EXAME DO
CREMESP UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
C R E M E S P 1
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
EXAME DO
CREMESP UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
C R E M E S P Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
2009
Exame do Cremesp - Uma contribuição para a avaliação do ensino médico Publicação do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo Rua da Consolação, 753 - Centro - São Paulo SP - CEP 01301-910 Tel: (11) 3017-9300 – www.cremesp.org.br Coordenador do Exame do Cremesp Bráulio Luna Filho Comissão do Exame do Cremesp Akira Ishida, Bráulio Luna Filho, Ieda Therezinha do Nascimento Verreschi, Isac Jorge Filho, Moacyr Perche e Reinaldo Ayer de Oliveira Redação e Edição Aureliano Biancarelli e Mário Scheffer Colaboradores Adelmo de Angelis e Thaïs Souto Arte e diagramação José Humberto de S. Santos Foto capa Osmar Bustos
Exame do Cremesp : uma contribuição para a avaliação do ensino médico / Coordenação Institucional de Bráulio Luna Filho. São Paulo : Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, 2009. 116 p. Vários colaboradores 1. Exame do Cremesp 2. Ensino Médico 3. Avaliação do Ensino Médico I. Luna Filho, Bráulio (Coord.) II. Título III. Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo NLM
W18
APRESENTAÇÃO A necessária reforma do ensino médico Henrique Carlos Gonçalves Presidente do Cremesp
O aprendizado da Medicina no Brasil é caro e exigente. A graduação em seis anos de estudo, em período integral, atinge perto de 11.000 horas/ aula. Além disso, o ingresso nas boas e concorridas faculdades de Medicina requer excelente preparo dos candidatos, nos cursos fundamental e médio, para ultrapassar as barreiras do vestibular. Na atualidade, face aos avanços da Medicina e da ciência, não basta a graduação de qualidade; a plena habilitação depende também da Residência Médica, com duração de dois ou mais anos, com carga horária de 60 horas semanais. No Brasil, com o fenômeno de proliferação desgovernada de escolas de Medicina, impõe-se de forma inequívoca a intervenção do Estado e de outras instituições conducente à melhoria do ensino médico. Os investimentos necessários para a boa formação dos médicos são extremamente altos. Não se aprende Medicina apenas com computadores, livros e modelos artificiais. A íntima interação com a assistência médica nos diferentes níveis de assistência (hospitalar e ambulatorial) aos pacientes, prestada por professores altamente qualificados e comprometidos com o ensino, é indispensável para que o aluno possa desenvolver os conhecimentos, as habilidades e as atitudes necessárias ao exercício profissional. Infelizmente, convivemos com faculdades de Medicina de excelência, comparáveis com as melhores do mundo e com outras, cuja qualidade do ensino é extremante preocupante.
O resultado deste contraste é a formação de médicos com habilidades e práticas muito heterogêneas. De um lado, os médicos que cursaram as escolas de excelência tendem a ingressar nos bons programas de Residência Médica e podem se tornar profissionais competentes, superando até mesmo os formados em quaisquer escolas renomadas dos países ricos. A maioria dos formandos das escolas sem condições adequadas de ensino não ingressam na Residência, pois sequer há vagas para todos, tampouco conseguem se especializar. Independente do esforço e da vontade individual, vítimas da desorganização do ensino médico no país, estes profissionais terão seu desempenho comprometido. É neste conjunto de faculdades e de alunos que o Estado e as entidades médicas devem agir. Para o exercício da Medicina não há que se admitir o “ruim e o péssimo”, mas, tão somente, “o bom e o ótimo”. Tal objetivo será atingido se agirmos com rigor na adequação do ensino. As faculdades públicas sofrem com a falta de investimento do governo e com a baixíssima remuneração dos professores; nas escolas privadas, o quadro se agrava, pois os empresários visam, obviamente, o lucro, sempre incompatível com as exigências de qualidade do ensino. O que deve ficar claro é que, tanto nas escolas públicas como nas privadas, há consumo de recursos da sociedade. As isenções fiscais e as parcerias com unidades públicas de saúde são exemplos de investimentos públicos nas escolas médicas privadas. Tal fato, por si, deveria exigir que a abertura de novas escolas e a manutenção das atuais obedecesse a critérios rígidos de custo-benefício e de efetiva necessidade social e não ser tratada como um negócio que, simplesmente por ser lícito, deve ser liberado incondicionalmente. Caberia aqui uma ampla discussão sobre o que precisamos e pretendemos: mais médicos simplesmente, médicos melhor formados ou assistência médica melhor. Não é a maior quantidade de médicos, mas sim a qualidade destes profissionais que irá proporcionar a melhoria da atenção em saúde no Brasil. Não é correta a tese de que a abertura de novas escolas ou o aumento do número de vagas das já existentes interfere positivamente na melhoria
da assistência médica ou na distribuição territorial dos profissionais. O Brasil já é o segundo país no mundo com maior número de escolas médicas e, nem por isso, nossa população é bem assistida. A boa formação do médico interfere não só na melhoria da assistência, mas também no melhor aproveitamento dos recursos e na diminuição dos custos na atenção à saúde. A concentração dos médicos se dá em torno de estruturas dotadas de recursos diagnósticos e terapêuticos atualizados, criando condições para a atuação digna dos profissionais. A existência de escolas de Medicina, algumas sem locais adequados sequer para a assistência médica, não têm o poder de fixar profissionais em seu entorno. A maioria das escolas médicas, internamente, não avalia corretamente seus estudantes ao longo dos seis anos e não obriga a repetição dos estágios em que o aproveitamento não foi satisfatório. Assim, se impõe a adoção de avaliações externas, obrigatórias e independentes, quer dos alunos, quer dos docentes e das Escolas. As medidas e investidas do Ministério da Educação, proibindo a realização de vestibulares e reduzindo o número de vagas oferecidas para as novas turmas das Faculdades com deficiências detectadas no Enade, embora numericamente tímida, demonstra ser um procedimento correto para exigir a adequação do ensino ministrado. Se a escola deficiente não se adequar em curto prazo será automaticamente extinta, com a proibição de realização de vestibulares. Felizmente decisões judiciais têm concordado com esta determinação do governo federal. O Exame do Cremesp, cujos resultados ganharam a presente publicação, pretende contribuir com a tese de que as avaliações internas das escolas médicas não são suficientes. As avaliações dos alunos e das escolas (corpo docente, recursos materiais, hospitais de ensino, ambulatórios, laboratórios etc) devem ser realizadas por instituições externas, isentas, com competência técnica e com poderes legais de intervenção nas faculdades e nos cursos. O ideal é que ocorra durante o curso, antes da desobrigação da escola com o aluno que se propôs graduar.
É certo que a formatura do aluno não pode ser uma simples decorrência do ingresso concorrido, do término da duração do curso ou do pagamento das matrículas e mensalidades. A boa formação do médico não se dá por decurso de prazo e depende, fundamentalmente, da organização e da estrutura física e humana da escola. No momento em que uma faculdade atesta à sociedade a colação de grau em Medicina de seus alunos, esse fato tem importantes implicações sociais, éticas, humanitárias e legais que não podem ser ignoradas. O direito das faculdades de aprovarem os alunos pelo bom aproveitamento durante o curso implica na obrigação de reprovar aqueles que se mostram insuficientes, tantas vezes quanto for necessário. Este ônus não pode ser transferido ao aluno e muito menos à sociedade. Os resultados das avaliações, a exemplo do Exame do Cremesp, devem ter conseqüências eficientes, eficazes e imediatas, não só para impedir que o aluno malformado ingresse no mercado de trabalho, mas também, com a mesma importância, para obrigar as escolas a se adequarem às necessidades do ensino.
SUMÁRIO
■ PREFÁCIO Uma análise sem preconceito ............................................................................. 11
■ INTRODUÇÃO A crise no ensino e a resposta do Cremesp ......................................................... 15
■ EXAME DO CREMESP Uma contribuição para a avaliação do ensino médico ........................................ 19 Ferramenta bem aplicada e resultados preocupantes ........................................... 20 Desempenho da maioria é desconhecido ............................................................ 22 O SUS entra na maioridade. O ensino médico recua ........................................... 22 Aprovação dos médicos e da sociedade .............................................................. 24 Cremesp impulsiona o debate público ................................................................ 24 Projetos e diretrizes: hora de sair do papel .......................................................... 25 Instrumento confiável e seguro ............................................................................ 26 Um exame experimental e voluntário .................................................................. 27 “Medicina reprovada” ......................................................................................... 27 Exame reforçou diagnóstico da Cinaem ............................................................... 28 “Diplomas na UTI” ............................................................................................. 29 O exame de 2008: ressalvas que precisam ser feitas ............................................ 30 61,4% foram reprovados na primeira fase ........................................................... 33 Pediatria e Ginecologia tiveram notas menores ................................................... 34 Escolas privadas tiveram pior desempenho .......................................................... 36 Estatísticas básicas da Fase 1 ............................................................................... 36 Clínica Médica teve maior diferença no desempenho ......................................... 37 Mal desempenho em questões básicas ................................................................ 39
8
EXAME DO CREMESP
Participantes erram situações comuns da prática médica ..................................... 40 21 escolas tiveram representantes na Fase 1 ........................................................ 48 As instituições e as áreas de conhecimento ......................................................... 49 Alunos com dez e alunos com zero ..................................................................... 50 Participantes foram melhor na prática ................................................................. 50 Escolas privadas e as mais novas tiveram pior desempenho ................................. 53 Ensino precário e erro médico ............................................................................. 54 Da elite intelectual para a elite econômica .......................................................... 55 Maioria se forma em escolas privadas ................................................................. 56 País é o segundo em número de escolas .............................................................. 56 175 escolas e 17 mil vagas por ano ..................................................................... 58 Pelo menos 50 novas escolas aguardam na fila ................................................... 59 O risco das promessas “latinas” ........................................................................... 60 Muitos médicos e má distribuição ....................................................................... 60 Médicos preferem ficar onde estão as escolas ..................................................... 61 Um escola a serviço do SUS? .............................................................................. 62 Diretrizes Curriculares, o caminho a seguir ......................................................... 63 Mudanças devem encontrar resistências .............................................................. 64 MEC anuncia mudança de paradigma ................................................................. 65 Cem anos atrás .................................................................................................... 66
■ O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS Como os participantes do Exame do Cremesp avaliam suas escolas ................... 67 Breve perfil do participante ................................................................................. 69 Professores pouco disponíveis ............................................................................. 69 Cursos pouco exigentes ....................................................................................... 70 Amostragem tem limitações ................................................................................ 71 Maioria é de classe média alta ............................................................................ 72 Um terço lê jornais diariamente .......................................................................... 74 97% desenvolveram alguma atividade acadêmica ............................................... 75 Maioria das classes tem mais de 70 alunos .......................................................... 76 Para 42%, acesso a computadores é limitado ...................................................... 77 Disciplinas são parcialmente integradas .............................................................. 78 Provas são escritas e discursivas .......................................................................... 79 Domínio das disciplinas pelos professores ........................................................... 80 75% queriam cursos mais exigentes .................................................................... 80 Competências pouco desenvolvidas .................................................................... 80 Atividades práticas ao longo do curso ................................................................. 85 Parto sem a presença de professor ....................................................................... 85 Ética e relação com o paciente ............................................................................ 86 Supervisão é inadequada para 33% ..................................................................... 87
9
SUMÁRIO
Internato teve 3.500 horas ................................................................................... 87 Projeto de Residência Médica ............................................................................. 87 Metade quer Clínica Médica e Cirurgia Geral ...................................................... 88 CRM e escolas têm boa imagem .......................................................................... 90 Para 37%, prova foi difícil ................................................................................... 90 Enunciados foram claros e objetivos .................................................................... 91 Abordagem do conteúdo foi a maior dificuldade ................................................. 92 Maioria das questões foi considerada adequada .................................................. 92
■ ANEXO 1 Diretrizes curriculares dos cursos de Medicina .................................................. 93 Perfil do formando egresso/profissional ............................................................... 93 Competências e habilidades ................................................................................ 93 Conhecimento, Competências e Habilidades Específicas ..................................... 95 Conteúdos curriculares ........................................................................................ 97 Organização do curso ......................................................................................... 97 Estágios ............................................................................................................... 99 Atividades complementares ............................................................................... 100 Acompanhamento e avaliação .......................................................................... 100
■ ANEXO 2 Principais conclusões da Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico (Cinaem) .......................................... 101 Problemas constatados ...................................................................................... 101 Recomendações e propostas ............................................................................. 102 Principal diagnóstico ......................................................................................... 102 Principal resultado esperado ............................................................................. 102 Entidades que integraram a Cinaem (Regional São Paulo) .................................. 103
■ ANEXO 3 Hospitais de ensino: a precariedade dos locais de estágio prático dos estudantes de Medicina ................................................. 105 Falhas em prontuários ....................................................................................... 106 Ausência de supervisão ..................................................................................... 107
■ ANEXO 4 Cursos de Medicina do Estado de São Paulo por ano de abertura e número de vagas por ano ..................................................... 111
■ CONCLUSÕES ...................................................................................... 115 10
PREFÁCIO Uma análise sem preconceito Isac Jorge Filho Conselheiro e ex-presidente do Cremesp
Há mais de 20 anos, em janeiro de 1989, por iniciativa do Cremesp, os Conselhos Regionais de fiscalização do exercício profissional de nível superior se reuniram para tratar da massificação do ensino. Foi implementado o Fórum de Qualificação Profissional de Nível Superior, coordenado pelo então ministro da Justiça, Oscar Dias Corrêa. Como conseqüência desse Fórum e de estudos posteriores, o Cremesp e a Associação Paulista de Medicina realizaram, em 11 de novembro de 1990, o primeiro Exame de Qualificação Profissional e Auto-avaliação para Médicos no Estado de São Paulo, contando com cerca de 1.100 participantes, entre alunos do sexto ano (70%), recém-formados (20%) e profissionais que já atuavam como médicos (10%). O exame foi organizado pela Fundação Carlos Chagas e a inscrição era voluntária. O tema passou a ser amplamente discutido, muitas vezes com posições apaixonadas, a favor ou contra. Dessas discussões nasceu, nas reuniões realizadas principalmente no Cremesp, a Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico (Cinaem), mantida, enquanto durou, com subsídios de algumas entidades, entre elas o Conselho de São Paulo. Essa alusão a uma experiência passada tem dois objetivos. O primeiro é mostrar, para alguns críticos das atividades do Cremesp ligadas ao ensino médico, que esta preocupação não é recente, já sendo tradicional nossa 11
EXAME DO CREMESP
luta neste campo. O segundo objetivo é o de deixar patente que, após 20 anos, os problemas ligados à qualidade dos médicos formados em muitas de nossas faculdades não só não foram resolvidos como, pelo contrário, se tornaram maiores. É interessante observar também que os argumentos daqueles que se colocavam contra um exame para avaliação dos formados não mudaram: duas décadas depois, são os mesmos. Declarações, até como palavras de ordem, de que a avaliação do estudante de Medicina se faz dentro das faculdades, voltaram a ser repetidas. É claro que a avaliação do estudante de Medicina se faz ao longo da graduação e é também claro que, aquilo que o Cremesp propõe, é avaliar a exeqüibilidade de que, após terminar seu curso (e aí já não é mais estudante), haja uma avaliação externa da qualidade da formação deste médico. Os críticos da iniciativa do Cremesp não discutem se esta avaliação dentro dos cursos tem sido eficiente, se tem atingido seus objetivos. Na grande maioria das faculdades praticamente não existem reprovações ao longo de todo o curso e isso não pode ser normal. Alguns professores disseram de seu desencanto pelo fato de que, quando chegam a reprovar alunos, logo aparecem medidas judiciais buscando anular o feito. É lamentável que isso não seja claramente denunciado e que não passe a fazer parte de campanhas de alunos e entidades estudantis interessadas na boa formação de médicos. Outro argumento repetido após 20 anos é de que o problema fundamental é a criação de novas faculdades de Medicina e, portanto, os trabalhos devem se concentrar na luta contra essa abertura indiscriminada. Essa é uma carapuça que não serve ao Cremesp, que sempre lutou, luta e continuará lutando, inclusive na Justiça, contra esse festival de abertura de escolas médicas. No entanto, os resultados dessa luta são quase nulos, tamanho é o poder das forças contrárias, interessadas nesse rico filão. Pergunta-se: a quem interessa manter apenas esse foco de luta que quase nunca se ganha, que não prospera? A quem interessa concentrar quase todos os esforços das entidades em um único aspecto que, apesar de muito importante, não é o único caminho? Certamente não é a população que se interessa em manter esse status quo. Queremos crer que também 12
PREFÁCIO
não é esse o interesse dos docentes e dos alunos bem intencionados, que felizmente constituem a grande maioria. É isso que o Cremesp quer discutir. Em nenhum momento apontamos o Exame do Cremesp como única solução ou sequer que fosse solução, mas não temos receio de colocá-lo como uma das opções, entre outras que também já surgiram como, por exemplo, a acreditação dos cursos de Medicina. Temos chamado todos para essa discussão. Continuaremos a chamar, apesar de algumas manifestações inexplicáveis de raivosa contrariedade. Não é possível deixar de se levar em conta que a situação hoje é pior do que aquela de 20 anos atrás. Com o Exame do Cremesp pretendemos discutir, com todos os setores interessados, os resultados obtidos. Nossa meta é buscar, sem paixões, medidas eficazes a serem implementadas. Esperamos desta maneira estar cumprindo uma das funções reservadas para os Conselhos: zelar pela qualidade dos médicos em função do interesse maior da Medicina, que é a saúde da população.
13
INTRODUÇÃO A crise no ensino e a resposta do Cremesp Bráulio Luna Filho Conselheiro e coordenador do Exame do Cremesp
É com grande satisfação que apresentamos a publicação“Exame do Cremesp: uma contribuição para a avaliação do ensino médico”, que demonstra a determinação do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo em diagnosticar e apontar caminhos para superar a precariedade da graduação em Medicina, um problema de grande magnitude que tem repercussões no exercício profissional e no bem estar da sociedade Como veremos a seguir, o resultado dessa experiência inédita e inovadora do Cremesp é tão surpreendente quanto preocupante. Demonstra que há tendência de piora em cenário que já não era bom. O presente livro revela uma situação dramática de deterioração da qualidade do ensino médico no estado mais rico do País. Muitos daqueles que participaram do Exame do Cremesp desconhecem o diagnóstico ou o tratamento adequado para a solução de problemas de saúde em áreas elementares, como Clínica Médica, Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia. Se considerarmos o caráter facultativo do Exame e que a amostra de voluntários pode ser constituída pelos alunos mais confiantes nos seus conhecimentos, a situação pode ser ainda mais sombria. Com isso, chamamos a atenção das autoridades da educação e da saúde, dos parlamentares e das próprias universidades e cursos de Medicina. Urgentemente, é preciso considerar a necessidade de uma estratégia de fiscalização das escolas médicas que combine a avaliação continuada 15
EXAME DO CREMESP
durante os anos de formação com um exame terminal, para que apenas os profissionais habilitados tenham acesso ao mercado de trabalho. Também é inadiável uma reforma na legislação que rege os Conselhos de Medicina, autorizando-os a exigir que os médicos recém-formados, além do diploma, apresentem comprovação de competência através do exame de habilitação realizado por organismo externo à instituição que o graduou. Faz-se necessária a criação de um órgão independente das escolas médicas e dos órgãos de classe, mas com competência técnica e autoridade para efetuar esse tipo de exame em todo o País. Não é mais possível desconhecer que o erro médico é um intrincado fenômeno social de causas múltiplas, mas previsíveis e, portanto, possíveis de serem combatidas com o conhecimento e a experiência já disponíveis. Embora não seja simples correlacionar o número de denúncias contra médicos à qualidade da assistência em saúde, alguns dados levantam a hipótese de que alguma coisa não vai bem. Paradoxalmente ao avanço tecnológico do final do século XX, presenciamos um número crescente de denúncias contra médicos. Em uma década, o número de médicos denunciados no Cremesp aumentou em 140%, muito acima da taxa de crescimento de profissionais inscritos e do crescimento populacional de São Paulo no mesmo período. Não há escassez de médicos no Brasil, o que não quer dizer que estejam bem distribuídos geograficamente ou por especialidades. Sabese que os fatores socioeconômicos e culturais são responsáveis por essa realidade. Não pode ser uma política de Estado a tentativa de combater a concentração de médicos nos centros urbanos com o simples aumento no número de formandos. São Paulo chegou no ano de 2009 com 31 escolas de Medicina. Apenas nos últimos anos, desde 2000, foram abertos oito novos cursos cinco na capital e três no interior. Desses, sete são privados, cobram mensalidades entre R$ 2.600 e R$ 4.300. O Brasil já conta com 176 escolas médicas, mais que Estados Unidos, Rússia e China, nações bem mais ricas e mais populosas. Podemos afirmar que não precisamos de mais médicos e, sim, de bons médicos. 16
INTRODUÇÃO
Ao mesmo tempo em que luta historicamente contra a abertura indiscriminada de escolas médicas, o Cremesp tem apoiado experiências pioneiras na avaliação dos cursos e dos seus egressos. Lamentavelmente, essas iniciativas pouco surtiram efeito. Apesar da participação de inúmeras faculdades de Medicina e entidades do setor, a discussão sobre a insuficiência das avaliações das instituições de ensino é barrada tanto pelos interesses mercantis dos donos das escolas como pelo viés corporativo das entidades dos professores. É lamentável que o debate público abrangente sobre a instituição de exame de habilitação dos médicos recém-formados tenha sido protelado, quando se sabe que na maioria das faculdades do País são raros os indivíduos que, uma vez admitidos, não consigam obter o certificado de conclusão. Hoje confunde-se diploma com proficiência e competência para toda a vida. Outro aspecto relevante é que nos países onde se reconhece uma boa Medicina, os médicos fazem, necessariamente, Residência Médica, antes de adquirirem o direito pleno ao exercício profissional. No Brasil, a maioria que não consegue uma vaga de residente, muitas vezes vai trabalhar em prontos-socorros ou lugares menos privilegiados. Desnecessário especular sobre as conseqüências negativas dessa circunstância tão injusta do ponto de vista humano e social. O ensino médico agoniza no Brasil devido a uma combinação de fatores: abertura indiscriminada de escolas médicas para atender conchavos políticos e fins econômicos; currículos desatualizados; turmas com grande número de alunos; docentes despreparados e sem dedicação exclusiva, ausência de hospital-escola próprio ou convênio com hospitais que não são adequados para o ensino; predomínio da técnica e da especialização sobre a humanização do cuidado e da relação com o paciente. Ao descrever, registrar e divulgar os resultados das quatro primeiras edições do Exame do Cremesp, comprovamos a importância da iniciativa e reafirmamos, em caráter propositivo, a decisão de continuidade da avaliação anual do Cremesp bem como a defesa da realização de um exame nacional de habilitação dos egressos dos cursos de Medicina. 17
EXAME DO CREMESP Uma contribuição para a avaliação do ensino médico
O Brasil comemorou em 2008 dois séculos de criação da primeira escola de Medicina do Brasil, a Universidade Federal da Bahia. A escola foi aberta em Salvador em 18 de fevereiro de 1808. Duzentos anos depois, a divulgação do quarto Exame do Cremesp, de 2008, revelou que foram reprovados 61% dos estudantes que estavam no último ano das escolas médicas paulistas, e que compareceram voluntariamente às provas. Significa que mais da metade dos novos profissionais que participaram do Exame do Cremesp entraram no mercado sem condições mínimas esperadas para o exercício da profissão, de acordo com o desempenho observado. Desde que foi iniciado, em 2005, o índice de reprovação nos Exames do Cremesp aumentou, saltando de 31% para 61% (Quadro a seguir). Quadro 1
Resultados do Exame do Cremesp, por ano de realização Ano do exame
Participantes na primeira fase
Aprovados na primeira fase
Índice de aprovação %
Índice de reprovação %
2008
679
262
38,60
61,40
2007
833
367
44,06
55,94
2006
688
427
62,18
37,82
2005
998
685
69,00
31,00
Fonte: Cremesp, 2008
19
EXAME DO CREMESP
Dos cerca de 2.500 estudantes de Medicina das 24 escolas paulistas que tinham turmas no seu último ano e que foram convidados a participar do exame em 2008, 679 fizeram a prova e 262 foram aprovados. O resultado mostrou que apenas 39% adquiriram durante a graduação conhecimentos mínimos para o exercício da profissão, segundo a avaliação a que foram submetidos. Do total de graduandos do Estado que realizaram o Exame, 71,2% vinham de escolas privadas. Diferentemente de anos anteriores, o Exame do Cremesp de 2008 permitiu a participação de formandos de outros Estados. Os alunos das escolas paulistas, no entanto, representaram grande maioria, 93,1%, por isso os resultados de outros Estados não foram considerados. Desta forma, manteve-se os parâmetros de comparação com os anos anteriores. Havia, em 2008, 31 escolas médicas no Estado de São Paulo, e sete delas ainda não tinham turmas no último ano.
Ferramenta bem aplicada e resultados preocupantes O Exame do Cremesp de 2008, de 120 questões na primeira fase, foi considerado pela maioria dos participantes como de dificuldade média”, com “tempo suficiente” para realizá-lo e perguntas de “enunciados claros e objetivos”. Cerca de 60,4% disseram que a “adequação da prova em relação à formação que recebeu no curso foi “boa” e 8%, “excelente”. Significa que o exame, como ferramenta de avaliação, foi corretamente aplicado e que as questões corresponderam às expectativas em relação ao aprendizado dos estudantes de Medicina que chegam ao último ano. O fato de a prova ter sido corretamente aplicada e elaborada só reforça a preocupação com os resultados. O alto índice de reprovados é mais um indicador de um sistema de ensino onde cursos são abertos sem critérios e onde não há instrumentos de avaliação externa que possam contribuir para a melhoria da qualidade da aprendizagem. A divulgação desses resultados não pretende ser uma simples denúncia.
20
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Quer ser um passo à frente num debate que já dura mais de três décadas e que ainda não trouxe muitos resultados concretos. Deve-se, com isso, refletir sobre a situação de precariedade no conjunto da educação do País, pois o estudante de Medicina ainda hoje é uma elite. A maioria informou que estudou em escola particular e vem de família que pode arcar com R$ 3 mil por mês – mensalidade média das escolas privadas, que são maioria -, além dos gastos pessoais de cada um. Esses mesmos estudantes descreveram suas escolas como tendo um número excessivo de alunos por classe, instalações precárias, professores pouco disponíveis, parte das aulas “práticas” na própria classe, quando deveriam se dar nos ambulatórios e enfermarias. No entanto, a maioria classificou suas escolas como boas ou ótimas.
No Exame do Cremesp, em suas quatro edições, a nota considerada de corte foi 6,0. Ou seja, das 120 questões da primeira fase, o aluno deveria acertar 72 delas. Em 2008, em seis das nove áreas de conteúdo, a média do grupo ficou abaixo desse corte. Ginecologia, Clínica Médica, Pediatria, Clínica Cirúrgica estão nesse grupo, todas áreas básicas da Medicina nas quais se concentram as principais necessidades de saúde da população, sobretudo da imensa maioria dos brasileiros que dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde. Mesmo considerando a grande variação no número de alunos das 24 escolas participantes, o exame de 2008 revelou diferenças graves entre as instituições. Entre aquelas que tinham pelo menos 20 dos seus alunos presentes – número considerado pelo Cremesp suficiente para análise da instituição –, apenas três tiveram mais da metade de seus estudantes aprovados. Enquanto na melhor das escolas 64% foram aprovados na primeira fase, na pior, apenas 11% ficaram acima da média. O exame de 2008 (assim como dos anos anteriores) revelou também uma distância enorme entre escolas públicas e privadas e trouxe à 21
EXAME DO CREMESP
tona um fato que só aumenta a preocupação com a abertura e a avaliação dos cursos. Considerando as 13 escolas que tiveram participação representativa – com 20 ou mais de seus alunos presentes -, somente uma, entre as onze privadas, teve mais de 50% dos seus estudantes aprovados em 2008.
Desempenho da maioria é desconhecido Este balanço nada animador no caso do Exame do Cremesp de 2008, vale apenas para os 679 alunos que prestaram a primeira fase. Nada se sabe sobre os outros cerca de 1.800 que também estavam no sexto ano das escolas médicas paulistas e não se inscreveram ou não compareceram. Nem se conhece a situação de outros Estados. O cenário, portanto, pode ser pior, pois é razoável crer que aqueles que se julgam melhor preparados tenham maior interesse e disponibilidade em se apresentar voluntariamente para o Exame do Cremesp. Ao longo de sete anos, de 1991 a 1997, a Cinaem, Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico, – da qual o Cremesp tomou parte -, fez um minucioso diagnóstico das escolas médicas do País. Com o apoio das instituições, traçou o perfil dos alunos e professores, avaliou as instalações e o cumprimento do currículo. As conclusões transcritas no anexo dessa publicação trazem o essencial desse diagnóstico. Em 1997, a comissão concluiu o relatório com uma frase curta e preocupante que pode ser reproduzida uma década depois: “O médico se forma sem a competência mínima para atender às demandas da população”.
O SUS entra na maioridade. O ensino médico recua Vale lembrar que o Sistema Único de Saúde, o SUS criado pela Constituição de 1988, está entrando na sua maioridade sem que o ensino médico tenha evoluído à altura das demandas e necessidades de saúde da população. Nas duas décadas de SUS, marcadas pelas principais conquistas da reforma sanitária no País, as escolas privadas se proliferaram e revelaram que estão oferecendo um ensino cada vez pior. Junto com riscos à 22
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
saúde da população, essa realidade contribui para desqualificar o sistema de saúde brasileiro. Outro achado que deve ser levado em consideração é a variação de desempenho entre estudantes do mesmo curso, na mesma área. Mesmo universidades de referência tiveram uma maioria que foi bem e um grupo menor que foi muito mal. Como a faculdade de Medicina dificilmente reprova alunos, particularmente no último semestre, muitos profissionais estão chegando ao mercado com a grife das melhores escolas, mas com questionável formação para a prática. Estudantes de algumas escolas de referência optaram por não participar dos exames, o que não significa que essa distorção não ocorra entre seus alunos. Doze anos depois, a atual publicação com os resultados do Exame do Cremesp e o perfil traçado pelos estudantes mostra um quadro igualmente preocupante. Nesse tempo, pode-se registrar de positivo uma ampliação do Pró-Saúde, programa dos ministérios da Educação e da Saúde criado para colocar em prática as transformações propostas pela Cinaem, reforçar as Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Medicina e, especialmente, levar o ensino médico para dentro do serviço público de saúde. Outra iniciativa foi a criação de uma comissão liderada pelo médico e ex-ministro Adib Jatene para avaliar in loco os 17 cursos de Medicina que ficaram com conceitos 1 e 2 no Enade, Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes, divulgado em 2008. Num universo de 175 escolas em todo o país, e diante dos resultados colhidos pelo Cremesp entre as escolas paulistas – que estão entre as melhores –, parece irrisório o número registrado de faculdades com baixo desempenho em todo o território. Mesmo assim, entre os cursos “reprovados” e avaliados pela equipe do MEC, apenas quatro tiveram que suspender aulas ou reduzir o número de vagas enquanto supriam deficiências apontadas. Os avaliadores verificavam os quesitos de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais, verificando as disciplinas oferecidas, o perfil do corpo docente, o campo de prática médica e o internato. Algumas escolas tinham menos de 15 leitos destinados à prática dos alunos. 23
EXAME DO CREMESP
Do filtro do Enade não escaparam cursos de três universidades federais. A essas, o MEC destinou cerca de R$ 6 milhões para que promovam as adequações apontadas no relatório da comissão de supervisão. Quando se olha o conjunto das escolas e se avalia o nível de cobrança das comissões criadas pelo MEC, não se vê grandes perspectivas de mudança num horizonte próximo. De todo modo, o Cremesp defende e apóia a avaliação permanente realizada in loco pelas próprias faculdades e iniciativas como o exame do Enade, conduzido pelo MEC.
Aprovação dos médicos e da sociedade Pesquisa realizada a pedido do Cremesp pelo Instituto Datafolha, em 2005, com quatro públicos distintos (médicos, estudantes, formadores de opinião e população) revelou grande aceitação do Exame do Cremesp . A maioria dos médicos (83%), dentre os cerca de 100 mil profissionais em atividade no Estado, aprovam a iniciativa. Dentre os formadores de opinião o apoio ao Exame do Cremesp chega a 93%, aceitação bem próxima da população geral (92%). Já entre os estudantes de Medicina de São Paulo, a maioria (62%) é contrária à obrigatoriedade do exame. Outra pesquisa do Datafolha , desta vez em 2007 e só entre médicos, para colher a opinião sobre diversos assuntos e áreas de atuação do Cremesp, indicou que cresceu entre os médicos a aprovação ao Exame. Se comparado à pesquisa anterior ( 83% de aprovação), o índice cresceu 7% (acima da margem de erro de 5%), atingindo 91%.
Cremesp impulsiona o debate público O que se verá ao longo dessa publicação é que duas décadas de esforços para se criar instrumentos de avaliação e controlar a abertura de novos cursos continuam sendo anuladas pelo lobby das escolas e dos interesses políticos. Hoje, dos 175 cursos do país, 105 deles são privados. Só neste século, 70 novas escolas foram abertas. O país só perde para a Índia no número de faculdades médicas. Na fila do MEC, aguardando aprovação, 24
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
estavam, em 2008, 50 instituições, 38 privadas e 12 públicas. Nesse ritmo, e com a balança pendendo para o privado, o ensino médico e o exercício da Medicina tendem cada vez mais a se submeter às regras do mercado, avançando na contra mão da política de saúde do SUS, prevista na Constituição. A série de quatro exames já realizados pelo Cremesp e o debate que a instituição quer ampliar com essa publicação precisam do entendimento e da parceria da sociedade. Além de grupos interessados no rentável mercado dos cursos médicos, é compreensível que parlamentares defendam que suas cidades e Estados tenham novas escolas de Medicina. É natural também que aos olhos da sociedade, mais faculdades possam significar mais médicos, mais saúde e, para seus filhos, mais chances nos vestibulares. Sem uma ordenação firme, porém, tudo não passará de fantasia, daí a importância de se informar corretamente a opinião pública. Sem a parceria e o entendimento da sociedade, a tendência é que mais escolas continuem a ser abertas. E que, sem um debate público, nenhum órgão terá autoridade para fechar os cursos ruins e impedir a abertura de novos.
Projetos e diretrizes: hora de sair do papel O Cremesp defende amplo debate com a sociedade, governo, entidades médicas, alunos, docentes e dirigentes de escolas médicas a respeito dos Projetos de Lei que tramitam no Congresso Nacional e que exigem a obrigatoriedade do exame de habilitação para o exercício da Medicina. Há projetos que também estabelecem regras para a abertura de novos cursos e ampliação do número de vagas. Em comum, estabelecem normas e definem as instituições – entre elas as entidades médicas e o Conselho Nacional de Saúde – que terão papel consultivo ou terminativo na abertura e na avaliação dos cursos. O cumprimento das Diretrizes Curriculares para os cursos de Medicina e a existência de um hospital universitário, próprio ou conveniado – que em muitos dos cursos nunca saiu do papel – passariam a ser exigências, conforme projetos em tramitação.
25
EXAME DO CREMESP
Instrumento confiável e seguro O índice de reprovação no Exame do Cremesp de 2008 foi de 61,40%, contra 31% em 2005, um salto de 97% no número de reprovados, em quatro anos. Na prática, 6 de cada 10 graduandos não preencheram os critérios mínimos estabelecidos pelo Cremesp. O exame revela outras preocupações: as escolas privadas e abertas mais recentemente são as que tiveram pior desempenho. E mesmo nas boas faculdades públicas, uma porcentagem importante de estudantes sextoanistas não conseguiu nota mínima, o que significa que muitos estão entrando no mercado com o aval das boas escolas, mas sem condições mínimas para exercer a profissão. O Brasil já é o segundo país no mundo com maior número de escolas médicas, só perdendo para a Índia. Das 175 escolas em funcionamento no Brasil até final de 2008, 105 eram privadas. O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo realizou nos meses de setembro e outubro de 2008 a 4ª edição do Exame de Habilitação para graduandos das escolas médicas paulistas. A proposta da prova, como nos anos anteriores, foi verificar em que medida os cursos de Medicina estão proporcionando a seus egressos formação compatível com o perfil esperado para um médico que completa sua formação. Como se trata de área do conhecimento bastante ampla e diversificada, com habilidades práticas complexas, vasto conteúdo teórico e componente ético determinante, o Cremesp constituiu uma comissão organizadora que se dedicou à elaboração das provas. Docentes das faculdades de Medicina foram convidados a participar da preparação do questionário e as escolas interessadas puderam acompanhar a elaboração, aplicação e correção dos testes. Em face de tantas áreas de conteúdo, das dezenas de especialidades da Medicina, e diante das mais diversas situações que o médico enfrenta no seu cotidiano, coube à comissão organizadora o desafio de preparar uma prova que não fosse excessivamente longa, mas suficientemente objetiva para avaliar o conhecimento, a habilidade e as atitudes dos estudantes. A intenção é que os exames se constituam num instrumento confiável e seguro dentro do possível para qualificar o perfil que se espera dos egressos dos cursos de graduação. 26
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Um exame experimental e voluntário A comissão encarregada da elaboração e aplicação dos exames é coordenada pelo conselheiro do Cremesp, Bráulio Luna Filho. A organização e aplicação dos testes foi feita pela Fundação Carlos Chagas, instituição com grande experiência em concursos públicos, incluindo exames para Residência Médica. Como nos anos anteriores, o Exame do Cremesp de 2008 teve caráter experimental. As provas não têm similaridade com o Exame de Ordem da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A participação dos graduandos não é obrigatória nem é pré-requisito para a habilitação do médico ao exercício profissional da Medicina. As notas individuais não são divulgadas. Não cabe ao Cremesp instituir um exame obrigatório para avaliar a qualificação dos formandos nem tem poderes para impedir que os reprovados obtenham o registro e a carteira profissional da entidade. Isso demandaria uma legislação federal específica, com aprovação pelo Congresso Nacional. O estudante aprovado no Exame do Cremesp recebe um certificado que pode ser útil no seu currículo acadêmico e profissional e que ele tornará público se desejar.
“Medicina reprovada” “Essa é mais uma demonstração do quanto o País ainda tem de avançar, para melhorar a qualidade do ensino superior. Realizada pela primeira vez há dez anos, a avaliação das universidades hoje está consolidada. Foi um grande avanço, não há dúvida. Mas o passo seguinte, a aplicação de sanções aos piores cursos, até hoje não foi dado. Embora tenham prometido rigor, principalmente com relação aos cursos “caça-níqueis”, as autoridades educacionais pouco fizeram para fechá-los. Com os péssimos resultados da prova do Cremesp, evidenciando os riscos que a população corre de ser atendida por médicos malformados, as autoridades não têm como justificar a excessiva leniência que vêm demonstrando com esses cursos”. Trechos de editorial do jornal O Estado de S. Paulo, 2/2/2007
27
EXAME DO CREMESP
Pela legislação em vigor, uma vez diplomado por escola médica reconhecida pelo MEC, o graduando tem direito ao registro no CRM e está apto para exercer as diversas áreas da Medicina. De acordo com esses critérios, cabe exclusivamente à escola garantir e dar aval à qualificação dos novos profissionais. Ao MEC compete exigir o cumprimento do currículo pré-aprovado e a fiscalização do nível do ensino, acompanhando a qualidade docente e da infra-estrutura.Tarefa que, por suas dimensões e exigências, nem sempre é cumprida como deveria, especialmente com a abertura de grande número de escolas nos últimos anos.
Exame reforçou diagnóstico da Cinaem Preocupadas com esse cenário, as entidades médicas vêm há anos buscando mecanismos que possam contribuir para uma formação sólida e monitorada dos novos profissionais.Além dos exames que estão na quarta edição, o Cremesp vem apoiando outras medidas, como a avaliação permanente in loco realizada pelas próprias escolas. E participou ativamente da Cinaem, comissão interinstitucional que de 1991 a 1997 fez um minucioso diagnóstico das escolas no Brasil e propôs uma série de mudanças. A preocupação do Cremesp com a qualidade do ensino e a proliferação das escolas vem crescendo desde 1990, quando iniciou um movimento em defesa de um Exame para os médicos, ao final do curso. Nessa época, um projeto de lei no Senado havia proposto a instituição de um “Exame de Estado” para formandos em todos os cursos superiores, mas a idéia não evoluiu. Uma das decorrências desse debate foi a criação em 4 de março de 1991 da comissão de avaliação das escolas médicas, Cinaem. Representantes de pelo menos dez instituições das áreas de educação e saúde, ligadas ou não ao governo, constituíram essa comissão. Além do Conselho Federal de Medicina, participavam os conselhos regionais do Rio e de São Paulo, Estados que já concentravam o maior número de escolas. Era a primeira vez no País que um grupo assim representativo e diversificado se reunia, refletindo três preocupações que se tornavam inadiáveis: a proliferação de escolas médicas, a decorrente queda na qualidade do ensino 28
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
e a necessidade de formas de avaliação continuada e também externa. Paralelamente, em atenção à Constituição Federal e já como efeito da Cinaem, uma portaria dos ministérios da Saúde e da Educação criou em março de 2002 o Programa de Incentivo às Mudanças Curriculares para as Escolas Médicas, o Promed. Era uma tentativa de promover mudanças diante do diagnóstico preocupante que a Cinaem havia feito. Em 3 de novembro de 2005, os dois ministérios lançaram o Pró-Saúde, Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde, que na prática passou a substituir o Promed. O eixo da proposta é que o ensino prático das escolas de Medicina passe a ser ministrado nos ambientes onde se dá a assistência à saúde pelo SUS e que as instituições selecionadas recebam financiamento visando a qualidade do ensino. Em março de 2008, o Pró-Saúde divulgou o terceiro grupo de escolas e parcerias que foram selecionadas para participar do programa que deveria se estender por três anos. Cerca de R$ 40 milhões foram destinados para esta fase.
“Diplomas na UTI” “É urgente criar um exame de habilitação obrigatório para médicos em molde semelhante àquele que já existe para advogados. Como ocorre no caso do direito, atribuem-se os maus resultados à proliferação de escolas, muitas das quais de qualidade duvidosa. É fundamental, porém, que prevaleça o interesse público. Bacharéis em Medicina que não reúnam conhecimentos mínimos para clinicar não deveriam receber autorização para fazê lo. O sistema atual produz uma perversão adicional. Médicos recém formados e, portanto, inexperientes são alocados onde sobram vagas. Acabam sendo contratados a título precário por hospitais públicos. Por receberem a maioria das emergências, esses locais deveriam contar com profissionais qualificados.” Trechos de editorial do jornal Folha de S. Paulo, 12/12/2007
29
EXAME DO CREMESP
O diagnóstico que a Cinaem fez revelou a precariedade das escolas médicas em praticamente todos os quesitos. No anexo desta publicação, pode-se ver o essencial do relatório de conclusões feito anos atrás. Muitas dessas falhas não foram sanadas e os problemas aumentaram com o inchaço do número de escolas. O Exame do Cremesp, pelo baixo desempenho dos estudantes e pelo perfil que eles próprios traçaram de suas instituições, mostra que o cenário apenas se agravou. O que reforça a importância desse debate na busca de ferramentas que permitam auto-avaliações e avaliações externas das escolas médicas, e a conseqüente melhora na qualidade da formação dos alunos. O Exame do Cremesp, detalhado nessa publicação, é mais uma contribuição nessa direção.
O exame de 2008: ressalvas que precisam ser feitas Um total de 934 formandos das escolas paulistas se inscreveram para participar em 2008 da 4ª edição do Exame do Cremesp - além de 69 provenientes de faculdades de 12 outros Estados da federação, que não foram considerados para efeitos de comparação. Desse universo, apresentaram-se para realizar a prova 679 estudantes provenientes das 23 escolas médicas paulistas que tinham alunos no sexto ano em 2008. O número corresponde a cerca de 30% do total de estudantes de sexto ano, o que torna os resultados estatisticamente significativos. Apesar disso, há ressalvas importantes a serem lembradas antes do detalhamento dos resultados. Por ser voluntária, houve uma grande variação na presença de egressos de uma escola para outra. Escolas como a Unifesp, a USP e a Santa Casa de São Paulo, a PUC de Campinas e a Medicina do ABC tiveram mais de 60% de seus formandos participando do exame. Na outra ponta, cinco outras escolas tiveram menos de 5%. Alunos da Unicamp e da USP de Ribeirão Preto, por exemplo, optaram por boicotar o exame. Essa disparidade no número de representantes também ocorreu nos três exames anteriores, revelando a resistência por parte de algumas escolas e de parcela dos alunos. Para reduzir as distorções, a Comissão 30
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Examinadora dividiu as escolas em dois grupos: aquelas que tiveram pelo menos 20 alunos participando na primeira fase, e que foram 13. E aquelas que tiveram um número inferior a 20, ou nenhum participante, e que foram 10 escolas. As primeiras formam o bloco das escolas “com participação representativa”, as outras foram classificadas como “sem participação representativa”. Como se pode ver no Quadro 2, das 13 escolas médicas com participação de mais de 20 alunos, apenas 3 tiveram percentual de aprovação acima de 50%. Duas são públicas, a Unifesp e a USP de São Paulo, e a terceira é sem fins lucrativos, a Santa Casa de São Paulo. Nas outras dez, todas privadas, o percentual de alunos aprovados ficou abaixo de 50%, em seis delas a média de aprovação foi inferior a 30%. O Quadro 3 mostra as escolas paulistas “sem participação representativa” no exame de 2008, incluindo a Unicamp e a USP de Ribeirão Preto, cujos alunos se recusaram a participar da prova. Nos anos anteriores, a presença de alunos foi maior no exame de 2005, com 998 participantes na primeira fase. Em 2006 foram 688 e em 2007, 833. Em 2008, considerando-se apenas a participação das escolas paulistas, o número de alunos que fizeram a primeira fase foi 679. Por conta dessas variáveis, o Cremesp recomenda cautela na análise dos dados. Assim, não é aconselhável o estabelecimento de um “ranking” entre as escolas. Também não se aconselha a comparação entre o desempenho da mesma escola na série de quatro anos pois, como se viu, houve variação no número de participantes a cada ano. Dentro desses critérios de cuidados, o Cremesp divulga a nota média do conjunto de graduandos em cada área de conhecimento e a nota média por escola em cada uma dessas áreas. Mas não publica o desempenho de cada uma das escolas por área de conteúdo. Esses dados foram encaminhados apenas às instituições, assim como o desempenho do estudante é informação privativa de cada um deles. Com isso se evita conclusões como “tal escola forma melhor pediatra que a outra”, ou que “médicos da faculdade X não aprendem a fazer partos”, conclusões que a pequena série histórica ainda não permite tirar. 31
EXAME DO CREMESP
Quadro 2
Índice de aprovação das escolas médicas com participação representativa Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 ESCOLA MÉDICA Número de estudantes/ano (vagas disponíveis no 1º ano)
NATUREZA Participantes no Exame do Cremesp
Aprovados na primeira fase Nº
Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo 100 77 43 Universidade Federal de São Paulo - Unifesp 121 75 48 Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 175 75 39 Pontifica Universidade de Católica de Capinas 120 74 11 Faculdade de Medicina do ABC
%
Privada 56 % Pública federal 64 % Pública estadual 52% Privada 15% Privada
100 69 29 Centro Universitário Lusíada – Unilus – Santos 120 42 11 Universidade de Santo Amaro – Unisa 160 37 9 Universidade Metropolitana de Santos - Unimes
42 % Privada 26 % Privada 24% Privada
80 37 9 Universidade de Ribeirão Preto - Unaerp 132 31 13 Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto 64 29 12 Universidade de Mogi das Cruzes 90 28 6
24 % Privada 42 % Pública estadual 41 % Privada 21 %
Universidade São Francisco – Bragança Paulista 100 28 3 PUC SP – Faculdade de Medicina de Sorocaba 100 23 8
Privada 11 % Privada 35 %
Fonte: Cremesp, 2008
32
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Quadro 3
Índice de aprovação das escolas médicas sem participação representativa Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 NATUREZA
INSTITUIÇÃO DE ENSINO Número de estudantes sexto ano Participantes (vagas disponíveis do Exame no 1º ano)
Aprovados na primeira fase Nº
Faculdade de Medicina de Jundiaí 60
Privada
14
3
Universidade de Taubaté 80
12
4
11
7
7
14 % Pública estadual
5
4
Universidade de Marília 100
64 % Privada
1
Faculdade de Medicina de Marília 80
33 % Pública estadual
Faculdade de Medicina de Catanduva 64
21 % Privada
Faculdade de Medicina de Botucatu – Unesp 90
%
80 % Privada
3
1
Uninove
33 % Privada
160
1
1
Universidade do Oeste Paulista - Unoeste 230
1
Privada 0
Unicamp 110
0 Pública estadual
0
-
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP 100
100 %
0
-
0 Pública estadual 0
Fonte: Cremesp, 2008
61,4% foram reprovados na primeira fase Como nos anos anteriores, o exame de 2008 foi dividido em duas fases. A primeira constou de uma prova com 120 questões de múltipla escolha, com cinco alternativas cada uma, com quatro horas de duração.As perguntas 33
EXAME DO CREMESP
foram centradas nos conteúdos essenciais e nas habilidades que se espera de um formando nessa área. Nove áreas básicas da Medicina foram contempladas: Clínica Médica, Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia, Obstetrícia, Saúde Pública, Saúde Mental, Bioética e Ciências Básicas. A área de Saúde Pública compreende também Saúde Preventiva e Epidemiologia. Para esta fase, a comissão examinadora estabeleceu a nota de corte em 72 acertos para o total de 120 questões. Assim, quem assinalou corretamente 60% das perguntas estava aprovado e apto para fazer a segunda fase. Dos 679 candidatos presentes, 262 deles, ou 38,6%, foram considerados aprovados e convocados para realizar a prova prática. Abaixo de 60% de acertos, o resultado por área de conhecimento é considerado insatisfatório. No exame de 2008, o desempenho acima de 60% ocorreu apenas nas áreas de Saúde Púbica, Bioética e Saúde Mental. A primeira fase do Exame de 2008 foi realizada em agosto, em cada uma das cidades onde havia escolas com turmas de alunos no sexto ano. A segunda fase foi feita em São Paulo, capital, em setembro. Essa fase contemplou 40 questões de natureza eminentemente prática, e com formato interativo. Foram reproduzidas situações clínicas e problemas corriqueiros da prática médica com os mesmos temas básicos da primeira fase, exceto Ciências Básicas. O exame de 2008 teve o menor índice de aprovação na primeira fase, com 38,6%. Em 2007, a aprovação foi de 44,06%. Em 2006, a porcentagem de aprovados foi de 62,18% e em 2005, 69,00%. Entre 2005 e 2008, o índice de aprovação praticamente caiu pela metade, passando de 69,0% para 38,6%.
Pediatria e Ginecologia tiveram notas menores As nove áreas de conhecimento selecionadas para a primeira fase de 2008 formam a base do conhecimento essencial esperado para um graduando em Medicina. O número de questões por área reflete as cargas horárias e as prioridades dos currículos das escolas médicas.Três disciplinas tiveram 22 questões cada uma, Clínica Médica, Clínica Cirúrgica e Pediatria. Ginecologia e Obstetrícia, 11 cada. Ciências Básicas teve 14 questões, Saúde Pública/Epidemiologia, 9; Saúde Mental, 5, e Bioética/Ética, 4. 34
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
A Saúde Pública teve o menor percentual de acertos em 2005, 40,56%, subindo para 67,50% em 2006, 72,33% em 2007, caindo para 66,61% em 2008. Apesar da queda no último exame, o crescente desempenho nessa área pode ser reflexo do interesse e da importância que a Saúde Pública vem ganhando na comunidade acadêmica nos últimos anos. A mesma interpretação pode ser dada para as duas outras áreas com melhor pontuação, a Bioética, que teve 74,11% de acertos, e a Saúde Mental, 83,15%. Os bons resultados nas três disciplinas citadas podem indicar uma preocupação com áreas humanísticas da Medicina. Entre todas as disciplinas da primeira fase do exame de 2008, a Pediatria obteve a menor média de acertos, 51,32%, seguida de Ginecologia, 52,00%, Ciências Básicas, com 52,34% e Obstetrícia, com 53,90%. A Clínica Médica obteve média de 56,70%, e a Cirúrgica, 58,26%. Vale ressaltar que estas são áreas básicas da Medicina nas quais se concentram grande parte das demandas dos serviços de saúde e das necessidades da população, bem como dos currículos. Por isso mesmo era de se esperar um maior empenho de estudantes e instituições, o que, aparentemente, não vem acontecendo, segundo demonstrou o Exame do Cremesp. Quadro 4
Áreas de conhecimento e média de acertos, por ano de realização Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 Áreas de conhecimento
Pediatria
Médias (em %) de questões respondidas corretamente Exame 2008
Exame 2007
Exame 2006
Exame 2005
51,32
50,41
63,64
73,95
Ginecologia
52,00
49,09
64,82
65,19
Ciências Básicas
52,34
55,64
62,64
68,72
Obstetrícia
53,90
58,91
56,09
59,33
Clínica Médica
56,70
50,00
60,82
55,25
Clínica Cirúrgica
58,26
53,77
58,50
67,54
Saúde Pública
66,61
72,33
67,50
40,56
Bioética
74,11
70,00
71,25
62,83
Saúde Mental
83,15
63,60
58,60
68,37
Fonte: Cremesp, 2008
35
EXAME DO CREMESP
Escolas privadas tiveram pior desempenho Embora uma melhor atuação das faculdades públicas já tenha aparecido nos anos anteriores, o Exame do Cremesp de 2008 evidencia essa diferença ao separar as médias das escolas públicas e privadas por área de conhecimento (Quadro 5, a seguir). Em Ciências Básicas, as escolas públicas tiveram 60,38% contra 48,33% das privadas. Em Clínica Médica foram 61,80% contra 54,16%. Em Ginecologia, as duas vão mal, com uma média de 52% de acerto tanto nas públicas como nas privadas. Quadro 5
Médias (percentuais de acertos) de escolas médicas públicas e privadas, por área de conhecimento – Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 Número de acertos Áreas de conhecimento
Escolas médicas públicas
Escolas médicas privadas
Total
Ciências Básicas
60,38
48,33
52,34
Clínica Médica
61,80
54,16
56,70
Saúde Pública
71,28
64,28
66,61
Obstetrícia
58,21
51,75
53,90
Ética
77,67
72,34
74,11
Saúde Mental
86,42
81,52
83,15
Clínica Cirúrgica
61,32
56,73
58,26
Pediatria
53,39
50,29
51,32
Ginecologia
51,63
52,18
52,00
Fonte: Cremesp, 2008
Estatísticas básicas da Fase 1 O valor máximo da prova da Fase 1 era de 120 pontos. A média obtida pelos presentes foi de 68,67 pontos, com desvio padrão de 10,88.A nota mínima foi igual a 42 pontos e a máxima alcançada igual a 102 pontos. A mediana foi de 69 pontos, o que indica que metade dos participantes obteve nota abaixo desse valor e metade deles alcançou nota mais alta do que esse valor. 36
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
O grupo inferior de desempenho (n = 200) obteve notas entre 42 e 61 pontos, enquanto que no grupo superior (n = 208) as notas variaram ente 76 e 102 pontos. Constata-se que apenas 10% dos participantes obtiveram notas acima de 84 pontos, como se pode observar no Quadro 6, abaixo: Quadro 6
Estatísticas básicas – Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 Estatísticas
Geral
Nº de presentes
731*
Média
68,67
Desvio Padrão
10,88
Nota mínima
42
Percentil 10
55
Percentil 27 (Nota limite do grupo inferior)
61
Nº de indivíduos no grupo inferior
200
Mediana
69
Percentil 74 (Nota limite do grupo superior)
76
Nº de indivíduos no grupo superior Percentil 90
208 84
Nota máxima
102
Fonte: Cremesp, 2008 * Incluidos 52 egressos de outros estados, que não foram considerados nos resultados finais.
Clínica Médica teve maior diferença no desempenho Outra maneira de ler os resultados é separar o grupo que passou daquele que não passou, mostrando suas médias em percentual de acertos por área de conhecimento, como se vê no Quadro 7. Vale lembrar que dos 679 participantes da primeira fase do exame de 2008, provenientes das escolas médicas paulistas, 262 foram aprovados, ou seja, 38,6% passaram e 61,4% não passaram. Para ser aprovado, era necessário acertar 60% das questões, ou 72 das 120 perguntas. 37
EXAME DO CREMESP
Quadro 7
Médias (em percentual de acertos) segundo áreas de conhecimento Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 Áreas de conhecimento
Média geral dos presentes
Média dos aprovados
Média dos reprovados
Bioética
74,11
81,54
69,42
Ciência Básicas
52,34
62,19
46,11
Clínica Cirúrgica
58,26
65,56
53,64
Clínica Médica
56,70
70,24
48,15
Ginecologia
52,00
61,97
45,70
Obstetrícia
53,90
61,61
49,03
Pediatria
51,32
59,33
46,26
Saúde Mental
83,15
87,21
80,58
Saúde Públ/Epidemiologia
66,61
76,52
60,34
Média - Prova Objetiva
57,23
66,45
51,40
Fonte: Cremesp, 2008
Tomando-se as médias obtidas pelos dois subgrupos, aprovados e reprovados, vê-se que foi na Clínica Médica onde se observou maior diferença no desempenho dos participantes: o grupo dos aprovados teve 70,2% de acertos, contra 48,1% obtido pelo grupo dos reprovados. Na área de Saúde Mental, os resultados indicam desempenhos mais próximos entre os integrantes dos dois subgrupos – 87,2% para o grupo dos aprovados e 80,6% para os reprovados. Três outras áreas, Ciências Básicas, Ginecologia e Saúde PúblicaEpidemiologia apresentaram também um intervalo significativo, de 16 pontos percentuais, entre os aprovados e reprovados, revelando uma grande disparidade no desempenho dos alunos dentro dessas áreas. Esta comparação revela as matérias nas quais os alunos se diferenciaram em termos de desempenho, independentemente da instituição. Trata-se de um indicador de deficiências específicas no ensino de cada área, e que deve ser levado em consideração por cada uma das escolas. No Quadro 8, é apresentada a opinião dos avaliados sobre o nível de adequação das respostas por área de conhecimento. 38
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Quadro 8
Distribuição de percentual de respostas por nível de adequação, segundo áreas de conhecimento – Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 Áreas de conhecimento
Muito Parcialmente Inadequadas adequadas adequadas
Totalmente inadequadas
Não sei avaliar
Medicina Preventiva
44,4%
47,6%
6,0%
0,4%
0,8%
Clínica Médica
28,8%
56,4%
10,8%
2,4%
0,8%
Obstetrícia
35,6%
53,2%
8,0%
0,8%
0,8%
Bioética
23,2%
52,0%
18,4%
4,4%
0,8%
Ginecologia
25,2%
51,6%
17,6%
3,6%
0,8%
Clínica Cirúrgica
38,8%
46,0%
8,0%
3,6%
1,2%
Saúde Mental
10,4%
22,4%
36,0%
23,6%
6,8%
Ciências Básicas
33,6%
53,2%
10,8%
1,2%
1,2%
Pediatria
42,4%
44,8%
8,4%
2,4%
1,2%
Fonte: Cremesp, 2008
Mal desempenho em questões básicas Do conjunto de questões da primeira fase do Exame de 2008, uma delas foi acertada por apenas 7% dos participantes. Perguntava sobre o tratamento no caso de gestante de 30 semanas com ganho de peso de dois quilos em apenas uma semana. Pelo menos dez outras questões foram respondidas de forma incorreta por 70% ou mais, dentro de áreas básicas como a Clínica Cirúrgica, Pediatria, Clínica Médica e Clínica Cirúrgica de Emergência. A área de Saúde Mental foi a que concentrou maior número de acertos. Como aconteceu no Exame do Cremesp de 2007, várias das questões com baixo índice de acertos em 2008 tratam de situações bastante comum nas urgências e emergências, como a asma, diferentes tipos de trauma, diagnóstico e medicação para casos de hipertensão, e condutas em parto de risco. Mais de 60% dos estudantes erraram, em 2007, uma questão que tratava do preenchimento do atestado de óbito. Tais questões tratavam de situações habituais e exigiam habilidades fundamentais do médico, capaz de exercer a profissão após a graduação, de acordo com as diretrizes curriculares nacionais. 39
EXAME DO CREMESP
Participantes erram situações comuns da prática médica Questões que tiveram baixo índice de acertos podem revelar a falta de conhecimento dos participantes na solução de situações freqüentes no cotidiano da prática médica. Muitos daqueles que participaram do Exame do Cremesp desconhecem o diagnóstico ou o tratamento adequado para a solução de determinados problemas de saúde em áreas básicas como Obstetrícia, Pediatria, Clínica Médica e Clínica Cirúrgica. A situação é mais preocupante ainda nos casos de atendimentos de emergência. A seguir (Quadros 9, 10 e 11), alguns exemplos de questões e a porcentagem de participantes que erraram as respostas nos exames de 2008, 2007 e 2006. Quadro 9
Exemplos de questões, por área de conhecimento e respostas corretas Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 Erraram a questão (% de participantes)
Área de conhecimento
Questão (resumo do enunciado)
Resposta correta
Obstetrícia
Tratamento no caso de gestante de 30 semanas com ganho de peso de dois quilos em apenas uma semana
Ministrar betametasona 12 mg dois dias consecutivos e fazer o controle diário da pressão arterial
93%
Clínica Cirúrgica
Situação em que é contra-indicada a apendicectomia por via laparoscópica
Deve ser contraindicada quando houver história de mais de cinco dias de evolução
86%
Pediatria
Procedimento em caso de testículo não palpável em criança
A descida do testículo poderia ter ocorrido até o quarto mês de vida e, realmente, a indicação é cirúrgica
84%
40
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Erraram a questão (% de participantes)
Área de conhecimento
Questão (resumo do enunciado)
Clínica Médica
Exame diagnóstico indicado para paciente tabagista e alcoolista, em uso de medicamentos, com perda de força muscular
Tomografia computadorizada de tórax
76%
Clínica Cirúrgica/ Emergência
Afirmação correta a respeito de atendimento a criança com traumatismo
As lesões traumáticas de medula são raras na criança, sendo suas principais causas as colisões automobilísticas e as atividades esportivas
76%
Clínica Cirúrgica/ Emergência
Paciente dá entrada em pronto-socorro, sendo que começara a vomitar sangue há quatro horas. O tratamento deve incluir:
Endoscopia digestiva alta de urgência, ao mesmo tempo em que é feita a reposição volêmica
66%
Clínica Cirúrgica
São fatores que dificultam a cicatrização, exceto:
Obesidade
58%
Clínica Cirúrgica/ Emergência
Jovem de 23 anos dá entrada em prontosocorro com dor abdominal intensa, de início súbito, após uso de antiinflamatório. Pode-se afirmar que:
A recorrência ulcerosa é comum após o término da medicação
57%
Resposta correta
41
EXAME DO CREMESP
Erraram a questão (% de participantes)
Área de conhecimento
Questão (resumo do enunciado)
Saúde Pública
Quando se deve suspeitar de caso de tuberculose
Tosse com expectoração por três ou mais semanas, febre, perda de peso e de apetite; paciente com imagem radiológica compatível com tuberculose
56%
Clínica Cirúrgica/ Emergência
Paciente com tórax instável e respiração paradoxal decorrente de fratura de múltiplos arcos costais em dois ou mais lugares, por trauma fechado, deve ser tratado com:
Oxigênio por máscara, inicialmente, e monitorização ventilatória cuidadosa. A intubação traqueal e o suporte ventilatório mecânico ficam reservados para os pacientes que evoluírem com insuficiência respiratória
55%
Pediatria
Criança de três anos apresenta quadro clínico compatível com aspiração de corpo estranho. Qual sintoma sugere este diagnóstico?
Súbito aparecimento de chiado
52%
Obstetrícia
Em gestante HIV-positiva:
O parto vaginal pode ser liberado em mulheres com carga viral indectável ou menor que 1000 cópias/ml
52%
Resposta correta
42
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Quadro 10
Exemplos de questões, por área de conhecimento e respostas corretas Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2007 Resposta correta
Erraram a questão (% de participantes)
Substância que menos se associa ao aparecimento de um quadro de dependência
LSD
92%
Clínica Cirúrgica
Sobre a prevenção do trauma, é correto
A prevenção terciária, que inclui o tratamento e a reabilitação, visa reduzir as consequências das lesões traumáticas
89%
Clínica Médica
Em relação à asma, é correto afirmar:
Apesar do progresso da terapêutica e do conhecimento de sua fisiopatologia a prevalência e taxa de mortalidade têm aumentado nas últimas décadas
87%
Obstetrícia
Conduta terapêutica correta em gestante de 28 semanas, com perda de líquido claro, por via vaginal, há uma semana
Antibioticoterapia e indução imediata do parto
86%
Ginecologia
Causa mais provável de obstrução tubária bilateral em mulher de 28 anos
Tuberculose
83%
Área de conhecimento
Questão (resumo do enunciado)
Saúde Mental
43
EXAME DO CREMESP
Erraram a questão (% de participantes)
Área de conhecimento
Questão (resumo do enunciado)
Clínica Médica
Possível apresentação do ecocardiograma de mulher de 70 anos, ativa, com dispnéia progressiva aos esforços, ortopnéia e edema de membros inferiores há dois meses
Aumento da pressão (disfunção diastólica do ventrículo esquerdo)
82%
Clínica Cirúrgica
A colangiografia intra-operatoria não fornece informações sobre
O esvaziamento da vesícula
78%
Clínica Médica
Quadro que não levanta a suspeita de hipertensão renovascular:
Elevação de creatinina em um paciente acima de 40 anos com hipertensão arterial recentemente diagnosticada
78%
Clínica Cirúrgica
Condição que tem maior probabilidade de causar obstrução intestinal “em alça fechada”
Neoplasia de cólon esquerdo
77%
Clínica Médica
A gasometria que mostra pH de 7,53, bicarbonato de 39 mEq/L e pCO2 de 45mmHg, será encontrada com maior probabilidade em um indivíduo:
Em uso prolongado de hidroclorotiazida
73%
Resposta correta
44
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Quadro 11
Exemplos de questões, por área de conhecimento e respostas corretas Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2006 Erraram a questão (% de participantes)
Área de conhecimento
Questão (resumo do enunciado)
Pediatria
Prescrição correta para o quadro de desidratação e diarréia em criança de seis anos de idade
Soro glicosado a 10%, 1.120mL; Soro fisiológico, 640 mL e KCl19,1%, 14mL
88%
Pediatria
Prescrição correta de soro para recém-nascido com duas horas de vida, com insuficiência respiratória, em jejum
AD (água destilada) 144mL e G 50% 36 mL.
88%
Pediatria
Sobre vacina contra rotavírus é correto afirmar
Deve ser administrada exclusivamente pela via oral e está contra-indicada em crianças com malformações congênitas do trato digestivo
81%
Ginecologia
Provável agente etiológico para quadro de mulher de 27 anos, com dor pélvica intensa, prostrada, febril, ictérica
Clostridium
81%
Resposta correta
45
EXAME DO CREMESP
Erraram a questão (% de participantes)
Área de conhecimento
Questão (resumo do enunciado)
Clínica Cirúrgica / Emergência
Principal prioridade no tratamento do choque do paciente traumatizado:
Controlar o sangramento
80%
Obstetrícia
Mulher com queixa de sangramento vaginal em moderada quantidade há duas horas
Pode ser gravidez ectópica
78%
Clínica Médica
Procedimento que não é necessário para a decisão de manter hospitalizado homem de 61 anos, portador de angina estável, atendido no pronto-socorro
Punção diagnóstica do líquido pleural
77%
Clínica Médica
Doenças cujo agente etiológico principal são, respectivamente, estreptococos e estafilococos
Erisipela e foliculite
72%
Clínica Cirúrgica / Emergência
Em relação às hérnias inguinais, é correto:
Classicamente, as hérnias crurais são tratadas pela técnica de Mc Vay
71%
Ciências Básicas
No exercício anaeróbico, quais as principais fontes de energia?
Fosfocreatina e glicogênio muscular
71%
Resposta correta
46
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Erraram a questão (% de participantes)
Área de conhecimento
Questão (resumo do enunciado)
Ciências Básicas
Sobre cálculos biliares de colesterol, em mulher atendida em PS, é correto afirmar
Podem ser dissolvidos por excesso de sais biliares, que formam micelas nas quais o colesterol insolúvel pode ser solubilizado
70%
Saúde Pública / Epidemiologia
Para incorporar um tratamento terapêutico à prática clínica, qual o nível de evidência científica necessária?
Revisão sistemática de ensaios clínicos com metanálise.
69%
Resposta correta
Diversos cruzamentos não são possíveis a partir apenas dos resultados do Exame do Cremesp, mas a comissão organizadora vê a possibilidade de uma relação entre o desempenho do aluno e o tempo dedicado às aulas práticas, se o ambiente de treinamento era da própria escola, e a relação entre professor e número de estudantes, nessas disciplinas. Como se verá na parte que trata da avaliação dos cursos, um número significativo de alunos criticou a estrutura da escola, a atuação dos professores, afirmando que o curso poderia ter sido mais exigente. No Quadro 12, a seguir, a opinião dos avaliados de 2008 sobre o grau de dificuldade das questões da fase I do Exame do Cremesp. 47
EXAME DO CREMESP
Quadro 12
Distribuição do número e percentual de questões, segundo classificação do Índice de facilidade, para diferentes grupos de participantes Primeira Fase – Exame do Cremesp – 2008 Índice de facilidade
Grupo total
Escolas privadas
Escolas públicas
Nº
%
Nº
%
Nº
%
Muito fácil
12
10,4
11
9,6
15
13,0
Fácil
31
27,0
27
23,5
34
29,6
Média
47
40,9
50
43,5
46
40,0
Difícil
23
20,0
23
20,0
18
15,7
2
1,7
4
3,5
2
1,7
115
100,0
115
100,0
115
100,0
Muito difícil Total Fonte: Cremesp, 2008
21 escolas tiveram representantes na Fase 1 Das 23 escolas médicas do Estado de São Paulo que possuíam alunos no sexto ano, só duas não participaram da primeira fase do exame de 2008, como forma de protesto. Outras oito escolas, abertas a partir de 2002, não tinham ainda alunos sextoanistas. Como já foi assinalado, para reduzir distorções quanto à variação do número de participantes de cada escola, a comissão organizadora considerou como representativas aquelas que tinham pelo menos 20 de seus graduandos presentes. Das 23, 13 delas preencheram esse critério. A que teve maior participação foi a Universidade Federal de São Paulo, Unifesp, com 64,0% de seus estudantes presentes. Dos 121 alunos dessa escola que completaram o curso em seis anos, 75 fizeram a prova. Segue-se a Santa Casa de São Paulo, com 56,0% de participação, a USP de São Paulo, com 52,0%, a Faculdade de Medicina do ABC e a Universidade de Ribeirão Preto, Unaerp, ambas com 42,0%. Entre as oito escolas com menor participação, a Universidade do Oeste Paulista – Unoeste – e a Uninove, tiveram apenas um inscrito. 48
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
As instituições e as áreas de conhecimento Como já foi observado, o Cremesp não pretende nomear as escolas de acordo com a pontuação por áreas de conteúdo, considerando a variação no número de alunos presentes e a preocupação com possíveis distorções. Avaliando apenas o grupo das escolas com participação representativa – aquelas 13 que tiveram mais de 20 dos seus alunos presentes na primeira fase – ainda assim há variações significativas por área de conhecimento, dentro da mesma faculdade. Em Clínica Médica, por exemplo, o percentual de acertos dos alunos de três escola tidas como de excelência foi pouco acima de 60%. Em Obstetrícia, duas delas ficaram abaixo de 50%. Em Pediatria, o porcentual de acertos das três escolas ficou pouco acima de 50%. Considerando apenas estas três áreas essenciais da Medicina e estas três escolas de referência, é possível constatar que um número significativo de seus estudantes não atingiu a linha de qualidade traçada pelo Cremesp. Significa, como já foi dito, que boa parte dos estudantes está saindo com o diploma das melhores escolas, mas sem o conhecimento mínimo exigido no Exame do Cremesp. Naturalmente, a situação se acentua na maioria das escolas, onde o percentual de acertos ficou entre 40,0% e 45,0% em praticamente todas as áreas. Se o percentual de acerto de uma escola fica entre 40,0% e 60,0%, quer dizer que boa parte dos alunos acertou bem menos da metade da prova. Significa que, embora tendo acesso às mesmas condições de ensino, às mesmas instalações e aos mesmos professores, e mesmo tendo passado pelo mesmo processo de seleção de ingresso, há alunos com desempenho muito bom e outros com péssimas notas, na mesma turma. E todos serão aprovados pela escola. Mesmo quando há evidências sérias de deficiências no ensino médico, são raros os indivíduos que, uma vez admitidos em faculdades de Medicina, não consigam obter o certificado de conclusão. Sem nenhuma outra avaliação pela frente, a não ser o exame da própria escola, praticamente todos os alunos que prestaram o Exame do Cremesp já estão agora de posse do registro profissional e autorizados a 49
EXAME DO CREMESP
atender pacientes, independente da nota e do desempenho. Nas escolas, a aprovação no último semestre do último ano é praticamente automática. Situação desconhecida – mas que pode ser ainda mais grave – é a da maioria dos graduandos que não fizeram o Exame do Cremesp, sobre os quais pouco se sabe. O exame e a Residência Médica, em princípio, poderiam corrigir distorções, mas como as vagas atendem cerca de metade dos formandos, outra metade vai direto para o mercado de trabalho. Esta metade, aquela que justamente teve pior desempenho na graduação, é que será barrada pelo processo seletivo da Residência. Alunos com mau desempenho em escolas boas pode significar pouco empenho do estudante, mas reflete também uma deficiência nos mecanismos de avaliação e acompanhamento ao longo do curso.
Alunos com dez e alunos com zero A diferença de desempenho dentro de uma mesma instituição chama a atenção em todas as áreas. Na Clínica Cirúrgica, um grupo de escolas de referência teve um desvio padrão em torno de 2,5, significando que das 22 questões, parte acertou entre 17 e 19, outra acertou entre 8 e 10. Em Clínica Médica e Pediatria os resultados foram semelhantes nas principais escolas. No exame de 2007, nas 4 questões de Bioética, todas as escolas do grupo de referência tiveram máxima de 4 acertos. Em dez dessas escolas, o mínimo de acertos foi igual a zero, ou seja, todas as instituições contaram com alunos que acertaram todas as questões e alunos que erraram todas. Ainda no exame de 2007, em Pediatria, 4 entre as 15 escolas representativas tiveram mínimo de zero, isto é, pelo menos um aluno errou todas as 20 questões. Isso ocorreu até mesmo em escolas que tiveram médias gerais razoáveis.
Participantes foram melhor na prática Foram considerados aptos para prestar a segunda fase todos aqueles que acertaram pelo menos 60% das questões da fase inicial, um total de 262 formandos das escolas paulistas, no exame de 2008. Compareceram 50
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
250. Das 23 escolas que poderiam participar da primeira fase, duas boicotaram o exame e uma não teve alunos aprovados. O segundo exame, ou exame prático de 2008, foi composto por 40 questões distribuídas em oito áreas de conteúdo – todas as da primeira fase, menos as Ciências Básicas. A prova, de formato interativo, simulou situações clínicas e problemas cotidianos da prática médica. Os pontos foram contados de acordo com o número de tentativas que o aluno precisou para acertar a questão, 1 ponto na primeira tentativa, 0,5 na segunda e 0,25 na terceira. As notas dessa prova foram padronizadas e podiam variar no intervalo de 0 a 10 pontos. A média obtida pelos presentes foi de 6,76 pontos, com desvio padrão de 0,72. A nota mínima foi 4,75 e a máxima alcançada igual a 8,50 pontos. Quadro 13
Estatísticas, por área de conhecimento Segunda Fase – Exame do Cremesp – 2008 Área de conhecimento
Média
Desvio padrão
Nota mínima
Nota máxima
Pediatria
8,15
1,16
4,0
10,0
Radiologia
5,57
2,35
0
10,0
Clínica Médica
8,04
1,18
4,5
10,0
Ginecologia
4,88
2,33
0
10,0
Obstetrícia
5,25
2,03
0
10,0
Cirurgia
5,29
1,84
0
10,0
Medicina Preventiva
5,66
3,18
0
10,0
Fonte: Cremesp, 2008
O quadro seguinte permite comparar os resultados das escolas públicas e privadas por área de conhecimento. Como se verá, em todas as disciplinas houve alunos com nota 10 de aproveitamento, e na maioria delas foram registrados alunos que tiraram 0, ou seja, não acertaram nenhuma das questões daquela área. 51
EXAME DO CREMESP
Quadro 14
Resultados segundo a área de conhecimento e natureza das instituições de ensino – Segunda Fase – Exame do Cremesp – 2008 Áreas de conhecimento
Pediatria
Radiologia
Clínica Médica
Ginecologia
Obstetrícia
Cirurgia
Medicina Preventiva
Escola
Nº de partic.
Média
Desvio Mínimo Máximo padrão
Privada
134
7,99
1,27
4,0
10,0
Pública
116
8,33
0,98
5,0
10,0
Privada
134
5,58
2,33
0,0
10,0
Pública
116
5,56
2,38
0,0
10,0
Privada
134
7,88
1,10
4,6
10,0
Pública
116
8,24
1,22
5,5
10,0
Privada
134
4,70
2,34
0,0
10,0
Pública
116
5,09
2,31
0,0
10,0
Privada
134
5,30
2,05
0,0
10,0
Pública
116
5,20
2,02
0,0
10,0
Privada
134
5,15
1,92
0,0
10,0
Pública
116
5,46
1,74
0,0
10,0
Privada
134
5,34
3,19
0,0
10,0
Pública
116
6,03
3,13
0,0
10,0
Fonte: Cremesp, 2008
Embora os resultados da primeira fase de 2008 tenham sido os piores dos quatro anos, na segunda fase nenhum aluno foi reprovado, como já tinha ocorrido em 2007. Em 2007, a média global da segunda fase foi 8,11. O pior desempenho recebeu a nota de 6,25 e a melhor nota registrada foi 9,25. Como se observa no gráfico seguinte, as notas ficaram concentradas nos intervalos que variam de 6,1 a 7,0 pontos. 52
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Gráfico 1
Distribuição do percentual de concluintes, segundo notas obtidas Segunda Fase – Exame do Cremesp – 2008
Fonte: Cremesp, 2008
Escolas privadas e as mais novas tiveram pior desempenho A participação desigual no número de alunos entre as escolas, como já foi dito, torna difícil e limitada a comparação entre elas. Ainda assim, considerando essa ressalva, os resultados do Exame do Cremesp na primeira fase mostram que das cinco escolas públicas participantes em 2008, apenas uma teve menos de 50% dos alunos aprovados. Entre as 15 escolas privadas participantes, só duas delas tiveram mais de 50% de aprovação entre seus alunos. Há outra constatação significativa quando se considera o ano de fundação das escolas. Todas as 14 instituições privadas abertas no Estado de São Paulo depois de 1967 tiveram menos da metade de seus alunos 53
EXAME DO CREMESP
aprovados. Só no período de 1967 a 1970, foram abertas oito escolas, sete delas privadas e uma única pública. Parece haver uma relação direta e preocupante entre a administração da escola – se pública ou privada particular -, o período de existência do curso e o sucesso de seus alunos no exame. As particulares e as mais novas tiveram o pior desempenho. Esses dados reforçam a preocupação do Cremesp com relação à abertura de novos cursos de Medicina no Estado. Não se trata apenas de excesso de médicos em atividade, mas especialmente preocupação com a queda na qualidade do ensino com conseqüências na atuação do profissional. Essa preocupação é ainda maior porque a abertura de escolas se acentuou nesta década. De 2002 até 2007 foram abertas oito escolas de medicina no Estado, apenas uma delas pública. Como nenhuma delas ainda formou suas turmas, nenhum dos seus alunos – nem a qualidade de seus cursos – foi avaliado.
Ensino precário e erro médico Em dez anos, de 1998 a 2007, o número de denúncias protocoladas no Cremesp aumentou em 140,0%, muito acima da taxa de crescimento de médicos inscritos (42,0%) e da taxa de crescimento da população do Estado no mesmo período (12,0%). O número de denúncias contra médicos saltou de 1.874 em 1998 para 4.498 em 2007. A média diária de denúncias passou de 5,1 para 12,3 em dez anos. Enquanto em 1998 o Cremesp registrava 65.442 médicos inscritos, em 2007 já somavam 92.763 profissionais em atividade no Estado de São Paulo. A população, por sua vez, cresceu de 35,2 milhões de habitantes em 1998 para 39,5 milhões em 2007. O Cremesp tem levantado a hipótese de que há relação entre o aumento de processos ético-profissionais, a escola onde se formaram esses médicos, e o desempenho que tiveram no Exame do Conselho. Nos próximos anos, o Cremesp pretende correlacionar esses dados, levando em conta o número de processos, o número de médicos formados por escola e o tempo de existência de cada curso. 54
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Da elite intelectual para a elite econômica A Faculdade de Medicina da USP, campus de São Paulo, fundada em 1912, é a mais antiga do Estado. Até 1962, foram abertas outras cinco escolas médicas, apenas uma delas privada, a PUC São Paulo, campus de Sorocaba. Por décadas, as escolas públicas foram referência e exclusividade quase que total de uma elite intelectual. As melhores cabeças – e aqueles que fizeram os melhores cursos - é que faziam Medicina. Com a abertura desenfreada de escolas privadas nos anos 1960 e nos anos 2000, a Medicina passou a ser também privilégio de uma elite financeira. A média das mensalidades é de R$ 2.500, mas há pelo menos seis escolas cobrando R$ 3.500 ou mais. Escolas mais tradicionais e conceituadas cobram entre R$ 2.400 e R$ 2.700. O questionário aplicado durante o Exame do Cremesp, que caracterizou os estudantes – embora não tenha feito um recorte entre aqueles de escolas públicas e privadas – mostra que a grande maioria vem de família de classe média alta, fez o ensino médio em escolas particulares e frequentou cursinho pré-vestibular. O custo de um curso médico privado, ao longo de seis anos chega a R$ 200 mil em mensalidades e outro tanto com despesas próprias e material didático. O gasto direto estimado para a formação de um médico em escola privada chega a R$ 500 mil, sem considerar os anos seguintes de Residência e cursos de especialização. Como a graduação toma período integral, a grande maioria não consegue uma atividade remunerada perene. Com custos dessa monta, o curso de Medicina se torna um investimento que requer garantias de retorno. Pesquisa do Cremesp-Datafolha (2007) mostra que a maioria dos médicos na ativa diz estar na profissão por vocação, e que a satisfação em poder salvar vidas é a principal motivação e recompensa. Com a formação cada vez mais nas mãos das escolas particulares, e com custos crescentes, é provável que a vocação, mesmo sendo uma característica marcante do estudante de Medicina, acabe sendo apenas um dos ingredientes. 55
EXAME DO CREMESP
Maioria se forma em escolas privadas Dos cerca de 2.500 alunos que estavam no sexto ano em 2008 – ou seja, que acabam de se formar médicos -, em torno de 800 estudavam em escolas públicas e 1.700 em escolas privadas. Significa que 68,0% dos formandos bancaram seus cursos. No ano de 2007, eram 66,6%. Essa margem de participação dos cursos privados aumentará muito mais. Os oito cursos abertos em São Paulo entre 2002 e 2007 – e que ainda não formaram turmas – somam 680 vagas por ano. Dessas vagas, apenas 40 são públicas, ou seja, 94,1% desses estudantes estão em escolas privadas, pagando diretamente por seus estudos. O Cremesp não é e jamais será contrário aos cursos pelo fato de serem privados. Há diversas universidades privadas de excelência, não só na Medicina. O Cremesp é contrário, sim, à abertura sem critério de novas escolas, pois o País não precisa de mais médicos, mas de melhores profissionais e uma melhor distribuição. A enxurrada de novos cursos privados provocará, além de queda na qualidade – como os exames do Cremesp vêm comprovando – , uma mudança de perfil do médico e da própria profissão, em decorrência da passagem do público para o privado. É natural que quem investiu cerca de R$ 500 mil em sua formação vai querer a garantia de um retorno. Essa balança, que pende para o privado, vai na contracorrente do modelo de saúde pública pretendido no Brasil. Diferentemente da política norte-americana – que aliás está sendo revista –, onde a formação é privada e a saúde é vista como qualquer outro “produto” ou “serviço” – e onde se cobra caro por isso -, no Brasil prevalece o Sistema Único de Saúde, que adota o princípio constitucional de que a saúde é um direito de todos e dever do Estado. Em países como Canadá, França e Inglaterra, entre outros, onde a saúde é pública, a formação do médico também é pública e – em princípio - voltada para os interesses e necessidade da população, com forte regulação do Estado nesse sentido.
País é o segundo em número de escolas Até fevereiro de 2008, o País tinha 175 escolas de Medicina em funcionamento. São Paulo tem o maior número, 31, seguido por Minas, com 27, e Rio de Janeiro com 17. Três Estados têm apenas uma escola cada, 56
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Sergipe, Roraima e Acre. O país conta hoje com mais escolas médicas que os EUA e a China, só perdendo para a Índia, que tem população quase quatro vezes maior que a nossa. A primeira faculdade de Medicina fundada no Brasil foi a da Universidade Federal da Bahia, em 18 de fevereiro de 1808, exatamente dois séculos atrás. Em 5 de novembro do mesmo ano era aberta a Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A terceira escola só foi criada 90 anos depois, a Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande Sul, em 1º de fevereiro de 1898. Em 140 anos, de 1808 a 1948, o País abriu apenas 13 instituições de ensino médico, 11 federais e duas estaduais, todas localizadas nas capitais. Em abril de 1950 foi fundada a primeira escola privada e fora das capitais, a PUC campus de Sorocaba. Começava então o ensino médico privado e a interiorização das escolas. Nos seis anos seguintes foram abertas outras dez escolas, o que “motivou a AMB - em 1956 -, a criar a Comissão de Ensino Médico para avaliar a qualidade e os objetivos do ensino médico no Brasil”. Com os resultados nas mãos, o presidente JK “incumbiu o então ministro da Educação, Clóvis Salgado, de “organizar uma comissão interministerial, com a participação de professores de medicina, tendo como finalidade avaliar o ensino médico brasileiro e proceder e coordenar consultas visando à elaboração de um projeto de lei adequado à nova realidade do ensino da Medicina no Brasil”. O governo Kubitschek enviou o projeto de lei 2.046 ao congresso, mas a proposta acabou perdendo os prazos de tramitação. Esta teria sido a primeira tentativa do movimento médico associativo, por meio da AMB, de incluir na agenda do MEC a questão da avaliação das escolas médicas brasileiras. Isso faz mais de 50 anos. Com o regime militar, ocorreu o primeiro grande “boom” de novas escolas médicas. De 1965 a 1971 foram abertas 36 novos cursos médicos, 22 deles privados. No final dos anos 1990, o número e a privatização das escolas se intensificaram: de 1996 a 1999, um período de quatro anos, foram criadas 21 escolas médicas, 18 delas privadas. Mesmo com as campanhas realizadas pelas entidades médicas, alertando para a mercantilização 57
EXAME DO CREMESP
do ensino, o excesso de escolas e a queda na qualidade, o número delas continuou aumentando. De fevereiro de 2000 a fevereiro de 2008, 72 escolas foram abertas, 52 delas privadas, 10 federais e 8 estaduais.
175 escolas e 17 mil vagas por ano Em 2008, as 175 escolas médicas representavam 17.285 novas vagas a cada ano no Brasil. As escolas privadas dominam com 10.754 vagas, ou 62,22%. Do total de escolas, 105 são privadas, ou 60%, o que significa que, além de serem em maior número, oferecem maior número de vagas no conjunto. As faculdades federais, que ao longo de décadas foram referência para a qualidade do ensino médico, são hoje responsáveis por 4.514 vagas, ou 26,11% do total. Quanto ao número de escolas, elas somam 46, ou 26,28% do total. O investimento estadual nessa área foi sempre irregular e hoje as universidades dos Estados representam 21 das 175 escolas (12,00%) e 1.817 vagas, ou 10,51% do total. São as que oferecem menor número de vagas no conjunto. As iniciativas estaduais representaram esforços regionais para marcar presença na área do ensino médico, como a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, aberta em 7 de dezembro de 1912, e que foi a primeira escola médica estadual do país. A UERJ, do Rio, foi inaugurada em 4 de junho de 1935. Em 27 de março de 1951 foi a vez de Pernambuco abrir sua escola estadual. No ano seguinte, 1952, a USP abriu seu campus de Ribeirão Preto e em novembro de 1958 foi fundada a Unicamp. Em julho de 1962, o Estado de São Paulo inaugurou o curso de medicina da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, a Unesp de Botocatu. A partir daí, acentuou-se a interiorização das escolas. Das 21 faculdades médicas estaduais no país, seis são do governo paulista. Já as iniciativas municipais em escolas médicas são apenas três, significando 1,72% das instituições e 1,16% das vagas. Duas foram abertas no Estado de S.Paulo em 1968, em Taubaté e Jundiaí. E a terceira em 1998, na Universidade do Sul de Santa Catarina, em Palhoça. Embora existam mais de 17.000 vagas nas escolas do Brasil, aquelas abertas nos últimos anos ainda não têm graduados no mercado. Em 2008, cerca de 11 mil novos médicos se tornariam profissionais no País. 58
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
Quadro 15
Número e porcentagem de escolas e vagas no Brasil, segundo tipo de administração Administração
Nº de escolas
%
Nº de vagas
%
Privadas
105
60,00
10.754
62,22
Federais
46
26,28
4.514
26,11
Estaduais
21
12,00
1.817
10,51
3
1,71
200
1,16
175
100,00
17.285
100,00
Municipais Total
Fonte: Site Escolas Médicas do Brasil – fevereiro de 2008
Pelo menos 50 novas escolas aguardam na fila A perspectiva para um futuro próximo é ainda mais preocupante. Segundo o site Escolas Médicas do Brasil, em fevereiro de 2008 havia 50 escolas aguardando reconhecimento do MEC. Os pedidos mais antigos datam de 2000, são três escolas públicas – duas federais no interior do Ceará e uma estadual no interior da Bahia. No conjunto das 50 escolas que aguardam na “fila”, 38 são privadas, 12 são públicas (sete estaduais, quatro federais e uma municipal). Segundo o MEC, quatro delas estavam funcionando sub judice. No conjunto, as escolas “pretendentes” representam 3.507 vagas, 2.947 privadas, 200 federais, 310 estaduais e 50 municipais. Enquanto o percentual de escolas privadas corresponde a 76,00% do total, o número de vagas nessas “futuras” instituições representa 84,03%. Significa que, crescendo nesse ritmo, a iniciativa privativa, lucrativa, tomará conta do ensino médico no país dentro de alguns anos. Para disputar candidatos, as escolas já existentes investem numa concorrência cada vez mais agressiva na mídia publicitária. Algumas se valem de nomes conhecidos no meio artístico e esportivo. Outras prometem intercâmbios com universidades americanas ou européias, oferecendo ao jovem estudante uma dupla inverdade: a de que terá uma boa formação, e a de que poderá contar com intercâmbios ou estágios internacionais que o transformariam num profissional diferenciado no mercado. 59
EXAME DO CREMESP
O risco das promessas “latinas” Escolas médicas de países vizinhos vêm há anos atraindo estudantes brasileiros com a promessa de que, após completar o segundo ou terceiro ano, poderão reivindicar transferência para uma faculdade de Medicina no Brasil. Outros países, como Bolívia e Cuba, oferecem cursos completos, visando especialmente brasileiros e dispensando inclusive vestibulares. A Escola Latino-americana de Medicina, a Elam, de Cuba, vem nos últimos anos dando bolsas para até 400 alunos. Os candidatos e futuros estudantes são selecionados por instituições e partidos políticos que mantém relações estreitas com Cuba. O filtro de seleção não é o conhecimento acadêmico e as habilidades adquiridas, mas o engajamento político e social com o meio em que vivem, e a indicação de um partido político ou de um movimento social. A reivindicação de maior equidade na distribuição das vagas de Medicina no Brasil é compreensível quando se considera que a profissão do médico é uma das mais exclusivas e elitistas. A favela de Heliópolis, em São Paulo, uma das que tiveram três estudantes selecionados para a bolsa em Cuba, tem 130 mil habitantes, nenhum médico entre seus moradores, nenhum estudante em escola de Medicina. O Cremesp considera que a falta de oportunidade para nossos estudantes não pode justificar que se descuide, em nenhum momento, da qualidade da formação do médico. Nas mãos desses futuros profissionais estarão seres humanos e da boa formação deles dependerá políticas públicas que vão interagir diretamente com a saúde dessas populações. O Cremesp defende que todo médico formado lá fora – não importa o país nem a nacionalidade – seja submetido a um exame de revalidação do diploma aqui, como prevê a legislação. Não se pode concordar que acordos bilaterais entre Países – por seus entendimentos políticos – passe por cima desse critério essencial de qualidade.
Muitos médicos e má distribuição O meio médico no País vive um momento de absoluta perplexidade. Enquanto, de um lado, escolas militantes como a de Cuba, ou as mercantilistas dos países vizinhos, formam médicos brasileiros e pressionam sua entrada, o País 60
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
convive com um inchaço de faculdades de Medicina que inflaciona o mercado e, especialmente, coloca em risco a formação dos futuros médicos. O País já vive com um excesso de profissionais nos grandes centros urbanos, particularmente em cidades médias do interior do Estado de São Paulo que, por abrigarem escolas de Medicina, se transformaram em centros de referência, com grande mercado para os profissionais. No outro extremo, em grandes áreas do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, além da periferia de grandes centros, o país sofre com a falta de médicos. Não se trata neste momento de fazer uma avaliação da distribuição geográfica dos médicos no País, embora a qualidade da atenção à saúde tenha a ver com o acesso e a disponibilidade da assistência. O aprendizado sobre a saúde e a doença mudou muito nesses 200 anos de existência das escolas médicas no País. O que se questiona hoje é de qual Medicina o País precisa. Até 1950, quando o Brasil tinha apenas 14 escolas e formava cerca de mil médicos por ano, a grande maioria da população nunca tinha visto um médico. Hoje, com tantas escolas, a maior parte dos brasileiros já esteve diante de um médico, mas muitas vezes sem direito a um tempo mínimo que permita a ele dizer o que sente. Ou seja, a maioria da população já tem hoje acesso a um médico, mas não tem garantido plenamente o direito à saúde.
Médicos preferem ficar onde estão as escolas O estrangulamento do mercado e a interiorização, que ainda se limita aos centros mais importantes, estão longe de oferecer assistência a todos, como promete a Constituição. Em pelo menos quatro cidades do Estado de São Paulo, há mais de 4 médicos por mil habitantes morando no município, índice superior ao de países ricos. No conjunto do País, há centenas de municípios sem um único médico morando na cidade. Só em São Paulo, 134 municípios estão nesta situação. As tentativas de fixar médicos e outros profissionais de saúde nas regiões mais afastadas até agora não deram resultados. Estudos feitos em vários países mostram que a maioria dos estudantes de Medicina acaba se estabelecendo na cidade ou na região onde se formou ou fez Residência Médica. 61
EXAME DO CREMESP
O questionário sobre o perfil dos estudantes, que faz parte do exame do Cremesp, mostra que 72,4% dos graduandos pretendem iniciar o exercício profissional na cidade onde concluiu o curso. Outros 19,6% em “alguma cidade do interior do Estado de São Paulo”. Nos dois casos, são áreas que já convivem com um excesso de médicos. A mesma pesquisa mostra que 96,4% dos egressos desejam fazer Residência Médica na escola que cursou a graduação ou em outra do Estado de São Paulo. Some-se a isso o fato de São Paulo ser o Estado com maior número de vagas para Residência, o que acaba atraindo e fixando estudantes de outros Estados, saturando ainda mais o mercado.
Um escola a serviço do SUS? Entre os objetivos do Pró-Saude está o de “reorientar o processo de formação (...) de modo a oferecer à sociedade profissionais habilitados para responder às necessidades da população brasileira e à operacionalização do SUS”. Prevê também “mecanismos de cooperação entre os gestores do SUS e as escolas de Medicina”,“visando tanto a melhoria da qualidade na atenção prestada ao cidadão quanto à integração da rede pública de serviços de saúde à formação dos profissionais de saúde na graduação e na educação permanente”. Segundo o Ministério da Saúde, a iniciativa “visa a aproximação entre a formação de graduação no País e as necessidades da atenção básica, que se traduzem no Brasil pela estratégia de Saúde da Família”. Diz ainda que o “distanciamento entre os mundos acadêmico e o da prestação real dos serviços de saúde vem sendo apontado em todo mundo como um dos responsáveis pela crise do Setor da Saúde.” O Cremesp entende que as boas práticas de ensino se dão nos ambulatórios e nas enfermarias dos hospitais, onde estão os doentes e suas histórias clínicas. É com eles, ao lado de bons professores, que o aluno aprende a ver, ouvir e a tocar, adquirindo não só conhecimentos da prática clínica, mas também descobrindo o contexto social e antropológico no qual se insere o paciente – o que permite transformar em realidade o que aprendeu na teoria sobre humanismo e bioética. 62
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
O Conselho adverte, porém, para o risco de uma excessiva subordinação do ensino às políticas do SUS, substituindo profissionais por alunos, assim colocando em risco a saúde do paciente, a responsabilidade profissional e deteriorando o que se pretende promover, que é a qualidade do ensino As principais conclusões da Cinaem estão em anexo nesta publicação, com uma síntese dos problemas constatados e as propostas para que sejam resolvidos. Como se verá, os resultados do Exame do Cremesp, dez anos depois, só reforçam o diagnóstico que a Cinaem resumiu da seguinte forma:“O médico não se forma com a competência mínima para atender às demandas da população.”
Diretrizes Curriculares, o caminho a seguir Tão importante quanto o longo e minucioso trabalho feito pela Cinaem, e fruto desse, foram as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina. Instituídas por meio da Resolução nº 4 do Conselho Nacional de Educação, em 7 de novembro de 2001, foram construídas a partir de ampla consulta às entidades médicas, escolas, professores, alunos e especialistas. Constituem uma peça orientadora da educação médica que em nada deixa a desejar aos padrões das melhores escolas do mundo. A primeira diretriz do MEC, que define o perfil do formando egresso, resume o que se espera de um profissional: Que tenha “formação generalista, humanista, crítica e reflexiva”. Que seja “capacitado a atuar, pautado em princípio ético, no processo de saúde-doença em seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectiva da integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser humano.” Todo curso de graduação em Medicina – diz a resolução – deve ter um projeto pedagógico, construído coletivamente, centrado no aluno como sujeito da aprendizagem e apoiado no professor como facilitador e mediador do processo ensino-aprendizagem”. Em outro trecho, diz que a organização do curso deve “propiciar interação ativa do aluno com usuários e profissionais de saúde desde o início de sua formação, proporcionando 63
EXAME DO CREMESP
ao aluno lidar com problemas reais, assumindo responsabilidades crescentes como agente prestador de cuidados e atenção...”. Deve também “vincular, através da integração ensino-serviço, a formação médico-acadêmica às necessidades sociais da saúde, com ênfase no SUS”. As diretrizes também falam na necessidade de acompanhamento e avaliação permanente, “a fim de permitir os ajustes que se fizerem necessários ao seu aperfeiçoamento”. “As avaliações dos alunos deverão basearse nas competências, habilidades e conteúdos curriculares desenvolvidos tendo como referência as Diretrizes Curriculares.” Veja, no anexo, a íntegra dos pontos essenciais que compõem essas diretrizes.
Mudanças devem encontrar resistências Quando se olha para trás, vê-se que há mais de duas décadas entidades ligadas à saúde e ao ensino da Medicina – estudantes, professores, reitores, instituições médicas e governamentais, gestores e usuários – vêm alertando para a necessidade de maior controle na abertura dos cursos e uma adequada avaliação do ensino que é oferecido. Nesse tempo, especialmente com a Cinaem, criou-se um formidável banco de dados e de conhecimento, e se adquiriu consciência de que é tempo de iniciar as transformações. As Diretrizes Curriculares estão aí para mostrar o caminho, e o Pró-Saúde é uma das ferramentas nesse processo. O Cremesp teme que as mudanças encontrem resistências de várias frentes, como já se constatou ao longo das últimas décadas. De 2001 para cá, quando se acentuaram as iniciativas para as transformações – inclusive com portarias e decretos interministeriais, do MEC e da Saúde –, 67 novas escolas foram abertas, 53 delas privadas. O último instrumento foi a decisão, em 2008, do ministro Fernando Haddad, da Educação, de criar uma comissão que avaliaria in loco as escolas médicas com pior desempenho no Enade. A intenção era que o grupo, encabeçado pelo professor e ex-ministro Adib Jatene, fosse interministerial e que dele tomassem parte representantes dos mais diversos órgãos, estatais ou não, e entidades que tenham a ver com a medicina e o ensino médico. Espera-se que, com este combinado, 64
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO
se encerre a polêmica sobre a quem cabe conduzir a educação na saúde. Pela Constituição, cabe ao SUS a ordenação dos recursos na saúde, incluindo aí o ensino médico, da graduação à Residência Médica. Até agora, o MEC, sozinho, tomou conta dessa área. Passou da hora de os dois ministérios se entenderem em prol da sociedade e da saúde.
MEC anuncia mudança de paradigma Ao longo de décadas, o Ministério da Educação partiu da premissa de que cabia a ele abrir o máximo de escolas – inclusive as médicas. A regulação ficaria por conta do mercado, que condenaria ao fechamento aquelas ruins, promoveria aquelas eficientes, e definiria quantos profissionais e com qual perfil a sociedade precisa contar. Em abril 2008, num debate sobre “O Futuro das Escolas Médicas no Brasil”, ocorrido da Faculdade de Medicina da USP, em São Paulo, o MEC reafirmou sua mudança de paradigma, que já vinha sendo defendida pelo ministro Fernando Haddad. O marco regulatório, com relação às escolas médicas, caberá agora aos ministérios da Educação e da Saúde, com a participação dos conselhos nacionais das duas áreas (Conselho Nacional de Educação e Conselho Nacional de Saúde) e representantes de entidades médicas e acadêmicas. O debate sobre o “futuro das escolas médicas” foi realizado pela AMB, CFM e Faculdade de Medicina da USP, e contou com representantes de várias entidades da Educação, da Saúde e da academia. O professor e ex-ministro Adib Jatene, que coordenou um dos debates, disse que “infelizmente o marco regulatório mudou quando a porta já estava arrombada”. Representantes do MEC anunciaram que o Conselho Nacional de Educação – que até agora ditou as regras no credenciamento e recredenciamento das escolas médicas – terá seus poderes restritos à avaliação dos critérios técnicos. O Conselho Nacional de Saúde poderá recuperar seu poder de decidir, em caráter terminativo, a necessidade social da nova escola, como já previa o artigo 27 do decreto 3.386 de 9 de julho de 2001. Quanto às entidades – como o CFM, AMB e ABEM – elas estarão 65
EXAME DO CREMESP
representadas na comissão interministerial criada por Fernando Haddad e que é encabeçada pelo ex-ministro Adib Jatene. A comissão poderá ter o caráter técnico terminativo para decidir sobre a abertura e recredenciamento dos cursos, mas não o poder de realizar um exame capaz de aprovar ou vetar um profissional, como faz a Ordem dos Advogados do Brasil, com seu Exame da Ordem.
Cem anos atrás Quase um século atrás, em 1910, os EUA viviam situação semelhante à do Brasil, com número excessivo de escolas e sem critérios para abertura e avaliação dos cursos. Foi quando o governo encarregou o professor Abraham Flexner (1866-1959) de elaborar um relatório que leva seu nome e que se transformou em alerta para outros países. Flexner visitou 155 faculdades de Medicina que à época existiam nos EUA e no Canadá e seu relatório, que descreveu a situação precária de muitas escolas, mudou a educação médica americana e influenciou a européia desde então. “As escolas médicas eram essencialmente iniciativas privadas cujo espírito e objetivo eram gerar dinheiro... Um homem que pagasse suas mensalidades estava, assim, praticamente assegurado de conseguir seu título, mesmo que assistisse ou não às aulas”, escreveu Flexner nas suas conclusões. O relatório levou ao fechamento de muitas das escolas que não apresentavam condições mínimas de ensino e convenceu governo e entidades da necessidade de financiar as melhores instituições, tomando como modelo a Faculdade de Medicina da Universidade John Hopkins, em Baltimore, até hoje uma referência mundial em educação médica. Hoje o Brasil tem mais escolas médicas que os EUA. O Cremesp acredita que o País tem agora condições de escapar de um destino dramático, o de uma Nação condenada a perder o controle sobre suas escolas médicas depois de uma história de tantos avanços e conquistas. Se isso vier a acontecer, a perspectiva de uma sociedade com maior acesso aos médicos e à saúde se tornará cenário de um inchaço de alunos e profissionais despreparados, transformando-se num risco concreto à população e numa ameaça à dignidade e à ética da própria profissão médica. 66
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS Como os participantes do Exame do Cremesp avaliam suas escolas
Quem são os concluintes que passaram no Exame do Cremesp de 2008 e como eles avaliam os cursos, a qualidade das instalações, os recursos disponíveis e a atuação dos professores. No conjunto, a maioria faz críticas à infraestrutura básica de suas escolas. A mesma maioria avalia suas faculdades como boas ou ótimas. Os três primeiros exames do Cremesp, de 2005 a 2007, estiveram centrados nos estudantes das escolas médicas paulistas. Para o quarto deles, de 2008, foram convidados também graduandos de faculdades de Medicina de outros Estados. Como já foi dito no início desta publicação, do total de 1.003 inscritos, 93,1% eram alunos de escolas paulistas. Ou seja, apenas 69 estudantes vinham de outras regiões da federação, distribuídos por 12 Estados. Para evitar distorções, a primeira fase do trabalho, que trata dos resultados da prova propriamente dita, considerou apenas os candidatos paulistas. O segundo questionário, este que traça o perfil dos graduandos e avalia suas escolas – segundo a visão dos próprios alunos -, considerou o conjunto dos estudantes que prestaram a segunda fase, sem diferenciar a origem. Como os estudantes paulistas são em maioria absoluta, considera-se que os resultados retratam o perfil dos alunos paulistas e o cenário das escolas de São Paulo. Como se verá em muitas das questões, houve uma deterioração tanto da qualidade do ensino quanto do nível e histórico dos estudantes, quando 67
EXAME DO CREMESP
se compara com anos anteriores. Como a participação dos alunos de escolas de outros Estados é muito pequena, a oscilação para baixo não pode ser atribuída aos graduandos “externos” ao Estado de São Paulo. O Cremesp considera, portanto, que os resultados e comentários a seguir refletem a situação das faculdades do Estado de São Paulo, já que faltam elementos para uma avaliação do ensino em outras regiões. Daqui para a frente, todas as considerações e comparações, embora incluam estudantes de outros Estados, estarão se referindo aos alunos paulistas. Apesar de desigual e muito pequena, a participação de alunos de outros Estados chama ainda mais a atenção para a necessidade de uma avaliação e qualificação do ensino da Medicina em todo o Brasil. Num País federação, alunos formados em faculdade de qualquer Estado podem exercer sua profissão em qualquer outro, sem necessidade de testes, provas ou exames. Se São Paulo, Rio ou Minas têm – em tese – um conjunto de melhores escolas, nada assegura que não estejam “exportando” seus piores alunos. Dentro deste contexto, a iniciativa do Cremesp de avaliar o desempenho dos graduandos paulistas é apenas um alerta geral para a necessidade de se medir e classificar a qualidade do ensino médico em todo o país. Não se trata simplesmente de fechar escolas e reprovar alunos, trata-se de exigir de todos condições fundamentais e seguras para o exercício de uma profissão capaz de promover a saúde e administrar a melhor assistência médica possível. Assim como a doença não tem fronteiras, a saúde igualmente não deveria ter, especialmente num país que tem o SUS como linha mestra, e onde o acesso universal e o atendimento integral são regras da Constituição. A legislação que garante saúde para todos tem que, igualmente, oferecer o melhor para todos os profissionais responsáveis por tais funções: sejam aqueles que estão na linha de frente, recebendo pacientes doentes ou vítimas de causas externas, sejam aqueles que trabalham no anonimato dos laboratórios de pesquisa ou nos programas governamentais de promoção da saúde. E igualmente aqueles que assumem o papel de gestores e de responsáveis pela condução das políticas de saúde. 68
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
Breve perfil do participante Os graduandos de Medicina de 2008 que passaram na primeira fase e se apresentaram para a segunda têm em média 24 anos e são brancos na grande maioria. Um único se classificou como negro e 3,6% como pardos. Nos anos anteriores, o número de mulheres vinha subindo gradualmente, até empatar e ultrapassar o de homens em 2007, acompanhando a tendência dos registros de novos médicos no Cremesp. No exame de 2008, os homens saltaram para 56%, o que não reflete a situação das escolas médicas, onde as mulheres já se firmaram como maioria. A maior parte dos graduandos mora com os pais, não trabalha e 28% têm renda familiar mensal acima de 30 salários mínimos. Em 2007, eram 40%. Mais de 82% são filhos de pais com nível universitário e 40% vêm de família que tem o pai ou um irmão médico. Cerca de 88% cursou o ensino médio em escola privada e mais de 80% fizeram cursinho. Um quarto deles lê jornais diariamente, impresso ou pela Internet, 62,0% deles vão “raramente” ao teatro e metade deles “às vezes” ao cinema. Este é, em resumo, o perfil dos concluintes do curso de Medicina que passaram na Primeira Fase do Exame do Cremesp de 2008 e que se apresentaram para a segunda etapa. Embora com uma participação bastante desigual por parte das escolas, a amostragem tem representantes de 20 das 23 faculdades médicas paulistas que, em 2008, tinham alunos no sexto ano e que fizeram o exame do Cremesp – duas escolas boicotaram o exame e uma delas não teve aprovados na primeira fase, somando 231 estudantes. Um total de 19 alunos de outros Estados se apresentaram para a segunda fase e responderam a esse questionário. Como já foi dito, o exame tem a grande maioria de paulistas, por isso as considerações dessa fase dizem respeito especialmente aos estudantes e às escolas do Estado de São Paulo.
Professores pouco disponíveis O questionário sobre a caracterização dos formandos, com 120 perguntas de respostas múltiplas, é uma ferramenta tão valiosa quanto a prova que pontuou o conhecimento dos graduandos, principal objetivo da iniciativa do Cremesp. Além do perfil sócio-econômico e cultural dos 69
EXAME DO CREMESP
estudantes, o questionário permite saber a participação em atividades acadêmicas, a qualidade das instalações, os recursos disponíveis nas respectivas escolas e a avaliação que fazem de seus professores. Sabe-se, por exemplo, que 52,0% deles têm aulas teóricas em classes com 71 a 100 alunos. Para 33%, a supervisão por parte dos professores foi inadequada ou insuficiente. Para mais de um terço dos alunos, os equipamentos dos laboratórios estavam mal conservados ou desatualizados. Para quase 40% deles, a biblioteca de sua instituição tinha acesso informatizado, inclusive para a rede nacional e internacional de bibliotecas. Deve-se observar que o expressivo número de alunos, na segunda fase do Exame do Cremesp, provém de escolas que são consideradas como as melhores e mais tradicionais do Estado de São Paulo. Outra parte do questionário, sobre a estrutura curricular e a atuação docente, revelou que a grande maioria das aulas teóricas eram expositivas, parte delas com a participação dos alunos. Cerca de 39% dos estudantes se queixaram da pouca ou nenhuma disponibilidade dos professores em várias das matérias. Do total de graduandos, 8,8% disseram nunca ter feito um parto com a presença do professor. E 7,6% afirmaram não ter tido disciplina que tratasse de cirurgia ambulatorial.
Cursos pouco exigentes De acordo com o questionário, 75,6% dos alunos disseram que seu curso poderia ter sido um pouco ou muito mais exigente. No ano de 2007, essa porcentagem estava em 64,1%, o que permite concluir que os cursos diminuíram ainda mais seu nível de exigência, segundo os alunos. Cerca de 40% dos alunos classificaram as instalações como não adequadas ou não suficientes e um terço avaliou a supervisão docente como insuficiente ou inadequada, tanto nas áreas clínicas como nas atividades de laboratório. Em pelo menos duas áreas de competência os alunos julgaram que seus cursos contribuíram parcialmente ou muito pouco, ou que a competência não foi sequer desenvolvida. Uma delas é a “atuação responsável com relação ao meio ambiente”, a outra, a “utilização de recursos de informática necessários para o exercício profissional”. 70
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
Quanto ao futuro, praticamente todos os concluintes manifestaram a intenção de fazer Residência Médica, a maioria deles na própria escola onde estava terminando a graduação.A área com maior número de escolhas foi a Clínica Médica, com 32,0%, seguida da Cirurgia Geral, com 22,4%. O resultado do questionário é uma ferramenta importante para se conhecer o estudante de Medicina e avaliar as escolas médicas, de forma a detectar falhas e promover melhorias. O baixo índice de aprovação nos quatro anos de aplicação do Exame do Cremesp poderia ser atribuído, em parte, a fatores como dificuldades na compreensão das perguntas ou inadequação da prova em relação à formação recebida no curso. Essas são limitações próprias a qualquer processo de seleção, especialmente quando se trata de uma extensa área de conhecimento. No entanto, uma série de questões destinadas a avaliar a qualidade e adequação da prova mostra que a maioria dos alunos considerou as perguntas de dificuldade média, com enunciados claros e objetivos e conteúdos que tinham a ver com aqueles ensinados nas escolas. Em relação à análise do conteúdo da prova pela média de facilidade, aplicada no resultado da prova da fase I, observe-se que 78,3% das questões foram consideradas de grau de dificuldade média, fácil ou muito fácil. Em análise baseada em amostra dos 250 alunos que fizeram a segunda fase do exame, o percentual que considerou o conteúdo das perguntas, por área de conhecimento, adequado ou parcialmente adequado, variou entre Saúde Mental, com 32,8% e Medicina Preventiva, com 92%. A Comissão Organizadora considera, portanto, que a prova foi clara, com questões pertinentes às disciplinas cursadas, e tempo suficiente para respondê-las. O baixo desempenho se explicaria pelas deficiências apontadas pelos próprios alunos, tanto nas instalações e equipamentos, como na estrutura curricular e na atuação docente.
Amostragem tem limitações É preciso observar, no entanto, que o questionário tem suas limitações. Ao entrevistar apenas os estudantes que passaram na Primeira Fase e se apresentaram para a segunda, o questionário ouviu a parcela mais motivada e, eventualmente, melhor preparada entre os graduandos. 71
EXAME DO CREMESP
Em 2008, por exemplo, 250 alunos participaram da Segunda Fase, contra 679 que fizeram a primeira. O total de estudantes que cursavam o último ano nas 23 escolas do Estado em 2007 era cerca de 2.500. Significa, portanto, que o questionário traça o perfil e revela as opiniões de uma parcela de 10,0% dos estudantes paulistas concluintes dos cursos médicos. Pondera-se que, se ouvisse o total dos alunos, é muito provável que os resultados seriam mais preocupantes. Nos próximos exames, além de um esperado aumento no número de participantes, há a possibilidade de que o questionário seja apresentado aos alunos já na primeira fase. Também será possível separar os resultados por instituição, ou ao menos estabelecer um recorte entre escolas públicas e privadas, o que ajudará a detectar tendências que devem se acentuar com o crescimento contínuo dos cursos particulares. No questionário de 2008, considerando-se apenas as escolas paulistas, o desempenho foi melhor entre os estudantes de escolas públicas: 54,1% deles tiveram aprovação na primeira fase, contra 32,5% vindos das escolas privadas ou filantrópicas. O número de candidatos de escolas públicas que participaram da primeira fase foi de 192, contra 487 das escolas privadas. Em cinco anos, com a conclusão das turmas das novas escolas privadas, o número de formandos em escolas particulares deve ser pelo menos três vezes maior que aqueles concluintes de faculdades públicas. A análise e as informações que se seguem estão centradas no último exame, o de 2008. Questionário semelhante foi apresentado aos que fizeram a segunda fase dos exames dos três anos anteriores, 2005, 2006 e 2007. Apesar do curto espaço de tempo entre um exame e outro, foram observadas algumas diferenças que podem assinalar tendências importantes. Sempre que isso foi notado, as observações foram assinaladas no texto. A seguir, os principais resultados.
Maioria é de classe média alta Os dados da pesquisa confirmam a tendência de “juvenilização”, mas há uma distorção quanto à “feminilização” da profissão quando se observa os últimos anos do Banco de Dados do Cremesp. Entre os estudantes que 72
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
fizeram a segunda fase do exame, 56,0% são homens e 44,0% são mulheres. Em 2007, 50,7% eram mulheres contra 49,3% homens. Em 2005, 140 concluintes eram homens e 137 mulheres. Em 2006, eram exatos 132 homens e 132 mulheres. No mercado, dos cerca de 92,5 mil profissionais na ativa e inscritos no Cremesp em 2007, 61,6% são homens. Entre os graduandos de 2008, a maioria tem até 24 anos, 58,4%, e outros 40,4% têm entre 25 e 29 anos. Quase todos são solteiros, 98,4%, e apenas 1,6% tem um filho. A maioria dos estudantes vem de família de classe média ou média alta, mantendo a tradição de a Medicina ser uma escolha da elite. São 28% os que têm renda familiar superior a 30 salários mínimos enquanto 26,4% têm renda entre 21 a 30 salários mínimos. Apenas 1,6% tem renda abaixo de 3 salários mínimos. Em 2005, eram 33,60% os que tinham renda familiar superior a 30 salários mínimos e 26,22% entre 21 e 30. Em 2006, os de renda mais alta eram 39,25%. Em 2007, 40,0% vinham de famílias com renda superior a 30 salários mínimos. Nos três primeiros anos houve um aumento crescente da faixa de renda, mas uma queda significativa no último ano de 2008, com 28,0%.. A grande maioria dos estudantes, 88,4%, não trabalham e seus gastos são financiados pela família. Cerca de 81,2% não recorreram a bolsa de estudos para custear as despesas do curso. Quase 58% deles moram com os pais e/ou outros parentes, 82,4% têm apenas um ou dois irmãos, confirmando a tendência de famílias com menor número de filhos. Com relação à cor ou raça, 87,2% se consideram branco, 8,4% amarelo, de origem oriental, e 3,6%, pardo ou mulato. Apenas 0,4% se considerou negro. Em 2005, os que se classificavam como branco eram 80,0%, 13,6% amarelos, 3,2% pardos e apenas um estudante se classificou como negro e outro indígena. Em quatro anos, a presença dos brancos passou de 80,0 para 87,2% dos graduandos que se apresentaram na segunda fase. A família continua tendo papel importante na escolha da profissão quando se trata de Medicina. Cerca de 40% dos estudantes disseram ter algum 73
EXAME DO CREMESP
médico na família, considerando apenas pais e irmãos. O grau de escolaridade do pai é alta e bastante superior à da mãe. No caso, 82,8% dos alunos tinham pai com curso superior e 11,0% com ensino médio. Já entre as mães, 68,0% tinham ensino fundamental de 5ª a 8ª série, e 11,6% fizeram faculdade. O nível sócio-econômico dos estudantes aparece em vários outros itens. Por exemplo, 88,4% fizeram todo o ensino médio em escolas privadas e 3,6% em colégios predominantemente privados. Apenas 8,0% estiveram em escola pública durante todo o ensino médio Do conjunto dos estudantes, 85,2% passaram por cursinho preparatório para o vestibular de Medicina. Entre eles, metade fez curso preparatório durante um ano e outra metade freqüentou durante dois anos ou mais. Um número significativo desses alunos fez curso de línguas paralelo ao ensino médio, já que seu nível de conhecimento está acima daquele oferecido nas escolas tradicionais. Entre eles, 41,6% disseram ler, escrever e falar inglês “bem”. E outros 47,6%, “razoavelmente”. Já com a língua espanhola não ocorre o mesmo: 42,8% dizem ler, mas não escrever nem falar. E 36,8% afirmaram ter conhecimentos “nulo” da língua. Não houve diferenças significativas entre os quatro anos quanto à procedência escolar, conhecimento de línguas estrangeiras e escolaridade dos pais.
Um terço lê jornais diariamente Os estudantes de Medicina que responderam ao questionário – os 250 que fizeram a segunda fase do exame de 2008 – vão mais ao cinema e quase nunca ao teatro, gostam mais de ouvir música do que ir a shows. Dez perguntas foram feitas para saber o que eles costumam fazer em suas horas de lazer: 70,0% disseram ouvir música freqüentemente. Do total, 58,0% afirmaram que vão raramente a shows musicais, 62,0% vêem raramente peças de teatro e cerca de 80,0% fazem raramente atividades manuais como jardinagem ou cerâmica, ou executam trabalhos artísticos. A leitura como lazer é uma prática “freqüente” para 48,4% dos estudantes e o esporte e caminhadas são praticados por 52,4% deles, com freqüência. O uso do computador para navegar na web ou para jogos eletrônicos é uma atividade de lazer “freqüente” para 65,6%, enquanto 74
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
assistir TV foi apontado como prática freqüente por 52,4%. Outros 47,2% disseram ver TV “às vezes” ou “raramente”. A leitura de jornais, impressos ou digitais, não é uma prática diária para cerca de 75,0% dos alunos. Nesse grupo, 58,4% dizem ler “de vez em quando” e 17,0% afirmam que não costumam ler jornais. As revistas impressas ou digitais são lidas “freqüentemente” por 30,4% dos estudantes, enquanto 56,0% lêem “de vez em quando” e 11,2% não lêem esse tipo de mídia. Em 2005, o número de graduandos que liam jornais era menor: 16,8% disseram ler um jornal diariamente e 33,2% informaram que raramente ou nunca liam jornais. Cerca de 40% disseram usar a TV para se informar e 29,7%, a Internet. Cerca de 13,0% usavam o jornal para esse fim e 9,4%, a leitura de revistas. Nos anos seguintes, não se notou diferenças significativas nos resultados.
97% desenvolveram alguma atividade acadêmica Na consideração dos resultados do questionário aplicado, há que se fazer uma ressalva. Trata-se de uma amostra daqueles que passaram à segunda fase do Exame do Cremesp, ou seja, são alunos mais motivados, mais preparados, provenientes em sua maioria de escolas médicas públicas. Em alguns aspectos, como no desenvolvimento de atividades acadêmicas, a realidade do universo de todos os alunos do sexto ano, de todas as escolas, pode revelar uma situação pior. O questionário perguntou quantas horas por semana, aproximadamente, o aluno dedicava aos estudos, excetuando as horas que se encontrava em aula. Cerca de 43% disseram que dedicam mais de oito horas por semana, outros 18,0%, de seis a oito horas. Na outra ponta, um único aluno disse “apenas assistir às aulas”. E 37,6% afirmaram dedicar de uma a cinco horas por semana. Mesmo considerando que os cursos de medicina são dados em período integral, 97,4% disseram desenvolver ou ter desenvolvido alguma atividade acadêmica durante o curso. Cerca de 35,0% dos alunos afirmaram participar, predominantemente, de atividades de iniciação científica ou tecnológica. Outros 22,8% fazem ou fizeram atividades de monitoria, 75
EXAME DO CREMESP
22,0% atividades de extensão promovidas pela instituição e 16,8%, atividades em projetos de pesquisa conduzidos por professores da própria instituição. Apenas 1,2% afirmaram não desenvolver atividade alguma. Quando se perguntou se esteve envolvido em algum projeto de pesquisa (iniciação científica), 58,8% disseram desenvolver esse tipo de trabalho supervisionados por professores. Outros desenvolveram “pesquisas independentes” (3,6%) ou participaram de projetos de professores ou de estudantes da pós-graduação – 18,0%. Cerca de 16,0% dos alunos afirmaram que não se envolveram em projetos porque não se interessaram ou não tiveram oportunidade. Praticamente todos os alunos disseram ter participado de eventos como congressos, jornadas e seminários. E, para a maioria deles, 63,6%, foi a própria instituição de ensino onde estuda que promoveu a maior parte dos eventos. Para 12,0%, as atividades foram promovidas por associações cientificas ou profissionais da área. E para 12,8% foram diretórios estudantis ou centros acadêmicos. Como nos anos anteriores, constata-se que a grande maioria dos eventos e outras atividades das quais participaram os concluintes foram promovidos pela própria instituição de ensino. Para a maioria dos estudantes, esses eventos se constituem no mais importante ou no único meio de atualização.
Maioria das classes tem mais de 70 alunos As aulas teóricas são dadas em salas com um grande número de alunos na maioria das instituições. Cerca de 14,0% dos concluintes disseram que as turmas têm, em média, de 51 a 70 alunos. E 37,2% afirmaram que a maioria das classes recebem de 71 e 100 alunos. Outros 14,8% disseram que as salas têm mais de cem alunos presentes. Cerca de 34,0% dos alunos afirmaram que as aulas teóricas são dadas para grupos de menos de 50 alunos.Vale lembrar que os estudantes em questão se formaram em instituições paulistas diferentes, públicas e privadas, o que significa que pode ser prática comum na maioria delas, as aulas teóricas com grande número de alunos. 76
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
Mesmo considerando a grande lotação das classes, 46,8% dos estudantes disseram que o espaço é adequado em todas as aulas. E 44,8% responderam ser adequado “na maior parte delas”. A superlotação das classes, de acordo com os questionários anteriores, era ainda maior. Em 2005, 22,0% disseram que o número médio de alunos por classe passava de 100. Esse número caiu para 16,6% em 2006, contra 9,15% em 2007.
Para 42%, acesso a computadores é limitado A maioria dos alunos (52,46%) considerou que o material de consumo oferecido e o número de alunos presentes nas aulas práticas era “suficiente” na maior parte das aulas. Outros 30,8% disseram que eram suficientes em “todas as aulas”. Apenas 10% afirmaram que o material era suficiente em “apenas metade” das aulas ou em “menos da metade delas”. A grande maioria dos alunos também considera que os equipamentos disponíveis em sua faculdade são suficientes para o número de alunos em “todas as aulas” (24,8%) ou “na maior parte delas”(56,0%). A maioria deles (58,4%) avalia que os equipamentos de laboratório são atualizados e bem conservados, 14,8% disseram que são“atualizados, porém mal conservados” e para 31,2% eles são “desatualizados, mas bem conservados”. Para a maior parte dos concluintes (52,8%), a faculdade viabiliza “plenamente” o acesso aos microcomputadores para atender as necessidades do curso. Para 42,0% esse acesso ocorre de “forma limitada”. Metade das bibliotecas tem acesso nacional e/ou inernacional informatizado. As bibliotecas das faculdades foram, de um modo geral, mal avaliadas pelos estudantes. Perguntados como classificavam o acervo, quanto à atualização e face às necessidades do curso, 34,0% consideraram “atualizado”. Mas para 32,0% o acervo é “medianamente atualizado” e para 21,6%,“pouco atualizado”. Um número expressivo, 12,0%, classificou de“desatualizado”. Quando se perguntou se o número de exemplares disponíveis, dos livros mais usados no curso, atendia às necessidades, apenas 9,6% afirmaram que “atende plenamente”. Para 47,2% “atende razoavelmente”, para 77
EXAME DO CREMESP
28,0% “atende precariamente” e para 14,4% “não atende” – ou seja, quase dois alunos em cada dez acham que o número de exemplares de sua biblioteca não atende às necessidades. A maioria das opiniões foram mais favoráveis com relação à atualização dos periódicos científicos e acadêmicos disponíveis na biblioteca. Cerca de 44,0% dos entrevistados disseram que o acervo é atualizado e 24,0% classificaram como “medianamente atualizado”. No entanto, 21,6% avaliaram o acervo como “desatualizado” e 4,8% informaram que não “existe acervo de periódicos especializados” – o que surpreende em se tratando de uma instituição cujo tema de estudo é objeto de intensa produção científica e publicação em todo o mundo. E que por isso mesmo exige atualização e troca de informações constantes. A grande maioria dos alunos (81,9%) disse que a biblioteca de suas instituições oferece serviço de empréstimo de livros para todo o acervo. Mas quanto aos serviços disponíveis nessas bibliotecas, as respostas mostraram condições bastante desiguais. Cerca de 46,0% disseram que as bibliotecas dispõem de sistema informatizado local e de acesso às redes nacional e internacional de bibliotecas. Outros 14,0% disseram que há informatização do acervo local e acesso à rede nacional de bibliotecas. Cerca de 27,6% dispõe somente de acesso informatizado local e 6,0% “utilizam apenas processos manuais”. Quanto ao horário de funcionamento das bibliotecas, a maioria (54,0%) considerou “adequado” e 33,6%, “plenamente adequado”. Estas mesmas opiniões e porcentagens valem para as “instalações para leitura e estudo” da biblioteca, embora nesse item 12,4% tenham considerado as instalações como “pouco adequadas” ou “inadequadas”.
Disciplinas são parcialmente integradas Pouca vinculação entre as disciplinas, prevalência de aulas expositivas, com participação ou não dos estudantes, e inadequação nos procedimentos adotados por muitos professores. Esse é o quadro que aparece em várias das questões que tratam sobre o tema. Solicitados a dar uma opinião sobre o currículo, mais especialmente 78
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
sobre o quesito integração das disciplinas, 23,6% disseram que “é bem integrado, havendo clara vinculação entre as disciplinas”. Mas 59,6% afirmaram ser “relativamente integrado, já que as disciplinas se vinculam apenas por blocos ou áreas de conhecimento afins”. Outros 14,8% disseram que a integração ocorre em “menos da metade” das disciplinas. Ao iniciarem os trabalhos em cada matéria, 50,8% disseram que a maior parte dos professores discutem o plano de ensino com os estudantes. Outros 16,0% afirmaram que todos discutem. Mas para 33,1% essa discussão ocorre em metade, menos da metade ou em nenhuma disciplina. Na técnica de ensino usada pela maioria dos professores predominam as aulas expositivas com participação dos alunos (segundo resposta de 48,0% deles”), e expositivas com preleção, 42,4%. Cerca de 38,0% disseram que em “menos da metade” das disciplinas foram solicitados a realizar atividades de pesquisa como estratégia de aprendizagem. Outros 17,2% afirmaram que “apenas em metade delas” isso acontece, enquanto 28,4% deles disseram que essa atividade ocorre na maior parte das disciplinas. Cerca de 13% dos alunos afirmaram que não são solicitados a realizar pesquisa “em nenhuma disciplina”. Os estudantes também manifestaram ressalvas quanto aos procedimentos de ensino adotados pela maioria dos professores, com relação à adequação aos objetivos do curso. Apenas 8,0% avaliaram os procedimentos como “bastante adequados”, 46,8% como “ adequados” e 43,8% classificaram como “parcialmente” ou “pouco” adequados.
Provas são escritas e discursivas As respostas dos estudantes mostram que as escolas médicas no Estado de São Paulo, públicas ou privadas, ensinam de formam convencional e avaliam os estudantes com metodologia conservadora. A grande maioria dos alunos (87,6%) respondeu que o tipo de material mais utilizados por indicação de seus professores durante o cursos são livros-texto e/ou manuais. Para 4,0% dos concluintes, artigos e periódicos especializados são o material mais empregado. Outros 3,6% recorreram apenas a anotações manuais e cadernos de notas. 79
EXAME DO CREMESP
O conhecimento dos alunos é avaliado por“provas escritas discursivas”, segundo 48,8% deles, e por testes objetivos, de acordo com 49,6%.
Domínio das disciplinas pelos professores Para 49,6% dos estudantes, a “maioria” dos professores do curso tem disponibilidade para orientação extra-classe. Apenas 6,4% disseram que todos os professores do curso estão disponíveis para orientação fora dos horários de aula. No conjunto, no entanto, 44,0% dos estudantes se queixaram da falta de disponibilidade dos professores. Nos anos anteriores, 2005 e 2006, entre 34% e 40% dos estudantes se queixaram da falta de disponibilidade da maioria dos professores. Os alunos também manifestaram ressalvas quanto ao domínio atualizado das disciplinas por parte de seus professores. Um quarto dos estudantes, 24,0%, disse que todos têm domínio atualizado, 63,6% disseram que a “maior parte deles” tem, e 11,6% responderam que “apenas a metade deles” ou menos tem esse domínio.
75% queriam cursos mais exigentes A deficiência de parte das escolas e uma manifesta decepção dos estudantes aparecem na pergunta sobre a avaliação do nível de exigência do curso. Ao final dos seis anos de graduação, 75,6% disseram que o curso deveria ter exigido “um pouco mais” ou “muito mais”. Um quinto dos estudantes, 21,2%, disse que o curso exigiu deles “na medida certa” e 3,2% afirmaram que a exigência foi excessiva. A queixa de que o curso poderia ou deveria ter exigido “um pouco mais” ou “muito mais” também aparece em 2005, em 60,8% das respostas, e 2006, com 66,79%. Em 2007, foram 64,1%.
Competências pouco desenvolvidas O questionário dedicou dez perguntas para saber em que medida o curso contribuiu para o aluno desenvolver diferentes competências. Em apenas duas delas, mais de 50% disseram que o curso contribuiu “amplamente”. A “compreensão de processos, tomada de decisão e resolução de 80
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
problemas no âmbito de suas áreas de atuação” foram citadas por 53,2%%. A “atuação ética, com responsabilidade social, para a construção de uma sociedade includente e solidária” foi citada como“amplamente” por 52,0%. Em seis outras competências, o número de alunos que disse ter o curso “contribuído” ou “contribuído amplamente”, oscilou entre 30,0% e 46,0%. As respostas mostram que em pelo menos duas áreas de competência os alunos julgam que o curso contribuiu parcialmente ou muito pouco. Chama a atenção o tema “atuação responsável em relação ao meio-ambiente”, competência na qual 20,0% disseram que o curso contribuiu amplamente, 35,6% que contribuiu muito pouco e 13,6% afirmaram que não contribuiu de forma alguma ou que a competência não foi sequer desenvolvida. Outra crítica foi feita à “utilização de recursos de informática necessários para o exercício profissional”. Cerca de 39,2% dos alunos disseram que o curso contribuiu “parcialmente” e 37,4% disseram que contribuiu muito pouco ou não contribuiu em nada nessa questão. Nas outras competências, onde a maioria dos alunos considerou que a contribuição foi parcial, muito pequena ou nenhuma, estão: a “organização, expressão e comunicação do pensamento”, a “atuação em equipes multi, pluri e interdisciplinares”, a “utilização de procedimentos de metodologia científica e de conhecimentos tecnológicos para a prática da profissão”, e a “assimilação crítica de novos conceitos científicos e de novas tecnologias”. Surpreende que a Medicina, sendo uma área de ponta do conhecimento, esteja falhando – segundo os alunos – no uso de recursos de informática, na valorização de uma atuação responsável em relação ao meio-ambiente e no incentivo ao trabalho em equipes inter e multidisciplinares, práticas cada vez mais associadas à assistência à saúde. Nos Exames anteriores, os alunos também citaram a informática e especialmente o tema do meio ambiente como as competências menos desenvolvidas nos seus cursos. No Quadro a seguir, os participantes indicaram em que medida o curso contribuiu para o desenvolvmento de determinadas competências. 81
EXAME DO CREMESP
Quadro 16
Contribuição do curso de Medicina para o desenvolvimento de competências, segundo participantes do Exame do Cremesp – 2008 Atuação ética, com responsabilidade social, para a construção de uma sociedade includente e solidária Nº de participantes
%
Contribuiu amplamente Contribuiu parcialmente Contribuiu muito pouco
130 98 18
52,00 39,20 7,20
Não contribuiu de forma alguma Não considero que desenvolva tal competência Total
3 1 250
1,20 0,40 100,00
Organização, expressão e comunicação do pensamento Nº de participantes
%
Contribuiu amplamente Contribuiu parcialmente Contribuiu muito pouco
90 124 27
36,00 49,60 10,80
Não contribuiu de forma alguma Não considero que desenvolva tal competência Total
6 3 250
2,40 1,20 100,00
Compreensão de processos, tomada de decisão e resolução de problemas no âmbito de sua área de atuação Nº de participantes
%
Contribuiu amplamente Contribuiu parcialmente
133 93
53,20 37,20
Contribuiu muito pouco Não contribuiu de forma alguma Não considero que desenvolva tal competência Total
22 2
8,80 0,80
250
100,00
82
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
Raciocínio lógico e análise crítica Nº de participantes % Contribuiu amplamente 115 46,00 Contribuiu parcialmente 109 43,60 Contribuiu muito pouco 23 9,20 Não contribuiu de forma alguma 3 1,20 Não considero que desenvolva tal competência Total 250 100,00 Atuação em equipes multi, pluri e interdisciplinares Nº de participantes % Contribuiu amplamente 114 45,60 Contribuiu parcialmente 93 37,20 Contribuiu muito pouco 40 16,00 Não contribuiu de forma alguma 3 1,20 Não considero que desenvolva tal competência Total 250 100,00 Atuação profissional responsável em relação ao meio ambiente Nº de participantes % Contribuiu amplamente 50 20,00 Contribuiu parcialmente 77 30,80 Contribuiu muito pouco 89 35,60 Não contribuiu de forma alguma 25 10,00 Não considero que desenvolva tal competência 9 3,60 Total 250 100,00 Observação, interpretação e análise de dados e informações Nº de participantes % Contribuiu amplamente 101 40,40 Contribuiu parcialmente 119 47,60 Contribuiu muito pouco 26 10,40 Não contribuiu de forma alguma 3 1,20 Não considero que desenvolva tal competência 1 0,40 Total 250 100,00 83
EXAME DO CREMESP
Utilização de procedimentos de metodologia científica e de conhecimentos tecnológicos para a prática da profissão Nº de participantes Contribuiu amplamente Contribuiu parcialmente Contribuiu muito pouco Não contribuiu de forma alguma Não considero que desenvolva tal competência Total
%
94 96 55 5
37,60 38,40 22,00 2,00
250
100,00
Utilização de recursos de informática necessários para o exercício profissional Nº de participantes Contribuiu amplamente Contribuiu parcialmente Contribuiu muito pouco Não contribuiu de forma alguma Não considero que desenvolva tal competência Total
55 98 82 14 1 250
% 22,00 39,20 32,80 5,60 0,40 100,00
Assimilação crítica de novos conceitos científicos e de novas tecnologias Nº de participantes Contribuiu amplamente Contribuiu parcialmente Contribuiu muito pouco Não contribuiu de forma alguma Não considero que desenvolva tal competência Total
84
%
84 116 37 13
33,60 46,40 14,80 5,20
250
100,00
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
Atividades práticas ao longo do curso Perguntados sobre o percentual de atividades práticas do ciclo básico, 62,4% dos estudantes disseram que elas representaram de 30% a 49% da carga horária do curso. E 17,2% afirmaram que em suas escolas 50% a 70% deste ciclo foi ocupado com aulas práticas. Para 14,0%, as aulas práticas ocuparam apenas 10% ou menos do curso, e para 4,4% ocuparam mais de 70% do ciclo básico. Sobre o processo de aprendizagem do conteúdo prático do ciclo básico, 77,6% disseram que foi “direto e em grupos, com supervisão docente, no laboratório”. Para 5,2% dos alunos, o processo foi“somente teórico, em sala de aula. Com relação ao ciclo profissional (clínico-cirúrgico), 56,4% dos estudantes disseram que mais de 70% foi destinado a atividades práticas. Para 27,2% dos alunos, a atividade prática ficou entre 50% e 70% do ciclo, e para 12,0% representou menos de 49%. As respostas mostram que há uma disparidade importante entre as escolas quando se trata de atividades práticas, seja no ciclo básico, seja no profissional. Essa diferença aparece em várias das questões, entre elas a porcentagem do curso profissional que foi desenvolvido dentro do ambiente hospitalar, com pacientes. Para a maioria dos estudantes, 56,4% deles, mais de 70% do curso foi desenvolvido com pacientes, em ambiente hospitalar. Para 27,2% essa prática representou de 50% a 70% do curso e para 12,0%, de 30% a 49% das aulas. Da mesma forma, houve variação do número de alunos por professor no atendimento a pacientes nas atividades práticas. Para 57,0% dos estudantes, a situação mais comum era de quatro a sete alunos para um professor. Em 25,2%, havia menos de quatro alunos para um docente. Mas para 16,0% deles, o grupo de alunos era de oito a onze, e em 1,2% dos casos, de 12 a 15 estudantes para um professor.
Parto sem a presença de professor No caso específico do ensino de obstetrícia, 78,8% disseram que foi “prático, com supervisão docente, no âmbito da escola”. Para 5,2% foi “prático, com supervisão, mas fora do âmbito da escola”. E para 13,6% foi igualmente prático, no âmbito da escola, mas “sem supervisão docente”. 85
EXAME DO CREMESP
O número de partos realizados com a presença do professor é outro indicador importante no processo de aprendizagem da obstetrícia. Cerca de 26%, ou um quarto dos alunos, disse ter feito mais de onze partos, 16,0% participaram de oito a onze e 25,2%, de quatro a sete. Outros 23,6% fizeram de um a três e pelo menos 22 alunos, ou 8,8%, informaram que estava terminando o curso sem ter feito nenhum parto com a presença do professor. Em 2005, isso aconteceu com 17 graduandos e em 2007, com 14. Quanto às cirurgias ambulatoriais, de menor porte, 71,6% dos alunos disseram que o ensino foi “prático, com supervisão docente, no âmbito da escola”. Para 10,4%, foi igualmente prático, no âmbito da escola, mas sem supervisão docente. E 7,6% informaram que no seu curso não houve disciplina que tratasse de cirurgia ambulatorial.
Ética e relação com o paciente A aprendizagem sobre a relação médico-paciente ocorreu, na maioria das disciplinas e para a maioria dos alunos, por meio da interação efetiva com o paciente – 92,0% marcaram essa resposta. E foi nas relações com pacientes, em ambulatório ou enfermaria, que a maioria dos estudantes (89,6% deles) diz ter vivenciado o comportamento ético. A segunda vivência mais importante nessa questão foi na relação com familiares dos pacientes, citada por 4,4% dos alunos. Diante do problema de custos cada vez mais elevados da assistência médica, especialmente dos exames solicitados para os diagnósticos, a maior parcela dos concluintes (55,6%) respondeu que o tema foi tratado, “sempre que oportuno” com “análise crítica quanto ao custo-benefício médico e social”. Dos informantes, 33,6% disseram que “algumas vezes” o tema foi abordado com recomendações quanto ao custo-benefício médico e social. Outros 2,8% dos estudantes disseram que o tema foi tratado “sem maiores comentários”. Com o aumento dos custos e da tecnologia disponível, com as limitações da saúde pública e a prática excludente das empresas de saúde suplementar, seria de esperar que o tema fosse tratado na maior parte das disciplinas. 86
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
Supervisão é inadequada para 33% A maioria dos alunos fez ressalvas aos programas de estágio em áreas clínicas. Do total, 39,6% classificaram as instalações físicas de adequadas, e a supervisão docente adequada e suficiente. Os demais classificaram a supervisão de insuficiente (37,2%) e 13,6% criticaram a insuficiência e inadequação por parte dos docentes e instalações. As críticas também aparecem na supervisão docente dos programas de ensino das atividades de laboratório do ciclo básico. Um quinto dos alunos – 20,0% deles – classificou a supervisão de “plenamente adequada a suficiente”. Outros 46,4% avaliaram como “adequada e suficiente”. Os demais – cerca de 33% - classificaram como inadequada ou insuficiente.
Internato teve 3.500 horas Internato é o período que o estudante de medicina cumpre dedicando-se a atividades de atendimento aos pacientes, acompanhado do professor. A maioria dos estudantes (83,2% deles) disse ter realizado o internato integralmente na sua própria escola. Os outros, parcialmente na escola ou em hospital credenciado, não ligado à sua escola. A maior parcela de formandos – 60,4% - realizou internato com carga horária efetiva de mais de 3.500 horas. Os demais tiveram uma carga menor, com 4,0% cumprindo de 1.500 a 2.000 horas. A maior contribuição do internato, para a maioria dos que responderam ao questionário, foi o aperfeiçoamento técnico-profissional, 69,6%. Para 23,2%, o internato contribuiu para demonstrar a “necessidade de estudos contínuos para o eficiente exercício profissional”.
Projeto de Residência Médica Quando responderam a esse questionário – no final de 2008 – os graduandos estavam concluindo o sexto e último ano de graduação. Agora, diplomados, a grande maioria já está inscrita no Conselho Regional de Medicina e com isso aptos a atuar como médicos em qualquer área da medicina. A realização de um programa de Residência Médica, no entanto, é a “principal perspectiva” para 96,4% deles.A maioria, 56,4%, pretende fazer 87
EXAME DO CREMESP
a Residência na mesma escola onde concluiu o curso. Outros 40,0% desejam realizar o programa em outra escola. E apenas 1,2% disse iniciar imediatamente a prática em instituição hospitalar. No entanto, quando se pergunta o que pretendem fazer após os estudos, 80,0% disseram que irão “procurar emprego”. Outros 14,4% querem abrir consultório próprio, 2,0% pretendem trabalhar em consultório ou clínica da família e 3,2% disseram já estar empregados em área da Medicina e lá desejam continuar. Apenas um aluno disse que pretende trabalhar em outra área que não a Medicina. A maior parcela dos graduandos (72,4%) pretende se iniciar como profissional na cidade onde concluiu o curso de graduação. A opção se explica pelo fato dessas cidades serem, na maioria, grandes centros populacionais, com maior mercado de trabalho, e por que ali suas chances de conseguir vaga em Residência Médica são maiores. Isso também explica o fato de 19,6% dos graduandos desejarem iniciar o exercício profissional em alguma cidade do interior de São Paulo, Estado com maior mercado e maior número de escolas médicas. Pelos números do MEC e do Cremesp, as vagas para a Residência Médica atendem menos de 60% dos formandos no Estado. Como esses têm que disputar com médicos vindos de outras regiões, estima-se que 40% deixem de lado ou adiem o projeto da Residência Médica e assumam funções como médicos, muitos deles em plantões, prontos-socorros e no Programa Saúde da Família.
Metade quer Clínica Médica e Cirurgia Geral Mesmo considerando que não haverá vagas para todos na Residência Médica, foi perguntado a eles qual a primeira opção para a realização de uma Residência. As respostas revelam quais as especialidades almejadas pelos graduandos, independentemente de virem ou não a trabalhar nessas áreas. A Clínica Médica, com 32,0% de escolha, foi de longe a especialidade mais assinalada pelos graduandos, seguida da Cirurgia Geral, com 22,4%. Essas duas especialidades, que juntas somam 54,4% das intenções dos médicos graduandos, podem indicar mudanças no perfil dos especialistas, quando se 88
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
compara com aqueles que já estão no mercado com título da especialidade. Segundo o Centro de Dados de Cremesp, 53% dos 92.580 médicos inscritos em 2007, o que corresponde a 49.065, tinham título de especialistas. Dentre eles, a Ginecologia-Obstetrícia vinha em primeiro lugar, com 15,6%, seguido da Pediatria, com 11,7%. A Cirurgia Geral vinha depois com 7,1% e a Clínica Médica com 6,8%. Na intenção manifestada pelos graduandos de 2008, a GinecologiaObstetrícia teve 6,0%, e a Pediatria, 7,6%. A escolha dos concluintes, ao optar por especialidades mais gerais – como a Clínica Médica e a Cirurgia Geral – dá indícios de uma maior sintonia com as necessidades do Sistema Único de Saúde. Nos três anos anteriores, com algumas variações nas porcentagens, as quatro principais áreas de interesse dos concluintes também foram, na mesma ordem, Clínica Médica, Cirurgia Geral, Ginecologia e Obstetrícia, e Pediatria. Quadro 17
Preferência por especialidade de Residência Médica, segundo participantes do Exame do Cremesp – 2008 Nº de participantes
%
Clínica Médica
80
32,00
Cirurgia geral
56
22,40
Ortopedia e traumatologia
19
7,60
Pediatria
19
7,60
Ginecologia-obstetrícia
15
6,00
Otorrinolaringologia
11
4,40
Oftalmologia
9
3,60
Neurocirurgia
8
3,20
Psiquiatria
8
3,20
Anestesiologia
6
2,40
Anatomia Patológica Saúde pública ou PSF Não responderam Total 89
19
7,60
250
100,00
EXAME DO CREMESP
A opção por Saúde Pública ou Programa Saúde da Família não foi assinalada por nenhum estudante no questionário de 2008, repetindo o que aconteceu em 2007. Em 2005, 3,5% manifestaram intenção de fazer Residência Médica em “Saúde Pública”. Em 2006, foram 2,26%. Segundo a Comissão Nacional de Residência Médica, existem programas de Residência em Medicina de Família e Comunidade e em Medicina Preventiva e Social. Entre os especialistas formados, 0,3% tem título em Medicina da Família e Comunidade e 0,8% em Medicina Preventiva e Social.
CRM e escolas têm boa imagem Duas questões trataram diretamente da imagem que os graduandos têm da sua faculdade e da atuação do CRM. No segundo caso, 85,2% dos formando consideraram ótima ou boa a atuação do Conselho. Cerca de 18,0% classificaram como razoável e 3,6% como ruim. Com relação à faculdade em que estavam concluindo o curso, 81,9% disseram ter de sua escola uma imagem “ótima” ou “boa”. Cerca de 17% classificaram de razoável e apenas 0,8% avaliaram como ruim. Note-se que embora muitos graduandos tenham feito críticas às instalações e mesmo à atuação dos professores em seus cursos, a grande maioria diz ter uma imagem muito boa da escola. Outra questão tratou da opinião dos formandos sobre a resolução do CFM segundo a qual, a partir de 2006, os certificados de especialistas terão que ser atualizados a cada cinco anos. A grande maioria, 88,8%, disse estar a favor.
Para 37%, prova foi difícil No último bloco de questões, procurou-se saber dos alunos sua opinião sobre a qualidade e a adequação da prova realizada na primeira fase. As questões trataram sobre o nível de dificuldade, a extensão do exame, o tempo destinado à sua resolução e a clareza dos enunciados. A prova teve 120 questões e os alunos tiveram 4 horas para respondê-las. A maioria dos participantes classificou de“média” a dificuldade da prova, com 60,4%. Outros 36,8% classificaram de “difícil” e 0,4% de muito “difícil”. No outro extremo, 0,4%, avaliou a prova como “muito fácil” e 2,0% como “fácil”. 90
O PERFIL DOS NOVOS MÉDICOS
Na prova de 2007, o número de alunos que considerou a prova “difícil” foi 17,2% e 12,7% classificaram como fácil. Ou a prova de 2008 foi de fato mais difícil, ou os alunos estavam menos preparados. Na prova de 2005, 60,84% consideraram a prova como de “dificuldade média” e para 30,1% ela foi difícil. Na de 2006, 81,89% a classificaram como de dificuldade média e para 6,79% ela foi difícil. Com relação à extensão da prova, 34,8% a classificaram como “longa” e 12,4% como “muito longa”. A metade dos estudantes, ou 49,6%, avaliou a extensão da prova como adequada e 3,2% como curta ou muito curta. Em 2005, 55,24% a classificaram como adequada e 31,8% como longa. Em 2006, ela foi adequada para 66,42% e longa para 23,02%.
Enunciados foram claros e objetivos Também quanto ao enunciado das perguntas relativas à primeira fase, grande parte dos graduandos – 81,6% deles – disse que “a maioria das questões tinha enunciados claros e objetivos”. Outros 7,6% disseram que “todas as questões” eram claras e objetivas. Para 10,4% dos participantes, “apenas cerca da metade das questões” correspondiam a esse critério. E 0,4% disse que poucas questões tinham enunciados claros e objetivos. Em 2005, 71,0% disseram que a maioria das questões apresentaram enunciados claros e objetivos e em 2006 esse percentual foi de 74,72%. Vale lembrar que em 2005, ano em que uma maior porcentagem de estudantes classificou a prova de “difícil”, de “longa” e que mais ressalvas fizeram aos enunciados das questões, foi também o ano com maior índice de aprovação, 69%. Em 2006, foram aprovados 62% e em 2007, 44%. Em 2008, foram 39,0%. Ainda sobre a qualidade da prova, foi solicitado aos graduandos que avaliassem sua adequação em relação à formação que tinham recebido no curso. O grupo maior de estudantes – 60,4% deles – avaliou como boa, 8,0% como excelente, 24,8% como regular. Para 5,6%, houve uma “fraca adequação”. Em 2006, a avaliação “boa” foi dada por 71,70% e 16,23% disseram que foi excelente. 91
EXAME DO CREMESP
Abordagem do conteúdo foi a maior dificuldade Parte importante dos graduandos – 38,4% - atribuiu as dificuldades da prova à “forma diferente de abordagem do conteúdo”. Assim como para 13,2%, o que dificultou o desempenho foi a compreensão “do que era solicitado nas questões”. Para um grupo de 26,0%, a maior dificuldade foi o desconhecimento do conteúdo. E para 1,2%, a maior dificuldade foi a “falta de motivação para fazer a prova”. Um quinto dos estudantes – 20,8% deles – disse não ter tido “qualquer tipo de dificuldade para responder à prova”. Em 2006, os que disseram não ter tido dificuldade foram 27,92% e em 2005, 19,0%. De 2007 para 2008, cresceu de 19,4% para 26,0% a porcentagem de estudantes que atribui a maior dificuldade ao conhecimento do conteúdo.
Maioria das questões foi considerada adequada Nas últimas perguntas do questionário, foi solicitado aos graduandos que avaliassem a adequação das questões relativas às nove áreas de conhecimento que compuseram a prova da primeira fase do Exame de Habilitação. As respostas possíveis eram “muito adequadas”, “parcialmente adequadas”, “inadequadas” e “totalmente inadequadas”. Com exceção da Saúde Mental, em todas as outras áreas entre 45,0% e 56,0% dos estudantes classificaram as questões como “parcialmente adequadas”. Na Saúde Mental, essa porcentagem caiu para 22,4%, com 36,0% de questões inadequadas e 23,6% de totalmente inadequadas. Entre as disciplinas que tiveram maior número de questões “muito adequadas” estão Medicina Preventiva, com 44,4%, Clínica Cirúrgica, com 38,8%, e Pediatria, com 42,4%. A conclusão dos próprios alunos é, portanto, que a maioria das questões eram pertinentes e correspondiam ao conteúdo que constava da grade de ensino das diferentes áreas do conhecimento médico.
92
ANEXO 1 Diretrizes curriculares dos cursos de Medicina
Após ampla consulta às entidades médicas, escolas, professores, alunos e especialistas, o Conselho Nacional de Educação, por meio da Resolução nº 4, de 7 de novembro de 2001, instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina. Até hoje essas diretrizes permanecem como referência para as faculdades do País. Na prática, no entanto, muitas das escolas de Medicina estão longe de cumprir o que estabelecem as diretrizes curriculares. Veja a seguir os pontos principais dessa Resolução:
Perfil do formando egresso/profissional Deve ter formação generalista, humanista, crítica e reflexiva. Deve estar capacitado a atuar, pautado em princípios éticos, no processo de saúdedoença em seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectiva da integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser humano.
Competências e habilidades Competências Gerais: ■ Atenção à saúde: os profissionais de saúde, dentro de seu âmbito profissional, devem estar aptos a desenvolver ações de prevenção, promoção, 93
EXAME DO CREMESP
proteção e reabilitação da saúde, tanto em nível individual quanto coletivo. Cada profissional deve assegurar que sua prática seja realizada de forma integrada e contínua com as demais instâncias do sistema de saúde, sendo capaz de pensar criticamente, de analisar os problemas da sociedade e de procurar soluções para os mesmos. Os profissionais devem realizar seus serviços dentro dos mais altos padrões de qualidade e dos princípios da ética/bioética, tendo em conta que a responsabilidade da atenção à saúde não se encerra com o ato técnico, mas sim, com a resolução do problema de saúde, tanto em nível individual como coletivo; ■ Tomada de decisões: o trabalho dos profissionais de saúde deve estar fundamentado na capacidade de tomar decisões visando o uso apropriado, eficácia e custo-efetividade da força de trabalho, de medicamentos, de equipamentos, de procedimentos e de práticas. Para este fim, os mesmos devem possuir competências e habilidades para avaliar, sistematizar e decidir s condutas mais adequadas, baseadas em evidências científicas; ■ Comunicação: os profissionais de saúde devem ser acessíveis e devem manter a confidencialidade das informações a eles confiadas, na interação com outros profissionais de saúde e o público em geral. A comunicação envolve comunicação verbal, não-verbal e habilidades de escrita e leitura; o domínio de, pelo menos, uma língua estrangeira e de tecnologias de comunicação e informação; ■ Liderança: no trabalho em equipe multiprofissional, os profissionais de saúde deverão estar aptos a assumir posições de liderança, sempre tendo em vista o bem-estar da comunidade. A liderança envolve compromisso, responsabilidade, empatia, habilidade para tomada de decisões, comunicação e gerenciamento de forma efetiva e eficaz; ■ Administração e gerenciamento: os profissionais devem estar aptos a tomar iniciativa, fazer o gerenciamento e administração tanto da força de trabalho, dos recursos físicos e materiais e de informação, da mesma forma que devem estar aptos a ser empreendedores, gestores, empregadores ou lideranças na equipe de saúde; ■ Educação permanente: os profissionais devem ser capazes de aprender continuamente, tanto na sua formação, quanto na sua prática. Desta 94
DIRETRIZES CURRICULARES DOS CURSOS DE MEDICINA
forma, os profissionais de saúde devem ter responsabilidade e compromisso com a sua educação e o treinamento/estágios das futuras gerações de profissionais, mas proporcionando condições para que haja benefício mútuo entre os futuros profissionais e os profissionais dos serviços, inclusive estimulando e desenvolvendo a mobilidade acadêmico-profissional, a formação e a cooperação através de redes nacionais e internacionais.
Conhecimento, Competências e Habilidades Específicas ■ Promover estilos de vida saudáveis, conciliando as necessidades tanto
dos seus pacientes quanto às de sua comunidade, atuando como agente de transformação social; ■ Atuar nos diferentes níveis de atendimento à saúde, com ênfase nos atendimentos primário e secundário ; ■ Comunicar-se adequadamente com os colegas de trabalho, os pacientes e seus familiares; ■ Informar e educar seus pacientes, familiares e comunidade em relação à promoção da saúde, prevenção, tratamento e reabilitação das doenças, usando técnicas apropriadas de comunicação; ■ Realizar com proficiência a anamnese e a conseqüente construção da história clínica, bem como dominar a arte e a técnica do exame físico; ■ Dominar os conhecimentos científicos básicos da natureza biopsicosocio-ambiental subjacentes à prática médica e ter raciocínio crítico na interpretação dos dados, na identificação da natureza dos problemas da prática médica e na sua resolução; ■ Diagnosticar e tratar corretamente as principais doenças do ser humano em todas as fases do ciclo biológico, tendo como critérios a prevalência e o potencial mórbido das doenças, bem como a eficácia da ação médica; ■ Reconhecer suas limitações e encaminhar, adequadamente, pacientes portadores de problemas que não estejam ao alcance da sua formação geral; ■ Otimizar o uso dos recursos propedêuticos, valorizando o método clínico em todos seus aspectos; 95
EXAME DO CREMESP
■
Exercer a Medicina utilizando procedimentos diagnósticos e terapêuticos com base em evidências científicas; ■ Utilizar adequadamente recursos semiológicos e terapêuticos, validados cientificamente, contemporâneos, hierarquizados para a atenção integral à saúde, no primeiro,segundo e terceiro níveis de atenção; ■ Reconhecer a saúde como direito e atuar de forma a garantir a integralidade da assistência entendida como o conjunto articulado e contínuo de ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema; ■ Atuar na proteção e na promoção da saúde e na prevenção de doenças, bem como no tratamento e reabilitação dos problemas de saúde e acompanhamento do processo de morte; ■ Realizar procedimentos clínicos e cirúrgicos indispensáveis para o atendimento ambulatorial e para o atendimento inicial das urgências e emergências em todas as fases do ciclo biológico; ■ Conhecer os princípios da metodologia científica, possibilitandolhe a leitura crítica de artigos técnicos-científicos e a participação na produção de conhecimentos; ■ Lidar criticamente com a dinâmica do mercado de trabalho e com as políticas de saúde; ■ Atuar no sistema hierarquizado de saúde, obedecendo aos princípios técnicos e éticos de referência e contra-referência; ■ Cuidar da própria saúde física e mental e buscar seu bem-estar como cidadão e como médico; ■ Considerar a relação custo-benefício nas decisões médicas, levando em conta as reais necessidades da população; ■ Ter visão do papel social do médico e disposição para atuar em atividades de política e de planejamento em saúde; ■ Atuar em equipe multiprofissional; ■ Manter-se atualizado com a legislação pertinente à saúde. Com base nestas competências, a formação do médico deverá contemplar o sistema de saúde vigente no país, a atenção integral da saúde num sistema regionalizado e hierarquizado de referência e contra-referência e o trabalho em equipe. 96
DIRETRIZES CURRICULARES DOS CURSOS DE MEDICINA
Conteúdos curriculares Os conteúdos essenciais para o Curso de Graduação em Medicina devem estar relacionados com todo o processo saúde-doença do cidadão, da família e da comunidade, integrado à realidade epidemiológica e profissional, proporcionando a integralidade das ações do cuidar em medicina. Devem contemplar: ■ Conhecimento das bases moleculares e celulares dos processos normais e alterados, da estrutura e função dos tecidos, órgãos, sistemas e aparelhos, aplicados aos problemas de sua prática e na forma como o médico os utiliza; ■ Compreensão dos determinantes sociais, culturais, comportamentais, psicológicos, ecológicos, éticos e legais, nos níveis individual e coletivo, do processo saúde-doença; ■ Abordagem do processo saúde-doença do indivíduo e da população, em seus múltiplos aspectos de determinação, ocorrência e intervenção; ■ Compreensão e domínio da propedêutica médica – capacidade de realizar história clínica, exame físico, conhecimento fisiopatológico dos sinais e sintomas; capacidade reflexiva e compreensão ética, psicológica e humanística da relação médico-paciente; ■ Diagnóstico, prognóstico e conduta terapêutica nas doenças que acometem o ser humano em todas as fases do ciclo biológico, considerando-se os critérios da prevalência, letalidade, potencial de prevenção e importância pedagógica; ■ Promoção da saúde e compreensão dos processos fisiológicos dos seres humanos – gestação, nascimento, crescimento e desenvolvimento, envelhecimento e do processo de morte; atividades físicas, desportivas e as relacionadas ao meio social e ambiental.
Organização do curso O curso de graduação em Medicina deve ter um projeto pedagógico, construído coletivamente, centrado no aluno como sujeito da aprendizagem e apoiado no professor como facilitador e mediador do processo ensino-aprendizagem. A aprendizagem deve ser interpretada como um caminho que possibilita ao sujeito social transformar- se e transformar seu contexto. 97
EXAME DO CREMESP
Ela deve ser orientada pelo princípio metodológico geral, que pode ser traduzido pela ação-reflexão-ação e que aponta para a resolução de situações-problema como uma das estratégias didáticas. Este projeto pedagógico deverá buscar a formação integral e adequada do estudante por meio de uma articulação entre o ensino, a pesquisa, a extensão e a assistência. Porém, deverá ter a investigação como eixo integrador que retroalimenta a formação acadêmica e a prática do médico. As diretrizes curriculares deverão contribuir para a inovação e a qualidade do projeto pedagógico, orientando o currículo do curso de graduação em Medicina para um perfil acadêmico e profissional do egresso. Este currículo deverá contribuir, também, para a compreensão, interpretação, preservação, reforço, fomento e difusão das culturas nacionais e regionais, internacionais e históricas, em um contexto de pluralismo e diversidade cultural. O currículo do curso de graduação em Medicina poderá incluir aspectos complementares de perfil, habilidades, competências e conteúdos, de forma a considerar a inserção institucional do curso, a flexibilidade individual de estudos e os requerimentos, demandas e expectativas de desenvolvimento do setor saúde na região. A organização do curso de graduação em Medicina deverá ser definida pelo respectivo colegiado do curso, que indicará o regime: seriado anual, seriado semestral, sistema de créditos ou modular. A estrutura do curso de graduação em Medicina deverá: ■ ter como eixo do desenvolvimento curricular as necessidades de saúde mais freqüentes, referidas pela comunidade e identificadas pelo sistema de saúde; ■ utilizar metodologias que privilegiem a participação ativa do aluno na construção do conhecimento e a integração entre os conteúdos, além de estimular a interação entre o ensino, a pesquisa, a extensão e a assistência; ■ incluir dimensões éticas e humanísticas, desenvolvendo no aluno atitudes e valores orientados para a cidadania; 98
DIRETRIZES CURRICULARES DOS CURSOS DE MEDICINA
■
promover a integração e a interdisciplinaridade em coerência com o eixo de desenvolvimento curricular, buscando integrar as dimensões biológicas, psicológicas, sociais e ambientais; ■ inserir o aluno precocemente em atividades práticas relevantes para a sua futura vida profissional; ■ utilizar diferentes cenários de ensino-aprendizagem permitindo ao aluno conhecer e vivenciar situações variadas de vida, da organização da prática e do trabalho em equipe multiprofissional; ■ propiciar a interação ativa do aluno com usuários e profissionais de saúde desde o início de sua formação, proporcionando ao aluno lidar com problemas reais, assumindo responsabilidades crescentes como agente prestador de cuidados e atenção, compatíveis com seu grau de autonomia, que se consolida na graduação com o internato; ■ vincular, através da integração ensino-serviço, a formação médicoacadêmica às necessidades sociais da saúde, com ênfase no SUS.
Estágios A formação do Médico incluirá, como etapa integrante da graduação, estágio curricular obrigatório de treinamento em serviço, em regime de internato, em serviços próprios ou conveniados, e sob supervisão direta dos docentes da própria escola/faculdade. A carga horária mínima do estágio curricular deverá atingir 35% da carga horária total do Curso de Graduação em Medicina proposto, com base no Parecer/Resolução específico da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação. O estágio curricular obrigatório de treinamento em serviço incluirá necessariamente aspectos essenciais nas áreas de Clínica Médica, Cirurgia, Ginecologia-Obstetrícia, Pediatria e Saúde Coletiva, devendo incluir atividades no primeiro, segundo e terceiro níveis de atenção em cada área. Estas atividades devem ser eminentemente práticas e sua carga horária teórica não poderá ser superior a 20% do total por estágio. O colegiado do curso de graduação em Medicina poderá autorizar, no máximo, 25% da carga horária total estabelecida para este estágio, bem 99
EXAME DO CREMESP
como a realização de treinamento supervisionado fora da unidade federativa, preferencialmente nos serviços do Sistema Único de Saúde, bem como em Instituição conveniada que mantenha programas de Residência credenciados pela Comissão Nacional de Residência Médica e/ou outros programas de qualidade equivalente em nível internacional.
Atividades complementares Deverão ser incrementadas durante todo o curso de graduação em Medicina e as instituições de ensino superior deverão criar mecanismos de aproveitamento de conhecimentos, adquiridos pelo estudante, através de estudos e práticas independentes presenciais e/ou a distância. Podem ser reconhecidos: ■ Monitorias e Estágios, ■ Programas de Iniciação Científica; ■ Programas de Extensão; ■ Estudos Complementares; ■ Cursos realizados em outras áreas afins.
Acompanhamento e avaliação A implantação e desenvolvimento das diretrizes curriculares devem orientar e propiciar concepções curriculares ao Curso de Graduação em Medicina que deverão ser acompanhadas e permanentemente avaliadas, a fim de permitir os ajustes que se fizerem necessários ao seu aperfeiçoamento. As avaliações dos alunos deverão basear-se nas competências, habilidades e conteúdos curriculares desenvolvidos tendo como referência as Diretrizes Curriculares. O curso de graduação em Medicina deverá utilizar metodologias e critérios para acompanhamento e avaliação do processo ensino-aprendizagem e do próprio curso, em consonância com o sistema de avaliação e a dinâmica curricular definidos pela IES à qual pertence.
100
ANEXO 2 Principais conclusões da Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico (Cinaem) A Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico (Cinaem) buscou, ao longo de todo o processo de avaliação, criar uma consciência geral sobre a necessidade da avaliação permanente, de modo que os resultados pudessem ser autoaplicáveis. A idéia era que, constatado um problema ou uma deficiência, alunos, professores e gestores de cada escola pudessem buscar as melhores formas para superar suas falhas. A seguir, os pontos prioritários da Cinaem, conforme suas conclusões de 1997.
Problemas constatados 1. Falta de integração das escolas médicas com os problemas de saúde locais 2. Pouco comprometimento do governo com a educação 3. Proliferação de escolas médicas com objetivos comerciais 4. Ensino desvinculado da realidade de saúde da população 5. Pouco conhecimento do SUS por parte de alunos e professores 6. Estrutura curricular inadequada à realidade de saúde da população 7. Pouco estímulo à pesquisa e à iniciação científica 8. Interesses econômicos condicionando o ensino e a pesquisa 9. Formação humanista deficiente 10. Estrutura curricular tecnocêntrica 11. Infra-estrutura das escolas sucateada e inadequada 101
EXAME DO CREMESP
12. Condições de trabalho insatisfatórias para docentes, preceptores e demais profissionais 13. Processo de gestão burocrático e ineficiente 14. Baixo interesse e comprometimento de alunos e professores em relação à discussão dos problemas da escola e do ensino médico
Recomendações e propostas 1. Integração das escolas com o SUS e a comunidade 2. Política educacional do país favorecendo as Universidades 3. Modelo pedagógico integrando os ciclos básico e profissional e apresentando currículo interdisciplinar adequado à realidade social, orientando-se por critérios epidemiológicos 4. Incorporação adequada de tecnologias 5. Infra-estrutura adequada às atividades das escolas médicas, com programa de manutenção eficaz e racionalização do uso dos equipamentos 6. Dotações orçamentárias suficientes 7. Profissionais capacitados, contratados criteriosamente e remunerados condignamente por meio de um plano de cargos, carreiras e salários 8. Gestão autônoma, participativa e com perspectiva estratégica, enfatizando a avaliação contínua e global das escolas médicas 9. Comunidade acadêmica motivada e participativa, atuando ativamente nos programas de formação e gestão das escolas médicas
Principal diagnóstico O médico não se forma com a competência mínima para atender as demandas da população.
Principal resultado esperado A escola deve formar médicos com capacidade para atender – com postura ético-social desenvolvida – as necessidades de saúde da população.
102
PRINCIPAIS CONCLUSÕES DA CINAEM
Entidades que integraram a Cinaem (Regional São Paulo) ■ Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo ■ Associação Paulista de Medicina ■ Federação dos Médicos do Estado de São Paulo ■ Associação dos Médicos Residentes de São Paulo ■ Associação Brasileira de Educação Médica ■ Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina ■ Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior ■ Fórum dos Pró-reitores de Graduação ■ Conselho dos Secretários Municipais de Saúde de São Paulo ■ Conselho Estadual de Saúde (representante dos usuários)
103
ANEXO 3 Hospitais de ensino: a precariedade dos locais de estágio prático dos estudantes de Medicina
Em 2006 o Cremesp divulgou relatório após visita a 229 serviços pertencentes ou vinculados a escolas médicas no Estado de São Paulo e que recebem estudantes internos de quinto e sexto anos de Medicina. A constatação foi de que há sérias deficiências em boa parte dos serviços responsáveis pela formação prática dos futuros médicos. Dentre os problemas constatados pelo Cremesp encontravam-se instalações precárias para as atividades de ensino, procedimentos que não seguem o padrão ideal, ausência de supervisão adequada aos estudantes durante os plantões, preenchimento incorreto de prontuários de pacientes etc. Além da repercussão negativa na formação dos estudantes de Medicina, as deficiências encontradas podem prejudicar o atendimento à população. Muitos destes serviços são referências do sistema de saúde, pois além de prestarem assistência médica em geral, são responsáveis por atendimentos de urgência e procedimentos de alta complexidade. Os problemas são mais graves nas escolas que mantêm convênios com hospitais privados para o treinamento prático dos futuros profissionais. As informações constam de estudo realizado pela Comissão de Pesquisa e Ensino Médico (Copem) do Cremesp, para verificar a qualidade dos cursos de Medicina no Estado e ajudar na definição de diretrizes para as entidades e órgãos governamentais das áreas de saúde e educação. O trabalho, divulgado em 2006, foi iniciado em setembro de 2004 e concluído em janeiro de 105
EXAME DO CREMESP
2005 em 229 serviços de atendimento, sendo 53 hospitais, 52 prontossocorros, 42 ambulatórios e 82 unidades básicas de saúde). Os dados foram coletados por médicos fiscais do Cremesp, que seguiram um método especialmente desenvolvido, sob a coordenação da conselheira do Cremesp, e integrante da Copem, Maria do Patrocínio Tenório Nunes. Além de observar a adequação das instalações para as atividades de ensino, o trabalho procurou aferir o padrão dos procedimentos médicos em cada local de atendimento, como a presença de coordenadores dos estudantes ou a qualidade do preenchimento dos prontuários, e suas implicações no treinamento dos internos.
Falhas em prontuários Destaca-se o melhor desempenho obtido nos serviços médicos próprios das escolas de Medicina, contra um resultado sensivelmente pior dos serviços que mantêm convênios com as instituições de ensino. “Notamos que em muitos casos, os convênios não são documentados e, assim, não estabelecem claramente as obrigações de cada parte envolvida. Essa informalidade faz com que em alguns serviços haja certa improvisação ante a falta de uma biblioteca, de salas de aula ou de computadores conectados à Internet”, comenta a conselheira Maria do Patrocínio. Em relação ao preenchimento do prontuário, os dados mostram que parte desses documentos são preenchidos de forma inadequada. O descuido com esses registros é bem mais grave nos serviços conveniados, que apresentam 31% de inadequação em hospitais, 21% em ambulatórios e 22% em centros de saúde e UBSs. Nos serviços mantidos pelas próprias escolas, cerca de 93% a 100% dos preenchimentos são adequados. A melhor situação foi detectada em ambulatórios-escola, com 100% de correção. O pior índice encontra-se nos prontos-socorros conveniados, nos quais 41,9% do prontuários apresentam falhas. “A constatação é grave porque o prontuário é um instrumento fundamental para o acompanhamento da história do paciente. É inimaginável um médico que não saiba registrar as informações sobre seus pacientes conforme os padrões fixados nas normas”, comenta Maria do Patrocínio. 106
HOSPITAIS DE ENSINO
Ausência de supervisão Outro ponto grave anotado pela fiscalização do Cremesp é a ausência de supervisão adequada aos internos durante os plantões. Nos serviços médicos diretamente vinculados às faculdades, essa atribuição é normalmente responsabilidade de um docente ou preceptor em cerca de 77% dos casos, contra 38,5% nos estabelecimentos conveniados. Em muitos casos, a supervisão cabe ao residente ou ao diarista, que são também majoritariamente os profissionais aos quais os internos recorrem no caso de intercorrências. Na maioria dos hospitais visitados, os internos participam das visitas diárias aos leitos, com assistência de docentes na maior parte dos casos. A ausência do preceptor é comum em 75% dos hospitais conveniados e em 35% dos hospitais próprios das faculdades. A falta do docente é suprida principalmente por médicos diaristas e plantonistas, ou ainda por residentes. O tempo de estágio nas unidades de saúde também foi objeto do trabalho realizado pelo Cremesp. Embora a maioria dos internos permaneça entre quatro semanas (hospitais conveniados) e oito semanas (hospitais próprios), há casos de internos com estágios de uma semana ou menos. “Num prazo tão curto, o aluno sequer aprende onde estão guardados os materiais”, lembra Maria do Patrocínio. A conselheira avalia que, de forma geral, os internos encontram situações muito difíceis para um aprendizado adequado, já que os locais de trabalho freqüentemente não têm biblioteca, Internet ou salas de aula disponíveis. “Pior”, diz ela, é que “esses jovens estão se formando em ambientes às vezes caóticos, ao qual acabam se adaptando por falta de alternativa. Um estudante que estagie num pronto-socorro público desestruturado, onde tudo parece feio, velho, sujo e nada funciona, vai reforçar seu preconceito contra a saúde pública, estimulando a busca de emprego em serviços particulares. Isso é extremamente nocivo para a sociedade, que investiu na formação daquele jovem”, pondera Patrocínio. A seguir, os principais resultados da fiscalização do Cremesp nos locais de estágio prático. 107
EXAME DO CREMESP
Serviços de saúde vistoriados Hospitais
53
Prontos-socorros
52
Ambulatórios
42
Centros de Saúde/UBSs
82
Total
229
Vínculo com a faculdade: Hospitais – PSs – Ambulatórios – C. Saúde/UBSs Próprio
20
20
20
12
Conveniado
32
32
18
65
Sem vínculo
1
-
4
5
53
52
42
82
Total
Bibliotecas em hospitais de ensino: Tem – Não Tem Próprio
12
8
Conveniado
11
21
Sem vínculo
-
1
23
30
Total
Salas de aula em hospitais de ensino: Tem – Não tem Público
25
04
Privado
19
05
Total
44
09
Condições* da clínica médica em hospitais: Adequada – Inadequada Próprio
11
4
Conveniado
15
11
Total
26
15
Nota: Usou como indicadores a distância correta entre leitos, boas condições de higiene, rede de gases nos leitos e posto de enfermagem bem instalado
108
HOSPITAIS DE ENSINO
Existência de comissão de ética: Sim – Não Próprio
20
-
Conveniado
23
8
Sem vínculo
-
1
43
9
Total
Acesso à internet em hospitais de ensino: Tem – Não tem Próprio
17
3
Conveniado
17
15
Sem vínculo
-
1
34
19
Total
Qualidade* de prontuário médico: Adequado – Inadequado Próprio
14
1
Conveniado
17
9
Total
31
10
Nota: Prontuários foram escolhidos ao acaso e avaliados com base na Resolução CFM nº 1638 e Resolução Cremesp nº 70
Quem supervisiona os internos em hospitais: Docente/preceptor – Residente – Diarista/plantonista – Variável – Total Próprio
7
2
2
3
14
Conveniado
5
4
7
-
16
12
6
9
3
30
Total Fonte: Cremesp, 2006
109
ANEXO 4 Cursos de Medicina do Estado de São Paulo por ano de abertura e número de vagas por ano
INSTITUIÇÃO MANTENEDORA Ano de abertura
Sigla
Vagas/Ano
Natureza
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 1912
FMSP-USP
175
Pública estadual
Universidade Federal de São Paulo – Unifesp - Escola Paulista de Medicina 1933
Unifesp
110
Pública federal
Centro de Ciências Médicas e Biológicas da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - Campus Sorocaba 1950
PUCSP
115
Privada
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP 1952
FMRP-USP
100
Pública estadual
Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas – Unicamp 1958
Unicamp
110
Pública estadual
Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Unesp - Botucatu 1962
Unesp
90
Pública estadual
Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo 1963
FCMSCSP
100 111
Privada
EXAME DO CREMESP
Universidade de Taubaté 1967
Unitau
80
Privada
120
Privada
60
Privada
Centro Universitário Lusíada - Santos 1967
Unilus
Universidade de Mogi das Cruzes UMC 1968
UMC
Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto 1968
Famerp
64
Pública estadual
60
Privada
100
Privada
64
Privada
80
Privada
Faculdade de Medicina de Jundiaí 1968
FMJ
Faculdade de Medicina do ABC - Santo André 1969
FMABC
Fundação Padre Albino- Catanduva 1969
Fameca
Universidade de Santo Amaro - São Paulo 1970
Unisa
Universidade São Francisco - Bragança Paulista 1971
USF
80
Privada
80
Pública estadual
110
Privada
Faculdade de Medicina de Marília 1972
Famema
Pontifícia Universidade Católica de Campinas 1975
PUC-CAMP
Universidade do Oeste Paulista - Presidente Prudente 1987
Unoeste
120
Privada
Faculdade de Medicina da Universidade de Marília 1996
Unimar
100
Privada
80
Privada
120
Privada
Universidade Metropolitana de Santos 1997
Unimes
Universidade de Ribeirão Preto 1997
Unaerp 112
CURSOS DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Centro Universitário Barão de Mauá - Ribeirão Preto 1999
UFBM
60
Privada
100
Privada
Universidade Cidade de São Paulo 2002
Unicid
Universidade Camilo Castelo Branco - Fernandópolis 2003
Unicastelo
80
Privada
Centro Universitário Nove de Julho - São Paulo 2003
Uninove
100
Privada
60
Privada
Centro Universitário de Araraquara – Uniara 2005
Uniara
Universidade Federal de São Carlos Centro de Ciências Biológicas e da Saúde – Medicina - SP 2005
UFSCAR
40
Publica federal
100
Privada
Centro Universitário São Camilo 2007
Escola de Medicina da Universidade Anhembi-Morumbi 2007
100
Privada
Indefinido
Privada
Universidade Paulista 2007
UNIP
* As escolas abertas a partir de 2002 ainda não haviam formado turmas em 2008. Obs.: O número de vagas consta de informação ou material de divulgação das próprias escolas.
113
CONCLUSÕES
Após mais de 15 anos de dedicação do Cremesp à melhoria da formação médica, passado o tempo de diagnóstico, observação e análise, agora é crucial a tomada de posições. As evidências históricas, demonstradas no presente livro, descortinam um cenário atual intolerável. Escolas médicas mantém cursos medíocres, graduandos não adquirem a competência mínima necessária e, por isso, chegam despreparados ao mercado de trabalho. Trata-se de uma realidade que não pode continuar existindo. A indiferença e a inércia não condizem com a gravidade da situação. Não há justificativas razoáveis para que sejam adiadas medidas que , se colocadas em prática, poderão ensejar mudanças tão necessárias. Não podemos, por razões corporativas ou por limitações inclusive de legislação, ser complacentes em nossas ações. Não há motivo para, em detrimento de interesses específicos, embora legítimos, deixarmos de atuar em nome do interesse social, do direito à vida, à dignidade humana e à assistência médica de qualidade. Neste sentido, e pelo exposto na presente publicação, cabem algumas recomendações urgentes, de várias ordens, que não são necessariamente hierarquizadas, ao mesmo tempo que são complementares entre si. ■ Continuidade do Exame do Cremesp, de avaliação do desempenho dos estudantes do sexto ano de Medicina do Estado de São Paulo. 115
EXAME DO CREMESP
■ Implantação, em âmbito nacional, pelo Conselho Federal de Medi-
cina (CFM) e Conselhos Regionais, de um exame de avaliação dos egressos das escolas médicas. A avaliação poderia ser realizada duas vezes por ano em todos os Estados que contam com escolas médicas. ■ Aprovação, pelo Congresso Nacional, de Lei estabelecendo a obrigatoriedade do Exame, como condição para a obtenção do registro profissional de médico junto aos Conselhos Regionais de Medicina. Caberá ao CFM e aos CRMs a coordenação e a criação de estrutura para a aplicação do Exame. ■ Aperfeiçoamento do Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade) realizado pelo MEC nos cursos de Medicina. O MEC deve empreender supervisão rigorosa para que os cursos apresentem solução para os problemas verificados. Além da qualificação do quadro de professores, do projeto pedagógico da instituição, do número de vagas nos processos seletivos, da infra-estrutura adequada, da integração do curso com os sistemas de saúde locais, o MEC deve se ater à ampliação do conteúdo programático e dos módulos teórico-práticos do curso. O resultado do Enade de Medicina deve fazer parte do histórico escolar do aluno. ■ Que as Diretrizes Curriculares do MEC, para os cursos de graduação em Medicina, estabelecidas desde 2001, sejam definitivamente implantadas por todas as escolas médicas. ■ Devem ser incentivados e apoiados processos permanentes de avaliação, realizados pelas próprias escolas médicas, ao longo da graduação. ■ Que sejam buscados mecanismos de responsabilização ética e jurídica da instituição de ensino médico, sempre que comprovada a deficiência na formação oferecida. ■ “Congelamento” do processo de abertura de novos cursos de Medicina no Brasil até que seja concluída a avaliação criteriosa dos cursos já existentes, com diminuição do número de vagas e até mesmo fechamento das instituições de ensino sem condições de funcionamento. As recomendações acima elencadas, em consonância com o diagnóstico apresentado pelo Cremesp, são imprescindíveis, não apenas para mudar o rumo da educação médica no País, mas também vislumbram uma nova era no desenvolvimento da Medicina e da Saúde no Brasil. 116
CREMESP Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
Diretoria Presidente: Henrique Carlos Gonçalves. Vice-presidente: Renato Azevedo Junior. 1º Secretário: João Ladislau Rosa. 2ª Secretária: Silvia Helena Rondina Mateus. Tesoureira: Marli Soares. 2º Tesoureiro: Marco Tadeu Moreira de Moraes. Departamento de Comunicação: Nacime Salomão Mansur. Departamento Jurídico: Desiré Carlos Callegari. Corregedor: Krikor Boyaciyan. Vice-corregedor: Clóvis Francisco Constantino. Departamento de Fiscalização: Kazuo Uemura. Delegacias da Capital: Ruy Yukimatsu Tanigawa. Delegacias do Interior: Carlos Alberto Monte Gobbo.
Conselheiros (Gestão 2008-2013) Adamo Lui Netto, Akira Ishida, Alfredo Rafael Dell´Aringa, André Scatigno Neto, Antonio Pereira Filho, Bráulio Luna Filho, Caio Rosenthal, Carlos Alberto Herrerias de Campos, Carlos Alberto Monte Gobbo, Clóvis Francisco Constantino, Denise Barbosa Malek, Desiré Carlos Callegari, Eurípedes Balsanufo Carvalho, Gaspar de Jesus Lopes Filho, Henrique Carlos Gonçalves, Henrique Liberato Salvador, Ieda Therezinha Verreschi, Isac Jorge Filho, João Ladislau Rosa, João Márcio Garcia, José Henrique Andrade Vila, José Marques Filho, José Yoshikazu Tariki, Kazuo Uemura, Krikor Boyaciyan, Lavínio Nilton Camarim, Luiz Alberto Bacheschi, Luiz Flávio Florenzano, Marco Tadeu Moreira de Moraes, Maria do Patrocínio Tenório Nunes, Marli Soares, Mauro Gomes Aranha de Lima, Nacime Salomão Mansur, Pedro Teixeira Neto, Reinaldo Ayer de Oliveira, Renato Azevedo Junior, Renato Françoso Filho, Rodrigo Durante Soares, Rui Telles Pereira, Ruy Yukimatsu Tanigawa, Silvana Maria Figueiredo Morandini e Silvia Helena Rondina Mateus.
Copem-Comissão de Pesquisa e Ensino Médico Adamo Lui Netto, Akira Ishida, Alfredo Rafael Dell´Aringa, Carlos Alberto Herrerias de Campos, Desiré Carlos Callegari, Henrique Liberato Salvador, Ieda Therezinha do Nascimento Verreschi, Isac Jorge Filho, Luiz Alberto Bacheschi, Maria do Patrocínio Tenório Nunes, Reinaldo Ayer de Oliveira e Rodrigo Durante Soares.
“Parabenizo o Cremesp pelo excelente trabalho de avaliação do ensino médico em São Paulo. E acredito, sim, que a adoção dessa estratégia por outras unidades da federação poderiam acompanhar melhor, e melhorar, a formação de médicos no País”. José Gomes Temporão
“A avaliação deve ser feita em vários momentos do curso médico, com variados instrumentos de avaliação, que possam medir a aquisição de conhecimentos, de habilidades e atitudes médicas. A avaliação deve ser formativa, o avaliado deve ter sempre um retorno de sua avaliação para que possa se recuperar e a instituição deve ser responsável por essa recuperação.” Milton de Arruda Martins
“A escola que prepara mal dá o diploma e os Conselhos Regionais de Medicina funcionam como cartório. Registram o diploma e dão a carteira profissional autorizando o exercício. Isso precisa ser corrigido. Nos Estados Unidos, desde o início do século 20, os alunos são submetidos a um exame obrigatório para o exercício da profissão. Aqui no Brasil esse problema já vem sendo discutido há muito tempo. Em 1988 isso foi proposto, mas houve uma grande reação por parte dos alunos e dos sindicatos. Passaram-se quase 20 anos e aos poucos vai se consolidando a idéia de que é preciso esse exame. Tanto que em São Paulo, o Cremesp já há vários anos promove uma avaliação que revela resultados insatisfatórios.” Adib Jatene
“O exame do Cremesp mostra que o resultado final das nossas escolas deixa a desejar. Temos de promover grandes mudanças. Porém, defendo que essas mudanças devem ser promovidas pela própria escola médica. E temos de ser mais exigentes em relação à abertura de escolas e fechar aquelas que não oferecem educação adequada. Temos de reformar o ensino médico do País. Essa deve ser a grande revolução para dar tranqüilidade à população – que o médico que está saindo da faculdade tenha uma boa formação, independente da escola.” Giovanni Guido Cerri “A sociedade não pode ser prejudicada pela atuação de profissionais com formação acadêmica insuficiente; e o governo tem a obrigação de impedir essa agressão à população. Áreas como Medicina e Engenharia devem se espelhar no Direito e começar a aplicar exame ao final da graduação” José Aristodemo Pinotti
S
em ferramentas adequadas para a avaliação externa da qualidade do
ensino, e sem critérios na abertura de novos cursos, muitas escolas de Medicina correm o risco de sucateamento. Na esteira desse descuido, há riscos de piora do atendimento em saúde para a população, enquanto a profissão médica pode perder sua credibilidade e dignidade. No Exame do Cremesp de 2008, 61% dos graduandos não passaram por critérios mínimos exigidos para o exercício da profissão. Quatro anos atrás, em 2005, o índice de reprovação foi de 31%. O livro “EXAME DO
CREMESP: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A AVALIAÇÃO DO ENSINO MÉDICO”, é um alerta e um incentivo ao debate público necessário para a busca de soluções diante desse grave problema brasileiro da atualidade.
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo Rua da Consolação, 753 - São Paulo – SP 01301–910 – Tel: (11) 3017-9300 www.cremesp.org.br