Revista Versus #2

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maio 2012 - 2ª edição

VERSUS Direito delas Entenda o que propõe o Estatuto do Nasciturno e suas consequências

R$ 9,90

Endorfina e Adrenalina

Teatro

Autoconhecimento

Sem carne

Esportes radicais que despertam paixão

Nos palcos do Sul Fluminense

Os 10 mundos do Budismo

Vegerarianismo ganha adeptos na região


excesso , por natureza e por ofício.

Comovo-me em

Acho medonho alguém viver sem paixões.

Graciliano Ramos, autor homenageado na FLIP 2013

Festa Literária Internacional de Paraty De 3 a 7 de julho de 2013 www.flip.org


C

om uma equipe especial e ideias borbulhando na cabeça, os seis integrantes desenvolveram uma revista com conteúdo tão diversificado quanto a personalidade de cada envolvido na produção. Dizer que foi difícil avançar com esse projeto seria exagerar, mas foi um grande desafio, resumindo todo o trabalho empenhado. Quando a tarefa de produzir uma revista foi lançada, começaram a surgir os primeiros imprevistos: variedade de idéias, conflito de opiniões, necessidade urgente de organização, conciliação com outros afazeres e, ainda, a agenda apertada para finalização. Deu certo, apesar de tudo. O processo foi se tornando mais natural conforme seu andamento e o envolvimento do grupo. O que temos como resultado são reportagens e matérias que exprimem exatamente a essência da Versus – contrapõe pontos e apresentam os outros lados de uma mesma história. Nossa menina dos olhos, se é que podemos eleger uma, é a reportagem “Útero e Castigo”. Ela traz a discussão por trás do Estatuto do Nascituro, projeto de lei que concede direitos fundamentais ao embrião, além de outras questões. A ilustração da matéria, belíssima por sinal, devemos à artista Evelyn Negahamburguer, de apenas 24 anos. Usando temas como o feminismo, aceitação do corpo, sexo e cotidiano, ela consegue desenhar detalhes que passam despercebidos pelos olhos da maioria das pessoas. Nosso muito obrigada à atenciosa artista. Um agradecimento especial também à chinesa Susanne Fang, que estampou nossa capa. Esta edição traz ainda assuntos como a escolha de viver sem carne, uma resposta ao vegetarianismo que cresce na região, e os dez mundos do budismo, uma filosofia para aprimorar a essência de ser. O teatro ganha espaço na revista mostrando como tem crescido e se tornado democrático no sul do estado, mas ainda sofre com a resistência popular. A boa literatura pode estar escondida na escrivaninha do vizinho ao lado, já pensou nisso? E para extravasar, se você acha que esporte radical é coisa para maluco, entrevistamos praticantes de mountainboard, paraquedismo e montanhismo que provam o contrário. Entre as páginas que recheiam a revista, preparamos snacks falando sobre livros, séries e filmes, uma sugestão de diversão aos nossos leitores. Finalizamos o conteúdo com a crônica, um tanto interessante, da Carla Duarte. E se você tivesse a oportunidade de ligar, através de uma conversa, dois momentos da sua vida? É a jovem que conversa com a adolescente que foi um dia. À equipe Versus vale dizer que mais uma vez o desafio aceito foi cumprido. O arrepio ao pensar em diagramação vai ser menor daqui em diante. Dizer a seis estudantes de jornalismo que o espaço ocupado pelas matérias deve ser clean não se mostrou um problema. Conseguimos dar a você, leitor, a leveza visual de uma página limpa com textos de peso e qualidade. Boa leitura, Edurne Miravete

Em cima, da esquerda para direita: Carla, Victória e Brena Sentados: Edurne, André e Larine


amiga da moça, que tem mais interesse em demonstrar conhecimento do que carinho. Mary Margaret se mostra egoísta e desinteressada pela vida de Charlie, e o casal acaba terminando. Isso marca o afastamento entre Sam, Patrick e Charlie. O grande retorno do grupo acontece quando Patrick, apaixonado e envolvido com um jogador de futebol americano da escola, é defendido por Charlie em uma briga. Os amigos se reaproximam e se preparam para a comemoração do Natal para a despedida de Patrick e Sam, futuros universitários. Ciente de que a faculdade o afastaria um pouco dos amigos, Sam utiliza toda sensibilidade ao presenteá-los. Na comemoração do Natal, Sam e Charlie acabam se beijando, e isso faz com que ele se lembre da tia que o molestava quando era criança. O episódio o leva a uma complicada crise emocional e o deixa acamado no hospital por tentativa de suicídio. Apesar disso, a câmera abandona Charlie recuperado e esperançoso. O filme termina com a proposta que começa: a solidão - experimentada de forma sentimental no início e saudosa no fim – é uma parte da vida que muitas vezes precisa ser enfrentada. As Vantagens de Ser Invisível exulta também a superação e a capacidade de lutar contra todas as adversidades, tarefa mais fácil se realizada juntos.

As Vantagens de Ser Invisível, de Stephen Chbosky (2012, EUA). Na contramão dos filmes adolescentes produzidos em Hollywood, está o longa As Vantagens de Ser Invisível, de 2012. Os clichês de popularidade, vida social intensa e consumismo – que já vimos em outros filmes focados no público jovem – não norteiam o filme dirigido por Stephen Chbosky. A trama mostra a inserção de Charlie, representado por Logan Lurman, no ensino médio americano, o “High Scholl”. A solidão e a insegurança acompanham o jovem, que há pouco teria superado

Garotas e mulheres reais - com seus corpos, cabelos, pêlos, ossos,

crises de ansiedade supostamente engatilhadas pela morte de sua

dobras e cores. Esse é o principal tema da artista plástica Evelyn

tia, anos atrás.

Negahamburguer, que retrata temáticas como cotidiano, feminis-

O filme foi baseado no livro homônimo cujo autor também dirige

mo, sexo e amor próprio. Bem longe das artificiais campanhas

a película. Para Charlie, a rotina começa a mudar quando ele

publicitárias, a ilustradora abre seu sketchbook e mostra garotas

conhece Sam, interpretada por Emma Watson, e Patrick, que é

desenhadas que celebram seus corpos, e convidam as garotas da

Ezra Miller, que são irmãos de criação. Não demora muito para

vida real a se questionarem sobre determinados padrões de bele-

Charlie dividir seu tempo entre a literatura e os novos amigos, que

za e comportamento.

o introduzem em um mundo de festas, drogas e aventuras.

A artista acumula mais de 5 mil 'likes' em sua página no Facebo-

Paralelamente à vida social, Charlie recebe atenção e indicações

ok, onde posta sua produção. De graffites a tirinhas, estampas de

literárias do professor, Mr. Anderson, interpretado por Pual

blusas e cadernos artesanais, todas as plataformas são utilizadas

Rudd. O docente é o primeiro a identificar o talento e aspiração do

nos desenhos de Negahamburguer. Atualmente o trabalho dela é

jovem para a escrita. Charlie começa então a escrever cartas e

focado em arte urbana – dialogando entre diferentes linguagens,

demonstrar crescente afeto por Sam, que está sempre se envol-

como lambe-lambe e graffiti – e ilustração digital e pinturas. Para

vendo com rapazes mais velhos que não a tratam muito bem.

conhecer mais o trabalho da artista confira o blog www.negaham-

Mesmo se apaixonando por Sam , Charlie se envolve com uma

burguer.blogspot.com.br .

Comportamentos vegetarianos não são novidade ao longo da história. Ao contrário da sabedoria popular, nosso ancestral mais antigo, o Austraopithecus anamensis, aderia a uma dieta com base em vegetais há cerca de 5 milhões de anos. O consumo de carne só aparece na história humana com o Homo Neanderthalensis, há cerca de 127 mil anos – um passado recente se comparado ao tempo em que não nos alimentamos de animais.


Saúde e Bem-Estar

A

o contrário do vegetarianismo, que ganhou visibilidade a partir de Anna Kingsford, britânica conhecida por advogar pelo direito dos animais e pela tese “A alimentação Vegetal Humana”, não há incidências de quando o veganismo começou a angariar adeptos ou de quando a ideologia precede. A principal diferença entre uma e outra dieta é que a primeira é divida em subgrupos onde alguns elementos são permitidos. No semivegetarianismo, por exemplo, somente carnes vermelha e suína são abolidas. No Ovolactovegetarianismo, ovos, mel e laticínios são consumidos. No Ovovegetarianismo, além de qualquer tipo de carne, os ovos são também abolidos. No Vegetarianismo semiestrito, o consumo de mel ainda é permitido, para então, no Vegetarianismo estrito, nenhum destes itens participar da dieta. As fases entre semivegetarianismo até o Vegetarianismo semiestrito, onde algum ou alguns alimentos ainda são consumidos, frequentemente são vistas como pontes de transição entre o 'onívoro', como é chamado aquele que tem a carne como parte da dieta, para o vegetarianismo estrito. Já no veganismo, não só a alimentação restringe o consumo de carnes e derivados, mas também no vestuário, remédios, cosméticos e qualquer outro segmento. Uma diferença imprescindível é que entre os veganos, a ausência de elementos vindos de animais representa uma ideologia de proteção e não-abuso de qualquer ser vivo. Isto inclui exposições, circos, zoológicos e qualquer outro tipo de exploração animal.

Mais de 9% dos brasileiros se declaram vegetarianos A cada ano, a dieta vegetariana e ideologia vegana ganham mais adeptos, mas um número global ainda não existe. Segundo o Ibope, no Brasil, cerca de 9% da população se declara vegetariana, uma porcentagem que representa mais de 17,5 milhões de habitantes. Alguns dos motivos mais comuns entre aqueles que aboliram a carne da dieta estão relacionados à saúde, religião, meio ambiente e proteção animal. Se as pesquisas sobre vegetarianismo são inconcludentes, o veganismo é ainda menos representado. Não há, até o momento, nenhum tipo de dado oficial que aponte quantas pessoas no Brasil ou no mundo decidiram não mais utilizar qualquer tipo de produto com origem animal.

Vegetarianismo ao redor do mundo Outra origem possível do vegetarianismo nos tempos modernos é na tradição indiana, onde a vaca é sagrada e o consumo da carne do animal indica impureza e contaminação. No país, no entanto, outras espécies são consumidas e vacas em idade avançada são frequentemente levadas clandestinamente a vilarejos no interior do país, onde são sacrificadas de maneira rústica e brutal pelo famoso couro indiano, comercializado em todo o mundo.

Saúde e Bem-Estar Crescimento do vegetarianismo e veganismo no Sul do Estado O número de adeptos de dietas com base na alimentação vegetal é crescente entre os jovens, e o Sul do Estado também é palco para a mudança. Prova disso são os encontros a favor da conscientização animal e a confraternização entre os seguidores da ideologia. Em Volta Redonda ocorre mensalmente um piquenique vegano, onde os participantes podem compartilhar receitas, alimentos e conceitos sobre a dieta sem carne. O primeiro encontro ocorreu em 2012 e foi organizado na Praça Brasil, na Vila Santa Cecília, em conjunto com a Feira Grátis da Gratidão, projeto que recolhe e realiza doações de diversos produtos, além de promover apresentações de artistas locais e oficinais sobre assuntos diversos. Camila Freitas, organizadora da Feira e uma das precursoras do Piquenique Vegano, aderiu à dieta há pouco mais de um ano. “Aderi ao veganismo devagar. Comecei pelo vegetarianismo e fui me adaptando. Sempre achei injusto que o ser humano tenha se concedido o direito de explorar outras espécies e em um ponto da vida, não consegui mais admitir a ideia de compactuar com isso” afirma Camila. Matheus Muniz, de 20 anos, se tornou vegetariano há mais de oito anos. “O vegetarianismo surgiu na minha vida após estudar a criação de animais para abate. Os maus-tratos e o sofrimento dos animais me chocou. Não foi forçado ou imposto, e ninguém na minha família deixou de comer carne. Ainda me alimento de derivados, mas talvez um dia consiga parar também. Por enquanto é mais difícil, já que passo o dia fora entre trabalho e faculdade” diz. Isis Guedes, de 26 anos, é vegana desde os 19. “Depois de algum tempo, se torna normal perguntar a composição dos alimentos, procurar ingredientes nas embalagens e adaptar receitas. Desde que decidi parar de comer animais e derivados, tenho diariamente a consciência de que nenhum ser morreu ou foi submetido a sofrimento desnecessário para que eu me alimentasse, por exemplo”, depõe. Para Isis, cidades maiores são mais propícias para quem quer se tornar vegano. “Em Barra Mansa, onde moro, é bem difícil encontrar alimentos totalmente livres de crueldade e as opções disponíveis não são tão acessíveis assim. Em cidades como São Paulo é possível comprar desde doces a refeições prontas, e não é preciso procurar tanto como aqui.”

Nutrição Um dos dilemas enfrentados por quem deseja parar de consumir carne e produtos com base animal é a nutrição. No Sul Fluminense ainda não há profissionais preparados para a orientação de uma dieta vegetariana ou vegana, portanto é muito comum que os adeptos se consultem em outras cidades ou procurem ajuda na internet. Questões como a obtenção de proteínas, cálcio e vitamina B12, mais aparente em carne vermelha, são levantadas comumente e apresentadas como sem alternativa pela maioria dos profissionais regionais. Obviamente, muitos dos impedimentos às dietas vegetariana e vegana são nada mais que mitos e crenças passadas há gerações, sem fundamentos científicos. A Revista dos Vegetarianos, uma publicação voltada exclusivamente para o público, trata mensalmente de questões como essa e dá dicas de como suprir tais carências com grãos, folhas e vegetais em geral. Além da revista, sites como ViSta-Se, também trazem informações importantes sobre diversas questões referentes a alimentação. George Guimarães é nutricionista e atua em São Paulo. Ele é também fundador do VEDDAS, um grupo de conscientização sobre os direitos dos animais. A ação, que possui um site e realiza intervenções em diversas capitais

Alimentação vegana foca em elementos sem carne e derivados do Brasil, recebe doações de amantes dos animais de todo o país. O nutricionista conta que iniciou o vegetarianismo aos quatro anos de idade e de maneira independente. “Se abster da carne nunca foi uma decisão da minha família e ainda criança eu me decidi pelo vegetarianismo” afirma. Aos 20 anos, George cursava Nutrição e direcionou o estudo para a dieta sem carne. Ele buscou apoio na literatura estrangeira e passou a participar de congressos e eventos em outros países. Nessa época, o veganismo passou a ser parte da vida do ativista. Há 18 anos seguindo a dieta vegana, George contradiz muitos profissionais que não se aprofundam no tema e afirma que o veganismo não é apenas possível, mas recomendado. “A abstinência de produtos de origem animal combate e previne doenças de origem crônica e degenerativa”, surpreende o nutricionista. Ele ainda acredita que a dieta é uma questão de respeito e dever moral para com outros seres.

«Sempre achei injusto que o ser humano tenha se concedido o direito de explorar outras espécies e em um ponto da vida, não consegui mais admitir a ideia de compactuar com isso” Camila Freitas

Veganismo e Meio Ambiente Um dos argumentos mais usados pelos onívoros é que a alimentação mundial já é suficientemente prejudicada e que a abolição de mais alguns itens, sendo estes de origem animal, poderia causar ainda mais fome e pobreza. Um estudo assinado pela Organização das Nações Unidas recomendou, mais uma vez, que a população diminua o consumo de produtos de origem animal e baseie a dieta em vegetais. O alerta é reincidente de 2010, quando a ONU lançou o primeiro apelo dos impactos do consumo desenfreado de animais no meio ambiente. O laudo “Our Nutrition World” (em português “Nosso Mundo de Nutrientes”) foi criado por 50 especialistas em 14 diferentes países e assinado pela ONU. No documento consta a atenção para a sobrecarga do planeta, principalmente com a demanda de água potável e espaço para criação. A poluição do solo é outro fator apontado, e o desperdício de comida na alimentação dos animais não deixa de ser preocupante em um mundo onde milhões passam fome. Ainda em um planeta onde o aquecimento global é discutido e a qualidade do ar que respiramos cai constantemente, é espantoso que florestas em todo o mundo sejam destruídas, sendo também o solo inutilizado por décadas, para que haja mais e mais espaço na criação de animais e plantação de grãos para alimentá-los. Àqueles que justificam que a alimentação seria mais difícil sem a carne, fica a contradição: a quantidade de água necessária para “produzir” 1 kg de carne é suficiente para que quase 9 kg de soja se transformem em alimento. Atualmente, a pecuária é a atividade que mais gasta água na Terra, e a água usada é devolvida a rios e mares com hormônios, excrementos, fertilizantes e diversos outros venenos à saúde. Com base em todas as pesquisas divulgadas pela ciência, o vegetarianismo e o veganismo ganham mais adeptos a cada dia. Considerando os impactos citados e ainda desconhecidos, fica o alerta: talvez seja hora de repensar o que vai ao prato.


Saúde e Bem-Estar

Faça você mesmo Um mito envolve a culinária vegetariana. Que ela nela falta algo, como se fosse seu objetivo, uma cópia da alimentação onívora. Para experimentar o sabor da refeição sem derivados de origem animal selecionamos duas receitas veganas. Elas são de autoria do editor de audiovisual Thiago Almeida, que mora em Barra Mansa. Durante 172 dias postou em seu blog, Projeto Vegan (projetovegan.blogspot.com.br), 172 receitas diferentes. Doces, salgadas, elaboradas e mais simples, tem para todos os gostos. Mãos a obra! Torta Americana

Yakisoba Tradicional

Ingredientes da Massa 2 xícaras de farinha de trigo 1/4 xícara de gordura vegetal 3/4 xícara de creme vegetal 1/3 xícara de leite de soja 1 colher (chá) de suco de limão 1 colher (chá) de sal Caramelo (para pincelar)

Ingredientes 250g de macarrão para yakisoba (pode ser o macarrão instantâneo, caso não achar o próprio) 1 cebola média picada 2 dentes de alho picados em laminas 1 cenoura picada em cubos 1 batata picada em cubos ½ maço de cebolinha picada 2 ramos de tomilho picado 4 salsichas vegetais cortadas em rodelas grossas 2 xícara de soja (pts grande) 3/4 xícara de shoyu ½ xícara de água Sal a gosto

Ingredientes do Recheio 1 xícara de açúcar 1 xícara de cereja em calda 1 xícara de morango picado 1 kiwi picado 3 colheres (chá) de maisena 2 colheres (chá) de suco de laranja 1 colher (chá) de raspa de laranja 1 colher (chá) de canela 50ml de creme de soja 1/4 colher (chá) de essência de baunilha Uma pitada de sal Modo de Preparo da Massa Misture o leite com o limão, reserve. Bata no liquidificador a farinha, o sal, a gordura e o creme vegetal, bata e mexa ocasionalmente com uma colher. Despeje a mistura de leite com limão e continue o processo até virar uma massa, separe a massa em duas (sendo um a parte bem maior do que a outra) e embale com plástico, deixe por 30 minutos. Modo de Preparo do Recheio Misture todos os ingredientes. Montagem Abra metade da massa em uma assadeira de fundo removível (pode ser outra), coloque o recheio e cubra com o restante da massa, pincele com caramelo e leve para assar por cerca de 40 minutos em forno médio . Caso não queira trançar e prefira colocar a massa cobrindo toda a torta, faça furos com um garfo, assim você evita uma explosão no forno e uma sujeira na cozinha.

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Modo de Preparo Hidrate a soja com 2 partes de água e uma de shoyu, corte em pedaços e reserve. Leve o macarrão para cozinhar, reserve quando terminar. Cozinhe a batata e a cenoura, reserve. Frite as salsichas em uma frigideira com óleo suficiente para cobrí-las. Doure a cebola juntamente com o alho em uma panela com azeite, adicione a batata, a cenoura, a cebolinha, o tomilho, o shoyu, as salsichas e a soja, deixe ferver por uns instantes e adicione o shoyu e a água, deixe ferver mais um pouco, adicione o macarrão e desligue o fogo. Deixe tampado por mais cinco minutos antes de servir.


A arte que diverte e emociona o mundo trouxe sua magia para a região. Conheça algumas iniciativas que buscam fortalecer o teatro nos municípios do sul Fluminense, as dificuldades encontradas pelos atores e pelos interessados em iniciar nos palcos e os benefícios que a prática pode trazer para o corpo e para a mente. Por Victória Amaral Com o “Pé Direito” teatro acompanha o homem desde os primórdios de sua história. As necessidades apresentadas pelas civilizações antigas de exprimir suas emoções se traduziram em diversas formas artísticas, entre elas a atuação. No Brasil, a quinta arte encontrou espaço nas tentativas feitas pelos jesuítas de catequizar os índios. Popular e democrática, a prática se difundiu em todo o mundo como uma das mais belas e complexas expressões do talento humano, tendo conquistado também o sul Fluminense.

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Apesar de ainda serem relativamente tímidos, os núcleos compostos pelo segmento já são numerosos no sul do Rio de Janeiro. São companhias e coletivos que buscam destaque em um cenário ainda desacostumado com essa manifestação cultural, vista como elitizada pela grande massa. Porém, apesar dessa má impressão, o teatro está mais acessível do que nunca. Além dos cursos gratuitos oferecidos por algumas prefeituras e projetos da região, vários espetáculos livres são encenados todos os meses, seja em festivais ou em iniciativas independentes, com o objetivo de divulgar os trabalhos ou simplesmente levar mais arte para o cotidiano das pessoas.

Uma das companhias que vem se firmando em Resende e contrariando as expectativas de um cenário pouco acolhedor é a Pé Direito, que em pouco tempo de existência já montou quatro espetáculos bem aplaudidos, entre eles dois musicais. Comandada por Arthur Vinciprova (à esq. na foto) , a trupe surgiu em 2011, a partir da bem sucedida peça “Turbulência”, assistida por centenas de pessoas na região e encenada pelos atores Diogo Guimarães (à dir. na foto), Itiana Rochelle, Jéssica Pavone e o próprio Arthur. “Tínhamos uma afinidade artística muito grande e já conhecíamos os pontos fortes um do outro. Achamos que era importante nos unirmos e criarmos uma companhia com trabalhos diversificados onde pudéssemos explorar Foto: divulgação todas as vertentes do teatro e encarar outros desafios”, explica Vinciprova . Formado em Cinema e Artes Cênicas pela Universidade Estácio de Sá (UNESA), no Rio de Janeiro, Arthur escreve, dirige e também atua nos espetáculos. Até agora, além de “Turbulência”, já produziu e participou de “Bar dos Fusco Comédia Musical” (foto), “Rúcula com Tomate

Seco” e “Blefe - O Musical”. Antes de trazer seu talento para o solo resendense, ele, que é natural de Volta de Redonda, já tinha mais de dez peças em seu currículo, entre elas "A dama das Camélias", “Sensações", “Boca de Ouro”, “As Bruxas de Salém”, “Al Capone - O musical” e o “Os Ordinários”. Mas a caminhada rumo ao sucesso e ao reconhecimento não foi exatamente um mar de rosas. O primeiro problema que os atores da Pé Direito encontraram foi justamente a resistência ao teatro demonstrada pela população. “Tivemos dificuldade em conseguir que as pessoas fossem nos prestigiar. Na região o hábito de ir ao teatro não é comum e existem muitos trabalhos inacabados que de certa forma fizeram com que o público ficasse um pouco descrente dos artistas daqui”, afirma Arthur. Aos poucos, com o esforço de uma equipe unida e através de um bom trabalho de divulgação, as portas foram se abrindo para a companhia. “Estamos trabalhado muito e hoje posso dizer que já temos um público grande que se identifica conosco, desde formadores de opinião a simples espectadores. Mas existe a consciência de todos envolvidos na companhia de que nada disso veio de graça ou por sorte. A verdade é que nossas conquistas só foram possíveis pela entrega que tivemos e sempre teremos a cada novo projeto”, desta-


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ca. Hoje, a Pé Direito é formada por quatro atores: Arthur Vinciprova, Itiana Rochelle (foto), Diogo Guimarães e Mônica Izidoro. Também já fizeram participações especiais Jéssica Pavone, Edilaine Maciel e Dandara Mariana. Além dos artistas, há no staff o braço direito Luis Lima, que faz a iluminação e a parte técnica de todos os espetáculos. “Dependendo do que se propõe o nosso novo trabalho, adaptamos o número de envolvidos. Por exemplo, em “Blefe - O musical” nós contamos com quatro dançarinos profissionais. Somos uma companhia aberta à entrada de atores novos, é sempre bom para nos reciclarmos e aprendermos”, finaliza Vinciprova.

Confira as opções de cursos gratuitos na região: Ÿ Curso Livre de Teatro, promovido pela Casa de

Cultura Macedo Miranda, em Resende. Possui turmas nas categorias infantil, juvenil e adulta. Abre as inscrições no início do ano. A CCMM está localizada na Rua Luiz da Rocha Miranda, 117, no Centro. Ÿ Curso de teatro avançado e iniciante promovido

pela Casa de Cultura de Itatiaia, que fica na Rua Antônio Gomes de Macedo, 331, no Centro. As matrículas também devem ser feitas no início do ano e as aulas são ministradas na CCI e no Teatro Municipal Oswaldo Mota. Ÿ Projeto Escola de Teatro e Circo Social, em

Volta Redonda. Oferece aulas de teatro e arte circense para jovens a partir de 14 anos. É mantido pela Secretaria de Cultura, que está situada na Avenida Sávio Gama, 642, no Retiro.

De dentro pra fora Como não é só de pão e circo que vive o homem, a disseminação do teatro na região não tem benefícios de caráter apenas cultural, mas também social. Uma pesquisa divulgada pela Universidade de São Paulo (USP) em março do ano passado indicou que mais da metade da população brasileira se considera tímida. Paquerar, falar com desconhecidos e se dirigir ao chefe estão entre os maiores pesadelos dos acanhados, de acordo com os pesquisadores. Porém, existem formas de amenizar os sintomas, e entre elas está o teatro. "A prática teatral proporciona uma melhora nas interações sociais e relacionamento interpessoal, por aumentar a autoestima através do autoconhecimento, que se dá com o controle do próprio corpo e emoções", aponta a psicóloga Lidiane Reis, que possui vasta experiência na área. De acordo com a especialista, o teatro é, de fato, uma das principais e mais eficazes maneiras de diminuir a timidez. "As capacidades de expressão e comunicação - maiores dificuldades de quem é tímido ou tem medo de falar em público - são desenvolvidas. Além dessas, a motivação, o bem estar na interação com outras pessoas e o desenvolvimento de novos dons artísticos, causando satisfação pessoal", analisa Lidiane, acrescentando que a prática é altamente recomendada ainda na infância. No ano de 2001 ela teve seu primeiro contato com esse universo, se inscrevendo em um curso do Teatro de Bolso, em Resende. "Fazíamos oficinas de expressão corporal, trabalho com argila e aquecimento vocal, entre outras atividades", detalha, frisando que durante esse período fez duas peças: "O inspetor Geral - Nikolai Gogol" e "O que não tem testemunha deixa de ser pecado com colagens de peças de Nelson Rodrigues", ambas dirigidas por Calé Miranda.

“A prática teatral proporciona melhora nas interações sociais e relacionamento interpessoal” – Lidiane Reis, psicóloga

"Constatei que as atividades propostas possibilitam que a pessoa tímida consiga se expressar e interagir melhor socialmente, pois o foco de atenção se volta para o indivíduo. É um desafio imenso que causa ansiedade, mas que gradativamente diminui através do exercício", relata. Após um período afastada, Lidiane retomou as atividades artísticas em 2007, com a peça "O berço do herói - Dias Gomes", de Anna Zelma. Logo depois, em 2008, participou de leituras dramatizadas. Já em 2009, fez um curso de interpretação para TV com o diretor Flávio Colatrello Jr., no Rio de Janeiro. Hoje, ela guarda boas lembranças dos tempos no palco, mas se dedica apenas à psicologia.

Iniciar no teatro para diminuir a vergonha foi exatamente o que aconteceu com Mabelle Balieiro. Formada em jornalismo e trabalhando em uma grande multinacional, a jovem já viveu dias de muita introversão. Quando criança, ela era bastante acanhada, o que fez com que seus pais precisassem dar um “empurrãozinho” em sua personalidade. “Minha mãe é da área educacional e meu pai da área cultural, então desde pequena já gostava de artes em geral, mas eu era muito tímida. Em 1996, eles me matricularam num curso de teatro, aqui em Resende, com o professor Calé Miranda”, conta Mabelle. O amor foi “à primeira fala”. Com um bom coach e dedicação para aprender, Mabelle chegou a atuar em mais de dez peças. “A estrutura do curso era bem bacana. Fizemos várias montagens de autores como Shakespeare e Nelson Rodrigues”, comenta, observando que o trabalho não era muito reconhecido. “O público era bastante seleto e ficávamos em cartaz por poucos dias devido ao baixo interesse da população”. Após anos de aulas e com a experiência que adquiriu, Mabelle uniu sua paixão à habilidade que seria fundamental em sua futura profissão: a escrita. Em 2003, criou e dirigiu a peça infantil “O circo da Emília”, apresentada no Teatro Salesiano. Com o passar dos anos e por conta de sua vida acadêmica, seu gosto pelos palcos ficou em segundo plano, mas não foi esquecido. Recentemente, em 2011, ela fez um curso de extensão na Casa das Artes das Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Na época em que Mabelle iniciou seus estudos na área, a grande massa era ainda mais distante do teatro do que é hoje. Poucas eram as iniciativas individuais ou públicas para promover uma aproximação e proporcionar oportunidades aos jovens da região. E, embora essa realidade tenha mudado (box), há um longo caminho pela frente. “Com a internet a informação chega com mais facilidade a todos. Melhorou bastante, mas muitas pessoas não se interessam de fato”, opina, salientando que não considera o teatro apenas uma forma de entretenimento. “Acredito que pode ser um importante instrumento para a educação popular”. Por acreditar firmemente nesta ideia, a jornalista pretende iniciar um curso comunitário em Resende, com professores voluntários e aulas gratuitas. "Estou montando o projeto", adianta. "Como disse antes, o teatro pode ser aliado à educação e se tornar mais um grande ferramenta na formação das crianças e dos jovens", completa.

Foto: divulgação

O melhor dos ‘‘atos’’ Assim como a jornalista Mabelle, existem outras pessoas em nossa região que enxergam no teatro uma oportunidade de fazer o bem. Danilo Calegari Manzella (foto), técnico superior na Funarte, é um bom exemplo. Bacharel em Teatro pela UniverCidade e estudante de licenciatura da UNESA, o barra-mansense - dono de um currículo respeitável na área teatral, diga-se de passagem - tem dedicado desde 2011 suas tardes de sábado a ensinar as técnicas da quinta arte no Sesc Barra Mansa gratuitamente. E logo o projeto teve sua resposta. "Em um dia de aula eles me perguntaram se eu gostaria de montar uma companhia com eles e caso a resposta fosse positiva, se poderia chamar-se Cia. Calegari, em homenagem a mim. Fizeram tudo e só me comunicaram", diz Danilo, aos risos. A iniciativa tem gerado ótimos frutos, que enchem o professor de satisfação e energia. "Fomos campeões do primeiro Festival de Esquetes da TV Rio Sul com "O Casamento da Maria Feia", orgulha-se Danilo. No último dia 24, ele levou a Calegari para apresentar o trabalho vencedor na "1ª Mostra de Curta Amador”, composta por curtas metragens amadores produzidos na região Sul Fluminense. O evento, que contou com a participação de atores e equipes de produção regionais, aconteceu ao ar livre na rua ao lado do Palácio Barão de Guapi, no Centro de Barra Mansa. Na opinião de Danilo, o distanciamento da população em relação ao teatro tem diminuído cada vez mais. "Hoje o teatro do Sesc já fica bem mais cheio do que antigamente. Acredito que isso deve-se, em parte, ao grande número de grupos que estão surgindo", conclui, ressaltando que quem quiser se inscrever em seu curso, basta procurá-lo aos sábados, de 13h às 18 horas no Sesc Barra Mansa, que fica na Av. Ten. José Eduardo, 560, Centro. Ações como a de Danilo tem o poder de promover transformações intensas na sociedade não só da região, mas também do Brasil. Vários países do mundo já deram provas de que a cultura em suas mais variadas formas pode fortalecer a educação e por consequência acelerar o crescimento de um povo. Mas para que isso aconteça, todos precisam participar: quem faz, quem gosta e quem ainda não conhece. Prestigie o teatro da região e apaixone-se você também.

Calendário regional de teatro Ÿ

Fester - Festival de Teatro de Resende - Consolidado como um dos principais da região, chega este ano a sua 13ª edição. Tradicionalmente acontece no mês de agosto e apresenta espetáculos nas categorias infantil e adulto.

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Festival de Teatro Arte em Cena - Criado pela Companhia Homônima, é realizado em Volta Redonda e também terá sua 13ª em 2013.

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Festival de Teatro da Criança – Realizado pelo Teatro GACEMSS, que já teve nove edições.

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Festan - Festival de Teatro das Agulhas Negras – Teve sua última edição realizada em 2011.

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Fita - Festa Internacional de Teatro de Angra - Considerado um dos mais importantes eventos teatrais do eixo Rio - São Paulo, seleciona as melhores peças do circuito na temporada. Aproxima-se de sua 10º edição, que deverá acontecer em dezembro.

Foto: divulgação

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Neve, livro de Omar Pamuk, Companhia das Letras Neve é um livro denso, que fala de política, conflitos religiosos, amor e literatura. Conta a história do poeta e jornalista Ka, um exilado político que viveu solitariamente em Frankfurt, e, após 12 anos, retornou a sua cidade natal na Turquia, chamada Kars (que significa Neve, em Turco). De volta a suas origens, Ka pretendia apenas escrever uma matéria sobre Kars para um popular jornal alemão. Ele acaba se vendo no epicentro de um microcosmo de conflitos raciais e religiosos do mundo mulçumano, além de presenciar um estranho aumento de suicídios entre as jovens da cidade. Toda narrativa permeia a cultura islâmica em conflito com o secularismo ateu, sendo envolta pelo romance entre Ka e Ïpek, uma antiga amiga do jornalista. O livro é bastante fiel ao conflito vivido na Turquia, tanto geograficamente e culturalmente quanto aos valores ocidentais e orientais. Está é a obra mais política de Pamuk, que em 2006 ganhou o prêmio Nobel de Literatura. Abordando questões políticas e culturais, além do romance envolvente do personagem principal com Ïpek, é um livro realmente interessante. Vale ressaltar que esta obra possui uma linguagem elegante, o que poderá dificultar um pouco sua leitura. Devido à densidade da trama, Neve não é uma leitura de mero entretenimento, e nos leva a refletir sobre questões de tolerância religiosa, divergências culturais e os encontros e desencontros da vida.

Neve Orhan Pamuk

Estatuto do Nascituro oferece personalidade jurídica a embriões e obriga constitucionalmente que meninas e adultas vítimas de estupro dêem continuação à gravidez Por Carla Duarte A Maldição do Tigre, livro de Colleen Houck, Editora Arqueiro Um romance de aventura ou uma aventura romântica? As duas definições cabem perfeitamente na descrição de A Maldição do Tigre, uma saga que alterna momentos de paixão e outros de pura ação, e que poderá agradar aos amantes dos dois gêneros. No primeiro momento, Colleen Houck nos faz pensar que se trata de uma obra destinada exclusivamente ao público romântico, um conto de fadas moderno. Mas o leitor surpreende-se ao embarcar junto com os personagens, na busca pelo rompimento da maldição. A começar por Kelsey que, marcada por uma trágica perda, alterna momentos de puro deslumbramento adolescente e de maturidade além de sua idade. Esta relação entre a fantasia e realidade é desenvolvida ao longo da obra, e que marcará as importantes decisões que a personagem será obrigada a tomar. Da mesma forma que Dhiren, ou Ren, apesar de ser “um perfeito príncipe”,

demonstra elementos que o humanizam, e que nos fazem torcer por personagens tão diferentes e ao mesmo tempo tão complementares. A Índia, tanto mítica quanto moderna, serve como palco principal para a aventura, sendo, na opinião dos leitores, o melhor aspecto do livro, que faz realmente o seu diferencial. mitologia, culinária, religião, cultura: a Índia, com todos os seus mistérios e contradições nos é apresentada, despertando um desejo incomum de se conhecer melhor o país e seus costumes. Os personagens secundários também merecem destaque, principalmente o fiel Sr. Kadam, que auxilia a Ren na busca pela quebra da maldição do título. Como faz parte de uma saga, o livro não tem um final definitivo, o que nos deixa com um gostinho de “quero mais”. E para quem quiser continuar a aventurar-se com Kelsey e Ren, já está disponível O Resgate do Tigre, segundo volume da saga e a Viagem do Tigre, a terceira aventura.

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Estatuto Estatuto do do Nascituro Nascituro (PL (PL 478/2007) 478/2007) vem vem movimentando a Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara dos Deputados, com as diversas tentativas de votação do projeto, que ainda não obtiveram sucesso. O deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) se esforça para que o projeto seja votado. A expectativa é que o Estatuto retorne à pauta do CFT durante o mês de maio. projeto de de lei lei ééconceder concederao aoembrião, embrião direitos fundamentais para que esse O objetivo do projeto tenha direito a vida, e atribuir a ele o mesmo status jurídico e moral que pessoas nascidas e vivas possuem. Para assegurar esse direito, o Estatuto do Nascituro criminaliza o aborto em qualquer situação, até mesmo na que atualmente é permitida por lei, além de proibir pesquisas com células-tronco, técnicas de reprodução assistida e congelamento de embriões.

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O Código Penal, em seu artigo 128 decretado em 1940, assegura que é direito das mulheres interromperem a gravidez em duas situações: quando a gravidez é resultado de estupro e em caso de risco à saúde da grávida. No primeiro caso é necessária autorização judicial, e no segundo, o médico não precisa da autorização para realizar o procedimento. Em 2008 o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a pesquisa com células troncas, quando decidiram que o direito à terapia com elas é constitucional e também um direito à saúde. O STF, em 2012, definiu que mulheres grávidas de fetos anencéfalos também poderiam interromper a gravidez sem autorização judicial e que o ato não configuraria crime. O serviço é gratuito no Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com a literatura médica, a anencefalia é uma má-formação fetal congênita e irreversível, conhecida como “ausência de cérebro”, que leva à morte da criança poucas horas após o parto. Segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), em 65% dos casos a morte do feto é registrada no útero. Em 2007 o Estatuto do Nascituro foi apresentado pelos deputados federais Luiz Bassuma (PT/BA) e Miguel Martini (PHS/MG). Em 2011, a deputada Sueli Vidigal (PDT/ES) o desarquivou, e o texto recebeu parecer favorável do deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) em função de sua adequação orçamentária e financeira e voltou a ser discutido na Câmara. Se aprovado, o estatuto tornará crime o aborto em caso de estupro. A pena para quem for considerada culpada é detenção de até três anos. Na prática, mulheres grávidas que corram risco de vida, gravidez de feto anencéfalo, vítimas de pedofilia e de estupro serão obrigadas constitucionalmente a manter a gravidez. De acordo com o texto, é direito do nascituro a prioridade em casos de adoção, quando o mesmo não for criado pela vítima de violência sexual. O projeto ainda prevê o pagamento de pensão alimentícia, com valor equivalente a um salário mínimo até que se complete 18 anos, para que essas crianças sejam sustentadas. Se o estuprador for identificado ele será o responsável pela pensão alimentícia, se não, a obrigação será do Estado. O pagamento da pensão prevista no Estatuto do Nascituro fez com que o projeto ficasse conhecido como “Bolsa Estupro”. Se for aprovado, a proibição da prática do aborto legal acontecerá em um momento em que os casos de estupro aumentam.

Casos de estupro no Rio de Janeiro crescem 23,8% comparado a 2011 Em maio foi lançado o Dossiê Mulher 2013, documento que está na 8ª edição e é elaborado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) do estado do Rio de Janeiro. O objetivo da publicação anual é diagnosticar os principais crimes relacionados à violência contra a mulher. A 8ª edição traz informações referentes a 2012 com base nas ocorrências registradas nas delegacias do estado. Segundo o Dossiê Mulher, em 2012 os casos de estupro tiveram um aumento de 23,8%, comparado a 2011. Em números absolutos, foram registrados 4.871 casos em 2011, e no ano passado, 6.029. Destes casos 82,8% das vítimas eram mulheres ou meninas, sendo que 51,4% tinham até 14 anos e 78,1% tinham até 29 anos. Ou seja, mais da metade dos estupros praticados contra vítimas do sexo feminino, de acordo com a Lei nº 12.015/09, podem ser classificados como “estupro de vulnerável”. O Dossiê Mulher ainda traz as informações de que 51,1% das mulheres e meninas conheciam seus agressores e em 29,7% dos casos, o agressor era parente da vítima. No que se refere à cor, 55,7% das vítimas eram negras (pardas ou pretas) e 36,4% eram brancas. No Sul Fluminense também foi constatado aumento no número de estupros. As informações são dos seguintes Batalhões da Polícia Militar: 28º BPM (que cobre Volta Redonda, Barra Mansa e Pinheiral), do 37º BPM (que atua nas cidades de Resende, Itatiaia, Porto Real e Quatis) e do 10º BPM (que cobre Barra do Piraí, Valença, Rio das Flores, Piraí, Vassouras, Miguel Pereira, Paty do Alferes, Mendes e Engenheiro Paulo de Frontin). De acordo com os registros desses batalhões, que tem como base o primeiro semestre de 2011 comparado com o primeiro semestre de 2012, o aumento em números absolutos foi de 35 casos. O 28º BPM registrou 55 casos no primeiro semestre de 2011, e no primeiro semestre do ano seguinte 67 casos, totalizando um aumento de 12 registros de estupro. Já o 37º BPM, no primeiro semestre de 2011 registrou 25 casos, e no primeiro semestre de 2012, 39 casos. O aumento foi de 14 registros de estupro. Já o 10º BPM, no primeiro semestre de 2011 registrou 40 casos, e no mesmo período no ano seguinte, 49 casos.

A origem da vida A discussão sobre o Estatuto do Nascituro por vezes pode ser polarizada nos debates de quando se começa a vida ou nos direitos reprodutivos das mulheres. Descobrir quando a vida começa é uma tarefa antiga, e foi apreendida por filósofos, religiosos e cientistas que criaram diversas explicações para o início - o que mostra que o assunto é relativo. Segundo a ginecologista Rosana Soares de Almeida e Silva, existem várias correntes diferentes que explicam o início da vida, e cada uma é interpretada de uma maneira. No âmbito religioso, por exemplo, tudo começa na fecundação e dali em diante já existe uma vida e ela é superior a tudo. “Alguns acreditam que ela começa com a fecundação, outros com a nidação. Existem aqueles que acreditam que é quando come-

-ça a bater o coração, outros quando há o registro de atividade neurológica”, afirma. De acordo com a publicação “Anticoncepção de emergência: perguntas e respostas para profissionais de saúde”, publicada em 2011 pelo Ministério da Saúde, a fecundação não acontece imediatamente após relação sexual, não é sinônimo de gravidez e nem de concepção. A fecundação refere-se, exclusivamente, ao processo de união do espermatozóide e do óvulo, que tem um tempo limitado e definido para ocorrer. Se a relação sexual acontecer no dia da ovulação, a fusão dos núcleos demora entre 12 e 24 horas. Se ocorrer antes, os espermatozóides ficam no colo de útero por até cinco dias aguardando a ovulação, migrando gradativamente em direção às trompas. Quando o zigoto (óvulo fecundado) é formado, são necessários de cinco a sete dias para chegar até a cavidade uterina. “A nidação acontece quando o óvulo fecundado se cola ao endométrio, começando a formar a placenta e a se fixar dentro do útero”, explica Rosana. Segundo a publicação do Ministério da Saúde, a nidação completa-se entre o 11º e o 12º dia após a fecundação, resultando na concepção. Por isso, o conceito de concepção se aplica ao processo de nidação. É somente a partir da concepção que o pólo embrionário do blastocisto se desenvolve e resulta no embrião. Menos de 50% das relações sexuais em período fértil terminam em fecundação, e metade dos zigotos são perdidos naturalmente, sem que ocorra a implantação (concepção). Outra maneira de compreender o início da vida é a partir da concepção religiosa. Segundo o padre Milan, que atualmente está na Paróquia de São Sebastião, no Centro de Barra Mansa, a vida não começa no nascimento. “Para a Igreja a vida começa na fecundação, mesmo que esse momento seja um processo de alguns dias”, explica. Por isso, as religiões cristãs se opõem a prática do aborto. O padre ressalta que apesar das leis serem importantes, nem todas são moralmente aceitáveis. “Muitas constituições não convocam Deus em seus princípios, e é perigoso colocar tanto o homem quanto Deus no centro de tudo. O homem tem que lembrar que precisa de Deus para ser guiado”, afirmou. Desde o século IV o catolicismo condena o aborto em qualquer estado e qualquer circunstância, e essa é a posição oficial da Igreja Católica.

Estatuto do Nascituro: sim ou não? A questão divide opiniões por estabelecer-se em um território em que passam direitos, ética e formas de se encarar a vida. A técnica de segurança do trabalho, coordenadora da pastoral da juventude paroquial e catequista da Paróquia Sagrado Coração de Jesus da Comunidade

São José, Mariana Diogo César, é a favor do estatuto. “Sou a favor, pois é uma forma de se garantir vidas. O ser vivo não deve ter negado seu direito de gozar a vida, muito menos ser interrompido por outro ser”, opina. Mariana observa que algumas particularidades do projeto, como a proibição de estudos com células-tronco, é algo complexo e delicado. “Acredito que seja sim um bom projeto, mas que ainda precisa sofrer consideráveis adaptações”, afirma. A professora de ensino infantil Taynara Figueiredo Reis também concorda com a proteção da vida proposta pelo Estatuto. “Concordo com o Estatuto sim, toda nova vida deve ser protegida”, acredita. A ginecologista Rosana Soares de Almeida e Silva é católica, e tem sua visão religiosa e profissional. Ela é contra o aborto, pois acredita que toda criança é uma benção. Ao mesmo tempo, acredita que não se pode expor a paciente ao risco de vida, e que em relação aos casos de estupro a mulher tem que ter o direito de decidir. “Você já imaginou ter a criança, olhar para ela e se lembrar de tudo o que aconteceu? E aquela criança, quando souber da história dela, como ela vai reagir? São questões muito difíceis de serem respondidas, e acho que cada um deve ter o direito de resolver. Não sou favorável ao aborto, mas sou favorável que a pessoa tenha o direito de decidir sobre sua própria vida”, acredita. Rosana considera o estatuto um retrocesso. “Retirar da mãe o direito dela abortar um feto mal formado, que não é compatível com a vida, a fazer chegar até o final daquela gestação e passar por um trabalho de parto no qual ela sabe que o feto não irá sobreviver. É causar um sofrimento muito grande”, ressalta. A Organização Não Governamental Católicas pelo Direito de Decidir (CDD/BR) trabalha para promover a cidadania e os direitos humanos (sexuais e reprodutivos) das mulheres tanto dentro da igreja católica e em outras religiões quanto na sociedade. Segundo a psicóloga e membro da ONG, Rosangela Talib, a CDD é contra o Estatuto do Nascituro. “Esse projeto de lei pressupõe que a vida humana se inicia no momento da concepção e que deve ser protegida desde então. Isso inviabilizaria a possibilidade da realização de quaisquer abortamentos, mesmo os permitidos pela legislação atual”, explica. Outro objetivo do grupo é divulgar o pensamento religioso progressista em favor da autonomia das mulheres, reconhecendo sua autoridade moral e sua capacidade ética de tomar decisões sobre todos os campos de suas vidas. De acordo com Rosângela, o CDD


compactua com a posição da Organização Mundial de Saúde (OMS), que considera que o processo de desenvolvimento de um ser humano acontece a partir da nidação. A corretora de seguros Melissa Fleming é contra o Estatuto do Nascituro, e acredita que cabe a mulher escolher ter ou não um filho que é resultado de um estupro. Melissa também chama a atenção para a relação entre religião e Estado. “Há outra coisa neste projeto que me incomoda profundamente. Ele é desenvolvido por um deputado cristão, que direta ou indiretamente, quer impor suas crenças como lei para a população. Segundo a constituição vigente, o Estado é laico, portanto política e religião devem ser separadas, o que claramente não acontece hoje”, argumenta. A estudante Ana Carolina Lacerda defende o aborto legal apenas em casos de estupro e gravidez de feto anencéfalo, mas também não concorda com o Estatuto do Nascituro. “Sou totalmente contra esse projeto de lei por achar que é um desrespeito a liberdade da mulher”, afirma.

reitos, o país dê um retrocesso desses”, avalia. O pagamento de pensão proposto pelo projeto é objeto de desconforto de Mariana e Francismara. As duas acreditam que “é uma vergonha” e Francismara ressalta “Como se todo o sofrimento fosse apaziguado com um salário mínimo por mês, e a mulher uma parideira sem vontade, sem autonomia, sem escolhas”. A professora acredita que o Estatuto “é o ápice do machismo e da misoginia institucionalizada que diz legislar pelo povo”. Segundo a teórica feminista e escritora chilena Margarita Pisano misoginia é uma expressão de ódio, desconfiança e desprezo às mulheres. A palavra é de origem grega, na qual misos significa ódio e gyné, mulher.

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Sinara Gumieri - O Estatuto do Nascituro é uma coleção de violações aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres consolidados como direitos humanos em marcos internacionais adotados pelo Brasil, como o Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (Cairo, 1994) e a Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher (Pequim, 1995). V - As restrições dos direitos das mulheres são mencionadas no projeto de lei?

Marcha das Vadias de Volta Redonda No dia 11 de maio o debate “Cantinho Feminista” marcou presença na Feira Grátis da Gratidão, que aconteceu na Praça Brasil, em Volta Redonda. O objetivo da conversa foi discutir a realização da primeira Marcha das Vadias na cidade, e também do Sul Fluminense. Inspiradas por outras marchas do Brasil e de outros países, uma das principais bandeiras da manifestação é discutir a culpabilização das vítimas por estupro, ao invés dos estupradores. O debate rendeu, e outras pessoas demonstraram interesse em participar da organização do ato, que ainda não tem data para acontecer. Atualmente o grupo que organiza a marcha é formado pela professora de História Francismara Lélis, a instrutora de informática Natália Elisa, e as estudantes Juliana e Mariana de Freitas. No grupo, a opinião sobre o Estatuto do Nascituro é unânime: todas não concordam com a proposta. Para Juliana, a proposta do Estatuto marca um retrocesso nos direitos reprodutivos das mulheres. “O Brasil não pode dar, conscientemente, esse passo pra trás. O direito a abortar embriões anencéfalos só foi aceito ano passado e já querem bani-lo. Não é possível, muito menos aceitável, que com toda essa caminhada em busca dos di-

VERSUS - Se o Estatuto do Nascituro for aprovado, o Brasil viola algum acordo no âmbito dos direitos humanos?

Machismo e sexismo são discutidos no 'Cantinho Feminista', que faz parte da Feira Grátis da Gratidão de Volta Redonda. Foto: Carla Duarte.

A discussão sobre o projeto de lei abarca argumentos diversos, da ciência à religião, do feminismo à saúde pública. Se for assinado, as conseqüências que ele traz são irreversíveis as mulheres e seus corpos, que se perdem em meio a uma discussão filosófica e são encontradas nas mãos da violência, na lentidão do sistema jurídico e na dor do sistema público de saúde. O debate passa e a pergunta que fica é, será que os úteros serão castigados?

O Conselho Federal de Medicina e o aborto Em março de 2013 o Conselho Federal de Medicina (CFM), entidade que representa 400 mil médicos, divulgou um parecer no qual sugere a ampliação da lista de situações em que o aborto é permitido. O CFM defende que procedimento também possa ser feito sem penalização até a 12ª semana de gestação por vontade da mulher, se o feto tiver anomalias genéticas que inviabilizem a vida fora do útero e se a gravidez tiver sido produto do emprego não consentido de técnicas de reprodução assistida (se ela não concordou com o uso de óvulos ou espermatozóides doados, por exemplo). O objetivo é que o documento seja enviado para a comissão especial do Senado que analisa as reformas do Código Penal. Os 27 presidentes dos conselhos regionais de medicina e a maioria dos conselhos federais aprovaram a posição da entidade. O parecer do CFM foi baseado na realidade brasileira, em que mulheres ricas optam por clínicas clandestinas que não oferecem tanto risco a saúde, enquanto mulheres pobres passam pelo procedimento em condições precárias e correndo risco de vida. O aborto realizado de forma precária é uma importante causa de mortalidade materna e o terceiro motivo de internações femininas no SUS.

SG - O Estatuto, ou projeto de lei, não aborda qualquer uma das dimensões reais das violações de direitos sofridas atualmente pelas mulheres - o que inclui a falta de acesso universal a informação, educação e serviços de saúde sexual e reprodutiva integrais, compreensivos e de qualidade. V - Em sua opinião, como a mulher é vista dentro do projeto? SG - O projeto inferioriza mulheres como sujeitos morais e de direitos em um ciclo: nascituros terão diversos direitos priorizados, exceto, é claro, se nascerem meninas e se tornarem mulheres: aí estarão à mercê do Estado e dos homens, na condição de meros úteros ambulantes, obrigadas a manterem gravidezes inviáveis, indesejadas, frutos de violência sexual ou que arrisquem suas vidas. Ao absolutizar expectativas de direitos de não-nascidos, isto é, conjuntos de células com potencialidade de se tornarem seres humanos, o Estatuto não disfarça a tentativa de cercear direitos de mulheres reais de terem autonomia e fazerem escolhas livres, informadas e responsáveis sobre seus corpos, sua sexualidade, sua saúde, seus relacionamentos e suas vida reprodutiva (se, quando, como e que número de filhas/os desejam ter).

Para compreender como o projeto de lei interfere nos direitos reprodutivos, nós conversamos com a consultora jurídica em Direitos Humanos e pesquisadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis) Sinara Gumieri.

V - De que forma o Estatuto do Nascituro trata mulheres e meninas vítimas de estupro? SG - O PL trata meninas e mulheres como recipientes de fetos, apenas. Não há qualquer preocupação razoável como motivos pelos quais muitas meninas e mulheres têm dificuldades em denunciar a violência sexual que sofrem. Que motivos seriam esses? Eles envolvem a culpabilização das vítimas (que atribui a suas roupas, comportamentos, hábitos e etc. a "origem" da violência, em vez de responsabilizar seus agressores pela violação da autonomia sexual das mulheres); a cultura do estupro (reproduzida na mídia e no diaa-dia, inclusive institucionalmente, em delegacias e tribunais); o fato de que, na maioria das vezes, o agressor não é um maníaco desconhecido, mas sim alguém próximo, como o próprio namorado ou companheiro, um amigo ou membro da família; a falta de sensibilidade e é t i c a n o acolhimento e atendimento médico e psicossocial a m e n i n a s e mulheres vítimas de violência sexual; e a percepção ou sensação de que os agressores ficarão impunes. Como o projeto trata a violência? O Estatuto do Nascituro normaliza a violência sexual, faz dela parte de uma política pública espúria, que responde a mulheres e meninas vítimas de violência sexual com a perpetuação, pela via do Estado, da violência que sofreram.


Canal Aberto realizado no UBM discutiu IMC com universitários

Edurne Miravete e André Calcagno

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ou não? Eis a questão

Projeto de lei quer estabelecer diretrizes para a regulamentação da internet

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mundo virtual é um universo à parte. Tanto pelo seu tamanho, quase incapaz de ser mensurado, quanto pelas atividades que são realizadas nesse espaço. O que acessamos diariamente em nossos computadores, tablets e smartphones não chega a 10% de todo conteúdo disponibilizado na web, de acordo com pesquisas realizadas. É nesse mar que navegamos sujeitos a todos os tipos de crimes, mais criativos a cada dia. Pensando nisso, atualmente tramita no Senado um projeto de lei que visa regulamentar a internet no Brasil. Esse projeto recebe o nome de Marco Civil da Internet. O debate foi tema de um encontro realizado em abril pelo curso de Jornalismo do Centro Universitário de Barra Mansa (UBM), que contou com a participação também dos alunos de Direito. Para discutir o Marco Civil da Internet, foi convidado o relator do projeto, deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ), assim como o professor do curso de Direito do UBM Pedro Luiz Dalbone e a jornalista Mônica Mourão, do Intervozes. “O Marco Civil é um projeto que teve origem na sociedade através de uma consulta pública, por isso seu debate é de grande importância. Ele defende pontos principais relacionados à privacidade do usuário, neutralidade da rede e liberdade de expressão” afirmou Molon. Segundo o deputado, a concepção desse projeto é bem vista e está sendo imitada por outros países. “Esse projeto não é meu, sou apenas o relator, por isso eu fico tão à vontade para elogiar o MCI, que vem essencialmente do povo”, completa. Desde 2012, o projeto do Marco Civil da Internet está em pauta na Câmara dos Deputados, onde aguarda votação. Ele foi elaborado e colocado em consulta pública na Internet onde recebeu mais de 2.300 sugestões de mudança para o texto. Além disso, passou por audiências públicas em quatro regiões do país. “Estamos sofrendo grande resistência dos provedores de conexão, por isso o único caminho para aprovação é a mobilização social. Ou defendemos o povo, ou os interesses comerciais, que nunca foi nosso compromisso”, frisou o parlamentar. Durante o debate Molon apontou que os provedores se incomodam principalmente porque os artigos do projeto tratam da neutralidade da rede e liberdade de expressão” afirmou Molon. Segundo o deputado, a concepção

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desse projeto é bem vista e está sendo imitada por outros países. “Esse projeto não é meu, sou apenas o relator, por isso eu fico tão à vontade para elogiar o MCI, que vem essencialmente do povo”, completa. Desde 2012, o projeto do Marco Civil da Internet está em pauta na Câmara dos Deputados, onde aguarda votação. Ele foi elaborado e colocado em consulta pública na Internet onde recebeu mais de 2.300 sugestões de mudança para o texto. Além disso, passou por audiências públicas em quatro regiões do país. “Estamos sofrendo grande resistência dos provedores de conexão, por isso o único caminho para aprovação é a mobilização social. Ou defendemos o povo, ou os interesses comerciais, que nunca foi nosso compromisso”, frisou o parlamentar. Durante o debate Molon apontou que provedores se incomodam principalmente porque os artigos do projeto tratam da neutralidade da rede e da privacidade dos dados dos usuários. Atualmente as informações são armazenadas e vendidas para que empresas possam conhecer as características dos clientes em potencial. Daí a publicidade tão direcionada. É uma coleta de dados e redirecionamento de produtos. Pelo MCI a prática seria proibida respeitando a privacidade do usuário. Quanto à neutralidade, a proposta prevê que um provedor não possa dar mais “largura de banda” a determinado conteúdo, mediante pagamento de uma taxa extra, por exemplo. É exatamente por seguir na frente quanto à regulamentação da internet que o projeto recebe apoio de especialistas no assunto.

É exatamente por seguir na frente quanto à regulamentação da internet que o projeto recebe apoio de especialistas no assunto. Em sua última visita ao Brasil, em maio, o físico britânico Tim Berners-Lee, considerado “pai” da web, declarou apoio às propostas brasileiras de regulamentação da internet. “O cerne da questão é que a neutralidade é importante e o Brasil está numa posição de liderança, partindo na direção certa, levando em consideração os direitos humanos” afirmou o cientista durante a coletiva do evento WWW 2013, realizado no Rio de Janeiro.

Por outro lado... Embora seja considerada uma forma eficaz de reduzir a insegurança jurídica no país em temas relacionados à internet, o Marco Civil da Internet tem sido alvo de críticas por não contemplar os direitos autorais, representando, segundo algumas entidades, um forte retrocesso neste campo. Inicialmente quando foi apresentado à Câmara dos Deputados, em agosto de 2011, o projeto de lei defendia a respeito “Da Responsabilidade por Danos Decorrentes de Conteúdo Gerado por Terceiros” o seguinte: “Art. 15. Salvo disposição legal em contrário, o provedor de aplicações de Internet somente poderá ser responsabilizado por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente.” Ou seja, os provedores de conexão à internet só serão julgados pelo conteúdo publicado por seus usuários na Justiça se, após uma ordem judicial, a empresa não tomar providências para tornar o conteúdo indisponível. A grande diferença é que, atualmente, a remoção do conteúdo pode ser feita de forma extrajudicial, como a partir da reclamação do usuário ao provedor.

«Ou defendemos o povo, ou os interesses comerciais, que nunca foi nosso compromisso.» - Alessandro Molon

Segundo o advogado Marcos Antônio Barros, a forma como é feita a retirada de conteúdo da internet hoje é a ideal. “Hoje podermos solicitar a retirada de conteúdo através de comunicado extrajudicial. Qualquer mudança neste ponto representa um grave anacronismo”, adverte ele. A fim de apaziguar um pouco os ânimos e abrandar críticas, o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), autor substituto do Projeto de Lei do Marco Civil da Internet, incluiu mais um parágrafo ao Artigo 15, no qual garante que a regra nova se aplica somente à liberdade de expressão. Dessa forma, as condições de retirada de conteúdo da rede não se aplicarão quando se tratar de infração a direitos de autor ou a direitos conexos. Já para o Comitê Nacional de Cultura e Direitos Autorais (CNCDA), formado por 22 entidades, entre elas a ABDA – Associação Brasileira de Direito Autoral - e a ABPI – Associação Brasileira de Propriedade Intelectual – vê com preocupação esta questão, visto que a isenção de referência aos direitos autorais e a judicialização do processo – o que, de acordo com os especialistas, protege os provedores em detrimento do autor– só irão agravar a situação já delica dos autores devido à pirataria. Sobre esta questão, Barros, se lembra da lentidão da justiça frente à velocidade em que circulam os dados na internet. “A internet é muito mais rápida do que qualquer judiciário do mundo. Se dependermos exclusivamente dele para retirar conteúdos, os agravos causados as vítimas serão terrivelmente maiores. Não podemos cair no erro de burocratizar ainda mais o processo”, explica ele. Em manifesto divulgado em meados do ano passado, o Comitê Nacional de Cultura e Direitos Autorais propõe ainda que o Projeto de Lei inclua no inciso I do artigo 3º, que cuida dos princípios a que se deve ater a disciplina da Internet, o seguinte texto: “I – garantia da liberdade de expressão, comunicação e o respeito aos direitos autorais e à propriedade industrial”.

Deputado Alessandro Molon é relator do projeto


Tem gente que acha que esporte radical é coisa de doido, mas o que os praticantes afirmam é que para sentir a adrenalina tem que ter a cabeça exatamente no lugar. Por Edurne Miravete

A maioria das pessoas pode não se dar conta, mas o Sul Fluminense é uma região bastante propícia para a prática desses esportes considerados de aventura. Resende, uma cidade de “vales, rios e montanhas” tem também um aeroporto municipal, único com saltos regulares de paraquedas no estado do Rio de Janeiro. Por esses motivos, muitos atletas vêm de fora para saltar e também praticar o montanhismo e mountainboard. Há quem diga que os adeptos dessas modalidades não têm “os parafusos no lugar”, mas os entendidos do assunto dizem que, ao contrário, para fazer esses esportes a pessoa precisa estar mais lúcida que nunca. Foto: Roberto Tuelho

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estômago dá um salto e gela dentro da barriga. As pernas tremem e as mãos suam. Não, esses não são sintomas provocados por algum tipo de doença. É o que as pessoas sentem quando estão sob influência da adrenalina e da endorfina. A primeira aciona o sinal de alerta de perigo, enquanto a endorfina determina a sensação de bem estar e prazer após alguma atividade física, por exemplo. O encontro desses dois agentes físicos causa no corpo tensão, dilatação das pupilas, suor frio e euforia. Você consegue identificar esses sintomas? Então é porque provavelmente já deve ter experimentado isso durante um momento de paixão, tensão, medo, ou em nosso caso, praticando um esporte radical.


Velocidade nos pés É o que acredita Paulo Solon, o Paulão, 51, como é conhecido. Pioneiro do montainboard no país, ele mantém um centro de treinamento em Visconde Mauá, distrito de Resende. Na Local Trip, Solon fabrica o equipamento, que é basicamente uma prancha de madeira (shape) com quatro pneus calibrados para andar na terra. O mountainboard, além de proporcionar um exercício que chega a grandes velocidades, é conhecido também por suas manobras aéreas realizadas em rampas e morros, como os que têm no centro de treinamento. Os atletas da Local já se aventuraram inclusive na Cachoeira do Escorrega, em Maromba. No lugar, a queda d'água passa por uma grande pedra escorregadia até chegar a um poço, o que caracteriza um desafio certo para os praticantes. - Ao contrário de algumas declarações sem fundamento que dizem que a alta performance em esportes radicais é 'coisa para malucos', posso afirmar exatamente o contrário, que maluco não se cria nesse esporte, talvez até nem sobreviva. Os atletas de nível mais avançado têm disciplina de treinamento, não ingerem álcool, nem usam drogas e são perfeitamente conscientes dos movimentos que fazem - , rebate Paulão. Pela difícil conciliação entre necessidade de domínio do instrumento e uma alta velocidade, é comum que os atletas caiam e acabem se machucando. Apesar disso, segundo Paulão, em 15 anos da existência da Local Trip, ele nunca presenciou nenhum caso tão sério. “Até hoje não vi nenhum acidente grave no nosso centro, nem mesmo em campeonatos do Circuito Brasileiro. O que já presenciei foram algumas contusões comuns também em outros esportes considerados 'não radicais'. Já fiquei sabendo no máximo de alguns braços e pernas quebradas em campeonatos onde os atletas costumam ir até o limite”, explica. A alta velocidade pode trazer consequências perigosas, por isso, para se tornar um atleta de mountainboard na Local Trip é preciso seguir algumas regras, como frisa Paulão. Primeira, é indispensável o uso de equipamentos de segurança como capacete, joelheiras, cotoveleiras, luvas, e em casos mais extremos, coletes de proteção cervical. Segunda, a prática só deve ser iniciada com instrutores capacitados. E última, antes de se aventurar nas manobras é preciso aprender o básico, que é parar de forma correta e segura.

Foto: Adilson Martins

Perto do céu

Mountainboard Local Trip Mountainboard Visconde de Mauá, Resende (RJ) Tel.: (24) 9845-4000 E-mail: localtrip@gmail.com www.localtrip.com.br Paraquedismo Aeroporto Municipal de Resende Estrada do Aeroporto s/nº Itapuca, Resende (RJ) Tel.:(24) 3354-4732 www.aerocluberesende.com.br

Dzdropzone (Escola de Paraquedismo) Aeroporto Municipal de Resende Tel.: (21) 9178-0469 (15) 9681-3787 www.dzdropzone.com Montanhismo Grupo Excursionista Agulhas Negras (GEAN) Praça Esperanto, nº 26, apto. 01. Campos Elíseos, Resende (RJ) Tel.: (24) 9905-8161 E-mail: grupogean@yahoo.com.br www.grupogean.com

Aliás, segurança é o princípio que guia esses atletas atraídos pela aventura. Daniel Guerra, 41, gosta tanto de velocidade que seguiu por outro caminho, o paraquedismo. Saltando o carioca consegue atingir uma velocidade de cerca de 200 km/h. Desde que iniciou no paraquedismo, há 23 anos, o instrutor da escola DZdropzone, instalada no Aeroporto Municipal de Resende, acumulou uma marca de 17 mil saltos. Para ele, o perigo é evidente, mas existem maneiras de amenizá-lo. “Pegar onda, escalar montanha, andar de balão e saltar de paraquedas são modalidades perigosas, mas cabe a você torná-las seguras”, afirma Daniel sobre os esportes que pratica. “O que vale é o conhecimento. Tenho que saber sobre o tempo, o clima da região, analisar os perigos e todas as possibilidades. Dessa forma consigo minimizar as chances de alguma coisa dar errado”, completa. Não fosse por essa consciência, Daniel bem que poderia ser apontado como maluco. Como está documentado na revista Trip de dezembro de 1996, ele e um amigo saltaram de paraquedas da Torre da Basílica de Nossa Senhora Aparecida, em São Paulo. Toda história é muito engraçada quando ele conta, mas o episódio causa pelo menos um segundo de preocupação em quem escuta. - Uma vez eu e um amigo médico, fizemos Base Jump em Aparecida. Nós subimos de elevador até a Torre, encontramos uma janela aberta e pedimos para senhora que estava na sala não chamar o segurança. 'É uma promessa', a gente disse para tentar convencê-la. Aí pulamos e quando aterrissamos conseguimos du-

ascoisas: a promessa cumprida e um registro policial. Graças a Nossa Senhora nada mais grave que isso - , lembra Daniel divertidamente sobre a situação. Apesar de não ter ocorrido nenhum acidente, Daniel não estava certo de que tudo correria bem. Ele e o amigo estiveram na Basílica algumas vezes antes do salto para analisar a situação. A também instrutora na DZdropzone, Vivian Bragante, 27, diz que essa preocupação é o que livra os atletas da maioria dos acidentes. “É questão de confiança. Quando você acha que já sabe tudo e pensa que nada vai acontecer, aí os imprevistos aparecem”, afirma a paulista. Não tem jeito de convencer esses apaixonados de que o risco não vale a pena. Daniel é categórico quando tentam persuadi-lo de que o que ele faz é arriscado demais e o instrutor logo diz: “Tá com tempo? Vamos conversar... Dependendo da maneira como você conduz seu carro ou moto você é mais maluco que eu. Não tenho moto porque adoro velocidade. Se eu tivesse uma, acho que não estaria mais aqui”, brinca. “As pessoas geralmente se sentem seguras no chão. Pra mim não, quanto mais longe do solo melhor eu me sinto”, emenda.

Desbravadores de montanhas Os integrantes do Grupo Excursionista das Agulhas Negras (GEAN) têm uma opinião um pouco diferente sobre isso. Para eles, quanto mais 'chão', mais interessante fica. Como o próprio nome já aponta, o GEAN é um grupo de montanhismo que programa, há 51 anos, viagens de excursão pelas trilhas da região das Agulhas Negras, como Resende e Itatiaia e outras cidades. Em fevereiro deste ano, Moises Sulam, guia no grupo, teve uma boa experiência ao tentar pela segunda vez subir a Pedra da Macela, em Cunha (SP). Na primeira tentativa ele guiava um grupo de quatro pessoas, mas pela forte chuva a caminhada não foi bem sucedida e eles não conseguiram finalizar o passeio. Desta vez, com 17 integrantes a mais na excursão, ele conta com orgulho como foi a aventura. - Foi prazeroso observar a reação de cada um que eu guiava. Já no cume, com o bom tempo que fazia, conseguimos observar bem a paisagem. Algumas pessoas buscavam localizar lugares conhecidos, outras analisavam as possíveis vias de escalas nas rochas, tiravam fotos ou como um menino que estava conosco, observavam o mar lá de cima - lembra Moises. No montanhismo não há restrição de idade, pois permite a participação de crianças e adolescentes. Os componentes do grupo programam seus passeios de acordo com seus níveis e preparo físico. Para os iniciantes é recomendado passeios mais leves, com trilhas menos exigentes. Mas há também algumas caminhadas que têm alto grau de dificuldade. A subida para o Pico das Agulhas Negras, na parte alta do Parque de Itatiaia, por exemplo, é cansativa pela extensão e duração da caminhada. Possui também muitos declives que devem ser escalados com cuidado porque as pedras são escorregadias. Com todas essas dificuldades, é a sensação de proximidade com a natureza que atrai os praticantes dessa modalidade. “Logo nos primeiros metros da Pedra da Macela encontramos um filhote de cobra que nos rendeu boas fotos. Em seguida um grupo de jumentos surgiu na trilha e uma fêmea bem mansinha se aproximou da gente”, comenta o guia. “Depois de ter visto tudo isso, quando cheguei ao ponto mais alto do passeio por vários instantes fiquei em silêncio admirando a extensão do mar e concluí: 'A montanha é a nossa praia'”, finaliza Sulam. São declarações como essas que nos fazem entender que para cada um dos entrevistados o risco não ofusca o benefício e a sensação agradável que preenche o corpo e a mente ao experimentar esses esportes. A Vivian do paraquedismo gostou tanto de descobrir essa paixão que passou a se dedicar somente à atividade. “Deixei dois empregos de contabilidade para viver isso aqui. Financeiramente é um pouco mais apertado, mas é o que eu gosto, né? Voando eu estou perto dos anjos”, afirma a instrutora. Já o Paulão do mountainboard, diz que toda essa aventura regenera a energia. “O mountainboard carrega nossas baterias para as missões do dia a dia”, salienta. Vendo por dessa perspectiva, maluco mesmo é quem ainda não experimentou a sensação de aventura-se por algum caminho desses esportes.

Foto: Taylor Abá

Esportes

27


C

om que frequência você vê alguém lendo um livro pela cidade? Com que frequência você lê? Você conhece a história do autor de sua obra preferida? Sabe aonde ele vive ou de onde ele veio? Fui apresentada a essas questões há alguns anos, quando tive meu primeiro contato com um autor barra-mansense. Passeava por uma dessas redes sociais para leitores ávidos e me interessei por um livro por causa da capa. Uma igreja um tanto quanto gótica e uma brilhante cruz eram os elementos principais de Velhos Segredos de Morte. Já com a obra em mãos, descobri aonde o autor vivia: na mesma cidade que eu. Imagino que isso seja comum quando se vive em São Paulo ou no Rio de Janeiro, mas encontrar um escritor deste nível em Barra Mansa era uma ideia inconcebível para mim. Com o passar do tempo, conheci inúmeros outros escritores da região e percebi que literatura se faz em todo lugar. O interior também inspira belas histórias e forma grandes autores. O publicitário Jefferson Sarmento é o pai da obra que me gerou tanta admiração. Ele conta que não escreve por profissão, mas por uma necessidade quase fisiológica. “Desde que comecei a juntar letras, quis contar estórias. Escrever é só um ato: a mágica está no enredo. E, com o tempo, acho que fui aperfeiçoando a técnica e o hábito de usar a ferramenta”, explica Jefferson. O ponto alto de Velhos Segredos de Morte, na opinião de muitos leitores, é a co-protagonista Isabel. Questionado sobre a inspiração para a moça, Jefferson conta que, ainda que Isabel seja uma criação, ela toma as rédeas do próprio destino. “Lá pelo meio do livro, ela não quer mais aquele rótulo de mocinha do filme de bangue-bangue. Ela não quer que escolham para ela. Ela não quer o destino que o escritor deu a ela. Isabel é a musa, o motor de inspiração para a estória. Embora saiba que centenas dessas mulheres passeiam por aí, não posso dizer que escolhi uma para moldá-la. Pelo contrário, essa é uma personagem que inverteu o processo criativo: escrevi por sua causa”, confessa. O autor tem quatro obras escritas, embora apenas duas tenham sido publicadas. O terceiro livro está em processo de edição e deve estar nas prateleiras ainda neste ano. Jefferson acredita que, com o passar do tempo, o escritor encontra gosto em redescobrir e reescrever estórias que ainda não estavam prontas para o público. “O terceiro escrito foi Os Ratos do Quarto ao Lado, publicado depois de Velhos Segredos. Fala basicamente sobre um serial killer que aterroriza uma cidade média, matando meninos e deixando-os expostos em cenas que lembram um ritual macabro”, adianta. Nesta obra, rapidamente, o leitor passa a desconfiar de todos os personagens, descobrindo motivos e acontecimentos que remontam ao passado de alguns dos personagens centrais. Nota-se, assim, que a atenção à mente humana é presença constante no trabalho de Jefferson, que tem apenas uma pretensão enquanto escritor: ser lembrado como um bom contador de estórias.

Ela que escreve Débora Costa seria apenas uma jovem como qualquer outra, se não tivesse sido apresentada ao mundo literário e desenvolvido um gosto especial pela coisa. Aos 21 anos, a estudante de Publicidade e Propaganda, que também vive em Barra Mansa, tem quase cem textos publicados no (blog) Ela que Escreve. A página é um diário virtual aonde ela fala sobre amor. Com o slogan “Sobre os dramas de quem se apaixona”, o blog tem mais de três mil fãs em toda a região e é atualizado semanalmente. “O Ela Que Escreve é um projeto bem antigo que veio para falar de amor. Eu queria escrever sobre como as pessoas realmente se sentem, seja em relacionamentos ou família, e que dessa forma, quem lesse, poderia encontrar uma solução para os próprios problemas ou ao menos não se sentir sozinho. Hoje, vendo o reconhecimento e elogios que recebo na rua, eu sei que estou cumprindo com o meu objetivo”, comemora Débora. Para ela, o amor pela escrita está atrelado à compulsão pela leitura. Débora lê cerca de 40 livros ao ano, mas ainda acha pouco. “Se toda a criança soubesse das maravilhas que um livro pode proporcionar, provavelmente elas não iriam querer outra coisa. O livro além de ajudar muito na escrita e na comunicação, proporciona universos que, pra muitas crianças, pode ser um refúgio”, argumenta. Questionada sobre o sonho de viver da escrita, Débora se mostrou com os pés bem fixos no chão, ainda que seu universo seja tão sonhador quanto o mundo literário. “Lançar meu próprio livro é um sonho. E, se eu puder viver apenas disso, eu viveria. Mas escrever não é fácil, todos sabem. Nos meus planos atuais, é a Publicidade que eu tenho como profissão, e a literatura como paixão”, conclui.

Debora Costa, escreve o blog Ela que Escreve

A culpa é das avós Tanto Jefferson quanto Débora foram principalmente influenciados por suas avós, as grandes narradoras. “Durante a infância, minha avó me contava histórias e também me incentivava a ler os livros que ela lia quando era mais jovem. Isso me tornou mais capaz de imaginar, desenvolveu minha criatividade e me possibilitou escrever minhas próprias histórias”, conta Débora. Para Jefferson, a leitura foi uma descoberta: a curiosidade com relação aos livros que a mãe lia avidamente. A criatividade, no entanto, veio da avó que lhe dedicava os contos. “Passava horas vendo-a costurar numa velha máquina Singer, no quarto dos fundos da casa. Ela terminava uma costura e eu insistia para que ela contasse mais uma estória enquanto rodava a máquina e gangorreava o pedal. E depois pedia outra, outra e outra. Daí a descobrir que aquela mágica que havia nas palavras ditas por ela estava também nos livros que minha mãe devorava foi um passo curto”, revela.

O Condomínio Cultural, localizado no bairro Volta Grande III, sediou, entre os dias 26 e 28 de Abril deste ano, a primeira Bienal do Livro de Volta Redonda. O evento – organizado pelo Instituto Dagaz, em parceira com a Academia Voltarredondense de Letras e a Associação de Moradores dos bairros Volta Grande I e III – contou com uma programação variada, incluindo exposições, atividades educativas e lançamentos de livros. Durante os três dias de funcionamento, o espaço reuniu mais de nove mil pessoas. “Eventos como a Bienal do Livro trazem para a região a real importância da leitura. Sempre ouvimos por aí que não existe tanto incentivo, mas a Bienal veio pra mostrar que isso não é verdade. Ter um evento deste porte em Volta Redonda é mostrar que as pessoas que lêem têm o seu espaço, e que o nosso 'universo' é muito grande”, defende Débora.Para Jefferson, este tipo de evento incentiva

Jefferson Sarmento está prestes a lançar o 3º livro

principalmente as crianças, que precisam ser motivadas desde cedo a se interessar pela leitura. “É quando se acende a centelha. As crianças são pura imaginação e quando descobrem que um livro é um pequeno cofre em que se guardam tesouros desse mundo fantástico, elas se apaixonam. É infinitamente mais difícil conquistar um adulto que não se apaixonou pelo Pequeno Príncipe lá atrás”, opina. Jefferson acredita que uma mente treinada desde cedo entende que as jornadas reais têm um paralelo com a fantasia. “Os heróis lutam pela vida, como nós; caem e se erguem, buscam outros caminhos, fraquejam, erguem-se outra vez. E continuam seguindo em frente porque essa é a única alternativa viável, correta. A leitura é basicamente um manual técnico cheio de sonhos para aprendermos a lidar com a vida”, finaliza.


a filosofia do Por Victória Amaral, Brena Lacerda e Larine Flores

Season finale eletrizante para Grey’s Anatomy A série Grey's Anatomy é focada na vida dos cirurgiões que trabalham no hospital escola Grey-Sloan. Em meio a diversos casos médicos de complicada solução, a série é um dos principais dramas da rede ABC. No dia 16 maio foi ao ar nos Estados Unidos o último capítulo da 9ª temporada da trama, que tem milhões de fãs no mundo todo. Depois de um final de matar qualquer fã do coração, com direito a dois possíveis rompimentos, uma quase morte e um parto de tirar o fôlego, Shonda Rhimes (criadora e produtora da série) comentou sobre o episódio - que foi assistido por mais de oito milhões de pessoas - e falou um pouco sobre o que vem por aí. Em entrevista à Entertainment Weekly, Shonda disse que está adorando o clima de dúvida que ficou após o fim de "Perfect Storm", onde um dos principais personagens da atração aparece aparentemente sem vida. Será que ele retorna para a 10ª temporada? De acordo com ela, sim. Só não dá pra garantir que será vivo. “Essa é uma pergunta bastante interessante! Não vou responder, pois gosto dessa questão. Direi apenas que o veremos novamente”, disse Rhimes. Quanto ao relacionamento homoafetivo mais querido da história da TV e que também teve suas estruturas abaladas na season finale, Shonda deu mais detalhes.

Autoconhecimento Com mais de dois mil anos de existência, o budismo traz ensinamentos práticos à vida cotidiana

“Eu acho que vários personagens LGBT na televisão — e espero não cair nessa categoria — são “limpos” para a nossa proteção. Eles estão felizes e apaixonados, dificilmente fazendo algo errado. Eles nunca traem, não são sexuais e não possuem outras histórias além do fato de serem gays. Eu queria dar a esse casal uma história complexa que não fosse sobre o mesmo assunto de sempre”, explicou a produtora. A décima temporada da série deve estrear em setembro nos EUA e provavelmente será a última da saga de Meredith Grey (Ellen Pompeo), a protagonista. Isso porque, nos últimos anos, entrar em consenso nas negociações financeiras e manter o elenco principal ficou cada vez mais difícil. Agora, resta aguardar o que Shonda reserva para os fãs.

O inverno está chegando A terceira temporada de Game of Thrones está quase no fim. A série, baseada na saga As Crônicas de Gelo e Fogo, do norte-americano George R. R. Martin, é uma fantasia épica ambientada na Era Medieval, quando cada família nobre tinha um brasão, um lema e sua honra a defender. GOT é pesado desde os primeiros minutos, mesclando cenas de profunda paixão, lutas com espadas e bestas, e, principalmente, os conflitos políticos da época. A história se passa na terra de Westeros, onde, ao longo dessas três temporadas, inúmeras tramas e batalhas acontecem para definir quem deve, por direito ou conveniência, se sentar no Trono de Ferro e governar sobre os Sete Reinos. A vida parece algo banal para o autor que, sem aviso prévio, acaba se livrando de nossos personagens favoritos (nem os protagonistas escapam!). E os sentimentos são muito intensos, a ponto de você nem se lembrar porque odiava tal personagem na temporada anterior. O elenco e a produção são tão grandes e ricos que, algumas vezes, podemos nos esquecer de certos lugares ou de alguém que ficou algum tempo sem aparecer, mas cada fio da história se liga perfeitamente ao outro, construindo com riqueza de detalhes a trama que nos encanta há quase três anos.

O retorno de Hannibal O lendário serial killer de Dragão Vermelho, O Silêncio dos Inocentes e do próprio longa Hannibal, retorna às telas desta vez por bem mais tempo que um par de horas. Na série homônima, Hannibal é um psicólogo que se envolve no trabalho do FBI capturando outros psicopatas. No início da ficção é possível se enganar e pensar que o famoso assassino não passa de uma entre diversas outras personalidades problemáticas. A relevância do protagonista é vista com o desenrolar de sua amizade com o principal detetive – dotado de uma habilidade de pensar como os autores dos crimes. Ainda nos primeiros episódios, a série promete momentos de tensão e surpresa ao refinado estilo clássico característico do Dr. Lecter.

Quem vive o serial kiler na série é o ator dinamarquês Mads Mikkelsen

A

o contrário do que muitos pensam, a filosofia budista não consiste em um sistema religioso, mas em um princípio ético que tem como objetivo o autoconhecimento e a libertação do sofrimento. Para o Budismo, o sentimento mais próximo e imediato à existência humana é o sofrimento, e é necessário aprender a lidar com ele para que possamos atingir um estado de consciência e harmonia satisfatórios para nós mesmos. Schopenhauer, filósofo alemão influenciado pelo budismo, disse certa vez que se o sentido mais próximo e imediato de nossa vida não é o sofrimento, nossa existência é o maior contrassenso do mundo. “Pois, constitui um absurdo supor que a dor infinita, originária da necessidade essencial à vida, de que o mundo está pleno, é sem sentido e puramente acidental”. O budismo é, portanto, o caminho para a libertação da dor intrínseca ao mundo, pois ele desperta o indivíduo para o conhecimento da verdadeira natureza dos seres e das coisas.


Filosofia

1

- Inferno – Qualquer ansiedade de medo ou mal-estar pode ser infernal. As pessoas consumidas pelo ódio estão no inferno, ou ainda quando sentimos dor ou sofrimento. NitirenDaishonin declara: “A ira é o estado de Inferno”. Este é o pior mundo para se morar e está além da razão e da paixão.

P

ara Júlia Hartmann, nutricionista e voluntária na Comunidade Zen Budista de Curitiba, o budismo nos leva a ver a realidade como ela é, e não como parece ser. “No universo não há nada permanente, o mundo é contingência, com isso, o homem experimenta uma realidade inconstante que lhe traz inquietação (Dukka). O que existem, de fato, são as sensações, percepções e a memória”, diz ela. Ainda segundo Júlia, tudo no universo está conectado; o “eu” e os mais diversos fenômenos não possuem autonomia, tudo é interdependente e efêmero. “O mundo não tem um sentido, todo sentido está no universo simbólico criado pela consciência humana, que é a única entidade capaz de atribuir sentido as coisas”, explica ela. Para Agy Campos, economista curitibano e praticante do budismo há mais de 10 anos, esta filosofia não é apenas para ser entendida intelectualmente, mas sim vivenciada. “A prática diária da meditação conciliada ao estudo filosófico nos eleva a outro nível de consciência. Passamos a compreender melhor o fluxo inevitável da vida, o que acaba nos ajudando a viver melhor”, comenta ele. Já Mayara Machado, 24 anos, enfermeira em Volta Redonda, acredita que o budismo nos conecta de forma diferente com o mundo a nossa volta. “A filosofia budista nos ensina que tudo está conectado. Se nos cercarmos de bons fluídos, de uma energia calma e tranquila, podemos mudar o mundo a nossa volta”, diz ela. Ainda Segundo Agy, quando percebemos que os ensinamentos de Buda nos direcionam a uma compreensão de mundo diferente do pensamento ocidental, encontramos um momento especial em nossa jornada espiritual. “Nossas comunidades não precisam de 'pessoas de sucesso' como prega nossa cultura, mas de pacifistas, educadores, restauradores, contadores de estórias e sonhadores. Só assim poderemos mudar alguma coisa pelo bem comum”, finaliza Agy.

Dentro da filosofia Budista, encontramos NitirenDaishonin, uma espécie de Sócrates japonês, que aplicou um dos conceitos orientais mais interessantes, os Dez Mundos. Obviamente estes não são mundos físicos, mas dez estados mentais que vivenciamos a todo o momento, sendo que um dessas instâncias estará sempre em predominância. São eles: inferno, fome, animalidade, ira, tranquilidade, alegria, erudição, absorção, Boddhisatva e o estado de Buda. Todos os estados, menos o de Buda que é exclusivamente bom, podem resultar em causas boas ou ruins.

4

- Ira – Não se deve entender apenas por perder a calma. Mas um estado contínuo de raiva ou mau humor, onde qualquer coisa é capaz de nos irritar sem grandes dificuldades. Ou ainda pessoas sádicas, arrogantes ou que vivem criticando tudo e todos. Esses tipos de ira são paixões insensatas e exageradas. Também pode ser aplicado de forma benéfica, como a ira contra a injustiça, impelindo à luta.

2

- Fome - Não se refere ao apetite físico, mas aos anseios da alma. Pessoas obcecadas têm esta fome, assim como as viciadas. Muitas pessoas, por exemplo, tem uma fome afetiva terrível, tentam suprir sua carência de sentido, amor ou propósito no outro, não suportando a solidão. Estes tipos de fome são paixões estremadas (ou não naturais). Este, de todos os estados, talvez seja o mais estimulado na Sociedade Ocidental.

6

- Alegria – Seria um estado de súbita e efêmera felicidade, ou mesmo êxtase. É a paixão mais risonha, e por este mesmo motivo, mais fugidia. Não existe grande esforço, ou até mesmo nenhum, para ser vivido.

8

- Absorção – Ao contrário da erudição, o conhecimento aqui é apreendido por nós mesmos, através de nossa observação e experiência. É descoberta, invenção ou conexão. É a razão inspirada pela paixão criativa. Torna-se má quando a invenção é má.

3

- Animalidade – São os impulsos instintivos, inerentes à nossa natureza. Como fome, sede, sono, afeição, excreção e sexo. Sendo todos eles naturais, uma vez que não precisam ser aprendidas. Portanto são paixões normais.

5

- Tranquilidade – É um estado de pacifismo, onde sua mente não é perturbada. Nada em particular lhe perturba, nem você mesmo. Tranquilidade é a neutralidade e ausência tanto da paixão, quanto da razão, podendo ser tanto positiva através da paciência e razoabilidade, como negativa, pela preguiça e complacência.

7

- Erudição – Neste estado você desenvolve suas habilidades cognitivas, sejam elas quais forem. A mente está envolvida. Impele-nos ao desenvolvimento ou à separação dos outros, quando ruim.

9

- Boddhisatva (ajuda) – É um estado de doação, de quem auxilia. Em seu estado mais alto, busca apenas ajudar sem receber nada em troca, apenas substituindo o mal-estar do outro por bem-estar. Os que agem desta forma, auxiliando outros a despertarem mais inteiramente, são chamados B o d d h i s a t va . S ã o l â m p a d a s qu e iluminam o caminho. A ajuda é a razão motivada pela compaixão.

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- Estado de Buda (despertar) – Todos os outros mundos são estados da mente parcialmente desperta, alguns mais, outros menos. O Sutra de Lótus ensina que todos nós já somos um Buda, apenas, talvez, ainda não tenhamos percebido isto. É o único estado imune ao inferno. É o melhor mundo para habitar e nada nos impede de habitá-lo além dos outros estados de espírito.

Ao contrário da maioria das Filosofias Orientais que buscam, em geral, vencer as paixões e exaltar a razão, Nitiren nos diz algo bem diferente. Como vimos todos os estados, com exceção do estado de Buda, pode ser bom ou ruim. É importante ter isso em mente. É muito comum, por exemplo, ver belíssimas obras de arte nascerem de mentes em estado de inferno. Como foi o caso de Ludwig van Beethoven, que mesmo enfrentando uma progressiva surdez que o deixara bastante depressivo, foi ainda capaz de compor lindas obras, dentre elas, o que para muitos seria sua obraprima, a Sinfonia n° 9 em Ré Menor. Ou ainda, grandes mudanças sociais podem começar por homens e mulheres com fome/sede de justiça, como foi o caso de Mahatma Gandhi, que através do princípio de não agressão, liderou e inspirou os hindus contra o governo de Transvaal. Portanto, fica evidenciado que o melhor não é erradicar as paixões, mas aprender a dosá-las, como quem faz do veneno um soro. Deste modo, seja qual for o estado que se manifeste, devemos dirigir-lhe para o melhor de todos os mundos possíveis.


Crônica

Por Carla Duarte

E

sses dias, na faculdade, nos foi pedido que escrevêssemos uma carta. Logo me interessei, a característica confessional e reflexiva do gênero sempre me despertou interesse. Fiz minha tarefa com empenho e a escrevi para mim mesma. Trata-se de algumas coisas que, se eu soubesse aos 16 anos, teria os tornado melhor. De Carla com vinte e poucos para Carla da adolescência, com amor. Como vai? Espero que bem e que esteja se dedicando aos estudos. Sei como no ensino médio podemos ter diversas distrações que fazem parecer que tudo é mais interessante do que estudar elementos alcalinos, guerra fria e coerência e coesão textual. Me lembro dos meus 16 anos e, pode ter certeza, eles não foram moleza. Tal qual a adolescência de várias outras garotas e garotos, que já sentiam a pressão de escolher uma profissão a seguir, que queriam se divertir e sentiam que tudo que acontecia era um grande drama insolúvel. Eu carregava uma ânsia bem grande. Passava horas imaginando – e romantizando - como seria a minha vida depois que eu começasse a faculdade. Achava que, ao iniciar o ensino superior, o que aconteceu antes seria mera lembrança. Desde os problemas com meus pais à minha indecisão quanto à profissão e a insatisfação em morar em uma cidade que não me oferecia uma cultura vibrante. Ingênuo engano, essas questões estão presentes até hoje. A diferença é que atualmente o olhar, a experiência e os ânimos são outros. Aprendi que não existe solução rápida e que a distância, em alguns casos, não ajuda a resolver os problemas. Muito pelo contrário. Agora, vejo que o diálogo – essa coisa que antes via como dispensável porque eu era “uma ilha” – é imprescindível para se aprender a viver melhor, e com mais calma. Espero que você seja mais aberta a ele para evitar as experiências que tive. Se conversar é fácil? Não. Me refiro aquela conversa honesta, que coloca os pingos nos 'is' e que permite uma troca efetiva entre as partes, que é baseada no consentimento e no respeito. Para mim trata-se de um exercício para diminuir a arrogância e de tentar entender a experiência do outro. Com o passar do tempo ficamos melhores – eu espero – nisso. Se você está pensando que eu abandonei quem eu era na adolescência, você está enganada. Acho que quem não me conhece pode ainda me ver como uma.

Mesmo que as minhas roupas sejam parecidas com as que eu usava aos 16, eu mudei um pouco. Uma prova são minhas blusas de banda, que melhoram espantosamente de qualidade. Ou, talvez, apenas tenham sido agregadas novas músicas e gêneros musicais a minha coleção de estampas. Afinal de contas, quem disse que mudar nossa essência, o que gostamos, seja sinônimo de maturidade? Para mim, maturidade trata-se de aprender, melhorar nossos erros e buscar o que for melhor para nós, e isso inclui somar mais bagagem ao que já carregamos. Seja ela cultural, emocional ou profissional. O que estou querendo dizer é que não tem problema você carregar para a vida adulta o que você gosta e acredita. Acho que essa suposta “vida adulta” trata-se de somar, de agregar e não de sair largando nossos pedaços por aí. As coisas melhoram, se complicam e nos deixam triste. Às vezes é tudo na mesma medida e às vezes não. Isso ainda estou aprendendo a fazer, lidar com as diversas situações que temos, a despeito do que estamos vivendo. Mas, ah, eu não posso te contar tudo sobre essa fase adulta, porque ainda não sei tudo. Acho que boa parte da graça está em, aos poucos, percebermos nossas próprias mudanças e aquilo que ainda continua igual. Vou ficando por aqui, Carla da adolescência. Não se espante com o texto à mão e o envelope decorado. Sim, eu também sou da era dos computadores, mas você não pode negar a magia que existe em puxar o papel dobrado e ver a carta tomando forma diante dos seus olhos. Que a vida adulta nos trate bem.



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