Análise do filme Cléo de 5 à 7, segundo a Obra Cinematográfica de Agnès Varda História da Arte do Cinema Catarina Silva
ÍNDICE ÍNDICE ....................................................................................................................................................1 ÍNDICE DE LEGENDAS ........................................................................................................................2 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................4 AS CARACTERÍSTICAS DA OBRA CINEMATOGRÁFICA DE AGNÈS VARDA .........................5 CLÉO DE 5 A 7 – ANÁLISE ...................................................................................................................6 CONCLUSÃO ...................................................................................................................................... 12 BIBLIOGRAFIA................................................................................................................................... 13 OBRAS CITADAS ............................................................................................................................... 13 ANEXOS............................................................................................................................................... 14
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ÍNDICE DE LEGENDAS Imagem 1 – Fonte: Cléo de 5 à 7.............................................................................................. 14 Imagem 2 – Fonte: Cléo de 5 a 7.............................................................................................. 15 Imagem 3 – Fonte: Cléo de 5 a 7.............................................................................................. 15 Imagem 4– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................... 16 Imagem 5 – Fonte: Cléo de 5 a 7.............................................................................................. 16 Imagem 6 – Fonte: Cléo de 5 a 7.............................................................................................. 17 Imagem 7 – Fonte: Cléo de 5 a 7.............................................................................................. 17 Imagem 8 – Fonte: Cléo de 5 a 7.............................................................................................. 18 Imagem 9 – Fonte: Cléo de 5 a 7.............................................................................................. 18 Imagem 10– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 19 Imagem 11– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 19 Imagem 12– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 20 Imagem 13– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 20 Imagem 14– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 21 Imagem 15– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 21 Imagem 16– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 22 Imagem 17– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 22 Imagem 18– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 23 Imagem 19– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 23 Imagem 20 – Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................ 24 Imagem 21– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 24 Imagem 22– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 25 Imagem 23– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 25 Imagem 24– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 26 Imagem 25– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 26 Imagem 26– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 27 Imagem 27– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 27 Imagem 28– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 28 Imagem 29– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 28 Imagem 30– Fonte: Cléo de 5 a 7............................................................................................. 29
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INTRODUÇÃO Agnès Varda foi, entre 1948 e 1960, fotógrafa oficial do Théâtre National Populaire, e só depois enveredou pelo cinema. Antes de ser fotógrafa, estudou Pintura. Actualmente trabalha como Artista Visual. Até 1960, Varda não tinha qualquer contacto com a linguagem cinematográfica. Ficou conhecida por ser a única realizadora mulher do grupo da Nouvelle Vague e em certa medida sua precursora, ao trazer um novo estilo de filmar uma história e produzir um filme. Tornou-se um símbolo para as feministas, no meio da indústria cinematográfica europeia. No entanto conseguiu manter-se, muitas vezes voluntariamente, sempre um pouco à margem da atribuição de rótulos – os quais não aceita. A Nouvelle Vague consistiu num movimento cinematográfico que surgiu um pouco ao acaso, entre 1959/ 1960, resultante de contexto geral de reacção ao cinema tradicional francês. Ligado de forma vinculativa à escola crítica dos Cahiers du Cinéma dos anos 50 e a nomes como Claude Chabrol, Jean-Luc Godard, Eric Rohmer, Jacques Rivette, e François Truffaut, este movimento afirmou-se nos anos 60. As obras produzidas resultantes de acontecimentos, ideias, autores, concepções de direcção e orçamentos reduzidos conduziram a uma prática cinematográfica complexa e plena de paradoxos. Ainda assim, tornaram-se referência e influência decisiva para as futuras gerações de cineastas. O termo de Nouvelle Vague foi também aplicado – até de certa forma pejorativamente – para designar um estado de espírito, mais ou menos desprendido, até negligente de realizar um filme – um filme Nouvelle Vague era, neste contexto, um filme realizado por alguém jovem e pouco profissional, mas sempre surpreendente. Frequentemente produtora, argumentista e diretora dos seus filmes Agnès Varda tornou-se um exemplo de autora completa, influência de gerações vindouras de mulheres cineastas, como Marleen Gorris, Dorris Doerrie e Margarethe von Trotta.
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AS CARACTERÍSTICAS DA OBRA CINEMATOGRÁFICA DE AGNÈS VARDA «Interessa-me precisar as coisas surdas, secretas, inexpressas, que existem nos seres» - Agnès Varda «Você sempre tem respostas; é engraçado, eu tenho sempre perguntas...» Cléo para Antoine em «Duas Horas na Vida de uma Mulher»
Esta frase define a obra de Varda, que sempre primou pelo desalinhar face às convenções, tendo uma percepção do cinema muito própria. A sua obra caracteriza-se por um cinema, que mais do que certezas, questiona e propõe momentos de reflexão. São momentos mágicos e suspensos, unindo realismo e poesia. Os seus filmes não deixam alternativa ao espectador senão o processo da descoberta e da busca da compreensão. Varda faz-nos descobrir e dizer o que não está dito, guia-nos o olhar para momentos que habitualmente nos escapam. Plenas de inventividade narrativa e de possibilidades reflexivas, as suas obras resultam belas e originais, assentes sempre na experiência humana e no mundo à volta da sua câmara. Agnès Varda denomina os seus filmes de Cinécriture, uma cinescrita à qual muito se deve a liberdade criativa da autora. Neste contexto, podemos considerar que existe uma procura de originalidade e de afirmação dentro da linguagem cinematográfica. Esta cinescrita resulta de um método de trabalho baseado na associação de ideias, utilizado na montagem. Trata-se de estabelecer ligações entre situações e estabelecer sentidos que não existiriam se essas fossem lidas separadamente. Pode-se afirmar que, neste sentido Varda antecipou o que viria a ser uma das características do cinema da Nouvelle Vague. As artes em geral, a Fotografia e o Cinema, bem como a Literatura, estão sempre presentes quando se fala no percurso artístico de Varda. Mas a Fotografia influenciou de forma marcante os seus filmes, enriquecidos pelo seu olhar fotográfico e pelo hábito de observar, contribuindo para a cineasta concretizar a sua intenção de transformar a realidade em ficção.
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CLÉO DE 5 A 7 – ANÁLISE Cléo de 5 a 7 – em português, Duas Horas na Vida de uma Mulher – é um filme francês de 1962, considerado um clássico da Nouvelle Vague. Lança a discussão sobre temas como a dificuldade humana em lidar com a própria beleza, em lidar com a iminência da morte, com a incerteza de um futuro e com a indiferença dos que nos são mais próximos perante as nossas inseguranças e dificuldades. Este filme conta a história de uma cantora de música pop, à qual foi comunicado um diagnóstico médico sombrio e corresponde no tempo, ao tempo de espera para que ela obtenha a confirmação do mesmo. O enredo passa-se precisamente entre as cinco e as sete horas, acompanhando duas horas da vida de uma aspirante a chanteuse e assistindo aos seus ataques de diva e à sua solidão, à medida que esta vai deambulando sem rumo pelas ruas de Paris dos anos 60 - pelo trânsito caótico, pelos bistros repletos, pelas inúmeras lojas... Não obstante o grande número de imagens que se sucedem continuamente, o ritmo bastante lento e a existência de cenas onde a ausência das palavras é longa, torna o filme difícil de assistir para o espectador que não estiver predisposto a partir à descoberta do que está para lá do óbvio. A história em si é muito simples, mas Varda faz questão de construir momentos que afastam o espectador da estrutura base e o fazem participar nas reflexões, nas informações ou no espectáculo puro. «São 5 da tarde e a cartomante faz o seu jogo (…) é uma viagem, (…) é a morte na última carta.(…) O jogo é sempre o mesmo, em qualquer latitude, em qualquer nível. É velho como o tempo que se escoa no relógio barulhento. E infinito. Mas para Cléo o tempo é finito agora.» (Silva, 1963)
O filme inicia com uma sessão de tarot, a cores [Imag. 1,2,3] e depois passa para o preto e branco, fazendo com essa mudança de valor cromático uma distinção entre o que é real e o que é imaginário. As superstições são uma constante – a consulta de tarot, não usar nada novo às terçasfeiras, ver a morte num espelho partido[ , as máscaras africanas, etc – e servem para confirmar os piores receios da cantora.
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Cléo (de Cleópatra – remetendo para a morte e para a crueldade) tem todos os atributos para atrair a si o mundo: alta, loira, bonita e uma cantora numa fase ascendente da carreira; é mimada e caprichosa. Depois de saber que está doente, a grande preocupação de Cléo é a da possibilidade de ter cancro significar o fim da sua beleza exterior. A constante amoralidade presente nos argumentos dos filmes de Varda que, sem quaisquer julgamentos nos apresenta a verdade de cada personagem, está presente também em Cléo: esta sente prazer na ilusão chegando mesmo a afirmar que a fealdade é uma forma de morte e que enquanto for bela está viva… Cléo, como as restantes personagens de Cléo de 5 a 7 e como todas as outras nos filmes de Varda, é um ser livre que busca a sua felicidade e os seus desejos, ainda que estes se prendam à morte ou ao medo. Por isso, ainda que tenha momentos de escape aos seus sentimentos volta sempre à sua verdade mais profunda. Varda fragmenta fotograficamente as sequências de imagens, pretendendo representar, em cada momento “congelado” os olhares das personagens, ou o seu próprio olhar, ou o dos espectadores sobre determinado objecto visual. É o caso da cena que capta as reacções de Cléo e da sua assistente, diante dos chapéus nas vitrines das lojas parisienses: Cléo deseja-os, como deseja tudo o que é fútil, enquanto a assistente os observa com um olhar de rejeição, provavelmente porque os acha extravagantes demais para usar. Cléo ainda se contrai, ainda não sente, ainda não vê para lá de si. Cléo ainda se esconde nos seus caprichos, ainda se refugia em casa e dos outros. Apresenta-se por isso como uma personagem instável, ora contraindo-se ora expandindo-se nos seus pulsares. Varda constrói uma cena - quase um vídeoclip - onde Michel Legrand surge como um dos compositores que trabalham para Cléo: o compositor contracena com esta, que canta «Sans Toi» (Sem ti). Reforçada pela carga emocional da música, Varda enfatiza a instabilidade da personagem. Apesar de existirem várias pessoas na sua vida quotidiana – uma assistente, amigos e um amante - ela acaba por sentir que todos são indiferentes ao seu sofrimento. A cantora encara pela primeira vez o facto de que é apenas mais uma na vida dos outros e que a vida continuará após a sua morte, inexoravelmente.
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As perguntas que Agnès Varda nos coloca são mesmo essas: as nossas relações interpessoais são autênticas, são verdadeiras? Que importância dar à beleza física? E onde entra a beleza interior? Somos o reflexo do nosso interior ou reflectimos apenas o exterior? Os apelos de Cléo – sem retorno – no sentido de ter a atenção que considerava devida, por parte dos que lhe são mais próximos, mostram a falta de autenticidade dos relacionamentos que construiu na vida. Em dado momento, Cléo tira a sua peruca, deixa o vestido branco e veste-se de preto, é o tempo que se esgota. Decide então sair, vendo a cidade de todos os dias com outros olhos: pela primeira vez arrisca relacionar-se com as pessoas, em vez de se manter distante e resguardada. A nova Cléo vai absorvendo vários fragmentos de vidas e de locais e vai-se reconstruindo. Ela passa pelo café, como por quase todo o filme, como se estivesse num sonho, numa irrealidade enquanto à sua volta a vida real continua, indiferente ao turbilhão de pensamentos que passam pela cabeça de uma mulher jovem com cancro. É com a proximidade da morte que Cléo percebe o quanto está sozinha, ou melhor, que tanto a vida como a morte são caminhos solitários…
O que é o universo? O que somos nós?
Através do trabalho de fotografia e de edição de imagem, o espectador não tem dúvidas que após a morte previsível de Cléo, Paris continuará igual a si própria, as mesas dos bistros continuarão a ser limpas e repostas, os pombos continuarão a empoleirar-se, os amantes a passear, os táxis a «empurrar-se»… O facto de Varda ser fotógrafa transparece em cada momento – Paris raramente terá sido fotografado com tal precisão. No entanto, trata-se de uma narrativa na primeira pessoa. Trata-se de mostrar a verdade mais profunda - o universo é apenas aquilo que é, e que continuará a ser, depois de Cléo morrer, de nós morrermos. Só nos lembramos disso quando confrontados – como Cléo, com algo que desafie a nossa existência.
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«… à medida que o pavor de Cléo aumenta, e consequentemente a sua atenção para com o que a rodeia, um factor subjectivo e limitado se junta ao objectivo e ilimitado: o tempo contrai-se quando Cléo é vista, expande-se quando Cléo vê.» (Silva, 1963)
Varda vai-nos apresentando a transformação de Cléo, cada vez mais Flora (de Flora de Florence, remetendo para o amor e para a vida), recorrendo à introdução de elementos que confirmam a passagem do tempo – ex: o relógio que aparece de forma fugaz, em grande plano, intercalado com os rostos dos transeuntes, quando Cléo vai para o estúdio da sua amiga. Sucedem-se os cortes secos e os travellings. O espectador acompanhá-la-á pelas ruas cheias de cartazes (destacando-se um, a anunciar o filme “Um cão Andaluz” de Buñuel1), num encontro com a amiga Doroteia que posa para escultores e numa visita ao estúdio de Raoul, namorado desta, onde o espectador pode observar o decorrer da rodagem da curta-metragem "Os noivos da Ponte MacDonald", com Jean-Luc Godard e Anna Karina. Enquanto na primeira parte do filme Cléo se relaciona com a sua própria imagem e daí o uso sistemático dos espelhos, na segunda metade do filme Cléo relaciona-se com os outros e as imagens capturadas já o são segundo os seus olhos. Varda regista as «suas» deambulações por Paris de uma forma que não corresponde, quanto à montagem das sequências, à maneira habitual de Hollywood - convencional e discreta. Pelo contrário, Varda mostra tudo. Como diz Richard Roud «Little is omitted, there are no ellipses. The streets and cafes of Paris, the taxis and the cinema, are seen as they really are and as they appear through the eyes of a woman who is tracked by death.» Em Cléo de 5 a 7, cada figurante, cada placa de trânsito, cada nova rua que aparece sugere mais do que uma função, revela um espírito. Agnès Varda baralha a percepção do espectador: na ilusão de movimento, o espectador é guiado pela edição e pelos ritmos de um presente contínuo. Diante da imagem fixa, porém, é trazido de volta si próprio, àquilo que infere da imagem e ao que memoriza das outras imagens já vistas. Quando a imagem fixa subitamente instala-se o passado dentro do presente contínuo do filme.
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Surrealismo
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Reforçam esta intenção: as conversas cruzadas – ex: quando logo após a ida à cartomante, ouvimos a história que Adèle, a assistente de Cléo, conta aos empregados de mesa de um café e, em simultâneo, ouvimos a conversa do casal que na mesa ao lado se zanga; os cortes ritmados pelas acções das personagens e pela música, que acompanha a narrativa – ex: a música aparece em momentos chave – no táxi, no café, em casa, no ensaio; o jogo constante entre narrativa e não narrativa, meticulosamente orquestrado por Varda, atingindo o clímax na cena do café, mais ou menos a meio do filme, em que, por momentos, ficamos sem saber onde se está e quem está – ex: os espelhos que multiplicam as pessoas, as mesas, os objectos e os reflexos que fundem interior com exterior. Ainda nesta cena, Varda enfatiza esta desconexão justapondo os planos médios de Cléo, glamourosos, com os grandes planos das caras vulgares dos clientes do café.
Qual das histórias devemos seguir? Que imagem devemos olhar?
O poder do filme resulta da sua insistência em forçar a coexistência do objectivo e do subjectivo. O filme recorre a dois tempos distintos: o tempo objectivo – o do relógio, o tempo exato - e o tempo subjectivo – aquele que nos parece interminável quando esperamos por algo ou nos parece “correr” quando estamos a fazer algo que gostamos. Varda, famosa por confundir realidade e ficção, quis que sentíssemos o tempo objectivo, mas também o de Cléo, os seus encontros e as suas impressões. (FIGURA DO ANJO)
«São 6.12, Cléo atravessa um parque, cheio de flores, ruídos e crianças O tempo como que pára, e de dentro dele parece surgir António. António (…) tem de comum com aquela mulher apenas uma coisa: o medo; e realmente apenas uma diferença: não tem medo do medo.» (Silva, 1963)
Já próximo do final do filme, reforçando a ideia de transformação de Cléo, esta conhece um soldado de licença, que está prestes a voltar para a Argélia2. Cléo, agora
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A Guerra pela independência da Argélia contra a França durou de 1954 a 1962
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rebatizada por Antoine como Flora, consegue identificar-se com o soldado – que como ela, parece ser uma vítima do destino. A atitude do soldado perante a inevitabilidade do destino acaba por ser uma mensagem de esperança e liberdade para Cléo. Assim, embora o tema seja trágico, o filme não é angustiante. Estranhamente este é o tempo que mais se sente irreal, de tão construído. Embora seja necessária a sua existência para que se concretize a mudança de atitude na cantora, o soldado não é mais importante do que a luz que bate nas árvores do jardim. Então o que aconteceu nesta uma hora e meia de narrativa – em tempo real – que justificasse a transição dentro da protagonista?
A transformação da protagonista só se dá, porque está em contacto com o ambiente, porque o espaço é um mecanismo vivo, em constante modificação. Enquanto ele muda, Cléo muda com ele. Paris constrói Cléo e Paris é construída por ela. Dessa troca, dessa interrelacção entre ambiente e personagem, nasce uma simbiose, dentro da qual os atores se transformam em pessoas e as paisagens em personagens.
«São 6.30, o médico diz: «Dois meses de rádium e isso resolve-se». «É agora o soldado que tem lágrimas nos olhos, é agora Flora que sorri, o seu primeiro grande sorriso». (Silva, 1963)
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CONCLUSÃO
Cléo de 5 às 7, acaba por ser uma lição de vida. Tem as características dos filmes da Nouvelle Vague – a excessiva atribuição de sentidos, a presença de citações, os diálogos cheios de intencionalidade, mas aparentemente banais e é directo, na medida em que parece que nós percorremos, com a realizadora, as ruas de Paris, com a câmara ao ombro. No entanto, tem também as marcas resultantes do olhar tão particular de Varda, um olhar para os detalhes. Segundo Fabrice Revault d’Allones, Cléo de 5 a 7 aproxima-se mais da Nouvelle Vague sobretudo pela sua liberdade iconoclasta, mas retém alguns aspectos bastante clássicos. Assim situa-se entre a nova visão e a visão humanista dos anos 50 (a criança sentada no pátio da casa de Cléo que brinca com um piano, o fascinante comedor de rãs, etc.) A forma que Varda tem de representar o mundo prende-se com a busca, na pureza das imagens capturadas, da essência da alma. O protagonista nos seus filmes é antes de tudo o tempo. A carga de subjectividade nas suas obras é imensa, e para alcançá-la Varda recorre de forma sistemática ao congelamento das imagens, onde encontra possibilidades infinitas de movimento.
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BIBLIOGRAFIA Silva, M., 1963. Cléo de 5 a 7. Seara Nova, Abril.pp. 108-109.
OBRAS CITADAS Silva, M., 1963. Cléo de 5 a 7. Seara Nova, Abril.pp. 108-109.
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ANEXOS
Imagem 1 – Fonte: Cléo de 5 à 7.
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Imagem 2 – Fonte: Cléo de 5 à 7.
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Imagem 46– Fonte: Cléo de 5 à 7.
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