Outro consumo é possível PRODUÇÃO: • Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas - CICAF • Centro de Formação Urbano Rural Irmã Araújo - CEFURIA • Rede de Educação Cidadã - Talher Paraná EQUIPE DE ARGUMENTAÇÃO Irmã Lenita Gripa-cf Irmã Lourdes Maria Schaefer-cf (in memorian) Irmã Olma Caleffi-cf Irmã Maria Armine Panini-cf Antonio Carlos Bez Lourdes Marchi Ana Inês de Souza PESQUISA E REDAÇÃO Gisele Carneiro FOTOS Arquivo Cefuria Arquivo Irmãs Catequistas Franciscanas DESENHOS Rodolfo Silva REVISÃO Márcia Carneiro Knapik DIAGRAMAÇÃO Mainardes Comunicação (mainardes.com) PUBLICAÇÃO Editora Gráfica Popular - CEFURIA ASSISTENTE DE ARTE Thyago Rodrigues da Silva 4
Sopa de letras vivas (João Santiago) A fé, a vida e a cultura Se passam de mãe pra filha Quem sabe cuidar da vida Não joga no lixo a pilha Educar pra liberdade Para a solidariedade Se propõe essa cartilha A vida é uma maravilha Se vivida em comunhão Se quem trabalha governa Os meios de produção Conhecendo a procedência Consumindo com consciência Vivendo a autogestão Formando a associação Criando as cooperativas Escrevendo a própria história Com sopa de letras vivas Empunhando a rebeldia A prática e a teoria Das cadeias produtivas Moedas alternativas Renovável combustível Combatendo o consumismo E o egoísmo irresistível Numa outra economia Com a solidária ousadia 5
Outro consumo é possível
Sumário APRESENTAÇÃO .................................................................. 08 INTRODUÇÃO .................................................................... 09
Parte I
CONSUMO SOLIDÁRIO DIA DE FAZER COMPRAS ..................................................... 15 I CONSUMO....................................................................... 22 1. Cadeia produtiva .................................................... 22 2. Trabalho ............................................................... 25 3. Natureza ............................................................... 26 4. Tipos de consumo ................................................. 28 5. Ética ................................................................... 30 6. Você e o consumo ................................................ 31 II CONSUMISMO ............................................................. 34 1. Doença do consumo ............................................. 35 2. Necessidades para viver ......................................... 36 3. Propaganda comercial ........................................... 37 4. Pesquisas sobre propaganda comercial ...................... 38 5. De olho na propaganda .......................................... 40 6. Outra mídia é possível! ........................................... 41 III ECONOMIA SOLIDÁRIA E O SEU CONTRÁRIO ................. 43 1. Origens da economia solidária ................................ 44 2. Capitalismo ......................................................... 44 3. Sistema capitalista x economia solidária .................... 45 4. Banco capitalista x banco da economia solidária ......... 46 5. Moeda oficial x Moeda Social ................................. 50 6. Agricultura: lucro ou vida? ...................................... 51 7. Desenvolvimento .................................................. 53 6
IV ESCOLHAS DE CONSUMO .............................................. 1. Círculo virtuoso ................................................... 2. Produção local .................................................... 3. Redes solidárias ................................................... 4. Consumo solidário e responsável .............................
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Parte II
EXPERIÊNCIAS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL I MAPEAMENTO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL .... 67 1. Bancos Comunitários .................................................... 68 Banco Palmas – Fortaleza–CE ........................................... 68 Banco Pirê – Dourados–MS .............................................. 69 2. Comercialização e feiras solidárias ................................... 70 Feira de Economia Solidária do Mercosul – Santa Maria–RS .... 71 Supermercado Solidário – Vila Velha- ES ............................. 73 3. Clubes de troca ............................................................ 74 Rede Pinhão–PR ............................................................ 74 4. Cadeia produtiva ecológica – Justa Trama ......................... 75 5. Associação das Padarias Comunitárias .............................. Fermento na Massa–PR 6. Movimentos Sociais ...................................................... Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis ... MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – Grupo de Agroecologia Terra Livre .................................... Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu ....
76 77 78 79 81
II FÓRUM SOCIAL MUNDIAL - FSM .................................. 83 III NÓS PODEMOS...! ...................................................... 85 7
Outro consumo é possível
Apresentação Esta é uma cartilha elaborada a partir do clamor da mãe terra e do universo inteiro que, em seu movimento vital de recriação, conclama homens e mulheres para uma atitude de contemplação, respeito e reverência frente a tudo o que vive. Convoca ao compromisso e ao cuidado da vida em todas as suas formas e expressões. Convida a um novo jeito de se relacionar com as pessoas, com a natureza, os meios de produção e, chama à prática cotidiana do consumo consciente e solidário. Neste momento da história, somos convocados(as) a retomar a criação do universo como um grito que vem de todas as direções e que, de dentro desse movimento, como “voz que clama no deserto”, denuncia a destruição e anuncia novas possibilidades de vida.
“Comece por você mesmo a mudança que propõe ao mundo.” (Gandhi) Em pleno século XXI, estudos apontam que a distribuição das riquezas no mundo acontece assim: enquanto os 20% mais ricos da população mundial são responsáveis por 86% do total de gastos em consumo privado, os 20% mais pobres consomem apenas 1,3%! Mais de um bilhão de pessoas não conseguem satisfazer suas necessidades básicas de consumo, enquanto outras consomem demais!1 Além da injustiça social, o excesso de produção e de consumo causa impactos sobre o ambiente natural e destruição dos recursos do planeta, colocando a vida em risco.
O exercício do consumo ético e solidário nos desafia não apenas a proteger a natureza e os povos mais pobres, mas a buscar um novo caminho para a permanência no planeta. Trata-se de um projeto coletivo e complexo que exige superação dos métodos e formas capitalistas de produção e de consumo.
Você acredita que é possível recuperar e cuidar do planeta? O que fazer para construir solidariedade e justiça social?
Este processo de co-responsabilidade socioambiental implica passos qualitativos na construção de uma sociedade que gere menos desperdício, reduza o consumo e fortaleça práticas de reciclagem, assumindo caminhos coletivos, justos e solidários.
A qualidade das nossas escolhas depende do conhecimento e da informação que temos a respeito das várias opções que existem.
A decisão de nossas escolhas de consumo influencia na geração e manutenção de postos produtivos e tem força decisiva na implementação da qualidade de vida planetária e da sociedade que queremos. “A maneira como consumimos define o tipo de sociedade que queremos construir”. Irmã Tereza Valler-cf * 8
INTRODUÇÃO
* Teóloga e Coordenadora Geral da Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas
Podemos iniciar refletindo sobre nossas escolhas na hora de consumir.
Será que aquele alimento tão bonito, de embalagem alegre e colorida, anunciado na televisão, faz bem para a saúde e para a natureza? Infelizmente, a propaganda comercial está comprometida com o lucro, e por isso, não estaremos bem informados(as), somente a partir do que vemos na TV, revistas, nos cartazes ou outros espaços. 1 Conforme dados do Relatório do Programa de Desenvolvimento Humano da ONU, intitulado “Consumo para o Desenvolvimento Humano”, elaborado em 1998. Ver no site www.pnud.org.br – consultado em 25.02.2009.
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Outro consumo é possível Esta cartilha contém informações simples e dicas que, somadas aos seus próprios saberes, podem ajudar a construir hábitos de consumo para uma forma ética e saudável de viver. Você é convidado(a) a fazer parte de um movimento que se espalha por todo o mundo: as redes solidárias. Redes solidárias conectam pessoas e grupos que propõem e praticam uma forma solidária de produzir, distribuir, consumir e organizar a vida no planeta. Um primeiro passo para entrar nesta rede pode ser praticar o consumo solidário, e assim ajudar a construir uma sociedade justa e ecologicamente equilibrada. Um segundo passo pode ser a troca de informações e de experiências, convidando outras pessoas e grupos a entrarem na rede de solidariedade. Desta forma, vamos construindo, em mutirão, UM OUTRO MUNDO POSSÍVEL.
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Parte I
CONSUMO SOLIDÁRIO “Nas cirandas do povo está nascendo um mundo novo” (Lenita Gripa)
Outro consumo é possível
Dia de fazer compras Vou ao supermercado, você quer ir comigo?
Não, obrigada! Eu não frequento supermercados. À tarde podemos tomar café.
Filas no Supermercado 15
Outro consumo é possível Prefiro consumir produtos de trabalhadores(as) da economia solidária. Dessa forma, contribuo com a construção de uma sociedade diferente. Os produtos de marca geralmente escondem um rastro de destruição e morte. Por exemplo: o que sabe sobre este óleo que você comprou?
Ele estava em promoção. Aproveitei e peguei três.
Depois das compras...
Estou cansado! O mercado estava muito cheio! Filas no estacionamento, filas no caixa! Por que você não freqüenta supermercados?
Porque prefiro fazer as compras aqui mesmo, no bairro. Já faz alguns anos que não piso num supermercado e nem em shopping. 16
Este é um óleo produzido com soja transgênica.2 Faz mal para a saúde, a produção contamina a terra, causa diversos danos à natureza e ainda torna os produtores de sementes dependentes de grandes empresas que detêm a patente.
E este leite em pó que você comprou duas latas? O que sabe sobre ele?
2 Consulte o site do greenpeace. Ali há uma lista de marcas que utilizam transgênicos: www.greenpeace.org.br. (site consultado em 21.02.2009) - Alimentos transgênicos são obrigados a rotular os produtos com o símbolo
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Outro consumo é possível
Neste leite eu confio, porque é de uma marca muito antiga, que tem nome.- E estava barato, comprei logo duas latas.
Este leite que você confia é de uma empresa que está sendo processada por incentivar que as mães não amamentem seus filhos, só para vender mais leite artificial. Esta empresa também é acusada de prejudicar fontes de água mineral no Brasil. Por isso e muito mais, está na lista das empresas mais irresponsáveis do mundo.3
Quanto ao óleo, só compro se for livre de transgênicos. Consigo sempre na loja solidária que fica ali na esquina. Lá também tem o leite Terra Viva e outros produtos bons para a nossa saúde e para a saúde da natureza.
E este detergente de roupa? Por que você escolheu esta marca?
Porque o cheiro é muito bom e faz bastante espuma. Sempre uso esta marca. O leite que eu consumo é da marca Terra Viva, produzido pela Cooperativa Cooperoeste4, dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. É leite da reforma agrária, produzido a partir dos princípios da economia solidária.
Todos anos, acontece em Davos, Suíça, um evento chamado Fórum Econômico Mundial. Participam deste fórum econômico as empresas mais poderosas do planeta, além de chefes de governo. Há um fórum alternativo chamado “Olho Público em Davos” e faz um “concurso ao contrário”, ou seja: prêmios são concedidos aos piores. Informações disponíveis nos sites http://www.observatoriosocial. org.br/boletim/boletim.htm; http://www.sncweb.ch/portugues/arquivo/2005-janeiro/11-b.htm ; http://www.riosvivos.org.br/canal.php?canal=167&mat_id=6612 Sites foram acessados em 08 de fevereiro de 2009. Acompanhe a premiação anual das empresas mais irresponsáveis no site http://www.publiceye.ch (em inglês) 4 Para saber mais sobre a Cooperoeste, acesse o site www.terravivasc.com.br - acessado em 21.02.2009. 3
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Este produto que você sempre utiliza tem dois problemas: o primeiro é que a indústria utiliza animais para fazer os testes, causando muito sofrimento a eles.5 O outro motivo é que este detergente polui a natureza.6 Eu só utilizo detergente ecológico, que não polui as águas e nem faz testes com animais. 5 Ver mais informações nos sites http://www.pea.org.br/crueldade/testes/index.htm . http://www.aila. org.br/denuncias_testes.htm . Estes sites contêm uma lista de empresas que fazem testes em animais. Sites acessados em 08 de fevereiro de 2009. 6 Há detergentes que poluem as águas e causam morte da fauna marinha. Mais informações no site http://www.verbeat.org/cgi-local/mt4/mt-search.cgi?IncludeBlogs=34&search=bid%C3%AAs - acessado em 08 de fevereiro de 2009
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Outro consumo é possível SE O PRODUTO ESTÁ EM PROMOÇÃO? A PROPAGANDA QUE PASSA NA TELEVISÃO? A COMPOSIÇÃO DO PRODUTO? A EMBALAGEM? O HÁBITO DE COMPRAR SEMPRE DA MESMA MARCA? O HÁBITO DE COMPRAR SEMPRE NOS MESMOS LUGARES?
Aqui na comunidade tem uma loja solidária que vende produtos de limpeza produzidos por mulheres da economia solidária. Todos são produtos ecológicos e lá ainda aceitam moeda social!
Leia esta cartilha e vamos, juntos e juntas, refletir sobre estas questões e descobrir uma forma diferente de ser e de viver.
O que é mesmo moeda social? E economia solidária?
Vou lhe explicar direitinho. Você vai descobrir que não precisa mais sofrer nos supermercados, há muitas coisas boas à nossa volta!
E VOCÊ? CONHECE A ECONOMIA SOLIDÁRIA? A MOEDA SOCIAL? COMO VOCÊ ESCOLHE O QUE VAI COMPRAR? O QUE LHE ATRAI NUM PRODUTO?
20 O PREÇO? A MARCA? 20
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Outro consumo é possível
I CONSUMO Segundo o Dicionário “Aurélio”, consumo é a utilização de mercadorias e serviços para satisfação das necessidades humanas. Quando vamos ao supermercado ou a uma loja solidária adquirir produtos que necessitamos, estamos sendo consumidores ou consumidoras. O consumo faz parte da cadeia produtiva.
Quando se extrai da natureza mais do que ela suporta, a vida do planeta fica ameaçada.
1. Cadeia Produtiva
b) Produção - Os bens, depois de extraídos da natureza, precisam ser processados para se transformarem em produtos. Trata-se da produção. Na fase da produção é comum a utilização de agentes químicos, que podem ser prejudiciais à saúde e causar poluição quando os resíduos tóxicos são lançados na natureza. c) Distribuição - Depois de prontos, os produtos precisam ser distribuídos para os locais onde serão consumidos. Eles irão para lojas, mercados, mercearias, feiras... Podem também ir para outros países, outros continentes.
Cadeia produtiva é o caminho que os produtos percorrem desde a extração da matéria prima para a produção até o retorno à natureza.
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a) Extração - É o ponto de partida da cadeia produtiva. É retirar da natureza o que se necessita para produzir as coisas. Por exemplo: árvores para fabricar papel, minérios para os eletroeletrônicos.
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Outro consumo é possível d) Consumo - Depois de distribuídos, os produtos são comercializados. É neste momento que você, leitor ou leitora, participa ativamente da cadeia produtiva. Quando vamos às compras, todos(as) nós somos consumidores e consumidoras.
Excesso de Lixo
2. Trabalho Podemos escolher comprar produtos que foram produzidos perto do local onde moramos ou então adquirir os que vêm de fora. Ao escolhermos consumir produtos do local onde moramos, ajudamos a desenvolver a nossa região, porque a riqueza passa a circular na própria comunidade. e) Retorno à natureza – Depois de consumidos, os produtos retornam à natureza, transformados. Se houve utilização de agentes químicos tóxicos na sua fabricação, o ambiente sofrerá alterações. 24
O excesso de lixo e sua destinação são, hoje em dia, um grande problema ambiental.
Em todas as etapas da cadeia produtiva, existe trabalho. Este trabalho pode ou não ser uma atividade digna e construtora de vida. Por exemplo: determinada fábrica, que produz um tênis bonito e famoso, pode ter utilizado trabalho escravo ou infantil na etapa da produção, gerando dor e sofrimento para muitas famílias. Outro exemplo: uma camisa bonita e confortável pode ter sido produzida por um grupo de pessoas que trabalham num ambiente de igualdade e de fraternidade. Neste caso, o trabalho é construtor da vida, porque garante a sobrevivência, relações afetivas e realização pessoal. Se você consumir o tênis obtido a partir do trabalho infantil, estará contribuindo para que esse tipo de exploração continue e 25 até aumente.
Outro consumo é possível Se você adquirir camisas produzidas pelo grupo de pessoas que atuam de forma solidária, estará contribuindo para que esta forma de trabalho em grupo se fortaleça.
Qual é a melhor escolha? 3. A natureza A natureza é essencial na cadeia produtiva. Dela se extrai o que é necessário para a produção. A natureza pode ser vista de duas formas: como mercadoria, depósito de lixo ou como uma “mãe” que precisa ser respeitada e cuidada, porque é fonte de vida. a) Natureza não é mercadoria A natureza é tratada como mercadoria quando: • dela se extrai mais recursos do que pode suportar, retirando suas possibilidades de se renovar; • coloca-se preço em bens que são dos seres vivos em geral (água, terra, matas, dentre outros) • são lançados no ambiente agentes químicos e resíduos, considerados lixo, que causam poluição; • há agressão aos seres vivos, fauna, flora e à biodiversidade. Exemplos de agressões: desmatamentos, queimadas, agrotóxicos, transgênicos, extração desordenada de minerais, exploração de animais, lançamento de resíduos da produção. Os países mais ricos já destruíram tudo ou boa parte do próprio ambiente. Por isso, instalam suas fábricas nos países que ainda 26 têm muitos recursos naturais. O Brasil é um bom exemplo disso.
Você conhece ou já ouviu falar de alguma grande empresa que prejudica a vida? Qual? O que ela produz? Qual o dano que ela causa? Você consome o que ela produz?
b) Descartáveis e descartados A economia capitalista segue uma lei: produzir muito e vender muito. Quanto mais se produz, mais se vende. Dizem que assim a economia fica “aquecida”. Para que haja muitas vendas, é preciso que os produtos tenham pouco tempo de vida. Muitos são feitos para serem logo substituídos. Isso acontece com os descartáveis (copos, pratos, garrafas etc.) e também com aparelhos elétricos ou eletrônicos, que já são feitos para durar pouco. Há, também, produtos que são descartados porque saíram da moda ou porque a tecnologia criou outros mais avançados. Por exemplo: roupas, acessórios, calçados, aparelhos eletrônicos e outros. A superprodução e o consumismo estão esgotando as reservas naturais do planeta. Esta forma de ver e tratar a vida como se fosse uma mercadoria tem relação com a visão capitalista, que em tudo vê possibilidades de lucro. c) Mãe natureza, fonte de vida É possível atender às necessidades das pessoas e ao mesmo tempo cuidar dos seres vivos e do ambiente. Por exemplo: a produção de alimentos pode se dar a partir da agroecologia. Esta forma de cultivo protege e recupera a natureza, 27 além de produzir alimentos saudáveis.
Outro consumo é possível
Você conhece pessoas ou grupos que produzem alimentos sem utilizar agentes químicos? Conhece alguma forma de produção que não cause poluição?
Resíduos orgânicos podem ser utilizados na agricultura, e resíduos sólidos podem ser tratados e reaproveitados. A produção deve ser pensada para atender às necessidades humanas e não obter lucro. É possível retirar da natureza somente o necessário para que todos e todas tenham o suficiente. “Viva de forma simples para que outros possam simplesmente viver.” (Gandhi)
4. Tipos de consumo7 Há quatro tipos de consumo: a) Consumo alienante Consumo alienante é quando a compra se dá por influência da televisão, rádio, jornais, dentre outros meios. Muitas vezes, não há necessidade de comprar, mas a propaganda faz as mercadorias surgirem como se fossem uma solução, um remédio para todos os males e problemas. Sinônimo de felicidade e realização pessoal. Utiliza-se imagens sedutoras, com símbolos das marcas famosas. De tanto que são expostas em todos os locais, acabam por penetrar 28
Esta é uma classificação proposta por Euclides MANCE, na obra A Revolução das Redes. Editora Vozes, Petrópolis, 2000, 220 pág.
no subconsciente das pessoas, formando hábitos de consumo e gerando lucro às grandes empresas. Você costuma praticar o consumo alienante? Já parou para refletir sobre aquilo que compra de forma “automática”, sem pensar? Já parou para perguntar sobre a procedência daquilo que está adquirindo? Procedência do produto significa: em que lugar ele foi fabricado, como foi fabricado, quem trabalhou, como foi feito esse trabalho. São os passos da cadeia produtiva, a história do produto.
b) Consumo compulsório Consumo compulsório é praticado quando as pessoas são obrigadas a satisfazer suas necessidades, mas não têm possibilidades de escolha. Compram motivadas pelo preço menor e não pensam na qualidade ou procedência do produto. Precisam obter o máximo e gastar o mínimo. Preços baixos podem esconder conteúdos perigosos para a saúde e para a natureza, como alimentos transgênicos, contaminados por pesticidas e outros agentes nocivos. Podem esconder, também, uma cadeia produtiva repleta de crueldade contra trabalhadores e trabalhadoras. O consumo compulsório tem relação com o consumo alienante, porque há o sonho de obter produtos anunciados nas propagandas, caros e de marca famosa. c) Consumo para mediação do bem-viver
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Consumo para mediação para o bem-viver se dá quando se
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Outro consumo é possível adquire produtos necessários, que fazem bem à saúde, trazem conforto, bem-estar e qualidade de vida. Quem consome para o bem-viver não se influencia com a mídia, com a aparência dos produtos e nem com a embalagem. Também não se deixa levar pelas “ondas” da moda. Consumir para o bem-viver é importante, mas não é suficiente! É preciso ir além e praticar também o consumo solidário! d) Consumo Solidário Consumo solidário é aquele que leva em conta o cuidado com a natureza, o próprio bem viver, o bem viver das outras pessoas, o bem viver da comunidade, do país, o fortalecimento da economia solidária. Adiante, trataremos do consumo solidário.
5. Ética Ética vem do termo ethos, que quer dizer modo de agir, de ser, de cuidar do que é de todos(as). Ação ética é aquela considerada “boa” para os indivíduos, para a sociedade, para a vida. Somos éticos e éticas quando cuidamos da vida. “O cuidado é uma relação amorosa para com a realidade; anula as desconfianças e confere sossego e paz a quem o recebe. Onde há cuidado, não há violência. E tudo o que amamos, também cuidamos.” (Leonardo Boff)8 Leonardo Boff nos diz que é preciso cuidar, o que envolve: 30
Do Iceberg à Arca de Noé. O Nascimento de uma Ética Planetária. Editora Garamond, Brasil, 2002, 160 páginas. 8
• Cuidar de todos os seres vivos: pessoas, animais, plantas, o planeta... • Não permitir que destruam ou prejudiquem a vida. Por isso, o ato de consumir pode ou não ser um ato ético. Pode ou não estar a serviço do que é “bom”, pode ou não estar a serviço da vida. Boicotar empresas que patrocinam guerras, que se beneficiam do trabalho escravo ou do trabalho infantil, que expulsam povos indígenas, pequenos agricultores e agricultoras de suas terras e maltratam a natureza, é dever ético. “A maneira como consumimos define o tipo de sociedade que queremos construir” (Joaquim de Melo)
6. Você e o consumo Você é convidado/a a mudar os hábitos de consumo dentro de sua casa, no trabalho e na comunidade. Você poderá se juntar com as pessoas que amam a vida e cuidam do planeta. Veja como é fácil! Reduzir o consumo - consumir somente aquilo que precisa, sem desperdícios. Por exemplo: • Não deixar luzes acesas sem necessidade; • Desligar sempre os aparelhos que não estiverem sendo utilizados; • Economizar água da torneira e do chuveiro; • Usar pilhas recarregáveis ou alcalinas.9 Reutilizar - evitar adquirir novos produtos, reutilizando o que já possui. 9 Pilha e baterias não podem ser recicladas e são resíduos perigosos. Por isso, devem ser depositadas em locais adequados. Veja na sua comunidade os locais que fazem a coleta deste tipo de material.
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Outro consumo é possível Por exemplo:
No mundo todo, utiliza-se as seguintes cores para a coleta seletiva:
• Folhas de papel podem ser usadas nos dois lados; • Objetos sem uso podem ser doados ou trocados por outros; • Potes, garrafas, latas e outros objetos podem ser utilizados de forma criativa para artesanato; • Roupas podem ser reformadas. Reciclar - Quando não for mais possível reutilizar, então reciclar. É possível em casa, separar os resíduos (lixo) orgânicos dos secos. O resíduo seco reciclável pode se transformar em novos produtos e, dessa forma, se evita retirar mais matéria prima do meio ambiente. Os catadores e catadoras de materiais recicláveis garantem o sustento de suas famílias com esses resíduos e são as pessoas responsáveis por sua transformação. Entregando a eles(as) os resíduos secos produzidos em nossa casa, no trabalho e na comunidade, contribuímos com a vida dessas pessoas e para a preservação da natureza.
Outras dicas: • Utilizar objetos até o fim de sua vida útil; • Em casa, evitar construir calçada. A terra precisa estar livre para respirar, para absorver a água da chuva, alimentando os lençois freáticos (águas subterrâneas) e aumentando a umidade do ar. A calçada torna o solo impermeável, fazendo com que a água da chuva escorra para os ralos. Em pouco tempo, as ruas e os rios se alagam, causando inundações; • Preferir adquirir produtos com embalagens retornáveis; • Preferir utilizar transportes públicos, contribuindo para descongestionar o trânsito e emitir menos poluentes no ar; • Exigir que o poder público construa ciclovias para diminuir a poluição.
Mudança individual não é suficiente
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Lixo orgânico: restos de alimentos, folhas, plantas secas, cascas, bagaços de frutas e verduras. Resíduo seco reciclável: papel, metal, plástico, vidro, madeira.
Quem mais polui e destroi a natureza são as grandes empresas. Ao mesmo tempo em que fazemos nossa parte, também precisamos denunciar e fiscalizar as empresas que causam destruição no “atacado”. 33
Outro consumo é possível
II CONSUMISMO Meu marido quer me internar num hospital psiquiátrico! O médico diz que eu estou doente!
Doente? Mas você está com uma ótima aparência!
CONSUMISMO é quando se busca satisfação comprando coisas que não são necessárias. Pessoas consumistas, gastam tudo o que têm para obter coisas supérfluas que, muitas vezes, ficam guardadas, sem uso. Utilizam crediário, pegam dinheiro emprestado, deixam de pagar contas da casa para satisfazer o grande desejo: o de comprar, comprar, comprar. Quanto mais compram, mais querem, porque descobrem que aquele produto ou serviço não trouxe a satisfação esperada. Ou então, o produto satisfaz, mas logo surge o desejo por outro ainda mais novo, avançado, de moda. O último lançamento!
1. Doença do consumo Vou explicar-lhe o que é a minha doença: Eu não consigo parar de comprar. Vou ao supermercado, vou ao shopping e preciso comprar aquelas coisas maravilhosas que a televisão mostra. Se não compro, fico desesperada!
Existe uma doença chamada “doença do consumo” ou “oneomania”10. Pessoas com esta doença precisam de tratamento psiquiátrico e tomam antidepressivos, porque apresentam três sintomas: • Desejo irresistível de comprar; • Endividamento pelo descontrole nas contas; • Sofrimento devido a esse endividamento e a essa dependência.
Mas você tem tanto dinheiro assim, para comprar tudo o que quer?
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Esse é o problema! Quando não tenho, faço crediário ou peço dinheiro emprestado. Eu e meu marido estamos endividados e o médico diz que estou doente!
Quem sofre de oneomania vive uma constante pressão interna, Oneomania é uma doença que atinge principalmente as mulheres. É comparada à dependência das drogas. Pessoas não conseguem parar de comprar e se endividam até perder o controle do orçamento doméstico. Há uma irmandade chamada Devedores Anônimos que auxilia estas pessoas a se livrarem da dependência. Informação disponível no site http://www.adroga.casadia.org/grupos/devedoresanonimos.htm - acessados em 08 de fevereiro de 2009. 10
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Outro consumo é possível um estado de ansiedade que leva a fazer compras. Enquanto está comprando, surge a sensação de alívio e prazer que logo se acaba e o processo recomeça. É uma dinâmica parecida com a dependência das drogas. Marketing e propaganda podem ter papel fundamental no surgimento e agravamento desta doença. Produtos de marca famosa, geralmente desnecessários, são apresentados pelo marketing e propaganda comercial como fundamentais para a sobrevivência das pessoas. Já vimos que consumo significa “utilização de mercadorias e serviços para satisfação das necessidades humanas”.
consumir e, assim, conseguir a felicidade. Será isso de fato? Os meios de comunicação convidam e insistem, sob diversas formas, para que as pessoas comprem cada vez mais. Assim contribuem para o consumismo e as chamadas “doenças do consumo”. Lembrando as palavras de D. Helder Câmara: “A mãe terra pode satisfazer a necessidade de todas as pessoas, mas é incapaz de saciar a ganância de um único ser humano...”.
3. Propaganda Comercial
Mas, afinal, o que são as necessidades humanas?
2. Necessidades para viver A vida humana nasce do chão da terra e se recria ao alimentarse desse mesmo chão (húmus). Nessa relação com a mãe terra e com o cosmos, homens e mulheres satisfazem necessidades básicas de água, ar, alimento, luz do sol, segurança. Mas as pessoas também criam outras necessidades que podem contribuir para viver melhor, como a necessidade de casa, roupas, diversão, trabalho... Nessa busca para viver humanamente, também nascem como necessidades, o afeto, o amor, a solidariedade, a comunicação e a interação, possibilitando a formação de grupos e o fortalecimento das relações entre os diferentes grupos e culturas.
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Olhando para essas necessidades, podemos logo perceber que, algumas coisas que necessitamos, podemos comprá-las. Por exemplo, uma roupa ou uma casa, pode estar à venda, mas um abraço, uma palavra amiga, não. Algumas pessoas pensam que basta ter dinheiro para poder
Mãe, me ajuda a fazer lição? Mãe, pai...
O que você quer mesmo, minha filha? Quero cola 37
Outro consumo é possível A propaganda comercial desperta grande desejo por adquirir produtos anunciados, e as pessoas muitas vezes compram de forma automática, seduzidas por imagens e promessas. Passam a acreditar que serão felizes, bonitas e bem sucedidas se tiverem este ou aquele produto, ou se contratarem este ou aquele serviço. Para vender mais e mais produtos e serviços, é preciso convencer as pessoas a comprar. Existem ciências que estudam esta “arte”. Em uma faculdade, no curso de publicidade, um professor falou aos alunos no primeiro dia de aula: “Esqueçam que Deus criou o mundo. Nós, publicitários, é que criamos um mundo com as necessidades que queremos, para que as pessoas comprem nossos produtos.”
Você concorda com esse professor?
sucos artificiais, salgadinhos de pacote, biscoitos recheados, bolo, lanches rápidos. Ao mesmo tempo, há um aumento assustador de casos de obesidade, diabetes, hipertensão. A crianças são as maiores vítimas! Os comerciais de TV bombardeiam adultos, crianças e adolescentes de todos os jeitos, seduzindo e “fabricando” desejos e necessidades. Um estudo mostra que crianças e adolescentes de até 12 anos têm dificuldades de separar o programa que estão assistindo da propaganda comercial. Ou seja: enquanto elas estão assistindo a um desenho ou programa infantil, percebem a propaganda comercial como parte integrante daquele desenho ou programa. Não percebem aquilo como sedução, com o objetivo de lucro.12 Crianças, portanto, são vítimas frágeis e indefesas, e por isso a mídia se aproveita deste fato, direcionando propagandas a elas. Adolescentes também são alvos de toda a pressão exercida pelas propagandas comerciais.
4. Pesquisas sobre propaganda comercial Foi realizada uma pesquisa sobre propaganda comercial de alimentos no Brasil. Descobriu-se que 72% destas propagandas na televisão têm mensagens que levam a consumir produtos que fazem mal à saúde.11 Desses produtos nocivos, os campeões foram balas, chicletes, Pesquisa realizada pelo Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição (Opsan) da Universidade de Brasília (UnB). Ver sites: http://www.alana.org.br/CriancaConsumo/NoticiaIntegra. aspx?id=5279&origem=23, http://www.pmf.sc.gov.br/portal/noticias/procon/?acao=listar&id_noticia=4939. Acessados em 22 de fevereiro de 2009 11
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A adolescência é uma etapa da vida marcada por conflitos, crises, angústias, pelo desejo de se afirmar, de ser aceito ou aceita pelo grupo. Em meio a todos esses sentimentos e mudanças, a mídia exerce grande influência. Faz pressão para que se busque a satisfação das necessidades e alivio dos problemas através da compra de produtos de marca. Conforme estudo do sociólogo sueco Erling Bjurstrom, sobre os efeitos dos comerciais de TV sobre crianças. Ver site (em inglês) http://www.konsumentverket.se/Documents/in_english/children_tv_ ads_bjurstrom.pdf - acessado em 22.02.2009. 12
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Outro consumo é possível
5. De olho na propaganda Há grupos e entidades que se preocupam com os efeitos nocivos da mídia na vida das pessoas, e criam espaços de denúncias e campanhas, das quais podemos participar. Em 2002, a partir da XII Conferência Nacional de Direitos Humanos, surgiu uma campanha chamada “quem financia a baixaria é contra a cidadania”. O objetivo é defender princípios éticos e direitos humanos na televisão brasileira. É possível ligar gratuitamente e fazer a denúncia. Quem financia a baixaria é contra a cidadania!
Ligue 0800 619619 e denuncie! Há também o INSTITUTO ALANA, entidade que recebe denúncias relacionadas às propagandas direcionadas ao público infantil. O Instituto Alana já moveu e move processos contra marcas conhecidas. As acusações principais são: erotização precoce das crianças, incentivo ao consumismo, ao consumo de alimentos nocivos à saúde, incentivo à delinquência, à violência, etc. “De acordo com a interpretação conjunta da Constituição Federal, do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Código de Defesa do Consumidor, a legislação brasileira já proíbe qualquer tipo de publicidade dirigidas às crianças. Ao vedar a publicidade abusiva, o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor repu40
dia expressamente a mensagem publicitária que se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança.”13
6. Outra mídia é possível Quando a mídia estiver a serviço da vida e não do capital, será possível avançar na construção de uma sociedade diferente. Imagine os meios de comunicação ajudando a propagar práticas e valores de solidariedade! Já pensou em programas de televisão que, ao invés de estimularem a competição entre as pessoas, incentivem a cooperação? E os intervalos sendo utilizados para dar informações sobre direitos sociais, acesso a serviços públicos, ao trabalho e condições dignas de vida, sobre participação popular? Isso não acontece porque as poucas famílias que dominam os meios de comunicação estão comprometidas com as grandes empresas. Essas grandes empresas utilizam todos os espaços possíveis para anunciar seus produtos. Os meios de comunicação têm manipulado a opinião pública, propagando o consumismo, circulando idéias e propostas que interessam ao grande capital. Há movimentos que lutam pela democratização dos meios de comunicação, que buscam construir uma “outra mídia possível”.
Fórum Nacional pela Democratização da informação - www.fndc.org.br Extraido do site do Instituto Alana - www.alana.org.br. Acompanhe também neste site os processos contra empresas e faça sua(s) denúncia(s). 13
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Outro consumo é possível Rádios Comunitárias têm sido uma importante ferramenta democrática para a divulgação de notícias, valorização da cultura e identidade local, para incentivar a participação popular, a reivindicação de direitos, para divulgar a economia solidária.
III ECONOMIA SOLIDÁRIA Economia vem de oikos = casa, moradia Nomos = administração, organização, distribuição. Ou seja: o sentido do termo tem relação com a administração da casa. Podemos considerar casa como nosso corpo, nossa residência, a comunidade ou o planeta que habitamos. A palavra economia também significa “ciência que estuda a produção, distribuição e consumo de bens e serviços”.14 Solidariedade se refere aos laços de interdependência entre seres vivos. No caso específico de seres humanos, solidariedade significa as relações de responsabilidade e cuidado uns com os outros e com a vida, de modo geral. Uma sociedade se organiza de forma solidária se a produção, distribuição e consumo de bens e serviços acontecer numa relação de responsabilidade, de troca, valorização e cuidado com o ser humano e com a natureza.
Nas autênticas Rádios Comunitárias, ouvintes não são meros receptores(as) de mensagens e não são convidados(as) a participar apenas para escolher músicas. Ao contrário: são protagonistas, são agentes de comunicação! A comunidade pode e deve incentivar a criação e manutenção de rádios comunitárias, ocupando os espaços de direito, comprometendo-se com a qualidade da transmissão.
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Quando dizemos experiências de “economia solidária” estamos nos referindo a grupos de trabalho que se organizam de forma cooperada, igualitária, democrática. Podem ser cooperativas, grupos de produtores e produtoras, clubes de troca, etc. A economia solidária também pode acontecer entre trabalhadores e trabalhadoras individuais ou familiares, que se agrupam periodicamente para comercializar, trocar, dialogar, refletir, interagir, se fortalecer mutuamente. Nos grupos de economia solidária não há patrões, patroas, empregados ou empregadas. Todos e todas têm responsabilidades e decidem juntos(as) sobre questões do grupo. Por exemplo: como, 14
Definição encontrada no Dicionário “Aurélio”
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Outro consumo é possível o que e onde produzir; como e onde comercializar; de que forma realizar a trocas; como dividir e aplicar o dinheiro que é de todos e todas... Esta forma igualitária de se organizar e de se relacionar se chama autogestão.
1. Origens da economia solidária A economia solidária surgiu na Inglaterra, no século XIX, como um movimento social dos trabalhadores e trabalhadoras em luta contra o capitalismo. Eram inúmeros operários e operárias das indústrias, que se revoltavam contra a exploração de homens, mulheres e crianças, obrigados a trabalhar até 18 horas diárias, recebendo salários de fome. Estes trabalhadores e trabalhadoras saíam das fábricas, uniam-se aos sindicatos e formavam cooperativas: espaços alternativos onde trabalhavam em igualdade, de forma solidária, sem chefes, sem patrões e sem empregados.
A economia solidária utiliza palavras e termos bem diferentes, que expressam práticas e valores: grupo, trabalho, cooperação, solidariedade, autogestão, afeto, partilha... Estas palavras têm relação com o coletivo, com a participação. Demonstram o jeito de ser, de se relacionar e de viver em comunidade.
3. Sistema Capitalista X Economia Solidária
Sistema Capitalista
Economia Solidária
Utiliza-se o “eu”
Utiliza-se o “nós”
Tudo pelo lucro e a propriedade
Tudo pela vida
Esperteza, egoísmo, individualismo
Solidariedade, fraternidade Cooperação - acolher e agregar pessoas ou grupos
O objetivo ia além do trabalho solidário. A busca era a de transformar a sociedade inteira.
Competição e concorrência eliminar pessoas ou grupos
Economia solidária, portanto, é uma luta antiga contra o modelo capitalista de se organizar. São práticas que querem dizer: não aceitamos este modelo, queremos outro!!!
Trabalho humano é mercadoria
Trabalho de vida
Acumulação de riqueza, propriedade privada
Partilha de coletiva
Natureza é mercadoria e precisa ser explorada
Natureza é vida e precisa ser cuidada.
Hierarquia
Autogestão
Patriarcado
Homem e mulher participam em igualdade
2. Capitalismo Toda vez que ouvimos ou falamos palavras como emprego, mercado de trabalho, lucro, patrão, empregado, concorrência, propriedade privada etc., estamos usando palavras e termos que expressam valores e práticas capitalistas. 44
Estas palavras e frases têm relação com um jeito de ser egoísta, competidor, individualista.
Há também ditados populares e frases que são típicas do capitalismo: tempo é dinheiro; levar vantagem; a lei do mais forte; dinheiro traz felicidade...
-
humano
bens,
é
construtor
propriedade
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Outro consumo é possível
ENQUANTO O SISTEMA CAPITALISTA VIVE EM FUNÇÃO DO LUCRO, A ECONOMIA SOLIDÁRIA ESTÁ A SERVIÇO DA VIDA!
Em todo o mundo há grupos que se organizam a partir de princípios comuns e buscam construir uma outra economia mundial, como bancos comunitários, agroecologia, produção coletiva autogestionária, dentre outras.
No sistema capitalista, “dinheiro fabrica dinheiro”. Quanto mais se tem e se aplica, mais se ganha. Por outro lado, quanto mais as pessoas se endividam, mais perdem e se empobrecem. Os grandes bancos estão, hoje, na lista dos grupos mais poderosos do planeta porque são verdadeiras “indústrias de dinheiro”.
4. Banco capitalista X Banco da economia solidária Você já foi abordado(a) na rua por pessoas oferecendo crédito? Já insistiram para você fazer cartão de crédito em lojas, mercados e bancos? Já caiu numa dessas armadilhas e ficou endividado(a), sem saída? Por que o dinheiro está tão “fácil”, e por que é tão difícil pagar as dívidas que se contrai? A lógica que comanda as ações financeiras no capitalismo é a lógica do lucro. Altas taxas de juros, elevadas taxas de crédito fazem 46 com que seja um negócio muito lucrativo emprestar dinheiro.
Será que todos os bancos são iguais?
Nem todos os bancos são ou precisam ser iguais. Existem os bancos comunitários! Bancos comunitários são projetos que surgem a partir de iniciativa popular. Têm como objetivos: • Valorizar o potencial de cada comunidade;
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Outro consumo é possível • Dar oportunidade a pessoas e grupos de economia solidária para produção e prestação de serviços; • Gerar renda; • Elevar auto-estima; • Promover o desenvolvimento local; • Incentivar a criação de novas experiências de economia solidária.
Banco Capitalista
Banco Comunitário
Dinheiro “viaja” para longe
Dinheiro ou moeda social fica na própria comunidade.
Melhores clientes são as pessoas mais ricas
Para ser considerado banco comunitário, a instituição deve ter como princípio a oferta de crédito visando, principalmente, ao fortalecimento da produção e do consumo local.
Todos e todas tem acesso aos produtos que o banco oferece, independente da situação financeira ou classe social
Promove a riqueza dos grupos mais poderosos do Planeta
Promove o bem viver das pessoas da comunidade
Os bancos comunitários pertencem à comunidade, que também é responsável por sua gestão.
Precisa vender produtos para dar lucro aos sócios e acionistas
Precisa atender às necessidades da comunidade
Hierarquia no trabalho: pessoal da limpeza está abaixo de atendente, que está abaixo do caixa, que está abaixo de supervisor e supervisora, que estão abaixo da gerência, que está abaixo da presidência...
Autogestão no trabalho: um grupo da própria comunidade assume a responsabilidade pelas tarefas, sem empregados e nem patrões. Sem chefes e sem subordinados. Todos e todas são iguais
Relação de competição entre bancos e entre trabalhadores e trabalhadoras;
Relação de cooperação e solidariedade entre todos e todas.
Oferta de crédito para lucrar
Oferta de crédito para fortalecer a produção local, a comercialização, o consumo solidário.
Acionistas resolvem sozinhos como aplicar o dinheiro e que decisões tomar
Comunidade, ou um fórum popular resolvem juntos como aplicar o dinheiro e que decisões tomar
Os bancos comunitários utilizam a moeda social. Esta moeda garante que a riqueza irá circular na região, favorecendo a população local. Veja alguns produtos que os bancos comunitários oferecem: • • • •
Moeda social;. Crédito para o consumo e para a produção solidária; Cartão de crédito Formação para a economia solidária.
Quando adquirimos produtos e crédito do mercado capitalista, estamos contribuindo para que a riqueza “escorra” para fora da comunidade, que é onde as pessoas estão trabalhando, se organizando, lutando pela sobrevivência. Quando adquirimos produtos e crédito dos bancos comunitários, estamos contribuindo para o desenvolvimento da própria região.
48
49
Outro consumo é possível
5. Moeda oficial X Moeda social Moeda social é um instrumento estratégico utilizado em clubes de troca, nos bancos comunitários, no comércio local. Tem como objetivo ampliar e valorizar a produção e consumo na comunidade, no município, na região, gerando trabalho e renda. A moeda oficial (no Brasil, o Real) é geralmente vista como um “deus”. Por ela, algumas pessoas chegam até a cometer crimes porque acreditam que dinheiro é o maior objetivo da vida e fazem de tudo para obtê-lo. Diferente da moeda oficial, a moeda social não é taxada com juros e não deve ser acumulada. Ela serve para ajudar a distribuir e fazer circular a riqueza e não para concentrar. Por isso, a moeda social contribui para que haja justiça social. Existem várias moedas sociais no Brasil e no mundo, com diferentes nomes. Nos locais onde há bancos comunitários, as pessoas adquirem produtos e serviços de estabelecimentos cadastrados, utilizando moeda social.
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Dessa forma, a região se desenvolve, porque as riquezas passam a circular por perto, e todos e todas se beneficiam dela.
No final de 2008, o Brasil registrou 37 bancos comunitários em funcionamento e filiados a uma rede chamada Rede Brasileira de Bancos Comunitários.15
6. Agricultura: lucro ou vida? Agroecologia é um estilo de agricultura, com base ecológica. Visa utilização prudente dos recursos naturais e busca uma convivência harmoniosa entre todos os moradores do planeta. A produção de alimentos se liga em uma visão de mundo diferente, e motiva práticas que demonstram ser possível seres humanos cuidarem da natureza, da comunidade e ao mesmo tempo produzirem os alimentos necessários. A agroecologia vem construindo uma unidade, uma cooperação solidária e muito forte entre o saber e a prática indígena e camponesa e o saber acadêmico-científico Já o agronegócio é estilo de agricultura que visa lucro. Na hora de escolher o que produzir, como produzir, para que e para quem, o agronegócio vai optar pelo que gera mais lucro, sem levar em conta impactos ambientais ou as necessidades humanas. Por exemplo: arroz e feijão são a base da alimentação das pessoas. Desde l992, a produção destes alimentos não cresce, porque o agronegócio investe no que é mais lucrativo, como produzir cana-de-açúcar para combustível, eucalipto para papel, grãos para ração que vai alimentar animais, que serão consumidos pelas populações mais ricas do planeta.16 A seguir, página 52, quadro comparativo entre agronegócio e agroecologia.
Pirapirê - Moeda Social de Dourados-MS
Dados extraídos do jornal Le Monde Diplomatique Brasil, produzido para o Fórum Social Mundial realizado em Belém/PA. Janeiro de 2009. pág. 24. 16 Ver Jornal Brasil de Fato, nº 271, 08 a 14 de maio de 2008. “Produção de arroz e feijão não cresce desde 1992 no Brasil” – Dafne Melo 15
51
Outro consumo é possível
Agronegócio
Agroecologia
Utiliza terras imensas para a produção (latifúndio)
Produção em pequenas propriedades familiares, assentamentos da reforma agrária, terras indígenas e quilombolas.
Utiliza produtos químicos na agricultura e pecuária (fertilizantes sintéticos, pesticidas, adubos químicos, agrotóxicos, transgênicos etc.)
Nunca utiliza produtos químicos na produção, ao contrário: aproveita os recursos naturais disponíveis
Gera desequilíbrio ambiental
Restabelece e mantém o equilíbrio ambiental
Modelo voltado para a exportação
Modelo voltado para o consumo local
Contamina o solo, destrói a biodiversidade
Reconstrói o solo, preserva a biodiversidade
Destruição de florestas
Reconstrução de florestas e renascimento da vida
Grandes plantações de produto só (monocultura)
52
um
7. Desenvolvimento É preciso desenvolver a agricultura de vocês! Vim ajudar nisso! Vamos derrubar essa floresta, preparar a terra e plantar só uma cultura. Assim, podem usar só um tipo de veneno. Isso vai dar muito dinheiro e vocês vão ter uma vida boa.
Você acha que o indígena vai ter uma vida boa matando a floresta e poluindo a terra que sempre lhe trouxe vida?
Mas é preciso inovar! É preciso se desenvolver! Vocês não podem ser atrasados a vida toda! Veja o projeto que tenho para vocês. Uma linda plantação de soja! Quilômetros e quilômetros de soja!
Produção diversificada convivendo junto com florestas.
Princípios da economia de mercado
Princípios da economia solidária
Compromisso com o lucro
Compromisso com a vida
Não convive com outras espécies, nem mesmo com seres humanos, que são expulsos de suas terras para dar lugar às monoculturas
Convive e integra todas as espécies, em perfeito equilíbrio.
Indígenas não precisam de grandes plantações, e nem que as plantas cresçam juntas e sejam do mesmo tamanho. Podemos plantar o que necessitamos junto com as árvores, com as matas, com outras espécies. A planta grande ajuda a planta pequena, a pequena ajuda a grande. Nenhuma precisa morrer para que outras possam viver. 53
Outro consumo é possível
Mas usem pelo menos fertilizantes! Dessa forma, a produção será muito maior do que aquela que vocês estão acostumados.
Negativo! Se poluirmos nossa terra, nossas águas e nossas plantas com estes agentes químicos, para apressar o tempo, estaremos cometendo um crime contra a mãe natureza e contra nós próprios. Este diálogo aconteceu no ano de 2004, entre técnicos da empresa Aracruz Celulose e indígenas da etnia Tupinikim, da Aldeia Pau-Brasil, no Espírito Santo. No município de Aracruz-ES, há séculos, vivem indígenas da etnia Tupinikim e Guarani. Eram mais de 30 aldeias, até o momento em que a empresa gigante Aracruz Celulose invadiu as terras, na década de l960. Destruiu aldeias, expulsou indígenas e transformou as matas em plantações de eucalipto para a produção de celulose, a ser transformada em papel. A poluição tomou conta da região, contaminando as sete aldeias que restaram. O deserto verde, como é chamada a monocultura do eucalipto, fez secar vários rios e eliminou toda a biodiversidade. Os indígenas travam uma luta incansável contra a Aracruz Celulose pela recuperação das terras e a regeneração da natureza. Além disso, ainda precisam resistir à pressão sedutora dos técnicos da empresa, que tentam convence-los a aderir a um modelo de desenvolvimento que tem a morte como matéria prima.17 54
Para mais informações sobre a luta dos povos Tupinikim-Guarani, consulte o site http://www.fase. org.br/_reg_espsanto/ , acessado em 13.02.2009. 17
IV CONSUMO SOLIDÁRIO Admiro sua atitude de ser consumidora ética, responsável, solidária. Mas isso não serve para mim. Não abro mão do conforto, de comer bem, me vestir bem...
E você acha que tem mais qualidade de vida do que eu? Não sei... Você parece sempre muito bem.
Mas é claro! Minha alimentação é saudável, sem venenos. Consumo produtos de ótima qualidade da agroecologia. Quando preciso de um serviço, posso chamar alguém da Rede de Economia Solidária! Mas você não vai aos shoppings, não come os lanches deliciosos que tem ali, não compra as novidades da moda... Não tem o prazer de entrar num hipermercado, ver aqueles eletrônicos lindíssimos e juntar dinheiro para comprar um... 55
Outro consumo é possível
É verdade, eu já valorizei muito essas coisas, numa etapa de minha vida. Hoje, não valorizo mais. Libertei-me disso!
Exatamente, como eu era antes.
Você quer dizer que eu sou escrava do consumo?
Descobri que preciso de poucas coisas materiais para ser feliz. O que me traz mais alegria eu não preciso comprar. Descobri também que, nossa escolha na hora de consumir, tem conseqüências. Na vida tudo é interligado. Aquecimento global, enchentes, furacões, doenças que antes não existiam,... a própria oneomania que você está tratando! São conseqüências do consumismo.
56
Acho que você tem razão. Vou pensar melhor antes de fazer compras.
Consumo é um ato de livre escolha. É possível escolher livremente o que consumir, quando consumir, onde, para que e de quem consumir. Por exemplo, você pode escolher comprar o pão da padaria da esquina ou ir até o supermercado. Pode preferir o pão de marca famosa ou o pão caseiro. Pode escolher, também, comprar de quem vende na porta de casa ou frequentar uma padaria comunitária. Se você se habituar a comprar na padaria comunitária, que faz parte da economia solidária, estará praticando o consumo solidário.
1. Círculo Virtuoso Consumindo de forma solidária, ajudamos a formar um círculo virtuoso. Por exemplo: na hora de comprar frutas e verduras, podemos ir a uma feira de pequenos agricultores e agricultoras que trabalham de forma coletiva, solidária e não utilizam produtos químicos nas plantações. Estes agricultores(as) também podem adquirir os produtos que necessitam de outros produtores e produtoras solidárias, como as embalagens para seus produtos ou o seu próprio alimento e de sua família. Outro exemplo: ao adquirir detergente ecológico de um grupo de economia solidária, muitos poderão ser beneficiados: • você, que utilizará um produto de qualidade; • o grupo que produz o detergente ecológico, que poderá obter o sustento da família; • catadores de material reciclado, que fornecem embalagens para os produtores de detergente e também podem obter seu sustento; • a natureza, que é poupada.
57
Outro consumo é possível Estará formado o círculo virtuoso. Virtuoso vem da palavra virtus, que significa força. O termo virtuoso significa disposição firme e constante para a prática do bem (opõe-se a vício).18 Círculo dá a idéia de movimento. Portanto,
Círculo virtuoso significa um forte movimento para a vida. O sistema capitalista, ao contrário, gera um forte movimento de morte. Ao adquirirmos uma roupa de marca famosa, produzida com produtos químicos poluentes, pode acontecer o seguinte: • poluição do planeta pelos resíduos químicos lançados no ambiente; • prejuízo às comunidades nativas, à fauna, à flora existente nos locais onde são despejados agentes tóxicos; • problemas para a saúde de quem trabalha e dos seres vivos que habitam o local, pelo contato com poluentes; • maior concentração de renda, porque estaremos adquirindo produtos das empresas ricas e que muitas vezes exploram trabalhadores e trabalhadoras; • aumento da pobreza local, porque o dinheiro que é aplicado nos produtos de marca sai da comunidade e vai para outros países. É comum, também, empresas de confecção que trabalham com 58
18
Ver Dicionário Aurélio
sistema de facção se beneficiarem de trabalho escravo, trabalho infantil e de imigrantes. Neste tipo de exploração, trabalhadores e trabalhadoras recebem pela quantidade que são capazes de produzir. O valor que recebem por peça costurada é muito baixo. Por isso, trabalham sem descanso para produzir o máximo e assim, poder sobreviver. Em São Paulo, foram descobertas várias oficinas de costura clandestinas, em condições degradantes, funcionando à base de trabalho desumanizado, explorado. Foram encontradas etiquetas de conhecidas lojas de moda. Estas lojas tiveram que se explicar para o Ministério do Trabalho e Emprego.19
2. Produção Local Quando comprarmos produtos de multinacionais, nosso dinheiro vai para outros países. Pode ser até utilizado para financiar guerras injustas ou para causar danos a pessoas, animais e a natureza, como tem sido acusada a Coca-Cola20, o Mc Donald’s21, a Shell22 e outras grandes corporações. Podemos adquirir produtos e serviços dos nossos vizinhos, Veja mais detalhes sobre o trabalho escravo nas confecções nos sites http://www.reporterbrasil. org.br/exibe.php?id=617 – acessado em 13.02.2009 - http://www.agenciamigrantes.com.br/noticia171007 - acessado em 13.02.2009 www.ecodeate.com.br - Matéria da Folha de S.Paulo, publicada pelo IHU On-line, 23/03/2008 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS. Site acessado em 13.02.2009 20 A Coca-Cola é responsável por muitos crimes, dentre eles: (a) o uso irracional da água no planeta: (b) assassinato de concorrentes; (c) violação de direitos humanos dos trabalhadores, dentre outros. Ver www.adital.com.br – Coca-Cola Denunciada” 21 McDonald’s é a multinacional que mais utiliza carne no mundo. O metano emitido pelo gado criado pela indústria da carne é um dos principais causadores da crise do “aquecimento global”. McDonald”s gasta milhares de toneladas de embalagens desnecessárias, que vão para o lixo. Os lanches produzidos têm elevado índice de gorduras, aditivos químicos. Ver www.vidavegetariana.com - Boicote o McDonalds 22 Dentre outros crimes, Shell é acusada de poluição tóxica nas águas subterrâneas e no solo (www. greenpeace.org.br – Greenpeace protesta no Rio de Janeiro contra poluição tóxica causada pela Shell em Paulínea); foi “premiada” pela organização “Olho Público sobre Davos” como uma das cinco empresas mais irresponsáveis social e ecologicamente do planeta em 2005. www.observatoriosocial. org.br. Fórum Econômico Alternativo premia as cinco empresas mais irresponsáveis. 19
59
Outro consumo é possível freqüentar o comércio da comunidade, visitar pequenos produtores e produtoras, as feiras agroecológicas, grupos de economia solidária. Dessa forma, estaremos entregando nosso dinheiro para ser investido na nossa comunidade, na nossa cidade, beneficiando os próprios moradores e moradoras. Além disso, é muito mais fácil conhecer a procedência de um produto que é produzido por perto do que aquele que se compra nos grandes shoppings ou supermercados. Pense na sua rua, na sua comunidade: quais os produtos e serviços que você pode obter ali? Faça uma relação de todas as possibilidades de consumo, desde a alimentação até os serviços: cabelo, manicura, serviço de pedreiro, encanador etc. Pode haver muitas pessoas e grupos que produzem ou prestam serviços, que você ainda não conhece ou não prestou atenção. É possível que haja algum grupo de economia solidária bem próximo de você. Veja se na sua região existem estas experiências: • • • • • • • • • • • • • 60
Banco comunitário Moeda social Clube de troca Loja solidária Cooperativa de produção Cooperativa de consumo Feira solidária Grupos que trabalham com agroecologia Padaria comunitária Horta comunitária Micro-empresa cooperada Associações solidárias Outros
Se há alguma dessas experiências na sua região e você não
conhece bem, faça visitas, converse com as pessoas, observe como acontece o trabalho ali.
3. Redes Solidárias A palavra rede é bem antiga e vem do latim retis, significando entrelaçamento de fios com aberturas regulares que formam uma espécie de tecido. Se pensarmos na vida do planeta, constataremos que tudo está interligado, como numa grande teia. Seres humanos dependem dos animais, que dependem dos vegetais, que dependem dos quatro elementos (água, fogo, terra, ar). Redes são circulares. Num círculo, ninguém é mais ou menos importante. Redes não possuem ápice. Lembram igualdade, interdependência, cooperação. Quando falamos em rede solidária, estamos nos referindo a pessoas e grupos de trabalho, que se unem entrelaçando afetos, práticas, experiências, lutas. A economia solidária cresce a cada dia, sob a forma de redes. Laços são construídos, ligando grupos, experiências e pessoas que acreditam e praticam os valores da solidariedade, autogestão, partilha, cooperação, trabalho coletivo. Ao consumirmos bens e serviços das Redes Solidárias, os grupos vendem toda a produção e aumenta o excedente para o reinvestimento coletivo na criação de outros grupos solidários. Desta forma, amplia-se a autonomia das redes frente aos mercados capitalistas, gerando novos postos de trabalho com distribuição e renda. Conforme as redes vão sendo tecidas e ampliadas, uma nova forma de organizar o trabalho vai surgindo e se consolidando. Aos poucos estas práticas adquirem força, ocupam e renovam os 61
Outro consumo é possível espaços, transformando antigos postos de competição e ganância em redes de cooperação e solidariedade. Você também pode fazer parte desta rede e participar na construção de uma outra economia possível!
4. Consumo solidário e responsável Encerramos a primeira parte desta cartilha com as palavras inspiradoras de Leonardo Boff: “O consumismo que a cultura do capital gestou está na base da fome de bilhões de pessoas e da atual falta de alimentos da humanidade. Em face a tal situação, como deveria ser o consumo humano? Em primeiro lugar, o consumo deve ser adequado à natureza do ser humano. Esta, por um lado, é material, enraizada na natureza e precisamos de bens materiais para subsistir. Por outro lado, é espiritual que se alimenta com bens intangíveis como a solidariedade, o amor, a acolhida e a abertura ao Infinito. Se estas duas dimensões não forem atendidas nos tornaremos anêmicos no corpo e no espírito. Em segundo lugar, o consumo precisa ser justo e equitativo. A Declaração dos Direitos Humanos afirma que a alimentação é uma necessidade vital e por isso um direito fundamental de cada pessoa humana (justiça) e conforme as singularidades de cada um (equidade). Não atendido este direito, a pessoa se confronta diretamente com a morte. Em terceiro lugar, o consumo deve ser solidário. É solidário aquele consumo que supera o individualismo e se auto-limita por causa do amor e da compaixão para com aqueles que não podem consumir o necessário. A solidariedade se expressa pela partilha, pela participação e pelo apoio aos movimentos que buscam os meios de vida, como terra, moradia e saúde. Implica também a disposição de sofrer e de correr riscos que tal solidariedade comporta. 62
Em quarto lugar, o consumo há de ser responsável. É responsá-
vel o consumidor que se dá conta das consequências do padrão de consumo que pratica, se suficiente e decente ou sofisticado e suntuoso. Consome o que precisa ou desperdiça aquilo que vai faltar na mesa dos outros. A responsabilidade se traduz por um estilo sóbrio, capaz de renunciar não por ascetismo, mas por amor e em solidariedade para com os que sofrem necessidades. Trata-se de uma opção pela simplicidade voluntária e por um padrão conscientemente contido, que não se submete aos reclamos do desejo nem às solicitações da propaganda. Mesmo que não tenha conseqüências imediatas e visíveis, esta atitude vale por ela mesma. Mostra uma convicção que não se mede pelos efeitos esperados, mas pelo valor que esta atitude humana possui em si mesma. Por fim, o consumo deve ser realizador da integralidade do ser humano. Este tem necessidade de conhecimento e então consumimos os muitos saberes com o discernimento sobre qual deles convém e edifica. Temos necessidade de comunicação e de relacionamentos e satisfazemos esta necessidade alimentando relações pessoais e sociais que nos permitem dar e receber e nesta troca nos complementamos e crescemos. Às vezes esta comunicação se realiza participando de manifestações em favor da justiça, da reforma agrária, do cuidado pela água potável, da preservação da natureza, ou também vendo um filme, assistindo a um concerto, indo a um teatro, visitando uma exposição artística, participando de algum debate. Temos necessidade de amar e de sermos amados. Satisfazemos esta necessidade amando com gratuidade as pessoas e os diferentes de nós. Temos necessidade de transcendência, de ousarmos e de estarmos para além de qualquer limite imposto, de mergulharmos em Deus com quem podemos comungar. Todas estas formas de consumo realizam a existência humana em suas múltiplas dimensões. Estas formas de consumo não custam e não gastam energia, pressupõem apenas o empenho e a abertura para a solidariedade, para a compaixão e para a beleza. Tudo isso não traduz aquilo que pensamos quando falamos em 63 felicidade?”
Parte II
EXPERIÊNCIAS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL “Muita gente pequena Em muitos lugares pequenos Fazendo coisas pequenas Mudará a face da terra” (Provérbio africano)
Outro consumo é possível
I MAPEAMENTO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL No Brasil, a economia solidária tomou impulso a partir da segunda metade da década de l990. Vários grupos diferentes começaram a se organizar buscando construir uma nova economia: justa e solidária. Merecem destaque, na década de l990, as cooperativas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), as empresas falidas que foram assumidas pelos trabalhadores e trabalhadoras, o surgimento de entidades que apóiam as iniciativas da economia solidária e a caminhada no sentido da constituição de redes.23 Instâncias federais e estaduais foram constituídas na década de 2.000, a partir do mandato do Presidente Lula, como resultado de uma intensa mobilização desencadeada a partir do primeiro Fórum Social Mundial, em Porto Alegre: SENAES (Secretaria Nacional de economia solidária), FBES (Fórum Brasileiro de economia solidária), os fóruns estaduais de economia solidária. No ano de 2007, no Brasil, foram mapeadas 21.859 experiências de economia solidária: cooperativas, associações, clubes de troca, bancos comunitários, grupos de produção e de consumo, micro-empresas cooperadas24, empresas autogestionárias25, dentre outras.26 Estas experiências têm se multiplicado a cada ano, tecendo redes no Brasil e em outros países. A seguir, apresentamos algumas delas. Ver a obra de Paul SINGER: A economia solidária no Brasil: autogestão como resposta ao desemprego. São Paulo, Contexto, 2000. pág. 25. 24 Micro empresas cooperadas são aquelas microempresas que se pautam nos princípios e valores da Economia solidária. 25 Empresas autogestionárias são aquelas administradas pelos próprios trabalhadores e trabalhadoras, de forma coletiva, seguindo os princípios da economia solidária. 26 Ver o Atlas da economia solidária do Brasil, atualizado em 2008, disponível no site http://www.mte. gov.br/ecosolidaria/sies_atlas.asp, acessado em 09 de fevereiro de 2009. 23
67
Outro consumo é possível
1. Bancos Comunitários
vem projetos, administram o Banco Palmas e todas as suas ramificações. É um orgulho para cada morador e moradora do Conjunto Palmeiras dizer que o bairro possui um banco próprio, cuja finalidade é beneficiar a todos e todas. A partir do Banco Palmas, surgiram muitos outros bancos comunitários e a Rede Brasileira de Bancos Comunitários.
Banco Palmas www.bancopalmas.org.br • Banco Pirê – Dourados-MS • Banco Palmas – Fortaleza–CE O Banco Palmas foi o primeiro banco comunitário do Brasil. Surgiu a partir da luta e da organização de moradores(as) de uma área de ocupação chamada Conjunto Palmeira. Em l998, a Associação de Moradores criou um banco popular. A experiência foi se expandindo, ganhando parceiros e agregando os moradores do bairro. Hoje27, o Banco Palmas trabalha com cartão de crédito (Palma Card), moeda social (Palmares), micro-crédito, lojas solidárias, clube de troca, feira de produtores e produtoras, grupos de produção. Para obter um Cartão de Crédito PalmaCard é preciso ter um bom nome no bairro. Moradores(as) e o pessoal do comércio local assumem juntos e juntas as responsabilidades do pagamento do crédito. 68
São os próprios moradores e moradoras que cuidam, desenvol27
Ano de referência: 2009
Em Dourados há o Banco Comunitário de Desenvolvimento, o Banco Pirê. Na região circula a moeda social Pirapirê, o cartão de crédito PireCred, loja solidária, grupos de produção coletiva e individual, além de trocas solidárias. Todos estes produtos circulam no próprio município, promovendo o desenvolvimento local, beneficiando moradores e moradoras. Cerca de 250 empreendimentos solidários estão envolvidos na Rede, seja na circulação da moeda social e cartão de crédito, seja nas trocas solidárias, ou grupos de trabalho. Os povos indígenas Tupi-Guarani foram os primeiros habitan- 69
Outro consumo é possível tes do município de Dourados. Por isso, a inspiração para o nome dos produtos utilizados pelo banco comunitário: Pira, em tupi-guarani, significa peixe. Pire é casca ou escama de peixe. Pirapirê, que é o nome da moeda social, no idioma guarani, quer dizer fartura ou dinheiro.
Banco Pirê www.bancopire.org 2. Comercialização e feiras solidárias
sementes crioulas, de agricultura familiar, de artesanato, as feiras municipais e estaduais de economia solidária, e tantas outras. Em vários municípios brasileiros, os grupos que fazem parte da economia solidária também contam com locais fixos para a comercialização dos produtos e serviços. Existem lojas, mercados solidários, centrais de comercialização solidária, dentre outros. São espaços que favorecem uma maior integração entre grupos e o intercâmbio entre as diversas experiências e a comunidade. Além disso, as pessoas que desejam praticar o consumo solidário têm mais facilidade em encontrar os produtos e serviços de que necessitam nos locais fixos de comercialização.
• Feira de economia solidária do Mercosul Santa Maria, RS A nossa luta é sagrada É sagrado este lugar! Esta Feira é o altar Da biodiversidade Da solidariedade Que Deus quer e suscita Por primeiro Ele acredita No povo livre e liberto E só o coração aberto Organizado na luta Vencerá suas disputas Seguindo no rumo certo. (...)
Feiras Solidárias são espaços de encontro dos grupos de economia solidária. Têm como objetivo, além da comercialização dos produtos, trocar experiências, reflexões, informações, divulgar e expandir o projeto da economia solidária no Brasil e no mundo. 70
Em todo o Brasil acontecem feiras de agroecologia, feiras de
Nosso saber é do povo Da luta e da união Formando um só coração Sem medo de ser feliz Fazendo um novo país Da nossa diversidade
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Outro consumo é possível Diferentes, na igualdade Que nos torna lutadores Incansáveis construtores Da SOLIDARIEDADE! 28 Todos os anos, acontece uma grande feira de economia solidária na cidade de Santa Maria, que é visitada por pessoas de várias partes do mundo. A primeira feira aconteceu no ano de 1994. Desde então tem se ampliado muito. A partir de l998, tornou-se Feira Estadual, em 2.000 Nacional; em 2005, passou a ser a Feira do Mercosul e a partir de 2007, passa a ser uma feira latino-americana. Acredita-se que o evento se encaminha para se tornar um Fórum Mundial de Economia Solidária. Ali, uma outra economia acontece. Cada visitante e participante da feira de Santa Maria descobre que é possível um outro jeito de organizar a economia, e se insere no movimento em torno da economia solidária. Em 2008, a feira recebeu pessoas de 30 países, 400 municípios brasileiros e aproximadamente 1.000 experiências de Economia solidária. No evento, além da comercialização, é possível participar de feiras de troca, seminários nacionais e internacionais, caminhadas para a paz, eventos culturais, trocas de experiências, shows, debates e muitas outras atividades.. “Economia solidária: outra economia acontece. A Feira de Santa Maria é uma feira aprendente e ensinante, que fortalece os processos participativos, organizativos, autogestionários e transformadores. Esta proposta forma sujeitos e cidadãos/as no exercício da cidadania.”29 Trechos do Hino da Feira Internacional do Mercosul. Autores: Valdeci Oliveira e Humberto Gabbi Zanatta. Extraído do Jornal da Economia solidária – Edição Especial. Dezembro de 2008 – Santa Maria. 29 Extraído do folder da 5ª Feira de Economia solidária do Mercosul. Site: www.esperancacooesperanca.org.br 28
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• Supermercado Solidário–ES Moradores e moradoras da Bacia do Aribiri, em Vila Velha, contam com um banco social. Este banco social troca material reciclável e óleo de cozinha por moeda social. Com a venda do material, o banco compra alimentos que vão para as prateleiras do supermercado solidário. Moradores e moradoras que receberam a moeda social em troca do material reciclável freqüentam o supermercado e ali podem adquirir o alimento de que necessitam, utilizando a moeda social Verde Vida. A gestão do banco fica a cargo do Fórum Permanente da Bacia do Aribiri, instituído em 2004 com o objetivo de implementar estratégias para o desenvolvimento da região. Por acreditarem na proposta da economia solidária, pessoas e grupos, doam mensalmente ao supermercado solidário, alimentos, produtos de limpeza, e outros, contribuindo com a vida do planeta. A moeda Verde Vida tem os seguintes dizeres: “Esta moeda social será trocada por garrafas pet, latinhas, papel, vidro, papelão e/ou óleo de fritura devidamente separados e limpos, nos postos credenciados pelo Fórum Permanente da Bacia do Rio Aribiri. O valor da moeda será equivalente ao valor do produto, exemplo: 70 garrafas pet valerão 1,00 = 1 kg de macarrão. A moeda será trocada no supermercado solidário, por produtos (arroz, feijão e outros). Utilize a Moeda Verde e contribua para a promoção do desenvolvimento sustentável! ”30 30
Site: www.movive.org.br
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Outro consumo é possível
3. Clubes de troca Clubes de troca são espaços onde as pessoas se reúnem para se organizar, conversar, trocar produtos, serviços, saberes, afetos, experiências, crescer em autonomia. Clubes de troca são verdadeiras escolas de autogestão: ali se exercita a participação, a tomada de decisões, a cidadania. Cada clube de troca tem um jeito próprio de ser e de fazer acontecer o evento. O importante é que haja solidariedade, cooperação, diálogo, justiça, autogestão. Cada participante leva para trocar produtos ou serviços, de preferência que sejam de produção própria. Na troca pode ser utilizada ou não a moeda social. O clube de troca de São Paulo foi pioneiro no Brasil, inspirado na experiência da Argentina. Existem clubes de troca em vários estados brasileiros.
• Rede Pinhão - PR No Paraná, há uma rede de clubes de troca chamada “Pinhão”. Pinhão é semente da Araucária, árvore símbolo do Paraná. A moeda social também recebe esta denominação. O primeiro clube de troca nasceu em 2001 e rapidamente se expandiu. Os encontros seguem os seguintes passos:
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• • • • • •
Recepção/acolhida Mística/reflexão/diálogo/encaminhamentos Apresentação das pessoas e dos produtos Trocas Partilha de recursos do grupo Avaliação
Os clubes de troca da rede “Pinhão” se organizam da seguinte forma: há uma comissão de trabalho eleita pelo grupo e composta por cerca de 6 pessoas, que assumem a cordenação por tempo determinado. A comissão tem como responsabilidade: • Coordenar as diversas etapas do encontro • Representar o clube de troca nos vários espaços de economia solidária e de lutas (mobilizações, fóruns, conferências, reuniões etc.); • Zelar pelo bom andamento dos trabalhos; • Ajudar na articulação em questões que se referem aos grupos; • Participar de espaços de formação em economia solidária, formação cidadã e outros, para contínua atualização e contribuindo para a expansão do grupo; Cada grupo constrói o seu regimento interno ou estatuto, que contém as regras necessárias ao bom andamento dos trabalhos. Há uma reunião mensal com representantes de todos os Clubes de Troca, que é o coletivo de animadores e animadoras. Espaço destinado ao encontro da Rede, onde acontecem estudos, debates, planejamento, avaliação de eventos, etc.
Veja mais informações no site www.cefuria.org.br 4. Cadeia produtiva ecológica – Justa Trama Justa Trama é uma cadeia produtiva ecológica e solidária. Cerca de 700 pessoas, espalhadas em todo o Brasil, participam deste projeto, desde a plantação do algodão agroecológico, passando pelos grupos de costureiras até os grupos de comercialização. Todas as etapas da cadeia produtiva, desde a extração até o 75
Outro consumo é possível retorno à natureza, são realizadas segundo os princípios da economia solidária. O algodão é produzido sem utilização de agrotóxicos, ou seja: não há poluição na terra, água e ar. Também não se utiliza nenhum elemento químico nas etapas da produção. “Quem comprar um produto “Justa Trama”, também estará contribuindo para a construção de um novo modelo de economia, embasado em valores da autogestão, da solidariedade e da inclusão. Estará levando uma roupa inteiramente produzida de forma coletiva, agroecológica – feita com o emprego de técnicas de conservação do solo e da água e de controle de pragas com produtos naturais inofensivos aos(às) trabalhadores(as) – e isenta de qualquer produto químico sintético, radicalmente diferente da produção convencional.”31
5. Associação das Padarias Comunitárias Fermento na Massa–PR Desde l996, padarias comunitárias de Curitiba e Região Metropolitana vêm construindo sua história. Tudo começou com um grupo de mulheres, amigas, que conversavam sobre os problemas sociais e a necessidade de se buscar formas não capitalistas de trabalho e geração de renda.
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Hoje são 22 padarias comunitárias, distribuídas em vários bairros de Curitiba e região metropolitana.32 31 32
Texto extraído do site www.justatrama.com.br Ano de referência: 2009
As padarias produzem pães, bolachas, bolos e outros produtos. A comunidade geralmente apóia este tipo de iniciativa e adquire os pães, praticando consumo solidário e possibilitando que o projeto cresça. Há um coletivo chamado Conselho Gestor Fermento na Massa, grupo composto por representantes das 22 padarias, que se reúne mensalmente para troca de experiências, decisão conjunta, partilha de conquistas e dificuldades. A Associação das Padarias e Cozinhas Comunitárias Fermento na Massa foi fundada em 2007. Esta entidade da economia solidária, é formada por representantes das Padarias e Cozinhas Comunitárias que fazem parte do conselho gestor. A experiência tem se expandido. Surgiram parcerias importantes, que possibilitaram a aquisição de equipamentos, formação técnica e cidadã, possibilidades de intercâmbio com outras experiências de economia solidária. “Esperamos que essas sementes se espalhem pelo Brasil afora, mostrando que é assim que todas as realizações começam: através de um sonho. Neste caso específico, é o sonho coletivo de uma nova sociedade justa, humana, solidária.”33
6. Movimentos Sociais Movimentos Sociais são grupos que se formam para conquista e defesa dos direitos humanos, sociais, culturais, ecológicos... É formado por pessoas que se unem a partir de esperanças e lutas comuns, resistindo à ordem preestabelecida. A Economia solidária pode ser considerada um movimento Ver Caderno Metodologia e Sistematização de Experiências Coletivas Populares. Márcia Carneiro Knapik e Salete Bagolin Bez: Padarias Comunitárias : Fermentando outra economia. Consultar site www.cefuria.org.br 33
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Outro consumo é possível social, já que luta contra a exploração do trabalho, contra a destruição da natureza e busca justiça social.
(MNCR) surgiu em meados de 1999, com o 1º Encontro Nacional de Catadores de Papel.
• Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis
Existem, no Brasil, várias associações de catadores e catadoras de material reciclado, que atuam segundo os princípios da economia solidária.
As grandes indústrias colocam seus produtos no mercado, lucram com eles, mas não se responsabilizam por embalagens e resíduos por elas produzidos. Pouco se importam com o seu destino final.
O MNCR busca seguir os princípios da autogestão, ação direta popular, independência e solidariedade de classe, apoio mútuo.
Todos os dias, a cada minuto, são consumidos e lançados fora, milhões de celulares, móveis, plásticos, roupas, vidros, papéis, alumínio etc. Existem no Brasil, cerca de 200 mil catadores e catadoras de materiais reciclados. Estes trabalhadores e trabalhadoras têm contribuído para preservar o meio ambiente, retirando milhares de toneladas de matérias primas recicláveis das ruas e dos aterros sanitários, destinando-as à reciclagem. Apesar do seu importante papel, sofrem discriminação e geralmente são explorados.
O Assentamento Contestado se situa na Lapa, região metropolitana de Curitiba-PR. No período colonial, era uma fazenda que pertencia ao Barão de Campos Gerais, um famoso latifundiário que mantinha trabalho escravo. Depois, a fazenda passou a ser propriedade de uma empresa transnacional, a INCEPA. Como a empresa devia uma enorme quantia à Previdência Social, um grupo de famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, ocupou a fazenda em 1999.
“Lutamos pela autogestão de nosso trabalho e o controle da cadeia produtiva de reciclagem, garantindo que o serviço que nós realizamos não seja utilizado em beneficio de alguns poucos, mas que sirva a todos. Nesse sentido organizamos bases orgânicas do Movimento em cooperativas, associações, entrepostos e grupos, nos quais ninguém pode ser beneficiado às custas do trabalho do outro.”34
Logo se iniciou uma produção diferenciada de alimentos na área, baseada na cooperação e participação de todas as pessoas, pertencentes às 108 famílias moradoras do local.
O Movimento Nacional dos Catadores de Material Reciclado
Algumas famílias decidiram produzir alimentos e ao mesmo tempo proteger trabalhadores e trabalhadoras, consumidores e consumidoras, e o ambiente natural.
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• MST – Movimento dos Trabalhos Rurais Sem Terra Grupo de Agroecologia Terra Livre
Fala de um catador, extraída do site www.movimentodoscatadores.org.br
Depois de um ano produzindo de forma convencional – utilizando agrotóxicos e outros químicos, houve casos de intoxicação por veneno.
Não foi fácil recusar a pressão dos técnicos do governo, para 79
Outro consumo é possível continuar a utilizar veneno nas plantações! Parecia ridículo abrir mão da tecnologia! Mas o pessoal foi firme na determinação de criar um assentamento agroecológico. Houve muitos estudos, debates, planejamento, e finalmente a criação do grupo de Agroecologia Terra Livre. Por que o termo Terra Livre? Moradores do grupo respondem: “A terra tem que ser livre de venenos, livre de fogo, livre de tudo que é mal. A terra tem que ser livre da concentração.” (D. Maria de Lima) “Se a terra está doente, ela prejudica a mim mesmo e eu prejudico a ela. Se a terra está livre, o ser humano também estará bem.” (Antonio Capitani) “Quando nós pensamos que a terra tem que ser livre, nós também temos que nos libertar!” 35 (Marisete Padilha Steklain) No Assentamento Contestado, funciona a Escola LatinoAmericana de Agroecologia, com 88 estudantes filhos(as) de camponeses(as), assentados(as) e pequenos(as) agricultores(as), ligados(as) a movimentos latino-americanos da Via Campesina.36 O curso de graduação é ministrado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e tem três anos de duração, com aulas que funcionam por etapas, em regime de alternância, entre tempo escola e tempo comunidade, com uma média de 60 a 70 dias cada etapa. Bioenergia “No Assentamento Contestado, pouco se utiliza da medicina convencional. A medicina bioenergética segue a lógica do cuidado e cura sem atingir a natureza e os seres humanos. Depoimenos de três moradores do Assentamento do Contestado, sobre o termo “Terra Livre”. Extraído do caderno da 6ª Jornada de Agroecologia: Cuidando da Terra, Cultivando a Biodiversidade, Colhendo Soberania Alimentar. 36 Ano de referência: 2008
A gente junta bioenergia e agroecologia, projeto de vida e da natureza.” (Maria de Lima)
Veja mais informações no site www.mst.org.br • Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu O coco babaçu é fruto de uma palmeira nativa da região norte do Brasil. Este coco apresenta em seu interior várias sementes ou amêndoas, de onde é extraído o óleo de coco babaçu. O óleo de coco babaçu tem várias aplicações: indústria cosmética, alimentícia, sabão, detergentes, lubrificantes, pomadas cremosas, entre outras. As sementes também são utilizadas para a produção de álcool. Áreas de babaçu, têm sido cercadas e apropriadas injustamente por fazendeiros, pecuaristas e empresas agropecuárias, buscando expulsar trabalhadores e trabalhadoras rurais que sobreviviam da extração do coco babaçu. As palmeiras de babaçu têm ocorrência em mais de 18 milhões de hectares brasileiros. Os grandes empreendimentos capitalistas procuram dominar o mercado do babaçu e devastam as florestas, causam a destruição da biodiversidade e dos povos tradicionais, ameaçam a sobrevivência de cerca de 300 mil extrativistas. A resistência se deu quando grupos de mulheres se organizaram como a Articulação das Mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu, a partir de l990. Depois de l995, nascia o MIQCB – Movi-
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Outro consumo é possível mento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu, em luta pela preservação dos babaçuais, da natureza, pela conquista dos direitos.
Veja mais informações no site www.miqcb.org.br “Essa luta não é fácil, mas vai ter que acontecer! As mulheres organizadas têm que chegar ao poder!” (Refrão da música cantada pelo movimento durante encontro do MIQCB) Hoje, centenas de mulheres das regiões do Maranhão, Piauí, Pará e Tocantins estão organizadas em diversos grupos, cooperativas e associações. Lutam pela terra, pelo cuidado da natureza e pelo direito de assegurar a produção familiar. Produzem artesanato, sabonete, sabão, massa de babaçu, azeite, carvão vegetal, óleo e resíduo para ração animal. “Onde as mulheres fazem enfrentamento, a lei vigora, a lei vale, mas onde as mulheres não se envolvem, a lei também não tem significado nenhum.” (Integrante do MIQCB)
II FÓRUM SOCIAL MUNDIAL - FSM “Deus está sempre conosco, mas achar que vai ficar observando e julgando tudo o que fazemos é ilusão. Ser humano é lutar pela plenitude da vida” (Frei Betto, no FSM de 2009) Não estamos sozinhos na luta por uma sociedade diferente. Pelo contrário! Há grupos espalhados nos cinco continentes, que estão construindo uma forma diferente de organizar a vida. Infelizmente, os meios de comunicação não mostram isso. A mídia quer que nos tornemos consumidores e consumidoras alienadas e utilizam todo o tempo fazendo propaganda de produtos de marca. Os meios de comunicação de massa não querem mudanças, e por isso tratam de esconder tudo o que aponte para a mudança. No entanto, mesmo que as lutas não apareçam ou apareçam pouco na televisão, elas não deixam de acontecer. As pessoas e os grupos se encontram, trocam experiências, dizem não às guerras, ao individualismo, à violência... dizem sim à vida, à justiça, à fraternidade... propõem alternativas, buscam uma forma ética de satisfazerem as suas necessidades produzindo e consumindo de forma solidária... Não estamos sós! O FSM é um grande encontro anual, que acontece desde 2001. Povos de todas as partes do planeta buscam construir um outro mundo possível: justo e solidário.
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São pessoas, grupos, entidades, movimentos sociais, governantes, que se unem pela mesma causa, buscando articulação e fortalecimento a partir deste grande encontro. Na semana em que ocorre o FSM acontecem debates, reflexões, formulação de propostas, troca de experiências, articulação de movimentos sociais,
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Outro consumo é possível articulação entre redes, momentos culturais, mobilizações, marchas e muitas outras atividades.
III NÓS PODEMOS...!
Graças ao FSM, propostas e idéias são lançadas e difundidas, ajudando a derrubar regimes autoritários, chamando governos a atuarem para o bem dos povos e defender a vida do planeta.
Nós podemos...
No Brasil, o movimento da economia solidária se consolidou a partir do FSM. A partir de 2001, o debate se expandiu e foi possível o fortalecimento desta outra economia possível. Caminhando nestra estrada, lado a lado, vamos lá! Construir um novo mundo, e o planeta transformar. Com humanidade, solidariedade, nós vamos vencer! Com muita coragem, esta nossa luta, pode nos dizer... Que a aqui Um outro mundo, é possível, se a gente quiser! Aqui, um outro mundo é possível, se a gente quiser! E vejam só, há quem só vê... Exclusão e lucro pra manter o poder! Anti-social, neoliberal... Mas com a gente vai ser diferente. Por quê? Aqui, um outro mundo é possível, se a gente quiser! Aqui, um outro mundo é possível, se a gente quiser! Música do FSM
• Assumir um compromisso importante conosco, com as pessoas que estão a nossa volta, com aquelas que se encontram mais distantes, com as próximas gerações; • Comprometermo-nos com a vida, onde e como quer que ela se manifeste; • Dar as mãos e lançarmo-nos em um novo projeto de consumo no nosso cotidiano!
Nós podemos... • Dizer não enquanto todos(as) dizem sim; • Dizer sim enquanto todos(as) dizem não!
Nós podemos... • Dizer não ao consumo de produtos elaborados a partir da destruição do meio ambiente e do trabalho escravo; • Dizer sim aos movimentos sociais populares que, corajosamente abrem trilhas e constroem caminhos de justiça e solidariedade;
Nós podemos... Nós podemos construir um outro mundo possível e necessário!
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Outro consumo é possível
Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas Rua Des. Nelson Nunes Guimarães, 346 Cep: 89203-060 Bairro Atiradores Caixa Postal 796 89201- 974 - JOINVILLE-SC - BRASIL Tel: 47 3422-4865 Fax: 47 3433-1815 Página Principal: www.cicaf.org.br E-mail: cicaf@cicaf.com.br
CEFURIA - Centro de Formação Urbano Rural Irmã Araujo Fone-fax: (41) 3322-8487 Praça Generoso Marques, 90 Galeria Andrade, Edifício Astor, 66-C - Curitiba, PR Endereço Eletrônico: cefuria@cefuria.org.br Página na Internet: www.cefuria.org.br
RECID-PR
Praça Generoso Marques, 90 Galeria Andrade, Edifício Astor, 66-C - Curitiba, PR Tel: (41) 3013-1475 ou 3322-8487 Página na Internet: www.cefuria.org.br www.recid.org.br Publicação: Editora Gráfica Popular Fone: (41) 3346-0034 86
Março de 2009