Por que é tão difícil incluir Pessoas com Deficiência?

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Agosto de 2011 | www.revistamateriaprima.com.br

Por que é tão difícil incluir Por Camila Schäfer Jornalista (MTB 15120) “As empresas precisam entender que as pesso- pessoa com deficiência também é importante para coas com deficiência (PCD) são capazes de fazer o que nhecer a sua realidade. “Isso é fundamental para que quiserem, basta que exista um ambiente adaptado a os pais, muitas vezes super protetores, entendam que o elas”. Com essa fala, a consultora de inclusão e admi- mercado de trabalho pode ser bom para o desenvolvinistradora da Desenvolver Inclusão de PCDs, Marcia mento do seu filho”, conta a consultora Miriam Duarte. Gonçalves, sintetiza como o mercado de trabalho ainda De acordo com Marcia, a principal barreira para vê com preconceito as pessoas com deficiência. Em incluir pessoas com deficiência no mercado de trabaentrevista realizada para a revista Matéria Prima, a lho é a atitude das demais pessoas. Muitas pensam que consultora, juntamente com as colegas Miriam Duarte os cegos devem trabalhar como telefonistas, os surdos (consultora), Carlena Weber (assistente social), Aneliz no estoque e os deficientes físicos em call centers, por Silva (estudante de psicologia) e Sandra Cardoso (intér- exemplo. Segundo a consultora, esse modelo é muito prete LIBRAS), conta como as empresas podem incluir disseminado, mas acaba limitando ainda mais as PCDs. PCDs em seu quadro de colaboradores e os maiores Para ela, as pessoas podem trabalhar no que quiserem, desafios para colocar essas pesdesde que o ambiente seja adapsoas no mercado. Mesmo com a Mais de um bilhão de tado às suas limitações. Ela cita Lei de Cotas (1991), que obriga como exemplo um rapaz que é indivíduos têm algum tipo as empresas com 100 ou mais cego e que possui uma deficiênfuncionários a destinarem até de deficiência no mundo, de cia auditiva de 85%. O desafio 5% de suas vagas às pessoas acordo com relatório divulgado era colocá-lo em uma linha de com deficiência, ainda há muito produção. “Para isso, adaptamos a ser trabalhado na questão ati- pela Organização Mundial de a linha colocando uma bancada, tudinal. A própria Desenvolver Saúde e Banco Mundial. uma cadeira e um gabarito para é um exemplo de que incluir o encaixe das peças. Ele já está PCDs dá certo. A empresa emprega hoje uma cadeiran- há um ano nessa empresa e suas peças seguem para a te (a assistente social Carlena) e uma colaboradora com exportação sem defeito algum. A empresa inclusive está Síndrome de Grebe (a estudante de psicologia Aneliz). pensando em fazer essa adaptação para os demais funUm dos maiores problemas é fazer com que as pes- cionários porque o processo está tão bem fechado que soas sem deficiência entendam a realidade das PCDs. evita defeitos. Foi uma mudança simples e barata que Mais de um bilhão de indivíduos têm algum tipo de de- no fim se tornou vantajosa para toda a empresa”, explificiência no mundo, de acordo com relatório divulgado ca Marcia. A consultora também cita o exemplo de um pela Organização Mundial de Saúde e Banco Mundial. surdo que trabalha no setor de marketing de um site de O estudo mostra que milhões de pessoas têm a vida música. No início parecia impossível a adaptação, mas dificultada por falta de condições que incluem, além graças a um mecanismo de acessibilidade criado na indas barreiras físicas, a discriminação, a falta de cuida- formática foi possível fazer com que ele trabalhasse no dos na saúde e a inexistência de serviços de reabilitação que realmente queria. adequados. Com isso, as pessoas com deficiência têm Mudar o estereótipo que se criou das pessoas com pior saúde, baixo nível educacional, menos oportunida- deficiência ainda é muito difícil no Brasil, mas com des e maiores taxas de pobreza do que as pessoas sem ações simples é possível alterar esse cenário. As ações qualquer tipo de deficiência. Devido a esse histórico inclusivas são exemplos disso. Através de palestras e de exclusão, é difícil para as empresas aceitarem uma vivências, os demais funcionários podem aprender a pessoa que, além de ter uma deficiência, vive essa reali- conviver com o colega deficiente e a empresa a acolher dade. “Os recrutadores estão preparados para escolher essa pessoa. Na Desenvolver, quem trabalha com essas entre os melhores, os mais bonitos, os mais eficientes, ações é Carlena Weber, que há 11 anos é cadeirante. “Eu os mais rápidos, e o cenário que a gente tem das PCDs já fui uma pessoa ‘andante’ e sei como é difícil imaginar no Brasil muitas vezes é o oposto, então o preconceito a vida de uma pessoa com deficiência. Por isso a gente acaba se tornando maior ainda”, explica Marcia. Para trabalha com a vivência lúdica nas empresas, para que amenizar essa situação, dar maiores chances às pessoas os funcionários se imaginem como PCDs. Simulamos com deficiência e poder oferecer profissionais qualifi- que um é cego, outro é surdo, outro é cadeirante e eles cados às empresas, a Desenvolver, além de fazer o re- precisam saber trabalhar em equipe. Os resultados são crutamento, também oferece cursos e treinamento para bem positivos e as pessoas começam a pensar diferente, as PCDs, que depois são encaminhadas para o mercado aprendem que existem limites e possibilidades. Então de trabalho. Um acompanhamento junto à família da nossa função é mostrar para as empresas que não se


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Por que é tão difícil incluir Por Camila Schäfer Jornalista (MTB 15120) “As empresas precisam entender que as pesso- pessoa com deficiência também é importante para coas com deficiência (PCD) são capazes de fazer o que nhecer a sua realidade. “Isso é fundamental para que quiserem, basta que exista um ambiente adaptado a os pais, muitas vezes super protetores, entendam que o elas”. Com essa fala, a consultora de inclusão e admi- mercado de trabalho pode ser bom para o desenvolvinistradora da Desenvolver Inclusão de PCDs, Marcia mento do seu filho”, conta a consultora Miriam Duarte. Gonçalves, sintetiza como o mercado de trabalho ainda De acordo com Marcia, a principal barreira para vê com preconceito as pessoas com deficiência. Em incluir pessoas com deficiência no mercado de trabaentrevista realizada para a revista Matéria Prima, a lho é a atitude das demais pessoas. Muitas pensam que consultora, juntamente com as colegas Miriam Duarte os cegos devem trabalhar como telefonistas, os surdos (consultora), Carlena Weber (assistente social), Aneliz no estoque e os deficientes físicos em call centers, por Silva (estudante de psicologia) e Sandra Cardoso (intér- exemplo. Segundo a consultora, esse modelo é muito prete LIBRAS), conta como as empresas podem incluir disseminado, mas acaba limitando ainda mais as PCDs. PCDs em seu quadro de colaboradores e os maiores Para ela, as pessoas podem trabalhar no que quiserem, desafios para colocar essas pesdesde que o ambiente seja adapsoas no mercado. Mesmo com a Mais de um bilhão de tado às suas limitações. Ela cita Lei de Cotas (1991), que obriga como exemplo um rapaz que é indivíduos têm algum tipo as empresas com 100 ou mais cego e que possui uma deficiênfuncionários a destinarem até de deficiência no mundo, de cia auditiva de 85%. O desafio 5% de suas vagas às pessoas acordo com relatório divulgado era colocá-lo em uma linha de com deficiência, ainda há muito produção. “Para isso, adaptamos a ser trabalhado na questão ati- pela Organização Mundial de a linha colocando uma bancada, tudinal. A própria Desenvolver Saúde e Banco Mundial. uma cadeira e um gabarito para é um exemplo de que incluir o encaixe das peças. Ele já está PCDs dá certo. A empresa emprega hoje uma cadeiran- há um ano nessa empresa e suas peças seguem para a te (a assistente social Carlena) e uma colaboradora com exportação sem defeito algum. A empresa inclusive está Síndrome de Grebe (a estudante de psicologia Aneliz). pensando em fazer essa adaptação para os demais funUm dos maiores problemas é fazer com que as pes- cionários porque o processo está tão bem fechado que soas sem deficiência entendam a realidade das PCDs. evita defeitos. Foi uma mudança simples e barata que Mais de um bilhão de indivíduos têm algum tipo de de- no fim se tornou vantajosa para toda a empresa”, explificiência no mundo, de acordo com relatório divulgado ca Marcia. A consultora também cita o exemplo de um pela Organização Mundial de Saúde e Banco Mundial. surdo que trabalha no setor de marketing de um site de O estudo mostra que milhões de pessoas têm a vida música. No início parecia impossível a adaptação, mas dificultada por falta de condições que incluem, além graças a um mecanismo de acessibilidade criado na indas barreiras físicas, a discriminação, a falta de cuida- formática foi possível fazer com que ele trabalhasse no dos na saúde e a inexistência de serviços de reabilitação que realmente queria. adequados. Com isso, as pessoas com deficiência têm Mudar o estereótipo que se criou das pessoas com pior saúde, baixo nível educacional, menos oportunida- deficiência ainda é muito difícil no Brasil, mas com des e maiores taxas de pobreza do que as pessoas sem ações simples é possível alterar esse cenário. As ações qualquer tipo de deficiência. Devido a esse histórico inclusivas são exemplos disso. Através de palestras e de exclusão, é difícil para as empresas aceitarem uma vivências, os demais funcionários podem aprender a pessoa que, além de ter uma deficiência, vive essa reali- conviver com o colega deficiente e a empresa a acolher dade. “Os recrutadores estão preparados para escolher essa pessoa. Na Desenvolver, quem trabalha com essas entre os melhores, os mais bonitos, os mais eficientes, ações é Carlena Weber, que há 11 anos é cadeirante. “Eu os mais rápidos, e o cenário que a gente tem das PCDs já fui uma pessoa ‘andante’ e sei como é difícil imaginar no Brasil muitas vezes é o oposto, então o preconceito a vida de uma pessoa com deficiência. Por isso a gente acaba se tornando maior ainda”, explica Marcia. Para trabalha com a vivência lúdica nas empresas, para que amenizar essa situação, dar maiores chances às pessoas os funcionários se imaginem como PCDs. Simulamos com deficiência e poder oferecer profissionais qualifi- que um é cego, outro é surdo, outro é cadeirante e eles cados às empresas, a Desenvolver, além de fazer o re- precisam saber trabalhar em equipe. Os resultados são crutamento, também oferece cursos e treinamento para bem positivos e as pessoas começam a pensar diferente, as PCDs, que depois são encaminhadas para o mercado aprendem que existem limites e possibilidades. Então de trabalho. Um acompanhamento junto à família da nossa função é mostrar para as empresas que não se


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trata apenas do cumprimento de uma lei, mas de uma mudança de atitude”, conta. Mesmo que o Brasil possua uma das melhores legislações do mundo para a pessoa com deficiência, mudar a cultura e a atitude das pessoas ainda é um obstáculo porque a PCD é vista como alguém que não vive, não trabalha, nem estuda. “Gostaria que não existisse a Lei de Cotas, mas como no Brasil ainda é difícil mudar essa visão das pessoas com deficiência, acho que é um mal necessário”, afirma Carlena. Outra dificuldade relatada pelas funcionárias da Desenvolver é a exigência das empresas quanto ao perfil do candidato. Segundo elas, as companhias querem pessoas com “deficiências leves”, o que, na teoria, não existe. “Tivemos, inclusive, de recusar algumas ofertas porque sabíamos que não conseguiríamos atingir o objetivo daquela empregadora. São muitas as exigências e às vezes nem é a deficiência o problema, mas a condição social, a aparência ou a etnia do candidato. Então o preconceito está em todas as esferas e não inclui apenas a deficiência”, afirma Marcia. A consultora explica que, ao contrário do que muitas vezes é divulgado na mídia, existem pessoas com deficiência suficientes para preencher as vagas disponíveis. O cadastro da Desenvolver, por exemplo, conta com 1080 pessoas, todas aptas para trabalhar. O problema é que as empresas fazem exigências que não estão de acordo com a realidade dos deficientes brasileiros. “As empresas anunciam vagas de emprego interessantes para PCDs. Eu entro em contato com elas, mas elas não querem as pessoas com deficiência que eu tenho.

Elas querem pessoas sem a pontinha do dedo, por exemplo”, explica Marcia. Nos cinco anos de atuação da Desenvolver já foram incluídas 553 pessoas no mercado de trabalho. A rotatividade no último ano foi de 15% e o índice de afastamento de apenas 2% (sendo que esse índice, na maioria das empresas, é de 10%). Os dados mostram que as pessoas com deficiência só mudam de empresa quando conseguem um emprego melhor, quando passam em um concurso público ou quando mudam de cidade e raramente porque adoeceram ou devido à sua deficiência. A força de vontade dessas pessoas também encoraja e motiva os demais funcionários. “Temos exemplos de empresas em que o absenteísmo dos outros colaboradores diminuiu porque eles se sentem motivados vendo os colegas deficientes se esforçarem”, conta Marcia. Mas assim como há exemplos positivos, a consultora afirma que também há aquelas pessoas que se utilizam da Lei de Cotas para tirar vantagens. “Da mesma forma que pessoas sem deficiência são preguiçosas, faltam e não gostam de trabalhar, também há pessoas com deficiência com esse perfil e se usando da lei para obter vantagens. Mas é importante lembrar que caráter não tem a ver com ter ou não ter deficiência e sim com a personalidade da pessoa. Então é bem importante que as empresas estejam atentas para isso”, explica. Os atestados e faltas por motivo de saúde também são temores do empresariado, mas é preciso lembrar que pessoas com deficiência adoecem

como qualquer outra pessoa e o acompanhamento com seu médico é essencial para que o funcionário desempenhe bem suas atividades. Estudos mostram que, justamente por receberem um acompanhamento sistemático e preventivo, os deficientes adoecem menos. “Porém, se o empregador quiser apenas cumprir a Lei de Cotas, sem se preocupar em como aquela pessoa está sendo acompanhada, provavelmente terá problemas no futuro. Por exemplo, se uma pessoa com apenas um dos braços for alocada para trabalhar na montagem de peças, muito provavelmente ela sobrecarregará o braço e adoecerá porque não teve acompanhamento médico e o ambiente não foi adaptado para sua limitação. Ou seja, o que adoece não é a deficiência, mas a falta de adaptação no ambiente de trabalho e nas funções que a PCD desempenha. Gripe e cansaço qualquer pessoa sente. O vírus não escolhe se a pessoa tem deficiência ou não”, brinca Marcia. “Além disso, os médicos do trabalho precisam entender que a pessoa com

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deficiência quer trabalhar como qualquer outra pessoa e não passar o resto da vida aposentada”, completa. “Incluir a PCD também traz lucro à empresa” – Marcia Gonçalves Todo empresário sonha em ter um negócio de sucesso e rentável. Para isso, muitos investem no aumento da produtividade para que o lucro, principal objetivo de uma empresa privada, seja atingido. Quando alguém recomenda uma pessoa com deficiência para esse empresário, logo ele pensa que sua produtividade e retorno financeiro estarão comprometidos ou que se trata apenas de uma ação solidária, de responsabilidade social. No entanto, assim como qualquer pessoa, uma PCD pode trazer resultados e lucro à empresa. Márcia cita o exemplo de uma deficiente visual que participou do projeto Sentir com as Mãos, em que cegos são contratados como massoterapeutas. “O objetivo de uma rede de farmácias era aumentar as vendas, mas também havia o desejo de incluir pessoas com deficiência na empresa. Então se pensou, em conjunto com a empresa, que a cada R$ 30 em compras, o cliente ganharia uma massagem. O sucesso foi tanto que hoje a massoterapeuta dessa loja está com a agenda lotada e já há compradores que viraram pacientes dela, ou seja, a loja fidelizou muitos clientes com essa ação e o investimento trouxe resultados”, conta. Assim como há alguns anos as empresas perceberam que os idosos eram um nicho de mercado, também as pessoas com deficiência podem trazer lucro para os micro e pequenos empresários. Elas vão para restaurantes, lojas e mercados, mas nesses locais ainda sofrem com a falta de acessibilidade arquitetônica. “Colocar uma rampa ou uma etiqueta em braile não é apenas responsabilidade social, voluntariado, mas uma ação que poderá trazer muitos clientes e lucratividade para aquele negócio”, conta Marcia. Segundo a consultora, é preciso investir mais na inclusão dessas pessoas. Deficiência intelectual e psicossocial Além de deficientes físicos, a Desenvolver trabalha também com a inclusão das pessoas com deficiência intelectual (redução da capacidade intelectual) e psicossocial (Autismo, Esquizofrenia, Síndrome do Pânico). Muitos empregadores pensam que essas pessoas são ainda mais

difíceis de incluir, pelo seu tipo de deficiência. No entanto, Marcia explica que com o acompanhamento psicológico e psiquiátrico correto, elas podem trabalhar normalmente. Uma psicóloga da Desenvolver é quem faz o acompanhamento mensal ou semanal. “Conhecemos um rapaz esquizofrênico que era muito fechado, não abraçava ninguém e inclusive tinha um amigo imaginário. Mesmo que alguns profissionais defendam que não devemos estimular a limitação, a gente fazia de conta que enxergava esse amigo para que esse rapaz se sentisse acolhido. Isso é uma característica comum nas pessoas esquizofrênicas que estão sem tratamento e acompanhamento médico (a família estava em total vulnerabilidade social). A partir do momento em que ele se sente acolhido, ele expressa o que está sentindo e aí muitos sentem coragem de procurar ajuda médica e perdem esses sintomas da doença. Tanto é que, quando esse rapaz foi fazer a aprendizagem, ele já não tinha mais o amigo imaginário”, conta Marcia. Miriam Duarte complementa dizendo que foi realizado um trabalho de acompanhamento e que hoje esse mesmo rapaz está trabalhando em uma grande empresa. “Certo dia, a mãe dele entrou em contato conosco para nos agradecer porque fazia 10 anos que ela não ganhava um abraço do filho. Isso foi muito gratificante para nós”, lembra Miriam. LIBRAS As Línguas de Sinais (LS) são as línguas naturais das comunidades surdas. Ao contrário do que muitos imaginam, elas não são simplesmente mímicas e gestos soltos, utilizados pelos surdos para facilitar a comunicação. São línguas com estruturas gramaticais próprias. Atribui-se às LS o status de língua porque elas também são compostas pelos níveis linguísticos: o fonológico, o morfológico, o sintático e o semântico. A LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) tem sua origem na Língua de Sinais Francesa. Cada país possui a sua própria LS, que sofre as influências da cultura nacional. Como qualquer outra língua, ela também possui expressões que diferem de região para região (os regionalismos), o que a legitima ainda mais como língua. Para a intérprete de LIBRAS da Desenvolver e estudante de Letras – LIBRAS, Sandra Cardoso, todos os brasileiros deveriam conhecer pelo menos o básico de

Camila Schäfer/MP

Equipe da Desenvolver

Acessibilidade A acessibilidade arquitetônica e a segurança no trabalho são muito importantes para as pessoas com deficiência. Por isso, a Desenvolver tem em seu quadro de colaboradores um técnico em segurança do trabalho que cuida dessa área. “As pessoas pensam que a PCD, ao fazer um trabalho repetitivo, não vai adquirir doença porque ela já é deficiente. Por exemplo, uma empresa coloca um cego para trabalhar como telefonista e ninguém se preocupa com a audição ou ergonomia dele porque ele já é cego. Acham que não precisa, que não tem importância”, explica Marcia. Segundo a consultora, há anos a empresa insiste na questão da acessibilidade, pois acredita que ela é universal. Ou seja, uma rampa serve, além do cadeirante, para um idoso ou uma gestante. LIBRAS, já que esta é a segunda língua oficial do País. O trabalho de Sandra inclui, além das interpretações, cursos nas empresas para que os funcionários consigam se comunicar com os colegas surdos. O curso tem duração de três a seis meses. “Comecei a ter contato com surdos com 14 anos, em uma congregação. Eu interpretava congressos, assembleias, reuniões. Apaixonei-me e trabalho com isso há 17 anos. Para mim, trabalhar com a comunidade surda é muito gratificante. São muitas experiências que a gente presencia e aprende”, conta Sandra.


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1 - Elaboração de projetos: • projetos para o cumprimento da Lei de Cotas pelas empresas; • aprendizagem inclusiva para PCDs (qualificação durante um ano); • Sentir com as Mãos: projeto voltado às pessoas com baixa visão e cegueira, que oferece emprego como massoterapeuta. Essas pessoas podem trabalhar no ambulatório das empresas com o objetivo de prevenir Lesões por Esforço Repetitivo (L.E.R), Distúrbios Osteo-musculares Relacionados ao Trabalho (D.O.R.T) e lombalgia, por exemplo. Em algumas empresas, os funcionários já têm horários fixos com o massoterapeuta a fim de prevenir essas lesões. 2 – Ações Inclusivas: voltadas às empresas que não querem desenvolver projetos de inclusão, mas ações para sensibilizar os funcionários sobre a questão do convívio com a pessoa com deficiência, para que entendam quais são os tipos de deficiência, o que é a Lei de Cotas e outros assuntos. São trabalhados 3 nichos de acessibilidade: atitudinal (sensibilização das pessoas), arquitetônica (adaptação do ambiente) e de comunicação (oficina de LIBRAS). 3 – Inclusão de Pessoas Com Deficiência: • recrutamento e seleção de PCDs; • treinamento para recrutadores; • treinamento de suporte à legislação; • qualificação de PCDs.

MITOS E VERDADES

Surdo-mudo: De acordo com a Desenvolver, a expressão surdo-mudo é incorreta. Os surdos só não falam porque não escutam e normalmente se comunicam em Libras, a Língua Brasileira de Sinais. A expressão correta é Pessoa Com Deficiência (PCD): As expressões “portador”, “necessida-

Camila Schäfer/MP

DEPOIMENTOS Aneliz Silva – estudante de psicologia, 22 anos – tem Síndrome de Grebe (encurtamento extremo dos membros e ausência de falanges médias e proximais) “Em algumas entrevistas de emprego que fiz, notei que as pessoas ficam impressionadas quando recebem alguém com deficiência. Inclusive fiz uma onde a entrevistadora não parava de me olhar. Percebi que aquela empresa não teria condições de receber alguém como eu. Essas situações às vezes incomodam porque as pessoas ficam olhando pra gente, tocando, perguntando. Mas por sorte já estamos acostumadas e lidamos bem com isso.” Marcia Gonçalves – administradora e consultora de inclusão “A gente não determina que cego tem que ser telefonista e cadeirante tem que ser call center. A pessoa pode ser o que ela quiser. A gente é que precisa ter o entendimento, conhecimento e tecnologia para que ela possa fazer o que quiser e a acessibilidade serve pra isso.” des especiais” e “excepcional” são nomenclaturas incorretas. Por que: 1 - A pessoa não “porta” a deficiência; 2 – as gestantes e obesos, por exemplo, também têm “necessidades especiais” e, no entanto, não são deficientes; 3 – o termo “excepcional” era usado para pessoas com deficiência intelectual (baixo Q.I). No entanto, provou-se que o termo não poderia se referir exclusivamente aos que tinham deficiência mental, pois as pessoas com superdotação também são excepcionais por estarem na outra pon-

Carlena Weber – assistente social, 32 anos – cadeirante há 11 anos “Com a deficiência minha vida mudou de uma hora pra outra. Eu pensava que toda a minha vida seria voltada para o tratamento, fisioterapia e cuidar do corpo. Mas com o trabalho comecei a descobrir aos poucos que tinha potencial. Eu deslanchei para namorar, pra voltar a beijar na boca e me ‘sentir gente’ depois que voltei a trabalhar. Se as pessoas ditas normais já se sentem muito mal quando estão desempregadas, imagina quando isso acontece com deficientes. A gente se sente incapaz ao cubo. Mas quando tu descobres que pode trabalhar, aí já não quer parar mais. Sei que cada caso é um caso, mas como tetraplégica, eu entendo bem como o mercado de trabalho vê a pessoa com deficiência. A faculdade também me fez entender melhor esse contexto da sociedade e perceber porque existe essa exclusão das PCDs. Meu trabalho é com foco nas empresas e é muito gratificante, ainda mais porque eu gosto e vivo isso no dia-a-dia.”

ta da curva da inteligência humana e muitas vezes é entendida como uma expressão pejorativa. Portanto, a pessoa possui ou não possui a deficiência e o termo correto é Pessoa Com Deficiência (PCD). Deficiência auditiva é diferente de surdo: Pessoa com deficiência auditiva ouve e utiliza, em muitos casos, próteses auditivas, além de desenvolver a capacidade de articulação da fala.

reportagem especial

Sobre a Desenvolver: A Desenvolver é uma empresa privada, de consultoria para inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. A empresa desenvolve seu trabalho em três linhas:

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