Bairro Alto - Mutações e Convivências Pacíficas

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BAIRRO ALTO Mutações e Convivências Pacíficas


Direção Municipal de Cultura Departamento de Património Cultural Divisão de Arquivo Municipal




Índice Apresentação Inês Morais Viegas

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I - O Bairro Alto: da Lisboa Manuelina aos inícios do século XXI Hélder Carita

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II - De Vila Nova de Andrade ao Bairro Alto de São Roque - 1498, 1513 e 1554 Hélder Carita

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III - O Bairro Alto de São Roque e os Jesuítas: a nobilitação do Bairro Edite Alberto

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IV - O urbanismo e a arquitetura da Provedoria de Obras Reais Hélder Carita

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V - O Terramoto e a integração do Bairro Alto nos planos pombalinos Renata Araújo

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VI - Bairro Alto: os palácios e edifícios religiosos Maria João Pereira Coutinho

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VII - Bairro Alto: arquiteturas e vivências do pós-Terramoto ao dealbar do século XX António Miranda

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VIII - Bairro Alto, capital da Imprensa Portuguesa Álvaro Costa de Matos

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IX - “Tensão e Festa”: o ambiente e as novas tendências estéticas, culturais e sociais no Bairro Alto Miguel Andrade

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Fontes e bibliografia

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Imagens da exposição Bairro Alto - Mutações e Convivências Pacíficas

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Pormenor das escadarias do Palácio dos Marqueses de Minas na rua da Rosa Azulejos do 1º quartel do séc. XVIII Cláudia Damas, 2012 Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/LSB/200063

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APRESENTAÇÃO

O projeto Bairro Alto – Mutações e Convivências Pacíficas surge, a pretexto da ideia da comemoração dos 500 anos de existência do Bairro Alto, como meio de divulgação do acervo documental do Arquivo Municipal de Lisboa. Tendo como missão a preservação, descrição e promoção dos documentos produzidos pelo município, ou à sua guarda, este evento insere-se na política de disseminação cultural da instituição. O Arquivo Municipal de Lisboa inaugura a 15 de dezembro do corrente ano uma exposição no Palácio Pombal, que se prolongará até meados de fevereiro de 2013. O lançamento do catálogo e várias atividades associadas à exposição, como conferências e ações de caráter educativo, marcarão a participação do Arquivo nas comemorações. Pretende-se abordar a história do Bairro Alto através do estudo da sua arquitetura e urbanidade, evidenciando os principais edifícios construídos, como palácios e casas religiosas, identificando os locais de sociabilidade, pracetas e jardins, destacando-se as festas e as mutações sociais ocorridas ao longo dos tempos. O Terramoto de 1755 e a consequente reconstrução de Lisboa, tornou o Bairro Alto numa ilha dentro da cidade reforçando a sua identidade urbana. O seu caráter único que se mantem desde o aparecimento das redações de jornais até às discotecas, bares, restaurantes, galerias de arte, cabeleireiros, lojas de tatuagens, clusters de lojas originais de moda que foram surgindo ao longo das últimas décadas, reflete-se na diversidade e multiculturalidade das pessoas que o habitam e frequentam.

Brasão da cidade de Lisboa Livro do Regimento dos vereadores (Livro Carmesim), f.8v. 1502 Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/CMLSB/07/004

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No sentido de englobar a comunidade local no evento encontram-se envolvidas várias entidades como a Associação de Comerciantes do Bairro Alto, o Teatro do Bairro e outros serviços da Câmara da Municipal da Lisboa, destacando-se a Unidade de Intervenção Territorial Centro Histórico – Bairro Alto e a Hemeroteca. O arquiteto Hélder Carita, comissário do projeto, reconhecido investigador na temática da história da arquitetura e do urbanismo, associou investigadores de várias áreas do saber na elaboração dos textos que compõem o catálogo da exposição, produzido pela equipa do Arquivo Municipal de Lisboa. Pela dedicação, profissionalismo e exigência demonstrada com o projeto, a todos um especial agradecimento.

Inês Morais Viegas Chefe de Divisão do Arquivo Municipal de Lisboa


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O Bairro Alto: da Lisboa Manuelina aos inícios do século XXI

O Bairro Alto: da Lisboa Manuelina aos inícios do século XXI Hélder Carita* Com uma longa história de mais quinhentos anos, o Bairro Alto afirma-se hoje como um caso exemplar e um fenómeno de particular relevo dentro do urbanismo e da arquitetura portuguesa. Atravessando as mais variadas vicissitudes e mudanças de gosto, o Bairro Alto manteve uma identidade particular e uma dinâmica interna, contrariando uma tendência geral dos bairros do centro da cidade para a desertificação e perda de atividade social e económica. Como um organismo vivo o bairro nasce, adapta-se, transforma-se, resiste, manifestando ao longo dos séculos uma identidade própria e uma imensa capacidade de regeneração. Estas raras qualidades são dadas, não só, pela homogeneidade da sua malha urbana, que permaneceu inalterada durante mais de quatrocentos anos, como pela reduzida variação das suas tipologias e elementos de composição arquitetónica. A qualidade do conjunto edificado não se revela porém monótona, pois estes elementos sofrem com os séculos pequenas variações, dentro dos mesmos tipos, constituindo-se como um sistema quase infinito de variações sobre o mesmo tema que conferem ao ambiente unidade e vibração. Mantendo um delicado balanço, nas suas características essenciais, o estudo deste bairro exige uma reflexão alargada em contextos diversos mas inseparáveis, que se estendem do urbanismo e arquitetura à sociologia urbana ou história das mentalidades. A presente Exposição pretende divulgar os vários valores urbanísticos, arquitetónicos e sociais visando fortalecer uma consciência patrimonial face às recentes solicitações desta área como local de lazer, à escala da zona metropolitana de Lisboa, que colocam em perigo o seu delicado equilíbrio arquitetónico e humano. Na sua remota origem, o Bairro Alto inicia-se, em 1498, um pequeno núcleo urbano de ruas que, transbordando as antigas muralhas medievais da chamada Cerca Fernandina, se situavam junto às antigas Portas de Santa Catarina ( atual largo Camões). Designado por Vila Nova de Andrade, este núcleo rapidamente alastra com uma segunda fase de urbanização que se inicia em 1513 para norte e poente. * Instituto de História de Arte da UNL.

Vista da cidade de Lisboa Crónica de D. Afonso Henriques (de Duarte Galvão) Séc. XVI Cascais, Museu-Biblioteca Condes de Castro Guimarães MCCG-14

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De particular significado, no contexto do urbanismo manuelino, estes dois momentos do desenvolvimento da Vila Nova de Andrade ganham particular significado ao coincidirem, cada um, com o início de dois grandes programas de reorganização da Lisboa Manuelina que visavam dotar a cidade de uma imagem e uma nova estrutura urbana adequada a um então jovem Império. A racionalidade do seu programa urbano, constituindo uma das mais vastas operações imobiliárias da história da cidade, a par com a aplicação de novas normas arquitetónicas em implementação na época, expressam de forma exemplar um clima cultural de experimentalismo científico afeto aos Descobrimentos e a uma nova mentalidade de vertente moderna. Em meados do século XVI (1553) a instalação dos jesuítas junto à ermida de São Roque vai constituir um novo e importante foco de dinamização da zona ocidental da cidade. Vila Nova de Andrade ou o Arrabalde de Santa Catarina, como também era designado, perdem importância a favor de uma entidade urbana, que polarizada no alto de São Roque, passa a ser designada, de forma significativa, por Bairro Alto de São Roque. Em clara consonância com a instalação dos Jesuítas, tanto os frades do mosteiro da Santíssima Trindade como os Andrades iniciam, no ano de 1554, o aforamento da zona do Bairro Alto situada junto a norte e poente da Igreja de São Roque, dando origem uma terceira fase urbanística deste bairro. No crescente prestígio do Bairro não é estranha a divulgação do coche que ao contrário da cidade medieval e islâmica encontrava aqui um sistema de ruas desafogadas para a sua circulação. As qualidades urbanísticas do bairro, a par do prestígio dos Jesuítas vão contribuir para uma nobilitação do bairro. De uma vocação habitacional inicial direcionada para artífices especializados como, mestres pilotos, cartógrafos, calafates, mestres carpinteiros, pedreiros e pintores, vemos acrescentar-se uma habitação mais nobilitada de palácios e grandes casas que passam a imprimir uma vivência aristocrática na área, facto que se manterá por todo o século XVII e parte do século seguinte. O Terramoto de 1755 e o incêndio subsequente não afetaram de forma drástica o Bairro Alto. A sua resistência ao terramoto aliada à modernidade e racionalidade da estrutura urbana será motivo para que os arquitetos da Lisboa Pombalina confiram particular atenção ao bairro, integrando-o nos

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O Bairro Alto: da Lisboa Manuelina aos inícios do século XXI

grandes eixos de desenvolvimento viário e respetivo plano da cidade. A par dos grandes conjuntos urbanos pombalinos que se desenham para as ruas do Loreto e da Misericórdia, a zona da rua do Século (antiga Formoza) e a calçada dos Caetanos sofrem um processo de ordenamento urbano. Duas pequenas praças em forma de meia-laranja formam-se em frente do palácio do Marquês de Pombal, em articulação com a nova calçada dos Caetanos, numa intervenção urbana marcada por um gosto barroco na ondulação de volumes e na acentuação dos efeitos visuais. Na sua vivência social o bairro parece, no entanto, passar de moda como zona de residência para a aristocracia lisboeta, que opta na sua grande maioria por preferir viver nas suas quintas dos arredores da cidade; a maioria dos seus palácios urbanos é, no entanto, reabilitada para arrendamento mais popular. Pelos finais do século XIX, verificamos um ajustamento da malha e dos limites do Bairro contribuindo para uma maior identidade e coerência urbana. Os quarteirões da zona norte do bairro são retificados, sofrendo a antiga rua da Cotovia um forte alargamento. Com a designação de rua D. Pedro V, esta nova artéria completa o sistema de grandes vias que, envolvendo todo bairro, lhe conferem um notável sentido de unidade face a outros bairros ou zonas de Lisboa onde a demarcação dos limites não se conforma com a mesma clareza. Acrescentados em altura, os edifícios vão sofrendo uma sistemática renovação, densificando a população e conferindo uma maior efervescência e dinâmica ao dia-a-dia do Bairro.

Rua da Atalaia Fotógrafo não identificado, [entre 1898 e 1908] Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/FAN/000790

Numa outra vertente o Bairro afirma-se como um lugar de centralidade urbana no contexto da cidade de Lisboa, instituindo-se como uma espécie de ilha no meio da urbe. Perto do Chiado, onde, após o Terramoto, se concentra a nova burguesia do Marquês de Pombal, o Bairro Alto vai fortalecendo a sua identidade, onde convergem qualidades de centralidade que se associam a outros valores modelados pela forte privacidade do ambiente interior das suas ruas. A abertura do largo de Camões, pela demolição do velho e meio arruinado Palácio dos Marialvas, o reordenamento do largo da Misericórdia ou ainda a formação dos jardins de São Pedro de Alcântara e do Príncipe Real, embora situados na periferia do Bairro Alto, vão contribuir para a constituição de um conjunto de infraestruturas urbanas que acrescentam uma peculiar urbanidade ao bairro. Todo o interior constitui-se como uma vasta e 13


BAIRRO ALTO | Mutações e Convivências Pacíficas

coerente unidade habitacional situando-se as suas infraestruturas urbanas na periferia. Decorrendo de uma sedimentação de valores arquitetónicos e urbanos, ao longo do século XIX, o Bairro Alto é animado por um ambiente de intensa atividade cultural mercê de um vasto conjunto de jornais que aqui se instalam. Um pouco fora de moda como lugar de residência aristocrática, os antigos palácios constituem espaços ideais para a instalação destes jornais, mercê sobretudo dos grandes espaços de cocheiras e cavalariças onde se instalam os serviços e máquinas de impressão. Alçado com proposta de alterações em edifício na travessa da Água Flor Prospecto do prédio que Miguel Solano de Almeida pretende alterar, na travessa da Água Flor nº 7, freguesia de Nossa Senhora da Encarnação 1869 Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/CMLSB/ADMG-E/08/1185

À sua clara centralidade e proximidade ao Chiado, aos jornais associamse instituições como o Conservatório de Teatro que, convivendo com os próximos teatros da Trindade e do Ginasium, acentuam um ambiente de debate cultural e circulação de ideias. As noitadas de preparação dos jornais favorecem a multiplicação das casas de pasto, baiucas, tascas e tabernas, onde moradores do bairro se cruzam com jornalistas e escritores, num ambiente cultural de tertúlia marcado por uma certa boémia e transgressividade. Ao longo do século XX, o Bairro Alto mantém uma pacata animação. O bairro não se desertifica como outras zonas da cidade onde a população vai para a periferia. A par da população de estratos pobres, o bairro mantém uma forte presença de pequenas lojas de artífices e oficinas de carpinteiros, sapateiros, encadernadores... Se os jornais se vão deslocando para zonas de maior acessibilidade, permanece uma certa vida noturna com as tradicionais tascas e algumas casas de fado. Nos anos setenta do século XX, e após o golpe de Estado do 25 de Abril, o bairro começa a dar indícios de renovação no seu ambiente popular tradicional. De forma progressiva vão abrindo lojas de decoração, galerias de arte, bares e restaurantes que chamam cada vez mais uma juventude intelectual de tendências boémias e transgressivas. As noites, sobretudo nos fins de semana, atraem não só os lisboetas, mas também uma juventude vinda de zonas distantes, enriquecendo o ambiente de características claramente cosmopolitas.

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Rua da Atalaia nos inícios do século XX Fotógrafo não identificado, [entre 1898 e 1908] Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/FAN/001649

Com a abertura do Frágil, forma-se um ponto de encontro de referência para artistas, intelectuais, atores e o dito beautiful people. Num progressivo


O Bairro Alto: da Lisboa Manuelina aos inícios do século XXI

crescendo, na década de 90, continuam a multiplicar-se os bares, restaurantes e lojas de moda, onde a frequência transborda para as ruas que se enchem, num fenómeno que tem apenas paralelo nas chamadas noites de santos populares. A intensidade e dinâmica do Bairro atinge um equilíbrio instável entre moradores, comerciantes e tendências de terciarização – mas, mesmo assim, o Bairro Alto permanece.

Taberna na rua da Rosa Luís Pavão, 1979 Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/LUP/000003

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De Vila Nova de Andrade ao Bairro Alto de São Roque - 1498, 1513 e 1554

De Vila Nova de Andrade ao Bairro Alto de São Roque - 1498, 1513 e 1554 Hélder Carita I - LISBOA MANUELINA E AS ORIGENS DO BAIRRO ALTO Testemunho da Lisboa dos Descobrimentos, os primórdios urbanos do Bairro Alto integram-se numa conjuntura desenvolvida pela Casa Real durante o reinado de D. Manuel I, que visava dotar a cidade de Lisboa de uma imagem e de uma estrutura urbana adequada à sua novíssima condição de grande metrópole de um florescente comércio que se estendia a todo o Oriente. Numa clara interdependência, verificamos que a fundação do processo urbano do Bairro Alto, ainda como Vila Nova de Andrade, inicia-se em 1498, em sintonia com um primeiro programa de reordenamento da cidade de Lisboa iniciado neste mesmo ano1. Poucos anos depois, em 1513, processa-se e uma nova fase, mais ambiciosa, de Vila Nova de Andrade, coincidindo da mesma forma com um segundo conjunto de obras de ordenamento do centro da cidade de Lisboa iniciadas na sequência das grandes vitórias alcançadas pelas armadas portuguesas na Índia e respetiva consolidação do comércio com o Oriente. Vila Nova de Andrade nasce, assim, não como um fenómeno isolado mas como um elemento essencial das grandes estratégias urbanas desenvolvidas, ao longo do reinado de D. Manuel, para a cidade de Lisboa. Da mais importante cidade portuguesa, Lisboa emerge como jovem capital ou como era referido na altura como “cabeça do Reino”. A este fenómeno não é indiferente a chegada a Lisboa da armada de Vasco da Gama e a abertura definitiva de uma via marítima de comércio cuja alta rentabilidade colocava Lisboa no centro de grandes operações marítimas e comerciais. De forma inaugural e transbordando a antiga muralha fernandina, que corria ao longo das margens do Tejo, o programa de reordenamento urbano, iniciado em 1498, enceta um processo de definição de uma larga praça onde um novo paço real e um conjunto de edifícios de administração régia

Para um melhor conhecimento destes dois programas urbanos da cidade de Lisboa, consultar CARITA, Hélder - Lisboa Manuelina e a formação de modelos urbanísticos da época moderna (1495-1521). Lisboa: Livros Horizonte, 1999.

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Panorâmica de Lisboa em meados do século XVI Olissippo quae nunc Lisboa, civitates amplissima Lusitaniae, ad Tagum. Totis orientis, et multarum Aphricoeque et Americae emporium nobilissimum c. 1598 Reprodução de gravura em cobre Lisboa, Câmara Municipal de Lisboa, 1965

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O Bairro Alto de São Roque e os Jesuitas: a nobilitaçao do bairro

O Bairro Alto de São Roque e os Jesuítas: a nobilitação do Bairro Edite Alberto* “Nesta nova cidade, edificada de novo, no bairro alto, cheios de gente nobre e fidalgos ilustres; os valados toscos se trocaram em formosas ruas; o campo se fez cidade, o monte se converteu em corte e o sítio deserto se viu mudado em copiosa povoação, de sorte, que representa hoje aquele bairro huma bastante cidade...1 “

Em meados do século XVII, Baltasar Teles, cronista da Companhia de Jesus, descrevia deste modo as alterações inerentes à fixação dos padres jesuítas no Alto de São Roque2. Chegados a Portugal em 1540, fruto das conversações estabelecidas entre D. João III e Diogo de Gouveia, diretor do Colégio de Santa Bárbara de Paris, os religiosos instalaram-se primeiro no Convento de Santo Antão. Mais tarde, em 1553, estabelecem na zona ocidental da cidade a sua Casa Professa, na ermida de São Roque doada por D. João III à Companhia3. Este pequeno santuário, que se erguia fora da muralha fernandina, perto das Portas de Santa Catarina e perto da Torre de Álvaro Pais fora construído no reinado de D. Manuel para nele se venerarem as relíquias de São Roque, enviadas de Veneza, como santo protetor contra a peste. Agora, D. João III cede-o aos religiosos jesuítas na condição de conservarem sempre na igreja o título e invocação do santo. A cerimónia religiosa oficializando a doação ocorreu no dia 1 de outubro de 1553 com a presença do monarca, do príncipe D. João, do infante D. Luis, do arcebispo de Lisboa D. Fernando de Vasconcelos, da corte e da população atraída pela solenidade4. A cerimónia foi aberta pelo padre Francisco de Borja que então se achava em Lisboa e que fez a pregação evocativa do momento. * Arquivo Municipal de Lisboa. TELES, Baltasar - Chronica da Companhia de Jesu na provincia de Portugal.... Lisboa: Paulo Craesbeeck, 1645-1647, vol.2, p. 101

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Sobre a vida e obra do cronista Baltasar Teles, cf. GONÇALVES, Nuno da Silva - Baltasar Teles, cronista da Companhia de Jesus. In CARVALHO, José Adriano de Freitas - Quando os frades faziam História de Marcos de Lisboa a Simão de Vasconcellos. Porto: Centro Universitário de História da Espiritualidade, 2001, p. 95-100.

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A Ermida de São Roque foi escolhida em detrimento de outros quatro locais sugeridos para fundação da nova casa: as igrejas de Nossa Senhora do Paraíso (Campo de Santa Clara), Espírito Santo da Pedreira (Chiado), Nossa Senhora do Loreto e São Sebastião da Mouraria. Sobre este assunto cf. RODRIGUES, Francisco - História da Companhia de Jesus na Assistência de Portugal. Porto: Apostolado da Imprensa, 1931. tomo I, vol. I, p. 620-621.

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RODRIGUES, Francisco, op. cit., tomo I, vol. I, p. 623-625.

Portal maneirista do antigo Palácio Rebelo Palhares Atelier Hélder Carita, 2012

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O urbanismo e a arquitetura da Provedoria de Obras Reais

O urbanismo e a arquitetura da Provedoria de Obras Reais Hélder Carita

INTRODUÇÃO Nos seus valores patrimoniais, o Bairro Alto apresenta uma notável convergência de qualidades arquitetónicas, urbanísticas e vivenciais que se expressam, hoje, na sua inequívoca dinâmica económica e social. Fruto de um conjunto de circunstâncias que lhe permitiram a permanência do seu traçado urbano inicial, como, através dos séculos, a significativa estabilidade das suas morfologias arquitetónicas convergem para uma paisagem arquitetónica de marcada coerência urbana, que se exprime na forte identidade e na viva dinâmica social deste bairro. Constituindo-se como o primeiro traçado racionalizado da Época Moderna, a regularidade e coerência do seu traçado integra-se numa conjuntura alargada de grandes reformas administrativas, efetuadas durante o reinado de D. Manuel I, que tomaram o urbanismo como elemento essencial ás suas novas estratégias de centralização do poder real. É, porém, o cruzamento de um traçado, baseado numa malha ortogonal de quarteirões retangulares, com uma arquitetura urbana, marcada por uma notável unidade dos seus elementos constituintes, que se afirma como um dos mais significativos valores patrimoniais deste bairro. Situada entre a arquitetura erudita dos grandes monumentos e a arquitetura rural e popular, a arquitectura urbana que se desenvolve durante a Época Moderna não tem tido a suficiente atenção da historiografia. Considerada na sua unidade e harmonia como uma feliz coincidência, fruto de um certo génio popular, esta arquitetura releva, porém, uma matriz erudita decorrente de normativas e de uma teorização que pretendia dotar a cidade portuguesa de valores de uniformidade e coerência formal. Se o traçado do Bairro Alto nasce numa clara sintonia com as grandes reformas urbanas da Lisboa Manuelina, a formação da sua arquitetura urbana, decorre da Provedoria de Obras Reais cuja ação vai assegurar, ao longo dos séculos, valores estéticos marcados pela aplicação de idênticos elementos arquitetónicos, como das mesmas métricas, materiais e acabamentos.

Pormenor da planta da cidade de Lisboa, onde o traçado regular e ortogonal do Bairro Alto se destaca do emaranhado de ruas e becos de Lisboa Medieval Planta da cidade de Liª em que se mostrão os muros de vermelho com todas as ruas e praças dos muros a dentro com as declarações postas em seu lugar. Delineada por João Nunes Tinoco em 1650. Cópia de Carvalho Júnior. Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/11/456/01

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O Terramoto e a integração do Bairro Alto nos planos pombalinos

O Terramoto e a integração do Bairro Alto nos planos pombalinos Renata Araújo* Na Planta Topographica da Cidade de Lisboa (...) de 17581, em que se apresenta a síntese do plano de reconstrução da área mais arruinada da cidade, indicando a vermelho o que se mantinha e a amarelo o que se devia construir de novo, o Bairro Alto não aparece. Ou melhor, não se desenha a maior parte do bairro. A planta mostra um conjunto de quarteirões a sul da rua do Loreto (calçada do Combro), onde se propõem alguns alinhamentos e reconstruções, o que é importante de se ter em conta. Contudo a norte, aparece apenas a rua da Misericórdia, até a altura da igreja de São Roque, e uma segunda linha de quarteirões. Para oeste, para o interior do bairro, não há planta desenhada, apenas a indicação de que os quarteirões apontados continuavam. O que não se desenhou na planta de 1758 aparece na Planta topographica da Cidade de Lisboa (...) de cerca de 17772. Aqui novamente se indica a vermelho o que se conserva antigo e a amarelo o Projecto do Novo Plano. Nesta planta, em que se mostra a cidade pensada no seu todo, o Bairro Alto aparece como uma espécie de ilha desenhada a vermelho cercada de projeções de novas áreas desenhadas a amarelo. Indicam-se ali as novas áreas projetadas do Bairro das Águas Livres, a ordenação da rua do Colégio dos Nobres e da zona da Patriarcal e mais adiante a intenção grafada na planta da construção do que seria a nova Basílica da Estrela. Fica igualmente claro a renovação operada na zona das Chagas, a sul da rua do Loreto, a que o bairro estava vinculado na sua génese, e que aqui aparece já redesenhada e reconstruída em moldes pombalinos, desligando-se de certo modo do próprio bairro3.

* Universidade do Algarve; investigadora do CHAM-Centro de História de Além Mar da Universidade Nova de Lisboa. RIBEIRO, João Pinto - Planta Topographica da Cidade de Lisboa arruinada também segundo o novo Alinhamento dos Architectos Eugénio dos Santos e Carvalho e Carlos Mardel. s.d., cópia, publicada por SILVA, A. Vieira da - Plantas topográficas de Lisboa. Lisboa: CML, 1950.

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Museu da Cidade(MC) - Planta topographica da Cidade de Lisboa comprehendendo na sua extensão a beira Mar da Ponte d’Alcantara até o Convento das Comendadeiras de Santos, e sua largura da Real Praça do Comercio ate ao Collegio dos Religiosos Agostinhos descalços na Rua de São Sebastião da Pedreira. MC. GRA.0495.

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Cf. CARITA, Helder - Bairro Alto: tipologias e modos arquitectónicos. 2ª ed. Lisboa: CML, 1994. p. 32.

Planta com proposta de reconstrução da cidade de Lisboa Planta Topographica da Cidade de Lisboa arruinada também segundo o novo Alinhamento dos Architectos Eugénio dos Santos e Carvalho e Carlos Mardel. Vieira da Silva, Plantas Topográficas de Lisboa. Lisboa CML, s.d. Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/11/456/02

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Bairro Alto: os palácios e edifícios religiosos

Bairro Alto: os palácios e edíficios religiosos Maria João Pereira Coutinho1

Nos alvores do século XVII, a malha urbana do Bairro Alto apresenta potencialidades em alguns dos seus loteamentos que a tornam permeável à construção de edifícios civis e religiosos, de dimensões consideráveis, que se demarcam do restante casario pelo carácter erudito que ostentam, quer na articulação de inúmeros volumes que os compõem, quer no que concerne às composições das suas fachadas2. O traçado ortogonal, referido de sobremaneira por Hélder Carita e por Leonor Ferrão, entre outros autores3, permite grosso modo uma construção regular, de acordo com uma estética chã, onde a valorização da fachada passa pela presença de portais e de ritmos horizontais e verticais criados a partir da disposição de janelas, e da sua dimensão, intimamente ligada à função de cada piso, bem como da presença de pilastras e cunhais. Na génese da transformação urbana do bairro, do florescimento de casas de famílias aristocráticas, ou das de prestadores de serviços à corte (desembargadores, como André Valente4, cujo topónimo ainda resiste, Francisco Nunes Cardeal5, António Leite de Campos e Joaquim Oliveira

Membro do Instituto de História da Arte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Bolseira do projeto “Lisboa em Azulejo antes do Terramoto” (PTDC/EATEAT/099160/2008)

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Neste sucinto texto não se referem todas as edificações religiosas e civis do Bairro Alto de que há conhecimento na atualidade mas somente as que consideramos serem de maior relevo para a construção da ideia de monumentalização da zona.

2

Cf. CASTILHO, Júlio de - Lisboa Antiga: o Bairro Alto de Lisboa. 2ª ed. Lisboa: Antiga Casa Bertrand, 1902 (1.ª ed. 1879); CARITA, Helder - Bairro Alto, tipologias e modos arquitectónicos. Lisboa: Câmara Municipal, 1994; CARVALHO, Gabriela de - Bairro Alto (História do Urbanismo), in SANTANA, Francisco; SUCENA, Eduardo (dir.) - Dicionário da História de Lisboa. Lisboa: Carlos Quintas & Associados, 1994. p. 124-125; FERRÃO, Leonor - Lisboa Barroca: da Restauração ao Terramoto de 1755. Desenvolvimento urbanístico. Os palácios e os conventos, in MOITA, Irisalva (coord.) - O livro de Lisboa. Lisboa: Livros Horizonte, 1994. p. 239-282 e CARITA, Hélder - A Igreja, a Rua Larga e o Bairro Alto de São Roque. Património Arquitectónico, Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Lisboa: Museu de São Roque, 2006. p. 18-35, por nós considerados os textos com maior relevo sobre o assunto.

3

O desembargador André Valente terá vivido na primeira metade do séc. XVII no Bairro Alto, apesar de possuir um palácio em Arroios, onde também terá residido.

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Este desembargador faz obras significativas na sua propriedade em 1734. Cf. Arquivo Municipal de Lisboa (AML) - Livro dos Cordeamentos (1730-1737), s. n.º fl., referido por CARITA, Helder - A Igreja, a Rua Larga e o Bairro Alto de São Roque (...), p. 31.

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Palácio dos Sousas do Calhariz/Palmela sendo visível parte do seu antigo jardim, antes das obras realizadas no século XX Coleção de Alexandre Cunha Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/ACU/002522

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Bairro Alto: arquiteturas e vivências do pós-Terramoto ao dealbar do século XX

Bairro Alto: arquiteturas e vivências do pós-Terramoto ao dealbar do século XX António Miranda* No rescaldo do Terramoto de 1755 o Bairro Alto resistia praticamente incólume. Os efeitos da catástrofe e do incêndio sequente lamberam as franjas sul e nascente do conjunto renascentista, respetivamente atuais ruas do Loreto e da Misericórdia. As opções urbanísticas e arquitetónicas propostas no plano da reconstrução pombalina para a zona vieram reforçar a ideia deste conjunto urbano enquanto ilha dentro da cidade. A alteração predial dos lotes mas, sobretudo, a uniformização da gramática e volumetria das novas construções, que, como escreve Hélder Carita, vão “adquirir uma escala de monumentalidade que se estrutura como muralha de envolvimento da malha interior do bairro,”1 acabaram por, ao isolálo, reforçar a identidade urbana que o individualizou da demais cidade, definindo com precisão os seus limites. Planeados na lógica de quarteirões uniformes, os conjuntos urbanos projetados para as referidas ruas abriam para o exterior, virando costas ao bairro. No limite poente definido pela atual rua do Século, antiga rua Formosa, o Bairro Alto irá conhecer uma outra solução urbanística que constituirá a maior ruptura do seu tecido urbano. Não que o Terramoto tivesse tido grande impacto por estas zonas, mas antes por iniciativa do próprio José Sebastião de Carvalho e Melo, futuro marquês de Pombal, que, paralelamente às obras que efetuava na casa de família, era o mentor de uma profunda remodelação urbanística na sua envolvente, iniciada em 1760 quando o, então, Conde de Oeiras cedeu, para benefício público e obra das Águas Livres, propriedades que possuía no lado oposto da rua Formosa, fronteiras ao seu palácio, pelo que o engrandecimento da envolvente passava a ser um desígnio de Estado. Nas proximidades seu irmão Paulo de Carvalho e Mendonça adquiria, três anos depois, umas casas vizinhas, mas é a compra, no ano seguinte de 1764, que o Conde de Oeiras faz de parte da cerca do convento dos Caetanos, que vai introduzir um novo arruamento, criado de raiz, no bairro. Trata-se da calçada Nova dos Caetanos, atual rua João Pereira Rosa.

* Unidade de Intervenção Territorial Centro Histórico - Bairro Alto. 1

CARITA, Hélder - Bairro Alto, tipologias e modos arquitectónicos. Lisboa: CML, 1990. p.59.

Planta do Bairro Alto [Atlas da carta topográfica de Lisboa]: planta n.º 35 Direção de Filipe Folque, 1856-1858 Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/05/01/44

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Bairro Alto, capital da Imprensa Portuguesa

Bairro Alto, capital da Imprensa portuguesa Álvaro Costa de Matos* INTRODUÇÃO Durante bastante tempo, desde a segunda metade do século XIX até cerca de 1974, o Bairro Alto, em Lisboa, funcionou como uma espécie de capital da imprensa portuguesa. Com efeito, a partir de 1850 assistiu-se à concentração de jornais nesta zona da cidade (por razões diversas, como iremos ver, num fenómeno que coincidiu com a explosão do periodismo lisboeta e nacional), que, com o passar dos anos, forjou um ambiente de intensa atividade cultural e boémia. O Bairro Alto adquiriu assim uma vivência muito peculiar, que contrastava com a dos outros bairros da cidade. Era profundamente marcado pelo afã da vida jornalística, do trabalho das tipografias, da recolha dos jornais pelos ardinas, o que originava, portanto, uma animada vida noctívaga, que trouxe novas funcionalidades às antigas cocheiras e cavalariças, agora transformadas em redações, composições ou impressões dos jornais. Mas o dia não era menos excitante, com os moradores e comerciantes a cruzarem-se com os jornalistas, escritores, caricaturistas e ilustradores, e mesmo com políticos famosos, pelo que o Bairro Alto quase que não dormia. A instalação de outros equipamentos, como o Conservatório do Teatro, a par da atividade das instituições culturais já existentes, como o Conservatório Nacional de Música, ou das que se encontravam localizadas nas fronteiras ou na periferia do Bairro Alto, como o Teatro da Trindade, o S. Carlos, o Grémio Literário, a Livraria Bertrand, a Brasileira, os salões de arte, entre muitos outros, aumentou a oferta cultural da capital, diversificou-a, captando, desta forma, novos públicos, por outras palavras, acentuou “um ambiente de debate cultural e circulação de ideias”, fazendo do Bairro Alto, e do Chiado, o coração artístico e cultural da cidade de Lisboa. Em 1913, António Cobeira, um dos principais cronistas da revista ilustrada O Ocidente, para contrastar com o “dolorosíssimo abatimento (...) por que vai passando a nossa nacionalidade”, destacava o “movimento crescente e magnífico da Literatura e Arte”, que se vivia na cidade de Lisboa, protagonizado, em * Coordenador da Hemeroteca Municipal de Lisboa. Investigador do Centro de Investigação Media e Jornalismo, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova de Lisboa.

Instalações do jornal O Século, na antiga rua Formosa, hoje rua do Século Joshua Benoliel, 1917 Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/JBN/001280

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“Tensão e Festa”: o ambiente e as novas tendências estéticas, culturais e sociais no Bairro Alto

“Tensão e Festa”: o ambiente e as novas tendências estéticas, culturais e sociais no Bairro Alto Miguel Andrade * Até 1974, o Bairro Alto acompanhava o processo de decadência e desertificação da cidade, com a ausência de estratégias políticas de requalificação urbana e a sangria dos habitantes para bairros periféricos ou mesmo outros concelhos da Área Metropolitana de Lisboa. Mantinha, no entanto, características que viriam a ser determinantes para a atração de uma nova geração que irrompeu graças à liberalização dos costumes e à abertura aos movimentos culturais e artísticos internacionais, possíveis após o fim da ditadura. Entre os fatores que contribuíram para essa originalidade do bairro estava, desde logo, a localização geográfica: em pleno centro da cidade e colado ao Chiado, tradicionalmente ligado à alta cultura das livrarias, dos teatros e dos movimentos artísticos e políticos do século XIX e XX. O local concentrava ainda algumas redações de jornais e tipografias que, durante o dia, povoavam o bairro de jornalistas, figuras públicas e demais trabalhadores das empresas de jornais, e noite mantinham uma atividade contínua, com a movimentação de ardinas e de pessoal da distribuição dos diários e semanários. A permanência noturna de intelectualidade ligada à escrita, nos muitos locais que ficavam abertos até altas horas, permitia a mistura de diferentes classes sociais, nos restaurantes, tascas, prostíbulos e demais locais de maior e menor respeitabilidade social. A presença do Conservatório no Bairro Alto e a proximidade da Faculdade de Belas Artes, também foram fatores de abertura e renovação constantes. Finalmente, a própria configuração urbanística contribuiu para a nova dinâmica social ocorrida no final dos anos 70. Apesar de tendencialmente ortogonal, o bairro é propenso ao recato das suas ruas estreitas, com entradas e saídas controláveis do interior, e um edificado que, apesar de organizado, é fechado para quem vem de fora. Configuração ideal para permitir o isolamento do resto da cidade face ao que se passa lá dentro. Estes factos ajudaram a manter um ambiente bairrista, simultaneamente transgressor e permissivo, com fadistas, prostitutas e famílias humildes, que tanto atraiu os primeiros modernos nos anos iniciais da Democracia. * Jornalista - SIC.

Rua da Barroca Fotógrafo não identificado, (entre 1898 e 1908) Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa PT/AMLSB/FAN/000806

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FICHA TÉCNICA Câmara Municipal de Lisboa Direção Municipal de Cultura Departamento de Património Cultural Divisão de Arquivo Municipal

CATÁLOGO Direção e coordenação executiva: Inês Morais Viegas, Marta Gomes Coordenação geral: Hélder Carita Coordenação da edição: Edite Alberto, Rui Pedro Pereira Texto institucional: Inês Morais Viegas Estudos e investigação: Álvaro Costa de Matos, António Miranda, Edite Alberto, Hélder Carita, Maria Cecília Cameira, Maria João Pereira Coutinho, Miguel Andrade, Renata Araújo, Rui Pedro Pereira Design: Joana Pinheiro, Marília Afonso Digitalização: Luis Ramos, Manuela Pires, Marco Alves, Nelson Roque, Ricardo Salgado, Sandra Campos Impressão e acabamentos: CML/ Imprensa Municipal (miolo), Ducover (capa) Tiragem: 1000 exemplares ISBN: 978-972-8517-54-0 Depósito Legal:

EXPOSIÇÃO: Direção e coordenação executiva: Inês Morais Viegas, Marta Gomes Comissariado: Hélder Carita Comissariado científico: Edite Alberto, Rui Pedro Pereira Produção e coordenação das exposições: Sofia Castro Montagem: Alexandra Nunes, Ana Paula Rafael, Cláudia Damas, Joana Pinheiro, José Luis Neto, Marília Afonso, Rui Luciano, Sofia Castro Projeto de iluminação: José Luis Neto Tratamento documental: Fernando Dias, Maria Cecília Cameira, Maria José Silva, Paula Serafim, Rui Pedro Pereira, Vasco Brito Digitalização: Luis Ramos, Manuela Pires, Marco Alves, Nelson Roque, Ricardo Salgado, Sandra Campos Restauro: Adriana Ferreira, Ana Paula Rafael, Helena Nunes Design: Joana Pinheiro, Marília Afonso Comunicação e divulgação: Carla Manso, Paula Candeias Tradução: Anabela Esteves Serviço Educativo: Alexandra Nunes, Ana Brites, Paula Cunca, Vitória Pinheiro Secretariado: Ana Tavares, Sofia Macedo Colaboração: Fernando Matos, Manuela Tavares, Filomena Júlio, Jacqueline Ferreira

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BAIRRO ALTO | Mutações e Convivências Pacíficas

VÍDEO: Produção: AML - Videoteca Realização e Argumento: Fernando Carrilho Consultoria: Hélder Carita Montagem: Miguel Amaral Som: Pedro Lourenço Animação gráfica: Fátima Rocha

CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS: Arquivo da Fundação António Quadros, Arquivo Municipal de Lisboa, Atelier Hélder Carita, Biblioteca e Arquivo Histórico das Obras Públicas, Biblioteca Nacional de Portugal, Carlos Barroco, Cláudia Damas, Hemeroteca Municipal de Lisboa, Família Abel Manta, José Balbino, Luís Pavão, Manuel Reis, Meluxa, Museu-Biblioteca Conde de Castro Guimarães, Museu da Cidade, Coleção Marqueses de Ficalho, Rosa Tyszkiewicz.

COLABORAÇÃO: Arquivo da Fundação António Quadros Biblioteca e Arquivo Histórico das Obras Públicas Biblioteca Nacional de Portugal Carpe Diem Arte e Pesquisa Museu-Biblioteca Conde de Castro Guimarães Santa Casa da Misericórdia de Lisboa Teatro do Bairro C.M.L.: Divisão de Manutenção da Frota Departamento de Património Cultural Divisão de Gestão e Manutenção de Edifícios e Apoio aos Serviços Divisão de Execução de Manutenção de Instalações Elétricas e Mecânicas Divisão de Organização de Eventos e Protocolo Gabinete de Estudos Olisiponenses Hemeroteca Municipal de Lisboa Museu da Cidade

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AGRADECIMENTOS: Associação 31 de Janeiro; Café Luso; Galeria Zé dos Bois; Galeria Leo; Livraria J. C. Silva; Atelier 31 D’Atalaia; Atelier Teresa Lacerda; Atelier Fábrica dos Chapéus; Loja Rosa da Rua; Espaço Fátima Lopes; Loja Lena Aires; Loja Cork & Co; Loja Sneakers Delight; Loja GDEGaleria de Exclusivos; Bar Portas Largas; Restaurante Pap’Açorda; Restaurante Bota Alta; Restaurante A Rosa da Rua; Café-Bar Arroz Doce A TODAS AS PESSOAS DO BAIRRO ALTO QUE APOIARAM ESTA EXPOSIÇÃO: António Vieira de Castro; Anthony Millard; Carlos Baltazar; Carlos Guerreiro; Conchita; Cristina Almeida; D. Mirocas; Dulce Albuquerque; Fátima Lopes; Fátima Martins; Fátima Pinheiro; Fernando Fernandes; Francisco Gonçalves; Hernâni Miguel; Ilídio António; Isabel Manta; Joana Fortes; João Franco; José Miranda; José Pinho; Lena Aires; Luís Rodrigues; Madalena Barbosa; Manuel Calçada; Manuel Dias; Manuel Pais; Manuel Reis; Maria Domingues; Maria do Sacramento Martins; Miguel Andrade; Paulo Cassiano; Rosário Valério; Teresa Terreira de Almeida; Teresa Lacerda; Teresa Seabra; Vasco Antunes

Paralelamente foi organizada pelo Arquivo Municipal de Lisboa a exposição de fotografia N 38º42’47.5” W 9º 8’43.75” de Cláudia Damas sobre o Bairro Alto, patente ao público entre 14 dezembro de 2012 e 15 de fevereiro de 2013 no Arquivo Municipal de Lisboa/ Fotográfico.

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