Design Thinking para Inovação Social (TCC)

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BRUNO MARTINS RIZARDI

DESIGN THINKING PARA INOVAÇÃO SOCIAL

Londrina 2017


BRUNO MARTINS RIZARDI

DESIGN THINKING PARA INOVAÇÃO SOCIAL

Tr a b a l h o d e C o n c l u s ã o d e C u r s o apresentado ao Departamento de Design da Universidade Estadual de Londrina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Design Gráfico. Orientador: Prof.a Dr.a Ana Luisa B. Cavalcante

Londrina 2017

L.


BRUNO MARTINS RIZARDI

DESIGN THINKING PARA INOVAÇÃO SOCIAL Tr a b a l h o d e C o n c l u s ã o d e C u r s o apresentado ao Departamento de Design da Universidade Estadual de Londrina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Design Gráfico. Orientador: Prof.a Dr.a Ana Luisa B. Cavalcante

L.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________ Orientadora: Profa. Dra. Ana Luisa B. Lustosa Cavalcante Universidade Estadual de Londrina - UEL

____________________________________ Profa. Dra. Rosane Fonseca de F. Martins Universidade Estadual de Londrina - UEL

____________________________________ Prof. Me. Paulo Rafael de Souza Santana Universidade Estadual de Londrina - UEL

Londrina, _____de ___________de _____.

Londrina 2017


AGRADECIMENTOS

Agradeço a minha orientadora pela paciência, apoio e aprendizado, muito mais como uma profissional a quem admiro e me espelho, também como grande amiga. Agradeço a minha mãe por ser uma figura de inspiração e de força, a pessoa a quem mais respeito por todos os sacrifícios e resiliência. Agradeço aos movimentos, Social Good Brasil e Movimento Choice, por me acolherem e me mostrarem que um mundo melhor é possível. Que o otimismo pode superar o pessimismo e que podemos pensar em um mundo de abundância e não de escassez. Agradeço ao movimento social LGBTQ, que ajudou a me empoderar e a me desenvolver como ser humano.


Todos somos designers. Victor Papanek 


RIZARDI, Bruno Martins, Design Thinking para Inovação Social. 2017. 134 folhas. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Design Gráfico) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2017. RESUMO O presente trabalho apresenta uma reflexão sobre o papel do design e do designer na sociedade, traçando uma análise histórica da aplicação do design ao desenvolvimento socioeconômico, assim como os efeitos desta no processo de desenvolvimento de soluções. Entendendo o design como uma abordagem e sua ramificação com o design thinking, busca-se entender como tais processos podem contribuir para a construção de inovação para populações de baixa-renda ou em estado de vulnerabilidade social, caracterizando, assim, uma inovação social. Para a construção deste trabalho, realizou-se pesquisa quantitativa por meio de questionário, seguido de uma pesquisa bibliográfica e análise de conteúdo, implicando, desta maneira, uma curadoria de conteúdos relacionados a design thinking e inovação social. Por fim, manual de Design Thinking para Inovação Social foi desenvolvido como produto de design editorial, com o intuito de orientar estudantes universitários de diversas áreas a utilizar a abordagem do design em comunidades para criação de inovação social, trazendo assim uma contrapartida à sociedade e buscando expandir o conhecimento e aplicação acadêmica para além dos muros da universidade. Palavras-chave: Inovação Social. Design Thinking. Design e Sociedade.


RIZARDI, Bruno Martins, Design Thinking for Social Innovation. 2017. 134 leaves. Work Completion of course (Diploma in Graphic Design ) - State University of Londrina, Londrina, 2017. ABSTRACT The following work presents a reflection on the role of design and the designer in society, tracing a historical analysis of the application of design to socioeconomic development, as well as its effects in the process of solutions development. Understanding design as an approach and its ramification as design thinking, thiw work seeks to understand how such processes can contribute to the construction of innovation for low-income and social vulnerable populations, thus characterizing a social innovation. For this work's construction, a quantitative research was carried out by a questionnaire application, followed by a bibliographical research and content analysis, implying in a curation of knowledge related to design thinking and social innovation. Finally, a manual of Design Thinking for Social Innovation was developed as a product of editorial design for digital publication, which purpose is to guide university students from different areas to use the design approach in communities, creating social innovation, thus bringing a counterpart to society and seeking to expand academic knowledge and its application beyond the walls of the university. Palavras-chave: Social Innovation. Design Thinking. Design and Society.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Escada Virtuosa do Design e do Desenvolvimento ..............................20 Figura 2 – Novos espaços de design emergindo ...................................................22 Figura 3 – Espaços da cultura de inovação ...........................................................61 Figura 4 – Painel de Referências ...........................................................................85 Figura 5 – Estudo conceitual 1...............................................................................87 Figura 6 – Estudo conceitual 2..............................................................................88 Figura 7 – Estudo conceitual 3...............................................................................89 Figura 8 – Estudo conceitual 4...............................................................................90 Figura 9 – Estudo conceitual 5...............................................................................91 Figura 10 – Estudo Visual 1 ...................................................................................92 Figura 11 – Estudo Visual 2 ...................................................................................92 Figura 12 – Estudo Visual 3 ...................................................................................93 Figura 13 – Estudo Visual 4 ...................................................................................93 Figura 14 – Capa, página 1....................................................................................95 Figura 15 – Páginas 2 e 3 ......................................................................................95 Figura 16 – Páginas 4 e 5 ......................................................................................96 Figura 17 – Páginas 6 e 7 ......................................................................................96 Figura 18 – Páginas 8 e 9 ......................................................................................97 Figura 19 – Páginas 10 e 11 ..................................................................................97 Figura 20 – Páginas 12 e 13 ..................................................................................98 Figura 21 – Páginas 14 e 15 ..................................................................................98 Figura 22 – Páginas 16 e 17 ..................................................................................99 Figura 23 – Páginas 18 e 19 .................................................................................99 Figura 24 – Páginas 20 e 21 ..................................................................................100 Figura 25 – Páginas 22 e 23 ..................................................................................100 Figura 26 – Páginas 24 e 25 ..................................................................................101 Figura 27 – Páginas 26 e 27 ..................................................................................101 Figura 28 – Páginas 28 e 29 .................................................................................102 Figura 29 – Páginas 30 e 31 ..................................................................................102 Figura 30 – Páginas 32 e 33 ..................................................................................103 Figura 31 – Páginas 34 e 35 ..................................................................................103 Figura 32 – Páginas 36 e 37 ..................................................................................104


Figura 33 – Páginas 38 e 39 ..................................................................................104 Figura 34 – Páginas 40 e 41 ..................................................................................105 Figura 35 – Páginas 42 e 43 ..................................................................................105 Figura 36 – Páginas 44 e 45 ..................................................................................106 Figura 37 – Páginas 46 e 47 ..................................................................................106 Figura 38 – Páginas 48 e 49 ..................................................................................107 Figura 39 – Páginas 50 e 51 ..................................................................................107 Figura 40 – Páginas 52 e 53 ..................................................................................108 Figura 41 – Páginas 54 e 55 ..................................................................................108 Figura 42 – Páginas 56 e 57 ..................................................................................109 Figura 43 – Páginas 58 e 59 ..................................................................................109 Figura 44 – Contra-capa, página 60 ......................................................................110 Figura 45 – Grid .....................................................................................................111 Figura 46 – Família Cassannet .............................................................................112 Figura 47 – Família Bebas Neue ...........................................................................112 Figura 48 – Família Oswald ...................................................................................112


LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Seções e capítulos do manual ..............................................................59 Tabela 2 – Cores Utilizadas....................................................................................113


LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Inovação Social em Organizações Sociais .........................................34 Quadro 2 – Inovação Social em Movimentos Sociais ............................................34 Quadro 3 – Inovação Social na Política .................................................................35 Quadro 4 – Inovação Social no Governo ...............................................................35 Quadro 5 – Inovação Social no Mercado ...............................................................36 Quadro 6 – Inovação Social na Academia .............................................................37


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BOP

Base of Pyramid

CEO

Chief Executive Officer

CMYK

Cyan, Magenta, Yellow, Black

DNP

Desenvolvimento de Novos Produtos

IBGE

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IBOPE

Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística

ICSID

International Council of Societies of Industrial Design

HCD

Human Centered Design

ONU

Organização das Nações Unidas

PNUD

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

RGB

Red, Green, Blue

UCD

User Centered Design

UNIDO

United Nations Industrial Development Organization

UNDP

United Nations Development Program


SUMÁRIO 1

INTRODUÇÃO .......................................................................................12

1.1

PROBLEMA ...............................................................................................15

1.2

OBJETIVOS ...............................................................................................15

1.2.1

Objetivo Geral .........................................................................................15

1.2.2

Objetivos Específicos .............................................................................15

1.3

JUSTIFICATIVA ...........................................................................................16

1.4

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ...........................................................16

2

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................17

2.1

DESIGN SOCIAL ........................................................................................17

2.1.1

Design para Inovação Social ..................................................................26

2.1.1.1

Como acontecem as mudanças .............................................................29

2.1.1.2

Condições para inovação social .............................................................30

2.1.1.3

Estágios e processo da inovação social .................................................31

2.1.1.4

Contextos de inovação social .................................................................33

2.1.1.4.1 Inovação social em organizações sociais ...............................................34 2.1.1.4.2 Inovação social em movimentos sociais.................................................34 2.1.1.4.3 Inovação social na política......................................................................34 2.1.1.4.4 Inovação social no governo ....................................................................35 2.1.1.4.5 Inovação social no mercado ...................................................................36 2.1.1.4.6 Inovação social na academia .................................................................36 2.2

GESTÃO DE DESIGN ..................................................................................37

2.2.1

Gestão de Design e Inovação ................................................................38

2.2.1.1

Gestão de design para inovação social ..................................................41

2.2.1.1.1 Human centered design ..........................................................................43 2.2.1.1.2 The base of pyramid protocol .................................................................45 2.2.1.1.3 UNDP (united nations development program) ........................................46 2.2.1.1.4 The open book for social innovation .......................................................48 2.3

NEGÓCIOS DE IMPACTO SOCIAL .................................................................49

2.3.1

Case: Programa Vivenda........................................................................50

2.3.2

Case: Kickstart International ...................................................................50


3

METODOLOGIA DE PESQUISA ...........................................................52

3.1

QUESTIONÁRIO .........................................................................................53

3.1.1

Análise ....................................................................................................54

3.2

ANÁLISE DE CONTEÚDO .............................................................................55

4

METODOLOGIA DO PROJETO ............................................................57

4.1

CONCEITUAÇÃO ........................................................................................58

4.1.1

Estrutura do Material Didático ................................................................58

4.1.1.1

Manifesto ................................................................................................59

4.1.1.1.1 Por um design engajado .........................................................................59 4.1.1.2

Antes de começar ...................................................................................60

4.1.1.2.1 Cultura de inovação ................................................................................62 4.1.1.2.2 Mindsets .................................................................................................64 4.1.1.2.3 Ferramentas ...........................................................................................66 4.1.1.3

Design para inovação social ...................................................................67

4.1.1.3.1 Panorama geral ......................................................................................67 4.1.1.3.2 Imersão ...................................................................................................67 4.1.1.3.3 Ideação ...................................................................................................72 4.1.1.3.4 Prototipagem ..........................................................................................75 4.1.1.3.5 Desenvolvimento ....................................................................................76 4.1.1.3.6 Engajamento...........................................................................................78 4.1.1.3.7 Implementação .......................................................................................80 4.1.1.3.8 Acompanhamento ...................................................................................82 4.1.2

Projeto Gráfico ........................................................................................84

4.1.2.1

Linguagem visual ....................................................................................84

4.1.2.2

Painel de referências ..............................................................................85

4.2

GERAÇÃO DE ALTERNATIVAS......................................................................86

4.2.1

Estudos Conceituais ...............................................................................86

4.2.2

Estudos Visuais ......................................................................................92

5

RESULTADOS .......................................................................................94

5.1

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ..................................................................94

5.2

ALTERNATIVA ADOTADA: REPRESENTAÇÃO VISUAL DO PRODUTO ................94

5.3

VIABILIDADE DE EXECUÇÃO .......................................................................110


5.4

MEMORIAL DESCRITIVO .............................................................................110

5.4.1

Formato e Grid........................................................................................111

5.4.2

Tipografia ................................................................................................111

5.4.3

Paleta de Cores ......................................................................................113

6..............CONCLUSÃO .........................................................................................114 ................REFERÊNCIAS ......................................................................................117 ................APÊNDICES ...........................................................................................122


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1 INTRODUÇÃO

A Universidade está notoriamente distante da sociedade. No Brasil, a educação passou de um direito a um serviço que pode ser privatizado e, como consequência, a universidade passou de instituição social para organização prestadora de serviços. Enquanto uma instituição social, segundo Chauí (2003), caracteriza uma prática social autônoma e cuja legitimidade e atribuições lhes são aferidas pelo reconhecimento popular, a organização prestadora de serviços é definida por sua instrumentalidade, direcionada por seus objetivos particulares. Assim sendo, a universidade pública passa a ser definida por estratégias de eficácia e sucesso, quais sejam, g estão, planejamento, previsão, controle e êxito, desvinculando-se, assim, da prerrogativa dos questionamentos de sua própria existência, função e posição em relação à luta de classes. A universidade, doravante, se desvincula dos aspectos dialéticos da sociedade e se enclausura em uma dinâmica de produção sistemática do conhecimento. Isso se dá porque a universidade pública se rende aos mecanismos econômicos de produção e retenção do saber. Em uma sociedade do conhecimento, a informação se cristaliza como uma commodity e o controle da mesma e do seu processo produtivo caracteriza um poderio financeiro e econômico por parte de empresas e países. Em resumo: a noção de sociedade do conhecimento, longe de indicar uma possibilidade de grande avanço e desenvolvimento autônomo das universidades enquanto instituições sociais comprometidas com a vida de suas sociedades e articuladas a poderes e direitos democráticos, indica o contrário; isto é, tanto a heteronomia universitária (quando a universidade produz conhecimentos destinados ao aumento de informações para o capital financeiro, submetendo-se às suas necessidades e à sua lógica) como a irrelevância da atividade universitária (quando suas pesquisas são autonomamente definidas ou quando procuram responder às demandas sociais e políticas de suas sociedades). (CHAUÍ, 2003, p.9).

Assim sendo, a universidade tem construído conhecimentos que muitas vezes não se preocupam com as problemáticas sociais, ou seja, as comunidades que entornam a instituição não se beneficiam de suas produções diretamente - se tornam reféns das lógicas do mercado para que o conhecimento lhes seja acessível. Isso constitui um desmantelamento da universidade enquanto instituição social, atribuindo sua prerrogativa ao mercado e não à sociedade que financia seu


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funcionamento. A universidade, enquanto instituição pública, deve se comprometer com a sociedade e colocar suas temáticas como ponto-chave na produção de conhecimento. A educação superior, por mais que se transforme, não pode ser renuente a seu papel de formação intelectual e moral, ao mesmo tempo que de desenvolvimento material das sociedades, por meio das atividades públicas de construção e promoção de conhecimentos e valores. A educação superior é um patrimônio público na medida em que exerce funções de caráter político e ético, muito mais que uma simples função instrumental de capacitação técnica e treinamento de profissionais para as empresas. Essa função pública é a sua responsabilidade social. (SOBRINHO, 2005, p. 170).

Essa descaracterização da universidade como instituição social e a orientação direcionada à eficiência também é notada na formação dos graduandos, que se formam rapidamente para entrar no mercado de trabalho, no qual em poucos anos serão descartados por se tornarem ultrapassados. O ensino tecnocrata das universidades, aliado ao desligamento em relação às problemáticas da sociedade, gradua jovens com pouca perspectiva crítica e criativa, apenas capazes de repetir aquilo que lhes fora ensinado. Assim sendo, o universitário não é estimulado a pensar criativamente em seu processo formativo, resultando em um profissional técnico com poucas ferramentas para lidar com os problemas complexos do mercado e sociedade. Isso se dá porque o ensino tradicional vem sendo demarcado pela rigidez de um processo de transmissão vertical de conhecimento, legitimado pelas estruturas hierárquicas de conhecimento científico atribuídas em regime acadêmico. Essa educação formalizada pela transmissão do saber científico não estimula o discente a questionar e quebrar paradigmas existentes, vendo-se obrigado a aceitar o conhecimento científico como uno e intangível. Pela ótica da transmissão, o conhecimento fica circunscrito a uma síntese comprovada pela autoridade intelectual do professor e passa a ser um conjunto de informações registradas pelos alunos-ouvintes, para garantir aprovação em exames avaliativos. Assim, o processo de ensino-aprendizagem pouco contribui com o desenvolvimento do pensamento questionador e criativo dos alunos, e mantém a cultura de reprodução tradicional, num ciclo de transmissão-reproduçãotransmissão que precisa ser revitalizado, pois fazer ciência sugere, também, subjetividade e criatividade. (BARRETO, 2007, p. 4).

Nesse sentido, o saber científico e técnico é instituído como principal forma de perceber o mundo, dispensando o pensamento criativo. A universidade, como


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ambiente formativo de futuros cidadãos e profissionais, deve se responsabilizar pela

criação de um ambiente que estimule o pensamento crítico, reflexivo, transformador e criador, para que os paradigmas gerados pelo saber científico possam ser mudados consoantes à complexidade da sociedade em que nos encontramos, deixando de produzir profissionais preocupados apenas em repetir os saberes construídos historicamente e desenvolvendo profissionais capazes de um pensamento inovador. O design oferece uma abordagem que estimula a criatividade, integrando-a ao pensamento científico tão presente na universidade. O design é uma forma de pensar quando se está atacando um problema; é o planejamento do processo de resolução de problema por meio de criatividade e intuição aliadas a uma leitura analítica do contexto que cerca o problema em questão e prototipação iterativa de soluções. Entretanto, o design também se encontra instrumentalizado pela lógica capitalista de produção, estando defasado enquanto atividade profissional criativa que busca a resolução de problemas sociais em decorrência de sua representação cada vez mais confusa na própria sociedade em que atua. Hoje, esta sociedade tem uma ideia reduzida sobre o que é o Design, indicando que este faz parte apenas de um processo que concede valor a determinado produto, empresa ou serviço. Uma vez que sua prática modifica e molda a sociedade, o Design não pode existir separadamente da mesma. Assim como é por ela adaptado, é visível que as produções de Design têm se dado de maneira industrial e predatória, não abordando as reais necessidades e problemas da sociedade, principalmente no que tange as comunidades de baixa renda, visto que o sistema capitalista atual não enxerga essa parcela da população como clientes economicamente viáveis. O design para inovação social então surge como uma abordagem sensível a questões sociais e promove soluções específicas para comunidades em condição de vulnerabilidade, buscando a interação entre design, sociedade e novas possibilidades projetuais que gerem soluções coletivas em contextos sociais cada vez mais globalizados. Aliado à gestão de design, o design para inovação social traz resultados inovadores para problemas sociais, preconizando um processo fluido e orgânico, caracterizado pela iteração contínua das soluções, co-design1 e resolução

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Para Sanders e Stappers, (2008, tradução nossa) o co-design "refere-se à criatividade de designers e pessoas que não são treinadas em design trabalhando juntos no processo de desenvolvimento de design”.


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criativa de problemas, resultando em um planejamento customizado para a solução de determinada situação. A universidade, neste sentido, poderá resistir à lógica mercadológica e academicista de produção de informação, desenvolvendo práticas disruptivas de

ensino que levarão ao desenvolvimento de conhecimentos inovadores e aplicáveis às comunidades que financiam e cercam aquela instituição, retribuindo a elas o investimento e consolidando sua responsabilidade social ao dar o devido acesso da população a essa produção.

1.1

PROBLEMA O design em seu contexto histórico e sociopolítico possui uma abordagem

com foco na complexidade das questões sociais como apontou Papanek (1984), Cardoso (2012) e outros. Deste modo, a questão principal se configura em como o ensino do design com foco no impacto social inserido em um grupo de universitários pode colaborar na solução de um problema de ordem social? 
 1.2

OBJETIVOS

1.2.1

Objetivo Geral •

Desenvolver uma publicação digital para um público multidisciplinar de universitários, promovendo o aprendizado em conhecimentos sobre design operacional, inovação social e negócios de impacto social.

1.2.2

Objetivos Específicos •

Propor procedimentos metodológicos de inovação social a universitários de diversos cursos.

Elaborar publicação digital abordando a temática de design thinking para inovação social.

Estimular a aplicação de design thinking por universitários em comunidades de baixa-renda.


1.3

JUSTIFICATIVA

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A integração do design como abordagem e plataforma de aplicação de conhecimentos acadêmicos na sociedade permite uma reaproximação do público universitário com as problemáticas sociais. Com este objetivo, busca-se empoderar os universitários dos conhecimentos relativos a design thinking, oferecendo a estes ferramentas tangíveis para geração de inovações sociais. Buscando a riqueza do conhecimento coletivo e a integração universitária, implica-se que estes procedimentos sejam realizados por grupos multidisciplinares de universitários. Assim como é necessário que um grupo de diferentes especializações esteja envolvido na aplicação dos procedimentos propostos, também é fundamental que estes sejam feitos em contextos reais, ou seja, em comunidades de baixa-renda ou que esteja sob alguma vulnerabilidade social. Assim sendo, este processo busca reaproximar o público acadêmico de problemáticas reais e urgentes de nossa sociedade. Por fim, por se caracterizar como uma ferramenta open-source, o material disponível estará disponível para download e aberto a modificações e alterações pelos próprios aplicadores, caracterizando-se como uma ferramenta orgânica e flexível. Também é importante ressaltar que a característica open-source deste material objetiva o uso do mesmo por populações de baixa-renda que, uma vez empoderadas do processo de design, possam resolver seus próprios problemas de maneira criativa. 1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para a metodologia científica, será realizada uma pesquisa quali-quantitativa, primeiramente levantando dados quantificáveis em um levantamento com estudantes universitários para a o diagnóstico do ensino criativo na universidade, para então elaboração, com base em pesquisa bibliográfica e em cases, de uma manual de design thinking para inovação social, cujo conteúdo será desenvolvido de acordo com um levantamento bibliográfico e análise de conteúdo, para posterior desenvolvimento dos tópicos e capítulos que comporão o material gráfico.


2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

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2.1 DESIGN SOCIAL O design social é uma vertente que se preocupa com o desenvolvimento de projetos que se orientem para a solução de problemas de grupos sociais ou da sociedade. Atendendo a setores como educação, saúde, habitação, pobreza, entre outros, visa à melhoria das condições de vida e de acesso das porções menos privilegiadas da sociedade a serviços e produtos que satisfaçam seus desejos e necessidades. Combina tecnologia, inovação, estudos etnográficos e co-design para trazer inovação social para seu público foco. Papanek (1984) define design, separando-o em seis partes: método, uso, telesis2, necessidade, estética e associação. Ao definir a necessidade, o autor é enfático: o design produzido preocupava-se muito mais em satisfazer necessidades passageiras e supérfluas definidas pela moda a atender a necessidades reais e constantes. Em Design for the Real World (1984), Papanek advoga por um pensamento anticonsumista, contrastando a superficialidade dos produtos de design nos países industrializados aos problemas básicos e ausência de produtos primordiais em países emergentes (na época denominados países de terceiro mundo). O autor pregava aos designers de países desenvolvidos que projetassem para países periféricos, com vistas à promoção do acesso a produtos básicos e necessários para melhoria da qualidade de vida. Papanek, na verdade, havia criado em Design for the Real World uma oposição binária entre a irresponsabilidade e o desperdício dos produtos criados pelos designers do Primeiro Mundo e os produtos mais significativos que ele e seus alunos haviam projetado para usuários do Terceiro Mundo (MARGOLIN, 2015, p.18).

Entretanto, Bonsiepe (1991 apud MARGOLIN, 2015) problematiza essa visão, apontando que tal iniciativa consiste em uma abordagem colonialista, uma vez que os produtos seriam desenvolvidos em total desconexão com as populações que pretendiam atingir. Além disso, a abordagem de Papanek se caracterizava pelo uso

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Papanek (1985) descreve telesis como a utilização proposital dos processos da natureza e da sociedade na busca de um objetivo específico. Para o autor, o conteúdo de um objeto de design deve refletir o tempo e o contexto em que foi criado e deve se encaixar na ordem socioeconômica na qual ele opera.


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de baixas tecnologias e mão de obra intensiva, que para Alpay Er (2015), esse tipo de produção não propõe um desenvolvimento de design industrial nesses países.

Bonsiepe (MARGOLIN, 2015), por outro lado, pregava uma prática desenvolvimentista do design, na qual o design industrial seria uma alavanca para a industrialização de países periféricos e, por conseguinte, desenvolvimento da sociedade e melhoria da qualidade de vida. O autor, entretanto, reconhece que essa abordagem pode se mostrar problemática, uma vez que a industrialização de um país não significa necessariamente o desenvolvimento social, podendo os meios de produção e o capital se encontrarem concentrados somente a uma pequena parcela da população. […] Não podemos falar de industrialização em termos abstratos, neutros. Devemos perguntar pelo conteúdo e pela orientação da industrialização: qual industrialização? Explico-me: nesse momento, em vários países latino-americanos, ocorrem a céu aberto explorações de recursos minerais altamente contaminadoras e consumidoras de água, que prejudicam a população local e a sua agricultura. Essa forma de industrialização não somente me parece daninha, mas também contraproducente aos interesses da população local, beneficiando somente alguns políticos locais e os capitais de investimento, nada mais (PATROCÍNIO; NUNES, 2015, p. 81).

As abordagens propostas por Papanek (1984) e Bonsiepe (1973) não se caracterizam como opostas, mas complementares. Enquanto o primeiro se preocupava com um design voltado às populações em condições precárias, o segundo pregava a transferência do processo do design para países periféricos. Assim, as duas abordagens em conjunto caracterizariam um design local voltado a práticas sociais para o desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida das populações de países emergentes. Em outras obras, o autor [Bonsiepe] coloca um forte destaque na diferença entre os países que historicamente exportavam matériasprimas e importavam produtos acabados, prática que ainda caracteriza grande parte do mundo em desenvolvimento, e aqueles que produzem bens acabados para seu próprio consumo e também para exportação. Claramente, estes últimos são os que perpetuam a vantagem assimétrica, de modo que Bonsiepe constantemente incita os países em desenvolvimento a incluírem o design em seus setores industriais. Por outro lado, a abordagem de Papanek, acolhida por muitos designers quando tratam da ideia de design para o desenvolvimento, corresponde muito mais a um aspecto específico do planejamento social, conhecido como desenvolvimento comunitário. Essa ideia é atualmente conservada em grande parte pelo Terceiro setor, que é composto principalmente de organizações locais e internacionais dedicadas à promoção social, incluindo a redução da pobreza (MARGOLIN, 2015, p.24).


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É importante ressaltar, portanto, que a prática de um design voltado a sociedade não pode ser desenvolvida de forma colonialista, ou seja, fora do contexto e desconectado com as populações que se pretende atingir. Em países emergentes, é papel de seus designers desenvolver tecnologias e soluções para problemas sociais, sem importá-las de países centrais, uma vez que os produtos destes países não se fazem eficazes fora de seu contexto (telesis). Nesse sentido, Bonsiepe (1973), ao escrever sobre políticas nacionais de design em documento denominado Development through design, requisitado pelo ICSID (International Council of Societies of Industrial Design) para a UNIDO (United Nations Industrial Development Organization), pontua o papel do design industrial para o desenvolvimento em países periféricos. Entre outros apontamentos, o autor cita que o design nesses países é importante porque a produção de designs nacionais faz com que os países possam “alocar suas reservas em divisas e seus rendimentos para fins produtivos, ou seja, direcionar esses recursos financeiros para criação de uma diversificada estrutura tecnológica” (item i), na qual os produtos respeitarão as limitações e necessidades locais (item ii), estimulando a cultura e identidade nacional em que “[…] o design industrial pode ajudar a criar esta identidade, superando o estado de cultura de segunda mão dos países em desenvolvimento” (item vi) e poderão trabalhar no “[…] desenvolvimento de produtos para atender às necessidades das maiorias pobres” (item ix). (BONSIEPE, 1973, p. 242). Em uma posterior releitura deste documento, em entrevista concedida a Nunes e Patrocínio (2015), Bonsiepe avalia:

Considero que o teor básico do documento de reduzir a dependência e aumentar a autonomia mantém a mesma relevância de quatro décadas atrás. Esse é o caminho ao qual as políticas de desenvolvimento podem ou poderiam, devem ou deveriam, destinarse. Obviamente, uma política com tal orientação pode entrar em conflito com interesses antagônicos, tanto internos como externos, que não veem com simpatia, mas sim com desconfiança, esses esforços. Em não poucos aspectos, lida-se com uma realidade que, pela falta de um melhor termo, se chama “neocolonialismo”. É aí que se encontra a diferença fundamental em relação ao design - e às políticas de design - nos países centrais (NUNES; PATROCÍNIO, 2015, p. 77).


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Para Patrocínio (2015, p.68), Papanek “exclui os usuários do processo de design, e delega ao designer a atribuição de determinar quais são as necessidades dos outros”. O autor sintetiza que Papanek advogava o design para, enquanto Bonsiepe pregava o design com. Patrocínio (2015) desenvolve essa noção ao propor a Escada Virtuosa do Design e Desenvolvimento, observada na figura 1, na qual o autor descreve o processo de implementação do design em empresas ou no governo. Nesse modelo, “evolui-se por quatro degraus consecutivos, desde um estágio de dependência em direção a um estágio de autonomia do design” (PATROCÍNIO, 2015, p.69). São estes degraus (em ordem subsequente): Design para - exógeno, no qual é claro o aspecto intervencionista e assistencialista, vindo a ação de uma força externa e não nativa; Design em - imersivo, supondo-se que o designer não nativo se estabeleça no lugar de atuação, absorvendo os aspectos locais; Design com - participatório, caracterizado por parcerias com designers locais, onde o designer não nativo tem a função de trazer novos conhecimentos, mas ainda numa relação de liderança; e Design por - autônomo, estágio final, sendo o design produzido e exercido por locais, sem que haja uma situação de hierarquia entre os designers nativos e não nativos. Figura 1 - Escada Virtuosa do Design e do Desenvolvimento.

DESIGN POR (autônomo)

DESIGN COM (participatório)

DESIGN EM (imersivo)

DESIGN PARA (exógeno)

estágio de autonomia

estágio de intercâmbio 
 e parcerias

estágio de intercâmbio 
 e descoberta

estágio de dependência

Fonte: PATROCÍNIO, 2015, p. 69.

É possível traçar um paralelo com o levantamento da evolução do design realizado por Sanders (2006). Em seu trabalho, a autora descreve a transformação do papel exercido pelas pessoas no processo de design - algo que transparece nas


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nomenclaturas atribuídas a estas durante as décadas. De “clientes” e

“consumidores” nos anos 80, passando por “usuários" nos anos 90, caracterizado pelo surgimento dos computadores e interfaces digitais, hoje encontramos diferentes níveis de participação das pessoas no design, como “adaptadores” dos produtos disponíveis no mercado a "participantes" no processo criação. A evolução dos papeis exercidos pelas pessoas catalisou o surgimento de pessoas co-criadoras no processo de design. Esta evolução se vê refletida na alteração dos espaços de design existentes (figura 2). O design tradicional visava apenas a estimular o consumo, com produtos que atendiam somente às necessidades da indústria, sem levar em conta os feedbacks dos usuários. O desenvolvimento de softwares fez com que o design a serviço dos usuários ganhasse força, a fim de facilitar as interações entre as pessoas e a tecnologia. Com a chegada da internet, surgiu o design a serviço dos adaptadores, no qual as pessoas passaram a ter maior capacidade de busca e escolha de produtos extremamente específicos. O aumento da interação entre pessoas de todo o mundo estimulou o surgimento do design a serviço dos participantes, em que os produtos e serviços passam a ser uma experiência compartilhada por pessoas de diversos lugares. Por fim, o reconhecimento do papel das pessoas no processo criativo permitiu a ascensão do design a serviço dos co-criadores, no qual o processo de design conta com a habilidade criativa das pessoas comuns para desenvolvimento de novos produtos e serviços, permitindo um design mais imersivo, humano e colaborativo. Esses dois modos de perceber a relação entre o design e pessoas indica que existe uma evolução do processo de design, ou seja, existem níveis mais básicos de interação entre pessoas e design, resultando em produtos menos assertivos e eficientes, e níveis com maior colaboração entre as duas partes, resultando em um processo criativo em conjunto, com produtos que satisfaçam as necessidades das pessoas. Nesse sentido, é importante pensar no design não somente como um profissional criativo, mas como um facilitador da criatividade, trazendo pessoas de diversas áreas, potenciais usuários do produto e demais stakeholders de um ecossistema a coletivamente projetar uma solução para determinado problema.


!22 Figura 2 - Novos espaços de design emergindo.

Design a serviço dos co-criadores Design a serviço dos participantes Design a serviço dos adaptadores Design a serviço dos usuários

Fonte: SANDERS, 2006, p. 31.

Além disso, o designer tem responsabilidade sobre o que produz: uma ferramenta que cause ferimentos, uma embalagem que polua o meio-ambiente ou um objeto com pouco estudo ergonômico ou sem ergonomia de concepção são exemplos do mau design, que permeia a sociedade pós-industrial. O designer possui a responsabilidade de trazer à sociedade produtos que sejam feitos pensando no usuário final e não nas necessidades das indústrias.

Diante da magnitude do problema ambiental que é o acúmulo de lixo, compete a todos contribuir para soluções coletivas. Mas o que o design pode fazer nesse sentido? Os designers não controlam políticas públicas, não comandam as redes de fabricação e nem são responsáveis pelo desenvolvimento de novos materiais e tecnologias. Além de descartar menos e reciclar mais - algo que está ao alcance de qualquer indivíduo, independente de sua profissão pode parecer que há muito pouco a ser feito na hora de projetar. Um ou outro profissional pode se negar a gerar novos artefatos, alegando que não quer contribuir para o acúmulo de coisas no mundo, mas isso não vai impedir que outras pessoas o façam. Contudo, existem sim contribuições importantes que podem ser feitas na etapa do projeto, contanto que se entenda o ciclo de vida do produto de modo mais abrangente (CARDOSO, 2011, p.156).

Mudanças incrementais em objetos para garantir apenas pequenos aumentos nos dividendos das empresas podem não ser a melhor solução para a


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produção de designs mais coerentes com o mundo complexo em que vivemos. O

pensamento industrial tradicional ainda se inclina ao projeto voltado para o objeto, em detrimento do contexto em que se encontra. O design voltado àquilo que existe (seja em seu aspecto conceitual ou funcional) dificilmente resulta em um processo inovador. Cardoso (2011) explicita essa situação: o designer que se volta ao projeto de uma cadeira dificilmente irá escapar da morfologia típica do objeto (pernas, encosto, assento), trazendo apenas melhorias incrementais a ele. Por outro lado, o designer que se voltar ao contexto do objeto - ou seja, a própria situação de sentar irá encontrar diversas outras possibilidades projetuais distintas do mero design de uma cadeira, resultando no que pode ser uma solução inovadora. Flusser (2007), aponta essa problemática, indicando que o designer tem-se voltado a uma abordagem centrada no objeto, ignorando que estes artefatos são, na realidade, uma mediação entre os humanos. Diante dessa questão, os objetos se caracterizam como intersubjetivos e dialógicos, e o design destes, quando desconsidera tais características, constitui uma produção egocêntrica, lançando-os ao mundo como um novo obstáculo ao próximo, para o qual o objeto não fora projetado.

Quando decido responder pelo objeto que crio, enfatizo o aspecto intersubjetivo, e não o objetivo, no utilitário que desenho. E se dedicar mais atenção ao objeto em si, ao configurá-lo em meu design (ou seja, quanto mais irresponsavelmente o crio), mais ele estorvará meus sucessores e, consequentemente, encolherá o espaço de liberdade na cultura. Um simples olhar na situação atual da cultura revela o seguinte: ela está caracterizada por objetos de uso cujos designs foram criados irresponsavelmente, com a atenção voltada apenas para o objeto (FLUSSER, p. 196, 2007).

Assim sendo, para atender às necessidades básicas de milhares de pessoas que vivem em condições precárias é necessário um processo que busque entendêlas profundamente em seus contextos. A adaptação de soluções existentes para as camadas menos privilegiadas da população dificilmente se fará útil em seu contexto, visto que grande parte dos produtos de design desenvolvidos nos últimos séculos se voltou às problemáticas das classes que ocupam as porções mais elevadas da pirâmide socioeconômica. O desenvolvimento de processos inovadores para a solução de problemas básicos, muito presentes em nossa contemporaneidade, deve passar pelo estudo aprofundado das populações mais vulneráveis e marginalizadas


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da sociedade, nas quais os problemas existentes não foram atingidos pela lógica do design industrial.

Não costumamos pensar em mergulhar nos cantos mais pobres e negligenciados do planeta para aprender sobre a vida de pessoas que estão às margens do sistema, mas é nesses locais que podemos encontrar soluções globalmente aplicáveis para os problemas mais prementes do mundo (BROWN, 2010, p.194).

São nestes locais onde se encontram reais oportunidades para o desenvolvimento de produtos de design inovadores. É assim necessário que se compreenda que vivemos em uma era em que o designer precisa se preocupar com problemas reais. Nos países em desenvolvimento, nos quais as desigualdades sociais e condições de vida de milhões de pessoas ainda são precárias, o papel do designer torna-se ainda mais importante. O desenvolvimento de projetos fantasiosos e desarticulados da realidade da população do país em questão não só distancia os profissionais da população, como faz com que os designers produzam apenas para as camadas mais privilegiadas da sociedade, negligenciando àqueles que mais precisam a atuação de um profissional da inovação. Do ponto de vista social, qualquer esforço deve estar orientado para a busca de uma situação na qual prevaleça a igualdade e estimule a mobilidade social e mantenha a identidade cultural e o desenvolvimento institucional. No âmbito ambiental, os negócios devem conduzir a sociedade à promoção do desenvolvimento da biodiversidade e a manutenção da capacidade de carga dos ecossistemas. A orientação de qualquer negócio, pela ótica econômica, deve ser o crescimento, a eficiência e a inovação (ROCHA; DORRESTEIJN, 2009, p.25).

Para tanto, o designer ao se orientar nas práticas de responsabilidade social pode alcançar uma das principais missões do profissional que é “valorizar os impactos econômicos, sociais e ambientais de seu trabalho e suas contribuições para a cocriação e melhora da qualidade de vida” (ICSID, 2016), não podendo, portanto, ignorar as camadas menos privilegiadas da população na estrutura econômica. O designer contém em sua prática a responsabilidade de projetar, considerando a sociedade em toda sua complexidade, destrinchando os diversos contextos a ela inerentes. Seus produtos devem ser voltados à amenização das diferenças sociais e melhoria da qualidade de vida da população, deixando de focar


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apenas nas camadas mais abastadas e doravante se distanciando de sua prática tradicional reminiscente da revolução industrial. Porém, esse novo tipo de abordagem pode mostrar-se problemático, uma vez que a tradição do ensino e prática do design tem se voltado ao incremento e inovação tecnológicos e ao desenvolvimento industrial. Nota-se que o design para a equidade e coesão social ainda é uma área a ser explorada, ampla e complexa, pois seu ensino ainda é voltado para o desenvolvimento industrial que, em geral, não abarca as questões sociais e muito menos as étnicas e ambientais. Necessita de maiores estudos, com o apontamento a respeito de duas questões abordadas por Vezzoli (2010, p.140). Uma que não se refere apenas às economias emergentes ou em desenvolvimento; e outra em que a sustentabilidade ambiental e socioética são aspectos relacionais e interconectados. Deve ser uma preocupação de todas as economias, pois tanto países industrializados como os emergentes ou em desenvolvimento possuem problemas sociais, portanto pensar em equidade e coesão social está além da busca por estratégias de erradicação da pobreza, mas refere-se à busca de a melhoria da qualidade de vida e do bem-estar social. É algo mais amplo que uma inovação apenas tecnológica, pois inclui a sociocultural e a organizacional. E, sistemicamente, possui características de interação entre atores envolvidos no ciclo de vida de um produto/serviço e de orientação a sistemas ecoeficientes e socialmente justos e coesos (CAVALCANTE, 2014, p.128).

Cavalcante (2014) e Bonsiepe (NUNES; PATROCÍNIO, 2015), apontam que as problemáticas do design tecnocrático remontam ao modo como o mesmo vem sendo ensinado. Bonsiepe também pondera o nível de politização dos designers e suas relações com o governo:

Primeiro, [os designers] devem saber de política e interpretar o conceito de cidadania, ocupar o espaço da cidadania. Pergunto: os estudantes dos cursos de design hoje têm uma formação política, digamos, oposta ao festejo da individualidade? Não se deve esperar passivamente que o governo garanta trabalho ou convoque os designers. Em razão da banalização que o conceito design sofreu, incluindo o ensino de design, temo que os políticos atuais tenham uma ideia confusa e até equivocada do design ou da possível contribuição dos designers para a solução de problemas da comunidade e da indústria (NUNES; PATROCÍNIO, 2015, p.78).

Nesse contexto, e retomando as problemáticas da Escada Virtuosa do Design e Desenvolvimento de Patrocínio, nos deparamos com duas situações: o empoderamento pelo design e o empoderamento do designer. Na primeira situação, os países emergentes devem empoderar-se dos métodos e processos do design


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para desenvolver seus próprios produtos, desatando-se das amarras

neocolonialistas de monopolização do conhecimento praticada por países centrais. O empoderamento pelo design permite a sociedade local a se desenvolver, manter dividendos dentro do país (que seriam enviados a países ricos por meio de royalties), além de gerar produtos que atendam às necessidades específicas e locais. Na segunda situação, faz-se necessário que os designers se empoderem do conhecimento político para assim poderem se aliar ao governo e instituições locais, exercendo sua responsabilidade para com a sociedade local de evoluir a cultura, identidade e qualidade de vida de seu país. 2.1.1 Design Para Inovação Social O Manual de Oslo, documento produzido pela OECD (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) define inovação como “[…] a implementação de um produto novo ou significativamente melhorado (objeto ou serviço), ou processo, novo método de marketing, ou novo método organizacional de práticas internas em empresas, organização do local de trabalho ou de relações externas.” (OECD, 2005, p.46, tradução nossa). Joseph Schumpeter descreve inovação como o principal processo que mantém o mercado em funcionamento, no qual o que é novo substitui o velho, o que ele denomina “destruição criadora”. Para ele, as inovações ocorrem quando: i) introduz-se um novo produto; ii) introduz-se de novos métodos de produção; iii) abrem-se novos mercados; iv) desenvolvem-se novas fontes provedoras de matérias-primas e outros insumos; v) criam-se novas estruturas de mercado em uma indústria. Nenhum dos autores, entretanto, explana sobre inovações sociais. O Manual de Oslo recomenda “estudos à parte para formação de arcabouço conceitual para processos de inovação em setores não orientados ao mercado” (FARFUS; ROCHA, 2007, p.17). Entre diversas bibliografias, nota-se o grande número de sugestões para que sejam conduzidos maiores estudos sobre os processos que levam à inovação social, evidenciando uma lacuna de conhecimento neste campo. Na literatura, encontram-se diversas definições para inovação social, sendo elas: “um conjunto de processos, produtos e metodologias que possibilita a melhoria da qualidade de vida do outro e diminua as desigualdades. Ou seja, é a contribuição para a sustentabilidade da comunidade e do país.” (FARFUS; ROCHA, 2007, p.9);


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“as mudanças no modo como indivíduos ou comunidades agem para resolver seus problemas ou criar novas oportunidades.” (MANZINI, 2008, p.62); “atividades inovadoras e serviços que são motivadas pelo objetivo de resolver uma necessidade social e que são predominantemente difundidas por organizações em que o propósito primário é social” (MULGAN, 2006, p.1463); “novas ideias (produtos,

serviços e modelos) que simultaneamente atingem necessidades sociais e criam novas relações sociais ou colaborações. Em outras palavras, são inovações que são boas para a sociedade e que aumentam a capacidade desta de atuar.” (MURRAY, CAULIER-GRICE; MULGAN, p.3, 2010). Em todas estas definições, nota-se que o objetivo principal do processo de inovação social é resolver desafios de ordem social, não necessariamente buscando lucro ou competitividade, como é o caso de inovações voltadas ao mercado. As inovações sociais representam não uma categoria específica de inovação, mas um aspecto sociológico, que pode ser observado e avaliado, e que transcende os presentes tipos apontados no Manual de Oslo (de produto; de processos; de marketing e organizacional) e os três setores da economia (sendo o primeiro setor o governamental, o segundo setor o mercado e o terceiro setor o sem fins lucrativos). A inovação social não tem limites fixos: ela acontece em todos os setores, público, sem fins lucrativos e privado. De fato, muitas das ações mais criativas acontecem nos limites entre os setores, em campos tão diversos quanto comércio, ensino à distância, hospícios, agricultura urbana, redução de lixo e justiça restaurativa”. (MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010, p.3, tradução nossa).

Para Manzini (2008), as inovações sociais ocorrem quando uma tecnologia penetra uma sociedade ou quando problemas sociais urgentes devem ser enfrentados. Para o autor, esse processo ocorre principalmente por mudanças comportamentais e em comunidades criativas, definidas como "pessoas que, de forma colaborativa, inventam, aprimoram e gerenciam soluções inovadoras para novos modos de vida" (MERONI, 2007 apud MANZINI, 2008, p.64). Manzini também destaca que este tipo de ação leva a um novo tipo de empreendedorismo, os empreendimentos difusos, caracterizados por grupos de pessoas auto-organizadas que buscam obter resoluções para problemas de alto interesse pessoal ou comunitário, em que os indivíduos usuários colaboram direta e ativamente no

3

Tradução nossa.


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resultado que se pretende alcançar no empreendimento. Esse tipo de organização, aparentemente espontâneo, não pode ser criado artificialmente: deve-se, para seu surgimento, propiciar condições necessárias.

Por outro lado, Mulgan et al. (2007) enfatizam que as primeiras inovações sociais surgiram com grandes protagonistas, nas quais indivíduos politizados e com determinado acesso socioeconômico promoveram mudanças sociais profundas em seus contextos; também demonstra o importante papel de movimentos sociais, como o movimento sufragista dos anos 20 nos Estados Unidos, o movimento LGBT a partir dos anos 60, movimentos trabalhistas e outros mais, e também de inovações sociais promovidas pelo governo, como o estado do bem-estar social. Em ambas as abordagens, percebe-se a ausência de empresas e do mercado no campo de inovação social, indicando uma grande dificuldade do segundo setor em transformar positivamente a vida de comunidades e pessoas. Esta problemática deve-se a diversos fatores. Um deles é a falta de interesse de diversas empresas em processos que não tragam lucro imediato, demonstrando uma falta de perspectiva e conhecimento sobre a relação do mercado com a sociedade; outro fator, mais obscuro, é a instrumentalização de camadas vulneráveis da população para a maximização dos lucros da empresa, fazendo com que estas se oponham a processos de inovação social que permitam a mudança das relações de poder entre mercado e população. Este último fator, mais grave, demonstra-se no Brasil de forma epidêmica, onde as elites regionais, que estão em controle do Estado e do mercado, vivem de forma abastada, semelhante às de países ricos, reproduzindo a lógica centro-periferia dentro do próprio país.

“[…] a burguesia, que estaria encarregada de liderar o processo de modernização latino-americano, parecia mais interessada em resolver seus próprios apetites, consumindo e vivendo como se fossem parte do primeiro mundo e deixando passar a necessária oportunidade de investir, renovar o sistema tecnológico e, assim, puxar o desenvolvimento, como era esperado. Era uma elite arrivista.” (BUITRAGO, BRAGA, 2015, p.98).

Neste contexto, a inovação social se faz importante na mudança das estruturas de poder que se estabeleceram no país, transformando a vida das populações em situação de vulnerabilidade e as libertando da lógica exploratória até então praticada. O design, enquanto abordagem que promove processos de solução criativa de problemas e de inovação poderá servir como instrumento para o


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desenvolvimento de comunidades e de sua qualidade de vida. Para tanto, é necessária uma abordagem do design voltada à inovação social, com

especificidades e sensibilidade em relação ao complexo contexto socioeconômico da população que se pretende atingir. 2.1.2.1 Como acontecem as mudanças Mudanças acontecem quando novas ideias encontram as condições certas para prevalecer sobre velhos ideais. Para Mulgan et al. (2007), o processo de mudanças encontra quatro estanques principais: eficiência, interesses pessoais, mentalidade e relações. Quanto à eficiência, novas ideias e processos ameaçam o desempenho estabelecido por processos incorporados. A implementação de uma inovação implica mudanças estruturais que, em curto prazo, poderão diminuir os padrões de eficiência. Isso acontece porque em qualquer sistema social, diferentes elementos se aperfeiçoaram entre si (MULGAN et al., 2007, p.18). Outro fator importante a se notar é o “dilema do inovador” (innovator’s dilemma): enquanto processos estabelecidos são melhorados de maneira incremental durante sua trajetória, novos processos podem surgir como menos eficientes que os antigos modelos otimizados, porém demonstram o potencial de transcendê-los. Assim, em períodos de implementação, é provável que transpareça uma aparente piora dos processos invés de melhora. Em um determinado sistema, é comum que as pessoas tenham forte interesse na estabilidade: a mudança, afinal, é arriscada. Além disso, os grupos que tem maior poder em um modelo saberão como manipulá-lo em seu próprio interesse, muitas vezes estancando processos de inovação que ameaçam o status quo. A mentalidade, outro fator importante, é expressa em normas, valores e suposições, notoriamente mais engessados quando a percepção do funcionamento do sistema é positiva. Assim, a organização se prende a uma rotina tanto operacional quanto psicológica. Por fim, as relações entre as pessoas no contexto da mudança podem impedi-las de acontecer, uma vez que as relações de poder tendem a resistir a mudanças pelos favorecidos dentro do sistema já estabelecido. Para que a mudança aconteça, portanto, não basta que apenas uma ideia melhor seja proposta: o sistema atual deverá ter diversas falhas para que seja substituído. Quando problemas de eficiência começam a emergir, eles se traduzem


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em uma crise de diversos níveis, atingindo os lucros da empresa, a quantidade de estresse dos colaboradores, crise fiscal, entre outros; então, determinados grupos de interesse, geralmente aqueles mais marginalizados, começam a perder a

confiança no sistema, buscando alternativas: os jovens, marginalizados, ambiciosos, “criadores de problema” advogam por mudanças; esses ativistas então se tornam lideranças, mudando a mentalidade de grupos de pessoas e as tensões aumentam; por fim, as relações que se colocaram como principal segurança para que o sistema se mantenha começam a se distender e diluir: a mudança é eminente. 2.1.1.2 Condições para a inovação social Segundo Mulgan et al. (2007), a inovação social é um acontecimento simbiótico que depende de indivíduos ou grupos com o poder de gerar ideias disruptivas e de organizações com capacidade de implementar essas ideias: a essa troca, se dá o nome de bees & trees - abelhas & árvores. As abelhas são pequenas organizações, grupos ou indivíduos rápidos, com grande mobilidade e que fazem trocas entre diversas instituições. Já as árvores são grandes organizações, como ONGs, empresas, governo, que não tem

grandes capacidades criativas, mas

dispõem de estrutura e escala para que os novos processos sejam implementados. Já para Manzini (2008), a inovação social acontece em comunidades criativas, que dependem de uma sociedade em que as rápidas mudanças estimulem seu aparecimento. Para tanto, são necessários um ambiente tolerante e instrumentos de governança que produzam um contexto no qual o surgimento de comunidades colaborativas é mais provável. Por ambiente tolerante, entende-se por contextos em que ideias disruptivas possam se desenvolver, uma vez que sua promoção significa “aceitar algo que provavelmente não se encaixará nas normas e regras existentes” (MANZINI, 2008, p.77). Assim, para que exista um ambiente favorável ao desenvolvimento de inovação social, devem-se promover mecanismos políticos, administrativos e sociais flexíveis e maleáveis; instrumentos de governança podem auxiliar os empreendimentos sociais difusos a criar novos espaços sociais, ao oferecer estrutura tecnológica, fomentar talentos e promovendo ambientes tolerantes. Notam-se, em ambas as abordagens, duas características confluentes: a primeira é a necessidade de uma aliança entre pequenos grupos e indivíduos


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criativos e grandes organizações e instituições com estruturas capazes de

desenvolver soluções; a segunda, é o fomento e desenvolvimento de indivíduos empreendedores, capazes de articular e criar ideias de solução próprias para seus contextos, ou seja, a necessidade de um designer local. 2.1.1.3 Estágios e processo de inovação social O primeiro passo para o desenvolvimento de uma inovação social é a identificação dos desafios e problemas em seus determinados contextos e a identificação de potenciais soluções. Muitas vezes, os problemas são autoevidentes, como a fome, miséria, epidemias, etc. outras vezes, são evidenciados por organizações como ONGs, programas de voluntários, instituições religiosas, indivíduos empreendedores e comunidades, mudanças de paradigmas sociais, ou mudanças demográficas. Para o desenvolvimento de uma solução, é necessária, neste primeiro estágio, a compreensão em profundidade do contexto sobre qual está atuando. Ferramentas de etnografia, observação e análise social e comportamental são importantes nesse processo, compreendendo os atores-chave enquanto indivíduos, suas relações interpessoais e sua dinâmica enquanto grupo ou comunidade. Para tanto, compreende-se que as pessoas são as melhores intérpretes de seus contextos e com a maior aptidão para resolver os próprios desafios. Nesta abordagem, os chamados “desviados positivos” (positive deviants) emergem, demonstrando possíveis soluções já desenvolvidas por determinados indivíduos na comunidade - oferecendo insights sobre as possibilidades de melhoria dentro daquele contexto: Desvio positivo é a observação que em grande parte das configurações, alguns indivíduos em situação de vulnerabilidade seguem práticas incomuns e benéficas e consequentemente atingem melhores resultados que seus vizinhos que estão em situação similar de vulnerabilidade (MARSH et. al., 2016, p.1177).

Quando a imersão naquele contexto é feita de forma adequada, as possibilidades começam a se evidenciar de forma natural - os chamados insights - e as primeiras ideias de solução emergem, caracterizando o segundo estágio. O desenvolvimento de ideias normalmente varia de acordo com os grupos e contextos, nos quais diversas ferramentas para criação são adotadas e testadas. Como


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afirmam Mulgan et. al, (2007), também é comum, neste processo, o teste rápido de

possibilidades para sua validação e entender melhor a sua viabilidade. Outras vezes, o processo de inovação é aberta - ou seja, as ideias inovadoras são compradas ou adotadas de agentes externos. Como apontado no início deste texto, esse tipo de inovação pode ser extremamente problemático, uma vez que a solução em questão não foi desenvolvida considerando o contexto em que irá atuar. Para melhor funcionamento, a fase de implementação dessa inovação deverá ser iterativa e adaptativa, reconhecendo e melhorando seus processos por meio de sistemas de feedback - o que resulta, de uma maneira ou de outra, em um processo criativo. É importante notar o papel fundamental da prototipagem nesse processo as soluções sociais são, muitas vezes, testadas diversas vezes e rapidamente, para que seu desenvolvimento seja intimamente ligado ao contexto do desafio. Assim, os sistemas de feedback, análise, desconstrução de paradigmas e desenvolvimento criativo são críticos nesse processo, uma vez que os principais interessados no funcionamento da inovação são aqueles que testam as soluções.

No estágio de

prototipagem, é determinante a colaboração de uma instituição ou organização que ofereça a estrutura para a realização de testes, seja ela tecnológica, financeira ou até mesmo para captação de feedback. Mulgan et. al (2007) dizem que normalmente as inovações sociais são implementadas em estágios precoces - motivados por ansiedade dos desenvolvedores da solução. Essa implementação pode ser extremamente positiva uma vez que isso permitira um processo de co-design e, portanto, levaria a uma solução mais eficiente e contextualizada; entretanto, quando essa implementação está atrelada a altos custos, burocracia, ou até mesmo interesses maiores que o desenvolvimento social, e os processos de feedback e iteração falham, a inovação social pode resultar em uma solução falha, podendo até mesmo criar um problema maior do que aquele que se propôs a solucionar. Quando a solução começa a funcionar e se desenvolver, é necessária a escala e crescimento da inovação - o terceiro estágio. Para que isso aconteça, é necessário um planejamento estratégico, levando em consideração aspectos sociais, políticos e econômicos. Normalmente, esses instrumentos estão em poder de instituições e organizações, que possuem métodos formais para alcançar investimentos, mudar políticas e promover a solução em questão. O crescimento e replicação de inovação social dependem de dois fatores. O primeiro, a demanda


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efetiva, caracteriza-se por um ambiente que ofereça as condições econômicas de

viabilidade da solução. O segundo é a capacidade de crescimento: são habilidades de administração, liderança, governança e comunicação. Para Manzini (2008), a escala da inovação social se dá em forma de redes de organizações colaborativas, mantendo suas dimensões individuais, mas aumentando seu impacto, ou seja, capilarizar os empreendimentos sociais. Assim sendo, notam-se três métodos principais: o franchising, na qual uma empresa maior oferece a pequenos empreendedores as ferramentas necessárias para replicação do empreendimento, ao mesmo tempo em que exige destes um determinado procedimento e um controle de qualidade; format, caracterizado por um show, passo a passo, de procedimentos necessários para se desenvolver o empreendimento. Neste modelo, o produtor dá aos compradores o poder de utilizar da experiência original e adaptá-la a seu respectivo contexto, resultando em um programa global e local ao mesmo tempo. Por fim, o toolkit, que consiste em uma caixa de ferramentas (tangíveis e intangíveis) que possibilitam ao empreendedor desenvolver o procedimento da empresa desenvolvedora. Esse processo dá grande liberdade ao empreendedor, ao mesmo tempo em que a empresa não assume responsabilidade pelos possíveis resultados - uma abordagem de DYI (do it yourself - faça-vocêmesmo). O quarto estágio, de aprendizado e evolução, é quando o empreendimento de inovação social aprende com os resultados de sua aplicação e evoluem seus modelos para novas plataformas que podem, até mesmo, não corresponder às expectativas iniciais de seus empreendedores. É importante que uma organização seja capaz de aprender e se adaptar a sua interação com o contexto e desafio no qual atuou, podendo se aprimorar e melhorar seus processos - momento de inovação incremental. 2.1.1.3 Contextos de inovação social O processo de inovação social pode variar de acordo com o contexto em que ocorre. Normalmente, esse processo se dá em seis contextos, sendo eles as organizações sociais, movimentos sociais, política, governo, mercados e academia.


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2.1.1.3.1 Inovação social em organizações sociais

A inovação em organizações sociais se dá de forma lenta e precária, uma vez que esse modelo necessita de investimentos para desenvolver soluções, o que pode ser difícil de atingir por se tratar de um processo complexo de alianças que viabilizem a solução economicamente. Quadro 1 - Inovação Social em Organizações Sociais.

Geração de possibilidades

Protótipos

Crescimento

Prática, imaginação, contribuições de beneficiários e usuários geram possibilidades.

Start-ups, incubadoras, aprender fazendo, pilotos e testes.

Crescimento da organização, emulação, replicação e franchising para atingir escala.

Fonte: Mulgan et. al (2007, p.29).

2.1.1.3.2 Inovação social em movimentos sociais Os movimentos sociais operam entre a política e a sociedade civil. Normalmente, procura-se aglomerar pessoas com ideias parecidas, movidas por esperança ou raiva, para promover mudanças. Este processo está intimamente ligado ao Estado, que pode contribuir para que a mudança ocorra ou pode bloquear o processo.

Quadro 2 - Inovação Social em Movimentos Sociais.

Formação

Campanhas e advocacia

Legislação, mudança de hábitos, mudança de valores

Pequenos grupos, buscando aliados com ideais parecidos, movidos por raiva ou ressentimentos.

Movimentos tentam mostrar sua validade, unidade, números e comprometimento.

Governo endossa as reivindicações e aprova legislação

Fonte: Mulgan et. al (2007, p.29).

2.1.1.3.3 Inovação social na política Na política, a inovação social ocorre quando políticos (ou até mesmo


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partidos) reivindicam um posicionamento em relação a um problema, apontando

uma solução para o mesmo, parcialmente relacionado a seus ideais e muitas vezes relacionado ao ganho de votos e apoio popular. O ativismo político dentro da estrutura estatal se desenvolverá, dependendo de diversos fatores e de um contexto favorável para que se desenvolva e seja implementado. Quadro 3 - Inovação Social na Política.

Demandas e Campanhas

Formulação de políticas e manifestos

Gastos públicos, programas, legislação, novas profissões

ONGs, ativistas de partidos, pessoas necessitadas e a mídia fazem demandas por novos programas.

Políticos se tornam campeões, ministros e funcionários públicos assumem problemas sociais e se comprometem politicamente.

Burocratas e profissionais implementam, provendo fundos e autoridade.

Fonte: Mulgan et. al (2007, p.29).

2.1.1.3.4 Inovação social no governo Em governos já estabelecidos, a inovação social é motivada por um problema urgente ou pelo corte de gastos. Neste momento, o governo busca a experiência dos próprios funcionários, consultores e mercados emergentes. As possíveis soluções são prototipadas e testadas com uma metodologia formalizada para mensurar e avaliar seus resultados. Quadro 4 - Inovação Social no Governo.

Geração de Possibilidades

Piloto, teste, aprender fazendo

Métodos criativos, consultores, Incubadoras, zonas, contestações e guias - com métodos de adaptação de modelos de avaliação e mensuração outros setores geram teste e captura de lições. possibilidades. Fonte: Mulgan et. al (2007, p.29).

Escalonamento

Crescimento, novas estruturas, franchising e programa de gastos alcançam escala.


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2.1.1.3.5 Inovação social no mercado

Inovações sociais no mercado estão atreladas, muitas vezes, ao empreendedorismo - seja ele dentro ou fora de empresas. Quando um empreendedor encontra seu nicho, desenvolve um mercado e um processo financeiramente viável, investidores ajudam na escala do empreendimento, fazendo com que surja um empreendimento social, ou negócio de impacto social, que será visto mais adiante. Quadro 5 - Inovação Social no Mercado.

Nichos embrionários

Mercados de nicho

Entrada no mercado principal

Entusiastas produzem e consomem em uma quase economia de doação.

Pequenas empresas, investimento voltado a missões, e ativismo de consumidores e acionistas desenvolvem um mercado de nicho.

Multinacionais compram participação e atingem poder de mercado.

Fonte: Mulgan et. al (2007, p.30).

2.1.1.3.6 Inovação social na academia Algumas vezes, a academia produz soluções de inovação social, que são trabalhadas em disciplinas acadêmicas, testadas e avaliadas antes de serem colocadas em prática. Entretanto, a academia ainda não possui ferramentas eficientes para cultivar e disseminar boas ideias. Isso se deve ao esforço que ocorreu para a renovação tecnológica em universidades, em detrimento do desenvolvimento no campo social. Em alguns casos, tem-se criado e desenvolvido laboratórios de inovação social, conectando os desenvolvedores de inovação com os usuários. Quadro 6 - Inovação Social na Academia.


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Invenção

Difusão

Incorporação

Novas ideias são desenvolvidas nas margens da academia.

Ideias são testadas na prática ou espalhadas por meio de redes acadêmicas.

A ideia radical se torna comum.

Fonte: Mulgan et. al (2007, p.30).

2.2 GESTÃO DE DESIGN A Gestão de Design se caracteriza por um processo de integração de processos de design em empresas. Para Martins (2004, p.94), "A característica distintiva da Gestão de Design é a identificação e a comunicação de caminhos pelos quais o design pode contribuir ao valor estratégico da empresa”, enquanto Mozota define: A gestão de design é a implementação do design como um programa formal de atividades dentro de uma corporação por meio de comunicação da relevância do design para as metas corporativas de longo prazo e da coordenação dos recursos de design em todos os níveis da atividade corporativa para atingir os seus objetivos. O papel da gestão de design também é promover a compreensão da importância do design para a realização das metas de longo prazo da empresa e coordenar recursos de design em todos os níveis. (MOZOTA, 2002, p.95).

A gestão de design atua, portanto, em diversos níveis em organizações: no nível operacional, relacionado à execução do projeto, nível tático, relacionado à coordenação dos projetos, e nível estratégico, relacionado aos objetivos da organização. Enquanto a gestão de design estratégico preocupa-se com a inserção da empresa na sociedade e mercado, com um olhar holístico e futurista, a gestão de design tático se preocupa com o setor de design dentro da organização, descrevendo processos, manejando pessoal e coordenando equipes de design; já a gestão operacional de design se preocupa com a solução a ser desenvolvida, ferramentas e táticas praticadas e eficiência do processo produtivo. Enquanto as atividades são descritas separadamente, as mesmas são indissociáveis, uma vez que a solução a ser desenvolvida no nível tático-operacional afeta a estratégia da


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empresa e sua interação com a sociedade e mercado. Pereira (2002, p.2) apresenta os três níveis e suas respectivas competências: Nível Estratégico: fatores ambientais, tendências de mercado, tendências de Design, legislação, padrões; manifestações de Design, como identidade corporativa, padrões de Design corporativo, produtos, ambientes, comportamentos, comunicações; fatores internos, ou seja, estratégias e controle do Design corporativo, compreensão do Design e desenvolvimento de habilidades para Gestão de Design, integração, centralização, responsabilidade pelo Design, elaboração e introdução de sistemas para Gestão de Design, avaliação dos investimentos em Design, seu impacto e sua contribuição para a atuação da organização; Nível Tático: recursos para o Design, humanos, físicos, internos, externos; habilidades para o Design; core competencies; treinamento; descrição dos processos, normas e procedimentos para a Gestão de Design, localização, serviços e objetivos da equipe responsável pelo Design. Nível Operacional: natureza dos processos e projetos de Design; propostas; relacionamento entre gestão e equipe de Design do projeto; seleção dos integrantes da equipe; documentação e sistemas de controle; implementação das soluções; avaliação dos projetos.

Assim, para que uma organização tenha uma inserção estratégica dentro do mercado, ela deve integrar a gestão de design nos três níveis, definindo estratégias, construindo e coordenando equipes e executando projetos que reflitam a visão e filosofia da empresa. A Gestão de Design deve ser, então uma ferramenta que integre as funções operacionais do Design desenvolvido em todos os setores da empresa, visando atingir os objetivos traçados e propiciar a percepção de uma imagem positiva. Coordena seus produtos e suas comunicações, ambientes e serviços. Como comunica os valores e a filosofia da empresa para o ambiente em que, deve estabelecer uma política que se manifeste por meio de um Design corporativo consistente, atingindo, assim, uma unidade em seu discurso, facilidade na identificação de sua mensagem e possibilitando índices de memorização que favoreçam o comportamento de troca. A dinâmica das empresas requer um monitoramento continuado do processo para que os produtos possam ser redesenhados, reposicionados, reduzidos, retirados do mercado ou deixados como estão. Genericamente, as empresas que apresentam as características que mais favorecem o Design são aquelas que se adiantam em relação a mudanças ou a pressões do seu ambiente de atuação, e possuam uma cultura propícia à inovação (MARTINS, 2004, p.159).

2.2.1 Gestão de Design e Inovação É notável que o processo de design, por ser de caráter humanista, questionador e criativo, leva a soluções inovadoras, uma vez que sua abordagem é fundamental para a quebra de paradigmas.


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Toda inovação, seja ela radical ou incremental, exige a contribuição do design. Assim como qualquer invenção gera diferentes configurações formais e sucessivas modificações, a maioria dos produtos de design é baseada em invenções passadas e em inovações incrementais: na verdade, 90% do design de produtos pode ser considerado um processo de inovação incremental (MOZOTA, 2002, p.59).

Enquanto Mozota (2002) descreve a grande quantidade de inovação incremental em produtos, tem-se assistido a um aumento no número de inovações disruptivas, principalmente aquelas relacionadas a serviços. Neste contexto, surgiram novas extensões do design, como design de experiências, design de serviços, UX design, UI design, entre outras especializações relacionadas ao boom tecnológico e a um novo momento de implementação de processos de design para a inovação. Essas especializações evidenciam o papel fundamental da gestão de design voltada ao desenvolvimento de novos produtos (DNP), que ocorre no nível operacional do design. A inovação bem-sucedida requer o aperfeiçoamento de produtos e de processos organizacionais. O design cria valor em ambas as áreas. Além disso, a inovação é um processo coletivo e interativo que está próximo da realidade do processo de design, uma vez que combina fatores internos e externos. O design é valorizado tanto pela qualidade superior do produto quanto pelo processo superior de DNP (MOZOTA, 2002, p.146).

Para que um produto inovador seja desenvolvido, portanto, a empresa deve contar com uma gestão de design operacional com processos adequados à inovação. Para Mozota (2002), isso pode ser atingido quando existe um grande trabalho de campo, com pesquisas com os usuários, pesquisas socioculturais que apontem para cenários macro e micro, mapeamentos dos contextos apresentados, além de uma filosofia voltada ao usuário, colocando-o no centro do processo. A chave para o sucesso da gestão da inovação resulta do fato de que todo processo de DNP é orientado ao consumidor. Isso implica a necessidade de todos os diferentes porta-vozes do cliente - para marketing, design, comercialização e qualidade - estarem de acordo. Esses parceiros estão interpretando as carências latentes do cliente. Desse modo, as informações sobre tais necessidades e usos devem ser integradas em todas as áreas de produção: processos, equipamento e procedimentos de funcionários. A gestão de produção é modificada para acomodar um ambiente empresarial orientado para o mercado (MOZOTA , 2002, p.151).


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Essa abordagem da gestão de design, pautada no mercado, não

problematiza seu modus operandi, que coloca uma grande parte da população mundial à margem do sistema econômico, desconsiderando as necessidades desta parcela da população quando se centra no aspecto mercadológico da inovação em detrimento do aspecto social. Em alguns esforços recentes, empresas tem-se atentado ao novo mercado, descrito como Base of Pyramid (BoP) por Stuart Hart (2008). Em seu documento, The Base of Pyramid Protocol, co-autorado por Erik Simansis (2008), o autor descreve empresas que desenvolveram produtos para populações marginalizadas, porém suas estratégias centraram-se em diminuir os custos do produto em questão, desconsiderando as reais necessidades destas comunidades, caracterizando uma abordagem neocolonialista destas organizações, ao acreditar que as necessidades e desejos das populações vulneráveis economicamente correspondiam às das classes mais privilegiadas que normalmente consomem seus produtos. Muito tem-se falado em integração de criatividade em empresas, além de melhoria de processos e de atividades projetuais, resultando em inovações. Entretanto, pouco se fala em gestão de design para outros modelos de instituições, ou até mesmo, gestão de design voltada a inovações que levem em conta não somente aspectos organizacionais, processuais e de mercado, mas também os contextos sociais em que irão atuar. Esta problemática é evidenciada principalmente pela desconexão entre o design estratégico (responsável pelo planejamento de processos) e tático-operacional (responsável pela coordenação e execução de processos). Também é notável a ausência de métodos de mensuração de impacto, iteração e melhoria do processo, um movimento contra-fluente do design táticooperacional para o design estratégico. As duas áreas não podem agir de maneira linear e teleológica, mas sim, devem-se coordenar práticas de trocas e iteração, para contínua melhoria dos produtos e serviços alcançados com o processo de design. Considerando-se os problemas de gestão de design em organizações, é evidente que para aquelas que almejam alcançar inovações sociais o processo de gestão de design deve ser completo, com estratégias específicas para populações vulneráveis, táticas de processo que incluam todos os humanos envolvidos no processo como agentes de cocriação, e operações que sejam extremamente empáticas, sensíveis e frugais no desenvolvimento da solução, além de ferramentas de implementação que sejam bastante apuradas, com instrumentos de mensuração,


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captação de feedbacks, avaliações de protótipos, além de testes responsáveis e assertivos, uma vez que a solução final poderá mudar a vida das pessoas do

contexto em que atua, no qual muitas das pessoas poderão até mesmo se tornar dependentes da solução, uma vez que não tem acesso a alternativas. Neste contexto, a gestão de design para inovação social deve considerar outras variantes, considerando-se a vulnerabilidade das comunidades envolvidas, a dificuldade do desafio disposto, os contextos instáveis em que se atua, os paradigmas intrínsecos da equipe de design, as práticas tradicionais de mercado, entre outros fatores. Para este trabalho, será focada a gestão de design operacional para a inovação social. 2.2.1.1 Gestão de design para inovação social Tim Brown, CEO (chief executive officer) da IDEO, empresa globalmente reconhecida por processo de inovação, vem defendendo a inserção do Design Thinking em empresas que buscam desenvolver soluções criativas e inovadoras para um mercado cada vez mais saturado e complexo. O autor defende o Design Thinking enquanto uma abordagem criativa para enfrentar desafios, contando com a flexibilidade da criatividade com o rigor analítico de um método (BROWN; WYATT, 2010). Nesta abordagem, a figura principal é o ser humano, o qual oferece as informações necessárias para o desenvolvimento da solução, as co-cria, testa e valida. Como o design thinking equilibra as perspectivas dos usuários, da tecnologia e dos negócios, é, por natureza, integrador. Como ponto de partida, contudo, ele privilegia o usuário final, e é por isso que tenho me referido repetidamente a ele como uma abordagem à inovação "centrada no ser humano". Os design thinkers observam como as pessoas se comportam, como o contexto de uma experiência afeta sua reação a produtos e serviços. Eles levam em consideração o sentido emocional das coisas, bem como seu desempenho funcional. E, com base nisso, tentam identificar as necessidades não declaradas, ou latentes, das pessoas e traduzi-las em oportunidades. A abordagem centrada nos ser humano do design thinker pode fundamentar novas ofertas e aumentar as chances de sua aceitação ao vinculá-las a comportamentos existentes (BROWN, 2010, p.215).

Pode-se dizer, portanto, que o Design Thinking é uma abordagem bastante focada no ser humano, no qual as pessoas e comunidades que serão afetadas pela solução tem grande poder de decisão sobre aquilo que está sendo desenvolvido, opondo-se a métodos tradicionais de DNP, que comumente acontecem em


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laboratórios fechados e com noções enviesadas de empresários e engenheiros

sobre a sociedade, resultando, muitas vezes, em soluções que não somente não se prestam ao desafio, como podem agravá-lo ou até mesmo trazer outros problemas tão difíceis quanto aquele que primariamente mobilizou o projeto. No contexto de inovação social, essa situação é extremamente delicada, uma vez que as populações em situação de vulnerabilidade não possuem os meios para escolher alternativas àquela solução, colocando-as como reféns de achismos de governos e empresas que pouco se interessam em interagir com as populações mais pobres situação que surge de preconceitos dessas organizações, uma vez que não consideram essas pessoas capazes de pensar e refletir sobre a própria realidade a ponto de contribuir para a solução dos problemas que enfrentam todos os dias. O designer não pode ser visto como um intrépido antropólogo, se aventurando em uma cultura alienígena para observar os nativos com a máxima objetividade. Em vez disso, precisamos inventar uma nova e radical forma de colaboração que turve as fronteiras entre criadores e consumidores. Não é uma questão de "nós contra eles" nem de "nós em nome deles". Para o design thinker, deve ser uma questão de "nós com eles” (BROWN, 2010, p. 55).

Essa problemática se evidencia em alguns casos ao redor do mundo, nos quais soluções falharam ao entender as necessidades e jornadas dos seus usuários. É o caso do Naand Treatment Center, que oferece água para locais da cidade de Hyderabad, Índia: enquanto o centro oferece água tratada e potável para os residentes da região, algumas famílias ainda procuram água em poços artesanais, pela simples razão de não conseguirem carregar os galões de água por serem pesados demais (BROWN; WYATT, 2010). Outro caso interessante é o da PlayPumps, iniciativa que buscou prover abastecimento de água para vilarejos na África por meio de bombas que eram acionadas quando crianças brincavam em um carrossel. Neste caso, além da associação com trabalho infantil, as bombas tinham um alto custo de instalação, não poderiam ser acionadas por pessoas que não fossem crianças (devido ao projeto ergonômico do carrossel), além de não levar em consideração outras intempéries que poderiam atrapalhar a brincadeira das crianças. Como resultado, alguns vilarejos tiveram o acesso à água dificultado após a instalação da PlayPump, e a empresa parou de instalar novas unidades em 2010 (GOVINDARAJAN; WINTER, 2015). Esses dois exemplos mostram a importância de um conhecimento aprofundado dos contextos em que se irá atuar. Para tanto, não


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basta apenas um trabalho de imersão, cujo objetivo é retirar informações por meio

de observações dos projetistas - é necessário envolver as pessoas que enfrentam os desafios diariamente, pois estas se caracterizam como as verdadeiras especialistas daquele contexto. A inserção de atores-chave no processo de design não deve seguir o pensamento somente voltado ao usuário final. Quando se atua em um desafio complexo, deve-se perceber que a solução desenvolvida irá afetar não somente o usuário imediato daquele produto ou serviço, como também toda a comunidade, uma vez que os papéis ali determinados serão abalados pela solução. Assim sendo, passa-se de uma abordagem de Design Centrado no Usuário (UCD) para o Design Centrado no Humano (HCD, Human Centered Design). A IDEO.org, braço social da empresa IDEO, desenvolveu o The Field Guide to Human-Centered Design (2015), um manual que direciona o design para um entendimento amplo dos seres humanos inseridos no contexto do desafio, afirmando que “as pessoas que enfrentam os problemas no dia-a-dia possuem a chave para sua solução” (IDEO.ORG, 2015). 2.2.1.1.1 Human centered design O HCD é caracterizado por longos e importantes processos etnográficos para maior assertividade no diagnóstico do desafio, além de uma ideação contemplando a cocriação, e implementação com estratégias de mensuração, iteração, testes seguros e avaliação da solução enquanto ideia (protótipos sofisticados) ou como sistema (projetos piloto). Para a IDEO.org (2015), o processo age como “uma chance de fazer design com comunidades, entender profundamente as pessoas a quem se busca servir, a sonhar diversas ideias, e criar soluções inovadoras enraizadas nas necessidades reais das pessoas”. Neste sentido, o HCD ajuda as pessoas das comunidades a se empoderar no próprio processo de design, fazendo com que as mesmas sejam co-responsáveis pelas soluções que se criam, e assim, possam se desenvolver junto a elas, levando a inovações mais assertivas, éticas, coerentes e funcionais. O HCD acontece em três espaços fundamentais (IDEO.org, 2015): o primeiro, a inspiração, é um momento de exploração de contexto, no qual os membros da equipe de design deverão se aprofundar no desafio, entender as pessoas envolvidas, ou seja, imergir naquele ecossistema para se extrair uma grande


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quantidade de informações; o segundo, a ideação, consiste no estudo dos dados

levantados na inspiração, desenvolvimento de ideias, testes de protótipos e refinamento de soluções; por fim, a implementação preocupa-se com a viabilização da solução, considerando tópicos como o mercado, o modelo de negócios, parcerias e aspectos relacionados ao empreendimento. Esses três espaços não são lineares, portanto, deve-se considerar que o processo de design pode transitar de um espaço ao outro enquanto a equipe avança no projeto. Considerando-se o papel importante do envolvimento das pessoas no processo de design, evolui-se de um Design Exógeno para um Design Participatório (PATROCÍNIO; NUNES, 2015). Essa mudança de paradigma retira o designer de seu papel neocolonialista, como um ator autoritário, retentor dos conhecimentos, e o coloca como um membro de uma equipe horizontal, atuando como um guia para que as pessoas da comunidade possam desenvolver suas próprias soluções, agindo de duas maneiras: primeiramente, possibilita um processo mais criativo e assertivo; ao mesmo tempo em que empodera esses mesmos atores a se tornarem designers em suas próprias comunidades, gradualmente levando a um Design Autônomo (PATROCÍNIO; NUNES, 2015), o que Manzini (2008) descreve como comunidades criativas. Colocados os argumentos acima, três momentos emergem como fundamentais para uma boa prática de HCD em um projeto de inovação social. O primeiro é um processo de inspiração bem executado, colocando os participantes da equipe de design como atores do próprio contexto em que irão agir, possibilitando o desenvolvimento de uma empatia maior pelas pessoas daquela comunidade, assim como um olhar holístico do complexo sistema que entorna aquele desafio. Este momento é crítico e deve ser desenvolvido com grande cuidado e sensibilidade, uma vez que se está vivendo em uma cultura completamente diferente, no qual os costumes, crenças e tradições podem se tornar pontos fundamentais para o desenvolvimento de uma solução assertiva. O segundo momento, dentro do espaço de ideação, é o momento de cocriação, envolvendo os atores-chave daquele contexto na geração de ideias para a solução, ajudando-os a se empoderar em sua criatividade, assim como trazendo um olhar interno e externo sobre o problema, enriquecendo o processo e mantendo uma coerência criativa no desenvolvimento da solução. Por fim, na implementação, é importante que os atores-chave testem a solução repetidamente, para que esta possa ser iterada e traga benefícios concretos


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para aquela comunidade, possibilitando que as pessoas de determinado contexto se empoderem da solução e participem ativamente de sua criação, resultando em uma educação do consumidor. Por fim, para uma solução se desenvolver e se estabelecer enquanto uma inovação social, a fase de implementação é crítica. Quando a inovação se caracteriza como um produto ou serviço, ela deve estar de acordo com um modelo

que traga sustentabilidade financeira para sua escala e difusão, além de estar atrelada a uma organização que possa monitorar os resultados, coletar feedbacks e promover uma melhoria contínua (inovação incremental) de seu produto ou serviço junto à comunidade. Para tanto, é necessária uma organização que alie uma missão social com sustentabilidade financeira em seu modelo de negócios. Estas são conhecidas como Negócios de Impacto Social. 2.2.1.1.2 The base of pyramid protocol Para Amartya Sen (2000, apud CRESPO; GUROVITZ, 2011) a pobreza pode ser definida como a privação de capacidades básicas de uma pessoa, ou seja, a pobreza é entendida como a falta de escolha ou liberdade de indivíduos ao acesso de determinados produtos e serviços. Esta privação, quando relacionada a necessidades básicas, pode levar a problemas de saúde, subnutrição, morte prematura, analfabetismo, entre outras tragédias que assolam populações consideradas pobres. O Protocolo da Base da Pirâmide (The base of pyramid protocol), escrito por Simanis e Hart (2008) é um documento que estimula a abordagem da pobreza por empresas. Esse pensamento é impulsionado pela percepção de que governos e filantropos tem falhado em tratar da miséria. As empresas, por outro lado, podem utilizar de seus mecanismos de inovação e dinamismo para entender melhor este problema e trazer desenvolvimento e aumento das capacidades básicas de populações de baixa-renda. Para os autores, esta preocupação torna-se cada vez mais evidente quando as empresas buscam atingir uma parcela de 4 bilhões de pessoas que possuem uma renda per-capita abaixo de 1.500 dólares. O documento descreve a interação entre empresas e comunidades BoP (base da pirâmide) como relações de co-invenção e cocriação de negócios, opondo-se ao pressuposto que empresas devem focar em apenas “vender aos pobres” - algo que


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coloca estes agentes como replicadores do neocolonialismo. A abordagem sugerida

pelo protocolo é de uma relação muito mais profunda e significativa, trazendo à comunidade um fortalecimento não só econômico, assim como um empoderamento aos indivíduos destes locais, colocando-os como protagonistas de seu próprio desenvolvimento. Essa parceria entre empresas e comunidades deve ser estimulada pelo objetivo comum de desenvolvimento e redução da pobreza, ou seja, aumento das oportunidades e liberdade de escolha das pessoas para que satisfaçam suas necessidades. O documento traz diversas diretrizes, ferramentas e caminhos a serem seguidos para uma empresa que busca estabelecer um relacionamento com uma comunidade BoP, buscando sempre lembrar do valor da cocriação e envolvimento das pessoas no processo de criação de um negócio local.

2.2.1.1.3 PNUD (Programa das Nações Unidas de Desenvolvimento) A UNDP (United Nations Development Program), conhecida na América Latina como PNUD (Programa das Nações Unidas de Desenvolvimento), é uma organização vinculada à ONU que busca a redução da pobreza e das desigualdades: O PNUD trabalha em 170 países e territórios, ajudando-os a alcançar a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades e exclusão. Nós ajudamos países a desenvolver políticas, habilidades de liderança e de parcerias, capacidades institucionais e a construir resiliência para sustentar resultados de desenvolvimento. (UNDP, 2017).

Como parte de suas estratégia para colaborar com a construção de uma sociedade mais igualitária, o PNUD lança publicações que ajudam a orientar os atores de cada país a se mobilizar em torno desse objetivo. Em 2008 a organização publicou o relatório Criando Valores para Todos, cujo objetivo é fomentar a criação de mercados inclusivos. Para o PNUD, este processo é vantajoso tanto para empresas, que aumentam seus dividendos, criam novos mercados, promovem a inovação, expandem a reserva de mão-de-obra e fortalecem a cadeia de valor, quanto para as populações de baixa-renda, que tem suas necessidades básicas


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atendidas, tornam-se mais produtivos, aumentam suas rendas e se capacitam individual e coletivamente. O documento compreende cinco estratégias para o desenvolvimento desses mercados: adaptação de produtos e processos, investimento na remoção das restrições de mercado, fortalecimento do potencial dos pobres, combinação de

recursos e capacidades com outras instituições e engajamento no diálogo político com o governo. Ao modificar os produtos e processos existentes, uma empresa se vê forçada a inovar, trazendo novas maneiras de pensar sobre seu serviço e como ele pode atuar em determinado contexto. Dentro desta perspectiva, o uso de novas tecnologias, aliadas à adaptação da maneira de fazer negócio, traz produtos inovadores e inclusivos para as pessoas. Embora a remoção de restrições de mercado seja uma tarefa governamental, muitas vezes as empresas se veem inclinadas a tomar este papel. Ao investir no desenvolvimento pessoal e profissional dos colaboradores, investir na criação de uma infraestrutura local e fomentar iniciativas de educação, a empresa ganha valor social e desenvolve a comunidade a sua volta, investimento que trará retorno a longo prazo. Ao estreitar o relacionamento com as comunidades, ocorre o fortalecimento do potencial dos pobres, ou seja, fomenta-se a inclusão de pessoas de baixa-renda como parceiros da empresa. Isso acontece quando se desenvolve laços com a comunidade como um todo, atuando-se dentro das relações sociais das pessoas envolvidas, procurando entender as regras informais e os mecanismos sociais que atuam naquele contexto. Esse movimento fortalece a atuação da empresa e contribui para o desenvolvimento de mercados ausentes na comunidade. Realizar parcerias, combinando recursos e capacidades com outras instituições, é muito importante para a ampliação da atuação da empresa em mercados inclusivos. As parcerias podem ser feitas com ONGs (organizações nãogovernamentais) e com agentes públicos, dois atores que tem ampla experiência e alcance dentro destes mercados. Por outro lado, parcerias com outras empresas para fornecer um serviço único reduzem os custos e expandem a oferta de serviços e produtos para populações de baixa-renda. Muitas das restrições e obstáculos encontrados para

desenvolvimento de

mercados inclusivos vem das políticas de governo. Assim, muitas empresas


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engajam-se em um diálogo político com instituições governamentais, a fim de

estender seu impacto e ajudar na elaboração de políticas para a solução de problemas sociais. 2.2.1.1.4 The open book for social innovation O Open Book for Social Innovation (Livro Aberto para Inovação Social) é uma publicação escrita por Murray, Caulier-Grice e Mulgan (2010), resultante da aliança entre a Young Foundation, um dos maiores institutos de pesquisa em inovação social, e o NESTA (the National Endowment fos Science, Technology and the Arts). A publicação descreve o processo de inovação social em seis estágios, os quais não são sequenciais e se comunicam em loops de feedbacks: Alerta, inspiração e diagnóstico; propostas e ideias; prototipagem e pilotos; sustentando; escalando e difundindo; mudança sistêmica. O estágio do Alerta, inspiração e diagnóstico se caracteriza pela coleta de fatores que indicam a necessidade de inovação, assim como inspirações que podem ajudar no entendimento do desafio. Neste estágio é feito o diagnóstico - colocando a raiz do problema como questão a ser solucionada, em vez de atacar seus sintomas. A geração de ideias e conceitos é feita no estágio de Propostas e ideias, com métodos e estratégias mais informais, com o uso da criatividade e do design, resultando em insights e experiências. As ideias são testadas no estágio de Protótipos e pilotos, por meio de tentativas mais simples ou por métodos mais aprimorados, como o uso de pilotos. Os testes são bastante importantes na inovação social, uma vez que é por meio da iteração e tentativa e erro que se desenvolvem relações mais fortes e paradigmas são quebrados, além de resultar em um consenso geral sobre métricas de sucesso. O estágio de Sustentação implica na elaboração de um modelo que tenha sustentabilidade financeira da organização que irá implementar e acompanhar a inovação. A Escala e difusão de uma inovação social pode seguir diversos caminhos, dependendo da natureza da solução. Ela pode ser escalada por meio do crescimento da organização responsável ou franqueamento, ou por meios mais orgânicos, como a difusão da ideia por diversos contextos, com laços mais soltos. Por gravitar ao redor de uma missão, normalmente as organizações de inovação


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social tendem a apostar mais na propagação de sua inovação que no seu desenvolvimento de forma privada. Mudanças sistêmicas acontecem quando inovações mudam sistemas

fundamentais nos quais vivemos. Este tipo de processo envolve mudanças em mindsets, conceitos e fluxos econômicos, mexendo nas estruturas de poder e envolvendo quatro setores: negócios, governo, sociedade civil e a família. 2.3 NEGÓCIOS DE IMPACTO SOCIAL Assim como a gestão de design favorece o processo de inovação social, a sua manutenção deve ser feita por períodos longos de implementação, avaliação e aprendizagem. Dentre diversos mecanismos para que esse estágio de inovação ocorra, está a criação de um negócio de impacto social, ou seja, um empreendimento social que tem em sua base o produto ou serviço alcançado com o processo de design, que tenha os mecanismos de sustentação, manutenção, melhoria e até mesmo reestruturação da solução alcançada naquela comunidade. Os negócios de impacto social são empreendimentos que "objetivam oferecer formas de valor que atualmente os mercados tradicionais não conseguem reconhecer ou recompensar.” (HARTIGAN, ELKINGTON, 2009, p.20). Essas empresas são normalmente guiadas por uma missão, mas buscam gerar lucros ainda que estes lucros estejam primariamente voltados à sustentabilidade financeira da empresa, das pessoas envolvidas e até mesmo da viabilidade da solução. Negócios Sociais são empresas que têm a única missão de solucionar um problema social, são autossustentáveis financeiramente e não distribuem dividendos. Como uma ONG, tem uma missão social, mas como um negócio tradicional, geram receitas suficientes para cobrir seus custos. É uma empresa na qual o investidor recupera seu investimento inicial, mas o lucro gerado é reinvestido na própria empresa para ampliação do impacto social. (Yunus Negócios Sociais, 2016).

Comumente, os empreendimentos sociais operam sob grandes restrições econômicas, vendo-se obrigados a buscar investidores, financiamentos estatais, além de desenvolver processos inovadores frugais - ou seja, de baixo custo/ benefício. É notável, entretanto, que com o interesse em se desenvolver economicamente as populações de baixa-renda, ou o que Hart e Simanis (2008) denomina de Bases of Pyramid (BoP), criou-se esse novo nicho de mercado, com


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produtos e serviços acessíveis, altamente eficientes e rentáveis, além de serem

específicos para as necessidades das populações de baixa-renda. Essa quebra de paradigma, por si só, já demonstra uma grande inovação social, com aumento da acessibilidade e empoderamento de comunidades economicamente marginalizadas, na qual as pessoas previamente reféns de uma lógica dominadora e excludente, passam a ter oportunidade de escolha e de consumo de produtos que façam sentido em seu contexto. Essa nova abordagem econômica das populações da BoP é guiada, principalmente, por uma inovação que, por se caracterizar como processo frugal, colaborativo e específico para as comunidades, é uma inovação social. Assim sendo, demonstra-se que somente processos de inovação social poderão trazer equidade, acessibilidade, empoderamento e dignidade a populações vulneráveis, trazendo-as a novos patamares de exercício de sua cidadania e poderio econômico, desenvolvendo, junto a elas, serviços e produtos que lhes façam sentido. O futuro da inovação é social. 2.3.1 Case: Programa Vivenda No Brasil, cerca de 11 milhões de pessoas vivem sem condições de moradia adequada (EXAME, 2015). O Programa Vivenda é um negócio de impacto social no setor de moradia e habitação que busca mudar essa realidade, oferecendo um sistema inovador de reformas para populações de baixa-renda. O programa é caracterizado pela oferta de cinco kits (PROGRAMA VIVENDA, 2017): kit banheiro, kit cozinha, kit área de serviço, kit sala e kit quarto. Os kits são compostos por quatro itens, sendo eles: visita e planejamento por parte de arquitetos ao local, oferecimento de material para reforma, mão de obra qualificada para execução do serviço e crédito para pagamento da reforma. Assim, a empresa responsabiliza por toda a operação e os clientes podem pagar pelo serviço de forma parcelada, de maneira que seja viável financeiramente. 2.3.2 Case: Kickstart International A Kickstart International é um negócio de impacto social cuja missão é “retirar milhões de pessoas na África da pobreza, rapidamente, custo-efetivamente e de


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modo sustentável ao possibilitar que elas possam gerar renda” (KICKSTART INTERNATIONAL, 2017). A empresa atua no ramo de irrigação, com a produção de bombas de água de baixo custo, permitindo que agricultores possam irrigar suas plantações de forma correta e aumentem a sua produção de alimento e renda. A bomba em questão, nomeada de MoneyMaker, foi criada para ser facilmente transportada, de alta resistência, fácil manutenção, uso intuitivo e custo baixo. O design, nomeado pela empresa de “design centrado no fazendeiro" por trás da bomba permite que as pessoas possam comprar em suas próprias comunidades o equipamento e usá-las sem necessidade de instrução. Para que seja um negócio sustentável, a empresa não doa as bombas, permitindo assim que esta tenha um fluxo de capital que permita a produção e distribuição de mais bombas, viabilização de serviços e peças de manutenção e promoção e educação das pessoas por meio de marketing e publicidade.


3 METODOLOGIA DE PESQUISA

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A pesquisa estudará estratégias de aplicação de design thinking e inovação social e, posteriormente, produzirá um manual de Design Thinking para Inovação Social. Tendo, portanto, caráter qualitativo e quantitativo. Segundo Neves, a pesquisa qualitativa: Compreende um conjunto de técnicas interpretativas que visam descrever e a decodificar os componentes de um sistema complexo de significados. Tem por objetivo traduzir e expressar o sentido dos fenômenos do mundo social; trata-se de reduzir a distância entre indicador e indicado, entre teoria e dados, entre contexto e ação (MAANEN, 1979 apud NEVES, 1996, p.1).

O primeiro passo para a construção do manual de design thinking para inovação social foi uma pesquisa bibliográfica, pois ela "busca conhecer, analisar e explicar contribuições sobre um determinado assunto, tema ou problema.” (MARTINS; THEÓPHILO, 2009, p. 54). Assim, para a busca e compreensão de como a criatividade se insere no contexto do ensino superior, foram analisados livros, textos, periódicos ou qualquer outra fonte secundária para a criação de inventário de problemáticas e soluções encontradas em sistemas de ensino relacionadas à inserção do pensamento criativo em planos pedagógicos. Após a análise dos fatores acima mencionados, a estruturação do manual passou por um levantamento junto a estudantes universitários, em que foram apurados dados referentes às suas necessidades de aprendizado e dificuldades em relação ao uso da criatividade no sistema acadêmico, por meio de um questionário (survey) aplicado eletronicamente.

O conteúdo das perguntas de levantamento cobre quatro áreas fundamentais de conteúdo: dados pessoais, dados sobre comportamento, dados relativos ao ambiente (circunstâncias em que os respondentes vivem) e dados sobre nível de informações, opiniões, atitudes, mensurações e expectativas. (MARTINS; THEÓPHILO, 2009, p. 61).

Com o objetivo de direcionar o estudo para resultados relevantes ao escopo do projeto, o case tomou o caminho descritivo, no qual serão levantados negócios de impacto social, ONGs ou qualquer outra organização que realize ações de inovação social para análise. O manual terá por base a linha de pensamento do Design Thinking. Segundo Brown, (2010, p.215) esta abordagem foca no usuário


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final, integrando a tecnologia, os negócios e o contexto sociocultural das pessoas, possibilitando soluções mais eficientes e inovadoras.

Considerando-se que "A convergência de resultados advindos de fontes

distintas oferece um excelente grau de confiabilidade ao estudo, muito além de pesquisas orientadas por outras estratégias” (MARTINS; THEÓPHILO, 2009, p. 68), os dados levantados foram analisados e foi realizada análise de conteúdo destes, com o intuito de se discutir os resultados da pesquisa comparando-se as diferentes fontes de informações levantadas, buscando similaridades e discrepâncias, para elaboração de um material completo e assertivo. Finalmente, dados levantados se configurou em um material gráfico didático, com o intuito de agir como um toolkit (caixa de ferramentas) para a aplicação de design thinking para inovação social por universitários em comunidades. 3.1

QUESTIONÁRIO Para a estruturação do manual de Design para Inovação Social, foi

necessário um levantamento de dados com a comunidade universitária, mais especificamente docentes, discentes e demais pessoas que passaram pela experiência de formação universitária, a fim de levantar evidências e problemas latentes dessa comunidade em relação ao ensino criativo no ambiente universitário. Para tanto, foi elaborado um questionário, que, segundo Martins e Theóphilo (2009, p. 93), “é um importante instrumento de coleta de dados para uma pesquisa social. Trata-se de um conjunto ordenado e consistente de perguntas a respeito de variáveis e situações que se deseja medir ou descrever”. Günther (2003), enumera a estruturação do questionário em três princípios, sendo eles: 1) tratar a temática do geral para o específico; 2) Ordenamento lógico das perguntas; 3) Agrupamento de perguntas por temáticas, precedidas por uma introdução. Finalmente, a autora pontua que os questionamentos pessoais devem

vir ao fim: Um erro mais que comum é começar um instrumento com o levantamento de dados pessoais, às vezes até chamando seção de “Identificação”. Em se tratando de pesquisa, não convém identificar o respondente. Pelo contrário. Geralmente há que assegurar que a pesquisa não visa identificar indivíduos, mas que perguntas sóciodemográficas como educação, estado civil, sexo, idade, composição da família, renda, tempo de moradia, etc. servem apenas para caracterizar a amostra. (GÜNTHER, 2003, p.6)


Quanto ao tipo de pergunta, optou-se pela Escala tipo Likert:

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Consiste em um conjunto de itens apresentados em forma de afirmações, ante os quais se pede ao sujeito que externe a sua reação, escolhendo um dos cinco, ou sete, pontos de uma escala. A cada ponto, associa-se um valor numérico. Assim, o sujeito obtém uma pontuação para cada item, e o somatório desses valores (pontos) indicará sua atitude favorável ou desfavorável, em relação ao objeto, ou representação simbólica que está sendo medida. (MARTINS; THEÓPHILO, 2009, p. 96)

Também foram utilizadas perguntas de múltipla escolha para a caracterização do público respondente, tendo em vista que o questionário tem por público-foco a população que frequenta ou já frequentou o ambiente universitário. Para facilitar essa aplicação, foi escolhido o método de envio eletrônico, pois apresenta diversas vantagens, tais como “menores custos (materiais, fotocópias, postagem, input de dados, tratamento de dados, deslocamentos etc.); maior velocidade; possibilidade de se distribuir (enviar) para um grande número de potenciais respondentes etc” (MARTINS; THEÓPHILO, 2009, p. 94). A plataforma escolhida para a aplicação foi o Google Forms. Com a estruturação do questionário terminada, iniciou-se um pré-teste, selecionando-se cinco colaboradores para a validação das questões propostas. O pré-teste “evidenciará possíveis falhas, inconsistências, complexidade de questões formuladas, ambiguidades, perguntas embaraçosas, linguagem inacessível, etc” (MARTINS; THEÓPHILO, 2009, p. 94). Para tanto, foram adicionadas duas perguntas abertas ao final do formulário, “Descreva abaixo alguma dúvida ou dificuldade em responder este questionário.” (de caráter obrigatório) e “Descreva abaixo suas críticas e sugestões.” (de caráter facultativo). A validação ocorreu com um grupo multidisciplinar de cinco pessoas durante o período de 18/05/2016 a 21/05/2015. As falhas apontadas na validação foram ajustadas no questionário final. As respostas referentes à validação do questionário encontram-se no Apêndice A. 3.1.1 Análise O questionário final foi aplicado dos dias 30/05/2016 a 25/07/2016, contando com a colaboração total de 37 pessoas. Após este período, analisou-se os resultados do questionário “Criatividade no Ensino Superior”. Na seção “Sobre a Docência”, foram apontados claros problemas no sistema avaliativo, na afirmação


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“As avaliações se dão apenas pela memorização e repetição de conteúdo dado em aula e presente em livros-texto." em que 29,7% dos respondentes marcou 4 na escala e 24,3% marcou 5, constituindo uma média de 3,48; na afirmação "Existe um sistema eficiente e construtivo de feedback dos professores aos estudantes.”, 35,1% marcou 1 e 29,7% marcou 2 na escala, totalizando uma média de 2,02. Isso demonstra uma ausência de processos avaliativos assertivos na formação do estudante, colocando em dúvida a validade do conhecimento adquirido pelo aprendiz. Na seção “Sobre o Estudante”, percebeu-se uma abertura frágil à introdução de discussões por parte dos estudantes. Na afirmação “Eu percebo um estímulo proveniente do professor para a proposição de novas ideias e reflexões.”, 10,8% marcou 1 e 29,7% marcou 2, em contraponto à opção 5, que obteve 0% das respostas, com uma média de 2,72. Também notou-se um cerceamento da liberdade do estudante para administrar seu processo de aprendizado na afirmação "Eu sinto liberdade para escolher trabalhar em equipe ou individualmente no ambiente universitário.”, com 27% das respostas na opção 1 e 32,4% na opção 2, cuja média marcou 2,45; e na afirmação "Eu tenho conhecimento de um sistema de feedback dos estudantes aos professores.” com 32,4% das respostas na opção 1 e 32,4% das respostas na opção 2, com média 2,21, mesmo quando a vontade de participação se mostra clara na afirmação "Se há um sistema de feedback, eu me sinto à vontade em participar.”, com 35,1% das respostas na opção 4 e 13,5% na opção 5, alcaçando a média de 3,10. Por meio desta análise, é possível indicar que o sistema educacional estabelecido apresenta diversas falhas, conjurando práticas de ensino pouco assertivas ao público universitário, que se enquadra como jovem adulto. Portanto, é necessária a introdução de um modelo reformulado, mais adequado a essa comunidade, que considere as suas necessidades, experiências e perspectivas. 3.1.2 Análise de Conteúdo

Após o levantamento por meio do questionário, foi desenvolvida uma pesquisa bibliográfica, cujo o objetivo foi aprofundar e entender o conteúdo desenvolvido por teóricos da área por meio da discussão de seus trabalhos. Para tanto, foram selecionados quatro bibliografias principais para discussão e construção


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do manual, sendo elas o Field Guide for Human Centered Design (IDEO, 2015), o Bases of Pyramid Protocol (HART; SIMANIS, 2008), Criando Valor para Todos: estratégias para fazer negócios com os pobres (PNUD, 2008) e The Open Book for Social Innovation (MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010). A pesquisa bibliográfica implicou em uma análise de conteúdo, que para Bardin (1977) é:

Um conjunto de instrumentos metodológicos cada vez mais subtis em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a «discursos» (conteúdos e continentes) extremamente diversificados. O factor comum destas técnicas múltiplas e multiplicadas - desde o cálculo de frequências que fornece dados cifrados, até à extracção de estruturas traduzíveis em modelos- é uma hermenêutica controlada, baseada na dedução: a inferência (BARDIN, 1977, p.9).

A análise documental, portanto, oscila entre uma abordagem objetiva do texto com a interpretação subjetiva do autor, buscando evidenciar o que está colocado implicitamente no texto, trazendo a tona um texto paralelo que atua nas entrelinhas do conteúdo original. Isso só é possível devido à pesquisa bibliográfica em um âmbito maior, trazendo de outras obras pensamentos e teorias que se relacionam e complementam o conteúdo analisado, contribuindo assim para a explicitação de um discurso que ocorre no segundo plano do texto. Assim, por meio das relações estabelecidas entre os textos analisados entre si e com as obras da pesquisa bibliográfica, foi possível desenvolver um texto que une e decodifica todas estas relações, buscando evidenciar de forma coerente as ocorrências repetidas e complementares de todas as leituras, para a produção de um manual compreensível de Design Thinking para Inovação Social.


4 METODOLOGIA DO PROJETO

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Para o projeto gráfico do manual, foi realizada uma análise do levantamento bibliográfico e do questionário aplicado, levando-se em conta os métodos de design pesquisados e as necessidades do público-foco, a fim de conceituar o produto final, sendo ele o formato do material, estilo gráfico, construção didática e sessões a serem desenvolvidas. Segundo os materiais levantados na pesquisa bibliográfica e no questionário aplicado, enumerou-se as necessidades de ensino de design para inovação social, levando-se em consideração as metodologias e bibliografias levantadas (IDEO.Org, 2015, HART; SIMANIS, 2008, PNUD, 2008 e MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010) e o conceito de Andragogia, visto que o objetivo do manual é ensinar a universitários a replicar design thinking para inovação social em campo, com comunidades de baixa-renda. O processo andragógico caracteriza-se pela sua diferenciação no tratamento do aprendiz: enquanto a pedagogia trata o ensino a crianças, por técnicas caracterizadas pela transmissão do conhecimento e figuras de autoridade do saber, a andragogia se desenvolve enquanto um processo horizontal, na qual os aprendizes são caracterizados como indivíduos críticos, com experiências, necessidades e percepções distintas, capazes de determinar a qualidade da informação que recebem e, portanto, aceitam ou refutam aquilo que é transmitido (NOGUEIRA, 2004). Assim, a andragogia evita cenários que remetam à pedagogia, colocando os aprendizes em um papel ativo do conhecer, necessitando de um papel de facilitador, que os guie e organize os processos de aprendizado, contrariamente ao posicionamento de autoridade do saber que é característico de um professor. Para a aplicação do design thinking para inovação social por parte dos universitários em comunidades, os designers devem preocupar-se em facilitar os participantes pelo processo, desenvolvendo suas habilidades em conjunto e deixando claro os objetivos enquanto coletivo e enquanto indivíduo. Para isso, o manual foi elaborado como um guia prático, demonstrando diversas ferramentas para que os participantes possam aprender o processo de design thinking e se tornem designers autônomos (PATROCÍNIO; NUNES, 2015).


4.1

CONCEITUAÇÃO

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Para a estruturação do manual, seguiram-se as premissas do conceito de Andragogia, considerando-se o desenvolvimento de práticas que sustentem o desenvolvimento pessoal e intelectual dos participantes, assim como buscar promover aos estudantes responsáveis pela aplicação do processo uma linguagem simples, direta e objetiva. O manual oferece diretrizes a serem seguidas, sem uma rigidez metodológica, algo que não é congruente com o conceito de design thinking. 4.1.1 Estrutura do Manual O manual deverá agir como um material de apoio para aplicação prática de design para inovação social, no qual o estudante esteja capacitado em promover ações de inovação social em comunidades, propagando a habilidade de design para as populações vulneráveis, possibilitando que estas se empoderem e desenvolvam soluções próprias. O material de apoio será dividido em um total de 3 seções, subdivididas em 12 capítulos, com base nas bibliografias levantadas (IDEO.Org, 2015, HART; SIMANIS, 2008, PNUD, 2008 e MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010). A divisão encontra-se estruturada no quadro a seguir.


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Gráfico 1 - Seções e capítulos do manual.

Seção

Capítulo

Manifesto

1 - Por um Design Engajado 2 - Cultura de Inovação

Antes de Começar

3 - Mindsets 4 - Técnicas 5 - Panorama Geral 6 - Imersão 7 - Ideação

Design para Inovação Social

8 - Prototipagem 9 - Desenvolvimento 10 - Engajamento 11 - Implementação 12 - Acompanhamento

Fonte: Acervo do autor.

4.1.1.1 Manifesto Para entendimento do papel do designer em um mundo complexo, considerando as linguagens dos jovens adultos, o aspecto político do manual e do posicionamento em relação à atividade de design, optou-se pela produção de um manifesto introdutório neste material. O manifesto tem por função comunicar profundamente com o olhar crítico do leitor, assim engajando-o intelectual e emocionalmente ao conteúdo e posicionamento apresentado. 4.1.1.1.1 Por um design engajado O design vem enfrentando diversas transformações em sua prática em nossa sociedade. Em um mundo complexo e instável, essa prática vem se distanciando da sociedade e se integrando em processos industriais cada vez mais desconectados com as reais necessidades das pessoas. O designer, um indivíduo altamente


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sensível e criativo, está sendo reduzido a um papel operacional e mecânico, em uma posição na qual a criatividade e o potencial do designer é desperdiçado. Então, para que serve o design? O design é uma prática. Todo mundo é, de alguma forma, designer. Todos nós projetamos, construímos e mudamos o mundo a nossa volta, seja diretamente ou indiretamente. Viver sob a ilusão que designer é somente aquele que tem o seu diploma e domina as ferramentas é um erro que impede que construções muito mais significativas sejam realizadas por pessoas de diferentes áreas e contextos. O designer é aquele capaz de aliar criatividade com capacidade analítica, juntando a racionalidade à subjetividade e transformando conceitos imateriais em interfaces materiais. Enquanto profissionais, nós devemos repensar nosso papel na sociedade. Fazer design não deve significar mais receber um pedido e criar algo com uma assinatura. Para esse novo mundo, criar é uma atividade social, colaborativa. Devemos

facilitar a criatividade latente de pessoas que não se veem como designers e cocriar soluções inovadoras que realmente reflitam os contextos que irão atuar. O designer deve agir como embaixador da criatividade, ajudando pessoas a se empoderar por meio do design. O design deve se engajar com comunidades, com as pessoas, os usuários. O design deve ser humano e social. 4.1.1.2 Antes de começar Para que o processo de inovação ocorra, diversas variáveis devem ser consideradas, equiparadas e trabalhadas. Atualmente, para a formalização da criatividade - em termos de organização e execução - tem-se pensado na criatividade enquanto um processo, dividido em etapas, que, para algumas escolas, são sequenciais, enquanto outras acreditam na fluidez do processo. Tem-se colocado a criatividade em moldes metodológicos, algo que assegura os meios e fins, mas pode resultar em um engessamento das capacidades criativas do time ou indivíduo praticante. É importante refletir, entretanto, que a metodologia - ou seja, a sequência de instrumentos metódicos que devem ser seguidos para que se alcance um resultado final - não é capaz de fomentar a criatividade por si só, como vem sido praticada. Em diversas organizações, tem-se utilizado “ferramentas criativas” como plug and play (conectar e jogar - algo que vem pronto para uso), sem se preocupar


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com aspectos anteriores ao uso dos instrumentos. No contexto de times criativos, a criatividade é um processo social, demandando, portanto, ambientes que estimulem a troca entre os indivíduos. Para Alencar (1998, p.21), “A criatividade ocorre no contexto social e depende de processos de pensamento que têm suas raízes mais profundas na cultura. Tanto as normas, como as tradições, os valores, os tabus, os

sistemas de incentivo e punições afetam sua expressão”. Esta cultura reflete os contextos internos e externos das organizações, assim como as percepções individuais dos membros da equipe de design - a saber, os mindsets (mentalidades): "Não obstante, não podemos também deixar de lembrar que, embora a criatividade seja influenciada poderosamente por características da organização, o indivíduo exerce também uma influência no seu ambiente de trabalho, afetando, entre outros aspectos, o clima psicológico prevalente nesse ambiente” (Alencar, 1998, p.19). Portanto, para que as ferramentas sejam funcionais, é necessário uma Cultura de Inovação, construída por meio de Mindsets individuais apropriados, possibilitando o uso das técnicas criativas para um trabalho criativo fluido e honesto (Figura 3). Figura 3 - Espaços da cultura de inovação

Cultura de Inovação

Mindsets

Técnicas

Fonte: Acervo do autor.


4.1.1.2.1 Cultura de inovação

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A cultura de inovação se caracteriza pelo ambiente estabelecido em uma organização, com diversos aspectos que estimulam a criatividade dos indivíduos envolvidos no desenvolvimento de uma solução. A criatividade deve acontecer em dois âmbitos, o individual e o social: enquanto alguns processos criativos tem melhor desempenho quando praticados em times, outros momentos requerem reflexões e desenvolvimentos pessoais. Para tanto, é necessário um ambiente em que o indivíduo sinta-se livre e estimulado para elaborar ideias próprias e trazê-las a discussões em times criativos. Alencar (1998, p. 24) discute características de cultura adequadas ao pensamento inovador: Entre as primeiras, situam-se liberdade e controle, estilo de gerenciamento flexibilidade, recursos para se colocar a idéia em prática, apoio do grupo de trabalho, encorajamento, reconhecimento e feedback, tempo adequado para realização das tarefas. Por outro lado, dentre os fatores que bloqueiam a criatividade, estariam um clima organizacional pobre, excesso de avaliação e pressão, recursos insuficientes, ênfase no status quo, pressão de tempo, competição acirrada e projeto inadequado de gerenciamento.

Neste contexto, elencam-se quatro características essenciais para uma cultura de inovação estimulante: tolerância ao erro, empreendedorismo, comunicação e flexibilidade e horizontalidade. Tolerância ao Erro
 
 Na cultura ocidental, há uma visão negativista sobre o erro: este deve ser evitado a todo custo, e sua ocorrência significa um fracasso, falta de estratégia e de competência. Entretanto, quando se trata da criação de novas ideias e conceitos, o erro se torna primordial, uma vez que se caracteriza enquanto processo de aprendizagem e validação de ideias. Assim, o erro é um processo fundamental em uma cultura de inovação (BROWN, 2010), e sua abordagem não deve ser punitiva, mas reflexiva: o questionamento sobre o como e porque aquela determinada ideia falhou é um momento de aprendizado para construção de conceitos mais robustos e complexos.


Empreendedorismo

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A Endeavor Brasil define empreendedor como: Empreendedores questionam a realidade e fazem acontecer a evolução todos os dias, em todas as partes do Brasil e do mundo. Solucionando problemas de outras pessoas, de outras empresas ou de toda a sociedade, seus negócios são os grandes promotores do desenvolvimento. (ENDEAVOR BRASIL, 2016). 
 Uma cultura inovadora deve estimular os indivíduos a empreender suas próprias ideias, muitas vezes trabalhando sozinhos em protótipos e conceitos, trazendo a times conceitos mais elaborados para discussão e desenvolvimento. O espírito empreendedor caracteriza-se por otimismo, autoconfiança, coragem para arriscar, protagonismo, resiliência e perseverança (ENDEAVOR BRASIL, 2016). Portanto, a cultura que envolve este indivíduo deve trazer segurança, sentimento de pertencimento, espírito de equipe e uma missão comum. Comunicação A comunicação interpessoal é fundamental em processos criativos, uma vez que comunicar uma ideia pode não ser uma tarefa tão simples. Assim, a cultura deve permitir que cada membro da equipe comunique seus pensamentos da maneira em que se sentir mais seguro - seja por meio visual, verbal, gestual, escrito etc. Também é muito importante assegurar que os feedbacks gerados pelo time não sejam restritivos e sim redirecionadores, apresentando pontos de vista diferentes e propondo novas ideias e abordagens a partir da informação que gerou o feedback (HARVARD BUSINESS REVIEW IDEACAST, 2016). Assim, a construção de ideias colaborativas torna-se mais fluida e os membros da equipe sentem-se livres e engajados na proposição de ideias, sem gerar uma competição entre as ideias propostas. Flexibilidade e Horizontalidade


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Para que haja um trabalho em equipe fluido e criativo, as configurações hierárquicas de trabalho devem ser evitadas, assim como os entraves burocráticos característicos de empresas com abordagens tradicionais. As equipes criativas devem se sentir livres de uma autoridade para experimentar, testar, errar e propor ideias e conceitos, sem que precisem de autorização para cada ação proposta. Assim, existirá um processo orgânico de criação e desenvolvimento. Também é importante ressaltar que, em times de trabalho, é comum que líderes informais surjam. Estes líderes, entretanto, devem desempenhar um papel de guia, de facilitação, delegação e organização, sem que sejam vistos como figuras de autoridade. Para Alencar (1998) o papel do líder criativo é incentivar o time de trabalho em direção a uma missão comum, para que o interesse dos membros seja partilhado e universal. 4.1.1.2.2 Mindsets A cultura de inovação é influenciada e influencia os mindsets (mentalidade)

dos membros da equipe. Enquanto a cultura diz respeito aos aspectos coletivos de clima e ambiente organizacional, os mindsets são características individuais e pessoais dos membros, que definem suas atitudes, interações e formas de trabalho. Um elenco de traços de personalidade: pessoas que se caracterizam pela iniciativa, independência de pensamento e ação, flexibilidade, persistência e autoconfiança têm maiores chances de aproveitar as oportunidades para expressar e desenvolver idéias criativas. De especial relevância para a expressão da criatividade é a disposição para correr riscos e aprender com os próprios erros. A coragem é, pois, indubitavelmente um atributo de fundamental importância, uma vez que a criatividade implica lidar com o desconhecido. (ALENCAR, 1998, p. 21).

Portanto, para que o processo criativo seja bem sucedido, os membros da equipe devem se munir de mindsets adequados à produção criativa: Confiança Criativa A confiança na capacidade criativa é muito importante para o processo de inovação. Muitos mitos construíram-se em torno do conceito de criatividade, colocando-a como algo completamente intuitivo e inacessível para aqueles que não possuem “dom da inspiração”. A IDEO.org (2015, p.19, tradução nossa) define


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confiança criativa como “a crença que todo mundo é criativo, e que a criatividade não é a capacidade de desenhar, compor ou esculpir, mas uma forma de entender o mundo”4. É importante que cada membro da equipe se sinta empoderado de sua

capacidade de gerar e propor ideias, criando um sentimento de pertencimento ao processo criativo do time. Ao estimular sessões criativas, o designer deve compelir todos a participar, opinar e propor ideias e conceitos. O desenvolvimento de confiança criativa leva tempo, mas quanto maior a prática do processo, mais fácil será gerar e expressar conceitos criativos. Mão na massa O processo criativo é, além de propositivo, um momento de aprendizado, e a melhor maneira de se aprender é por meio da experiência. Muitas das ideias e propostas dos indivíduos e times envolvidos necessitam de validações para se estabelecerem como conceitos robustos e mais complexos. Assim, é necessário que o membro da equipe esteja sempre colocando suas ideias à prova, observando e questionando os resultados, aprendendo com sua própria ideia e iterando o conceito inicial. Não há desculpa para não criar: seja criando protótipos de papel e fita adesiva, a objetos mais complexos e caros, a experimentação é fundamental para que a ideia seja compreendida completamente. Espírito de equipe É importante entender que mesmo dentro de uma cultura que estimule o empreendedorismo, os membros da equipe estejam atentos ao nível de competitividade que se estabelece no time. A competitividade pode ser saudável, mas a colaboração é muito mais importante e necessária na criação de uma solução inovadora. Entender o próximo, ouvir suas preocupações, apontamentos, além de se comunicar assertivamente, mostrar novos caminhos e partilhar um propósito comum são maneiras de manter uma unidade no time de trabalho e construir uma solução na qual todos se sintam refletidos e empoderados.

4

"Creative confidence is the belief that everyone is creative, and that creativity isn’t the capacity to draw or compose or sculpt, but a way of understanding the world”.


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Segurança no Processo O processo criativo pode ser extremamente dúbio, frustrante e cheio de incertezas. Em alguns momentos, pode parecer que não existem mais caminhos para seguir e que a solução elaborada talvez não seja a resposta para o desafio levantado. É importante que o membro seja otimista e confie no processo: muitas vezes, é necessário um passo para trás para dar dois à frente. Muitas ideias surgirão e muitas ideias falharão ao se desenvolver enquanto solução, mas isso não significa falta de competência ou de criatividade; é apenas parte do processo de criação. Empatia Poder se colocar no lugar do outro é fundamental para a inovação. Entender profundamente os contextos em que se irá trabalhar, ver o mundo sob a perspectiva destas pessoas e trazê-las para dentro do processo é muito importante para que a solução desenvolvida seja adequada. Por muito tempo, o desenvolvimento de produtos tem abordado os mercados de forma egocêntrica, se pautando em percepções de necessidades e de problemas que muitas vezes não se traduziam na sociedade. Com empatia, a pessoa é colocada no centro do processo, possibilitando um trabalho integrador e assertivo. Tentar entender seus desafios diários, como elas fazem suas escolhas, sua cultura e suas reflexões, além de tentar se integrar neste meio, são formas para se desenvolver empatia. 4.1.1.2.3 Técnicas Quando a cultura de inovação estabelece um ambiente empreendedor, tolerante e flexível e os membros do time se sentem confiantes, otimistas, seguros, empáticos e pró-ativos, as técnicas que facilitam o processo de design podem ser introduzidas e utilizadas. Essas técnicas não caracterizam uma metodologia: ao contrário, se colocam enquanto um toolkit (caixa de ferramentas), que podem ser utilizadas ou não, dependendo das necessidades do time e das condições do contexto em que se encontram. Já os espaços em que estas técnicas se encontram são importantes para a realização de um trabalho de inovação social, uma vez que


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atendem a necessidades específicas relacionadas às condições especiais de um contexto vulnerável. Entretanto, a realização integral dos espaços não condicionam

o processo de inovação social, uma vez que há uma infinidade de variáveis a serem consideradas na execução de um projeto de design para inovação social. 4.1.1.3 Design para Inovação Social A partir deste capítulo, serão apresentadas técnicas e ferramentas levantadas de diversas fontes para aplicação de um processo de design thinking cujo o objetivo é estimular o surgimento de inovação social. 4.1.1.3.1 Panorama geral O panorama geral é representado por um infográfico, representando todas os espaços relacionados às ferramentas, assim como os conteúdos relacionados aos mindsets e à cultura de inovação. 4.1.1.3.2 Imersão A imersão é um processo de entendimento e aprofundamento no contexto em que se encontra o desafio a ser solucionado. Como o próprio nome indica, a imersão não se caracteriza por apenas uma observação objetiva daquela comunidade específica, mas requer um envolvimento do profundo do time com o ecossistema identificado. Para tanto é necessário que os indivíduos do time de design se coloquem como participantes daquele contexto, para que o desenvolvimento de empatia e o entendimento do desafio sejam completos. Mapeamento O mapeamento é um processo de imersão preliminar, uma visão superficial do contexto do desafio, e pode ser dividido em três momentos: a tour guiada, a definição de escopo de atuação e criação de um plano de projeto. A tour guiada age como uma observação preliminar do contexto em que se irá trabalhar. Seu papel é identificar os grupos, indivíduos e famílias da comunidade, o


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panorama geral, as principais dificuldades enfrentadas, os aspectos geográficos, estruturais, identificar pessoas-chave, relações importantes, agentes externos etc. Esse processo se caracteriza como um olhar panorâmico, um entendimento holístico do contexto e seus pontos-chave relacionados ao desafio. A tour guiada não deve ser feita direcionada ao desafio, uma vez que informações aparentemente não relacionadas a ele podem surgir neste momento. Após a tour guiada, a equipe deverá se reunir, mapear o ecossistema visualizado na tour e identificar pontos-chave de atuação da equipe, que podem estar relacionados direta ou indiretamente ao desafio. Esse processo facilitará a definição do escopo de atuação, que são os problemas que a equipe irá abordar, respondendo a perguntas como:

“Qual o problema geral que estamos tentando

responder?”, “Quais as ramificações específicas deste problema que devem ser abordadas?”, “Quem são as pessoas relacionadas a cada ramificação?”, “Quem são as pessoas-chave deste processo?”. Por fim, a equipe deverá definir um plano de projeto, identificando quem irá a campo para realizar outras técnicas de imersão, quais serão os locais (geográficos e sociais) de atuação da equipe, quais os procedimentos de coleta de dado (captura de vídeo, fotografia, áudio, anotações etc.), como estes dados serão tratados (análise etnográfica, análise comportamental etc), selecionar as técnicas a serem utilizadas e delegar funções na equipe. Construindo Confiança Entender um contexto completamente diferente de sua vivência é algo muito difícil. Por mais empático que possamos ser, muitas vezes não conseguimos projetar a realidade de outras pessoas a nossa própria experiência. Por isso, é muito importante que as relações estabelecidas em campo com as pessoas sejam honestas e de confiança, para que o máximo de informação seja apreendida, tanto empiricamente quanto objetivamente. Construir confiança com comunidades vulneráveis pode ser desafiador, uma vez que os indivíduos do time serão vistos como intrusos naquele contexto, criando um sentimento de suspeita e rejeição pelas pessoas da comunidade. Para superar este obstáculo, Hart e Simanis (2008) sugerem encontros com os habitantes locais


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para introduzir os membros da equipe, esclarecer os objetivos do time dentro da comunidade e responder às dúvidas das pessoas.

Após esse momento, o time deve identificar famílias que possam abrigar membros da equipe, para que estes vivam o dia-a-dia junto às pessoas da comunidade. Este momento não se caracteriza pela coleta de dados e de informações, mas de construção de confiança. O membro da equipe deverá participar nas tarefas de casa e da comunidade e auxiliar o morador em seu trabalho, sempre com cuidado para não criar um fardo para a família que o está recebendo. Este processo deverá ajudar a identificar as pessoas-chave da comunidade, ou seja, aquelas que têm acesso a uma grande quantidade de informações e contatos, aumentar a empatia entre o time e as pessoas, além de evitar o surgimento de gate-keepers (guardiões de portão), que poderiam restringir o acesso da equipe de design em determinados momentos do processo. Observação A observação é uma técnica em que a equipe se colocará em um papel passivo de receptor de informações, acompanhando pessoas da comunidade, visitando famílias e verificando seu cotidiano, seus comportamentos, dificuldades, relações, atividades, cultura e visão de mundo. A observação é um procedimento cognitivamente exigente, sendo recomendável a coleta de dados (gravações, fotos, vídeos) e anotações pelos membros da equipe, uma vez que algumas percepções e insights podem surgir em campo, enquanto outras informações importantes podem ser ignoradas por algum tipo de distração ou por não parecerem relevantes naquele momento. O processo de observação preferencialmente deve ser realizado diversas vezes, a fim de se obter uma gama de informações e percepções diferentes. Realizadas as observações, os dados devem ser tratados por meio de análises etnográficas, para mapeamento de informações críticas coletadas em campo, que irão facilitar a elaboração de insights, visualização de desenvolvimento de ideias para uma solução no processo de ideação, além de servir de guia para estruturação de entrevistas e definição de pontos de desvio positivo. Entrevistas


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Entrevistas podem ser feitas em grupos, individualmente ou com especialistas

(IDEO.org, 2015). O poder da entrevista é direcionar o entrevistado a questões chave surgidas no período de observação. O melhor meio para se entender uma pessoa é conversando com ela. Neste momento, a equipe deve ter cuidado para não intimidar o entrevistado para que suas respostas sejam honestas. Para tanto, a equipe de entrevistadores deve ser pequena; o local da entrevista deverá ser o ambiente do entrevistado, onde ele se sinta à vontade e se possa perceber sua relação com seu ambiente; o entrevistado deve estar seguro de que sua entrevista não será identificada e as informações repassadas serão de caráter de pesquisa somente. Também é importante desenvolver um roteiro de perguntas de forma semiestruturada, ou seja, que seja adaptável ao fluxo da conversa, apresentando perguntas abertas para o entrevistado. Deve-se observar a linguagem utilizada e termos comuns ao entrevistado, evitando-se termos técnicos (à excessão da entrevista com um especialista). Para a estruturação do questionário, deve-se começar por perguntas gerais, seguidas por perguntas mais específicas. Pode-se usar outras ferramentas para esta técnica, como imagens que evoquem sentimentos do entrevistado, facilitação gráfica no decorrer da entrevista e perguntas sobre outras pessoas inseridas naquele contexto. É importante que o entrevistado tenha tempo para responder às perguntas feitas, ou seja, os momentos de silêncio entre uma pergunta e uma resposta devem ser respeitados, uma vez que eles significam que uma reflexão está sendo feita por parte do entrevistado. Desvio Positivo O desvio positivo (positive deviance) pode ser entendido como: O Desvio positivo é baseado na observação de que em toda comunidade existem alguns indivíduos ou grupos com comportamentos e estratégias incomuns que os possibilita achar melhores soluções para problemas que seus pares, enquanto possuem o mesmo acesso e os mesmos recursos e


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enfrentam desafios piores ou similares. (POSITIVE DEVIANCE INITIATIVE, 2016).5

Em muitas comunidades é comum que haja um espectro de dificuldades consequentes de um único desafio, geradas por impactos diretos e indiretos de um problema específico. Consequentemente, cada núcleo, família, grupo ou indivíduo será impactado diferentemente pelo desafio. Neste contexto, as famosas gambiarras - soluções informais desenvolvidas pelas pessoas afetadas pelo problema - podem ser um exemplo de desvio positivo, uma vez que oferecem pistas de como a solução para um problema pode ser alcançada sob o olhar da própria comunidade. Portanto, é interessante observar comportamento, objetos criados e estratégias desenvolvidos pela comunidade sobre o desafio, oferecendo pistas de como sanar problemas. Para identificar casos de desvio positivo, deve-se identificar as pessoas mais afetadas pelo desafio, entender como elas convivem com aquele problema e como solucionam ou se adequam àquela situação. Também deve-se identificar as pessoas com a melhor qualidade de vida naquele contexto, identificando qual o caminho que foi tomado para que se alcançasse este status. Pesquisa Desk A pesquisa desk é feita em bases de dados (internet, livros, revistas etc.) com o objetivo de olhar para situações externas à comunidade que tenham alguma similaridade com o desafio encontrando. A pesquisa desk caracteriza-se por pesquisa de tendências sociais e de mercado, análise de similares, estudos acadêmicos e análise de análogos. As pesquisas de tendências sociais e de mercado são normalmente oferecidas por observatórios, mas é possível identificar tendências por meio de análise de dados de institutos de estatística (como IBGE e IBOPE). A pesquisa de tendência é importante para entendimento do contexto social e macroeconômico, que afetam indiretamente a comunidade em que se atua.

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“Positive Deviance is based on the observation that in every community there are certain individuals or groups whose uncommon behaviors and strategies enable them to find better solutions to problems than their peers, while having access to the same resources and facing similar or worse challenges".


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A análise de similares se dá quando se procuram contextos similares àquele enfrentado no desafio, identificando casos em diferentes países, culturas e

sociedades e entendendo a qual solução se chegou e o porquê desta. É importante ressaltar que a equipe deve evitar copiar modelos já executados, uma vez que cada contexto oferece desafios e características distintas, portanto necessitando de soluções adequadas e assertivas. Os estudos acadêmicos podem ter um papel interessante na construção de conhecimento sobre o desafio, uma vez que a academia muitas vezes parte de um resgate histórico para o estudo de um caso específico, trazendo insights sobre como este problema se desenvolveu ao longo da história. A análise de análogos difere-se da análise de similares por procurar casos que parecem não ter relação com o desafio imposto. Os análogos oferecem elementos específicos que, quando isolados de seu contexto, trazem insights que podem ser adaptados ao desafio em que se trabalha. 4.1.1.3.3 Ideação A ideação é organização, análise e interiorização da informação levantada na fase de imersão, transformando os dados do campo em conhecimento dos membros da equipe, para elaboração de ideias e conceitos que proponham uma solução para o desafio identificado no projeto. A equipe deve, para tanto, por em prática técnicas de cunho criativo, conectando conceitos, mapeando insights e desenvolvendo uma solução criativa. Mapeamento de Insights Insights são pensamentos que surgem como clarificações a respeito de um problema, podendo aparecer espontaneamente ou após um longo processo de racionalização. O mapeamento de insights é um processo analítico, ou seja, de sintetização do que foi colhido em campo, transformando os dados em informação e, posteriormente, em conhecimento. O mapeamento é importante para resgatar insights ocorridos no processo de imersão, além de gerar novos insights pela visualização de informações e conexões feitas durante a análise de dados. Assim, diversos pensamentos serão evidenciados,


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dando diversos direcionamentos ao processo de ideação. Neste momento, deve-se evitar julgamentos precipitados, dando espaço a todos os tipos de insights

emergentes, para que exista uma diversidade criativa e diversos caminhos a serem seguidos no processo de ideação. Cocriação A cocriação é um processo no qual as pessoas que serão impactadas pela solução final auxiliam no processo de criação da mesma. Ao contrário do que se tem visto na indústria, na qual os colaboradores são colocados em uma situação controlada, com suas opiniões, decisões e ideias são restritas a um fim específico e que, normalmente, não afeta a solução de maneira ampla, no processo de cocriação, o colaborador é colocado como membro da equipe de design, participando totalmente da elaboração de ideia, análise das mesmas e processos decisivos. É importante que os colaboradores colocados sejam pessoas que realmente façam parte do contexto em que se irá atuar, evitando-se restringir a participação de qualquer membro da comunidade que esteja interessado (SANDERS; STAPPERS, 2008). Caso sejam muitas pessoas, é possível promover uma rotatividade dos colaboradores, para que todos possam se sentir empoderados na criação da solução, assim como há a diversificação de ideias e perspectivas, muito importante para o processo de design. Brainwriting O brainstorming, por muito tempo, foi tido como uma ferramenta fundamental para a elaboração de ideias e conceitos. Entretanto, estudos recentes (PEACE, 2016, EVANS, 2016) provam que não somente o brainstorm não é eficiente enquanto método para se obter inovação, ele é nocivo para a elaboração de ideias inovadoras. O brainwriting é um método que vem se estabelecendo como mais produtivo e eficiente de geração de ideias. O processo é simples: cada participante escreve suas ideias em uma folha de papel e passa a folha para a pessoa ao lado, continuando a escrever as proprias ideias na folha que receber, realizando um


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círculo de troca de ideias. Após a sessão de brainwriting em grupo, cada pessoa

deve desenvolver suas ideias individualmente. Por fim, cada um do grupo deve apresentar suas ideias e conceitos. Mash-up O Mash-up consiste na mistura das ideias que foram desenvolvidas pelo grupo. Essa técnica pode ser realizada de diversas maneiras: escrevendo em duas listas e conectando conceitos; colocando todas as ideias em uma matriz, cruzandoas e descrevendo o resultado da mistura; conectando todas as ideias e agregando todos os conceitos em uma ideia guarda-chuva, etc. Este é um processo livre, ainda de criação e desenvolvimento de alternativas a partir das ideias obtidas no brainwriting. Essa técnica permite que conceitos mais robustos sejam entendidos, desenvolvidos e evoluídos, para que a solução seja abrangente e assertiva. Princípios de Projeto Os princípios de projeto são diretrizes que guiam e mantém a solução coerente e consistente para sua evolução e desenvolvimento. Normalmente, ao se elaborar e definir conceitos e ideias, alguns elementos em comum começam a emergir, unificando os diferentes conceitos elaborados pelos times. Esses elementos, normalmente alinhados com os insights que surgiram no mapeamento, se transformarão nos conceitos de design. Para definir um conceito, deve-se identificar os pontos em comum entre as soluções, qual o impacto que elas teriam no contexto estudado e o porquê deste impacto. Identificados estes pontos, eles devem ser transformados em frases curtas e diretivas, evitando-se construções muito específicas, uma vez que estas podem ser limitantes ao projeto.


Conceituação

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A conceituação é o momento de dar mais corpo a uma ideia. O conceito é mais refinado, detalhado e assertivo que uma ideia, representando elementos que podem ser testados e desenvolvidos em etapas posteriores. Para desenvolver um conceito, pode-se desenvolver uma ideia, ramificando-a em diversas extensões e ações, criando um sistema em que aquela solução irá atuar. Também é possível criar um sistema conectando outras ideias e conceitos, detalhando assim uma jornada que envolverá diversas ações, ideias e conceitos para uma determinada solução. É importante sempre se referir ao desafio, perguntando-se se ele está sendo resolvido e como isso acontece no conceito atual. Também não se deve engessar um conceito, mantendo-o flexível para que possa se adaptar a futuros testes e ideias que emergirão nas fases conseguintes. 4.1.1.3.4 Prototipagem A prototipagem constitui-se como uma das principais técnicas do processo de design (BROWN, 2010). É muito comum que ideias que se originam em organizações sejam desenvolvidas antes de serem devidamente testadas, resultando em produtos que são pouco funcionais, de sucesso pífio ou até mesmo danosos para os contextos em que buscam atuar. Portanto, a prototipagem é um mecanismo eficiente para assegurar que os conceitos desenvolvidos sejam validados junto às pessoas e comunidades a qual se prestarão a solucionar um desafio. Elas devem ser realizadas em campo, com as pessoas que serão impactadas pela solução e demais atores-chave identificados na fase de imersão. Protótipos Rápidos O principal propósito de um protótipo é tangibilizar uma ideia para que ela possa ser testada. Ele deve ser construído para que seja suficiente para transmitir um conceito ou ideia e que ela possa ser posta à prática, com a intenção de validação. O protótipo rápido é algo de baixo custo, inacabado, imperfeito e com o único propósito de testar ideias - o time deve elaborar, testar, aprender e iterar sobre aquele protótipo, seja construindo sobre e adicionando novos elementos a ele ou


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desenvolvendo novos protótipos para a validação de dados obtidos em testes. Os

protótipos são uma maneira excelente de aprender fazendo, colocar ideias à prova e dar mais corpo a conceitos. Role Playing Role playing (interpretação de papéis) é uma maneira de se colocar no lugar dos colaboradores e clientes de uma organização e testar experiências, serviços e sensações. O princípio fundamental do role playing é detalhar como aquela experiência acontece, entender o que o cliente procura ao interagir com a organização e qual é a reação dos colaboradores a esses desejos. Esse processo pode ser extremamente rico, principalmente quando se coloca encenam diversos cenários e possibilidades de experiência. Acessórios ajudam os membros da equipe a desempenhar a técnica com mais facilidade, tornando o processo mais realista. É importante ter observadores do role playing para tomar notas e levantar questionamentos neste tipo de prototipagem. Storyboard Storyboard é uma técnica na qual se coloca uma ação em diversos planos sequenciais, com o fim de determinar o passo-a-passo de uma jornada para que a solução seja executada. O storyboard ajuda a equipe a refinar a solução, visualizar todos os passos da experiência da solução, além de auxiliar na visualização de lacunas na jornada do usuário. Para realizar um storyboard, basta determinar que conceito deve ser desenhado, determinar quem, onde e quando aquilo ocorrerá (temporalidade, cenário e pessoas envolvidas) e desenhar uma sequencia de ações. Para o storyboard, não é importante que se desenhe bem: o que importa é que as ações façam sentido e sejam sequenciais. O storyboard também pode ser usado como um guia para a técnica de Role Playing. Plano de Negócios Elaborar um plano de negócios de uma solução significa estabelecer todos os aspectos importantes para que a solução se integre ao ecossistema em que irá ser


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introduzido. Isso significa visualizar os meios de capitalização e rentabilidade, os parceiros necessários para viabilização da solução, os custos do processo, os

canais de comunicação e entrega para o cliente, a relação que será estabelecida com o usuários e demais fatores que compõem o Canvas Business Model (OSTERWALDER; PIGNEUR, 2011). Essa técnica é importante para estabelecer os caminhos necessários para que a solução seja viabilizada no mercado.

4.1.1.3.5 Desenvolvimento O desenvolvimento de uma solução acontece quando o conceito da solução é robusto, as ideias foram testadas, validadas e iteradas e o sistema já pode ser visualizado e avaliado tanto no macro quanto no micro da solução. Assim, se faz necessário o desenvolvimento da solução, seja ela um produto, serviço, marketing, mudança organizacional ou mudança de processos. Produto O desenvolvimento de produtos normalmente envolve engenheiros, designers, técnicos, equipamentos e tecnologias. Sendo assim, é um processo custoso, que dependerá de investimentos e envolvimento de organizações maiores para sua elaboração. É importante que o time de design esteja próximo do time de desenvolvimento, uma vez que devem-se evitar alterações no processo de desenvolvimento que mudem os conceitos e princípios de design que o time estabeleceu. As equipes devem agir de forma conjunta e pensar como adaptar a ideia em um produto tangível e funcional para implementação no mercado. Serviço Para serviços, a equipe de design deve desenvolver um blueprint do processo, especificando todos os passos para realização do serviço, cenários possíveis, agentes envolvidos, os papéis de cada agente, funções e sistemas organizacionais. A inovação em serviço envolve treinamentos, recrutamento e


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organização dos papéis, uma vez que o principal valor de um serviço é a sua experiência. Marketing Inovação em marketing consiste em uma nova abordagem em relação ao mercado para algo que já existe. Podem ser consideradas ações de marketing

processos educacionais, remanejamento de marca, mudanças comunicacionais, reavaliação de canais com os consumidores e demais ações que agreguem um valor positivo para a imagem da marca em questão. No campo de inovação social, as ações de marketing normalmente encontram-se na área de responsabilidade social, que deve ser construída com muito cuidado para não causar dependência da comunidade com o projeto. Para uma inovação em marketing, o time deve contar com profissionais da área que sejam capazes de elaborar e executar um plano de marketing. Organização Mudanças organizacionais podem atingir desde a cultura de uma organização até a mudança de algumas funções e papéis em setores operacionais. Em qualquer inovação organizacional, será necessário um processo de treinamento dos colaboradores, reavaliando diversos papéis exercidos por todos os envolvidos na solução. Mudanças organizacionais requerem ações conjuntas ao RH e um psicólogo organizacional, que direcione as mudanças e facilite os treinamentos dos colaboradores. Processos Mudanças em processos podem desdobrar em mudanças de maquinários, fornecedores, tecnologias, pessoal e até mesmo espaços. As mudanças em processos afetam a cadeia produtiva de uma organização, mudando a maneira como um produto ganha seu valor material e imaterial. É importante que as mudanças de processo sejam acompanhadas por treinamento, não interfiram


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negativamente na qualidade final do produto e resultem e um processo mais eficiente e, consequentemente, menos custoso. 4.1.1.3.6 Engajamento Normalmente, quando se pensa em inovação, pensa-se em um novo produto

ou serviço que irá atingir um mercado não explorado, trazendo dividendos para uma organização e aumentando sua lucratividade e competitividade. Essa visão mercadológica de inovação não se reflete completamente nos processos de inovação social. Isso acontece porque o principal impacto da inovação social é a melhoria da qualidade de vida de um determinado grupo. Dito isso, a inovação social, portanto, não deve trazer a dependência de uma população com a organização promotora da solução, visto que este tipo de relacionamento não favorece as pessoas em situação de vulnerabilidade, colocandoas sob o poder de decisões arbitrárias destas organizações. A verdadeira inovação social é aquele que transforma vidas, envolve aqueles que fazem parte do contexto trabalhado, colocando as pessoas da comunidade como colaboradoras da solução e empoderadas de seus processos e funcionamento. Treinamentos e Organização Entre os diversos obstáculos que restrigem a integração de pessoas de baixarenda ao mercado, a falta de habilidades e conhecimento emerge como um grande impeditivo para desenvolvimento socioeconômico (PNUD, 2008). Neste contexto, para integração da comunidade no desenvolvimento da solução e sua viabilidade enquanto empreendimento, são necessários dois momentos: organização e distribuição de funções e treinamentos. Para que uma solução seja bem sucedida, é necessário que se desenvolva uma equipe responsável pelo empreendimento que a entorna. A melhor maneira de garantir que isso aconteça é criando este empreendimento com as pessoas da comunidade que é impactada pela solução, uma vez que elas são as maiores interessadas no bom funcionamento da inovação. Assim sendo, a equipe de design deve se atentar às relações já estabelecidas na comunidade, observando as atuações das pessoas no contexto, para atribuir um papel coerente no


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empreendimento social (PNUD, 2008). Após a determinação de cargos, a equipe deve elaborar treinamentos para cada papel criado, capacitando as pessoas da comunidade a desempenhar seus cargos da melhor maneira possível, garantindo a sustentabilidade da solução (IDEO.Org, 2015). Criando o Mercado Ao se envolver a comunidade na criação, desenvolvimento e implementação

de uma solução de inovação social, relações de confiança são criadas entre a comunidade e o empreendimento. Isso acontece porque as relações sociais já estabelecidas corroboram com credibilidade para o projeto (PNUD, 2008). Este processo também é verdade para a criação de mercado - quanto mais envolvida uma comunidade de um projeto de inovação social, maior será a consciência da solução e, consequentemente, se criará um mercado no contexto trabalhado (HART; SIMANIS, 2008). Ao se criar em conjunto com a comunidade, existe uma sensação de pertencimento das pessoas com o empreendimento, desenvolvendo um mercado-base muito forte e fiel à marca criada. Empoderamento Transformar uma ideia em um empreendimento depende da capacidade dos colaboradores em assegurar a sustentabilidade econômica da empresa, segundo Hart e Simanis (2008). Assim que os papéis dos colaboradores da comunidade estiver devidamente distribuído, o time de design deve promover sessões de capacitação, convidando empreendedores de sucesso para palestrar, promovendo visitas em campos de start-ups bem sucedidas, promovendo acesso a material de estudo para os colaboradores e promovendo sessões práticas de gestão de negócios, assessorando e mentorando as pessoas da comunidade para que elas possam desenvolver seu papel dentro do negócio social que está emergindo da solução. Este passo é importante porque contribui para o alinhamento de expectativas das pessoas da comunidade, além de promover o empoderamento destas como principais agentes de mudança, atribuindo a responsabilidade de promover a inovação do contexto social em que vivem às próprias pessoas impactadas pela


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solução. Esse processo se identifica como uma mudança de paradigma no design, no qual os principais responsáveis pelo projeto são os cocriadores e não o time de design. 4.1.1.3.7 Implementação A inovação normalmente nasce de processos de tentativa e erro, aprendizado

rápido, iteração e melhoria (MURRAY, CAULIER-GRICE E MULGAN, 2010). A implementação é um ponto crítico do projeto, na qual a equipe deve se preocupar em colocar toda a solução - que a este ponto se transformou em um sistema - em prática. Isso significa introduzir a solução no mercado e sociedade, reconhecendo todas as interações criadas, intencionais ou não, criar parcerias, desenvolver o plano de negócios, enfim, envolver a comunidade na construção de um Negócio de Impacto Social (IDEO.Org, 2015). Roadmap de Implementação Roadmaps de implementação são visualizações estratégicas dos caminhos que a equipe deve seguir para chegar em um resultado efetivo na implementação da solução em uma determinada linha do tempo. Para a elaboração de um Roadmap de implementação, o time deve determinar as metas de implementação da solução e em qual momento aquela meta deve ser cumprida. Feito isso, a equipe se pergunta sobre o que deve acontecer entre o início da implementação e a data da meta para que ela seja alcançada, quem são as pessoas envolvidas nesse processo e determinar os responsáveis pelo cumprimento da mesma. Nesse processo, a linha do tempo pode ser reorganizada de acordo com cada meta, criando um processo passo-a-passo para que cada uma das metas tenha sucesso. Piloto O projeto piloto, diferentemente do protótipo, é um processo no qual se avalia a solução como um sistema, introduzindo sua primeira versão no mercado e observando, a longo-termo, como a solução interage com as forças do mercado,


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forças sociais e, acima de tudo, como ela se sustenta no contexto em que foi introduzida (IDEO.Org, 2015).

Normalmente em projetos piloto, o sistema a ser testado é congelado, ou seja, a solução idealizada não passa por iteração e melhorias durante o processo de pilotagem, para que a equipe consiga avaliar formalmente todas as repercussões do projeto no contexto trabalhado (MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010). Os projetos pilotos podem ser testados em diferentes instâncias e com diferentes modelos idealizados, observando e reportando os pontos em que o sistema tem sucesso e os pontos em que falha. Parcerias e Investimento A esse ponto do projeto, a equipe já consegue visualizar a solução validada, seu impacto no contexto trabalhado e suas necessidades principais - é o momento de buscar parcerias e investimento para viabilização da estabilização, escala e difusão da solução em outros contextos em comunidades. Para tanto, é necessário mapear e desenvolver parcerias e determinar uma estratégia de investimento (IDEO.Org, 2015). Para construir parcerias, a equipe deve determinar quais necessidades podem ser resolvidas pela equipe e quais necessitam de atores externos para serem viabilizadas (IDEO.Org, 2015). Isso significa entender onde a solução precisará de investimentos, prestação de serviços, fornecimento de material ou mesmo produção industrial. Com as necessidades definidas, a equipe deve mapear possíveis parceiros e entender quais os meios necessários para estabelecer a parceria. Ao mesmo tempo, a equipe, elencando onde precisa de investimentos para viabilizar a solução, agora deve determinar a quantidade de investimento que necessita, observar o modelo de negócios e visualizar quando a empresa será capaz de realizar o break-even6. Com essas informações será mais fácil estabelecer qual caminho a estratégia de investimento seguir, seja ele por meio de crowdfundings, editais do governo, modelos de equidade, investidores-anjo, financiamentos, investimentos de fundações etc. (MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010).

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Break-even acontece quando o custo e a receita se igualam, resultando em um lucro neutro. (MERRIAM WEBSTER, 2016)


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4.1.1.3.8 Acompanhamento Para que uma solução de inovação social se desenvolva, é necessária a sua expansão, transformando uma solução em impacto social (SEELOS; MAIR, 2016). Para que isso aconteça, a equipe de design deve acompanhar sua implementação e desenvolvimento no mercado a longo prazo por meio de uma organização de Negócio de Impacto Social, responsável por captar feedbacks, iterar e melhorar a solução e buscar escala e difusão. Este processo pode ser difícil, uma vez que o a inovação social está atrelada a condições locais (HART; SIMANIS, 2008), necessitando mecanismos específicos para que a inovação social seja capaz de atingir outros contextos e comunidades (MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010). Determinação de métricas O papel das métricas é evidenciar se a solução está bem sucedida, quais pontos estão se desenvolvendo e quais outros necessitam de atenção, além de ajudar a entender se a solução pode ser escalada (MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010). É importante que as métricas englobem tanto aspectos econômicos como sociais, ajudando a organização a entender a sua saúde financeira e a extensão do impacto causado pela solução. Neste processo, é importante estabelecer qual o objetivo de cada métrica, observando as metas estabelecidas anteriormente e trazendo os parceiros e pessoas da comunidade para discutir como elas gostariam de monitorar a solução (IDEO.Org, 2015). Por exemplo, se a solução atinge a área da saúde, verificar as métricas de internações, diagnósticos e conscientização da população sobre o problema são bons meios de verificar o impacto da solução. Contrapondo estes dados a análises de custo-benefício, retorno social do investimento, métricas operacionais de produção, satisfação dos usuários (MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010), se consegue uma análise da eficácia da solução e seu potencial de crescimento. É importante que se utilize métodos quantitativos e qualitativos de avaliação em conjunto, criando uma mistura poderosa de histórias e dados (IDEO.Org, 2015).


Canais de Feedback

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Receber o feedback das pessoas impactadas pela solução é um processo que não tem fim (IDEO.Org, 2015), uma vez que a organização deve procurar sempre crescer e melhorar. O processo de design para inovação social é cíclico, e, portanto, ouvir o que as pessoas tem a dizer é indispensável. A captação de feedbacks pode ser realizada de diversas formas. Pode-se criar um conselho na comunidade com mecanismos de rotatividade (HART; SIMANIS, 2008, MURRAY; CAULIER-GRICE; MULGAN, 2010), realizar entrevistas com usuários e não-usuários (IDEO.Org, 2015), reuniões com parceiros e demais atores-chave envolvidos no processo de inovação. A captação de feedback pode até mesmo necessitar de um novo processo de Imersão, trazendo novos insights e ideias para iteração da solução e levando a equipe para um novo processo de Ideação - podendo resultar em novos produtos, novas estratégias, ou até mesmo em projetos spin-off. Escala e Difusão Para que uma inovação social se estabeleça como um processo de impacto social, a escala é necessária (SEELOS; MAIR, 2016), e para isso, deve-se pensar em um crescimento horizontal e não vertical (HART; SIMANIS, 2008), uma vez que o impacto social está associado a implementação da solução em diversos contextos e locais. Porém, esse trabalho pode se demonstrar dificultoso, uma vez que todo o projeto foi desenvolvido com uma comunidade específica. Existem diversos modelos de difusão de inovação social. Manzini (2008) elenca três modelos de replicação: a franquia, que segue um roteiro restrito definido pela empresa-mãe; o format, no qual o roteiro oferece certa flexibilidade para as replicações; e o toolkit, que dá acesso a instrumentos necessários para desenvolvimento de um empreendimento baseado na empresa-mãe, mas oferece mais liberdade e, muitas vezes, isenta a empresa-mãe de responsabilidade por suas réplicas. Hart e Simanis (2008) argumentam que o melhor meio de difusão é por meio de projetos de polinização, na qual a equipe de design replica o processo de inovação social, porém com maior especificidade e assertividade, utilizando dados e ideias levantados no primeiro projeto e, assim, replicando e adaptando a ideia para


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cada contexto. Esta abordagem é importante para promover engajamento em novas comunidades, assegurando maiores taxas de sucessos do que a simples réplica de um produto ou serviço em novos contextos. 4.1.3 Projeto Gráfico Para desenvolvimento dos materiais de Design Gráfico, pesquisou-se diversas alternativas e possibilidades, observando-se elementos como linguagem visual, grids, tipografias e cores. 4.1.3.1 Linguagem visual Visto o posicionamento da abordagem desenvolvida e sua tangência em assuntos de ordem social e cultural, além dos aspectos políticos que envolvem empoderamento, melhora da qualidade de vida, luta de classes, acesso socioeconômico e responsabilidade social, a ilustração foi escolhida como linguagem visual para o material gráfico, por representar figurativamente os conceitos explicitados no manual. 4.1.3.2 Painel de Referências O painel de referências age como um guia para o material gráfico, indicando caminhos estéticos e sensações que contribuirão para a construção imagética do produto gráfico a ser desenvolvido. Figura 4 - Painel de Referências. Fonte: Acervo do autor.

4.2 GERAÇÃO DE ALTERNATIVAS A geração de alternativas ocorre no processo de design para visualização das possibilidades gráficas do projeto. Ela demonstra-se essencial para que se desenvolva uma solução final, uma vez que a geração de diversas ideias contribui para a construção de um conceito final robusto.


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Para esta geração de alternativas, optou-se por desenvolver as alternativas em dois momentos. No primeiro, foram feitos estudos conceituais, refletindo-se sobre a mídia escolhida, o formato, a diagramação, relacionados com os preceitos conceituais explicitados anteriormente. Estas alternativas foram desenvolvidas por meio de rascunhos, procedimento comum no processo de design. No segundo momento, foram desenhados estudos visuais mais elaborados, preocupados com a questão estética final do produto, propondo alternativas de estética a se seguir para elaboração do material de apoio, descritos nos resultados. 4.2.1 Estudos Conceituais Os estudos conceituais se dispõem como organizações visuais do produto final, elaborando primeiros esboços de grid, disposição de texto e imagem, distribuição de conteúdo, formato, entre outros.


!87 Figura 5 - Estudo conceitual 1.

Fonte: Acervo do autor.


!88 Figura 6 - Estudo conceitual 2.

Fonte: Acervo do autor. 


!89 Figura 7 - Estudo conceitual 3.

Fonte: Acervo do autor.


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Figura 8 - Estudo conceitual 4.

Fonte: Acervo do autor.


!91 Figura 9 - Estudo conceitual 5.

Fonte: Acervo do autor.


4.2.2 Estudos Visuais

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Estudos visuais são gerações de alternativas mais elaboradas, testando e desenvolvendo possibilidades visuais para o produto gráfico. Os estudos resultam em uma alternativa escolhida, que irá guiar o produto final.

Figura 10 e 11 - Estudo visual 1 e 2.

Fonte: Acervo do autor.


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Figura 12 e 13 - Estudo visual 3 e 4.

Bruno M. Rizardi

Fonte: Acervo do autor.


5 RESULTADOS

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5.1 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A partir das alternativas desenvolvidas, selecionou-se as mais promissoras, relacionando a estética e a viabilidade de execução ao escopo do projeto. Por fim, a Figura 13 (p. 93) foi selecionada, guiando o restante do projeto visualmente, estabelecendo um esquema de cores, linguagem e auxiliando na escolha de tipografia, grid e demais elementos visuais que compõem o manual. O manual desenvolvido contém 60 (sessenta) páginas, contemplando todo o conteúdo disposto na Metodologia do Projeto, descrito e estruturado na Tabela 1 (p. 59), além de páginas prefaciais como Prefácio, Índice, Folhas de Rosto, Capa e Contra-Capa. Para este capítulo, serão representados o produto, sua viabilidade de execução e informações técnicas dos aspectos gráficos da publicação. 5.2 ALTERNATIVA ADOTADA: REPRESENTAÇÃO VISUAL DO PRODUTO A alternativa adotada (Figura 13, p. 93) caracteriza-se pelo uso e diversas gradações de cor, uso de ilustrações elaboradas pelo autor e texturas, compondo a linguagem visual que será representada a seguir.


Figura 14 - Capa, pรกgina 1.

Fonte: Acervo do autor. Figura 15 - Pรกginas 2 e 3.

Fonte: Acervo do Autor.

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!96 Figura 16 - Pรกginas 4 e 5.

Fonte: Acervo do Autor. Figura 17 - Pรกginas 6 e 7.

Fonte: Acervo do Autor.


Figura 18 - Pรกginas 8 e 9.

Fonte: Acervo do Autor. Figura 19 - Pรกginas 10 e 11.

Fonte: Acervo do Autor.

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Figura 20 - Pรกginas 12 e 13.

Fonte: Acervo do autor. Figura 21 - Pรกginas 14 e 15.

Fonte: Acervo do autor.

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Figura 22 - Pรกginas 16 e 17.

Fonte: Acervo do autor. Figura 23 - Pรกginas 18 e 19.

Fonte: Acervo do autor.

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Figura 24 - Pรกginas 20 e 21

Fonte: Acervo do autor. Figura 25 - Pรกginas 22 e 23.

Fonte: Acervo do autor.

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!101 Figura 26 - Pรกginas 24 e 25.

Fonte: Acervo do autor. Figura 27 - Pรกginas 26 e 27.

Fonte: Acervo do autor.


Figura 28 - Pรกginas 28 e 29

Fonte: Acervo do autor. Figura 29 - Pรกginas 30 e 31.

Fonte: Acervo do autor.

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Figura 30 - Pรกginas 32 e 33.

Fonte: Acervo do autor. Figura 31 - Pรกginas 34 e 35.

Fonte: Acervo do autor.

!103


Figura 32 - Pรกginas 36 e 37.

Fonte: Acervo do autor. Figura 33 - Pรกginas 38 e 39

Fonte: Acervo do autor.

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Figura 34 - Pรกginas 40 e 41.

Fonte: Acervo do autor. Figura 35 - Pรกginas 42 e 43.

Fonte: Acervo do autor.

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Figura 36 - Pรกginas 44 e 45.

Fonte: Acervo do autor. Figura 37 - Pรกginas 46 e 47.

Fonte: Acervo do autor.

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Figura 38 - Pรกginas 48 e 49.

Fonte: Acervo do autor. Figura 39 - Pรกginas 50 e 51.

Fonte: Acervo do autor.

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Figura 40 - Pรกginas 52 e 53.

Fonte: Acervo do autor. Figura 41 - Pรกginas 54 e 55.

Fonte: Acervo do autor.

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Figura 42 - Pรกginas 56 e 57.

Fonte: Acervo do autor. Figura 43 - Pรกginas 58 e 59.

Fonte: Acervo do autor.โ ฉ

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Figura 44 - Contra-capa, página 60.

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Fonte: Acervo do autor.

5.3 VIABILIDADE DE EXECUÇÃO O manual foi desenvolvido com o intuito de ser veiculado como um e-book (livro eletrônico), ou seja, uma publicação voltada para o meio digital. Assim sendo, o material será disponibilizado por meio de um link para download gratuito. Não obstante, o projeto gráfico também permite que as pessoas possam imprimir o material em suas próprias casas, considerando as dimensões de cada página como um A5, ou seja, para impressão caseira, em um A4 seriam possíveis até 4 páginas impressas (frente e verso). Assim sendo, esta publicação é open-source, ou seja, de livre acesso e uso para qualquer pessoa que se interessar por seu conteúdo, estimulando o uso e reprodução, tendo em vista os objetivos deste trabalho. 5.4 MEMORIAL DESCRITIVO O memorial descritivo é um compilado de informações técnicas quanto aos aspectos gráficos da alternativa adotada. Estes aspectos referem-se à tipografia utilizada, paleta de cores, grid e formato da publicação.


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5.4.1 Formato e Grid O formato da publicação fechada é de 14,8 cm x 21 cm, caracterizando um A5. A publicação aberta tem as dimensões de 21 cm x 29 cm, caracterizando um A4. O grid escolhido foi o de cinco colunas (Figura 12), considerando sua flexibilidade na diagramação do manual, com margens de 1,5 cm em todos os lados. Outro fator importante é a dimensão da publicação, um A5, limitando o número de colunas. O grid de cinco colunas torna possível a diagramação simétrica e assimétrica, importantes para o uso de colunas. Este tipo de grid também permitiu que o manual não seguisse uma diagramação restritiva, ou seja, as colunas variam de tamanho e quantidade em todo o manual, permitindo uma fluidez e dinamicidade, condizente com a linguagem visual escolhida para este produto. Figura 45 - Grid.

Fonte: Acervo do autor.

5.4.2 Tipografia Foram utilizadas três famílias tipográficas para este manual. Para a capa, foi utilizada a Cassannet (figura 13), cujo formato passou por uma alteração da fonte


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existente, a fim de atribuir à capa uma personalidade e estética únicas (CARDINALI, 2015). Para os títulos, foi utilizada a família Bebas Neue (figura 14), com formas estreitas e sem serifa, com um aspecto mais limpo e bastante chamativo. Para o

texto, a família Oswald (figura 15) foi escolhida, devido ao grande número de pesos, permitindo uma boa hierarquização dentro do texto. Também de forma estreita, essa tipografia harmoniza por proximidade à Bebas, resultando em uma mancha gráfica harmônica e limpa, ideal para leitura em telas, mas ainda apropriada para impressão. Figura 46 - Família Cassannet.

Fonte: Acervo do autor. Figura 47 - Família Bebas Neue.

Fonte: Acervo do autor. Figura 48 - Família Oswald.

Fonte: Acervo do autor.


5.4.2 Paleta de Cores

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As cores para este projeto não seguiram um padrão pré-determinado. Sua unidade foi garantida pela alta saturação e pelo uso de gradações no projeto gráfico. Para fins de registro, elaborou-se uma tabela (Tabela 1) com as cores utilizadas em cada capítulo. Tabela 2 - Cores Utilizadas.

Fonte: Acervo do autor.


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6 CONCLUSÃO

Papanek (1984) celebremente afirmou: “Todos somos Designers”. Essa afirmação, dos anos 1970, caracterizou-se como uma quebra de paradigma no campo, em que

o design, até então, era desenvolvido de maneira vertical. Dos

criativos para os consumidores, apoiado pelo marketing para que os produtos se tornassem desejáveis aos olhos do público. Em um mundo infinitamente mais complexo no qual se vive hoje, é impossível imaginar um design que não se relacione com as pessoas a quem pretende atender. Entretanto, essa prática ainda é um lugar comum. Se todos somos designers, o que isso significa? Em termos de projeto, isso quer dizer que todos nós somos capazes de planejar e executar ações. Mas design também é criatividade. Somos todos criativos? Essa pergunta pode vir acompanhada de um sonoro “não” de diversas pessoas - aqueles que não se veem como criativos, e os criativos que veem os outros como incapazes de entender a estética e o processo de criação. Esse pensamento é, minimamente, um mito, ou melhor, uma construção social que vem para socorrer o protecionismo de classe de alguns profissionais que se recusam a admitir que pessoas “sem qualificação” também podem ter boas ideias. Em uma sociedade fluida e volátil, esse protecionismo de classe não faz mais sentido e é prejudicial para o profissional de design. Apenas uma pessoa é incapaz de criar e desenvolver projetos que abracem os múltiplos aspectos e pessoas envolvidas no contexto em que a solução irá atuar. Isso vale tanto para uma simples cadeira quanto para um complexo sistema de serviços de saúde. Elizabeth Sanders (p.32, 2006) afirma que “estamos perdendo o controle do processo de design tradicional”. Isso já se evidencia em diversos cursos e projetos envolvendo design thinking, nos quais, muitas vezes, os profissionais de design não são incluídos, muito menos condutores ou mentores, ou em profissionais do marketing e publicidade assumindo papeis de designers gráfico, executando o que, em teoria, deveria ser uma atividade especializada. O designer, então, vê-se em um mercado extremamente competitivo e, ironicamente, pouco protegido. Por que isso acontece? Ora, Papanek já respondeu a essa pergunta. Somos, em algum nível, projetistas e criativos, e todos nós temos ideias. Alguns, com maior confiança, executam suas ideias e as transformam em produtos, serviços ou em outras


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interfaces, enquanto outros se calam, convencidos de que a criatividade é um dom restrito a algum número de pessoas. É impossível pensar em uma classe de

designers. Entretanto, o designer é fundamental para a sociedade que emerge neste século. Se o designer não é mais o responsável pelo processo criativo, que outra função ele pode exercer na sociedade? Estar afastado do controle do processo criativo não quer dizer que o designer está sendo excluído dele. A abordagem deve ser outra: ele deve atuar como um catalizador da criatividade. Ou seja, o papel do designer de hoje é guiar, liderar e desenvolver processos criativos junto a outras pessoas, estimulando o florescimento da criatividade e permitindo que grandes ideias e conceitos tomem vida a partir da criação compartilhada. O designer pode ser, de certa forma, um embaixador da criatividade. Entretanto, apenas desenvolver ideias compartilhadas não basta. O design, a despeito do contexto em que nasceu, se tornou uma atividade voltada ao desenvolvimento de produtos e serviços que atendem somente a populações mais privilegiadas, em detrimento daquelas com menor poder aquisitivo, cujo acesso aos mesmos é limitado ou inexistente. O processo de design, ironicamente, é uma arma poderosa para a resolução ou redução da pobreza, criando soluções aos problemas mais prementes de nossa sociedade, atacando-os de forma criativa e inovadora e quebrando paradigmas impostos pela falta de acesso das populações de baixarenda. Como profissionais, principalmente os que se formam em universidades públicas, os designers tem uma responsabilidade para com a sociedade, cujas necessidades se tornam cada vez mais complexas e urgentes. O uso das técnicas de design também devem se voltar às classes menos privilegiadas, para o desenvolvimento de soluções que afetem positivamente a vida de milhões de pessoas que vivem em condições precárias no Brasil. Ou seja, os designers, empoderados em suas responsabilidades e capacidades, devem se envolver com as comunidades e ajudá-las a se empoderarem por meio do design, desenvolvendo-se e gerando soluções próprias para os problemas que enfrentam em seu cotidiano. O design é de todos, para todos. Este manual, por ser open-source, caracteriza-se como um trabalho sempre em construção coletiva, onde o autor buscará recolher feedbacks de usuários do manual para iteração e melhoria do mesmo. Também flexível, o material permite a


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aplicação livre dos procedimentos e técnicas, não se caracterizando como uma

metodologia, mas como uma série de diretrizes que ajudem a guiar empreendedores sociais que buscam criar impacto em determinados contextos. Enquanto desdobramentos, este trabalho poderá indicar novos caminhos para criar culturas de inovação social e mindsets específicos voltados à inovação social, assim como a coleção e evolução de ferramentas e técnicas mais diversas e assertivas para o uso do design thinking em contextos de desafios sociais.


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APÊNDICES


APÊNDICE A Validação do Questionário “Pensamento Criativo no Ensino Superior”

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APÊNDICE B Questionário “Pensamento Criativo no Ensino Superior”

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APÊNDICE C Respostas ao Questionário “Pensamento Criativo no Ensino Superior”

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