Por que poucas empresas apostam nas leis de incentivo?

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Agosto de 2012 | www.revistamateriaprima.com.br

Por que poucas empresas apo Investir em projetos culturais, sociais e esportivos, além de muito simples, pode trazer bom retorno à imagem da empresa. E muitas vezes utilizando somente recursos públicos.

Quando uma empresa se instala em uma cidade, além de utilizar seus recursos, ela tem também seus compromissos com a sociedade. Gerar empregos e movimentar a economia local são apenas alguns deles. Outros, como o cuidado com o meio ambiente e responsabilidade social já são pauta nas mesas de reuniões de grandes empresas. O investimento em projetos sociais, culturais e esportivos feito por empresas, seja por meio de doações ou de patrocínios, pode reduzir a carga tributária e ainda colaborar para a construção de uma imagem positiva perante a comunidade. No entanto, muitas empresas desconhecem os benefícios das leis de renúncia fiscal e, com isso, deixam de se favorecer do marketing que alguns

projetos podem trazer. “Sem custo algum, uma empresa pode ter sua marca em locais de grande visibilidade, como museus, galerias de arte e teatros”, explica o produtor cultural da Liga Produção Cultural, Jack Garcia. Para a empresa que quer investir em projetos culturais, sociais ou esportivos, utilizando-se das leis de renúncia fiscal, é importante que ela procure projetos aprovados pelo governo (municipal, estadual ou federal) e produtores/artistas com um bom histórico. Já se a opção for uma doação ao Fundo da Criança e do Adolescente, por exemplo, basta procurar o Conselho Municipal, Estadual ou Nacional. Em Cachoeirinha existe o COMDICA e em Gravataí o CMDCA (Conselho Municipal dos Direitos da


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Por que poucas empresas apo Investir em projetos culturais, sociais e esportivos, além de muito simples, pode trazer bom retorno à imagem da empresa. E muitas vezes utilizando somente recursos públicos.

Quando uma empresa se instala em uma cidade, além de utilizar seus recursos, ela tem também seus compromissos com a sociedade. Gerar empregos e movimentar a economia local são apenas alguns deles. Outros, como o cuidado com o meio ambiente e responsabilidade social já são pauta nas mesas de reuniões de grandes empresas. O investimento em projetos sociais, culturais e esportivos feito por empresas, seja por meio de doações ou de patrocínios, pode reduzir a carga tributária e ainda colaborar para a construção de uma imagem positiva perante a comunidade. No entanto, muitas empresas desconhecem os benefícios das leis de renúncia fiscal e, com isso, deixam de se favorecer do marketing que alguns

projetos podem trazer. “Sem custo algum, uma empresa pode ter sua marca em locais de grande visibilidade, como museus, galerias de arte e teatros”, explica o produtor cultural da Liga Produção Cultural, Jack Garcia. Para a empresa que quer investir em projetos culturais, sociais ou esportivos, utilizando-se das leis de renúncia fiscal, é importante que ela procure projetos aprovados pelo governo (municipal, estadual ou federal) e produtores/artistas com um bom histórico. Já se a opção for uma doação ao Fundo da Criança e do Adolescente, por exemplo, basta procurar o Conselho Municipal, Estadual ou Nacional. Em Cachoeirinha existe o COMDICA e em Gravataí o CMDCA (Conselho Municipal dos Direitos da


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Criança e do Adolescente). Para cada incentivo fiscal existe uma legislação específica. Mesmo trazendo benefícios para ambos os lados e sendo muito simples e seguras, essas leis acabam recebendo críticas. Entre elas, a de que projetos menos importantes ou que teoricamente não precisariam do incentivo passam na frente de outros mais urgentes. Outra crítica é de que o governo deixa as próprias empresas decidirem de qual forma querem investir, ao invés de investir diretamente nas ações que deveriam ser prioridade. Outros aspectos ligados ao setor público como burocracia, corrupção, ineficiência e lentidão também são responsáveis pela falta de interesse e informação de muitos empresários. Ainda que já tenham sido divulgados escândalos de recursos desviados (já

devidamente condenados), o número de projetos aprovados e concluídos com lisura e profissionalismo chegam aos milhares. “É importante que o empresário se resguarde, procurando projetos com bom histórico, mas vale lembrar também que não são os seus recursos que estão indo para estes projetos. São recursos do governo, que abre mão de uma porcentagem dos tributos. É importante também que os colegas contadores orientem seus clientes de que o processo é simples e seguro. Temos instituições como a Apae, a Associação Amigos Voluntários e projetos da prefeitura que estão só no aguardo de recursos. E não só as pessoas jurídicas podem ajudar, como as pessoas físicas”, afirma o contador Vitor Rahde. Michael Porter, no livro “Vantagem competitiva: criando e susten-

tando um desempenho superior” (1985), afirma que as empresas têm duas maneiras de alcançar a liderança no mercado e se destacar de seus concorrentes: através do preço e através da diferenciação. Aquelas que apostam na vantagem competitiva por preço dificilmente têm condições de investir ou apoiar projetos culturais, sociais, ambientais ou esportivos, pois seus recursos estão empenhados na melhoria dos processos, maximização da produção e logística. Já em mercados onde a competição é muito grande e o preço não é fator decisivo, uma boa aposta é a diferenciação. Por isso, investir e apoiar projetos amparados por leis de incentivo pode ser uma solução simples e barata de se destacar da concorrência e ainda garantir maior visibilidade da marca.

Incentivo ao esporte Em vigor desde 2007, a Lei de Incentivo ao Esporte funciona de forma similar à Lei Rouanet. Os benefícios provenientes das duas leis podem ser usados simultaneamente pelas empresas, pois são vistos de forma separada e como tipos de incentivo diferentes. Depois que um projeto é analisado, adequado à lei e aprovado pelo Ministério do Esporte, ele precisa de um patrocinador. As pessoas jurídicas tributadas com base em seu lucro real podem destinar até 1% do imposto devido a projetos esportivos e paraesportivos aprovados pelo MinE. É permitida a utilização de 100% de verba incentivada nos projetos, sem a necessidade de utilização de recursos próprios. A lei também vale para

pessoa física, que pode abater até 6% do valor devido ao imposto de renda, desde que opte pelo modelo de declaração completa. Além de ter financiado ações e eventos em mais de 90 modalidades e em todos os estados brasileiros, a lei tem sido tomada como modelo por estados e municípios na formulação de legislações complementares de financiamento e fomento ao esporte. No Rio Grande do Sul existe o Proesporte, projeto que viabiliza recursos financeiros para práticas esportivas em diversas modalidades. A Lei de Incentivo criada pelo Ministério do Esporte já beneficiou cerca de 800 mil pessoas em todo o Brasil. Até o ano passado, foram captados quase R$ 430 milhões de mais

de 1.100 empresas patrocinadoras. A Lei de Incentivo ao Esporte tem alto índice de aprovação. De acordo com dados do Ministério do Esporte, em 2009 mais de 75% dos projetos apresentados foram aprovados. Com a proximidade de eventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas, as empresas e entidades que incentivarem o esporte ganharão muita visibilidade no mercado. O esporte traz benefícios ao cidadão, agregando valores como determinação, persistência e liderança, os mesmos tão citados e procurados pelas empresas. Investir no esporte também traz repercussão positiva da responsabilidade social da empresa, pois ele é visto como uma ferramenta muito eficiente de inclusão social.

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Incentivo à cultura “A produção cultural se especializou muito nos últimos anos. Algumas produtoras focaram em produzir artistas, outras em trazer espetáculos de fora e outras, como nós, especializaram-se em projetos culturais. Trabalhamos com a elaboração, produção e administração de projetos, mas também oferecemos consultoria às empresas que querem utilizar as leis de incentivo à cultura. Fazemos um mapeamento das necessidades e da melhor forma de utilizar o dinheiro dos impostos”, explica a produtora cultural da Liga, Dedé Ribeiro. De acordo com ela, existem hoje quase 40 projetos em andamento na produtora, aguardando recursos. Os projetos abrangem diversas áreas, como restauro, música, teatro, simpósios e dança. A empresa trabalha com diversas leis de incentivo, como a Lei Rouanet e Lei Estadual de Incentivo à Cultura (LIC), fundos como o Fumproarte (Porto Alegre) e Fundo de Apoio à Cultura (FAC)

e editais públicos. Nos fundos, o governo transfere o dinheiro direto ao artista, portanto não existe a participação das empresas. Já no caso das leis de incentivo, o governo fornece uma aprovação ao projeto e isso permite que o artista ou produtor procure uma empresa patrocinadora. “Acredito que somos uma das produtoras que mais ganhou editais públicos no estado, entre eles Petrobras Cultural, Natura Musical, Rumos Itaú. Caixa Econômica Federal, Eletrobras e CGTEE”, conta Dedé. A produtora explica que para cada empresa pode ser utilizado um benefício diferente, de acordo com suas possibilidades econômicas e estrutura. “É preciso uma boa estratégia e planejamento porque existem muitas opções”. Os maiores entraves na área cultural, segundo Dedé, são a falta de informação do empresário e a dificuldade das empresas em montar uma política cultural clara. “No Rio Grande do Sul

vemos as empresas utilizarem os patrocínios culturais como moeda de troca de favores políticos e empresariais. Em Minas Gerais, por exemplo, muitas empresas já têm suas políticas culturais bem definidas, mas aqui isso é bem complicado. Acredito que elas deveriam alinhar isso juntamente com o setor de marketing”. A produtora conta que apenas 5% das empresas tributadas pelo Lucro Real (cuja receita bruta total, no anocalendário anterior, seja superior a R$ 48 milhões), que poderiam patrocinar projetos culturais, realmente patrocinam. Algumas não o fazem por desconhecimento e outras porque têm medo. “O empresário precisa se resguardar, mas também ter em mente que não vai ser roubado, porque o dinheiro vai pro Fundo Nacional da Cultura. O processo todo é muito simples. É como o desconto do médico utilizado no imposto de renda. Mesmo que o projeto não se


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concretize ou não dê retorno imediato ao empresário, ele já ganhou aquela vantagem fiscal”, explica Dedé. A Liga Produção Cultural elabora projetos para artistas, mas também para empresas. É o caso da Fundação Sicredi, que existe há seis anos e já desenvolveu quase dez projetos com a produtora. De acordo com o Gerente de Educação Cooperativa da Fundação, Marcos Alexandre Schwingel, os projetos são nas áreas de educação e cultura e incluem aquisição de livros para a biblioteca do Sicredi, peças de teatro, gravação de DVD, publicação de livros, concurso de desenho e outros. A captação é feita nas empresas do sistema, que inclui 116 cooperativas. “Também incentivamos a doação de pessoas físicas. Hoje somos mais de 14 mil colaboradores. Também pensamos em abrir essa opção para os associados pessoa física e jurídica, que hoje somam mais de 2 milhões”, conta Schwingel. A fundação também auxilia na captação de doações para os Fundos Municipais dos Direitos da Criança e Adolescente, nas cidades onde o siste-

ma atua. Hoje são beneficiadas cerca de 160 mil crianças. Apesar de desenvolver bons projetos, o gerente conta que o maior entrave ainda é conseguir a aderência das cooperativas e das comunidades. Leis A Lei Rouanet utiliza o recurso público de forma indireta, valendo-se da iniciativa privada como intermediária e, às vezes, parceira. Com base nesta lei, a empresa que investe em projetos culturais aprovados pelo Ministério da Cultura poderá deduzir até 100% do valor investido do imposto de renda devido. Esta lei vem sendo aperfeiçoada, visando conter abusos e contemplar as necessidades da comunidade artística e da população. Para ser enquadrado na lei, o projeto deve passar pela aprovação do Ministério da Cultura e posteriormente ser apresentado à Coordenação Geral do Mecenato e aprovado pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura. As empresas patrocinadoras dos projetos

Sem custo algum, uma empresa pode ter sua marca em locais de grande visibilidade, como museus, galerias de arte e teatros Jack Garcia produtor cultural da Liga Produção Cultural

recebem incentivos fiscais, tendo abatimento de determinada porcentagem em seu imposto de renda. O apoio pode vir da empresa na forma de doação ou patrocínio. Na doação, há transferência definitiva e irreversível de recursos financeiros ou bens, em favor do titular da proposta cultural. Ela pode ser feita por pessoa física pagadora do imposto de renda ou pessoa jurídica tributada com base no Lucro Real. Na doação é proibido qualquer tipo de promoção do doador e só podem se beneficiar propostas culturais de pessoa física ou jurídica sem fins lucrativos. Já na modalidade de patrocínio, há


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a transferência definitiva e irreversível de dinheiro ou serviços e/ou utilização de bens móveis ou imóveis do patrocinador, sem transferência de domínio. O patrocinador tem direito a receber até 10% do produto resultante do projeto (CDs, ingressos, revistas, etc), para distribuição gratuita promocional. Se houver mais de um patrocinador, cada qual receberá o produto em quantidade proporcional ao valor incentivado, respeitado o limite de 10% para o conjunto de patrocinadores. No patrocínio pode haver publicidade do investidor e qualquer proposta aprovada pode se beneficiar dele, inclusive as que estiverem em nome de pessoa jurídica com fins lucrativos. As empresas ou pessoas físicas que apoiarem os projetos enquadrados no artigo 18 da Lei Rouanet podem deduzir 100% do valor doado ou patrocinado, dentro do limite de 4% para pessoa jurídica e 6% para pessoa física. Enquadram-se nesse artigo as artes cênicas, livros, música erudita ou instrumental, exposições, doações de livros, produção de obras cinematográficas e videofono-

gráficas de curta e média metragem e preservação do patrimônio cultural material e imaterial (tombado em qualquer instância de governo). O artigo 26, por sua vez, inclui todo o restante das áreas artísticas e culturais. Nesse caso, os percentuais de abatimento no imposto de renda são os seguintes: empresas: 30% do valor patrocinado; 40% do valor doado; pessoa física: 60% do valor patrocinado; 80% do valor doado. Para que a empresa tenha certeza de que o projeto foi devidamente aprovado, basta solicitar ao produtor ou artista a cópia da publicação da aprovação no Diário Oficial e o número do Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac). Depois é só consultar esse número no site do Ministério da Cultura. Feito isso, a empresa deposita o valor em uma conta aberta pelo próprio MinC e o produtor emitirá um Recibo de Mecenato (que traz o logotipo do ministério), que a empresa utilizará na declaração do Imposto de renda. O processo todo é muito simples e seguro. Além da Lei Rouanet, existe tam-

bém a Lei Estadual de Incentivo à Cultura (LIC), que trabalha com a renúncia fiscal de ICMS. Em vigor desde agosto de 1996, ela propõe a dedução fiscal de 100% do valor do projeto apoiado, do ICMS devido. Porém, todos os investimentos em projetos culturais através da LIC devem destinar um percentual sobre o valor patrocinado para o FAC – Fundo de Apoio à Cultura do RS. • 5% para projetos de construção e restauração de patrimônio; • 10% regra geral; • 25% para projetos cujo valor de captação seja superior a R$ 700 mil. A LIC possui uma tabela progressiva – que hoje vai até 20% do ICMS devido – de acordo com o faturamento da empresa investidora. Assim, pequenas e médias empresas podem beneficiar-se. Incentivar a cultura traz diversos benefícios à sociedade, como garantir o acesso à cultura, que é um direito de todo cidadão; estimular as produções culturais e artísticas regionais e nacionais e ajudar a desenvolver a consciência e o respeito aos valores de outros povos e nações.


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Diversas instituições sociais passam por dificuldades para sobreviver. Ainda que elas recebam ajuda do poder público, muitas ainda precisam da contribuição de empresas e pessoas físicas. De acordo com o empresário Eliseu Gonçalves da Silva, essas instituições prestam um serviço voluntário, preenchendo uma lacuna deixada pelo governo. Ele cita o caso específico da Apae Cachoeirinha, que já fez diversas ações para angariar recursos. Uma delas é a parceria com a empresa de energia elétrica RGE. O projeto, intitulado Apae Energia, possibilita que pessoas físicas e jurídicas façam uma doação à entidade através da conta de energia elétrica. As pessoas físicas podem contribuir com um valor men-

sal a partir de R$ 3 e pessoas jurídicas a partir de R$ 20. “Fiz uma grande campanha com amigos e colegas, mas obtive pouco retorno. Ainda há muita desconfiança das pessoas”, afirma. Outra opção é destinar parte do imposto de renda a entidades filantrópicas. As pessoas jurídicas podem destinar até 1% do valor devido e as pessoas físicas podem destinar até 6%. O empresário chegou a fazer um trabalho com quase 60 contadores para que divulgassem essa opção e para que as empresas ajudassem a Apae a angariar recursos para sua nova sede. Eliseu comprovou as carências da entidade, mostrou os benefícios da legislação, mas ainda assim obteve pouco retorno. “Acho que os

contadores talvez não tenham uma boa impressão disso. Os empresários também sentem medo de terem suas contas e dados invadidos, ou que o dinheiro possa ser mal utilizado, mas isso não acontece”, afirma. Atualmente, a instituição busca apoiadores para construir sua nova sede e continuar atendendo quase 100 crianças. Além da Apae, muitas outras entidades podem ser beneficiadas, como Associação Amigos Voluntários, asilos, casas de apoio, além de projetos desenvolvidos pelas próprias prefeituras. Tudo isso com dinheiro público, que as empresas destinam para o pagamento de impostos. Informe-se sobre como sua empresa pode ajudar. É simples e é seguro.

Acho que os contadores talvez não tenham uma boa impressão disso. Os empresários também sentem medo de terem suas contas e dados invadidos, ou que o dinheiro possa ser mal utilizado, mas isso não acontece Eliseu Gonçalves da Silva empresário

Fotos: arquivo Liga Produção Cultural

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