Reportagem cami itaim

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MAIS UM DIA NO ITAIM A rotina ca贸tica e glamorosa do bairro que mais cresce em S茫o Paulo

Por Daniel Lopes e Camila Gregori


Vista aérea do bairro Itaim Bibi, zona Oeste de São Paulo

N

ão são nem sete horas da manhã, mas a quantidade de pessoas na rua é impressionante. Ao som de buzinas e escapamentos, crianças e jovens, distraídos com os seus caríssimos smartphones, são deixados na escola pelos pais ou pelas babás (sempre uniformizadas). Engravatados caminham apressados para dentro dos mais sofisticados arranha-céus, enquanto outras pessoas, vestidas de maneira bem mais simples, saltam dos ônibus. Os pedestres disputam lugar com os carros e ônibus que já estão na rua desde cedo também. Não demora muito para que onde quer que você olhe, seja possível ver um engarrafamento. Os termômetros não marcam mais do que quinze graus, o ar gelado é uma constante logo cedo. Mais um dia, então, começa no Itaim Bibi. BAIRRO EM EXPANSÃO Distrito da Zona Oeste de São Paulo, o Itaim Bibi é um dos locais que mais cresceu nos últimos 30 anos na capital e não tem previsão para parar de se expandir. Pouco mais de 93 mil pessoas vivem atualmente no Itaim, que se divide em outros bairros menores como Vila Olímpia e Brooklyn, numa área de 10km² segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Muito maior é a quantidade de gente que se desloca até lá diariamente. São 143 prédios empresariais na região que,

somados, agrupam quase doze mil funcionários, além, é claro, da força do comércio de rua que atrai mais algumas centenas de trabalhadores ao bairro todos os dias.O Itaim abriga as sedes das principais empresas nacionais e estrangeiras da cidade como Unilever e Santander, além de ser o local onde se encontram os escritórios dos principais conglomerados hi-tech do mundo como Yahoo, Google, Microsoft, Intel, Motorola e o Facebook (cujo único escritório na América Latina fica no bairro), o que levou alguns executivos a apelidarem a região como o Vale do Silício Paulista. Meio-dia, hora do almoço. É quase impossível andar nas ruas com tanta gente deixando o escritório para almoçar. O trânsito continua ruim, se não pior, com os pais indo buscar as crianças na escola. O comércio ferve. A Rua João Cachoeira (conhecida como o “Shopping a Céu Aberto) preserva as antigas lojas de rua em três quarteirões. São diversas opções desde roupas e sapatos até tapetes árabes e celulares falsificados da China. A oferta de serviços no Itaim Bibi é maior do que a de qualquer outro bairro da cidade, até mesmo que a região da Avenida Paulista. São 313 restaurantes, 263 bares e lanchonetes, 39 farmácias, dezessete padarias e onze supermercados. A facilidade de ter tudo à sua mão pode ter sido o principal fator que

CRÉDITO: encontraitaim.com.br

convenceu Analice Moura a se mudar. Antiga vizinha da USP no Butantã, a secretária já trabalhava no bairro por dez anos quando decidiu vir para perto do serviço. “Levava cerca de uma hora para chegar em casa todos os dias” relembra. “Além de trabalhar aqui, coloquei meus filhos estudando no bairro também. Agora posso fazer tudo a pé. Sair de casa dez minutos antes do trabalho e almoçar com eles todos os dias não tem preço” comemora Analice que já está vivendo no bairro por quase cinco anos. LUXO PARA POUCOS O movimento em direção ao Itaim veio se intensificando nos últimos anos. Os corretores já perceberam um curioso fenômeno: os novos moradores do bairro passaram a acompanhar a migração de suas empresas. Um dos grandes problemas de trabalhar e não viver no bairro é chegar até lá. Nenhuma das cinco linhas do metrô de São Paulo chega ao local. A oferta de ônibus é relativamente grande, mas os veículos demoram para passar e os terminais mais próximos são o Santo Amaro e o Capelinha, ambos bem distantes do Itaim. Sem muitas opções de transporte público, os carros são esmagadora maioria e o trânsito nas grandes avenidas como a Juscelino Kubitschek e a Brigadeiro Faria Lima é caótico durante todo o dia. O maior

desejo das pessoas que chegam ao bairro atualmente, em geral jovens casados, entre 27 e 30 anos, é, assim como Analice, estar perto de onde trabalham. A comodidade, porém, custa caro. Um levantamento da EMPRAESP (Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio) indica que o metro quadrado dos lançamentos residenciais no Itaim custa em torno de 13.400 reais, cerca de 150% acima da média paulistana. O lugar acaba sendo uma cidade-dormitório ao contrário: poucos dormem, muitos trabalham. Nos domingos de manhã, o Itaim é quase uma cidade-fantasma. É possível contar o número de pessoas e carros nas ruas e o máximo que se ouve são latidos de um cachorro abandonado que passeia em frente a vitrines de lojas fechadas. É esse o reflexo de um bairro que se expandiu muito nos últimos tempos, mas que cresceu tanto para acomodar as empresas que acabou por afastar antigos moradores. Marilia Buonomo nasceu no Itaim, ainda na década de 50. O bairro, na época ainda chamado de Chácara Itaim, era de fato rural. Casas muito simples em ruas de terra, cercadas de brejos. “Era como uma cidadezinha de interior. Ninguém queria morar aqui porque ficava muito distante do centro” explica Marilia que viveu no Itaim até 1992 até se mudar para o Campo Limpo. “Depois da criação da Faria Lima (na década de 60), muitas empresas vieram se instalar aqui. Alguns anos depois, o bairro começou a ficar mais moderno. A casa que eu vivi foi demolida e hoje dá lugar para um prédio empresarial enorme”. Silvia Pereira trabalha no prédio que um dia foi a casa de Marilia desde 1989. A ex-datilógrafa precisa pegar dois ônibus e o trem da CPTM se quiser vir do Capão Redondo, onde vive, ao bairro. A opção que resta é enfrentar o congestionamento diário. “Mais de uma hora todos os dias para vir e para voltar. É estressante” desabafa.

Os prédios dominam a paisagem do bairro

“É lógico que eu gostaria de viver aqui, mas o Itaim é para poucos”. ESTILO E SOFISTICAÇÃO Final da tarde, início da noite. Durante a semana, a luz dos faróis dos carros em fila, todos parados, pode chegar a ser encantadora para quem vê, mas desesperadora para os presos no trânsito. As principais avenidas do bairro como a Nove de Julho e a São Gabriel parecem grandes estacionamentos, os veículos se movem lentamente entre as 17h e as 20h. Porém, no fim de semana, a história muda. O trânsito continua lá, mas a vida noturna do bairro fervilha. Os barzinhos próximos à Vila Olímpia ficam apinhados de gente saindo do trabalho, pronta para aproveitar o happy hour. A região também é conhecida por casas noturnas badaladas que atraem um público bem distinto, mesmo antes da tão esperada sextafeira. Além da presença dos jovens mais abastados de São Paulo e algumas celebridades, não é raro ver moças e

CRÉDITO: acervo

rapazes bem altos, magros e com jeito de poucos amigos desfilando pelas ruas. São os modelos que vivem no Itaim, um dos locais com mais agências de publicidade e modelagem da cidade. O estilo das pessoas é algo marcante para quem chega no bairro. “Acho que uma coisa especial do Itaim que eu nunca vi em outro lugar de São Paulo é a quantidade enorme de gente bem vestida” comenta Silvia, que se inclui entre os fashionistas do bairro. A madrugada é uma aventura para os motoristas e moradores que acabam tendo que conviver com rapazes e moças alcoolizados andando no meio da rua, além da música eletrônica vinda das boates. A noite para eles só acaba com o raiar do sol e o cafezinho com pão na chapa na recém-inaugurada padaria 24 horas da Rua Joaquim Floriano, onde já é possível ver a chegada dos primeiros ônibus lotados, os pais e empregadas domésticas deixando os filhos na escola, enfrentando o clima gelado de mais um dia que começa no Itaim...


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