Alfabetização e Letramento - Uma Visão Geral

Page 1

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO – UMA VISÃO GERAL


ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO – UMA VISÃO GERAL


Apresentação

Apresentação Um conteúdo objetivo, conciso, didático e que atenda às expectativas de quem leva a vida em constante movimento: este parece ser o sonho de todo leitor que enxerga o estudo como fonte inesgotável de conhecimento. Pensando na imensa necessidade de atender o desejo desse exigente leitor é que foi criado este produto voltado para os anseios de quem busca informação e conhecimento com o dinamismo dos dias atuais. Com esses ideais em mente, nasceram os livros eletrônicos da Cengage Learning, com conteúdos de qualidade, dentro de uma roupagem criativa e arrojada. Em cada título é possível encontrar a abordagem de temas de forma abrangente, associada a uma leitura agradável e organizada, visando facilitar o aprendizado e a memorização de cada disciplina. A linguagem dialógica aproxima o estudante dos temas explorados, promovendo a interação com o assunto tratado. Ao longo do conteúdo, o leitor terá acesso a recursos inovadores, como os tópicos “Atenção”, que o alertam sobre a importância do assunto abordado, e o “Para saber mais”, que apresenta dicas interessantíssimas de leitura complementar e curiosidades bem bacanas, para aprofundar a apreensão do assunto, além de recursos ilustrativos, que permitem a associação de cada ponto a ser estudado. Ao clicar nas palavras-chave em negrito, o leitor será levado ao Glossário, para ter acesso à definição da palavra. Para voltar ao texto, no ponto em que parou, o leitor deve clicar na própria palavra-chave do Glossário, em negrito. Esperamos que você encontre neste livro a materialização de um desejo: o alcance do conhecimento de maneira objetiva, concisa, didática e eficaz. Boa leitura!

5



Prefácio

Prefácio O início do processo de alfabetização de uma criança é determinante para que ela possa prosseguir no avanço da aprendizagem. A evolução desse processo somente ocorre quando os mecanismos, ferramentas e observações são fornecidas e feitas de modo adequado. É o que este conteúdo visa apresentar para o leitor que necessita conhecer sobre a técnica da Alfabetização e Letramento. Nesse conteúdo, temas importantes serão debatidos e vistos sob o ângulo prático da sua aplicação. Na primeira Unidade será tratada a importância do desenho na formação da escrita da criança, a construção das formas de representação e, entre outros assuntos, o processo evolutivo do grafismo da escrita. A segunda Unidade vai apresentar temas como o processo de alfabetização, a os tipos de escrita (escrita pré-silábica com leitura global, silábico sem valor sonoro, silábico com valor sonoro, silábico alfabético e alfabético) e a importância da sondagem no processo de alfabetização. Na Unidade 3, a substituição progressiva de formas gráficas não identificadas por letras, a importância do trabalho com o nome próprio e o processo de construção de novas palavras são alguns dos assuntos analisados. Finalmente, na Unidade 4, temas como o movimento na educação infantil, a música na educação infantil, as artes visuais na educação infantil, a literatura infantil e como estimular o gosto pela leitura serão estudados. Bons estudos.

7



Unidade 1 – Do desenho ao grafismo das letras

UNIDADE 1

DO DESENHO AO GRAFISMO DAS LETRAS Capítulo 1 A importância do desenho no desenvolvimento da criança, 10 Capítulo 2 As fases do desenho segundo Georges Henri Luquet,

Jean Piaget e Lev Vygostky, 11

Capítulo 3 A ligação entre o desenho e a escrita, 17 Capítulo 4 O progresso evolutivo do grafismo da escrita, 19

Glossário, 23

9


10

Alfabetização e letramento II

1. A importância do desenho no desenvolvimento da criança O pensamento da criança está ligado à sua capacidade representativa, ou seja, ele é capaz de substituir o que está ausente por imagens, desenhos ou até mesmo palavras. Quando a criança utiliza-se do jogo simbólico ou do desenho, automaticamente vai se inserindo no processo de ensino aprendizagem. Dessa forma, ela passa primeiro pelo plano de conceito mental, para depois representá-lo graficamente. Podemos então dizer que o desenho é o antecessor da escrita, pois a criança vai dominando-a por meio de imagens, acrescentando então novos conhecimentos em sua aprendizagem. As crianças utilizam o desenho para expor suas ideias, suas vontades ou fantasias, mesmo que ele não represente de forma fiel o que veem. Em suas reproduções, nos deixam a visão que tinham sobre determinada realidade, sendo essa representação individual, com sua própria particularidade e características. Assim, o desenho pode parece totalmente diferente da realidade aos nossos olhos. Muitos professores precisam mudar sua concepção sobre o desenho e as representações gráficas das crianças, valorizando-o e entendendo que ele faz parte do processo de aprendizagem. Na maioria das vezes, quando o professor propõe um tipo de atividade para as crianças, não leva em consideração sua expressão livre e espontânea, indicando, então, exercícios mecânicos e que em nada estimulam o pensamento. Desde bem pequena, a criança já explora o meio à sua volta e percebe que também é capaz de realizar algumas atividades. Quando lhe é oferecido um papel e um lápis, ela, de seu jeito, exprime ali sua marca, ora com pequenas representações, ora com desenhos repetitivos, como círculos, por exemplo. De acordo com sua interação com o meio, a criança percebe novos movimentos, mesmo que ainda sem compromisso com a representação real. Este primeiro contato com o desenho aparentemente pode não apresentar coerência, pois as crianças pequenas desenham na tentativa de representar o que interpretam do mundo à sua volta. Nos primeiros anos de escolaridade, é particularmente importante explorar esse tipo de produção. Os professores, em sua necessidade de avaliação e entendimento, tentam, por muitas vezes, direcionar o traço dos pequenos. A criança rabisca inicialmente sem que seus traços tenham sentido, e, posteriormente, passa a atribuir um significado de seu mundo imaginário. Para a criança, desenhar representa um momento prazeroso, agradável, no qual não se faz necessária a interferência direta do adulto. Ela pode fazer isso sozinha porque, utilizando apenas sua imaginação e criatividade, constrói suas próprias regras.


Unidade 1 – Do desenho ao grafismo das letras

O desenho é considerado a primeira forma que a criança utiliza para se interligar com tudo que a cerca depois da fala, pois é também uma forma de linguagem, que ela utiliza como a fala ou gestos. Por meio do desenho, a criança também pode se comunicar. Na maioria das vezes, a criança sente-se satisfeita com seus desenhos, pois essa atividade não demanda muito tempo. Suas produções são muito rápidas. Seu repertório gráfico fica condicionado ao seu meio, às suas experiências e é através desse repertório que suas produções acontecem.

A

TENÇÃO! Todas as crianças desenham, independentemente de sua faixa etária. Os desenhos são expressos de formas diferentes, caracterizando, assim, as fases do grafismo.

Os estudiosos do grafismo infantil reconhecem que existem fases comuns no processo de apropriação do desenho como sistema de representação, isso desde o rabisco sem intencionalidade até a representação gráfica.

2. As fases do desenho segundo Georges Henri Luquet, Jean Piaget e Lev Vygostky Georges Henri Luquet se dedicou ao estudo do desenvolvimento da comunicação humana pelo uso da imagem, sendo um dos precursores do estudo do desenho infantil. Seus ensinamentos foram retomados por Jean Piaget. Foi um dos primeiros a estudar o grafismo infantil e dividiu a sequência do desenho em quatro fases: realismo fortuito, realismo fracassado ou incapacidade sintética, realismo intelectual e realismo visual.

Realismo fortuito Este primeiro estágio se inicia por volta dos 2 anos e subdivide-se em desenho involuntário e desenho voluntário. No desenho involuntário, a criança desenha linhas sem intenção, rabisca as linhas apenas por prazer, porque não tem consciência de que elas podem traçar objetos. No segundo estágio, as crianças desenham sem intenção, porém enxergam nos seus traçados semelhanças com objetos conhecidos e a interpretação de seus desenhos pode variar.

11


12

Alfabetização e letramento II

Realismo fracassado ou incapacidade sintética Surge geralmente entre 3 e 4 anos de idade, quando a criança desenha objetos sem ter relação entre eles, ou seja, os desenhos são independentes, pois podem exagerar ou omitir partes. Os elementos estão justapostos em vez de estarem coordenados num todo.

Realismo intelectual Esta fase acontece dos 4 até aproximadamente 12 anos e caracteriza-se pelo fato de que a criança representa objetos através do seu conhecimento e consegue produzir as coisas que vê e também as que estão ausentes. Representa com clareza alguns objetos, desenhando o que está dentro do corpo, por exemplo. Utiliza também legendas, representa distâncias, profundidades ou posições, usando referências.

Realismo visual Nesta última fase, que ocorre por volta dos 12 anos, a criança já consegue desenhar um objeto por completo. É também o período em que começa a fazer uma crítica de seus desenhos e a reparar que os desenhos anteriormente concebidos não estavam de acordo com os objetos reais. Segundo Piaget, a capacidade de criação e inovação supõe construções efetivas e não simplesmente representações fiéis da realidade. Essas etapas do desenho são classificadas como: a) Garatujas: as garatujas começam com traços desordenados no papel e, gradualmente, passam a representar formas que os adultos conseguem identificar. São definidas em duas categorias: garatujas desordenadas e garatujas controladas.


Unidade 1 – Do desenho ao grafismo das letras

b) Garatujas desordenadas: a criança não se preocupa com qual das mãos segura o lápis, giz ou qualquer outro instrumento que utiliza para desenhar. Seus movimentos são amplos, descoordenados e parecem um simples exercício motor, sem a preocupação de preservar os traços que faz, que são cobertos por rabiscos. Por várias vezes, podemos perceber também que, mesmo sendo oferecido um papel maior, este parece não ser suficiente para seu desenho. A criança varia em suas diferentes formas, em seus movimentos mais característicos de trás para a frente e, muitas vezes, pode olhar para o outro lado enquanto desenha. As crianças menores ainda não desenvolveram totalmente seu controle muscular e por isso utilizam os movimentos amplos de maneira repetitiva. É importante que a criança tenha oportunidade de desenhar e, para isso, o adulto deve oferecer suportes para que a criança o faça, evitando, assim, que represente sua criatividade em outros lugares, como paredes ou móveis. Não devemos, nessa fase, pedir que as crianças desenhem um objeto real, mas que valorizem suas representações, pois assim elas entenderão que, de alguma forma, conseguiram se comunicar. No final dessa fase, é possível que surjam os primeiros indícios de figuras humanas, como cabeça e olhos. Essa fase faz parte do desenvolvimento da criança e reflete sua própria evolução. c) Garatujas controladas: a criança descobre que há ligação entre seus movimentos e os traços que faz no papel. Percebe então sua relação com os traços

13


14

Alfabetização e letramento II

e dá mais atenção ao que está fazendo, demonstrando maior controle no tamanho das garatujas, nas formas que representam e na utilização dos espaços do papel. A criança pode variar mais nas cores utilizadas e explorar mais os movimentos longos e circulares, preocupando-se em fechar os círculos que faz. Pode surgir em seu imaginário o desenho da figura humana, fase em que se inicia o jogo simbólico, atribuindo nomes e histórias aos seus desenhos. É na fase pré-operatória que aparece a descoberta da relação entre desenho, pensamento e linguagem. A criança começa então a estruturar melhor a figura humana com braços, pernas e tronco, apesar de não desenhar o pescoço, pois é a imagem interna que possui. Utiliza mais cores, porém seu desenho ainda não condiz com a realidade. Nessa fase, a criança varia também nos movimentos, que são tanto em linha reta como circulares. É pouco comum encontrarmos pontos repetitivos em seus desenhos e o tempo destinado a eles se amplia. Outro ponto relevante é que a criança passa a segurar o lápis, buscando imitar o modelo convencional. A garatuja é de extrema importância e devemos observar a atenção e concentração dispensada aos desenhos. As crianças também começam a desenhar o que está mais próxima a elas, como o pai, a mãe, a irmã ou o irmão. Com isso, cada garatuja passa a representar um universo e uma identidade pessoal e por isso são tão representativas. d) Pré-esquematismo: dentro da fase pré-operatória, que acontece a partir dos 3 anos de idade, aparece a descoberta da relação entre desenho, pensamento e realidade. Quanto ao espaço, os desenhos não se relacionam entre si. A criança já atribui significado ao que desenha, fazendo riscos na horizontal, vertical, espiral e círculos, apesar de não dominar o que faz. Com relação às cores, às vezes podem ser utilizadas em suas produções, mas não há uma relação forte com a realidade. A figura humana torna-se uma procura de conceito, o que depende de seu conhecimento ativo, iniciando a mudança de símbolos. Aos 4 anos, a criança já é capaz de representar no papel o que ela sente, mesmo sendo incapaz de aceitar a opinião de outra pessoa. Até os 6 anos, a criança apresenta uma fase mais criativa e diversificada nas produções, proporcionando uma interação maior entre desenho, pensamento e linguagem. e) Esquematismo: esta fase vai dos 7 aos 10 anos e faz parte das operações concretas. A partir dos 7 anos de idade, as operações mentais da criança ocorrem em resposta a objetos e situações reais. Dessa forma, ela compreende termos de relações como: maior, menor, direita, esquerda, curto, comprido etc. Já tem um conceito definido em relação à figura humana, porém aparecem alguns desvios como exagero, negligência, omissão ou mudança de símbolo. Há também a descoberta das relações quanto à cor.


Unidade 1 – Do desenho ao grafismo das letras

f) Realismo: também faz parte da fase das operações concretas, mas já no final. Em seus desenhos, as crianças também utilizam bastante as formas geométricas, com maior rigidez e formalismo. Descobre o plano e a superposição, abandonando as linhas de base. A representação das roupas é bem acentuada para diferenciar o sexo. g) Pseudonaturalismo: esta fase acontece dos 10 anos em diante. Caracteriza-se pelas operações abstratas. É marcada pelo fim da arte como atividade espontânea e passa a ser uma investigação da própria personalidade da criança, buscando profundidade e uso consciente da cor. A figura humana apresenta características sexuais exageradas com articulações e proporções detalhadas. Há também maior conscientização no uso da cor, que pode ser objetiva ou subjetiva. A expressão aparece como: “eu represento e você vê” e estão presentes o exercício, o símbolo e a regra. A consciência visual (realismo) ou acentuação da expressão também fazem parte desse período. Para Vygotsky, a escrita é um processo longo e complexo, e não simplesmente uma habilidade motora, que envolve a elaboração de um sistema de representação simbólico da realidade. Poucos adultos conseguem perceber quanto o desenho pode revelar o grau de maturidade e o equilíbrio emocional e cognitivo da criança.

A

TENÇÃO! Outro ponto importante na evolução do desenho é a relação com a fala no momento em que as crianças estão desenhando. Em um primeiro momento, a criança, depois de sua representação gráfica, fala o que desenhou. Ao longo de seu desenvolvimento, ela passa a planejar sua ação, verbalizando o que vai fazer.

15


16

Alfabetização e letramento II

Vygotsky também classifica o desenvolvimento da expressão como gráfico-plástica, que se divide em etapas: I) Etapa simbólica: é a fase dos bonecos com cabeça e pés, na qual as crianças procuram representar a figura humana. Essa etapa, segundo o estudioso, é descrita pelo momento em que as crianças desenham com o recurso da memória, sem a preocupação de retratar a imagem fiel do que está sendo representado, destacando apenas o que é importante. Em seus desenhos da figura humana, as crianças se limitam a desenhar duas ou três partes do corpo, como podemos observar na figura abaixo. II) Etapa simbólico-formalista: é a fase na qual percebemos maior elaboração dos traços e formas do grafismo infantil. É o período em que a criança começa a sentir necessidade de não se limitar à enumeração dos aspectos concretos do objeto que representa, buscando estabelecer maior relação entre o todo representado e suas partes. Nessa fase, já se percebe o início de uma figura mais verossímil, e os desenhos são mais detalhados aos olhos de quem vê. III) Etapa formalista veraz: é a fase em que os desenhos se tornam mais verossímeis, ou seja, as representações são mais fiéis ao aspecto observável, e acaba então a etapa dos aspectos mais simbólicos. Nos desenhos desse período, as crianças enfatizam a realidade por meio da proporcionalidade e tamanho dos objetos, que podem mudar de forma.


Unidade 1 – Do desenho ao grafismo das letras

IV) Etapa formalista plástica: identifica-se uma nova forma, um novo modo de desenhar, porque, como um desenvolvimento das habilidades motoras, o sujeito acaba se utilizando de técnicas projetivas e de convenções mais realistas. O grafismo deixa de ser uma atividade com fim em si mesmo e torna-se um trabalho criador. No entanto, há uma diminuição do ritmo dos desenhos, que permanecem mais entre aqueles que realmente desenham porque sentem prazer nesse ato criador. A criança já não mais se satisfaz com produções simples, ou seja, ela busca adquirir novos hábitos representacionais, diferentes técnicas gráficas e alguns conhecimentos artísticos. O professor precisa entender o percurso criador das crianças e regular as intervenções, de acordo com as reais possibilidades de aprendizagem. Cabe ao educador destinar momentos em seu planejamento para elaborar propostas significativas e tomar decisões adequadas em relação ao que pretende ensinar. Vale lembrar que o planejamento é fator primordial e deve servir de subsídio em todos os momentos da rotina do professor. Desenhar é um processo e pode ser ensinado, desde que o docente consiga estimular o aluno de maneira satisfatória. Por isso, reflexões são necessárias para que os professores possam ampliar sua metodologia quanto ao fazer pedagógico, porque, para intervir nas atividades das crianças, deve-se ter muito claro o objetivo. O professor deve valorizar e perceber que a criança tem intencionalidade e utiliza de procedimentos em suas representações. Podemos oferecer desenhos diários, proporcionar aos alunos momentos de apreciação tanto de suas produções como de outros colegas e até mesmo de outros artistas e, assim, intervir no traçado das crianças, favorecendo a ampliação de seu repertório gráfico. As propostas devem fornecer desafios para os alunos, ou seja, estímulos em relação aos desenhos, às cores, ao uso de diferentes suportes e técnicas etc. O professor deve interpretar e questionar as crianças sobre as linhas serrilhadas, pois elas fazem parte do início da escrita e, depois de serem estimuladas, podem apontar o real significado, como o próprio nome ou até mesmo a origem de outras letras. Depois da ampliação desses movimentos gráficos, podem surgir os traçados das primeiras letras.

3. A ligação entre o desenho e a escrita É fato que a partir do momento em que o homem passou a simbolizar suas ideias, o uso da linguagem visual passou a ser primordial para expressar todo tipo de intenção, ideia e necessidade. A própria invenção da escrita surge do processamento de desenhos em símbolos que nomeiam o que nos cerca. Ao observarmos o desenho, devemos levar em consideração que ele faz parte de uma das linguagens básicas da comunicação e da expressão humana.

17


18

Alfabetização e letramento II

Podemos considerar que o desenho então é uma forma de conceito e que é a partir dele que se inicia uma nova forma de representação, o da escrita. Se o desenhar for bem explorado, não prejudicará o desenvolvimento da criança. Primeiro, em seu processo de construção da escrita, as crianças não sabem ainda diferenciá-la dos desenhos. Quando as crianças encontram-se no período de alfabetização, procuram entender o que a escrita significa, como os sinais se organizam e o que eles representam. Na abordagem de Emília Ferreiro e Ana Teberosky, o processo de aquisição da escrita, concentra-se em três períodos: a distinção entre o modo de representação da escrita, a construção das formas de representação e a fonetização.

Modos de representação da escrita É notório que desde a pré-história o homem vem buscando sistemas de representação para exprimir suas ideias e pensamentos, bem como suas necessidades, e isso se dava através de representações gráficas nada organizadas e sem padronização. Por isso surgiu a necessidade de combinação de símbolos para que a comunicação ficasse mais clara e evidente aos olhos de quem via. As crianças passam por esse processo a partir do momento em que começam a estabelecer distinções entre os elementos icônicos e os não icônicos. Os elementos icônicos caracterizam-se pela utilização de desenhos para a representação da escrita, quando a criança ainda não consegue diferenciar o desenho da escrita em si e expressa seu pensamento apenas através de imagens. Já a representação icônica caracteriza-se pela ampliação de representações utilizadas pelas crianças. Além dos desenhos, elas utilizam garatujas ou rabiscos, iniciando o processo de escrita. Apesar disso, ainda não reconhecem as letras e seu valor sonoro. Assim, as crianças percebem que a escrita não é definida apenas como desenho, porque existem outros elementos para compô-la.

A construção das formas de representação Neste período, a criança consegue diferenciar o desenho da escrita. Esta etapa caracteriza-se pelas condições formais da linguagem escrita. Para que a escrita tenha sentido, é necessário um número mínimo de caracteres, entre dois e quatro, explorando nela os eixos qualitativos, quantitativos e até mesmo o controle de sua grafia.

Fonetização Neste período, a escrita começa a representar a fala e não mais os objetos. Aí começa o trabalho com a diferenciação dos sons e dos seus significados. Nesse


Unidade 1 – Do desenho ao grafismo das letras

momento, a criança estabelece as relações entre grafemas e fonemas, ou seja, atribui à letra seu valor sonoro, utilizando-se da linguagem oral para representar e identificar na escrita os sons que antes não conseguia. Percebemos diante de tudo isso então, a importância do desenho no desenvolvimento cognitivo da criança e como sua evolução acompanha o desenvolvimento da escrita, ou seja, diante dos desenhos, dos riscos e rabiscos, vão surgindo as primeiras letras, e cabe ao professor estimulá-la para que seu aprendizado seja efetivo e significativo. É essencial que o professor entenda o caminho que a criança percorre e interfira para que o conhecimento seja entendido e ampliado. O ensino isolado das letras e a progressão em uni-las para formar sílabas e posteriormente palavras, depende de uma programação e exige que o educador participe ativamente do processo de ensino e aprendizagem. Desse modo, ele conhecerá as ideias que as crianças fazem sobre a escrita e, assim, compreenderá como se dá a passagem de um nível para o outro, conseguindo intervir e favorecer a construção da aprendizagem de seus alunos.

4. O progresso evolutivo do grafismo da escrita Quando as crianças conseguem apontar onde está o desenho e onde está a escrita, significa que aprenderam e demonstram segurança na diferenciação deles. Isso é um grande avanço diante dessas duas representações. Neste momento, também, a qualidade do traçado tem menos importância do que o que a criança conseguiu representar. O educador deve compreender que o desenvolvimento cognitivo não se dá de forma linear, é um processo que vai e volta diante das propostas apresentadas. Essas oscilações entre avanços e retrocessos não quer dizer que a criança está regredindo. O educador deve ter a concepção de que isso faz parte do processo de alfabetização. As etapas do aprendizado das crianças seguem seu crescimento. Ao elaborar o planejamento, o professor não pode deixar a cronologia de lado, porém sabemos que não é possível definir o plano de aula totalmente com base nas idades dos alunos, pois devemos respeitar o fato de que as crianças são diferentes e possuem conhecimentos diversos. O aprendizado da criança acontece de acordo com seu próprio ritmo e as influências que seu meio traz. Alguns estudiosos apresentam reflexões sobre o processo de maturação, processo no qual acontecem mudanças. O crescimento é progressivo, tanto no aspecto físico, quanto psicológico e orgânico. Em qualquer estágio da vida do ser humano, podemos falar de maturidade, sem nos limitar à condição adulta.

19


20

Alfabetização e letramento II

A maturidade está ligada à capacidade de o indivíduo em questão realizar atividades, levando em consideração suas condições. Quando falamos de desenvolvimento, devemos pensar na maturação e levar em conta que a aprendizagem é decorrente dela, ou seja, é importante que o organismo esteja maduro para que ela aconteça. É essencial também acreditar que, se as condições tanto biológicas quanto de estimulação forem conservadas, todas as crianças, de acordo com seu nível de conhecimento, podem realizar qualquer ação. Alguns cuidados, porém, devem ser tomados, como estipular certas aprendizagens para cada idade ou focar apenas no que a criança não consegue fazer, pois o vínculo aluno-professor pode ser quebrado e não recuperado, sendo ele um dos fatores essenciais para a aprendizagem. Alguns professores devem ficar atentos a suas expectativas. Diante das respostas das crianças, erradas ou não, os educadores devem oferecer propostas para que as crianças avancem de maneira significativa em seu desenvolvimento. Assim, o professor não deve atribuir o fracasso do aluno à sua imaturidade, e sim à metodologia de ensino e ao planejamento do docente que devem ser analisados e revistos. O aluno tem que se sentir confiante no processo, e o professor deve valorizar os alunos e acreditar nas conquistas deles.


Unidade 1 – Do desenho ao grafismo das letras

A criança evolui também em seu aspecto motor. O simples gesto de agarrar algo com a mão e segurá-lo, assim como o movimento de pinça ou de encaixar peças de brinquedo, exigem um grande esforço por parte das crianças. De acordo com as etapas que vão passando, as crianças estabelecem relações internas e externas, que não estão somente ligadas ao movimento, mas também à organização intelectual. Devemos levar em consideração o desenvolvimento do pensamento e não acreditar que, para a criança avançar em seu aspecto motor, devemos aplicar uma série de atividades de coordenação motora. Quando aplicamos exercícios desse tipo, não facilitamos em nada o processo de aprendizagem dos alunos, pois eles não precisam refletir em nenhum momento, mas apenas repetir os movimentos direcionados pelo professor. Isso não significa que o controle motor não é necessário para a escrita, mas que devemos explorar outros meios para desenvolvê-lo. As propostas de desenho que muitos de nós vivenciamos eram destinadas à pintura de desenhos já elaborados pelo professor, cuja missão era simplesmente “pintar bem bonito”, ou seja, “pintar apenas no espaço de dentro e fazer um belo contorno”. Por muitas vezes, nossos professores indicavam as cores que deveríamos utilizar. Portanto, o percurso criador era totalmente descartado. Atividades de coordenação motora ou desenhos já prontos para serem pintados não passam de técnicas e muitos professores ainda mantêm essa concepção, acreditando que auxiliam no processo de ensino aprendizagem e que são necessários para o desenvolvimento motor pleno dos alunos. Os desenhos livres devem ser valorizados e os professores devem incentivar os alunos a buscar semelhanças entre o que produzem com os objetos reais. Com isso, pode identificar a ação da criança e apontar o significado do que desenhou. Isto posto, não resta nenhuma dúvida de que a criança é capaz de traçar algumas letras, sem exercícios de coordenação motora, repetitivos e extremamente cansativos. A criança coloca no papel a manifestação externa de seu pensamento, isto é, o que já tem elaborado. Quando solicitamos a ela que escreva o que desenhou, que coloque seu nome na folha ou, até um pequeno registro do que fez, possibilitamos diretamente o contato com a escrita e, com isso, ela se sentirá estimulada a “escrever” em suas produções. Evidentemente, essa estratégia não deve ser auxiliada pelo professor, que agirá apenas como mediador do processo. Ao escrever, as crianças passam do simples traçado para uma linha mais contínua e depois a outras linhas para representar várias palavras. Porém, com o tempo, há certa instabilidade, pois a criança passa a não fazer mais as linhas contínuas em suas escritas e podemos identificar algumas tentativas de registrar graficamente algumas letras, particularmente as letras de seu próprio nome.

21


Referências

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO – UMA VISÃO GERAL

O objetivo principal da obra Alfabetização e letramento é tratar da diferença do grafismo do desenho e da escrita, como foi o progresso evolutivo do grafismo para a escrita; a substituição progressiva de formas gráficas não identificadas por letras e a descoberta dos valores sonoros das letras. O livro aborda a conquista da base alfabética da escrita e a proposta pedagógica de Emília Ferreira, além de diferentes áreas como Matemática, Conhecimento de Mundo, Literatura Infantil e Língua Portuguesa.

73


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.