar, e reportagens de menor importância podem ser derrubadas para que o fato novo e relevante seja exibido. O produtor deve estar atento ao enfoque do noticiário de outras TVs, rádios e sites. O apoio da central informativa é fundamental, cotejando a evolução dos assuntos por meio de resumos do noticiário de outras emissoras de televisão, rádio e sites. Verificar a produção dos programas anteriores é obrigação diária, pois vários temas podem ser aprofundados no programa seguinte. E não há limite de esgotamento, a não ser aquele imposto pelo próprio assunto. Por isso, deve-se ter sempre em mente a realização e a organização de debates e mesas-redondas, uma vez que debate é uma forma democrática de discussão e contribui para o esclarecimento do telespectador. O produtor deve ficar atento aos artigos assinados de jornais e revistas, porque os autores geralmente têm credibilidade e abordam temas polêmicos que podem render entrevistas e reportagens para a TV. E aqueles assuntos complexos devem ser brifados para o apresentador pela produção, pois ninguém é obrigado a entender de tudo. E se houver necessidade de pesquisa de texto sobre o assunto tratado, a internet pode contribuir para a agilidade e riqueza das informações complementares. Outra função do produtor é cuidar para que o contato com pessoas, empresas ou entidades acusadas durante uma entrevista seja imediato, pois ouvir todos os lados da notícia é a prioridade do bom jornalismo. Quando a chefia de reportagem utiliza a palavra “urgente” faz que qualquer coisa que esteja no ar seja interrompida para a informação da reportagem ou apurada na redação. Por isso, é necessário o máximo critério para afirmar que alguma intervenção é urgente. A agenda é fundamental para o produtor e a programação, portanto, ele próprio ou seu assistente sempre devem atualizar os telefones dos entrevistados em sua agenda ou em seu computador. Além disso,
ele deve estar sempre em contato com as fontes, porque notícias interessantes podem surgir de uma conversa informal, mesmo nos bastidores, e se o entrevistado adiantar uma notícia, o produtor deve informar imediatamente o entrevistador. Em caso de mudança de pauta, deve-se ligar desmarcando a entrevista agendada com o convidado. É importante ressaltar que esse é um ponto de honra, pois é melhor cancelar com o entrevistado do que deixá-lo esperando. A gravação com as entrevistas feitas durante o programa deve ser encaminhada ao editor acompanhada de respectivo material de apoio. Converse com o editor sobre o trecho da entrevista considerado mais importante, tendo em vista que o material editado pode ser usado em outros programas. Vale repetir o entrevistado desde que ele tenha novas e importantes informações para acrescentar ao noticiário, mas tome cuidado tanto com os habitués quanto com os que se oferecem, lembrando que nunca se põe um entrevistado no ar apenas para tapar buraco. É natural que médicos, advogados, consultores e outros especialistas queiram aparecer na mídia, visto que isso vai lhes trazer retorno direto ou indireto, seja na carreira ou na vida econômica. Contudo, não se pode arriscar a credibilidade abrindo espaço para pessoas que têm como mais importante a dizer apenas o endereço e o telefone. As organizações não governamentais também devem ser analisadas, até porque muitas são escritórios de advocacia disfarçados, que cobram mensalidades e honorários sob a capa de utilidade pública, outras são entidades fantasmas, sem representatividade social e que promovem política e economicamente seus eternos presidentes. Os assuntos relacionados à saúde e beleza têm grande espaço na imprensa, principalmente quando se trata de novas descobertas, novos remédios ou métodos que mexam com a vaidade das pessoas. Todavia, é necessário que se faça uma distinção entre os entrevistados que realmente têm algo a dizer e os que não são idôneos. Algumas clínicas se enquadram no perfil de baixa credibilidade, principalmente as que cuidam de cirurgia plástica, estética, obesidade, impotência, implantes etc. Salvo exceção, é melhor procurar especialistas nas universidades ou entidades oficiais dessas categorias. O produtor deve se precaver para a falta de notícias nos fins de semana e feriados, e uma opção é agendar ou gravar entrevistas com antecedência. Merecem atenção especial a prestação de serviços (estradas, aeroportos, meteorologia, lazer) e o esporte, que são apurados até o fim do jornal. A conquista da audiência exige o esforço de todos, mas não é sacrificando o conteúdo do noticiário e os limites éticos do jornalismo que a emissora adquire credibilidade. Se houver confronto entre audiência e credibilidade, deve-se optar pela credibilidade. A programação de um jornal eletrônico, rádio ou TV é quase sempre concebida em blocos, cuja duração varia de acordo com o modelo. O bloco permite a inserção da publicidade e facilita a transmissão em rede, além de organizar e explorar os ganchos que podem preparar o telespectador para as atrações que são anunciadas. E as famosas vinhetas chamando reportagens ao vivo, ou início de programas, constituem o que os semiotistas chamam de enunciado. O produtor deve manter sempre um arquivo com ideias para reportagens e estar reparado para produzir a reportagem lendo o que puder sobre o assunto. Ele é também responsável por todas as indicações técnicas no texto do programa, sendo sua responsabilidade garantir que as fitas estejam relacionadas na sequência do espelho e assegurar que disparem no ponto. Esse profissional é responsável pela preparação do material de arquivo usado para cobrir reportagens ou notas cobertas e também cuida das ilustrações do telejornal, como selos, vinhetas, tabelas, etc. É imprescindível que ele verifique se os entrevistados estão vestidos e usando objetos em uma tomada e com roupas e objetos diferentes em outra, pois isso pode prejudicar a edição da reportagem. Além disso,
é importante anotar corretamente o nome do entrevistado e passar para o responsável pelo gerador de caracteres com antecedência, sempre tomando muito cuidado com os nomes estrangeiros. O produtor deve conversar com os apresentadores do telejornal pelo ponto eletrônico, orientando-os no ritmo e na paginação do jornal e tomando cuidado para não falar quando o âncora estiver lendo o script, pois isso pode atrapalhar a apresentação. Nada acontece no estúdio de gravação a não ser que o produtor providencie para que aconteça. Sendo assim, é importante que ele visite pessoalmente o local onde a reportagem vai se desenvolver, converse com pessoas, peça sugestões. Como a responsabilidade é sempre do produtor, ele nunca deve confiar na visão de outras pessoas, pois elas podem comprometer a produção. Em casos de locações externas, é preciso conhecer o local, verificar o sol, listar as sequências e relacionar as tomadas de cena. Verifique o local onde vai ser gravado o stand up e atente, por exemplo, a uma parede repleta de frases que não interessam à matéria, como desenhos racistas ou pornográficos. Entende-se que não é necessário pedir autorização em um espaço público, mas em um espaço privado, como um supermercado, por exemplo, e é interessante solicitar essa permissão antecipadamente. A justiça norte-americana entende que praças e corredores de shoppings são locais públicos. As filmagens não são feitas aleatoriamente pela equipe de reportagem, portanto, é preciso saber o que vai ser filmado. Pouca imagem é ruim, muita imagem também não é bom. Em transmissões ao vivo de eventos públicos, sujeitas a imprevistos de toda a ordem, inclusive meteorológicos, é válido ter à mão material stand by. Reportagens pré-gravadas com informações acessórias sobre o evento podem ser usadas em caso de emergência. Não esqueça que o vídeo é bidimensional, portanto, junto com a imagem vai o som. Essa avaliação é mais importante nas transmissões ao vivo, quando, em caso de manifestações, por exemplo, slogans, palavras de ordem e as mais variadas agressões verbais entram na matéria. Como produtor, dialogue constantemente com a técnica e acompanhe a solução de todos os requisitos como o som, acesso ao local, equipe de trabalho, dia e hora da gravação ou transmissão ao vivo, fontes de energia etc., e nunca subestime o tempo para a realização da reportagem. Geralmente entrevistados e eventos atrasam, portanto, verifique a disponibilidade da equipe se houver demora e não corra o risco de ter que interromper a reportagem por causa da organização funcional dos envolvidos. Explique com antecedência para o chefe da equipe técnica sobre a produção, planeje um roteiro e dirima todas as dúvidas que surgirem. Não deixe para a última hora nem para o momento em que a equipe se desloca para o local da pauta. Além disso, indique quais são as gravações mais importantes e não se esqueça de que os equipamentos, mesmo os mais novos, são passíveis de defeitos. Mudanças repentinas do tempo também podem atrapalhar a reportagem. Sendo assim, peça para que a equipe filme primeiro as cenas externas e só depois as demais, e não se esqueça de que o que se vê na tela nem sempre coincide com o que se vê pessoalmente, principalmente em ambientes externos. Certifique com a equipe técnica o tipo de microfone que vai ser usado e se é adequado para o local da reportagem – o vento muitas vezes dita o tipo do microfone e não se esqueça de que o trabalho em TV é coletivo e, portanto, todos devem ser informados dos passos da produção.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Uma emissora pretende realizar uma grande reportagem sobre a deficiência dos aeroportos brasileiros, incluindo aí um debate entre vários especialistas no assunto ao final da matéria. Como devem ser selecionadas as fontes e personagens que participarão dessa reportagem? 2. Durante uma entrevista ao vivo feita pelo âncora com um importante senador da República, tratando de um escândalo de corrupção que está em todas as mídias, ocorre uma tragédia local que necessita ser levada imediatamente ao ar. De que forma o produtor deve proceder nessa situação? 3. Você é produtor de um telejornal e tem em mãos uma denúncia anônima muito grave e de interesse público. Para realizar essa reportagem, o repórter terá de lançar mão do recurso da câmera escondida e atuar disfarçado. Como cobrir esse assunto sem exceder os limites éticos da profissão?
Sugestões De Leitura 1. Prado Magaly. Produção de rádio: um manual prático. Rio de Janeiro: Campus; 2006. 2. Machado Arlindo. A televisão levada a sério. São Paulo: Senac; 2000.
Dicas de filmes Salvador, o martírio de um povo, EUA, 1980 – Dir. Oliver Stone Um fotojornalista “gonzo” e seu amigo DJ chegam a El Salvador durante os conflitos político-ideológicos do início da década de 1980. Lá ambos descobrem um país em plena guerra civil, onde os direitos humanos não são respeitados e crianças, mulheres e clérigos são assassinados sem a menor cerimônia e com total impunidade. Medo e Delírio, EUA, 1998 – Dir. Terry Gilliam Hunter Thompson foi o criador do chamado Jornalismo Gonzo, no qual o repórter se mistura aos fatos, pode utilizar-se da ficção, não é fiel ao assunto principal da matéria e escreve em primeira pessoa. O filme mostra uma viagem do jornalista a Las Vegas, juntamente com seu advogado, para cobrir uma corrida de motos no deserto de Nevada. Na bagagem, muita maconha, cocaína, éter, bebidas e todo tipo de estimulante, colecionados em uma mala. Em vez de trazer uma cobertura fiel dos eventos, as reportagens feitas por Th ompson focaram na fragilidade do american way of life (ou “sonho americano”), uma das buscas constantes dos protagonistas no filme.
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O texto para rádio, TV e internet “Quem não vê bem uma palavra não vê bem uma alma.” Fernando Pessoa
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Entender a importância do texto nas diversas mídias jornalísticas. • Explicar alguns conceitos de gramática importantes para um bom texto. • Saber como redigir um texto coeso e coerente. O texto jornalístico, seja em veículo impresso ou eletrônico, deve ser claro, conciso, direto, preciso, simples e objetivo. São normas universais, de absoluto consenso na TV, no rádio, na internet, em jornal ou revista, enfim, em qualquer plataforma. Algumas regras, porém, devem ser seguidas em cada veículo para que a missão de conquistar o telespectador, ouvinte ou leitor seja alcançada. A televisão, o site e o rádio têm a característica da instantaneidade, o que obriga o jornalista a fazer a notícia ser entendida pelo receptor no exato momento de sua transmissão. Na TV, na internet, bem como no rádio, o texto deve ser coloquial, e o jornalista precisa ter em mente que está contando uma história para alguém; entretanto, existe uma diferença fundamental: o casamento da palavra com a imagem. É a sensibilidade do jornalista que vai fazer essa “união” atingir o objetivo de levar ao ar uma informação fácil de ser compreendida pelo telespectador. O texto do vídeo tem uma estrutura de movimento, instantaneidade, testemunhalidade, indivisibilidade de imagem e som, sintetização e objetividade. O primeiro passo para a redação de um texto no vídeo é conhecer as imagens que poderão ser usadas na edição, a fim de fazer o casamento da palavra com a imagem. Procure não descrever no texto exatamente o que está na imagem, pois o resultado será a redundância. No que diz respeito à utilização do computador e à exibição do texto diretamente da rede para o teleprompter eletrônico da câmera, o formato ainda lembra os antigos scripts. Ou seja, do lado esquerdo da tela vão as informações do vídeo e do lado direito, o texto para ser lido pelo apresentador, forma que também é utilizada no rádio. O texto começa com o lead, portanto, procure a novidade, o fato que atualiza a notícia e a torna o mais atraente possível. Ele deve ter uma sequência lógica, na ordem direta, seguindo a regra simples sujeito + verbo + predicado. A pontuação merece atenção especial, ao passo que uso dos sinais ortográficos facilita a entonação da voz e a respiração do apresentador. Por exemplo, em frases interrogativas faça uso da técnica espanhola de pontuação, ou seja, coloque um sinal de interrogação no início da frase, pois, desse modo, o apresentador não será pego de surpresa. Por exemplo:
(?) Quem será o campeão brasileiro? (!) Atenção à última informação!!!
A adjetivação excessiva ou inadequada enfraquece a qualidade e o impacto da informação, e substantivos fortes e verbos na voz ativa reforçam a densidade indispensável ao texto jornalístico. O texto deve ser coloquial, mas sem apelos à linguagem vulgar, portanto, fique longe de gírias, chavões, lugares-comuns e expressões que se desgastaram com o tempo. Também é bom evitar frases longas, pois elas dificultam a respiração do apresentador e são mais difíceis de ser entendidas. Como é importante que o texto tenha ritmo, prefira as frases curtas – mas que não sejam telegráficas –, cada uma expressando uma ideia, e evite frases intercaladas entre vírgulas. A repetição de palavras na TV, desde que na medida certa, ajuda na compreensão da notícia. Essa é uma questão de bom-senso, porque tanto a repetição desnecessária quanto a ansiedade de buscar um sinônimo podem empobrecer o texto. Evite começar um texto com as palavras “continua” ou “permanece”. Ou seja, procure um enfoque novo, para não dar a conotação de que o assunto está superado. Também fique atento ao efeito sonoro das palavras com a mesma terminação, uma vez que não é agradável ouvir “O temporal na capital alagou a marginal” ou “A organização da programação da televisão”. Deve-se tomar especial cuidado com os cacófatos – encontro de sílabas de palavras diferentes pode formar som desagradável ou palavras obscenas. Por exemplo: “boca dela”, “confisca gado”, “de então”, “ela tinha marca”, “gol nunca” e “ganhou por cada”. Alguns cacófatos podem ser evitados com a simples substituição da palavra por um sinônimo ou com a mudança na estrutura da frase. Por exemplo:
O prêmio por cada vitória – O prêmio para cada vitória. Nunca ganhou uma eleição – Jamais ganhou uma eleição.
Os artigos não devem ser suprimidos, especialmente nas manchetes, pois seu uso tem função importante na linguagem coloquial da TV. Mas é interessante verificar se ele tem função na frase. Por exemplo: “o jogador sentiu medo” é melhor que “o jogador sentiu um medo”. Não confunda os pronomes demonstrativos “este” e “esse”. O primeiro indica o que está mais próximo de quem fala ou escreve, ao passo que o segundo indica o que está mais distante de quem fala ou escreve. Atenção também aos gerúndios, pois eles deixam as frases longas e enfraquecem o texto. Aliás, nunca inicie uma frase com gerúndio. Cuidado também merece o “queísmo”, ou seja, uso excessivo do “que”, principalmente numa mesma frase, pois isso prejudica o ritmo e empobrece o texto. Avalie os verbos usados nas declarações – os mais usados são dizer e afirmar. “Informar” significa relatar um fato, “garantir” é assegurar, dar certeza absoluta, “declarar” significa pronunciar e “admitir” tem sentido de confessar. Cuidado com o verbo “advertir”, pois ele é ambíguo e tem sentido de censurar, chamar a atenção etc. Ambíguos também são os verbos “dever” e “poder”, pois indicam capacidade e possibilidade; já o verbo “querer” indica intenção, nunca decisão. Prefira o uso do presente no indicativo e do futuro composto quando se referir ao que vai acontecer. É melhor ouvir “O presidente viaja amanhã” ou “O presidente vai viajar amanhã” do que “O presidente viajará amanhã”. Seja criterioso também no uso dos verbos no futuro do pretérito, os quais expressam dúvida ou incerteza e devem ser usados quando se tem consciência de um fato social, mas não há provas.
Use o cargo, a profissão ou o título para identificar autoridades e personalidades, lembrando que a forma de tratamento deve vir antes do nome. No caso de pessoa que morreu no exercício do cargo não se usa “ex”, e pessoas consagradas, como Pelé e Madonna, dispensam qualificação. Respeite os casos em que a pessoa é conhecida pelo nome completo e não use dona, doutor, senhor e senhora no texto. Redija os números por extenso, para facilitar a leitura pelo apresentador. Por exemplo: • sessenta e duas mil pessoas • dois terços da população • setecentas caixas • dezoito por cento • dois milhões e quinhentos mil reais • onze de setembro de dois mil e um • cento e sessenta quilômetros por hora • cinco quilos e trezentos gramas • nove da manhã. Quando colocados na tela, os números não são redigidos por extenso, e em algumas situações os números podem ser simplificados para que o telespectador capte melhor a informação. Por exemplo: a informação vai chegar mais clara se redigirmos que o prêmio da loteria é de oito milhões e quatrocentos mil reais, em vez de oito milhões, 401 mil, 795 reais e 76 centavos. Porém, nunca arredonde um número quando ele for a notícia principal, com: o aumento no preço da gasolina vai ser de seis por cento. É preciso atenção ao redigir medidas estrangeiras. Quanto vale uma milha terrestre? E uma milha náutica? E um nó? E um pé? São termos que indicam extensão, altura e velocidade usados tanto na aviação quanto na marinha. Também não confunda altura com altitude: altitude é a partir do nível do mar e altura, a partir do solo. Os acidentes geográficos e aéreos são expressos em altitude e, no caso de velocidades (milhas, nós etc.), redija sempre o equivalente em quilômetros por hora – toda redação tem uma tabela para conversão. Não se deixe envolver pela linguagem de documentos oficiais, redigindo detalhes como número, parágrafo, inciso da lei, entre outros. Com relação às siglas mais conhecidas, elas não precisam ser desdobradas; ou seja, podemos usar siglas como INSS, FMI, ONU. Apenas separe a sigla por hífen para facilitar a leitura do texto, como I-P-C-A, mas tome cuidado para não separar letras de siglas pronunciadas como palavras, por exemplo, Fiesp. As siglas estrangeiras pouco conhecidas podem ser adaptadas: FED, banco central dos Estados Unidos; FAO, órgão das Nações Unidas de incentivo à agricultura. Identifique os lugares, pois o público nem sempre sabe onde fica cada cidade, cada país etc. Por exemplo: Afeganistão, na Ásia Central, Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, e lembre-se de que os recursos visuais facilitam a identificação dos lugares. Evite o estrangeirismo, mesmo que sejam de uso frequente, pois tais palavras nem sempre são conhecidas de todos os telespectadores, e indique no script como é a pronúncia das palavras estrangeiras. Fique atento aos nomes próprios: o ideal é que a pronúncia seja de acordo com o país de origem, mas lembre-se que há exceções, como Nova York. Os termos técnicos devem ser explicados, pois há expressões que são conhecidas apenas pelos profissionais da área; isso acontece muito com economistas, médicos e advogados. Por fim a revisão do texto em voz alta é a melhor maneira de evitar erros que “derrubam” o apresentador, pois, com a leitura em voz alta, é possível descobrir problemas com a sonoridade das palavras, concordância, cacófatos, frases sem sentido, enfim, uma série de “defeitos” que podem comprometer a qualidade da informação.
Exercícios propostos Para Refletir 1. O filho de um famoso cantor sertanejo sofreu um grave acidente de carro e é mantido em coma induzido num hospital em Goiânia. Diariamente, são emitidos boletins médicos pela equipe responsável pelo atendimento ao rapaz. O assunto causa comoção nacional, e a população acompanha atentamente as notícias sobre o assunto. No último boletim, é informado pela equipe médica que a situação do paciente está inalterada. Redija o título e o lead dessa notícia para ir ao ar no próximo jornal. 2. Os jogadores do Santos Futebol Clube foram homenageados pelo Congresso Nacional no dia em que o clube completou seu centenário. O atacante Neymar foi o mais festejado e bateu bola no plenário com o presidente da Câmara, diante dos cinegrafistas e dos parlamentares. Redija essa notícia em uma nota curta, observando as regras de identificação dos personagens. 3. Um vulcão entrou em erupção na Islândia e está prejudicando gravemente todo o tráfego aéreo na Europa. Quando se trata do vulcão Etna, é fácil identificá-lo no texto para ser pronunciado pelo locutor. Mas esse vulcão se chama Eyjafj allajoekull, ou seja, tem um nome de difícil pronúncia. Como mencioná-lo de modo conveniente no texto da notícia, já que não é o único vulcão da Islândia?
Sugestões De Leitura 1. Squarisi Dad. Manual de redação e estilo para mídias convergentes. São Paulo: Geração Editorial; 2011. 2. Martins Eduardo. Manual de redação e estilo de o estado de são paulo. São Paulo: O Estado de São Paulo; 1997;.
Dicas de filmes Rede de intrigas, EUA, 1976 – Dir. Sidney Lumet Um locutor de noticiário de uma rede de televisão norte-americana é demitido em razão da baixa audiência do programa. Ele então anuncia que cometerá suicídio no ar e, por essa razão, os índices de audiência do programa voltam a crescer, e ele acaba sendo readmitido. Mas seu comportamento insano faz com que os responsáveis pela sua ascensão decidam detê-lo. O filme faz uma crítica severa e mordaz à falta de ética da televisão, à massificação do público e à mentalidade puramente capitalista e inescrupulosa dos poderosos que estão nos bastidores da TV. Discute também o papel dos meios de comunicação da massa e a necessidade de um controle social, além de expor os interesses existentes entre conglomerados empresarias que controlam os meios de comunicação, sobretudo a televisão. O quarto poder, EUA, 1997 – Dir. Costa-Gavras História de Max, que já foi o mais popular repórter da TV norte-americana, mas agora vive no anonimato e vê oportunidade de mudar sua carreira. Ao entrevistar a diretora de um museu, ele conhece o ex-segurança Baily, que quer seu emprego de volta e, armado até os dentes, invade o local e dispara um tiro acidental. A partir daí, a situação de Baily se complica, pois acaba fazendo da diretora a sua refém. Esse erro será o trampolim para o repórter voltar a ser visto por todo o país, numa cobertura jornalística que usa métodos para lá de questionáveis.
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A edição “É possível contar um monte de mentiras dizendo apenas a verdade.” Publicidade do jornal Folha de São Paulo na TV
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Compreender a importância do editor de jornal, de reportagem ou de programa em uma redação. • Dominar as técnicas de edição de entrevistas. • Reconhecer a importância do editor na produção de um programa jornalístico. A função de editor na mídia eletrônica é trabalhosa, dá pouca visibilidade ao jornalista, mas é de fundamental importância, pois a edição é a montagem final da reportagem que vai ao ar no telejornal. É nessa etapa da elaboração da matéria que fica mais clara a ação do jornalista em excluir e suprimir parte do material colhido, sob ação da subjetividade. É preciso reduzir a complexidade do real para torná-lo inteligível em uma reportagem de TV, portanto, a objetividade é um ideal a ser perseguido sempre. Editar uma reportagem é como contar uma história, e como toda a história, a edição precisa de uma sequência lógica que, pelas características do veículo, exige a combinação de imagens e sons. Em algumas emissoras o repórter chega com a matéria bruta, vai logo para a ilha de edição e finaliza a reportagem. Contudo, a produção de notícias na maioria das redações está organizada de forma industrial, ou seja, ao terminar uma matéria o repórter não volta para a redação, vai para a outra matéria enquanto as gravações são enviadas para a edição. Nas matérias mais elaboradas, geralmente de um dia para o outro, é possível uma conversa entre repórter e editor e, também, o acompanhamento da edição pelo repórter. Mas isso é exceção, e não o dia a dia, quando todos são pressionados pelo deadline. Os editores também escrevem cabeças e pés de matérias, e notas que compõem o script do telejornal. Editam reportagens vindas de outras praças e são os primeiros a avaliar se uma determinada matéria deve ou não cair. Em alguns casos são necessárias duas ou mais horas para se editar uma matéria de um minuto e meio. Então, imagine de quantas horas o editor necessitaria se fosse montar, sozinho, um telejornal de uma hora. É por isso que os editores são numerosos nas redações, e nessa função, a oferta de trabalho costuma ser maior, mas não tem o atrativo de aparecer na TV, a não ser ocasionalmente em uma reportagem especial. A edição começa com a decupagem do material enviado da rua pela reportagem. O editor deve anotar todos os detalhes das imagens, sonoras, passagens e o off do repórter. Decupada a reportagem, o editor seleciona o que vai usar, tendo sempre em mente a narração de uma história com início, meio e fim. O tempo da reportagem é determinado pela importância do assunto e pela força das imagens, e nem sempre a passagem do repórter é necessária numa edição. O que importa é a notícia, portanto, a presença forçada dele, apenas para que ele apareça, pode quebrar a sequência da edição. Ao iniciar a edição, o editor deve “mentalizar” a matéria como um todo e precisa definir quais informações serão destacadas na cabeça (que será lida pelo apresentador), para saber o ponto de partida da edição. O texto lido na cabeça nunca deve ser o mesmo do off do início da edição. Além disso, a edição precisa de equilíbrio, portanto, um off longo seguido de sonora curta ou off curto seguido de sonora longa quebra o ritmo da matéria.
Como o jornal eletrônico é formado em sua maior parte por reportagens editadas, se o estilo for o mesmo pode tornar o programa monótono. Por isso, variar a forma de edição ajuda a torná-lo mais agradável. A cobertura do off deve ser feita pelo editor de texto e pelo editor de imagens, que, juntos, têm melhores condições de construir uma reportagem. O editor deve acompanhar o trabalho na pós-produção até o fechamento da matéria, e não apenas pedir esse ou aquele efeito especial. Podemos considerar razoável o tempo de 20 segundos para cada sonora, mas há exceções: um assunto importante, uma declaração polêmica e a capacidade de síntese do entrevistado também podem influir no tempo da sonora. O editor deve cuidar para que a edição não apresente “pulo de imagem”, com corte brusco de um local para outro, pois isso provoca um efeito desagradável para o telespectador. O uso de uma imagem neutra evita o “pulo” – é o uso do insert. Nem todas as TVs usam essa técnica, e algumas optam por deixar o corte ainda que dê um pequeno pulo, percebido com facilidade pelo telespectador. O profissional de edição deve pedir para a equipe de cinegrafistas filmar cenas do cotidiano, para que não precise usar imagens de arquivo, pois nem sempre elas existem ou estão à disposição na hora da edição. O material de arquivo é indicado para cenas que informem com clareza a data na qual foram filmadas. Peça para a equipe filmar sequências inteiras com vistas a facilitar a edição, como a entrada do repórter em uma loja. Nesse caso, deve-se filmá-lo entrando na loja e, alguns segundos depois, a imagem deve mostrar que ele desapareceu de cena. Cuidado com as claquetes para designar as pessoas que aparecem na tela gravada ou ao vivo, e não se escreve no GC senhor ou senhora, mas títulos de autoridades. Como é sempre necessário reduzir ao máximo os títulos na tela, é preciso usar abreviaturas. O repórter grava o off da matéria, que é a história na qual ele não aparece, e o off é coberto com imagens obtidas pela equipe de reportagem na rua, com imagens do arquivo ou com a exibição de dados que ocupam toda a tela. O apresentador também grava off tanto de reportagens quanto de notas cobertas que são notícias apuradas e redigidas na redação, e este é construído pelo editor e coberto com imagens de agências nacionais ou internacionais, ou, então, de arquivo. Ao usar o material de arquivo, é necessário tomar cuidado para não se colocar imagens ou sonoras de personagens de situações completamente diversas da reportagem que se quer construir. Quando as cenas importantes são muito rápidas, o editor pode repeti-las em slow motion (câmera lenta) como forma de chamar a atenção do telespectador para o fato relatado. Pode escrever no off, por exemplo, “Veja de novo a cena filmada por um cinegrafista amador”. Cuidado com imagens de closes que identifiquem pessoas cuja filmagem não foi autorizada. Em reportagens sobre obesidade, drogas, criminalidade, por exemplo, deve-se recorrer a takes abertos, pois isso é tanto uma questão ética como legal. O editor deve esperar o material que vem da rua para a decupagem com uma pesquisa prévia de textos e imagens, caso sejam necessários para a conclusão da matéria. Ele deve ficar atento aos créditos que orientam a matéria no ar e, além dos nomes das pessoas e dos locais envolvidos na reportagem, é preciso indicar o tempo da reportagem, deixas, número de fitas e demais orientações ao departamento técnico, pois tais informações servem para orientar os técnicos. Os enganos são responsáveis por defeitos que pioram quando levados ao ar, por isso o ideal é que outra pessoa, além do editor, confira o material. O mesmo se aplica quando se escrevem tabelas, porcentagens e localidades que fazem parte da matéria. Erros de digitação são comuns em prévias eleitorais, e a falta de revisão muitas vezes provoca a demissão do responsável pelos erros. Dados sensíveis, como valor do dólar, poupança, bolsa de valores,
se incorretos, arranham a credibilidade da emissora e podem acarretar prejuízos materiais para o público. O ideal é que a revisão dos textos seja feita por duas pessoas: enquanto uma lê em voz alta, outra confere o script. Verifique sempre se a gravação está no ponto, para evitar que a matéria entre truncada por atraso ou antecipação, uma vez que é comum alguém da equipe assistir à reportagem antes de ir ao ar e não pedir para pôr no ponto de disparo. Sempre que for necessário, o editor deve lançar mão de recursos infográficos, como mapas, estatísticas, quadros e recursos de computação gráfica. Para isso, deve recorrer aos préstimos da pós-produção. A identificação do nome do repórter, com ou sem passagem, é muito significativa para a individualização da matéria. É a sua marca pessoal e, ao mesmo tempo, uma identificação para o público. Em geral, a identificação integral é reservada a personalidades, ao passo que “personagens do povo” têm identificação genérica de “testemunha”, “dona de casa”, “manifestante”, entre outras. Em casos excepcionais, quando as imagens são obtidas de outra fonte que não a da própria emissora, deve-se informar o telespectador, no texto em off, ou por meio de claquete. Em caso de cenas de conflito, a imagem pode ser censurada pelas autoridades locais, e isso também deve ser informado, de preferência continuamente no vídeo. Somente em casos excepcionais é que se deve usar imagens ou sonoras de arquivo para cobrir o início da reportagem. É preferível usar inicialmente as imagens gravadas durante a realização da matéria, que reforçam a atualidade do assunto desenvolvido. O arquivo de imagens só deve ser usado se contiver informação relevante para a reportagem, e nunca apenas para cobrir o texto do repórter. Um áudio ruim pode ser usado se for de grande importância para a reportagem, mas a fala do entrevistado deve ser transcrita pelo gerador de caracteres, para que o telespectador possa acompanhar o que diz o personagem. Uma declaração contundente que chame a atenção do telespectador pode ser separada e usada nas manchetes dos jornais – o chamado teaser. Ele deve ser editado dentro do contexto, para que o telespectador possa entender seu significado. Por ter pequena duração, não se confunde com a sonora usada na edição. No teaser, o repórter deve ter o cuidado para não furar o que ele vai dizer na matéria e, portanto, justificar sua participação. Em uma sonora muito longa, o entrevistado deve ser identificado pelos caracteres mais de uma vez, porém há personagens que dispensam identificação por serem muito conhecidas, como o presidente e o papa. Nomes muito longos costumam causar problemas, e isso exige a abreviatura de um ou mais nomes; entretanto, é preciso critério com a abreviação para não atrapalhar a identificação do entrevistado. O ideal é escrever os nomes pelo qual o entrevistado é popularmente conhecido; sendo assim, o poeta é Olavo Bilac, e não Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, nem Olavo B.M.G. Bilac. Preste atenção ao ritmo da fala, à entonação, à pausa e à respiração, pois esses detalhes são importantes nos cortes e nas emendas necessários em uma edição. Os pontos ideais para os cortes e emendas são descobertos pelo editor com a prática e a sensibilidade, mas a regra básica é dar sentido à fala e à imagem. A sonora deve terminar com a entonação “para baixo”, pois o depoimento que termina com a entonação “para cima”, além de ser esteticamente horrível, dá a impressão de o entrevistado ter sido cortado antes de completar o pensamento ou ter sido alvo de censura. As sonoras devem ser as mais opinativas possíveis, e o contexto e o enredo devem estar no off construído pelo editor. Este não opina no texto; quem opina é o entrevistado, por isso as sonoras opinativas são sempre mais contundentes e chamam mais a atenção. Sonoras que contenham emoção também rendem boas edições. Um choro, uma gargalhada ou uma frase em tom de desabafo às vezes dizem mais que uma declaração de 20 segundos. Entretanto, é preciso
cuidado, porque a emoção pode ser tanto um instrumento enriquecedor quanto o caminho para a desinformação. Não repita na sonora a informação do texto em off ou ao vivo e desconfie das sonoras que você tem de ouvir três ou quatro vezes para entender a declaração do entrevistado. Lembre-se de que o público só tem uma oportunidade, por isso, a sonora deve ser clara. Algumas reportagens são passíveis de utilização de músicas, e não há qualquer impedimento para que elas sejam usadas. É preciso apenas ter critério e bom-senso, considerando-se sempre qual o valor desse tipo de sonora para ilustrar a edição e qual sua função no corpo da história. A música pode aparecer no desenvolvimento ou no final da edição. Nesse último caso, é sempre conveniente encerrar com “queda de áudio” e indicar no texto o uso do recurso para que não haja um corte brusco no encerramento da matéria. No caso de uso de músicas, é recomendável o aproveitamento do som ambiente, ou seja, captado no local da reportagem para o BG. O editor deve sempre conferir nos sites se a reportagem editada contém todas as informações sobre o fato, as quais podem ser usadas como subsídio para um texto mais completo. É preciso critério para que a cabeça não entre em contradição com o corpo da matéria, e o fato jornalístico, como todos sabem, tem várias versões, mesmo se captado por jornalistas que estejam no mesmo local ou com o mesmo entrevistado. Por isso, o editor deve verificar qual enfoque prevalecerá. Grandes acontecimentos, como um julgamento de grande impacto na opinião pública e sessões de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, também merecem tratamento de edição especial. Na maioria das ocasiões, eles se estendem por várias horas e, às vezes, por mais de um dia e, nesses casos, é necessária uma edição por partes. Ou seja, contamos a história até aquele momento, e quando o fato prossegue, fazemos uma nova edição, aproveitando os melhores momentos do material anterior, e assim por diante até o final. A edição de um debate deve levar em conta o princípio e a equidade de conteúdo, pois nem sempre dar o mesmo tempo aos debatedores faz justiça com os participantes. É preciso bom-senso para equilibrar as sonoras de tal forma que permitam a cada um expor por inteiro o seu ponto de vista sobre o assunto em foco. Geralmente, o último depoimento tem mais apelo de atenção, por isso, de preferência, deve-se encerrar a edição com uma sonora na qual o participante rebata uma afirmação anterior e não abra nova discussão, sob pena de a outra parte não ter como se defender de um ataque. O editor deve ter atenção especial às marcações no script, pois é preciso detalhar a deixa do texto, a deixa da imagem, o sobe som, o repórter, o entrevistado etc. Ele deve utilizar todos os recursos audiovisuais possíveis para conseguir uma boa edição, mas nunca se valer deles para deturpar uma reportagem. Há também a questão da subjetividade, que na edição de uma matéria atua duas vezes: a primeira, com a interpretação dos fatos pelo repórter; a segunda, do editor, que não foi para a rua, não colheu as sonoras, não conversou com o entrevistado e não gravou o off. É um novo trabalho e uma nova interpretação, logo, mais uma carga de subjetividade. Daí a importância ética da fidelidade às informações. As reportagens que envolvem crianças precisam ter um maior cuidado de edição, e esse é mais um motivo para redobrar a atenção na escolha de imagens, sonoras e cenários. Lembre-se de que o Estatudo da Criança e do Adolescente proíbe a identificação de crianças e adolescentes suspeitos ou acusados de delito, portanto, as imagens devem partir de ângulos que não permitam a identificação. Se for necessário, o editor deve recorrer aos efeitos da pós-produção que alteram a imagem, o uso de tarjas ou distorção da voz. Ao lado da clareza e da concisão, a simplicidade completa a eficiência na comunicação dos fatos.
Sendo assim, tenha em mente que o público telespectador é heterogêneo.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Ao editar uma entrevista gravada para uma reportagem de rádio com um importante político envolvido em denúncias graves de corrupção, você se depara com trechos de silêncio, pigarro e tosse, e observa que eles acontecem sempre após as perguntas mais contundentes do repórter. De que forma deve ocorrer essa edição? 2. Você está diante de uma declaração importante de um entrevistado, obtida com grande dificuldade, numa disputa com inúmeros outros microfones e gravadores, e o personagem caminhando e tentando abrir passagem entre os repórteres. Por isso, a sonora ficou um tanto comprometida. Como resolver esse impasse sem desperdiçar a gravação a duras penas obtida? 3. Para conseguir encaixar uma sonora numa reportagem de modo a deixá-la ajustada ao tempo existente para o programa, você percebe que a edição poderá descontextualizar a declaração do entrevistado. Como proceder nesse caso?
Sugestões De Leitura 1. Chantler Paul, Stewart Peter. Fundamentos do radiojornalismo São Paulo: Roca; 2006. 2. Curado Olga. A notícia na TV São Paulo: Campus; 2002.
Dicas de filmes Ausência de malícia, EUA, 1981 – Dir. Sydney Pollack Um líder sindical desaparece, e a polícia não consegue encontrar o culpado. Querendo mostrar eficiência, passa a investigar um homem que aparentemente poderia ser suspeito, mas que nada tem a ver com o crime, e para dar visibilidade ao trabalho de investigação, usa a imprensa. Manipulação e publicação de informações obtidas em off , suicídio de fontes, falta de apuração – o filme trata do poder da imprensa e suas implicações. Diamantes de sangue, EUA/África do Sul/Sul/Moçambique, 2006 – Dir. Edward Zwick Ao final da década de 1990, Serra Leoa está em guerra civil, e governo e rebeldes se digladiam pelo controle das minas de diamantes. Em meio ao caos, há quem se aproveite da situação, como o contrabandista e mercenário Danny Archer, e também milhões de vítimas, como o pescador Solomon Vandy, separado de sua família e obrigado a trabalhar na procura de pedras preciosas. A história dos dois se entrelaça quando, na prisão, Archer descobre que o pescador achou um diamante com mais de 100 quilates e o enterrou no meio da zona de guerra. Somente com a ajuda da jornalista Maddy Bowen, engajada na luta para desmascarar a indústria dos diamantes de sangue, eles poderão reencontrar a pedra. Bowen é uma repórter que se cansou da monotonia das redações e resolveu dedicar seu tempo à busca por histórias em guerras ao redor do mundo. Quer contar aquilo que a mídia e o mundo muitas vezes se esquecem de enxergar. Na África, ela se defronta com o comércio ilegal de diamantes em meio à catástrofe da guerra civil. Escolhas éticas, proteção de fontes e envolvimento emocional são questões sensíveis com as quais a jornalista terá que lidar, buscando a neutralidade que o jornalismo exige.
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Esportes “O importante é o crítico dizer por que o jogador não foi bem e explicar o porquê. É injusto falar do jogador como pessoa, dizer que é louco, medíocre.” Pelé
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Aplicar ao esporte as mesmas boas práticas jornalísticas de outros assuntos. • Explicar quais conhecimentos são imprescindíveis ao repórter esportivo. • Mostrar como um repórter esportivo deve se portar para manter a ética jornalística. A emoção faz com que o jornalismo esportivo no veículo eletrônico esteja sempre numa linha tênue entre a pieguice e a razão. Costuma-se dizer que não há boa cobertura esportiva sem emoção, mas o jornalista não pode se deixar levar por ela, pois o exagero é um passo para a desinformação. Transmissões de jogos de seleções brasileiras em copas do mundo e olimpíadas, por exemplo, ensejam surtos de nacionalismo. O atleta vira “nosso jogador” e o tom adquire um ufanismo demodé que lembra o nacionalismo fascista. A emoção do espetáculo é uma relação direta entre os esportistas e o público, e a intervenção do narrador ou repórter deve ser discreta, sem que haja a manipulação da emoção do público com adjetivos e advérbios falsos e inconsistentes, com o objetivo de estimular a audi- ência e a sustentação dos patrocinadores das transmissões. A rapidez dos acontecimentos no esporte exige do jornalista a improvisação constante, mas as informações não podem ser recheadas de metáfo- ras, erroneamente confundidas com estilo. O jornalismo esportivo obedece às mesmas regras, inclusive éti- cas, válidas para outros assuntos jornalísticos, e deve estar pre- parado para fazer uma reportagem sobre qualquer assunto, uma vez que política e economia também movimentam o noticiário esportivo. Jornalistas de outras áreas também devem estar em condições de fazer uma reportagem esportiva, pois esse segmento não é jornalismo de segunda categoria e não se confunde com talk-show, pois quem faz o espetáculo é o atleta, e não o narrador ou o repórter. Conhecer as regras dos esportes e os regulamentos dos campeonatos é importantíssimo, porque o repórter que não conhece a regra de um jogo e não sabe, por exemplo, os critérios para a classificação dos times na disputa de um campeonato não terá condições de fazer boa cobertura de nenhum evento esportivo. Nas transmissões ao vivo, o repórter deve estar ainda mais bem pre- parado para acrescentar informações que fogem do alcance das telas. Seja em campo ou em quadra, ele deve ser um observador atento, sempre pronto para acrescentar informações que fogem ao alcance das câmeras, uma tarefa cada vez mais difícil se levarmos em conta a estrutura montada hoje em dia pelas emissoras de TV. Na apresentação de reportagens gravadas, o repórter não deve se des- lumbrar com as belas imagens que o esporte sempre proporciona e abrir mão da informação, mas também não deve deixá-las de lado, pois muitas vezes uma cena captada pelo cinegrafista durante um treinamento é importante para a concepção da reportagem. E outro fator fundamental para a execução de um bom trabalho: o relacionamento repórter-cinegrafista.
Não use termos técnicos nas informações sobre as lesões sofridas pe- los atletas, pois o telespectador não é obrigado a conhecer os termos médicos. Na dúvida, pergunte ao médico do clube, mas não repita termos que o telespectador médio não é capaz de entender. Nada irrita mais o torcedor do que as mesmas e velhas perguntas dos repórteres e respostas dos jogadores depois das partidas. Para fugir disso, é preciso conhecimento e criatividade. Tenha critério ao pegar carona em entrevista já iniciada, levando em conta que frases como “Vamos saber o que fulano está dizendo…” ou a divulgação de declarações sem controle – há casos, inclusive, de divulgação de palavras de baixo calão – podem dificultar o entendi- mento por parte do público. Fique atento à pronúncia dos nomes dos atletas e das equipes. A padronização da pronúncia dos nomes estrangeiros é importante para evitar que durante a transmissão de uma partida de futebol, por exemplo, repórter, locutor e comentarista pronunciem de maneira diferente o nome do mesmo atleta. O que você tem a ver com a sexualidade de atletas e dirigentes? Cui- de para não invadir a privacidade alheia, principalmente se ela não influi na vida profissional. Também é preciso cuidado nas entrevistas com familiares, tratá-los respeitosamente, sem pieguismo, com sim- patia e sem tietagem, e antes de publicar qualquer notícia sobre a vida dos ídolos, duvide delas. Não faça especulações. O esporte também é um negócio, e interes- ses milionários movimentam informações plantadas por dirigentes e representantes de jogadores. Elogios desmesurados a determinados atletas levantam suspeitas de valorização para renovação de contrato ou transferência para outra equipe. As empresas estão aproveitando cada vez mais os espaços para di- vulgação de suas marcas, e é comum um campeonato ter associado o nome de uma empresa, como a Copa Toyota Libertadores. Isso também ocorre com equipes esportivas, como Rexona/Ades, Tele- mig/Minas, Wizard/Suzano e Sollys/Nestlé. Nada impede a citação de nomes de empresas patrocinadoras de equipes e eventos esporti- vos se eles forem de interesse para a informação, mas é preciso ana- lisar caso a caso para simplesmente não se fazer publicidade como querem as empresas ou omitir o nome sob pena de descaracterizar o evento. A saída é não dar nomes comerciais nas manchetes ou nos leads, deixando a citação para o corpo da notícia. Repórter de campo não usa camisetas, bonés ou qualquer outra peça que divulgue patrocínio comercial, e não se avança sobre a relação de trabalho do atleta com o clube. Só se divulga valor de contrato e salário se a iniciativa for do atleta, do clube ou do patrocinador, uma vez que o atleta tem o direito do comercial, como qualquer outro cidadão. Lembre-se de que demonstrar intimidade com ídolos não dá credibilidade nem audiência. Trata-se de um esnobismo dispensável, que passa uma falsa sensação de convívio entre o jornalista e o atleta. Jogadores e dirigentes têm garantido sempre o direito ao contraditó- rio, e os recursos técnicos podem atropelar a equipe esportiva que se antecipar no julgamento de lances polêmicos. Use e abuse das repetições tira-teimas para entender o que de fato aconteceu na jogada e só depois opine sobre isso. O repórter deve ter cuidado com o microfone aberto por acidente no meio de torcedores ou próximo do campo ou quadra, pois uma situação como essa pode captar coros de palavrões e outros xingamentos. Também é importante ressaltar que a necessidade de impro- viso não é desculpa para atropelos no idioma, nem desconhecimento do que se passa na quadra ou no campo. Na apresentação de um programa ou da transmissão de uma par- tida deve haver a distinção entre narrador, repórter e comentarista. Boa parte dos narradores, repórteres esportivos ainda levam, principalmente para as transmissões ao vivo, cacoetes típicos do passa- do, repetindo insistentemente algumas frases que não acrescentam nada à informação, uma vez que os lances que as imagens mostram com uma precisão bem maior. A “verborragia” precisa ser varrida das transmissões esportivas, pois falar
para impedir o silêncio é um contrassenso. Os comentaristas devem conhecer as táticas usadas nas partidas, e para justificar uma opinião, é preciso saber do que se está falan- do. Eles devem usar a didática e explicar o que está acontecendo de modo que o público mediano consiga entender os verdadeiros acontecimentos de um jogo. Nem todos os torcedores entendem de esquemas táticos, e os comentaristas não devem explorar frases como “o gol saiu como eu antecipei há pouco”, até porque o público tem espírito crítico e sabe quando o comentarista erra ou acerta. Os comentários devem se prender aos fatos, e não agradar a essa ou aquela torcida. Há comentaristas que analisam o jogo apenas do ponto de vista do time da casa, do time mais famoso, de maior torcida, esquecendo-se do fato de existirem duas equipes em uma parti- da, cada uma com sua disposição, tática e peculiaridade que podem explicar determinadas situações dentro de campo. Recursos gráficos existentes há muito tempo e pouco explorados no Brasil podem servir de diferencial para o comentarista em apoio às opiniões de transmissão. Ele peca quando, numa partida, eleva o atleta à condição de semideus e na outra, passa a desacreditá-lo, pois isso faz o público colocar em dúvida a opinião do comentarista. Na transmissão esportiva o lugar-comum é constante, mas deve ha- ver limites para que não se caia no ridículo. Fuja das frases e gírias que se desgastaram ao longo do tempo, e não há necessidade do uso de expressões que incitem a violência, do tipo “animal”, “inimigo”, “matador”, “guerra”. Tenha em mãos com antecedência dados históricos sobre os jogos e detalhes sobre a carreira dos atletas, porque isso ajuda a criar um repertório que enriquece a reportagem. Grandes competições, como jogos olímpicos ou campeonatos mun- diais, exigem maior preparação. Além de jornais, revistas e internet, é conveniente consultar a bibliografia especializada. Por fim, não caia no óbvio nem estimule o nacionalismo rançoso. É desnecessário dizer. Verifique cada caso. Em nosso exemplo, o termo brasileiro não acrescenta nada à informação; o importante é a nacionalidade do adversário O jornalismo esportivo deve respeitar os mesmos limites já expostos para qualquer área do jornalismo, e caso você tenha alguma dúvida, leia novamente o Capítulo 1, que traz boas informações sobre Ética.
Exercícios Propostos Para Refletir 1. Na cobertura de uma partida importante de um campeonato na- cional de futebol, você consegue uma entrevista exclusiva com o as- tro de um dos times, que será concedida no vestiário, após o jogo. Depois da entrevista, o jogador o convida a participar de uma festa que ele vai oferecer a alguns amigos dentro de poucos dias. Qual é a sua atitude? 2. Um jogador famoso de futebol, mas cuja carreira está em franco declínio, é também proprietário de uma empresa que mantém con- trato de publicidade com a emissora em que você trabalha. Durante uma partida, ele se mostrou particularmente fraco e em péssima for- ma, sendo inclusive substituído antes do final e deixando o campo sob vaias. Como você conseguiria avaliar o desempenho desse jo- gador na partida de forma a ser justo para com seu público, sem se comprometer perante seu empregador? 3. Um importante torneio de hipismo internacional será promovido no Brasil. Embora não seja a sua área de atuação, você é designado pelo seu chefe para cobrir o evento e produzir uma grande reporta- gem, já que o torneio terá grande destaque na mídia nacional. Como você deve proceder para dar conta da tarefa?
Sugestões De Leitura 1. Coelho Paulo Vinicius. Jornalismo esportivo São Paulo: Contexto; 2003. 2. Molica Org Fernando. 11 Gols de placa – uma seleção de reportagens sobre o nosso futebol São Paulo: Record; 2010.
Sugestão de filmes A primeira página, EUA, 1974 – Dir. Billy Wilder Um inescrupuloso editor-chefe (Walter Matthau) tenta dissuadir seu melhor repórter (Jack Lemmon) da resolução de se casar bem às vés- peras da maior reportagens dos últimos anos: o enforcamento de um prisioneiro acusado de homicídio. A testemunha ocular, EUA, 1992 – Dir. Howard Franklin História de um fotógrafo que descobre um assassinato cometido por um gângster e chega na cena do crime antes da polícia, e por isso é acusado do crime. O filme foi baseado na vida do fotógrafo Weegee, que trabalhava no New York Daily News, um tabloide da década de 1940.
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A redação “Hoje tudo vai contra a comunicação entre os seres humanos. Sou a favor da tecnologia, mas devemos humanizá-la.” Pedro Almodóvar
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Explicar quais fatores são importantes para o bom funcionamento de uma redação. • Entender a importância da apuração em uma redação. • Mostrar a importância da apuração da prestação de serviços. A redação de uma empresa jornalística deve levar em consideração a funcionalidade e a proximidade dos equipamentos e das pessoas. Se não houver organização, fatalmente a qualidade do trabalho ficará comprometida. Algumas TVs abriram mão do conceito tradicional do cenário e ambientaram seus telejornais na redação, o que provoca alguma limitação na movimentação das pessoas e na produção de ruídos. Algumas emissoras se preocupam mais, outras menos, em ocultar os que trabalham, os fios, as luzes e os demais equipamentos. É comum o uso de câmera portátil com travelling na redação, por isso é preciso organização, uma vez que ela faz também o papel de cenário. As bancadas tradicionais são substituídas por mesas que permitem novas tomadas de câmeras, de apresentadores e entrevistados. O uso de softwares especiais para redações facilita a organização do trabalho. Esses programas permitem, por exemplo, a criação de páginas especiais para laudas, pautas, agendas, relatórios. Entretanto, é importante que os computadores funcionem em rede, de modo a possibilitar o acesso à intranet e às agências de notícias. Um arquivo organizado de textos, imagens e gravações de áudio ajuda o jornalista a ganhar minutos preciosos, mas precisa estar informatizado para aliviar o tráfego de pedidos. Além disso, é bom que TVs estejam à disposição, para que todos acompanhem a programação dos concorrentes. A ilha de edição deve ser um espaço fechado da redação para que o som não prejudique o trabalho dos demais. A cabine de off também deve integrar a redação. Já a central informativa deve ser instalada em local apropriado, com todos os equipamentos necessários para acompanhamento dos noticiários de outros veículos e apuração das informações. A central técnica deve ter conexão com a redação, e contato entre os técnicos, a chefia de reportagem e os editores tem de ser permanente. Entretanto, toda a tecnologia que temos à nossa disposição hoje será inútil se não houver uma colaboração de todos os jornalistas para a atualização da agenda da redação, em ícone distinto no computador. Algumas emissoras, como a Record News optam por construir o estúdio do ar na redação. Essa proximidade compromete todo o conjunto com o programa que está no ar, mas também é preciso conviver com os sons próprios de uma redação, como os telefones. Algumas emissoras optam por um vidro fechando o estúdio, para que os sons indesejáveis não vazem. E para o estúdio ficar na redação, é preciso a cooperação de todos, mas vale lembrar que todos estão trabalhando, e não fazer parte de um cenário estático é bom comportamento. A concorrência acirrada entre as empresas abertas ou a cabo faz com que toda empresa queira ser a
primeira a mostrar as imagens dos fatos relevantes tão logo acontecem, como o incêndio, o acidente, o congestionamento, a manifestação, entre outros, e o papel mais importante nesse processo de captação de notícias cabe à central informativa. Os jornalistas da central informativa, chamados na redação de apuradores, fazem a ronda dos prestadores de serviço à comunidade. São telefonemas para a polícia, os bombeiros, postos rodoviários, defesa civil, prontos-socorros, aeroportos, enfim, uma variedade de órgãos públicos e privados. Outra função é o acompanhamento do noticiário das emissoras de TV concorrentes, emissoras de rádio e internet. A central informativa não é uma “espiã” dos concorrentes, apenas apura o que é tornado público e, assim, pertence a toda sociedade. É preciso avaliar o que está sendo apresentado e identificar o que é relevante e inédito. O “pensar televisão” é um requisito essencial para um bom apurador, e este, ao conversar com a fonte ou o telespectador, deve “enxergar” a reportagem em sua cabeça. A força da imagem e a relevância do fato são os argumentos básicos para o apurador convencer a chefia de reportagem da importância do envio de uma equipe para a realização de uma matéria, que pode vir a ser a mais importante do telejornal. A central informativa funciona como uma agência interna de notícias na redação e está subordinada à chefia de reportagem, e o trabalho de verificação e captação das notícias é feito nas 24 horas do dia. Mesmo passando o dia todo para captar as notícias pelo telefone, dificilmente o apurador vai conseguir saber tudo o que acontece numa grande cidade ao mesmo tempo. Por isso, é essencial saber cultivar as fontes e ter a confiança de que os informantes (bombeiros, policiais, promotores, médicos etc.) vão telefonar para avisar sobre algo importante. Diante disso, o maior pecado para um apurador é ter preguiça de atender o telefone. Lembre-se de que a notícia mais importante do dia poderá vir de um telespectador. Normalmente, as primeiras informações sobre casos graves (como incêndios, enchentes, acidentes) chegam às emissoras por meio de telefonemas de populares que moram ou que, naquele momento, passam pelo local. Portanto, todo o público que liga para a redação deve ser muito bem tratado. Montar uma boa agenda é essencial, pois, de repente, aquele número de celular da fonte que só o apurador tem pode ser a salvação quando é preciso verificar ou apurar uma informação importante minutos antes do telejornal. Em geral, o apurador não redige a notícia que vai ao ar, trabalho habitualmente executado pelos editores de texto. A informação apurada precisa ser direta e o mais clara possível. Como a informação apurada fica disponível a todos nos computadores da redação, não pode dar margens a interpretações dúbias. Além disso, a vibração e a rapidez no raciocínio são fundamentais para quem trabalha na central informativa, pois é preciso saber como apurar determinada informação, bem como saber de imediato a qual fonte recorrer. A notícia deve ser tratada como a mais importante, enfim, o apurador tem de acreditar que toda informação poderá ser “espelhada” no telejornal, virando no mínimo uma nota lida pelo apresentador.
A prestação de serviços Os veículos de comunicação, principalmente os eletrônicos, também são prestadores de serviço. O “serviço”, que ocupa parte importante da programação, inclui informações de trânsito, estradas, aeroportos, rodoviárias, pagamento de impostos, previdência social, mercado financeiro, licenciamento de veículos, oferta de empregos, previsão do tempo, agenda cultural etc. O uso do helicóptero aprimorou a prestação de serviços pelas emissoras de rádio e TV, principalmente quando o objetivo é informar os congestionamentos no trânsito da cidade ou das estradas. A arte visual é outro recurso que deve ser explorado, pois facilita a memorização das informações pelo telespectador. A reportagem de assunto referente à prestação de serviços não pode ser considerada de menor importância e deve ter a mesma qualidade, seriedade, exatidão e credibilidade de qualquer outra matéria. O serviço oferecido não pode ser nem igual, nem pior do que o das emissoras concorrentes: tem de ser melhor. É preciso mostrar sempre competência por meio da aprimoração constante. Uma boa parte dessas informações é obtida de órgãos de serviços públicos e privados, e é conveniente que a fonte de informação seja citada pelo repórter, esteja na nota lida pelo apresentador ou em caracteres na tela. Informações de trânsito ou estradas, por exemplo, são voláteis, daí a necessidade de que a fonte fique bem clara para o telespectador. Se a emissora se dispõe a prestar o serviço, o telespectador deve ter facilidade na obtenção das informações caso perca algum detalhe no telejornal. As informações podem ser colocadas no site da emissora ou estar disponíveis por meio de contato telefônico. E, diante de tudo o que vimos, vale ressaltar que é preciso atender com cortesia os telespectadores que ligam para a redação, pois o atendimento nota dez fica para sempre na mente dele.
Exercícios Propostos Para Refletir 1. Muitos ouvintes e telespectadores utilizam a imprensa para “por a boca no trombone”, protestando contra a inércia das autoridades e/ou empresas. Qual a sua opinião a esse respeito? Você acha que é papel da imprensa mediar esse tipo de conflito ou isso pode acabar resvalando no sensacionalismo? 2. Atualmente, a televisão oferece praticamente de tudo em termos de prestação de serviços ao seu público, em diferentes formatos de programas – jornalísticos ou entretenimento. De que forma seria possível inovar e conquistar audiência na atualidade, explorando esse viés do jornalismo? Que tipo de programa poderia ser criado para prestar serviços de uma forma inovadora? 3. Cumprindo seu papel social, algumas emissoras cultivam a prática de provocar mutirões de cidadania em bairros ou mesmo cidades, em que diversos serviços são oferecidos às comunidades – dos mais elementares, como corte de cabelo e aferição de pressão sanguínea, aos que normalmente seriam obrigação do Estado, como emissão de documentos e educação ambiental. O que você pensa sobre esse tipo de iniciativa? Tem efetividade ou serve apenas para mascarar a falta de ação dos governantes, que acabam sempre deixando para a iniciativa privada o dever que na verdade é das autoridades? 4. É próximo da hora do rush em São Paulo e você fica sabendo por uma emissora concorrente que acabou de acontecer um acidente aéreo nas proximidades do aeroporto, que causou um grande incêndio num prédio das imediações. Qual deve ser sua atitude diante dessa informação? 5. Um ouvinte liga e denuncia que um grande festival de rock, que aconteceria em outro estado, foi cancelado na véspera de seu início, sem qualquer explicação. Como você deve proceder para verificar se o fato é verdadeiro? 6. Sempre atento ao noticiário da internet, você lê no blog de um prestigiado jornalista que foi determinada pela Justiça a prisão do dono de uma das mais importantes redes de televisão do país. Considerando a gravidade da notícia e a confiabilidade da fonte de onde obteve a informação, o que você faz em seguida? Por quê?
Sugestões De Leitura 1. Hersey John. Hiroshima. Cia. das Letras: São Paulo; 2002. 2. Pereira Junior Luiz Costa. A apuração da notícia – métodos de investigação na imprensa. Vozes: São Paulo; 2006. 3. Medina Cremilda. Entrevista, o diálogo possível. Atica: São Paulo; 2008. 4. Noblat Ricardo. A arte de fazer um jornal diário. Contexto: São Paulo; 2008.
Dicas de filmes O rei da baixaria, EUA, 1997 – Dir. Ivan Reitman A trajetória de um radialista de sucesso, dos tempos de universidade aos primeiros empregos no ramo, até abandonar a censura de seus superiores e se tornar um grande sucesso assumindo uma postura louca e sem fronteiras. Baseado no best-seller autobiográfico do ator principal, que interpreta a si mesmo. O passageiro – profissão: repórter, Itália/EUA, 1975 – Dir. Michelangelo Antonioni David Locke, um jornalista televisivo, está no deserto africano preparando um documentário sobre as guerrilhas da região. Depois de ser abandonado pelo seu guia e ter seu veículo atolado na areia, ele entra em crise, vendo-se cansado do trabalho, do casamento e da vida. Ele consegue voltar ao hotel e procura pelo inglês estranho Robertson, um hóspede que lhe contara um pouco da vida dele, fascinando David ao se mostrar como um viajante despreocupado. Quando entra no quarto, David encontra Robertson morto. O homem possui uma grande semelhança física com David, que então tem uma ideia: resolve trocar de identidade com o morto e passa a seguir a agenda que encontrou com ele, indo aos vários locais ali anotados. Em defesa da verdade, Inglaterra, 1985 – Dir. David Drury Um repórter se vê em maus lençóis quando começa a investigar uma história que liga um importante membro do parlamento com um obscuro agente da KGB. Os fatos que ele apura acabam ligando um jovem com uma base norte-americana, tendo como pano de fundo um possível acidente nuclear. Assim, com a ajuda de mais duas pessoas, ele mergulha fundo em uma perigosa investigação para trazer todos os fatos à tona e evitar que o pior aconteça. O âncora – A lenda de Ron Burgundy, EUA, 2004 – Dir. Adam McKay Nos anos 1970, Ron Burgundy era considerado um dos melhores âncoras de telejornais de San Diego. Sua colega, a feminista Veronica, fica responsável pelas matérias de cozinha e de outros interesses femininos. Até que se cansa de ser mais um rostinho bonito e começa a querer mais espaço no noticiário. Ron sente-se ameaçado pela presença de Veronica e os dois travam uma guerra nos bastidores, tentando assumir a bancada do noticiário.
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O jornalismo e os direitos humanos “É mais fácil desintegrar um átomo do que o preconceito.” Albert Einstein
Após a leitura deste capítulo você será capaz de: • Explicar o que são os direitos humanos e a que eles se aplicam. • Mostrar que os direitos humanos estendem-se a todas as camadas da população. • Entender por que é imprescindível que o jornalista respeite os direitos humanos. O jornalismo existe para melhorar as condições de vida da humanidade e é comprometido com o bemestar, a segurança e a democracia. Por esse motivo, tem um compromisso íntimo com a defesa dos direitos humanos, e não é possível fazer jornalismo sem esse comprometimento. Ele paira acima das convicções partidárias e de outros interesses, e precisa saber como pode contribuir para a defesa da vida e da dignidade humanas. A liberdade de expressão e de imprensa é inadmissível sem o amplo respeito aos direitos humanos, os quais garantem a integridade do jornalista e de todas as pessoas que querem expor livremente suas ideias sem qualquer temor, opressão, ameaça ou atentados contra a vida. Ele tem o compromisso de manter a universalidade dos direitos humanos, independentemente da condição social, econômica ou mesmo criminal das pessoas. Os direitos humanos abominam a tortura, a confissão obtida pela força, a execução sumária por esquadrões da morte, organizações paramilitares e o desrespeito às leis. Eles são um dos limites do jornalismo e ajudam a materializar a liberdade fundamental de divulgar ideias e opiniões consolidadas na Declaração Universal dos Direitos Humanos, ainda que haja uma diferença incontornável entre a realidade e a representação feita pelo jornalista. Os jornalistas têm o compromisso ético de denunciar à opinião pública nacional e internacional qualquer violação dos direitos humanos. Episódios como o Massacre do Carandiru, no qual 111 detentos foram mortos pela polícia, são um exemplo de como a imprensa pode contribuir para casos de violação dos direitos humanos não caírem no esquecimento, ainda que acusem setores da imprensa de não relatarem a realidade, mas sim produzirem reportagens sobre a realidade. Os jornalistas precisam estar conscientes de que somente os poderes constituídos democrática e legalmente podem impor ordem à sociedade, e que o poder das autoridades é limitado pela lei e ninguém deve se submeter ao arbítrio. É também dever dos jornalistas denunciar casos de abuso, ou seja, os direitos humanos devem ser estendidos a todas as camadas da população, e não apenas às elites; em que pesem as violações afrontarem os princípios morais e éticos do jornalista, ele deve manter sob controle sua emoção no processo de produção da notícia. Os detratores dos direitos humanos tentam transformar em vilões os que cometem crimes, como se fossem atos voluntários, desprezando os fatores sociais. O crime é a cristalização da deterioração social, é o fato originado pelo esgarçamento do tecido social, e o jornalismo tem um peso decisivo na construção da realidade. Assim, desemprego, miserabilidade, concentração de renda e falta de programas de apoio às camadas pobres geram as condições sociais para a manifestação da violência que as elites jogam nas costas da população. Com o apoio de parte da imprensa, linchamentos e “justiciamentos” têm
ocorrido no Brasil. A reação de entidades de direitos humanos contra essas tentativas de fazer justiça com as próprias mãos, uma volta à barbárie, é classificada com o jargão de que só defendem bandidos, e isso cresce quando ocorrem crimes relacionados à violência sexual, quando as pessoas são submetidas à violência e humilhação. Muitas vezes eles são apresentados sem a relevância jornalística, mas com força para expor as vítimas à execração, e o jornalista não tem o direito de insistir se os entrevistados não quiserem falar ou ser mostrados na televisão. Os direitos humanos se estendem a todos sem distinção, mas é comum os programas sensacionalistas acusarem entidades de direitos humanos de “protegerem bandidos” ou não darem “assistência às famílias das vítimas”. Os jornalistas têm o dever ético de defender o fim da impunidade, e essa é uma contribuição cidadã e democrática à qual nenhum jornalista pode se furtar. O Estado não pode se confundir com os próprios criminosos sob o pretexto de combatê-los, e não há pior crime do que aquele organizado pelo Estado. Não é raro segmentos mais nacionalistas do país rotularem os movimentos de defesa dos direitos humanos como parte de uma conspiração internacional, que tem o intuito de limitar a soberania do país. Logo, entidades como Anistia Internacional, Human Rights Watch, Transparência Internacional e outras são acusadas de prejudicar a imagem do Brasil no exterior por divulgarem essas violações. O princípio fundamental dos direitos humanos está fundamentado no pressuposto moral de que todas as pessoas merecem igual respeito. A cobertura de acontecimentos que envolvem a violação dos direitos humanos pode gerar conflito de consciência com a pauta proposta ou até mesmo com a chefia. Nessas situações, o jornalista comprometido com os direitos humanos não pode abrir mão de suas convicções e precisa resistir e lutar para que o enfoque da matéria seja mudado. Não é possível negociar fora dos limites do comprometimento e, em alguns casos, o conflito pode terminar com a demissão do jornalista por “desobediência”, porém arriscar o emprego por aquilo em que se acredita é inerente à profissão.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Ao cobrir a iniciativa do governo carioca de invadir os morros no Rio de Janeiro para lá instalar as Unidades de Polícia Pacificadora e banir os grupos criminosos dominantes, você presencia alguns excessos. Policiais agem de forma truculenta e usam de força desproposital durante a invasão, sob a alegação de que “os fins justificam os meios”. Diante desse quadro, qual será o tom de sua reportagem? Por quê? 2. Você recebe uma denúncia dando conta de haver serviço escravo numa das fazendas do presidente do Senado, em sua cidade natal. A chefia de reportagem resolve designá-lo para verificar a veracidade dos fatos, que são confirmados. Indignado, você dá um tom contundente à sua matéria, mas, após a edição, verifica que foi dado um tratamento ao texto e sonoras que abrandou significativamente o resultado final. Como você reage a isso? 3. Enquanto criminosos notórios, que desviam milhões dos cofres públicos, respondem ao processo em liberdade, você descobre que existe um cidadão que aguarda julgamento na prisão há anos, acusado de roubar alimentos num supermercado. Tendo a oportunidade de denunciar essa desigualdade gritante, qual deve ser a sua atitude?
Sugestões De Leitura 1. Matos Carolina. Jornalismo e política democrática no Brasil. São Paulo: Publifolha; 2008. 2. Jung Milton. Jornalismo de rádio. São Paulo: Contexto; 2004.
Dicas de filmes A testemunha ocular, EUA, 1992 – Dir. Howard Franklin A história de um fotógrafo que descobre um assassinato cometido por um gângster e chega na cena do crime antes da polícia, e por isso é acusado do crime. O filme foi baseado na vida do fotógrafo Weegee, que trabalhava no New York Daily News, um tabloide da década de 40. Em defesa da verdade, Inglaterra, 1985 – Dir. David Drury Um repórter se vê em maus lençóis quando começa a investigar uma história que liga um importante membro do parlamento com um obscuro agente da KGB. Os fatos que ele apura acabam ligando um jovem com uma base norte-americana, tendo como pano de fundo um possível acidente nuclear. Assim, com a ajuda de mais duas pessoas, ele mergulha fundo em uma perigosa investigação para trazer todos os fatos à tona e evitar que o pior aconteça.
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O jornalismo e a sustentabilidade “A sabedoria consiste em não se acreditar em tudo sem reflexão.” Albert Einstein
Ao final deste capítulo você será capaz de: • Compreender o que faz uma empresa socialmente responsável. • Diferenciar ações sociais de estratégias de marketing e, desta forma, produzir reportagens sobre ações de sustentabilidade. • Reconhecer a importância desse tipo de iniciativa na sociedade atual. O jornalismo contemporâneo abre espaço para noticiar as ações do Terceiro Setor, campo no qual atuam as empresas que desenvolvem a responsabilidade socioambiental. Ela é definida pela relação que a empresa estabelece com todos os seus públicos no curto e no longo prazos. A ação social das empresas é uma característica da nova economia, ou hipercapitalismo − ou seja, uma mudança qualitativa sofrida pelo sistema capitalista no final do século XX − e se desenvolve no século seguinte. A iniciativa privada não suprime a responsabilidade do Estado, mas assume uma participação ativa no desenvolvimento social, garantindo mudanças necessárias para a própria sobrevivência. Uma parte dos resultados obtidos pelos grandes complexos industriais, comerciais, financeiros, em sua maior parte composto de empresas transnacionais, é aplicada em ações sociais. A origem dessas ações ocorreu nos Estados Unidos, centro do sistema, e depois se espalhou pela periferia econômica, em grande parcela levadas pelas filiais dessas organizações transnacionais, e contaminou as grandes empresas locais. A ação social também é uma manifestação ideológica da nova economia, ou do globalismo. Com abundância de recursos, muitas vezes trazidos do exterior, e poder de pressão política, a atividade do Terceiro Setor começou a se desenvolver no Brasil na década de 1990. Nessa época, as organizações passaram a difundir a ideia de que não é possível deixar tudo sob a responsabilidade do governo. Para elas, é preciso assumir uma parcela da responsabilidade pela melhoria do bem-estar social da população, seja por meio de ações da própria empresa, seja subsidiando organizações não governamentais comprometidas com o desenvolvimento de trabalhos sociais definidos. Algumas empresas transferiram a ação para grupos organizados da sociedade, que apresentaram projetos e se reservaram a condição de fiscalizadores dos recursos aplicados. O trabalho nas organizações não governamentais, em sua maioria, é voluntário. A Organização das Nações Unidas lançou uma ampla campanha mundial pelo trabalho voluntário, e as empresas estimularam os funcionários a participar de algumas ações, oferecendo facilidades, como horas de trabalho dispensadas ou desenvolvimento da ação dentro da própria empresa. Enfim, é um movimento que tem como base a ação da iniciativa privada, e não se confunde com filantropia, nem com socialização da riqueza. As ações do Terceiro Setor se esparramam pela recuperação de crianças e jovens, desenvolvimento educacional e profissionalizante, alfabetização de adultos, recolhimento de alimentos, roupas e outras doações destinadas às populações carentes, aprimoramento de mão de obra, defesa ambiental e outras tantas iniciativas sociais. A responsabilidade social das empresas abrange também a adoção de códigos de ética, compromissos
públicos assumidos, gestão e prevenção de riscos, mecanismos anticorrupção, diversidade, apoio às mulheres e aos não brancos. O Instituto Ethos é a organização que sistematizou os conceitos básicos e os indicadores de responsabilidade social empresarial. É preciso separar o que é ação de marketing de ação social. Algumas empresas gastam cinco para realizar a ação e 50 na divulgação publicitária. As ações de marketing não podem ser confundidas com ações sociais, e o jornalista deve estar preparado para diferenciar uma coisa da outra. O marketing é a arte de conquistar, inebriar e manter o cliente fiel. Trata-se de uma estratégia de gerenciamento de empresa com o objetivo de alcançar, em última análise, resultados financeiros. A ação social também consolida resultados, fortalece marcas e as faz mais admiradas por seus consumidores, mas tudo isso é resultado da ação reconhecida em âmbito social, e não única e simplesmente uma estratégia para conseguir ou manter o mercado. As regras jornalísticas para a cobertura do Terceiro Setor são as mesmas de qualquer outro ato social. O jornalista precisa saber que cumprir a lei não torna uma organização socialmente responsável. Portanto, a empresa não faz mais do que sua obrigação ao pagar os funcionários em dia, obedecer à legislação trabalhista e ter uma contabilidade transparente, sem caixa dois. Pagar os impostos é uma obrigação, e não um mérito da empresa; é um ato de cidadania, e não de submissão coercitiva ao Estado. Segundo o Instituto Ethos, as principais características de uma empresa socialmente responsável são: transparência, estabelecimento de compromissos públicos, envolvimento com instituições que representam interesses variados, capacidade de atrair e manter talentos, alto grau de motivação e comprometimento dos colaboradores, capacidade para lidar com situações de conflito e estabelecimento de metas de curto e longo prazo. A tomada de decisões nas empresas deve levar em conta princípios que demonstrem a cultura de organização e orientem o cumprimento de sua missão. Transparência e ética devem estar presentes não só nas ações sociais, mas também no relacionamento com clientes, fornecedores e funcionários. O jornalista deve lembrar que uma empresa socialmente responsável tem um código de ética, e seus princípios valem para todos, do presidente ao funcionário mais humilde. Ela leva seus valores ao conhecimento de parceiros e atualiza seus princípios com satisfação. Essas ações podem ser transformadas em pautas, desde que devidamente fundamentadas e fiscalizadas. Empresas éticas atendem o consumidor, esforçam-se para gerar produtos e serviços de boa qualidade, e são ambientalmente responsáveis, tanto que as queixas nos órgãos de defesa do consumidor são raras. São abertas as críticas e não fogem dos compromissos, além de responderem por aquilo que prometem, por isso atendem a imprensa com transparência mesmo quando a notícia não lhes é favorável. Elas buscam a liderança nos mercados nos quais atuam, mas isso não quer dizer construir monopólios e oligopólios para impor os preços, a quantidade e a qualidade do que produzem. As empresas socialmente responsáveis publicam balanço social, e é necessário verificar o volume de recursos destinados à área social. Impostos pagos, salários, contribuições sociais, benefícios, participação nos resulta-dos, distribuição de dividendos e variação do patrimônio líquido são outros índices que devem ser verificados. Algumas empresas até hoje impedem a entrada de sindicalistas em suas instalações. As relações ainda são tensas, muitas vezes por intransigência dos dois lados, entretanto, a empresa socialmente responsável tem diálogo contínuo com a liderança sindical, com ou sem divergências. Gestão participativa e participação nos resultados são outras características dessa nova ordem. É preciso verificar, para as reportagens do Terceiro Setor, se há práticas de discriminação, inclusive no processo de seleção, programas de aprendizes para jovens, programas de benefícios e recolocação no mercado para empregados demitidos, orientações quanto ao procedimento necessário à obtenção de
aposentadoria e programa de previdência complementar. Outras características são comprometimento com a causa ambiental, criação de cultura de responsabilidade social nas relações com consumidores/clientes, excelência no atendimento, gerenciamento do impacto da empresa na comunidade, mecanismos de apoio e estratégias de atuação na área social, mobilização de recursos para investimento social e apoio ao trabalho voluntário dos empregados. Essas características devem ser contestadas e comprovadas, uma vez que algumas empresas tentam aproveitar o espaço dedicado pela mídia ao Terceiro Setor para apresentar ao público ações de marketing como sendo ações de responsabilidade social. Assim, nas reportagens sobre o Terceiro Setor é preciso ter cautela e exercitar o sagrado direito da dúvida.
Exercícios propostos Para Refletir 1. Uma grande multinacional do ramo de cosméticos envia um release às redações divulgando o lançamento de um novo e revolucionário produto, anunciado como absolutamente natural e produzido com matéria-prima obtida na selva amazônica de forma sustentável, ou seja, mediante extração criteriosa, sem que qualquer dano às populações locais ou ao meio ambiente tenha ocorrido. Como produzir uma reportagem sobre o assunto de forma a apurar se o alegado pela empresa é verdadeiro? 2. Um dos maiores bancos atuantes no país mantém uma fundação que patrocina a educação formal e a atividade física para crianças carentes, e também participa de diversos empreendimentos e campanhas sociais promovidas periodicamente pela grande mídia, o que lhe confere grande visibilidade. No entanto, não raro a mesma empresa é envolvida em escândalos políticos e imbróglios perante a Justiça Trabalhista, em processos movidos por ex-funcionários. De que forma pode ser encarada esta empresa sob o ponto de vista da responsabilidade social tomandose por base os princípios estabelecidos pelo Instituto Ethos?
Sugestões De Leituras 1. Trigueiro André. Mundo sustentável. Rio de Janeiro: Globo Livros; 2012. 2. Savitz Andrew W, Weber Karl. A empresa sustentável: o verdadeiro sucesso é lucro com responsabilidade social e ambiental. São Paulo: Campus/Elsevier; 2006.
Dicas de filmes Uma verdade inconveniente, EUA, 2006 – Dir. Davis Guggenheim Documentário sobre o aquecimento global, que utiliza exemplos simples, mas concretos, apresentados pelo ex-vice-presidente norteamericano Al Gore a um auditório, abordando causas e consequências de décadas de agressão à natureza e utilizando como base relatórios e levantamentos produzidos por cientistas e especialistas renomados no assunto. A história das coisas, EUA, 2007 – Dir. Annie Leonard Documentário de 20 minutos produzido por uma ativista norte-americana que trata com profundidade da questão do consumismo desenfreado – abordado praticamente como um dever inquestionável para os indivíduos da sociedade atual – e abre o diálogo sobre as consequências da produção descontrolada de lixo e o alto custo do consumismo para a humanidade.
ReferĂŞncias
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19. Medo e delírio, EUA, 1998 – Dir. Terry Gilliam. 20. O âncora - A lenda de Ron Burgundy, EUA, 2004 – Dir. Adam McKay. 21. O informante, Eua, 1999 – Dir. Michael Mann. 22. O jornal, EUA, 1994 – Dir. Ron Howard. 23. O passageiro, profissão repórter, Itália/França/EUA/Espanha, 1975 – Dir. Michelangelo Antonioni. 24. O poder da imagem, EUA, 1990 – Dir. Peter Werner. 25. O poder da mídia, EUA, 2004 – Dir. Brian Goeres. 26. O preço de uma verdade, EUA, 2003 – Dir. Billy Ray. 27. O quarto poder, EUA, 1997 – Dir. Costa-Gavras. 28. O rei da baixaria, EUA, 1997 – Dir. Ivan Reitman. 29. Os gritos do silêncio, EUA/Reino Unido, 1984 – Dir. Roland Joff é. 30. Piratas da Informática, EUA, 1999 – Dir. Martyn Burke. 31. Powers of Ten, EUA, 1977 – Dir. Charles e Ray Earnes. 32. Quase famosos, EUA, 2000 – Dir. Cameron Crowe. 33. Rede de intrigas, EUA, 1976 – Dir. Sidney Lumet. 34. Salvador, o martírio de um povo, EUA, 1980 – Dir. Oliver Stone. 35. Sob fogo cerrado, EUA, 1983 – Dir. Roger Spottiswoode. 36. Todos os homens do presidente, EUA, 1976 – Dir. Alan J. Pakula. 37. Última hora, EUA, 2007 – Dir. Nadia Conners e Leila Conners Petersen. 38. Um sonho sem limites, EUA, 1994 – Dir. Gus Van Sant. 39. Uma verdade inconveniente, EUA, 2006 – Dir. Davis Guggenheim. 40. Veronica Guerin – O preço da verdade, EUA/Irlanda/Inglaterra, 2003 – Dir. Joel Schumacher.