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Agradeço aos amigos pelo convívio durante os anos de graduação, especialmente aqueles com quem aprendi lições que foram muito além da arquitetura e do urbanismo. Aos professores – também amigos – que espero ter sempre por perto. Em especial à Klara, pela firmeza e paciência nas orientações sensíveis desde o princípio. Ao Alexandre, pelo zelo e atenção descomunal que presta a todos. E à Cristiane Muniz, pelas importantes aulas que me dá mesmo fora da FAU.
À minha pequena grande família, pelo apoio de sempre e por todo o resto: minha mãe Alice, meu pai Eduardo e meu irmão que também é Eduardo.
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SUMÁRIO
1 A N T A G O N I S M O S
M E T R O P O L I T A N O S
P Á G I N A
0 8
2 L E I T U R A
M E T R O P O L I T A N A
P Á G I N A
2 8
3 I N V E N T Á R I O
R E F E R E N C I A L
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4 E N S A I O P Á G I N A
1 5 2
N O T A S P Á G I N A
2 2 2
B I B L I O G R A F I A P Á G I N A
2 3 0
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P R E Â M B U L O
A revisão integral do sistema metropolitano de transportes, trata de uma das operações essenciais à possibilidade de assegurar a liberdade e dar suporte à imprevisibilidade da vida. Ampara-se no desejo de transformar as condições cotidianas estanques da população, o que requer construir uma cidade que se afasta cada vez mais daquela em que vivemos. O ensaio a seguir, tem como objetivo contribuir com o lançamento de uma hipótese de reorganização estrutural de São Paulo, apresentando um breve recorte propositivo sobre a ampliação de sua rede metroviária.
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1
ANTAGONISMOS METROPOLITANOS
1 A N T A G O N I S M O S M E T R O P O L I T A N O S
[OU
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PONTOS
DOS
QUAIS
FUGIR
]
O processo de formação do espaço urbano de São Paulo foi violento. Entre 1940 e 2012, sua população cresceu quase 13 vezes. A Região Metropolitana de São Paulo conta com uma população de mais de 20 milhões de habitantes em uma área de 8 mil quilômetros quadrados. O gigantismo que a escala de seu espaço urbano tomou, se viabilizou a partir do momento no qual os meios técnicos do alastramento e da congestão nortearam seu crescimento, tornando-se rentáveis aos agentes que participaram de sua produção. A somatória do crescimento permanente, apressado e desqualificado das periferias e da concentração econômica e política em um centro expandido saturado, perpetuou uma conjuntura urbana profundamente fragmentada, heterogênea e socialmente injusta. Materializam-se em São Paulo, uma cidade e uma [sub]cidade1. Esta última configura um território que paradoxalmente permanece às margens da própria vida urbana, e que nitidamente, revela a plena incapacidade paulistana de criar, expandir, regular ou equalizar seu espaço produtivo.
Uma cidade é – não só – uma ferramenta de trabalho. São Paulo não cumpre esta função. Sua ineficiência corrói o corpo e frustra a mente2.
A precariedade do sistema metropolitano de transporte de São Paulo é fator fundamental ao reforço do desarranjo espacial vigente que em última instância, nega a própria razão de ser de uma cidade, ao passo que sabota gradualmente uma das condições essenciais à produção e reprodução social, que é, vale dizer, desimpedir e catalisar o acesso e o fluxo de pessoas, mercadorias, conhecimento e informação através de seu espaço. Diante disso, mesmo que não seja isoladamente suficiente para tornar uma cidade ao mesmo tempo eficiente e agradável, um bom sistema de transportes é sem dúvidas, uma condição essencial para tanto. O nível da provisão de infraestruturas depende do estágio de desenvolvimento econômico vigente. A superação do estágio extensivo da acumulação capitalista3 está relacionada ao desenvolvimento das aglomerações urbanas que depende, mesmo que não exclusivamente, da revisão, melhoria e expansão de suas infraestruturas de transporte. É urgente para São Paulo a implantação de uma rede de transporte hierarquizada, eficiente e com abrangência compatível à sua escala. Estruturada por uma rede de alta capacidade, encontra no metrô sua espinha dorsal. Infelizmente, desde a fundação da Companhia do Metropolitano de São Paulo, em 1968, a expansão da rede vem se dando a passos de formiga, crescendo em média 1,65 quilômetros por ano. Este TFG se baseia na premissa de que, sob o iminente risco de colapso, é premente a reversão deste quadro.
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1.
A propensão à mercadorização4 da maior porção possível daquilo que a sociedade produz, é basicamente, a força motriz do capitalismo. Em outras palavras, o que move o capitalismo é a produção de valores de uso enquanto valores de troca, ou seja, como mercadorias. A produção não se volta mais à subsistência, mas ao consumo de um terceiro. A mercadorização, no entanto, sempre esbarra em uma parcela da produção que deve ser imune ao seu processo, tendo de ser assumida pelo Estado. Uma das definições possíveis de infraestrutura é precisamente o coletivo de valores de uso assumidos, produzidos e conduzidos diretamente pelo Estado, tendo em vista que pressupõem planejamento e regulação mais abrangente. Transporte público faz parte do coletivo de infraestruturas necessárias para o desempenho das funções da [re]produção social. Portanto, a mercadorização não é absoluta e deve possuir limites bem delineados no que se refere à produção do espaço urbano. No entanto, não é novidade que tais limites foram progressivamente diluídos em São Paulo, na medida em que condições gerais de produção vêm sendo cedidas ao mercado, que sabidamente, não dá conta. Provavelmente, o exemplo recente mais emblemático seja a Linha 4-Amarela do Metrô, cuja construção e operação se deram por meio de regime público-privado através de diferentes concessões5. A alienação e o desencontro proveniente do tratamento de linhas como empreendimentos isolados que se embasam na participação da iniciativa privada geram profundos danos para o Metrô de São Paulo, nos âmbitos e escalas mais diversas.
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A brisa condicionada e a tecnologia driverless dos trens futurísticos da Linha 4 podem nos fazer esquecer que o material circulante importado fabricado pela sul-coreana Rotem, é autônomo e obedece ao edital do consórcio, não prevendo a compatibilidade de seus componentes com as especificações técnicas das linhas existentes. A bitola – que é a distância entre as faces interiores das cabeças de dois trilhos – na qual se baseiam os componentes da Linha 4, é a bitola de 1,435 metro (internacional), ao invés da bitola de 1,6 metro (larga ou irlandesa) presente nas Linhas 1, 2 e 3 do Metrô de São Paulo. O que pode surgir equivocadamente como um irrelevante detalhe tecnicista, nos deixa com uma frota de veículos incompatíveis com a totalidade da rede, que sabota qualquer política ou manejo estratégico e sistêmico que uma rede de metrô saudável deve possuir. A irresponsável diversificação tecnológica, que desarranja os mais diversos componentes de uma mesma rede de uma mesma cidade, para se submeter a uma ordem internacional, reflete em última instância a inexistência de uma politica nacional de fomento no setor.
Um exemplo mais literal pode ser relembrado e destacado. Na manhã do dia 12 de janeiro de 2007, no canteiro de obras da Estação Pinheiros da Linha 4 do Metrô, um deslizamento de terra abriu uma cratera. Com diâmetro de 80 metros e profundidade de mais de 30 metros, o buraco engoliu dois carros, uma van, quatro caminhões e setenta e nove famílias foram forçadas a abandonar suas casas deixando duzentas e trinta pessoas desabrigadas. Sete pessoas morreram soterradas. Para além do óbvio apelo trágico das consequências do deslizamento de terra, suas causas merecem especial atenção. Em 6 de junho de 2008, quase dezessete meses depois do desastre, o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) concluiu e entregou aos responsáveis pela
investigação - Ministério Público, Polícia Civil, Metrô e Consórcio Via Amarela - um laudo6 de 29 volumes acerca da sucessão de falhas que resultaram no colapso do canteiro de obras. O laudo é claro e enfático ao concluir que as principais causas que culminaram na abertura da cratera provêm da negligência com que o Consórcio Via Amarela - formado pela Construtora Norberto Odebrecht, Construtora OAS, Grupo Queiroz Galvão, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Alstom - geriu e conduziu a obra. Consta ainda no laudo que apesar do prévio conhecimento da geologia local – o perfil de terreno encontrado pelos peritos durante a remoção dos escombros é o mesmo que havia sido mapeado já em 1997 pelo próprio IPT para a elaboração do projeto básico de construção da Linha 4 – o projeto executado pelo consórcio se balizou em um modelo geomecânico equivocado fazendo com que a estrutura fosse projetada e dimensionada com suporte de baixa capacidade. Se não bastasse partir de uma estrutura subdimensionada, o ritmo da escavação executada pelo consórcio foi maior do que aquele previsto em projeto, expondo ainda mais as frágeis estruturas às condições geológicas desfavoráveis da região. Em janeiro de 2007, de acordo com o IPT, as escavações avançaram 70% a mais do que o registrado no mês anterior. Para que este ritmo demasiadamente acelerado das obras fosse viável, foi necessário queimar processos e etapas imprescindíveis na gestão e execução da obra. Foram encontrados pelos peritos durante as investigações, placas de concreto com dimensões menores àquelas previstas no projeto (vale dizer, subdimensionado por si), concreto com quantidade de fibras de aço inferior ao recomendado além da falta de ensaios no cimento. A pressa e a inconsequência norteavam e esboçavam um canteiro de obras que viria a colapsar. Em relação à operação, que é conduzida pela concessionária ViaQuatro, o que se evidencia é o caráter desarticulador da Linha 4.
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Desarticulam-se a operação, a administração e a gestão. Exemplo claro foi o comportamento da Linha 4 no contexto da greve geral dos metroviários de São Paulo no dia 23 de maio de 2012. A paralisação, cuja legitimidade como meio de reinvindicação não é o ponto a ser aqui abordado, não contou com a adesão da Linha 4, que se descola da Companhia do Metropolitano de São Paulo, flutuando como uma verdadeira entidade autônoma. Descolamento que também fica expresso na escolha por diferenciar a própria identidade visual da Linha 4 em relação às demais linhas7. Novamente, o que pode parecer um detalhe, se configura como uma desarticulação da legibilidade e identidade do metrô como rede. O estrago causado - não por acaso - por esta que foi a primeira concessão público-privada na história do Metrô de São Paulo passa lamentavelmente despercebido em meio aos benefícios míopes que nos são enfiados goela abaixo. Fato é que a Linha 6-Laranja, a próxima a ser implantada, já se encaminhou um modelo similar. Está se delineando uma rede desarticulada do ponto de vista operacional e administrativo. Este processo evidencia um Estado que vem se abstendo da regulação de um dos instrumentos de suma importância para a produção do espaço urbano de São Paulo. Concretamente, a desastrosa experiência de tratar isoladamente uma linha do Metrô de São Paulo enraizada na participação privada demonstra que a provisão de infraestrutura de transportes possui peculiaridades que não se paralelizam com o mercado e a competição.
A competitividade inserida no setor de infraestrutura possui potencial de destruição.
2.
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A lógica que rege o binômio formado entre o quanto e onde se aplicam os investimentos públicos pelo território da Região Metropolitana de São Paulo, provoca um modelo de urbanização que perpetua a segregação de seu espaço e de suas atividades urbanas. Mantêm-se cronicamente níveis reduzidos de investimentos, fazendo com que estes se deem com maior intensidade em uma porção muito reduzida do espaço urbano, sendo no caso de São Paulo, em seu centro expandido. O pouco que se investe se concentra primordialmente nas regiões que já de partida eram as mais estruturadas. Em contraponto, nas periferias se reafirmam desigualdades e reproduz-se à exaustão o precário e o escasso. É preciso estar atento ao fato de que o desequilíbrio dos investimentos, e a consequente diferenciação na implantação de infraestruturas nas diversas regiões da metrópole, não são a causa dos altos níveis de segregação das atividades urbanas, mas sim, sua consequência8. Vejamos um exemplo. Ao contrário daquilo que surge à primeira vista, a [mono]funcionalidade do uso do solo das diversas áreas da cidade que estão condicionadas a servir unicamente como dormitório da população de baixa renda, não pode ser vista de forma alguma, como a origem da escassez e da precarização da sua respectiva implantação de infraestruturas, sendo que é justamente a partir ausência integral ou parcial de por exemplo, sistema de esgoto, água, eletricidade, coleta de lixo, vias, transportes e equipamentos públicos, que se originam tais territórios incapazes de servir como suporte a qualquer uso que vá além do residencial precário e frequentemente irregular.
Por outro lado, um processo cíclico assegura às mesmas áreas do centro expandido, as locações que contam com melhor infraestrutura. Essa parcela do espaço urbano de São Paulo, por possuir o uso do solo mais intenso e por ter – não por acaso – os índices mais elevados de congestão, recebe paulatinamente os novos investimentos, se torna consequentemente ainda mais valorizada, assiste a uma nova intensificação de usos e valorização imobiliária. Em seguida, invariavelmente estoura-se o limite da capacidade de suas infraestruturas instaladas, volta-se à condição inicial de congestão elevada e ao fim o processo essencialmente viciado se reinicia. Chega-se assim à constatação de que o elevado nível de segregação das atividades produtivas e do próprio espaço urbano de São Paulo advém da escassez de áreas dotadas dos meios técnicos apropriados para a prática das diversas funções urbanas. Os altos diferenciais dos preços da terra reforçam esse desequilíbrio, tornando a escassez de áreas tecnicamente adequadas ainda mais aguda. Nada resta àqueles providos de menor poder econômico além do progressivo distanciamento de qualquer território valorizado e minimamente estruturado. Morfologicamente, isso é nitidamente manifestado no crescimento alastrado da mancha urbana: no extremo sul, a ocupação já transgrediu e se sobrepôs aos mananciais; ao norte já alcançou os contrafortes da Serra da Cantareira; a ausência de obstáculos físicos faz com que o já extremo leste se distancie e prive cada vez mais sua população da própria vida urbana.
Fica claro o reforço à conformação de uma cidade e uma [sub]cidade. O extremo leste chama a atenção por ter contado com ampla contribuição do poder público na produção de seu espaço, primordialmente na provisão de habitação.
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Rua Cristiano Lobe, na Cidade Tiradentes, onde comércio e serviços ocupam áreas concebidas como garagens.
Extração dos elementos informais.
É emblemático pelo porte e história, o maior aglomerado de conjuntos habitacionais do Brasil, em Cidade Tiradentes, cuja população supera 596 dos 645 municípios do Estado de São Paulo9. Chama muita atenção na região, a presença constante de milhares de puxadinhos, que geridos e locados pelos próprios moradores, abrigam desde estúdios de tatuagem até igrejas evangélicas. Fruto da mais pura transgressão e informalidade, os inúmeros serviços instalados nas áreas originalmente concebidas como garagens, são constatações espontâneas e empíricas de que a habitação resultante de uma política exclusivamente setorial, que flutua em meio ao nada, não se sustenta. Fica evidente que não basta chamar um determinado território de cidade para que de fato se cumpra este papel. Com relação aos transportes públicos, o arranjo espacial desequilibrado fica claro na constante busca viciada pela padronização de valores de deslocamentos diários que sirvam como parâmetro para justificar a implantação de um ou outro modo de transporte. No caso do metrô por exemplo, ao condicionar exclusivamente sua implantação às áreas nas quais ocorre uma elevada quantidade de deslocamentos, sua implantação fica limitada às porções do território que de partida são dotadas de infraestrutura abundante, e que justamente por isso dão suporte ao elevado número de viagens exigido. Novamente, no caso de São Paulo, isso ocorre essencialmente em seu centro expandido. As desigualdades são assim perpetuadas. Sabota-se assim, a possibilidade de uma infraestrutura de transporte servir como indutor ou como o próprio suporte ao desenvolvimento das porções do território que mais carecem de intervenções que melhorem a condição de vida de sua população e estruturem adequadamente seu tecido urbano. Para além da sistemática sobreposição entre os fluxos existentes e o traçado de novas infraestruturas de transportes, tais instrumentos e valores devem ser utilizados para identificar setores e vetores do
espaço urbano que em função de uma precariedade de infraestruturas, se mostram incapazes de dar suporte e servir plenamente sua população. Em suma, os altos níveis de segregação das atividades urbanas na Região Metropolitana são em última instância, nítidos reflexos não só dos baixos níveis de investimentos, mas também do direcionamento destes pelo território. Os investimentos em São Paulo norteiam-se pela priorização repetida das mesmas áreas pré-priorizadas.
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Diferentes demandas são atendidas por diferentes modos de transporte. O processo de planejamento de um bom sistema metropolitano de transporte passa pelo atendimento compatível às diversas escalas de demanda através do uso adequado dos diversos modos disponíveis, que vão desde a bicicleta até o metrô. Avaliar, selecionar e conjugar os diversos modos é fundamental, não só no que diz respeito aos custos de investimento e desempenho, mas também pelo impacto que o sistema de transporte terá sobre o futuro e o caráter das diferentes escalas do espaço urbano e na qualidade de vida de sua população. O desequilíbrio modal em São Paulo é claro. O metrô, gravemente subdimensionado, possui uma abrangência muito reduzida, e o alcance dos trens urbanos se limita aos mesmos vetores das antigas estradas de ferro do século XIX. Somados, metrô e trens absorvem respectivamente 8,8% e 3,2% das viagens moto-
rizadas. O restante é absorvido essencialmente pelos carros e motos que representam 44,2% e dos ônibus que assumem 35,9% do total de viagens motorizadas10. Diante disso, cabe ao vulnerável sistema viário a incumbência de estruturar a [i]mobilidade urbana de São Paulo. Isso reflete uma estratégia essencialmente equivocada, que solapa repetidamente qualquer expansão relevante do metrô, ao passo que se insiste em concentrar os investimentos em propostas de otimização ou aprimoramento dos sistemas de superfície, passando a míope impressão de que o problema está sendo resolvido. As infraestruturas de transporte atualmente implantadas, especialmente aquelas relacionadas aos carregamentos de alta capacidade, são frequentemente incompatíveis com o padrão de atendimento adequado às demandas existentes – para não citar as futuras ou desejadas – provocando a saturação imediata de infraestruturas inauguradas já obsoletas. Ano após ano, gestão após gestão, a insistência em soluções paliativas se repete. Exemplo recente mais emblemático são as obras de ampliação da Marginal Tietê, que consistem essencialmente na construção – em sobreposição ao antigo canteiro central – de três novas faixas de rolamento em ambos os sentidos, somadas à criação de quatro novas pontes e três novos acessos. O custo total da ampliação ultrapassa 2 bilhões de reais11. Paira-se sobre a ilusão de que a mobilidade urbana de São Paulo pode ser solucionada pela simples ampliação e adaptação do sistema viário com o intuito de melhorar as condições do transporte individual. Empiricamente, como explicado a seguir, a ampliação da Marginal Tietê comprovou que esse tipo de resposta, se configura como o início de um ciclo que volta e meia retorna ao problema que procurava solucionar. Em um espaço saturado e extremamente congestionado, como é o
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caso da Região Metropolitana, uma melhoria direcionada ao transporte individual proporciona, em um primeiro momento, uma redução no tempo de viagem. Consequentemente, no segundo momento, a melhora cria uma sensação de que o problema está resolvido, atraindo viajantes que anteriormente utilizariam outros caminhos ou até mesmo outros meios de transporte. Finalmente, em um terceiro momento, as vias gradualmente tornam a se saturar, esgotam seu carregamento e voltam ao estágio inicial de congestionamento, e em última instância, os investimentos são perdidos. O atual caos dos transportes reverbera em grande parte uma opção histórica pelo rodoviarismo, que ainda é reforçado em obras de grandes proporções, como a ampliação da Marginal Tietê, que não contribui de maneira relevante para a melhoria da mobilidade urbana da metrópole. Por mais absurdo que seja, a Rodovia Expressa nas margens do Rio Tietê projetada por Robert Moses em 195012, não só ecoa como é intensamente amplificada em pleno século XXI. A receita do colapso, enraizada na perspectiva de sustentar a mobilidade urbana estruturada basicamente no sistema viário e no rodoviarismo, é atualmente reforçada em âmbito federal quando a economia nacional se baseia fortemente na isenção do IPI cobrado sobre automóveis e na [in]consequente explosão de vendas de veículos populares. Através do tempo, foi consolidada uma noção complacente em relação à abstenção e alienação da Prefeitura de São Paulo em relação ao Metrô. Hoje é visto como inevitável ou até mesmo desejável a condição de que a responsabilidade do Metrô é exclusiva ao Governo do Estado de São Paulo. Tanto é assim que a parcela de participação da Prefeitura nos investimentos da Companhia do Metropolitano de São Paulo foi sendo cortada exponencialmente durante as últimas décadas, sendo que atualmente não ultrapassa os 8%13. Ao abdicar integralmente do planejamento e provisão do Metrô,
esse item fundamental de infraestrutura se mantem em última instância, fora do alcance político-administrativo da população. O papel que a Prefeitura assume, paulatinamente reforça uma estratégia composta de medidas novamente paliativas cuja obrigação de efeito imediato e explícito reduz o horizonte ao mínimo possível, buscando apenas disfarçar o desastre antes que o mandato de cada Prefeito chegue ao fim. Isso faz com que os vultosos investimentos tenham uma vida útil muito curta, de apenas dois ou três anos, já que se abstém de investimentos em transporte rápido de massa. Cada vez mais, as intervenções no setor de transportes são reduzidas ao seu desempenho puramente operacional, ficando restritas à solução de demandas setoriais, não propiciando respostas compatíveis às disfunções urbanas existentes. Levando em conta a reverberação que exercem no espaço urbano e a consequente herança social, funcional e física, a pretensão destas intervenções deve possuir uma abrangência muito maior.
É premente a reversão do atual desequilíbrio e precariedade do sistema metropolitano de transportes a partir do desenvolvimento de uma rede ampla e hierarquizada de transporte público coletivo, que constitua condições de inclusão social em São Paulo. Isso deve ser [macro]estruturado pelo investimento na construção de um sistema de trânsito rápido de alta capacidade, ou em bom português, de uma rede de metrô adequada.
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LEITURA METROPOLITANA
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De certa forma, o que motivou a formulação deste trabalho foi a possibilidade de dar início a um desmanche gradual da ilegibilidade espacial que se impôs cotidianamente através dos anos vivendo em São Paulo. Na leitura breve e primária apresentada, o enfoque dado tentou subsidiar a articulação de alguns aspectos relacionados mais especificamente ao ensaio proposto, ou seja, à ampliação da rede metroviária. A sugestão de sobreposição física de mapas e de reordenamento entre as páginas deste estudo têm o intuito de permitir uma leitura cruzada a partir da costura livre entre os dados apresentados.
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TERRITÓRIO
O primeiro conjunto de mapas apresentado é referente à base técnica metropolitana consolidada, ou seja, o suporte físico-espacial existente. Mesmo que a construção desta base técnica que estruturou o território de São Paulo não tenha sido fruto de um processo contínuo e unificado, foi produto de operações que revelam em última instância, a existência de uma lógica³ que pautou a formação do suporte físico necessário para que o massivo espaço metropolitano atual tenha sido alcançado em um período de tempo bastante curto. Não é possível então, apontar o caos e a aleatoriedade como os únicos agentes condutores da urbanização. No entanto, o ritmo explosivo que foi imposto ao crescimento metropolitano, reduziu esta lógica a operações regidas fundamentalmente pela aplicação do mínimo esforço possível, limitadas a prover soluções setoriais e pontuais aos enunciados técnicos propostos de imediato. A essencial formação simultânea de cidade que deve acompanhar e conduzir a construção deste suporte não foi considerada, o que perpetuou um território talhado por um conjunto de barreiras e desarticulações fundamentais à atual urbanidade entravada da metrópole.
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Esta constatação fica evidente ao identificar que as principais várzeas da Bacia do Alto Tietê contidas no maciço urbanizado de São Paulo, que serviram como o suporte primário ao adensamento dos sistemas técnicos fundamentais ao desenvolvimento das estruturas de produção e expansão da metrópole, se configuram hoje como grandes cesuras urbanas. As ferrovias e as [rodo]vias expressas implantadas paralelamente aos rios, serviram como estruturadores na escala metropolitana e desestruturadores na escala local, ao passo que em função da plena eficiência do sistema, foram concebidas de modo a apresentar independência total em relação ao tecido urbano por onde passaram, pouco importando se o destruia neste processo ou não. Verdadeiros vácuos urbanos surgiram como resultado de áreas compartimentadas entre estruturas de grande porte. A sobreposição entre a rede viária e os rios de São Paulo [mapas 06 e 07] evidencia a conjugação plena destes sistemas, ficando ainda mais explícita a partir da identificação das inúmeras avenidas de fundo de vale. Acompanha a implantação de infraestrutura de transporte a possibilidade de contribuir com a superação barreiras físicas e desarticulações urbanas. Tomando novamente o exemplo fluvial, enquanto os rios Pinheiros e Tietê são atualmente cruzados apenas 3 vezes pelo metrô, os rios Tâmisa (Londres), Sena (Paris) e Han (Seul) são transpostos coincidentemente 10 vezes cada.
Em pouco mais de cem anos, o processo frenético e inconsequente de urbanização atropelou qualquer perspectiva abrangente de preocupação com a qualidade e com o impacto causado durante sua formação. A morfologia metropolitana que hoje se configura, evidencia que o respeito à dignidade de seus habitantes não foi a prioridade.
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POPULAÇÃO
Desde a década de 1960 a Região Metropolitana de São Paulo apresenta uma tendência declinante em sua taxa de crescimento populacional, sendo que esta redução se intensificou progressivamente durante as últimas décadas. A explosão demográfica de São Paulo teve seu claro momento de inflexão na década de 1980, quando somaram-se à recessão econômica, políticas estaduais de descentralização da indústria e repetidas diminuições nas taxas de imigração e fecundidade, o que reduziu a taxa de crescimento populacional neste período a 1,88% a.a., representando uma queda de 58% em relação à década anterior (4,46%a.a.). Apesar das sucessivas reduções na taxa de crescimento, que baseado no censo de 2010 chegou aos 1,07% a.a., o maciço populacional metropolitano é colossal, tendo superado a impressionante marca de 20 milhões de habitantes em 2013.
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No entanto, a vertiginosa evolução da população de São Paulo se traduziu morfologicamente em um espaço urbano desarticulado, espraiado e de baixa densidade demográfica média, revelando uma clara inaptidão em assimilar adequadamente o apressado ritmo de dilatação de seu território, assim como a impotência ao lidar com os impactos de uma dimensão urbana tão extensa. Chama a atenção o elevado grau de desarticulação da continuidade urbana, ou até mesmo a cisão entre aquilo que pode ser identificado como a cidade e a [sub]cidade de São Paulo. Não é novidade que estes dois setores urbanos também possuem padrões de crescimento bastante distintos. Enquanto determinadas áreas urbanas abundantemente dotadas de infraestrutura e serviços se atrofiam e presenciam um claro processo de redução populacional, as periferias metropolitanas por sua vez, absorvem progressivamente um crescente montante de habitantes como reflexo direto do alastramento difuso da mancha urbana metropolitana que não encontra meios efetivos de regulação ou controle.
Esse processo pode ser constatado na comparação entre as duas últimas pesquisas OD, que é incisiva nesse sentido. Basta observar, por exemplo, a redução populacional por razões diversas em zonas como Sé (-25%), Trianon (-22%), Clínicas (-20%), Consolação (-19%) e Berrini (-38%). 15 Do outro lado, nas periferias, o crescimento foi explosivo: Picanço (+83%), Estrada de Nazaré Paulista (+98%), Pinheirinho (+152%), Cocaia (+91%), Parelheiros (+62%), Aldeia de Carapicuíba (+240%) e Cidade Tiradentes (+45%). A compreensão da peculiar conjuntura atual de adensamento demográfico de São Paulo, enquanto produto do tensionamento entre
expansão e retração populacional metropolitana merece atenção especial. Ambos os mapas 12.2 e 12.3 abrangem dados relativos à densidade demográfica, possuindo no entanto, diferentes métodos de representação. O primeiro mapa expressa cada habitante através de um ponto, permitindo que a densidade demográfica seja apreendida diretamente a partir do gradiente que escurece na medida em que o adensamento de habitantes se eleva, e foi elaborado a partir do lançamento randômico da população de cada Zona OD em sua respectiva área urbanizada. Já o segundo, mais tradicional, permite a identificação do valor da densidade demográfica das diversas Zonas OD através de faixas de valores pré-definidos e expressos por diferentes cores. A identificação dos principais núcleos de alta densidade demográfica, representados no mapa 12.1, ajuda a reconhecer em um primeiro momento, uma área central densamente ocupada, sendo que alguns dos valores mais expressivos se encontram em Zonas como: Treze de Maio (309 hab./ha), Bixiga (263 hab./ha), Higienópolis (259 hab./ ha), Perdizes (249 hab./ha) e Paraíso (217 hab./ha). Chama a atenção o fato de este ser o único núcleo considerável contido nos limites daquilo que se denomina como centro expandido (mapa XX). O espaço urbano que circunda este aglomerado central mais denso, é nitidamente composto por zonas contíguas que apresentam abruptas reduções de concentração populacional, que conformam em linhas gerais, um anel de baixa densidade demográfica. Esta redução está vinculada, entre outros aspectos, ao modelo apontado anteriormente de ocupação predominantemente técnico e funcional da várzea do Tietê ao norte, do Pinheiros a oeste e do Tamanduateí a leste. É curioso no caso de São Paulo o fato de que ao invés de prosseguir com um gradiente de densidade que diminui progressivamente na medida em que se distancia do centro, o que se observa de fato, é a presença sistemática em diversas direções, de núcleos periféricos
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de densidade demográfica bastante elevada brevemente descritos a seguir. O quadrante oeste apresenta uma sequência de núcleos densos contíguos à Rodovia Castelo Branco e ao trecho da antiga Estrada de Ferro Sorocabana atualmente identificado como Linha 8 da CPTM. Entre as Zonas OD mais densas que compõem estes núcleos estão: Carapicuíba (171 hab./ha); Jardim Veloso (191 hab./ha) e Munhoz Junior (195 hab./ha) que pertencem ao município de Osasco; e Jardim Silveira (212 hab./ha) no extremo oeste, próximo a Jandira e que pertence ao município de Barueri. Ao sul, acima do entroncamento entre o Rio Pinheiros e a Represa Billings, encontra-se um núcleo de alta densidade que conta com Zonas OD como: Vila Missionária (246 hab./ha) e Jardim Miriam (231 hab./ha) pertencentes ao distrito de Cidade Ademar; Vila Santa Catarina (178 hab./ha) e Jardim Bom Clima (194 hab./ha) contidas no distrito de Jabaquara. Próximo ao entroncamento entre o Rio Pinheiros e a Represa Guarapiranga, um núcleo consideravelmente extenso, engloba Zonas OD como: M´Boi Mirim (201 hab./ha); Jardim Angela (174 hab./ha); Capão Redondo (185 hab./ha), Adventista (177 hab./ha) e Parque Fernanda (220 hab./ha) que pertencem ao distrito de Capão Redondo; Jardim Mitsutani (192 hab./ha) e Jardim Umarizal (165 hab./ ha) no distrito de Campo Limpo. Dois núcleos principais se destacam ao norte já tocando a Serra da Cantareira. O primeiro é composto por Zonas OD como Brasilândia (224 hab./há) e Vila Terezinha (257 hab./ha), que apresenta a quarta densidade mais elevada de toda a Região Metropolitana de São Paulo. Consta ainda neste mesmo núcleo: Mandaqui (176 hab./ha); Itaberaba (167 hab./ha) no distrito de Freguesia do Ó; Cachoeirinha (171 hab./ha) e Jardim Peri (176 hab./ha) que pertencem ao distrito de Cachoeirinha.
Um outro núcleo ainda no quadrante norte conta com Zonas OD como: Vila Medeiros (187 hab./ha); Parque Edu Chaves (173 hab./ ha) que pertence ao distrito de Jaçanã; e Jardim Guapira (169 hab./ ha) no distrito de Tremembé. O núcleo periférico de alta densidade que possui a área mais extensa se encontra no extremo leste da Região Metropolitana, sendo composto por um conjunto de treze Zonas OD que apresentam densidade demográfica superior a 150 habitantes por hectare. Os valores mais altos são encontrados em Zonas como Limoeiro (204 hab./ha), Lajeado (218 hab./ha), Fazenda Itaim (214 hab./ha) e José Bonifácio (223 hab./ha). Ainda no quadrante leste, ao sul do Parque do Carmo, se localiza um vasto núcleo composto por Zonas OD contidas fundamentalmente nos distritos de Sapopemba, São Mateus e Aricanduva.
No entanto, as novas características assumidas pela condição periférica de crescimento metropolitano, apontam para o agravamento gradativo das condições de inserção metropolitana da população de baixa renda que é nítido, por exemplo, na proliferação das favelas [ver mapa 09], na incorporação compulsória de áreas impróprias à ocupação e no intenso acréscimo populacional em territórios- dormitório. Fica claro que a desaceleração no ritmo de crescimento da população metropolitana não se traduziu diretamente em melhorias nas condições de atendimento às deficiências habitacionais da parcela da população mais pobre da metrópole. O que ocorreu de fato caminhou no sentido oposto. De modo geral, o padrão de distribuição e concentração urbana de São Paulo é bastante distinto do encontrado em uma boa parte das grandes metrópoles mundiais contemporâneas. Para citar alguns
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exemplos, em cidades como Nova Iorque, Paris, Londres e Madri, são as áreas centrais que conjugam concentrações mais elevadas tanto de habitantes como de empregos e serviços, exigindo assim sistemas exclusivos de transporte de alta capacidade. Seu contraponto está no território muito menos denso de caráter de suburbano que se encontra ao se aproximar das extremidades urbanas, sendo por sua vez, atendido adequadamente por modais de baixa e média capacidade. No caso de São Paulo, se desconsiderou o fato de que a escolha estratégica dos diferentes sistemas de transporte nestas cidades foi condicionada fortemente às respectivas particularidades no modo de ocupação territorial, ao passo que apenas se importou alienadamente a convicção paradigmática de que o metrô possui um raio máximo de atuação que deve se limitar a um perímetro fundamentalmente central, que por sua vez deve ser alimentado por modos de menor capacidade que alcançam as periferias. Isso se traduz, por exemplo, no monotrilho em construção que liga a Vila Prudente à Cidade Tiradentes, que pretende atender isoladamente a um carregamento incopatível à capacidade específica deste modal. É inaugurado assim, como um sistema essencialmente saturado.
Em suma, a conjunção das novas relações de uso e ocupação do espaço metropolitano de São Paulo diverge da imposição de modais de transporte que invariavelmente, apresentem capacidade gradativamente decrescente na medida em que se aproximam das periferias. Isto porque determinadas concentrações demográficas periféricas elevadas são nitidamente compatíveis com carregamentos de alta capacidade, demandando a implantação de infraestruturas de transporte rápido de massa.
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ECONOMIA
Se partirmos do final do século XIX, quando mudou da Rua 15 de Novembro para a Rua Direita, o que se observa é um processo de deslocamento periódico do arranjo da concentração dos empregos e serviços em São Paulo, passando pela Rua Barão de Itapetininga, entre 1930 e 1960, seguindo para a o binômio da Avenida Paulista e Rua Augusta entre 1950 e 1980, chegando hoje até a região da Avenida Faria Lima, Avenida Luís Carlos Berrini e Marginal Pinheiros. 16
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A sobreposição entre a distribuição espacial dos empregos e da renda pelo território da Região Metropolitana de São Paulo [mapas 15 e 17] expressa claramente que não é coincidência que os deslocamentos apontados acima seguiram um rumo bem definido, em direção ao quadrante sudoeste. O desnivelamento de poder político e econômico entre os diferentes substratos sociais fica evidente na produção de um suporte técnico que cria condições mais favoráveis para os deslocamentos entre os locais de residência e de trabalho da porção mais rica da metrópole. São poucos os casos que destoam desta lógica, sendo que podemos destacar a região do ABC e de Guarulhos, que apesar de não apresentarem densidade de empregos entre as mais elevadas, superam em números absolutos o próprio centro expandido. Isto porque se concentram nestas regiões a maior parte dos empregos do setor secundário da metrópole, sendo que a própria morfologia e condicionantes técnicas das indústrias promovem uma distribuição mais espraiada se comparada com prédios e torres de escritórios do setor terciário.
Inertes ao processo, nas periferias, especialmente aquelas localizadas nos vácuos entre os grandes eixos de transporte, acumulam-se zonas relegadas a servir quase que exclusivamente como dormitório das populações de baixa renda. Novamente, podemos destacar o miolo da Zona Leste, cuja desestruturação espacial é reforçada pela ausência de grandes eixos regionais de transporte, o que nunca possibilitou um significativo desenvolvimento industrial, apesar da grande proximidade de mão-de-obra abundantemente disponível.
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DESLOCAMENTOS
Neste estudo, as considerações relativas aos deslocamentos procuraram somar à leitura do espaço urbano, a caracterização do movimento daqueles que o ocupam. Aproximam-se assim, da simplificação direta do que se pode entender como dinâmica, no sentido apontado mais especificamente pela Física, ou seja, como o estudo do movimento de um corpo, assim como as condições e as causas desse movimento. Convergem em última instância, com o estudo da mobilidade, que por sua vez, é entendida aqui como um atributo relacionado às pessoas, que trata basicamente do quanto uma população ou um indivíduo é capaz de se locomover.
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Pode parecer precipitado, mas em relação à mobilidade, a iminência de colapso em São Paulo já foi ultrapassada, tendo em vista que sua falência se configura por um bom tempo como um fato cotidianamente perceptível. Fica expressa nitidamente na corrosão física e mental imposta diariamente sobre a população seja pela superlotação indigna de ônibus e trens, pelo ar contaminado que se respira ou pelas horas desperdiçadas na congestão viária em São Paulo. Infelizmente, não se configura mais como novidade o fato de que mais de 27 dias são gastos anualmente por cada habitante unicamente para se deslocar em São Paulo17. Neste contexto, não é exagero dizer que ponderar sobre o trânsito por exemplo, tornou-se aqui, vulgar. Esta conjuntura se torna perigosa na medida em que o congestionamento passa a ser assumido isoladamente como o ponto central a ser combatido pelas políticas públicas recentes. Este tratamento justifica repetidamente uma prática autômata enraizada na opção histórica pelo rodoviarismo, onde novos investimentos são sistematicamente destinados à ampliação do sistema viário, surgindo a cada gestão uma nova avenida que supostamente resolverá a mobilidade e a acessibilidade metropolitana. O projeto de ampliação da Marginal Tietê apontado anteriormente é emblemático neste sentido. Todavia, os infalíveis congestionamentos de São Paulo, merecem um olhar mais insistente já que permitem compreender a extensão do impacto – não só – econômico que envolve o custo do transporte em São Paulo. Para tal, foi muito oportuna a atualização de um estudo¹ realizado pela Fundação Getúlio Vargas publicado há poucas semanas. O estudo realizado bianualmente desde 2002 tem justamente como objetivo estimar o custo do congestionamento na cidade de São Paulo, levando em consideração dois indicadores básicos denominados custo oportunidade e custos pecuniários. O custo oportunidade é relativo ao preço pago pelo tempo médio
perdido no trânsito por habitante integrante da população economicamente ativa da cidade. A partir dos métodos e critérios² utilizados na pesquisa, o custo parcial é de 30,2 bilhões de reais. São somados ainda os custos pecuniários, responsáveis pela adição de mais 9,99 bilhões de reais referentes aos gastos adicionais desprendidos pelo desperdício de combustível, pelo aumento da poluição e pelos entraves no transporte de cargas. O montante final é de 40,2 bilhões de reais. Posto em uma perspectiva mais ampla, este prejuízo já equivale a 1% do PIB do Brasil inteiro. Com certa complementariedade, a Companhia do Metropolitano de São Paulo estima anualmente em seu Relatório da Administração um valor relativo aos benefícios sociais decorrentes do funcionamento da rede metroviária existente. São contemplados no valor final parâmetros como: redução de emissão de poluentes; redução no consumo de combustível; redução do custo operacional do ônibus; redução do custo operacional com carros; redução do custo de manutenção e operação de vias; redução do tempo das viagens; redução do custo com acidentes. O Metrô gerou, no ano de 2012, um benefício social positivo de 7,2 bilhões de reais. A somatória dos valores compreendidos no período entre 2003 e 2012, aponta para o acúmulo de um benefício líquido positivo de 66,6 bilhões de reais, sendo isoladamente mais que suficiente para propiciar o retorno dos investimentos aplicados na construção de toda a rede metroviária existente18.
Apesar dos congestionamentos serem uma das poucas condições plenamente democratizadas em São Paulo, a comparação entre o tempo médio de viagem por modo coletivo é 2,16 vezes superior ao
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desprendido por modo individual. Mesmo que os mapas relativos ao tempo médio de viagem [mapas 21 e 22] devam ser vistos com certa cautela, pois são realizados a partir da média de todas as viagens realizadas, não desagregando os valores por motivo, é possível afirmar que a grande prejudicada é a população de baixa renda, historicamente a maior usuária do transporte público.
O cruzamento entre dados relativos ao índice de mobilidade às faixas de renda familiar média, reforça que sem dúvidas, a [i]mobilidade é mais grave para a parcela mais pobre da população [ver gráfico ao lado e mapas 18, 19 e 20].
Os mapas relativos aos deslocamentos diários entre origem e destino [mapas 24 e 25] devem ser apreendidos unicamente como a representação simplificada do padrão de distribuição espacial dos principais locais de moradia e de emprego em um determinado momento. Isto quer dizer que apesar da denominação – equivocada – como linhas de desejo, o conjunto de vetores representado não pode ser adotado como a diretriz central e literal na elaboração de planos de transportes, ao passo que não expressa a demanda por viagens da população, apenas a quantidade absoluta de conexões entre as origens e os destinos das viagens suportadas diariamente. Uma utilização possível é exatamente o inverso da sobreposição literal de linhas de baixa, média e alta capacidade em função dos vetores existentes, ao passo que deslocamentos muito tímidos em determinadas áreas podem decorrer precisamente de um atrofiamento estrutural que deva ser superado.
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CONJUNÇÃO
Surgiu naturalmente durante o processo a necessidade de unir e cruzar os diferentes temas abordados de modo a possibilitar que as diversas áreas da metrópole fossem organizadas e categorizadas de maneira sistêmica e conjugada. Um exemplo neste sentido pode ser encontrado no estudo “Estrutura Urbana da Aglomeração Paulista” realizado em 1956 pela equipe SAGMACS (Sociedade para a Análise Gráfica e Mecanográfica Aplicada aos Complexos Sociais) liderada por LouisJoseph Lebret. Para ilustrar o diagnóstico dos aspectos demográficos, sociais, econômicos e espaciais do espaço urbano de São Paulo, foi elaborada uma interessante metodologia de representação gráfica. Aqui, a conjunção de dados foi expressa através de um gráficosíntese das 460 Zonas OD, representadas individualmente como um polígono pentagonal, no qual cada vértice expressa respectivamente o valor de um dos seguintes indicadores: densidade demográfica; densidade de empregos; renda média familiar; índice de mobilidade motorizada; tempo médio de viagens por modos coletivos [ver gráfico ao lado].
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Deste modo, a comparação e categorização dos 460 pentágonos referentes respectivamente a cada uma das Zonas OD permite, a partir da identificação de determinados padrões, o agrupamento daquelas que possuem certas condições em comum, sendo posteriormente possível relocá-las no território. Foi proposto um recorte entre as diversas combinações possíveis, do padrão denominado Arranjo A, que é composto por zonas que combinam simultaneamente as seguintes características: alta densidade demográfica; baixa densidade de empregos; baixa renda média familiar; baixo índice de mobilidade motorizada; tempo médio de viagens por modos coletivos elevado. Compõe este arranjo um total de 76 Zonas Origem e Destino [destacadas na página X] sendo que o padrão de distribuição espacial se dá nas periferias da metrópole [mapa X, página XX].
A adoção destas áreas como as regiões prioritárias de implantação da rede metroviária – como será explicado mais adiante – se trata, em última instância, de atender da maneira mais eficiente possível as demandas futuras assim como reduzir os tempos de viagem de modo que justifiquem o alto investimento simultaneamente do ponto de vista econômico e urbanístico19. Aponta também, para a tentativa de instrumentalização direta da análise e do tratamento de dados realizado.
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INVENTÁRIO REFERENCIAL
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R E F E R E N C I A L
O conjunto de mapas a seguir tem o intuito de catalogar e organizar algumas redes e planos que serviram como referência durante o trabalho. Os planos e propostas de redes metroviárias para São Paulo permitem ver o que já foi proposto e descartado, provocando a imaginação a supor aquilo que poderia ter sido feito e nunca saiu do papel. Também sugere possibilidades e caminhos, indicando que determinadas recorrências de traçado não se tratam de mera coincidência, devendo ser consideradas com atenção. Outras quatro redes de metrô de outras metrópoles foram catalogadas, sendo estas: Madri, Moscou, Londres e Seul. O estudo de outras redes implantadas permite perceber o nítido atraso do metrô de São Paulo e também nos fornece subsídios para desmanchar paradigmas e limitações técnicas por meio da comparação com estruturas já implantadas.
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HIPÓTESE
DE
REORGANIZAÇÃO DE
SÃO
UMA
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PAULO
Em pouco mais de um século, o processo de formação do espaço metropolitano de São Paulo teve invariavelmente em sua matriz a submissão incondicional à imposição do imediatismo. O reflexo morfológico e institucional deste processo se revela cotidianamente através do agravamento desenfreado dos entraves impostos pela debilidade das infraestruturas metropolitanas de produção. Compromete-se paulatinamente qualquer perspectiva relevante de crescimento econômico ou de transformação social, já que a intensificação dos desarranjos e disparidades regionais amplifica o entrave das funções urbanas essenciais da metrópole. Fica anunciada neste sentido, a opção histórica pela reprodução da precariedade e da escassez, o que esclarece em termos, a origem da plena inaptidão em superar o setorialismo das operações que incidem na produção do espaço metropolitano.
Nos acostumamos a achar normal adotar a lógica de cada macaco no seu galho na construção do território de São Paulo: em resposta ao trânsito, avenidas; em resposta às enchentes, piscinões; em resposta ao descarte, lixões; e assim por diante. Em meio à desarticulação, a população se limita a [sobre]viver. Não é exagero apontar que a fragmentação e desestruturação do suporte físico metropolitano de São Paulo se devem fundamentalmente à reprodução exaustiva de políticas setoriais que expressam a profunda incompreensão do potencial transformador inerente às operações de implantação de infraestruturas. Neste contexto, a implantação de uma linha de alta capacidade isolada e ensimesmada, pode tanto contribuir na formação do espaço urbano como também, trabalhar no sentido contrário, potencializando o estrago que pretendia rever. P.156
Aquilo que parece surgir como essencial é a nitidez das conjecturas com as quais se trabalha, e em última instância, dos objetivos pretendidos: ampliar a oferta global de transporte de passageiros e equilibrar sua distribuição territorial com o intuito de balizar uma reorganização estrutural do espaço urbanizado da Região Metropolitana de São Paulo. O que fica evidente, é que o aproveitamento pleno do potencial das infraestruturas de transporte está condicionado primordialmente à sua provisão conjugada a outros programas e operações, como o adensamento de moradia, de equipamentos de educação, saúde, serviços, comércio e lazer. O objetivo final desta articulação é devolver à população os ganhos decorrentes da transformação físico-social dos altos investimentos realizados.
Fica definida a conjunção entre duas escalas de intervenção que nunca se uniram plenamente em São Paulo. O sistema de transporte abrangente e concebido plenamente como rede, assegura a redução das disparidades de acessibilidade e mobilidade metropolitana. As estações, devem intermediar a articulação entre a rede e o tecido urbano, catalisar a reestruturação do lugar e reverter a segregação das atividades urbanas. É comum às duas escalas a perspectiva de transformação do tecido urbano, que permita simultaneamente fortalecer os vetores existentes e criar continuidades e articulações espaciais novas que, em última instância, assegurem a liberdade e amparem a imprevisibilidade da vida. Trata-se afinal, de uma hipótese de mudança nas condições cotidianas definida pelo lançamento de uma visão da cidade pretendida.
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PADRÃO E
DE
ATENDIMENTO
FUNCIONAMENTO DOS
DESLOCAMENTOS
É essencial que a proposta de ampliação da rede estrutural de alta capacidade sobre a qual este trabalho se debruça estabeleça a amarração imprescindível entre o âmbito econômico e a gestão técnica da metrópole. Neste estudo, a gestão técnica da metrópole é entendida como o processo de sucessiva aproximação a padrões de funcionamento desejados. E é precisamente a partir destes padrões que se equaliza o conjunto de soluções técnicas compatíveis com a dimensão das intervenções e a intensidade dos investimentos. Neste contexto, surge como critério fundamental à proposta de ampliação da rede metroviária definir os padrões desejados de funcionamento e atendimento dos deslocamentos a serem realizados futuramente em São Paulo. Um ponto importante a ser destacado na elaboração deste estudo é o reconhecimento da enorme complexidade técnica inerente ao
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planejamento de infraestruturas de transportes. Não existe aqui a pretensão de reproduzir a completude de um trabalho de engenharia de transportes profissional, que é realizado em um contexto multidisciplinar, demanda muito mais tempo e faz uso de metodologias e instrumentos técnicos específicos. O estudo pretende, no entanto, contribuir para a reflexão sobre a formação do suporte técnico na qual a produção de infraestrutura seja reconhecida de fato, como catalizadora fundamental à organização, qualificação e transformação social e espacial que pretendemos alcançar. É preciso reverter o modelo de construção de infraestrutura que se limita tão-só a remediar as falências consolidadas, em uma corrida invariavelmente defasada e sem fim atrás do prejuízo. Até que esta reversão não se dê, será invariavelmente mantida a segregação das atividades urbanas na Região Metropolitana de São Paulo. Deve estar claro assim, que a definição dos padrões de funcionamento, a variação dos níveis de mobilidade e a consequente redistribuição modal, não podem ser aqui consideradas como estatísticas tecnicistas que exprimem meramente um determinado momento conjuntural, devendo ser assumidas plenamente como o próprio partido da intervenção no sistema metropolitano de transportes.
De partida, mostra-se necessária a definição do horizonte de projeto ou ano-meta a ser considerado, tendo em vista que este servirá como embasamento para o escopo das etapas posteriores. O horizonte de aproximadamente 20 anos se mostra adequado, sendo recorrentemente adotado em diferentes planos de transportes de médio e longo prazo. Foi adotado assim, o ano-meta de 2030. Mostra-se oportuna a utilização da projeção populacional20 realiza-
da pela SEADE (Sistema Estadual de Análise de Dados) que estima uma população de 22.143.440 habitantes na Região Metropolitana de São Paulo em 2030. Isso representa um crescimento absoluto de 12,5% em relação a 2010, apresentando uma taxa de crescimento geométrico de 0,59% ao ano. O crescimento estimado para 2030 está em concordância e amplifica a tendência declinante da taxa de crescimento populacional apontada anteriormente, sendo significativamente inferior ao que se registrou entre 1991 e 2010 (taxa de crescimento de 1,28% ao ano que representou um crescimento absoluto de 27,5%) e ainda mais distante do que ocorreu entre 1970 e 1991 (3,10% ao ano, e 89,8% de crescimento absoluto). Todavia, o montante absoluto superior a 2 milhões de habitantes a ser absorvido não pode ser relevado.
O índice de mobilidade motorizada exprime a relação entre as viagens motorizadas e os habitantes de uma determinada área [já expresso nos mapas 18, 19 e 20]. É um indicador que permite compreender tanto a evolução da mobilidade de um determinado espaço urbano, quanto a comparação da mobilidade entre diferentes espaços urbanos. Apesar do índice de mobilidade motorizada em São Paulo de 1,29 viagens motorizadas por habitante registrado na Pesquisa Origem e Destino de 2007 ter apresentado crescimento em comparação com a pesquisa anterior, ainda é inferior ao que foi registrado em 1987. Partiu-se da adoção primária de um índice de mobilidade motorizada que tenha necessariamente evoluído em relação à situação atual. A partir da projeção populacional, o número total de viagens motorizadas para o horizonte do estudo foi estimado em 36,54 milhões, em função de um índice de mobilidade motorizada definido em 1,65.
Apesar da melhora significativa, tendo crescido 28% em relação a 2007, o índice continua sendo inferior à maioria das outras cidades do mundo21: Paris (2,30); Nova Iorque (2,05); Londres (1,91); Hong Kong (1,82); Tóquio (1,57).
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Já a divisão modal, pode ser definida como a divisão proporcional do total de viagens realizadas entre os diferentes modos de viagem22. Como apontado, é fundamental que a divisão modal também deixe de ser apreendida como a simples expressão numérica que representa a relação entre valores acidentais de distribuição das viagens em um determinado momento, para se tornar justamente o centro a partir do qual o estudo de dimensionamento do sistema metropolitano de transportes se estrutura. A relação entre as viagens individuais e coletivas, assim como a divisão adequada entre os modos de alta, média e baixa capacidade em função das distâncias a serem percorridas, que assegurem uma velocidade média satisfatória aos deslocamentos, deixam de ser assumidas como estatísticas impostas, para serem, de fato, definidas em concordância com o partido adotado. O ajuste modal calibrado por critérios estabelecidos permite, por exemplo, definir o conjunto de atributos necessários para que a rede de alta capacidade desempenhe na prática, a função de modo estruturador. A plena eficiência de aproveitamento do sistema estará amarrada em última instância, com a conjugação simultânea do dimensionamento de seus componentes com a articulação espacial adequada de cada uma de suas partes constituintes com o cenário de divisão modal desejado. A ausência deste sincronismo impede a constituição de um sistema plenamente integrado.
A partir da projeção de viagens para o horizonte de 2030, fica enunciada explicitamente a impossibilidade de manter a atual divisão modal entre viagens individuais e coletivas. A mobilidade colapsada e a falência do modelo de uso extensivo do sistema viário na Região Metropolitana de São Paulo são inegáveis, seja pela deseconomia gerada através dos congestionamentos, seja pelo nível crônico de contaminação do ar pelos gases tóxicos dos motores à combustão. Se a situação atual já é inaceitável, qualquer perspectiva de melhoria relevante no funcionamento e atendimento dos deslocamentos impõe que o crescimento demográfico seja acompanhado pelo crescimento mais que proporcional da participação dos modos coletivos, dando prioridade ainda, aos modos que independem da rede viária para funcionar. É preciso levar em consideração que a opção por um determinado modo de viagem em um espaço urbano se insere em um contexto dinâmico, sendo que qualquer alteração rearranja integralmente a divisão modal dos deslocamentos. Ou seja, atribuir à alta capacidade a incumbência de servir como o eixo estruturador da rede integrada de transportes metropolitanos, pressupõe não só a possibilidade de criação de novas viagens, mas também a absorção e o rearranjo das viagens realizadas anteriormente por outros modos. Nesse contexto, em função das condições inaceitáveis apontadas anteriormente, foi adotada como partido de reordenamento modal, não só a frenagem, mas a redução do volume atual de viagens motorizadas que têm o sistema viário como suporte. O montante de deslocamentos por modos individuais fica fixado em 10,96 milhões para o ano de 2030. Representa uma redução de 2,6% em relação ao valor de 2007. Em relação ao valor hipotético de manutenção em 2030 da mesma divisão modal de 2007 (que correspondia a 44,7% do total de viagens motorizadas), a redução é de 32,9%.
O modo individual passa a representar 30% do total de viagens motorizadas. Converge com a busca de uma divisão modal entre coletivos e individuais compatível tanto com a ordem de grandeza do volume das viagens, quanto com a [in]disponibilidade física do sistema viário.
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O ônibus é historicamente o modo de transporte público mais desenvolvido e utilizado em São Paulo. A Pesquisa Origem e Destino de 1967 demonstrava que 93% das viagens coletivas eram realizadas por ônibus, reflexo do abandono do sistema de bondes, da ínfima participação dos trens metropolitanos e do metrô que ainda estava longe de ser inaugurado. Por mais que esta relação tenha se alterado, o ônibus ainda realiza 75% de todas as viagens coletivas na Região Metropolitana de São Paulo, revelando que o pleno desequilíbrio modal persiste no sistema de transportes metropolitanos. O desequilíbrio modal enraizado no uso extensivo do ônibus pode ser explicado em grande parte, pelo alcance rápido e fácil de toda a extensão metropolitana através do menor investimento possível na compra de um material rodante capaz de fazer uso da própria infraestrutura viária existente, por mais precária que seja. A aplicação da lógica do mínimo esforço, ou seja, a disseminação do ônibus como a base sistema metropolitano, viabilizou a abertura de loteamentos populares isolados na periferia metropolitana, fator essencial ao modelo de expansão urbana dispersa e desarticulada. O sistema de ônibus, não se adequa, e em última instância não dá conta de atender a colossal extensão metropolitana, sendo essencialmente irresponsável sua adoção como o embasamento estrutural principal de todo o sistema metropolitano de transportes. Mesmo que o sistema de ônibus seja fundamental à capilaridade
do sistema metropolitano de transportes, seu desempenho deve ser complementar ao sistema de alta capacidade, operando de acordo com sua faixa específica de maior eficiência, ou seja, compatível com os deslocamentos de baixa capacidade e de menor distância, entre 8 e 10 quilômetros de extensão. E é nesse sentido – não podendo ser confundido com uma defesa ao enfraquecimento dos modos coletivos públicos – que se propõe a redução de 10% do carregamento realizado atualmente pelos ônibus. Ficam fixadas em 8,13 milhões as viagens absorvidas por ônibus em 2030, que representam 31% das viagens realizadas por modos coletivos. Até que este rearranjo não se dê, será invariavelmente mantido o desarranjo brutal no atendimento dos deslocamentos em São Paulo. Cabe ressaltar que a redução de participação dos modos suportados pela rede viária não isenta de maneira alguma, a necessidade premente de investimentos na melhoria e racionalização dos componentes do sistema de superfície, através da ampliação dos corredores e faixas exclusivas, da construção de estações e terminais de transferência e do próprio enfrentamento das desarticulações do sistema viário. Considerando o horizonte de 2030, somando todos os modos, o sistema viário suporta 55,8% das viagens motorizadas, contra os 88,3% registrados em 2007.
Fica evidente que é necessário levar em consideração que a opção por um determinado modo de transporte em um espaço urbano, se insere em um contexto dinâmico, sendo que qualquer alteração rearranja integralmente a divisão modal dos deslocamentos. Ou seja, atribuir por exemplo à alta capacidade a incumbência de servir como o eixo estruturador da rede integrada de transportes metropolitanos,
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pressupõe não só a possibilidade de criação de novas viagens, mas também a absorção e o rearranjo das viagens realizadas anteriormente por outros modos. A média capacidade é cercada de muita controvérsia em São Paulo, desde o antigo fura-fila, até o monotrilho da Cidade Tiradentes, ao passo que vem sendo concebida e implantada aqui de maneira essencialmente equivocada. Não pode ser desconsiderada em função disto, sendo um importante componente do sistema metropolitano de transportes, desde que se relacione com os carregamentos compatíveis e existam as condições de implantação adequada no suporte físico. Deve ser implantada assim, em trajetos que não mais condizentes aos modos de baixa capacidade e que ao mesmo tempo não possam assegurar em horizontes adequados, carregamentos compatíveis à alta capacidade. Ao sistema de média capacidade, fica estimado um carregamento de 1,48 milhões de viagens diárias.
O sistema de trens urbanos apresenta o maior potencial de crescimento no atendimento de viagens fazendo uso da própria infraestrutura atualmente existente (258 quilômetros), correspondendo de acordo com a Pesquisa Origem e Destino de 2007, ao carregamento de 815 mil viagens diárias23, o que representa 3,2% do total de viagens motorizadas, sendo valor um bastante tímido para um modo de alta capacidade. A rede ferroviária exerceu um papel importante na formação do espaço urbano de São Paulo, ao passo que estruturou parte considerável da expansão e consolidação de novos centros desde o tempo dos povoados-estação identificados por Langenbuch24. O alcance da rede ferroviária é bastante vasto e compreende simultaneamente áreas
com concentração elevada de empregos e áreas de alta densidade demográfica. Tendo em vista a escassez de grandes eixos desocupados dentro do espaço urbano de São Paulo, a ampliação do sistema de trens metropolitanos fica essencialmente restrita a trechos reduzidos, tendo em vista o impacto espacial inerente à implantação de grandes linhas segregadas em superfície. Isso significa que a intervenção no sistema de trens urbanos se concentra fundamentalmente na revisão das características operacionais e de funcionamento das diversas linhas, que contribuem para uma transformação drástica do padrão de serviços. Dentre as possibilidades de intervenção está por exemplo, a adoção sempre que possível de sistemas expressos que operem conjuntamente aos sistemas paradores e a redução dos headways para padrões metroviários. Também é fundamental a ampliação do número e a melhor localização das estações, com o intuito de coordenar o adensamento da cidade de modo que transforme as relações setoriais, regionais e metropolitanas. A possibilidade de intervir na malha ferroviária a partir da revisão da localização e distribuição das estações, ganha muita força caso seja plena não só a articulação intermodal, em especial nas conexões com o metrô, mas também a combinação com outros programas, como habitação, serviços, educação, equipamentos e lazer. Surge a oportunidade de permitir a criação de continuidades espaciais e articulações programáticas novas. Este conjunto de intervenções permite o melhor aproveitamento da rede ferroviária na absorção do montante crescente de passageiros a ser transportado, sendo fundamental ao rearranjo modal do sistema. Designa-se aos trens urbanos um volume diário estimado de 3,01 milhões de viagens, o que representa 11,8% do total das coletivas.
P.168
Finalmente, a convergência do padrão de funcionamento e atendimento dos deslocamentos, com a política de transportes definida, fica explicitada na composição modal final que embasa o sistema metropolitano de transportes desejado. Compete à rede estrutural de alta capacidade – que compreende o sistema metroviário somado ao sistema de trens urbanos – o carregamento correspondente a 57,3% de todos os deslocamentos por modos coletivos em 2030. Nesse contexto o metrô se encarrega de 11,65 milhões de viagens diárias, volume 425% superior ao transportado em 2007. Foi adotado como partido, a adoção primária de uma densidade de uso da rede do metrô que tenha necessariamente diminuído em relação à conjuntura atual, já que manter o tal valor não só manteria, mas garantiria o agravamento gradual da condição de total saturação do sistema. A densidade de uso do sistema metroviário fica então definida em aproximadamente 29,5 mil passageiros diários por quilômetro de linha, o que resulta em um pré-dimensionamento final da rede em 395 quilômetros de extensão para o horizonte de 2030. Fica manifestada nitidamente a implantação de uma rede de transportes hierarquizada, integrada e com abrangência compatível à sua escala. Estruturada pela rede de alta capacidade, encontra no metrô sua espinha dorsal. [Valores sintetizados na tabela Estimativa da demanda, divisão modal e extensão da rede, na página 88 e no gráfico da Divisão Modal, Viagens Motorizadas, 2007-2030, que está na página 87] A escala de investimentos e a complexidade inerente à dimensão da intervenção demandada ficam ainda mais evidentes ao aferir sobre o ritmo de construção da rede dimensionada. Considerando a conclusão das obras em andamento, a rede metroviária terá aproximadamente 145 quilômetros de extensão no ano de 2015, o que impõe um ritmo de construção de 16,6 quilômetros por ano até 2030.
Temos que considerar um espaço urbano integralmente em obras por um bom tempo. Mesmo que seja uma mudança brusca, o ritmo paulistano não pode servir de parâmetro. Madri por exemplo, expandiu 16,7 quilômetros de extensão de sua rede anualmente entre 1998 e 2007, enquanto em Seul, entre 1991 e 2000, o ritmo foi de 22,6 quilômetros ao ano, o que evidencia que o ritmo proposto é perfeitamente factível.
Se de um lado é essencial considerar que o urbanismo é uma disciplina regida por prioridades, sendo irresponsável se apoiar em um cenário irreal de recursos infinitos, do outro, fica evidente que as colossais deseconomias provenientes da debilidade que norteou a construção da base técnica de São Paulo25, demandam investimentos condizentes ao retorno também colossal a ser gerado pela reversão do quadro atual. Deve estar clara a premência de superar todo paradigma complacente com noções de impotência, se opondo à inércia autômata que impõe repetidamente o mantra de país pobre e infraestrutura precária. Trata-se afinal, do crescimento do espaço da produção, da perspectiva de elevação do desempenho econômico e da ampliação das condições de transformação social na Região Metropolitana de São Paulo.
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ESTIMATIVA
DA
DEMANDA,
DIVIS
ANO
POPULAÇÃO
VIAGENS MOTORIZADAS
DIVISÃO MODAL
MILHÕES
ÍNDICE DE MOB.
VIAGENS MOT./hab.
VIAGENS
MILHÕES
INDIVIDUAL
MILHÕES PORCENTAGEM
COLETIVO
MILHÕES PORCENTAGEM
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DIVISÃO MODAL COLETIVOS
ALTA
(METRÔ)
ALTA
(TREM)
MILHÕES PORCENTAGEM (col.) MILHÕES PORCENTAGEM (col.)
MÉDIA (VLT)
MILHÕES PORCENTAGEM (col.)
BAIXA (ÔNIBUS)
MILHÕES PORCENTAGEM (col.)
OUTROS
MILHÕES PORCENTAGEM (col.)
DENSIDADE DE USO
METRÔ
VIAGENS METRÔ/km
EXTENSÃO DA REDE
METRÔ
QUILÔMETROS
Sテグ
MODAL
E
EXTENSテグ
DA
REDE
1977
1987
1997
2007
2030
10,28
14,25
16,79
19,54
22,14
1,56
1,31
1,22
1,29
1,65
16,00
18,66
20,49
25,17
36,54
5,95
8,19
10,00
11,26
10,96
37%
44%
49%
45%
30%
10,05
10,47
10,49
13,94
25,58
63%
56%
51%
55%
70%
0,54
1,44
1,70
2,22
11,65
5,4%
13,8%
16,2%
15,9%
45,5%
0,51
0,83
0,65
0,82
3,01
5,1%
7,9%
6,2%
5,9%
11,8%
-
-
-
-
1,48
-
-
-
-
5,8%
8,66
8,06
7,25
9,03
8,13
86,4%
77,3%
69,6%
65,2%
31,8%
0,33
0,15
0,89
1,86
1,31
3,1%
1,0%
8,0%
13,0%
5,1
32,3
50,7
39,0
36,3
29,5
16,7
28,4
43,5
61,2
395
P.174
4 E N S A I O
ESTRATÉGIA
DE
IMPLANTAÇÃO
APRESENTAÇÃO
DA
E
REDE
A decantação dos apontamentos iniciais em consonância com a dimensão da intervenção fixada, baliza a proposição de um sistema de transporte hierarquizado, estruturado pela espinha dorsal formada pelos modos de alta capacidade que ampare os grandes deslocamentos metropolitanos e se articule simbioticamente aos outros modos de menor capacidade e maior vascularidade no tecido urbano. A estratégia de ampliação da rede metroviária buscou identificar critérios básicos que permitissem, ao conjugar as soluções técnicas estruturais do sistema de transporte com o território metropolitano, reduzir as alternativas infinitas de traçados admissíveis a um conjunto plausível de opções condizentes à construção da cidade desejada. A síntese destes critérios foi condensada nas seguintes diretrizes de implantação:
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1
reduzir as disparidades regionais de acessibilidade e mobilidade metropolitana; 2
formar e fortalecer polos regionais, equilibrando o arranjo espacial metropolitano e amparando a criação de configurações urbanas novas; 3
prover acesso aos equipamentos de caráter metropolitano, como parques, hospitais, instituições de ensino, equipamentos públicos, aeroportos e infraestruturas de transporte existentes; 4
superar barreiras e desarticulações físicas do espaço urbano.
O traçado preliminar da rede metroviária é composto por 11 linhas que somadas, correspondem aos 395 quilômetros fixados, pelos quais estão distribuídas 387 estações. A rede proposta realiza 75 integrações de alta capacidade. A hipótese preliminar do sistema metropolitano de transporte proposto é apresentada a seguir em dois conjuntos de mapas. O primeiro apresenta em linhas gerais o arranjo estrutural da rede, permitindo – por estar na mesma escala – a sobreposição com os outros mapas apresentados até aqui [mapas 37 a 39]. O segundo aproxima a escala e aprofunda a visualização dos diversos componentes do sistema [mapas 40 a 48].
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Primordialmente, uma rede de metrô serve como suporte modal aos deslocamentos diários compatíveis com a alta capacidade. Tendo em vista que estes deslocamentos estão majoritariamente orientados pela concentração e pelo arranjo espacial das atividades urbanas, o gesto primário de implantação da rede de alta capacidade é condicionado pelo atendimento aos principais vetores consolidados de São Paulo. O conjunto de linhas 1 a 7, de caráter radial atendem a este pressuposto [mapa 45]. Ao mapear a distribuição de empregos, serviços, comércio, lazer, instituições de ensino e equipamentos na Região Metropolitana de São Paulo, fica evidente que sua concentração se dá mais intensamente nos limites do setor que se define como centro expandido. O adensamento de integrações decorrentes dos cruzamentos das linhas radiais nesta porção do território condiz com a melhoria de acessibilidade e utilização dos equipamentos existentes. No entanto, a utilização deste argumento isolado para justificar implantação da rede de alta capacidade exclusivamente nesta porção do espaço urbano, somada a tímidos prolongamentos incapazes de ultrapassar os limites municipais, o que configura em linhas gerais a estratégia que vem sendo adotada para São Paulo, acaba em última instância por reforçar profundamente a segregação espacial e a exclusão social. Isto porque é incompatível à peculiar conjuntura atual de adensamento demográfico e de distribuição espacial da renda em São Paulo. Uma vez que a população periférica não margeia, mas integra plenamente a economia global do aglomerado metropolitano, ao passo que compõe parte significativa da força de trabalho de São Paulo, não há razão para prosseguir construindo as periferias seguindo um padrão diferenciado das demais áreas, [re]produzindo territórios que permanecem excluídos da própria vida urbana. Em função do
preço da terra, foi precisamente esta porção da cidade que absorveu a expansão da porção mais pobre da população, constituindo grandes adensamentos populacionais inegavelmente consolidados hoje, alheios à plena precariedade do suporte técnico implantado. A combinação entre a concentração da oferta de trabalho no centro expandido e grandes concentrações demográficas expelidas às margens da metrópole, condena de partida que a população mais pobre realize enormes deslocamentos territoriais diariamente. Fica evidente, que é justamente nestas áreas escassamente equipadas as que a implantação de infraestruturas exerce o papel fundamental de amparar e capacitar a formação deste território como espaço produtivo. Paralelamente, é premente que o adensamento habitacional e das atividades urbanas se dê essencialmente no território atualmente ocupado, devendo haver planejamento e regulação dos setores ainda adequados à expansão urbana, contendo o espraiamento irresponsável da mancha urbanizada, fato que nunca aconteceu na história de São Paulo. Como apontado anteriormente, o ritmo frenético que foi imposto ao crescimento metropolitano, reduziu o processo a operações regidas fundamentalmente pela aplicação do menor esforço possível, sendo que sua fase de expansão territorial mais intensa não foi acompanhada pelo investimento na implantação das infraestruturas essenciais. Dentre as diversas decorrências da frágil formação do aglomerado urbano metropolitano, inexistiu na cidade, ou se deu muito frouxamente, aquilo que a própria composição de sua estrutura original exigia, ou seja, a conexão de seus eixos radiais através de articulações tangenciais, estruturando de fato o território como um todo. Neste sentido, restringir a implantação da rede de alta capacidade ao atendimento exclusivo dos vetores radiais se revela como uma estratégia ineficaz e desatenta ao potencial de reestruturação do tecido urbano e à própria organização social da metrópole. O funcionamen
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to integrado do sistema de transporte depende hoje, da combinação de linhas radiais a número condizente de linhas tangenciais que possibilitem a conexão direta e a reestruturação de determinadas áreas, adequando a rede à lógica decorrente das incorporações ao núcleo original de novas configurações urbanas. A incorporação plena da região do ABC, por exemplo, constitui a conurbação de uma estrutura essencialmente polinuclear, o que subverte por completo o tratamento exclusivamente radioconcêntrico do território metropolitano. O processo de formação do extremo leste que partiu de territórios originalmente ocupados por fazendas, no momento que se impôs a necessidade de servir como suporte à vida urbana, foi adotada a sobreposição direta de moradia a lotes rurais originando um território profundamente fragmentado e limitado a desempenhar a função que [des]cumpre hoje. Neste caso, frente à incoerência plena do tecido urbano existente, a implantação de linhas apontou para a necessidade induzir uma organização estrutural ao território. O conjunto das linhas 8 a 11 da rede metroviária proposta condiz com o atendimento e estruturação de deslocamentos tangenciais pelo território metropolitano [ver mapa 46]. Admite-se que a concentração de empregos e serviços centralizados no espaço urbano de São Paulo decorre também da escassez de outras opções de locais capazes de dar suporte a estes usos. Fica reforçada então, a necessidade de melhoria na distribuição de infraestruturas pelo território urbanizado de São Paulo que contribui para um rearranjo mais equilibrado destas atividades e, consequentemente, para a transformação do próprio padrão atual de viagens. O espaço urbano deve ser visto como uma composição em constante transformação, adotando como partido a superação de limitações paradigmática que restringem aos transportes, e às infraestruturas em geral a prover soluções sectárias e regionais aos enunciados técnicos propostos a curto prazo.
O potencial de reestruturação do tecido urbano em escala metropolitana fica claro ao identificar as superações de barreiras físicas propiciadas pela ampliação do sistema de transporte. Nos cruzamentos, ou confluências entre os rios e os trilhos, toma-se como estratégia a articulação das estações a equipamentos públicos e áreas livres, procurando devolver ao leito maior dos rios sua função primordial de parque fluvial urbano, alterando profundamente a relação entre as águas e a cidade. O Rio Tietê, que apresenta atualmente 2 cruzamentos com o sistema de alta capacidade, passa a ser transposto 13 vezes. O Rio Pinheiros passa de 3 para 8 transposições. O Rio Tamanduateí, passa de 4 para 10. O Rio Aricanduva, passa de 3 para 7. Ao todo, o conjunto destes quatro rios é transposto 38 vezes. As operações relativas aos cruzamentos com as rodovias procurou acolher os principais eixos de chegada macrometropolitanas através da articulação das estações com estações rodoviárias e estacionamentos públicos, imaginando a possibilidade de absorção destes deslocamentos pelo sistema de alta capacidade, sem a necessidade de saturar de partida a região central. No total, são 15 articulações com a rede proposta, que cruza ao menos uma vez todas as rodovias que chegam a São Paulo. A exceção é a Rodovia Raposo Tavares, na qual se propõe a implantação sobreposta de uma linha de média capacidade que vai desde a estação Butantã até a intersecção com o trecho oeste do Rodoanel, integrando-se ainda com outras linhas de média capacidade na Avenida Politécnica e no encontro com o Parque Jardim Previdência. Os 28 cruzamentos com as ferrovias permitira também a multiplicação das opções de integração intermodal.
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N O T A S
1
Ver introdução de MORI, Klara Kaiser (1991) “Rede de Metrô 2010 – Parâmetros Espaciais”. 2
Tomou-se emprestado, apesar do contexto completamente diverso, um trecho de Le Corbusier: The town is a working tool. Towns do not normally fulfill this function. They are inefficient: they wear out the body, theiy frustrate the mind. The increasing disorder in our towns is offensive: their decay damages our self-esteem and injures our dignity. They are not worthy of the age. They are no longer worthy of us. (1925) Guiding principles of town planning in Programs & Manifestoes on 20th Century, MIT Press, 1970
3
Tema abordado em profundidade em DEÁK, Csaba (1991) “Acumulação entravada no Brasil e a crise dos anos 80” em Revista Espaço & Debates, número 32. São Paulo, 1991. 4
Termo propriamente abordado em DEÁK, Csaba (1989) “O mercado e o Estado na organização espacial da produção capitalista”. Revista Espaço & Debates, número 28. 5
P.224
Enquanto a ViaQuatro é a concessionária responsável especificamente pela operação e manutenção da Linha 4, a concessão para a construção se divide entre o Consórcio Via Amarela (responsável pela construção da linha e das estações dos Lotes 1 e 2) e o Consórcio Linha Amarela (responsável pela construção do pátio Vila Sônia e do Lote 3). 6
Ao solicitar ao IPT a consulta do laudo, foi informado que os resultados de laudos técnicos, bem como os materiais decorrentes destes, não são divulgados uma vez que tais relatórios são confeccionados respeitando contratos de Confidencialidade entre o IPT e o contratante do laudo. Desta forma foram utilizados como fonte de informação, artigos que tiveram acesso ao laudo. Tais artigos foram: “IPT aponta má qualidade da obra” em O Estado de S. Paulo, 07 de junho de 2008. “Erros e negligência de consórcio provocaram a tragédia no Metrô” em Jornal Hora do Povo, Edição 2662, 30 de abril de 2008.
7
A uniformização dos critérios de aplicação dos símbolos, sinais, logotipos, cores e avisos veiculados na sinalização das estações, das obras e impressos do Metrô pode ser consultado em: SÃO PAULO (Estado). Companhia do Metropolitano de São Paulo. “Manual de Identidade Visual”. São Paulo, 1981. 8
Para um relato mais completo deste e dos parágrafos a seguir, ver: MORI, Klara Kaiser (1991) “Rede de Metrô 2010 – Parâmetros Espaciais”. 9
A partir do artigo: “A vida na cidade dentro da cidade” em O Estado de S. Paulo, 29 de agosto de 2011. 1 0
SÃO PAULO (Estado) Companhia do Metropolitano de São Paulo. Pesquisa Origem e Destino 2007. São Paulo, 2009. 1 1
A partir dos artigos: “Custo da ampliação da Marginal do Tietê já é 75% maior do que o previsto” em O Estado de S. Paulo, 10 de julho de 2011. “Custo da Nova Marginal sobe e beira R$ 1,9 bi.” em Folha de S. Paulo, 22 de outubro de 2009. NOBRE, Eduardo “Eduardo Nobre comenta a prioridade urbanística da ampliação da Marginal Tietê” em Revista Arquitetura e Urbanismo, 2010.
1 2
MOSES, Robert. Programa de Melhoramentos Públicos para a cidade de São Paulo. New York. International Basic Economy Corporation, 1950. 1 3
Quadro Comparativo dos Recursos Financeiros - 2011/2010 em SÃO PAULO (Estado) Companhia do Metropolitano de São Paulo. Relatório da Administração 2011. São Paulo, 2012 1 4
P.226
Tema abordado em profundidade em FRANCO, Fernando de Mello (2005) “A Construção do Caminho: A estruturação da metrópole pela conformação técnica das várzeas e planícies fluviais da Bacia de São Paulo”. Tese de Doutoramento, FAU USP 1 5
Foi utilizada neste caso, a denominação das Zonas OD proposta na Pesquisa Origem e Destino de 1997, sendo que em 2007 diversas Zonas foram redefinidas. 1 6
Processo abordado em profundidade em VILLAÇA, Flávio e ZIONI, Silvana (2005) “Rede de transportes de sobre trilhos na Região Metropolitana de São Paulo”. Relatório de Pesquisa da FAPESP. 1 7
Para uma panorama mais completo, ver: ROLNIK, Raquel e KLINTOWITZ, Danielle (2011) “(I)Mobilidade na cidade de São Paulo”.
1 8
Tabela Benefícios Sociais em 2012 em SÃO PAULO (Estado) Companhia do Metropolitano de São Paulo. Relatório da Administração 2012, página 32. São Paulo, 2013. 1 9
Assim como apontado por PONTES, Fábio Martini (2010) “Diretrizes de Projeto para a Ampliação da Rede de Metrô de São Paulo”. Trabalho Final de Graduação. 2 0
Para consultar a metodologia adotada na estimativa, ver: Sistema de “Projeções Populacionais para os municípios do Estado de São Paulo”. Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (2012). 2 1
Dados levantados por: CARVALHO, Bruno Taiar de (2010) “Infraestrutura de Transportes Metropolitanos como Elemento Organizador do Espaço Urbano”. Trabalho Final de Graduação. PONTES, Fábio Martini (2010) “Diretrizes de Projeto para a Ampliação da Rede de Metrô de São Paulo”. Trabalho Final de Graduação. 2 2
Para mais detalhes, ver: BRUTON, Michael J. (1979) “Introdução ao Planejamento dos Transportes”. Rio de Janeiro. Editora Interciência Ltda.
P.228
2 3
Deve ser destacado no entanto, que há uma diferença com os dados contabilizados pela CPTM, que apresentou um valor quase duas vezes maior em relação à Pesquisa OD no mesmo ano de 2007. Este desencontro se deu em função da metodologia adotada pela Pesquisa OD na categorização das viagens realizadas. Um único modo principal é atribuído a cada viagem de acordo com uma ordem pré-definida na qual o metrô é o modo dominante. Este fato, para além do descompasso estatístico, expressa a intensa integração entre os trens metropolitanos e a rede metroviária em São Paulo apesar das dificuldades impostas tanto pela escassez de integração não tarifada como pela fragilidade de micro acessibilidade das estações intermodais. 2 4
Ver Capítulo 2, “A Evolução Pré-Metropolitana dos Arredores Paulistanos (1875-1915)” em LANGENBUCH, Juergen Richard (1971). “A Estruturação da Grande São Paulo – Estudo de Geografia Urbana”. Tese de Doutorado. IBG, Dept. de Documentação e Divulgação Geográfica e Cartográfica, Rio de Janeiro. 2 5
Como apontado anteriormente no item Deslocamentos, no capítulo 2 deste estudo.
P.230
B I B L I O G R A F I A
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