PLURAL: A Identidade Brasileira Revelada a Partir da Arquitetura

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BRUNO DOS SANTOS VEIGA

PLURAL


Bruno dos Santos Veiga Plural: a identidade brasileira revelada a partir da arquitetura

Trabalho Final de Graduação apresentado ao Centro Universitário Belas Artes como requisito para a obtenção do título de Arquiteto e Urbanista Orientador: Me. Sérgio Ricardo Ortiz Lessa São Paulo 2018


PLURAL A IDENTIDADE BRASILEIRA REVELADA A PARTIR DA ARQUITETURA



AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer primeiramente meu orientador, Sérgio Lessa, que com toda paciência me ajudou a entender qual o caminho que AGRADECIMENTOS AGRADECIMENTOS queria seguir com meu trabalho e o tornou possível. À professora Aline Nasralla, que durante suas aulas me mostrou agradecer primeiramente orientador,projetos Sérgio que a Gostaria profissão depoderia ir muito além demeu desenvolver Lessa, que comacendendo toda paciência me ajudou a entender qual o caminho que arquitetônicos, a chama para seguir na área acadêmica. queria seguir meudo trabalho e o Brasil tornouArquitetura, possível. que me acolheu e À todacom equipe escritório professora Aline Nasralla, durante suas aulas me mostrou mostrou À que não é preciso se renderque ao mercado imobiliário e deixar de que nossos a profissão lado ideais. poderia ir muito além de desenvolver projetos arquitetônicos, a chama para seguir na área acadêmica. À minhaacendendo mãe, Rosana dos Santos, que durante esses cinco anos

todaminha equipecapacidade, do escritórioseBrasil Arquitetura,de que me acolheu e acreditouÀ na disponibilizou todas maneiras mostrou que é preciso senas render aotécnicas mercadopara imobiliário e deixar de possíveis e menão acompanhou visitas o desenvolvimento

lado nossos ideais. desta monografia. À minha Rosana Santos, durante esses cinco anos Ao Pedro mãe, Machado e àdos Júlia Hirata,que as melhores pessoas que eu

acreditou na minha capacidade, se disponibilizou todas poderia querer ter ao meu lado durante este processo, de nunca me maneiras deixando possíveis e me acompanhou nas visitas técnicas para o desenvolvimento desistir. desta monografia. Aos amigos que me acompanharam desde a AT1AU: Laíssa Ao Pedro Machado e àGuedes, Júlia Hirata, melhores pessoas que eue Ribeiro, Larissa Teixeira, Letícia LuizaasSerzedello. Mariah Lopes poderia querer ter ao meu lado durante este processo, nunca me Melina Gomes. deixando desistir. Aos amigos que me acompanharam desde a AT1AU: Laíssa Ribeiro, Larissa Teixeira, Letícia Guedes, Luiza Serzedello. Mariah Lopes e



RESUMO A monografia Plural: A identidade brasileira revelada a partir da arquitetura busca a relação entre elementos arquitetônicos, movimentos artísticos e contexto histórico. Para identificar como foi criada e se desenvolveu a construção da identidade nacional e cultural no Brasil, por meio da arquitetura, foram selecionados quatro projetos de edificação: o MASP (1968), o SESC Pompeia (1986), o Complexo KKKK (1996) e o Teatro do Engenho Central (2009).

RESUMO A monografia Plural: A identidade brasileira revelada a partir da arquitetura busca a relação entre elementos arquitetônicos, movimentos artísticos e contexto histórico. Para identificar como foi criada e se desenvolveu a construção da identidade nacional e cultural no Brasil, por meio da arquitetura, foram selecionados quatro projetos de edificação: o MASP (1968), o SESC Pompeia (1986), o Complexo KKKK (1996) e o Teatro do Engenho Central (2009).



SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................... 08 CAPÍTULO 1. Contexto Histórico ............................................................. 11 1.1 O Primeiro Momento ............................................................. 11 1.2 O Governo Vargas ................................................................. 17 1.3 A Ditadura Militar ................................................................... 23 1.4 O Retorno da Democracia ...................................................... 26 CAPÍTULO 2. O Nacionalismo na Cultura Brasileira ................................. 33 2.1 Os Manifestos ........................................................................ 43 2.2 Lina Bo Bardi e o Tropicalismo ............................................... 57 2.3 A Representação Contemporânea ......................................... 65 CAPÍTULO 3. Estudo de Casos ................................................................. 75 3.1 MASP ..................................................................................... 75 3.2 SESC Pompeia ....................................................................... 89 3.3 KKKK .................................................................................... 101 3.4 Teatro Engenho Central ....................................................... 111 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................... 121 REFERÊNCIAS ........................................................................................ 123 LISTA DE ILUSTRAÇÕES ........................................................................ 131


INTRODUÇÃO A diversidade cultural e as muitas maneiras de como uma cultura pode ser apresentada sempre esteve presente na trajetória do autor deste trabalho, introduzida a partir das mudanças de estado, seja com sua família, seja sozinho. Atualmente, adentrando em um momento de dificuldades governamentais quanto à educação, cultura e identidade, é de grande importância entender como a arte e a arquitetura, juntas, podem responder a estas tensões e agregar elementos na identidade cultural, tomando como base épocas anteriores da história nacional que possuíam características semelhantes, fundamentando a partir dos conceitos de identidade, cultura popular e nacionalismo. A partir da problemática “Como a arquitetura pode refletir e desenvolver a identidade cultural de um país?”, definida no início do processo, o Trabalho Final de Graduação aborda a pluralidade de características, que unidas, são responsáveis pela formação da identidade cultural brasileira. O objetivo proposto era produzir análise arquitetônica a partir de dois pontos que se correlacionam: o contexto histórico brasileiro, abrangendo questões políticas, sociais e governamentais, e como estes aspectos interferem nos movimentos artísticos daqueles momentos. Com o levantamento de dados e o cruzamento de informações, a segunda parte do trabalho - o estudo de casos de quatro projetos edificados produzidos por Lina Bo Bardi e pelo escritório Brasil Arquitetura -, teve embasamento para ser produzida. De imensa extensão territorial, tentar analisar a identidade cultura de todo o Brasil e os fatores que a influenciaram até os dias atuais, resultaria 08


em uma extensa pesquisa incapaz de ser desenvolvida no tempo determinado pela instituição de ensino. Entendendo os fatores limitantes, um recorte de espaço foi definido: a região sudeste, mais precisamente o Estado de São Paulo. Quanto ao recorte tempo, foi estipulado início na Semana de Arte Moderna em 1922, devido sua importância para o tema. A data final se dá na conclusão da última obra analisada: 2013. Uma vez que se trata de um trabalho monográfico, algumas vertentes de pesquisa foram adotas. Dentre as opções do método, foi escolhido o exploratório, para que uma bagagem maior sobre o tema seja adquirida por meio de referências em livros, artigos e trabalhos acadêmicos, conversas com os arquitetos do Brasil Arquitetura, levantamento em campo e análise projetual das obras selecionadas: MASP. 1968. São Paulo, SP - Lina Bo Bardi SESC Pompéia. 1986. São Paulo, SP - Lina Bo Bardi KKKK. 1996. Registro, SP - Brasil Arquitetura Teatro Engenho Central. 2009. Piracicaba, SP - Brasil Arquitetura No primeiro capítulo se desenvolve um panorama geral do contexto histórico brasileiro. Dividido em quatro partes, os temas decorridos passam por momentos diferentes da trajetória brasileira e fala de como estes acontecimentos foram responsáveis por moldar a identidade nacional. Junto ao contexto histórico, o segundo capítulo aponta os movimentos nacionalistas que ocorriam nos quatro períodos abordados anteriormente, e algumas das obras artísticas e arquitetônicas que representam tais características. Por fim, o capítulo três utiliza de cinco pontos para conectar as informações abordadas anteriormente com as obras estudadas, sendo eles: ficha técnica, contexto histórico e geográfico de cada uma delas, materialidade, programa e a relação com a identidade encontrada durante o processo de desenvolvimento da monografia.

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INTRODUCAO

[01] Universidade Federal de Manaus


1. CONTEXTO HISTÓRICO

A data escolhida para início do recorte temporário é o ano de 1922, devido ao acontecimento da Semana de Arte Moderna ocorrida na cidade de São Paulo. O evento foi de grande importância para o rumo que a arte nacional viria a tomar. 2.1 – O PRIIMEIRO MOMENTO

A Semana de 1922 foi a exposição de uma ideologia que surgiu anos antes, porém, até que de fato fosse disseminado para a população de modo geral, era discutido somente entre o grupo vanguardista. Alguns pontos que aconteciam no meio político, econômico, social e artístico influenciaram nas ideias abordadas pelo movimento. No início do século XX as primeiras universidades brasileiras surgiam, sendo a primeira delas em 1909 em Manaus. Apesar de crescente, o acesso ao ensino superior no Brasil ainda era escasso, fazendo com que as famílias de boas condições financeiras mandassem seus filhos para estudar na Europa. Em consequência desta elite intelectual estar sempre em contato com o que ocorria no exterior, ideias adotadas pelos pensadores e artistas europeus reverberavam em uma parcela da sociedade nacional. (...) em 1922, aconteceu a Semana Modernista em São Paulo. Este evento foi protagonizado por jovens intelectuais da elite de São Paulo, cidade que começava a despontar como futura metrópole. Com toda sua complexidade e diferenciação ideológica, o movimento modernista que surge com a Semana de 1922 representa um divisor de águas nesse processo: por um lado, significa a reatualização do Brasil em relação aos movimentos culturais e artísticos que estavam ocorrendo no exterior, e, por outro, implica também buscar as raízes

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[02] Morro do Castelo, Rio de Janeiro


nacionais, valorizando o que haveria de mais autêntico no Brasil (OLIVEN, 2001, n.p).

Enquanto em São Paulo o desenvolvimento cultural ocorria de forma rápida e proporcionado quebras de barreiras, no Rio de Janeiro era um pouco diferente. Acontecia no mesmo ano a Exposição Internacional do Centenário da Independência, influenciando na escolha da data da Semana de Arte Moderna, como será abordado mais à frente. Os preparos para o evento buscavam mostrar a modernização da Capital Federal, e exibir para o mundo a capacidade de desenvolvimento do país. Porém, algumas medidas tomadas para o preparo da Exposição, como a de demolição do Morro do Castelo, não foram bem aceitas. A polêmica na imprensa sobre a Exposição e o morro do Castelo - que acabou afinal sendo parcialmente demolido - fazia parte, na verdade, de uma discussão que envolvia os destinos da República Brasileira: o que conservar, o que transformar? Este seria o grande tema da arte e cultura da década de 1920 (PCDOC, 2017, n.p).

Apesar do Governo Federal tentar passar a imagem de desenvolvimento nacional, a situação política brasileira passava por problemas: o então presidente Epitácio Pessoa havia tornado o recém fundado Partido Comunista ilegal. Assim, demonstrava as ideias autoritárias que viriam a ganhar força, através da implantação do Movimento Tenentista. Outro acontecimento que retratou a situação nacional foi o 18 do Forte de Copacabana (1922), influenciado pelo aprisionamento de Marechal Hermes da Fonseca. “A revolta foi logo debelada mas um grupo de jovens oficiais do Exército resolveu enfrentar, em plena praia de Copacabana, as forças legais” (PCDOC, 2017, n.p). O Brasil, neste mesmo período, passava por uma grande crise monetária. As primeiras décadas mostravam uma grande queda nas economias regionais não ligadas ao café (CANO, 2012), portanto, devido à Política do Café com Leite, que concentrava o governo nas mãos de políticos de São Paulo e Minas, não se abrangia os demais Estados 13


[03] Iracema, JosĂŠ Maria de Medeiros


nacionais, resultando na Revolta Tenentista (1924) e na Coluna Prestes (1924). Foi nesse quadro de crescente insatisfação, com as condições do Exército e com a política do governo, que eclodiram diversos levantes militares. A presença significativa de tenentes na condução desses movimentos deu origem ao termo "tenentismo" (PDOC, 2017, n.p).

Neste primeiro momento abordado, as características que circundavam a nação, se assemelhavam com o que havia acontecido antes mesmo do Brasil se tornar República, em 1889. Luis Fernando Tosta Barbato aponta, em seu texto A construção da identidade nacional brasileira: necessidade e contexto (2014), a crise institucional que ocorria em solo nacional, erguendo uma ideia separatista entre os estados. Portanto, era o momento ideal para se operar um processo de invenção das tradições, prover uma identidade nacional capaz de produzir códigos de comunhão entre brasileiros de norte a sul, de leste a oeste do país, separados por rios, montanhas e florestas, que pouco – ou quase nada – enxergavam semelhanças entre si, além das semelhanças de viverem sob um mesmo governo (BARBATO, 2014, p. 03-04).

As intenções de fazer a manobra de massa se deu por meio de um Romantismo tipicamente brasileiro. Enquanto na Europa o estilo buscava referências no medieval e no gótico, no Brasil o desenvolvimento de nação era um tanto quanto recente, impossibilitando fazer um resgate utilizando o modo europeu como base.

Nesse contexto, a natureza serve como enfoque para a construção de uma cultura marcadamente nacional, pois se tratava de um elemento tido como originalmente brasileiro. (...) ao valorizar a natureza tropical do Brasil, potencializa aquilo que a Europa não é ou não tem. Este viajante reconhece o europeu como símbolo da história sem natureza, e observa o índio brasileiro como o seu oposto direto, o representante da natureza sem história (BARBATO, 2014, p. 06). 15


[04] Vargas após Revolução de 1930, Itacaré


Apesar desta criação de identidade nacional no século XIX, os laços com a cultura europeia ainda se mantiveram. Percebem-se duas [04] Getúlio Vargas em Itacaré,mantidos pós Revolução de 1930 vertentes de como a cultura nacional seguiu, visto que em um mesmo ano a semana de Arte Moderna utilizava como base os elementos nativos, entendiam como a cultura nacional a dos povos indígenas; enquanto na Exposição Internacional do Centenário da Independência resgatavam da cultura colonial.

2.2 – O GOVERNO VARGAS

Ao final da década de 1920, a situação conturbada que se encontrava o país ainda não havia sido controlada. Na época, o café, produto de maior índice de exportação e responsável por grande parte do Produto Interno Bruto (PIB), não tinha se reerguido e com a quebra da Bolsa de Nova York, os Estado Unidos, principal comprador do grão, diminuíram ainda mais suas atividades econômicas, reverberando para a produção brasileira, que passou a acumular o estoque de café, consequentemente afetando a economia nacional. Na questão política, a situação se agravava com as eleições ocorridas em 1929, corroborando para o surgimento da Revolução de 1930. (...) a Revolução de 1930 teve como causa conflitos provocados pela disputa do poder político entre os estados. Nas eleições de 1929 o Brasil estava praticamente dividido em dois grandes grupos políticos, dispostos a vencer a qualquer custo. Dois candidatos disputaram a presidência: Júlio Prestes, presidente de São Paulo, apoiado pelo Presidente da República Washington Luís, e Getúlio Vargas, presidente do Estado do Rio Grande do Sul, apoiado pelos estados de Minas Gerais e da Paraíba. Tendo Júlio Prestes vencido as eleições, o grupo político que apoiava Getúlio Vargas não concordou com o resultado e começou a preparar uma revolução, que estourou em outubro de 1930, no Rio Grande do Sul, recebendo adesão dos Estados da

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[05] Soldados da Revolução Constitucionalista


Paraíba e de Minas Gerais (...) Quando os revoltos do Sul se prepararam para invadir São Paulo, a fim de alcançar o Rio de Janeiro, um grupo de militares, para evitar maiores conflitos, resolveu depor Washington Luís, três semanas antes do dia em que deveria terminar seu mandato (HOLLANDA, 1972, p.75).

Após o golpe de estado aplicado, Getúlio Vargas assume e presidência do país, dando início ao Governo Provisório. Utilizando do discurso de organizar a situação do país deixada pelos coronéis da Política do Café com Leite, como também era chamada a relação das oligarquias de Minas Gerais e São Paulo. As iniciativas tomadas durante esses primeiros cinco anos de governo visavam combater o federalismo instaurado durante anos, sendo elas: (...) a dissolução do Congresso Nacional, das assembleias legislativas estaduais e câmaras municipais, a suspensão das garantias constitucionais e a nomeação de interventores federais para os estados, que, por sua vez, nomeariam os prefeitos de cada município (ARQUIVO NACIONAL, 2013, n.p).

Apesar das medidas tomadas para governar o Brasil com o mínimo de intervenções externas possíveis, durante o Governo Provisório, eclodiu o movimento denominado Revolução Constitucionalista (1932), que buscava uma nova Constituição e eleições imediatas. Após três meses de luta popular, o governo, ainda em 1933, elegeu uma assembleia constituinte e no ano seguinte promulgou uma nova Constituição (1934). O período governamental ficou conhecido como Governo Constitucional (HOLLANDA, 1972). De características mais severas quando comparada com os dois momentos anteriores, em 1937, alegando a possível instalação de um regime comunista, Vargas junto às Forcas Armadas fecharam o Congresso Nacional, resultando no cancelamento das eleições que estariam para ocorrer. “Começou, assim, o período do Estado Novo, período de completa centralização do poder político e administrativo nas mãos de Getúlio Vargas” (HOLLANDA, 1972, p.104). 19


[06] Vargas em desfile no Pacaembu


Neste período a industrialização do Brasil sofreu um grande avanço derivado da criação de empresas estatais que substituíam as matérias primas que até então eram importadas. Alguns exemplos que foram criados a partir desta inciativa são: Companhia Siderúrgica Nacional, Companhia Vale do Rio Doce e Petrobras. Apesar de extremamente rígido em questões governamentais, o Governo Vargas foi responsável por um grande avanço em educação e cultura, utilizada como forma de política, principalmente quando se trata do Estado Novo. Vargas utiliza das raízes brasileiras e da cultura popular como forma de doutrinação. Em 1937, por meio constitucional a impressa passa a ser subordinada ao poder público, acredita-se que com essa subordinação o Estado iria garantir a comunicação direta entre governo e sociedade sem a necessidade de “intermediários nocivos ao progresso”. No projeto educativo proposto pelo Estado Novo, o Estado aparece como único interlocutor legítimo para falar com e pela sociedade. Fica claro então, o empenho do governo no sentido de utilizar as manifestações da cultura popular como canal de disseminação da ideologia oficial (SILVA; CARVALHO, 2016, p.251).

O Estado enxergava os intelectuais como a parte capaz de educar o restante da população e endireitar o país. Kelen Katia Prates Silva e Carlos Eduardo Souza de Carvalho (2016) comentam sobre a estratégia de utilizar a elite cultural para assumir cargos do governo, como o caso do arquiteto Lúcio Costa e do escritor Manuel Bandeira. Ao longo da Era Vargas são criados símbolos nacionais que concentram a cultura popular. O samba e o futebol são vistos como símbolos de nacionalidade e se tornam ferramentas de divulgação do ideal de unidade nacional (SILVA; CARVALHO, 2016, p 252).

Utilizando da cultura popular para criar uma identidade para o povo brasileiro, vale ressaltar que Vargas encontrou no futebol o maior símbolo que poderia associar a brasilidade e junto à imprensa mobilizar a 21


[07] João Goulart em comício


grande massa. Portanto, apesar de moldado visando uma comunicação política do Governo com a população, e como instrumento de divulgação das ideias governamentais, a relação entre o esporte e o brasileiro se tornou parte da identidade nacional, sobrevivendo e evoluindo até os dias de hoje.

1.3 – A DITARDURA MILITAR

Nos primeiros anos da década de 1960 o Brasil passava por uma situação de dualidade. O projeto Memórias da Ditadura, coordenado por Ana Rosa Abreu e Lucas Paolo Vilalta, explica a circunstância vivida no país: (...) apesar de grande parte da população viver em situação de extrema pobreza, vivia seu sonho de modernidade. A inauguração de Brasília, obra polêmica do governo Juscelino Kubitschek, era a síntese desse sonho, materializado numa cidade planejada, elegante, de vanguarda, construída no Planalto Central. Boa parte da sociedade brasileira ansiava por essa modernidade, que significava mais indústrias, mais empregos, mais riqueza (MEMÓRIAS DA DITADURA, 2014, n.p).

O mandato de Juscelino Kubitchek (JK) se destacou pela industrialização do Brasil, assim como havia feito Vargas anteriormente, porém os projetos executados resultaram em uma grande dívida externa que se acumulava desde a década de 1930. Apesar de um curto período pós JK, este trabalho não abordará os 219 dias governados por Jânio Quadros e Ranieri Mazzilli, direcionará, sem intermediários, para João Goulart, eleito pelo voto popular no ano de 1961. Buscando solucionar a crise financeira e social e anuncia “(...) que iria colocar em prática as Reformas de Base, com objetivo de reduzir a concentração da renda e da terra no país” (MEMÓRIAS DA DITADURA, 2014, n.p). As

medidas

propostas

não

agradaram

as

classes

mais

conservadoras, que saíram às ruas alegando, mais uma vez, uma tentativa 23


[08] MatĂŠria sobre AI-5 no jornal Folha de SĂŁo Paulo


de implantação de um governo comunista. O descontentamento de uma grande parcela da população foi a deixa encontrada pelos militares para utilizar como argumento a deposição do presidente João Goulart. A ditadura militar no Brasil passou por três fases diferentes ao longo de seus 21 anos de duração. A primeira foi de legalização do regime autoritário, por meio de decretos-lei e de uma nova constituição. A segunda, de recrudescimento da repressão e da violência estatal contra os opositores da ditadura. E a terceira, de reabertura política, com a Lei da Anistia e o movimento pelas eleições diretas para presidente (MEMÓRIAS DA DITADURA, 2014, n.p).

Durante o primeiro momento do Governo Militar, a censura, aspecto que marcou o período, não era tão severa, porém à medida que o governo se tornava cada vez mais rígido, a cultura sofria repressão. O endurecimento do regime foi responsável pela criação de 17 diplomas legais que estavam à cima de qualquer lei, denominados Atos Institucionais. O documento de número 5 (1968) merece destaque pois intervia diretamente na liberdade de expressão da população. O AI-5 abrangia pontos que possibilitavam a censura à imprensa, cinema, música, teatro e televisão, direcionando a construção da identidade para um rumo diferente. A música, o cinema e o teatro se tornaram veículos de oposição, mesmo que de forma velada, devido aos órgãos que vetavam as produções que destoavam ideologicamente do Governo. Compositores como Chico Buarque, Caetano Veloso e Geraldo Vandré atacavam de maneira mais ou menos velada a tortura, o autoritarismo, a censura (...). O pensamento marxista marcava o Cinema Novo de Nelson Pereira dos Santos, Leon Hirszman e Glauber Rocha, que não só exibiam a miséria do país, mas a colocavam no centro de sua linguagem. Era a chamada “estética da fome”. No teatro, grupos como o Oficina e o Teatro de Arena baseavam-se em peças de alto teor político e na irreverência das montagens, que desobedeciam a convenções estabelecidas e procuravam quebrar a 25


passividade do público (MEMÓRIAS DA DITADURA, 2014, n.p).

Não há como negar que as providências tomadas para que a soberania do governo fosse mantida influenciaram no desenvolvimento da identidade cultural durante o período discutido. A equipe do portal Memórias da Ditadura (2014), financiado pelo Governo Federal, afirma o impacto negativo que a repressão e proibição de diversos materiais culturais gerou no Brasil. Porém, comentam também a respeito de como as duras medidas tomadas de tortura e perseguição influenciaram na renovação da vida cultural, mesmo que as ideologias expostas estivessem de maneira camuflada, era um dos únicos modos de se opor e criticar o Estado. “A cultura brasileira mais crítica e esquerdista não fez a revolução, mas influenciou na formação dos jovens, promovendo ideais de democracia, igualdade social, liberdade” (MEMÓRIAS DA DITADURA, 2014, n.p).

1.4 – O RETORNO DA DEMOCRACIA

Após o fim do Regime Militar, que durou entre 1964 e 1984, o Brasil demorou alguns anos para se reestabilizar. O tópico atual não abordará o todo processo de redemocratização em si, mas como esse período influenciou no governo de dois presidentes específicos: Fernando Henrique Cardoso (FHC) e Luís Inácio Lula da Silva, fase em que houve um aumento na produção e divulgação da cultura devido a uma série de fatores. Durante a redemocratização do país após o movimento Diretas Já (1983-1984), “que o setor da cultura começou a se estruturar, com a implantação de um Ministério específico, conquistada com a pressão legítima de intelectuais, artistas, governos de oposição” (PINTO, 2010, p. 11), mais precisamente a partir do marco de 1985 pelo Decreto que retirava o setor das mãos do Ministério da Educação e Saúde e tornava um Ministério da Cultura.

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A autora do trabalho De Fernando Henrique Cardoso a Lula: Uma Análise das Políticas Públicas de Cultura no Brasil (2010), Viviane Cristina Pinto, cita a Constituição de 1988 como marco que regulariza como o Estado deve se portar diante dos aspectos culturais no seguinte trecho: (...) o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais, (...) protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional (PINTO, 2010, p. 10).

Fernando Henrique Cardoso, eleito em 1994 por meio do voto popular e novamente nas eleições subsequentes (1998), adotou características administrativas para o país que tomaram rumos diferentes de acordo com a necessidade da época. Durante o primeiro mandato, FHC deu prioridade em estabilizar economicamente o país e impedir a volta da inflação, programa iniciado com Plano Real (1994), enquanto assumia o cargo de Ministro da Fazenda. Enquanto

no

primeiro

mandato

as

medidas

econômicas

prevaleciam, o segundo se destacou pela visão educacional e cultural, incentivada por meio de mecanismos de financiamento reestruturados pelo Governo, que estimulavam as atividades ligada à cultura (PINTO, 2010). A modernização dos museus nacionais, os programas do patrimônio histórico, artístico e cultural, a recente política do patrimônio imaterial e a política para o cinema merecem acento pelas inovações institucionais que significaram na época (PINTO, 2010, p. 13).

As medidas tomadas geravam resultados para o meio cultural e assimilação pela população em geral. A parcela que tinha acesso ao conteúdo havia aumentado consideravelmente, a cultura aos poucos saía do acesso majoritário das classes mais avantajadas monetariamente.

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Ao fim do segundo mandato de FHC o avanço havia se iniciado e com a eleição de Lula as políticas públicas que proporcionassem essa possibilidade mais justa do acesso aos direitos constitucionais continuou como meta governamental. Perry Anderson (2011) em artigo publicado na London Review of Books cita o compromisso que Lula havia assumido em ajudar os pobres. O autor faz a seguinte citação: “Um acordo com os ricos e poderosos seria necessário, mas a miséria tinha que ser tratada de modo mais sério do que no passado” (ANDERSON, 2011, p. 28). Programas como o Bolsa Família (2003) passaram a ajudar famílias de baixa renda a ter acesso a produtos de necessidades básicas por meio de um valor depositado em conta diretamente pelo Governo, “desde que comprovado o compromisso de que elas estão enviando os filhos para a escola e acompanhando a saúde deles” (ANDERSON, 2011, p. 28). Essas

medidas,

mesmo

que

de

extrema

importância

por

simplesmente possibilitar o acesso a esses itens, representava o olhar do Estado para todos os brasileiros, não somente os que proporcionavam vantagens ao Governo. Desde 2005, os gastos do governo com a educação triplicaram, e o número de estudantes universitários dobrou. Durante os anos 1990, o ensino superior no Brasil deixou de ser em grande parte uma função pública, com três quartos de todos os estudantes indo para universidades privadas que desfrutavam de isenção fiscal. Astutamente, essas instituições foram obrigadas, em troca da isenção, a oferecer vagas para estudantes de famílias pobres ou não brancas que de outra maneira nunca teriam a chance de ir além do ensino médio, mas que puderam contar com essas bolsas para ingressar no ensino superior (ANDERSON, 2011, p. 29).

As questões sociais que aos poucos foram tomando um rumo para que a dívida histórica com essa população fragilizada pudesse ser sanada não foram os únicos pontos trabalhados. Como já falado anteriormente, os períodos de governo anteriores já haviam iniciado um trabalho para disseminar o acesso à cultura, e Lula a partir de sua visão, deu 28


continuidade. Medidas como o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), já existente, e o Programa Cultura Viva, criado em 2004, fortaleceram a rede cultural que proporcionava esse acesso. Sobre o Cultura Viva, Viviane Cristina Pinto discorre: Este Programa se fortalece como uma política de cultural, ao ponto que, em lugar de determinar ou impor ações e condutas, estimula a criatividade, propiciando o resgate da cidadania pelo reconhecimento da importância da cultura produzida em cada localidade. O efeito é o envolvimento intelectual e afetivo da comunidade, motivando os cidadãos a criar, participar e reinterpretar a cultura, aproximando diferentes formas de representação artística e visões de mundo, criando um movimento que vai além da premiação, pois consolidam iniciativas culturais locais e formam uma rede entre elas que permite o fortalecimento do Programa (PINTO, 2011, p.16).

Durante os dois mandatos de Lula, a identidade nacional, que durante os momentos anteriores havia sido criada pela elite cultural para conter a população por necessidades governamentais, nesse momento se modificava por meio da adição de novos elementos trazidos da cultura popular contemporânea à época de forma mais natural, não como uma imposição mascarada utilizada como manobra de massa. Por fim, Viviane Cristina

Pinto

(2011)

afirma

que

a

promoção

do

desenvolvimento social relacionado aos direitos culturais utilizavam de alguns princípios, que direta ou indiretamente moldaram a identidade cultural brasileira nos anos 2000: (...) abranger as demandas e diversidades culturais dos brasileiros e brasileiras de todas as situações econômicas, localizações

geografias,

faixas

etárias;

buscar

a

universalização do acesso aos bens e serviços culturais de toda população; a cooperação entre os entes federados, os agentes públicos e privados atuantes na área da cultura; o fomento à produção, difusão e circulação de conhecimento e bens culturais; a integração e interação na execução das políticas, programas, projetos e ações desenvolvidas; a complementaridade nos papéis dos 29


[09] Expressão Artística Popular [10] Expressão Artística Popular


agentes culturais; a transversalidade das políticas culturais; a autonomia dos entes federados e das instituições da sociedade civil; a transparência e compartilhamento das informações; a democratização dos processos decisórios com participação e controle social; a descentralização articulada e pactuada da gestão, dos recursos e das ações (PINTO, 2011, p. 17).

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[11] D. Quixote em S. Paulo: nรณs temos talento


2. O NACIONALISMO NA CULTURA BRASILEIRA

Como já abordado anteriormente, o Brasil é um país multicultural e plural, portanto, querer resumir as correntes artísticas e arquitetônicas em uma única vertente é algo improvável, ou até mesmo impossível. Tratando do recorte espacial do trabalho: o Estado de São Paulo, elementos e movimentos artísticos/arquitetônicos serão analisados no decorrer do capítulo para que se possa entender como a identidade cultural brasileira foi impressa no espaço de análise. Dois acontecimentos distintos ocorriam ao mesmo tempo no território nacional: a Semana de Arte Moderna, em São Paulo e a comemoração do Centenário da Independência, no Rio de Janeiro. Apesar de uma delas estar localizada fora do recorte territorial do trabalho, é importante situar do ocorrido, que teve influência direta na escolha da data da Semana de 1922, a qual de acordo com os idealizadores, representaria a “segunda” independência do Brasil, dessa vez a cultural. Na exposição do centenário no Rio de janeiro em 1922 – comemoração da independência brasileira -, alguns dos principais pavilhões foram projetados dentro do espírito neocolonial, De outro lado, no mesmo ano de 1922, a Semana de Arte Moderna, promovida em São Paulo por um grupo de jovens intelectuais, reunia no Teatro Municipal uma exposição de pintura, escultura e arquitetura, com apresentação de música e leitura de textos e poemas deliberadamente chocantes para os padrões artísticos vigente no país _ a primeira manifestação antitradicionalista, cultivada com a importação dos movimentos artísticos europeus (SEGAWA, 1998, p. 36).

A arte e expressão brasileira, mesmo com a Independência de Portugal e o início da República, continuavam atreladas ao modo europeu de produzir materiais artísticos, seguindo as características do academicismo francês, mesmo na busca da representação da nação brasileira e suas

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[12] Exposição do Centenário da Independência


características da época. Inquietações quanto à produção artística do Brasil vinham ocorrendo há alguns anos, porém em fevereiro de 1922 ocorria um marco no Movimento Moderno Brasileiro com a Semana de Arte Moderna. Aracy Amaral no livro Artes Plásticas na Semana de 22 (1970), comenta sobre o desejo dos artistas naquele instante: Os modernistas desejavam uma linguagem, uma comunicação, literária como visual, mais de acordo com o seu tempo, é certo. E iam buscar as ideias para essa nova linguagem nas experiências iniciadas na Europa. Foi, porém, precisamente o sentido nacional que os levou - no entusiasmo do industrialismo crescente paulista - a cantar aquilo que é nosso, a analisar e estudar as nossas fontes mais tradicionais de inspiração, como já vimos em movimento que se antecipa à Semana, no surgimento do neocolonial brasileiro na arquitetura, como posteriormente a ela, com os estudos de nossa tradição indígena (como as realizadas por Vicente do Rêgo Monteiro e Regina Gomidez Graz a partir de 1923), ou com o nativismo propriamente dito, cujo maior exponente foi Tarsila do Amaral (AMARAL, 1998, p.103).

Antes de aprofundar no momento de virada cultural com a Semana, é necessário entender o Neocolonial, nascido em São Paulo no início do século XX, inicialmente introduzido pelo arquiteto Ricardo Severo, segundo Roberto Conduru (2009). O estilo, conhecido principalmente pela expressão arquitetônica, pode ser denominado como um movimento artístico-cultural, visto a ramificação para outros elementos como mobiliários e áreas utilitárias. Configurou-se por meio do debate de idéias e ações que constituíram um glossário de formas arquitetônicas destinadas a caracterizar – em pedra e cal – a nacionalidade, gerando obras que pretendiam instituir ambientes brasileiros genuínos, por serem condizentes técnica, bioclimática e culturalmente com a vida no país (CONDURU, 2009, n.p).

O Neocolonialismo possuía uma linguagem que resgatava as características do período colonial, como o próprio nome diz. O 35


[13] Rancho da Maioridade, Dubugras


movimento surgiu em busca de uma arte genuinamente brasileira, que para alguns pensadores da época significava o resgate das raízes lusitanas. Durante alguns anos a arquitetura e os produtos gerados pelos artistas do movimento, eram o que se considerava um dos maiores responsáveis pelo resgate da identidade cultural do Brasil. A intenção de recuperar características da cultura local vinha de influências francesas, por meio da recuperação do classicismo. Segawa (1998) cita em seu livro o arquiteto Victor Dubugras, um dos pioneiros no estilo remetente à Arquitetura Colonial, além de introduzir os preceitos do racionalismo. Em toda a construção Sr. Dubugras deu inteira preferência às formas de estrutura real. As disposições construtivas e a natureza dos materiais são francamente acusadas, lealmente postas em evidência: o que parece parte suportada funciona verdadeiramente como tal o granito é granito mesmo (...) Aplaudimos convictos essa maneira de construir tão honesta e racional (TOLEDO, 1905, p.77).

É importante citar a A Arte Tradicional Brasileira, proferido por Ricardo Severo na Sociedade de Cultura Artística, (...) preconizando a valorização da arte tradicional como manifestações de nacionalidade e como elemento de constituição de uma arte brasileira. Discorrendo sobre as origens portuguesas da cultura brasileira, Severo defendia o estudo da arte colonial como orientação para “perfeita cristalização da nacionalidade” (SEGAWA, 1998, p.35)

A intenção do “culto à tradição”, como diz o próprio autor do texto, ocorria em Portugal desde o final do século XIX, sendo absorvida posteriormente ao movimento cultural brasileiro, “transformando a exaltação da raiz cultural e étnica portuguesa no fundamento da arte brasileira.” (SEGAWA, 1998, p.35). Devido contexto histórico mundial, a recepção de estrangeiros no Brasil foi intensa nos primeiros vinte anos do século XX. Renato Ortiz (1985) 37


[14] O Homem Amarelo, Anita Malfatti [15] O Farol, Anita Malfatti


cita a criação da identidade nacional a partir de um tripé formado por negros, indígenas e brancos, e após o país se tornar destino de acolhimento para povos que fugiam de seus territórios de origem devido à Primeira Guerra Mundial, a adição de novas culturas elevou ainda mais o nível da miscigenação popular e consequentemente cultural. A movimentação do cenário urbano, consequência do movimento migratório e do êxodo urbano, resultou no interesse da elite pelas diversas características culturais que eram agregadas a partir do aumento populacional das cidades. Esses representantes iniciavam a busca de encontrar expressões que realmente retratassem o contexto nacional através da cultura, se desligando dos padrões academicistas. Elementos nacionalistas começaram a aparecer aos poucos, de maneira ressignificada, seja pela arquitetura neocolonial, que ganhava força fora de São Paulo, ou seja através de publicações, como a de Gonzague Duque, que expressavam o descontentamento com a extrema importação da cultura europeia. Até que a Semana de 1922 viesse a ocorrer, marcando o início do Movimento Moderno Brasileiro, alguns eventos ocorridos anteriormente à data tiveram papel importante para a construção da vanguarda. Hugo Segawa (1998) comenta sobre a Exposição de Pintura Moderna de Anita Malfatti e a repercussão na classe artística, gerando críticas, a maior delas denominada Paranoia ou Mistificação? (1917), escrita por Monteiro Lobato, escritor e crítico de arte. O texto, publicado no jornal O Estado de São Paulo separava os artistas em dois grupos: os que faziam arte pura e “a outra espécie” (...) formada pelos que vêem anormalmente a natureza, e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. São produtos de cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência: são frutos de fins de estação, bichados ao nascedouro. Estrelas cadentes, brilham um instante, as mais das vezes com a luz de escândalo, e somem-se logo nas trevas do esquecimento (LOBATO, 1917, n.p).

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[16] Membros da Semana de 1922


Segawa (1998) comenta sobre a importância da publicação da crítica, responsável pela solidarização dos colegas com a pintora, resultando no primeiro grupo modernista brasileiro, composto por poetas, jornalistas e artistas, dentre eles Mario de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Graça Aranha, Di Cavalcanti, Anita Malfatti, Villa-Lobos e Guiomar Novaes, unidos para discutir os aspectos conservadores e passadistas no meio artístico brasileiro. A pintura catalisou o movimento, a reunião organizou-se com a concorrência sobretudo de literatos, mas o sentido de “movimento” visava algo além das artes plásticas e da literatura: a causa era a renovação do ambiente cultural em geral (SEGAWA, 1998, p.42).

Com a explícita intenção de romper com o academicismo de forma abrupta, o grupo de artistas e intelectuais, liderado por Graça Aranha, realizam no Teatro Municipal de São Paulo a Semana de Arte Moderna, entre os dias 13 e 17 de fevereiro de 1922, na tentativa de “valorizar a cultura popular e introduzir no Brasil os movimentos políticos-artísticos surgidos na Europa após a Primeira Guerra Mundial” (SILVA, 2015, s.n). As apresentações ocorridas no palco do Teatro Municipal de São Paulo refletiam acontecimentos ocorridos anos antes. Não era incomum que as pessoas de classes sociais mais avantajadas fossem estudar na Europa, devido aos recursos disponíveis no país, que começavam a dar mínimos sinais de melhoras. Beatriz Coelho Silva (2015) comenta sobra a importância das vanguardas dadaísta, futurista, cubista e expressionista, todas elas possuintes de características de quebra com as regras do que se era belo na arte, possibilitando uma maior liberdade na criação artística. Ana Paula Cavalcanti Simione (2013) para a revista Perspective, afirma a construção do movimento como uma espécie de dogma, visto que os membros pertencentes à Semana tinham um espaço de destaque nos meios de comunicação da época, “tornada uma espécie de arena de propagação dos ideais do grupo” (SIMIONE, 2013, p.05). A autora cita Menotti del Picchia e a coluna no jornal Correio Paulista, de Oswald de Andrade, dono da revista O Pirralho e o acesso às publicações do 41


[17] Desenho de Georg Przyrembeel [18] Túmulo [19] Residência


Commercio, além dos manifestos e publicações especiais como a revista Klaxon. Alçado à condição de primeiro movimento genuinamente brasileiro e compreendido como um grito da consciência nacional, o modernismo garantiu a certos grupos e a seus protagonistas um lugar de grande proeminência; eles tornaram-se, assim, símbolos culturais – e políticos – dos poderes de transformação oriundos das nações “periféricas” (SIMIONE, 2013, p.05).

Enquanto no campo das artes plásticas e literatura a vertente nacionalista se encontrava a todo vapor com as exposições de pinturas e esculturas no saguão do Teatro Municipal, a conferência de Graça Aranha, a leitura do poema Os Sapos (1922)de Manuel Bandeira, dentre outras exibições; na arquitetura não foi produzido algo às alturas do restante do material apresentado durante este período inicial. Silvio Colin (2011) refere à Semana de 1922 como pouco influente na produção arquitetônica nacional. Somente dois arquitetos fizeram parte desta primeira geração de artistas, sendo eles: Antonio Garcia Moya, nascido na Espanha, e o polonês Georg Przyrembel. De pouca importância para o decorrer do movimento, os produtos expostos eram projetos não edificados com influências espanholas apresentada em elementos como arcadas, pátios e elementos decorativos, quase como uma cenografia. Nesse primeiro momento a grandiosidade da quebra de paradigmas e a renovação no ambiente cultural brasileiro, claramente não se deu através da arquitetura.

2.1 OS MANIFESTOS

O primeiro confronto de como se pensar arte e a arquitetura havia ocorrido, a barreira tradicionalista inicial havia sido quebrada, 43


[20] Rino Levi [21] Gregori Warchavchik [22] Oswald de Andrade


porém ao fazer a afirmação de que modernismo não era um movimento artístico estático, entende-se que os produtos e debates ocorridos durante a Semana foram só o início do resgate à cultura brasileira. Ao longo dos anos, novos conceitos e abordagens surgiram, discussões e divergências marcaram o campo do nacionalismo e os métodos de reproduzir o tema. Ficará bem explícito que não se intimida ao artista de hoje a postura inerte da esfinge, voltada em adoração estática para os mitos do passado, mas sim a atitude viva do caminhante que, olhando o futuro, tem de seguir um caminho demarcado pela experiência e pelo estudo do passado, e cuja única diretriz é o progresso e a glória das artes nacionais (SEVERO, 1916, p.81).

A releitura e nova abordagem das artes e arquitetura não são exclusividades ou criações daquele momento, nem mesmo do Brasil. O engenheiro

Filinto

Santoro

(1909)

afirma

que

todas

as

formas

arquitetônicas presentes no continente europeu derivam de estilos anteriores que foram assimilados e adaptados para as novas necessidades, tendências, influências da sociedade, através da introdução de elementos e materiais originais. Ao arquiteto que utiliza das referências, apesar da liberdade de criação como julgar necessário, cabe preocupar-se com alguns pontos citados no texto: “o clima, as tendências do viver coletivo, o progresso dos materiais, que porventura, disponha” (Santoro, 1909, p.111112). Estes novos conceitos de referência ao tradicional e ao passado, introduzidos ao movimento geraram alguns artigos que tratavam a respeito da nova arquitetura, destacando-se A arquitetura e a estética das cidades (1925), uma das primeiras expressões que buscavam uma Arquitetura Moderna brasileira. Rino Levi introduz a ideia de fazer uma ruptura com o clássico no texto publicado no Estado de São Paulo, vinculando o conceito com as vanguardas europeias. A respeito do material de Gregori Warchavichik (1925) no Correio da Manhã: Acerca da arquitetura moderna, considera-se: 45


[23] Imagem de capa, Revista de Antropofagia


Destinando-se sobretudo a divulgar no Brasil as ideias do modernismo europeu, o artigo de Warchavchik não foi, portanto, um trabalho original ou que pretendesse uma contribuição pessoal. O estilo buscava mais persuadir o leitor da necessidade da renovação do panorama arquitetônico. A influência de Le Corbusier é clara em todo o texto (FIORE, 2002, p.02).

Concomitantemente aos manifestos que introduziriam os novos rumos que a arquitetura tomaria, Oswald de Andrade seria o responsável por dois dos mais importantes manifestos para toda a classe artística: o Manifesto Pau Brasil (1924) e o Manifesto Antropofágico (1928). O primeiro dos manifestos desenvolvido pelo escritor, abordava os debates desenvolvidos na Semana de Arte Moderna em busca de características nacionais, absorvendo as críticas da modernidade europeia. O Manifesto Pau Brasil, publicado no jornal O Correio da Manhã, defendia a poesia brasileira, criticando o uso da linguagem utilizada pelos autores tradicionalistas. Referenciando

o

primeiro

produto

tipicamente

brasileiro

comercializado internacionalmente, Oswald dá nome ao manifesto para o que chamaria de “poesia de exportação”, a (...) poesia pau-brasil, produzida a partir da atualização obtida pelo contato com os países desenvolvidos. Seu projeto visava um afastamento em relação aos modelos poéticos importados do século passado e propunha uma poesia emancipada, livre da metrificação (DIAS, 2012, p.60).

Rosália de Almeida Dias (2012) cita as ideias básicas na Revista de Literatura, História e Memória, como a oposição ao erudito e a favor de uma escrita mais natural e realista, sem buscar em cada linha a norma culta da fala, abrindo espaço para os “erros” linguísticos. O texto abordava características que alguns anos mais tarde apareceriam no antropofagismo, como a desaprovação da cópia e “a utilização de uma temática brasileira,

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[24] Abaporu, Tarsila do Amaral


onde seria valorizado o que é nosso: o carnaval, a favela, a formação étnica rica e a riqueza vegetal, mineral, culinária e folclórica” (DIAS, 2012, p.60). Quatro anos mais tarde é publicado o Manifesto Antropofágico, nomeado a partir de costumes de algumas aldeias indígenas brasileiras. Em sua linha de pensamento, conceituava a absorção de novas culturas e após a “deglutição” produzia um material novo, com novas características, pertinentes ao Brasil do início do século XX. Publicado na Revista de Antropofagia (1928), o autor dizia que (...) só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz. Tupi, or not tupi that is the question. Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos. Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago (ANDRADE, 1928, n.p).

Baseado nos preceitos do manifesto, obras de enorme importância para a cultura nacional foram produzidas. Tarsila do Amaral, casada com Oswald no período da publicação é uma das artistas que melhor representa os conceitos abordados. A pintora desenvolveu quadros como Abaporu (1928), Operários (1933) e O Batizado de Macunaíma (1956), integrando as produções junto à Villa-Lobos com a composição de Bachianas Brasileiras (1930). Retratando a importância do Movimento Moderno como um todo, incluindo os manifestos artísticos recém citados, Aracy Amaral (1998) faz a seguinte citação em seu livro, de quão difícil poderia ser recuperar características que até então não haviam recebido a devida importância: (...) o retorno ao nacional tanto tempo desprezado não era simples. Era como se o passado se tivesse esvaído de mão demasiado abertas: “Quem quiser estudar as tradições e costumes, a vida, em suma, da velha sociedade brasileira, não encontrará facilmente os elementos necessários à tais pesquisas” escreveu Ronald de Carvalho em 1924. “Vão desaparecendo, pouco a pouco, do país, vendidas a vil preço aos colecionadores

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[25] Casa modernista da rua Santa Cruz, Gregori Warchavchik


americanos e europeus, as mobílias, as joias, as alfaias, a baixelas, todas as peças da indumentária dos nossos maiores. Vamos destruindo, assim, fisionomia do nosso passado, o espólio, pequenino, mas valioso, que nos foi transmitido pelos antecedentes” (AMARAL, 1998, p.226).

Silvio Colin (2011) aponta como “impulso definitivo” da arquitetura no Modernismo a construção da casa da Vila Mariana, feita por Warchavchik em 1928. A residência construída para o próprio arquiteto e sua

esposa,

Mina

Klabin,

é

considerada

a

primeira

expressão

genuinamente modernista brasileira, segundo Hugo Segawa (1998). Com características não abordadas até então na construção nacional, com elementos retirados de casas bandeiristas paulistanas e da arquitetura modernista que vinha sendo discutido na Europa, além da questão dos materiais adaptados à realidade, como já citado, se contrapondo com a clara inspiração francesa que o restante dos edifícios tinham na cidade de São Paulo. O projeto, finalizado em 1928, foi uma ruptura de tamanha proporção, que matérias jornalísticas foram publicadas comentando sobre o mesmo, afetando os arquitetos tradicionalistas, que não puderam mais tratar o manifesto de 1925 como indiferente. A repercussão foi extremamente positiva, possibilitando que apenas quatro anos após a Casa da Vila Mariana ter sido concluída, Warchavichik projetasse outras sete residências. Dentre os projetos executados pelo arquiteto, um deles se destaca quanto a importância para a geração modernista. A casa da Rua Itápolis, foi ponto de encontro da geração de 1922 e palco de exposições e debates do meio cultural durante os anos 1930. Para inauguração, ocorrida em março de 1930, foi exibida a Exposição de uma Casa Modernista, responsável por expor pinturas, esculturas, mobiliário e até mesmo o jardim da residência, que rompia com os padrões europeus e utilizava de espécies nativas brasileiras. O acontecimento foi quase que uma metalinguagem que retratava o Movimento Moderno.

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[26] SalĂŁo de 31, Revista da Semana


Durante o processo de construção da residência do Pacaembu, Warchavchik já recebia destaque no meio arquitetônico internacional. O reconhecimento do produto executado pelo arquiteto fez com que Le Corbusier, em passagem pelo Brasil, visitasse a execução do projeto. O encontro entre os dois resultou no convite proposto à Gregori Warchavchik para representar a América do Sul no Congresso Internacional da Arquitetura (CIAM). O portfólio criado pelo arquiteto, unindo as caraterísticas pregadas pelo Movimento Moderno na Semana de 1922, juntamente com os preceitos de Le Corbusier para a arquitetura, fez com que Warchavchik se tornasse elemento essencial para que a renovação de fato ocorresse. Mário de Andrade, pouco depois de sua inauguração (da casa da Vila Mariana), caracterizou a casa de Warchavichik como uma prova de “que mesmo em arquitetura nos coube iniciar a modernização artística do Brasil”, alinhando a obra como representativa de um novo conceito de arquitetura moderna” (SEGAWA, 1998, p.49).

Novamente é necessário sair um pouco do recorte de espaço escolhido para o trabalho para entender o cenário artístico e arquitetônico que utilizavam do nacional como preceito. Novos nomes integravam o grupo de arquitetos que utilizavam da cultura nacional como base para seus projetos, dentre eles destaca-se Lúcio Costa, que mantinha relação direta com Warchavchik. Durante a década de 1930, pairava sobre o Brasil uma intenção de modernização gerada pelos acontecimentos dos anos anteriores, resultando em uma modernização da Escola Nacional de Belas Artes (ENBA), a fim de divulgar a Arte Moderna no país. Lúcio Costa fica encarregado da direção da Escola Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro, assumindo o posto em setembro de 1931. Enquanto assumia o cargo, Lucio Costa, junto com elementos importantes no Modernismo Brasileiro, como Tarsila do Amaral e Manuel Bandeira organizam o Salão de 1931, quebrando os padrões conservadores do que se era apresentado pela instituição até então. A exposição teve uma 53


[27] PavilhĂŁo de Nova York 1939, Lucio Costa


repercussão tão grande, que após forte reação conservadora, o até então diretor, deixa o cargo em dezembro do mesmo ano. O Salão de 1931 exaltava essa nova maneira de se enxergar a arte nacional, porém, não só por este acontecimento que Lucio Costa se destaca na exaltação da cultura brasileira. Assim como Warchavchik, o arquiteto se realçava internacionalmente, sendo responsável pela exportação do que era desenvolvido no Brasil. Dentre os feitos do arquiteto estava o Palácio Gustavo Capanema, que recebeu destaque dentro do próprio movimento, pela união de diversos artistas para sua elaboração. Projetado por Costa junto à Le Corbusier, nomes como Affonso Eduardo Reidy, Carlos Leão, Jorge Moreira, Ernani Vasconcellos e Oscar Niemeyer integraram a equipe projetista, além de ser responsável por reunir obras de Candido Portinari, esculturas de Celso Antônio, Bruno Giorgi e Jacques Lipchitz, e também paisagismo feito por Burle Marx. Ou seja, o Palácio era basicamente uma síntese de todo o Movimento Moderno, em todas suas áreas. Mais dois pontos são de extrema importância ressaltar no trabalho do arquiteto: a integração da equipe do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), desenvolvendo junto ao órgão “três frentes de trabalho – tombamento, recuperação e restauro e por fim, a inscrição de bens em livro de tombos” (PEREIRA, 2018, n.p), sendo responsável por proporcionar na área da arquitetura a devida importância que a história do país requer. Por fim, o projeto do Pavilhão do Brasil em Nova Iorque, junto à Oscar Niemeyer, ponto final para provar a relevância da arquitetura e arte brasileira para o mundo, resultando na publicação do Brazil Builds em 1943, pelo MoMA. O livro que retratava as criações arquitetônicas desenvolvidas por arquitetos brasileiros era a confirmação da capacidade de produção nacional com qualidade, quase que uma demonstração que não era necessário a “síndrome de vira-lata” que existia na população como um todo. Em passos certeiros, as ideias pregadas no início dos anos 1920 foram ocupando cada vez mais espaço na produção cultural e arquitetônica 55


[28] Casa de Vidro, Lina Bo Bardi


nacional, tanto dentro, quanto fora do país. Segundo John Graham, citado por Aracy Amaral (1998) em seu livro, a dedicação para a renovação dos meios artístico e ao mesmo tempo a busca das raízes brasileiras, são partes inseparáveis de um mesmo objetivo. O autor parafraseado acredita que sem o resgate e manutenção das tradições de um povo a revolução e renovação de um projeto de país, como um todo, não é possível.

2.2 LINA BO BARDI E O TROPICALISMO É curioso como em momentos diferentes na história do Brasil, movimentos artísticos distintos se correlacionam. Dois deles, separados por quarenta e cinco anos, tiveram o impulso necessário para integrar a arquitetura ao restante das artes, dados por arquitetos estrangeiros. Assim como Gregori Warchavchik, nascido na Rússia, foi elemento crucial para a solidificação da arquitetura no Movimento Moderno, Lina Bo Bardi foi o elo entre arquitetura e o Tropicalismo. Desde a primeira vez no Brasil, em 1945, Lina Bo Bardi tem contato com as vanguardas artísticas que aconteciam no país, através de Lúcio Costa, Burle Marx, Oscar Niemeyer, Portinari, Oswald de Andrade, Vinicius de Morais, dentre outros. No ano seguinte após a viagem, Lina e o marido Pietro Bardi se mudam para São Paulo a convite do político Assis Chateaubriand para a fundação e direção de um museu de arte moderna, como cita o Instituto Bardi em sua página digital. A residência do casal, no bairro do Morumbi, foi o primeiro projeto de Lina construído. A Casa de Vidro, como também era conhecida, já demonstrava os interesses da arquiteta pelas raízes culturais brasileiras, mesclados com a formação erudita que havia recebido na Itália, como retrata Marcelo Ferraz em seu texto.

No Novo Mundo ela se apaixona pela exuberância da natureza tropical – a verdura – e pelo povo brasileiro, com sua descontração e um certo quê de ingenuidade, “ainda 57


[29] Tropicรกlia, Panis et Circencis


não contaminado pela soberba e pelo dinheiro”, como costumava dizer (FERRAZ, 2008, n.p).

Lina desde quando morava em seu país natal, sempre foi ligada às questões sociais e políticas e não seria diferente ao chegar no Brasil. Ao deixar a Itália, que passava por momentos difíceis de pós-guerra, encontra na América do Sul uma nova cultura que a encantava, repleta de diversidade e elementos. Em 1958, Bo Bardi viaja para Bahia, “e descobre lá um Brasil até então desconhecido da maioria dos brasileiros. Era o Brasil da pobreza de meios e bens materiais, por um lado, e rico de seiva criativa e alegria de viver, por outro” (FERRAZ, 2008, n.p). Nesta viagem para o estado nordestino, foi onde Lina teve seu primeiro contato com artistas da Tropicália, movimento artístico brasileiro dos anos 1960 que a arquiteta integrou, junto a diversos nomes como Glauber Rocha, Caetano Veloso e maria Bethânia. Cláudio N. P. Coelho, explica a vanguarda como uma forma de contestação sobre as influências na produção cultural que ocorria no país. (...) a Tropicália compartilhava a posição defendida pela esquerda de que a obra de arte deve ter por objeto a realidade brasileira e estar associada às lutas por mudanças revolucionárias, tendo construído, no entanto, uma versão própria desta posição. A Tropicália apresentava uma visão mais complexa da realidade brasileira (...), indicando a presença de uma combinação entre o arcaico e o moderno (COELHO, 1989, p.159).

Símbolo do movimento, o álbum Panis et Circencis (1968) reflete a utilização de aspectos da cultura regional mesclada com diversas influências externas para a criação das obras artísticas, influência do manifesto antropofágico de Oswald de Andrade, publicado anos antes. Caetano Veloso, líder do movimento, em seu livro Verdade Tropical (1997) comenta sobre a vontade de abrasileirar o rock tradicional vindo da Inglaterra, e o fez por meio de instrumentos típicos que roubavam o lugar das guitarras elétricas, além de escrever músicas que quebravam o padrão

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[30] Museu de Arte Popular da Bahia, Lina Bo Bardi


do que se via até então, trazendo inovação para estética musical, como aborda Cunha na matéria Tropicalismo na arte. A música pode até ter sido de onde o movimento surgiu, porém seria um equívoco afirmar que a Tropicália se resume a isso. Iniciado a partir da realização do III Festival de Música Popular Brasileira em 1967, com apresentações de Caetano Veloso, Maria Bethânia, Nara Leão, Gilberto Gil e outras diversas pessoas, repercutiu em grande escala para as artes visuais, tendo representantes como Hélio Oiticica, autor da obra Tropicália, exibida na exposição Nova Objetividade Brasileira. A obra era constituída por um labirinto de madeira forrado com areia e pedras, que, ao ser percorrido pelo espectador, colocava-o em contato corporal com diversos elementos naturais e culturais do Brasil, como plantas tropicais e araras nativas, num percurso que terminava em frente a um aparelho de televisão ligado (MEMÓRIAS DA DITADURA, 2018, n.p).

Desempenhando obras na área de artes plásticas se encontravam Lygia Clark, Lygia Pape e Ivan Serpa. No teatro se destaca o Grupo Oficina com montagens de O Rei da Vida e Roda Viva, no cinema Glauber Rocha lidera o Cinema Novo na direção de Terras em Transe. Por fim, temos Lina Bo Bardi, maior representante da arquitetura na vanguarda. Em um ambiente de grande riqueza cultural que se encontrava a todo vapor, Lina, junto ao governo do estado, se torna fundadora e diretora no Museu de Arte Moderna da Bahia (MAMB), e pouco depois do Museu de Arte Popular, no Solar do Unhão. E é nesse ambiente efervescente, de uma Bahia que tomava a dianteira cultural no Brasil, que se forma a geração de tropicalistas. Todos freqüentavam as exposições de Lina. Glauber Rocha foi seu assistente no Museu de Arte e ali escreveu o roteiro do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol. Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Rogério Duarte, Hélio Eichbauer relembram até hoje o forte impacto que ela teve no cenário baiano. Pela primeira vez o Brasil pôde ver num museu, com dignidade, a obra do seu povo pobre e oprimido, a

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[31] A MĂŁo do Povo Brasileiro, Lina Bo Bardi


revelar suas entranhas e sua enorme capacidade criadora. Afrontavam-se preconceitos e barreiras culturais num ambiente de elite (FERRAZ, 2008, n.p).

Responsável por diversas exposições ao longo de sua vida que retratava a realidade do povo Brasileiro, Lina inaugura o Museu de Arte Popular com a conhecida exposição Nordeste, descontruindo a ideia errônea que habitava o pensamento de muitas pessoas. Ferraz em seu texto diz a seguinte frase sobre: “Com ela, dá seu golpe fatal, mostrando que beleza, sofisticação, inteligência, criatividade e domínio técnico não eram atributos exclusivos e nem posse da classe dominante ou dos detentores do poder econômico. Era um gesto estético e político” (FERRAZ, 2008, n.p). Após a temporada na capital baiana, Lina retorna para São Paulo em 1966 e inicia o acompanhamento da obra do Museu de Arte de São Paulo (MASP), que havia projetado no ano de 1957, antes de se mudar para Salvador. Inaugurado em 1968 o edifício que viria a se tornar ícone de São Paulo foi aberto ao público. Devido a futura abordagem do projeto no terceiro capítulo, por hora não se entrará em detalhes. Sempre ligado ao meio artístico, Lina Bo Bardi não executava somente projetos de arquitetura, durante os anos de sua carreira, diversos projetos museográficos, cenográficos, de mobiliário e até mesmo de design de joias foram desenvolvidos por arquiteta de formação. Liderando a equipe de desenvolvimento de diversas exposições, Lina recebeu destaque pelo seu trabalho na área. A importância dada à italiana para o desenvolvimento da arquitetura nacional, relacionando à cultura local, atingiu o campo dos museus e exposições, devido a recorrência destes mesmos temas, que por muitos não seria abordado de forma tão realista. Iniciado pelo já citado MAMB, ao longo da carreira Lina foi responsável pelas seguintes exposições: Bahia no Ibirapuera (1959) A Mão do Povo Brasileiro (1969), Repassos (1975), Design no Brasil – História e Realidade (1982), Mil Brinquedos para a Criança Brasileira (1983), Caipiras, capiaus: Pau-a-Pique (1984). Somente em analisar o nome das

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[32] Francisco Fanucci, AndrĂŠ Vainer, Lina Bo Bardi, Marcelo Ferraz e equipe


exposições, constata-se que Lina estava sempre em busca de divulgar os aspectos da cultura nacional, elevar o povo brasileiro e seus costumes. Responsável por alguns trabalhos cenográficos, Lina produz o projeto do filme A Compadecida (1969), do diretor George Jonas, e do espetáculo Na Selva das Cidades (1969), do diretor José Celso Martinez Corrêa, no qual é também responsável pela ambientação e pelo figurino. Na Selva das Cidades surgia para denunciar a opressão urbana sobre o homem e, principalmente, sobre aquele que vem de centros menores do país. [...] A peça trata do vampirismo do homem pelo homem. Não podíamos ser piedosos conosco. Na Selva das Cidades era um grito de socorro – em muitos momentos até conformado – mostrando uma grande impotência frente a uma realidade tão dura (MOSTAÇO apud NANDI, 2009, p. 02).

No ramo teatral também trabalhou com o Grupo Oficina, no qual teve o primeiro contato durante o Tropicalismo, na execução de projetos artísticos, o qual futuramente proporcionaria o desenvolvimento projetual da sede do Teatro Oficina. Após anos liderando a equipe dos projetos que desenvolvia, Lina durante o desenvolvimento do SESC Fábrica da Pompéia, que será abordado no próximo capítulo, (...) abriu uma nova fase em sua carreira. Apoiada pelos seus jovens colaboradores, Marcelo Ferraz, André Vainer e Marcelo Suzuki, produziu projetos que apontavam para uma renovação da arquitetura brasileira, então um tanto acomodada pela falta de oxigênio cultural dos anos da ditadura (INSTITUTO BARDI, 2012, n.p).

2.3. A REPRESENTAÇÃO CONTEMPORÂNEA O escritório Brasil Arquitetura fundado pelos arquitetos Francisco Fanucci, Marcelo Ferraz e Marcelo Suzuki em 1979 desde o princípio, quando ainda estudantes, sabiam bem qual o caminho que gostariam de 65


[33] Construção dos Estúdios Vera Cruz


seguir: o da exaltação de características típicas do espaço, integrado com as referências arquitetônicas que colheram no decorrer dos anos. Ao explicar qual o modo em que fazem arquitetura, declaram: “buscamos uma arquitetura atenta às ‘raízes e antenas’, ou seja, uma arquitetura criada a partir de profunda conexão com as bases culturais de cada lugar, mas sempre observando o presente e mirando o futuro” (BRASIL ARQUITETURA, 2016, n.p). Ainda em processo de formação acadêmica, o grupo conheceu Lina Bo Bardi, e os integrantes começaram a atuar individualmente em determinados projetos. A ligação dos fundadores do escritório com a arquiteta teve início em 1981 com o sócio fundador, Marcelo Suzuki, no desenvolvimento dos estudos do Teatro Oficina, a partir de então Suzuki, Ferraz e Fanucci trabalharam em diversos deles, sendo o SESC Pompéia o marco que consolidou a relação entre os dois lados. Fica claro ao analisar as obras e os depoimentos da equipe do escritório que os preceitos utilizados nos desenvolvimentos dos projetos seguem a ideia pregada por Lina Bo Bardi: ressaltam a identidade local, a cultura e o povo da região. Em entrevista para o site Vitrúvius, Francisco Fanucci (2011) afirma a consideração pelo local do projeto e o que ele pode proporcionar, fazendo da arquitetura implantada um veículo de transformação social que pode provocar na comunidade que o usufrui. Ainda relacionando à Lina Bo Bardi, o projeto do Centro de Convivência Vera Cruz desenvolvido no edifício que abrigava os Estúdios da Companhia Cinematográfica Vera Cruz, na época uma das três companhias de cinema mais importantes do Brasil, segundo Mayara Cristina Ribeiro, foi projetado pela arquiteta em colaboração de Marcelo Ferraz, Marcelo Suzuki e André Vainer, no ano de 1991. A proposta para o desenvolvimento do projeto mostra a expressão artística cinematográfica, que vinha ganhando cada vez mais espaço na representação da nacional. O programa proposto, porém, nunca de fato construído, abrigava teatro, sala de exposições, espaço para atividades gerais, restaurante e serviços de apoio.

67


[34] Central do Brasil, foto de divulgação


A intenção de executar uma obra neste espaço do Vera Cruz mostrava o avanço cinematográfico que ocorria no período, Após passar por um grande período reprimido devido a ditadura militar, a indústria de produção audiovisual, que durante o governo opressor censurava as películas que iam contra a ideologia militarista, voltou a ganhar força, se adaptando ao novo momento que se encontrava a sociedade. Aos poucos, novas produções foram ganhando as salas de cinema, até atingir o ponto que marcou a ascensão da sétima arte: o filme Carlota Joaquina: Princesa do Brazil, produção de 1994 dirigida por Carla Camuratti. A partir de então, novos títulos surgiam com mais frequência. Em 1995, o destaque foi O Quatrilho, filme de época que utilizava como base a história de imigração italiana no Rio Grande de Sul. Esses dois filmes foram responsáveis por mostrar a qualidade que a arte poderia ter no Brasil. Porém em 1998, com o lançamento do filme Central do Brasil, que mostrava a realidade das condições de vida no subúrbio em uma das maiores cidades do país, a representação de uma história que tentava ser escondida, que não era digna de produção artística com base sobre, começou a aparecer e quebrar totalmente os paradigmas do que seria retratado. Com indicações à prêmios internacionais, o filme estrelado por Fernanda Montenegro imprimia os aspectos culturais que se ascendia no país, o das culturas, de certa forma, renegadas e escondidas também faziam parte da identidade do povo. As produções de filmes como Cidade de Deus (2002), Carandiru (2003) e Tropa de Elite (2007), mostravam a realidade que se vivia aqui, não de forma mascarada, ao se tentar emular um país similar aos europeus. A produção artística de uma nação é reflexo de diversos fatores, entre eles sociais, econômicos e políticos. Como citado no primeiro capítulo, após o fim do Regime Militar em 1985, o foco seguia rumo para o lado oposto dos últimos 21 anos e a indústria cinematográfica respondia da mesma forma. O filme dirigido por Fernando Meirelles e Kátia Lund, Cidade de Deus, não poupa detalhes ao mostrar a realidade da comunidade 69


[18] A Mão do Povo Brasileiro: Lina Bo Bardi

[35] Museu do Pão, Brasil Arquitetura


marginalizada no Rio de Janeiro. Carandiru e Tropa de Elite retratam, em caráter de denúncia, a realidade do sistema carcerário e policial no Brasil, mostrando os dramas e dificuldades do meio. Basicamente, as histórias contadas resgatam pontos delicados e polêmicos ocorridos na história recente do Brasil e transformam em arte, na tentativa de ressignificar os acontecimentos e não deixar que as memórias, mesmo que conturbadas no imaginário popular, sejam esquecidas. A ideologia adotada por essa nova onda cinematográfica nacionalista: sem restrições e que não se destinava somente para a apreciação da elite, pode ser encontrada nos projetos da Brasil. Na entrevista concedida à Beatriz Carra Bertho, Marcelo Ferraz explica utilizando como exemplo o Museu do Pão, em Ilópolis, Rio Grande do Sul: (...) restauramos um moinho antigo e projetamos um conjunto novo, (do qual se pode dizer “é arquitetura paulista, é a nossa origem FAU USP, é miesiano em planta, é assim e assado...”). Para nós isso não importa tanto, o mais importante é o efeito transformador que esse projeto provocou na comunidade - e esse é o caminho mais difícil. Isso não está expresso em sua forma, em sua cara, não está claro quando você visita. Então, recuperar e transformar o significado de um moinho velho abandonado, lembrança de um passado pobre, sofrido, de tempos duros dos imigrantes pioneiros, é muito importante e pode ser legal. Fazer esse conjunto – moinho, museu, escola de panificação – viver na atualidade é o efeito objetivo de um projeto de arquitetura. É muito bom, é uma satisfação enorme poder atuar nesse sentido. Hoje, a comunidade local que já via no moinho um motivo de vergonha, orgulha-se dele. Essa foi a conseqüência de um projeto arquitetônico (e de um programa, que para nós é uma coisa só: fazer mudar o comportamento, mudar a visão das pessoas, mudar uma comunidade (FERRAZ, 2011, p.03).

Dezenas de obras poderiam ser citados para que as características ideológicas e projetuais fossem retratadas, como o Museu Rodin Bahia, em Salvador; a Praça das Artes em São Paulo; o KKKK, no interior de São Paulo,

71


[36] Coleção de objetos de Lina Bo Bardi


o Engenho Central, em Piracicaba, SP; o Cais do Sertão, na capital pernambucana; porém o depoimento sobre como os próprios arquitetos do Brasil Arquitetura pensam sua arquitetura e utilizam de referências é a melhor opção. Atuamos politicamente e nossa ferramenta é a arquitetura. Em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, foi a mesma coisa, ter trabalhado com os índios e criar um lugar confortável, um espaço novo, que tem forma, tem a nossa planta racional do Mies, tem Artigas e tudo o mais, mas tem também um elo forte com a comunidade no aproveitamento da técnica local e, mais ainda, na maneira de utilizar e compartilhar os espaços (FERRAZ, 2011, p.03).

O resgate ao nacional que em diversos pontos da história do Brasil se revelou de maneiras diferentes, mudando o agente de transmissão cultural e até mesmo quais aspectos iriam ressaltar, portanto a intenção era sempre a mesma: demonstrar as características únicas regionais, que assim torna o país plural. Passando por Lúcio Costa, Lina Bo Bardi e chegando ao escritório Brasil Arquitetura, que com maestria mostram através de grandes estruturas ou até mesmo pequenos detalhes, as características do povo brasileiro, que por centenas de anos constrói de maneira singular cada uma de suas partes.

73


[37] MASP


3. ESTUDO DE CASOS

A trajetória de Lina Bo Bardi e do escritório Brasil Arquitetura, como já analisado, converge em diversos momentos com o assunto desta monografia, então os quatro edifícios foram escolhidos para o decorrer do capítulo a partir deste ponto. Dando continuidade, os projetos teriam que ter pelo menos dez anos de diferença entre eles, algumas outras características

foram

estabelecidas:

se

encaixar

no

recorte

do

tempo/espaço estabelecido; o uso necessitaria ser, ao menos em parte, público e o programa deveria abrigar áreas expositivas.

3.1 MASP FICHA TÉCNICA PROJETO: MASP LOCALIZAÇÃO: Bela Vista. São Paulo, SP. Brasil ANO DO PROJETO: 1957 ANO DE CONCLUSÃO: 1968 ÁREA CONSTRUÍDA: 10.272 m² ARQUITETURA: Lina Bo Bardi

CONTEXTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO

O edifício localizado na Avenida Paulista, em São Paulo, SP, foi projetado em 1957 e desde então recebe o mesmo uso: abrigar o Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand. A história da arquitetura, que se tornou marco de capital paulista, não se separa do museu enquanto instituição. 75


[38] Vão livre do MASP


Fundado por Assis Chateaubriand no ano de 1947, o MASP foi desde o início um marco na cultura brasileira. Chateaubriand utilizou de sua influência na elite brasileira para propor a criação de um museu de “nível internacional” no Brasil. Pietro Maria Bardi, marido de Lina Bo Bardi, foi convidado pelo fundador para dirigir o museu, visto o alto nível que possuía de conhecimento na área. Inicialmente instalada no Edifício Guilhermo Guinle, na região central da cidade de São Paulo, a instituição, no decorrer dos anos, passou a ter a necessidade de um espaço maior, mesmo já tendo crescido em número de pavimentos ocupados dentro do conjunto. Para solucionar o problema de espaço, uma nova sede para o MASP começou a ser projetada em 1957 por Lina Bo Bardi, que já havia adaptado o interior do edifício da rua Sete de Abril para suportar as necessidades do programa. A Avenida Paulista havia passado por uma transformação poucos anos antes da data de início do projeto. Até meados dos anos 1950 os palacetes predominavam no logradouro, porém com a mudança de legislação em São Paulo, permitindo verticalização de áreas fora do centro, resultou na mudança do polo monetário, migrando para a Paulista e consequente transformando o aspecto residencial em comercial. A troca da área onde percorria o dinheiro influenciou na escolha da área para construir o MASP, já que necessitava de doações e patrocínios para manter toda a estrutura. O terreno que hoje se encontra o museu, era uma doação feita por Joaquim Eugênio de Lima à Prefeitura de São Paulo. A única exigência para o espaço era a necessidade de manter a vista para o centro da cidade, a qual já existia. O lote, antes já havia uma laje, que igualava o Belvedere Trianon ao nível da avenida, utilizada para execução de festas e bailes. O estado e características originais da topografia em declive – treze metros , já haviam sido transformados algumas vezes, visto que além do uso já citado, o pavilhão da primeira Bienal de Arte de São Paulo (1951) se implantou ali. Seguindo a diretriz feita por Joaquim Eugênio Lima e entendendo a relevância do local para a vida pública da cidade, Lina elevou o volume 77


[39] Vão livre do MASP observado de baixo


que abriga partes das salas de exposição através de quatro grandes pilares, criando o vão livre que caracteriza a edificação, adequando para “criar os necessários vínculos com seu entorno imediato, ser exato em sua predisposição com a urbanidade e sua existência na cidade como um todo” (CÁRDENAS, 2015, p. 12)

MATERIALIDADE

O MASP, inaugurado em 1968, foi um ponto de destaque na história da Arquitetura Moderna na América do Sul, devido à sua desafiadora arquitetura e sistema estrutural, afirma Alexandra Silva Cárdenas em seu livro sobre o edifício. A história de Lina Bo Bardi e seu contato com as características arquitetônicas que vinham sendo desenvolvidas, influencia diretamente na materialidade do museu. A relação da arquiteta com a arquitetura que se desenvolvia no país, após a construção do Ministério de Educação e Saúde Pública, no Rio de Janeiro, influenciou seu modo de pensar arquitetura no Brasil. Cárdenas ainda cita que ao visitar o recém-inaugurado Palácio Gustavo Capanema, Lina se encanta com o edifício moderno no hemisfério sul, considerado “terceiro mundo”, sua escala em relação à cidade , além da disposição dos ambientes. Utilizando da vertente brutalista do Modernismo, a arquitetura no Brasil, com destaque para São Paulo, passou a aplicar as influências de novas técnicas e modos de construção, como o concreto armado e o protendido, exibindo a estética original do material. Além de elementos pré-fabricados, exemplificado pelas cortinas de vidro fixadas em esquadrias modulares. A estética e preceitos do Brutalismo se tornava mais forte com a construção de Brasília em 1956, se tornando característica do momento arquitetônico que se vivenciava. “Em São Paulo, importante também foi a tradição de formação de engenheiros-arquitetos, que deu lugar a uma geração de importantes profissionais, com destaque para João Batista 79


Croqui desenvolvido pelo artista Danilo Bressiani Zamboni DisponĂ­vel em: http//www.daniloz.com


Vilanova Artigas” (CÁRDENAS, 2015, p. 21), importante para o desenvolvimento do Movimento Moderno no Brasil. Porém, não foi só a Capital Federal que influenciou a ascensão do Movimento Brutalista, o contexto histórico nacional foi parte de extrema importância para alavancar. A ditadura militar instituída no país havia polarizado a população. Muitos arquitetos se associaram com o Partido Comunista e passaram a sofrer censura por características nos projetos que se assemelhassem às ideologias de esquerda e possibilitassem espaços para manifestações. Instaurada a ditadura anticomunista, a arquitetura moderna passa a ser vista pelo novo estamento no poder como esquerdista; afinal, vários arquitetos eram membros efetivos do Partido Comunista (...) Daí por diante, criticar o modernismo passou a ser de direita, era fazer o jogo da ditadura (FICHER, 2014, n.p).

Entendendo o cenário abordado e observando as características do MASP: estrutura executada em concreto armado e protendido, o vão de 74 metros destinado ao uso público, o revestimento de vidro que possibilita a entrada de luz natural e o tratamento dos materiais para deixar com aparência natural, percebe-se a relação de Bo Bardi com o movimento, “caracterizando a atmosfera cultural e empreendedora do Brasil naquela época” (CÁRDENAS, 2015, p. 24 ), se opondo ao governo ditatorial.

PROGRAMA

O Museu de Arte de São Paulo distribui seu programa nos 5 pavimentos do edifício. Ao considerar o nível da Avenida Paulista como zero, dois deles ficam à cima e dois deles à baixo, conectando com a Praça Arquiteto Rodrigo Lefreve. Iniciando a análise do programa a partir do pavimento que recebe os usuários do museu: o nível zero. Espacialmente é o mais simples e o que 81


[41] Foyer

[40] Acervo fixo do museu


abriga a menor parte do programa, devido à intenção de criar um vazio que integrasse à cidade e liberasse a vista para região central, Lina elevou uma parte e “enterrou” todo o restante do programa, sobrando somente a bilheteria com três boxes, localizada à direita do terreno, perto do elevador e das escadas que liga o visitante ao restante dos espaços. No primeiro andar da volumetria elevada, as escadas e elevadores saem em um hall, que acessa o café e os sanitários implantados na extremidade direita. O restante do espaço é dividido em três. Nas laterais do prédio ficam as salas administrativas, o que possibilita a entrada de luz natural para os trabalhadores. A partir destes ambientes se acessa a reserva técnica do acervo, ao lado oposto do hall. No centro da laje se localiza a sala de exposições temporárias, instaladas em 645 m2. Ao continuar a circulação vertical se acessa o espaço que expõe o acervo próprio do museu, que de tempos em tempos algumas obras são trocadas para que todos os títulos possam ser expostos. Este grande salão ocupa toda a área contornada pela pele de vidro vista pelo exterior do edifício: 2.100 m2. Na parte inferior ao nível da Avenida Paulista, o primeiro “subsolo”, as escadas e elevadores desembocam em um pequeno salão utilizado como foyer para os dois auditórios, o maior com capacidade para 500 pessoas e o menor, para 60, ambos conectados diretamente com a parte de apoio, possuindo camarins e banheiros para uso dos artistas. Neste pavimento também, se localiza o café, a loja de souvenirs e os banheiros, além de mais uma sala de exposições temporárias, que se conecta com o restante pelo mezanino, possibilitando a visão do andar inferior. Para alcançar pavimento mais baixo, duas escadas saem do mezanino e descem pelo vazio se cruzando, chegando ao salão de exposições, que possui abertura para a Praça Arquiteto Rodrigo Lefreve, utilizada somente para eventos, também são instalados a biblioteca do MASP e o restaurante com toda estrutura que necessita para funcionamento.

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[42] Escada de acesso Ă parte superior


RELAÇÃO COM A IDENTIDADE

O primeiro projeto analisado utiliza de métodos diferentes dos observados e aprofundados durante o trabalho, porém não significa que o método que aborda o nacionalismo seja melhor ou pior em relação a vertente estudada, somente diferente. Toda arquitetura deve ser inserida na situação política, econômica e social para entender qual o significado dela. Muito mais do que simplesmente ser um espaço edificado, as arquiteturas representam todo o contexto. Com o MASP não seria diferente, Lina utiliza dos preceitos em que acreditava e de modo sutil apresenta a elevação da cultura nacional e da liberdade de expressão, que com o AI-5 vinha sendo ameaçada. Tratando da questão física, a materialidade em primeiro momento de difere da ideia geral da arquitetura tradicional brasileira, das ocas na cultura indígena ou das casas bandeiristas paulistas, porém o brutalismo, naquele momento, já era parte da identidade da cidade. Já estava tão enraizado, que a partir dos conceitos gerais, surgiu a Escola Paulista, liderado por Vilanova Artigas e com Lina fazendo parte do grupo. ”O estilo paulista não buscava apenas um conceito estético, apoiando-se também na militância política” (BORGES, 2017, p.03). Portanto, ao entender a importância do Brutalismo para a cidade de São Paulo, chega-se na conclusão de que não necessariamente deveria ter acontecido centenas de anos antes, mas poderia abordar o atual que já poderia imprimir sua identidade. Quanto a questões de proporcionar a continuação da identidade cultural através da memória coletiva, se encaixam sobre o conceito abordado por Renato Ortiz (1985), em seu livro Cultura Brasileira e Identidade Nacional, a necessidade da interação social e convivência para propagá-la. Ao promover esse grande vazio de forma que integra a rua, a arquiteta entende essa importância ao elevar a edificação do modo que a fez, mesmo que a vista tivesse sido uma exigência.

85


[43] Exposição Lina no Bardi


A arquitetura do MASP, assim como as outras três que serão analisadas neste capítulo, pode ter sofrido influências diretas ou indiretas dos

movimentos

artísticos

abordados

durante

este

trabalho.

O

modernismo pregado pela Semana de 1922 e suas ramificações, podem ser analisados de uma forma mais abstrata quando relacionado ao Manifesto Antropofágico (1925). Como já citado, Lina nasceu na Itália e quando já adulta mudouse para o Brasil. Um projeto arquitetônico recebe toda a vivência de quem o projetou, portanto, o Museu de Arte de São Paulo, assim como as outras obras da arquiteta, representam a ideologia criada por ela ao longo dos anos, traduzidas para a realidade brasileira. A fase em que a arquiteta passou na Bahia coincidiu com o desenvolvimento da obra do Museu de Arte de São Paulo, porém arquitetonicamente a estética tropicalista não se encontra no edifício, visto que foi projetado antes de sua mudança de cidade. Todavia, observando o trabalho de Lina quanto curadora da instituição, a conexão ocorre claramente, deixando explícito o modo como ela observava a arte naquele momento. Observando os trabalhos de curadoria e os depoimentos deixados sobre elas, é possível notar que, à frente do seu tempo, Bo Bardi já utilizava de pensamentos que ainda chegariam em seu ápice com o cinema nos anos 1990. Sobre a exposição Repassos (1975), instalada no museu, Lina fala: Uma pequena contribuição à grande tomada de consciência coletiva que transcende as fronteiras nacionais para entrar no debate internacional que denuncia a perversidade de um sistema que acreditou no ‘industrial design’ como força purificante e sabe que não pode voltar à apologia de Ruskin e Morris. Uma procura artística a nível antropológico, uma autocrítica de nível coletivo (INSTITUTO BARDI apud BARDI, 1993, p. 200)

87


[44] SESC Pompeia


3.2 SESC POMPEIA FICHA TÉCNICA PROJETO: SESC Pompeia LOCALIZAÇÃO: Água Branca. São Paulo, SP. Brasil ANO DO PROJETO: 1977/1982 ANO DE CONCLUSÃO: 1982 ÁREA CONSTRUÍDA: 22.026,02 m² ARQUITETURA: Lina Bo Bardi COLABORADORES: André Vainer e Marcelo Ferraz

CONTEXTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO

Originalmente, o espaço localizado no bairro Água Branca, Zona Oeste da cidade de São Paulo, abrigava uma fábrica de tambores construída pela empresa alemã Mauser & Cia. Ltda. O projeto original possuía inspirações nos galpões ingleses do início do século XX e passou por algumas transformações para se adequar às novas necessidades da indústria Gelomatic, que ocupou o local no meio tempo. Lina Bo Bardi, na segunda metade da década de 1970, foi convidada pelos diretores do SESC, Renato Requixa e Gláucia Amaral, para que readequasse o espaço já utilizado de forma provisória pela rede. Inicialmente, a intenção era demolir a estrutura fabril utilizada anteriormente. Porém, ao pesquisar a história da construção e da região, que por muito tempo teve destaque na ocupação industrial decide mudar os rumos que o projeto tomaria, comenta Marcelo Ferraz: Lina, com olhar arguto e culto, descobre que a velha fábrica possui uma estrutura moldada por um dos pioneiros do concreto armado no início do século XX, o francês François Hennebique. Talvez a única conhecida no Brasil até esse momento (FERRAZ, 2008, n. p).

89


[46] ร rea expositiva com a presenรงa do fluxo de รกgua interno

[45] Detalhe construtivo


Junto aos recém-formados Marcelo Ferraz e André Vainer, a arquiteta iniciou em 1977 a transformação da antiga fábrica em um complexo de lazer e cultura, conhecido na época como SESC Fábrica da Pompeia, remetendo à história do espaço. Retomando visões pessoais já colocadas em prática durante os projetos desenvolvidos durante o período do Tropicalismo, Lina utiliza dos elementos populares através da criação de um programa abrangente, que possibilitasse a conversa do edifício com a rua, complementando a cidade e convidando a vida pública a ocorrer ali dentro.

MATERIALIDADE

Buscando recuperar a história do espaço, como já comentado anteriormente, optou-se pela reparação dos elementos já existentes. A sede do SESC começou a ser projetada pouco mais de dez anos após a Carta de Veneza, documento criado em 1964 para nortear projetos de restauro e intervenção, visando o fim da cultura de recriar a edificação em sua forma original, como se nunca tivessem ocorrido mudanças no decorrer do tempo. Seguindo tais recomendações, Lina mantém todas as características que foram possíveis se adequar ao projeto desenvolvido. À primeira vista, a rua interna de paralelepípedos em conjunto com a tonalidade do tijolo e a volumetria da edificação parecem transportar o usuário para outro local, de maior calmaria e menor velocidade, fora da capital paulista ou até mesmo em outra época. Ao fazer modificações no projeto original, a arquiteta combina elementos rústicos e metais, que dialoguem com o existente, criando uma relação com o estilo arquitetônico presente desde o início daquele século. Para a parte interna dos galpões, foi escolhido revestimento de pedras com acabamento natural, em coloração similar ao concreto, que junto às estruturas metálicas suportam a cobertura do local. Toda a estética, que se assemelha ao brutalismo, é quebrada pelo caminho de

91


[47] Rua interna


água que representa o percurso original do rio, buscando uma sensação de aconchego. Se tratando do projeto que complementa o programa requisitado, três torres construídas a partir de formas para moldar concreto, que após o tempo de cura recebeu tratamento para aguentar o clima. A estética maciça dos edifícios construídos a partir do zero é quebrada pelas aberturas das paredes. O de maior projeção recebeu 16 aberturas em formas orgânicas, com vedação a partir de brises móveis em tom de vermelho. Já o outro volume, recebe a quebra da brutalidade pelas janelas vermelhas, posicionadas de forma desencontradas.

PROGRAMA

Das quatro obras analisadas no decorrer deste capítulo três delas são intervenções em construções já existentes, sendo o SESC Pompeia a primeira delas. Esta característica tem um nível de influência importante na hora do desenvolvimento do programa e como será distribuído. Após tomar a decisão de preservação dos galpões originais, Lina e sua equipe definiram qual seria o preceito básico do projeto: servir como espaço de lazer para a população. “O novo centro deveria fomentar a convivência entre as pessoas, como fórmula infalível de produção cultural” (FERRAZ, 2008, n.p), além de incentivar o esporte como meio de recreação. A primeira parte programática do conjunto se dá logo após passar pelo portão, com o espaço entre os galpões, formando uma continuação da Rua Clélia, direcionando o público para a entrada do restante dos ambientes durante sua extensão. Ao chegar no fundo do terreno, onde se localiza o Córrego das Águas Pretas, se avista um grande deck que é utilizado como solário, cobrindo o fluxo de água. Para uma melhor compreensão será explicado através dos blocos que se correlacionam as atividades exercidas. Logo ao adentrar o terreno as antigas edificações já recebem os indivíduos. No primeiro deles, localizado à direita da entrada, se encontra as salas administrativas, tendo 93


Desenho retirado do livro Lina Bo Bardi e adaptado pelo autor do trabalho


uma conexão com o espaço destinado a receber grandes exposições, uma pequena biblioteca e a área de estar. Vale destacar esta área de estar, que recria o caminho original do rio, através de uma espécie de espelho d’água, trazendo a memória da história da região. A segunda parte, ainda próxima a rua, abriga a área dos funcionários, que possuem vestiários e uma copa de apoio. Destinado ao público geral, este bloco possui a comedoria do SESC, dividida em: salão e cozinha industrial. Andando mais alguns metros na rua interna, no lado direito, fica o teatro, com palco central e plateia capacitada para abrigar 1200 pessoas, dispostas em arquibancadas dos dois lados do espaço; além do foyer, que recepciona os espectadores em dias de apresentações. A quarta, e última, parte abrigada nos galpões foi destinada a exposições e oficinas que a instituição proporciona. Dentre elas é possível encontrar fotografia, colagem, cerâmica, dentre outras possibilidades. A segunda parte do programa, destinada às atividades esportivas, foi implementada nos dois novos volumes construídos, que se conectam por meio de oito passarelas de concreto armado. No primeiro dispõe de quatro andares com pés-direitos altos para que pudessem abrigar as quadras esportivas e a piscina, localizada no andar térreo. No segundo prédio se encontram os vestiários, salas de exercícios, escadas de emergência e terraço de circulação, distribuídos ao longo de onze pavimentos. Ainda, mais um terceiro volume foi construído para abrigar a caixa d’água. O mais alto deles, atingindo 80 metros de altura, foi feito a partir de formas de concreto moldado in loco, construído para remeter às chaminés do período industrial.

RELAÇÃO COM A IDENTIDADE

A trajetória de Lina Bo Bardi já diz muito sobre a percepção que a arquiteta tinha sobre arquitetura e arte, sempre em busca do resgate da identidade nacional e como adaptá-la para o momento em que estava. O

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[49] Espaço para oficinas

[48] Detalhe do galpão pré-existente


SESC Pompeia, desde o princípio tinha a ideia de preservar a estrutura da fábrica, para não apagar a história da cidade. Tratando do primeiro projeto de intervenção em um patrimônio já existente a ser analisado, se difere no modo de agregar a cultura nacional quando comparado com o MASP. Lina, ao fazer a opção de manter todo os galpões da Mauser & Cia. Ltda já levantava a bandeira de que a história da cidade deveria continuar sem apagar o passado e preservá-lo, tornando a memória parte do cotidiano. A definição do programa e como seria distribuído foi parte essencial para que o objetivo fosse atingido. A continuação interna que foi proposta para a Rua Clélia torna a experiência mais dinâmica e incentivadora da interação social, para que a disseminação da cultura de fato ocorra, utilizando dos usuários como agentes transmissores, assim como o solário e os grandes espaços de convivência projetados, formando uma espécie de praça coberta. Além da importância como estrutura que propicia a disseminação cultural, alguns elementos palpáveis buscam preservar essa história. A volumetria mantida e os tijolos da recuperação da arquitetura existentes resgatam o material e as técnicas trazidas pelos imigrantes italianos e alemães durante o período de imigração e da expansão da cidade, parte da formação da história do país. O caminho d’água construído dentro da área expositiva remete ao fluxo original do rio, que passa pelo terreno de forma canalizada. Recobrendo a memória do fluxo que um dia esteve ali presente, se conectando não só com a história da fábrica, mas do espaço como um todo, instigando a curiosidade do usuário, ao fazê-lo se perguntar o porquê do elemento estar ali, junto a exposições, livros e outros objetos. Talvez o ponto que pareça mais óbvio quando se fala em cultura: a área de exposições e atividades manuais, que de maneira acolhedora convida os usuários a participar, fazer a troca de conhecimentos, se enriquecendo não só tecnicamente, mas também de experiências e convívio. Tendo em vista esse resultado, a arquiteta, junto à sua equipe decidiram

fazer

o

mínimo 97

de

divisórias

possíveis,

e


[50] Fachada do prĂŠdio em concreto


quando imprescindível utilizaram paredes baixas, que se interrompesse antes de chegar ao teto, possibilitando a visão sobre elas. Tratando do complexo esportivo, a intenção de Lina nunca foi seguir as regras das instituições reguladoras, mas utilizar de forma exclusivamente recreativa, proporcionando, assim como no restante dos espaços já citados anteriormente a inter-relação humana. Quanto à estrutura física relacionada a características históricas e de identidade, dois pontos são notados: as rampas que fazem a conexão entre os prédios, construídas de maneira que respeitassem o rio, e a materialidade, resgatando o ponto abordado na análise anterior (3.1): o brutalismo na cidade de São Paulo e sua importância. Enquanto na obra anterior (3.1) a questão do Manifesto Antropofágico era algo incerto ou aplicado de maneira extremamente sutil, relacionado à suas vivências próprias, neste projeto a própria estrutura da fábrica, inspirada na arquitetura industrial inglesa, proporciona essa leitura através da deglutição de uma cultura interna e transformação para algo com sentido local. O Manifesto Pau-Brasil, que buscava simplificar e trazer a poesia para a linguagem cotidiana, reflete, mesmo que de forma não intencional, na proposta de manter a rua interna, conectando com a cidade, proporcionando uma utilização diária e usual. Elementos como o caminho de água e a lareira, por trazer o fogo, conversam com as ideias tropicalistas, que convergem também com as das Semana de Arte Moderna. A premissa de encaixar o programa na volumetria existente, reafirmando a história e arquitetura da fábrica, já flertava com o que viria a surgir anos depois: o realce da cultura “não nobre” através de expressões artísticas. Portanto, vale ressaltar que este ponto ainda não se encontrava nos debates para a maioria dos arquitetos e artistas. Neste quesito, Lina sempre foi um ponto fora da curva.

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[51] KKKK


3.2 KKKK FICHA TÉCNICA PROJETO: Complexo KKKK LOCALIZAÇÃO: Registro, SP. Brasil ANO DO PROJETO: 1996 ANO DE CONCLUSÃO: 2002 ÁREA CONSTRUÍDA: 4.290 m² ARQUITETURA: Brasil Arquitetura AUTORES: Francisco Fanucci e Marcelo Ferraz COLABORADORES: Anderson Freitas, Carlos Ferrata, Carmem Ávilla,

Cícero Cruz, Fabio Mosaner, Juliana Antunes, Paulo Alves e Pedro Barros CONTEXTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO

A cidade de Registro, SP, localizada no Vale do Ribeira, durante o período de forte imigração japonesa no Brasil recebeu uma grande quantidade de nativos do país oriental, devido ao acordo entre o governo do Estado de São Paulo e o sindicato de Tóquio. A edificação a ser analisada, implantada às margens do Rio Ribeira de Igaupe, foi construída em 1919 pela empresa Japonesa Kaigai Kagyo Kabushiki Kaisha (KKKK) para abrigar as instalações do engenho de beneficiamento de arroz. Porém, durante a Segunda Guerra Mundial e o envolvimento do Brasil no embate, a companhia proprietária da edificação entrou em liquidação. Após o acontecimento, o prédio ficou por anos abandonado e acabou se deteriorando com o decorrer do tempo. Devido a importância histórica para a região, o KKKK foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT) e em 1990 desapropriado e passado para a secretaria de educação, que após projeto de intervenção executado pelo escritório Brasil Arquitetura, em 1996, se tornou o Museu da Imigração Japonesa. 101


[53] Intervenção em facha pré-existente

[52] Fachas


O projeto, destinado a contar a história da região e de seus moradores, recebeu um trabalho de restauro da estrutura original, implementação de novos elementos que se diferenciassem do material pré-existente, um novo volume para abrigar a sala de espetáculos, além de um espaço permeável para drenar a água nos períodos de cheia do rio. Inserido na cidade, o complexo KKKK não possui barreiras físicas que imponha receios para acessá-lo, muito pelo contrário, se integra plenamente com o entorno diverso: residências de dois pavimentos em uma das laterais, comércio em outra e o rio à frente. Junto ao projeto do Museu da Imigração Japonesa, o escritório desenhou uma praça pertencente ao Parque Beira Rio, que percorre parte do fluxo fluvial, limite para o desenvolvimento urbano da cidade. Projetado para este uso específico, a construção abrigou a instituição por 14 anos e em 2016 passou a ser administrado pelo SESC, que instalou a primeira unidade da rede na região, utilizando inicialmente de forma provisória com os elementos que projeto já proporcionava e após dois anos o adequou para as necessidades requeridas.

MATERIALIDADE

As informações cedidas pela prefeitura de Registro apontam que o projeto original teria vindo do Japão. As características da arquitetura adotada se assemelham, assim como no SESC Pompéia, a arquitetura fabril da Inglaterra no início do século XX, não absorvendo características do país de origem. O método de intervenção adota para o KKKK se assemelha com o executado na análise anterior (3.2), devido às semelhanças históricas, porém de uma forma mais contida, os novos elementos não buscam a todo momento se conectar ao estilo industrial. As características industriais permaneceram na volumetria da arquitetura e no material de isolamento: o tijolo de barro. Além nome dos galpões (K1, K2, K3 e K4), que continuam

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TÉRREO

PRIMEIRO ANDAR

IMPLANTAÇÃO – sem escala

Desenhos cedidos pelo escritório Brasil Arquitetura


estampados até os dias de hoje na parte superior de cada um, remetendo ao uso original do prédio. Além das instalações que dão nome ao conjunto da antiga empresa Kaigai Kagyo Kabushiki Kaisha, a outra construção também foi restaurada e manteve seus materiais originais, assim como a chaminé. O corredor aberto que possuía entre as duas partes do projeto recebeu uma marquise de concreto armado, que se prolonga na parte dos fundos do edifício, traz uma nova informação de materialidade, que não se destacava até então, assim como o anexo do elevador em placas metálicas vermelhas, instalado à construção. O projeto desenvolvido pelos arquitetos do Brasil Arquitetura não possui somente o restauro e intervenção no patrimônio, foi construído no terreno, compondo os edifícios de tijolo aparente, um volume retangular em alvenaria pintado de branco, que abriga o auditório.

PROGRAMA

A divisão dos elementos contidos no programa acontece em quatro blocos: três deles se instalaram no estrutura pré-existente, e o quarto na nova edificação projetada em 1996. Iniciando o conteúdo programático a partir dos galpões K1 e K2, que sofreu transformações após a administração do SESC. Hoje, o conjunto abriga a área expositiva, na direção da rua Félix Aby Azar, separado internamente pelos sanitários, criando, em direção ao rio, uma grande sala de estar com móveis projetados pelo próprio escritório, utilizando madeiras nacionais. Separado por um pequeno jardim, O K1 e K2 se unem através de um caminho central ao segundo bloco - K3 e K4 -, onde se encontra a parte educacional do programa. O grande pé direito foi divido, em parte do galpão, para abrigar a quantidade de ambientes necessários. O nível térreo dá acesso à quatro salas de aulas, o bloco sanitário desta parte do conjunto e um grande espaço de estudos. Subindo as escadas que se encontram 105


[54] Ă rea expositiva


nas extremidades do edifício, foi implantada outra sala de aula, uma de informática com o dobro do espaço das comuns e uma sala de reuniões. Compondo o programa, foi construído uma marquise que percorre duas das laterais do espaço de exposições e área de estar, sendo utilizadas como continuação das mesmas, porém sem vedações. O novo elemento agradou os usuários, devido às grandes temperaturas que a região atinge durante o verão. O espaço de uso misto também conecta as edificações com o bloco três, direcionando para a parte administrativa, dividida em dois pavimentos; à compactada loja SESC e a comedoria, equipada com uma pequena cozinha de equipamentos industriais. A quarta parte do programa, se encontra um pouco mais afastada das outras, cerca de 30 metros. O edifício construído já no século XXI possui, para acesso geral, os seguintes espaços: plateia para 240 espectadores, foyer e dois banheiros. Para funcionários e artistas: dois camarins de acesso direto ao palco e duas escadas para acesso ao pavimento técnico.

RELAÇÃO COM A IDENTIDADE

Diversas características do complexo KKKK se assemelham com o projeto do SESC Pompéia, seja pelo contato do arquiteto Marcelo Ferraz na execução durante os anos 1970, ou pela administração feita pela mesma rede empresarial. As características físicas da edificação, após passar pela intervenção, buscam recontar a história da fábrica, mantendo a volumetria original, lembrando da importância que a mesma teve para o desenvolvimento da região. Os tijolos, desta vez, não buscam recontar a história da mudança de técnicas construtivas, como na análise anterior, mas sim ressaltar a matéria base, de extrema importância para a região, que ainda hoje se destaca nos produtos criados a partir dele. Os novos elementos buscam de maneira simples ajudar a contar a história: novo prédio com uma volumetria simples e branca não tem a 107


[55] K2 e K3


intenção de se destacar, serve somente como plano de fundo, levando as atenções para o que importa: as antigas instalações da Kaigai Kagyo Kabushiki Kaisha. Muxarabis foram instalados em diversas partes do prédio, mesmo que não intencionalmente para esta obra em específico, resgatam a história da arquitetura nacional através do elemento. Quanto ao programa, a significância cultural e na maneira de influenciar o contato com a cultura, quando construído, havia o propósito claro de expor a comunidade japonesa e sua influência, porém com a mudança de administração do espaço, o SESC atua de uma maneira um pouco diferente: não priorizando somente materiais expositivos. A instituição, como um todo, procura sempre trazer a cultura através de diversas atividades como debates, palestras, shows, rodas de conversa, dentre outros, proporcionando o conhecimento de forma desmistificada e por meio da educação leva as informações para a sociedade, incentivando a busca por mais, mostrando que cada um dos usuários é responsável pela construção da identidade e da cultura. O projeto do KKKK, desenvolvido concomitantemente à explosão do cinema nacional, também reflete a característica de abraçar a realidade, independente qual seja ela. A arquitetura fabril, adaptada ao novo programa, busca representar o passado da região e de seus imigrantes, que através do tempo criaram uma nova história fora de seu país de origem, assim, se relacionando ao antropofagismo de Oswald de Andrade.

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[56] Teatro ErotĂ­des de Campos


3.4 TEATRO ENGENHO CENTRAL FICHA TÉCNICA PROJETO: Teatro Erotídes de Campos ENDEREÇO: Engenho Central. Piracicaba, SP. Brasil ANO DO PROJETO: 2009 ANO DE CONCLUSÃO: 2013 ÁREA CONSTRUÍDA: 2850 m² ARQUITETURA: Brasil Arquitetura AUTORES: Francisco Fanucci, Marcelo Ferraz e Gabriel Grinspum COLABORADORES: Anne Dieterich, Anselmo Turazzi, Beatriz Marques,

Cícero Ferraz Cruz, Fabiana Fernandes Paiva, Felipe Zene, Gabriel Mendonça, Kristine Stiphany, Luciana Dornellas, Pedro del Guerra, Rebeca Grinspum, Victor Gurgel e Vinícius Spira

CONTEXTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO

A última obra a ser analisada é mais um exemplo de arquitetura de intervenção em patrimônio histórico. O Teatro Erotides de Campos, como se encontra atualmente, foi projetado pelo escritório Brasil Arquitetura na década de 2000. Implantado nas margens do Rio Piracicaba, que dá nome à cidade de localização, o projeto original foi concluído no ano de 1881, fim do século XIX, período que o país passava por uma grande crise política e social com a regência monárquica. Idealizado pelo Barão de Rezende, o edifício tinha como objetivo a modernização do processo de produção da cana de açúcar ao substituir o trabalho escravo pela mecanização. Se tratando de uma obra com mais de cem anos desde a concepção, já é de se esperar que houvesse mudanças no uso do edifício. Devido a crises econômicas e modos de produção, o Engenho Central

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[57] Intervenção no galpão do conjunto Engenho Central


passou por diversas administrações, até que recebesse um destino cultural, devido a importância histórica para a cidade. Pela relevância e influência no desenvolvimento do município, a extensão do Rio Piracicaba cresceu nos aspectos culturais e de lazer ao longo dos anos. Localizado às margens do fluxo fluvial e pouco menos de dois quilômetros do local onde se iniciou a cidade de Piracicaba, o Engenho Central, recebe grande fluxo de pessoas devido à implantação em local estratégico. O complexo que abriga o teatro foi implantado em um terreno relativamente distante de outras construções, sem vizinhos imediatos em nenhum dos lados, se distanciando pelo menos dez metros da arquitetura mais próxima. O suave desnível topográfico que o lote possui foi resolvido com a criação de taludes, resultando em três platôs: dois deles localizados os prédios da administração e o maior deles, que recebe a implantação dos galpões. MATERIALIDADE

Esteticamente, ao observar a edificação do Teatro Erotides de Campos é possível notar a forte presença do método construtivo original: o tijolo. Mais uma vez seguindo as recomendações da Carta de Veneza de 1964, o escritório Brasil Arquitetura evidenciou a recuperação do antigo e ao propor mudanças, que possibilitassem a utilização do espaço para o novo programa, utilizou materiais de fácil diferenciação. Originalmente, o galpão de número seis, explorava elementos rústicos como tijolos, telhas de barro, ferro e concreto. Após a intervenção, as aberturas que não se encaixavam no novo projeto foram fechadas através das chapas metálicas pintadas de vermelho, assim como os revestimento e isolamento das estruturas anexadas ao sistema estrutural já existente, sendo elas: uma nova escada que se adequasse às normas de segurança do corpo de bombeiros, marquises responsáveis por determinarem as entradas do teatro multifuncional, e por fim, a grande caixa que se acopla a parede de tijolo da face traseira, aumentando o

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Desenhos cedidos pelo escritรณrio Brasil Arquitetura


tamanho do palco, visto que a solução encontra com tal elemento possibilitasse o avanço do perímetro original.

PROGRAMA

Tratando-se de um projeto de intervenção em uma construção tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural (CODEPAC) e pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT), as propostas elaboradas para o edifício necessitavam se encaixar nos padrões impostos pelas leis. A fachada do galpão era o ponto a ser preservado da edificação, porém com o adendo de liberação de construção de anexos. Já o interior do edifício não possuía restrições ao se tratar de mudanças. Para que abrigasse todas as necessidades que um teatro requer, o programa foi dividido em quatro pavimentos. No primeiro, abriga o hall principal junto à bilheteria, local onde o público geral utiliza como foyer em dias de espetáculo antes de se destinar à sala de apresentações. Dando apoio ao hall, dois banheiros se localizam à direita do ambiente, já no lado esquerdo, o espaço de socialização se conecta ao café, capaz de abrigar 39 usuários, além de todo o ambiente de apoio requisitado pela vigilância sanitária. Na sala de exibição das montagens teatrais, que comporta 285 espectadores, e ao adentrá-la se avista o grande palco ao fundo, e nas duas laterais as escadas de acesso aos camarotes. Quanto às áreas restritas à funcionários no primeiro pavimento, se encontra além do palco, três camarins equipados com banheiros, tendo ligação direta à área de apresentações e uma sala de máquinas com entrada pelos fundos do teatro. O segundo pavimento possui um grande vazio central que possibilita os 24 assentos superiores tenham visão total do palco. Destinado ao uso diário para treinamentos e atividades cotidianas, o Teatro Erotides de Campos possui duas salas de ensaio, dois banheiros e a copa 115


[58] Palco do Teatro Erotídes de Campos [59] Café do Engenho Central [60] Hall / Foyer


de uso exclusivo dos artistas. O restante da área é destinada às funções técnicas como: equipamentos de ar condicionado e despressurização. O terceiro e quarto andar possuem tamanho reduzido, devido à volumetria do galpão, e abrigam exclusivamente salas técnicas que acomodam máquinas de grande porte e as passarelas de apoio ao palco. Entendendo a relação do complexo com o restante dos equipamentos que se encontram nas margens do rio e também com a cidade, o projeto desenvolvido pelo escritório Brasil Arquitetura, em 2009, levou em consideração o espaço livre nos fundos do galpão em que houve a intervenção. Foi criado um pátio que possibilitasse a convivência dos moradores da cidade, adicionando um atrativo: uma abertura na estrutura que abriga o palco. Assim, tornando propício para produzir apresentações voltadas para o lado interno ou externo.

RELAÇÃO COM A IDENTIDADE

A última obra analisada se difere um pouco quando comparada às outras, já que a pedido do cliente a intervenção seria somente no galpão destinado especificamente para o programa, não recebendo um projeto para a área do entorno imediato. Na questão construtiva, dois pontos ressaltam a identidade nacional: o primeiro deles é a materialidade do edifício, que mais uma vez é o tijolo de barro. O segundo é a volumetria e aberturas originais, que não foram alteradas de maneira a camuflar na história, sempre destacando com utilização de materiais esteticamente diferentes. Ambas escolhas feitas a fim de resgatar a memória do antigo engenho com respeito e entendimento do que a construção representa”. O projeto, por se tratar de uma edificação específica, dentre o conjunto de várias, não teve a possibilidade de propor mudanças no terreno implantado, como o caso do SESC Pompéia (3.2) e o KKKK (3.3), proporcionando uma melhoria para uma interação social, que como já dito anteriormente, é o principal meio para a troca cultural e criação da identidade. Entendendo essa limitação, a Brasil Arquitetura utilizou do 117


[61] Fachada posterior do Teatro


pátio nos fundos como parte do projeto, possibilitando a abertura do palco para a área que está mais conectada com a cidade, não limitando a busca pela arte no interior do edifício, que por uma outra perspectiva causa uma certa barreira nos grupos sociais que não utilizam com frequência este tipo de equipamento. Apesar de arquitetonicamente o teatro do Engenho Central ter recebido menos elementos que resgatassem características da identidade cultural quando comparado aos demais projetos analisados, na questão do conceito abordado, o teatro é o que melhor se conecta à vertente artística que ocorria concomitantemente. O projeto de 2009, assim como o que vinha ocorrendo no cinema, não tenta apagar a situação que, no caso da arquitetura, já foi realidade. O espaço lida com o passado escravocrata do Brasil como forma de

conscientização

através

da

edificação,

ressignificando-a

e

consequentemente possibilitando contar uma nova história, em conjunto com o que ela costumava representar. Se assemelhando assim a forma como a identidade do Brasil foi, e vem sendo, construída: adicionando novos aspectos às características pré-estabelecidas.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A abrangência que o tema proposto possibilitava, gerou uma enorme quantidade de direcionamentos a serem seguidos. Entender que a Semana de Arte Moderna (1922) e o Movimento Tropicalista, ocorrido entre as décadas 1960 e 1970, vinham de uma base, mas se imprimiam de maneiras distintas quanto à arquitetura, foi o ponto de mudança para chegar no tema escolhido.

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Os três capítulos que integram esta monografia analisam diferentes aspectos que se entrelaçam, resultando em um único produto: a identidade cultural brasileira. O primeiro deles aborda o contexto histórico, político e social do início dos anos 1920, a Era Vargas, a Ditadura Militar e a redemocratização do país. O conteúdo produzido aponta que os aspectos administrativos sofrem altos e baixos: hora mais liberal, hora mais conservador. Os momentos pré-estabelecidos no capítulo um ocorrem concomitantemente a determinadas vertentes artísticas abordadas no capítulo dois, sendo elas: o Movimento Moderno, o Tropicalismo e a reascensão do cinema brasileiro na década de 1990. A comparação das características entre estas duas vertentes da história expôs a correlação entre elas, hora em concordância, hora em discordância. No capítulo três, as obras escolhidas foram determinadas por alguns aspectos que foram julgados essenciais para a análise da identidade cultural em elementos arquitetônicos, como já abordado. Devido à visão do que era cultura e como funcionava, antes da pesquisa, a dúvida de como as quatro obras escolhidas conseguiriam se conectar, principalmente no caso do MASP, pode ser sanada no decorrer do processo; mostrando que apesar de projetadas em diferentes épocas e possuírem características diversas, todos elas se conectam com a identidade cultural de alguma forma particular, sempre relacionado com o contexto histórico em que foram inseridas. Portanto, o resultado do trabalho foi satisfatório, chegando no patamar desejado e abrindo diversas outras oportunidades para pesquisas a serem desenvolvidas, podendo elas serem focadas em um espaço/ tempo diferente, ou em um aprofundamento nos movimentos artísticos e arquitetônicos derivados de um momento histórico específico. A monografia, também, abre espaço para aplicações na área da construção, com a possibilidade de servir como referência para compreensão dos elementos que ressaltam a identidade nacional e de qual modo são capazes de serem agregados aos mais diversos tipos de edificações. 121



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Eventos) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2010. RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro: formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. RIBEIRO, Mayara Cristina. Vera Cruz. Trabalho de Conclusão de Curso (Arquitetura e Urbanismo) – Centro Universitário SENAC. São Paulo, 2015 ROCHA, Ricardo. Resenhar Brazil Builds. Resenhas Online, São Paulo, v. 142, n. 5, n.p, out./2013. Disponível em: <https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/12.142/4923>. Acesso em: 17 out. 2019. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil: 1900 - 1990. São Paulo: EDUSP, 1998. SIMIONI, A. P. C. Modernismo brasileiro: entre a consagração e a contestação. Perspective, Paris, v. 2, n. 1, p. 1-17, jan./2013. Disponível em: <http://journals.openedition.org/perspective/5539 ; DOI : 10.4000/perspective.5539>. Acesso em: 20 out. 2019. SOUZA, R. L. D. História, poder e identidade em Gilberto Freyre. Métis, Caxias do Sul, v. 5, n. 10, p. 159-177, dez./2006. Disponível em: <http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/metis/article/view/805>. Acesso em: 15 out. 2019. TEMAS DE ARTE CONTEMPORÂNEA . Artes visuais na Tropicália. Disponível em: <http://temasdeartecontemporanea.blogspot.com/2013/08/artes-visuaisna-tropicalia.html>. Acesso em: 12 nov. 2019. WEIMER, Günter. Arquitetura Popular Brasileira. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2005.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES [00] O batizado e Macunaíma, Tarsila do Amaral Fonte: ARTE!Brasileiros Disponível em: <https://artebrasileiros.com.br/opiniao/tarsila-populista/>.

[01] Universidade Federal de Manaus Fonte: Instituto Durango Duarte Disponível em: <https://idd.org.br/acervo/universidade-de-manaos/>.

[02] Morro do Castelo, Rio de Janeiro Fonte: Diário do Rio Disponível em: <https://diariodorio.com/historia-do-morro-do-castelo/>.

[03] Iracema, José Maria de Medeiros Fonte: Toda Matéria Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/romantismo-no-brasil/>.

[04] Vargas após Revolução de 1930, Itacaré Fonte: Poder 360 Disponível em: < https://www.poder360.com.br/congresso/camara-aprova-projeto-queflexibiliza-transmissao-da-voz-do-brasil/>. 130

[05] Soldados da Revolução Constitucionalista Fonte: Brasil Escola Disponível em: <https://brasilescola.uol.com.br/historiab/revolucaoconstitucionalista.htm>.

[06] Vargas em desfile no Pacaembu Fonte: Alambrado Disponível em: <https://alambrado.net/o-futebol-paulista-e-o-estado-novo/>.

[07] João Goulart em comício Fonte: Hora do Povo Disponível em: <https://horadopovo.com.br/jango-e-a-eletrobras-uma-homenagem-a-umbrasileiro/>.

[08] Matéria sobre AI-5 no jornal Folha de São Paulo Fonte: Estadão Disponível em: <https://cultura.estadao.com.br/blogs/marcelo-rubens-paiva/50-anosde-ai-5/>.

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[09] Expressão Artística Popular Fonte: Cultura Viva Disponível em: <http://culturaviva.gov.br/saiba-mais/>.

[10] Expressão Artística Popular Fonte: Cultura Viva Disponível em: <http://culturaviva.gov.br/saiba-mais/>.

[11] D. Quixote em S. Paulo: nós temos talento Fonte: História das Artes Disponível em: <https://www.historiadasartes.com/nobrasil/arte-no-seculo20/modernismo/semana-de-arte-moderna/>.

[12] Exposição do Centenário da Independência Fonte: Brasiliana Fotográfica Disponível em: <http://brasilianafotografica.bn.br/brasiliana/handle/20.500.12156.1/6392>.

[13] Rancho da Maioridade, Dubugras Fonte: ArquivoArq Disponível em: <aa5f6d_bf248a30bece4dc890554ee8c6c89c2a~mv2_d_2080_1307_s_2.jpg>.

[14] O Homem Amarelo, Anita Malafatti Fonte: Arte e Artistas Disponível em: <https://arteeartistas.com.br/o-homem-amarelo-anitamalfatti/>.

[15] O Farol: Anita Malfatti História das Artes Disponível em: <https://www.historiadasartes.com/sala-dos-professores/interpretacao-daobra-o-farol-de-anita-malfatti/>.

[16] Membros da Semana de 1922 Fonte: Outras Palavras Disponível em: <https://outraspalavras.net/poeticas/a-semana-de-22-por-oswald-deandrade/>.

[17] Desenhos de Georg Przyrembell Fonte: Artes Plásticas na Semana de 22, Aracy Amaral

[18] Túmulo Fonte: Artes Plásticas na Semana de 22, Aracy Amaral

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[19] Residência Fonte: Artes Plásticas na Semana de 22, Aracy Amaral

[20] Rino Levi Fonte: Veja São Paulo Disponível em: <https://vejasp.abril.com.br/cidades/quem-foi-arquiteto-rinolevi/>.

[21] Gregori Warchavchik Fonte: Etel Design Disponível em: <http://etel.design/creative/gregori-warchavchik>.

[22] Oswald de Andrade Fonte: Folha de São Paulo Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2017/02/1857657-nova-edicaotraz-22-poemas-ineditos-de-oswald-de-andrade.shtml>.

[23] Imagem de Capa, Revista de Antropofagia Fonte: Educa Mais Brasil Disponível em: <https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/artes/movimentoantropofagico>.

[24] Abaporu, Tarsila do Amaral Fonte: BBC Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/geral-47808327>.

[25] Casa Modernista da rua Santa Cruz, Gregori Warchavchik Fonte: Archdaily Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/01-17010/classicos-da-arquiteturacasa-modernista-da-rua-santa-cruz-gregori-warchavchik>.

[26] Salão de 31, Revista da Semana Fonte: Salão de 31 Disponível em: <https://www.salao31.com/o-salao-de-31>.

[27] Pavilhão de Nova York 1939, Lucio Costa Fonte: Archdaily Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/615845/classicos-da-arquiteturapavilhao-de-nova-york-1939-lucio-costa-e-oscar-niemeyer>.

[28] Casa de Vidro, Lina Bo Bardi Fonte: Archdaily

133


Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/01-12802/classicos-da-arquitetura-casade-vidro-lina-bo-bardi/12802_14278>.

[29] Tropicália, Panis et Circencis Fonte: Tenho Mais Discos que Amigos Disponível em: <http://www.tenhomaisdiscosqueamigos.com/2018/07/25/tropicaliapanis-50-anos/>.

[30] Museu de Arte Popular da Bahia, Lina Bo Bardi Fonte: Universidad del Valle Disponível em: < http://cvisaacs.univalle.edu.co/crisisycritica/index.php?option=com_content&view=article&id=20& catid=9&limitstart=2>.

[31] A Mão do Povo Brasileiro, Lina Bo Bardi Fonte: Lina Bo Bardi, Instituto Bardi

[32] Francisco Fanucci, André Vainer, Lina Bo Bardi, Marcelo Ferraz e

equipe Fonte: Acervo Brasil Arquitetura

[33] Construção dos Estúdios Vera Cruz Fonte: G1 Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/06/apos-61-anos-fechadosestudios-da-vera-cruz-serao-revitalizados-no-abc.html>.

[34] Central do Brasil, foto de divulgação Fonte: 42ª Mostra Internacional de Cinema Disponível em: < http://42.mostra.org/br/filme/9518-CENTRAL-DO-BRASIL>.

[35] Museu do Pão, Brasil Arquitetura Fonte: Acervo Brasil Arquitetura

[36] Coleção de objetos de Lina Bo Bardi Fonte: Vitruvius Disponível em: <https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.093/163>.

[37] MASP Fonte: Nelson Kon

[38] Vão livre do MASP Fonte: Autoral

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[39] Vão livre do MASP observado de baixo Fonte: Autoral

`[40] Acervo fixo do museu Fonte: Autoral

[41] Foyer Fonte: Autoral

[42] Escada de acesso à parte superior Fonte: Autoral

[43] Exposição Lina Bo Bardi Fonte: Autoral

[44] SESC Pompéia Fonte: Autoral

[45] Detalhe Construtivo Fonte: Autoral

[46] Área expositiva com a presença do fluxo de água interno Fonte: Autoral

[47] Rua Interna Fonte: Autoral

[48] Detalhe do galpão pré-existente Fonte: Autoral

[49] Espaço ara oficinas Fonte: Autoral

[50] Fachada do prédio em concreto Fonte: Autoral

[51] KKKK Fonte: Autoral

[52] Fachadas Fonte: Autoral

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[53] Intervenção em fachada pré-existente Fonte: Autoral

[54] Área expositiva Fonte: Autoral

[55] K1 e K2 Fonte: Autoral

[56] Teatro Erotídes de Campos Fonte: autoral

[57] Intervenção no galpão do Engenho Central Fonte: autoral

[58] Palco do Teatro Erotídios de Campos Fonte: autoral

[59] Café do Engenho Central Fonte: autoral

[60] Hall / Foyer Fonte: autoral

[61] Fachada posterior do Teatro Fonte: autoral

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