A ILHA DOS MARINHEIROS NA DOCUMENTAÇÃO ESCRITA E IMAGÉTICA
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LUIZ HENRIQUE TORRES
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A ILHA DOS MARINHEIROS NA DOCUMENTAÇÃO ESCRITA E IMAGÉTICA
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ÍNDICE UMA GRANDE ILHA NA LAGOA DOS PATOS...............................................................6 A ILHA DOS MARINHEIROS NA DOCUMENTAÇÃO ESCRITA E IMAGÉTICA....21 BIBLIOGRAFIA.................................................................................................................249
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A ILHA DOS MARINHEIROS NA DOCUMENTAÇÃO ESCRITA E IMAGÉTICA
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pós a caracterização preliminar das dimensões espacial e histórica, serão reproduzidos documentos escritos e fotográficos que são fontes para o estudo da história da Ilha dos Marinheiros.
É um painel com diferentes registros de documentos e imagens, colocados em sequência cronológica, que busca fazer conhecer e também instigar a ampliação das pesquisas sobre a Ilha dos Marinheiros. Nesta direção, foi realizado um arrolamento bibliográfico que traz referências ou tem a Ilha como objeto central. A proposta é ser uma contribuição documental/imagética para a valorização histórica e turística da maior ilha do Rio Grande do Sul.
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UMA GRANDE ILHA NA LAGOA DOS PATOS
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io Grande tem uma íntima ligação com a Lagoa dos Patos! Por mais óbvia que seja esta afirmação, de fato, a Lagoa parece ser uma famosa desconhecida para um grande número de pessoas que visita a cidade ou que aqui reside. Uma grande parte da identidade de Rio Grande passa pela Lagoa dos Patos; inúmeras outras comunidades do Rio Grande do Sul, também construíram vínculos históricos com este espaço natural e cultural. Lagoa dos Patos é a maior Lagoa de tipo estrangulado (choked laggon) do mundo, estendendo-se na direção NE-SW entre as latitudes 30°30’S e 32º12’S. Está localizada na Planície Costeira do Rio Grande do Sul e recebe grande volume de água doce dos rios ao norte da planície costeira e dos rios afluentes da Lagoa dos Patos. Cinco unidades biológicas a constituem: Rio Guaíba, Enseada de Tapes, Lagoa do Casamento, Corpo Central Lagunar e Estuário. Junto a Barra do Rio Grande, ocorre o escoamento da água doce e o ingresso de água salgada neste sistema de mais de 250 km de extensão. Suas margens fazem parte dos municípios de Viamão, Capivari do Sul, Palmares do Sul, Barra do Ribeiro, Tapes, Arambaré, Camaquã, Turuçu, São Lourenço do Sul, Pelotas, Rio Grande, Mostardas, Tavares e São José do Norte. A tradição dos mapas e documentos legou o termo Lagoa dos Patos! Porém, cientificamente, a denominação correta é Laguna dos Patos. Laguna, geomorfologicamente, se refere a uma depressão formada por água salgada ou salobra que se localiza nas proximidades da costa litorânea. A comunicação com o oceano se faz através de um canal onde o fluxo de água doce e de água salgada interage. No caso da Laguna dos Patos, o intenso despejo de água doce
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de vários rios faz com que, na maior parte de sua extensão, predomine a água doce. A área compreendida entre a Barra do Rio Grande e a ponta da Feitoria é considerada como o Estuário da Lagoa dos Patos. Portanto, são aproximadamente 70 km da embocadura da Lagoa dos Patos com o Oceano, onde ocorre de forma intensa o processo de contato das águas salgadas do Atlântico com o fluxo de água doce da Bacia Atlântica. Isto não impede que em certas condições, a maré salina invada a Lagoa até a altura do Rio Guaíba. A área do Estuário estende-se por cerca de 900 km², constituindo uma área de marisma (mistura entre água doce e salgada formando uma vegetação de gramíneas e juncos) com grande biodiversidade e onde ocorre a reprodução/proteção para várias espécies. Várias ilhas estão localizadas nesta área: a Ilha da Pólvora onde está edificado o EcoMuseu; e a Ilha dos Marinheiros, a maior do Rio Grande do Sul, e o nosso foco neste livro.
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Figura 1 Lagoa dos Patos. Imagem de satélite, NASA.
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Figura 2 Localização geográfica da Ilha dos Marinheiros no Sul do Brasil e no Estuário da Lagoa dos Patos. In: QUINTELA, 2018.1
QUINTELA, F.; CORRÊA, F.; PINHEIRO, R. M.; LOEBMANN, D.Ichthyofauna of Marinheiros Island, Patos Lagoon estuary, southern Brazil Biota Neotrop. vol.18, no.1, Campinas, 2018. Acesso: 02-07-2020. 1
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A Ilha dos Marinheiros2 se localiza no extremo sul da Planície Costeira do estado do Rio Grande do Sul em uma área pertencente ao município de Rio Grande, especificamente na margem oeste da laguna dos Patos e no centro da enseada estuarina (lat. 31º 58’ e 32° 02’ S; long. 52º 05’ e 52° 12’W).3 A superfície total é de 3.980 hectares, no sentido sudoeste-nordeste tem uma extensão de 10,2 km e no sentido noroeste-sudeste uma largura de 5, 7 km. A Ilha apresenta um conjunto de características que a tornam especial no contexto do Estuário da Lagoa dos Patos: representatividade em área (40 km²), significado cultural e científico, população tradicional de pescadores e agricultores, diversidade de ambientes (matas, dunas, terraços, marismas, lagoas) e um grande potencial turístico.4
Pela Lei Municipal n.º 3.414, de 08-10-1979, é criado o distrito de Ilha dos Marinheiros. Sob a mesma lei, o distrito de Cassino é extinto, sendo seu território anexado ao distrito sede do município de Rio Grande. Em divisão territorial datada de 2001, o município é constituído de 5 distritos: Rio Grande, Ilha dos Marinheiros, Povo Novo, Quinta e Taim. Assim permanecendo em divisão territorial datada de 2007. Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 3 AVILA, Luisa Bataglin de; ERTHAL, Camile; CARVALHO, Claudia Wollmann, CASARTELLI. Maria Regina. Contribuição de Íons em águas subterrâneas de áreas sob florestamentos (Pinus sp.) – sul da Zona Costeira, RS. Anais do VII Salão Internacional de Ensino, Pesquisa e Extensão – Universidade Federal do Pampa, 2016. 4 TAGLIANI, C. R. A.; CONTERATO, M. R.; ANTIQUEIRA, J.A.F.; CALLIARI, L.J.; TAGLIANI, P.R. Construção de um Modelo de Elevação Digital de Terreno para a Ilha dos Marinheiros, Rio Grande, RS, com uso de DGPS e Rotinas de Geoprocessamento. GRAVEL. Porto Alegre: dezembro de 2006, p. 89-98. 2
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A configuração morfológica atual da região estuarina, onde a Ilha dos Marinheiros está inserida, é o resultado de processos sedimentares, que ocorreram nos dois últimos ciclos de transgressão-regressão do Sistema Laguna-Barreira. Juntamente com o surgimento dessas barreiras arenosas desenvolveram-se ilhas sedimentares quartzosas, denominadas de lacustrinas. Estas ilhas eram formadas por terraços pleistocênicos, posteriormente, cobertos por areias aluviais e eólicas recentes, além de silte e argila, em menor quantidade.5 A Segundo Rebouças (2003) ao compilar as considerações de Long & Paim (1987), A formação da Ilha dos Marinheiros, tem seu início há 2.500 anos. Neste período a Ilha encontrava-se unida ao atual município de São José do Norte.6 O fluxo lagunar se comportava com dinâmica semelhante à de um rio e seu canal principal escoava onde hoje se encontra o Saco do Arraial e a Ilha do Leonídeo. O fluxo lagunar acabou por erodir os flancos côncavos dos meandros, depositando sedimentos nos flancos convexos o que ocasionou o rompimento do cordão
ANTIQUEIRA, J.A.F.; TAGLIANI, C.R.; CALLIARI, L.J.; TAGLIANI, C.R.; SOARES, M. Modelo comportamental da margem leste da Ilha dos Marinheiros Rio Grande/RS . Os autores, a partir da 5
interpretação de uma série histórica de fotografias aéreas e de imagens de satélite da Ilha no período de 1947 a 2004 concluiu que os “efeitos erosivos nas margens da Ilha dos Marinheiros estão associados à elevação do nível de água e incidência de ondulações de curto período. A margem leste é a que apresenta as maiores taxas de erosão, em função da sua exposição às ondulações geradas pelos ventos de nordeste e leste”. http://www.abequa.org.br/trabalhos/2007_joao_antiqueira_quatcost2.pdf 6 LONG, T. & PAIM, P.S. 1987. Modelo de evolução histórica e holocênica da Lagoa dos Patos, RS. I Congresso da Associação Brasileira de Estudos do Quaternário . ABEQUA. p.227-248
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arenoso, isolando a Ilha dos Marinheiros e formando o canal principal da Lagoa dos Patos.7 Esta formação geológica recente e a localização no Estuário, remete a preocupações frente à vulnerabilidade da Ilha dos Marinheiros em relação à elevação do nível do mar.8 Foi realizado um estudo, um exercício de projeção, para futura tomada de decisão visando à mitigação de um hipotético aumento neste nível. Este mapa da vulnerabilidade traz dupla contribuição na nossa localização espacial: primeiramente, delimita as localidades em que a Ilha está dividida, ou seja, Bandeirinhas, Porto do Rei, Marambaia, Coréia e Fundos da Ilha. Em segundo, com o uso de cores, identifica os locais com maior índice de vulnerabilidade a elevação do nível do mar. Os tons em laranja, quanto mais intensos, significa maior vulnerabilidade. O que remete o menor índice a localidade de Bandeirinhas e o maior a Marambaia.
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REBOUÇAS, Gabriel Nunes Maia. Caracterização e diagnóstico ambiental da Ilha dos
Marinheiros (Estuário da Lagoa dos Patos - RS): subsídios ao gerenciamento costeiro integrado. Monografia (Graduação em Oceanografia) Universidade Federal de Rio Grande, 2003. TAGLIANI, Carlos Roney; CALLIARI, Lauro Júlio; TAGLIANI, Paulo Roberto; ANTIQUEIRA, José Antonio de. Quaternary and Environmental Geosciences (2010) 02(1):18-24. Vulnerability to sea level rise of an estuarine is land in southern Brazil. O artigo apresenta um mapa de vulnerabilidade à elevação do nível do mar para a Ilha dos Marinheiros permitindo o reconhecimento de cinco fatores principais de vulnerabilidade, incluindo variáveis dos meios físico, biótico e socioeconômico. 8
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Figura 3 Vulnerabilidade a elevação do nível do mar. TAGLIANI, C.R. 2010.
Em relação à ocupação humana na Ilha dos Marinheiros foram identificados sítios arqueológicos9 pré-coloniais da Tradição Vieira que, além de construtores de cerritos eram pescadores com datações para a região de Rio Grande entre 500 a.C. a 1.750 d.C. Também foram encontrados sítios arqueológicos da Tradição Tupiguarani, horticultores de floresta tropical e SILVEIRA, Cleiton Silva da. Potencial Arqueológico da Ilha dos Marinheiros de Rio Grande. Revista Memorare. N.1, 2013. http://www.portaldeperiodicos.unisul.br/index.php/memorare_grupep/article/view/1894/1389 acesso em 2-7-2020 9
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subtropical oriundos da Amazônia e com datações mais antigas para a região do município do Rio Grande de 1.200 d.C.10 a 1.400 d.C.11 O início e o fim da ocupação pré-colonial na Ilha somente podem ser conhecidos com a realização de pesquisas arqueológicas.
NAUE, Guilherme & SCHMITZ, Pedro I. & BASILE BECKER, Ïtala I. Sítios arqueológicos no Município de Rio Grande. Pesquisas, Antropologia nº 18, Estudos Leopoldenses, nº 9. Anais do Segundo Simpósio de Arqueologia da Área do Prata. São Leopoldo: Instituto Anchietano de Pesquisas, 1968. p. 141-52. 11 CARLE, Mirian Baptista. Investigação Arqueológica em Rio Grande: uma proposta da ocupação guarani pré-histórica no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Dissertação de Mestrado em História Ibero-Americana, PUCRS, 2002. 10
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As primeiras informações documentais sobre a Ilha dos Marinheiros estão relacionadas com a ocupação militar portuguesa da margem sul da Barra do Rio Grande a partir de fevereiro de 1737. Não há registro na documentação da presença indígena na Ilha dos Marinheiros ou em seus arredores neste período. Quando da construção do Forte Jesus-Maria-José, a madeira utilizada foi retirada da Ilha dos Marinheiros. 12A Ilha vai surgir na cartografia em 1737 e em documento em 1738. No ano de 1739, a Ilha foi dividida pelo comandante militar do Rio Grande André Ribeiro Coutinho em três sesmarias pertencentes a Antônio dos Anjos, Antônio Araújo Vilella e Antônio Pereira de Farias, que deveriam conter a derrubada indiscriminada da mata nativa. Porém, em 1744, a propriedade da Ilha foi alterada, passando para Marçal da Silva Veiga. Em Rio Grande, na indisponibilidade de material de pedra (rochas), as fortificações e residências acabavam, com raras exceções no século XVIII, sendo construídas com madeira, arbustos e lama. A restrita disponibilidade de madeira em Rio Grande fez com que as autoridades buscassem na mata nativa da Ilha dos Marinheiros o suprimento necessário, inclusive para a população sobreviver às baixas temperaturas do inverno. Não causa estranheza, devido à necessidade de madeira, que um mapa de 1737 de autoria do Brigadeiro José da Silva Paes e do cartógrafo Francisco de Barbuda, assinale pela primeira vez a presença da Ilha na cartografia lusitana da época (denominada de Ilha do Marinheyro). Neste mesmo ano, uma embarcação foi destacada por Silva Paes para conduzir soldados que retirariam FORTES, João Borges. Fundação do Rio Grande. II Congresso de História e Geografia Sul-RioGrandense. Porto Alegre: Globo, vol. II, 1937, p. 206. 12
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madeira e trariam para o consumo em Rio Grande. Além da madeira, a qualidade da água da Ilha passou a ser apreciada pela população da Comandância Militar/Vila do Rio Grande. Com a invasão espanhola em 1763, a exploração de madeira pode ter se intensificado. Em 1790, o militar português Domingos Alves Barreto faz referência a uma grande Ilha chamada de “Marinheiro, muito fértil; nela se encontram todos os auxílios necessários para se poder fazer naquele continente uma bem regulada povoação”, referindo-se à fertilidade e a abundância de hortaliças cultivadas, ainda incipientemente, na Ilha. A funcionalidade inicial da Ilha foi ser uma fonte de fornecimento de madeira e também de água potável para Rio Grande. Outra funcionalidade, mesmo que assistemática, era ser uma ilha-prisão ou um “degredo”: “o negro do Sargento-mor, causa da última desordem, seja remetido para a Ilha dos Marinheiros por três meses”.13 Quase ao final do século XVIII, no ano de 1799, foi registrada a construção de uma casa na Ilha por parte de um comerciante da Vila do Rio Grande: o português José de Souza Rey dá início a edificação de residências a serem ocupadas no final de semana14. Este processo vai se disseminar ao longo do Registro da ratificação do perdão que mandou o Exmo. Sr. General Gomes Freire de Andrada ao Corpo de Dragões (3 de abril de 1742). Textos do século XVIII para o estudo da ocupação lusitana no Brasil Meridional. ALVES, Francisco das Neves e TORRES, Luiz Henrique. Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Instituto Europeu de Ciências da Cultura Padre Manuel Antunes Biblioteca Rio-Grandense, 2016. 14 O comerciante manda construir um trapiche chamado de Porto do Rey e uma passagem pública por sua chácara chamada de Rua do Rey. In: AZEVEDO, Anna Lúcia Dias Morrison. A Ilha dos Três Antônios. Águeda, Portugal: Editora Jornal Soberania do Povo, 2003. 13
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século XIX e a força política destes comerciantes, almejará inclusive a construção de uma ponte ligando a Ilha com a cidade. A Lei número 179 de 16 de outubro de 1850 criou a Capela de São João Evangelista.15 No ano de 1858, esta Capela registrou 961 habitantes para a Ilha dos Marinheiros, sendo 734 livres e 227 escravos.16 Isto evidencia uma forte presença de escravos negros compatível com percentuais registrados para o núcleo urbano em Rio Grande. Indica que a Ilha estava sendo utilizada pelos proprietários de escravos de Rio Grande para o desenvolvimento de atividades econômicas na agricultura e na vitivinicultura. A conquista da Capela não está dissociada de um avanço da articulação política local. É nesta década de 1850 que os debates ligados à construção de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros chegaram à Câmara Municipal. Já naquele momento, a importância econômica da Ilha na produção de hortigranjeiros, viticultura, de madeira e de água potável, associada a um espaço para o lazer da população da cidade do Rio Grande, sinalizaram a um esforço no sentido de consolidar a relação da Ilha com a cidade. Porém, depois de passada uma década, não ocorreram avanços em infraestrutura.17 Com o surgimento do
CAMARGO, Antônio Eleutério de. Quadro Estatístico e Geográfico da Província de S. Pedro do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Tipografia do Jornal do Comércio, 1868, p. 285. 15
RUIVO, José Carlos Vieira. Contribuição para a História da Ilha dos Marinheiros, Rio Grande, RS. In: ALVES, Francisco das Neves; TORRES, Luiz Henrique. Temas de História do Rio Grande do Sul. Rio Grande: FURG, 1994. 17 As obras de uma ponte demoraram mais de um século para saírem do papel. Em 1977 teve início obras de aterro ligando a Ilha do Leonídio e a Ilha dos Marinheiros. Foram projetadas duas 16
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Balneário Vila Siqueira (Cassino) em 1890, os investimentos em construção de residências para veraneio foi catalizado pela praia de banhos de mar. A atuação de pescadores artesanais recua ao século XIX, porém, é na agricultura que a Ilha obteve expressão econômica e edificou um perfil português. Esta etnia foi predominante e ocorreu a manutenção/adaptação de práticas culturais de seus ancestrais na Península Ibérica. Esta comunidade de agricultores lusitanos e luso-brasileiros teve como objetivo produtivo fornecer legumes, verduras e frutas (em alguns casos, vinhos e produtos da granja), aos consumidores ou às fábricas alimentícias de Rio Grande. Com expansão e recuo no consumo destes produtos, frente a crises econômicas ou concorrência, a Ilha dos Marinheiros foi construindo uma demografia que cresceu muito até a década de 1940 e se estagnou a partir dos anos 1950, decaindo para patamares de meados do século XIX: em 1858 - 961 habitantes; 1863 – 1.051 habitantes; 1885 – 1.500 habitantes; 1911 – 1.935 habitantes; 1940 – 7.200 habitantes; 1974 – 2.725 habitantes, 2000 – 1.324 habitantes; 2010 – 1.119 habitantes. A grande crise da agricultura remonta a 194518 e o efeito econômico da enchente de 1941 foi considerável. Com a inauguração da ponte ligando a Ilha ao Continente, ocorreu uma motivação em avançar em outra variável econômica que é o turismo. Muitas pesquisas e produtos (monografia, dissertação, tese e artigos) foram produzidos pontes para circulação do peixe e do camarão, sendo a primeira com 90 metros de extensão e a segunda com 150 metros. As obras duraram entre 1999 e a inauguração em 2004. 18 AZEVEDO, 2003, op. cit.
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sobre conhecimentos físicos e culturais da Ilha dos Marinheiros com ênfase no potencial turístico e da preservação ambiental. O Projeto Costa Sul, aplicado a Ilha dos Marinheiros, a partir de 2006, começou a elaborar um plano de manejo ambiental que produziu vários resultados científicos e que contribuiu para divulgar a Ilha e instigar uma diversificada produção acadêmico-científica que é parcialmente arrolada no final deste livro. Num cenário de contribuir para novas investigações, foi realizado este levantamento e reprodução de fontes para a compreensão da historicidade da Ilha dos Marinheiros. São documentos escritos de viajantes, autoridades civis e militares luso-brasileiras, estudos técnicos, comissão científica, relatório, matérias jornalísticas; e também documentos visuais como uma litogravura e várias fotografias que estão contextualizadas em eventos relevantes e no seu impacto na esfera local. Outro volume foi elaborado arrolando a cartografia da Barra do Rio Grande e às vezes que a Ilha dos Marinheiros foi representada.
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Figura 4 Placa do Projeto Costa Sul, NEMA/FURG. Fonte: Luciane Goldberg.
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ANDRÉ RIBEIRO COUTINHO - 1738 Em suas “Memórias”, o Mestre de Campo André Ribeiro Coutinho, governador da Comandância Militar do Rio Grande,
deixou algumas
informações sobre o material de construção utilizado nos primeiros anos de ocupação da Barra do Rio Grande. Segundo ele, “todos os sobreditos quartéis, armazéns e mais obras” foram realizados “de pau a pique e barro”, com exceção das casas dos oficiais que eram “assoalhadas e forradas” com couro. A madeira utilizada para as “estacas e faxinas” era oriunda da Ilha dos Marinheiros. A demanda era intensa e Ribeiro Coutinho mandou construir uma falua grande (embarcação de boca aberta e dois mastros) “para a contínua condução de madeiras para todas as casas, quartéis e fortificações”.19
Memória dos Serviços Prestados pelo Mestre de Campo André Ribeiro Coutinho ao Governo do Rio Grande de São Pedro, dirigida a Gomes Freire de Andrada em 1740. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul . Porto Alegre: n.16, 4 trimestre de 1936. 19
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TENENTE-GENERAL HEINRICH BOHN – 1776 O comandante do Exército do Sul, Tenente-General Heinrich Boehm escreveu um diário das operações militares no Rio Grande do Sul no período de dezembro de 1774 a janeiro de 1779: “Memoires Relatifs a L’Expédition au Rio Grande”. O destinatário destas “Memórias” era o Vice-Rei do Brasil o Marquês de Lavradio. Boehm comandou a restauração da Vila do Rio Grande de São Pedro (1776) e de parte do Rio Grande do Sul para a soberania de Portugal. Nestes diários, em três oportunidades, ele deixou algumas pistas sobre a importância da Ilha dos Marinheiros (Isles de Mariniers), seja para espanhóis que a controlaram por 13 anos, seja para os portugueses. Segundo Boehm a Ilha dos Marinheiros e a Ilha Marçal de Lima (atual Leonídio) eram utilizadas pelos espanhóis para o corte de madeira e para a fabricação de tijolos, tendo abandona nestes lugares suas ferramentas quando do ataque militar lusitano.20 Em carta de 10 de junho é feita referência a distúrbios na Vila devido à falta de madeira para as construções. A madeira era extraída com grande dificuldade da Ilha dos Marinheiros e parte ia para os fogões (comida, aquecimento, ferver água etc) e também era muito usada nos casebres.21 “(...) dans les Isles de Mariniers et Marçal de Lima ils ont laissé leurs outils pour couper des bois et des commencements pour faire des briques”. Carta de 11 de abril de 1776. BOEHM, J. Heinrich. Memoires Relatifs à l’Expédition au Rio Grande. In: Anais do Simpósio Comemorativo do Bicentenário do Rio Grande (1776-1976). Rio de Janeiro: Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; Instituto de Geografia e História Militar do Brasil, 1979, p. 116. 21 “(...) j'ai diminué en même temps le nombre des trouppes dans cette villa, ou il coute beacucoup a les porvoir. le bois se tire avec beaucoup de peine de lisle des mariniers et il faut en fournir pour sauver les enclos”. Carta de 10 de junho de 1776, BOEHM, op. cit., p. 126. 20
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Em outra carta, de 29 de julho de 1776, Boehm relata ao Marquês de Lavradio que a escassez de madeira para cozinhar e para a construção das casas, o forçou a aumentar o número de soldados que frequentavam a Ilha dos Marinheiros realizando o corte e transporte de madeira para a Vila do Rio Grande.22 Portanto, a Ilha dos Marinheiros teve um papel fundamental (fornecimento de madeira) para a permanência das tropas luso-brasileiras, que, a partir da Vila do Rio Grande, estabeleceram as estratégias militares para a manutenção do controle territorial frente à resistência espanhola e as tentativas de nova ocupação do atual Rio Grande do Sul no ano de 1777.
“La rareté du bois dont les particuliers ont besoin pour la cuisine, comme pour la reparation de leurs maisons, et que les paisans ne peuvent conduire ici, faute de boeufs et de charrettes, ma obligé a aumenter le nombre des soldats, qui en coupoient a isle des mariniers, pour que le menu peuple puisse etre fourni sans que le Roi y perde”. Carta de 29 de julho de 1776, BOEHM, op. cit., p. 130. 22
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DOMINGOS ALVES MONIZ BARRETO - 1778 O Capitão de Infantaria do Regimento de Estremoz Domingos Alves Branco Moniz Barreto (?-1831) deixou um pequeno trecho escrito sobre a Ilha dos Marinheiros em suas “Observações relativas à Agricultura, Comércio, e Navegação do Continente do Rio Grande de S. Pedro no Brasil”. “Dentro deste lagamar, acha-se uma grande ilha chamada do Marinheiro, muito fértil. Nela se encontram todos os auxílios necessários para se poder fazer naquele Continente uma bem regulada povoação. Os nacionais deste Continente são dóceis, amáveis, sinceros e muito vigorosos para o trabalho. O seu torrão desde a barra que fica duas léguas de distância até a povoação é de areia”.23
Figura 5 Biblioteca Nacional de Portugal.
BARRETO, Domingos Alves Branco Moniz. Observações relativas a Agricultura, Comercio, e Navegação do Continente do Rio Grande de S. Pedro no Brasil. Manuscrito, Lisboa, 1791. Acervo: 23
Biblioteca Nacional de Portugal.
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SEBASTIÃO BETTAMIO - 1780 O português nascido em Lisboa Sebastião Francisco Bettamio participou da Guerra da Restauração do Rio Grande do Sul (1774-1776) na Logística do Exército do Sul (como Secretário-Chefe da Junta da Fazenda do Continente do Rio Grande). Ele deixou o mais detalhado relato setecentista, datado de 1780, dos desafios de retomada do desenvolvimento da Vila do Rio Grande após a expulsão dos espanhóis.24 A Ilha dos Marinheiros não escapou de suas observações pela necessidade de retirada da madeira. Bettamio traz a informação sobre a relativa devastação realizada pelos espanhóis da cobertura vegetal, faz referência à água de qualidade e também da necessidade do povoamento de todo o entorno da Vila do Rio Grande, incluindo, a Ilha. “Defronte da vila em distância por mar de menos de uma légua, está uma ilha chamada dos Marinheiros, na qual tem sesmarias e datas de terras alguns particulares, e como dali vem a lenhas para a vila pelas não haver mais próximas, foram isentas da sesmaria e datas, assim as lenhas como os capins que servem para cobertas de casas, a fim de que tanto a Fazenda Real como os moradores da vila se pudessem livremente utilizar das ditas lenhas e capins. Os cortes de lenhas e madeiras tem sido tão extraordinários, e tão sem regra, de tempo a esta parte, que já é necessário entrar muito no interior da ilha, e com dificuldade para trazer a lenha, que virá a acabar-se com detrimento grave dos moradores da vila, se não der alguma providência, a qual me parece fácil Ver TORRES, Luiz Henrique. Sebastião Bettamio e a construção da civilização luso-brasileira no extremo sul do Brasil. Lisboa: CLEPUL/Biblioteca Rio-Grandense, Coleção Documentos, 9, 24
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obrigando ou acautelando que nas cervas dos quintais e nos pântanos da vila há, que se não semeiam por serem alagadiços, se plantem matos, ou árvores destinadas somente às lenhas, porque não só haverá abundância de lenhas, mas até cada um a terá em sua casa para seu gasto, não sendo também má a lenha do pessegueiro, que bom será plantem muitos, porque crescem na vila com grande facilidade. Em qualquer parte a Vila onde se pretenda fazer poços ou cacimbas, como lá lhe chamam, se acha água em pequena altura, e em muitas partes capaz de beber; suposto que nem todos usam dela, porque a mandam buscar à dos Marinheiros em que já se falou, onde há um rio corrente de excelente água, mas não deixa de ser incomodo o ir-se buscar esta água tão longe, sendo necessário embarcações, etc. Desde a Vila de S. Pedro, saindo pelo sítio do Arroio e depois encostando se a parte da Lagoa dos Patos pelas povoações que por ali há até o Rincão da Barra Falsa, compreendendo as Ilhas dos Marinheiros, de Marçal de Lima e de Tororotama, continuando pelas margens do Sangradouro de Mirim até sair às Guardas de Taim e Albardão; voltando pelo caminho da praia até à Barra do Sul, e recolhendo-se pela Mangueira para a Vila, em que medeia uma grande porção de léguas, há muitos terrenos devolutos em que se podem acomodar bastantes casas de lavradores, se lhes repartirem as terras como o costume a estes casais e me parece se deveria estabelecer, declarar e ordenar: 1° Que enquanto no circuito declarado houver terrenos devolutos se não hão de repartir, nem acomodar casais em outra parte; 2° A cada casal se deve repartir somente a terra que é estilo para as suas plantas, deixando entre um tanto numeroso de casais uma porção de campo baldio para logradouro e pastos dos seus cavalos, bois e vacas mansas e leiteiras; 3° Acabados que sejam de repartir os terrenos devolutos ou sem dono, me parece se deviam entrar a repartir e acomodar os casais nas estâncias que tem donos repartindo-lhes a cada casal a mesma quantidade de terreno que é estilo; Aos donos das estâncias se poderá deixar a
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cada um o dobro do terreno que se dá aos casais e isto se vir que as suas lavouras são dignas desta graça. O que também se poderá fazer a outro qualquer casal, se as suas forças de lavoura assim o pedirem. Tudo o que deixo exposto se encaminha a três fins: o 1° é unir os moradores e povoar a Vila e seus subúrbios para a fazer abundante de gente trabalhadora e por consequência farta e rica; o 2° é para que na Vila e seus subúrbios não fique terreno inculto; 3° é para que não haja de dentro dos sítios que declaro, criações de gados a que chamam estâncias, que ocupam um considerável terreno de seis e mais léguas, que podia ser aproveitado em lavoura e se pode considerar perdido; porque servindo bem para plantas, dá mal pasto e por esta causa necessita ocupar maior extensão; o estando dividido em datas a casais, que cada um tenha os seus bois e vacas mansas, talvez que se depois se fizer a conta ao total de gado que todos possuem, que se ache maior número do que tinha antes a estância, estando demais cultivado o terreno, que era inculto e sustentando um número suficiente de pessoas”.25
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BETTAMIO, Sebastião Francisco. Notícia Particular do Continente do Rio Grande do Sul.
Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro . Rio de Janeiro: IHGB, v. 21, 1858.
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DOMINGOS JOSÉ MARQUES FERNANDES - 1804 O Sargento-mor português Domingos José Marques Fernandes, permaneceu no Rio Grande do Sul entre 1798 e 1804, neste período fez muitas observações dos lugares onde passou. Ele faz referência à Ilha dos Marinheiros quando escreveu a Descrição Corográfica, Política, Civil e Militar da Capitania do Rio Grande de São Pedro, datada de 10 de setembro de 1804. “Não admira que em lagos de vinte até quarenta léguas de comprimento haja ilhas; mas é para notar que não se vejam nas lagoas de que temos falado, e se achem nas correntes do Rio Grande, e de outros, como vamos indicar. Logo três léguas acima da barra do Rio Grande se encontra a primeira das ilhas mencionadas, e se chama dos Marinheiros; tem cinco léguas de comprimento, e tem quatro até meia légua de largura: esta ilha é plana, e por tanto muito úmida e inabitável; serve de criar lenha para consumo das povoações vizinhas, como são a Vila de S. Pedro e o lugar de S. José do Norte e outros: e ainda mesmo para as embarcações que ali entram. Tem preciosos olhos d’água doce, que é preferida pelos povos à de terra firme; e principalmente pela gente náutica para embarque. É a mesma ilha um admirável viveiro de papagaios, que ela cria diferentes dos de fora dela, tanto em figura, como em serem mais dóceis e galantes que os outros. Além desta ilha se seguem várias outras até Porto Alegre; mas não há que dizer de alguma delas”.26
FERNANDES, Domingos José Marques. Descrição Corográfica, Política, Civil e Militar da Capitania do Rio Grande de São Pedro do Sul, 1804. Pesquisas: História. Porto Alegre: Instituto Anchietano de Pesquisas, a. 5, n. 15, 1961. 26
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Figura 6 Capa da Revista Pesquisas com o texto de Fernandes.
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JOHN LUCOOCK - 1809 A Ilha dos Marinheiros chamou ligeiramente a atenção do comerciante inglês John Luccock (1770-1826) que esteve em Rio Grande em 1809 e considerou que a proximidade do Oceano e a existência do espaço portuário garantiam uma “preeminência permanente” a Rio Grande enquanto “maior mercado do Brasil Meridional”. Luccock fez referência a Ilha dos Marinheiros como sendo uma pequena enseada onde se encontravam “alguns dos terrenos mais altos e dos sítios melhor cultivados de toda a vizinhança”, sendo célebre pela sua produção de cebolas e de suas reservas de água potável que basicamente abastecem Rio Grande. 27 Conforme Luccock, “um pouco mais acima fica outra pequenina enseada, navegável para iates até cinquenta toneladas, dentro da qual se acha a fértil Ilha dos Marinheiros, onde se encontravam alguns terrenos mais altos e dos sítios melhor cultivados de toda a vizinhança. O solo é constituído de argila vermelha, prova de que a ilha já esteve outrora ligada ao continente e que é de formação mais antiga que a baía. Ela é célebre pela sua produção de cebolas e de um outro artigo de maior valor ainda: é dali (...) que provém quase todo o abastecimento de água potável disponível na cidade”.
LUCCOCK, John. Notas sobre o Rio de Janeiro e partes Meridionais do Brasil . Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Editora da USP, 1975, p. 115. 27
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AUGUSTE SAINT HILAIRE - 1820 Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853) não visitou a Ilha dos Marinheiros, mas, escutou conversas sobre a sua importância para o abastecimento de lenha e água na Vila do Rio Grande. “Conforme relatei, a cidade do Rio Grande está situada à margem de uma lagoa sobre a faixa de terra a que me acabo de referir, à entrada de uma espécie de enseada ou canal compreendido entre essa península e uma ilha, chama da ilha dos Marinheiros. Entretanto, não é esta que se vê em frente da cidade, mas, sim, uma outra muito menor, denominada ilha dos Cavalos, muito rasa e alagadiça. Aqui não existem outras plantas a não ser uma mirsinácea de quatro a cinco pés de altura. Apenas se encontram, aí, algumas gramíneas e o funcho-marinho, nº 1.829, e além dessas espécies, apenas me recordo de ter visto o cravo-de-paris, da espécie recolhida em Cabo Frio, uma belífera, a tetragonia nº 1.853 e o Polygonum nº 1.855, cuja haste é lenhosa, aliás, e notável por sua semelhança com o Polygonum aviculare. A Ilha dos Marinheiros, todos concordam que tem ela duas léguas e meia de comprimento. E em grande parte, coberta de mato e é lá que se vai buscar a lenha necessária para os hospitais e quartéis. Encontra-se aí uma excelente fonte de água potável, cuja qualidade pude bem apreciar, à mesa do Major Matheus.”28
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SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem ao Rio Grande do Sul. Brasília: Senado Federal (Coleção O
Brasil visto por Estrangeiros), 2002, p. 94-95.
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Figura 7 Cartão comemorativo com selo postal em homenagem a Saint-Hilaire em 1953.
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O OBSERVADOR – QUILOMBO DO NEGRO LUCAS, 1833
Na Ilha dos Marinheiros se formou o Quilombo do Negro Lucas que abrigou escravos fugidos por cerca de dez anos (1823-1833). Conforme o jornal O Observador do dia 9 de janeiro de 1833, o líder do grupo chamava-se Lucas que ocupava uma casa no meio da mata que existia na Ilha: “armado de espingarda, espada e faca, saía de vez em quando a passear pela Ilha, ameaçando os moradores brancos, a quem se tornava ainda mais terrível pela grande proteção que tinha dos pretos e pardos forros, que ali residiam...”. Acusado de ter matado o filho de um delegado, negro Lucas foi morto numa emboscada feita por quatro guardas e um delegado. A classe senhorial da Vila do Rio Grande respirou aliviada! No dia 9 de janeiro de 1833 noticiava a morte de um escravo que comandava um quilombo na Ilha dos Marinheiros. Era o negro Lucas que “há
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mais de dez anos se achava fugido, e embrenhado no mato da Ilha dos Marinheiros” que “junto com muitos outros escravos fugidos, que ali se costumam acoutar desde largo tempo”. Lucas era acusado de sete homicídios e a Guarda Nacional do Rio Grande preparou uma armadilha quando visitava “um preto escravo”: “no mesmo instante o negro recuou, pôs o joelho em terra, e com a maior rapidez disparou a espingarda para dentro da casa, de cujo tiro pouco faltou que matasse um dos Guardas Nacionais, avançando depois sobre eles de espada, e ao mesmo tempo os outros dois de lança: os Guardas Nacionais vendose em iminente perigo, um deles disparou sobre eles um tiro, do qual caiu morto Lucas, pondo-se ou outros dois em apressada fuga”. No acampamento do negro Lucas os guardas encontraram “uma grande casa, com vários repartimentos, alguns couros de vaca (...) muita carne, graxa, sebo, panelas de ferro, chocolateiras, garrafas, frascos, garrafões, uma lança, grande porção de lenha cortada, e amarrada, e muitas provisões; tendo-se dali evadido cinco pretos, e quatro pretas, que estavam debaixo das ordens do tal Lucas...”.
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O NOTICIADOR - 21 DE JUNHO DE 1834
O jornal O Noticiador, no ano de 1834, denuncia que “meia dúzia de ambiciosos” sem apossaram dos matos da Ilha dos Marinheiros e estavam manipulando o preço da lenha prejudicando os moradores da Vila do Rio Grande. A matéria foi reproduzida digitalmente a seguir.
Figura 8 O Noticiador, 21-06-1834. Acervo: Biblioteca Rio-Grandense.
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O NOTICIADOR – 06 de OUTUBRO de 1834
A matéria do dia 6 de outubro de 1834 faz referência a que um suplente da Junta de Paz seria um dos “donatários” que estavam partilhando os matos da Ilha dos Marinheiros para explorar a madeira.
Figura 9 O Noticiador, 06-10-1834. Acervo: Biblioteca Rio-Grandense.
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NICOLAU DREYS – 1839
O militar e comerciante francês Nicolau Dreys (1781-1843) chegou ao Brasil em 1817 e foi atuar no comércio do Rio de Janeiro. No mesmo ano mudouse para Porto Alegre onde permaneceu até 1825. Em 25 de setembro deste ano seguiu para Rio Grande onde permaneceu atuando no comércio até 1827. Durante a Revolução Farroupilha ele lançou no Rio de Janeiro a Notícia Descritiva29, no ano de 1839. Dreys descreve o meio geográfico, os espaços urbanos, a economia, o perfil populacional, o caráter e os costumes dos habitantes etc. Edição utilizada: DREYS, Nicolau. Notícia Descritiva da Província do Rio Grande de São Pedro do Sul (1839). Porto Alegre: Nova Dimensão/EDIPUCRS, 1990. 29
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Sua permanência em Rio Grande por dois anos possibilitou um conhecimento presencial de muitos cenários ou a busca de oralidades que estão refletidas em comentários feitos ao longo do texto. A Ilha dos Marinheiros é destacada em relação à cobertura vegetal, fornecimento de água e de lenha para Rio Grande. Estas informações remetem a este período de 1825-1827 quando a ocupação da Ilha era rarefeita. Descrevendo as características geográficas daquela que chamava de cidade de S. Pedro, no que tange a limites e relevo, Dreys apontava a importância das ilhas (dos Marinheiros e Torotama) para o abastecimento da localidade, quais, mesmo não estando totalmente isentas de areia, eram ao menos cobertas de matas e de verdura assaz suculenta para dar pastagem ao gado leiteiro. Destacava ainda que os matos da Ilha dos Marinheiros não eram de pouca importância, pois forneciam quase exclusivamente a lenha que se consome na cidade. Segundo sua descrição, havia ainda na ilha uma fonte natural de água límpida, eu a classe abastada preferia à água das cacimbas30 e que mandava buscar diariamente para seu consumo, apesar da distância; bem como existiam algumas chácaras produzindo com abundância todas as hortaliças e legumes. Lamentava, porém, que as ilhas não tivessem quase população alguma, além Apesar dessa preferência da “classe abastada”, Dreys destacava a qualidade da água com a qual Rio Grande era abastecida: “A água potável que se acha no território da cidade de S. Pedro é a água de cacimba; chamam cacimba a um posso praticado nas areias cujas paredes são amparadas pro duas ou três pipas, sem fundos, superpostas umas às outras, onde a água aparece sempre a tão pouca profundidade que os aguadeiros costumam extraí-la por meio de um coco embutido na ponta de um pau. A água da cacimba é talvez uma das mais puras que se pode beber no globo, e sua qualidade incorruptível é bem conhecida dos marinheiros, que a procuram com preferência. É certo que nos primeiros dias a água de cacimba deixa alguma coisa que desejar ao hidrópota, mas também preciso é dizer, conforme a nossa própria experiência, que não há nada mais fácil do que o acostumar-se com ela, e, depois, de acostumado, é então a água mais doce das fontes correntes que obriga o órgão do gosto a uma educação”. DREYS. p. 79-80. 30
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dos escravos empregados na manutenção das quintas e de poucos pescadores, cujas famílias se ocupavam ao mesmo tempo da criação de algum gado. Dreys contradizia muitos dos autores que apontaram como um problema do Rio Grande o abastecimento de alimentos, destacando, no que tange a esse assunto, a abundância da vila. De acordo com ele, não havia quase casa alguma que não tivesse seu quintal, considerando esse fato como um tipo de fertilidade, onde eram produzidas frutas e hortaliças com tão exata periodicidade que praticamente inutilizava os suprimentos diários que recebia a vila da horticultura vizinha.31 Ele deixou os seguintes apontamentos sobre a Ilha dos Marinheiros: “(...) a região das areias parece limitar-se, ao território em que batem as vagas do Oceano; já no interior do Rio Grande, isto é, na espécie de baía aberta ao Noroeste, defronte da cidade de São Pedro, a natureza muda de figura: existem aí várias ilhas, e algumas delas bastantemente extensas, tais como a Ilha dos Marinheiros e a de Torotama; as quais se não estão totalmente isentas de areia, estão ao menos cobertas de matas e de verduras assaz suculenta para dar pastagem ao gado lactífero: dizem mesmo que a planície em que está edificada a cidade do Rio Grande foi a princípio agradável, rica de vegetação, coberta de árvores; mas que, no tempo da última invasão dos Espanhóis, chegaram estes acompanhados de tantos animais, e tanto tempo os conservaram no território para o serviço da tropa, que na retirada dela a vegetação circunvizinha se achou completamente arruinada. É depois daquela grande dilapidação que as areias arrebatadas pelos ventos, não achando mais obstáculos, progrediram em suas constantes irrupções, até chegarem ao centro da cidade, e sepultarem uma parte dela. 31
DREYS, p. 79.
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Os matos da Ilha dos Marinheiros não são de tão pouca importância, pois que fornecem quase exclusivamente a lenha que se consome na cidade do Rio Grande, e isto desde longos anos, sem diminuição sensível: existe também nesta ilha uma fonte natural de água límpida, que a classe abastada da mesma cidade prefere a água das cacimbas, e que manda buscar diariamente para seu consumo, apesar da distância; algumas chácaras, que lá estabeleceram os moradores da cidade, produzem com abundância todas as hortaliças e legumes que lhes pedem: causa certa pena ver um deserto no meio das liberalidades da natureza: a Ilha dos Marinheiros, como a Ilha de Torotama, não tem quase população alguma, além dos escravos empregados na manutenção das quintas, e de poucos pescadores, cujas famílias se ocupam ao mesmo tempo da criação de algum gado. Entre a Ilha dos Marinheiros e a cidade veem-se outras ilhas mais pequenas, inteiramente despovoadas, por não se acharem com aquelas proporções que procuram os homens para os seus lares; quase todas essas ilhas intermediárias estão cobertas de pântanos, e são inacessíveis na maior parte de sua circunferência, por se levantarem no meio de um baixio, em que não se pode nem navegar nem caminhar; todavia, somos levados a crer que a ilha (Ilha da Pólvora) mais próxima da costa da cidade já teve outrora alguma população permanente, ainda que não fosse senão de militares; pois nesse lugar achamos uma peça de artilharia enterrada na lama, e totalmente escondida debaixo de espessos tufos de plantas marinhas; quem sabe se não houve nessa ilha, em tempos já esquecido alguma bateria própria a impedir os aproches do porto?”.32
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DREYS, p. 47-48.
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THOMAS MESSITER E A UVA ISABEL - 1839 O comerciante inglês Thomas Messiter tem um destaque na viticultura brasileira. Ele foi o primeiro cultivador da uva americana Isabel, projetando a Ilha dos Marinheiros, como o berço deste cultivo. Rinaldo Dal Pizzol e Sérgio Inglez de Souza explicitam como ocorreu este processo: “A Isabel foi a primeira uva produtora americana introduzida na Europa, África e Ásia, inicialmente como planta curiosa recomendada aos colecionadores amadores e, mais tarde, como uma videira resistente ao oídio, foi planta em Nice (França) e na Argélia. Nesta sequência de acontecimentos internacionais, a notícia chegou aos ouvidos de empreendedores brasileiros e, especialmente no Rio Grande do Sul, a introdução de castas americanas veio a se dar por volta de 1839-1842. O cidadão gaúcho Marques Lisboa, estando nos Estados Unidos, recebeu o impacto do surgimento de grandes vinhedos de variedades americanas no País e da intensa importação de mudas pelos cultivadores europeus, criando uma verdadeira febre internacional. Assim, Marques Lisboa foi o precursor da uva Isabel no Rio Grande do Sul, quando remeteu de Washington, em 1839, bacelos dessa variedade ao comerciante Thomas Messiter. Também forneceu ao amigo informações sobre a impressionante robustez e produtividade da uva que lhe indicavam para ocupar destacado papel no comércio gaúcho. Thomas Messiter formou os primeiros vinhedos na Ilha dos Marinheiros, ficando com o mérito de iniciador do cultivo dessa casta no território gaúcho. Segundo o relatório da Intendência, assinado pelo Dr. José Barbosa Gonçalves, o comerciante Thomas Messiter, diante das informações
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impressionantes acerca das qualidades da Isabel, procurou cercar seu vinhedo de todo mistério possível, na tentativa de valorizar comerciante a nova uva e desfrutar da exclusividade de sua produção e comercialização. Chegava ao final o período em que se tentou introduzir a viticultura de viníferas europeias de origem portuguesa que começara logo após a descoberta do Brasil, a partir do momento em que desembarcaram as variedades americanas, principalmente nos arredores de São Paulo e na Ilha dos Marinheiros, próxima de Rio Grande. Não obstante seus cuidados extremos, mudas de Isabel foram sendo subtraídas da Ilha dos Marinheiros, seguramente por viajantes, navegadores e agricultores da região, e seu plantio foi difundido de povoação em povoação, vinhedo a vinhedo, assim se tornando a rústica variedade americana a rainha dos vinhedos das regiões circunvizinhas, substituindo rapidamente as variedades viníferas que até então existiam, remanescentes de tentativas açorianas anteriores. Antigos pomares de Ferral, Bastardo, Alvarelhão, Dedo de Dama, Malvasia e Moscatel sucumbiram ante a força da Isabel (...) É de notar que a uva Isabel prosperou exuberantemente na Ilha dos Marinheiros, conforme apontam as notícias de embarque, em 1873, de vinho de Isabel elaborado ali, pelo porto de Rio Grande, destinado aos portos de Santos e Rio de Janeiro”. 33
PIZZOL, Rinaldo Dal & SOUZA, Sérgio Inglez. Memórias do Vinho Gaúcho. Porto Alegre: AGE, 2014, vol. I, p. 49-50. 33
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D. PEDRO II – 1845 O Imperador D. Pedro II, realizou uma visita ao Rio Grande do Sul. A viagem se deu no contexto do final da Revolução Farroupilha (1835-1845) cuja paz foi assinada em março de 1845. No contexto diplomático deste reatamento entre os Rio-grandenses e o Império Brasileiro a visita de D. Pedro II teve o objetivo de “verificar” a receptividade e a fidelidade da Província que era essencial para o Brasil frente ao tumultuado cenário platino. Os 20 anos seguintes comprovaram que as preocupações eram procedentes, com conflitos no Uruguai, Argentina e Paraguai. Em sua estada em Rio Grande, D. Pedro II expressou a vontade de conhecer a Ilha dos Marinheiros, o que ocorreu no dia 18 de novembro de 1845. Várias pessoas da elite social da época possuíam casa de veraneio na Ilha. O convite deve ter partido de membros deste segmento. D. Pedro II e a Imperatriz Teresa Cristina desembarcaram no Porto do Rei e foram recepcionados na casa de veraneio do vereador João Miranda Ribeiro. Com a comitiva que acompanhava o Imperador estava o Presidente da Província, Luiz Alves de Lima e Silva, futuro Duque de Caxias; o Ministro do Império, Visconde de Albuquerque; o Chefe-de-esquadra, o inglês John Pascoe Greenfell e demais integrantes. A comitiva percorreu a cavalo às chácaras mais próximas, jantaram cedo da tarde e retornaram às 18 horas para Rio Grande.34
AZEVEDO, Anna Lúcia Dias Morrison. A Ilha dos Três Antônios. Águeda, Portugal: Editora Jornal Soberania do Povo, 2003, pp. 43-44. 34
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Figura 10 Fotografia com a placa existente na Ilha com referĂŞncia a visita de D. Pedro II.
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DIÁRIO DO RIO GRANDE - 19 DE OUTUBRO DE 1853 Esta publicação do jornal Diário do Rio Grande, discute a construção de uma ponte ligando a Ilha dos Marinheiros com a sede da Vila do Rio Grande. “Uma ponte à Ilha dos Marinheiros! Das melhores nomenclaturas da Câmara Municipal em prol da nossa cidade, sem dúvida é esta senão a primeira, a segunda. Cônscio no que lemos nos artigos do O Rio-grandense de 15 a 16 a esse respeito, cabe aqui exprimirmos o quanto nos achamos penhorados por tão acertado e bem ponderado desfecho do Exmo. Sr. Presidente da Província, assim como pela feliz e honrosa lembrança de nossa Câmara Municipal, a qual nos permitirá que lhe dedique por tributo, glória e homenagem em nome de seus munícipes. Em qualificável e livre da menor questão, é as melhorias que experimentará esta cidade e a Ilha dos Marinheiros, com a construção de uma ponte que as ligue. O Rio Grande e a Ilha ganharão com essa obra cofres de ouro, essa obra virá despertar o ‘lethurgo’ dos pobres e desconsolados lavradores daquele lugar, abrilhantará suas terras abandonadas. A influência e desejo de possuir uma chácara ou mesmo uma casa na Ilha dos Marinheiros será tal, que uma braça de sua fértil campina bastará para fazer uma boa herança! A importante empresa que acaba de dar começo a Câmara Municipal pede coadjuvação, e é de supor que nossa população com afã se preste para a pronta conclusão desse pendão de glória. O estudo atual do Rio Grande, a digníssima corporação municipal e os distintos cidadãos da comissão mostrarão que o projeto não ficará em ‘planta de orçamento’. Vede, ilustrados habitantes, que esta cidade com tal obra ganhará excelência, levando em mira que com isso muito ganhareis. Temos demonstrado, segundo nossa pouca inteligência, o
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quanto se tem desenvolvido esta bela cidade no curto espaço de 10 anos! O que viemos de narrar ninguém animar-se-á desdizer-nos. O Rio Grande de 1843 a esta parte é que tem concebido as melhores apontadas. O vasto... Portanto, assim como nós, este povo conta com a dita de ver a ponte a Ilha dos Marinheiros dentro em poucos meses finalizada. Pensai, e vede a quem devemos essas melhorias. Pensai, e vereis que os conspícuos sustentáculos desta terra são os mesmos que se acham à testa dessa ponte desejada, dessa obra que nos mostrará em breve uma outra Califórnia”. A.E. “Comunicado. O Passado e o Presente – O Rio Grande”. Diário do Rio Grande, 19 de outubro de 1853.
Figura 11 Esta linha no lado esquerdo é o aterramento e as duas pontes que concretizaram a travessia terrestre entre a Ilha de Leonídio e a Ilha dos Marinheiros.
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DIÁRIO DO RIO GRANDE - 9 DE JULHO DE 1859 Depois de vários anos de pressão e de expectativa, a discussão sobre a efetivação da construção de uma ponte ligando o centro urbano com a Ilha dos Marinheiros persiste, como se constata nesta matéria do jornal Diário do Rio Grande de 9 de julho de 1859. “A Ponte a Ilha dos Marinheiros. Há bem pouco tempo, houve uma quadra que não faltava mais do que no projeto para a construção de uma ponte a Ilha dos Marinheiros. A câmara municipal desta cidade em sessão de 11 de janeiro do corrente ano resolveu definitivamente a construção dessa ponte tão justamente reclamada e que ia ligar a formosa Ilha com nossa cidade. Foi logo deliberado que a obra seria feita sob as vistas da municipalidade, e por tanto tivemos a esperança de ver realizada essa via de comunicação que nos ia proporcionar o fácil transito a esse jardim, que jaz no meio de nossa bahia, banhado pelas suas quietas ondas. A obra foi então orçada em cento e cinquenta contos de réis, cuja soma seria dividida em três mil ações de cinquenta mil réis cada uma, quantia bastante pequena para que todos pudessem possuir uma parte na útil e necessária obra que se premeditava construir. A municipalidade na mesma data nomeou uma comissão encarregada de agenciar acionsita e se não estamos enganados cremos que a afluência foi grande, e em breve ficariam esgotadas. E tudo isso, parecia incrível foi passageiro, tudo ficou em projeto e hoje em dia para nada é lembrado a ponte a Ilha dos Marinheiros. Se conta com os elementos, há desejo de fazê-la, a obra acha que queria ajudá-la que falta pois? Principiá-la! Avante pois, e as benções de um povo inteiro cairão sobre as cabeças dos iniciadores e executores de tão útil quão bela ideia.
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A realização desse projeto operaria um câmbio vantajoso; na Ilha dos Marinheiros pois não tão somente facilitaria a vida de comunicação que até agora é entorpecida por qualquer refega de vento, leve movimento das ondas, ou baixa da maré; senão que os prédios existentes ali tomariam um valor tríplice do atual. A providência divina que tudo coordena com uma sabedoria e previsão infinita, ao colocar a Ilha dos Marinheiros no centro de nossa bahia, cheia de fertilidade e sempre verdejante, parece haver destinado a que ela fosse a notrisa de nossa cidade, fornecendo-a com os legumes e hortaliças necessárias para o alimento da mór parte do Rio Grande. E graças a ela, estes ingredientes nunca se vendem a alto preço. Em segundo lugar, a cidade do Rio Grande, que já por sua posição topográfica, ou já seja pela qualidade de seu terreno acha-se acéfala de lugares próprios para passeios com o fácil transporte e livre comunicação a ilha, nos dias festivos e domingos os habitantes do Rio Grande, iriam procurar no meio daqueles jardins a sombra das frondosas árvores e sobre o verdejante tapete de relva, algumas horas de recreio e passatempo. A colocação da Ilha dos Marinheiros, a pequena ilha donde acha-se construindo a nova casa da pólvora, e a ponte donde acha-se a nova casa da Misericórdia; tudo oferece facilidade para a realização de tão útil e necessário projeto. Sendo pois como está mais que provado, que esta empresa não somente facilita e quebra as traves da comunicação a Ilha senão que oferece grandes vantagens e lucros, a ela não devem trepidar a dar princípio, que cremos que todos os proprietários da Ilha dos Marinheiros se alistarão pressurosos na lista de acionistas. Não duvidamos também que por sua parte o governo provincial propenderá em sua cooperação, para a realização de tão útil empresa acordando a proteção devida em atenção aos bons resultados que ela pode oferecer a cidade do Rio Grande”.
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UMA PONTE PARA A ILHA – RELATÓRIOS DA CÂMARA MUNICIPAL Uma fonte fundamental para a compreensão do desenvolvimento histórico de uma comunidade são os relatórios da Câmara Municipal que começaram a ser publicados no Rio Grande do Sul no ano de 1845. Anualmente, o presidente da Câmara deveria elaborar uma síntese das principais discussões e decisões ocorridas naquele exercício. Nestes relatórios da Câmara Municipal do Rio Grande na década de 1850 uma das discussões envolvendo a Ilha dos Marinheiros é a da construção de uma ponte. Alguns tópicos destas discussões são narrados a seguir. No Relatório de 1853 da Câmara Municipal do Rio Grande a Assembleia Provincial, foi ressaltada a importância da Ilha dos Marinheiros como sendo “o lugar que abastece a cidade de lenhas, hortaliças etc, é também a melhor distração e recreio que a natureza legou, nos subúrbios de uma cidade como a do Rio Grande que tendo tanto de importante, como praça comercial, quanto de pouco aprazível, ressente-se aos olhos de todos de uma necessidade palpitante: uma ponte que facilite e desenvolva a comunicação da cidade com a ilha, a comunicação tantas vezes interrompida pelos temporais que obstam, por espaço de dias, a navegação, único veículo de que na atualidade dispõem; ao passo que seria dotar a mesma cidade de uma beleza que a nela, contribuiria para o aumento e prosperidade rápida de uma povoação nascente (a mesma Ilha) que já uma vez ocupou a atenção da Assembleia legislativa provincial. A construção desta ponte não apresenta dificuldades insuperáveis: se a Câmara for autorizada por uma lei, a organizar uma companhia empresaria, debaixo da inspeção da primeira autoridade da província, se por lei se conceder a companhia uma vez organizada, o privilégio por 20 anos, e o imposto de barreira, regulado pela
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presidência da Província; se oferecerem estas vantagens, a Câmara crê, que com muita facilidade levará a efeito este tão útil quanto importante melhoramento, sem o menor auxílio dos cofres provinciais”. A Província autoriza em agosto de 1853 os estudos para construção de uma ponte e a Câmara nomeia uma comissão constituída por Porfírio Ferreira Nunes, Antônio Teixeira de Magalhães e Domingos Vieira de Castro para escolha do local mais apropriado. No relatório de 30 de agosto de 1854 repete-se o discurso: “conhece-se perfeitamente a importância desse lugar e existindo nela já um crescido número de habitantes (estando alguns habilitados para os cargos públicos) a Câmara julga também que se fazia um serviço importante a Ilha dos Marinheiros sendo ela elevada a categoria de distrito pois assim melhor seria administrado a justiça de que tanto carece essa povoação.” Porém o relatório de 1858 reconhece que “há tempos se propôs o estabelecimento de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros e por falta de meios e de autorização não se tem podido levar isso a efeito”. A Câmara pede ao governo provincial que a “autorize a contratar a sua construção com qualquer companhia nacional ou estrangeira, concedendo-se-lhe o competente privilégio e o imposto de barreira que for regulado.” No ano seguinte, a Câmara considera de reconhecimento público a construção de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros, sendo levantada uma planta e nomeada, em sessão de 11 de janeiro de 1859, uma comissão encarregada de promover a assinatura das ações “afim de depois, solicitar a precisa aprovação, mas, até esta data, nenhuma conta deu a mesma comissão de seus trabalhos”. Em 1861 a situação parecia avançar no sentido de concretizar o antigo projeto de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros, sendo encarregado o sr. capitão Nabor Delfim Pereira “formando para isso uma companhia sob certas condições. Sua proposta , planta e orçamento já a Câmara remeteu ao sr.
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presidente da Província. Sendo esta uma obra que deve contribuir muito para o desenvolvimento e progresso da Ilha dos Marinheiros já tão provada, e de bom ofício para esta cidade, a Câmara não toma por ocioso pedir a Assembleia Provincial que se sirva despender a esta empresa a proteção que for compatível com os interesses da Província.” Um desgaste com o assunto já se fazia sentir no relatório de 1862: “Por intermédio da Câmara, o capitão Nabor Delfim Pereira propôs à Assembleia Provincial, a incorporação de uma companhia para a construção de uma ponte, desta cidade para a Ilha dos Marinheiros. A Câmara informou convenientemente esta proposta acompanhada de competente planta e orçamento e S. Ex. respondeu para se comunicar, como se comunicou, ao pretendente que aguardava a chegada de um engenheiro hidráulico para examinar o projeto, e que brevemente daria conhecimento do seu resultado. Isto passou-se creio que em novembro de 1860, e de então a esta parte nada mais tem ocorrido a respeito”. Ao final de dez anos de insistência a Câmara novamente reiterou a solicitação à Assembleia Provincial para o apoio a uma empresa que construísse uma ponte. (Relatório de 20 de janeiro de 1863). Conforme este relatório, o projeto do capitão Nabor de uma ponte da cidade para a Ilha dos Marinheiros, “ainda se acha no mesmo estado que disse no meu relatório anterior”. Nos relatórios seguintes o assunto desapareceu de pauta. Constata-se que a construção da ponte também possuiu uma dimensão histórica no contexto da atuação e do silêncio do poder público.
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Figura 12 Ponte da Ilha dos Marinheiros. Acervo: https//www.riogrande.rs.gov.br
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MISSÃO CIENTÍFICA ESPANHOLA – 1862
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No mês de junho de 1862 foi nomeada uma Comissão de professores de Ciências Naturais para acompanhar uma esquadra naval espanhola para realização de pesquisas. As atividades científicas se estenderam entre 1862 e 1866. Estudos foram realizados sobre geologia, entomologia, peixes, moluscos, zoófitos, mamíferos, aves, répteis, botânica, antropologia e etnografia. Partiram de Cádiz em 10 de agosto de 1862 e no Brasil, visitaram a Bahia, Rio de Janeiro, Florianópolis e chegaram a Rio Grande em 24 de novembro, permanecendo até 4 de dezembro quando partiram para Montevideo. Don Manuel de Almagro publicou Breve descripción de los viajes hechos en
América por la Comisión Científica enviada por el gobierno de S.M.C. durante los años de 1862 a 1866.35 Um trecho se refere a estadia em Rio Grande e as
coletas realizadas na Ilha dos Marinheiros com a ajuda de Frederico de Albuquerque. “Diez y siete días estuvimos en la isla de Santa Catharina, y el 19 de noviembre nos embarcamos en el vapor Emperatriz, para ir a San Pedro de Río Grande do Zul, donde llegamos el 24 por la mañana; esta población es una de las principales de las de la provincia de Río Grande, cuya capital es Porto Alegre; está situada en la orilla S. del río, a 20 millas de su desembocadura en el mar. Ya en esa latitud desaparece la cordillera de los Órganos, y con ella los hermosos paisajes que se percibían desde el mar. Desde el S. de Santa Catharina, el aspecto de la costa es árido, arenoso, bajo y monótono. El Río Grande, poco al O. de San Pedro, nace del inmenso lago de los Patos; esta última ciudad tiene más de doce http://www.cervantesvirtual.com/obra-visor/breve-descripcion-de-los-viajes-hechos-enamerica-por-la-comision-cientifica-enviada-por-el-gobierno-de-sm-durante-los-anos-1862-a1866-acompanada-de-dos-mapas-y-de-la-enumeracion-de-las-colecciones-que-forman-laexposicion-publica/html/c2885b34-2277-4535-a43c-70226e24ed3a_7.html 35
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mil habitantes; su exportación consiste en carnes saladas y cueros; está rodeada de arenales, que con frecuencia movidos por el viento, cubren casi la mitad de la altura de las casas. Gracias a la buena amistad del distinguido naturalista D. Federico Alburquerque, natural de la misma ciudad, pudimos hacer diversas excursiones en provecho de nuestras coleciones (...) La goleta de S. M., Virgen de Covadonga, vino desde Montevideo a buscarnos, y nos embarcamos en ella el 4 de diciembre; abandonando por entonces los dominios del emperador Pedro II”. Nesta publicação é feita uma relação das coletas realizadas entre o Oceano Atlântico e o Oceano Pacífico. Em relação a Rio Grande, é feita a seguinte descrição: bivalvas marinas (recolhidas por Paz y Martínez, 4 espécies, 29 exemplares); univalvas fluviátiles (recolhidas por Paz y Martínez, 2 espécies, 16 exemplares); crustáceos (recolhidas por Martínez, 2 espécies, 53 exemplares); peixes (recolhidas por Martínez, 8 espécies, 8 exemplares). Nesta publicação, não foram descritas as espécies. Várias coletas devem ter sido realizadas na Ilha dos Marinheiros.
Figura 13 Rio Grande observada a partir do Porto do Rey (Ilha dos Marinheiros). Acervo: Autor.
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CONDE D’EU E O VINHO DA ILHA - 1865 Em sua passagem por Rio Grande o nobre francês Conde D’Eu (1842-1912), chegou a cidade no dia 5 de agosto de 1865. O esposo da princesa Isabel ficou hospedado na casa do comerciante Eufrásio Lopes de Araújo e de sua esposa Euphrasia. Nesta residência ele provou o vinho da Ilha dos Marinheiros. “Ao almoço a senhora Euphrasia deu-me para provar "vinho da terra”, vinho brasileiro, que eu ainda não vira, pois a província do Rio Grande do Sul é a única que por enquanto o produz. Este é feito na própria cidade do Rio Grande com uvas que se colhem numa ilha próxima (creio lembrar-me que a Ilha dos Marinheiros). É de cor vermelho-clara e tem um sabor que não é propriamente desagradável, mas que é acre e se não parece com o de nenhum vinho europeu. A razão disto é que o vinho procede de cepas dos Estados Unidos, cujas uvas tem igualmente este sabor especial. As cepas europeias crescem e dão mesmo uvas nesta província e em outras; mas parece que não se tentou tirar delas vinho. Quanto a mim, sem querer dizer mal da vinha americana, prefiro francamente o vinho e as uvas europeias!”36
D’EU, Conde. Viagem Militar ao Rio Grande do Sul. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1936, p. 31-32. 36
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Figura 14 Conde D'Eu e a Princesa Isabel.
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THE ILLUSTRATED LONDON NEWS - 30 DE NOVEMBRO DE 1867
Figura 15 The Illustrated London News, 30 de novembro de 1867.
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Raríssima imagem da cidade do Rio Grande - vista ao fundo - separada pelas águas da Lagoa dos Patos. O texto em inglês faz referência a Rua da Boa Vista (Riachuelo) que está envolvida por uma floresta de mastros dos navios (como escreveu Conde D'Eu). A Ilha dos Marinheiros é representada envolta em vegetação numa contraposição entre natureza e civilização. Num primeiro olhar, não acreditei que poderia ser uma vista da Ilha e do Rio Grande, afinal, a iconografia foi publicada no The Illustrated London News de 30 de novembro de 1867 (página 21 e autoria de David Powel). Este jornal ilustrado tinha publicado uma imagem das atividades no cais da Cais da Boa Vista (Porto Velho) no ano de 1865. Desconhecia outra imagem que pode ter sido feita naquela ocasião e publicada dois anos depois (hipótese de trabalho). A matéria faz referência a visita do Imperador D. Pedro II a Rio Grande no contexto da Guerra do Paraguai e continua chamando a Rua Riachuelo (que recebeu esta denominação em 1865) de Rua da Boa Vista e Cais da Boa Vista. O que sugere que as informações do jornal ainda são aquelas do ano da visita do Imperador, inclusive, na Ilha dos Marinheiros.
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BARÃO HOMEM DE MELLO – 1868 No dia 16 de abril de 1868, Francisco Inácio Marcondes Homem de Melo (1837-1918) o Barão Homem de Mello, esteve na Ilha dos Marinheiros e observou a fertilidade da horticultura, relatou as oliveiras, macieiras, pessegueiros, damasqueiros, butiás, ameixeiras, cerejeiras, castanheiras, figueiras, marmeleiros, laranjeiras, limoeiros e parreirais da uva moscatel e americana. Também destacou os “cômoros movediços”, de areia, a água límpida e leve, a fertilidade da orla da praia, as chácaras cultivadas, o fornecimento de verduras que a fazem o “celeiro do Rio Grande”. Esta Memória das “excursões de 1868” foi publicada na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em 1872 (Tomo XXXV).
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Figura 16 Barão Homem de Mello.
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MICHAEL MULHALL – 1871 Michael Mulhall nasceu em Dublin em 1836 e faleceu na mesma cidade em 1900. Em 1858, com apenas 22 anos, buscou o comércio na América do Sul fundando, em 1861, o jornal Buenos Ayres Standard. Este foi o primeiro periódico diário em inglês da América do Sul, num empreendimento jornalístico que obteve sucesso com a direção de Mulhall até 1894. Ele acompanhou o avanço urbano e econômico de Buenos Aires, defendendo vários projetos que alavancassem o capitalismo portenho. Em 1878, casou-se nesta cidade, com Marion McMurrough Mulhall, a revisora de seus livros. Em sua passagem pela cidade do Rio Grande, no ano de 1871, o irlandês Michael Mulhall deixou várias observações que retratam a condição urbana da localidade, os arredores, o cemitério protestante, a viagem pela Lagoa dos Patos até Porto Alegre etc. Ele sistematizou alguns dados sobre a importância do Porto do Rio Grande (atual Porto Velho) para o escoamento da produção da Província, ressaltando que Rio Grande e Porto Alegre eram os maiores centros econômicos da época. Acompanhou as obras de gás que estava sendo realizadas pela São Pedro Brazilian Gás Company uma empresa inglesa que instalou canalização de gás no centro da cidade do Rio Grande. Estas obras eram fundamentais para a melhoria dos serviços urbanos e para construir uma visão de desenvolvimento tecnológico característico da expansão imperialista dos anos 1800. O conjunto de informações de sua estadia em Rio Grande e na Província do Rio Grande do Sul foi publicado em Londres com o título Rio Grande do Sul and its German Colonies (1873). Uma edição que em português foi publicada em 1974: O Rio Grande do Sul e suas Colônias Alemãs.
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Um breve trecho ele deixou sobre a Ilha dos Marinheiros, referente ao mês de novembro de 1871: “Quase na frente da Alfândega está à loja dos senhores Halliwell, farmacêuticos, um ponto de encontro favorito dos estrangeiros. O clube destes, com muitos salões envidraçados de vastas dimensões e temperatura amena, tem vista para o porto e a lagoa, ainda permitindo a visão da fértil Ilha dos Marinheiros e do subúrbio aquático de São José. Como na maioria das cidades brasileiras, vale a pena uma visita ao mercado, que é abundante em frutas, vegetais, peixes, etc... provenientes da Ilha dos Marinheiros”.37
Figura 17 Ilha dos Marinheiros ao fundo vista da torre da Alfândega, déc.1950. Acervo: IBGE. 37
MULHALL, Michael George. O Rio Grande do Sul e suas Colônias Alemães. Porto Alegre:
Bels/IEL, 1974, p. 46. Datou o escrito como remetendo a Rio Grande em 13 de novembro de 1871.
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HENRIQUE AMBAUER – 1873 A Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro publicou no ano de 1888 (Tomo LI) os apontamentos do italiano Henrique Schutel Ambauer (18401899) com o título "A Província do Rio Grande do Sul: descrição e viagens". Os manuscritos originais de Ambauer são datados de 1873 e está sendo reproduzido o trecho referente a Ilha dos Marinheiros. “Ao norte da península do Rio Grande encontra-se um arquipélago de ilhas baixas e arenosas. A formação dessas ilhas é de aluvião moderna, tendo sido em sua origem bancos de areia cujo nível o remanso das águas, os sedimentos e os ventos vieram a pouco e pouco elevando. A maior e mais importante do grupo é a Ilha dos Marinheiros a duas milhas de distância da cidade do Rio Grande, seguindo-se o pequeno canal aberto entre os baixios, que a circulam. Essa ilha tem duas léguas de largura e cinco de circunferência, segundo me disseram. A parte meridional é bordada de matos de uma vegetação bem desenvolvida. Grande número de chácaras regularmente plantadas abastece abundantemente o mercado do Rio Grande de verduras e frutas de boa qualidade, tentando-se já a alguns anos de fabricar vinhos, os quais vendem-se facilmente. Algumas outras chácaras circulam a ilha em circunferência; a dificuldade de transporte às torna menos importantes. Ao sul da Ilha dos Marinheiros veem-se as Ilhas dos Cavalos e das Pombas. A primeira ainda pode chamar-se banco, ficando a seco com as vazantes e onde apenas cresce uma gramínea de folhas ásperas, que lhe chamam mangal, utilizada para estivar navios e para cobrir galpões. A oeste da Ilha dos Marinheiros encontra-se a Ilha do Leonídio, separada por um pequeno braço de mar da costa firme. Esta ilha, de propriedade do
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indivíduo que lhe dá o nome, é um pouco mais alta que estas últimas e, segundo dizem, é uma agradável vivenda devido ao cuidado do proprietário. Segue-se ao norte a Ilha da Torotama e alguns bancos à flor d’água”.38
Figura 18 Cenário atual em que se avista, a partir de Rio Grande, parte da cobertura vegetal da Ilha dos Marinheiros (na parte central da fotografia). Acervo: Autor.
38
AMBAUER, Henrique Schutel. A Província do Rio Grande do Sul: descrição e viagens. Revista
do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: IHGB, 1888 (Tomo LI).
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FREDERICO GUILHERME DE ALBUQUERQUE - 1876 Descendente de imigrantes portugueses oriundos do Arquipélago dos Açores,39 Frederico Guilherme de Albuquerque nasceu em Rio Grande no dia 18 de dezembro de 1839 e faleceu no Rio de Janeiro no dia 3 de novembro de 1897. Ele estudou como aluno interno na Escola de Belas-Letras (Desterro) e entre 1858-1859) na Escola Central do Rio de Janeiro (Escola Polytechnica). Em seis de outubro de 1860 cassou-se na Igreja Matriz de São Pedro com Maria Ephigênia Lorena (Rio Grande, 18 de dezembro de 1840 – São Paulo, 5 de novembro de 1927). Ainda no ano de 1860 fixou residência na Fazenda da Marambaia, na Ilha dos Marinheiros onde morou por onze anos. Neste local desenvolveu experimentos agrícolas e botânicas introduzindo e aclimatando ampla variedade de videiras, desenvolvendo conhecimentos e argumentando sobre as amplas possibilidades do desenvolvimento da vitivinicultura na Ilha, no Rio Grande do Sul e no Brasil. Em 1862 fez o acompanhamento do grupo de cientistas e orientou a realização da coleta de amostras de animais e plantas realizado pela Expedição Científica Espanhola. Em 1868 (ou talvez antes) aclimatou na Ilha dos Marinheiros duas espécies de Eucalipto originários da Austrália. Portanto, Albuquerque é um dos pioneiros na introdução do eucalipto no Brasil conforme os arquivos da Société Impériale Zoologique d'Acclimatation de Paris,40 estes plantios ocorreram a partir de dezembro de 1868, conforme 39
Regiões do Arquipélago dos Açores que eram originários os seus descendentes: de Ponta
Delgada – Ilha de São Miguel; de Angra do Heroísmo – Ilha Terceira; da Ilha do Pico; da Ilha de São Jorge; da Ilha do Faial e da Ilha Graciosa. O Bulletin de la Société d’Aclimatation de Paris (segunda série, tomo IX, 1872) se refere a Medailles de première classe recebida por Albuquerque pela aclimatação do Eucalyptus no Rio Grande do Sul. 40
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confirmação de Albuquerque em 1870. As espécies aclimatadas foram globulus, amygdalina e polyanthemos.41 Navarro de Andrade em 1911, apontou Albuquerque como o primeiro a realizar a introdução do eucalipto no Brasil42, porém, o tema é polêmico e não está definido e “segue a espera de dados incontestáveis, que somente fontes primárias podem trazer”.43 Em janeiro de 1871, mudou-se para a Serra dos Tapes (3 léguas de Pelotas), para ampliar seus experimentos de aclimatação de plantas e de animais importados. Ainda mantinha a Fazenda da Marambaia, mas, o desligamento se faria em cerca de um ano e os experimentos na Ilha começam a decair sem o seu acompanhamento. Seus contatos com comunidades científicas na França, Espanha e outros países lhe abriram as portas para um convite feito por D. Pedro II em 1872 para assumir uma vaga na Seção de Botânica do Museu Nacional no Rio de Janeiro. Suas atividades de pesquisa e divulgação científica como redator da Revista de Horticultura (1876-1879) o notabilizaram no campo incipiente da botânica no Brasil oitocentista. Gostava de atuar de forma prática e não apenas teórica, como provou na Ilha dos Marinheiros, criando um estabelecimento de sementes e mudas raras (chamado de Beliche) no Bairro do Encantado, Rio de Janeiro. Escreveu artigos, defendeu a criação de uma Escola de Viticultura, foi Diretor-Geral dos Jardins Públicos (São Paulo) e ajudou a criar a Sociedade Nacional de Agricultura.44 Frederico Guilherme de Albuquerque é um nome SAMPAIO, Armando Navarro, Os Eucaliptos no Brasil, p. 1. (celso- foelkel.com.br). NAVARRO DE ANDRADE, E. Manual do plantador de Eucalyptos. São Paulo: Typographia Brazil de Rothschild & Comp., 1911, p. 343. 43 MARCHIORF, José Newton Cardoso. Primórdios da Silvicultura no Rio Grande do Sul – nota sobre a introdução do gênero Euclyptus L’Her. BALDUINIA. n. 44, p. 21-31, 30-III-2014, p. 23. 41
42
44
ALBUQUERQUE, Francisco Tomasco de. Frederico Guilherme de Albuquerque: um escorço
biográfico. Niterói: Instituto Cultural Frederico Guilherme de Albuquerque, 1997, pp. 33-38.
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essencial para o avanço, no Segundo Império Brasileiro, das relações entre cultura paisagística francesa e a nascente arte dos jardins no Brasil. Ele faz parte destacada da primeira geração de paisagistas e horticultores nacionais.45 A seguir serão reproduzidos trechos do artigo denominado “Da Videira: sua origem e história; conveniência de sua cultura; variedades preferíveis” que foi publicado por Albuquerque em números da Revista de Horticultura (Rio de Janeiro, 1876). São os trechos relacionados às experiências promovidas na Ilha dos Marinheiros. Sua relevância está em que na Ilha ocorreu a primeira tentativa sistemática de aclimatação de muitas espécies vitíferas (mais de duzentas cepas) e não apenas do plantio da cepa Isabel.46 O material foi reproduzido da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro (https://bndigital.bn.gov.br/).
DOURADO, Guilherme Mazza. Belle Époque dos Jardins: da França ao Brasil do século XIX e início do século XX. São Carlos: USP/Escola de Engenharia de São Carlos, Tese de Doutorado em 45
Arquitetura e Urbanismo, dezembro 2008, p. 125. 46 No Bulletin de la Société d’Aclimatation de Paris (segunda série, tomo IX, 1872, p. 579) é reproduzida parte de uma carta de Frederico Albuquerque para a respectiva Societé em que crítica a adoção pelos proprietários na Ilha dos Marinheiros na exclusividade do uso da uva Isabel (Isabela). Afirma que ofereceu sementes de legumes, alcachofras, aspargos, morangos e outras videiras, mas as arrancam e tudo o que faziam era cultivar a uva Isabel. Isto é esclarecedor para entender o seu combate célere contra a uva Isabel.
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JORGE DE ALBUQUERQUE – O POETA O poeta árcade Jorge de Albuquerque (pseudônimo Alceu Fileno) nasceu em Rio Grande em 07-08-1861 e faleceu no Rio de Janeiro em 08-05-1919. Atuou como Agente de Estação na The Leopoldina Railway Co. na Zona da Mata de Minas Gerais e escreveu poemas e contas que foram elogiados por João Ribeiro e Silvio Romero. “Sua modéstia, no entanto, o impediram de publicar seus escritos, apesar dos estímulos recebidos dos amigos. Consta que, em certa ocasião de particular depressão, atirou muitos de seus trabalhos às águas do Rio Pirapetinga, em Minas Gerais”. Apesar disso, alguns poemas foram preservados e que relatam a “nostalgia que sentia dos pagos de seu Rio Grande, onde desfrutou de uma feliz infância e juventude junto a seus pais e irmãos”.
47
Éo
caso do poema que está sendo reproduzido chamado “A Família” que retrata as lembranças de criança na Ilha dos Marinheiros com referência ao “lago formoso”, praias lindas, fulgentes de areia, a ilha cingindo de bons Marinheiros. O distraído menino contemplava na Lagoa dos Patos a passagem das embarcações a vela: “além para o lago, fulgente lençol, aonde, enfunada, vogava uma vela”. A Fazenda da Marambaia foi assim descrita na memória poética de Jorge: “Aí, numa ponta, cobrindo um outeiro, erguia-se a casa que fora então minha; 47
ALBUQUERQUE, Francisco Tomasco de. Frederico Guilherme de Albuquerque: um escorço
biográfico. Niterói: Instituto Cultural Frederico Guilherme de Albuquerque, 1997, p. 14-16.
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aos pés preguiçosa, quebrava na praia a vaga e alcançava depois Marambaia; por trás as areias, ao lado era a vinha, depois os pomares, no fim o potreiro”. É um retrato da década de 1860 na Ilha dos Marinheiros, no local onde ocorreu
experimentos
agrícolas
e
botânicos,
especialmente,
ligados
a
vitivinicultura. Para além da memória lúdica de um menino, é um registro da construção de um ambiente de laços afetivos num cenário concreto de investigação científica.
Figura 19 Paisagem característica da face da Ilha junto a Lagoa dos Patos. Acervo: Autor.
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Figura 20Jorge de Albuquerque, poema “A Família”.
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O TRABALHO NACIONAL – 1889/1890 Em 16 de setembro de 1889 o jornal O Trabalho Nacional (órgão da Sociedade Agrícola-Industrial da Cidade do Rio Grande) deu início, em sua edição número 2, uma série de publicações sobre o potencial econômico da Ilha dos Marinheiros. Os textos são assinados por João de Saldanha e tem sequência nas edições 3, 4, 5, 8, 10 e 11. A partir do dia 7 de setembro de 1890 foram publicados três matérias, não assinadas em defesa da viticultura (edições 53, 55 e 56), com enfoque ao desenvolvimento desta atividade na Ilha dos Marinheiros. Este conjunto de textos é o mais extenso levantamento de perspectivas para o desenvolvimento econômico da Ilha publicado na imprensa. Temas como a plantação de pinus, avanços na qualidade dos hortifrúti e na qualidade do vinho são contempladas nestas extensas matérias.
Figura 21 Acervo: Biblioteca Rio-Grandense.
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Figura 22 O Trabalho Nacional, n.2, 16 de setembro de 1889.
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Figura 23 O Trabalho Nacional, n.3, 23 de setembro de 1889.
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Figura 24 O Trabalho Nacional, n.4, 30 de setembro de 1889.
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Figura 25 O Trabalho Nacional, n.5, 7 de outubro de 1889.
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Figura 26 O Trabalho Nacional, n.8, 28 de outubro de 1889.
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Figura 27 O Trabalho Nacional, n.9, 4 de novembro de 1889.
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Figura 28 O Trabalho Nacional, n.9, 4 de novembro de 1889.
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Figura 29 O Trabalho Nacional, n.10, 11 de novembro de 1889.
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Figura 30 O Trabalho Nacional, n.11, 18 de novembro de 1889.
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Figura 31 O Trabalho Nacional, n.53, 7 de setembro de 1890.
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Figura 32 O Trabalho Nacional, n. 55, 21 de setembro de 1890.
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Figura 33 O Trabalho Nacional, n.56, 28 de setembro de 1890.
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CARL LINDMAN - AS NEVES ETERNAS (1892) O botânico sueco Carl Axel Magnus Lindman visitou, a Ilha dos Marinheiros em novembro de 1892. Dos lugares em que esteve em Rio Grande, as dunas e o deslocamento da areia o deixaram muito impressionado. É o aspecto mais ressaltado em suas observações e que estão em coerente sintonia com os registros deixados pelos viajantes estrangeiros que aqui estiveram ao longo do século XIX. Lindman esteve na "Lagoa das Noivas" (ou Lagoa do Rei) e observou o cenário de cima das dunas, como pode ser feito no tempo presente. Ele fez uma comparação do que viu como uma "cratera" cercada de barrancos, como uma "arena de um gigantesco circo". E o que lhe veio a mente foi um quadro de "neves eternas". Olhei o mesmo cenário dezenas de vezes, provavelmente, de um ponto de visão muito próximo ao de Lindman. Afinal, ele deve ter ido de barco até o Porto do Rei e caminhando em linha reta se faz a escalada da linha de dunas e se obtém esta visão privilegiada que considero das mais espetaculares de Rio Grande. Porém, nunca imaginei uma "cratera", apesar de considerar desconcertante observar a paisagem. Aquele cenário, nos meus pensamentos, me passa uma vontade de cruzar a Lagoa das Noivas e continuar em frente, avançando pela areia como num deserto do Saara sem fim. E sem encontrar o final do percurso da infinitas dunas e nem chegar na Lagoa dos Patos e recordar que se estava numa Ilha. Bom lugar para filmar uma analogia da série Lost, e criar um lugar sem tempo e sem referenciais civilizatórios: apenas dunas, o movimento de areia fina tocada pelo vento e o som discreto de pássaros.
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Na Ilha dos Marinheiros: “(...) cheguei ao fim das plantações quando o terreno de repente se elevava cerca de 10 metros de altura comporto duma areia fina e amarelada. Esta elevação tinha uma largura considerável, porque o seu cimo formava um plano irregular de areia movediça com montículos e pequenas baixadas. Alcançado o outro barranco, fiquei surpreendido com a paisagem que avistei. Diante e por baixo de mim estendia-se uma planície de areia, semelhante a arena de gigantesco circo; ao redor dela erguia-se um barranco circular em continuação daquele em que eu estava e do outro lado formava uma cadeia de morros despidos, cujos cabeços amarelados contrastavam com o céu azul. Toda esta linha de areia movediça assemelha-se pois a uma grande cratera com fundo chato de quase um quilômetro de diâmetro; a beira da cratera com fundo chato, de quase um quilômetro de diâmetro é formada pelo alto barranco anular. A arena neste circo de areia movediça é deserta; pois não é destinada a representações de vida orgânica. A vegetação está ausente, e só as folhas amarelo-cinzentas de algumas touceiras de capim testemunham os vãos esforços de uma invasão. Tudo isto forma um quadro cuja desolação só é comparável a uma paisagem de neves eternas. Durante os meses de inverno, o principal tempo das chuvas nestes lugares, aglomera-se aqui água bastante para imitar um lago de cratera. Os cimos mais altos deste barranco são também destituídos de vegetação, e a permanência ali é sumamente incômoda por causa do reflexo brilhante e a penetração da areia fina nos olhos, ouvidos, boca e nariz. Ao contrário, as baixadas e os declives do barranco são parcialmente cobertos de uma singular flora psamófila, mais exuberante no barranco de fora, onde também algumas moitas densas de arbustos avançam da mata em baixo... A distância a ilha parece como se fosse coberta de mata, pois divisa-se uma linha de grandes figueiras, pinheiros cultivados, coqueiros e outras árvores. Esta mata
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porém ocupa apenas uma faixa plana ao pé da praia, de algumas centenas de metros de largura”. 48
Figura 34 LINDMAN, 1856-1928. http://www2.nrm.se/fbo/hist/lindman/lindman.html.en
LINDMAN, Carl Axel Magnus. A Vegetação no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Livraria Echenique, 1906 (original Estocolmo, 1900). 48
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Figura 35 Lagoa das Noivas. Lindmann esteve neste local e o descreveu em seus escritos.
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A CANHONEIRA PÁTRIA – 1905 A Colônia Portuguesa no Brasil, buscando estreitar relações culturais e políticas com Portugal em período de crise diplomática com a Inglaterra, fez uma campanha de arrecadação financeira para a construção de um navio de guerra a ser doado a Marinha Portuguesa. Adquirida a “Canhoneira Pátria”, no ano de 1905 ocorreu uma visita há várias cidades brasileiras onde ocorreram homenagens e confraternização com as comunidades portuguesas locais. Em Rio Grande, que também contribuiu com recursos, a Canhoneira visitou o Porto do Rio Grande no mês de dezembro. Ampla mobilização da população local ocorreu e os eventos foram muito prestigiados. Nos preparativos para a visita, foram organizadas duas Comissões: uma responsável pelas atividades a serem realizadas em Rio Grande e a outra, com festejos na Ilha dos Marinheiros. Isto indica a representatividade “política” da Ilha conseguindo estruturar recursos para realização das atividades. Segundo, é a associação da Ilha com a cultura portuguesa e com os moradores que mantinham um vínculo afetivo e raízes biológicas com Portugal. Também se constata, nesta Comissão, a presença de comerciantes de “grosso trato” ligados ao comércio de exportação e importação como é o caso de Joaquim de Campos Assunção e José da Silva Fresteiro. Algumas fotografias foram realizadas quando desta visita da tripulação da Canhoneira Pátria a Ilha dos Marinheiros: mostram os integrantes da Comissão, a chegada das embarcações, o desembarque no Porto do Rei, o almoço
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em meio aos parreirais, comissão e convidados na casa de João de Boer, fotografia, possivelmente, em frente a casa de Boer. O acervo das fotografias é da Biblioteca Rio-Grandense.
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Figura 36 Em 2020, a cidade do Rio Grande vista do cais do Porto do Rei. Acervo: Autor.
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ECHO DO SUL E A VINICULTURA - 1912 A Ilha dos Marinheiros tem uma história vinícola pioneira, que recua a década de 1860, quando das experimentações com a usa ‘Isabel’, importada dos Estados Unidos pelo comerciante radicado em Rio Grande Thomas Messiter. Estas primeiras mudas de videira Isabel teriam sido enviados de Washington por José Marques Lisboa e recebidos por Messiter. Quando, no ano de 1865, ocorreu a visita do Conde D’Eu a Rio Grande, foi oferecido o vinho da Ilha dos Marinheiros durante os jantares. O jornal Echo do Sul do dia 18 de janeiro de 1912, com entusiasmo, destacou a vinda de um renomado agrônomo da época na expectativa de que o vinho da Ilha tivesse subsídio do governo federal buscando ampliar os negócios. Quase trinta anos depois, a grande enchente de 1941 traria grandes prejuízos também a esta atividade desenvolvida na Ilha. O documento jornalístico do momento que se vivia a atividade vinícola, há cem anos, deixou o seguinte registro. “Dr. Gomes do Carmo. Visita importante à Ilha dos Marinheiros. O sr. dr. Gomes Carmo, distinto agrônomo brasileiro, que depois de formado, teve ainda dois anos de assistente em altos estudos da sua especialidade na escola de Montpellier, França, esteve anteontem na Ilha dos Marinheiros, de onde regressou ontem de manhã. Achando-se na secretaria desta redação o nosso prezado amigo o sr. João de Saldanha, na mesma ocasião em que o sr. dr. Gomes Carmo nos deu o prazer da sua visita, conforme a nossa notícia de anteontem,
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foram os dois apresentados e, logo, o segundo fez uma apelo gentil ao primeiro no sentido de o acompanhar na sua digressão a referida Ilha, visto serem ambos do ofício e ter assim com quem poder conversar em assuntos da missão que ali o levava. Combinaram-se as coisas de modo que o sr. João Saldanha, não podendo sair da cidade a hora em que o dr. Gomes Carmo partia, em gasolina, com o dr. Carlos Pinto e o major Rodrigo de Souza, faria, entretanto, todo o possível por corresponder a gentileza do convite, indo a Ilha, embora mais tarde, como foi, e ali se encontrariam como de fato se encontraram. É assim que a viagem de estudo do dr. Gomes teve duas fases: uma, com os primeiros dois companheiros, na costa sul da Ilha; outra com o sr. João Saldanha na costa norte, onde estão localizadas as melhores chácaras e as terras em geral são muitíssimo superiores as da costa primeiramente indicada. O sr. dr. Gomes Carmo ficou maravilhado com os produtos das culturas, tanto na totalidade como na qualidade; admirou os vinhedos na exuberância do fruto, muito e belamente desenvolvido; no vigor geral da vara, mal grado a invasão do mildium, em alguns lugares, e sobretudo da anthracnose, devido, em grande parte, diga-se a verdade, a descuidos imperdoáveis do agricultor, que não sulfata em tempo competente nem tantas vezes quantas a vinha necessita. Em relação às terras, o dr. Gomes Carmo aconselhou, com muito critério científico, o emprego da cal e dos fosfatos (cal hidratada e cinza de ossos) ou de cal de marisco, na qual existe em comum o carbonato e fosfato. Na mesma ocasião e em presença do dr. Gomes Carmo, provou o sr. João de Saldanha, vir
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dando, há muitos anos, o mesmo conselho, além de outros, as mesmas pessoas que ali se achavam presentes. O dr. Gomes Carmo tudo viu, enfim, e examinou de visu com calma de profissional apaixonado e perito. Finda a inspeção das terras, dos frutos e plantas (...) foram tiradas das competentes pipas e na presença do ilustre visitante, quatro diferentes amostras de vinho, tinto e branco, todo de uva Isabel, desde o superior vinho de mesa, como não há igual no município, nem no estado, até ao tipo da mais fina malvasia para sobremesa de entendidos. O dr. Gomes elogiou muito todos os tipos, fixando mais a sua ponderosa e meditada atenção sobre os brancos, que aliás são de fabricação menos difícil e menos trabalhosa. Da adega passou-se à secção de destilação, anexa mas independente, e aí apreciou a aguardente só de bagaço e borra, que achou, e realmente é, verdadeira especialidade. Aguardente exclusivamente de vinho não havia mais na ocasião. S.S. gostou da disposição da casa, da montagem dos aparelhos e do alambique, que destila uma pipa de cada vez; e referindo-se de novo a dita aguardente, disse achá-la muito superior a muito cognac que por aí se apregoa como artigo de primeira qualidade. De volta a residência, o Gomes Carmo fez a última prova num vinho de vinte e um anos, que o sr. Saldanha fabricou, também de uva Isabel, e que obteve medalha de ouro na última exposição do Rio de Janeiro. S.S., com quanto seja de um temperamento nervoso, não é de arroubamentos. Por estudo ou por ciência própria das coisas, vê e observa com calma prudente e ponderada e por essa razão as suas opiniões são mais apreciáveis. Depois de ter levado a espaços, o dito vinho ao crisol do paladar, apenas disse e foi o bastante: - O melhor vinho da região de Málaga, não é melhor do que este. Isto não é mais vinho, é um licor
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finíssimo. Em nome dos agricultores da Ilha dos Marinheiros, pedimos ao sr. dr. Gomes Carmo que, pairando como paira lá pelas alturas do Ministério da Agricultura, se interceda por eles quanto em si caiba, de modo que tanto esforço ali despendido, que só conta com a própria iniciativa, seja contemplado na proporção dos seus merecimentos e das suas necessidades.”49
Figura 37 Acervo: Biblioteca Rio-Grandense.
49
Echo do Sul , 18 de janeiro de 1912.
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CARLOS SANTOS - A ENCHENTE DE 1941
Carlos Santos elaborou o “Relatório – Extensão, repercussão e danos causados pela Grande Enchente 1941. Dirigido ao Prefeito Municipal do Rio Grande Dr. Roque Aíta. Rio Grande: julho de 1941”. Este documento é uma referência para o estudo do tema pois detalha o impacto na cidade e também nas Ilhas. As perdas econômicas na Ilha dos Marinheiros foram de grande monta e hipoteticamente, é um fator fundamental para o início do decréscimo da população que se desloca para a cidade.
“Fenômeno periódico no Rio Grande do Sul, de repercussão sempre desastrosa, pela perturbação do ritmo esplendente das nossas múltiplas atividades, a última enchente, entretanto, mais que qualquer da que há lembrança, assumiu proporções tão agigantadas que bem podemos retratá-la no termo – calamidade pública – dentro da mais plena expressão do vocábulo. Foi, em verdade, uma revolução dos elementos da natureza, associados numa empreitada sinistra de destruição e angústia, contra a inteligência e os recursos humanos, impotentes e impassíveis ante a fúria das águas – fonte soberba de vida – transformadas em motivo de desalento, de desespero e de dor. A nossa cidade, pela sua própria posição geográfica, encastoada entre o canal do Rio Grande e a enseada conhecida por Saco da Mangueira, escoadouro natural de grande parte da imensa bacia-hidrográfica do Estado, foi o último reduto da luta
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titânica entre o homem e a natureza, naqueles dias memoráveis de maio, e, por isso mesmo, a última tonelada de água da enchente, vomitada para o oceano pela garganta da nossa barra, levou consigo os últimos resíduos da intranquilidade e das apreensões dolorosas que torturavam, então, o Rio Grande do Sul. Durante longos dias esteve a nossa população ameaçada pelas águas que, subindo e baixando, crescendo e minguando, chegaram a lavar ruas situadas, quase, no coração da cidade. A nossa campanha enfrentou primeiro o flagelo das águas, e a perturbação do tráfego na via férrea Rio Grande-Pelotas foi o reflexo inicial do desolador bloqueio aquático. Veio, depois, a invasão da cidade e, isso, verificou-se no momento em que a bacia do Rio Grande começou a despejar para terra todo o volume de água que a barra não conseguia extravasar. Surgindo a inundação pelo cais fronteiro ao Mercado Público, pela rua Riachuelo e por toda a extensa margem do canal, em breve todo o litoral norte e, depois, a parte sul, pelo Saco da Mangueira eram assustadoramente invadidos pelas águas. Numa incógnita enervante, as ilhas da Torotama, dos Marinheiros, do Leonídio, dos Ovos, Martins Coelho, do Malandro, no canal do Rio Grande, e do Pequeno, no canal do São Gonçalo, viam a lhes acenar de bem perto a dolorosa contingência de desapareceram tendo, a da Torotama, permanecido vários dias totalmente submersa. E quando o flagelo das águas alcançou o máximo da sua extensão, um verdadeiro mar cobria os quadrantes Norte, Sul e Oeste da cidade.
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Daí, então, saiu o contingente formado por milhares de flagelados com que a nossa população pagou o seu tributo à Grande Enchente. (...) Ilha dos Marinheiros. Situada no sangradouro fronteiro ao Rio Grande, ao norte da cidade, e compreendendo os sítios da Marambaia, Porto do Rei, Bandeirinhas, Barro e Fundos da Ilha, vive aí uma população de cerca de 2.400 almas na sua grande maioria composta pelo elemento luso. A agricultura e a pescaria constituem o meio de vida desta gente laboriosa. Pescadores em número aproximado a 300, se espalham pela costa norte da Ilha onde, também, inúmeros agricultores atendem às suas chácaras. O litoral sul é, todo ele, uma sequência ininterrupta de lotes de terra coalhadas de plantações, as mais variadas, agora grandemente sacrificadas pela ação destruidora das águas da enchente. Mais ou menos 300 chácaras, grandes e pequenas, estão distribuídas pelas várias dezenas de quilômetros que forma o perímetro da Ilha dos Marinheiros e constituíram sempre o celeiro do Rio Grande atendendo, ainda, a vários pontos deste e de outros Estados, notadamente no mercado da cebola onde uma produção em média de 10.000.000 quilos por ano dizem bem da importância deste produto no conjunto de atividades dos agricultores da Ilha e na própria economia do nosso município, levando-se em conta a média de rs. 2$700 para o quilo da cebola verificada na última safra. O aspecto que oferece a localidade epigrafada, no que se refere a agricultura, é simplesmente desolador e exige uma medida de assistência tão pronta e eficiente capaz de levantar o ânimo daquela gente que olha, hoje, para a terra, o grande laboratório onde cristalizaram a plenitude as suas esperanças em afirmações de trabalho e de
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capacidade produtiva, sem coragem de prosseguir lutando em circunstâncias assim tão desesperadoras. A Grande Enchente inutilizou nas terras da Ilha dos Marinheiros cerca de 2.400 garrafas de sementes de cebolinho, numa média de rs. 100$000 a garrafa, ou seja, rs. 240:000$000. Outra faceta dos danos causados pelas cheias aos agricultores está representada na perda total das suas grandes plantações de hortaliças num valor aproximado de rs. 450:000$000. O primeiro golpe, porém, embora assim tão rude, não conseguiu alquebrar a energia daquelas enxadas que baixavam e subiam, após a enchente de maio, impulsionadas pela ânsia incontida de reaver, em novos e extensos sulcos rasgados na terra, o trabalho e o dinheiro perdidos. E, outra vez, o solo se entumeceu de mudas diversas e atapetado ficou de semente de cebolinho, a mais importante produção da localidade, pelos resultados compensadores que proporciona aos plantadores. E como um motivo a mais de esperança, foram as plantas verdejantes irrompendo da terra antes inteiramente escondida pelas águas. Agora, porém, o transplante do cebolinho é tarefa que a nova enchente está a impossibilitar num aceno enervante aquelas pobres criaturas. O desespero, então, vai, pouco a pouco delas se apoderando. Até setembro, grandemente prejudicada a transplantação e, se passar, totalmente perdida. Eis o doloroso dilema que o plantio da cebola oferece aos agricultores da Ilha dos Marinheiros. Gente que vive de e para o trabalho, os menos afortunados, e estes formam a grande maioria, conseguem se manter estribados no fator Crédito. Trabalham e sustentam-se durante toda a quadra hibernal para pagarem na época da colheita, este ano, de perspectivas sombrias. A ideia do abalo fatal desse crédito e das suas desastrosas consequências, é o outro lado da grande
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tragédia vivida pelos moradores da Ilha. Muitos pensam em abandonar aquelas plagas onde aportaram outrora acariciando no espírito mil e um sonhos de realizações e de triunfos da vida. José Maria Simões Netto é um agricultor que reside ali ha mais de 30 anos. A sua chácara está situada na parte mais alta da Ilha, no Porto do Rei. O fornecimento de verdura para os navios da Companhia Nacional de Navegação Costeira era feito com o produto de suas plantações. As águas da enchente cobriram-lhe toda a chácara e no conjunto de prejuízos sofridos por este homem destacam-se a perda de 50.000 quilos de batatas doces, 20 garrafas de sementes de cebolinho, 5 quilos de sementes de cenoura a rs. 180$000 o quilo, quase todo o produto da sua importante horticultura, um extenso parreiral e um sem número de pessegueiros cujo raizame foi todo apodrecido pelas águas. A sua casa residencial ruiu sob a ação destruidora das cheias e pela vez primeira, após a vigência do negócio do fornecimento citado, se viu a Companhia Costeira obrigada a suprir-se de legumes em mercados outros como Santos, Rio, etc. José Cruz é outro agricultor da Ilha dos Marinheiros. Plantou e perdeu 10 garrafas de cebolinho. Um acidente sofrido quando lidava com a horta o levou ao hospital onde submeteu-se a delicada intervenção
cirúrgica.
Tudo
quanto
possuía
vendeu
para
atender
às
necessidades da doença e da família. Voltou agora, em convalescença, e num esforço quase sobre-humano atirou-se para a terra em busca de recursos materiais para enfrentar a sua aflita situação econômica. O mesmo problema de toda a Ilha consternada, a impossibilidade de transplantar os viveiros existentes. Este homem vê de bem perto a miséria lhe rondando o lar. Citamos, apenas, estes dois exemplos para refletir a situação geral dos agricultores da
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localidade em apreço. Nas várias chácaras visitadas encontramos o mesmo ambiente desolador. Ao norte da Ilha estão os pescadores oferecendo, também, embora em menor vulto, um conjunto de prejuízos que impressionam sobremodo. Redes, barcos e outros utensílios de pesca, danificados, perdidos e inutilizados, a impraticabilidade oferecida pelo mar durante a Grande Enchente e a pobreza dos próprios recursos econômicos, formaram o grande problema destes homens. As mulheres e crianças, a exemplo das outras que pertencem aos agricultores, cultivam a terra. Mas, esta também, tanto quanto o mar, se rebelou contra o homem e o condenou, parece, ao desespero e à dor. E num total aproximado de rs.40:000$000 os pescadores residentes na Ilha dos Marinheiros firmaram o seu quinhão de prejuízos sofridos em consequência das cheias”.50 O Relatório também é constituído por uma parte fotográfica. A Ilha dos Marinheiros foi contemplada com várias fotografias que ajuda a visualizar parte dos estragos provocados pela enchente.
SANTOS, Carlos da Silva. “Relatório – Extensão, repercussão e danos causados pela Grande Enchente 1941. Dirigido ao Prefeito Municipal do Rio Grande Dr. Roque Aíta. Rio Grande: julho de 1941”. 50
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Figura 38 Inundação na Ilha dos Marinheiros. Carlos Santos e um morador.
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Figura 39 Inundação na Ilha dos Marinheiros. Desmoronamento de uma casa. Carlos Santos é o homem do centro da fotografia.
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Figura 40 Trabalho agrícola feminino e o alagamento da plantação.
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Figura 41 Trabalho agrícola feminino e o alagamento da plantação.
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Figura 42 Parreiral perdido.
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Figura 43 Perda total no parreiral do Ilhéu José da Cruz.
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Figura 44 Enchente de 1941 na Ilha dos Marinheiros.
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Figura 45 Enchente de 1941 na Ilha dos Marinheiros.
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Figura 46 Alagamentos das plantações.
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Figura 47 Carlos Santos e o agricultor Ernesto Sena.
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Figura 48 A partir da beira da Lagoa dos Patos em Rio Grande se observa o pĂ´r do sol na Ilha dos Marinheiros. Acervo: Autor.
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Figura 49 Entardecer na Ilha dos Marinheiros fotografado a partir do Rincão da Cebola em Rio Grande. Acervo: Autor.
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Figura 50 Em primeiro plano o Iate Clube em Rio Grande e na outra margem a Ilha dos Marinheiros (com as dunas em sua parte central). Acervo: Autor.
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