Prazer,
PM Y
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Carolina Linhares
Prazer,
PM Y
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Carolina Linhares
Trabalho de Conclusão de Curso da Graduação em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo
Escola de Comunicações e Artes Universidade de São Paulo 2014
Reportagem: Carolina Linhares Projeto gráfico e diagramação: Vinícius Giba Revisão: Carolina Linhares Orientação: Claudio Tognolli
Agradecimentos Aos meus pais, pelo que sou e pelo que posso ser. Pelos mimos, pela compreensão, pela honestidade, pelo compromisso, pelo perfeccionismo, mas, principalmente, por embarcarem em todas as minhas loucuras –a maior delas, ser jornalista; A minha irmã, um grande orgulho e uma grande companheira; À Nossa Senhora de Aparecida, que me livra dos perrengues; Aos professores e jornalistas inesquecíveis, pela inspiração e dedicação; Ao orientador, Claudio Tognolli, por inisistir na riqueza das orações subordinadas; Ao Vinícius Giba, pelo projeto gráfico ousado e pelas madrugadas a fio; Aos policiais que me dedicaram seu tempo, sua atenção, sua gentileza. Sem vocês, isto não se realizaria; Aos meus familiares policiais, pela ideia e pela ajuda; À USP e à ECA, por terem aberto a minha cabecinha. Vou sentir muita saudade; Ao Projeto Redigir, pelo carinho e por me ensinar que o esforço vale a pena;
Aos incríveis colegas destes cinco anos de jornalismo, as pessoas mais inteligentes que já conheci e com quem eu adoro conversar –especialmente os jormats 10; Às amigas com quem divido a mesma alma; Às brothers, amigas de colégio ao bingo; Ao Breno, pela agradável surpresa e pela paciência nesses tempos de TCC; Aos colegas de redação da Folha de São Paulo, pelo batismo no jornalismo e por um estágio de muitas dúvidas, risadas e aprendizagem; E, finalmente, a todos que me incentivaram e me ajudaram no longo caminho percorrido nesta graduação e na produção deste livro. Por causa de vocês todos, creio que evoluí e aprendi um tanto. Muitíssimo obrigada.
Estigma, 11 Paralelo, 12 Prazer, PM, 15 Novinho, 25 Memória, 55 Enxugando gelo, 73 Estereótipo, 105 Vingança, 129 Dentro da lei, 179 A mãe, 209 PM na mídia, 241 Bibliografia, 295
Estigma Jornalista inventa, jornalista mente, só mostra o que quer mostrar, só fala de um lado da história, é pura manipulação, serve aos interesses das grandes empresas, dos grandes partidos, vive de jabá, quer mais é vender notícia violenta, notícia ruim, notícia irrelevante, nem precisa de diploma, é arrogante e prepotente, acha que sabe um pouquinho de tudo, não sabe nada de nada, se mete a contrariar especialista, viciado em café, cigarro, álcool, jornalista é um chato, um pedante, só quer fofocar, quer ver o circo pegar fogo, gosta é de uma polêmica, jornalista emite opinião e fala que é imparcial, é tudo comunista e ainda por cima escreve tudo errado. * Policial atira primeiro, pergunta depois, só aborda negro e pobre, é tudo assassino, filhos da ditadura, chama golpe de revolução, prefere regime militar, é um repressor, o braço armado do governo, dá medo, tem é que manter distância, policial é violento, vê a população como inimiga, criminaliza os movimentos sociais, é morto de fome, não estudou, é ignorante, corrupto, pede propina, não paga nada que compra, é um fortinho de cabelo raspado, um coxinha, é explorado e desconta a raiva nos outros, mal treinado, mal preparado, uma vergonha, reaça, invade favela, vive de bico, gosta de ver sangue, gosta de dar porrada, além de ser um pau mandado sem coração.
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Paralelo Depois de meter-se a ser jornalista (ou até antes para os mais espertos), vem a amarga constatação de que se trata de uma profissão bastante problemática, estressante, desvalorizada, mal remunerada, cercada de estigmas, mas que é um ideal de vida. Tive a oportunidade de ouvir mil vezes da boca de jornalistas o que era o jornalismo. Dispensei as generalizações do senso comum como aquilo que ele não é. Ou não deveria ser. Ou pelo menos não é só isso. Nunca, porém, ouvi de um policial o que era a polícia. Melhor: como era ser policial. Contentei-me com o estigma. Defini a polícia, ao longo da vida, através de duas narrativas: a dos porta-vozes oficiais que representam a instituição Polícia Militar do Estado de São Paulo e a dos jornalistas que denunciam os crimes daqueles que deveriam combater os criminosos. Enquanto as vítimas da PM, mesmo sem o destaque que os violentados pelo Estado requerem, tinham sua voz representada pelos jornalistas, pelos ativistas, pelas redes sociais, os homens fardados não falavam. Deixavam a corporação falar. E nunca foram, portanto, nada mais que uma farda. Nesses tempos em que jornalistas e PMs se encontraram mais do que nunca e se enfrentaram mais do que nunca, achei de bom tom conhecê-los. E vi no meu último trabalho nesta graduação uma oportunidade para isso. Resolvi perguntar a mulheres e homens de farda: afinal, o que é ser PM? Trata-se, veja só, de uma profissão bastante problemática, estressante, desvalorizada, mal remunerada, cercada de estigmas, mas que é um ideal de vida. 12
Prazer, PM
A Polícia Militar do Estado de São Paulo é responsável pelo policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública. Segundo a Constituição, é organizada como uma força auxiliar e reserva do Exército Brasileiro. Está subordinada ao Governo do Estado de São Paulo através da Secretaria Estadual de Segurança Pública. O efetivo da PM em São Paulo é 88 mil homens (embora o número fixado por lei seja de 93 mil), que trabalham em todos os municípios do Estado. Atualmente, o comandante-geral da PM é o coronel Benedito Roberto Meira e o secretário de Segurança Pública é Fernando Grella Vieira. 15
Já a Polícia Civil, também subordinada ao Estado de São Paulo, funciona como polícia judiciária (é responsável, por exemplo, por encaminhar detidos pela PM à Justiça) e apura infrações penais, exceto as militares. Organização O Comando-Geral é o órgão máximo da corporação --inclui o Subcomandante, o Gabinete do Comandante-Geral, o Centro de Inteligência e o Centro de Comunicação Social. Subordinado ao Subcomandante, está o Estado Maior, com suas seis seções, e a Corregedoria. Abaixo estão os chamados Grandes Comandos. São eles: o Comando de Policiamento da Capital (CPC), o Comando de Policiamento Metropolitano (CPM) e o Comando de Policiamento do Interior (CPI). Unidades especializadas de policiamento estão no mesmo nível. Dentro dos Grandes Comandos, estão os Comandos de Policiamento de Área (CPA), geralmente compostos por três batalhões e, cada batalhão, é composto por três companhias. Cada batalhão tem uma Companhia de Força Tática, que tem armamento mais pesado e atua em ocorrências mais complexas, regiões de mais criminalidade e controla distúrbios civis. A Rocam é o policiamento da Força Tática feito em motos. O Comando de Policiamento de Choque é responsável pelo controle de distúrbios civis e operações especiais. O Choque tem um regimento de Cavalaria e quatro batalhões –a Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) é o 1º batalhão. O 2º batalhão faz o policiamento em grandes eventos. O 3º batalhão realiza controle de distúrbios civis e faz escoltas de presos de 16
alta periculosidade. O 4º batalhão é de Operações Especiais –a 1º companhia é o Coe (Comandos e Operações Especiais), a 2º companhia é o Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) e a 3º companhia é o Canil. Comandante Geral Gabinete do Comandante Geral Subcomandante
Estado Maior
Corregedoria É a polícia da polícia, foi criada em 1948. Faz apuração de infrações penais de militares da corporação e investiga casos em que o policial militar é vítima.
Comando
Comando
Comando
Diretorias
de Policiamento
de Policiamento
de Policiamento
do Interior:
da Capital:
Metropolitano:
tem 10 CPA
tem 8 CPA
tem 4 CPA
Comando de
Comando de
Comando de
Grupamento
Policiamento
Policiamento
Policiamento
Aéreo
Ambiental
Rodoviário
de Choque Comando do
Corpo de Bombeiros
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Divisões (menor para maior) Destacamento Pelotão Companhia (a área de policiamento da companhia coincide com a área de um DP da Polícia Civil) Batalhão Comandos de Policiamento de Área Grandes Comandos (Capital, Região Metropolitana, Interior) Seções do Estado-Maior A 1º Seção do Estado Maior, funciona como um RH: administra as políticas de pessoal, os concursos, as contratações, as transferências e o pagamento dos salários. A 2º Seção coleta e analisa dados de inteligência e funciona também como polícia interna da corporação. Na 3º Seção é que são definidas as estratégias de ensino e de operações –onde será o patrulhamento do policial operacional através da análise dos índices criminais. Na 4º ficam os assuntos relativos à logística da PM, como transporte, alimentação e fardamento. A 5º Seção é responsável por assuntos civis, cuidando das relações públicas e da comunicação. Finalmente, à 6º Seção cabem os assuntos de orçamento e gestão pela qualidade. Há uma reprodução dessa estrutura, com exceção da 6º seção, nos Grandes Comandos, Comandos de Policiamento de Área e Batalhões. São os chamados “Ps”. Nesses escalões, portanto, existem as seções P1, P2, P3, P4 e P5, responsáveis por cada uma dessas áreas em uma escala menor, enquanto as Seções abrangem todo o Estado de São Paulo. 18
Hierarquia militar Função no policiamento Aluno da Escola Superior de Soldados por um ano Formou-se e está em estágio de um ano
PRAÇAS Aluno Soldado
Soldado 2ª Classe
Patrulheiro
Soldado 1ª Classe
Patrulheiro
Cabo
Comandante de Grupo de Patrulha – Supervisor de Policiamento Comandante de Grupo de Patrulha – Supervisor de Policiamento
3º Sargento 2º Sargento 1º Sargento Sub Tenente PRAÇAS ESPECIAIS
Aluno da Academia do Barro Branco por três anos Formou-se e está em estágio de seis meses
Aluno Oficial (cadete) Aspirante a Oficial OFICIAIS
Comandante de Força Patrulha –
2º Tenente
Gerente de policiamento
1º Tenente
Comandante de companhia ou P1, P3 ou P5 de batalhão Coordenador Operacional ou SubComandante de batalhão
Capitão
Major
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Comandante de batalhão. Coroneis escolhem entre os tenentes-
Tenente-Coronel
coroneis quais serão promovidos Comanda Comandos de Policiamento de Área e Grandes Comandos.
Coronel
Atualmente, há 60 coroneis.
Histórico1 Atendendo ao pedido do ministro da Justiça nomeado pela Regência, o padre Diogo Antônio Feijó, para que as províncias criassem forças de segurança vinculadas ao Estado, o Presidente da Província de São Paulo, Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar, estabelece o Corpo de Guardas Municipais Voluntários em 15 de dezembro de 1831. Durante o Segundo Império, o órgão, que adotou o nome de Corpo Policial Permanente, era responsável por funções mais repressivas no policiamento na periferia da capital e em outras cidades, enquanto outras guardas tinham função mais preventiva e urbana, fazendo o policiamento do centro da capital. Na República Velha, a milícia é reorganizada e recebe novas denominações, consolidando-se como Força Pública do Estado. Nessa época, com a concentração do poder na esfera estadual, a força funciona como braço armado do poder político do Estado de São Paulo e se fortalece, tornando-se uma espécie de pequeno Exército. 1 Texto baseado em ARRUDA, Luiz Eduardo Pesce de. Polícia Militar: uma crônica.
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A Força Pública atuou em conflitos tanto no período monárquico como na primeira fase da República, tendo lutado, por exemplo, na Guerra dos Farrapos, na Guerra do Paraguai e contra a Coluna Miguel Costa-Prestes. Em 1926, com o afastamento da Força Pública das áreas urbanas em função do combate à coluna, fez-se necessária a criação da Guarda Civil para o policiamento da capital. A Guarda Civil era auxiliar da Força Pública, mas sem caráter militar. À Guarda Civil, então, coube o policiamento de áreas urbanizadas e nobres da capital, enquanto a Força Pública se concentrou no policiamento da periferia e do interior e na realização de tarefas repressivas. Ainda assim, a Guarda Civil também exercia tarefas repressivas por meio da DR (Divisão de Reserva), base do atual policiamento de choque. Em 1930, a centralização do poder com Getúlio Vargas esvazia a esfera estadual, e o aparato bélico da Força Pública é desmantelado. Pela última vez, em 1932, a Força Pública funcionou como Exército paulista, lutando na Revolução Constitucionalista, mas vivendo momentos de incerteza após a derrota. Em 1940, a ditadura de Vargas, no esforço de enfraquecer o braço armado paulista, altera o nome de Força Pública para Força Policial. Antes disso, em 1936, a lei federal 192 reorganizou as polícias militares, atribuindo a elas funções policiais. No ano seguinte, a lei estadual 2905/37 também organiza a Força Pública com um papel acima de tudo policial. Em 1947 com a redemocratização, a Força Pública volta ao seu nome original; mesmo ano em que a Guarda Civil se expande para o interior. Ainda assim, a partir daí, a Força Pública concentra-se em atividades de policiamento, com a primeira companhia de radiopatrulha criada em 1948. No golpe militar de 1964, a Força esteve em prontidão aguardando a decisão de seu chefe, o governador do Estado, sobre se 21
São Paulo apoiaria o novo governo militar, o que aconteceu. Com isso, a Força Pública e a Guarda Civil vivem interferências do governo federal centralizador –o ensino das corporações foi reorganizado e os comandantes-gerais vinham do Exército. A Força Pública foi então organizada segundo o decreto-lei nº 667 de 1969, que regulamentou as polícias militares do Brasil. Ao policiamento fardado coube enfrentar guerrilhas urbanas e, para isso, em 1970, é criada a Rota. A repressão adotada às atividades terroristas é igualmente utilizada contra criminosos comuns. Buscava-se acabar com o crime pela força e, com a conivência do governo militar, a violência foi respondida com mais violência, criando-se um estado de guerra urbana não declarada, no qual confrontos armados e a morte de suspeitos eram frequentes. O contexto favoreceu uma atuação violenta adotado por policiais, inclusive com a criação de esquadrões da morte. O desrespeito aos direitos humanos rendeu críticas, e a Polícia Militar foi tida como um órgão violento, imagem que persiste até hoje. No fim da década de 1960, a Guarda Civil, com 15 mil homens, atuava na zona sul, oeste e partes do centro da capital e nas principais cidades do interior. A Força Pública, com um efetivo de 35 mil, agia nas zonas norte, leste, centro e em todo o interior. Como as polícias tinham funções semelhantes –e na tentativa de controlá-las e submetê-las à doutrina de segurança nacional vigente– foram unidas na criação da Polícia Militar de São Paulo através do decreto-lei 217 de 1970. Com a redemocratização, policiais militares passaram a assumir o posto de comandante-geral em vez de oficiais do Exército. A Polícia Militar voltou-se ao serviço à comunidade, com o objetivo de dar segurança ao cidadão e não mais ao Estado. Manifestações democráticas exigiam e exigem ainda hoje o policiamento comunitário. 22
A Constituição de 1988 trata da segurança publica no Capítulo III, artigo 144: “A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.” O parágrafo 5º define que “às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.” Em 1995, é criada a Ouvidoria das Polícias, regulamentada com a lei nº 826/97, em 1997. Nos anos 1990, o massacre do Carandiru e o caso Favela Naval revelaram uma polícia extremamente violenta e prejudicaram a imagem da corporação. A partir daí, a PM empenhou-se de forma mais significativa no ensino de direitos humanos e no policiamento comunitário. Ao todo, 111 detentos foram mortos no Carandiru durante operação da PM para conter uma rebelião em 1992. O julgamento dos policiais só terminou em 2014 com 73 condenados. O coronel Ubiratan Guimarães, responsável pela ação, foi condenado a 632 anos de prisão em 2001, mas morreu em 2006, enquanto o processo ainda corria em outras instâncias da Justiça. O caso favela Naval foi revelado em 1997 pelo Jornal Nacional, que exibiu imagens de policiais agredindo, extorquindo e até atirando contra moradores do bairro de Diadema. Um deles foi morto. O policial autor do homicídio foi condenado a 15 anos de prisão. Atualmente, a PM adota o método Giraldi de tiros, recomendado pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha, na tentativa de diminuir o número de civis mortos em ocorrências.
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Novinho Você sabe qual a diferença entre um Palio 2002 e 2003? Oswaldo, tenente
Viatura Comando COPOM
COPOM Viatura
Emergência aqui! Papa Mike (PM, policial militar) baleado! Papa Mike baleado! COPOM, QRX (aguarde) na rede aí, atento aí, a viatura está modulando. Comando, estou tentando verificar aqui qual viatura, porém é new, está vindo só o prefixo do HT (rádio transmissor). * Dá um QRX (aguarde) parceiro, modula com calma aí, qual é o QTH (local da ocorrência)? Tô aqui ó... Tô aqui é... 25
Comando
COPOM Comando COPOM
Comando
COPOM
Viatura Comando COPOM
Comando
COPOM
26
COPOM, o comando pra informar é, encostando aí, próximo a viatura aí DA025, QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? Qual QTH (local da ocorrência), comando? Pela rotatória aí, próximo à piscina. QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), as viaturas vão apoiar o comando na rotatória próximo a piscina. Viatura alvejada, Mike (militar) baleado no local. Positivo, ô COPOM. É umas três viaturas, botar aí no QTH (local da ocorrência). Deslocar com cautela, QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). As viaturas vão ter cautela no deslocamento, vão encostar, vamos chegar no apoio lá do policial. Me tira daqui, porra. Ô, COPOM, por gentileza, aciona o resgate pro local. Policial aqui ferido, positivo? QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida) comando, tem o QSA (a intensidade do sinal) aí do Mike (militar)? A UR (Unidade de Resgate) já está sendo acionada. * Ô, COPOM, joga para os demais aí da rede, uma moto amarela envolvida, QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), atenção a toda rede uma moto amarela. Moto amarela apenas aí. Troca de tiro com a DA025. Mike (militar) baleado. Todas as viaturas cautela na abordagem.
Comando COPOM Comando COPOM COPOM Comando COPOM
Comando
COPOM
COPOM
COPOM Comando
Comando tem o QTH (local da ocorrência) que se evadiu essa moto? * COPOM, verifica aí qual é a situação do resgate, do QTH (local da ocorrência). Comando, já acionei. Tô fazendo 193 (telefone do Corpo de Bombeiros) pra confirmar. Verifica quanto tempo demora pra chegar até o QTH (local da ocorrência). Só um QRX (aguarde), já volto. * Comando, QAP (na escuta). QAP (na escuta). Positivo, teve um desabamento aí na marginal QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? Todas as URs (Unidades de Resgate) estão empenhadas lá, porém já fiz contato com o comando de área, estão tentando deslocar uma viatura pro local. QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), COPOM positivo. Vou efetuar o socorro aqui do Mike (militar), QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), comando. Qual PS (pronto-socorro)? * Comando, qual PS (pronto-socorro) aí vai fazer o resgate? * Comando, comando, QAP (na escuta) do COPOM? Deslocando aí com o Mike (militar). 27
COPOM Comando COPOM
Viatura 2
COPOM COPOM
Comando COPOM
Comando Viatura 3 COPOM Viatura 3 COPOM Viatura 3 28
Qual PS (pronto-socorro), comando? PS (pronto-socorro) do portão 2. QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). Vou verificar uma viatura já dando início aos procedimentos aí no portão 2, QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? * COPOM, 019 (viatura número 019) em acompanhamento a moto amarela, QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? QTH (local da ocorrência), 19? Ô, comando chegou pro senhor aí? 19 em acompanhamento uma moto amarela. Cautela na abordagem pode estar envolvido no QRU (alguma mensagem, missão, ordem...) do Mike (militar). * COPOM, eu não copiei o último QTC (mensagem, notícia), repita. Chegou pra mim aí a 19 em acompanhamento a uma moto amarela. Pode ser o QLO (local) aí do Mike (militar), QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? Só não jogou o QTH (local da ocorrência). Não consigo mais contato. Positivo. * COPOM, é a 014 (viatura número 014). QAP (na escuta), 14. Por gentileza uma pesquisa de emplacamento. Prossiga. Bravo (B), Lima (L), Lima (L), 0581.
Viatura 2 COPOM COPOM COPOM
Comando COPOM
Comando COPOM
Comando
COPOM
Comando
Ô comando, ô comando. Dá um apoio. O cidadão aqui tentou reagir. COPOM. Ô 19, 19 qual é o QRU (alguma mensagem, missão, ordem...)? Atenção a rede aí QRX (aguarde), troca de tiro. Qual o QTH (local da ocorrência), 19? Comando, copiou o QRI (transmissão) da 19 aí? Possível troca de tiro aí com QRU (alguma mensagem, missão, ordem...) da moto amarela. Pelo PS (pronto-socorro) portão 2 estou indo no apoio, QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? 19, QTH (local da ocorrência) por gentileza. QTH (local da ocorrência) aí pro apoio. * A vtr (viatura) do comando pra informar que juntamente com a 19 aí pelo QTH (local da ocorrência). Positivo. Qual QTH (local da ocorrência) pra apoio, comando? * COPOM, é o comando. Resgate aqui pro QTH (local da ocorrência). É a rotatória aqui próxima ao esqueleto. QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). A UR (Unidade de Resgate) tinha acabado de chegar no QTH (local da ocorrência) da viatura alvejada e confirmou o óbito do outro Papa Mike (PM, policial militar), então ela já está direcionada pra esse QTH (local da ocorrência) aí. QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). * 29
Comando COPOM Comando
COPOM
COPOM Comando COPOM Comando
COPOM, é o comando pra informar. QAP (na escuta). Positivo. É... durante a abordagem aí houve... o indivíduo reagiu aí à abordagem, fez menção de sacar uma arma, os policiais acabaram revidando, QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)? Como foi a situação aí do resgate pro QTH (local da ocorrência)? QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). O resgate já está a caminho, positivo? * Comando, sem novidade aí com Papa Mike (PM)? Positivo. Os policiais aí reagiram, graças a Deus ninguém ferido. QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), tem a placa da moto aí? Verificar se é caráter geral. COPOM, é Fox (F), Fox (F), Neutra (N), 2007.
Toda a ação, com duas ocorrências, leva cerca de nove minutos. Isso porque trata-se de uma simulação dentro da área da Academia do Barro Branco. Na cidade de São Paulo, a distância entre o QTH e o pronto-socorro não é a distância da rotatória da piscina ao portão dois. O comando tampouco se desloca rapidamente entre dois locais com trocas de tiro para dar apoio. Ainda assim, a simulação é bem planejada. O aluno do curso de formação de oficiais (que muitas vezes já é um policial praça) entra em uma viatura e começa a circular pela academia sem saber de nada. Outros alunos estão posicionados em seus lugares para representarem seus papeis. Na rotatória da piscina, já está a viatura alvejada, com um policial desacorda30
do e outro, ferido e nervoso, que avisa da ocorrência, mas não informa o local. Os “papas mike” baleados têm até ketchup na farda. O aluno tem que se virar pra achar a viatura ali e, depois, mostrando pleno domínio do código Q, usado internacionalmente pelas forças armadas, informar sobre a ocorrência ao COPOM, o centro de operações, que reúne no rádio as informações dos policiais em suas viaturas e das ligações ao 190. O teatro é repetido de novo e de novo: uma vez para cada dupla de alunos. Um é o tenente e o outro é seu motorista. De propósito também é a demora da ambulância, obrigando o aluno a decidir entre esperar ou socorrer o policial ferido. Para causar mais estresse, dois outros alunos, representando soldados que patrulhavam a pé perto da ocorrência, chegam ao local do tiroteio e ficam desesperados com a cena, pressionando o comandante a fazer o resgate. O nervosismo dos alunos, transparente nas mensagens de rádio, chega a deixar a situação engraçada. COPOM
Comando Soldado Comando Soldado Comando
Alguma viatura aí no QTH (local da ocorrência)? Só pra jogar pro COPOM aí quantos indivíduos baleados, se tem policial baleado... COPOM, solicito apoio. Preciso de uma... um.... De um o quê, comando? Pelo amor de Deus, comando!!! Preciso de um... do apoio de uma... Ele está desmaiado!!!! Está desmaiado... Apoio de uma ambulância.
Não há um tempo limite pré-determinado para esperar a ambulância, mas diante da demora por causa do “desabamento na marginal”, espera-se que o comandante decida por 31
socorrer ele mesmo o policial baleado, enquanto os soldados tomam conta do policial desacordado. Em relação a civis, a ordem é dar prioridade ao resgate por profissionais de saúde porque um resgate mal feito pode custar a vida da vítima e a carreira dos policiais que a socorreram. No caminho do aluno ao “pronto-socorro do portão 2”, está estrategicamente posicionada a viatura 19, com um casal de policiais abordando um homem em uma moto amarela. A ideia é que o comandante veja a viatura e perceba a abordagem da moto para já saber o lugar aonde ir quando a mesma viatura disser que o homem reagiu, já que esse local tampouco é informado pelo rádio. Ali também, os alunos fazem graça. Viatura
COPOM, cidadão baleado aqui no local, COPOM. Tentou reagir aqui. E não teve jeito, COPOM.
Os alunos dão risada. “Defina ‘não teve jeito’”, diz uma delas. Quando o aluno chega junto à viatura, vê o corpo do suspeito da moto amarela caído no local. Os policiais, nervosos, justificam os tiros dizendo que o homem fez menção de sacar uma arma e, com certeza, devia ser o “desgraçado” que baleou o outro policial. Os alunos atores vão inclusive retirando as cápsulas de bala do local enquanto explicam o que aconteceu. É aqui o principal teste do futuro tenente. Mesmo depois de todo o estresse da ocorrência anterior, com um policial ferido e outro morto, ele tem que desconfiar daquela troca de tiros –foi mesmo uma reação necessária ou pode ter sido uma execução? O procedimento correto é separar os policiais para explicarem a ocorrência. Perguntar qual deles atirou. O local tem que ser preservado. O tenente precisa verificar as cápsulas e a posição do corpo 32
para ver se coincidem com o relato dos seus subordinados. Além disso, deve recolher a arma do policial que atirou e do homem que tentou reagir. A melhor parte da ocorrência é esta: o homem morto não estava armado. Nem todos os alunos descobriram isso porque nem todos solicitaram a arma do suspeito aos policiais. “É uma ocorrência de alto estresse. Teve uma troca de tiro. Ninguém sabia onde, o policial não conseguia informar. Estava todo mundo desesperado pra saber onde era o local. Quando ele encontra o local, fica naquela né? Socorre, não socorrre, policial baleado, o outro morto...”, explica o jovem tenente Andrade, instrutor da turma e idealizador do exercício. Ele também participa fazendo o papel do Copom. Vai acompanhando a viatura com seu próprio carro: um Hyundai HB20 branco. Os alunos que já passaram pelo teste ficam por ali, dedurando os outros. — Olha lá, passou [para o pronto-socorro] olhando o retrovisor nem viu a cor da moto [sendo abordada]. No fim, o tenente fala com cada aluno: — Você viu a abordagem quando estava indo ao pronto-socorro? — Tinha dois indivíduos sendo abordados. Eu lembro. — Não, era só um. — Era só um mesmo? Os outros alunos tiram sarro: “Está vendo fantasma.” O tenente continua: — A hora que você passou pela abordagem já havia lançado [no rádio] que era uma moto amarela. 33
— Isso. — Não passou nada pela sua cabeça? — Era o capeta. O que provavelmente baleou o policial lá. — E você não acha estranho o cara estar sendo abordado e depois aparecer morto? — Se ele reagiu... — Com o quê? — Com arma. Já aconteceu comigo. Eu fui abordar.... — Mas cadê a arma? Não tinha arma. — A policial disse pra mim que ele fez menção de sacar arma. — Então você precisava separar esses dois pra contar direito essa história. E perguntar para o morto vendo o corpo dele. Você precisa olhar se foi de baixo pra cima. Outra coisa: o local também fala. Quem que atirou? Você não perguntou. — Foi ela. — Tá. Ela atirou da onde pra onde? Daqui pra lá. O que que você precisa olhar? Se tem cápsulas pro outro lado. Tem que olhar a arma dos dois. Perguntar quantos disparos deu. O fundamental é separar os dois. O sol da manhã já vai alto no céu enquanto os alunos repetem o teatro das ocorrências. Seu dia começou horas antes com a revista matinal no pátio da Academia de Polícia Militar do Barro Branco, na avenida Água Fria, Tucuruvi, na zona norte. Bem ao lado do Colégio Objetivo, onde a Água Fria encontra a avenida Nova Cantareira, há uma ruazinha com um portal e uma cancela. É a entrada da academia. Ali, por três anos, os alunos oficiais têm aulas teóricas e práticas em um complexo que mais parece um clube –bastante arborizado, com espaço para prática esportiva e simulações de ocorrência, além dos prédios com salas de aula e dormitórios. 34
A ruazinha continua no lado de dentro. Passando por um ginásio, leva ao estacionamento em frente à entrada do prédio principal. No saguão, ficam duas colunas no estilo greco-romano. Uma indica “ala General Salgado”, e abaixo “hierarquia”. Na outra: “ala general Miguel Costa – disciplina”. Educação não está escrito em lugar nenhum, mas não precisa. Ninguém passa por um civil no corredor sem desejar bom dia. Ninguém passa por um militar superior sem prestar continência. O prédio e o rancho (o refeitório) estão dispostos formando um retângulo, de maneira que, no centro, fica o amplo pátio para as cerimônias e os desfiles. O teto de tijolos do rancho tem uma enorme pintura com a bandeira do Brasil à esquerda, a bandeira de São Paulo à direita, o logotipo da Polícia Militar ao centro e os dizeres de cabo a rabo: “Escola de Comandantes”. Nas paredes de fora do rancho, há uma sequência de placas com os nomes de todos os Estados brasileiros seguindo a ordem da sua fundação e, quando há cerimônias, as bandeiras de cada um deles também são penduradas ali. O chão do pátio tem uma grande pintura azul com o símbolo do Barro Branco. — Escola, sentido! – ordena um major. Sete horas da manhã. A revista matinal começa. Todos fardados e em formação. Nessa cerimônia diária, os alunos cantam as canções militares. Naquela sexta, foi a vez da Canção do Patrulheiro. Para ajudar a memorizar, os alunos têm um hinário com as letras de todas as canções. Depois, desfilam marchando ao som da banda. Os alunos do terceiro ano é que vão à frente de cada pelotão. Em certo momento, gritam todos: — Barro! Branco! 35
As pernas se movimentam absolutamente juntas. O ritmo é marcado pelos passos no chão. A exibição é tanto bonita quanto surreal. Um desfile de 7 de Setembro, mas diário. Só depois é que os alunos são liberados para as aulas. E o tenente Andrade pode começar sua instrução de procedimento operacional. O tenente é responsável por um pelotão de 30 alunos do terceiro ano. Seu braço direito é o aluno “mais antigo” –o que está no topo da hierarquia entre policiais da mesma patente. Como os alunos, na verdade, não podem ser comparados por antiguidade por terem entrado juntos na academia, o aluno mais antigo é aquele com maior nota. Como uma espécie de comandante-chefe do grupo, o tenente verifica se os alunos estão em ordem, passa os recados da academia e, principalmente, conta das suas experiências na rua para criar familiaridade com a atividade de policiamento. Mas o tenente Andrade não é um tenente como os outros. É um tenente novinho. Aos 26, tem mais cara de Oswaldo do que de tenente Andrade. Suas aulas têm de vídeos do Porta dos Fundos sacaneando a abordagem policial violenta a causos de roubo de bancos, passando por áudios verdadeiros de ocorrências. Praticamente recém formado na academia e no posto mais baixo do oficialato, ele faz mais o tipo brother: é amigo dos alunos. “O vídeo do Porta dos Fundos [“Dura”] não é pra ficar revoltado. É pra rir. É pra ficar revoltado que isso exista. Temos que usar pra melhorar. É uma crítica. Se você nunca fez isso ou nunca presenciou isso como civil ou policial, você tem que saber que existe. E, se existe, vamos tentar evitar.” Oswaldo é o filho mais velho de uma escadinha –os irmãos têm 25 e 24. Ele tem ainda uma irmã mais velha, de 32 anos. Professora de ioga, budista e vegetariana, mora na Alemanha. É filha 36
do primeiro relacionamento da mãe. O pai dela não quis se responsabilizar. Sumiu no mundo. Já o pai de Oswaldo por pouco não vira padre. Sua mãe, vó materna do tenente, largou o marido pra virar freira e tocar um orfanato. Pela convivência próxima com religiosos, ele quase seguiu o mesmo caminho, não fosse ter conhecido a mãe de Oswaldo. Num fim de semana de folga do seminário, voltou para o orfanato da mãe. “E aí quem tava lá lavando prato que era funcionária da minha vó? Minha mãe”, conta Oswaldo. O casamento, porém, acabou em 2010. A atividade religiosa da avó garantiu bolsas para os netos e para as crianças do orfanato em colégios particulares. “Graças a Deus a gente conseguiu ter um ensino de qualidade. Foi primordial para nossa carreira.” Oswaldo morou a vida toda na zona norte. Há cerca de um ano, se mudou para a casa da namorada, que estuda Engenharia, e diz que a convivência com os sogros é ótima. “Eu sou o intruso na sociedade. Mas meu sogro foi militar também. Ele foi do Exército durante um tempo, sofreu um acidente numa instrução e perdeu os movimentos de dois dedos. Ele ainda tem a coisa do militar muito forte. Quando descobriu que eu era tenente, adorou.” Criado também no orfanato da avó, Oswaldo era católico. Era. Hoje não tem mais religião, apesar de manter a religiosidade. “Acredito em Deus, acredito que tem alguma coisa que une todos nós. Porque tudo é muito complexo, a natureza, a relação de todos os animais, a gente... é uma coisa muito complexa pra existir só por acaso. Acho que existe algo por trás. Agora como é chamado, como funciona e pra onde a gente vai, eu não sei.” Crismado e ex-coroinha, sua prática religiosa ia além da missa aos domingos. Participava de cursos e grupos de estu37
do. Aprofundando-se na parte histórica, na origem do catolicismo, na origem das outras religiões e na relação de Jesus com profetas das demais crenças, o tenente viu que os símbolos são os mesmos e concluiu que as religiões foram inventadas para obtenção de poder. Além disso, ele já questionava a proibição da camisinha e do aborto. A gota d’água, porém, foi a separação dos pais. “Onde eu achava que mais ia ter apoio, foi onde menos teve: dentro da igreja. Em vez de dar suporte pra família, começou o zunzunzinho: ‘ah! eu sempre soube...’” Defensor das liberdades individuais, além da legalização do aborto, Oswaldo é a favor da legalização da maconha. “Do ponto moral, filosófico, até que ponto o Estado pode impedir alguém de usar algo?”, questiona. “Em algumas sociedades não é proibido o álcool? Antigamente, tinha sociedade que era proibido o café. Hoje eu estou aqui tomando um cafezinho. Se eu estivesse em outra sociedade, anos atrás, eu estaria sendo preso. É tudo uma questão cultural.” Fora que a legalização seria uma mão na roda para a polícia, que gasta tempo, dinheiro e esforço prendendo traficantes só para que sejam substituídos instantaneamente no que se tornou um sistema quase empresarial e muito lucrativo. A legalização da maconha, desde que feita com bastante orientação sobre os riscos do consumo, ajudaria porque o consumidor dessa droga mais leve, ao se aproximar do tráfico para obtê-la, pode acabar comprando também cocaína e crack, explica Oswaldo. “Uma vez eu prendi um menor no tráfico. Como tinha que achar um responsável, fui até a casa dele numa favelinha aqui na zona norte. Aí toquei lá, a mãe não estava. Só o irmão.” 38
— Puta! De novo? Meu irmão é foda. Na viatura, o tenente aproveitou para conversar. — Seu irmão já faz isso faz tempo? — Ah, meu irmão é um perdido na vida. Olha, não vou poder demorar porque tô indo lá pro McDonald’s que eu trabalho agora. — Você trabalha no Mc? — Trabalho. Ganho R$ 800 por mês. Meu irmão tira isso por dia. Na cabeça do jovem, a decisão: ganhar R$ 800 por dia ou por mês? Aí Oswaldo separa os que têm cabeça fraca dos que, como ele, tomam a decisão certa. “Eu tenho minha visão e eu não quero isso para minha vida. Uma hora a casa do traficante vai cair, ele tá fazendo uma coisa errada. É uma questão moral.” Oswaldo não vê o criminoso como alguém obrigado a viver fora da lei por não ter oportunidade dentro dela. É alguém que fez uma escolha. No mundo, existem pessoas boas e más, ele diz. “Talvez eu fosse muito inocente. Quando eu fui pra rua, eu vi um pouco mais da maldade. Eu não tenho dó nenhuma de prender o cara. Ele fez uma coisa errada, ele tem que pagar. Tem até aquela frase que as pessoas criticam: antes ele do que eu. Mas é a pura verdade. Eu sou um agente da lei, estou trabalhando, fui treinado durante quatro anos pra fazer isso, pra me proteger, pra proteger terceiros. Agora um ladrão? Se eu me defendi, a ocorrência é 100%.” A opinião e o pensamento de Oswaldo sobre a polícia e a atividade policial não divergem muito da posição adotada geralmente pelos homens fardados. É claro que, até por ser jovem e ter sido formado numa polícia mais moderna e humanizada, ele faz mais ressalvas e admite erros na corporação, mas não foge 39
de um caminho delimitado –mesmo quando defende a legalização da maconha. É uma nova cara da velha polícia. Mas apenas isso já é quase uma revolução. Ele não foge à regra quando argumenta que a criminalidade não é só problema da polícia ou da falta dela. “Compete a outros fatores: educação, saneamento básico, emprego.” Quando diz que a lei é muito branda. “A gente vive num Estado impune. E isso acaba aumentando a violência policial. O policial vai dar uma de Superman e resolver do jeito dele.” Quando critica o sistema carcerário. “Pra mim está falido.” De fato, há um déficit de 220 mil vagas no sistema prisional. Enquanto a população cresceu 12% entre 2000 e 2010, a população carcerária cresceu 128%. Em 2013, cerca de 40,1% dos presos eram provisórios, ou seja, nem tinham tido seu crime julgado ainda. Para começar a consertar a situação, o governo federal teria que investir R$ 11 bilhões só em criação de vagas, mas o investimento desde 2010 foi de apenas R$ 3,6 bilhões. “O preso não é ressocializado, aprende coisa pior com quem já está lá. Também não é motivo de exemplo porque o cara que está na rua sabe que, se rodar, vai ficar uns mesezinhos preso e logo volta.” Quando defende a redução da maioridade penal –com ressalva de que, já que o sistema carcerário está falido, essa medida de nada adiantaria. “Eu já abordei cara de 17 anos que tinha 11 prisões. Ele falava que tinha um ano ainda de liberdade para continuar roubando –‘Depois eu sossego’. Falava isso na minha cara! E o que você vai fazer?.” Quando prefere as policias civil e militar unificadas –“com as informações compartilhadas”– ou então separadas, mas com o ciclo de atuação completo –“deixa a Polícia Civil livre pra investigação e a PM encaminha os detidos para a prisão.” 40
Quando alfineta os jornalistas. Oswaldo, porém, não generaliza. “Tem pessoas que são mais tendenciosas a um ponto e tem pessoas que são mais tendenciosas ao outro lado. É difícil passar informação sem exprimir opinião.” Quando reclama que o salário não compensa o risco. Um tenente recebe R$ 6 mil brutos por mês. São descontados cerca de R$ 2 mil. Aos 26 e sem filhos, Oswaldo acha um valor até que bom. “Talvez não pelo risco que eu corro. Posso subir numa favela e tomar um tiro, posso estar atrás de um carro roubado e tomar um tiro. Eu nunca disparei, mas já dispararam contra mim. Na hora, você fica na dúvida: vou reagir ou não vou? Depois, você fica pensando: podia ter morrido.” Se um policial morre, a família pode receber até R$ 200 mil de indenização –em 2013, o Estado dobrou o valor que antes chegava no máximo a R$ 100 mil. Claro que não é tão fácil. O Estado pode demorar a liberar o seguro. Precisando pagar as contas, as famílias passam necessidade. Quem salva, em geral, é a vaquinha do pelotão. Um acidente na viatura, também é o PM que paga. O policial vê um carro roubado, mas, antes de começar a persegui-lo, tem que parar e pensar: se eu bater a viatura, tenho dinheiro pra pagar? “É complicado.” “É complicado” define muita coisa na polícia. É a frase preferida de Oswaldo. Às vezes, vem acompanhada de uma risada, que toma conta do rosto fino –sempre em evidência diante da falta de cabelo, que é raspadinho bem rente, no estilo militar. Há menos de dez anos, ele ficava de saco cheio com essa história de farda bem passada, barba impecável, cabelo raspado. Já foi criticado pela falta de cuidado com esses itens essenciais quando era ainda o aluno-oficial Oswaldo Andrade, que passava pelos corredores do Barro Branco batendo continência pra todo mundo. Hoje é ele quem 41
recebe continência dos alunos e anota as fardas encurrunhadas sem pudor algum. Tudo por causa da teoria das janelas quebradas. A lógica é a seguinte: um prédio abandonado está em perfeito estado até que tem suas janelas quebradas. Esse descuido é interpretado como descaso e as pessoas se sentem, então, livres para cometerem pequenos crimes ali, como jogar lixo irregular, por exemplo. É por isso que num bairro largado pelo Estado, sem iluminação, sem saneamento, sem estrutura, os pequenos crimes se proliferam, alimentando uma bola de neve. Num bairro de classe alta, por exemplo, um pequeno crime já não passa despercebido. Ora, no quartel a mesma coisa. Oswaldo diz que nenhum amassado no uniforme pode passar incólume ou ele estaria alimentando a bola de neve. “Eu vou criar 30 caras do meu pelotão que vão estar nem aí. Não tá nem aí pra farda, não tá nem aí pra tal coisa.... São vários ‘tá nem aí’ pequenos que talvez reflitam num ‘tá nem aí’ médio. Vários ‘tá nem aí’ médios, geram um grave.” Ou seja: não deixe as janelas serem quebradas. A corporação se preocupa primordialmente com isso. O próprio Regulamento Disciplinar da Polícia Militar não define procedimentos no policiamento, mas trata majoritariamente dos valores defendidos pela corporação, das normas de conduta, da ética militar, das faltas disciplinares e suas punições. No Barro Branco, a função de Oswaldo é justamente conduzir aqueles alunos e lhes relatar suas experiências como se fosse mesmo um paizão, ele brinca. Além de anotar esses desvios do “tá nem aí”, ele entrevista os alunos a cada bimestre, avaliando onde podem melhorar e também, claro, onde a academia pode evoluir. “Se eu conseguir incutir um pouquinho em cada um o que eu penso e o que a sociedade espera da policia, eles vão ensinar sargentos, soldados e cabos, que vão transmitir isso pra população. É disso que eu gosto.” 42
Na rua, o trabalho do tenente é o mesmo: instruir. Mas, em vez de alunos, são os praças o foco dos ensinamentos. Com um ano de curso, o praça é formado para ser um executor. Assim como os oficiais, tem aula de polícia comunitária, direitos humanos, comunicação social, direito, mas não na mesma carga que no Barro Branco. O soldado de São Paulo, cuja formação é referência no Brasil, tem 1.516 horas de instrução. O oficial, que também deve dominar a parte administrativa, além de análise criminal e desenvolvimento de planos de policiamento, tem 5.465 horas. Recentemente, o tempo de curso foi reduzido de quatro para três anos. Os alunos oficiais recebem um salário inicial de R$ 2.663,50. Em todo o Estado, são cerca de dois mil soldados e 200 oficiais formados por ano. Uma evolução da PM nesse quesito é a implantação de uma formação mais humanitária, sem humilhação, castigos e desrespeito aos direitos humanos no intuito de que o policial, ao ser respeitado, respeite também o cidadão quando for para a rua. “Isso é perceptível. Aqui dentro todo mundo fala. O treinamento de acordar de madrugada, soltar bomba, correr e vir aqui ficar sem comer já não existe. São coisas que já não tem. São diferenças de longos anos e de poucos anos. Os que entraram agora já não tiveram o que eu tive em 2006.” Os alunos também não ficam mais presos na academia sem direito à defesa. Quando recebe uma punição, o aluno agora pode recorrer. “As coisas estão evoluindo. Aos passos de tartaruga, como a sociedade. Dá dois passos, volta um, dá dois, volta um. A PM também é assim. Eu estou instruindo meu pelotão talvez de uma forma que eu não fui instruído. Se dois, três, quatro ou cinco caras pensarem assim, eles vão instruir daqui a cinco ou dez anos outros oficiais. Então vai mudando.” 43
Um dos desafios do tenente é desmistificar os direitos humanos para sua tropa. “A população acha que direitos humanos é só pra proteger bandido. A tropa tem um certo preconceito de achar que é o ‘direito dos manos’. Mas eles existem para proteger quem não é amparado pela sociedade, até os policiais podem ser protegidos pelos direitos humanos”, explica Oswaldo. E explica de novo. E de novo. E vai falando com o pelotão. Falando, orientando, instruindo, carregando cada soldado pela mão. Até melhorar a qualidade do policiamento. Quando saiu do Barro Branco, Oswaldo trabalhou por dois anos como comandante de força patrulha no 9º batalhão. Era o oficial responsável por fiscalizar as patrulhas de policiamento, ou seja, as viaturas que atendem o 190, de toda a área do batalhão: Vila Guilherme, Santana, Casa Verde e Limão. É uma região especial por ter zonas de favelas e bairros de classe alta, além de abrigar o Anhembi com seus eventos –o pobre Oswaldo trabalha em todos os desfiles de Carnaval. “Lidar com bandido é a minoria dos casos. A gente não prende gente todo dia. O maior número de atendimentos é o chamado Charlie 4, que é a nossa desinteligência. Todo dia, todo horário tem desinteligência. É aquele pessoal que briga, se envolve em algum tipo de atrito e liga 190.” Mas erram os que pensam que policiar é fácil. Um carro foi roubado. Um Palio prata, ano 2002, duas portas. “Você sabe qual a diferença entre um Palio 2002 e 2003? Eu também não sabia, tive que aprender. Fui perguntando para os policiais, vendo no Google...” É complicado. Oswaldo revela ainda um personagem da patrulha de todo dia: o policial mais ou menos. O policial mais ou menos é herói? Não. 44
É assassino? Não. Tampouco é corrupto. O policial mais ou menos é só mais ou menos. Feijão com arroz. “Um carro foi roubado? Beleza, eu vou continuar indo pra lá pra atender minha ocorrência. Ou: um carro foi roubado? Eu vou atender minha ocorrência, mas vou prestando atenção nos carros. Pra gente, internamente, é o que diferencia um policial mais ou menos de um policial bom.” As ocorrências ficam mais graves no patrulhamento de Força Tática, da qual Oswaldo também participou por dois anos. São doze horas de patrulhamento em Blazer ou Hilux, com três homens na viatura e armamento mais potente. A pior ocorrência da sua vida foi um estupro. De uma criança. Que ainda chorava quando a viatura chegou. Acabara de acontecer. Um parente que costumava tomar conta do menininho um dia foi pego no flagra e fugiu. Mas a PM o encontrou. “Na hora aquilo foi crescendo e parecia que tinha sido um parente meu. Fiquei com raiva, com raiva. Quando a gente pegou ele, queria extravasar a raiva, mas tem que ser muito consciente. Respira, conta até dez, algema, põe na viatura e leva.” Outra ocorrência que muda o semblante de Oswaldo quando vem à memória é um acidente que poderia ter acontecido com qualquer um: uma moto avançou no sinal amarelo e bateu na sua viatura. O condutor foi arremessado para um lado, o garupa para o outro. A viatura rodou, o vidro estilhaçou. Veio a ambulância e constatou que o motoqueiro tinha morrido. Sua mulher sobreviveu. “Foi triste na hora ela gritando, e a gente já sabia que ele estava morto. E meu motorista também estava super abalado. Foi complicado. Eu lembro até hoje. Você fica pensando um monte de coisa: será que não daria pra evitar?.” “Não era um ladrão, não era uma pessoa que estava procurando. Eu já cheguei em diversos tiroteios que o ladrão acabou mor45
to. Mas é diferente, por mais que envolva morte, a gente chega lá e vê que a pessoa procurou aquela situação. Eu tenho muito mais sensibilidade quando é uma vitima.” É complicado. Em 2013 e 2014, Oswaldo viveu situações talvez ainda mais complicadas na PM: foi escalado para participar das manifestações do Movimento Passe Livre e anti-Copa. É especialmente difícil, diz o tenente, balizar os direitos das pessoas: o direito à manifestação e o direito de ir e vir. Além disso, tem os policiais –casos pontuais, enfatiza– que são estourados e acabam agredindo manifestantes e jornalistas. Para uma corporação jovem, 183 anos diante de um país de 514, Oswaldo crê que a PM aprendeu muito com os protestos em massa. “Houve excessos de ambos os lados. A gente tem que ficar ouvindo e vendo coisas que são ilegais. Mas tudo bem, estou lá para defender o direito da pessoa de protestar. Agora, quando a pessoa já vai com a intenção de depredar e entrar em confronto, não tem o que fazer. A tropa de manifestação trabalha do meio-dia até a noite. Às vezes, trabalha doze horas. Você já vai estafado, né? Aí o cara tá lá fumando um baseado e me chamando de coxinha filha da puta porque eu não estudei e virei polícia. É fácil aguentar isso aí? Não é fácil... Eles não estão ali pra protestar. Você acha que quebrando banco, queimando lixeira, alguém está protestando alguma coisa? Pra mim, isso não leva a lugar nenhum. O dono do banco tá rindo da cara dele. Tudo tem seguro. E o governo está maravilhado. Porque coloca a população contra a polícia e fica fora de foco. A maioria das manifestações qual foi o resultado? Quebra-quebra e confronto. Então fica polícia versus manifestantes e todo mundo esquece a real intenção da manifestação.” 46
O problema do quebra-quebra é que sobra pra todo mundo. Essa ação indiscriminada da polícia também é alvo de críticas, mesmo fora de situação de manifestação. O contrário também é deplorável: quando a polícia se concentra em abordar negros e pobres. Oswaldo justifica que é necessário abordar qualquer suspeito. Qualquer. “Um palio branco é roubado. Eu vejo um palio branco e abordo. Mando todo mundo descer. A pessoa já desce achando um absurdo: — Mas eu não fiz nada! Calma, mano. Eu não sei. Eu não sei! Não está escrito na sua testa. Até a gente conseguir ver quem é quem, tem que levantar a mão. Deixa eu ver se está armado, se não está...” A polícia, muitas vezes, é respeitada por medo, lamenta o tenente e diz que o temor vem da ditadura. “É engraçado falar porque eu não vivi a ditadura, meus pais viveram. A minha geração de policial é diferente dos coronéis que viveram a ditadura. O ensinamento que eles tiveram é diferente do que a gente teve e do que a gente está dando agora.” Ainda assim, a visão da sociedade sobre a polícia é ruim – uma polícia truculenta e repressiva, o braço armado do governo. Sem contar que a polícia sempre é chamada nas situações de erro, de crime, de sangue e de história triste. Tudo isso cria uma visão da corporação. “É difícil, né? Ser policial. A gente trabalha com cerceamento de liberdade, restringindo os direitos da pessoa. Todo mundo que está errado, não admite que está errado, não gosta. A pessoa para o carro no lugar errado, aí você vai autuar, ‘é só um minutinho’. Ou seja, pra ela pode abrir uma exceção. Mas quando ela está vendo alguém fazendo alguma coisa errada, aí 47
tem que tomar a atitude correta. A gente vive numa sociedade um pouco hipócrita.” Oswaldo garante que a ditadura não é assunto de aulas nem de conversa de corredor na academia. Não é tema de velhos coronéis saudosos. Até porque muitos instrutores nem viveram direito o regime militar. Eram muito jovens. O comandante da academia, por exemplo, tem uns 50 anos. O tenente, por sua vez, acha que não é certo viver num governo que restringe seus direitos, mas, ao mesmo tempo, critica o sistema atual. “A nossa democracia talvez não seja uma ditadura fantasiada? Realmente todo mundo tem direito à educação, à saúde? Até que ponto a gente melhorou?” Novamente, sem ser diferente dos demais homens fardados, ele diz gostar do militarismo pelos valores essenciais na formação de um indivíduo. “O pessoal fala que no militarismo vamos aprender a combater um inimigo, como o militar das forças armadas. Então o policial vai ver a sociedade como inimiga. A gente não tem nenhum tipo de treinamento aqui em que a gente veja a sociedade como inimiga. É diferente. Acho que isso está mudando cada vez mais. O que a gente consegue utilizar que é muito bom no militarismo é a ordem, a hierarquia, a disciplina. É o cara saber que ele tem que acordar 6h, ele tem aula 7h30, não pode atrasar, ele tem que vim aqui, cantar o hino nacional. Acho isso essencial para a nossa função. Se você vai cuidar da sociedade, você tem que pelo menos tentar ser o exemplo.” Alguns policiais estão bem longe de ser o exemplo. O tenente diz que essas pessoas “más” vêm da sociedade má e que suas ações acabam encobrindo as boas práticas da PM. E ele concorda que os desvios tenham mesmo que chamar atenção. Oswaldo defende ainda a justiça militar, que diz ser mais eficaz. No boletim48
-geral publicado todos os dias na intranet, ele vê a lista de policiais expulsos da corporação por diversos motivos. “Com certeza, posso falar que a PM tem muito mais homem bom e muito mais coisa boa. Porém, acho que acabam tomando maior proporção as coisas negativas. Acho que todo lugar é assim.” Sobre a fama de violência e as comparações com o Exército, o tenente explica que a PM adota o método Giraldi de tiros, baseado no “double tap”: são dois tiros com o objetivo de fazer o agressor parar. Caso ele continue, mais dois tiros. Além disso, a munição da polícia, ponto 40, tem “alto poder de parada”. Ou seja, vai parar no agressor, e não passar por ele. No Exército, onde um tiro de preferência tem que matar logo uns três, a munição é transfixante –ultrapassa o corpo atingido. E quem cobra da polícia que o tiro acerte braço ou perna não sabe o que diz. É impossível, explica Oswaldo, ter essa mira específica. Só para os atiradores de elite que, em geral, não estão correndo ou dentro de um carro em movimento. Na academia, os alunos também treinam tiro ao alvo. O som do disparo é de doer os tímpanos. Muito mais alto que nos filmes de ação. Enquanto a turma de Oswaldo se virava na ocorrência do “papa mike” baleado, outra turma fazia, em duplas, uma sequência de exercícios conjuntos. Era como uma gincana: tinham que terminar as estações no menor tempo possível. Já saem da viatura correndo, levando uma arma de cano longo. O primeiro desafio era conter uma pessoa alterada (por drogas ou problemas psicológicos). A capacidade de luta corporal é avaliada. Depois, eles arrastam de um cone a outro um boneco de 80 quilos que representa um PM a ser socorrido. É a vez de pular um muro –um policial tem que fazer pezinho para o outro e depois conseguir pular sozinho. Testam o equilíbrio em uma 49
trave paralela e desviam de obstáculos. Pulam um muro menor no impulso. Uma corrida entre cones, transporte de um pneu, um rolamento e voilà! Não acabou. A última estação é a de tiro. Uma série de tiros ao alvo e, agora sim, podem descansar. De segunda à quinta, as aulas vão das 7h às 17h30. Na sexta acaba mais cedo, às 13h. A alegria dá para ouvir: dos dormitórios, os alunos cantam música sertaneja. É sexta-feira. Vão voltar para suas casas. Os alunos do primeiro e segundo ano passam a semana na academia. Apenas o terceiro ano não é interno. Antes disso, porém, os alunos têm que ouvir os últimos recados do tenente Andrade. Meio dia e meia, ele reúne os alunos em formação: um atrás do outro, em fila. — Primeira Companhia, sentido! O pelotão bate continência. — Companhia, dispensar! Os alunos se posicionam com as pernas abertas e os braços cruzados para trás. — Companhia, à vontade. As vozes vão se levantando, instala-se o burburinho. Os soldados conversam entre si sem precisar manter a postura. Fica até difícil para o tenente recuperar a palavra. Alguns soltam um “shiiiiiu”. — Atenção, companhia!
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Oswaldo avisa que houve palavras cantadas de forma errada na Canção do Expedicionário e que os alunos vão ter que treiná-la na próxima semana. Avisa aos que vão viajar para o interior fardados que a recomendação é usar também o colete a prova de balas devido a informações via P2 (o serviço de inteligência da polícia) de atividades e movimentação do PCC. Os aniversariantes do mês são chamados um a um para receberem um cartão e uma salva de palmas. Um aluno dá ainda um recado relacionado ao serviço administrativo que os alunos cumprem dentro do Barro Branco: a luz da fachada tem que ficar acesa durante a noite por ordem do coronel. A cada recado, uma reação de comentários e gritos de piada por parte dos alunos. No nível de zoeira, parece uma sala de ensino médio. Ainda mais depois da intimidade de três anos juntos. A maior sacaneada, contudo, vem de Oswaldo. Durante o dia, chega a suas mãos o VR de um aluno, ainda no envelope e com a senha anotada, que fora achado e devolvido por um funcionário da limpeza. — Quem foi aí que perdeu um cartão de alimentação? — Ummmmm – reage o pelotão. — Vamos abrir aqui pra ver quem é.... — Ihhhhhhh! — Diego... — Ihhhhh! — Martins... — Uhhhhh! — Franco! — Aeeeeeeeee! – todos batem palma.
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Diego Martins Franco nunca mais vai esquecer nada. E o tenente sugere ao aluno que compre uma cesta básica para recompensar a honestidade do tio da limpeza. Ainda para o fim de semana, Oswaldo pede moderação na birita. “Agora, os senhores são exemplo.” No pátio, soa uma corneta. O pelotão grita e faz barulho. — Pessoal, então vou liberar vocês, não vou segurar mais não. — Paraniiiiiiinfo! –vários deles gritam, indicando o apreço pelo tenente que chega a ser mais novo que muitos ali. Oswaldo libera oficialmente seu pelotão. Mais gritos de euforia. Fim de semana.
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Memória A pessoa tem o maior medo de reagir com bandido, mas com o policial ela reage, ela não aceita. Laercio, sargento
Desde o fenômeno das manifestações de rua massivas em junho, as marchas para as mais diversas causas se multiplicaram. Muitas vezes, são palco de conflitos com a polícia. Sempre, portanto, são lotadas de policiais. Quase sempre, eles também são alvo do protesto. No Quarto Grande Ato contra a Copa não foi diferente. Os cantos contra o mundial se igualavam em quantidade e importância aos gritos contra a Polícia Militar. “Não acabou. Tem que acabar. Eu quero o fim da Polícia Militar.” Aquelas palavras, à repetição exaustiva, podiam perder o significado para aqueles que as entoavam. Para os policiais, eram 55
uma provocação. Impossível medir, porém, a importância que davam àquilo. Impossível saber quanto a provocação influenciava o comportamento de cada um dos homens e mulheres fardados. Pode ser que os cantos fossem tomados como uma grande bobagem. Algo a ser ignorado. Ainda assim, um daqueles cantos era especialmente sensível. “Que vergonha, que vergonha deve ser. Reprimir trabalhador pra ter o que comer.” Laercio acha que os gritos contra a polícia são falta de cultura. Coisa de vandalismo. Ele diz que as pessoas não entendem que a polícia não está ali porque quer, mas porque está fazendo a função que lhe cabe. “É um protesto insignificante porque a polícia sempre vai existir, faz parte da humanidade.” Pior: aqueles que gritam contra a PM, quando precisarem, vão recorrer a ela. “Existe um ditado que diz que na hora do perigo, a pessoa pensa em Deus e na polícia. Passou o perigo, esquece Deus e amaldiçoa a polícia”, diz Laercio. A mesma frase foi dita recentemente pelo ex-capitão da Rota, Conte Lopes, em entrevista à TV Folha. Sobre o senso-comum de que o polícia só é polícia porque não estudou, Laercio diz que é um preconceito. Sem curso superior, ele estudou em escola pública. O pai o bancou até o fim do colégio. Depois, como seus irmãos mais velhos, teve que se virar. O caminho mais seguro, indicado pelo próprio pai, era o serviço público. Os três se aposentaram policiais. “Ninguém fica rico, mas é uma gotinha que não para de pingar.” Na época, Laercio prestou concurso para Sabesp, Correios, PM –que foi o primeiro a sair. Entrando aleatoriamente aos 21 anos, logo se viu no lugar certo. “Pelo dinamismo, adrenalina, coleguismo. Fiz muitos amigos.” A aparência cansada contradiz a voz calma que supõe uma vida tranquila. Pelo visto, a vida de um PM é sempre um tanto 56
mais difícil do que imaginamos. Como tantos outros, Laercio fez operação na favela, trocou tiro, salvou reféns, perdeu colegas e viveu de bicos. Como tantos outros, Laercio se sente desvalorizado. “Existe uma rejeição da sociedade. A gente sente isso.” Diante desse repúdio, Laercio, que foi promovido a sargento ao se aposentar em 2012 após 30 anos de carreira, guarda como bom exemplo aquele que tentou valorizar o policial. Coronel Camilo, comandante-geral entre 2009 e 2012, atualmente vereador, mudou o nome dos cursos da PM, colocando a palavra “superior” em todos eles. A Escola de Soldados agora é Curso Superior de Polícia, o que, para Laercio, tira a ideia do “bem-feito, quem mandou não estudar.” Camilo ia pessoalmente às companhias e batalhões falar com a tropa, incentivando o policial. Antes, Laercio conta que o comandante-geral era um deus: soldados nunca o viam. Para os não policiais de São Paulo, porém, a gestão de Camilo foi bastante contestada. Sua saída, em abril de 2012, ocorreu pouco após a operação de reintegração de posse do Pinheirinho, em São José dos Campos, em janeiro de 2012. Cerca de 1.700 famílias ocupavam o terreno. Na época, o Conselho Estadual de Direitos da Pessoa Humana fez um relatório com base em 634 depoimentos no qual os policiais foram acusados de abuso de autoridade, agressão e estupro. O Conselho recebeu 1.876 denúncias de violações de direitos humanos, incluindo 260 denúncias de ameaças e humilhações, 166 denúncias de agressão física, 71 casas saqueadas e 54 denúncias de falta de assistência. O relatório aponta ainda que a morte do morador Ivo Teles da Silva tem relação com a violência policial. A Promotoria de Justiça de São José dos Campos apresentou uma denúncia contra o coronel Manoel Messias Melo, coman57
dante da operação. Segundo a Promotoria, foram usados dois mil homens armados com metralhadoras, tonfas, balas de borracha, bombas de gás e equipamentos de spray pimenta, além de mais de duzentas viaturas, um carro blindado, dois helicópteros águia, quarenta cães e cem cavalos. O texto diz que a reintegração foi feita de maneira truculenta, com o uso de bombas de gás e tiros de borracha, e que crianças presenciaram os pais apanhando da polícia. A 5º Vara Criminal da Comarca de São José dos Campos rejeitou a denúncia. O caso foi apresentado ainda à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Um caso paralelo ao Pinheirinho também rendeu denúncias. Enquanto a PM fazia a reintegração de posse, no dia 22 de janeiro, policiais da Rota fizeram uma ronda em outro bairro de Sâo José dos Campos, o Campo dos Alemães. Ali praticaram abuso sexual, tortura e agressão, segundo as vítimas. A Corregedoria indiciou 14 PMs pelo ocorrido. Para Laercio, a culpa pela imagem ruim da PM é do militarismo mal interpretado e da mídia, que divulga as notícias ruins sobre a polícia atrás de audiência. “O militarismo é associado ao governo militar. Essa associação vem de longe. É mais uma tradição. O policiamento não tem a ver com o sistema político militar.” Quando Laercio entrou na PM, o Brasil vivia os tempos da ditadura militar. De 1982 a 2012, ele percebeu diversas mudanças na polícia de São Paulo e os mecanismos que as tornaram possíveis. Sobre a sua formação, ele diz ser incomparável com a atual, por exemplo. Eram seis meses de escola militar de guerrilha, um treinamento mais para a Força Auxiliar do Exército. A PM, segundo a Constituição, ainda é uma Força Auxiliar do Exército, embora suas atividades sejam diferentes atualmente: o foco é o 58
policiamento. “Era mais bruto. Porque o Exército é direcionado pra matar mesmo, pra guerra. A gente era muito mais direcionado para esse lado do que para o policiamento propriamente dito”, conta. Hoje em dia, o curso na Escola Superior de Soldados tem dois anos de duração –incluindo um ano de estágio. De lá pra cá, Laercio viu a instituição ir de um extremo a outro –de violência em excesso para falta de ação, segundo sua opinião. O sargento pondera que o que era generalizado passou a constituir casos isolados, mas que, bem explorados pela mídia, fazem com que a sociedade tome a parte pelo todo. “Criou-se o artigo quinto, cheio de direitos [direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade]. Mudou muita coisa, mas hoje a mídia ainda passa a imagem da PM violenta. São casos, mas quem está dentro sabe que não é assim”, ele diz. Houve uma época que sim, Laercio não nega, matar era a forma mais “eficiente” de resolver um crime, mas ele divide essa responsabilidade com a sociedade, que também pensava assim. “Eu diria que essa mentalidade não era só da PM. E muitos ainda a têm. Hoje em dia, eu acho que esse pensamento existe mais na sociedade do que na própria PM, que chegava no caso e queria resolver logo.” Talvez, a realidade da criminalidade atualmente, com as mesmas pessoas sendo presas e soltas diversas vezes pelos mesmos crimes, contribua para que um policial ainda veja o assassinato como uma opção para cortar o mal pela raiz. A diferença é que a sociedade cada vez menos compactua dessa ideia e a mídia está mais amadurecida e preparada para denunciar os crimes policiais. A partir do momento em que o pacto ideológico entre PM e sociedade foi rompido, quando a democratização já não era suficiente e a população exigia também a implantação de um Estado 59
de Direito efetivo, a polícia teve que mudar –e, claro, os soldados se viram limitados. “De acordo com as cobranças que vão surgindo, a PM vai mudando.” O cabo dá pistas de como a ação policial se enquadrou nessas mudanças e de como se sentiu de mãos atadas, reclamando de vários aspectos práticos do seu trabalho. “É uma dificuldade danada pra trabalhar. Os próprios bandidos reagem muito mais. Antigamente, era mais difícil um bandido reagir.” [...] “A gente é muito restrito hoje em dia. Antes tinha mais liberdade de patrulhar com viatura onde a gente queria dentro do setor designado. Hoje existe um roteiro já pré-estabelecido de onde tem que parar, estacionar, as ruas certas que tem que passar, de acordo com o índice de criminalidade. O comandante de companhia vai mudando o roteiro conforme a necessidade.” [...] “Hoje em dia é difícil a polícia trabalhar. Às vezes você fala ‘coloca a mão pra cima’ e o cara fala ‘não vou fazer’. Aí se tiver alguém filmando, já aproveita. O policial vai fazer o que? Vai atirar? Aí não atira, mas ele está fazendo o trabalho dele e ele tem que ter segurança pra fazer. E, para fazer com segurança, tem que fazer a abordagem profissional. Tem muitos casos de desobediência. Às vezes tem que abordar à força porque não pode deixar de fazer. A pessoa tem o maior medo de reagir com bandido, mas, com o policial, ela reage, ela não aceita.” [...] “Antigamente a gente fazia muita operação na favela. Hoje em dia é raro porque tem que passar por um monte de aprovação. Antes, o comandante da companhia falava: vamos fazer uma operação em tal lugar, a criminalidade lá ta alta, tem boatos que 60
tem armas lá ou que o tráfico está muito grande. Ele pegava todo mundo que estava trabalhando naquele dia e fazia. Hoje em dia, ele precisa da aprovação do comandante do batalhão, do comandante-geral, da Secretaria de Segurança Pública. Aí até chegar lá e até voltar tudo... desestimula. Não tem autonomia.” Laercio é saudoso da época em que a polícia era respeitada. “Antigamente, uma viatura pequena chegava num bar cheio, todo mundo parava. Quem tava jogando parava, já ia pra parede. Todo mundo respeitava.” O militar admite que o preço por tal respeito era caro. Era um respeito calcado no medo de uma polícia violenta e despreparada, que queria resolver o crime a qualquer preço, até mesmo se colocando em risco. Em 1983, no ano seguinte à sua entrada na polícia, Laercio perdeu o primeiro companheiro de trabalho. “É o que marca mais: a gente chega e vê o colega fardado já morto em serviço...” Era noite quando uma viatura de patrulha foi avisada que uma loja de peças de automóveis estava sendo assaltada na avenida Cursino. “Eles foram meio despreparados, não chamaram ninguém, não avisaram. Na época, tinha muito esse negócio de produção, de chegar e pegar. Aí eles foram nessa de pegar em flagrante e o primeiro que entrou já tomou o tiro fatal”, conta Laercio. Antes ainda da chegada dos companheiros, o policial já estava morto. Nem chegou a ser socorrido. “Já tinha o sangue espalhado. Uma cena... Não tem explicação. Claro que pensamos ‘podia ter sido eu’, mas não é só isso. Um sentimento de revolta. Difícil explicar. É muito forte”, conta Laercio. Aqueles policiais de atitude, que matam e são mortos, ainda têm o apoio dos colegas. Ainda são considerados heróis, explica Laercio. Mas perderam o apoio da sociedade e da 61
corporação. O sargento diz que deve haver um meio-termo entre a polícia que mata primeiro e pergunta depois e a polícia amputada pela sociedade. “O policial acaba desestimulado a fazer o seu trabalho. A instituição desestimula. Uma ocorrência que o policial chegava e resolvia, hoje ele chega, não pode resolver, não pode entrar, chama o apoio, espera o comando chegar, aí o comando avalia, conforme for chama o Gate. Fica aquela negociação. Aí os bandidos aproveitam para exigir isso, exigir aquilo. Antigamente não tinha isso, mas colocava o refém mais em risco. Acho que hoje é a maneira mais certa, mas passamos de um extremo a outro: falta achar o bom-senso de todos os lados, polícia e sociedade.” Essa virada na polícia, segundo o diagnóstico de Laercio, se deu também por causa da Constituição de 1988, mas principalmente devido aos episódios que abalaram a sociedade civil: o Carandiru em 1992 e a Favela Naval em 1997. A partir deles, gerou-se a discussão de que a PM agia errado e era preciso rever isso. Revelado pelo Jornal Nacional, o caso Favela Naval ocorreu em março de 1997, quando policiais faziam uma espécie de blitz na favela de Diadema e agrediam os motoristas que passavam por ali. As cenas brutais, exibidas em rede nacional, mostram um homem sendo espancado por oito minutos, antes de levar um tiro. Dias depois, no mesmo local, outro vídeo mostra os PMs cobrando propina dos motoristas e agredindo os passageiros de um carro. Um dos policiais chega a atirar contra o veículo, matando uma pessoa no banco de trás. O ex-soldado Otávio Lourenço Gambra, conhecido como Rambo, foi condenado a 15 anos e dois meses de prisão pelo assassinato de Mário José Josino, 30. Em 2005, ao completar um sexto da pena, Rambo passou ao regime semi-aberto. 62
Nove policiais que participaram da blitz foram denunciados pelo Ministério Público –três foram demitidos e seis expulsos da PM. Há ainda outros dois policiais que foram punidos internamente, mas não participaram da ação, segundo a PM e, por isso, continuam na corporação. Laercio conta que as ocorrências de resistência, quando havia troca de tiros ou mortes, costumavam ser elogiadas e os policiais eram condecorados. Atualmente, a ocorrência considerada certa é a sem violência. “Começou a ser exemplo só quando não havia uma necessidade de trocar tiro.” Ele diz que o PM hoje “conta até dez” antes de agir porque sabe as implicações: vai ser processado pelo tribunal civil e militar, vai ser tirado da rua, vai passar por acompanhamento psicológico e pode perder o bico. “Se o psicólogo achar que o cara é perigoso, ele manda desarmar. Isso é humilhante pro policial. Uma coisa que você gosta de fazer, que acredita estar fazendo certo. Claro que há exceções, mas geralmente o policial estava fazendo do jeito certo.” Justamente definir o “jeito certo” em uma ação policial é a dificuldade. A decisão de atirar ou não é tomada em segundos. “O momento do tiro é complicado porque às vezes a gente já vai com adrenalina, já vai sabendo o que está acontecendo, sabendo o que pode encontrar e às vezes encontra mesmo. É uma decisão que tem que tomar em um décimo de segundo, não tem como explicar em que a gente se baseia exatamente.” Essas ações de controle da atividade policial, como o afastamento compulsório, embora sejam necessárias para tentar garantir o cumprimento dos direitos dos cidadãos, estimulam a omissão da polícia na visão de Laercio. “Isso inibe o policial. Ele prefere deixar o bandido fugir. Ele podia chegar e forçar um tiroteio, mas ele prefere ir devagar, chegar depois, quando o cara já fugiu.” 63
E reclama: “A polícia ficou sem apoio pra trabalhar. De todos os lados: da sociedade, do Estado, da própria instituição. Uma coisa provoca outra. Conforme a sociedade cobra mais, a polícia recua mais.” O próprio afastamento da atividade policial seria “mais pra dar satisfação pra sociedade.” Pegou mal para o governo que as pessoas encontrassem policiais com assassinatos na carreira patrulhando por aí. O exemplo mais recente é o do soldado Henrique Dias Bueno de Araújo, que disparou contra Carlos Augusto Muniz Braga, um camelô que tentou tirar da sua mão um spray de pimenta. O spray era usado para dispersar as pessoas enquanto outros policiais imobilizavam outro camelô. Carlos morreu com o tiro na cabeça. O soldado, que alegou ter atirado acidentalmente, foi preso em flagrante por homicídio e levado ao presídio militar Romão Gomes. Poucos dias depois, porém, a Justiça emitiu um alvará de soltura. O problema é que Henrique já responde a outro caso de homicídio, por ter atirado contra um morador de rua. Segundo a PM, o morador de rua resistiu à abordagem e usou um facão para ameaçar o soldado. Exatamente para evitar que casos como esse ocorram, o policial envolvido em ocorrência com vítimas fatais costuma ser afastado. Esse afastamento, acompanhado por psicólogo, é, em geral, visto pelos policiais como uma punição –pelo estigma e por mudar o horário de trabalho, afetando o bico. O Proar (Programa de Acompanhamento a Policiais Militares Envolvidos em Ocorrências de Alto Risco), criado em 1995, previa o afastamento automático do PM envolvido em uma ação que resultasse em morte. Em 2002, o Proar foi substituído pelo Programa de Acompanhamento e Apoio ao Policial Militar (PAAPM), que é mais abrangente. O policial pode ser encaminhado 64
para avaliação psicológica após ações de risco e troca de tiros mesmo sem vítimas. Porém, a sensação de estar sendo castigado, apesar ter sido maior nos primeiros anos do Proar, persiste. Sobre a punição real, mais necessária do que esta simbólica, Laercio diz que quando um policial assassino é pego, é punido judicialmente. Mas, para escapar da cadeia, basta esconder bem o crime. “A gente usa um termo que a polícia dá um tiro de canhão pra matar mosquito. Isso vale para tudo, não só para o policial envolvido em crime, mas para a disciplina, o próprio RD [regimento disciplinar] é muito rígido, militar mesmo, muita cobrança, muita pressão.” Pode-se questionar se o tiro de canhão contra os policiais criminosos realmente funciona. Mas não restam dúvidas de que a disciplina militar é um rojão que pesa, principalmente nos soldados. “Ordens são ordens. Muita pressão, muita coisa ruim, digamos assim. Mas tem a parte bonita, a parte boa do militarismo que traz união. Às vezes a vida da gente depende de um colega ou da corporação inteira.” As ordens vêm de escalões superiores –de oficiais que não estão nas ruas. Por isso, o soldado de patrulha, muitas vezes, se vê confrontado entre a sua experiência e seu conhecimento sobre o terreno e uma ordem que ele, justamente por estar na linha de frente, crê não ser efetiva. “Isso é quase uma constante praticamente. Não existe uma pesquisa. Em tudo. O fardamento ninguém pergunta pra gente se é confortável, simplesmente é imposto. Ninguém pergunta que viatura é melhor pra trabalhar. É imposto. Tudo é imposto. Às vezes a agente está trabalhando recolhido pra ficar em prontidão. Sabemos que não vai precisar. Mas quem dá ordem não está vendo o que está acontecendo. Ele se baseia nas informações dele e dá uma ordem. O cara está atrás de uma mesa. A gente está na rua, a gente sabe quando é necessário e quando não é.” 65
Ainda assim, não há questionamento. As ordens e o regimento disciplinar estão ali para serem cumpridos. Laercio explica que existe uma fiscalização disciplinar, ligada à Corregedoria da PM, que funciona como a polícia da polícia. “Eles têm um fardamento diferente. Sai um ostensivo fardado que aborda policial de serviço e vê se a bota dele está limpa, se está suja, se ele está com postura... Qualquer coisa que acharem errado, o policial é punido. Ele é comunicado, depois vai pro batalhão e é punido.” A julgar pelos desabafos de Laercio sobre os problemas mais cotidianos de um soldado, do desestímulo à ação às ordens engolidas à seco, fica difícil entender como alguém que entrou por acaso na polícia se manteve ali 30 anos. Mas essa é uma questão difícil mesmo se explicada. Não há razão. Há apenas uma irracionalidade que prende as pessoas em seus empregos chamada também de vocação. “A parte institucional é difícil de lidar. É muito mais difícil conviver com a parte militar do que com o trabalho em si. O trabalho em si a gente gosta. Vai atender ocorrência, vai atender o cidadão, é gratificante na maioria das vezes. O patrulheiro que gosta de rua... Tá acabando isso, né? Mas ainda deve ter gente que vê as coisas como eu e que ainda gosta.” Esse grande balanço do que foi e do que é a polícia é quase tudo que o tímido Laercio tem a dizer. Humilde e prestativo, interrompe o bico de segurança à paisana no supermercado Assaí da avenida João Dias, onde trabalha há dez anos, para discorrer sobre a própria vida durante algumas horas de uma manhã de domingo. Mas não fica totalmente à vontade com isso. Um sorriso de verdade, só com o gravador desligado. Para o dia frio, ele veste uma calça jeans e uma camisa xadrez de flanela. O rádio vai pendurado na cintura, pronto para dedurar algum movimento suspeito. O rosto bem redondo, em 66
geral, está sisudo. A careca e as bolsas cansadas abaixo dos olhos pequenos denunciam a idade. Laercio nasceu em Itaquera em 1961 e foi criado ali. É o mais novo de cinco irmãos. O pai era mecânico de máquinas pesadas e trabalhou em várias construtoras. “Tive uma infância pobre, na periferia. Não diria difícil. Pobre, mas feliz e tranquila.” O trabalho o levou a morar na zona sul, onde patrulhava. Aliás, foi numa patrulha em São Judas que conheceu sua mulher, que trabalhava em uma loja no bairro. “Na época, inventaram o policiamento localizado, que ficava duas horas parado no mesmo lugar. A idéia era fazer contato com o comércio. Foi o inicio do policiamento comunitário. Eram umas kombis, que ficavam paradas. Eu trabalhava oito horas –duas horas em cada local que o comandante estabelecia.” Quando se casaram, em 1986, ambos trabalhavam no Paraíso, onde alugaram uma casa. Laercio teve um casal de filhos: Douglas, de 25 anos, e Daísa, de 15. “Esses dez anos de diferença são os dez anos de aluguel. A gente estava pagando aluguel e pensou: pô, ter outro filho... A gente queria uma menina, porque já tinha um menino. Aí um dormitório já não serve mais, teria que ter três dormitórios. Aí a gente foi se segurando.” Há 18 anos, comprou um terreno em Guarapiranga e construiu sua casa. E o casal pôde engravidar novamente. Douglas e Daísa estudaram em escola pública. Hoje a família tem dois carros e uma moto –comprada quando Laercio precisou se deslocar da zona sul para o bico em Osasco, onde ficava o Assaí na época. Com o nascimento do primeiro filho, a mulher teve que parar de trabalhar porque não tinha com quem deixá-lo. Foi uma boa escolha: Douglas é um orgulho para a família. Depois de fazer cursinho com bolsa, ele passou nas três universidades públicas em São Paulo no curso de Engenharia. Escolheu a 67
Poli, na USP, e teve que se mudar para o Crusp, depois de muito madrugar e pegar ônibus lotado, dada a distância entre Guarapiranga, na zona sul, e o Butantã, na zona oeste. “A gente se realiza mais através dos filhos. O que meu pai não pôde fazer por mim, eu tento fazer para meus filhos.” O filho do militar foi parar justamente na USP, um reduto anti-PM. Em 2011, uma ação da polícia para reintegração de posse da Reitoria, invadida por alunos, provocou uma greve estudantil que se estendeu até o ano seguinte. Toda a história começou em maio, quando o aluno da Faculdade de Economia e Administração Felipe Ramos de Paiva foi morto no estacionamento, após uma tentativa de assalto. Em setembro, o reitor João Grandino Rodas assinou, então, um convênio com a PM, que passou a ter presença mais frequente no campus. Desde então, estudantes (especialmente negros) relataram terem sido abordados diversas vezes e sentiram sua liberdade restringida. O ápice foi no dia 27 de outubro, quando policiais prenderam três estudantes que fumavam maconha no estacionamento da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, gerando um confronto entre alunos e policiais ali mesmo. De imediato, começou a polarização no campus entre aqueles a favor da PM e os contrários, sendo que a Poli, onde Douglas já estudava, era um dos pontos de apoio à PM. A questão é que os alunos mais exaltados resolveram ocupar a Reitoria da USP, em um movimento com pouquíssima legitimidade na comunidade uspiana. Até que a polícia os transformou em heróis. Na madrugada do dia 8 de novembro, mais de 400 policiais do Choque, Cavalaria, Goe e Gate, além de um helicóptero, cercaram a Reitoria e levaram presas 73 pessoas. Os alunos relataram abusos e violência na operação. A polícia negou. Os 68
detidos foram indiciados sob suspeita de desobediência a ordem judicial (não cumpriram o prazo de desocupar a reitoria) e dano ao patrimônio público. Moradores do Crusp disseram terem sido impedidos de saírem de casa durante a reintegração e que a PM usou bombas de gás, estudantes alegaram terem sido agredidos, uma estudante disse ter sido amordaçada, os detidos afirmaram que a própria polícia destruiu partes da Reitoria. O Ministério Público Estadual de São Paulo pediu a abertura de um inquérito para investigação da ação da PM no Crusp. O resultado não podia ser outro: no mesmo dia uma Assembleia Geral com cerca de três mil estudantes deliberou a greve. Os alunos exigiam o fim do convênio da Reitoria com a Polícia Militar e a saída da PM do campus. Foi nesse ambiente que o filho de Laercio levou sua graduação, mas o policial minimiza a situação. “Pelo que eu converso com ele [Douglas], ele fala que não é a USP. Aquele pessoal não representa a USP. Ele fala que é mais uma parte, do pessoal de sociologia, por exemplo. Esse pessoal sempre foi assim, não é só na USP. Mas ele não tem essa mesma visão. Inclusive, não só ele como todo mundo achou muito errado o pessoal invadir, destruir, achar que a USP era local isolado, que você pode fazer o que quiser lá dentro, fumar maconha, fazer tudo abertamente. Ele também não concorda com isso. Eu acho que por eu ser PM, mas também pela própria visão dele.” Laercio subiu ao posto de cabo por tempo de serviço e se aposentou, portanto, como sargento. Um sargento aposentado ganha R$ 5 mil por mês. São descontados mais ou menos R$ 800. “Eles cortam alguma coisa em relação a quando você estava na ativa. Existe uma briga na Justiça porque por lei isso não pode. Militar não poderia ter esse corte. Mas o governo vai 69
dando um jeitinho, já que a mídia explora isso [o baixo salário na ativa e o salário integral na aposentadoria] e fica mal pro governador. Os caras vão dar um jeito de tirar dos aposentados pra pagar os das ativa. Teve um tempo que isso aconteceu. Tirava dos mais velhos para pagar o inicial.” Para complementar o salário, os bicos, é claro. Laercio conciliava a escala 12x36 da PM e dos bicos. Ele trabalhava à noite na PM, das 19h às 7h. “A gente chega e tem meia hora de preleção. O sargento passa as ordens do dia, confere o pelotão. Depois, pegamos as viaturas e saímos. Se não tiver ocorrência, temos que seguir o roteiro de onde patrulhar.” Às 10h, pegava serviço como segurança no Assaí, de onde saía às 22h. Descansava até às 19h do dia seguinte, quando começava a rotina outra vez. Rotina essa bem diferente da de policiais em filmes de ação. A maior parte das ocorrências são brigas de família, as chamadas ocorrências de “desinteligência”. Também atendem muitos casos de embriaguez e “código 13 –uma pessoa meio louca”, o que a rigor não seria uma função da PM. “A gente diz que a polícia abraça tudo. Abraça ocorrência que não é dela. O pessoal liga 190 por qualquer coisa e a polícia é praticamente obrigada a ir. Aí vai lá, faz socorro, parto. Na verdade não é função da polícia, é função de ambulância, de resgate. Até para ocorrências de bombeiro, muitas vezes o pessoal liga 190. Acaba faltando viatura para a atividade-fim, que é combater o crime, manter a paz.” Diante disso, Laercio é mais um defensor da polícia comunitária, ainda que ela também esteja em outro campo que não a atividade-fim. A função da polícia comunitária é ser mais integrada à sociedade, conhecer os problemas daquele ambiente e prever novos problemas. O PM terminou a carreira fazendo poli70
ciamento comunitário em São Judas –e conheceu a mulher quase da mesma forma, diga-se. “A gente cuida de outras coisas, por exemplo, a gente faz pedido pra iluminação, porque, devido ao local escuro, o pessoal é muito assaltado. Faz pedido pra asfalto. Pede para a Prefeitura cercar parques porque a pessoa entra e usa droga. A gente entra em outra áreas que não o policiamento.” Contudo, os benefícios são sensíveis, diz Laercio, inclusive a queda da criminalidade. “Você não vai chegar num policial qualquer e dizer: ó, conheço um bandido ali. Mas você tendo amizade com o policial, sendo sempre os mesmos, numa base comunitária, você cria vinculo e pode até falar. É como se fosse um amigo. Ele fica sabendo dos problemas daquele pedaço. Eu acho que é o ideal. Lógico que não dá pra ter só polícia comunitária, mas é o ideal, deveria ser o principal.” Antes de voltar ao trabalho, entre os “bips” de produtos passando no caixa e o chiado do rádio, Laercio deixa ainda uma última consideração sobre a polícia: critica a divisão entre os policiais militares e os civis. “Fica uma briga de poderes e competências. O governo, se dá uma coisa pra uma, tem que dar pra outra para agradar também. Se ele dá um helicóptero pra PM fazer patrulhamento, tem que dar para a Polícia Civil também. Acaba perdendo a sociedade porque se paga duas polícias separadas para o que deveria ser a mesma coisa.” Agora sim, depois do mergulho, certamente involuntário, no seu passado, mas que acabou trazendo à tona muito mais – as transformações de toda a Polícia Militar de São Paulo pós redemocratizaçao–, Laercio pôde voltar ao bico de um domingo, finalmente, normal. Antes, um sorriso e um aperto de mão forte e firme, como se todas as histórias anteriores não bastassem para comprovar seu caráter policial. 71
Enxugando gelo Incomoda saber que a polícia não é o que estão falando. Massera, capitão
“A minha casa está sempre arrumadinha.” Mesmo sem nunca ter estado lá, ninguém duvida disso quando vê o capitão Massera –um sujeito arrumadinho. Está impecável de camisa pólo listrada branca e azul da Tommy Hilfiger, calça jeans e cabelo penteado. As entradas e os grisalhos não são páreo para a juventude que, praticamente, exala. Com um sorrisão, é um homem bem simpático e educado. Sobretudo didático e organizado nas ideias. Voz firme e assertiva. Perfeito para exercer a função mais difícil dentro da Polícia Militar. Como todo oficial, se formou na Academia de Polícia Militar do Barro Branco. Antes disso estudou a vida toda em escolha pública. 73
Na época, a concorrida seleção para o Barro Branco era feita pela Fuvest. Hoje, igualmente concorrida, a prova é feita pela Vunesp. O último edital, aberto no fim de 2013, convocava para 220 vagas e teve 11.430 inscritos (quase 52 por vaga). Após avaliação médica, exames psicotécnico e físico, Emerson Massera passou a ser um recruta no ano de 1990. Fez o curso preparatório de dois anos –que equivalia ao ensino médio– e o curso de formação de oficiais de três anos, reconhecido pelo MEC como um curso de nível superior. “Geralmente, o oficial quando se forma faz outra faculdade. Eu fiz mais três”, se gaba. O capitão escolheu cursos que se relacionavam com o seu trabalho e com cada momento da sua carreira. A primeira foi ainda em 1994, junto com o último ano do Barro Branco, quando estudou Processamento de Dados no Mackenzie, o que levou três anos. A segunda foi o Direito, comum entre os oficiais, já que é uma disciplina também da carreira policial. Algumas faculdades, como a Unicsul, onde Massera estudou, dão ao policial o direito de eliminar matérias já cursadas no Barro Branco. O resultado é que, em dois anos, Maserra concluiu o Direito e, no ano seguinte, em 2006, entrou na USP para estudar Ciências Sociais, graduação concluída em 2013, depois de dois anos trancados. Massera começou seu trabalho de tenente como comandante de força patrulha no 12º batalhão, que engloba os bairros de Moema, Campo Belo, Brookilin e Vila Mariana, na zona sul da capital. Ele, de dentro de uma viatura, coordenava o policiamento de rua da região de 62 km2. Essa é a função do oficial: gerenciar o policiamento feito pelos praças. Naquela manhã de sábado, Massera tomava seu café mais tranquilo. Estava de férias. Era fevereiro e seria bom descansar antes da pauleira que viria com a Copa do Mundo. E que já vinha sendo desde junho, quando o Brasil acordou. Estava 74
especialmente difícil ser policial desde então. Mas a confiança, o sorriso e a serenidade de Massera não murcham. Na quinta-feira mesmo fora obrigado a interromper as férias e vestir sua farda. Para um apaixonado pela profissão, um alívio na abstinência. Ainda mais porque a ocasião era nobre: no quartel da PM na Washington Luis, em frente ao aeroporto de Congonhas, foi receber uma medalha em homenagem ao seu trabalho no 12º. Resultado de uma carreira que começou da maneira mais clichê possível. Durante toda a vida, o pai de Massera foi um praça. Um sargento. Chegou ao oficialato na aposentadoria, quando todos os policiais sobem uma posição na rígida hierarquia militar. Pelos olhos do filho, Jair era um líder natural, honesto, querido pelos vizinhos e pela família, um resolvedor de problemas alheios –e com prazer. “Lembro o dia que falei com ele que queria ser policial. Devia ter uns 14 ou 15 anos. Ele me disse para não cometer os mesmos erros. Que estudasse. Que ele tinha tido a oportunidade de estudar e não estudou. ‘Seja oficial que você vai poder ajudar muito mais gente do que eu.’” “Não tem nada melhor do que, na adrenalina, você perseguir um carro roubado e, quando você prende o ladrão, sai uma vítima de dentro do porta-malas e te abraça. ‘Se não fosse você, eu já estaria morta agora’. A sensação disso é fantástica: eu fui o diferencial para a vida de alguém. Ainda que seja uma atividade tão difícil e tão pouco reconhecida, tão discriminada. Se fala em discriminação de minorias, de migrantes, de pretos, mas acho que a classe mais discriminada que existe hoje é a classe policial. Todo mundo olha torto pro policial, ninguém quer precisar do policial, mas quando precisa, acaba recorrendo. É uma categoria desvalorizada tanto em termos salariais como socialmente.” 75
Depois de diversas ocorrências com bastante adrenalina no 12º, Massera passou para o lado administrativo da PM. Trabalhou seis anos na inteligência da polícia e outros seis anos fazendo análise social e criminal de São Paulo a partir do estudo de estatísticas –foi isso o que motivou a última das graduações, em Ciências Sociais. Foi no setor de inteligência da PM, ligado ao Comando-Geral, que começou o trabalho de análise criminal quando ainda não existiam ferramentas para isso. Cada delegado ou comandante de companhia, se quisesse e como bem entendesse, separava os dados criminais da sua região e a partir daí traçava uma estratégia. Em 1998, a secretaria de Segurança Pública lança a primeira ferramenta para obter dados criminais sistematizados: o infocrim. De lá pra cá, a vida ficou mais fácil. “Hoje com um clique, você tem tudo, inclusive BO”, diz. Em 2002, foi chamado para fazer análise criminal para a cidade de São Paulo, passando da inteligência do Comando-Geral para a inteligência do Comando da Capital, onde trabalhou com planejamento operacional, ou seja, identificava prioridades para a ação policial na capital. Massera conta que justamente na época do início do trabalho de análise na capital, os homicídios começaram a cair, mas ressalta que não há relação de causalidade comprovada entre os dois acontecimentos. “Seria leviano dizer que o homicídio caiu a partir desse trabalho porque ele caiu em todo o Estado, mas que teve uma participação teve.” Para Massera, a redução dos homicídios está ligada ao envelhecimento populacional. Se em 1999, a taxa de homicídios no Estado era de 35,27 a cada cem mil habitantes, em 2013, o número passou a 10,5 –o segundo menor desde 2001, só per76
de para 2011, quando a taxa foi de 10,1. Em 2013, foram 4.444 casos de homicídios dolosos segundo a Secretaria de Segurança Pública. Nos três primeiros trimestres de 2014, foram 3.176. Enquanto isso, as pessoas de 15 a 24 anos, que representavam quase 19% da população em 2000, passaram a cerca de 16% em 2010. “Como a violência é sofrida e praticada por jovens, parece coerente dizer que a diminuição da população jovem leva a diminuição da violência”, explica. Mas o capitão também admite o papel do investimento social na redução da criminalidade. “A diminuição da desigualdade também contribui. Tinha um prefeito aí famoso que, pra investir em moradia, construía viaduto pro pobre morar embaixo. Mas no fim da década de 1990, começou o investimento mais forte na área social e isso contribui muito para a redução da violência. Aliás, isso é fundamental.” Massera, então, engata um discurso com teorias dignas de um estudante da FFLCH de esquerda, quase estranho na boca de um policial, embora ele mesmo reaja: “já ouvi que eu não penso como um policial, mas como o policial pensa? Você já teve contato com policiais pra saber isso?” E segue, destoante do senso-comum: “O pessoal fala em investir cada vez mais em policiamento, cada vez mais em repressão, e não é isso que vai reduzir a violência. O que vai reduzir a violência é investir na área social. Na redução dos problemas que dão causa a criminalidade. Quando você investe no fortalecimento do aparato policial e na repressão, você não está investindo nas causas, mas nas consequências.” Massera estaria sugerindo um foco nas causas: um trabalho de prevenção –quase nunca associado à PM, que acaba lidando mais com as consequências: a repressão. Para ele, investir em repressão é como o Ensaio sobre a Cegueira, do Saramago, no qual 77
a solução foi segregar. Só que chega um momento em que todo mundo fica cego –e as prisões ficam lotadas. “O problema é que a PM é um órgão de repressão. Embora sua função na Constituição seja de prevenção, a polícia faz muito pouca prevenção. Isso simplesmente porque a demanda é grande. São 1.200 viaturas na rua para 45 mil chamados do 190 por dia só na capital. Essas viaturas somem, estão sempre em atendimento de ocorrência. Ou seja, estão sempre atrás. É um trabalho de enxugar gelo.” Traçar a mentalidade de Massera também é como enxugar gelo. Ele já alerta: “você não vai sair daqui com um perfil meu de esquerda ou de direita.” Até porque esquerda e direita hoje não existe mais, ele prega. Minutos depois de defender a prevenção, não com o aumento da presença ostensiva da polícia, mas com ações para moradia, urbanização, revitalização do centro e integração entre empresas e a periferia, Massera fala em leis mais duras e redução da maioridade penal. Ele conta que, na Baixada do Glicério, a Record faz flagrantes de bandidos quebrando vidros para roubar o interior de carros. “A polícia não faz nada, acontece todo dia, a qualquer hora que viermos, nós filmamos isso”, eles dizem. Ao que Massera responde: “Tá vendo esse menino aí na filmagem? No último mês, prendemos 14 vezes.” Não, a solução, para Massera, não são leis mais brandas. A teoria Saramago funciona nas condições normais de temperatura e pressão, o que não é o caso da sociedade brasileira –um organismo doente, ele explica. Em um corpo com câncer não adianta fazer a quimioterapia sem retirar o tumor. A prevenção vai evitar que novas pessoas optem pelo crime, mas os criminosos reincidentes precisam ser combatidos. Segundo Massera, a lei dura, 78
inclusive para menores, é necessária no processo de retirada do tumor. Uma vez curado o organismo, seria possível pensar em penas alternativas e restabelecimento da maioridade penal aos 18. “Dizem que colocar menor na cadeia é colocar a criança numa escola de maldade. Mas hoje ela já está! O que precisaria é de um sistema especial para as crianças porque o sistema não reeduca ninguém. Aqui o preso trabalha três dias e desconta um dia na pena, e trabalha se quiser. Há modelos na Ásia e Europa em que o preso é obrigado a trabalhar pra pagar a estadia na cadeia e ainda aprende uma profissão lá dentro.” “Na PM, sou extrema esquerda. Fora da PM, sou extrema direita”, diz. Além de defender investimento na área social e, fugindo do tema, a união civil entre pessoas do mesmo sexo, Massera é totalmente contra a violência da polícia, que é praticada pelos “maus policiais” –um termo que, junto com “bandido”, está na boca dos policiais para definir quem é quem no mundo da PM. Mocinho, empregando também um papel na narrativa, Massera nunca anda armado. Só quando transita fardado. “Sou a favor do desarmamento total e irrestrito. O fácil acesso a arma de fogo é responsável pela violência que nós estamos vivendo hoje. O estatuto do desarmamento foi também uma das grandes ferramentas para a diminuição dos homicídios.” Ele explica que embora a PM continue aumentando suas abordagens a cada mês, a apreensão de armas vem caindo a cada ano. “O que isso mostra? Que a quantidade de armas em circulação no mercado é cada vez menor. E a quantidade de homicídios vem caindo. Então tem uma relação entre a arma de fogo e homicídio.” E continua: “Estive no Japão em 2007, tenho dados de 2006. Foram 116 homicídios no país, quase todos por arma branca. Porque lá é proibido usar arma. A arma do policial está até enferruja79
da porque ele nunca usa. A organização criminosa lá –que é mais romantismo do que uma organização criminosa– quando muito tem uma pistola. Um projeto como esse tem muita reação conservadora, mas seria um dos caminhos.” Em 2006, em São Paulo, foram 6.057 homicídios. Em 2013, 4.444. Mas a vida da polícia não ficou melhor, pelo contrário. Nunca foi tão difícil ser PM como em 2013. * É numa salinha de móveis novos e escuros, persianas verdes e quatro mesas que, sentado em uma confortável cadeira de escritório preta com encosto alto, Massera tem que lidar com a maior crise da PM. Ao lado do computador, em cima da mesa, jornais do dia. Aqueles que publicam sobre Amarildos desaparecidos, Fábios presos, Fabrícios feridos e Carlos mortos. É maio e logo a Copa começa. A demanda por informações da PM por parte da mídia aumenta –na verdade, já havia aumentado em junho, com as manifestações– e o Centro de Comunicação Social da Polícia Militar do Estado de São Paulo tem muito o que fazer. Na sala adjunta, os subordinados de Massera trabalham no esquema de plantão 24h nos sete dias da semana e têm que responder aos cerca de 50 pedidos diários de jornalistas. São quatro nessa função, dois cuidando da intranet e o primeiro tenente Felipe, braço direito do capitão, formado em jornalismo pela Cásper Líbero em 2010 e formado no Barro Branco em 2003. No comando, com Massera, está o capitão Marques e a capitã Cibele. São, por sua vez, chefiados pelo coronel Lopes, sub-chefe do Centro de Comunicação Social. O centro foi criado para concentrar as demandas de assessoria de imprensa, comunicação externa e interna, enquanto a 5º seção do Estado Maior, que ori80
ginalmente cuidaria dessa parte, mantém as diretrizes de comunicação. O capitão trabalha ali desde 2008. A vista lá fora é sempre mais agradável. A janela no primeiro andar dá para a entrada do Quartel do Comando-Geral, na praça Coronel Fernando Prestes, onde o sol vai encontrando brechas entre as muitas árvores. Um prédio com um lindo vitral na fachada –uma homenagem aos Bandeirantes. Na frente, uma estátua de Tobias de Aguiar, fundador da Força Pública Paulista, futura PM, quando foi presidente da Província de São Paulo, em 1831. O primeiro batalhão do Comando de Policiamento de Choque leva o nome de Tobias Aguiar: Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar, a Rota. Aliás, o batalhão da Rota fica ali quase em frente, num prédio amarelo antigo, do outro lado da avenida Tiradentes, perto da Luz. Mas a melhor parte da vista na sala de Massera é o jardim japonês da entrada do quartel, com muito verde e um laguinho. O prédio do Quartel do Comando-Geral abriga o Comando da Capital e o da Região Metropolitana, além das seções do Estado Maior e um prédio do Copom. O prédio do Copom, aliás, cheira a tinta fresca. O Copom, comando de operações, é que recebe as ligações do 190 e passa informações a todas as viaturas através da comunicação via rádio. Com cerca de 700 policiais atendendo aproximadamente 150 mil ligações por dia em todo o Estado, há um déficit no serviço de mais de 500 policiais que, por sua vez, não podem ser retirados do policiamento de rua para trabalhar no Copom. A solução foi terceirizar as chamadas do 190. Massera diz que não haverá prejuízos já que policiais continuarão supervisionando o trabalho e PMs aposentados serão também empregados na função. 81
São 9h e, por alguma solenidade, o hino nacional ecoa do terceiro andar, onde fica o salão nobre com lustres sofisticados e sofás de couro marrom. É ali a sala do coronel Benedito Roberto Meira, comandante-geral da PM. Mas o primeiro andar de Massera também é privilegiado. Como uma espécie de mezanino, tem a melhor vista do vitral bandeirante. Massera vai sentir falta de tudo isso. O capitão está de mudança. Da próxima semana até o dia 20 de julho, vai para o CPCopa, o Comando de Policiamento da Copa, criado especialmente para o Mundial no Brasil. Vai trocar o uniforme administrativo social da PM, com camisa e sapatos, pelo uniforme de policiamento. Sem perder a oportunidade de fazer propaganda, Massera diz que o plano de comunicação para a Copa está pronto há muito tempo –o Centro de Comunicação Social foi o primeiro órgão a terminar o planejamento. O plano operacional também está definido: serão 4265 policiais, divididos em três batalhões, para cobrir os aeroportos, Fan Fest, hotéis, metrô, pontos turísticos e, claro, o Itaquerão. Esse efetivo foi conseguido recrutando policiais de todo o Estado e também com os alunos da PM. Os 1.190 formandos do curso de soldado não vão nem passar para o policiamento de rua, vão direto da formatura para o CPCopa. O mesmo com 1018 sargentos e 280 oficiais. Por enquanto, Massera ainda está ali, na sala de móveis novos e escuros. Dentro da sala adjunta, quatro TVs ligadas ao mesmo tempo na Globo, Globo News, BBC e Record. Enquanto um PM liga pra Massera pedindo a divulgação de uma operação bem sucedida de assalto a banco, chovem críticas à atuação da polícia. É a crise de imagem mais complexa da PM, diagnostica Massera. E é ele que tem que enxugar esse iceberg. Mais de 70%. Essa é a porcentagem da população brasileira que não confia na polícia. 82
O Índice de Confiança na Justiça Brasileira (ICJBrasil), realizado pela Fundação Getúlio Vargas no primeiro semestre de 2013, mostra que 70,1% da população não confia no trabalho das diversas polícias no Brasil –são 8,6 pontos porcentuais acima do registrado no primeiro semestre de 2012. O mesmo índice mostra que, em São Paulo, apenas 53% concordam que a maioria dos policiais é honesta. Um estudo da Anistia Internacional de maio de 2014 é ainda mais alarmante: 80% dos brasileiros temem sofrer tortura policial. É o maior índice entre os 21 países analisados e quase o dobro da média mundial, de 44%. Segundo o 8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ao menos seis pessoas foram mortas por dia pelas polícias brasileiras em 2013. Mas, assim como matam, também morrem. Em 2012, a taxa de homicídio no Brasil foi de 24,3 por cem mil habitantes, enquanto a de policiais mortos em serviço e fora de serviço foi de 72,1 por cem mil policiais. Dados oficiais de São Paulo mostram que, no primeiro semestre de 2013, foram 115 pessoas mortas por policiais de folga e outras 150 mortas por PMs de serviço. Em janeiro de 2014, foram 76 mortos por policiais de folga ou de serviço –o maior número desde novembro de 2012, quando 79 morreram. Os policiais militares envolvidos nessas ocorrências com mortes são na maioria brancos (79%), já as vítimas são na maioria negras (61%) e jovens (57% tinham menos de 24 anos). A informação é de um estudo da Ufscar que analisou 734 processos com 939 vítimas entre 2009 e 2011. Apenas 1,6% dos policiais foi indiciado, já que na maioria das vezes concluiu-se que não houve crime ou que houve legítima defesa. 83
O número de homicídios com envolvimento de PMs denunciados à Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo no primeiro semestre caiu 29%, de 197 casos em 2012 para 140 em 2013. Queixas envolvendo corrupção passiva também diminuíram: de 62 reclamações para 54. Já as denúncias de excessos cometidos por policiais durante abordagens cresceram 106% no primeiro semestre de 2013 em comparação com o mesmo período do ano passado. Foram 66 reclamações registradas ante 32 em 2012.
1º semestre
1º semestre
de 2012
de 2013
32
66
106%
329
539
64%
32
42
41%
283
343
21%
Prevaricação
73
95
30%
Homicídios
197
140
- 29%
Corrupção passiva
62
54
- 13%
Lesão corporal
16
10
- 38%
Excessos durante abordagem Má qualidade no atendimento Ameaças Infrações disciplinares
Variação
Fonte: Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo
84
A atividade-fim da polícia também não é bem avaliada. Entre os paulistanos, a fonte número um de insatisfação é a segurança, segundo pesquisa do Datafolha de 2014. Um total de 44% está insatisfeito com a “segurança para circular nas ruas da cidade”. Em 2012, com 14,2 mortes a cada cem mil habitantes, a cidade apresentou a quinta maior taxa de homicídio entre 35 grandes cidades do mundo avaliadas pela ONU. Embora as taxas de homicídio estejam em queda, os roubos, de 2005 a 2014, aumentaram 54,2%. Entre os policiais, o panorama não é melhor. Uma pesquisa de 2014 feita com policiais de todo o país revelou que a maioria diz ser a favor da desmilitarização da PM –77,2% disseram não concordar que as polícias militares e os corpos de bombeiros militares sejam subordinados ao Exército, como forças auxiliares. No total, 53,4% discordam que os policiais militares sejam julgados pela Justiça Militar. E para 80,1% deles, há muito rigor em questões internas e pouco rigor em assuntos que afetam a segurança pública. Além disso, um terço pensa em sair da corporação onde trabalha. O estudo foi realizado com 21.101 policiais militares, civis, federais, rodoviários federais, bombeiros e peritos criminais de todos os Estados. Os militares eram maioria: 52,9%. Sobre as dificuldades que enfrentam na rotina de trabalho, mais de 80% deles citou baixos salários, leis penais inadequadas, contingente policial insuficiente, falta de uma política de segurança pública e formação e treinamento insuficientes. Como solução, 27,1% sugerem a criação de uma nova polícia civil e 21,86% querem a unificação entre a polícia civil e militar. Embora os números e as notícias preocupem, a confiança de Massera na instituição não se abala. Afinal, para ele, esse infer85
no astral da PM é o resultado de uma campanha contra a corporação. “Incomoda saber que a polícia não é o que falam dela”, desabafa. Conhecendo os repórteres que cobrem a polícia pelo nome, o capitão distingue os imparciais daqueles que “deixam o ativismo atrapalhar a isenção” ou dos que têm interesses pessoais em alimentar o descrédito na PM. “As críticas aumentaram muito mais agora. Elas se potencializaram com o fenômeno das redes sociais. Hoje é lugar comum falar mal da polícia. Você vai a uma festa e ouve: ‘ah, mas você viu como a polícia abusa da autoridade, como a polícia é violenta?’. A maior dificuldade é lidar com essas críticas. Lidar com essas injustiças. As coisas boas que a polícia faz acabam ficando escondidas. Que policial faz parto em viatura ou que nós temos hoje uma quantidade de salvamentos que polícia nenhuma do mundo tem. A PM de São Paulo mata mais que todas as polícias dos EUA juntas, mas a PM também morre mais do que todas as polícias dos EUA juntas. É uma cidade violenta. E os casos de violência da polícia são tratados como regra quando são exceção.” Massera, como boa parte dos policiais, acredita que o jornalismo escolhe mostrar o lado ruim da PM. “As pessoas só vêem o lado mal da polícia. Dá a sensação de que a polícia só erra. Mesmo quando faz tudo certo, mas uma vírgula sai errada, vão focar nessa vírgula.” O clássico argumento policial de “temos de 15 a 18 mil ocorrências bem sucedidas por dia, só os erros são divulgados” revela uma profunda distorção do conceito de notícia, que é justamente o inusitado, o fora do padrão. A manchete sempre será “homem morde cachorro”, a despeito dos milhares de cachorros que morderam homens naquele mesmo dia. Só é notícia, o que foge da regra. 86
Idem para o caso da polícia. O bom trabalho do efetivo deveria ser a rotina, o ordinário, o normal. Às manchetes cabem os desvios, a irregularidade, aquilo que é extraordinário e ainda com um agravante: a atividade policial é exercida pelo Estado, e é função do jornalismo, principalmente, vigiar e denunciar o mau funcionamento daquilo que é público. Quando um criminoso mata uma pessoa, seus familiares buscam a justiça através do Estado. Agora quando o Estado é que mata, onde podem se abrigar os injustiçados se não no jornalismo? É claro que o resultado é um banho de propaganda ruim pra PM nas páginas dos jornais –e pior: nas redes sociais–, mas a “perseguição” à corporação é igual para qualquer órgão, empresa ou figura de relevância pública e explica a máxima popular de que “jornal só tem notícia ruim”. O fato é que essa bomba agora está nas mãos de Massera: como colocar a opinião pública ao lado da PM, mesmo com um escândalo de violência atrás do outro. “O problema da PM é que a comunicação é deixada de lado culturalmente. A corporação não consegue mostrar seus pontos bons.” A consequência é uma polícia estereotipada com policiais estigmatizados. “Dizer que a polícia é violenta porque é militar, ou seja, é um entulho autoritário, é uma das maiores bobagens que eu já ouvi até hoje. Eu conheço o pensamento de quem defende isso, mas eu conheço principalmente a PM. Estudo modelos de policia no mundo há mais de 20 anos. Já visitei países para conhecer a polícia. Esse discurso é que está ligado ao ranço da ditadura. Procurar eleger um inimigo para unir as pessoas. Porque esses movimentos não são unidos.” Massera inverte o raciocínio, então, para dizer que os movimentos sociais é que demonizam a PM para, em torno disso, 87
ganharem adeptos. “O Movimento Passe Livre, muito embora a causa seja extremamente justa, como eles conseguiram adesão maciça da população? Provocando a polícia. O movimento em si era fraco. Provocaram a polícia e conseguiram uma reação desproporcional. No meu entendimento, houve excessos por parte da PM, mas era exatamente o que eles queriam.” Massera admite que o fatídico 13 de junho de 2013 foi especialmente violento. Dois dias antes, acontecera o Terceiro Ato do MPL contra o aumento do preço da passagem no centro e na Paulista. “Contra tarifa, manifestantes vandalizam centro e Paulista”, era a capa da Folha de São Paulo descrevendo o ato. “Foram mais de 80 feridos, os dois lados erraram. Ninguém tinha ouvido falar de black bock até então. Nunca antes tinha tido uma manifestação violenta como aquela. Mas os jornais haviam cobrado mais ação da polícia.” Os editoriais de Folha de São Paulo e Estado de São Paulo que se seguiram ao terceiro ato chegavam a ser radicais. Em “Retomar a Paulista”, escreveu a Folha: “Oito policiais militares e um número desconhecido de manifestantes feridos, 87 ônibus danificados, R$ 100 mil de prejuízos em estações de metrô e milhões de paulistanos reféns do trânsito. Eis o saldo do terceiro protesto do Movimento Passe Livre (MPL), que se vangloria de parar São Paulo –e chega perto demais de consegui-lo. Sua reivindicação de reverter o aumento da tarifa de ônibus e metrô de R$ 3 para R$ 3,20 –abaixo da inflação, é útil assinalar– não passa de pretexto, e dos mais vis. São jovens predispostos à violência por uma ideologia pseudorrevolucionária, que buscam tirar proveito da compreensível irritação geral com o preço pago para viajar em ônibus e trens superlotados. 88
[...] É hora de pôr um ponto final nisso. Prefeitura e Polícia Militar precisam fazer valer as restrições já existentes para protestos na avenida Paulista, em cujas imediações estão sete grandes hospitais. [...] No que toca ao vandalismo, só há um meio de combatê-lo: a força da lei. Cumpre investigar, identificar e processar os responsáveis. Como em toda forma de criminalidade, aqui também a impunidade é o maior incentivo à reincidência.” No Estado, o texto era “Chegou a hora do basta”: “No terceiro dia de protesto contra o aumento da tarifa dos transportes coletivos, os baderneiros que o promovem ultrapassaram, ontem, todos os limites e, daqui para a frente, ou as autoridades determinam que a polícia aja com maior rigor do que vem fazendo ou a capital paulista ficará entregue à desordem, o que é inaceitável. [...] A PM agiu com moderação, ao contrário do que disseram os manifestantes, que a acusaram de truculência para justificar os seus atos de vandalismo. Num episódio em que isso ficou bem claro, um PM que se afastou dos companheiros, nas proximidades da Praça da Sé, quase foi linchado por manifestantes que tentava conter. Chegou a sacar a arma para se defender, mas felizmente não atirou. [...] A atitude excessivamente moderada do governador já cansava a população. Não importa se ele estava convencido de que a moderação era a atitude mais adequada, ou se, por cálculo político, evitou parecer truculento. O fato é que a população quer o fim da baderna –e isso depende do rigor das autoridades.” 89
E foi aí que a PM mordeu a isca. No dia 13, respondeu de forma troglodita, fazendo com que os próximos atos do MPL fossem apoiados por milhões nas ruas no país inteiro e, principalmente, tendo essa mesma mídia apontando o dedo para a excessiva violência, em especial depois que uma repórter da Folha levou um tiro de borracha no olho. Massera acredita ter conseguido reverter um pouco a situação desfavorável para a PM com a estratégia de comunicação sobre a chamada tropa do braço –um grupo de PMs especializado em artes marciais, que não porta arma de fogo e que passou a agir nas manifestações para tentar controlar os distúrbios sem violência. A tropa do braço surgiu antes da mídia do que na rua, o que de fato acalmou os ânimos, mas, quando finalmente apareceu atuando, no Segundo Grande Ato contra a Copa, em 22 de fevereiro, acabou jogando lenha na fogueira. Foram cerca de mil manifestantes, e o número de policiais era equivalente ou maior. A PM tentou fagocitar os black bloks, isolando-os dentro de um cordão de policiais que formava um círculo. Ainda assim, a manifestação acabou novamente em pancadaria indiscriminada pelas ruas do centro –foram 262 presos. Muitos jornalistas foram vítimas da violência e a ação foi largamente criticada. “O MPL e os black blocks não são distintos”, diz Massera. “Os black blocks são a tropa de choque do MPL. Eles sabiam muito bem a estratégia. Sempre foi estratégia provocar a polícia para que aja de forma violenta e, consequentemente, unir o grupo. Que foi o que aconteceu.” Para Massera, junho de 2013 foi apenas a repetição de um outro caso, vivido em 2011, mas agora num nível nacional. Massera viu a história se repetir –não por farsa, mas por tragédia. 90
Em 2011, no ano em que a PM entrou no campus da USP, prendeu usuários de maconha, causou um levante estudantil, organizou uma reintegração de posse homérica com 73 presos – políticos, dizem os estudantes– e, assim, tudo o que conseguiu foi fazer um movimento antes sem respaldo interno se tornar uma greve estudantil massiva que durou até o ano seguinte, Massera dividia a sala de aula com aqueles que gritavam “Fora PM” nas horas vagas. Mas o capitão não acha que a operação tenha sido violenta e que muito menos que tenha legitimado os invasores da Reitoria. Justo o contrário. “A operação [de reintegração de posse da Reitoria] foi bem conduzida. Havia muito mais PMs que invasores. Sabíamos que haveria um ambiente contra a PM, mas, quando há força policial em excesso, não há chance de reação. Porque se houvesse reação, teria agressão e contra-reação. Quanto menos PMS, maior a chance de confronto. E não houve uso de violência. A grande lamentação daquelas pessoas foi essa. Deslegitimou o discurso deles. Houve a menina que gritou que nem louca, mas ninguém encostou nela. Ela se debateu. Foi mentira dela. O relato dela no Jornal do Campus é igual a tortura do Vladimir Herzog, não tiveram nem originalidade. Na verdade, tivemos 99% de acerto porque teve um PM que cometeu um erro e jogou uma bomba de gás no Crusp. Ele foi punido.” Foi nesse ninho de cobras, por assim dizer, que o capitão buscou uma especialização que o ajudasse no seu trabalho de análise social e criminal para a cidade de São Paulo. Do curso de Ciências Sociais da USP, ele diz, absorveu muitas coisas, mas descartou outras tantas. “Essa concepção de extrema esquerda na USP não é a maioria, nem na própria FFLCH. É uma minoria barulhenta que se impõe. Um discurso forte e anacrônico.” Com toda a situ91
ação de tensão no campus naquela época, porém, o capitão não teve nenhum episódio problemático. Conta que começou a ser mais ouvido, as pessoas queriam saber a opinião de um policial. Os alunos sempre o respeitaram. Em maio, logo após a morte de Felipe Ramos de Paiva, aluno da Faculdade de Economia e Administração, Massera disse que houve um clamor popular pela presença da PM e que a violência diminuiu na USP. Para responder a uma reportagem feita pelo Jornal da Tarde “com números distorcidos de violência divulgados pelo Sintusp”, a PM divulgou seu próprio levantamento. A estatística considera os 80 dias anteriores à morte de Felipe e os 80 dias posteriores, descontando julho por ser mês de férias, e foi feita através de Boletins de Ocorrência que têm a USP como local do crime. Entre um período e outro, o furto de veículos caiu de 20 para dois e o roubo de veículos caiu de 13 para um. Roubos em geral passaram de 18 para seis, lesão corporal de nove para dois e sequestro relâmpago de oito para um. Segundo dados da USP, porém, a presença da PM na Cidade Universitária não impediu o aumento de roubos entre 2012 e 2014. Massera admite que a polícia não manteve ao longo de todo esse tempo o mesmo número de policiais que circulavam no campus nos primeiros meses após a morte de Felipe. Em relação a 2012, os casos de roubo deste ano aumentaram em 55%. Foram 41 casos em 2011, 60 em 2012, 72 em 2013 e 93 até setembro de 2014. O convênio com a PM assinado pelo reitor João Grandino Rodas em 2011, que estabeleceu os trâmites para a entrada da polícia no campus, vence em 2015. Do episódio da USP aos protestos de junho, pouco mudou. Novamente, a polícia caía na velha estratégia apontada por Massera de ser o inimigo comum que alavanca um movimento sem 92
respaldo. Mas, se é tão velha essa estratégia, por que sempre funciona? “Não é que a polícia cai, a polícia não tem alternativa. A polícia é o ultimo dos remédios, apesar que muitos políticos vêem como único. Mas é um remédio que sempre traz efeito colateral. Quando você aplica a polícia numa manifestação em que o objetivo dos manifestantes é buscar o confronto, o confronto vai existir e a polícia não tem como controlar isso se não usar da força, da violência teoricamente legítima.” Se a corporação não tem alternativa, os policiais muito menos. “Agora o policial é um ser humano. É difícil dosar a violência quando você precisa empregar a tropa. Porque imagine só, o policial está ali intacto esperando ordem pra agir ou não. Vai sendo provocado. ‘Você é um coxinha, sua mulher é uma vagabunda, você é um analfabeto’. E ficam lá provocando. E o policial engolindo aquilo. A hora que vem a ordem de agir, uma minoria se exalta, mas eu não preciso de mais que dois ou três policiais exaltados para provocar aquilo que eles querem. Infelizmente, é isso.” Massera diz que por excesso de força ou por omissão, a PM sempre será criticada. Especialmente em ocorrências de reintegração de posse e manifestação. Ainda assim, seja por sincera opinião pessoal ou porque faz parte do seu trabalho de propaganda da PM, Massera defende a atuação da polícia no geral naquele histórico mês de junho e também nas manifestações contra a Copa de 2014. No caso da repórter da Folha, Giuliana Vallone, atingida no olho, Massera espera o resultado das investigações, mas acredita na versão, diferente daquela narrada pela jornalista, de que o policial atirou para o chão e a bala ricocheteou. No caso do estoquista, Fabrício Proteus Chaves, baleado por um policial em uma manifestação em janeiro, Massera é bem menos tolerante. 93
“No caso daquele rapaz... Vou usar o termo correto: aquele bandido que foi baleado naquela manifestação dos black blocks, o Fabrício, cabeludo, black block, que estava com um estilete. Quem faz o treinamento de tiro entende por que o policial atirou. Uma pessoa com arma cortante, principalmente se a pessoa tem habilidade para isso, que era o caso dele, estoquista, ela precisa de poucos segundos pra cortar a jugular de alguém. O policial caído, ele indo pra cima com instrumento cortante, não tinha outra alternativa que não arma de fogo. Mas, no momento que a polícia usa arma de fogo para o policial não morrer, Fabricio passou a ser um menino, manifestante, jovem.” Com base na instrução de ação da Polícia Militar, o capitão justifica o tiro. “A lei diz: você vai usar os recursos disponíveis de maneira proporcional. Cessada a agressão, cessa a reação. A morte pode ocorrer, mas não é o desejado. Naquele momento, com o manifestante muito perto, o único recurso disponível era a arma de fogo. Não tinha como reagir como uma tonfa. Então, é possível sim você usar arma de fogo contra alguém que venha com uma faca. Se o policial estivesse em pé, podia recuar, mas ele estava caído. Era questão de segundos para ser cortado. A orientação, segundo o método Giraldi, é dar dois tiros. Se a pessoa parar, você para. Se a pessoa continuar, mais dois tiros.” Massera explica ainda que é impossível exigir que o policial atire em locais do corpo específicos, como no braço ou na perna. Com uma pistola ponto 40 e a uma distância de quatro metros, já não é possível acertar onde se quer. “O policial é condicionado a atirar onde tem mais massa, que é no tronco. Não é na cabeça, é no tórax. Tanto que os dois tiros atingiram o tórax de Fabrício. Qual é o objetivo do tiro policial: cessar a agressão. E os policiais foram perfeitos nisso. Deram dois tiros, o 94
cara parou e foi socorrido depois. Se não houvesse o vídeo [que mostra o policial caído], os policiais já estariam presos. Mas eles agiram sim de acordo com o protocolo.” Enquanto chefe da assessoria de imprensa da PM, Massera repete o mantra: “A PM não tolera o mínimo de erro. Quem errou, vai pagar pelo erro. A PM trata o policial que erra com mais rigor do que o criminoso. Bandido usando farda precisa ser punido com rigor: é cadeia.” Mas, de novo, o capitão nem esquerda nem direita também pende para o outro lado e admite: sim, há violência policial. Sem deixar, é claro, de relativizar: “temos que levar em consideração que o jornalista só mostra o que quer, aquilo que vai vender. O que derruba a pauta, ele vai esconder. Temos que ver até que ponto a denúncia é real.” Se a violência da polícia não vem do resquício autoritário da ditadura, Massera prega que a violência tampouco se cria na PM. O caráter não pacífico do policial já existe nele desde antes, a PM, porém, potencializa esse perfil agressor ao entregar uma arma na mão dele. “Muita gente diz que o policial vem da sociedade, a sociedade é violenta e, por isso, a violência na policia é uma reprodução da construção social. Que tem muita gente na sociedade que tem essa visão de que bandido bom é bandido morto é fato, que acha que tem que ter violência contra bandido também é fato. Vimos o episódio da Sheherazade. O policial que pensa assim vem mesmo dessa sociedade que também pensa assim. Mas a polícia não é só uma reprodução da configuração social. É uma reprodução da configuração social potencializada. Quem quer ser policial? É a pessoa que já associa a PM a esses valores e a procura porque tem esses valores já incutidos. Geralmente, uma pessoa que tem uma postura mais à es95
querda não quer a carreira policial. Quem quer a carreira policial é mais conservador, mais à direita.” E aí entra um trabalho essencial da polícia que, quando não é feito, sobra para Massera, que tem que enxugar o iceberg. A PM deve, na formação daquele policial, neutralizar sua veia agressiva. “O treinamento do PM em São Paulo é o mais longo em todo o Brasil. O policial não sai pra rua com uma arma com menos de 13 meses de instrução. Para soldado, são dois anos de curso, sendo um de estágio. É muita teoria pra tentar corrigir a carga que ele trouxe da sociedade. A função da PM, ao contrario do que muita gente pensa, é tentar depurar essa pessoa que veio da sociedade com uma carga violenta. Esse trabalho não consegue êxito 100% e muitos policiais acabam adotando a postura de fazer justiça com as próprias mãos.” Ainda assim, Massera aponta que o número de policiais que optam por agir dessa maneira caiu vertiginosamente. Na década de 1980, cerca de 1.500 pessoas morriam na mão da polícia todo ano. Segundo a Secretaria de Segurança Pública, nos dois primeiros trimestres de 2014, houve 317 ocorrências de resistência seguida de morte, ou seja, aquelas nas quais houve reação contra a PM e o suspeito foi morto. Cabe à PM investigar quais dessas mortes foram legítimas e quais são resultado da ação dos justiceiros fardados. O capitão diz que a PM intensificou o controle interno a ponto de os policiais se darem conta de que não vale a pena matar. Ele diz que a justiça militar é mais rigorosa e, para os policiais que ainda costumam vingar morte de PM matando outros dez bandidos, existe o Romão Gomes, hoje com uma população carcerária de 187 policiais. “Todas as mortes provocadas pela PM são legitimas? Eu diria que não. Eu reconheço que não. Com base em parâmetros internacionais, quase metade das mortes eu acredito que poderiam 96
ser evitadas. É aquela situação em que está só o bandido e o policial, o ladrão reage, mas o policial tem a opção de pegá-lo vivo ou morto e escolhe pegar morto, porque não tem nenhuma testemunha e nenhum juiz do mundo vai condenar isso.” Como sempre, voltamos à sala de aula, único lugar onde o crime praticado pelo Estado pode e deve ser combatido. “Pode assistir qualquer aula”, garante o capitão. “Em nenhum momento se pregam esses valores, pelo contrário. Todas as instruções ensinam a usar recursos menos letais. A carga de direitos humanos direta é pequena, mas em todas as matérias tem direitos humanos. Se você assistir uma aula, vai ver que não é essa polícia que a imprensa prega.” Massera também dá aula na polícia, sabendo que se não for eficiente ali, terá que ser depois para explicar à mídia o inexplicável. Sua tática, ao falar com seus alunos, parece bastante convincente. — Quando você executa um ladrão, você está fazendo trabalho do PM (patrulhando e identificando o criminoso), da Policía Civil (fazendo um inquérito relâmpago), do promotor (acusando), do juiz (julgando e condenando), do carrasco (executando uma pena que nem existe no país), e, em última instância, fazendo o papel de Deus, decidindo entre a vida e a morte das pessoas. Tirando o carrasco que não existe, qual é o menor salário nessa linha toda? É o seu. Então, ao fazer justiça com as próprias mãos, você está sendo bom pra sociedade ou está sendo um otário, usado por ela? Quem assume o risco é você. Mesmo que fosse correto, quem assume o risco é você. Se a sociedade quisesse que você resolvesse o problema, existiria uma lei: cabe ao PM, prender, julgar e executar. Se não é isso que a sociedade quer, você tem que fazer seu papel. * Nos tempos de policiamento, Massera teve que por em prática o que prega. Nada fácil. O capitão já precisou usar a arma em 97
algumas situações, mas nunca teve uma ocorrência com morte. Em pelo menos três ocorrências, atirou contra o suspeito. Em duas, acertou, mas provocou apenas ferimentos sem gravidade. “Uma vez perseguindo um bandido, que já tinha atirado contra mim três vezes, acabou a munição dele. Ele jogou a arma, ajoelhou e pôs a mão na cabeça. Não tinha testemunha, não tinha nada. Se eu tivesse atirado nele ninguém iria me condenar porque ninguém ia saber a realidade. Eu algemei o ladrão e prendi.” Massera, mesmo com toda a experiência, diz que esse tipo de ocorrência abala o psicológico. “Eu já tenho uma tendência a tremer, depois de uma ocorrência como essa, minhas pernas começaram a tremer, demorei mais de 15 minutos pra voltar à calma.” Mesmo que o policial envolvido não apresente nenhum transtorno evidente, ele defende o afastamento da atividade policial depois de ocorrências violentas. Como não é todo dia que tem ocorrência de tiroteio, são poucos policiais que são afastados para receber apoio psicológico, o que não afeta o efetivo da tropa e nem o policiamento. Enquanto a PM exalta essa medida de afastamento, muitos policiais detestam ser retirados da rua, principalmente porque têm a rotina alterada, prejudicando os bicos. O capitão diz que não sente raiva dos bandidos e ensina os alunos a controlar esse sentimento. A raiva atrapalha o raciocínio. “Por mais que seja difícil, você está vendo alguém atirar num pai de família, um estuprador –nossa! não existe nada mais terrível do que isso–, na hora você tem que ser profissional.” Em certa ocorrência, Massera prendeu um suspeito com uma mulher sequestrada no porta-malas. Ao levá-lo para a delegacia, ouviu dele algo inesperado: — Tenente, gostei da sua postura. 98
Massera achou estranho. Percebeu que se o bandido falara aquilo, é porque algo andava errado na polícia. — Que postura você gostou? — Você me prendeu, me tratou dignamente, me conduziu pra delegacia, não me esculachou, você fez seu papel de policial e eu tiro o chapéu pra isso. Eu faço meu papel de bandido e você de policial. Eu tento, hoje eu me dei mal, mas você agiu de maneira nobre. Uma das ocorrências que mais marcou o capitão foi um assassinato que aconteceu bem na sua frente. De madrugada, Massera fizera um bom flagrante. “Seis motos estavam praticando crimes em Moema. Eles roubaram um grupo de rapazes num barzinho. As vítimas ligaram pro 190 e eu estava com uma operação na avenida Indianópolis. Eu tinha viaturas em todas as saídas. E consegui fazer o cerco. Das seis motos, eu peguei quatro. Seis ladrões. Foi demorado, cheguei às 3h na delegacia e sai às 17h. O estresse da atividade burocrática é terrível.” Voltando para entregar a viatura no quartel, já que seu turno já havia acabado desde às 8h, Massera viu uma pessoa atirando em outra. O capitão conseguiu prender o atirador e, enquanto outra viatura o levava para a delegacia, Massera foi socorrer a vítima, que perdeu massa encefálica e acabou morrendo antes de chegar ao hospital. “Me arrepio porque esse caso foi terrível. Quando eu voltei, o filho dele estava esperando por notícias. Terrível. Acabei tendo que dar a notícia da morte do pai e ver o desespero daquele menino. Devia ser um rapaz de uns 20 anos. Saiu chutando, quase quebrou uma placa de trânsito. Acho que a pior coisa da vida é dar uma notícia como essa.” 99
“Essa ocorrência já está fazendo 18 anos e eu lembro dela até hoje. Lidar com a frustração é terrível. E eu me considero relativamente equilibrado, mas e o policial que tem dificuldades financeiras, problema com a família, uma profissão não reconhecida, estressante, tem que fazer bico, como ele lida com essas situações? Qual é a capacidade de resiliência desse policial? Se uma situação como essa me marcou a vida inteira, imagina uma pessoa que não tem a mesma estrutura que eu pra suportar isso? Muitos sociólogos, jornalistas, filósofos, colocam o criminoso como uma vítima da sociedade. E o policial que comete esses abusos também não seria uma vítima da sociedade? Conviver com a violência durante todo o tempo numa carreira extremamente difícil não torna o policial mais violento? Das duas uma: ou a violência é banal pra ela ou a pessoa acaba se tornando violenta também”, diz Massera em tom de desabafo. Massera já ficou entre a vida e a morte várias vezes. Já teve medo de morrer. Se lembra de uma negociação durante um sequestro. O sequestrador com a arma apontada para a cabeça do refém. Massera e um delegado negociando. O delegado, na certeza de que o sequestrador iria se entregar, colocou a mão no ombro dele. O sequestrador levantou a arma para atirar, Massera segurou o tambor e começou a lutar com ele. “Se eu perco ali, ele me dá um tiro. Quando termina, você pensa: não sei se deveria ter feito isso, mas pelo menos eu salvei uma pessoa e deu certo. Será que a próxima vai dar certo?” * Se um dia Massera contou ao pai que queria seguir sua carreira militar, agora ouve a mesma coisa do filho de 17 anos. Se for mesmo essa a vontade dele, o pai o apoiará, mas preferia que o filho fosse médico ou engenheiro. No caso de ser mesmo policial, o 100
jeito é torcer para terminar bem os 30 anos de carreira. Os dois já conversaram bastante sobre o assunto, afinal, o capitão conhece os dois lados dessa moeda. “É uma carreira gratificante, você não se realiza em outra, mas tem duas coisas que ponderar: o risco elevado e o reconhecimento social. Você vai ser frustrado e submetido a um grande risco.” Até agora na carreira, a recente cirurgia de hérnia de disco na coluna por causa de ficar sentado muito tempo na frente do computador foi a única sequela de Massera. Mas ele pensa no pior: “a morte é algo muito próximo.” Separado, seu filho é o único que ainda depende dele. O capitão já o deixou totalmente amparado por via das dúvidas. “Mas o trauma de perder um pai não é fácil. Eu não quero isso pra ele não. Quero morrer velhinho”, diz dando risada. Depois da separação, Massera se define como um solteirão convicto. Sem dúvidas, parece muito feliz com a condição. Aos 42 anos, vive livre e leva sua rotina de maneira prazerosa. O capitão gosta de correr, ir ao cinema (chega a assistir duas ou três sessões no mesmo dia) e sair para jantar ou curtir um bar. No sábado, é quando pode colocar a vida em ordem: leva a roupa na lavanderia, lava o carro, caminha, almoça na padaria, arruma a casa e sai, geralmente, para ir ao cinema. Massera nasceu e foi criado em São Paulo. Como o pai era PM e policiais nunca receberam bem, o capitão diz não ter tido uma infância muito fácil. Não passou fome, mas não tinha luxos e se lembra bem dos três ou quatro brinquedos que teve. Nascido no Ipiranga, foi criado em São Mateus, onde morava com os pais e a irmã três anos mais velha em condições precárias de moradia e saneamento. “Dos meus colegas de infância, dois ou três entraram na polícia, uns 20% foram presos e o resto morreu. Essa é a 101
realidade da periferia.” Seu Jair morreu em 2001, um ano antes da mulher. Naquele mesmo ano, Massera foi morar sozinho. Pouco antes de entrar no Barro Branco, Massera ficou noivo. O noivado durou até dois anos depois do fim do curso de oficial, acabando em 1996. Duas semanas depois da separação, a noiva disse que estava grávida. “Não vou voltar atrás na minha decisão: assumo meu filho, mas a minha decisão é irrevogável.” Assim sendo, o capitão se casou com outra mulher, com quem se relacionou de 1996 a 2009. “O problema não são as mulheres, sou eu”, ele brinca. O oficialato deu a Massera a possibilidade de ascensão social. Seu filho, por exemplo pôde estudar em escola particular e agora faz cursinho para entrar no Barro Branco. O capitão acumula sua função no Centro de Comunicação com a de professor no Barro Branco e na Escola de Sargentos, embora já tenha dado aula em faculdade e cursinho. Seu salário varia de acordo com as aulas, mas geralmente recebe R$ 19 mil brutos e R$ 12 a 13 mil líquidos. “A perspectiva que a vida me dava aos 15 anos não era tão boa quanto a realidade de aonde eu consegui chegar hoje, graças ao sacrifício do meu pai e ao meu esforço também. Eu sou exatamente aquilo que eu queria ser em termos de realização pessoal. Eu tenho a possibilidade de ajudar pessoas, mesmo em uma atividade administrativa.” Em 1990, quando entrou na PM, ser policial era um orgulho, um status, conta Massera. Em 2014, todo mundo esconde a identificação militar –seja por medo da violência contra PM, seja pela “campanha” contra a PM na mídia e na área acadêmica. A sociedade não os reconhece mais. Para ir à padaria naquela manhã, Massera deixou a identificação em casa. Por questões de segurança, claro. Garoto pro102
paganda da instituição, nunca terá vergonha da sua profissão. Justo o contrário. “Eu continuo tendo orgulho. São poucas as categorias que tem oportunidade de ajudar pessoas como a polícia tem. Pra mim, a farda é um símbolo daquilo que lutei a vida toda: a justiça e o serviço à população.”
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Estereótipo Se eu não matar, eu que vou morrer. Rubens, ex-soldado da Rota
— Mas o que você acha daquela Sheherazade do SBT? –pergunta direto ao ponto, depois de ter lançado sem pudor toda sua condenável filosofia de vida. Cala-se à espera de uma resposta. A ausência da voz forte e grave cria um silêncio constrangedor. Ele se rende: — Eu acho que ela fala a verdade. Rubens é desses para quem direitos humanos deveriam valer só para humanos direitos. Ele materializa os estereótipos 105
do policial militar –da defesa de morte aos bandidos à cara de mau. O incrível é que, em vez de ser escolhido o “funcionário do mês”, acabou expulso da corporação. Ainda assim, brada sua intolerância aos que chama de “vagabundos”. Mas é preciso dar um desconto ao ex-soldado. Deve ser mais difícil ver criminosos com bons olhos quando um deles atira em você pelas costas. Ele tinha 23 anos. Foram cinco dias na UTI do HC, vinte e oito dias no quarto andar e um mês e meio no Hospital Militar. Baleado em agosto, ele voltou para a rua em fevereiro. “Eu tinha que voltar pra provar que não ficou nenhuma sequela”, diz. O ex-soldado tem boa memória. Volta como se fosse ontem ao 30 de agosto de 1982, época em que a polícia não tinha colete a prova de bala e usava três oitão. “A gente estava na zona norte. O Copom irradiou uma ocorrência do outro lado da norte. Era uma segunda-feira fria. Nunca vou esquecer.” Com quatro policiais, a viatura fazia o caminho da Cachoeirinha para o Jardim Brasil. Em uma travessa de chão batido de uma avenida, viram um carro suspeito com a lanterna acesa. Quando a viatura voltou, o carro já estava com as portas abertas e os passageiros corriam. “Eu, como era moleque novo, corria, saí que nem um doido na frente.” Perto das 23h, a rua era bem escura. Rubens não viu que “um dos elementos” tinha se escondido. Quando o policial passou correndo, ele atirou. “Pegou nas costas, aí eu rodei. Fui trocando tiro com ele. Ele atirando, eu atirando. Eu saí baleado, ele saiu baleado. Aí eu não lembro mais nada. Me socorreram no pronto-socorro da Cachoeirinha”, Rubens conta. “Eu senti na hora que eu tava morrendo. Você escuta as coisas muito longe, sabe? É muito rápido, é muito rápido. ‘Eu vou morrer’. Aí você fica fraco.” 106
Rubens entrou na Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), o 1º batalhão da tropa de choque da PM, aos 21 anos. Fez o curso de soldado da Polícia Militar aos 20 –na época, eram seis meses de curso e três meses de estágio. Rubens começou na 1º companhia da Rota, que era vespertina até que o primeiro-tenente Conte Lopes foi promovido a capitão e assumiu a companhia. Lopes fazia questão que sua companhia fosse noturna, e Rubens foi trabalhar durante a noite. Conte Lopes, ex-capitão da Rota, foi, portanto, um dos seus mentores. Lopes seguiu a carreira política, tendo sido deputado estadual em São Paulo de 1986 a 2010. Em 2012, foi eleito vereador da capital e, ao lado do ex-tenente-coronel da Rota Paulo Telhada (PSDB) e do ex-comandante-geral da PM Álvaro Camilo (PSD), compõe a chamada “bancada da bala”. Entre seus projetos de lei, está a proposta de proibir utilização de vias públicas para realização de bailes funk, por exemplo. Lopes é conhecido por ser um dos policiais mais matadores de São Paulo, com ao menos 40 mortes assumidas na carreira. Enquanto ele alega nunca ter matado inocentes, o livro Rota 66, de Caco Barcellos, lançado em 1992 e que investiga assassinatos cometidos pela Rota, mostra o contrário. Em 2014, Lopes foi candidato a deputado federal pelo PTB, mas não se elegeu. Ao contrário do chefe, porém, Rubens não quer saber de política. “Eu odeio político. Odeio política, odeio o PT. Não me desce. Muita roubalheira que a gente fica sabendo, muita coisa errada. A polícia tinha que ser totalmente independente de política, de governo, tinha que ser uma coisa separada. Durante quatro anos um governo fala ‘ó, quero a polícia verde’. Aí muda, vem outro cara lá: ‘ó, eu quero a polícia branca’. Você dança conforme a música. Não é assim que funciona a coisa. É polícia ou ladrão, é certo ou errado.” 107
A revolta é por causa das decisões políticas que interferem no funcionamento da polícia. “Entra um governador corrupto lá, safado e aí? Tira os caras bons. Na época que eu estava na Rota, tiraram o Capitão Conte que era um cara de frente, um comandante de frente. Jogaram ele para... acho que foi pro [batalhão] 19, na zona leste, depois jogaram ele pro Hospital Militar. Aí tiraram um capitão do hospital, que nunca trabalhou na rua, pra comandar uma companhia de Rota. O cara não tem noção nenhuma, tudo política.” “Na época que o Montoro ganhou a eleição pra governador [1983], ele queria acabar com a Rota e com o Dops (Departamento de Ordem Política e Social). Só que fizeram uma pesquisa antes com a população e 85% era favorável à Rota. O Dops ele acabou, mas com a Rota não podia. O que ele fez? Se eu não posso acabar com a Rota, então vou tirar os caras bons de lá. Tira o Capitão Conte, tira o Capitão Cora, tira o Tenente Salgado, que são linhas de frente e que estão junto da tropa. Aí coloca uns caras que são zero à esquerda, que trabalharam atrás de uma escrivaninha, que nunca trocaram tiro com vagabundo, que nunca foram pra rua”, desabafa Rubens. “A política é essa, eu não gosto de política, acho que tudo é errado.” Talvez, justamente por ter entrado na Rota quando essa “limpeza” estava em curso, Rubens não tenha testemunhado a ação dos esquadrões da morte enquanto soldado. Ele jura que na sua época eles já não existiam, embora muita gente falasse que sim. O primeiro esquadrão da morte foi formado no fim dos anos 1960 e era comandado pelo delegado e chefe do Dops, Sérgio Paranhos Fleury, de forma que as mesmas técnicas violentas usadas pela ditadura foram aplicadas também aos criminosos comuns. 108
Rubens, aliás, prefere a ditadura. “Não é essa pouca vergonha que é hoje em dia. O cara rouba, você sabe que ele roubou e você não consegue pôr ele na cadeia por causa da lei.” “Que democracia é essa? Democracia na cabeça desses caras é sinônimo de baderna. Eu não entendo essa democracia, não entendo. Democracia que nego rouba, esse Mensalão... Os caras roubaram pra caramba. Democracia e os caras ficam na cadeia na maior mordomia.” Ele explica, porém, que a polícia não tem nada a ver com a ditadura, como as pessoas pensam. “Pensam isso por causa da farda militar, mas não tem nada a ver. [A polícia] está na mão da Dilma, na mão do Lula. O Lula é liso, ninguém pega esse cara. Pra mim, ele é um tremendo de um safado. Não vale nem a água que bebe.” O ex-soldado diz que a preferência pela ditadura é estritamente pessoal e que ele nem gosta do militarismo, por exemplo. “Eu era consciente que tinha que andar com a farda passada, minha bota tinha que estar engraxada. Mas moleque [oficial] chega lá na Rota, você que tem 20 anos de polícia tem que falar pra ele ‘sim, pois não, seu tenente’ e chamar de senhor.” Voltando aos esquadrões, Rubens garante que já não existiam na década de 1980. “Na minha época já não tinha mais. Na época do meu pai tinha. Eu era moleque, meu pai falava. E lá onde eu morava de vez em quando aparecia cara morto. Dizia meu pai que deixavam os caras lá mortos, matavam e jogavam lá. Eu era moleque, bem moleque.” Do pai, ex-policial rodoviário, Rubens herdou o gosto pela polícia e por moto. Tendo sido expulso da primeira, hoje se dedica à segunda. Ele transporta motos, estudou em escola pública, está no terceiro casamento, tem um filho de 27 anos e, pela primeira vez na vida, mora em uma casa própria: um apartamento no Piqueri. 109
Rubens não tem curso superior. Tinha planos de fazer Educação Física depois que saiu da polícia, já que havia sido efetivado na parte administrativa do cursinho Objetivo, onde trabalhava antes como segurança, e então podia fazer cursinho sem pagar. Mas acabou sendo chamado para trabalhar no Banco Digibanco, da Sharp, onde foi promovido a chefe de contas correntes. Estava satisfeito com o emprego, mas a Sharp faliu. Quando o banco foi comprado pelo Banco Pontual, ainda foi trabalhar na gráfica da Sharp, que fazia os manuais dos produtos eletrodomésticos. “Aí, infelizmente, o seu Matias faleceu num acidente de helicóptero em Atlanta em 1994. Em 2000, a Sharp pediu concordata.” Rubens abriu então uma lanchonete, depois um estacionamento, voltou a trabalhar como segurança –para o presidente da Sony e para a dona do shopping Eldorado–, até chegar ao negócio das motos. Mesmo como segurança, teve pelo menos uma ocorrência memorável. Enquanto a dona Maria Helena, proprietária do Eldorado, fazia compras com os filhos em algum “shopping chique”, os seguranças do estabelecimento pediram ajuda pra dois dos seis seguranças que a acompanhavam. Homens haviam sequestrado um rapaz e usavam seu cartão de crédito no shopping. Rubens e Moacir prenderam os sequestradores na saída do local e os entregaram nas mãos da polícia antissequestro. A melhor parte: Maria Helena nem ficou sabendo. “Eu não sei o que é tirar 30 dias de férias acho que desde que entrei na polícia. Nunca tirei férias 30 dias. As vezes que tirei férias na polícia foi pra fazer bico. Descansar 30 dias? Não sei o que é isso. Não me lembro.” A rotina de Rubens quando trabalhava na Rota era pesada. Pegava serviço como segurança no cursinho Objetivo na Teodoro Sampaio às 9h e saía entre 13h e 14h. De lá, ia para o quartel da 110
Rota, um prédio antigo e amarelo na avenida Tiradentes. Almoçava, descansava, fazia educação física às 16h. O expediente começava às 18h. Ouvia as instruções e ia pra rua uma hora depois. Sem ocorrências graves, estaria de volta no quartel às 3h e em casa às 4h –morava em Santana na época. Trabalhava na Rota uma noite sim, uma não. No dia seguinte, levantava às 8h para ir para o Objetivo. Depois, até às 22h, era segurança na Companhia Atlética do Brooklin. O terceiro bico era no restaurante Bistecão na avenida São João, onde ficava até fechar. Hoje, fora da PM, Rubens percebe o tamanho do desgaste. “Você entra num sistema que você faz parte e não percebe. Hoje eu vejo que ali no dia-a-dia é estressante.” Os três bicos foram a forma que Rubens encontrou de se sustentar com salário de soldado sem ser corrupto. “Polícia corrupto é pior que ladrão”, diz. Lembrando que, pra ele, ladrão tem que morrer. “Ó, vou te resumir, vagabundo de preferência morto. Não importa a forma que você matou, é vagabundo tem que morrer. Ponto.” Rubens acredita que os professores e os policiais tinham que ser mais valorizados pelo Estado. Ganhar um salário bom para, na folga, “poder curtir a família e os filhos.” O bico tira o tempo da família. “Se você tem um bom salário, se você tem uma folga, se você tem tempo de ficar com a sua família, eu acho que seria bem diferente”, diz. Além disso, Rubens conta que os PMs não tinham apoio para estudar. “Na própria polícia tem oficial que não gosta de ver um praça fazendo faculdade, não é interessante pra ele. Não sei se mudou, mas, na minha época, eu lembro que tinham muitos policiais que estudavam e que tinham seus horários atrapalhados só para que se prejudicassem na faculdade.” 111
Mas, se essa vida de soldado da Rota era ingrata, Rubens ainda estava por descobrir. De um dia para o outro, perdeu tudo. Foi a pior parte de sua vida. Foi preso, a mulher o abandonou, vendeu sua moto e, por infeliz coincidência, o irmão bateu seu carro. Tudo na mesma época. “No fim de semana, quando eu via meu filho, ele segurava na minha blusa e falava ‘quero meu pai, quero meu pai’. Ali acabava o mundo pra mim.” Foi em 1988. Um carro roubado. Cinco suspeitos (ou cinco “vagabundos”). “Foram os cinco para o saco”, mas Rubens também “rodou”. Ele e os colegas foram presos sob suspeita de execução. Enquanto muitos criticam a omissão da imprensa e a impunidade da polícia nesses casos, Rubens vê diferente. Para ele, a “Rede Globo e os Direitos Humanos meteram o pau” e “a polícia manda embora, não ta nem aí.” A Rota patrulhava em Itaquera, quando viu um carro roubado e foi abordá-lo. Os suspeitos saíram em fuga. Houve perseguição. De dentro dos carros, suspeitos e policiais trocavam tiros. Os suspeitos foram baleados e, numa curva de uma rua de terra, capotaram o carro. “Aí socorremos os elementos. Todos morreram. Tinha um menor, deu muita repercussão porque tinha um moleque no meio, 14 anos na época.” Segundo Rubens, os bandidos morreram dos tiros e não do acidente. Os cinco. Houve a acusação de execução. Algo lógico devido às circunstâncias da ocorrência. Algo quase óbvio se tratando de um policial que prega o assassinato contra o crime. Mas Rubens nega ter matado os suspeitos. “Tanto que eu fui absolvido depois.” O policial admite, porém, que atira para matar. “A preferência é que ele morra. Não tenho dó não. Eu saio de casa pra 112
trabalhar, ele sai pra roubar. Atira em quem está na frente dele e não está nem aí.” Como de se esperar, Rubens crê que entrar no crime é uma simples questão de escolha e, pra quem toma essa decisão, não cabe recurso. Com ele, vagabundo não tem vez. “Eu tive chance de fazer coisa errada na minha adolescência e nunca fiz. Eu fui criado numa vila, um monte morreu. Um monte. Pessoal fumava maconha, ladrão, falecia um monte lá. Poderia ter tomado esse rumo, mas meu pai me ensinou. Esse negócio de falta de oportunidade eu acho uma tremenda safadeza. Se você quer trabalhar você arruma emprego. Nem que seja pra varrer o chão. Eu mesmo, quando eu saí da polícia, estava há dez anos na PM. Eu era militar, não era mais paisana. Eu vi o mundo desabar. Mas eu nunca desisti. Eu trabalhei, tive lanchonete, tive estacionamento, fui gerente em loja no Brás, fui segurança...” Rubens teve que reconstruir a vida depois daquela ocorrência. “Saiu no jornal, televisão, Jornal Nacional... Só que a Rede Globo manipula tudo. Eu não gosto da Globo. Eu acho que eles dão a notícia que eles querem, manipulada pelo governo. Hoje ela está mais ligada ao PT, não sei, não gosto. Aí alegaram execução e a polícia mandou a gente embora.” Sua cunhada era oficial da PM e também o acusou. Chamou-o de assassino e disse que a Rota fazia lavagem cerebral. “Você é tenente lá no seu quartel, aqui na minha casa mando eu”, ele retrucou. Mas já era tarde. Sua mulher saía pela porta carregando o filho. Rubens acha que seu caso foi político. Que ele foi usado como bode expiatório, tanto que a acusação e a prisão foram rápidas. Só a absolvição é que demorou. O julgamento foi em 1994. Ele, então, moveu uma ação contra o Estado para voltar à PM, mas o prazo para fazê-lo já havia passado. “Segundo o juiz, você pode 113
mover uma ação contra o Estado em até cinco anos. Mas antes disso, eu não sabia se eu ia ser inocentado ou culpado”, diz. Ele ficou no reservado (a polícia da polícia) por 18 dias. “É tortura psicológica”, diz Rubens. “Você fica já numa celinha que só tem uma janelinha. Um espaço 2 x 2 ou 2 x 3, deve ser. Aí toda hora tem interrogatório, de madrugada, de manhã, você já não sabe quando é dia, quando é noite, é tudo escuro. Tortura psicológica. Não provaram nada contra mim.” Ainda assim, passou mais três meses no Romão Gomes, o presídio militar. O inferno para Rubens. “Liberdade não tem preço. Eu, um policial, sempre trabalhei corretamente, nunca peguei uma bala de ninguém, me vejo preso por causa de vagabundo.” No Romão Gomes, a distinção entre “policial assassino” e “policial corrupto” guiava a dinâmica social. Para Rubens, os primeiros eram heróis e os segundos, a escória da polícia. Ele conta que tinham direito a uma ou duas horas de sol, “de resto, todo mundo no xadrez”. “Policial ladrão tinha mais mordomia do que policial que matou vagabundo. Você era obrigado a ouvir nego falar assim: ‘Eu matar vagabundo? Eu não! Não sou trouxa’. Tinha um monte de polícia ladrão, drogado, maconheiro. Nem ficavam no nosso lado, nem vinham conversar com a gente. A gente era tachado como assassino.” Em abril deste ano, o presídio Romão Gomes completou 65 anos. Segundo reportagem do G1 do ano passado, 184 das 225 vagas estavam ocupadas. Entre os detentos, 96 foram presos por homicídio e 47 já foram excluídos da PM. A exclusão não vem necessariamente no momento da prisão e, para alguns presos, pode nunca acontecer. Além do homicídio, as outras violações mais comuns são crimes sexuais e roubos. Os presos mais recentes ficam em uma cela 22h por dia. Depois de meses, segundo avaliação psicológica, podem se mudar para um alojamento e frequentar algumas partes do presídio. 114
Quando a mãe visitou Rubens no Romão Gomes, disse que havia males que vinham para o bem. Antes preso do que morto ou numa cadeira de rodas, ela pensava. Pelo visto, a marca da bala que o filho levara anos antes era tão nítida nela quanto nele. Em três meses, houve a primeira audiência com o juiz e o advogado de Rubens –pago através de uma vaquinha do pessoal da Rota– conseguiu suspender a prisão preventiva. O ex-soldado Rubens pôde responder em liberdade. A expulsão da PM foi um golpe certeiro. Ele, que defendia a corporação, que tinha três bicos para conseguir ser um policial honesto, que amava a farda, estava expulso. “Você está trabalhando num dia, no outro, está na cadeia.” O pior: Rubens tem absoluta certeza de não ter feito nada errado. Anos dedicados, um trabalho impecável e, sem motivo, você está fora. Sozinho. De um jeito ou de outro, o caso de Rubens é de injustiça. Se é mesmo inocente como alega, sofreu preso sem motivo. Se é culpado, pior ainda –acabou absolvido. “Matei vagabundo, não matei pai de família. Não me considero um assassino. Considero que o que fiz tava certo. Tanto podaram [a PM] que está essa porcaria que está hoje esse país.” Rubens explica que não é contra a fiscalização e a punição na PM. Desde que para o alvo correto. A Corregedoria é um “mal necessário” que deveria ser usada para policiais corruptos e não para “policial que matou vagabundo”. “A polícia está cheia de corruptos”, diz Rubens e denuncia que, para eles, a impunidade reina. Para os que matam criminosos, o contrário: “se ferra, mandam embora”. “O mau polícia tem que ser escrachado, tem que ser retirado da corporação. Mas o bom polícia, o pessoal não valoriza. Para polícia que trocou tiro com vagabundo, eles deviam contar até dez, ver direitinho [antes de punir].” 115
O Proar (Programa de Acompanhamento a Policiais Militares Envolvidos em Ocorrências de Alto Risco), que existe justamente para auxiliar os policiais que mataram alguém em serviço, Rubens vê com maus olhos. “Pra mim não ajuda em nada, só atrapalha o bico do polícia. Você quer ajudar o polícia? Dê um salário correto pra ele. A ferramenta do pedreiro é a colher de pedreiro. Se cai do andaime e cai na cabeça de alguém, pode matar. A ferramenta do polícia é a arma. Ele pensa muito rápido, é segundos. Se, por um acaso, ele errar um tiro e pegar uma pessoa inocente, é a ferramenta de trabalho dele. O policial, antes de qualquer coisa, ele é um ser humano, ele não vai querer matar um pai de família, não vai querer matar uma pessoa inocente. Mas está arriscado a acontecer um acidente. Só que a imprensa não vê esse lado, não valoriza o bom polícia.” Nessa linha, ele defende a ação dos dois policiais do Rio de Janeiro, que teriam atirado na auxiliar de serviços gerais Cláudia Ferreira da Silva , em março, durante um tiroteio na periferia, e a levaram ao hospital. O caso ganhou repercussão porque o porta-malas da viatura abriu e Cláudia foi arrastada por 350 metros. Segundo a Polícia Civil, no entanto, ela não morreu em decorrência dos ferimentos provocados pelo atrito no asfalto mas por disparo de arma de fogo. Após o inquérito da Polícia Civil, os dois PMs foram indiciados por homicídio culposo e mais quatro policiais que participaram do resgate foram indiciados por fraude processual. Assim como Rubens, o tenente Rodrigo Boaventura e o sargento Zaqueu Pereira Bueno foram presos de um dia para o outro. Os dois foram soltos em 11 de maio, quando o prazo de prisão temporária expirou, e permanecerão em funções administrativas enquanto durar o processo. 116
“Não dá, não quero acreditar que aqueles caras fizeram aquilo de propósito pra mulher cair do carro. A mulher já tava morta com o tiro, eu acho. E todo mundo já caiu de pau. Não tem um respaldo. Você pega uma ocorrência na qual o policial está totalmente errado e fica a semana inteira divulgando isso, principalmente a Rede Globo. Quando a polícia faz uma ocorrência bonita, os caras falam um minutinho só e já esquecem.” E continua: “Todo mundo vira as costas pra você. Ninguém te apoia em nada não. Mas, quando precisa da polícia, corre e chama a polícia.” Rubens cita também o episódio do Carandiru –um marco na história da Polícia Militar de São Paulo. Dessa vez, a semelhança com seu caso é a condenação política, usada para dar alguma satisfação à sociedade. “O pessoal do Carandiru foi tudo condenado. Eles cumpriram ordem. Onde é que está o governador, secretário da segurança? Eles também têm que ser julgados. Alguém deu ordem. Eles não entraram lá por eles mesmos. Ficou o dia inteiro pra fazer aquilo lá. Entra, não entra, entra, não entra. A princípio foi ordem do coronel Ubiratan? Foi. Mas o coronel recebeu ordem do secretário, e de quem veio a ordem? Veio do governador. Por que tem que ser os polícias a serem condenados? E por que 22 anos pra ser julgado? Pra quê, fala pra mim? Por que quem morreu lá era inocente? Para com isso... tudo vagabundo”, diz. Ao todo, 111 detentos foram mortos no chamado Massacre do Carandiru, quando a polícia entrou no presídio para conter uma rebelião no pavilhão 9 no dia 02 de outubro de 1992. Em 2014, foram realizados os dois últimos julgamentos de policiais: foram 73 condenados no total. Devido ao grande número de réus e de vítimas, o julgamento do foi dividido em etapas, conforme os andares do pavilhão 9. 117
Na primeira etapa, em 2013, foram condenados 23 PMs da Rota a 156 anos de prisão pela morte de 13 presos. No mesmo ano, outros 25 policiais da Rota foram condenado a 624 anos cada um pela morte de 52 detentos. Em 2014, nove policiais do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) foram condenados a 96 anos de prisão e um a 104 anos pela morte de oito detentos. E, finalmente, 15 policiais do COE (Comando de Operações Especiais) foram condenados a 48 anos de prisão cada um pela morte de quatro detentos. O comandante responsável pela operação no Carandiru, coronel Ubiratan Guimarães, foi condenado a 632 anos de prisão em 2001 por 105 das 111 mortes. No entanto, Ubiratan, que chegou a se eleger deputado estadual pelo PSD, morreu em 2006, enquanto o processo ainda corria em outras instâncias da Justiça. O então secretário da Segurança Pública, Pedro Franco de Campos, deixou o cargo após o episódio. Luiz Antonio Fleury Filho era o governador de São Paulo na época. A Casa de Detenção do Carandiru, a maior da América Latina com mais de sete mil presos, foi implodida dez anos depois do massacre. Enquanto a sociedade civil comemorou os julgamentos, Rubens não vê sentido algum em punir policiais que, afinal, resolveram um problema: se livraram de criminosos. “Pra dar uma resposta pra sociedade? Que resposta? Só morreu vagabundo ali. Morreu pouco, deveria ter morrido mais. Você acha que tem cabimento bandido se criando na cadeia. Esses caras tem tudo que morrer.” Embora sempre defenda a corporação, Rubens diz que não voltaria para a PM como ela é hoje. Para ele, tudo mudou muito desde o Carandiru. “A polícia está de mãos atadas, não pode fazer nada. E não adianta, eu não vou mudar meu modo de pensar.” 118
Se, num milagre, Rubens recebesse o aviso de que poderia voltar agora para a PM, sua resposta estaria na ponta da língua. “Se falassem você vai voltar a trabalhar amanhã no sistema que o governo quer, no sistema de hoje em dia. Você vai receber seus atrasados e tudo. Eu não quero, eu não volto. Nesse esquema? Ficar pagando pau pra vagabundo? Não volto. Hoje é difícil trabalhar na rua. Você não tem respaldo de ninguém, é muita pressão, ninguém te valoriza. Você mata um vagabundo numa quebrada aí, à noite os caras já põem fogo em ônibus, já faz o diabo.” Para o soldado, polícia mesmo era aquela da década de 1980. Na Rota daquela época é que Rubens queria estar. “Na minha época vagabundo não fazia nome não. Ele fazia nome na favela, mas a Rota ia lá e sentava o aço, era caixão. Ia morrer. Hoje não. Infelizmente o crime se organizou e a polícia está estacionada. E a imprensa tem culpa. Não confio no Datena, não confio nesse Marcelo Rezende, esses caras tem culpa, eles tem uma parcela de culpa de estar essa vergonha... de tanto que eles ficam divulgando aí. Os caras ficam atrás de ibope com a desgraça alheia. Esses Cidade Alerta... Isso tudo pra mim é errado. Tudo errado.” Atualmente, segundo policiais apontam, existe uma orientação maior da corporação no sentido de evitar mortes em confrontos policiais. Ao mesmo tempo, a imprensa e a sociedade não toleram a violência policial como antes, já que a noção de direitos humanos está mais madura no país, e exercem seu papel de controle, apontando os erros policiais. Mesmo assim os mortos nas mãos de PM continuam a ser notícia quase diária, do que se conclui que a violência sistemática da corporação está longe de ser extinta. Um levantamento para monitorar a violência policial do Núcleo de Estudos da Violência da USP, feito com base em notícias publicadas em jornais desde 1980 até hoje, mostra o tamanho do 119
desafio. É interessante observar, porém, o papel da pressão social sobre a polícia. O número de vítimas fatais revela claramente o efeito Carandiru nos anos seguintes ao massacre, com queda significativa de mortos. Violência Policial no Estado de São Paulo (NEV) Número de Casos de
Vítimas
Vítimas
Vítimas
Total de
Violência Policial
Fatais
Feridas
Outras
Vítimas
1980
118
123
93
116
332
1981
278
327
208
116
651
1982
137
178
78
31
287
1983
113
118
263
11
392
1984
351
372
276
294
942
1985
298
360
308
51
719
1986
179
195
180
131
506
1987
168
195
85
199
479
1988
189
214
45
6
265
1989
214
278
1462
30
1770
1990
111
140
101
16
257
1991
372
423
125
23
580
1992
97
237
27
13
277
1993
68
54
191
11
256
1994
52
41
123
2
166
1995
55
75
64
2
141
1996
94
75
96
396
567
1997
275
179
328
9
516
1998
319
251
606
468
1325
1999
358
291
379
371
1041
120
2000
428
348
469
44
861
2001
256
219
349
8
576
2002
167
180
157
7
344
2003
178
193
357
12
562
2004
167
154
224
1111
1489
2005
129
108
184
15
307
2006
235
269
357
326
952
2007
206
199
265
417
881
2008
149
126
107
19
288
2009
186
132
163
42
337
2010
86
68
50
11
129
Também por causa do Carandiru, de um modo geral a sociedade paulista (e a PM) deixou de ver o homicídio como uma ferramenta para solução de problemas, o que explica a queda de mortes no Estado a partir dos anos 2000. Em 1999, a taxa homicídios era de 35,27 a cada cem mil habitantes, número que, em 2013, passou para 10,5. Segundo a teoria da ação situacional, toda ação, inclusive a criminal, é resultado das alternativas que uma pessoa percebe em um determinado contexto. Portanto, se uma pessoa opta pelo crime, é porque crê ser a melhor opção naquela circunstância. Na década de 1960, em São Paulo, o homicídio ganha um novo significado: passa a ser um instrumento de controle do crime. Matar os criminosos seria, então, a melhor opção para acabar com os crimes. Assim, os esquadrões da morte da PM se espalham na década de 1970. Nas comunidades, por sua vez, os civis também passam a ver o homicídio como algo eficaz, gerando um mecanismo de multiplicação de homicídios. Como as 121
mortes são praticadas em nome da justiça, o contexto moral permite a ascensão dos homicídios –são tolerados pela sociedade e pelas instituições de segurança. Entre 1920 e 1960, o Estado registra menos de cinco homicídios a cada cem mil habitantes. Entre 1960 e 1975, são de 5 a dez casos. Em 1999, já são 65 mortes em cada cem mil habitantes. Com o passar das décadas, porém, a situação fica insustentável. As pessoas começam a matar para não morrer e o contexto moral é modificado: há uma percepção de que o conflito deve ser evitado. As instituições de segurança buscam, então, outras políticas de redução do crime que não o homicídio, o que explicaria, juntamente com os trágicos episódios da Favela Naval e do Carandiru, essa nova PM “de mãos amarradas” que relata Rubens. Em 2014, contudo, vemos que resquícios desse pensamento homicida podem ser ainda encontrados na população de São Paulo –no segmento pró-Sheherazade– e também na PM –no estereotipado Rubens. A aversão ao homicídio que se instaura nos anos 2000 segundo a teoria da ação situacional faz considerar a explicação oficial da PM para os episódios de violência: são casos isolados. Os números, porém, deixam dúvidas se a morte justiceira cabe aos estereótipos perdidos da polícia ou se é institucionalizada. Segundo balanço do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os mortos pela polícia em confrontos em São Paulo foram 397 em 2008, 543 em 2009, 495 em 2010, 437 em 2011, 564 em 2012 e 352 em 2013 –sendo que os dois primeiros números incluem também mortos pela Polícia Civil. Nos dois primeiros trimestres de 2014, foram 317 pessoas mortas pela PM de acordo com a Secretaria de Segurança Pública. * 122
Rubens já é conhecido na padaria. Cumprimenta todo mundo, usa o salão do almoço para dar entrevista e ainda pede que desliguem a televisão –“tá gravando aqui, ó”. Sua fala é curta e grossa. Enquanto discorre sobre a inversão de valores na sociedade, leva uma blusa branca com uma bicicleta desenhada. Tem o rosto grande, assim como as orelhas e o nariz. A parte da testa acima do nariz é mais funda, dando a impressão de estar sempre franzindo a cara, como quem está bravo. E não é pra menos. Além dos problemas na PM, Rubens teve uma vida pessoal conturbada. É filho de mãe pobre com pai muito rico, uma relação nunca aceita pela avó paterna. Por isso, não conheceu o pai e acabou sendo criado pela tia (irmã da mãe) desde os oito meses de idade. Tio e tia passaram a ser seus pais (com registro e tudo) e ele diz nunca ter procurado a família verdadeira. A mãe biológica morava no Rio de Janeiro e veio visitá-lo em apenas duas ocasiões, antes de morrer. Rubens tinha cerca de dez anos. “Eu lembro uma vez só, eu era muito pequeno.” “Eram seis irmãos. Era complicado. Meu pai era militar também, uma pessoa corretíssima. Era difícil eu ganhar um presente. Uma bicicleta, quando ganharmos, era pra seis. Era uma briga”, conta, mas não mostra mágoas da infância. Ele era o mais velho –“o primeiro a apanhar”. Tinha responsabilidade sobre os irmãos e começou a trabalhar aos 12 anos, entregando pão em Bragança Paulista, onde moravam. Atualmente, depois da morte dos pais, não tem contato com nenhum dos irmãos. A mãe morreu de câncer aos 63 e o pai de leptospirose aos 71. “Meu pai deixou a casa aqui em São Paulo e uma chácara e aí... briga de família... eu abandonei tudo”, conta. “Quando meu pai faleceu, acharam por bem deixar o meu irmão caçula tomar conta da chácara e o dinheiro que sobrasse era 123
pra ele. Meu pai criou meu irmão caçula errado, ele passou muito a mão na cabeça do meu irmão. Eu não concordava, mas também não me envolvia. E meu irmão destruiu a chácara.” O irmão do meio começou a articular uma saída: — Acabaram com a chácara. — Não quero saber. Vocês que deixaram o João tomando conta. Então deixa que ele tome conta. O irmão insistiu e Rubens cedeu. — Eu tomo conta, mas do meu jeito, tá bom? — Tá bom. “Arrumei tudo. Meu irmão não pagou luz, cortaram luz, pedi pra religar. Bomba da piscina ele deixou queimar, bomba do poço. Eu fui arrumando tudo devagar, com o dinheiro que recebia do aluguel da casa do meu pai e coloquei dinheiro do meu bolso também.” Durante quatro anos, Rubens foi o responsável pela chácara e, nesse período, começou a se irritar quando os irmãos iam para lá levando amigos sem ao menos lhe avisar. “Aí meu sobrinho casou, e a mãe dele, minha cunhada, achou que o filho tinha que morar na casa do meu pai de graça. Eu falei que o dinheiro que se ganhava ali era o que sustentava a chácara. Começou umas picuinhas, umas coisinhas, sabe? Aí eu achei melhor parar.” Hoje em dia, os irmãos não ligam pra ele e ele não liga para os irmãos. “Família é bom no retrato dentro da gaveta”, diz. Com a primeira mulher, Irene, Rubens se casou no civil e na igreja e teve seu filho Rafael. Com a sua prisão, se separaram em 124
1989. Quando Irene se casou novamente e foi morar na Inglaterra, Rafael tinha dez anos e passou a viver com Rubens até que saiu de casa aos 22. O pai pagou a faculdade do filho na Unip, mas parou de bancá-lo depois da graduação. “Eu fui dar uma dura nele, ele ficou bicudo e foi pra casa da tia. Eu falei pra ele ‘tá na hora de você trabalhar, cara’. Ele chegava da faculdade e ficava com a televisão ligada até uma, duas horas da manhã. Um dia eu levantei seis horas da manhã e falei ‘vai procurar emprego’. Cheguei em casa, ele tinha ido embora pra casa da tia.” Ainda assim, pai e filho se dão bem. Aos 27, Rafael já mora sozinho. De 1990 até 2002, Rubens esteve com sua segunda mulher, Dalila, que conheceu quando trabalhava na Sharp. O relacionamento acabou quando a sogra morreu. “Ela pirou. Ela chegava ao ponto de, no domingo, chovendo, ela pegava balde, rodo, e ia no cemitério lavar o túmulo da mãe dela, debaixo de chuva. Pirou mesmo. Ela chegava em casa do serviço e ficava no quarto da mãe dela. Ali ela fumava até não sei que horas da madrugada e dormia e não tomava banho. Pirou, pirou. Eu quis ajudá-la, mas ela não quis. Hoje ela está legal. A gente se fala, ela sabe que, se precisar de mim, pode me ligar. Minha mulher atual sabe disso.” A atual mulher, Telma, entrou na vida de Rubens em 2002 e não saiu mais. “Eu não tenho dívida, meu filho está criado, eu estou casado, a minha esposa trabalha, tenho minha primeira casa própria, tenho carro, tenho moto”, diz Rubens. No fim, parece que tudo deu certo. O ex-soldado deu a volta por cima. “Eu fui revoltado muito tempo. Depois do negócio da polícia, fui revoltado pra caramba. Mas a vida vai te ensinando.” A estima pela carreira policial não o deixa esquecer a melhor parte do policiamento: defender o cidadão. “Eu tenho esse 125
raciocínio. Você poder ajudar as pessoas, né? Ser útil à população.” A memória da prisão não o deixa esquecer o pior da profissão. “Claro que ninguém te valoriza. Só vai te valorizar quando sentir na pele mesmo. Quando ladrão entrar em casa, barbarizar, fazer o diabo lá dentro. Fora isso, só mete o pau.” Apesar de tudo, Rubens defende a polícia sem pestanejar. “Gosto da polícia. Do meu lado ninguém fala mal dela que eu não deixo. Toda profissão tem um bom e tem um mau. Não vem querer criticar a polícia 100% que não é isso.” E, para não ficar 100% nas ocorrências que quase acabaram com sua vida, Rubens narra um episódio especialmente emocionante que viveu. “Eu estava saindo da base da Rota, ali na avenida Tiradentes. Nós estávamos já na avenida 23 de Maio, quando passa um cidadão com uma Brasília bege com o pisca ligado em alta velocidade desesperado. Eu nem sei quem da equipe que falou pra colar na Brasília pra ver o que tava acontecendo. Quando abordamos, era um pai com uma filhinha. Ela estava pronta pra ir a um aniversário, mas esmagou os dedos na porta do carro.” O ex-Rota nunca vai esquecer a menininha. Tinha uns três anos. Estamos ainda nos anos 1980. Era um sábado à tardezinha. “O pai entrou em pânico e estava levando a menina pro HC. Ela chorava demais. Estava prontinha já, com vestidinho, tudo cheio de sangue. Eu lembro que nós paramos a viatura ao lado do carro e ele falou que a menina tinha se machucado, tinha prendido a mãozinha, os dedos. Paramos a viatura, ele parou a Brasília, eu peguei a menina no colo e ela foi no meu colo na viatura até o HC.” Enquanto conta a história, Rubens vai mudando o semblante. Os olhos vão se enchendo d’água. 126
“Do jeito que ele estava, sozinho e com o pisca ligado, ele podia causar um acidente. Ele nem brasileiro era, falava enrolado, eu lembro disso. Ele disse ‘eu tinha uma imagem de vocês totalmente diferente’. Eu até choro.” Já está às lágrimas. “E o sangue dela ficou na minha roupa ainda. Acho que foi uma coisa boa que eu fiz pra uma criança. Criança mexia comigo, né? Eu acho que foi diferente porque ela parecia uma bonequinha. E pegou bem o dedo dela. Esmagou, sabe? E ela chorava muito. Ele mandou uma carta na época agradecendo o que nós fizemos.” Antes de ir embora da padaria com uma moto na carroceria da caminhonete, Rubens revela uma última intimidade dos estereótipos: eles também choram.
Vingança Os travestis são o grupo mais excluído com que eu já trabalhei até hoje. Arruda, coronel
No Ensino Médio, Arruda foi presidente do centro cívico de sua escola, em Araras. Era uma espécie de centro acadêmico, mas com outro nome, já que centro acadêmico era coisa de comunista e vigoravam as regras do governo Geisel. A escola, a maior da cidade, tinha 3.600 alunos. Quinhentos deles estavam reunidos em um auditório para ouvir um recado do diretor: — Atenção, todos! Amanhã tem que pagar a Associação de Pais e Mestres. Quem não tiver carteirinha vai ser desligado da escola.
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Arruda resolveu consultar o estatuto e leu no artigo primeiro que a contribuição era voluntária. “Então eu li essa parte para o diretor. Maldita hora que eu fiz isso.” Os alunos começaram a bater o pé no chão gritando “Não paga, ninguém paga.” Os pais de Arruda foram chamados na escola. Embora sua relação com a mãe fosse boa, com o pai era diferente. E ele chamou o filho para conversar: — Fiquei sabendo que aconteceu esse incidente, você é o presidente do centro cívico e você que liderou isso aí. — Não é que eu liderei, eu só alertei para o que estava errado e o pessoal se levantou. — Disseram na escola que você é uma liderança muito perigosa e que está a um passo do da liderança estudantil e da luta armada. É verdade? — Não, claro que não, pai. — O diretor disse que se houver outro incidente, vão chamar o Dops e enquadrar você na 477. Você sabe o que é isso? É o decreto que dispõe sobre subversão no ensino. Sob esse decreto, o menor de idade pode ser punido e, se você for condenado, você vai ser desligado da escola, não pode fazer escola pública, nem estudar na USP, nem ter diploma reconhecido pelo MEC, nem fazer pós-graduação, mestrado e doutorado, não vai conseguir bolsa pelo CNPQ, Fapesp, não pode prestar concurso público, fazer serviço militar, nem sair do país. Você tem consciência disso? Você acha que agiu corretamente? — Eu acho. — Eu também acho, filho, mas, por favor, não faça mais nada. Porque te amamos muito.
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“Esse ato mudou a minha relação com o meu pai, foi um divisor de águas, porque, afinal, eu percebi que ele queria meu bem. Foi muito marcante também pra mostrar o que é viver sob o regime autoritário. Como os covardes se escondem atrás de um regime. Imagina na época quantos jovens devem ter sido acusados e acabaram caindo na luta armada, matando, morrendo sob tortura. Totalmente infundado. O que tinha a ver o regime militar com o fato de eu ter falado que não precisava pagar a carteirinha? Eu só falei que o diretor não podia nos extorquir.” Foi ali que Arruda teve um estalo e decidiu seu futuro. “Vou fazer parte das Forças Armadas. Vou me vingar. Vou me vingar desse idiota.” * Aos 54, Luiz Eduardo Pesce de Arruda é um coronel aposentado, faz parte da reserva da PM. Sentado no auditório da AACD, na Borges Lagoa, está disposto a narrar toda a sua carreira para uma platéia vazia. Não, não participa de nenhum evento. Ele agora trabalha na AACD e não havia outro lugar disponível onde pudesse contar suas aventuras. A testa cresce cabeça adentro, roubando espaço dos grisalhos. Tem uma verruga no lado esquerdo do queixo, olhos pequenos e um nariz grande. Maiores, porém, são as orelhas –os lóbulos, na verdade. Está sorrindo em boa parte do tempo. Gargalhadas também não são raras. Um tanto barrigudo, é um coroa meia-idade bastante normal. Arruda entrou na reserva em março de 2013, um feito relativamente simples na carreira militar. “É muito fácil progredir funcionalmente, basta estudar e ter uma boa folha de serviço e você chega a coronel. A PM é uma das estruturas mais democráticas 131
de acesso de público interno. Eu tenho certeza que tem mais oficiais que foram praça do que chefes que foram estagiários.” Como coronel, Arruda recebe R$ 21 mil brutos, mas, segundo ele, o salário líquido de um coronel é por volta de R$ 12 mil. Ele mesmo recebe R$ 9 mil, mas porque os R$ 6 mil de pensão do filho mais velho já são descontados no salário. Na AACD, recebe outros R$ 9 mil e mais R$ 2.200 por dar aula de comunicação na Fapcom. O filho mais velho nasceu em 1992, fruto do casamento com a primeira mulher, Simone. Separaram-se em 1995, ano em que começou a trabalhar com os Conselhos Comunitários de Segurança (Consegs) e, talvez por isso, tenha se dedicado tanto a eles. “Eu estava duro porque perdi tudo na separação. Minha propriedade se resumia a uma cama, um armário e um chuveiro no quartel, além de um fusca que meu pai tinha me dado.” Hoje, Arruda está com sua casa quase quitada. Também possui um Corolla e um Celta 2007. O filho Rodrigo estuda Direito no Ibmec do Rio e trabalha na Agência Nacional de Petróleo. “Eu namorei mulheres muito interessantes depois, mas sempre esbarrava no fato de que eu tinha uma relação próxima com minha ex-mulher, falo com ela umas duas vezes por semana, falo sobre meu filho. Não sou ex-pai. As mulheres de forma geral não entendiam isso e tinham ciúmes, mas a Márcia entendeu muito bem.” A Márcia entendeu tão bem que chegou a hospedar Simone doente em sua casa e cuidar dela. Arruda se casou novamente em 2001. “Ela tem uma cabeça muito boa, uma mulher extraordinária. Ela é pedagoga com ênfase em educação infantil. Ela lê a criança, é uma coisa impressionante. Sabe quando é dor ou manha. E a despeito disso, ela não engravidou.” O casal gastou R$ 70 mil em fertilização. Um dinheiro que, na verdade, eles nem tinham. Na primeira tentativa, os fetos du132
raram três semanas. Na segunda, uma. Márcia sofria com ansiedade, estresse, hormônios, exames, dor e ganho de peso. “Uma mulher quer ser mãe e não engravida... a casa fica um ambiente de luto permanente. Menstruou, começa a choradeira. ‘Deus está me punindo’. E eu dizia: Márcia, minha filha, Deus é amor, não está punindo nada. O casamento vai no limite da existência.” Márcia e Arruda resolveram, finalmente, tomar a “melhor decisão da vida” deles: adotar. Queriam uma menina. O Fórum ligava: “Olha, apareceu uma criança como vocês querem, se a mãe não aparecer em 15 dias, é de vocês.” Só que a mãe sempre aparecia. Márcia chegou a mandar jogar fora o berço e tacou tinta por cima da decoração do quarto do bebê. Um dia, o Fórum ligou. Tinham um menino. Um ano e meio. Pais usuários de droga. A criança fora achada pela PM com sarna e toda queimada depois de cinco dias sem trocar fralda. A mãe passeava com o carrinho na contra-mão da via expressa da Marginal Tietê. “Eu vi a foto e achei bonitinho. Cheguei no abrigo, ele estava sentadinho, brincando com um carrinho. Bonitinho, banhadinho, com umas roupinhas velhinhas. O tênis escrito ‘A Sta’. O “L” e o “R” tinham sumido. Era um dia de evento, tinham uns 20 adultos. Quando eu apareci do outro lado, ele abriu o braço, o rosto se iluminou, saiu correndo no meio das pessoas, me abraçou e pediu ‘colo, colo, colo’. Peguei e ele deitou no meu ombro, e foi uma choradeira. Eu não sou kardecista, mas, se eu fosse, eu diria que foi um reencontro. Foi impressionante.” Lucca, a alegria da vida do coronel, nasceu em 2007. Arruda pretende contar que ele é adotivo quando chegar a hora certa. “A relação tem que se basear na verdade.” Arruda é um cara conversador. Fala com as mãos e encena, mas essa agitação é só a expressão de um cara tranquilo, ou melhor, pa133
cífico. “Eu brigo por tão pouca coisa. Porque você vê que não vale a pena. A vida é muito frágil, muito curta. Não vale a pena... o cara briga com o irmão e fica 12 anos sem falar com ele por causa de um pato que a mãe deixou, sabe essas coisas? Eu vi tantas vezes chegar a hora para os outros. Uma hora vai chegar a minha, mas isso me fez muito mais feliz porque eu aproveito melhor a vida.” A última vez que Arruda quase morreu foi para defender um boliviano em 2000. É 1h da manhã. O policial acaba de deixar Márcia em casa e passa em um posto de gasolina, na zona norte, na esquina da rua Zilda com a Engenheiro Caetano Alves –a rua do Estadão– para abastecer. De repente, o posto é invadido por 30 jovens correndo atrás de um boliviano. O boliviano pula para a loja de conveniência e todos pulam atrás. Um deles pega um martelo e bate em alguma coisa que Arruda não consegue ver. Ali, o policial acha que o boliviano morreu. Mas ele se levanta e corre até uma bomba do posto. O grupo se dispersa. Arruda chama o 190 e se aproxima: — Como você chama? — Reinaldo. Reinaldo estava bêbado e com o braço fraturado em várias partes. — Reinaldo, eu sou polícia, vou te levar ao hospital. — No quiero, no quiero –o boliviano entra em pânico. Arruda ainda está agachado conversando com Reinaldo atrás de uma bomba, quando percebe muitas pernas ao redor. O grupo estava de volta, cercando a bomba. “Eu estava à paisana, mas armado. Normalmente eu ando armado. Eu pensei ‘se eu saco a arma, vou ter que matar uns quatro 134
adolescentes classe média no posto’. No dia seguinte, vai sair ‘policial maluco matou’. Minha mãe vai dizer ‘meu filho era tão bonzinho, ajudava a sustentar a família’. Vai ser aquela coisa que a gente já conhece e não funciona. Mas se eu não sacar eles me matam agora. Resolvi tentar a contenção verbal. Identifiquei o líder.” — Você, aqui. Polícia. Cala a boca e olha pra baixo. Dois passos de mim, não chega perto de mim. O líder foi ficando quieto. As ameaças de “vamos matar” foram se calando. — O que vocês estão fazendo aqui? Quem vocês vão matar aqui? Filho da puta, vou te jogar numa casa de detenção hoje. Você vai virar menina hoje, rapaz. Se manda que em três minutos a Força Tática está aqui. O grupo foi embora. “Eu pensei, ‘obrigado Senhor’. Arrumamos uma tala e eu entalei o braço dele. Legal, né? Eu achei que fosse morrer esse dia.” “Não dá muito tempo para pensar quando você acha que vai morrer. Você só pensa ‘poxa agora chegou minha hora’. É uma descarga de adrenalina, depois parece que você tomou uma surra. Sua perna pesa uma tonelada. E você fica ligadaço. Esse dia eu voltei para a casa da minha noiva e dormi lá.” Arruda nasceu e cresceu em Araras, no interior de São Paulo. Tem três irmãos: dois trabalharam no Banco do Brasil e uma irmã é bióloga. Família de classe média, branca, católica –a elite da cidade. O coronel conta que não tinha amigos negros. Judeus, muçulmanos, evangélicos eram uma realidade tão distante quanto Marte. 135
Ele tem dois parentes militares. Um tio que era capitão, mas largou a carreira e, no dia da formatura de Arruda como policial, quase morreu de emoção –teve que ir ao hospital por causa de uma desfribilação cardíaca. E um tio avô que foi sargento da cavalaria. Tio Francisco Ferraz de Oliveira era comunista desses que “levava mendigo pra casa”, fazia parte da Aliança Nacional Libertadora e passou mais da metade da vida na cadeia. Não foi nem por um nem por outro que Arruda escolheu a carreira militar. “Eu queria uma missão que me permitisse servir. Queria dedicar minha vida ao serviço ao próximo. A primeira coisa que pensei foi ser padre, mas não pode casar. Sou católico, mas sou contra o celibato, acho um crime. Não tem nenhum fundamento bíblico, é meramente administrativo e pode ser revogado pelo papa. Uma grande parte dos problemas que vemos hoje na igreja acontece pelo fato de ela atrair pessoas com questões sexuais muito mal resolvidas, aí acaba dando em pedofilia.” Arruda acabou mesmo indo fazer cursinho para prestar concurso para as Forças Armadas e, então, ficou sabendo da existência da Academia do Barro Branco, que formava oficiais da Polícia Militar. “Comecei a olhar o currículo de uma e de outra, e comecei a me interessar mais pelo currículo da PM. Porque a PM tem mais coisas de humanidades, e nas Forças Armadas é mais exatas, e eu sou muito ruim de exatas.” Na primeira tentativa, Arruda prestou para o Exército. Passou, mas não levou. Estava entre os 350 classificados, mas, antes da matrícula, cortaram cem vagas por questão de orçamento e ele ficou de fora. No ano seguinte, prestou concurso para a Força Aérea e para a PM. Quando as provas das duas instituições coincidiram, Arruda prestou as da PM. Mas, no teste de condicionamento físico, caiu fora do colchão e quebrou o braço. Na terceira tentati136
va, passou novamente na FAB e na PM. “Minha mãe falava ‘pelo amor de Deus, criar um filho pra ficar correndo atrás de bandido’. Todos da família queriam a FAB. Só meu pai disse que se era a PM que eu queria, era para a PM que eu deveria ir.” Na tentativa de evitar o que considerava ser uma tragédia, a mãe mobilizou o único psicólogo de Araras na época. “Um homem extraordinário, um padre chamado João Modeste. Ela pediu pra que ele fizesse um teste vocacional comigo. Foi o melhor psicotécnico que eu fiz até hoje. Foi um dia inteiro de teste direto, entrevista, desenho, mancha de Rorschach, desenho de novo... Quando ele terminou, disse para minha mãe: minha senhora, eu sinto muito, mas seu filho vai ser policial mesmo. Minha mãe chorou”, conta Arruda dando risada. O padre lhe perguntou: — Você já fugiu com o carro do seu pai? — Não. — Seu irmão tem moto, e você? — Não, nunca tive. Nem gosto de moto. — Como você é de matemática? — Ruim. “O padre disse ‘ele não gosta de matemática, mecânica, dirigir... O que ele vai fazer na FAB?’ E eu fui pra Academia. Sou muito feliz com a minha carreira. Eu não podia ter escolhido outra. Fiz exatamente o que quis fazer na vida.” A maneira mais adequada de contar a carreira de Arruda na PM é no melhor estilo Forrest Gump –em ordem cronológica dentro de um super flash back baseado quase exclusivamente em sua memória e cheio de gente famosa. A sorte é 137
que sua memória não parece ser das piores: traz muitas datas e muitos nomes, de modo que vamos ter que nos fiar nela. Segundo a sua versão de si mesmo, Arruda é um humanista. Quer dizer, tem o ser humano como maior preocupação e, dentro disso, trabalha pelas minorias. “Nós temos que desmistificar os direitos humanos. Direitos humanos significa um conjunto mínimo de direitos que é atribuído para qualquer pessoa pelo simples fato de ela ser pessoa humana. Quem discorda disso? Quem pode em sã consciência dizer que isso está errado. Ninguém pode.” Então vamos do começo. Depois do teste vocacional –o último recurso de uma mãe desesperada– Arruda entrou na Academia Militar de Polícia do Barro Branco. Foram dois anos preparatórios (equivalentes ao ensino médio) e três anos de curso. “Eu vivi intensamente a academia. Eu amei a escola todos os dias que estive lá.” Arruda também fez teatro e shows no Barro Branco, inclusive com Adoniran Barbosa. O coronel artista adora música e, além de compor, escreve também peças de teatro. Corria o ano de 1981. Da forma mais inusitada, a academia abriu o caminho de Arruda para a publicidade. Como parte da comissão de formatura, ele achou o convite para a cerimônia muito barroco e rococó –“nossa isso tá muito ruim, né?” Queria mudá-lo. Foi em uma gráfica e descobriu que ali só se fazia impressão. “Falaram que tinha um troço chamado agência de propaganda.” Arruda então pesquisou e soube da existência de Caio Luis de Carvalho, grande nome da indústria de eventos no Brasil, além de ter sido ministro do Esporte e do Turismo, presidente da Embratur e presidente da SPTuris. Carvalho apareceu no Barro Branco para avisar Arruda de que Roberto Duailibi, da DPZ, o esperava. “Peguei o ônibus elétrico e levei três horas pra chegar na Cidade Jardim.” 138
Ali, ninguém menos que Washington Olivetto e Neil Ferreira o ajudaram a melhorar o convite. “Pegaram meu convite e quebraram no meio, põe um traço aqui, põe brilho, chama o fotógrafo, não sei o quê...Eles tinham um Macintosh, uma coisa que ninguém tinha.” Nasceu outro convite. “Caramba! Como os caras conseguiram bolar isso? Aí mosca branca me picou.” — O que vocês estudaram? — Publicidade. Arruda decidiu estudar a tal publicidade após a academia. Duailibi o indicou a ESPM, onde estudou de 83 a 86, o que foi essencial para que “voltasse à sua geração”. “Em cinco anos de academia, eu fiquei alienado da linguagem da minha geração. Não sabia como ela falava, não sabia mais os dramas da minha geração, como o desemprego, que estava forte nessa época. Foi uma retomada ao meu papel imerso na sociedade. Eu tinha me isolado na academia, onde você não tem tempo pra nada.” Além da ESPM, Arruda tinha sua iniciante carreira na polícia. Nos primeiros quatro anos após a formatura, ele foi tenente de um pelotão do Comando de Policiamente de Choque. “Participei de invasão em penitenciária, casa de detenção, manicômio judiciário –coisas gravíssimas nessa fase da minha vida.” O episódio mais significante desses quatro anos foi uma rebelião em uma casa de detenção com nove reféns. O comandante da operação o mandou entrar com seus soldados para resgatá-los. Arruda entrou mal armado, conta. Não havia colete a prova de balas na época. Eram sete no total. Arruda com metralhadora, o sargento com uma espingarda calibre 12 e soldados com revólver. Entraram. Alcançaram a divineia, o pátio de entrada do presídio. De repente, 139
uma gritaria do lado de fora dos muros. Presos de três pavilhões vinham em uma operação chamada “cavalo doido”. Segundo Arruda, eram 2.500 presos correndo e gritando com pau, pedra e facão. Do pátio, os policiais viam a poeira levantando do outro lado do muro e logo “bum, bum, bum”. Começam a empurrar o portão. O caminho para a rua passa pela divineia. Os policiais pularam para um cercadinho de tijolo coberto. “Costas com costas. Cada um protege as costas do outro”, dizia o comandante. — Seguinte, eu atiro primeiro –Arruda disse aos colegas– E não percam munição, tem que atirar certo, não pode errar. Vamos derrubar quanto a gente conseguir aqui e vamos esperar que alguém resgate a gente. “Íamos ser massacrados. E aí os soldados de repente me jogaram pra cima na roda e sentaram em cima de mim. Eu comecei a dar soco: ‘sai daqui’. Eles estavam me colocando embaixo para me proteger”, conta. “Essa relação primitiva, pré-moderna, a gente não vê em empresas. O cara colocar o corpo dele pra proteger o comandante. Dar a vida pelo comandante. Como você explica uma coisa dessa?” O fato é que, na estrutura militar, a vida do comandante literalmente vale mais que a do soldado. A hierarquia é respeitada. Mesmo entre pessoas do mesmo posto, há hierarquia, segundo o tempo de serviço. Mesmo entre alunos, há hierarquia, segundo as notas. Ser sargento é ser mais que soldado. Ser tenente é mais que sargento. E ponto. As pessoas não têm o mesmo valor na corporação. Ser coronel é ser mais que todo mundo. Arruda chegou lá. Quem sobe a coronel ocupa o cargo por cinco anos e depois entra para a reserva –assim outros podem assumir o posto. O número de 140
coronéis não varia muito. Geralmente, um só vira coronel quando outro deixa de ser. Como, na prática, não dá pra deixar de ser coronel, a solução é ir para a reserva. “Na academia, nós éramos 190. Pouco mais de 50 fizeram o curso superior da polícia, que é o programa de doutorado da instituição, que habilita a promoção a coronel. Desses, só 23 foram coronéis. É bem piramidal.” Voltando à divineia prestes a ser invadida, Arruda e os subordinados foram salvos na última hora. Os presos não conseguiram derrubar o portão, os bombeiros entraram e os espantaram com jato d’água. Mas Arruda tem uma segunda passagem digna de nota no Choque: uma enorme manifestação contra os preços altos em São Paulo nos dias 4 e 5 de abril de 1983. “Um dia de saques e pânico” era a manchete da Folha de São Paulo no dia 5. “Manifestação de desempregados em Santo Amaro degenera em violência contra o comércio; muitos feridos; 70 presos.” Segundo informações de reportagens da Folha de São Paulo publicadas no dia seguinte, os protestos, iniciados em Santo Amaro, tomaram 40 km. No total, foram presos 566 manifestantes, houve 127 feridmos e uma pessoa morreu baleada. Em março, o governador Franco Montoro, eleito de forma democrática no ano anterior, havia tomado posse. No governo federal estava Figueiredo. Desemprego em cerca de 7% nas capitais. Inflação em 150% ao ano. Recessão pós “milagre econômico”. “Imagine o seguinte: as Forças Armadas querendo sair do poder enquanto era possível manter a dignidade e sair relativamente intocadas, mas havia uma parte dela que não queria a abertura política. Qualquer oportunidade que eles tivessem, iriam tentar o fechamento. Havia uma grande divisão das Forças Armadas nesse momento. O Geisel quase foi derrubado. ‘Vocês estão vendendo o Brasil para os comunistas, seus generais de merda’. Houve 141
atentado na ABI, explosão na banca do Estadão, atentado contra um carro da Folha, atentado do Rio-Centro. De uma forma ou de outra, todas foram manifestações de inconformismo da ala radical em razão da abertura política”, conta Arruda. No dia 5, a manifestação popular chegou ao Palácio dos Bandeirantes. As pessoas conseguiram derrubar as grades do palácio, mas foram detidas pela PM. Naquele momento, a polícia, por mais irônico que possa parecer aos críticos, “salvou” a democracia, segundo Arruda. “Se a invasão tivesse ocorrido, nós poderíamos ter um grave risco na democracia. Ficaria evidente que o governo de São Paulo não teria capacidade de manter a ordem pública e poderia ter tido interferência federal. A partir daí, já sabemos o que ia acontecer...” Montoro fez um pronunciamento e denunciou um plano de desestabilização em São Paulo para permitir intervenção federal. Depois da fala do governador, o secretário de Segurança Pública, Manoel Pedro Pimentel, elevou o tom: “a polícia sempre foi acusada de violência, mas agora vai agir sem medo de críticas.” Os jornais noticiavam que Figueiredo deixara o Segundo Exército de prontidão. “A violência se alastra e Montoro promete ordem”, era a capa da Folha no dia 6. As reportagens também denunciavam a violência na ação da PM para conter os distúrbios. Segundo Arruda, foram cinco dias de quebra-quebra em São Paulo. Destruição de trens e McDonald’s no melhor estilo black block. “Fiquei praticamente cinco dias e cinco noites com o Choque na rua. Meu subcomandante atendeu uma ligação do governador no orelhão na praça da República. Eu vi essa ligação.” — Governador, não precisa ter intervenção da segurança federal, nós temos capacidade, está tudo em ordem, vamos segurar isso aí. 142
“Se o Montoro sentisse que ia fraquejar, nós teríamos uma intervenção federal. Uma perturbação grave ao processo democrático que tava começando a se implantar. Depois disso, o Montoro se tornou muito próximo da PM. Junto com Paulo Egídio e com Claudio Lembo, talvez tenha sido um dos governadores que mais prestigiaram e respeitaram a polícia. Foi um grande amigo da PM. Quando ele entrava nos quartéis, a tropa o cercava. Quando ele entrou no governo, queria o fim da PM, mas depois gostou da polícia.” Os tempos de transição para a democracia estavam só começando. “Um dia, em 1985, eu estou descendo a rua Jorge Miranda e para um carrinho preto.” — Tenente, o senhor está estudando comunicação social? –perguntou o major. — Sim. — O senhor gostaria de trabalhar comigo no quartel general onde estamos montando uma equipe para trabalhar na abertura política? — Major, estou feliz no Choque. E quero me concentrar nos estudos. No dia seguinte, Arruda estava transferido para o tal quartel. O segundo posto de Arruda na PM foi na Comunicação Social, que tinha a missão de, após 20 anos de ditadura, reposicionar a polícia para trabalhar no regime democrático. Na época, a Secretaria de Transporte acabara de fazer um projeto para que os policiais fardados pudessem usar o metrô de graça para melhorar a segurança. Algo hoje comum, era inovação na época. A primeira campanha de comunicação de Arruda foi, então, para explicar aos PMs como agir, já que muitos chegavam na catraca, esperavam “dois décimos de segundo” e, se 143
ninguém aparecesse para liberar a entrada, simplesmente pulavam. “Ele é autoridade, então pulava. Só que se uma autoridade pula, duas mil pessoas pulam junto. E o metrô em três dias queria cancelar o convênio.” O terceiro posto na carreira foi de diretor de comunicação social do Centro Civil da Casa Militar do governo de São Paulo. De 1989 a 1990, trabalhou bem próximo ao governador Orestes Quércia. Arruda já era então capitão. “Foram dois anos muito interessantes pra conhecer como é o poder de perto.” Foi nessa época que a defesa civil foi incluída nas leis orgânicas municipais de 80 municípios, sendo São Paulo um deles. “Nós conseguimos fazer um lobby junto ao presidente da Câmara, dizendo que era importante inserir a defesa civil na lei orgânica.” O presidente era Eduardo Suplicy, do PT, que prometeu defender a inclusão da defesa civil, o que acabou sendo feito. Mas aí é que começa a história. Quando o deputado Paulo Caruso, do PMDB, ficou sabendo e falou com Arruda na ante-sala do governador. — Como você, capitão, entrega algo de tamanho peso político para alguém da oposição? — Nós estamos fazendo isso com todas as câmaras municipais, vereador. A defesa civil é suprapartidária, então falamos com o presidente da Câmara não importa o partido. — Não é assim, você deixou de dar visibilidade para o seu partido! — Desculpe, qual é o meu partido? Não sou filiado a um partido político. — Pode deixar que vou falar com o governador e nós vamos travar esse projeto lá na Câmara.
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“Ah, aquele dia...”, lembra Arruda sorrindo, mas como se pudesse sentir a mesma raiva novamente. — Pode falar agora, porque se você não falar, meu chefe vai falar. Então, por favor, fale com o governador e eu vou falar com o meu chefe da área militar, porque o que está sendo feito o governador sabe. “Ele resmungou e foi embora.” Desse episódio, a sábia lição: “se Jesus Cristo voltar hoje e falar que precisa de duas diárias pra ficar no Fórmula Um, pagando R$ 180 e mais R$ 8 pro café da manhã, se for interessante politicamente, os caras põem Cristo no High; se não for, eles falam que não tem dinheiro pro Fórmula Um. E o interesse público? Onde fica?” Se entre os políticos a coisa estava feia, a esperança do capitão vinha de baixo –das lideranças comunitárias com quem trabalhou nessa época. Lideranças, por vezes, de populações miseráveis castigadas por calamidades. “No natal, dia 24 de dezembro, não lembro se era de 89 ou 90, eu recebi um pedido da Funai a respeito de índios que estavam internados na Casa do Índio na rua Apeninos, na Aclimação. Houve uma epidemia na casa e eles tinham que tirar 40 índios de lá.” A Casa do Índio era um local de apoio, onde os indígenas ficavam às vezes o tempo necessário para terminar um tratamento. Arruda começou a ligar para hospitais e casas de repouso para alojar os 40 índios. “Eu tinha sido convidado para jantar na casa de uma família alemã, de um colega da ESPM. Os pais do meu amigo eram alemães, muito formais, maravilhosos, me queriam bem como a 145
um filho. Eles marcaram o jantar às 19h. Quando cheguei com a minha mulher, às 22h30, seu Frans estava na porta batendo o pé. ‘Muito bonito! Nunca vi militar atrasar assim que nem o senhor’. Ficou muito bravo porque eu tinha atrasado, né?” O próximo cargo foi como professor de história da PM na Academia do Barro Branco, o que durou quatro anos. “Foi um tempo muito feliz também.” Próximo da formação dos oficiais da polícia, Arruda garante que em São Paulo não existe mais aquelas aulas à la Tropa de Elite, com agressões e humilhação. “Se houver um caso desse, o camarada está desligado do corpo docente.” O coronel reconhece, porém, que outras instituições Brasil afora ainda agem assim e é preciso lutar contra a prática. Se um aluno é mal tratado, entende que é isso que a polícia quer dele e, por sua vez, age assim com a população, argumenta Arruda. “Você tem que tratar o aluno como autoridade desde o primeiro dia. Tratar com respeito e com responsabilidade. Porque nós temos uma tendência a infantilizar o aluno, pensar que o aluno é um ser não pensante. E não é verdade. Você tem um tempo muito curto para desvestir o homem velho e vestir o homem novo, como dizia o Paulo Apóstolo. O jovem é fruto do ambiente onde foi formado e dos valores familiares que recebeu. Ele vive no meio de um senso comum que pode ser de ‘bandido bom é bandido morto’. Você tem que desvestir aqueles valores antigos que ele tinha e dizer que direitos humanos é pra todo mundo. Se você tem a alternativa entre matar e não matar, sendo ambas as alternativas legais, você tem que não matar.” O quinto cargo foi na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Sua função, dessa vez, era trabalhar com os Conselhos Comunitários de Segurança, os incipientes Consegs. 146
“Eles tinham sete anos de vida, mas eram pequenos, não tinham regra, legislação, cada um fazia o que queria.” Era o ano de 1995, o mesmo em que Arruda se separou. Falido e sem família, ele se dedicou mais do que nunca aos Consegs –um grande empurrão para o que seria o tema da sua vida, as minorias. Durante a semana, Arruda participava de reuniões dos Consegues de todo o Estado –se lembra em especial de uma que foi invadida por uma cobra, causando confusão. Conheceu mais de 300 municípios do interior paulista. “Aprendi umas regras importantes das comunidades, por exemplo, as pessoas aceitam uma resposta que as desagrade, mas não gostam de ser engandas.” Assim, o diálogo sincero era importante e o policial dava orientações: “não dá pra seguir esse caminho, vamos fazer assim...” “Então criamos a legislação do Conseg, criamos sua formatação atual naquele período. E fizemos 22 treinamentos com líderes dos Consegs em pontos diferentes do Estado.” Segundo Arruda, o Conselho Comunitário de Segurança é uma entidade civil vinculada por adesão a normas gerais vindas da Secretaria de Segurança Pública. Seu objetivo é otimizar o diálogo entre o governo, a polícia e a sociedade civil. E, claro, Arruda faz a propaganda. “É a mais bem sucedida experiência de participação comunitária e segurança no país. Nós temos em São Paul mais de 600 Consegs implantados.” Foi através deles que Arruda foi saindo do seu mundinho de Araras. “Acabei trabalhando bastante com muçulmanos e judeus. Aprendi um pouquinho sobre o islã, fiquei encantado, não sabia nada sobre o islã. Tenho hoje grandes amigos no islã, e na comunidade judaica também.” Mesmo tendo acompanhado tantas reuniões de tantos Consegs diferentes, o policial guarda os bons personagens do pe147
ríodo e faz questão da digressão para mencionar, por exemplo, Maria do Carmo Espírito Santo, professora de Belo Horizonte, que morreu neste ano. “Ela foi para a guerrilha do Araguaia. Ela me mostrou um livro onde estava o nome dela: ‘desaparecida em ação na guerrilha do Araguaia’, mas era um nome falso que ela usou. Ela veio a pé do Paraguai, de carona, caminhão, foi presa, torturada e, depois da redemocratização, foi ser professora. Assumiu cadeira na escola, casou e se tornou uma grande líder comunitária em Diadema.” — Maria do Carmo, por que a senhora não entrou com pedido de pensão? A senhora foi torturada, a senhora tem direito à reparação. — Que reparação! Olha pra minha cara, coronel. Eu fui para lá sabendo o que eu ia fazer. Agora é justo penalizar a sociedade por um ato que foi de minha decisão? Não é correto. “Em compensação, umas pessoas aí pra quem falaram ‘ó, a garrafa de café que você está recebendo na redação eu vou cortar porque você é comunista’. Aí o cara fala: ‘me ofendeu’ e pede reparação.” Mas tudo bem. Arruda prefere ficar nos bons exemplos. É mais do tipo de bem com a vida do que revoltado. Satisfeito, ele segue: “conheci lideranças comunitárias maravilhosas, o que me restaurou a fé no país. Porque a gente ouve falar de tanta picaretagem... Houston, Siemens, mensalão, mensalão mineiro, Zé Dirceu... Tanta picaretagem que a gente acha que o país inteiro é assim, mas não é. Tem milhões de pessoas silenciosas, anônimas, que não ganham nada por isso e fazem coisas maravilhosas pela comunidade, como a Maria do Carmo por exemplo.” Os Consegs trilharam para Arruda um caminho sem volta: do trabalho com as comunidades à defesa das minorias. E 148
aí encontramos uma das melhores histórias do coronel: um quiprócó em Campinas, onde travestis estavam atendendo em bairros de elite. Estamos em 2004. “Houve uma invasão de travestis em um bairro nobre de campinas –e isso é uma tragédia social no bairro. O bairro estava em pé de guerra. Eu fiquei umas duas noites vendo como funcionava o movimento e vi que chegavam vans de oito cidades da região. As vans às 20h despejavam os travestis e de manhã iam buscar.” Teatral, Arruda inventa uma simulação para dimensionar o tamanho da encrenca. “Você chega no seu prédio à noite e tem o travesti com o cliente fazendo sexo na frente da garagem do seu prédio. Você tem que esperar porque, se você buzinar, eles jogam camisinha, fezes, sangue no seu carro. Obviamente, quando você subir, vai subir chorando. — Pai, aconteceu isso e isso e isso... Obviamente, seu pai vai ficar nervoso. — Cadê minha arma? Vou dar um tiro nesses filhos da puta. Aí sua mãe vai falar: — Calma! Calma! Calma! Ai meu Deus, seu pai! Segura! Aí o morador descontente resolve se mudar. Chega um advogado e fala: — Doutor, o senhor não gostaria de alugar o seu apartamento? 149
— Quero sim. — Quanto o senhor quer de aluguel? ‘Vou pedir alto’, pensa. — Seis mil de aluguel. — Está bom. Eu posso pagar seis meses adiantado par ao senhor? ‘Nossa, nossa, resolvi meu problema!’ Só que aquele apartamento, eles transformam num prostibulo. Imagina um prédio residencial com três prostibulos. Porque o problema não é o ato em si, são os crimes que cercam o mercado da prostituição: entorpecente, arma de fogo, menor, roubo, exploração de pessoas, tráfico de pessoas.” Estamos, então, na primeira reunião com a comunidade, organizada por Arruda, para resolver o problema. Havia até faixas “fora daqui seus travestis”. — Todas as partes estão reunidas aqui? –pergunta Arruda, agora no cargo de major. — Sim, tá todo mundo. — Cadê o presidente dos travestis? — Como?!?!?! — Todas as partes têm que estar representadas Nisso, um velhinho levanta e vai embora. Mais algumas pessoas fazem o mesmo. — Gente, temos que resolver o problema com os principais partícipes dessa história. 150
Duas travestis que faziam um trabalho de prevenção à Aids com o grupo são levadas à reunião para representá-las. “Foi a primeira vez na minha vida que eu falei com uma travesti. Já tinha abordado na rua, etc... Mas falar como nós estamos falando aqui, foi a primeira vez”, lembra Arruda. — Olha, os moradores estão aqui primeiro. Então, vocês têm que achar um ponto seguro pra vocês trabalharem. Nós vamos colocar uma viatura pra vocês lá porque vocês também são vítimas de violência. Tem que ser um ponto seguro, iluminado, onde as pessoas possam procurar vocês. Não pode ter menor, vamos bater duro em cima de tráfico de drogas, arma de fogo... Mas enquanto vocês estiverem lá com os clientes adultos, não temos nada com isso. Nós vamos, aliás, proteger vocês. — Então vamos escolher uma praça? — Vamos. “Todas tinham até a sexta série de escolaridade. Por quê? Porque a história se repetia. Ouvi a mesma história 15 ou 20 vezes. De Minas, Maranhão, Paraíba, interior de São Paulo, e vão todas para a cidade grande.” — Major, quando eu tinha doze anos, eu descobri que minha orientação sexual era diferente do meu fenótipo, eu gostava dos meninos, então os meninos me espancavam na escola, a professora não sabia como lidar. Tudo que era tarefa de meninos, a professora passava para mim, zombavam de mim. Até o dia que meu pai ficou sabendo e disse que preferia ter um filho morto a veado, me espancou e eu saí de casa. Aí fui pro posto de gasolina... 151
— Quanto você ganha por programa? — De 50 a 150 reais. Um programa de 20 minutos. Eu tenho clientes que são empresários, com carro bom... Se eles assumirem a condição passiva na relação e não usarmos camisinha, eles pagam o triplo. — Qual o índice de infecção de Aids do grupo? — 70%. “Sua cabeça vai a mil, né? O cara se expõe a contrair Aids! É uma patologia, é um problema patológico. Não é possível o cara se expor dessa forma ao risco de contrair Aids e exigir que a relação seja mantida sem preservativo.” — Bom, vocês têm que sair da rua –argumenta Arruda, disposto a tirá-las daquela vida. — Posso trabalhar na polícia? — Não. — Juiz de direito eu posso ser? — Não. — Posso ser médica? — Vai ser difícil... — Será que um consultório médico me contrata para ser secretária? — Acho bem difícil. — E nas lojas Marisa? Será que eu posso ser balconista? — Não. — E em banco? — Não. — Mas o senhor quer que eu trabalhe onde? “Pra mim foi muito chocante isso. Foi o grupo mais excluído com que eu já trabalhei até hoje. É um mundo paralelo. Para mim 152
foi tudo novo. Aí que eu fiquei sabendo que travesti é ‘ela’, o homem que se traveste é ela. Eu não sabia também.” Arruda então entrou em contato com pessoas da Secretaria do Trabalho para tentar achar empregos para as travestis e, depois de um estudo, concluíram que as opções possíveis seriam de auto-emprego, já que ninguém contrataria travestis. “Eles fizeram um programa de renda e emprego para essas travestis. Elas iriam trabalhar em customização de roupas. Elas modelavam lingerie para homens e faziam roupa pra pets. Quando eu saí de lá, oito tinham saído da rua, o que é pouco, mas são oito vidas. Eu considerei uma vitória razoável porque se uma saísse, já estava bom.” Em 2005, o sexto trabalho na PM: comandante do 2º batalhão, na zona leste. “Ouso dizer que foi a unidade onde eu fui mais feliz na minha vida. Fiquei três anos comandando policiamento lá.” Arruda assumiu o posto em abril como comandante interino e foi efetivado em agosto, quando subiu uma patente no oficialato, tornando-se tenente-coronel. Já no ano seguinte, Arruda enfrentaria a onda de ataques do PCC. No dia 12 de maio, foi chamado pelo comandante da capital e foi avisado, ainda durante a tarde, que haveria ataques na sua região. Arruda avisou seus capitães: preparem-se! Porém, incrivelmente, não havia uma metodologia para lidar com a situação. “Como eu li muito material da historia da instituição, eu me baseei exatamente no modo de lidar com o terrorismo. Colocamos viaturas em pontos distintos que mantenham contato visual, mas que formem múltiplos alvos –se for atacar, tem que atacar dois ao mesmo tempo– e diminuímos a luminosidade. Essa norma acabou se tornando uma norma padrão na polícia naquele momento, mas saiu do meu batalhão. Tudo baseado na experiência dos anos 1960, quando havia ataque dos grupos armados.” 153
Arruda deu a ordem: queria uma arma longa e uma força de resposta (com motos e Força Tática) em cada base. Durante a noite, foi vistoriando suas companhias. — Cadê o comandante? — Ah, o comandante não está aqui, ele ligou. — Mas e a arma longa? — Ah, não tem. Irritadíssimo, o tenente-coronel reuniu seus capitães. — Eu dei uma ordem e ela não foi cumprida como eu determinei, os senhores não passaram nas bases e nem nas companhias, não mandaram forças-resposta e tem companhia que não tem arma longa. Temos notícias de ataque já chegando pelo vale do Paraíba, Poá, Suzano. Esses ataques vão chegar aqui. Se eu vir algum ataque à base ou algum policial ferido e minha ordem não tiver sido cumprida, pode preparar a escova de dentes que vocês vão dormir no Romão Gomes. “Aí tocou o que a gente chama de ‘barata voa’. Sabe quando você acende a luz e a barata voa?”, riu Arruda. São dez e meia da noite. Finalmente, as companhias estão preparadas e todas as ordens foram cumpridas. Arruda já pode ir pra casa. Quando estava na Marginal Tietê, recebe uma ligação. Houve uma tentativa de ataque, mas, graças à força-resposta, não houve feridos. “Na época, infelizmente a Sheherazade não estava na mídia, porque ela teria falado várias coisas ricas como ela tem falado ultimamente, mas já tinham os cretinos falando bobagem na mí154
dia como sempre tem. ‘Vamos reagir vigorosamente’. Comecei a receber as mensagens do comando-geral: ‘vamos reagir vigorosamente’. E recebemos a ordem de que policiais com restrição de rua poderiam voltar para o policiamento.” Os policiais com restrição de trabalho na rua são, geralmente, aqueles que se envolveram em ocorrências de morte, o que, para Arruda, evidencia o cuidado da PM com a questão da letalidade, que foi drasticamente reduzida desde os anos 1980. “E isso não foi conseguido assim de graça. Isso foi muita coragem de vários comandantes que vieram dos anos 80 pra cá batendo duro pra não permitir, porque, se soltar, a coisa vai lá em cima.” Quando entra no tema da letalidade, Arruda abandona a expressão leve do rosto. O assunto é sério. “O Estado não é vingador. Se a lei não é suficiente, a democracia está aí pra isso. Vamos discutir e mudar. O que não pode é ficar estimulando a polícia a matar bandido, porque não é papel dela. É muito fácil você transferir pra policia a responsabilidade que não é dela. Todo mundo se omite e, se der algum problema, pune o cara, põe na rua. É uma irresponsabilidade de governantes fazer uma coisa dessas, ficar estimulando esse tipo de situação. É uma irresponsabilidade de comandantes também. Tem comandante que fica falando ‘é faca na caveira’. Esse comandante devia sentar junto nos banco dos réus depois, mas não senta. E o governador muito menos, e o secretário de segurança também não. A gente tem que parar de ser inocente. O político continua no cargo dele e o idiota que faz isso é condenado. Houve nos anos 80 e 70 irresponsáveis que ocuparam secretaria de segurança que faziam premiação de policias por resistência seguida de morte. Imagina você premiar um policial porque se envolveu em ocorrência de morte. A polícia é mais do que defensora dos direitos humanos, é promotora deles. Tem que falar: pessoal, o Estado não é vingador.” 155
Mas Arruda não deixa de também defender a corporação ao lembrar que, na capital, são 45 mil chamadas de 190 e não acontece nem 0,01% de erro, já que não há 4,5 mortes de inocentes por dia. “0,001%, ou seja, 0,4 morte de inocente por dia pode acontecer. Isso é um caso de erro a cada 90 mil chamadas.” Para o coronel, o policial que faz justiça com as próprias mãos pensa assim porque vem de uma sociedade que pensa assim –e sua formação na polícia não o convenceu do contrário. Contudo, Arruda vê que a valorização dos direitos humanos é um pensamento crescente na PM, mas ainda não dominante. “Se nós tivermos que pontuar fatos históricos, eu diria que uma mudança vem desde a Favela Naval. Em São Paulo, isso foi mais importante que o Carandiru. O Carandiru foi uma tragédia. Uma operação mal conduzida, mal planejada, uma decisão política prevalecendo sobre uma decisão técnica. A tropa estava apavorada que os detentos iam dar injeção com sangue infectado com Aids. À frente da tropa estava um líder carismático, era o Ubiratan Guimarães. Ele entrou na frente para acalmar a tropa. Quando ele entra, é ferido. Um soldado sai com ele no colo e fala ‘mataram o comandante’. E aí deu no que deu... Mas não teve a repercussão de causar vergonha no público interno. A gente teve a consciência seguinte: quem estivesse no Choque teria participado desse episodio do Carandiru. Amigos meus que eu conheço profundamente, gente comprometida com direito humanos estava lá. Uma loucura. Agora, a Favela Naval foi diferente. Os policiais chegavam em casa e a mulher dizia ‘é assim que você trabalha na rua? Você atira nas pessoas, você bate nas pessoas?’. Isso levou a uma grande reflexão do público interno sobre o papel da PM. Foi quando surgiu policiamento comunitário.” Só que agora, diante do PCC e com as restrições de policiamento suspensas, esse cuidado com as taxas de letalidade parecia 156
ter desaparecido. É uma e meia da manhã. Arruda reúne em seu gabinete seus comandantes de companhia, de Força Tática e os sargentos de policiamento de rua. — A mídia está pressionando pra gente sentar o dedo na malandragem. Quero dizer uma coisa pra vocês: o diabo não é inteligente, só é velho. Ele já viu acontecer isso antes. Então, se você não quiser estar daqui a um mês sentado sozinho no banco dos réus com essa mesma imprensa e esse mesmo político, que estão te exaltando agora, pedindo tua cabeça, não façam bobagem. Eu não tenho que provar pra vocês se sou homem, se sou macho, se sou bom de porrada. Eu não tenho que provar isso. Eu sou o comandante de vocês. Minha missão é não deixar vocês fazerem merda, então não façam bobagem. O comandante-geral não vai segurar, nem eu, nem governador, nem secretário, ninguém vai segurar. Quem fizer merda segura sozinho. E não deixe seu subordinado fazer merda também. Le-ga-li-da-de. Vamos fazer de acordo com a lei. A população e a opinião estão do nosso lado. Não vamos perder a opinião pública. Não quero ninja, não quero atentado, não quero sair caçando. Se vocês souberem de algum delinquente que atacou base nossa, atacou policial nosso, matou algum inativo nosso, vocês tragam o nome pra nossa inteligência, nós vamos levantar essa pessoa e nós vamos buscar essa pessoa. Um por um. E nós vamos trazer conforme o cliente desejar. Se ele se entregar, ele vem vivo, se não se entregar, ele vem morto, mas ele vem. A princípio vivo. Mas nós vamos agir com inteligência, com rapidez, com planejamento, com discrição. Trazendo um por um desses que atacaram policiais da nossa área, mas não quero bobagem. E eu to sabendo que tem gente entrando em 157
favela e dando tiro pro alto. Eu não quero que vocês vão perturbar pobre. Pobre já tem problema demais pra resolver. A favela está do nosso lado, não vamos perder a favela. Alguma dúvida? Não? Então, bom trabalho. Um detalhe dessa época de ameaça do PCC é que um ativista do movimento LGBT, diretor de uma ONG de defesa da diversidade sexual, Edson Azevedo, que Arruda conheceu no trabalho com as travestis, chegou a ligar oferecendo “uma rede de casas seguras” para abrigar policiais e suas famílias que estivessem sob risco. “Eu achei de uma dignidade extraordinária.” Mas não foi pela estratégia de defesa contra o PCC traçada no seu batalhão e adotada por toda a polícia que Arruda se tornou celebridade na PM. Foi por outro delicadíssimo episódio em seus anos de comando na zona leste. Estamos em 2005. Duas alunas da USP Leste estão se acariciando no campus. A policial Diana, da Ronda Escolar, resolve abordá-las e, por sua vez, é cercada por mais de 80 alunos. — Alguém chamou você aqui? Alguém pediu sua presença? – diziam. — Olha, gente, a USP é lugar de família. E Arruda dá gargalhadas contando a história. “Lugar de família!”, ele ri. Diana acabou levando as meninas para a delegacia. O episódio veio a público em outubro e, segundo matéria da Folha de São Paulo, teria ocorrido no dia 30 de setembro, embora o coronel insista que foi em junho. O fato é que Arruda só ficou sabendo quando recebeu a ligação do comandante responsável pelo policiamento na área da Cidade Universitária, o campus Butantã da USP. 158
— Ô, Arruda, você está sabendo que a congregação está reunida aqui na Reitoria? Pra proibir o acesso da PM aos campi da USP. — Não... mas por quê?! — Por causa de uma merda que vocês fizeram aí na USP Leste. — Como uma merda? — É... vocês fizeram. O tenente-coronel Arruda aciona seu P2, o sargento responsável pela inteligência no batalhão. — Comandante, foi um ato obsceno e houve uma intervenção policial lá. Mas foi uma coisa simples. Os policiais conduziram as meninas, mas o termo já foi arquivado. Arruda, então, procura o tenente, responsável por fiscalizar as patrulhas. — Ah, comandante, eu nem fui lá, era uma bobagem, um ato obsceno... Só aí ele se dá conta do “tamanho da merda”. — Gente, isso não é ato obsceno. Isso é intolerância! O que vocês estudaram sobre isso? Nada... — Eu sou velho e estou ultrapassado, então eu tenho direito a ser preconceituoso. Mas até eu aprendi que isso se chama intolerância. E vocês que são jovens não aprenderam ainda? 159
Não... — Hoje é quinta-feira. Domingo vai estar isso na mídia do mundo inteiro. Tenente e sargento se entreolham, incrédulos. Mas não deu outra. Domingo, 9 de outubro, enquete no Fantástico: Você achou correta a atitude da policial militar? 56% votaram não. Na segunda-feira, Arruda recebeu um ofício da Secretaria de Justiça pedindo a apuração do caso e providencias em relação à policial. As meninas foram chamadas ao batalhão e foram interpeladas pelo subcomandante. — A policial foi agressiva? — Não. — Como vocês foram para a delegacia? — Ela disse que poderíamos ir no nosso carro, mas preferimos ir no dela. — Tinha grade? — Não, fomos no estofado mesmo. — Vocês querem processar a policial? — Não. Elas e os advogados assinaram o depoimento e deu-se por resolvido. Arruda não puniu Diana, mas a transferiu de área. Disse que ela agiu como mãe, nordestina e evangélica, ignorando as normas para o caso. Horas depois, vem uma senhora do Jardim Keralux, um bairro pobre vizinho à USP Leste, bater na porta de Arruda com um almaço com 250 assinaturas pedindo a permanência de Diana. 160
— O senhor é o comandante que protege veado e sapatão? — ?! — Tô sabendo que o senhor e seus amiguinhos veados e sapatões estão punindo a Diana. Até que a senhora ouviu da própria Diana que ela não havia sido punida, mas transferida. — Então tá bom, mas é o seguinte: você avisa os seus amiguinhos lá da USP que lá dentro eles podem fazer a putaria que eles quiserem, mas aqui fora nos somos evangélicos e somos gente decente. Se começar a beijar menina aqui fora nós vamos quebrar o pau. Parece que o problema não estava tão resolvido assim. Arruda previa que os choques entre USP e Jardim Keralux iam sobrar pra PM e teve uma ideia. Ligou para um advogado do movimento LGBT com quem trabalhara no quiprócó das travestis de Campinas. — Então, cara, aquela PM do caso na USP é minha soldada. — Puta, Arruda! Que chato... — Não. Melhor assim. Agora a gente resolve esse problema. Eu sou ignorante nesse assunto, um pouco menos por causa do nosso trabalho em Campinas. Mas meus efetivos são muito mais ignorantes, ninguém sabe nada desse assunto. Eu preciso preparar eles pra lidar com diversidade. Você me ajuda? — Claro! — Me ajuda a montar um curso pra preparar meus policiais.
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Arruda e mais três lideranças LGBT começaram a planejar um curso e levantar nomes de convidados. Até um teatro do oprimido nos moldes Paulo Freire foi sugerido, mas logo vetado pelo comandante –“isso não passa na minha instituição”. Um tenente que havia estudado direito homoafetivo ficou responsável por criar situações concretas, como um casal gay que chega em um restaurante provocando a ira dos demais clientes ou uma travesti que quer usar o banheiro feminino, e os alunos debateriam como o policial deveria agir. Só faltava um local para as aulas, além da aprovação do comando da PM, claro. Arruda foi falar com o coordenador da USP Leste, que achou a ideia ótima e topou ceder uma sala de aula. “Mas eu pedi um favor, disse que a PM era muito ortodoxa e que o projeto ainda teria que ir para o comandante da ZL que iria mandar para o comandante da capital, etc. Só quando todos aprovassem, poderíamos acertar a parceria com a universidade.” Ocorre que a proposta do curso vazou e acabou veiculada na Folha de São Paulo. Arruda se lembra o mês: dezembro. O nome do jornalista: Ricardo Gallo. E a manchete: “PM quer aprender com gays a lidar com gays.” “Com auxílio de um transexual e de um bissexual, a Polícia Militar planeja para fevereiro um curso inédito, de dois dias, destinado a cem policiais militares da zona leste da cidade, para capacitar os integrantes da corporação a lidar com gays, lésbicas e travestis. O curso, que ainda depende de aprovação do comando da PM, está em fase de articulação pelo 2º Batalhão de Policiamento Metropolitano da Capital. As aulas estão previstas para ocorrer nos dias 9 e 10 de fevereiro na USP Leste, onde, em setembro, duas universitárias foram levadas à delegacia por uma PM porque se beijavam. 162
[...] ‘Sentimos que há a necessidade de um conhecimento mútuo [entre polícia e entidade de defesa de minorias]. As pessoas têm de saber o papel da polícia na sociedade democrática’, disse o tenente-coronel Luiz Eduardo Pesce de Arruda, comandante do 2º Batalhão da PM.” “Quando essa matéria veiculou, o mundo caiu na minha cabeça. Primeiro, o comando todo ligando pra mim: ‘Arruda você está louco? Você toma uma decisão dessa sem falar com o comando? Você está expondo a instituição!’ Foi um inferno.” — Filho, o que está acontecendo? – liga a mãe, lá de Araras. — O quê, mãe? — Filho, eu sou sua mãe, comigo você pode se abrir. O que está acontecendo, filho? — Ah... a matéria da Folha. Mãe, se a senhora quer saber se eu sou gay, eu não sou. Eu sou heterossexual. — Então porque você fica se metendo com essas coisas aí? Está todo mundo na cidade dizendo que você é veado. — Mãe, o que a senhora quer que eu faça? “Carl Marx dizia: tudo que é humano me interessa. Se é humano, merece minha proteção como policial. Como pessoa física, eu sou católico, sou heterossexual, tenho uma família, me casei de novo, tenho um filho do segundo casamento, tenho uma visão de mundo pessoal, minha. Mas como policial, todas as pessoas merecem minha proteção. Até o delinquente.” Arruda virou piadinha de grupo de e-mail de policiais. “Será que vamos ter que usar batom em vez de tonfa ou anel de diamante em vez de algema?” ou “Antes era proibido, de163
pois era tolerado, agora o Arruda quer tornar legal, então quero morrer antes que seja obrigatório.” O coronel reclama especialmente da crítica feita pela colunista da Folha, Barbara Gancia, que escreveu: “O ano de 2006 já começa fervendo. Caso receba a aprovação do comando da PM, nos dias 9 e 10 de fevereiro, o 2º Batalhão de Policiamento Metropolitano da Capital irá realizar um curso para ensinar cem policiais da zona leste a lidar com gays, lésbicas e travestis. As aulas serão ministradas na USP Leste, onde, em setembro, duas universitárias que trocavam beijos em público receberam voz de prisão de uma policial militar. Segundo o tentente-coronel Luiz Eduardo Pesce de Arruda, comandante do 2º Batalhão, um dos benefícios do curso será diminuir, entre os policiais, a carga de preconceito contra os homossexuais. Será que entendi direito? É o caso de perguntar se estamos vivendo em outro planeta ou se, aqui na terra, os homossexuais continuam a ser seres com uma cabeça, dois braços, duas pernas e um coração, tal e qual os policiais que irão tentar ‘decifrá-los’. Para evitar abusos como o da detenção indevida das duas jovens da USP Leste, não seria suficiente que os policiais conhecessem as leis que devem ajudar a impor? Se a moda pega, daqui a pouco vamos ver a Polícia Militar oferecendo cursos específicos para lidar com loiras, com cidadãos de olhos azuis e com gente da terceira idade. E já que a intenção é tentar compreender melhor o próximo, não seria mais proveitoso começar instruindo os policiais a não tecer julgamentos precipitados baseados na cor da pele ou no nível social?” “Ela foi injusta comigo. A crítica dela foi injusta. Um dia vou conhecê-la pessoalmente e vou falar pra ela isso. Ela disse que eu queria tratá-los como se fossem pessoas diferentes, mas há sim 164
uma legislação diferenciada. É uma minoria, e tem aspectos importantíssimos de natureza psicológica, cultural, legal que são diferentes. Como idoso, também tem legislação especifica. Criança também. Não estou dizendo que é um ser de outro planeta, estou dizendo que merece um recorte acadêmico [da polícia] porque tem legislação específica que trata do assunto. Adolescente, por exemplo, tem a psique do adolescente. Tem que tratar em específico.” “Disseram que eu queria dar aula na USP, que eu queria ser deputado federal, que eu era veado, enfim... Aí eu recebi três ligações. Um coronel que me disse ‘Arruda, fique tranquilo, o caminho é esse mesmo, está certo’. Me ligou a Heloísa Fernandes, filha do Florestan, uma socióloga maravilhosa. E recebi uma ligação da Ruth Cardoso.” — Aqui é a professora Ruth. — Ruth? — É, a Ruth Cardoso... — A senhora esposa do presidente Fernando Henrique? — Isso mesmo. — Oi, professora, pois não... — Olha deve estar muito difícil para o senhor, mas fique tranquilo. Eu estou muito orgulhosa, o senhor é muito corajoso, quero muito conhecê-lo pessoalmente. Todo satisfeito, Arruda conta que se encontraram no shopping e Ruth lhe deu um beijão. Foi o que ele ganhou de bom. De resto, a PM não aprovou o curso, alegando que os direitos humanos já eram tratados na formação policial e Arruda saiu mais que queimado. “Não sei como não perdi o comando, acho que eles ficaram com medo de tirar e dar mais polêmica.” 165
Polêmica é o sobrenome de Arruda. Não satisfeito, resolveu inventar outro curso: aulas preparatórias para bolivianos ingressarem na PM. “Uma ação de discriminação positiva para entrar boliviano na PM porque nós temos mais de 500 mil bolivarianos em São Paulo e não temos nenhuma interlocução com eles. Eles são explorados e ganham uma miséria, quando o tráfico cooptar essa comunidade, estamos ferrados. A gente quer acelerar o processo de inclusão desses imigrantes no Brasil. Vamos preparar 60 meninos desses pra trabalhar na PM, se 20 entrarem, desses 20, três vão ser oficiais e um vai ser juiz de direito.” A reação novamente foi negativa: mas e os pobres brasileiros, você não vai ajudar? “Mas o brasileiro já está na polícia”, argumenta. Repentinamente dominado por um ar de aparência e desânimo, desabafa. “Eu lembrava da Cecília Meireles. Há momentos em que eu me sinto tentando explicar pro deserto e pra geleira o significado da primavera.” Mas a primavera não demorou. Já em 2006, um homossexual foi agredido na Praça da República ao ponto de perder um rim. Na época, o secretário de segurança foi questionado sobre como a PM foi preparada para lidar com a diversidade sexual. Felizmente, uma assessora do secretário sabia sobre a tentativa de curso na USP Leste, o que ressuscitou a ideia. Segundo Arruda, o curso agora faz parte das aulas curriculares na Escola de Soldados e no Barro Branco. Avançando na carreira de Arruda, chegamos a sua promoção como coronel. Para subir de tenente-coronel a coronel, é preciso fazer um doutorado na PM. Depois de tentar duas vezes (na primeira ainda estava queimado com a história da USP Leste), Arruda foi aceito para o doutorado com uma tese sobre segurança pública em microcomunidades, um estudo que foi publicado pela PwC (PricewaterhouseCoopers) como um prêmio de direitos hu166
manos que eles concediam. A tese fez uma pesquisa com síndicos de prédio, pastores evangélicos e coordenadores de ponto de táxi e descobriu que uma minoria sabia dizer o nome de um policial da sua área. “Estão juntos na rua e não se conhecem”, disse Arruda. “Você não pode confiar em alguém que você não conhece.” “A vida profissional me ensinou que a pessoas não querem um super policial. Querem alguém que seja confiável, que seja capaz de ajudá-las a resolver problemas e que seja solidário a elas. O policial vê tanta desgraça, gente amputada, sem cabeça, assassinada. Aí uma senhora bate o carro dela, levando a criança pra escola. O policial diz que não foi nada, mas, para aquela mulher, aquele episódio foi o mais grave da vida dela. O policial não pode perder essa consciência.” Como tantos outros fardados, o coronel acredita que o futuro está no policiamento comunitário. “Do modo como está, está no limite, não consegue expandir, e eu não vejo outra saída que não seja um policiamento muito próximo da população.” A base do pensamento é que, se um policial não conhece o bairro e atua ali esporadicamente, esse policial tenderá a ser agressivo para impor sua autoridade onde não é conhecido. Além disso, um jovem que para aquele policial é um infrator, para a comunidade é um cara que nasceu no bairro, e as pessoas não hesitarão em ficar do lado dele caso seja maltratado. “Aí o PM mata o moleque num confronto lá no bairro e o que acontece com os outros moleques? Vão para a rua e queimam pneu em protesto contra a PM. Dizem que é o PCC. Não é o PCC nada, é uma reação espontânea. Assim você não tem a população com você.” “Mao Tsé-Tung, no Livro Vermelho, dizia as condições de você se relacionar para ter a população do lado do Exército de Libertação Popular. Ele dizia: ‘fale docilmente com a população e de167
volva tudo que pegar emprestado, pague tudo o que consumir e não destrua propriedades nem plantações, não se envolva com as mulheres e trate os presos com benevolência’. E o que nós vemos muitas vezes? O policial atende bem as pessoas? Você tem a segurança de chegar a um policial e ele te atender bem? Está certo ele ir à padaria, esse hábito cultural péssimo que nós herdamos de ficar tomando café e comendo de graça na padaria? Está errado, você não está pagando pelo que consome.” Já como coronel, Arruda foi chamado para dirigir o Centro de Altos Estudos de Segurança (Caes), onde trabalhou de 2009 a 2011. O Caes, onde os policiais realizam seus mestrados e doutorados sem os quais não podem subir de patente, tem quatro linhas de pesquisa, ele explica: polícia comunitária de direitos humanos; gestão organizacional; saúde e qualidade de vida; e prevenção e resposta a emergências e acidentes. Nessa época, o comando-geral pediu que Arruda acompanhasse um grupo de policiais em viagem à África do Sul para estudar sobre a realização da Copa do Mundo. O coronel reclama que agora as viagens de estudo foram cortadas. “O programa de mestrado fazia uma viagem nacional, em sete unidades federativas. Fizemos três vezes isso. Era uma visita muito bem estruturada, com debate, simpósio, visitas técnicas e culturais. E nada que devia ser oculto da imprensa, tribunal de contas ou do poder público. Jornalista podia ir junto. Eu sempre dizia para os meninos ‘vocês estão lidando com dinheiro público, não tem que fazer besteira’. Não tive um incidente.” Mas o ex-secretário de Segurança Pública Antonio Ferreira Pinto não achava que as viagens do Caes –nacionais e por vezes internacionais– colaborassem para pensar o policiamento e suspendeu tudo. “É deplorável quando você considera que educação não é prioridade.” 168
O oitavo cargo na polícia foi comandando a Escola Superior de Soldados, em Pirituba, onde não perdeu a oportunidade de inventar mais uma. Arruda diz que os alunos se achavam maiorais e tinham vinte que lutavam MMA. O esperto coronel convidou então seis indígenas do Xingu lutadores de Huka-Huka, “a única arte marcial brasileira”, para uma exibição. Foram 32 lutas. O placar? Um empate e 31 vitórias para os índios. “Isso se chama diversidade. As pessoas são diferentes umas das outras. Vocês não são piores nem melhores, são diferentes. Usem isso pra vida de vocês.” Depois de passar pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco, que forma oficiais, e pela Escola Superior de Soldados, que forma praças, Arruda consegue traçar um diagnóstico sobre o ensino na PM e aponta os temas importantes que são negligenciados. “Nós estudamos pouco a vítima. Ela é o objeto principal da ocorrência, não o delinquente. A PM existe para atender a vítima, e não para prender o delinquente. Ela prende para atender a vítima. Também precisamos aumentar o volume de estudo sobre adolescente em conflito com a lei. Biologicamente, ele está pronto pra vida, mas não ganha um centavo, então ele não exerce nenhum poder político dentro de casa. Analfabeto funcional, muitas vezes não chega à universidade. Está condenado ao subemprego e é pressionado pelo consumo. Ele tem baixíssima autoestima e um profundo temor de ser exposto ao ridículo pelos amigos através do bullying. Essa combinação explosiva leva o jovem a se aproximar do crime.” O coronel diz ainda que a maioria dos policiais escolhe a carreira por vocação –e aí que mora o perigo. “Um dos papeis da escola é transformar a ilusão em realidade. O cara acha que ser policial é Tropa de Elite. É chegar lá e bater na cara, mas não é assim, a vida não é assim. Muitas vezes você vai perder. Você vai prender o trafi169
cante e ele será libertado. E ele depois ri da sua cara. Quantas vezes isso não acontece? É uma profissão muito estressante.” Com seu jeito teatral, Arruda encena o exemplo mais básico do dia a dia policial. O PM chega na periferia. É a única autoridade visível ali. Logo é procurado por um comerciante. — Capitão, aquele moleque ali roubou meu estabelecimento quarenta vezes e está em liberdade. O senhor não vai fazer nada? Aquele comerciante (e boa parte das pessoas) não conhece a estrutura legal. Não sabe que a culpa pela libertação do moleque não é do policial. — Olha, capitão, não é pelos dez conto que ele leva todo dia. Mas outro dia ele bateu na minha filha, né, Maria Cristina? — Verdade, me deu uma coronhada. Resultado: se o policial não tem estrutura para aguentar firme, resolve fazer justiça com as próprias mãos. “É uma profissão muito difícil e pior: pouco valorizada pela sociedade. Eu estou no ônibus com o crachá da AACD, todos olham e falam ‘ai que legal’. Na PM, as pessoas já olham assim do tipo ‘quem mandou não estudar né?’” É fato inegável que grande parte da rejeição à PM advém da ditadura militar. Os policiais são vistos como um resquício do governo autoritário e, aliás, ainda pensam com a mesma cabeça, ou seja, ignoram os direitos humanos. Arruda argumenta que os responsáveis pela tortura e comandantes do DOI-CODI eram do Exército e que a polícia estava na rua. Claro que a PM também matou, mas em confrontos. Para ele, a característica 170
militar não implica uma ideologia. O coronel faz as vezes do professor de história da PM que já foi para explicar como a relação ditadura-polícia não se sustenta: “A PM foi organizada militarmente nesse moldes no período da Regência e foi assim no Segundo Império, na Primeira República, na era Vargas, durante o regime militar e na redemocratização. Ela tem esse modelo desde 1831. Aliás, durante o regime militar ela não foi leal ao regime militar, ela foi leal ao governo de São Paulo, que, por sua vez, era leal ao governo militar. Tem uma coisa muito significativa nisso. Naquele episódio de 1964, a PM não fechou com o Exército, fechou com o governador Ademar de Barros. Se ele resolvesse resistir ao golpe, a PM também teria resistido.” A violência sistemática da polícia, porém, deixa dúvidas sobre se o caráter pessoal de cada policial é fator determinante para agir fora da lei ou se há de fato um problema estrutural –o militarismo. Pensando com a cabeça da ditadura, a polícia veria a população como um inimigo a ser combatido. Duas leis ainda vigentes que organizam as polícias militares em nível nacional e estadual foram decretadas por presidente e governador “usando das atribuições que lhe confere o § 1º do artigo 2º do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968.” O decreto-lei nº 667 de 1969 regulamenta as polícias militares do Brasil e o decreto-lei 217 de 1970 constitui a Polícia Militar de São Paulo, unindo a Força Pública e a Guarda Civil do Estado. Ambos estão fincados no AI-5. Para Arruda, essa associação errônea entre PM e ditadura tem outra origem. E aqui, pela primeira vez, o defensor das minorias adota uma postura inesperadamente conservadora: tudo faz parte de um plano para enfraquecer as instituições federais, inclusive o Exército –e de lambuja a PM. 171
“Esse ataque vem por parte de segmentos ligados ao governo federal: PSTU, PSOL... Aparentemente, alguns grupos mais radicais de caráter bolivariano querem extinguir instituições que não sejam leais ao partido. A instituição não pode ser leal a nação, deve ser ao partido. Hoje a PM é a única instituição pública presente 24h por dia em todos os municípios paulistas e brasileiros. Pra tudo que acontece, a PM é acionada. Essa informação é processada, sai da PM, vai pro Exército, do Exército vai para a Abin e de lá para a Presidência da República. É uma rede de informação muito bem estruturada no país inteiro. Ao quebrar essa rede, o objetivo é acabar com a informação. Em segundo lugar, enfraquecer o Exército. E aí a ideia é substituir a PM por uma guarda bolivariana que não tenha nenhum compromisso com o Estado nem com a sociedade, mas tenha compromisso com o governo.” Pelo humanismo, defesa dos direitos humanos e, principalmente, pela tolerância, Arruda estaria bem enquadrado no lado esquerdo da política, não fosse a maneira como enxerga as mudanças sociais dos últimos tempos. “O país esta passando por uma crise moral muito grande, uma crise de relativização de valores, desde a família, e falta de valores religiosos também, que são importantes qualquer que seja a denominação.” Um discurso reacionário para provar que a complexidade humana –e o coronel– não pode ser encaixada em grupos definidos. Arruda, em tom de indignação, segue com críticas ao governo federal... “[Segmentos ligados ao governo federal] que acolhem terrorista e deixam ele em liberdade no Brasil, caso do Cesare Battisti, que permitem que você pague e explore mão de obra escrava de médico –precisa ir atrás de Cuba para mandar dinheiro pra Cuba. Ou seja, você deixa as prioridades ideológicas acima do interesse nacional. Veja o que está sendo feito com a Petrobras, veja o que está sendo 172
feito com o Itamaraty, Banco do Brasil. As instituições estão sendo profundamente afetadas. E a PM é a próxima, mas ela tem uma estrutura mais sólida.” ... e às manifestações de junho. “Essa articulação se aproveita da insatisfação com a Copa e com o Mensalão. O que a PM tem que evitar é uma camisa sangrenta, um novo ícone como Edson Luis. Na última manifestação, teve muito problema com jornalista. De jornalista preso, espancado, confusão etc. Em sã consciência, nenhum policial vai atacar um jornalista. Por que atacou? Será que ele não identificou o jornalista claramente como jornalista? Será que o jornalista tem que criar uma identidade visual mais fácil para ser identificado? Quem tem que decidir isso? O jornalista e a polícia. Tem que sentar junto e conversar.” Mas Arruda não estende essa imunidade à agressão da PM a todos os cidadãos –jornalistas ou não. Pelo contrário: “De forma geral, a PM agiu bem e corretamente. Se houve excesso, a estrutura da polícia é muito peremptória e muito dura para punir excesso. Bom, em um movimento social quem está no epicentro está sujeito a... Manifestação tem que ter ordem. As pessoas tem que estar identificadas. Você não pode usar anonimato, isso é contra a Constituição. Você não pode levar arma. Coquetel molotov... Estou impressionado como isso não matou ninguém até agora. Porque é uma arma utilizada pelos russos na resistência contra o avanço do Exército nazista. Queima um tanque de guerra, com a tripulação dentro, não é brincadeira aquilo lá. Está certo uma pessoa levar isso? Qual é o objetivo dela? Manifestação é um protesto legítimo, mas sem uso de violência. Violência é antidemocrático. Não e cabível usar a violência na democracia, em nenhuma hipótese.” 173
Segundo levantamento da Abraji, 114 jornalistas foram agredidos nos protestos de 2013 –71 de forma deliberada e 65 por agentes de segurança. A BBC Brasil diz ainda que a Corregedoria da PM abriu 21 inquéritos para apurar agressões entre 1º de junho e 28 de janeiro. Mas, se por um lado, o militarismo é responsável por essa ponte direta entre a PM e a ditadura na cabeça das pessoas, na cabeça dos PMs significa hierarquia e disciplina. Quando o assunto é militarismo, os policiais não raramente fogem da questão da repressão e divagam sobre os benefícios e malefícios de uma estrutura piramidal tão rígida. “A formação básica militar do PM é muito útil porque ele aprende honra, disciplina, respeito à hierarquia, respeito à nação, ao Estado de São Paulo. A sua responsabilidade é deixar uma instituição melhor para quem vier depois de você. Nós tivemos 31 coronéis exercendo cargo de subprefeito no governo Kassab, quantos foram processados por corrupção? Zero. Isso estatisticamente tem uma significação. Por que não teve nenhum caso? Porque são valores e o grupo cobra dele. O grupo é muito forte e cobra a maneira como você se conduz.” Ainda em 2011, Arruda deixou a Escola Superior de Soldados para assumir o Comando de Policiamento Metropolitano, ou seja, se tornou responsável pelo policiamento em toda a região metropolitana de São Paulo, excluindo a capital. Depois, foi ser diretor de Ensino e Cultura da PM em maio de 2012 e, finalmente, entrou para a reserva. Além dos dez cargos na polícia, não podemos esquecer os cursos de formação de Arruda. Além dos já mencionados – Academia do Barro Branco, Publicidade na ESPM, Mestrado e Doutorado no Caes–, o coronel cursou ainda Direito, tem 174
uma especialização em Gestão do Terceiro Setor na GV e ganhou uma bolsa do governo francês para uma especialização em Liberdades Públicas e Segurança Pública na École Nationale D’administration (Ena). “Fiz outros cursos como de polícia comunitária nos EUA, visitei a polícia italiana, sul-africana, japonesa, canadense, fiz estágio na Legião Estrangeira. Quando eu estudei na Ena, o Sarkozy era professor lá.” O caminho que levou Arruda à Paris passa pelo Caribe. Mas começou nos bombeiros. O comandante dos bombeiros precisava de um tradutor de francês para um curso de uma semana sobre defesa civil com franceses. Como Arruda fala bem a língua, acabou quebrando esse galho. Um dos franceses era da embaixada da França e, tendo todo interesse em manter boas relações com o Brasil, convidou Arruda para um curso na Martinica. Eram policiais de 14 países e o curso seria em francês, se alguns não tivessem reclamado porque só falavam espanhol. Resultado: Arruda, pela segunda vez na vida, traduziu um curso. Como recompensa, a escola da Martinica o mandou para a Ena. O coronel tentou ainda fazer mestrado na USP duas vezes (ECA e FFLCH), mas teve que abandonar por causa da carreira. Arruda está aí pra desmentir o ‘bem-feito não estudou’. Ele estudou. E escolheu ser PM apesar dos pesares. “É uma carreira que envolve risco concreto de vida. Dano à saúde. Má alimentação. Estresse. Risco de processo. Mas também você tem grandes histórias de vida partilhadas, possibilidade concreta de ajudar pessoas, de salvar a vida de pessoas. O maior desafio do policial é manter a humanidade a despeito do ambiente sórdido em que muitas vezes ele vai trabalhar.” 175
Hu-ma-ni-da-de, diz o coronel humanista. E defende todas as minorias, os PMs inclusos. “Hoje, portanto, eu me considero uma pessoa muito mais rica do que eu era quando vim aquele menino de Araras. Aquele menino branco, classe média, católico. Hoje eu tenho amigos negros, orientais, ciganos, judeus, muçulmanos, gente que eu tenho absoluta confiança. [...] Não existe uma instituição chamada polícia militar, o que existe são milhares de pessoas que se congregam em torno de uma instituição. Você não pode desumanizar. Existe um cara ali que também é pai de família, que tem uma mulher esperando por ele, que tem filho ou que tem um marido, no caso da polícia feminina, que tem mãe e pai.” No fim, a verdade é que nem aquele estudante de Araras enfurecido com um diretor autoritário teria conseguido imaginar uma vingança tão bem executada.
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Dentro da lei Eu entrei em 1984! Não vi nada disso, pô! Eu não faço isso! Franciscon, major
Era para ser um ano qualquer. Como foram os outros 60 em que levou seu comércio em Pirituba. Aos 85 anos, estava muito bem acostumado àquela rotina. Lá pelas sete da manhã, quando o sol amanhecia arrancando os trabalhadores da cama, ele já estava içando a porta de aço. Ali pela rua, vinham chegando quatro rapazes um tanto mal encarados. Cercaram-no dentro do bar e exigiram dinheiro. Ora, como ousavam perturbar um senhor? Não tinham vergonha na cara? Estavam um tanto alterados, certamente tinham se drogado. Ele foi empurrando o grupo rebelde para fora. Enxotando, indignado. Roubando um senhor?! E eles foram embora desorientados como vieram. Mas foi outubro que deixou a ci179
catriz no ano de 2010. Outra manhã. Hora de abrir a venda, e ele suspendia a porta, distraído. Foi até o balcão para ajustar os copos lagoinha onde servia café e pinga. Quando voltou-se para a porta, chegou a reconhecê-los. Mas teve tempo só para isso. Foram três tiros para cair manchando o chão de sangue. Morreu ali mesmo, sem ninguém para ver. Os rapazes já iam longe e, com a arma, sabe-se lá o que fizeram. Ainda assim, a fofoca no bairro era muita e todos os dedos apontavam para eles. O tempo que ficaram presos foi o mesmo que demoraram para executar a vingança: três meses. Sem testemunhas, sem provas e com um advogado pago pelo mais abastado, não poderiam mesmo ter ficado encarceirados por mais tempo. Às sete da manhã, alheio a tudo isso, o sol foi acordando os madrugadores nos dias que se seguiram. Mas a porta de aço não se movia. Os copos lagoinha estão onde sempre estiveram. * Na televisão, o major Franciscon apareceu com o cabelo mais curto. O corte raspado bem rente na cabeça devia ser uma exigência do trabalho na rua, para onde o major voltava por ocasião da Copa do Mundo. Franciscon comandou as operações policiais na Vila Madalena, na zona oeste. O bairro teve o recorde de 70 mil pessoas no dia do jogo entre Brasil e Colômbia, pelas quartas de final. O efetivo policial variava segundo a quantidade de torcedores, chegando a mais de mil policiais. A dificuldade ali era fazer a festa acabar. Os moradores precisavam dormir, as ruas precisavam ser limpas, os bares já estavam fechados. Certa hora da madrugada, lá ia Franciscon e seus soldados, varrendo metaforicamente as pessoas da rua para que os funcionários da prefeitura viessem logo atrás varrendo literalmente o lixo da rua. 180
Na madrugada de quarta-feira, 2 de julho, torcedores revidaram com garrafas porque não queriam deixar o local. A polícia respondeu com uma bomba de efeito moral e foi criticada pelos boêmios e estrangeiros. Na madrugada do sábado, dia 5, a PM colocou em prática outra tática –planejada com a subprefeitura de Pinheiros, a Guarda Civil e a CET. Major Franciscon começou a avisar por um megafone em três línguas (português, inglês e espanhol) que as pessoas deveriam ir embora. “A Polícia Militar agradece a presença de todos. Devido à necessidade de liberação da via para limpeza e demais providências, solicitamos a gentileza de encerramento das atividades festivas, para que possamos proporcionar condições de, em breve, receber a todos novamente. Desejamos um bom retorno a suas residências.” Depois disso, lá pelas 2h30, passava o cordão de policiais, garis e caminhões pipa lavando tudo. A tropa de choque não foi necessária. Fotos e vídeos do major e seu megafone foram parar nos jornais. Tudo muito diferente da vida de Franciscon há alguns meses, como subcomandante do 18º batalhão, em uma função administrativa, longe da confusão da Copa do Mundo. Na rua Chico de Paula, uma rua residencial pacata –tem até feira livre– bem próxima à praça da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, é que se esconde a sede do batalhão. O batalhão cobre uma área de dois milhões de pessoas. São 600 policiais e 102 viaturas distribuídas em três companhias que correspondem às áreas de três delegacias nos bairros Freguesia do Ó, Brasilândia, Parada de Taipas e Jaraguá. As viaturas são de vários tipos: Ronda Escolar, Força Tática, Rocam, 190, policiamento comunitário, viatura do comando (tenente), viatura do sargento, viatura do comandante de companhia (capitão) etc. 181
Franciscon acha que o governo deveria investir para ampliar o número de policiais. Mas, sem mais recursos, a decisão fica na mão da polícia: mais policiais seria dividir uma mesma pizza em mais pedaços. Como ninguém quer uma fatia menor, um tem que trabalhar por dois e a qualidade do serviço é comprometida. No 18º, o major é o subcomandante responsável pela parte administrativa. Há ainda outro major responsável pelo policiamento e o comandante, um tenente-coronel. Franciscon recebe R$ 6 mil líquidos. Acha um valor baixo para quem tem um doutorado e é responsável por uma área de dois milhões de habitantes, numa função com risco de morrer e de causar a morte. Seu local de trabalho é uma casinha pequenina com três bandeiras içadas, de um lado um muro verde de um instituto de reabilitação de pessoas especiais, do outro uma grade verde de um órgão da prefeitura de vigilância de saúde. As letras dispostas na fachada: Polícia Militar 18º BPM/M. Por dentro, a casinha é até bastante espaçosa. Passando um hall de entrada, vem uma sala com uma escada para baixo. Nas paredes, pintadas de branco na parte de cima e de azul-turquesa na de baixo, fotos dos heróis do 18º batalhão –policiais que morreram em serviço. Pela esquerda, segue um corredor que leva a outra salinha pequena. No corredor, as portas de acesso para as salas do comandante e do subcomandante, o major Franciscon. No fundo do corredor, o vestiário. Mas é descendo as escadas que se revela a casa de quatro andares com escritórios para os policiais que trabalham internamente no batalhão, um refeitório, cozinha e até um consultório de dentista. Na garagem, uma ou outra viatura, assim como na rua, estacionadas em frente à casinha. Uma delas está quebrada. O major, que costuma pegar serviço às 9h30, chegou atrasado ao batalhão porque teve que resolver esse pepino. Ir até a viatura, trazê-la com mecânicos. Os 182
mecânicos também são policiais, têm um macacão cinza da PM. Inclusive, segundo uma nova regra de contagem de efetivo estabelecida pelo governo em 2013, os mecânicos são considerados policias de rua, de policiamento. Além deles, atendentes do 190, assessores de imprensa, guardas de quartel, equipes de departamento pessoal, equipes de logística etc são considerados agora parte do efetivo de policiamento. Com a mudança, o número de PMs de rua passou de 61.174 em 2012 para 73.008 em 2013, e o número do pessoal administrativo diminuiu de 23.788 para 9.444. Franciscon não teve tempo nem de trocar de roupa antes de ir buscar a viatura quebrada. Chegou ao batalhão ainda de camiseta e short, o uniforme da Educação Física. O major, agora mais fora de forma, aos 48 anos, já foi um atleta –aliás triatleta, por dez anos. Competiu pela PM na África do Sul, na Olimpíada Mundial dos Policiais e Bombeiros. Pedalou ainda no México, nos EUA, e nos circuitos de São Paulo, Rio e Santa Catarina. A Olimpikus chegou a oferecer um patrocínio, mas não deu certo. Os tempos de glória acabaram quando o joelho se arrebentou. Franciscon fez cirurgia e parou. Agora só um exerciciozinho básico. Quando ainda era segundo tenente, depois de ter se formado, trabalhado no 17º batalhão, em Mogi das Cruzes, e no 14º, em Osasco, o major prestou um concurso interno para instrutor de Educação Física. Ele, então, fez o curso de Educação Física da PM, reconhecido pelo MEC como uma graduação. Segundo o major, é o primeiro curso de Educação Física do Brasil, criado em 1910. Em 1992 e 1993, o major deu aulas de Educação Física no curso de formação de soldados da PM, mas acabou transferido novamente para Mogi, onde trabalhava à noite na Força Tática. Com o filho mais velho, Victor, já nascido, o major pediu para voltar a 183
São Paulo. A única vaga disponível na capital era de professor na Academia do Barro Branco. Franciscon, já tenente, trabalhou nove anos na academia. Além de Educação Física, ensinava história da PM, defesa pessoal e ordem unida –marcha, movimento de tropa, disciplina. “No Japão, as escolas civis dão ordem unida para os alunos porque no Japão o pessoal é bem disciplinado. Não é uma coisa propriamente militar, é uma coisa disciplinar. Para trazer disciplina para um conjunto de pessoas”, explica. Ele chefiava ainda a seção de Educação Física e Esporte da academia, além de ser técnico das equipes de judô, natação e atletismo. Pois estava lá a viatura quebrada e o major precisava se deslocar para ver um galpão para alugar. A sede da Força Tática do batalhão vai ter que deixar o local onde hoje está bem instalada e é função do major encontrar um outro lugar para realocá-la. O problema é que houve uma redefinição da área de cada batalhão e, com isso, a Força Tática, onde está hoje, acabou fora da nova área do 18º. Franciscon não tinha tampouco um motorista disponível naquele momento. Teve que dar um jeitinho. Foi conversar com os mecânicos e pediu que um ficasse consertando a viatura enquanto o outro o levasse ao galpão na viatura dos próprios mecânicos – um Gol acabadinho, meio sujo por dentro, com umas peças soltas... Carro de mecânico. Um mecânico enquanto mecânico não é pau pra toda obra, mas um mecânico militar é. Se o comandante quer um motorista, um motorista ele vai ser. E com o macacão da PM. Chegando ao galpão, Franciscon foi recebido pelo dono do imóvel, um senhor velhinho com bastante dificuldades de audição, e um homem mais jovem, que estava intermediando o negócio. Eram dois galpões vizinhos que, no fundo, tinham espaço para uma salinha e um banheiro. No andar 184
de cima, mais alguns cômodos. Nada que impressionasse o major, que preferia que nada daquilo fosse necessário. Até porque os galpões estavam sujos e danificados, certamente precisariam de reforma. Dali, o major foi fazer uma visita à sede da Força Tática no Bairro do Limão –passar nas companhias periodicamente também é função dos comandantes. Cada batalhão tem uma companhia de Força Tática responsável por conter distúrbios civis ante da chegada do Choque, reforçar o policiamento de rua e atender ocorrências graves. No pátio, as novas viaturas Hilux e um grupo de policiais com uniforme preto de treinamento. Na parte de dentro, uma sala ampla e, no fundo, pilhas e pilhas de caixas de papelão sobre um tatame. Por causa daquele material ali, a aula de judô para crianças que acontece semanalmente teve que ser cancelada. — Oi, comandante. Olha, chegaram aqui os novos uniformes do batalhão, estamos separando pra cada companhia vir buscar. Eram calças, camisetas, botas... tudo encaixotado. O novo uniforme da PM começou a ser usado ainda antes da Copa. É muito parecido com o anterior, mas a camiseta passou a ser cinza escura, como a calça, e não de um tom mais claro. À direita, entramos em um corredor quadrado, que dá acesso às salas onde trabalham os PMs administrativos e também à sala onde guardam material –armas de todo tipo, uma com um cano maior que a outra. Depois de exploradas a talvez futura e a atual instalações da Força Tática, o major vai –no Gol com o mecânico– visitar o CIC, Centro de Integração da Cidadania, que fica na sua área, na Estra185
da de Taipas, no Jaraguá. Só aí temos a dimensão da área do 18º. Foi quase uma hora num trânsito levemente carregado e num sol de quase meio-dia para finalmente poder sair da viatura já cumprimentando os PMs na entrada do centro. Os CICs são programas da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania. Seis estão localizados em áreas vulneráveis da capital; há outros cinco no interior. No CIC, as pessoas têm acesso a serviços públicos gratuitos, palestras, oficinas, orientação social e jurídica, atividades educativas, podem emitir documentos e até casar, no casamento civil comunitário. A diretora daquela unidade, Edilaine Daniel, explica que os programas são realizados em parceria com diversos órgãos e, em Taipas, um deles é a PM –para o orgulho do major. Logo na entrada, está a base da PM com praças. Vira e mexe, estão brincando com as crianças por ali. Os próprios policiais dão aulas de futebol e jiu jitsu para as crianças no CIC. Em seis anos, foram 600 crianças atendidas. A importância do trabalho está em “agir na semente”, dizem, e se gabam porque até filhos de traficante aparecem nas aulas. Outro programa importante é o Resgatando Marias, que presta auxílio psicológico e jurídico para mulheres vítimas de violência doméstica, inclusive oferecendo tratamento para os maridos com problemas de drogas e álcool. Com isso, a manhã já passou. Faz muito calor. No CIC, o ambiente é mais agradável. Água e banheiro à disposição. Mas é preciso encarar mais uma hora de volta ao batalhão no Golzinho. O major tem que voltar aos pepinos diários. E o mecânico-motorista-quebra-galho tem que voltar a salvar viaturas. Numa outra manhã, anterior, o major lamentava enquanto olhava para as fotos dos policiais que morreram em serviço, ex186
postas na sala da escada, logo na entrada do batalhão. Os retratos mais antigos eram de PMs mortos na década de 1980. As mortes mais recentes eram do início dos anos 2000. “Todos nasceram de uma mulher e são cidadãos”, dizia Franciscon. Ali, antes de começar uma conversa sobre a sua vida de policial, achou necessário fazer um breve alerta sobre a mídia, que “escolhe uma parte e publica como se fosse o todo”. Ele tem receio de reportagem, diz. Não precisava nem dizer. Está na cara, no nervosismo, no tratamento excepcionalmente educado com aqueles que podem espalhar inverdades e, principalmente, na tentativa de expor todos os bons programas de polícia comunitária realizados no batalhão. Dentro da sua cordialidade, deixa claro que aquela entrevista é uma exceção, concedida tão somente porque havia também um laço pessoal –para uma jornalista amiga da namorada do seu filho. Sentado em sua mesa em “L”, em uma sala espaçosa, com até um sofá e uma mesinha dispondo livros sobre a polícia e sobre religião, Franciscon aprofunda suas críticas à mídia, que responsabiliza pela construção da imagem de uma polícia violenta e corrupta. “Os construtores de opinião pública e a mídia colocam o policial militar como corrupto. Então, o jovem, que não conhece o policial, pensa ‘ah esse cara aí não merece crédito’. É um processo de desconstrução de valores da nossa sociedade. [...] Se for conveniente, a pessoa vai filmar aquilo que ela quer passar. Para tender para onde ela quer.” “Mídia, intelectuais, personalidades, artistas e área acadêmica investem muito nessa mensagem de que a PM é filhote da ditadura. Eu entrei em 1984! Não vi nada disso, pô! Eu não faço isso! Vê o meu currículo. O que eu fiz na minha atividade? Policiamento de área, ambiental, professor de Educação Física. Quem é do 187
Choque está no Choque. Mas o efetivo do Choque dá 2% da polícia. Eu não me vejo como filhote da ditadura não.” Sobre as agressões a jornalistas durante manifestações, o major desconfia: será que eram jornalistas mesmo ou black blocks se passando por jornalistas para filmar o que interessa? Esses jornalistas agredidos fizeram exame de corpo delito? E tem mais: o jornalista que cobre manifestação deve saber que, se está na chuva, é pra se molhar. “A tropa de choque vai partir com tonfa pra poder lutar com o grupo que está depredando e o repórter entra exatamente no meio disso... É como entrar na chuva e achar que um pingo não vai cair em você. Se, em qualquer guerra, repórteres morrem porque vão querer filmar a linha de frente... É uma grande oportunidade para o jornalista filmar e espalhar para prejudicar quem quer que seja e vender reportagem. Essa é a única finalidade. No sentido de vingança ou oportunismo. Mas não há compreensão. O repórter não vai querer compreender o lado da polícia.” E qual é o lado da polícia? “O lado da polícia é proteger o governo e a sociedade. A gente age tanto em ação de cão bravo na via, como com um demente, um idoso na rua, que caiu ou teve um mal súbito. A mesma viatura que está atendendo isso, de repente, é chamada para desobstruir uma via que está interrompida por manifestantes xingando e tacando pedra. Quem é capaz de fazer tudo isso?” Com a conversa fluindo, porém, o major fica mais à vontade. Sem deixar de escolher cuidadosamente as palavras, medindo cada frase, se esforçando para ser o mais claro possível –falando devagar e pausadamente. Franciscon tem a pele bem branquinha e um cabelo cinza claro. Os olhos verdes pequenininhos estão sempre apertadinhos, principalmente quando 188
sorri. E sorri bastante. Com um nariz de batata, parece um papai noel. Se vestisse toda a fantasia, ficaria quase igual ao bom velhinho apesar de, justiça seja feita, Franciscon não estar na terceira idade e nem aparentar isso. Acaba cancelando todos os seus compromissos por causa da entrevista. Teria uma reunião com o pessoal da Ronda Escolar, mas a hora passa e o assunto não acaba. “Você se importa se a gente seguir?” Vai remarcando tudo para o dia seguinte. É breve com a mulher ao telefone: “Estou com uma jornalista, ela está gravando.” Mas, quando dá 12h, encerramos. O major tem que pegar a filha na escola. Sua filha mais nova tem 11 anos. É a filha do segundo casamento. A primeira mulher, Franciscon conheceu quando ainda estudava na Academia do Barro Branco. Casaram-se em 1990 e o filho, Victor, nasceu em 1991. Moravam na zona norte, a não ser no ano em que foi transferido para Mogi. Em 1995, se separaram, e o major se mudou para Pirituba, onde mora até hoje. O segundo casamento veio em 2000. A primeira mulher é médica da PM e, como todo médico da PM, é uma civil, que passou em um concurso e foi empossada como segundo tenente. Os médicos, então, fazem quatro meses de curso na academia e sobem à primeiro tenente. Depois de separados, Franciscon chegou a dar aula para a ex-mulher no Barro Branco, antes que ela assumisse um cargo no hospital militar. Numa família de classe média, o major viveu a infância em Pirituba. Aos 13, ajudava o pai no comércio, mas tinha o incentivo para que seguisse outra profissão. Os pais pagaram cursinho para que ele conseguisse ser aprovado no Barro Branco. Naquela manhã, Franciscon também chegara meio esbaforido ao batalhão. Estava atrasado para a entrevista porque o tenen189
te-coronel lhe enviou a um evento em seu lugar na última hora. Fora entregar umas três medalhas de reconhecimento a policiais do 18º na reunião mensal da tropa. O major, por sua vez, recebeu duas medalhas em sua carreira. Quando ainda era tenente, a polícia recebeu uma denúncia de que presos planejavam explodir parte de um presídio e fugir. Mas ao explodirem a determinada cela, iriam causar a morte de outros presos ali dentro. A denúncia veio justamente da mulher de um detento que não queria ficar viúva. Ela avisou que a dinamite já havia sido roubada. À paisana, Franciscon e outros policiais entraram em um barraco com 50 kg de dinamite e 15 pessoas “tomando cerveja e comemorando o que iam fazer no dia seguinte.” Depois, a equipe fardada entrou e acabou com a festa. “Evitei a morte de um monte de gente, embora fosse um monte de bandido, mas do mesmo jeito que ia morrer, também ia fugir.” A segunda medalha veio com uma ocorrência do carnaval de 1990. Um homem ligou para a polícia dizendo que, ao sair de um baile com a namorada, em Osasco, foi abordado por quatro homens em um fusquinha. Roubaram seu relógio, carteira, o agrediram e saíram levando junto a namorada. O Copom passou a ocorrência na rede: todos atrás de um fusquinha azul. Eram 23h. “Quantos carros azuis tinham naquela época em Osasco no carnaval? Um monte de carro. Aí o pessoal falava: poxa, é impossível. E eu no rádio falando ‘atenção, efetivo, não vamos cessar, vamos fazer as buscas em todos os carros azuis, não desanima’. Em 15 minutos, eu andando num local ermo, vi um fusquinha bem devargazinho, quando ele viu a gente, ele apagou as luzes. Aí nós abordamos. Eram eles. A mulher estava lá. Prendemos os quatro. Eles estavam com revólver e faca. Não chegaram a abusar da mulher, mas iam fazer isso. E aí salvamos”, conta orgulhoso. 190
As ocorrências mal sucedidas, contudo, marcam mais ou tanto quanto as heroicas. Era noite e um senhor chorava sentado na calçada. Havia sido assaltado, mas pegou o crachá de trabalho do ladrão. A polícia localizou o endereço da pessoa e a prendeu. Tempos depois, o major fica sabendo que o ladrão voltou e matou o senhor. Em outra ocasião, a mesma situação: um idoso chorava na calçada. — Eu moro na favela, mas entraram dois rapazes lá e me expulsaram do barraco. — Onde que é? Só mostra onde é o barraco, mas o senhor fica longe. Os policiais entraram no barraco e lá estavam dois homens armados e com as respectivas namoradas. Dessa vez, foram presos e tudo acabou bem. O major orgulha-se de nunca na carreira ter precisado atirar (só tiro pra cima para espantar suspeitos que haviam entrado no mato). “Nunca matei ninguém”, diz. Franciscon escolheu a carreira militar porque brincava de soldado desde criança. “Meus brinquedos eram forte apache, tanque de guerra. Com essa brincadeira, eu me realizava e hoje eu falo que brinco no meu trabalho. Pra mim, é uma realização, é um prazer. Não sinto nada que possa me desmotivar. Continuo me divertindo, mas levando a sério, claro.” A PM, porém, é muito diferente do Exército, que era onde queria ser cadete, na verdade. “Eu achava que a polícia era desprezada, né? Ainda é. Mas, na época, eu rejeitava a polícia.” Ele chegou a passar na Marinha, mas tendo sido aprovado no Barro Branco em segundo lugar, aos 17 anos, resolveu ser polícia mesmo. O curso de oficial na PM durou cinco anos, de 1984 a 191
1988. Foi um tempo de aprendizado sobre direito, administração pública, filosofia, sociologia. “Não aprendi nada de guerra. só vi canhão em exposição.” O militarismo da PM, para o major, é uma questão de estética, eficiência, organização e disciplina. E é difícil explicar a natureza híbrida, civil e militar, da polícia. “O PM é um catalisador de pessoas que colaboram tanto de outros órgãos públicos como da sociedade. Por isso, por estar envolvido diretamente com políticas públicas, é uma atividade civil. Ele tem que ser civil. Por outro lado, para sua administração, para facilitar o comando, o controle, preservar os valores institucionais e facilitar o relacionamento entre superior e comandados, a natureza militar reveste de mais autoridade a estrutura. Para manter a corporação menos vulnerável à tensão do dia a dia que acaba levando a essa cultura de corrupção.” “Nos Estados Unidos, as pessoas respeitam os vizinhos, o professor, o juiz. As casas têm bandeira na porta, eles cultuam isso. Claro que eles têm uma visão belicista, produzem pela mídia seus heróis. Mas ali não precisa de um regime forte para o policial fazer o papel dele. Porque ele já aprendeu a fazer o papel dele na família, na escola, na comunidade. Não precisa de um regime militar porque ele já foi regrado. Agora o brasileiro é meio assim... largado. Então se você ganhar um poder e não tiver um regramento forte, aquele que tem o poder vai abusar porque é costume.” O Tribunal Militar, por exemplo, é uma ferramenta de disciplina. O policial que comete um crime ou que simplesmente se recusa a obedecer seu comandante pode ser preso e será julgado. Além disso, o major aponta uma simbologia no militarismo que ajuda no psicológico do militar: um recrutinha que vê um coronel no fim de carreira e o toma como exemplo. As medalhas e o patriotismo também estão no simbólico do militarismo. 192
“A gente não fala hoje patriotismo porque está tão... O pessoal deixou tão de lado. Mas o civismo. O bem comum da sociedade. Você verifica que o pessoal só canta hino nacional quando tem jogo da seleção brasileira. Ou então nos quartéis. Então [o militarismo] acaba sendo uma reserva cultural do civismo do país.” Quando foi promovido a capitão, Franciscon foi trabalhar na polícia ambiental, que age em todo o Estado de São Paulo. Como vinha de uma área de ensino, após anos no Barro Branco, o coronel o designou para chefiar o treinamento da polícia ambiental. Foram nove cursos realizados em três anos –de identificação de madeira em parceria com o IPT, de manejo e contenção de animais com veterinários e zoológicos, de monitoramento georeferenciado, de policiamento de rua em torno do zoológico. Apesar do bom trabalho, Franciscon acabou sendo transferido de posto e foi comandar uma companhia do 49º batalhão em Pirituba em 2006. O major se preocupava na época –e em toda sua carreira– em aproximar polícia, órgãos públicos e sociedade para tornar as ações de prevenção mais eficazes dentro de um contexto de polícia comunitária. “A polícia militar é uma polícia de serviços humanos. Realiza serviço de ajuda. Se uma pessoa precisa de informação, chama o policial. Precisa ser socorrida pro pronto-socorro, viatura leva. Parturiente? Viatura. Cão bravo na rua, chama o policial. Então não é só crime, são serviços de ajuda humana. O que são serviços de ajuda humana? Tudo. A pessoa precisa, tá lá. Não dá pra falar ‘não vou.’” O principal problema identificado pelo major na companhia era o fato de, todos os dias, das 19h às 23h, quase todas as viaturas estarem empenhadas nas ocorrências chamadas de desinteligência, basicamente, brigas de família. O problema dessas ocorrências é justamente o potencial para que dali surja um ho193
micídio. A Secretaria de Segurança Pública analisou homicídios dolosos registrados em Boletins de Ocorrência entre janeiro e abril de 2014 e, em 12,5% dos casos, as vítimas foram mortas por causa de conflitos entre familiares e casais. Os mesmos números mostram que, a cada dois dias, três pessoas são mortas no Estado de São Paulo em brigas de família. “Eu vi que essas famílias precisavam de auxílio e orientação porque estavam em processo de desagregação familiar, por falta de formação ou recursos. A gente sente a carência de uma assistência social que tinha umas décadas anteriores, mas hoje não tem no Brasil. O governo não investe muito nisso.” O major então buscou suprir essa falta do Estado com organismos sociais (associações, igrejas, psicólogos e voluntários) que passaram a visitar as famílias com ocorrências. Ele pegava os Boletins de Ocorrência e ligava: — Oi, Fulana, a senhora recebeu a visita da polícia tal dia? — Foi... — E como que está a situação agora? — Tá tudo bem, é que aquele dia meu marido estava de cabeça cheia. — E vocês estão precisando de algum apoio? Orientação? — Ah, a gente precisa muito. — Posso fazer um contato com um agente comunitário pra visitar vocês? — Pode. Em quatro meses, as ocorrências de desinteligência foram praticamente zeradas e as viaturas não ficaram mais empenhadas nisso. Segundo o major, os policiais levam em média de 40 194
minutos a três horas para resolver uma ocorrência de marido e mulher. Isso em média. Ele conta de uma briga de filhos de vizinhos que envolveu 17 pessoas e levou 11 horas. Com as viaturas livres, as ocorrências “normais” caíram em 23%. Pela iniciativa, o major respondeu a nove denúncias feitas por outros policiais à Corregedoria da PM. “A gente enfrenta isso quando lida com pessoas, não consegue agradar todo mundo. Alguns policiais não concordaram, diziam que eu estava passando ocorrência pra minha igreja. Mas a minha igreja era em Guarulhos e eu morava em Pirituba. O que eu tinha era um contato com várias igrejas e associações.” Nessa época, Franciscon foi chamado para fazer o mestrado na polícia, no Centro de Altos Estudos de Segurança (Caes), algo necessário para alcançar o posto de major. Embora não seja reconhecido pela Capes, é um mestrado profissional e tem um ano de duração. O major fez dessa prática desenvolvida na companhia, batizada de “Paz na Família”, a sua tese na área de Ciências Policiais e de Segurança e Ordem Pública. Seu orientador foi o comandante do batalhão que, na época da apresentação, era o subcomandante da PM em São Paulo. “Na véspera da formatura, veio a última denúncia. Dei a cópia da minha tese, e o subcomandante encaminhou para o secretário de segurança. E nunca mais veio nada. Aí resolveu.” Em 2012, já no posto de major, foi comandar o 18º, na Freguesia do Ó, e ainda naquele ano, participou de uma mega operação envolvendo cinco batalhões na serra da Cantareira, uma área de encosta invadida, com muitas favelas, que vai desde o Jaraguá até a rodovia Fernão Dias. Em Jaraguá e Taipas havia um índice alto de 17 a 21 procurados da Justiça presos por mês. Detidos não em ocorrências, mas em abordagens. As abordagens policiais são, aliás, um dos pontos de questionamento sobre a ação da polícia. Segundo uma pesquisa di195
vulgada neste ano pela Ufscar, que analisou 734 processos da Ouvidoria, de 2009 a 2011, a cada 100 mil habitantes, houve 35 negros presos contra 14 brancos, sendo que 30% da população do Estado é negra. A tese argumenta que o racismo está, portanto, institucionalizado na PM. Franciscon diz que a abordagem é muito importante para retirar drogas e armas, e pegar gente que está com mau propósito para cometer o crime. “O policial está no policiamento: aquela pessoa lá tem um jeito suspeito, vamos abordar? O cara não estava fazendo nada, não tinha nada, respeitava o policial e, quando ia ver o RG, procurado pela Justiça.” Essa definição de jeito suspeito é que é, digamos, suspeita, mas o major tenta explicar. “A pessoa pode ter roupa de mendigo ou a roupa de uma pessoa chique, você não sabe, mas pode ser um ladrão. Tem pessoa que tem rosto de médico e professor, mas é bandido. Mas sempre tem um perfil. A maior parte dos presos são adolescentes e jovens, entre 16 e 23 anos, homens. Cor? Hoje não tem tanto. Hoje não tem status, rico está roubando, pobre está roubando, porque é uma moda, é o desafio do jovem adolescente de mostrar que é homem. Desafiar a autoridade e roubar.” O major argumenta que a ação de abordagem é preventiva e qualificada, ou seja, direcionada para tornar a ação eficaz. A definição do alvo vem com pela vivência ou feeling do policial, pelo planejamento do comando, que rastreia locais com mais incidência, e também através de descrições de vítimas. “As abordagens recebem críticas porque a mídia traz que a sociedade fala que a polícia está sendo autoritária ou arbitrária fazendo a busca pessoal. O código do processo penal dá esse poder. E é importante fazer isso para agir com prevenção.” Voltando à ação na Cantareira, os batalhões 26º, em Mairiporã, o 49º, no Jaraguá, o 5º e o 9º, na zona leste, ficaram res196
ponsáveis por cercar a área, enquanto o 18º atuaria lá dentro. A operação foi planejada com o coordenador operacional da PM e a Secretaria de Segurança Pública. Participaram a Rota, o Coe, a polícia ambiental e a polícia de trânsito –um total de 280 policiais. Dois meses antes, a PM se preparou com fotos, mapas, Google Earth, sobrevoos na região com helicópteros, maquete. Eram 81 pastas com informação para 81 equipes de prevenção qualificada. Parte da polícia entrou no local antes, às 4h, e a operação começou de fato às 6h. Em quatro horas, foram 17 presos, dinheiro e armas apreendidos, três mil pés de maconha e três antenas clandestinas encontrados, motos e veículos roubados recuperados, uma vítima de sequestro liberada. Quando a operação terminou, um grupo do Coe ainda ficou escondido na serra. Quando os suspeitos retomaram suas posições, onde terminava a ocupação do solo e começava a vegetação, os policiais chegaram pelo mato, surpreendendo a todos. Lidar com a favela que cresceu ocupando a serra não é nada fácil. Mas o que tira o sono do major mesmo são os bailes funk. São um pesadelo. São o sinal de que a sociedade caminha para o abismo. “Está havendo uma desconstrução de valores sociais. Está havendo questionamento de quem tradicionalmente tinha autoridade. E estão recebendo reconhecimento aqueles que não deviam. Por exemplo, um cara que promove um baile funk, ele é um herói, um líder. O PCC, que faz o tráfico e promove festa de baile funk, é o bambambã.” Franciscon explica que o fenômeno baile funk acabou diminuindo as biqueiras nas favelas porque é mais fácil vender tudo nos bailes, frequentados por jovens de várias camadas sociais e regiões da cidade. 197
Como não poderia deixar de ser, em sua carreira, o major teve um grande episódio de combate ao baile funk. Foi também no 18º, na Freguesia do Ó, em 2013. Restaurantes tradicionais próximos à praça da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, frequentadores da missa, feirinha de artesanato, crianças, todos no bairro tranquilo tiveram a rotina alterada quando o funk dominou as ruas entorno da igreja. O major conta que um político conseguiu (mesmo sem alvará da Prefeitura) abrir oito bares para oito cabos eleitorais em uma rua ali perto. Os bares fechavam a rua com mesas, vendiam bebida alcoólica barata para menores, e o funk rolava solto. Vinham dois mil jovens, inclusive das zonas sul e norte, para o baile funk que acontecia sexta, sábado, domingo e até quinta-feira à tarde. E sobrou pra PM resolver. Mas o major decidiu que não ia segurar o problema sozinho. “Houve um processo de omissão ao longo do tempo, dos poderes públicos e da sociedade. A Prefeitura não agiu quando tinha que agir, a CET não atuou, a Polícia Civil, a Polícia Militar, a Guarda Municipal, a igreja se omitiu, a associação do bairro... Então foi assim até atingir esse status, essa condição.” A solução foi marcar uma audiência pública no centro cultural do bairro. Franciscon chamou de porta em porta os bares, igreja, moradores, restaurantes. Convidou o delegado, subprefeito, CET, Psiu –“todos que tinham que dividir a pizza”. Numa quarta-feira à tarde, reuniu 81 pessoas. “Expusemos o problema e as autoridades puderam falar sobre o que estavam fazendo pra resolver. Na verdade, não estavam fazendo nada, mas deram aquele sambarilove.” Outra reunião foi marcada para que as os órgãos públicos apresentassem o que haviam prometido. A ideia era unir todos os responsáveis públicos e a sociedade para resolução do problema. “Eu fiz a reunião para mostrar à opi198
nião pública e não recair só nas minhas costas. Chamei os jornais de bairro para retratarem e um fato curioso foi que um desses órgãos públicos não veio. O jornal destacou essa ausência. Aí na reunião seguinte o cara veio, então funcionou.” Com todos os órgãos atuantes, o bairro venceu o baile funk. E Franciscon ganhou o prêmio Mário Covas, que homenageia boas iniciativas desenvolvidas por servidores e funcionários públicos em São Paulo. Outra questão que marcou esse período no 18º foi uma área de preservação em Taipas, com um manancial, que estava cercada de favelas. O major conta que pessoas com intenção eleitoreira estavam influenciando os sem teto a invadir a área. Em troca, teriam assessoria de um advogado, mas precisariam assistir às reuniões partidárias do tal partido. Quando o major foi procurar o dono do terreno, descobriu que ele também estava no esquema: iria doar o lote em troca de dinheiro. “No final, o que ia acontecer? Aquelas famílias, que iam invadir e multiplicar, talvez iam trazer famílias de outras áreas: zona sul e zona leste. Aumentaria mais a ocupação do solo, ia degradar a área ambiental, ia aumentar a quantidade de violência e crime. Ia aumentar esgoto, ia aumentar demanda de tudo.” A Polícia Militar então retirou as poucas famílias que já loteavam o espaço. “Documentamos tudo, tudo com educação, agindo sempre com a lei.” O major enviou o caso para a Prefeitura e para a Promotoria, que ordenou segurança ali 24h para evitar a invasão. Depois do sucesso contra o baile funk, Franciscon foi transferido. Foi ser chefe do planejamento operacional do comando da zona norte e foi chamado para fazer seu doutorado na PM, o que abre as portas para a ascensão a coronel. Com a tese concluída, o major só espera o dia da promoção e, até que se torne coronel 199
Franciscon, voltou a trabalhar no 18º. Detalhe: a tal área ambiental de Taipas foi invadida nesse meio tempo. Foi só mais um pingo de decepção na carreira policial –cheia de dificuldades. A maior desilusão de Franciscon é justamente a sociedade brasileira. “Porque ela não respeita a autoridade e não respeita as leis. O brasileiro viaja para os Estados Unidos e respeita as leis lá. Até para ser chique e educado. Mas quando ele desce no Brasil, continua fazendo as coisas igual ao favelado que ele critica. Isso vai desde o pobre até o que tem formação. Ser polícia no Brasil não é fácil que nem nos EUA ou na França, onde as pessoas respeitam a lei e a autoridade.” Mas, se brasileiro não gosta da polícia, vai ter que engolir mesmo assim. O major diz que não há governo sem polícia porque onde há lei, haverá gente disposta a descumpri-la. O major reclama, por exemplo, da falta de respeito com os pais, professores e até com o guardinha da CET. “Quando chega a Ronda Escolar, tem aluno que fala assim: ‘manda aquela viatura grande que essa pequena já não dá mais pra nós’. Falta o conteúdo de valores que vem da família, e o policial acaba agindo como inspetor de aluno.” No Brasil, o tal do “você pensa que é quem” reina. E contra isso, o major rebate com um pensamento conservador que reina igualmente, a tal da “inversão de valores”. “Essa troca de valores é um processo que eu noto há uns dez anos. Quando eu entrei na PM, em 1984, já era o processo de abertura política, a polícia já estava querendo não ser vista mais como autoritária, estava buscando uma forma de aparecer junto a sociedade, mas ainda tinha a rivalidade ideológica de quem era capitalista e quem era comunista. O governo militar do lado capitalista, os intelectuais, políticos e artistas dormiram pro lado da URSS, que era comunismo. A questão 200
ideológica era sempre presente. Mas quando eu entrei, adolescente, 17 anos, aprendendo as coisas, a policia me passou coisas boas, eram professores bons, eram pessoas boas, cidadãos, assim como eu fui professor na academia também. Aqueles pacotes que vêm prontos dos formadores de opinião para a sociedade são muito perigosos. E hoje a gente vê isso continuando de novo. Hoje você não tem os pólos de comunismo e capitalismo. Há bandeiras ideológicas fragmentando a opinião das pessoas. Ora a pessoa é a favor disso, ora é a favor daquilo, ora ela se radicaliza pra uma situação, ora ela tolera outra. Bandeiras da descriminalização das drogas, penas alternativas, questionamento da autoridade.” É dentro desse molde conservador de pensamento que o major analisa os protestos de junho de 2013. Para ele, não houve excesso da polícia nas manifestações porque não se tratavam propriamente de manifestações, mas de uma ação criminosa dos black blocks. “Eles não foram fazer só manifestação. Pra quem foi fazer a manifestação e não era black block, a polícia foi dar segurança. A ideologia dos black block é de guerra social. Pelo menos, é o que eu vi eles mesmos postando na rede social. Então, eles têm uma tática de ação, eles distribuem cartilha sobre como agir, eles pagam adolescentes para atuar. É um sistema tático de atuação. Eles se misturam com aqueles cidadãos que estão indo para se manifestar, mas não estão no mesmo espírito de manifestação civil. Eles estão no outro espírito e acabam causando o dano ao patrimônio e às vidas. Então, a polícia tem que agir.” Alegando que a medida limitaria a manifestação àqueles com espírito de protesto civil, o Estado de São Paulo aprovou em julho deste ano uma lei proibindo o uso de máscaras e o por201
te de “objetos pontiagudos, tacos, bastões, pedras, armamentos que contenham artefatos explosivos e outros que possam lesionar pessoas e danificar patrimônio público ou particular.” Franciscon diz que os movimentos sociais são manipulados segundo interesses eleitoreiros e de partidos. As pessoas nunca estão na rua somente pela causa que defendem. “Isso eu aprendi na vivência com o que eu observei. Eles pegam os humildes e usam a necessidade deles para fazer um movimento social de fachada para se autopromoverem como líderes sociais naquele meio. Dá vontade de... É triste isso viu!” Da mesma forma, os black blocks, com sua ideologia importada da Europa por “quem tem dinheiro”, se aproveitaram do sentimento anti-Copa para ganhar o movimento. A polícia identificou as táticas black blocks com base em estudo e análises e, embora não negue que falta comprovação, o major afirma: “muitos jovens deixaram de ser telemarketing e office boy pra ir pro black block. Ganham uma cartilha de tática de ação no movimento social. Por exemplo, cuspir na cara do polícia. ‘Ó, aquele policial ali é grande, vai dar visibilidade. Deixa o cara nervoso, cospe, joga pedra, que quando ele vier, ele vai bater em você, mas a gente vai filmar. Vamos com roupa normal e vamos falar que somos freelancer pra depois vender pra um jornal.’” O policial tem que estar preparado para essa tática da provocação e não responder. Cabe ao oficial, punir e retirar da operação aqueles que respondem, segundo o major. “Tem que ficar lá ouvindo, e entrar por um ouvido e sair pelo outro. Depois de um tempo, isso fica automático. Porque você já sabe as regras do jogo. O repertório é sempre o mesmo. Fala que é corrupto, que é da ditadura, da repressão, xingamentos chulos também. Não tem muita criatividade não”. 202
Franciscon diz que os black blocks têm origem no bloco das trevas, algo que surgiu com o punk depois da Segunda Guerra Mundial, já nos anos 60, quando o jovem estava louco, sem esperanças por causa das bombas atômicas. “Raspava o cabelo, numa forma de mostrar a revolta, e pintava o olho de preto. Aí vem o dark e mais toda aquela sequência de modismo, de comportamento jovem.” Para o major, não há falta de preparo para lidar com a manifestação. “Tem que ter uma preparação contínua. A polícia se preocupa muito em estar preparando. Prepara a parte psicológica, a parte intelectual, a parte física. As pessoas não têm conhecimento do nosso preparo. Mas é um risco de um piloto de avião. Se der uma pane, o avião cai e todo mundo morre. O erro dele é fatal. Um cirurgião, se errar, o erro dele é fatal. O policial, o erro dele pode ser fatal. O piloto e o médico tiveram um bom preparo. Pra ser um policial, exige-se um bom preparo, mas é estar lidando com fatalidade.” O problema é que a dificuldade do policial no Brasil não é só essa inversão de valores da sociedade. Franciscon diz que é também a falta de reconhecimento do Estado, o que se reflete nos salários dos PMs. “Na visão global abaixo da linha do Equador, quais cidades arrecadam como São Paulo? Cingapura? Nova Déli? A cidade tem esse potencial todo e como pode termos a quinta polícia mais mal paga do país. Tinha que ser a primeira mais bem paga do país e de outros países do sul.” Soma-se a isso a decepção do major com os “companheiros que não correspondem”, largamente chamados de “maus policiais”. Como em toda profissão há resiliência, diz o major, a boa formação e o caráter militar servem para evitar a má conduta –“e mesmo assim acontecem essas situações”. Franciscon conta que já prendeu policiais, mas já deixou de prender também, quando faltava evidência. Diz que não prende 203
injustamente um pai de família só por pressão de jornais. Ele só prende no ato se constatar que realmente houve dolo, a intenção de matar, ou quando houve corrupção. “Uma vez eu prendi um policial que desceu da viatura, disparou a arma acidentalmente e matou uma pessoa. Ele não queria matar a pessoa, mas esse eu tive que prender porque ele matou um cidadão. Acabou sendo solto porque se provou que a arma dele tinha problema. Há dez anos, eu mandei embora um cabo que roubou linguiça. Tinha um salário baixo, faltou dinheiro para comprar a mistura, e ele roubou para levar para a família. Foi furto famélico. Mas quem era essa pessoa? Era um metalúrgico, um desempregado? Era um policial. Aí muda de figura. Ele tem um dever. A família estar passando fome não justifica. Já tinha 25 anos de carreira, foi mandado embora e preso.” “Quem está pondo esta farda saiu da sociedade que a gente lida. Não tem diferença nenhuma. É a mesma pessoa. Ela só recebe o preparo técnico profissional e a doutrina de polícia para estar trabalhando. A polícia é um dos órgãos públicos do Estado que mais investem recursos financeiros em treinamento de pessoal. A Justiça Militar não é uma justiça especial, privilegiada. É eficaz. Julga apenas 120 mil pessoas (PMs na ativa e mais a reserva). O processo é rápido e o cara vai pra rua. A Corregedoria da PM também é muito forte e atuante.” Se a educação e a punição não conseguem zerar os casos de abuso policial, é claro que Franciscon não atribui isso à corporação, isolando os crimes cometidos por homens fardados. “No poder público do Brasil, tem muito abuso de poder. A região do Amazonas é uma terra sem lei. Aqui em São Paulo é ótimo. Nossa polícia não comete abuso de poder. Há ocorrências de abuso de poder individual, de algum policial que não conseguiu cumprir a lei, mas a instituição preza por manter o 204
cumprimento da lei. A pessoa representa toda a sua instituição, mas não é a instituição. Ela é membro. A instituição busca minimizar sempre o acontecimento desses fatos. Mas o ser humano é um ser imperfeito. Esse tipo de trabalho que eu fiz [no 18º batalhão] nada mais foi do que convidar e estimular os outros órgãos públicos a não abusar da lei, mas a cumprir a lei.” Nas suas teorias sobre criminalidade, ele diz que há um componente, social, claro, mas que quem pratica o crime não é só aquele que não teve oportunidade. “Essa resposta não é a resposta pra tudo.” O major diz que também depende dos valores de cada pessoa, já que um mesmo pai pode criar dois filhos: um se torna advogado, outro se torna criminoso. Mesmo pra quem tem condições de ser alguém na vida, às vezes o crime tem melhor custo-benefício. Além disso, o ambiente também pode ser um detonador de crimes. Adepto da teoria das janelas quebradas, o major diz que “um ambiente que não tem um cuidado, não tem o zelo da coletividade, vai induzir aquela coletividade a reproduzir isso, influenciando o comportamento das pessoas. Uma área que está impactada pode irradiar e aumentar a quantidade de ocorrências.” Sempre na defesa do cumprimento da lei, Franciscon acha que o discurso de “bandido bom é bandido morto” está “por fora”. Ele não cultua isso. E não compactua também com punição coletiva da sociedade. Bandido amarrado no poste “é uma cultura totalmente primitiva, é falta de regramento social”. Mas também prova que tanto a ação como a omissão da polícia influenciam a sociedade. “Se ela atuar bem, está influenciando bem. Se atuar mal, ela está influenciando mal. Por isso, é um setor muito importante que todos têm que valorizar, compreender, prezar pra que seja bem aperfeiçoada ao longo do tempo.” * 205
“Esses bandidos ainda devem estar vivos. Fazer o quê? A lei do Brasil é assim: falha. Mas eu não organizei esquadrão da morte, não mandei sair matando bandido por aí. Continuei normal. Não precisei de psicólogo. O que me ajudou muito foi a fé, sou evangélico. Me senti impotente como qualquer outro cidadão. Se aconteceu isso comigo, o comandante de policiamento de Pirituba na época, todos estão correndo o risco. Aí falam pra mim, que tive meu pai morto, que eles viraram bandidos porque a sociedade e o governo não deram oportunidade. Não tiveram oportunidade, né? Mas foram lá e mataram meu pai. Isso é um discurso muito superficial. Cada vida é um detalhe.”
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A mãe Ah, você quer brigar? Vamos brincar de tiro então. Vamos fazer um faroeste aí no meio da rua. Adriana, soldado
Adriana diz que é sua intuição que a leva ao lugar certo na hora certa. “Marta, preciso fazer uma ligação.” Na época, não havia celular. A viatura encostou perto de um orelhão (ainda do tipo casinha de concreto) em uma rua próxima à Augusta. “Quando eu chego no orelhão, tem uma criancinha. Recém-nascida, toda embrulhadinha, tinha acabado de sair da maternidade”, conta. Adriana nem fez a ligação. — Marta, olha isso aqui! 209
— Adriana, de quem é? — Eu achei. — Achou onde? — Dentro do orelhão. As roupas cor-de-rosa indicavam de qual maternidade vinha o bebê. Acostumada a patrulhar a área da Paulista, Adriana já tinha visto mulheres de rua dar à luz ali e ganharem a mesma roupinha rosa para os filhos. A soldado então acionou o Copom e o seu comandante –uma comandante, no caso. Antes da unificação do policiamento feminino e masculino, Adriana fazia parte da polícia feminina, com um efetivo separado e com batalhões próprios (quatro na cidade), que não cobriam uma área tão pré-determinada como os batalhões regulares. Elas cuidavam de ocorrências mais leves, como ajuda a gestantes, primeiros-socorros e casos de família. Quando, por acaso, pegavam ocorrências mais sérias, eram orientadas a esperar mais apoio e não tomar a dianteira do caso. Ao levarem o bebê à maternidade, conseguiram o nome de duas suspeitas que tinham parido há pouco. De lá, para delegacia. Enquanto o Boletim de Ocorrência era feito, Adriana, que ficara com a criança –desde a manhã até cerca de 21h–, tinha que levá-la de tempos em tempos ao hospital para ser amamentada. Choviam repórteres na delegacia. O delegado localizou uma moça, foram até a casa dela e... era ela mesmo. O irmão e a cunhada não haviam percebido que ela estava grávida, por medo, abandonou o bebê no orelhão. Já era madrugada quando a situação estava esclarecida e a criança foi entregue à mãe –não sem que quase todos os personagens fossem interrogados pelos repórteres. 210
As ocorrências que ficam na memória são as que “mexem com a gente como pessoa, mas temos que tomar atitude como policial militar”, diz Adriana. É claro que nem sempre dá tudo certo. “Uma que me emocionou muito e a gente teve um trabalho muito árduo como policial foi adentrar um prédio com dez andares e socorrer um senhor de 300 kg que estava tendo uma parada cardíaca”, conta. A ocorrência caiu nas mãos da PM feminina. Adriana e sua companheira não podiam esperar o resgate. Era preciso levá-lo ao hospital. Mas como movê-lo? “Ele estava no chão já. Nós fizemos respiração boca a boca. Enquanto uma fazia isso, a outra fazia massagem. Na época não tinha luva, não tinha nada. A gente pegou um saco plástico, fez um buraco no saco plástico e colocamos na boca dele. Com muito sacrifício, conseguimos colocar um cobertor debaixo dele e arrastamos junto com os dois zeladores do prédio. Fomos arrastando ele até o elevador”, diz Adriana. No térreo, o desafio era maior: colocá-lo dentro da viatura, o que foi feito através de “muito custo, muito muito muito”. “Saímos correndo e, infelizmente, ele chegou ao hospital morto. Mas ele saiu vivo, ele saiu vivo do prédio. Isso foi terrível. Mas a gente não mediu esforços pra fazer... Ele tinha 300kg.” Em 23 anos de carreira, Adriana nunca teve ocorrência com morte –nem de policial nem de suspeito. “Foram muitas ocorrências maravilhosas.” Nenhuma em que ela tenha tido medo de morrer –nem mesmo nos ataques do PCC, em 2006. E nem mesmo depois de perder um companheiro de trabalho. “É triste, muito triste. A gente não consegue raciocinar, a gente fica imaginando: ai, já pensou se fosse eu, se eu estivesse ali. É desolador. Mesmo porque, no outro dia, a gen211
te não vai ver o polícia, não vai ouvir ele falar no rádio”, conta, já com lágrimas nos olhos. Mas a tristeza é passageira. Adriana é moça alegre, logo se vê. Aos 47, depois de ter passado poucas e boas, é espontânea e divertida. Vai narrando uma sequência de acontecimentos incríveis como numa conversa de bar. É uma morena alta. O cabelo liso preto está preso num rabo-de-cavalo. Usa um piercing pequeno no nariz, uma blusa regata amarela e um esmalte azul –desses que chamam atenção. A soldado é absolutamente fiel à sua profissão. Não por afinidade total com a corporação, pelo contrário. Mas porque guarda o policiamento de rua no coração. Adriana entrou na PM em 1991, aos 23 anos. Foram oito meses no curso de formação, que, segundo ela foi “ótimo”. Sua turma foi a última a ter aulas no CFAB (Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Bombeiros), na marginal Tietê, onde hoje fica a Escola de Sargentos. Na época, não eram misturados os alunos homens e mulheres. Sua turma tinha 224 meninas. “Era todo dia treinamento, você entrava no alojamento e eram 224 meninas pra pouco chuveiro. Você tinha que tomar banho em um ou dois minutos porque tinha que voltar pra sala de aula. Aquele monte de menina! Tomava banho de gato, mas tinha que estar perfeita, cabelinho arrumado, batom, a roupa impecável, sapato engraxado, a saia e a camiseta muito bem passadas.” Depois da turma de Adriana, as “PM fem” foram treinadas nos próprios batalhões femininos –eram os GTs (Gabinete de Treinamento). “No GT, não tinha aula de tonfa, comando craw, era uma coisa muito simples. A minha não, a minha turma foi a última que foi pesada. Tive que passar embaixo de lama, atravessar corda e cair no rio na água podre, subir naqueles ferros bem altos pra ver 212
se a gente não tem medo de altura, correr 20 minutos todos os dias, abdominal... Quando faltava um mês pra terminar o curso, eu queria desistir porque eu não aguentava correr mais. E quem não deixou foi uma tenente que, na época, tenente ótima, lembro até hoje, era segurança da primeira-dama e dava aula de Educação Física. E ela não me deixou sair.” Dali, Adriana só saiu formada para fazer o policiamento de rua. “O sonho de todo mundo, não adianta, é sentar dentro de uma viatura. Não adianta falar ‘vou entrar na polícia, vou sair do curso e trabalhar na administração’. Mentira. O sonho de qualquer policial que faz um curso, o primeiro sonho dele é sentar numa viatura e modular no rádio. Eu saí, fui trabalhar na rua.” Trabalhou no primeiro batalhão feminino, que cobria antes a zona leste, mas passou a cobrir a região central, reforçando o efetivo de uma área policiada por três batalhões da PM masculina. Depois de fazer um curso na Honda e na Rocam, o efetivo de motos da tropa de choque, Adriana assumiu uma das motos que o batalhão havia ganhado da montadora. Era algo experimental e logo ela voltou pra rua, em uma perua de Assistência Família. “A gente passava na serra e recolhia as crianças pra ir pro abrigo. Ia quem queria. Aí lá eles tomavam banho, comiam. Quando era de tarde, tava lá de novo. A gente estacionava a Kombi. As mesmas carinhas que de manhã a gente levou, estavam lá de tarde.” — Tia, leva eu. Tia, leva eu. Para uma apaixonada pelo policiamento, a parte de mais orgulho na carreira foi quando participou do tático feminino, 213
o que durou de um a dois anos. “Tenho as fotos”, diz satisfeita. Para isso, fez um curso com a Rota em Pirutuba, onde montavam até simulações de favelas. Hoje Adriana trabalha no 2º batalhão, que cobre a área de São Miguel, Cangaíba, Penha –perto de onde mora, na zona leste. Mas é do centro que vêm suas melhores histórias. “Um taxista falou que tinha acabado de ser roubado e pedimos a descrição da pessoa. Aí estávamos patrulhando e, de repente, numa subida, eu vi um cara embrulhado no papelão.” — Marta, está muito estranho aquele cara se cobrindo com papelão. — Onde, Adriana? — Ali! Pode ir em cima que é o cara. Marta agiu sem pensar e, em vez de parar a viatura longe como é recomendado, parou na cara do ladrão. “Ele já jogou o papelão no chão e atirou na gente. Se a gente tivesse parado longe, quando ele fosse ter uma reação, a gente teria como reagir. Mas não foi nem culpa dela, foi mais um ‘vamos, vamos, vamos’ pra não deixar o cara fugir.” Elas se abaixaram. O suspeito aproveitou para fugir descendo a rua. A viatura estava no sentido contrário, as PMs tiveram quepersegui-lo a pé. “Ele desceu atirando pra cima, e a gente descendo a pé em zigue-zague. Por que em zigue-zague? Porque é mais difícil do tiro acertar.” Na troca de tiros, as policiais acreditam ter acertado o suspeito, já que viram rastros de sangue pela rua. “Só que ali na paralela era a avenida Nove de Julho. A gente acha que ele entrou dentro de um ônibus e foi embora. A gente não conseguiu pegá-lo.” 214
A intuição (ou sorte pra quem não acredita) também estava lá quando, perto do Hospital Pérola Byington, na Brigadeiro Luís Antônio, no centro, uma velhinha “toda senhorinha” abordou a viatura dizendo que haviam levado sua carteira. — Como que o rapaz estava? — Ai, não sei. — Ele usava boné? — Não sei... “Ela não sabia nada. Velhinha, né?”, lembra Adriana. — Olha, a senhora vai entrar aqui na viatura e nós vamos dar uma volta bem devagarzinho pra ver se a senhora vê alguém. Caso a senhora não localizar ninguém, a gente vai levar a senhora na delegacia e fazemos o boletim de ocorrência. A cada rapaz avistado, seguia-se a negativa da senhorinha. Eis que, quando a viatura ia subindo a rua Augusta, vêm descendo dois rapazes do outro lado. Um ainda criança. Quando a viatura passou, eles olharam para trás. — Marta, volta com essa viatura agora no meio da rua. É aquele rapaz. — Onde, Adriana? — Volta aqui no meio da rua agora! Enquanto a viatura virava, a criança, de uns oito anos, saiu correndo. O maior, porém, foi abordado. — Mão na cabeça. 215
Adriana apalpou a carteira que estava dentro da calça, na parte da frente. Segurando-a, perguntou: — O que é isso aqui? — Nada, senhora. — Isso aqui é uma carteira. É sua? — É minha. Ela tirou a carteira de dentro da calça e levou pra senhorinha, que aguardava na viatura. “Não expus ela, fui até a viatura e ela confirmou que era sua carteira.” Adriana levou o rapaz, já maior de idade, preso. “Era o maldito que tinha roubado a senhorinha. Aí a gente começa a falar umas coisas:” — Você não tem dó? Outro dia pode ser sua mãe! Dois ou três anos depois, Adriana e Marta foram depor sobre o caso. No fórum, o rapaz apareceu usando a mesma camisa do dia da prisão. Depois de serem ouvidos os advogados, Adriana é interrogada. A juíza lê um trecho do processo e pede que a soldado descreva o resto. Depois, o advogado de defesa lhe faz uma pergunta. Adriana responde à juíza, que diz: — Perfeito! Não preciso nem ouvir sua parceira mais. Está encerrado. Na saída, Marta a esperava. — Marta, nem vai te ouvir. — Por que, Adriana? 216
— O advogado perguntou qual era a camisa que o cara tava no dia e eu falei que era essa mesma de hoje. O caso marcou Adriana. “Era um rapaz novo: a partir do momento que a gente também tem problema na família, a gente toma as atitudes de policial militar, mas fica um pouco ferida, sabe? A gente se põe no lugar da família. Podia ser meu irmão aqui.” * Adriana nasceu e cresceu em Artur Alvim, na zona leste, sem que nada lhe faltasse graças à mãe, como faz questão de ressaltar. Em uma entrevista sobre a PM, a palavra “polícia”, mencionada cerca de 60 vezes, perdeu para o “mãe”, já que Adriana falou da dona Almira pelo menos 80 vezes. São vizinhas, moram na mesma rua. A casa de Adriana, na periferia, bem próxima à estação de metrô Artur Alvim, é a mais bonita da rua. Pintada de laranja por fora e absolutamente limpa e organizada por dentro. Ao entrar, o primeiro cômodo é a sala de TV e logo, atravessando-a, chegamos à cozinha, ampla, branca e com uma mesa no centro –tudo bem equipado com eletrodomésticos. “Sempre tive uma vida maravilhosa. Estudei em colégio particular, colégio de freira, toda minha vida. Fiz inglês. Eu e meus irmãos sempre tivemos de tudo por parte da minha mãe, não por parte do meu pai. Não sou rica, não sou classe média, mas não posso falar que tive uma infância má”, conta. Houve até um momento em que sua família chegou a passar fome, quando a mãe estava desempregada. Ela tinha oito ou nove anos. “A gente comeu pão seco, minha mãe teve que pedir pra vizinha.” Mas, ainda assim, Adriana não reclama e é profundamente grata à mãe, que claramente é a base de sua família. 217
Entre os irmãos, só Adriana fez faculdade. O irmão mais novo, Alexandre, nunca trabalhou. O mais velho, Almir, 56, casou novo e até pouco tempo era gerente do shopping Santa Úrsula, em Ribeirão Preto. O do meio, Anselmo, 49, vive com a mãe, pois tem uma deficiência. O pai, Armelindo, fresador, trabalhando um pouco em uma empresa, um pouco em outra, era mais desempregado que qualquer outra coisa. A mãe trabalhou em fábricas, como na Sousa Cruz, que antigamente ficava no Carrão, mas se aposentou como secretária de um juiz, com um bom salário. “E se eu falar pra você que somente de três anos pra cá que andei comprando o meu carro? E eu tenho 47 anos (risos). Ela paga minhas contas, ela faz tudo. Ela vai, compra uma panela pra ela e compra uma pra mim. Às vezes, compra só pra mim. Meu filho me pede alguma coisa, aí no outro dia ela sai. ‘Onde você vai mãe?’. Ela vai lá e compra o que meu filho pediu. Ela é maravilhosa.” A mãe, inclusive, foi a responsável pela entrada na PM. Adriana trabalhava em um instituto de idiomas para estrangeiros no Morumbi, que havia sido aberto para ensinar português e inglês para funcionários da Volkswagen, da Ford e da Autolatina. “Aí um dia eu passei mal, fui ao médico e passei no fórum onde minha mãe trabalhava, na João Mendes. Desci no Anhangabaú para pegar o metrô pra vir embora e pensei ‘vou passar na minha mãe.’” — Adriana, abriu inscrição pra Polícia Militar. Vai lá se inscrever. — Mãe, tô doente, não vou lá não. — Vai lá, Adriana, é aqui na Cruzeiro do Sul, no metrô Armênia.
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Adriana foi porque “tudo que minha mãe pede, eu faço”. Ao pagar a taxa e fazer a inscrição, ela recebe o aviso de que já tem um teste naquele dia mesmo. “Não era um teste só, eu fiz cinco testes escritos. Eu e muita gente que estava lá.” No dia seguinte, Adriana deveria voltar para continuar o processo de seleção, mas tinha que trabalhar. Ali, ela tomou um dos dois rumos: faltou quase a semana toda no trabalho para fazer testes para a polícia. Até que um motorista da empresa foi até sua casa lhe entregar uma carta dizendo que deveria se apresentar lá. O motivo era o mesmo já aventado por uma de suas vizinhas: — Adriana, vieram uns policiais aqui perguntar de você. Esse procedimento, chamado de “investigação social”, faz parte da seleção. Policiais à paisana perguntam a conhecidos como é o comportamento daquele que está prestes a entrar para a corporação. Após a visita dos policiais na empresa, seu chefe já lhe deu sua demissão. Veio o teste físico da PM. “Passei em tudo, não fui reprovada em nada.” Finalmente, chegou o dia de ver a lista de aprovados, mas seu nome não estava lá. E pior: ela estava desempregada. Uma semana depois, ela recebe uma cartinha. “Dizia que houve erro no computador e que ele havia ‘comido’ muitos nomes com a letra A. Eu tinha que entregar a documentação rapidinho porque as outras já tinham feito isso. Entreguei. Deu tudo certo.” Desde os 18, Adriana já morava sozinha –para ter uma vida mais independente e mais livre dos irmãos. “Mas eu sempre cuidei da casa e do meu irmão mais novo: dava comida, levava pra escola.” Para o irmão Alexandre, cerca de vinte anos mais novo, a mãe também conseguiu vaga com bolsa em escola privada, 219
pagou curso de inglês e deu uma moto, o que não o impediu de acabar no tráfico. “Aí ele se envolveu com os meninos aqui, as amizades, as amizades, as amizades... Começou a traficar. Dinheiro fácil. Tive muitos problemas com ele. Porque era uma policial militar irmã de um traficante, né?” Adriana, como muitos policiais, acha que a entrada no crime depende da cabeça de cada um. Não é só uma questão social, já que “o que a gente vê de ricos entrando no mundo do crime... empresários esses dias aí estavam roubando carga, e têm dinheiro, têm carrão, têm tudo!” “Cada um tem sua cabeça, sua personalidade. A gente não era rico, mas minha mãe dava de tudo. Por que meu outro irmão não entrou pro crime então? Não é verdade? Eu acho que é o caráter e a cabeça de cada um. Não é porque um tem e o outro não tem.” De toda forma, era um traficante irmão de uma policial. Dona Almira chorava: — Adriana, não aguento mais, não aguento mais. É a noite inteirinha, Adriana, gente chamando aqui. Eu não aguento, eu não durmo. E, para Adriana, a mãe é sagrada. — Alexandre, o que é isso? A mãe não dorme a noite inteira, você tá pensando o quê? E a vergonha da mãe? A mãe não sai mais no portão. A mãe nasceu aqui, se criou aqui. A mãe não sai no portão porque está morrendo de vergonha da vizinhança. Alexandre, você está acabando com ela. 220
E Adriana é impulsiva. Um dia, visitando a mãe, abriu o guarda-roupa do irmão e achou pedras de crack. “Sabe o que eu fiz? Errado, claro que errado, mas o desespero de ver minha mãe naquela situação foi muito grande. Eu sabia que eu ia comprar uma briga com meu irmão. Peguei aquelas pedras, joguei na privada e dei descarga.” Quando Alexandre chegou, Adriana já estava preparada. Os dois armados. — Cadê as pedras? Alexandre partiu pra cima de Adriana e começou a briga. Até que ele foi para a rua e ela aceitou a provocação. — Ah, você quer brigar? Vamos brincar de tiro então. Vamos fazer um faroeste aí no meio da rua. Você de um lado, eu do outro, vamos ver quem atira e quem acerta. As pessoas começaram a apartar a briga. Ele ficou na rua, Adriana foi pra casa. Até que ele pulou o muro para o lado de dentro, segundo Adriana, para matá-la. Adriana tomou a atitude mais óbvia, o que qualquer um faria, principalmente ela: chamou uma viatura, alegando que o irmão estava armado e não tinha porte. Por incrível que pareça, Adriana se decepcionou com a ineficiência da polícia, que apreendeu a arma, mas soltou Alexandre depois de dar uma volta com ele na viatura. “Eu fiquei muito revoltada, muito muito muito revoltada. Fiquei chocadésima. Chocada, porque eles sabiam que eu era policial. Ou tomasse a atitude correta ou não tomasse, não é verdade?” 221
Adriana esperava que o irmão fosse preso por porte ilegal de arma para “criar vergonha na cara”. — Mãe, ele vai ficar lá pra aprender. Deixa ele lá. — Adriana, mas ele vai sair de lá e vai te matar. — A gente resolve. Deixa ele lá. Ela não sabe explicar por que os colegas soltaram o irmão. Os PMs tampouco deram justificativa alguma. Adriana acredita que o irmão “cativou” os policiais. “Meu irmão era muito educado. Como se diz, ‘não tem cara de bandido’”, explica. Alexandre chegou a ser preso depois e, em vez de ir para um presídio, ficou um ano na delegacia. “Uma investigadora se apaixonou por ele e o delegado gostou tanto dele que não o mandou para casa de detenção.” Depois do passeio com a polícia, Alexandre voltou em fúria para casa, mas Adriana já não estava lá. Ele havia perdido além da droga, sua arma. E, no tráfico, é preciso prestar conta de tudo. As brigas perduraram. A mãe chorou por muito mais tempo. Um dia, Adriana estava na rua e (intuitivamente) precisou fazer uma ligação. — Marta, tem que ser agora. Acharam um orelhão num local um pouco perigoso. Era o que tinha. Ligou para a mãe. Naquele exato momento, a casa dela estava sendo metralhada. Mãe e irmão jogados no chão. Alexandre tinha fugido pelo fundo. Era uma emboscada. — Adriana, me socorre – dizia a mãe do outro lado. 222
“Você vê que alguma coisa me tocou pra eu ligar. Fui para o batalhão. Era o batalhão feminino. Falei com a coronel Luzia, uma mulher maravilhosa.” — Vamos ajudar você sim. Você é uma excelente policial. Luzia pediu apoio de duas viaturas da Rota. Dentro de uma delas, as policiais conversavam. — Adriana, agora eu quero que você me conte tudo. E a verdade. Ela contou tudo. E a verdade. Disse que o irmão era traficante. Uma das viaturas encostou na porta de Adriana. A outra estacionou na esquina, de modo a não ser vista. Ela juntou as coisas da mãe e pôs na viatura. O telefone tocava. — A senhora vai pra minha casa. A senhora, o Anselmo e o Alef. Alef é o filho de Alexandre, criado praticamente pela avó, já que a mãe não quis ficar com ele e o pai era traficante. O telefone continuava tocando. Quando a polícia atendia, Alexandre desligava. Os policiais revistaram o armário dele. Não tinha drogas. Olharam a papelada da moto. Tudo em dia, era a mãe que pagava. “Eles fizeram igual fazem na casa de tudo mundo, jogaram as roupas no chão, jogaram tudo, não tinha nada. Nada.” Depois desse episódio, Alexandre pediu ajuda à mãe. Pediu que se mudassem. Foram para Campinas. Todos, inclusive Adriana, que trabalhava na Rocam lá. No início, ela ia e voltava todos os dias, até que saiu a sua transferência. “Tive que mudar totalmente a minha rotina de vida pra ajudar esse meu irmão.” 223
“Nós temos parentes lá, eles arrumaram uma casa na rua deles, a gente se mudou de um dia pro outro. Eu vendi minhas coisas e fui morar com a minha mãe”, diz a policial. Elas ficaram na cidade pouco mais de um ano. Mas pouco adiantou. Alexandre ficava mais em São Paulo do que em Campinas durante esse tempo. Em uma madrugada, o telefone trouxe a notícia da sua morte. “Ele era um traficante pequeno. Vendia, pegava o dinheirinho dele, se mantinha em roupa. Coisa que não precisava, nunca precisou, minha mãe sempre deu tudo. Mas ele caiu. Tinha muitas mulheres, era mulher que chovia, era todo dia cesta de café, faixa na rua pra ele. Então assim... Caiu no mundo porque quis”, conta a irmã. Sua morte foi mais um acerto de contas no mundo do tráfico. Segundo Adriana, ele estava em frente a um bar, na rua, quando chegou uma van com 15 homens. Fizeram um círculo em volta dele e atiraram. Alexandre morreu de hemorragia aos 25 anos. “O pé ficou caído porque ele levou um tiro de calibre 12.” Como se não bastasse, para a revolta de Adriana, naquele dia, os próprios amigos de Alexandre aproveitaram para roubar sua carteira com cinco mil reais dentro. Não havia um documento com o corpo para facilitar o enterro. “Minha mãe sofre até hoje.” Ela reconheceu o corpo do irmão pelas tatuagens. “Eram tatuagem artísticas, nenhuma de bandido. Tinha uma índia no peito e o nome do filho dele.” Alef nasceu do casamento de Alexandre, mas a mãe do menino não quis criá-lo. Eles “se pegavam, se matavam, se batiam”, até que Alexandre voltou para a casa de sua mãe com o Alef. Quando ele morreu, a mãe do menino o pegou de volta –para a tristeza da avó. Mas acabou desistindo dele outra vez. 224
“Ele sabe toda a vida do pai, a gente não esconde. Então tudo que a gente vê, a gente fala ‘tá vendo, o seu pai passou por isso.’” Hoje, Alef tem 18 anos e é criado pela avó que, como fez com o filho, dá de tudo para o neto. Ainda assim, ele “é uma criança muito revoltada.” Compreensível. Abandonado pela mãe. O pai morreu baleado. “A vida dele agora é só ficar forte. Só faz musculação, é suplemento que não para. Ele está ficando neurótico. É isso.” Alef já se formou e não pensa em faculdade. Estudou em escola pública porque a mãe não deixou, na época, que ele fosse morar com a avó para estudar no Colégio Militar junto com o filho de Adriana. “Ele ia entrar como meu dependente, ia pagar o mesmo valor que pago para o meu filho”, explica Adriana sobre o desconto que os PMs têm no colégio. Adriana usa o exemplo de Alef para acalmar as angústias do próprio filho, Fernando, que, aos 16 anos, sofre a ausência do pai. — Filho, vamos se pôr no lugar do Alef. Ele não tem pai, a mãe não liga pra ele. Ele que tem que ser revoltado e, ainda assim, não muito, porque a vó dá de tudo pra ele. A vó só falta tirar a cabeça dela pra vender pra dar as coisas pro Alef. Adriana conheceu o pai de seu filho antes mesmo de entrar na PM. Ele já era policial, entrou na corporação três anos antes dela. Quando ela entrou na PM, tiveram um relacionamento. “Saímos, e nessa saída aconteceu. Eu estava na polícia há seis anos, tinha 30 anos.” No início, o pai não quis aceitar a criança porque já tinha outra mulher. Escondeu dela o filho Fernando. No fim, se separou, casou com outra, com quem teve dois filhos. Mas Fernando, ele abandonou. 225
“Até hoje não vê o menino. Na época, eu era motorista de uma coronel e ele também. A gente trabalhava no mesmo prédio. Eu cheguei a levar meu filho várias vezes pra trabalhar comigo. Eu deixava ele lá com as meninas quando eu tinha que sair com a coronel. Era quando ele via o menino.” A atual mulher também não sabe da existência de Fernando. Às vezes, Adriana liga pra ele cobrando visitas ao filho. Adriana recebia a pensão pela assistência social da PM, ou seja, o dinheiro saía do salário dele e caía no dela. Com o fim desse serviço, foi necessário fazer o processo judicial, com exame de DNA e tudo. Ele acompanhou o pré-natal de Adriana, paga a pensão e o documento de Fernando leva seu nome –aliás, os dois se parecem muito. Mas praticamente é tudo. “Todo mês de agosto, ele queria que meu ex-namorado fosse no Dia dos Pais na escola. E meu ex-namorado nunca ia e ele chorava: ‘todo mundo tem pai, só eu que não tenho’. Teve um Dia dos Pais que meu namorado jurou que ia. Eu cheguei lá e ele falou de longe ‘cadê o Carlos?’. ‘O Carlos não veio’. Aí ele já começou a chorar. Quando era a hora dos pais se aproximarem, eu que fui e ele chorou. Então o pai do amiguinho dele falou: ‘não, Fernando, eu sou seu pai. Hoje eu sou seu pai. Vem cá, vem, filho’. Aí abraçou ele, beijou ele. Aí ele falou ‘ó, nós estamos indo no McDonald’s. Vamos juntos?’. E fomos todos juntos.” Adriana elogia bastante o comportamento do filho e do sobrinho diante das circunstâncias. “Eles se dão muito bem. São umas crianças que não dão problema. E tudo que vai fazer tem que pedir, não faz sem nossa autorização, não vai pra bailinho, não fica na casa dos vizinhos. A gente não deixa.” Para o orgulho de toda mãe, Fernando gosta de estudar. “Só tira 9 ou 10. A única vez que tirou 8 chegou em casa chorando.” 226
Há uns cinco meses, começou a ir pra academia. Além disso, com o trabalho, a rotina ficou pesada: sai às 6h20 pra escola e volta só às 23h. “Está trabalhando... mas não porque precise. Trabalha numa casa de cereais, dessas que vendem coisas de academia”, diz Adriana. A vantagem é que ele pode comprar suplementos pela metade do preço. Dos R$ 650 que ganha, recebe entre R$ 100 e 200. O resto vai nos suplementos. Fernando nunca falou em ser policial. Quer prestar mecatrônica. Adriana acha bom. “Não quero que ele passe o que eu já passei.” * Dois ou três anos após a entrada na polícia, Adriana ganhou passagens para férias em Miami e Orlando. A mãe fez uma surpresa e lhe deu os bilhetes sem saber o tormento que viria por causa do visto americano. Segundo Adriana, ela teve dificuldades especialmente por ser policial. Buscando orientações de como ir à entrevista, recebeu a opinião de que deveria ir fardada por ser militar. Foi com o uniforme social da PM –“aquela sainha com aquele chapeuzinho”. Na época, ela conta que o visto era difícil de conseguir. “Chegando lá, já me viram fardada. Eu entrei com a documentação. Cheguei na salinha e sentei. Do lado de fora, fica um militar do Exército armado com metralhadora. Eu fui no banheiro. Quando eu saí, me senti muito constrangida. O militar foi na hora até a porta do banheiro, ele deu um pontapé na porta e olhou todinho, vistoriou o banheiro pra ver se eu não tinha largado uma bomba. Foi super constrangedor.” Na entrevista, perguntaram a ela qual era a garantia de que voltaria ao Brasil. — A garantia que eu dou pra voltar é a minha profissão, policial militar. 227
— Isso não é garantia. E como você vai sobreviver lá? — Eu estou levando o dinheiro para comer lá esses dias. — Também não é o suficiente. O seu salário não é o suficiente. “Nossa, aquilo acabou comigo como policial militar. Uma que o militar já tinha dado aquele pontapé na porta achando que eu tinha jogado uma bomba lá dentro e outra que não me autorizaram por ser policial militar.” Adriana resolveu então passar pela entrevista vestida como civil. Teve o visto negado novamente. Voltou para casa arrasada, chorando. “Foi assim uma decepção muito grande. Hoje já está bem mais fácil. Mas pra mim foi a pior coisa da minha vida. Pelo fato de ser policial militar, a gente não tinha condições de fazer uma viagem. O salário naquela época era muito baixo. Aí já começaram os constrangimentos, as tristezas.” A mãe, na época, já era secretária de um juiz, que veio a ser desembargador, e se queixou com ele sobre o episódio do visto. — Nossa, dona Almira, por que a senhora já não falou comigo? Me traz as passagens dela. Almira tirou xérox de toda a documentação do juiz, do RG ao registro da OAB. Ele fez uma carta dizendo que estava cedendo as passagens à Adriana e mais um valor para que ela se mantivesse nos Estados Unidos por trinta dias. “Ele empacotou tudo, pôs num envelope, lacrou e disse: ‘manda boa viagem pra sua filha.’” Adriana levou o pacote. Nem passou pela entrevista. Foi chamada já para pegar o passaporte com o visto. 228
“Foi a primeira vez que precisei da Polícia Militar, porque eu fui fardada. Eu joguei a minha profissão lá e falei: a minha garantia é a minha profissão. Se eu não voltasse, ia ficar como procurada. E ele disse que não era garantia. Eu não sei porque ele achou isso. Como não é garantia? Eu vou me ausentar do país, mas eu sou uma policial militar. Ele quis dizer que pra ele aquilo não era nada. Pra mim, era muito.” Como disse Adriana, começaram as tristezas. A soldado percebeu ali as dificuldades que teria dentro e fora da corporação durante sua carreira. Na sociedade, a rejeição de costume. “A polícia é tão banalizada, né? Tudo é a polícia. Eles nunca estão satisfeitos com a atitude da polícia. Se faz, é ‘por que fez?’; se não faz, é ‘por que não fez?’. Então você acaba sem saber o que fazer, não é verdade?” Com a polícia em evidência na mídia por causa das manifestações, o assunto repercute até dentro de casa. — Ai, Adriana por que os polícias não fizeram isso? — Mãe, eu não aguento a senhora. Se faz, questiona por que fez. Aí deixa de fazer, questiona também. A senhora é igual ao resto da população. Se a gente faz, tá errado, se a gente não faz, tá errado. Em tempos de protestos, gás e balas de borracha, a soldado defende a polícia. “Eu acho que todas as atitudes que a polícia está tomando são corretas. Na minha forma de ver, se não joga uma bomba, eles não se afastam e aí quem se machuca somos nós. E antes de ir pra rua, a gente tem preleção, tem orientações. A gente não vai aleatoriamente. Somos orientados sobre o que a gente deve fazer, o que não deve. Pra não se exceder.” 229
Adriana conta que a pressão não vem só através da mídia. Há ocasiões em que a própria população pede a ação da polícia em casos que ela não pode agir, como, por exemplo, num resgate, que deve ser feito pelos profissionais de saúde. Se a vítima morre, a culpa é da polícia que não socorreu. Se a polícia socorre de forma errada, é pior ainda. “A gente não tem valor nenhum, ainda mais na época que nós estamos. Se meu filho quiser ser policial, só aceito se ele entrar na academia, que já sai comandando. O salário é bom e a humilhação é menor.” Ainda assim, Adriana diz nunca ter sido desrespeitada nesses 23 anos. Nem pelo fato de ser mulher. Mas isso é porque ela faz concessões. “Eu procuro relevar porque eu me ponho no lugar da pessoa. Por exemplo, você vê um marinheiro todo bonitão ali. Você vai olhar. Vai falar ‘nossa, como você é bonito, né?’. Se eu estou ali fardada, por exemplo, com a roupa da Rocam, que é diferente, uma calça justa, uma bota, cabelo solto... Em vista das meninas da viatura que é um coque, é um fardamento diferente, então chama atenção. Uma mulher em uma motona dessa. Surge comentário ‘nossa, com essa farda fica mais bonita’ ou ‘que da hora, como você consegue dirigir essa moto?’. Então, você procura não ouvir e relevar. Se você trata com respeito, você vai ter respeito. Agora, se a pessoa não te der o respeito, aí você age na legalidade. Eu ajo na legalidade.” “Enquanto estiverem comigo e eu for encarregada, os meus parceiros não vão relar a mão em ninguém. Ninguém vai fazer mal a ninguém. Por mais que o cara seja bandido. Se ele me respeitar, se ele me tratar de ‘senhora’, me falar todos os dados, ele vai ter meu respeito. Se ele não me respeitar, é algema, viatura e 230
delegacia. Bater jamais. Sabe por que eu te digo isso? Porque a gente tem família e eu sei o que eu já passei com o meu irmão. E outra: a gente aprendeu a agir assim na escola, então tem que pôr em prática o que a gente aprendeu”, diz. Esses comentários aqui e ali são para a soldado apenas uma das características do trabalho na rua, que ela ama. “Você recebe o carinho da população também, sabe, por ser mulher. Todo mundo te olha, te admira, você recebe muitos elogios na rua. Quando tem um bloqueio de moto que tem uma mulher, os motoqueiros não ficam tão apreensivos.” Porém, na estrutura militar, Adriana reclama de discriminação contra a mulher, baseada no clássico “isso é coisa de homem”. Há uma generalização das mulheres, até que sejam reconhecidas pelo bom trabalho. “Eu vou trabalhar com essa menina na rua? Deus me livre”, exemplifica. “Eu sou novata na companhia em que trabalho hoje, mas lá também tem umas pessoas que eu conheço há vinte anos. Aí os policiais falam ‘nossa, que mulherão, bonita’. Isso eu estou sabendo já da boca dos outros, né? ‘Nossa, que mulherão, mas ela é toda delicadinha, deve ser maior burguesinha, olha o carrão dela.’” Logo, os policiais que a conhecem retrucam: — Meu, você não conhece essa menina na rua. Burguesinha? Ela é a maior bilona. Bilona é quem trabalha bem, explica Adriana. “Melhor que mil homens por aí.” Adriana gosta do respeito que o militarismo impõe, o “sim, senhora, não senhora”. Mesmo o filho, no colégio militar, segue a rígida disciplina. “Isso pra mim é essencial. Meu filho não chama 231
ninguém de você. Eu acho isso bonito em qualquer lugar. Dentro da polícia, eu acho muito bonito.” Mas as rígidas regras já lhe causaram problemas. “Às vezes eu sou meio assim, sabe? Ó, você pode ver meu esmalte (risos), você vê a cor do meu esmalte, meu piercing e tal...” Esmalte azul e piercing no nariz não são permitidos. Para as mulheres, apenas coque, brinco pequeno e esmalte claro. E Adriana ainda vai trabalhar naquele dia. O certo seria tirar o esmalte... Seria. “O piercing eu tampo com aqueles adesivinhos. A gente não pode adentrar o quartel com vestido branco, calça branca, bermuda, chinelo. O esmalte é clarinho. Camiseta de alcinha a gente não pode, não pode entrar com decote.” Ainda assim ela garante: “o regulamento é muito válido”. Às vezes ela foge um pouquinho? “Ah, sei lá, às vezes o calor, né gente... Mas está tudo no regulamento. ‘Vou usar esse vestidinho’. Não. Quando você entrou aqui você já sabia que não podia. Lê o regulamento. ‘Ah, esse piercing aqui não dá nem pra ver’. Dá! Lê o regulamento. Você quando entrou aqui não viu o regulamento? Você viu o regulamento, então não adianta se queixar. Não adianta você brigar que você vai ficar presa.” E Adriana já ficou presa. Culpa de ser “meio bocuda”, como diz. “Foi um processo administrativo e eu tenho muita mágoa da Polícia Militar quanto a isso porque eu fui injustiçada. Eu fui injustiçada.” E tudo começou, imagine só, com os ataques do PCC, em 2006. Adriana estava trabalhando em um trailer da PM em Sapopemba. De vez em quando, alguém passava e alertava: — Vão atacar o trailer.
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“Só que eles não paravam pra conversar com a gente, eles passavam andando e falavam ‘vão atacar o trailer’. Passava uma senhora e falava ‘ai moça, você não fica sozinha aí.’” Os avisos duraram o dia inteiro e deixaram a soldado em pânico. “Aquela pressão psicológica foi atacando a minha cabeça. O medo foi corroendo, mas era um medo que assim... você não queria ficar sozinha mesmo. Você não queria. Mas você tava ali, cumprindo seu horário de serviço, você tava ali de segurança, você tava todo perfeitinho ali. Você tava ali. Mas aquilo era o dia inteiro. Aquilo foi dominando minha consciência, minha cabeça, foi dominando. E você passando pro comando.” — Comando, todo mundo está falando isso. Comando... Mas a resposta dos comandantes era como se nada estivesse acontecendo. Adriana não sabia se eles não acreditavam ou se estavam adotando uma postura de não recuar. Não queriam mandar reforço. De fato, não mandaram mais policiais para o trailer, mas pelo menos reforçaram a patrulha de viaturas na área. O trailer foi atacado de dia. O local era uma praça movimentada, com muitas pessoas fazendo corrida. Entre elas, os bandidos, misturados ali, correndo armados. “Chegou uma determinada hora que fecharam todas as ruas paralelas e o trailer ficou cercado no meio. Tinha um carro, uma Fiorino, eles desceram com um tripé com uma metralhadora. Já estava montada dentro da Fiorino. Eles só pegaram o tripé, desceram pela calçada e metralharam. Foi uma coisa de louco, louco. Eu fiquei doidinha, fiquei ruim da cabeça.” Havia bastante policiais porque era troca de turno –mais de dez, segundo lembra Adriana. Os policiais responderam com 233
tiros. Um policial foi baleado. Pessoas foram baleadas dentro da igreja e dentro de um ônibus que passava. “Eu acho uma desvalorização muito grande porque a gente deu a o aviso sobre o ataque. Então a decisão do comando deveria ter sido de apoiar os policiais, pôr bastante viatura. Ou então vamos tirar. Não recuar. Vamos tirar desse local e por em outro. Sei lá... Porque olha... A gente foi atacado num dia, no dia seguinte, com o trailer todo metralhado, nós estávamos no mesmo lugar. Como se nada tivesse acontecido.” Mas havia acontecido. E Adriana não esqueceu. “Uns dias depois, eu comecei a desmaiar na viatura, de repente. Ia na companhia, desmaiava. Outro dia fiquei desmaiada duas horas dentro do alojamento e ninguém me achava. ‘Cadê Adriana? Cadê Adriana?’” Um dia o capitão cansou de socorrê-la no pronto-socorro e a levou para o Hospital Militar. “Fiquei lá quinze dias internada tomando soro. Diazepan na veia. Era uma tontura que não tinha fim. Mas foi um abalo psicológico muito grande. Aí comecei a ter aqueles problemas, aqueles problemas... Quando você tem esses problemas, você é encaminhado direto pra psiquiatria. Aí fui pra psiquiatria. Fiquei oito meses afastada da Polícia Militar, fiquei em casa. O salário lá embaixo, cai tudo. E você querendo pagar suas dívidas.” Quando voltou ao trabalho, Adriana recomeçou aos poucos. Ela podia voltar, mas “com restrições”. Restrições de farda e arma, ou seja, não podia estar fardada e nem armada. Ela passou a realizar atividades administrativas por um período. Ainda assim, seu comandante pediu a todos que vestissem um uniforme da polícia, o chamado “agasalho”. “O agasalho é um uniforme, é considerado uniforme. Só que a PM não paga. A gente que compra”, ela explica. “O comando queria que eu usasse o agasalho. Mas eu usava um tênis branco, e o regulamento diz que é um tênis preto. É o regula234
mento. Só que, até então, eu não tinha o tênis preto, tinha o branco. Eu tinha a intenção de cumprir a ordem. Pra começar, era pra eu estar à paisana, mas o coronel queria o agasalho e eu fui cumprir a ordem com o que eu tinha: o agasalho, a camiseta e o tênis branco.” Um tenente a comunicou por causa do tênis branco. Ao que ela respondeu que tinha restrição ao uso de uniforme e não deveria, portanto, estar nem de agasalho. Não colou. Teve que responder um processo administrativo. No outro dia, chega outro comunicado de outra pessoa. E mais outro ainda. “Eu respondi três processos administrativos. Todos iguais sobre o tênis branco. Aquilo perdurou dois anos, eu fui até o Tribunal de Justiça Militar [a última instância].” Como prova, Adriana apresentou uma foto do pelotão: todos com tênis vermelho, azul, roxo, mas só ela foi comunicada. (Ela tirou a cabeça das pessoas na foto para que não fossem identificadas). “E você não acredita! Eu perdi. Fiquei seis dias presa no quartel.” “Durante o processo, foram dois anos de total sofrimento. Eu emagreci, eu fiquei enterrada na Fluoxetina, Diazepam. Foi um sofrimento terrível, terrível. Eu pagando advogado, o advogado entrou com mandado de segurança. Aí tinha mês que vinha um papel ‘ó, Adriana, você vai ter que cumprir cadeia sábado’. Aí eu falava ‘imagina, estou com mandado de segurança’. Aí tinha que ligar pro advogado, o advogado tinha que ir lá. Olha, foram dois anos de total sofrimento. Eu entrei em depressão. Foi uma coisa de louco.” Depois do episódio, Adriana pediu transferência, mas só conseguiu a mudança para o 2º batalhão há cerca de um ano. “Eu estava com tudo pra ganhar esse processo. Porque o agasalho é considerado um uniforme, está no regulamento. E no processo estava lá provado que o pelotão inteiro estava com o tê235
nis diferenciado, não era só eu. Então me senti totalmente injustiçada. Totalmente, totalmente.” Talvez um civil não tenha a dimensão da humilhação, já que ninguém costuma ficar preso no trabalho. Um desgosto enorme para Adriana, para quem um elogio e um puxão de orelha são, respectivamente, o melhor e o pior da polícia. “Você pegar uma ocorrência e ser prestigiado é a melhor coisa. O seu chefe e a sua companhia virem que você está trabalhando. Você ter o devido valor. Porque aqui a gente não tem, por mais que faça bem feito. E esse é o meu desgosto. O chefe falar ‘a Adriana? A gente precisa dela, ela está aqui. A gente não precisa mandar ela fazer nada! Adriana é sempre impecável, é excelente. Na rua, sempre educada’. Agora, se você cometeu alguma gafe, se você for comunicada, eles deveriam falar ‘nossa, não, eu vou ajudar ela. Ela não vai ficar presa porque ela é uma excelente policial, a gente vai ajudar ela’. Mas isso não existe. Por mais boa policial que você seja, no dia que você escorregar, você fica presa, você responde a processo administrativo, ninguém te ajuda. Então isso desgosta muito. Cadê a valorização?” Talvez justamente pela não obediência incondicional do regulamento ter lhe causado um dos episódios mais tristes na PM, Adriana previne o filho de passar pelo mesmo. Ela diz que costuma testar seu comprometimento com o regulamento do colégio militar. “Quando chega a época de férias, ele põe aquele piercing aqui no nariz e faz mechas no cabelo. Mas, na volta às aulas, o regulamento não permite.” — Vai com esse cabelo mesmo, filho. — Não, mãe, não pode. — Não, filho. Vai assim mesmo. — Não pode, mãe. A senhora é louca? 236
“Eu falo para ver até onde ele vai”, conta Adriana. O interessante é que, se o regulamento incomoda, sem ele “o negócio fica feio”. A questão para ela não é, sem dúvida, a existência de exigentes regras militares. O problema é que tais regras serviram para mostrar que, no fim das contas, ela estava sozinha. * A reintegração de posse que Adriana tinha naquela manhã foi cancelada. “A juíza cancelou, não sabemos o motivo, só o capitão. Mas ele chegou tão nervoso que a gente procurou nem saber. Ficamos até mais tarde ontem esperando o capitão chegar do fórum para dar essa notícia pra gente.” Ela conta que já participou de várias reintegrações no centro, todas tranquilas. Mas seria sua primeira na zona leste. Adriana explica que há um planejamento: assistentes sociais visitam a ocupação antes, procuram ver para onde vão as pessoas, oferecem verba para aqueles de outras cidades voltarem para casa. Os policiais recebem as orientações, inclusive “é pra derrubar tudo, não é pra deixar pedaços de madeira pra depois fazerem tudo de novo”. Uns moradores retiram suas coisas. Outros enfrentam. “Querem fazer bagunça, auê, mas o capitão aqui é muito dócil, sabe conversar. Acho que seria tranquilo. Mas é um trabalho árduo. Um trabalho bem grande. E mexe com muita gente: Prefeitura, Eletropaulo, Sabesp, assistente social.” Por esses árduos trabalhos, a soldado recebe R$ 4.900 no fim do mês. Com os descontos, são R$ 3.500. Adriana será em breve promovida a cabo por tempo de serviço, o que aumentará seu salário em R$ 300. Quando se aposentar, receberá o salário de sargento, mas sem alguns benefícios de quem está na ativa, como a diária alimentação, por exemplo. 237
Adriana chegou a concluir uma faculdade de Psicologia antes de entrar para a PM, o que, junto com os mais de dez anos de carreira, a tornava apta a prestar um curso chamado Chacal, que leva ao oficialato em poucos meses, após um curso. “Serve pra quem tem dez anos de polícia e nível universitário, além de bom comportamento. Você paga uma taxa e presta esse concurso. E sai oficial, pode ser cabo, soldado, o que for. Você sai oficial. Prestei duas vezes e não consegui. É muito concorrido.” Adriana pouco se abalou por não ter conseguido o oficialato. Na polícia, ela já faz o que quer fazer e isso basta. Ela, inclusive, esconde da polícia o nível superior para manter-se em sua função de policiamento de rua. Em sua ficha, consta apenas segundo grau completo. “Todo mundo tem o sonho de, quando sair do curso de polícia, entrar numa viatura, falar no rádio, sair na rua, todo mundo ver você, entendeu? E existe um setor de psicologia em todos os lugares da Polícia Militar. De repente, por ser psicóloga, quando precisassem de uma, iam me tirar da rua e colocar num setor interno. É uma coisa que eu não queria. Eu amo trabalhar na rua. Então pra mim não ia servir, eu ia ficar muito revoltada. E uma vez que você recebe uma determinação, você tem que cumprir. E pra você sair é muito difícil. Por isso, lá nos meus dados não tem que eu tenho faculdade.” O porquê da psicologia, assim como o porquê da PM, não existe ao certo. A aleatoriedade costuma dar certo para alguém cuja intuição funciona. “É tudo assim aleatório, entrei na polícia casualmente. Fiz Psicologia porque achei que era uma coisa mais fácil. Odeio estudar (risos).” O fato é que os passos do acaso deram certo. Pela segunda vez, os olhos mareiam ao dizer que ama trabalhar na rua e ajudar 238
a população. “A minha perspectiva de vida é essa mesmo: ser promovida por antiguidade e me reformar sargento. Minha perspectiva de vida aqui é essa.” Se depender da mãe – e da sua intuição– é bem capaz que Adriana chegue lá.
PM na mídia Esta coleção de manifestações midiáticas sobre a polícia não tem caráter científico. Trata-se apenas de uma reunião do que eu li e do que chegou até mim sobre a PM via jornais e redes sociais. A imensa maioria das informações é sobre a Polícia Militar de São Paulo, embora tenham sido incluídas reportagens sobre a Polícia Civil e a polícia de outros Estados –principalmente do Rio de Janeiro– quando julguei relevante para todo o processo de entendimento da polícia. As publicações focam no período de 2014 e excluem as manifestações de junho de 2013 no país. Algumas notícias anteriores a 2014, porém, foram incluídas –novamente quando as julguei necessárias para a compreensão geral da polícia. Os dados encontrados nestas reportagens foram pertinentemente abordados nos perfis deste livro. Informações específicas usadas em cada perfil foram indicadas em bibliografia separada abaixo. 30 de dezembro de 2005 – UOL Todos os policiais do caso favela Naval estão soltos nove anos depois http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/27214/todos+os+policiais+do+caso+fav ela+naval+estao+soltos+nove+anos+depois.shtml
6 de fevereiro de 2013 – UOL Medo de transferência para prisão comum mantêm disciplina em presídio para PMs em SP http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/02/06/medo-de-transferencia-para-penitenciaria-comum-ajuda-a-manter-disciplina-em-presidio-de-pms-em-sp.htm
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3 de março de 2013 – Veja O dia a dia no Presídio Militar Romão Gomes http://veja.abril.com.br/multimidia/galeria-fotos/o-presidio-militar-romao-gomes-pmrg-2013
22 de abril de 2013 – G1 Conheça o interior do presídio Romão Gomes http://g1.globo.com/sao-paulo/fotos/2013/04/conheca-o-interior-do-presidio-romao-gomes.html
18 de julho de 2013 – Estadão Contra chacinas, Anistia Internacional pede mudança na PM http://politica.estadao.com.br/blogs/roldao-arruda/contra-chacinas-anistia-internacional-pede-mudanca-na-pm/
24 de julho de 2013 – R7 Treze PMs da Rota são indiciados por estupro e tortura durante reintegração de posse no Pinheirinho http://noticias.r7.com/sao-paulo/treze-pms-da-rota-sao-indiciados-por-estupro-e-tortura-durante-reintegracao-de-posse-no-pinheirinho-25072013
17 de agosto de 2013 - IG Mortes por PMs de folga crescem 53% e se aproximam de homicídios em serviço http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-08-17/mortes-por-pms-de-folga-crescem-53-e-se-aproximam-de-homicidios-em-servico.html
21 agosto de 2013 – Estado PM é afastado após usar gás contra jornalistas http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,pm-e-afastado-apos-usar-gas-contra-jornalistas-imp-,1066206
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4 de setembro de 2013 – Folha Terceirização do 190 deve sair em até 90 dias, diz Alckmin http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/09/1336772-terceirizacao-do-190-deve-sair-em-ate-90-dias-diz-alckmin.shtml
04 de outubro de 2013 – Folha em Espanhol Antes y después de Amarildo http://brasilcomn.blogfolha.uol.com.br/2013/10/04/antes-y-despues-de-amarildo/
8 de outubro de 2013 – Folha Vídeo flagra policiais [civis] espancando jovens em delegacia de São Paulo http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/10/1353207-video-flagra-policiais-espancando-jovens-em-delegacia-de-sao-paulo.shtml
29 de outubro de 2013– Comunique-se Polícia é responsável por 75% das agressões a jornalistas, revela levantamento da Abraji http://portal.comunique-se.com.br/index.php/comunicacao/73121-policia-e-responsavel-por-75-das-agressoes-a-jornalistas-revela-levantamento-da-abraji
30 de outubro de 2013 – Leonardo Sakamoto Violência policial: Salve, São Paulo! Os que vão morrer te saúdam! http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/10/30/violencia-policial-salve-sao-paulo-os-que-vao-morrer-te-saudam/
1º de novembro de 2013 – UOL Denúncias de excessos da PM em abordagens crescem 106% em SP http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/01/denuncias-de-excessos-da-pm-em-abordagens-crescem-106-em-sp.htm
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05 de novembro de 2013 – UOL Pesquisa aponta que 70% dos brasileiros não confiam na polícia http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2013/11/05/confianca-na-policia-cai-proxima-a-de-partidos-no-pais.htm
5 de novembro de 2013 – UOL Polícias brasileiras matam quatro vezes mais que a dos EUA , diz estudo http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/05/policias-brasileiras-mataram-126-vezes-mais-que-a-do-reino-unido-em-2012-diz-estudo.htm
12 de novembro de 2013 – Folha Taxas de homicídio são epidêmicas em 11 países da América Latina, diz ONU http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/11/1370335-taxas-de-homicidio-sao-epidemicas-em-11-paises-da-america-latina-diz-onu.shtml
13 de novembro de 2013 – Folha Suécia fecha quatro prisões porque população carcerária despenca http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/11/1370700-suecia-fecha-quatro-prisoes-porque-populacao-carceraria-despenca.shtml
1º dezembro de 2013 – El País Brasil Apesar de avanço social, Brasil não reduz índices criminais http://brasil.elpais.com/brasil/2013/11/23/actualidad/1385234850_199533.html
28 de dezembro de 2013 – Folha É preciso desmilitarizar a polícia? Sim http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/12/1390874-e-preciso-desmilitarizar-a-policia-militar-sim.shtml
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28 de dezembro de 2013 – Folha É preciso desmilitarizar a polícia? Não http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/12/1390875-e-preciso-desmilitarizar-a-policia-militar-nao.shtml
29 de dezembro de 2013 – Folha Intocada, previdência dos militares gasta mais do que o Bolsa Família http://dinheiropublico.blogfolha.uol.com.br/2013/12/29/intocada-previdencia-dos-militares-gasta-mais-do-que-o-bolsa-familia/
13 de janeiro – Folha Número de roubos de veículos em São Paulo é o maior em 12 anos http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1396826-numero-de-roubos-de-veiculos-em-sao-paulo-e-o-maior-em-12-anos.shtml
22 de janeiro – Folha Mortes provocadas por PMs de folga aumentam 50% no Estado de SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1401043-mortes-provocadas-por-pms-de-folga-aumentam-50-no-estado.shtml
26 de janeiro - Folha PM encurrala manifestantes em hotel durante protesto contra a Copa; veja http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1403137-pm-encurrala-manifestantes-em-hotel-durante-protesto-contra-a-copa-veja.shtml
26 de janeiro – Estadão ‘Polícia chegou batendo em todo mundo’, conta estudante Vinícius Duarte (protesto contra Copa) http://esportes.estadao.com.br/noticias/futebol,policia-chegou-batendo-em-todo-mundo-conta-estudante-vinicius-duarte,1123219
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27 de janeiro - Folha Manifestante é baleado pela Polícia Militar em protesto contra a Copa (caso Fabrício Proteus, baleado por PM) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149603-manifestante-e-baleado-pela-policia-militar-em-protesto-contra-a-copa.shtml
27 de janeiro - Folha Vídeo mostra PMs atirando dentro de hotel (protesto contra Copa) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149594-video-mostra-pms-atirando-dentro-de-hotel.shtml
27 de janeiro – Folha Maioria dos detidos é jovem e da periferia, mas perfil é variado (protesto contra Copa) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149596-maioria-dos-detidos-e-jovem-e-da-periferia-mas-perfil-e-variado.shtml
27 de janeiro – Folha ‘TV Folha’ flagra policiais sem identificação (protesto contra Copa) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149597-tv-folha-flagra-policiais-sem-identificacao.shtml
27 de janeiro – Folha Polícia evitou uma tragédia, diz Alckmin (protesto contra Copa) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149600-policia-evitou-uma-tragedia-diz-alckmin.shtml
27 de janeiro – Revista Fórum Inquérito revela tortura dentro da PM do Rio na formação de policiais http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/01/inquerito-revela-tortura-dentro-da-pm-na-formacao-de-policiais/
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27 de janeiro – Folha São Paulo bate recorde de roubo de veículos em 13 anos http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149604-sao-paulo-bate-recorde-de-roubo-de-veiculos-em-13-anos.shtml
28 de janeiro – Folha Homicídios caem e roubos crescem em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1403836-homicidios-caem-e-roubos-crescem-em-sp.shtml
28 de janeiro – Estado Editorial: O que o sábado mostrou (crítica à ação da PM em ato contra Copa) http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,o-que-o-sabado-mostrou-imp-,1123747
28 de janeiro – J.Press Depoimento de um estudante da USP sobre a ação da Polícia Militar durante manifestações http://jpress.jornalismojunior.com.br/2014/01/dia-descobri-luta-coletivo/
29 de janeiro – Estado Imagem mostra PM agredindo fotógrafo em manifestação http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,imagem-mostra-pm-agredindo-fotografo-em-manifestacao,1124572
4 de fevereiro – Folha Justiça do Rio declara morte presumida do pedreiro Amarildo http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1407426-justica-do-rio-declara-morte-presumida-do-pedreiro-amarildo.shtml
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4 de fevereiro – Folha Marcos Augusto Gonçalves: Por uma nova polícia http://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcosaugustogoncalves/2014/02/1407108-por-uma-nova-policia.shtml
5 de fevereiro – Folha Marginal Tietê é liberada após protesto [pró-PM]; via tem 9,4 km de filas http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1407904-marginal-tiete-e-liberada-apos-protesto-via-tem-94-km-de-filas.shtml
7 de fevereiro – Carta Capital “Perto de quem realmente manda, esses moleques estendidos no chão [mortos pela PM do Rio] são tão perigosos quanto o Patati e Patatá.” http://negrobelchior.cartacapital.com.br/2014/02/07/perto-de-quem-realmente-manda-esses-moleques-estendidos-no-chao-sao-tao-perigosos-quanto-o-patati-e-patata/
8 de fevereiro - Folha Rojão que feriu cinegrafista no Rio era de manifestante, afirma polícia http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/151323-rojao-que-feriu-cinegrafista-no-rio-era-de-manifestante-afirma-policia.shtml
10 de fevereiro – Folha Família de Fábio Porchat pede ajuda ao Congresso após ameaças na web [por vídeo de crítica à PM do Porta dos Fundos] http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/02/1410220-familia-de-fabio-porchat-pede-ajuda-ao-congresso-apos-ameacas-na-web.shtml
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10 de fevereiro – Estadão Bruno Paes Manso: Os assassinos que desafiaram o Governo de SP (ação violenta da PM em Sapopemba) http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/os-assassinos-que-desafiaram-o-governo-de-sp/
12 de fevereiro – G1 Tenente desabafa após bombeiros serem assaltados: ‘Nojo deste país’ http://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2014/02/tenente-desabafa-apos-bombeiros-serem-assaltados-nojo-desse-pais.html
13 de fevereiro – Folha Polícia Militar vai usar ‘tropa do braço’ em protestos em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1411475-policia-militar-vai-usar-tropa-do-braco-em-protestos-em-sp.shtml
14 de fevereiro – Folha Alunos acusam policiais militares de agressão em escola de São Simão (SP) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/ribeiraopreto/2014/02/1412335-alunos-depredam-escola-estadual-em-sao-simao-sp-e-prefeitura-contrata-seguranca.shtml
17 de fevereiro – Folha Defesa de PMs diz que não há como culpá-los por mortes no Carandiru http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1413334-defesa-de-pms-diz-que-nao-ha-como-culpa-los-por-mortes-no-carandiru.shtml
21 de fevereiro – Folha Adolescente amarrado a poste é detido em novo assalto em Copacabana http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1415662-adolescente-amarrado-a-poste-e-preso-por-assalto-em-copacabana.shtml
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17 de fevereiro – Estadão Erro de PM vira meme e recebe apoio de 75% dos comentaristas (caso de José Guilherme da Silva, que morreu dentro de viatura) http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/violencia-vira-meme-apoiado-por-70-dos-comentaristas/
21 de fevereiro – El País Brasil Polícia de São Paulo tenta esvaziar manifestação contra a Copa http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/21/politica/1392939683_466934.html
22 de fevereiro – Folha Protesto contra a Copa reúne mil pessoas no centro de SP (primeiro ato com tropa do braço) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416485-protesto-anti-copa-reune-400-pessoas-no-centro-de-sp.shtml
22 de fevereiro - Folha Ato contra Copa em SP termina em confronto, vandalismo e 230 detidos (primeiro ato com tropa do braço) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416525-ato-contra-copa-em-sp-termina-em-confronto-e-vandalismo.shtml
22 de fevereiro – Estado Megaoperação da PM usa pelotão ninja, isola black blocs e prende 230 (primeiro ato com tropa do braço) http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,megaoperacao-da-pm-usa-pelotao-ninja-isola-black-blocs-e-prende-230,1133414
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22 de fevereiro – Folha Vídeo mostra cerco policial a manifestantes e jornalista em SP (primeiro ato com tropa do braço) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416559-video-mostra-cerco-policial-a-manifestantes-e-jornalista-em-sp.shtml
23 de fevereiro – Folha Todos os 262 manifestantes detidos em ato anti-Copa foram soltos, diz SSP (primeiro ato com tropa do braço) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416621-todos-os-230-manifestantes-detidos-em-ato-anti-copa-foram-soltos-diz-ssp.shtml
23 de fevereiro – Folha Repórter da Folha é agredido por PMs em protesto; assista ao relato (primeiro ato com tropa do braço) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416729-reporter-da-folha-e-agredido-por-pms-em-protesto-assista-ao-relato.shtml
23 de fevereiro – Folha Reduzir depredação em protesto foi sucesso, afirma PM http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416746-reduzir-depredacao-em-protesto-foi-sucesso-afirma-pm.shtml
23 de fevereiro - UOL PM deteve manifestantes sem acusação formal e impediu trabalho de advogados (primeiro ato com tropa do braço) http://copadomundo.uol.com.br/noticias/redacao/2014/02/23/pm-deteve-manifestantes-sem-acusacao-formal-e-impediu-trabalho-de-advogados.htm#fotoNav=9
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23 de fevereiro – El País Brasil Um protesto com mais policiais que manifestantes (primeiro ato com tropa do braço) http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/23/politica/1393111858_875595.html
23 de fevereiro – El País Brasil Ativistas denunciam brutalidade policial durante o ato contra a Copa de São Paulo (primeiro ato com tropa do braço) http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/23/politica/1393194512_885141.html
23 de fevereiro – El País Brasil “Estávamos todos apavorados”, diz professor da USP detido (primeiro ato com tropa do braço) http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/23/politica/1393192949_387701.html
23 de fevereiro – Brasil Post Vídeo mostra truculência policial contra jornalistas (primeiro ato com tropa do braço) http://www.brasilpost.com.br/2014/02/23/video-policia-jornalistas_n_4842809.html
23 de fevereiro – Brasil Post [Relato de jornalista] Protesto em SP: pelo direito de fazer o meu trabalho (primeiro ato com tropa do braço) http://www.brasilpost.com.br/amanda-previdelli/protesto-em-sp-pelo-direi_b_4842874. html?fb_action_ids=10201442973066778&fb_action_types=og.likes&fb_source=other_ multiline&action_object_map=%5B528604807254693%5D&action_type_map=%5B%22og. likes%22%5D&action_ref_map=%5B%5D
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23 de fevereiro – Facebook Plínio comenta
h t t p s : / / w w w. f a c e b o o k . c o m / P l i n i o C o m e n t a / p h o t o s / p b . 4 6 3 3 0 8 3 1 3 6 9 1 5 5 3 . -2207520000.1415395335./707227559299626/?type=3&theater
24 de fevereiro – Folha PM não pune policiais que agridem manifestantes http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416800-pm-nao-pune-policiais-que-agridem-manifestantes.shtml
24 de fevereiro – Folha Maior número de homicídios em SP é ponto fora da curva, diz secretário http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416957-alta-de-homicidios-em-sp-e-ponto-fora-da-curva-diz-secretario.shtml
24 de fevereiro – Folha Juiz do caso Carandiru multa advogado que abandonou plenário http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1417271-juiz-do-carandiru-multa-advogado-que-abandonou-plenario.shtml
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24 de fevereiro – Folha – Charge Benett
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/22485-charges-fevereiro#foto-366195
25 de fevereiro – Nota de Rodapé Relato do repórter fotográfico Victor Moriyama, detido pela PM no Ato contra a Copa do Mundo http://www.notaderodape.com.br/2014/02/relato-do-reporter-fotografico-victor.html
25 de fevereiro – Folha Ministro diz que vai avaliar uso da ‘tropa do braço’ pelo país http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/153809-ministro-diz-que-vai-avaliar-uso-da-tropa-do-braco-pelo-pais.shtml
25 de fevereiro – Folha Polêmica, nova tática da PM já foi adotada em protestos na Europa e nos EUA (sobre tropa do braço) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/153811-polemica-nova-tatica-da-pm-ja-foi-adotada-em-protestos-na-europa-e-nos-eua.shtml
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25 de fevereiro - Folha Roubos têm 8º alta seguida e sobem 32,5% no Estado http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/153807-roubos-tem-8-alta-seguida-e-sobem-325-no-estado.shtml
26 de fevereiro – Folha Policiais que balearam estudante em protesto não tinham armas não letais (caso Fabrício Proteus, baleado por PM) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1418041-policiais-que-balearam-estudante-em-protesto-nao-tinham-armas-nao-letais.shtml
27 de fevereiro – Estado De tocaia, elite da PM está à espera do bando (Operação do COE contra PCC em Presidente Venceslau) http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,de-tocaia-elite-da-pm-esta-a-espera-do-bando,1135057
27 de fevereiro – Estado Alckmin confirma plano de resgate de líderes do PCC http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,alckmin-confirma-plano-de-resgate-de-lideres-do-pcc,1135391
27 de fevereiro – El país Brasil “Bandido que mexe com polícia acaba assim” (caso de José Guilherme da Silva, que morreu dentro de viatura) http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/27/politica/1393533978_778738.html
27 de fevereiro de 2014 – El País Brasil Polícia brasileira mata cinco pessoas a cada dia http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/27/politica/1393533362_626474.html
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28 de fevereiro – Folha Cláudia Collucci: As cadeias são os novos manicômios, diz psiquiatra http://www1.folha.uol.com.br/colunas/claudiacollucci/2014/02/1419355-as-cadeia-sao-os-novos-manicomios-diz-psiquiatra.shtml
1º de março – Facebook Ruth Sheherazade
https://www.facebook.com/RuthSheherazade/photos/a.456318524469703.1073741828.4562 69034474652/462922430475979/?type=3&theater
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4 de março – Estadão Policial tem casa atingida por ataque com coquetel molotov em Promissão http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,policial-tem-casa-atingida-por-ataque-com-coquetel-molotov-em-promissao,1137217
7 de março de 2014 – Youtube Marcelo Freixo comenta a morte do PM Rodrigo Paes Leme e de outros PMs em UPPs do Rio https://www.youtube.com/watch?v=W363ls3noo4#t=92
7 de março – Revista Fórum O culto à violência policial no Facebook http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/03/o-culto-violencia-policial-facebook/
10 de março – UOL Em meio a tensão com PCC, agentes penitenciários de SP entram em greve http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2014/03/10/em-meio-a-tensao-com-pcc-agentes-penitenciarios-de-sp-entram-em-greve.htm
10 de março - Folha Mortes causadas por policiais militares voltam a crescer em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1423082-mortes-causadas-por-policiais-militares-voltam-a-crescer-em-sp.shtml
11 de março – El País Brasil Facção [PCC] fatura 6 milhões de reais com tráfico e outros crimes http://brasil.elpais.com/brasil/2014/03/12/politica/1394584966_908556.html
257
12 de março – Estado Entidades e advogados tentam barrar prisão por averiguação e surras da PM em manifestação [contra a Copa] http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/os-70-black-blocs-que-ainda-causam-nas-ruas-de-sp/
12 de março – Carta Capital PM contraria jornalistas e insiste em distribuir coletes à imprensa para cobertura de protestos http://www.cartacapital.com.br/sociedade/pm-contraria-jornalistas-e-insiste-em-distribuir-coletes-a-imprensa-para-cobertura-de-protestos-6340.html
13 de março – Folha Justiça mantém ação da ‘tropa do braço’ em protesto em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1424897-justica-mantem-acao-da-tropa-do-braco-em-protesto-em-sp.shtml
13 de março – Folha Em ano eleitoral, Congresso tem fila de projetos contra manifestante violento http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1424810-em-ano-eleitoral-governo-tem-fila-de-projetos-contra-manifestante-violento.shtml
13 de março – Folha Vanessa Barbara: Diferentes conceitos de êxito (sobre tropa do braço) http://www1.folha.uol.com.br/colunas/vanessabarbara/2014/03/1425382-diferentes-conceitos-de-exito.shtml
13 de março – Folha PM simula ação em conflitos antes de protesto em SP; veja vídeo http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1425176-pm-simula-acao-em-conflitos-antes-de-protesto-em-sp-veja-video.shtml
258
14 de março – Folha Protesto tem mais PMs que manifestantes http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/156359-protesto-tem-mais-pms-que-manifestantes.shtml
14 de março – Agência Pública Pedidos feitos pela Lei de Acesso à Informação para a Polícia de São Paulo não têm resposta, em descumprimento da lei http://apublica.org/2014/03/pergunte-a-pm/
14 de março – Folha Cabral diz que PM ‘vai pegar covardes’ que mataram subcomandante [no Rio] http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1425558-cabral-diz-que-pm-vai-pegar-covardes-que-mataram-subcomandante.shtml
16 de março – Folha Organizadores da nova “Marcha da Família” pedem retorno dos militares http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/03/1426175-organizadores-da-nova-marcha-pela-familia-pedem-retorno-dos-militares.shtml
16 de março – Folha Ferreira Gullart: Paga o justo pelo baderneiro http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ferreiragullar/2014/03/1425537-paga-o-justo-pelo-baderneiro.shtml
17 de março – Extra Viatura da PM arrasta mulher por rua da Zona Norte do Rio. Veja o vídeo (caso Claúdia) http://extra.globo.com/casos-de-policia/viatura-da-pm-arrasta-mulher-por-rua-da-zona-norte-do-rio-veja-video-11896179.html
259
17 de março – Extra Viúvo de mulher morta em operação da PM em Madureira desabafa: ‘Arrastaram o corpo dela como se fosse um saco’ (caso Claúdia) http://extra.globo.com/casos-de-policia/viuvo-de-mulher-morta-em-operacao-da-pm-em-madureira-desabafa-arrastaram-corpo-dela-como-se-fosse-um-saco-11893573.html
17 de março – Folha PMs são presos após arrastar vítima de bala perdida na rua (caso Claúdia http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1426571-pms-sao-presos-apos-porta-malas-abrir-e-mulher-ser-arrastada-por-250-metros.shtml
17 de março – Folha Famílias dos presos deveriam processar Estado, diz advogado do Carandiru http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1426582-advogado-de-pms-do-carandiru-pede-que-estado-seja-processado-pelo-caso.shtml
17 de março – Facebook Mtst Trabalhadores Sem Teto
https://www.facebook.com/mtstbrasil/photosw /a.466755456696124.100595.464790330225970/704047659633568/
260
18 de março – Folha Mulher arrastada por carro da PM foi morta por tiro, aponta laudo (caso Claúdia) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1427471-mulher-arrastada-por-carro-da-pm-foi-morta-por-tiro-aponta-laudo.shtml
18 de março – Facebook Ruth Sheherazade
https://www.facebook.com/RuthSheherazade/photos/a.456318524469703.1073741828.4562 69034474652/468563409911881/?type=3&theater
20 de março – Folha PM diz que colocou mulher em porta-malas porque carro foi cercado (caso Claúdia) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1428110-policial-diz-que-mulher-foi-colocada-em-porta-malas-porque-carro-estava-cercado-por-moradores.shtml
261
20 de março – Estadão Bruno Paes Manso: Quando PMs arrastaram uma mãe morta pela rua, tiraram o chão que ainda nos mantém em pé (caso Claúdia) http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/quando-a-pm-arrastou-uma-mae-pela-corda-arrancou-o-chao-sob-os-nossos-pes/?fb_action_ids=10152343895984913&fb_action_types=og.recommends
20 de março – Folha Editorial: Novela policial (sobre caso Claúdia) http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/03/1428029-novela-policial.shtml
20 de março – El País Brasil Cartazes de homenagem a mulher arrastada pela PM (caso Claúdia) http://brasil.elpais.com/brasil/2014/03/21/album/1395358181_827395.html#1395358181_827 395_1395360025
20 de março – Folha em Espanhol Las UPPs no se tornarán una política pública sostenible y universalizada si no son acompañadas de una revolución radical en las policías http://brasilcomn.blogfolha.uol.com.br/2014/03/20/las-upps-no-se-tornaran-una-politica-publica-sostenible-y-universalizada-si-no-son-acompanadas-de-una-revolucion-radical-en-las-policias/
20 de março – UOL “Descarreguei a arma”, confessa suspeito de matar PM em SP http://tvuol.uol.com.br/video/descarreguei-a-arma-confessa-suspeito-de-matar-pm-em-sp-04020C193566D8C94326/
21 de março – BBC Brasil Governos buscam ‘investimento social’ para financiar recuperação de presos http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/03/140312_titulos_sociais_presidios_pai.shtml
262
25 de março – Pragmatismo Político Vídeo: Pichador tem a cara pichada por PM http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/03/video-pichador-tem-cara-pichada-por-pms.html
25 de março – Folha Policiais envolvidos em mortes em SP são na maioria brancos, diz pesquisa http://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2014/03/1430270-policiais-envolvidos-em-mortes-em-sp-sao-na-maioria-brancos-diz-pesquisa.shtml
25 de março – Folha Copa terá comando específico da PM a partir de maio em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1430553-copa-tera-comando-especifico-da-pm-a-partir-de-maio-em-sp.shtml
25 de março – Folha Homicídios voltam a reduzir no Estado; roubo cresce 47% na capital http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1430593-homicidios-voltam-a-reduzir-no-estado-roubo-cresce-47-na-capital.shtml
26 de março – G1 Taxa de negros mortos pela polícia de SP é 3 vezes a de brancos, diz estudo http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/03/taxa-de-negros-mortos-pela-policia-de-sp-e-3-vezes-de-brancos-diz-estudo.html
26 de março – Folha Vídeo mostra policiais atirando em rapaz; PM vai analisar imagens http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1431185-video-mostra-policiais-atirando-em-rapaz-pm-vai-analisar-imagens.shtml
263
27 de março – Folha Editorial: Roubos sem explicação http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/03/1431462-editorial-roubos-sem-explicacao.shtml
27 de março – Folha Manifestantes fecham pista da av. Paulista em novo ato anti-Copa http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1432027-manifestantes-fechar-pista-da-av-paulista-em-novo-ato-anti-copa.shtml
27 de março – Folha Pacífico, 4º ato anti-Copa reúne mil pessoas na região central de SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1432151-pacifico-4-ato-anti-copa-reune-mil-pessoas-na-regiao-central-de-sp.shtml
27 de março – BBC Brasil Como policiais acusados de crimes continuam nas ruas? http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/03/140326_policias_jp_lk.shtml
28 de março – Estadão Jovem que participava de arrastão é morto por PMs de folga na zona leste http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,jovem-que-participava-de-arrastao-e-morto-por-pms-de-folga-na-zona-leste,1146236
28 de março – IG Violência policial é herança da ditadura: ‘Pau-de-arara está onde sempre esteve’ http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2014-03-28/violencia-policial-e-heranca-da-ditadura-pau-de-arara-esta-onde-sempre-esteve.html
264
2 de abril – Última Instância UOL Estudo sobre violência policial revela “racismo institucional” na PM de SP; assista ao vídeo http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/70082/estudo+sobre+violencia+policial+reve la+racismo+institucional+na+pm+de+sp+assista+ao+video.shtml
2 de abril – Última Instância UOL Polícia Militar de SP nega informações de pesquisa divulgada pela UFScar (pesquisa racial) http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/70110/policia+militar+de+sp+nega+inf ormacoes+de+pesquisa+divulgada+pela+ufscar.shtml?fb_action_ids=812594622102619&fb_ action_types=og.likes&fb_source=aggregation&fb_aggregation_id=288381481237582
3 de abril – El País Brasil “A morte de inocentes, como Amarildo, é o resquício da ditadura” [diz Marcelo Rubes Paiva] http://brasil.elpais.com/brasil/2014/04/03/politica/1396562225_091459.html
3 de abril – Folha Caderno Especial Carandiru http://www1.folha.uol.com.br/especial/2013/massacredocarandiru/
21 anos depois 73 PMs condenados http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/159604-21-anos-depois-73-pms-condenados. shtml
Advogado diz que vai pedir anulação do júri http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/159605-advogado-diz-que-vai-pedir-anulacao-do-juri.shtml
265
Sobrevivente diz que não acredita em prisão de PMs http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/159606-sobrevivente-diz-que-nao-acredita-em-prisao-de-pms.shtml
‘Os presos se mataram por causa de drogas’ http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/159607-os-presos-se-mataram-por-causa-de-drogas.shtml
3 de abril – Fecebook Advogados Ativistas
h t t p s : / / w w w. f a c e b o o k . c o m / Ad v o g a d o s At i v i s t a s / p h o t o s / p b . 4 9 5 8 5 2 7 4 7 1 5 1 2 9 1 . -2207520000.1415396221./611870075549557/?type=3&theater
4 de abril – Folha Gestão Alckmin conta até enfermaria e infla vagas em presídios http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1435620-gestao-alckmin-conta-ate-enfermaria-e-infla-vagas-em-presidios.shtml
266
4 de abril – Folha Editorial: Justiça tardia (sobre julgamento do Carandiru) http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/04/1435571-editorial-justica-tardia.shtml
4 de abril – Folha – Charge Angeli
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/24074-charges-abril#foto-380413
5 de abril – Facebook Jornal A Nova Democracia
http://www.anovademocracia.com.br/no-128/5290-50-anos-do-golpe-militar-cadeia-para-os-torturadores
267
6 de abril – Folha Crimes crescem em SP, mas efetivo das polícias encolhe http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/160034-crimes-crescem-em-sp-mas-efetivo-das-policias-encolhe.shtml
6 de abril – Folha Secretário diz que Estado vai contratar mais policiais http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/160035-secretario-diz-que-estado-vai-contratar-mais-policiais.shtml
9 de abril – Folha País teve 136 agressões a jornalistas no ano passado: Cobertura de protestos motivou alta de 232% http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/160577-pais-teve-136-agressoes-a-jornalistas-no-ano-passado.shtml
9 de abril – Carta Capital A PM-SP revela sua ideologia em nota oficial: Para suprimir o debate sobre a desmilitarização, Polícia Militar adota discurso radical e insinua que críticos são comunistas http://www.cartacapital.com.br/sociedade/a-pm-sp-revela-sua-ideologia-3626.html
10 de abril – Folha 1 em cada 5 foi vítima de violência no país de um ano para cá http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1438478-1-em-cada-5-foi-vitima-de-violencia-no-pais-de-um-ano-para-ca.shtml
268
10 de abril – Folha Governo Alckmin conta mecânico e telefonista como policial de rua http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1438475-governo-alckmin-conta-mecanico-e-telefonista-como-policial-de-rua.shtml
10 de abril – Folha Interpretação para classificar policiamento estava errada, diz PM http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1438476-interpretacao-para-classificar-policiamento-estava-errada-diz-pm.shtml
10 de abril – Estadão Bruno Paes Manso: Em nota ao UOL, a PM chamou a sociedade para o debate. Eu, humildemente, aceito o desafio http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/em-nota-ao-uol-a-pm-chamou-a-sociedade-ao-debate-eu-humildemente-aceito-o-desafio/?fb_action_ids=10152210030904822&fb_action_types=og.recommends
12 de abril – Folha SP tem a quinta maior taxa de homicídios entre 35 grandes cidades http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1439591-sp-tem-a-5-maior-taxa-de-homicidios-do-mundo.shtml
12 de abril – Folha PM quer usar aposentados para reforçar efetivo em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1439841-pm-quer-usar-aposentados-para-reforcar-efetivo-em-sp.shtml
13 de abril - Folha Onda de roubo de celular impulsiona estatística do crime em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1439948-onda-de-roubo-de-celulares-impulsiona-estatisticas-do-crime.shtml
269
15 de abril – Folha Vídeo mostra homens baleados pela PM agonizando em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1441047-video-mostra-homens-baleados-pela-pm-agonizando-em-sp.shtml
15 de abril – Folha SP tem 3 tiroteios em 24 h; mulher morre com bebê no colo http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/161493-sp-tem-3-tiroteios-em-24-h-mulher-morre-com-bebe-no-colo.shtml
15 de abril – Vaidapé PM mata 76 em janeiro e Telhada afirma: ‘foi pouco. Bandido tem que ir para o saco’ http://revistavaidape.com.br/blog/2014/04/pm-mata-76-em-janeiro-e-telhada-afirma-foi-pouco-bandido-tem-que-ir-para-o-saco/
16 de abril -Folha Ato [contra Copa] acaba em vandalismo e causa pânico no metrô http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/161697-ato-acaba-em-vandalismo-e-causa-panico-no-metro.shtml
17 de abril – Folha 3 são mortos pela PM após invadir casa de cantor do Trio Los Angeles http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/161835-3-sao-mortos-pela-pm-apos-invadir-casa-de-cantor-do-trio-los-angeles.shtml
17 de abril - Folha Câmeras da PM darão alerta automático sobre crimes http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/161839-cameras-da-pm-darao-alerta-automatico-sobre-crimes.shtml
270
21 de abril – Folha Paramilitares americanos treinam policiais brasileiros para a Copa http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1443261-paramilitares-americanos-treinam-policiais-brasileiros-para-a-copa.shtml
22 de abril – Folha Alckmin vai retirar mil policiais do serviço 190 http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/162465-alckmin-vai-retirar-mil-policiais-do-servico-190.shtml
22 de abril – Folha PM conta policial da central [190] como efetivo de rua http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/162466-pm-conta-policial-da-central-como-efetivo-de-rua.shtml
23 de abril – Folha PM é baleado em tentativa de assalto na região dos Jardins, em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1444622-pm-e-baleado-em-tentativa-de-assalto-na-regiao-dos-jardins-em-sp.shtml
24 de abril – UOL Polícia erra e mata refém de sequestro relâmpago, em São Paulo http://tvuol.uol.com.br/video/policia-erra-e-mata-refem-de-sequestro-relampago-em-sao-paulo-04024C98306EC0815326
271
24 de abril – Facebook perfil pessoal
25 de abril – BuzzFeed 26 frases do programa Polícia 24 Horas que você poderia usar na vida real http://www.buzzfeed.com/manuelabarem/26-frases-do-programa-policia-24-horas-que-voce-poderia-usar
28 de abril – Folha Médico morre após levar tiro dentro de delegacia http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/163464-medico-morre-apos-levar-tiro-dentro-de-delegacia.shtml
30 de abril –Folha Protesto de sem-teto acaba em confronto http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/163758-protesto-de-sem-teto-acaba-em-confronto.shtml
30 de abril – Folha Ruy Castro: Pessoas dentro da farda (em defesa dos policiais) http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ruycastro/2014/04/1447437-pessoas-dentro-da-farda.shtml
272
1º de maio – Veja São Paulo Os advogados especializados em defender PMs http://vejasp.abril.com.br/materia/advogados-que-fazem-defesa-de-pms-tribunal-militar
2 de maio – Folha Leitores comentam coluna [de Ruy Castro] sobre mortes de policiais em serviço http://www1.folha.uol.com.br/paineldoleitor/2014/05/1448445-leitores-comentam-coluna-sobre-mortes-de-policiais-em-servico.shtml
4 de maio – Folha ‘Bancada da bala’ na Câmara de SP prega morte de bandido http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/05/1449170-bancada-da-bala-na-camara-de-sp-prega-morte-de-bandido.shtml
7 de maio Ruy Castro: “Protesto” de teatro (em defesa dos policiais) http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ruycastro/2014/05/1450419-protesto-de-teatro.shtml
10 de maio – Estado Contra latrocínio, guia da polícia diz para estrangeiro ‘não reagir’ na Copa http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,contra-latrocinio-guia-da-policia-diz-para-estrangeiro-nao-reagir-na-copa,1164966
11 de maio – Folha ‘Datenas’ do Facebook têm 20 milhões de seguidores http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/05/1452690-datenas-do-facebook-tem-20-milhoes-de-seguidores.shtml
273
12 de maio – Folha SP não paga indenização a família de PM assassinado http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165506-sp-nao-paga-indenizacao-a-familia-de-pm-assassinado.shtml
12 de maio – Folha Eventuais falhas [de pagamento de indenização] serão corrigidas, diz governo http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165508-eventuais-falhas-serao-corrigidas-diz-governo.shtml
12 de maio – Folha ‘Torturam muito ele’, diz mulher de policial morto http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165510-torturam-muito-ele-diz-mulher-de-policial-morto.shtml
12 de maio – G1 Polícia conclui inquérito sobre morte de mulher arrastada no Rio (caso Cláudia) http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2014/05/policia-termina-inquerito-que-investiga-morte-de-mulher-arrastada-no-rio.html
12 de maio - Estadão Polícia procura suspeitos de matar capitão da PM em Guarulhos http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,policia-procura-suspeitos-de-matar-capitao-da-pm-em-guarulhos,1165638
12 de maio – BBC Brasil Brasil lidera ranking de medo de tortura policial http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/05/140512_brasil_tortura_vale_rb.shtml
274
17 de maio - Folha Para Planalto, protestos não vão crescer http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/05/1455855-para-planalto-protestos-nao-vao-crescer.shtml
13 de maio – Folha Família de PM morto em janeiro ainda não recebeu indenização http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165698-familia-de-pm-morto-em-janeiro-ainda-nao-recebeu-indenizacao.shtml
17 de maio – Folha PM troca nome por código em tarja que identifica policiais http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/05/1455865-pm-troca-nome-por-codigo-em-tarja-que-identifica-policiais.shtml
20 de maio – G1 Policiamento da Copa começa a atuar em São Paulo nesta terça, diz PM http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/05/policiamento-da-copa-comeca-atuar-em-sao-paulo-nesta-terca-diz-pm.html
21 de maio – Estadão Bruno Paes Manso: EXCLUSIVO: PM invade apartamento de madrugada para deter inocente. Justiça mantém adolescente preso http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/bruno-paes-manso-e-andre-caramante/
23 de maio – Folha Roubos têm 11º alta consecutiva e crescem 29% no Estado de SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/05/1458998-roubos-tem-11-alta-consecutiva-e-crescem-33-no-estado-de-sp-diz-ssp.shtml
275
26 de maio – Folha Coronel justifica nova tarja de identificação de policiais militares http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/videocasts/2014/05/1459844-coronel-justifica-nova-tarja-de-identificacao-de-policiais-militares.shtml
26 de maio – Agência Efe Polícia de São Paulo recebe treinamento do FBI para controlar distúrbios http://www.efe.com/efe/noticias/brasil/brasil/policia-paulo-recebe-treinamento-fbi-para-controlar-disturbios/3/16/2328388
27 de maio – SBT Conexão Repórter mostra cenas de crimes contra a Polícia Militar http://www.sbt.com.br/conexaoreporter/noticias/14320/Conexao-Reporter-mostra-cenas-de-crimes-contra-a-Policia-Militar-.html#.VFVC7yLF8yL
28 de maio – Folha Rapaz de 17 anos é apreendido pela polícia pela 19º vez em SP http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/168099-rapaz-de-17-anos-e-apreendido-pela-policia-pela-19-vez-em-sp.shtml
31 de maio - Folha PM vai investigar se homem foi morto por policiais sem reagir http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/168709-pm-vai-investigar-se-homem-foi-morto-por-policiais-sem-reagir.shtml
31 de maio – Ponte Arma furtada na sede da Rota (PM-SP) é usada para matar soldado http://ponte.org/arma-furtada-na-sede-da-rota-tropa-de-elite-da-pm-de-sp-e-usada-para-matar-soldado-da-corporacao/
276
1º de junho – Folha Filme ‘Junho’ leva ao cinema os protestos de 2013 no país http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/06/1462506-filme-junho-leva-ao-cinema-os-protestos-de-2013-no-pais.shtml
7 de junho – Pirikart
http://www.pirikart.com.br/image/88106137680
13 de junho – Folha A cada dois dias, três são mortos em briga de família em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1469542-a-cada-dois-dias-tres-sao-mortos-em-briga-de-familia-em-sp.shtml
13 de junho – UOL Defensoria vê ato da polícia de SP [em abertura da Copa] como desproporcional http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2014/06/13/defensoria-ve-ato-da-policia-de-sp-como-desproporcional.htm
277
13 de junho – Estadão Bruno Paes Manso: “Is it always like this in Brazil? Always so violent demostrations?” (CNN) “Sabía que iba a haber tensión pero esto…Brutal” (El Mundo) http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/is-it-always-like-this-in-brazil-always-so-violent-demostrations-cnn-sabia-que-iba-a-haber-tension-pero-esto-brutal-el-mundo/
13 de junho – Pirikart
http://www.pirikart.com.br/image/88673202640
13 de junho – Folha – Charge Angeli
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/25777-charges-junho-2014#foto-404428
278
14 de junho – Folha – Charge João Montanaro
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/25777-charges-junho-2014#foto-405062
17 de junho – Estadão Bruno Paes Manso: Jornalismo não deve erguer muros, mas criar pontes. Os desafios depois de junho de 2013 (sobre a criação da Ponte Jornalismo) http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/jornalismo-nao-deve-erguer-muros-jornalismo-deve-criar-pontes/
19 de junho – Folha – Charge Angeli
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/25777-charges-junho-2014#foto-407396
279
20 de junho – Folha PM faz reintegração de posse na Unesp Araraquara e leva 15 alunos à delegacia http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/ribeiraopreto/2014/06/1473441-pm-faz-reintegracao-de-posse-na-unesp-araraquara-e-leva-15-alunos-a-delegacia.shtml
23 de junho – Folha Polícia Civil só investiga 1 a cada 10 roubos em SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1474720-policia-civil-so-investiga-1-a-cada-10-roubos-em-sp.shtml
23 de junho – Folha Boletim de ocorrência não basta para abrir inquérito, afirma secretaria http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1474725-boletim-de-ocorrencia-nao-basta-para-abrir-inquerito-afirma-secretaria.shtml
23 de junho – Folha Para especialistas, falta de investigação alimenta violência http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/172488-para-especialistas-falta-de-investigacao-alimenta-violencia.shtml
24 de junho – Folha PMs de folga vão reforçar segurança na porta das escolas de SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1475423-pms-de-folga-vao-reforcar-seguranca-na-porta-das-escolas-de-sp.shtml
25 de junho – Folha Painel do Leitor: críticas à gestão da PM e à atuação da Polícia Civil http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/172781-painel-do-leitor.shtml
280
26 de junho – Folha Roubos aumentam 42% na capital; homicídios saem de faixa epidêmica http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/173050-roubos-aumentam-42-na-capital-homicidios-saem-de-faixa-epidemica.shtml
27 de junho – Folha Ex-comandante da Rota, vereador lança revista em quadrinhos ‘para fãs da PM’ http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1477305-ex-comandante-da-rota-vereador-lanca-revista-em-quadrinhos-para-fas-da-pm.shtml
28 de junho – Folha Eliane Brum: o PM e o militante Steevan Oliveira: Não vim de Marte. Sou PM em uma sociedade desigual Luiz Fernando Vasconcelos: PM mantém uma ordem que é desordem http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/06/1477892-eliane-brum-o-pm-e-o-militante.shtml
02 de julho – Folha Polícia usa bomba de efeito moral para dispersar torcedores na Vila Madalena http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/07/1479685-policia-usa-bombas-de-efeito-moral-para-dispersar-argentinos-em-sp.shtml
02 de julho – Estadão Bruno Paes Manso: A ‘Ideologia Telhada’ é hoje o maior veneno para as polícias e para a população de SP http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/em-40-anos-de-servico-publico-coronel-telhada-ainda-nao-aprendeu-que-dispensamos-esses-herois/
281
02 de julho – Carta Capital “Aqui não tem mídia, agora você vai morrer”: Preso nesta terça-feira ao pedir a identificação de uma policial militar, o advogado Daniel Biral conta que foi agredido e ameaçado por PMs http://www.cartacapital.com.br/sociedade/201caqui-nao-tem-midia-agora-voce-vai-morrer201d-765.html
03 de julho – IG Inquérito da PM ‘absolve’ oficial da morte do pedreiro Amarildo http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-07-03/ipm-absolve-oficial-da-morte-do-pedreiro-amarildo.html
05 de julho – Ponte São Paulo proíbe máscaras e bombas em protesto http://ponte.org/sao-paulo-proibe-mascaras-e-bombas-em-protesto/
06 de julho – Folha Capital puxa ‘epidemia’ de roubos; Estado bate recorde http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1481647-capital-puxa-epidemia-de-roubos-estado-bate-recorde.shtml
06 de julho – Folha Haverá ‘total empenho’ para combater crimes, diz Grella http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1481654-havera-total-empenho-para-combater-crimes-diz-grella.shtml
06 de julho – Folha Infográfico: Roubos em alta http://www1.folha.uol.com.br/infograficos/2014/07/84900-roubos-em-alta.shtml
282
12 de julho – Folha Após alta de roubos, Alckmin troca 4 chefes da PM na capital http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/175649-apos-alta-de-roubos-alckmin-troca-4-chefes-da-pm-na-capital.shtml
12 de julho – Folha Condenado 1º PM por revide a ataques de facção (PCC, 2006) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/175648-condenado-1-pm-por-revide-a-ataques-de-faccao.shtml
12 de julho – Folha Datafolha traça ranking da insatisfação dos paulistanos (segurança aparece em 1º lugar) http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1484957-datafolha-traca-ranking-da-insatisfacao-dos-paulistanos.shtml
14 de julho – Folha Roubos esclarecidos caem 42% em SP nos últimos dez anos http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1485528-roubos-esclarecidos-caem-42-em-sp-nos-ultimos-dez-anos.shtml
14 de julho – Folha Delegado-geral diz que houve mudança em 2013 (em investigações de roubos) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/175899-delegado-geral-diz-que-houve-mudanca-em-2013.shtml
14 de julho – Folha Investigação em SP põe 30 policiais sob suspeita de elo com PCC http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1485479-investigacao-em-sp-poe-30-policiais-sob-suspeita-de-elo-com-pcc.shtml
283
15 de julho – Terra Quatro policiais detidos por agressão durante protestos contra Copa http://noticias.terra.com.br/brasil/politica/quatro-policiais-detidos-por-agressao-durante-protestos-contra-copa,7d51935b78c37410VgnCLD200000b2bf46d0RCRD.html
17 de julho – Folha Governo quer tornar permanentes os centros de segurança da Copa http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1487110-governo-quer-tornar-permanentes-os-centros-de-seguranca-da-copa.shtml
20 de julho - Folha Série nacional explora lado psicológico de policiais http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/07/1488016-serie-nacional-explora-lado-psicologico-de-policiais.shtml
24 de julho – Estadão PMs que atuaram em ação paralela ao Pinheirinho são indiciados por tortura e abuso sexual http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,pms-que-atuaram-em-acao-paralela-ao-pinheirinho-sao-indiciados-por-tortura-e-abuso-sexual,1056911
25 de julho – Folha Roubos têm aumento de 21% na capital paulista; homicídios caem http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1491196-mesmo-com-aumento-de-policiamento-para-a-copa-roubos-aumentam-em-sp.shtml
26 de julho – Folha Com Copa, roubos dobram na região da Vila Madalena http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1491563-com-copa-do-mundo-casos-de-roubo-dobram-na-regiao-da-vila-madalena.shtml
284
29 de julho – El País Brasil Os policiais brasileiros querem desmilitarizar a instituição http://brasil.elpais.com/brasil/2014/07/30/politica/1406679075_861116.html
29 de julho – Jornal Nacional Pesquisa mostra insatisfação dos policiais com o próprio trabalho http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2014/07/pesquisa-mostra-insatisfacao-dos-policiais-com-o-proprio-trabalho.html
30 de julho – UOL Pesquisa diz que 77,2% dos policiais são a favor da desmilitarização da PM http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2014/07/30/um-terco-dos-policiais-brasileiros-pensa-em-deixar-corporacao-diz-pesquisa.html
2 de agosto – Folha Dois pichadores são mortos por PMs dentro de prédio http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/178784-dois-pichadores-sao-mortos-por-pms-dentro-de-predio.shtml
6 de agosto – Folha Para delegado, laudo enfraquece só uma acusação contra presos em ato caso Fábio Hideki e Rafael Lusvarghi http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1496347-para-delegado-laudo-enfraquece-so-uma-acusacao-contra-presos-em-ato.shtml
10 de agosto – Agência Efe Brasil discute soluções para superlotação em presídios http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/efe/2014/08/10/brasil-discute-solucoes-para-superlotacao-em-presidios.htm
285
11 de agosto - Folha PM é presa em SP após atirar em idoso durante abordagem policial http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1498612-pm-e-presa-em-sp-apos-atirar-em-idoso-durante-abordagem-policial.shtml
20 de agosto – Ponte Comissão de Segurança Pública da Câmara prioriza punição ao crime: Relatório do Instituto Sou da Paz avalia que deputados federais preferem atuar no julgamento e punição ao invés de tratar das causas da violência. Resposta ao crime é ineficaz, aponta o estudo http://ponte.org/comissao-de-seguranca-publica-da-camara-nao-prioriza-prevencao-ao-crime/
21 de agosto – Vice Quem É o Juiz que Manda os PMs pra cadeia http://www.vice.com/pt_br/read/quem-e-o-juiz-que-manda-os-pms-pra-cadeia?utm_ source=vicefacebr
25 de agosto – Folha Comerciante é detido [no Paraná] após criticar ação de PMs nas redes sociais http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1505593-comerciante-e-detido-apos-criticar-acao-de-pms-nas-redes-sociais.shtml?cmpid=%22facefolha%22
28 de agosto - Folha Prefeitura terá olheiro em bairro violento http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/182806-prefeitura-tera-olheiro-em-bairro-violento.shtml
28 de agosto – Folha Assaltantes de ônibus são mortos [por PMs] em SP e no Rio http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/182813-assaltantes-de-onibus-sao-mortos-em-sp-e-no-rio.shtml
286
28 de agosto – G1 Tribunal Militar dá liberdade a PMs suspeitos de matar pichadores http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/08/tribunal-militar-da-liberdade-pms-suspeitos-de-matar-pichadores.html
28 de agosto – Folha Gestão Haddad quer criar grupo que receberá denúncia contra policiais http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1506978-gestao-haddad-quer-criar-grupo-que-recebera-denuncia-contra-policiais.shtml
8 de setembro- Folha Ação policial e eleição esvaziam protestos pelo país http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1512551-acao-policial-e-eleicao-esvaziam-protestos-pelo-pais.shtml
9 de setembro - Folha Governo de SP altera regras e facilita o pagamento de bônus a policiais [que cumpram metas] http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1513136-governo-de-sp-altera-regras-e-facilita-o-pagamento-de-bonus-a-policiais.shtml
10 de setembro – Folha Com mudança em programa, SP vai pagar bônus a 18,8 mil policiais [que cumpriram meta] http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1513646-com-mudanca-em-programa-estado-sp-pagara-bonus-a-188-mil-policiais.shtml
287
15 de setembro – BBC Brasil Medo de perder ‘voto conservador’ afasta violência policial de campanhas http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140912_salasocial_eleicoes2014_candidatos_policia_seguranca_cc.shtml
16 de setembro – BBC Brasil Para cada quatro mortos pela polícia no Brasil, um policial é assassinado http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140914_salasocial_eleicoes2014_violencia_policia_numeros_lk_jp.shtml
18 de setembro – BBC Brasil ‘Na faculdade, deixei minha profissão camuflada; somos discriminados’, diz PM http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140917_depoimento_pm_kawa_salasocial_eleicoes2014_rw
18 de setembro – BBC Brasil Por que é tão difícil investigar abusos por policiais? Conheça 5 razões http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140914_investigacao_crimes_salasocial_eleicoes_lk
18 de setembro – Folha PM é preso após morte de camelô durante operação na zona oeste de SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1518328-pm-e-preso-apos-morte-de-camelo-durante-operacao-na-zona-oeste-de-sp.shtml
19 de setembro – UOL PM preso por matar camelô responde por outra morte http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2014/09/19/pm-preso-por-matar-camelo-responde-por-outra-morte.html
288
19 de setembro – BBC Brasil ‘Morte sem pena’: Perfis nas redes fazem apologia à violência policial http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140917_salasocial_eleicoes2014_violencia_rs.shtml
19 de setembro – BBC Brasil Tragédia une mães de mortos por policiais: ‘Eles acham que a gente não tem voz’ http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140919_depoimentos_maes_vitimas_ salasocial_eleicoes2014_rw.shtml
19 de setembro – BBC Brasil Truculência e barbárie não são soluções para a segurança, diz sociólogo http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140919_entrevista_ignacio_cano_jeff_ salasocial_eleicoes2014_rw.shtml
19 de setembro – BBC Brasil Para analista, desmilitarização não resolve problemas da polícia http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140916_salasocial_eleicoes2014_jose_ vicente_lk.shtml
20 de setembro – Folha Editorial: Homicídio policial (sobre camelô morto) http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/09/1519075-editorial-homicidio-policial.shtml
23 de setembro – Folha Vídeos levam juíza a soltar PM que matou camelô horas após mandar prender http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1521138-videos-levam-juiza-a-soltar-pm-que-matou-camelo-horas-apos-mandar-prender.shtml
289
25 de setembro – Folha Análise: Bico e salário baixo contribuem para ação de PMs na folga http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/09/1346984-analise-militarizacao-bicos-e-salarios-baixos-contribuem-para-as-ocorrencias.shtml
25 de setembro – Folha Com críticas a PSDB e PT, ‘bancada da bala’ quer alçar voos maiores; assista http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/videocasts/2014/09/1522231-com-criticas-a-psdb-e-pt-bancada-da-bala-quer-alcar-voos-maiores-assista.shtml
2 de outubro – Folha Com presença da PM, roubos e furtos dentro do campus da USP sobem 55% http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/10/1525771-com-presenca-da-pm-roubos-e-furtos-dentro-do-campus-da-usp-sobem-55.shtml
17 de outubro – Estadão Bruno Paes Manso: Pelo fim da pena de morte aos adolescentes. O caso São Remo http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/pelo-fim-da-pena-de-morte-aos-adolescentes-o-caso-sao-remo/
19 de outubro – Folha PM é morto com tiro na cabeça na zona sul de SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/10/1534846-pm-e-morto-com-tiro-na-cabeca-na-zona-sul-de-sp.shtml?cmpid=%22facefolha%22
29 de outubro – G1 Justiça proíbe PM de usar balas de borracha durante protestos em SP http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/10/justica-proibe-uso-de-balas-de-borracha-por-pm-em-protestos-de-sp.html
290
29 de outubro – Ponte Documento secreto: PM viola normas de uso para bala de borracha http://ponte.org/pm-bala-de-borracha-documento-secreto/
3 de novembro – Folha Ligação com tráfico e milícia é 1º causa de expulsão de PMs no Rio http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1542378-ligacao-com-trafico-e-milicia-e-1-causa-de-expulsao-de-pms-no-rio.shtml
4 de novembro – Folha Fornecedora banca viagem de cúpula da polícia paulista a Orlando, nos EUA http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1542856-fornecedora-banca-viagem-de-cupula-da-policia-paulista-a-orlando-nos-eua.shtml
5 de novembro – Folha Sete pessoas são mortas em Belém (PA) após assassinato de PM http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1543495-belem-registra-oito-mortes-apos-assassinato-de-policial-militar.shtml
6 de novembro – Folha TJ suspende proibição de uso de bala de borracha pela Polícia Militar de SP http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1544218-tj-suspende-proibicao-de-uso-de-bala-de-borracha-pela-policia-militar-de-sp.shtml
10 de novembro – Folha Em 5 anos, polícia brasileira matou em média 6 pessoas por dia, diz estudo http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1545847-em-5-anos-policia-brasileira-matou-em-media-6-pessoas-por-dia-diz-estudo.shtml
291
Sem data – Estadão No fio da navalha: ‘Problema maior da polícia brasileira é a mentalidade militar de reagir à violência com violência’, diz estudioso americano http://www.estadao.com.br/noticias/geral,no-fio-da-navalha,1125620
Sem data – Tumblr Minha PM Registros de violência policial em fotos http://minhapm.tumblr.com/
Sem data – Tumblr Alckmin em Choque Sátira de como o governador responde a tudo com policiamento http://alckminemchoque.tumblr.com/
Sem data – Vídeo Coletivo Tatu Morto Polícia Militar: Organização Terrorista. http://vimeo.com/88219030
Sem data – Jornal Nacional O Caso Favela Naval http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/telejornais/jornal-nacional/favela-naval.htm http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/coberturas/favela-naval.htm
292
Sem data – Foto de manifestação anti-Copa
293
Bibliografia dos perfis Novinho - Tenente Oswaldo Dura - Porta dos Fundos https://www.youtube.com/watch?v=DyPb15CHdew
15 de abril de 2013 - Secretaria de Segurança Pública Assembleia aprova projeto que dobra seguro de policiais http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=30989
30 de abril de 2014 - Secretaria de Segurança Pública São Paulo ganha 1.190 soldados para o policiamento nas ruas http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=34021
17 de maio de 2014 - Secretaria de Segurança Pública PM entrega espadins a 228 cadetes em formação http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=34118
Memória - Sargento Laercio 6 de julho de 2012 - R7 Agentes reclamam de programa de apoio psicológico da Polícia Militar http://noticias.r7.com/sao-paulo/noticias/agentes-reclamam-de-programa-de-apoio-psicologico-da-policia-militar-20120706.html
295
25 de maio de 2013 - IG Programa para PM que passa por situação de risco vira “castigo” para agentes http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-05-25/programa-para-pm-que-passa-por-situacao-de-risco-vira-castigo-para-agentes.html
Enxugando gelo - Capitão Massera 29 de outubro de 2011 - Estadão Crimes no câmpus caem até 92% após convênio http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,crimes-no-campus-caem-ate-92-apos-convenio-imp-,791981
13 de junho de 2014 - Folha Editorial: Retomar a Paulista http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/06/1294185-editorial-retomar-a-paulista.shtml
13 de junho de 2014 - Estadão Editorial: Chegou a hora do basta http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,chegou-a-hora-do-basta-imp-,1041814
2 de outubro de 2014 – Folha Com presença da PM, roubos e furtos dentro do campus da USP sobem 55% http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/10/1525771-com-presenca-da-pm-roubos-e-furtos-dentro-do-campus-da-usp-sobem-55.shtml
Vingança - Coronel Arruda 5 de abril de 1983 - Folha Um dia de saques e pânico http://acervo.folha.com.br/fsp/1983/04/05/2/
296
6 de abril de 1983 - Folha A violência se alastra e Montoro promete ordem http://acervo.folha.com.br/fsp/1983/04/06/2/
7 de outubro de 2005 - Folha Namoro de garotas vira caso de polícia http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0710200501.htm
7 de outubro de 2005 - Folha Para diretor de Escola da EACH, não houve “ação obscena” http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0710200502.htm
30 de dezembro de 2005 - Folha PM quer aprender com gays a lidar com gays http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff3012200501.htm
30 de dezembro de 2005 - Folha Policial que abordou jovens foi inocentada http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff3012200502.htm
23 de janeiro de 2006 - UOL Testemunhas indicadas por meninas da USP não foram ouvidas em sindicância http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/27021/testemunhas+indicadas+por+m eninas+da+usp+nao+foram+ouvidas+em+sindicancia.shtml
12 de março de 2006 - Folha Comando da PM desiste de curso com gays http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1203200614.htm
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12 de março de 2006 - Folha “Não esperava outra atitude”, diz associação LGBT http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1203200615.htm
18 de setembro de 2011 - Estadão O coronel que trouxe uma luta indígena à PM http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,o-coronel-que-trouxe-uma-luta-indigena-a-pm-imp-,774030
13 de janeiro de 2014 - Estadão Formação de PMs deve ser humanizada, defende coronel [Arruda] http://politica.estadao.com.br/blogs/roldao-arruda/coronel-da-reserva-defende-mudanca-na-formacao-de-policiais-militares/
Dentro da Lei - Major Franciscon 2 de julho de 2014 – Folha Polícia usa bomba de efeito moral para dispersar torcedores na Vila Madalena http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/07/1479685-policia-usa-bombas-de-efeito-moral-para-dispersar-argentinos-em-sp.shtml
5 de julho de 2014 - Folha Mesmo com hora para acabar, torcedores não desanimam e fazem festa na Vila Madalena http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/07/1481608-mesmo-com-hora-para-acabar-torcedores-nao-desanimam-e-fazem-festa-na-vila-madalena.shtml
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10 de julho de 2014 - G1 PM circula em festa na Vila Madalena apĂłs registro de venda livre de droga http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/07/pm-circula-em-festa-na-vila-madalena-apos-registro-de-venda-livre-de-droga.html
10 de julho de 2014 - SPTV Major da PM fala em trĂŞs idiomas para dispersar multidĂŁo na Vila Madalena http://globotv.globo.com/globocom/g1/v/major-da-pm-fala-em-tres-idiomas-para-dispersar-multidao-na-vila-madalena/3487513/
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